Filosofia Nietzsche

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Niilismo

Franco Volpi O filósofo italiano Franco Volpi (19522009) foi professor na Universidade de Pádua e colaborador do jornal La Repubblica. Estudioso do niilismo e da filosofia alemã escreveu, além de O niilismo, Heidegger e Aristóteles.

Nietzsche e o niilismo Camus declara que o capítulo sobre Nietzsche e o niilismo pode ser considerado como um comentário à Vontade de Poder. O texto começa com uma citação da obra de Nietzsche: “Negamos Deus, negamos a responsabilidade de Deus, somente assim libertaremos o mundo”. Para Camus, com Nietzsche o niilismo torna-se profético e consciente. Nietzsche muda a pergunta “pode-se viver revoltado” por “pode-se viver sem acreditar em nada”. Para Camus, Nietzsche responde afirmativamente a esta pergunta. E a “dúvida metódica” muda em “negação metódica”. Assim, o niilismo adquire um caráter demolidor. Sua missão é demolir valores. Novamente as palavras de Nietzsche: “Para erigir um santuário novo, é preciso demolir um santuário, esta é a lei”. Para Camus, Nietzsche quer provocar uma espécie de crise, uma parada decisiva no problema do ateísmo, porque para Nietzsche o mundo marcha ao acaso e não tem finalidade. Camus lembra, no seu texto, que Nietzsche invejava a fórmula de Stendhal: “a única desculpa de Deus é que ele não existe”. Camus afirma que a filosofia de Nietzsche gira em torno do problema da revolta. Esta filosofia começa sendo uma revolta e seu ponto de partida é o “Deus está morto”. Camus esclarece que Nietzsche não meditou o projeto de matar Deus, mas ele o encontrou morto na alma de seu tempo. Assim, para Camus, “Nietzsche não formulou uma filosofia da revolta, mas construiu uma filosofia da revolta”. O essencial da descoberta de Nietzsche, diz Camus, consiste em dizer que, se a lei eterna não é a liberdade, a ausência da lei o é ainda menos. “Com Nietzsche, a revolta desemboca em ascese”. O niilismo de Nietzsche, diz Camus, tem como objetivo tornar insustentável a situação de seus contemporâneos. O “se nada é verdadeiro, tudo é permitido” de Karamazov, é substituído por “se nada é verdadeiro, nada é permitido”. Para ele a única esperança parece ser chegar ao extremo da contradição. Para Camus, Nietzsche não quer redenção. Junto com reconhecer a fatalidade, Nietzsche diviniza a fatalidade. Para ele, a alegria do viver é a alegria da aniquilação. Nietzsche, continua Camus, retorna aos pré-socráticos: a supressão das causas finais para deixar intacta a eternidade dos princípios. Só é eterna a força sem objetivos e o mundo é divino porque é fortuito. Camus afirma que a revolta em Nietzsche o levou a exaltação do mal. Embora esclareça que foi só em certo sentido e que na mente de Nietzsche trata-se

A relação do Nietzsche com o niilismo está documentada tanto nos próprios escritos de Nietzsche como nas obras que analisam seu pensamento. Para muitos historiadores da filosofia, como por exemplo Franco Volpi em sua conhecida obra O Niilismo, Nietzsche é o profeta máximo e o teórico maior do niilismo

apenas do consentimento orgulhoso da alma diante do inevitável. Nietzsche, continua Camus, era partidário do gosto clássico, da ironia, da impertinência frugal, e era um aristocrata que soube dizer que a aristocracia consiste em praticar a virtude sem se perguntar por quê, e que se deve duvidar de um homem que tivesse necessidade de razões para ser honesto. Nietzsche, de acordo com Camus, era obcecado pela integridade. Para ele a integridade era um instinto, uma paixão. Alias, devemos lembrar que em “O mito de Sísifo”, no primeiro parágrafos, “o absurdo e o suicídio”, Camus lembra que para Nietzsche, um filósofo, para ser estimado, deve pregar com seu exemplo. Camus lamenta a utilização ideológica que nacional-socialismo fez do texto de Nietzsche e diz que jamais conseguiremos reparar a injustiça que lhe foi feita. Para Camus nós devemos ser advogados

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