Revista T&D nº 145

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ANO 33 - Nº 145

R$ 18,00

Projeto Amazônia Conectada

O trabalho do CAAdEx

A guerra na Ucrânia - Parte 2


|TECNOLOGIA|

Amazônia Conectada O maior programa de expansão das comunicações na Amazônia Ocidental Roberto Caiafa

m muitas partes do planeta ainda existem grandes regiões de difícil acesso por terra e com baixa densidade populacional. As populações dessas áreas encontram nos rios que as atravessam uma solução comum para atender às suas diversas necessidades de sobrevivência, ou seja, a vida flui pelos rios. Esse é o perfil típico da Amazônia brasileira, onde as grandes dimensões territoriais e a sua precária rede de estradas, que servem apenas as maiores cidades, causam uma natural concentração demográfica ao longo das margens dos principais rios, tornando-os importantes rotas hidroviárias e sustentáculo de toda a atividade local, em que pese a falta de instalações básicas de serviços e a presença quase sempre tênue do estado. A debilidade de meios na Amazônia Ocidental brasileira é mais patente quando se lança um olhar sobre as telecomunicações. Não há capacitação disponível para que serviços comuns, como a internet e a telefonia celular, por exemplo, sejam prestados com a mesma qualidade e alcance verificados em outras regiões do País. Nos municípios com alguma infraestrutura de telecomunicações, links de comunicação via satélite são utilizados, uma solução de custo mensal muito alto e que oferece largura de banda limitada, 16 TECNOLOGIA & DEFESA

cuja latência (lag ou delay) da transmissão prejudica o funcionamento dos sistemas corporativos. Por outro lado, a evolução dos links de fibra óptica verificada no Brasil nas últimas décadas simplesmente ignorou grande parte daquela porção do território, criando o chamado “Tordesilhas Digital”, efeito assim denominado por concentrar grande parte da infraestrutura de cabos ópticos e suas redes nas Regiões Sudeste e Sul. Para superar essa lacuna e melhorar o sistema existente no Estado do Amazonas, foi idealizado o Programa Amazônia Conectada, com a proposta de realizar a conexão dos municípios isolados daquela imensidão.

O PROGRAMA Concebido inicialmente pelo Exército Brasileiro, prevê a instalação de cerca de oito mil quilômetros de cabos de fibra óptica nos leitos dos rios Negro, Solimões, Madeira, Juruá e Purus, interligando 52 municípios e atendendo a 3,8 milhões de pessoas. O objetivo é levar serviços de internet de alta velocidade, telemedicina, telesaúde, ensino à distância, entre outros, para populações ribeirinhas e indígenas, escolas, organizações militares e órgãos públicos. Compreendendo cinco infovias, o programa recebe verbas do Ministério da

Defesa e de outros ministérios, além de captar recursos de pesquisa e desenvolvimento (P&D) da Superintendência da Zona Franca de Manaus (SUFRAMA) e de outras fontes de investimentos. Lançado no final de 2014, foi oficialmente apresentado em 16 de julho de 2015, quando da conclusão do projeto piloto Backbone de Saída Manaus, e deverá estar concluído até o final de 2018, a um custo revisto de R$ 600 milhões (estava orçado em R$ 1bilhão). O Amazônia Conectada contribui com as ações do Governo Federal por meio do Programa Nacional de Banda Larga (PNBL), do Ministério das Comunicações, e apoia as políticas públicas de inclusão digital, de incentivo às pesquisas, educação, sensoriamento e monitoramento ambiental, e a segurança de dados nacionais. A tecnologia de fibra óptica permitirá conexões de até 100 gigabit por segundo. A adoção do programa deverá estabelecer um novo marco de desenvolvimento do País, através da informação e do conhecimento.


Fotos: Programa Amazônia Conectada / Centro de Telemática do Exército

A balsa da Aquamar com o carretel de cabo subaquático: 270 km de comprimento e 370 toneladas de peso! Ao lado, mapa com a disposição das cinco infovias fluviais previstas Desafios Uma vez que espalhar quilômetros de postes pela floresta é algo inviável, optou-se pelo lançamento de uma rede de fibra óptica nos leitos dos rios, que são as estradas naturais da região. Também, uma rota de cabo ao longo do leito causa danos ao ambiente muito menores do que a construção de uma estrada. A utilização de um cabo óptico subfluvial é a solução mais indicada para se montar uma rota tronco, solidificando ainda mais a vocação da Bacia Amazônica como o melhor curso para receber esse canal de informação. Entre os inúmeros obstáculos e gargalos detectados estavam a TECNOLOGIA & DEFESA 17


| UNIDADES |

CAAdEx Excelência no adestramento da Força Terrestre Roberto Caiafa

resultado da Guerra do Golfo de 1991 obrigou os Exércitos das grandes potências a reverem sua doutrina. Foi uma das campanhas mais inovadoras dos modernos conflitos, introduzindo no campo de batalha uma sofisticação tecnológica e um poder de fogo sem precedentes. Novos vocábulos como aviões stealth (furtivos ao radar) e bombas inteligentes, capazes de atingir alvos de forma cirúrgica, ficaram em voga na mídia e tornaram-se populares. Dentro desse contexto e acompanhando o cenário internacional, o Exército Brasileiro (EB) já havia iniciado, anos antes, uma profunda análise de suas capacidades e necessidades frente aos desafios futuros, ajustes esses que culminaram na criação do Comando de Operações Terrestres (COTER), em 06 de novembro de 1990. A ativação do Centro de Avaliação de Adestramento do Exército “General Álvaro Braga” (CAAdEx), em 21 de agosto de 1996, foi a consequência natural desse processo de transformação aplicada ao preparo da Força Terrestre.

ENTENDENDO O CAAdEx O CAAdEx está subordinado à 1ª Subchefia do COTER e tem por missão avaliar organizações militares operacionais do EB, com a finalidade de aprimorar o treinamento de indivíduos no desempenho das competências designadas; lapidar o adestramento de grupos reunidos taticamente na aplicação de Técnicas, Táticas e Procedimentos (TTP) inerentes às tarefas previstas para o seu escalão, tipo e natureza; avaliar a capacidade operativa (eficiência ou poder de combate) requerida pela tropa, conforme a missão; apoiar, simulando o combate, tropas do Exército e demais Forças, buscando desenvolver as capacidades de prontidão e interoperabilidade; cooperar com a doutrina, no nível tático, por meio da análise comparativa entre o previsto e o 24 TECNOLOGIA & DEFESA

executado pela tropa; trabalhar em conjunto com a Ciência e Tecnologia na avaliação operacional de produtos de defesa (PRODE) em parceria com outros órgãos; e cooperar com a instrução militar na análise do conteúdo, método e tecnologias previstos no Sistema de Instrução Militar do Exército Brasileiro (SIMEB) e Sistema de Ensino Militar (SEM). Ao longo de 20 anos, o CAAdEx desenvolveu metodologia própria, que foi aperfeiçoada através de intercâmbios com nações amigas. Esse método está baseado nos quatro pilares de avaliação utilizados: a Força Oponente (For Op), o Observador Controlador e Avaliador (OCA), o Dispositivo de Simulação e Engajamento Tático (DSET) e a Análise Pós-Ação (APA).

OS QUATRO PILARES FUNDAMENTAIS A For Op é uma tropa orgânica do CAAdEx que simula as força inimigas. Possui alto grau de adestramento e motivação. Estremamente flexível, não se prende necessariamente à Doutrina Militar Terrestre Brasileira, podendo adotar


Fotos do autor

“Um Exército pode passar cem anos sem ser usado, mas não pode passar um minuto sem estar preparado.” (Rui Barbosa)

modus operandi de outras forças, regulares ou irregulares. Busca vencer o combate, demonstrando eventuais deficiências das forças avaliadas. É, portanto, uma ferramenta nobre de treinamento. O OCA é o militar responsável pela observação e arbitragem dos exercícios. É o pilar insubstituível da Avaliação por ser um profissional profundo conhecedor da doutrina, das TTP e dos fundamentos de emprego da tropa em estudo. Ele detecta e esclarece erros e acertos, alimentando e direcionando as APA. Não intervém em decisões e ações da tropa, ou altera o cenário. É um profissional de difícil formação, devido à atividade que executa. O DSET é a ferramenta tecnológica de simulação viva que reproduz os efeitos do armamento sobre o pessoal, material e instalações. Quantifica os dados objetivos do combate e identifica os atores. Pela sua alta precisão na personalização do combate e na simulação dos efeitos letais do armamento, leva os partidos a vivenciarem a situação de forma intensa, gerando forte influência na área afetiva (estresse de combate).

A APA é um método analítico e interativo que visa, com participação das forças avaliadas, apontar as TTP que devem ser retificados ou ratificados de modo a aperfeiçoar o seu desempenho. Mediada pelo OCA, alimenta a Sistemática de Acompanhamento Doutrinário e Lições Aprendidas (SADLA), gerando Lições Aprendidas (Lç Aprd), Melhores Práticas (Mlh Prat) e Conhecimentos de Interesse Doutrinários Relevantes (CID-R). A avaliação de adestramento é feita com o embate entre a Força Avaliada (For Avl) e a For Op, que gera dados objetivos (DSET- número e tipo de baixas, fratricídios, consumo de munição, etc) e dados subjetivos (OCA - planejamento, aspectos doutrinários, etc). Todas essas informações são debatidas na APA, ocasião em que a tropa em estudo diagnostica, de modo realista, o seu desempenho, internaliza ensinamentos e modifica comportamentos. Os comandantes, em todos os níveis, aperfeiçoam sua liderança, com reflexos altamente positivos para o desenvolvimento do profissionalismo. Na sequência, os conhecimentos são consolidados em relatórios que retroalimentam a Força, contribuindo para a evolução da Doutrina, Ciência e Tecnologia e Educação. TECNOLOGIA & DEFESA 25


Ejercito Argentino

| FORÇAS TERRESTRES |

TAM 2C

MBTs na América do Sul Ejército de Chile

Um inventário

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EjĂŠrcito Bolivariano Roberto Caiafa

T-72B1V

Leopard 1A5

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|ESPECIAL |

Parte II

Ucrânia

A guerra no inverno

Kaiser David Konrad

Continuação do relato do jornalista de T&D, que esteve na linha de frente entre tropas ucranianas e separatistas pró-russos em Luhansk

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Fotos do autor

a Sofyiivska Ploshcha, a bela e famosa praça situada entre a Catedral de Santa Sofia e o Mosteiro de São Miguel, na região central de Kiev, milhares de pessoas se reuniam para celebrar a passagem do ano, aquecendo-se ao redor da tradicional “Árvore do Ano Novo”, que enfeitada de pombas brancas simbolizava o maior desejo da população do país naquele momento: alcançar a paz. À meia-noite, um ano novo de esperança era anunciado pelas badaladas dos sinos das torres das igrejas que, ao silenciarem, foram seguidos pelas vozes dos presentes que de forma uníssona e emocionada cantaram o Hino da Ucrânia numa clara demonstração de patriotismo e, acima de tudo, uma manifestação de apoio aos vários outros milhares de homens e mulheres das Forças Armadas e dos batalhões voluntários que desdobrados na linha de frente encontravam-se entocados, protegendo-se do frio do rigoroso inverno e do fogo inimigo, onde continuavam lutando para defender suas posições que nada mais eram que as novas demarcações do território controlado pelo governo, uma fronteira fictícia que mudava ao fim de cada nova batalha. Nas ruas de Kiev, o conflito não era visto como uma insurreição popular dos habitantes daquelas regiões, mas como uma guerra por procuração empreendida e sustentada pelo vizinho do leste, a poderosa Rússia. Este doloroso e caro conflito acabou por unir o país, histórica e geograficamente dividido pelas influências do Ocidente e da Rússia, fazendo ressurgir o nacionalismo e a verdadeira identidade do povo ucraniano.

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| REGISTRO |

Os últimos Stuart e Sherman

em operação

Helio Higuchi e Paulo Roberto Bastos Jr.

Paraguai é um país sul-americano com 406.000km2 de superfície e uma população de 7.8 milhões de habitantes. Suas Forças Armadas contam com 18 mil integrantes e, como muitos de seus vizinhos, sofrem com sérias restrições orçamentarias, que limitam tanto os equipamentos como a própria dotação de militares em atividade. Diante de uma politica governamental de não priorizar seu urgente e necessário reequipamento, muitos de seus meios, embora obsoletos, são ainda mantidos em estado operacional. O Exército, por exemplo, é o derradeiro operador no mundo dos carros de combate M4 Sherman e M3/ M3A1 Stuart, que equipam o Regimiento Escolta Presidencial (REP) e o Regimiento de Caballeria 4 Acá Caraya´ 58 TECNOLOGIA & DEFESA

(RC4), respectivamente, ambos na capital Assunción. A reportagem de T&D teve a oportunidade de visitar essas duas singulares unidades. O Regimiento Escolta Presidencial (REP) é considerado uma unidade de elite, com aproximadamente 900 homens, e tem como missão prover segurança ao presidente da República, ao vice-presidente e mandatários estrangeiros em visita ao país. Além da guarda palaciana, trajando uniforme tradicional, tem companhias equipadas com veículos para escolta presidencial em deslocamentos e enquadra uma companhia especializada em resgate de reféns. O REP conta com uma companhia blindada, junto a dois obuseiros M-101, de 105mm. Os blindados são os ENGESA


Fotos: Helio Higuchi

Ao lado: os 14 M3/M3A1 Stuart não possuem garagem e ficam ao relento. Acima: Os Sherman são movimentados semanalmente

Junto aos dois tipos de carro de combate, o Exército Paraguaio mantém em atividade três meia lagartas M9, sendo dois armados com canhão Oerlikon, de 20mm TECNOLOGIA & DEFESA 31


| INTERNACIONAL |

Colinas de Golã a inteligência de campo

Sistema de monitoramento da fronteira norte é a primeira linha de defesa de Israel frente às novas ameaças Kaiser David Konrad Enviado especial às Colinas de Golâ

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Fotos: IDF Spokeperson

região das Colinas de Golã é uma das mais belas de Israel. Situada ao norte do país, foi conquistada em 1967, durante a Guerra dos Seis Dias. Sua posição estratégica permitia às forças sírias uma visão privilegiada e com profundidade do território israelense, especialmente das áreas banhadas pelo Mar da Galileia. De lá, a Artilharia síria bombardeava constantemente os assentamentos israelenses e com a guerra Israel decidiu capturar as colinas, cuja posse era necessária para garantir sua segurança até que um acordo de paz fosse assinado, quando então as colinas seriam formalmente devolvidas. Tão logo a guerra acabou, Israel tentou incluir a área nas negociações de paz, mas a iniciativa foi recusada pelo mundo árabe. Com isso, em 1981, aquele território foi anexado. Depois de um novo e decisivo embate entre forças sírias e israelenses em 1973, na Guerra do Yom Kippur, a Organização das Nações Unidas (ONU) instalou uma missão de observação para monitorar a Linha Roxa, uma faixa de terra que separa os dois países e que começa no Monte Hermon, do lado da fronteira libanesa, até o rio Yarmouk, na fronteira com a Jordânia. A posse das Colinas de Golã não é reconhecida pela comunidade internacional, mas continua sendo a valiosa moeda de troca de Tel-Aviv pela paz com Damasco.

A inteligência de campo é a primeira linha de defesa de Israel e está equipada com modernos equipamentos e sistemas eletro-ópticos, utilizando, ainda, unidades táticas de Infantaria que percorrem os marcos fronteiriços

Quem visita Golã pode encontrar pelo caminho as ruínas de diversas bases sírias, cujas fortificações abandonadas e semidestruídas são representativas da História Militar israelense, frequentemente pautada por batalhas decisivas e vitórias impressionantes que acabaram por alterar mapas, e por consequência, a balança do poder no Oriente Médio. A área é ainda parcialmente minada e fortemente militarizada, sendo de responsabilidade operacional do Comando Norte das Forças de Defesa de Israel (FDI). Por mais de duas décadas a presença efetiva de unidades tradicionais do Exército Israelense (Tzahal), como a Brigada Golani, e de regimentos encouraçados fizeram das colinas uma das fronteiras mais seguras do pequeno país. Porém, essas unidades vêm realizando um trabalho de retaguarda, garantindo que nenhuma força tente se aventurar numa ação ofensiva além da Linha Roxa. O monitoramento e a antecipação de qualquer tipo de ameaça cabe à Divisão de Inteligência de Combate nº 210, subordinada ao Corpo de Coleção de Inteligência de Combate, um comando operacional das FDI responsável pela coleta de inteligência de campo. Sua principal unidade tática baseada ali é o Batalhão 595, que tem como missão detectar qualquer tipo de movimentação e confirmar intenções externas que possam se configurar numa ameaça à segurança de Israel.

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F-4E AUP Phantom II - 339 Squadron “Ajax”

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Fotos e texto: Silvio Maciel


Iniohos

2016

O exercício Iniohos (condutor de carruagem de corridas na Grécia Antiga) tem sua origem no final dos anos de 1980 e reunia apenas unidades da Hellenic Air Force (Força Aérea Grega) e era considerado um adestramento em pequena escala, conduzido na Base Aérea de Larisa. Sua mais recente versão, já de média escala, de caráter multinacional, aconteceu entre os dias 4 e 14 de abril último, na Base Aérea de Andravida, sede da “117ª Combat Wing”, e contou com a participação também da “United States Air Force in Europe (USAFE)” e a Força Aérea Israelense.

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