Reverso 92 jornal convivencia

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JORNAL

convivencia um produto reverso

n~91 - cachoeira

maio 2015

UM BREVE PANORAMA CULTURAL DE CACHOEIRA E SAO FELIX

Sessões ilustradas * * * *

Art Suzart Quarta dos Tambores Cineclube Mario Gusmao Deisiane Barbosa

História que sobrevive: desafios e contribuições da Casa de Cultura de São Félix, contados por Tarcila Santana

Ana Paula Santos em entrevista com Pan Batista: Protagonista Quilombola no Conselho de Cultura do Estado da Bahia

Projeto OURUA realiza terceira edição em Cachoeira e Priscila Martins presencia a formação de artistas


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PERFIL

editorial As cidades de Cachoeira e São Félix tentam preservar em si a história que carregam em seus trilhos, pedras e construções. Através de iniciativas dos órgãos, coletivos e indivíduos, as duas cidades vão recontando suas trajetórias num esforço coletivo (físico e financeiro) pela sobrevivência cultural do recôncavo. São notáveis o potencial e a capacidade produtiva da região, mas ainda existem campos inexplorados. Diante desse panorama, não podemos ficar cegos e alheios à essas ações. É necessário que elas ganhem visibilidade.

Esta edição especial mostra um pouco sobre as políticas de manutenção e fortalecimento culturais em Cachoeira, a história de alguns órgãos que, com ou sem incentivos dos governos locais, procuram incluir a comunidade nos processos que são dela por direito. Tentando fazer parte e contribuir neste percurso, o jornal Convivência narra experiência de uma mini-oficina de produção jornalística na instituição GAMGE, de Cachoeira.

quadro

de pirulito art

sumario

O que é o GAMGE? Oficina de jornalismo: como foi a troca de experiências?

Qual a história da Casa de Cultura de São Félix? Para que serve este espaço? Quais suas contribuições?

págs. 4 e 5

pág. 6

O que são políticas culturais? Pra que servem? Quais as políticas realizadas em Cachoeira? págs. 8 e 9

Ourua- ano II/ o que aconteceu no lançamento do projeto? Quais as expectativas da Ong? pág. 10

* Sessões ilustradas Art Suzart, Quarta dos Tambores, Cineclube Mario Gusmão, Deisiane Barbosa

expediente O jornal Convivência é um produto laboratório do Curso de Comunicação Social – Jornalismo, da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), criado pelos estudantes Aline Portela, Ana Paula Santos, Fabio Rodrigues Filho, Natália Dourado, Priscila Martins e Tarcila Santana, para disciplina Impresso I.

Coordenador do curso de Comunicação Social – Jornalismo Prof. Dr. Jorge Cardoso Filho

Reitor da UFRB Prof. Dr. Sílvio Soglia

Coordenação Editorial Convivência Aline Portela, Ana Paula Santos, Fabio Rodrigues Filho, Natália Dourado, Priscila Martins e Tarcila Santana;

Diretora do Centro de Artes Humanidades e Letras (CAHL) Profa. Dra. Georgina Gonçalves

Responsável pelo jornal Reverso Prof. Dr. J. Péricles Diniz

Edição e Editoração gráfica Fabio Rodrigues Filho


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sua maneira de escrita, interpretações e referências acumuladas, e sabendo que tudo perpassa pelo subjetivo, temos que nos distanciar ao máximo do fato e ouvir todas as versões possíveis sobre o acontecimento (desconfiando sempre do contado) afim de compreender e objetivá-lo.

PAREYSON, 1984, p.32)

o fazer recriado numa oficina com o gamge Por Natália Dourado Fundado por Rita Maluf, em 1997, o Grupo de Apoio ao Menor Gotas de Esperança (GAMGE) acolheu mais de quinhentas crianças e adolescentes, ao longo de seus 18 anos, na cidade de Cachoeira. Atualmente o GAMGE apoia mais de cem pessoas, contribuindo para a formação crítica e consciente desses cidadãos, utilizando como mecanismo de transformação social: educar através da arte. A ONG oferece atividades recreativas, como hip-hop, karatê, capoeira, violão e dança afro, além do reforço escolar e oficinas de crescimento pessoal, para um público entre sete e vinte e quatro anos, independente da renda familiar, mas a maioria deles é proveniente de classe baixa. E conta com uma equipe de seis professores e três monitores, que auxiliam na aprendizagem de seus integrantes.

Com intuito de publicizar, integrar e estender à comunidade cachoeirana as apresentações dos grupos do GAMGE, na última sexta-feira de cada mês acontece a Sexta Cultural, onde os alunos da instituição se apresentam abertamente ao público, na própria sede.

apesar de os adolescentes se enquadrarem na mesma faixa etária e grupo social, entendeu-se que cada um deles é singular, visto que é essa a condição de sujeito.

O decorrer deste processo foi marcado pelo cuidado na escolha e desenvolvimento das Ainda com o intuito de tornar visível o traba- atividades propostas em cada uma das oficilho realizado pelo Grupo, uma equipe de estu- nas, para que houvesse interesse e participadantes da Universidade Federal do Recôncavo ção entre os integrantes do grupo, com vista à da Bahia (UFRB) propôs a realização de uma inclusão. Implementar atividades em contexoficina jornalística, oferecidas a 6 integrantes tos reais de ensino e aprendizagem, de modo do GAMGE, entre monitores e alunos, objeti- interdisciplinar, desenvolve a reflexão crítica e vando que a instituição produza o seu próprio permite uma avaliação contínua do processo. jornal e divulgue seus conteúdos e especificidades, tanto internamente como para interes- Em comunicação, analisamos o que seria tal conceito e percebemos o quanto ela está arraisados na área cultural e social. gada e intrínseca à vida. Vimos como o processo comunicacional se respalda na transmissão Este relato compreende a experiência de rea- de informação entre emissor e receptor, onde lizar uma oficina com o GAMGE, entre os dias o último descodifica/interpreta determinada 16,17, 25 e 30 de abril de 2015. Para estabele- mensagem. Percebemos ainda, que qualquer cer o ensino-aprendizagem entre a equipe de tipo de informação que apresenta um aconteideação e os matriculados do GAMGE, foram cimento novo e recente ou desdobra e acrespropostas oficinas de escrita, comunicação, centa algo sobre uma situação já existente, é notícia. E que, informação é uma notícia refotografia e diagramação. cebida ou comunicada, em diferente meios e O principal objetivo das oficinas foi o de ofe- plataformas. recer aos participantes um referencial para a elaboração do seu jornal, com ênfase na lei- Na escrita, recontamos o lead (uma fórmula tura de mundo, na sociabilidade, no aprender de o quê mais quem, quando, onde, como e a observar e aplicar conceitos teóricos na prá- por quê, que nunca resulta em algo igual), a tica. Todo o processo foi desenvolvido numa cabeça da notícia que informa o assunto mais linha crítico-reflexiva, a partir da integração, e importante, numa forma de pirâmide invertida. Entendemos também que cada um tem a

Na escrita, recontamos o lead, a cabeça da notícia que informa o assunto mais importante, e que, como numa fórmula matemática (de o quê mais quem, quando, onde, como e por quê) conta-se perfeitamente uma notícia, numa forma de pirâmide invertida, mas que nunca resulta em algo igual. Cada um tem uma maneira própria de escrita, interpretações e referências acumuladas, e sabendo que tudo perpassa pelo subjetivo, temos que nos distanciar ao máximo do fato e ouvir todas as versões possíveis sobre o acontecimento, desconfiando sempre do contado, afim de compreender e objetivá-lo. Junto à fotografia veio arte, cheiro, física, música, literatura, expressão, pessoalidade. Ao retratar, uma foto nunca é igual a outra, a iluminação, o enquadramento, o foco, as interpretações, fazem com que o conceito de unicidade da fotografia se amplie, e o de manipulação da cena se restrinja a cada novo olhar. Além disso, experienciamos que fotografia é lembrança, e que não se precisa do melhor equipamento para tirar uma boa foto, pois mais que técnica, fotografia é criatividade e percepção. Diagramando pudemos ajustar erros para melhorar o resultado de cada matéria, ainda reconhecemos como é fácil ver os erros dos outros e como um elogio é dificil de ser expresso. As matérias foram digitadas e pretendemos, em breve, organizá-las, numa plataforma viável. “É muito importante aprender com alegria, com vontade [...] sendo importante ressaltar que a educação lúdica está distante da concepção ingênua de passatempo, brincadeira vulgar, diversão superficial” (DALLABONA, 2004, p.2). É por este motivo que acreditamos na diferenciação desta oficina - os alunos a escolheram, houve uma conversa antes da seleção, e só ficaram os meninos que realmente tinham interesse. Possibilitando o Jornal do GAMGE, um novo diálogo com o mundo surge, a partir da leitura de mundo que os integrantes do GAMGE possuem (e isso é bastante subjetivo). As percepções, pesquisas, buscas, experimentações, levantamentos, hipóteses, idéias, etc., são manifestações de ordem estética fundamentadas na necessidade do ser humano de criar, recriar, transformar a matéria e se expressar.

depoimentos “Fazer parte da oficina de impresso foi uma experiência que, além de proporcionar conhecimentos, me ajudou nos aspectos escolar e social. Foi bastante produtiva pois passei a ter uma visão crítica de tudo que está ao meu redor: questionar mais e acreditar menos. Espero que tenha novamente!” - Nicole

“As aulas de impresso foram muito produtivas porque nos motivou a observar cada coisa ao nosso redor e aumentou nossos conhecimentos. Minha visão sobre o mundo ficou mais crítica.” - Nonato

Bembé do Mercado Contará com a Participação do Ministro Juca Ferreira Por Ana Paula Santos O Bembé do Mercado é uma festa tradicional com mais de 126 anos que reúne a população de 42 terreiros de candomblé do Recôncavo baiano.O Bembé começou em 1889 e é chancelada como Patrimônio Imaterial da Bahia desde 2012 através de dossiê do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural (IPAC), órgão da Secretaria de Cultura do Estado (SecultBA). A festa tradicional que acontece todos os anos, na cidade de Santo Amaro, este ano, já tem a presença confirmada do Ministro da Cultura, Juca Ferreira.

“Eu achei uma ótima experiência, foi uma oportunidade gratificante e me fez pensar de uma forma diferente, apurar mais os fatos” - Adrihelle

“As aulas foram legais, pois me fizeram entender que jornalismo e fotografia não são tão difíceis como imaginava. Além disso, para mim a melhor maneira de se expressar é fotografando!” - Graziele

Em sua segunda visita ao estado da Bahia, o ministro Juca Ferreira, esteve em Salvador nos dia 13 e 14 de abril participando do evento Caravana da Cultura,cujo objetivo da ação foi estreitar relações com a sociedade e conhecer nos estados as principais demandas de artistas, gestores, produtores e fazedores de cultura do Brasil, especificamente na região nordeste. Referência na política cultural no Brasil, Juca Ferreira, atuou no ministério da cultura no período de (2008-2010) como ministro na segunda gestão do governo Lula e atualmente na segunda gestão do governo Dilma tendo como marca no seu ministério o reconhecimento bens imateriais ou intangíveis do Brasil e da Bahia como parte do projeto político-institucional do país

“Gostei das oficinas, mas acabei me apaixonando pela fotografia. Ela surpreende, me surpreendeu e espero que continue a me surpreender.” - Lukas

“A oficina de impresso foi o momento em que pude aprofundar meus conhecimentos , aprendi como se faz uma matéria e como a maneira de se expressar interfere numa mensagem.” - Sheyla

Foto Divulgação

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“a arte é um tal fazer que, enquanto faz, inventa o por fazer e o modo de fazer”

Foto: Nonato

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RELATO

COBERTURA

EXPERIENCIANDO


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POLÍTICAS CULTURAIS

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história que sobrevive

A Casa de Cultura Américo Simas é tombada pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC) e mantida pela prefeitura desde sua fundação. Seu acervo histórico é bastante acessado por estudantes brasileiros e estrangeiros para pesquisas e estudos sobre a história do recôncavo e suas vivências, constituindo-se como um dos grandes patrimônios da região.

Desafios e contribuições da Casa de Cultura de São Félix Fotos: Aline Portela Por Tarcila Santana No início da sua atuação como Casa de Cultura, havia um movimento muito intenso. O governo vigente naquela época foi um incentivador daquele espaço e promovia diversas atividades, que variavam entre oficinas artísticas e cursos profissionalizantes. Mas ao longo do tempo, o imóvel foi se desgastando e passou por diversas reformas, o que começou a alterar a dinâmica de funcionamento do ambiente.

O prédio que hoje dá lugar a Casa de Cultura Américo Simas carrega no próprio nome traços da sua longa história. Ele existe desde 1873, quando abrigava uma antiga fábrica de charutos alemã, mas só em 1984 foi adquirido e reformado pela prefeitura da época e transformar-se no que temos nos dias atuais. O espaço recebeu este nome em homenagem a um grande arquiteto nascido na cidade e serve como uma casa multiuso para a comunidade.

“cartas à Tereza” é um projeto artístico-literário e como tal busca relacionar modos de cruzar as artes visuais e a literatura, considerando suas riquezas de gêneros, linguagens e técnicas.

ATIVIDADES Atualmente o local é utilizado para reuniões e projetos de alguns setores da prefeitura (agricultura e esporte), além de abrigar oficinas de dança, grupos de artesanato e capoeira, e guardar algumas peças símbolos de tradições populares – o bumba meu boi e a boneca bibizona, criação da casa, e a cabocla do 2 de julho, são alguns dos objetos utilizados em desfiles e mostras culturais. Há também uma oficina de carpintaria, que fabrica e reforma as cadeiras das escolas.

O projeto abarca diversas ações, produções e processos – um determinado processo onde cabem pequenos (médios e imensuráveis) processos múltiplos… Segue alguns postais e cartas para apreciar e também como participar. Segundo a criadora do projeto, Deisiane Barbosa, o intuito agora é procurar Terezas reais para envio de cartas.

O espaço é apelidado carinhosamente de ‘casa-mãe’ pela atual diretora da Casa de Cultura, Beatriz da Conceição. Ela viu-se envolvida com o lugar bem antes de ele ser o que é hoje. “Me orgulha muito estar nesta casa, é um misto de orgulho e frustração...no sentido de querer fazer mais por este lugar e deixar ele do jeito que a comunidade merece. Mas essesonho ainda vai se realizar e eu sei que aqui já deixei o meu tijolhinho de contribuição”, revelou. PRESERVAÇÃO A carência de manutenção constante e a contenção de verbas pela prefeitura são alguns dos motivos pelos quais a diretora afirma que a casa não está como deveria ser. Mas ela acredita que o espaço serve muito bem a população. “O objetivo maior é estar disponível para a sociedade e atender nesta questão cultural e eu creio que esse papel ela cumpre”, afirmou.

O projeto será apresentado em julho em Feira de Santana e em Cachoeira.

“um barco quando vai ao mar deixa na areia as suas conchas ninguém sabe quando volta e se volta um barco parte e a velocidade quem diz é o vento ninguém sabe como volta e quando voltará” - deisianeB

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SESSÃO ILUSTRADA

CINE

O Cineclube Mário Gusmão é um projeto de pesquisa e extensão vinculado ao curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. O nome do cineclube é uma homenagem ao importante ator negro Mário Gusmão, nascido em Cachoeira, ícone do teatro e do cinema baianos nos anos de 1960 e 1970.

São realizadas sessões semanais e/ou quinzenais, sempre às quartas-feiras, às 19h, em diversos espaços. As críticas dos filmes, escritas por alunos e professores do CAHL, são distribuídas antes de cada exibição, sempre com a realização de debates.

MAIS SOBRE O PROJETO cartasatereza.tumblr.com/


SESSÃO ILUSTRADA

PROTAGONISMO QUILOMBOLA NO CONSELHO DE CULTURA DO ESTADO DA BAHIA Estudante de história da universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), quilombola nascida e criada na comunidade de Santiago do Iguape, em Cachoeira-Ba, Pan Batista é uma ativista cultural preocupada com a preservação da memória do seu povo, conselheira de cultura municipal de Cachoeira pelo segmento Cultura tendo a maior votação na conferência e com vasta experiência em ações culturais na sua comunidade. Em 2014, ela assumiu a responsabilidade de ocupar o conselho de cultura do estado Bahia, seguimento, setores culturais,sendo a primeira mulher quilombola a fazer parte do conselho estadual. Nesta entrevista ao jornal Reverso Pan Batista fala sobre o que faz um conselheiro, desafios, propostas para cultura e política cultural no Recôncavo da Bahia.

QT

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Foto Arquivo Pessoal

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POLÍTICAS CULTURAIS PERFIL

Por Ana Paula Santos

JORNAL CONVIVÊNCIA: A senhora é primeira quilombola a fazer parte de um conselho estadual de cultura. O que motivou a sua participação política ? Pan Batista: Ao perceber esse dado importante foi ai que eu vim perceber o tamanho de nossa ousadia,e quando falo nossa é porque foi um desejo coletivo,como todos sabem sou nascida e criada na comunidade quilombola de Santiago do Iguape no município da Cachoeira-Ba,e tenho como referencial de cultura minha própria família chefiada por mulheres guerreiras e que ativamente coordenou e participou de grandes festejos e manifestações culturais em meu quilombo,cresci vivenciando tudo isso.Mais também tendo que ver muitas manifestações culturais desaparecerem de nosso quilombo por falta de visibilidade,apoio financeiro, isolamento sempre foi um dos grandes desafios,comecei a trabalhar uma nova proposta e minha comunidade passando a motivar os grupos que eu participava diretamente ou aqueles que vinham dialogar comigo que estava na hora de sermos os autores de nossas próprias historias e que o protagonismo teria que ser nosso. Então, comecei efetivamente a ser uma articuladora de fato do processo de desenvolvimento e crescimento de minha comunidade. E não posso deixar de relatar um desejo que nos empurrou a participar ativamente do processo de discussão das políticas culturais e o nosso desejo de construir em nossa comunidade o CENTRO DE CULTURA NEGRA DO IGUAPE.A oportunidade surgiu com o dialogo com a Secretaria Municipal de Cultura da Cachoeira,quando eu fiquei sabendo que haveria uma conferencia municipal de cultura, motivada pela necessidade de sermos ouvidos e vistos incentivei grupos culturais na comunidade como samba de roda,capoeiristas,grupo musical,jovens,griôs,

que compartilhavam do mesmo desejo ver um espaço adequado em Santiago para efetivar nossas ações culturais e preservar nossa memória, depois disso não parei mais!Da maior votação da conferência municipal de cultura em 2013,aos conselhos hoje municipal e estadual pelo segmento Manifestações Populares. Quais são as principais atividades desenvolvidas por uma conselheira ?

cultura,capacitação para artistas,criação do Portal do Recôncavo, incentivo e fortalecimento das festas e ritos populares do Recôncavo, Cursos de capacitação para elaboração e execução de projetos, sendo os capacitados agentes multiplicadores em seus municípios,a cultura no recôncavo ainda sofre muitas dificuldades por parte do fomento e da promoção.Ficamos distantes de muitos equipamentos culturais que possibilitam uma maior divulgação e manutenção cultural.

Tenho convicção que nossa principal atividade é o comprometimento com nossas bases, com o nosso povo, todos aqueles que nos colocaram lá,os verdadeiros agentes da cultura,o que faz arte florescer onde há condições mínimas de oportunizar suas exposições,apresentações. Tornar real a descentralização da cultura para que seja acessível a todo,mas no que se referem as atribuições destaca-se: indicação,deliberação,parecer e resolução. O que a senhora tem pautado no conselho estadual de cultura de Bahia ? Ainda não estou participando das reuniões, mas vou pautar ações que propus na minha candidatura, por exemplo, a valorização dos conhecimentos e expressões das manifestações populares!Cultura, comunicação e cidadania e capacitação para acesso aos editais. Qual é o principal desafio em ocupar o conselho de cultura do estado da Bahia? Sabemos com a homologação da resolução n° 03/2014, que aprovou o Regimento interno do conselho estadual de cultura da Bahia, a estrutura da Secretaria de Cultura – SECULT, previsto no art. 272 da Constituição Estadual, no governo Jaques Wagner, as

resoluções proporcionaram sim um maior diálogo entre os diversos setores culturais,mas para mim o maior desafio é buscar o diálogo interagindo com os diferentes setores,fazer de fato o cumprimento das ações estabelecidas que foram frutos de vários anseios de nosso povo,pra mim fico pensando o que poderemos conquistar dentro do conselho de cultura que efetive e contemple as demandas de todos os segmentos e que não desconstrua nenhuma conquista antes adquirida. Em sua opinião existe uma política cultural ampliada para o recôncavo baiano ? Infelizmente não,por que foi recorde nas conferências municipais e territorial do recôncavo as demandas descentralização da

O que está faltando em termos de política cultural para o recôncavo ? A mudança da mentalidade de nossos gestores públicos, constituindo de fato a democratização do processo cultural, oportunizando a fruição dos bens culturais e das representações originadas das demandas de nossa região, o pensar, agir e um conjunto de conceitos que nos proporcionam grandes resultados. O que a senhora acha da elaboração do plano municipal de cultura ? O plano municipal de cultura é sem dúvida um grande desafio,pois concretizar nossas demandas através das consultas públicas é sem dúvida um grande passo.A missão mais importante para mim do plano municipal de cultura será constituir a execução dos nossos sonhos.

A Quarta dos Tambores, projeto que ocorre com o objetivo de apoiar e valorizar as manifestações culturais de matriz africana, surgiu em novembro de 2011 da necessidade de reunir a cidade em torno de sua cultura. Cada edição busca trazer uma temática relacionada a cultura negra e celebrá-la junto a comunidade. Além da tradicional saudação aos orixás no Toque das Nações, apresentam-se grupos de música e dança da região – Toque dos Artistas. O encontro acontece em toda primeira quarta-feira do mês na Praça Teixeira de Freitas, no centro de Cachoeira.


SESSÃO ILUSTRADA

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POLÍTICAS CULTURAIS Cobertura

PROJETO OURUA REALIZA TERCEIRA EDIÇÃO EM CACHOEIRA Por Priscila Martins

Contos, Cantos e Brincadeiras é uma atividade que tem como público-alvo crianças de 5 a 8 anos. Com histórias contadas, músicas e brincadeiras populares, a oficina tem o objetivo de valorizar a infância, desenvolver a sensibilidade, estimular a oralidade, criatividade, a capacidade de síntese, facilitando o aprendizado e ajudando a compreensão do ambiente em que a criança vive. O curso de teatro é dividido por faixa etária, como explica Alanna Oliveira, Assessora de Imprensa da Casa de Barro, “O Grupo Rouxinol, que é infantil, tem crianças a partir dos 8 anos, que se apresentam declamando poesias com técnicas de teatro. O teatro para jovens é a partir dos 12 e sem limite máximo de idade”. Eles pretendem contribuir no aperfeiçoamento das potencialidades dos alunos através de jogos e dinâmicas, explorando a capacidade de improvisação, a espontaneidade, a ludicidade e a criatividade como processo chave para iniciar a descoberta de um caminho teatral.

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VALDINEY SUZART

é um artista feirense autodidata, que passou sua infância no recôncavo, entre as cidades de São Félix, Cachoeira e Muritiba, fonte de suas temáticas e inspirações. Com influencias surrealistas e utilizando-se também do universo hiper-realista em seus quadros, suas figuras retratam nos rostos e corpos negros as questões sociais que perpassam suas vivências – sincretismo religioso, miscigenação, a cultura afro-brasileira e outras marcas do cotidiano da região. Seus traços circulam entre a poesia e as questões político-sociais, brincando entre as cores e texturas, através de um trabalho instigante e plural que retratam as pessoas que sempre cruzam o seu caminho. A força de sua mensagem e a delicadeza das pinturas dialogam em sua obra.

Foto Aline Portela

A organização cultural Casa de Barro retoma, em sua terceira edição, o projeto OURUA. A proposta tem como iniciativa a formação artística para a infância e juventude e de qualificação profissional para educadores, além de espetáculos para toda comunidade. O projeto conta com oficina de leitura e escrita criativa, o Ateliê de Ficção, curso de teatro e a atividade Contos, Cantos e Brincadeiras.

ARTE

Já expos seu trabalho em vários países e cidades brasileiras. Na V Bienal do Recôncavo, apresentou a instalação “As Marias”, construída com panelas recolhidas nos quintais de casas do recôncavo.

POESIA O Ateliê de Ficção trabalha com públicos mais adolescentes e com foco em contos como gênero literário. As atividades prioritárias são leitura e escrita criativa. “A ideia é que a gente tenha vários encontros e que leia vários contos, e a partir dessas leituras a gente faça exercícios de escrita e depois as próprias pessoas produzirem contos”, explica Maíra Vale, Coordenadora da Oficina. “A gente tem essa ligação com a questão patrimonial e tem a proposta de trazer essa vivência Cachoeira-Recôncavo-São

Félix e incentivar eles a irem buscar essas histórias, não só com a escrita, mas também com linguagens artísticas, inserindo fotografias, ilustrações com diversas técnicas, como desenho, gravura”, conta Deisiane Barbosa, também Coordenadora do Ateliê de Ficção.

O CAMINHO

A estudante Laíse Emília optou pelo Ateliê de Ficção como uma oportunidade de se aperfeiçoar e conhecer mais sobre a escrita, “Eu gosto muito de escrever, tenho mais facilidade para escrever. Eu tô no terceiro ano no colégio e todo teste vocacional que eu faço dá áreas ligadas à escrita. E tá sendo ótimo para mim”.

OURUA

A ESCOLHA DO TERMO AFRICANO OURUA era uma tribo africana que valorizava a cultura local como sua principal riqueza. A comunidade era integrada a seus bens culturais, amante e porta-voz da sua cultura. “Eles utilizavam de sua cultura para encantar os povos estrangeiros e promover desenvolvimento local; por isso escolhemos esse nome para esse projeto. E a ideia do projeto é sensibilizar as pessoas, principalmente crianças e jovens para o patrimônio cultural local através de práticas artísticas”, destaca Alanna Oliveira. O MISTÉRIO DA ÁGUA

A LUZ

“Sinto-me feliz em ser um artista do Recôncavo. Procuro não me prender a uma técnica só, porque quando estou trabalhando não sei qual rumo a pintura vai tomar. Às vezes um detalhe do quadro “pede” que seja feito de carvão ou acrílica. Aí sou “levado” a fazer, por exemplo, uma técnica mista. Sinto que meu trabalho tem uma linguagem simples, o que eu acho muito importante (...). Em 1982, fiz minha primeira exposição coletiva numa praça de Cachoeira, participei com duas telas pequenas. Desde aquele momento, venho descobrindo coisas fascinantes na arte de pintar e vejo que ainda tenho muito a descobrir, tanto na parte técnica como na estética. A pintura é, e sempre será, um grande veículo de expressão, assim como a instalação, escultura, fotografia, etc. Já fiz, e posso voltar a fazer, instalações e esculturas, mas meu negócio mesmo é a pintura”, diz Suzart. (Depoimento para Caixa Cultural de SP, onde realizou exposição) “A função da arte é provocar e talvez criar discussões e movimentos com a sociedade. O artista deve ser sincero com seu trabalho para que as pessoas vejam, admirem e faça parte da vida, mesmo que seja por pouco tempo, da mente destas pessoas.” – Suzart para grupo de dança em SP)


perfil

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Foto: Arquivo pessoal de Raimundo Carvalho

MEMÓRIA VIVA

UM ESPETÁCULO DE LEMBRANÇAS Um perfil de Adilson Machado Das pessoas que fazem a história do Cineteatro Cachoeirano e ainda transitam por Cachoeira, Adilson Machado é um dos que guarda mais lembranças e emoção ao pensar no período áureo de movimentação no tablado e na tela. Prestes a completar 85 anos, sua vida se confunde com a história do local. Não só por se tratar de um grande amante do cinema, mas também por contribuir muito com o Cineteatro Cachoeira, acionando o olho do projetor ou se emocionando ao assistir um filme lá. Com vinte anos, em Itajuípe, na região cacaueira baiana, seu Adilson já tinha sido pedreiro, pintor, alfaiate, balconista e, sobretudo, assíduo espectador do cinema da cidade. Quando soube da oportunidade de trocar seu salário de 420 cruzeiros por 600 cruzeiros indo trabalhar no cinema, não pensou demais. Largou o emprego de balconista e foi num domingo aprender sobre projetor de filmes. Trabalhou por ou tras cidades da Bahia onde a empresa estava abrindo cinemas, como Vitória da Cachoeira, aprendeu idiomas e chegou em Cachoeira, em 1952, quando a empresa Marom arrenda o até então Cine-Teatro Cachoeira, mudando o nome para Cine-Teatro Glória. Seu Adilson tornou-se operador chefe, projetava os filmes – o cineteatro possuía dois projetores, o que possibilitava projetá-los sem intervalo e um título de moderno –, produzia os cartazes de divulgação com destaque para os filmes coloridos, gravava as chamadas das exibições e também morava no cinema. Guardava em um dos camarins suas malas, fotos e tinha uma cama. Foi assim que o projetista tornou-se morador cachoeirano.

Enchentes A realidade das enchentes que assolavam Cachoeira não poupou o cineteatro. Em 1960 uma grande enchente viria prejudicar o cinema todo. Os funcionários entraram de canoa pelo primeiro andar do cinema e salvaram os equipamentos mais importantes. “As enchentes vinham até a marquise, a de 60, foi 10 cm dentro da cabine. 25 de junho passava um filme de toda história de Cachoeira, tinha de passar esse filme como lembrança, a gente esqueceu de baixo da cabine, com os jornais, aí perdeu a imagem toda na enchente. A água veio 10 cm dentro da cabine, na enchente de 60. No fundo da camarim, tinha minha cama, minha coleção de revista, fotos…”. No dia da enchente, Seu Adilson queria ainda dormir em seu quarto, mas foi impedindo pelos amigos. Se tivesse dormido, talvez não tivéssemos o cineteatro tão vivo hoje. Apesar das dificuldades e surpresas como um cinema afogado, trabalhar no cinema aumentou a paixão de seu Adilson por filmes. Dentre os vários filmes exaustivamente assistidos, ele escolhe como preferidos:“Ave do paraíso, que espetáculo! Duas sessões… filme que deixou saudade mesmo. Nunca mais esse filme voltou, ninguém sabe da cópia desse filme. Filme bom, colorido… 7 noivas para 7 irmãos, o filme que mais passou…”.

Linha do tempo “Eu trabalhava em Conquista, vim para reinaugurar [o cinema] com a Marom, que arrendou e fez a reforma. [Tinha] Tela maior [CinemaScope], dois projetores, projeção sem interrupção. Com um certo tempo, ele se chateou com o cinema e vendeu ao próprio gerente. Passou a ser o Cine Real. Depois disso um rapaz de Valença quis arrendar o cinema, mudando pra Cine Simões. Com um certo período, caiu a renda, entregou à empresa [Marom], entrando Thelmo”. Foi quando recebeu o nome de Cine Teatro Cachoeirano, acrescenta Adilson lembrando que o cinema foi administrado pela família Dayúbe com o nome de Cine Astro. Voltaria ainda para as mãos de Thelmo e depois de Luís, atual diretor da Santa Casa de Misericórdia. Resumindo a longa história de arrendamentos e de muitos diretores do cineteatro. Curiosidades As apresentações no cinema eram sempre eventos na cidade, todos se encontravam, vinham de fora e havia uma emoção coletiva ao partilhar do momento mágico de brotar da tela cor, som e lugares que não se imaginaria. “Iam duas filas até de junto do brega, duas filas pra comprar ingresso. O salão era 480 poltronas. No bar Night on Day todo mundo ia pegar cadeira emprestada pra não ficar em pé. Tinha sessão que chegava a 700 pessoas. Quando precisava passar dava um trabalho desgramado, tomavam todo corredor. Todos filmes bons superlotavam.” Coincidiu que naquele tempo, Cachoeira não era ligada a Salvador pela estrada de rodagem, o transporte era trem e navio, o pessoal ficava aqui. O pessoal do sertão vinha pegar o navio aqui. Os que não podiam pagar hotel, ficavam na praça, aí compravam ingresso pra dormir no cinema. Seu Adilson era também o responsável por acordar os desabrigados e por pra fora do cineteatro, muito embora ele entendesse bem do prazer de morar no cinema.

Teatro reformado “Ficou bacana para o que era o prédio. Hoje tem um cinema moderno, achei modificações no salão, o paredão da cabine. Mudança na escadaria e na sala de projeção. Houve uma reforma muito grande! Eu tô sentindo que não demora muito pra abrir.” O antigo funcionário não esconde a emoção de poder ver o cinema funcionando de novo, e com filmes e peças produzidas aqui. Ele considera que a Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) deve ficar com uma parte do cineteatro para fazer suas produções, amostras e eventos em geral. A decisão atual é que a Prefeitura da Cachoeira irá gerir o cineteatro, por um entendimento do Iphan junto à própria prefeitura. Seu Adilson trabalhou de 1952 a 1992 no Cineteatro Cachoeira. Hoje está aposentado, continua vivendo em Cachoeira, construiu família aqui, compra pão todos os dias no mesmo horário, segue com sua voz de locutor e costuma ficar na porta de sua casa com um largo sorriso para os passantes ao cair do sol, guardando a memória viva do velho/novo Cineteatro Cachoeira!


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