Reverso 76 esquadros

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RETRATO ARTE EDOCULTURA RECÔNCAVO RETRATOS DA ARTEDA E CULTURA RECÔNCAVO DO DA BAHIA

Ruínas de Cachoeira pag. 6 e 7

Vida de artista pag. 10

A dança na Quarta dos Tambores pag. 8 e 9

Entrevista com Sine A arte na Calmon pag. 5 educação pag.4

DA BAHIA

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Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia


CARTA AO LEITOR

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A cidade de Cachoeira em toda a sua essência transpira arte. Desde a arquitetura barroca até o artesanato em madeira, o samba de roda e a beleza natural. E nós, estudantes de Comunicação da UFRB, privilegiadas em vivenciar diariamente o charme, encanto e as cores dessa cidade, optamos por descobrir um pouco mais do que acontece sobre a arte por aqui. Eis que foi escolhida a linha editorial da Esquadros, revista que foi preparada quase como um dossiê de artistas, eventos e lugares voltados para a experiência estética de olhar, perceber e sentir a produção artística da região. A nossa equipe acompanhou a Quarta dos Tambores, conversou com o reggaeman Sine Calmon, redescobriu a educação artística na cidade, visitou Castro Alves, onde há Arte Na Rua, passeou pelas ruínas do centro histórico e registrou o corpo e a cultura com o colega Marlon (Baga). Trazemos também a canção Esquadros, que dá nome ao nosso projeto, e a poesia de Geisa Lima dos Santos, estudante de Artes Visuais da UFRB. O Ineditorial traz a palavra do musico e também colega de CAHL, Ícaro de Oliveira. Todo o processo de elaboração da Esquadros passou pela orientação do professor Péricles Diniz, que nos estimulou através do seu entusiasmo pela NOSSA profissão. O resultado de tudo isso está agora em suas mãos. Aproveite a leitura e experimente viver um pouco mais do que as artes tem para oferecer. Equipe Esquadros

>>EXPEDIENTE<< Reitor Paulo Gabriel Soledad Nacif Coordenação Editorial J. Péricles Diniz e Robério Marcelo Editora Lorena Bernardes Redatoras Alice Velame Cátia Lima Ilze Melo Lorena Bernardes Naiara Moura

Centro de Artes Humanidades e Letras (CAHL) Quarteirão Leite Alves, Cachoeira/BA CEP - 44.300-000 Tel.: (75) 3425-3189

Editoração Gráfica Alice Velame Naiara Moura Ilze Melo Lorena Bernardes

I NE DI T OR I AL

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A cultura do descaso

Ícaro de Oliveira* Cachoeira Heróica, berço cultural, patrimônio imaterial e afim, não faltam adjetivos quando nos referimos à cidade de Cachoeira. Mas será que toda esta pompa tem respingado em sua produção cultural e artística de fato? Em algum momento sinto uma espécie de propaganda enganosa, como aquelas do governo em período de eleição, o incentivo caminha ao mesmo passo que a reforma dos antigos casarões coloniais e a ditadura permanece instalada. Nada de novo. Mais recentemente como delegado de cultura, pude pelas conferências presenciar uma verdadeira Babilônia, assustadora, o retrato de uma cidade perdida dentro de sua própria riqueza, que tem mais servido para fomento midiático do que precisamente para seus artistas. O que sobra disto? Cachoeiranos plenamente afastados de sua herança, o que sobra é a mentira criada pela cultura massa, este é o gosto amargo da falta de ações e incentivos de fato à manutenção das raízes esfaceladas ao longo dos anos. Há muito mais por dentro destas paredes antigas, há muito pra sair daí. A dança tem ido às praças novamente, a musicalidade tão respeitada mundo afora quer se fazer ouvir, aqui dentro. Os poetas que se foram e os que aqui estão declamam cada vez mais alto e suas palavras ecoam e reverberam. “Todo Risco” para quem acredita neste lugar mágico. Não há outro como aqui, não para este jovem artista que vos fala. Estes últimos cinco anos nesta cidade, onde tenho tentado produzir arte sem vícios me enriqueceram de uma forma onde já não caibo dentro de minhas limitações, é preciso transcender, pois o que sai deste lugar é muito, para mim, que sou tão pouco. Desta forma, imagino que a chegada da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia traga mais do que mera mudança estética, é preciso prolongar os arredores e separar as fronteiras do academicismo impositivo. Saiam de suas salas e venham para a “universidade”, venham às sambadeiras, rezadeiras, aos loucos, aos cachorros da praça, aos artistas de nobre valor instalados nas entranhas da feira, que durante o dia labutam até a noite cair, quando a poeira se arrasta num samba.

Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo

Colaboradores Balbino Azevedo Aline Brandão Calvacante Geisa Lima Ícaro de Oliveira Juliano Mascarenhas Larissa Molina

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*Ícaro de Oliveira é estudante de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia e músico da Banda Escola Pública.


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Adriana Calcanhotto

CIFRA

ESQUADROS

Tom: A A Eu ando pelo mundo F#m7 Prestando atenção em cores que eu não sei o nome Bm7 E Cores de Almodovar, cores de Frida Kalo, cores A Passeio pelo escuro F#m7 Eu presto muita atenção no que o meu irmão ouve Bm7 E E como uma segunda pele, um calo, uma casca A Uma cápsula protetora F#m7 Eu quero chegar antes Bm7 E Pra sinalizar o estar de cada coisa, filtrar seus graus A F#m7 Eu ando pelo mundo divertindo gente, chorando ao telefone Bm7 E E vendo doer a fome nos meninos que tem fome Am Dm Pela janela do quarto, pela janela do carro Pela tela, pela janela Am Quem é ela, quem é ela? Eu vejo tudo enquadrado F7+ E Remoto controle A Eu ando pelo mundo F#m7 E os automóveis correm para quê? Bm7 E As crianças correm para onde? A Transito entre dois lados de um lado F#m7 Eu gosto de opostos Bm7

E

Exponho o meu modo, me mostro Eu canto para quem?

Am Dm Pela janela do quarto, pela janela do carro Pela tela, pela janela Am Quem é ela, quem é ela? Eu vejo tudo enquadrado F7+ E Remoto controle A Eu ando pelo mundo F#m7 E meus amigos, cadê? Bm7 E Minha alegria, meu cansaço... A F#m7 Meu amor cadê você? Bm7 Eu acordei E Não tem ninguém ao lado Am Dm Pela janela do quarto, pela janela do carro Pela tela, pela janela Am Quem é ela, quem é ela? Eu vejo tudo enquadrado F7+ E Remoto controle A Eu ando pelo mundo F#m7 E meus amigos cadê?... Am Dm Pela janela do quarto, pela janela do carro Pela tela, pela janela Am Quem é ela, quem é ela? Eu vejo tudo enquadrado F7+ E Remoto controle

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Arte EDUCAÇÃO

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Lorena Bernardes De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), a disciplina de Educação Artística é obrigatória nos diversos níveis da Educação Básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos. Porém, alguns estudiosos questionam a valorização de quem ensina arte, principalmente porque se acredita que qualquer um pode atuar na área. Nos últimos anos, projetos em arte e educação estão sendo desenvolvidos por associações, organizações não-governamentais e instituições privadas. O projeto de extensão “Diálogos da Arte Brasileira com a História da Arte”, realizado no Colégio Estadual da Cachoeira, é uma iniciativa da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB). Coordenado pelo professor de Artes Visuais Dilson Rodrigues Midlej, o projeto pretende estender as relações com a comunidade e estimular o gosto pelas atividades artísticas. O projeto promove encontros semanais com os estudantes do primeiro ano do Ensino Médio do Colégio Estadual da Cachoeira, para a realização de aulas teóricas e práticas. Segundo o professor Dilson, a proposta é adaptar o conteúdo das pesquisas desenvolvidas pelos estudantes de Artes Visuais para reforçar as aulas de Educação Artística do colégio. Para compreender a arte em sua totalidade é importante considerar que o conhecimento teórico caminha junto com a prática, am-

bos são inseparáveis. Alguns chegam a concluir que a arte é apenas diversão, mas a área envolve outros aspectos muitas vezes ignorados.

Fotos: Romielle Evangelista

Manifestações artísticas O espaço escolar é o mais indicado para a aproximação com o universo artístico. A professora de Educação Artística do Colégio Estadual da Cachoeira Edelzuita Pinheiro dos Santos acredita que o ensino de arte ajuda os alunos a desenvolver habilidades como a criatividade e a comunicação. “Através de um desenho, por exemplo, o aluno pode conhecer suas aptidões e talentos e se sentir estimulado a expressar o que sente”, explica a professora. Para a estudante Janaína da Hora dos Santos, 17 anos, as aulas de Educação Artística são as melhores. “É a oportunidade de livrar as coisas ruins da nossas mentes e poder relaxar”, comenta a jovem. O professor Dilson também afirma que a arte pode ultrapassar o espaço escolar e estar presente em nosso dia-a-dia em outros momentos. Além de ser educativa, ela é capaz de refletir valores sociais e culturais. “O contato com a arte transforma, porque torna o ser humano mais potencializado. As artes de uma maneira geral fazem com que as pessoas produzam sentidos, a manifestação artística é inerente ao ser humano”, afirma Dilson.

Alunos do primeiro ano do Ensino Médio do Colégio Estadual da Cachoeira aprendem a fazer trabalhos artísticos através de Projeto de Extensão da UFRB.


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Música

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Jogo rápido c o m Sine Calmon Texto e foto: Cátia Lima

Cachoeirano, Sine Calmon começou a vida artística aos 17 anos com a Banda Golpe de Estado. O reggaeman toca guitarra, piano e teclado. Já teve várias indicações para o Troféu Caimmy na Categoria Instrumentista de Cordas enquanto tocava na Banda Estúdio 5. Em 1994, formou a Banda Sine Calmon & Morrão Fumegante, presente no cenário musical até hoje. Sine já teve trabalhos gravados por Ivete Sangalo e Cássia Eller. O músico se prepara para lançar em breve o DVD “Live in Cachoeira”, gravado no São João de Cachoeira.

Revista Esquadros: Sine, conte para a gente como está sendo a sua volta, nesta nova temporada de shows. Não é voltando, é continuando, eu estava apenas fora da grande mídia, mas continuava fazendo shows em São Paulo como na Virada Cultural e no interior da Bahia. R.E: Como você vê o reggae no cenário musical atualmente ? O reggae sempre sofreu uma grande resistência do sistema, mas eu nem posso reclamar porque sempre tive muitos seguidores. R.E: Você vem fazendo uma série de shows em Salvador, fale um pouco sobre isso. Acabei de fazer um show com o Ilê Aiyê

na Senzala do Barro Preto, e estou fazendo parte de um projeto promovido pelo Governo do Estado, que durante dois anos levará minha música para a Praça Pedro Arcanjo no Pelourinho. R.E: Você também gravou um DVD recentemente, já tem previsão de quando ele chega no mercado ? Gravei sim, foi no São João e chamase “Live in Cachoeira”, onde também contei com ajuda de equipamentos de alta definição da UFRB. Ainda não tenho previsão de lançamento, pois o DVD ainda está em processo de edição e masterização. R.E: O que seus fãs podem esperar de novidade nesse DVD , tem música nova ? Tem muitas novidades, eu canto Tim

Maia, Edson Gomes, Djavan, tudo numa nova linguagem e trago uma música nova que chama Lata de Prata. R.E: Você se diz cristão, fala de passagens bíblicas, você acha que pode se tornar um cantor gospel ? Eu já sou. Peguei o trem do amor pra Jerusalém... (canta) R.E: Você já entoou cânticos do candomblé ? Não. Aliás, só aquela: nessa cidade todo mundo é de” babá”... mas cantava como música popular brasileira, não como música de candomblé. R.E: Como você vê o momento cultural cachoeirano? Vejo a depreciação da poesia, a desvalorização do samba de roda e do re-

ggae, mas com a chegada da universidade deu um gás e fortaleceu nossa cultura, tomando um novo rumo, como esse projeto que foi aprovado ai, a Quarta dos Tambores. R.E: Quais são os seus próximos projetos ? Por enquanto, tenho um convite do meu parceiro e amigo Gerônimo para gravar um DVD no TCA em 2014, e já tem até nome: Os dois lados da moeda. R.E: Como está sua agenda nos próximos meses? Tem o projeto do Pelourinho, tem coisa por marcar, como viagem para São Paulo, festival de reggae em novembro e o Réveillon na ilha, as coisas estão andando.


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Naiara Moura Andar pelas ruas de Cachoeira e ter a sensação de estar vivendo em um cenário de filme ou novela de época. Quem nunca foi arrebatado por esta sensação? Os imóveis em estilo colonial nos transportam pelo tempo na cidade que é história viva em cada rua. Também não é difícil notar num passeio ou estando apenas “de passagem” pela heroica e guerreira cidade que o tempo passou e deixou marcas desde o apogeu econômico nos séculos XVIII e XIX e a contemporaneidade. O tombamento de Cachoeira foi decretado em 1971, considerando a necessidade de proteger o acervo arquitetônico e natural da cidade que ficou conhecida como Cidade Monumento Nacional. Porém, mais de quarenta anos se passaram e o trabalho em prol da conservação patrimonial ainda enfrenta dificuldades. Para o condutor turístico cachoeirano Davi Rodrigues, há muito trabalho a ser feito e a grande dificuldade parte dos próprios moradores saberem que a cidade é tombada e não respeitarem. Foto : Maeli Souza

Foto : Maeli Souza Com uma localização privilegiada - as margens do Rio Paraguaçu, o prédio do Hotel Colombo segue em estado de arruinamento.

Conservação dificultada

Um incêndio destruiu as instalações da loja de eletrodomésticos Jota Lima em agosto de 2012. O prédio ainda não passou por reformas.

Foto : Maeli Souza

Pintura descascando, parapeitos enferrujados, janelas destruídas e vidros quebrados. De alguns imóveis somente a fachada resistiu e em algumas fachadas ainda é possível ver a data de construção. De acordo com o decreto-lei número 25 de 30 de novembro de 1937, que regula o patrimônio histórico e artístico nacional, o abandono de imóveis é punível. Conforme Karina Madureira, chefe do escritório técnico do IPHAN em Cachoeira, tem sido feita a fiscalização de bens em ruína e os proprietários recebem as autuações, porém a maioria destes imóveis está em proces-

so de inventário e, como a Vara Cível da cidade está sem juiz titular, os processos não seguem adiante. “Notifica-se também a prefeitura, que é o órgão que pode desapropriar e leiloar ou dar uso”, completa. Karina também explica que em casos específicos, como quando há risco de desabamento ou quando o proprietário não pode arcar com a conservação, o Iphan desapropria o imóvel e dá continuidade na conservação com verba da União. Cachoeira fez parte do programa Monumenta, do Ministério da Cultura, que realizou obras em monumentos como a Casa Natal de Ana Nery e Quarteirão Leite Alves e termi-


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nou em 2009, quando foi firmado o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) Cidades históricas, do Ministério das Cidades. O PAC Cidades Históricas está dividido em três etapas e na primeira foram abarcadas apenas cidades que não fizeram parte do Monumenta e por este motivo Cachoeira ainda não está inclusa. A cidade deve estar contida na segunda etapa do PAC entre 2014 e 2015. A Heroica e Guerreira cidade O patrimônio cultural da cidade de Cachoeira compõe um cenário único no mundo. Casarões e sobrados dispostos diante do Rio Paraguaçu, por onde os saveiros trafegavam antes. A viagem pelo tempo (e pelo rio) carrega marcas do

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Brasil Império, período em que a cidade foi uma das mais ricas e importantes do país. Não dá para resistir e não imaginar como teriam sidos os anos áureos de Cachoeira, a vida das famílias abastadas, a luta pela independência, a resistência do povo negro, a vida dos filhos ilustres de Cachoeira como Ana Néry, pioneira da enfermagem no Brasil, ou Ernesto Simões Filho, fundador do Jornal A Tarde. É difícil não pensar que toda essa história, vivida nas ruas por onde hoje caminhamos para ir ao trabalho ou a universidade, pode se apagar no decorrer de mais trinta ou quarenta anos caso as pessoas não entendam e invistam no potencial cultural e turístico de Cachoeira.

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Foto : Maeli Souza Localizada diante da feira livre de Cachoeira, a Igreja de Nossa Senhora dos Remédios está abandonada há décadas.

Foto : Maeli Souza

Foto: Wagner Almeida


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DANÇA

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Lutando pela preserva

Ilze Melo Foi com praça cheia que se iniciou aquela “Quarta”, queria presenciar as apresentações de dança daquela noite. Infelizmente não pude ficar até o final, mas me interessei em saber o que havia acontecido, então fiquei sabendo de um grupo de dança da cidade chamado “GAMGE street dance”, resolvi então procurá-los para fazer a minha matéria do Reverso. Cheguei à sede do Grupo de Apoio ao Menor Gotas de Esperança (GAMGE), numa quarta-feira à tarde, todos dançavam e brincavam entre si. O clima me conquistou de imediato, principalmente ao ser recepcionado por Samir Suzart 30 anos, professor, coreografo, coordenador, produtor, enfim, o “faz tudo” do grupo, ele me contou que está à frente do projeto desde o seu início em 2007. O grupo tem 24 integrantes, isto é, até o fechamento desta matéria, pois devido à gravação do primeiro DVD o número de componentes vinha aumentando consideravelmente. As aulas são gratuitas e disponibilizadas para jovens de 14 a 25 anos. Interpelei sobre a apresentação na Quarta dos Tambores, ele me contou que o convite surgiu por meio de uma amiga do GAMGE, percebi que a pessoa referida era do tipo especial para o grupo e que seria impossível a ela dizer não.

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Fotos: Mariana Brito /Divulgação

Enquanto ele falava observei que seria interessante procurar esta pessoa também, mas se fiz isso ou não eu conto mais tarde. O motivo de o grupo ter aceitado o convite, é que consideram a Quarta um movimento de efervescência cultural já consolidado e acreditam no projeto, além de considerar um bom lugar para a divulgação do GAMGE. Expliquei pra ele que gostaria de conhecer mais o grupo e para isso queria conversar com um dos integrantes, ele sorriu dizendo “vou buscar alguém pra você”.

Eis que surge atrás de mim uma linda moça de belo sorriso, e o corpo? Todos sabem que mulher repara uma na outra, mas ali não havia gordura alguma. “Deve ser a dança”, pensei, mas isso é outra história. O nome da simpática menina é Sheyla da Silva de 18 anos, apesar de sempre ter dançado ela só estava no grupo há seis meses, participava de outras aulas de dança por causa da incompatibilidade de horários do GAMGE. Falou que da apresentação na

Quarta o reconhecimento é que é legal tanto por parte da produção conhece o trabalho e que fez o convite quanto da sociedade que já reconhece na rua. “Eu sou conhecida como aquela menina do GAMGE”. A empolgação era facilmente percebida nas falas de Sheyla sobre o grupo. “Quando cheguei aqui e vi a galera dançando, eu gostei, gostei muito, é muito legal.” Sai dali decidida a procurar aquela amiga que fez o convite para o grupo se apresentar na Quarta dos Tambores, o nome dela é Lorena Morais minha co-


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DANÇA

ação da cultura negra www.ufrb.edu.br/reverso

lega de curso na universi- va sendo a pessoa mais um cara legal. No desenvolver da endade, mas que ainda não indicada para a entrevishavia tido a oportunidade ta, pois ele também tinha trevista me contou como contato com o grupo, ha- a Quarta surgiu e que de conhecer. Louvado seja o face- via sido o instrutor corpo- completará dois anos em dezembro. book. Como já sabia do Marquei o encon“São jovens como eu fui, seu envolvimento tro no CAHL, ela já que vêem no street dance a do grupo, quis enchegou me explicanpossibilidade de expressar as tender o que achava do que seria melhor fazer a entrevista suas identidades, de se posi- da galera e por que com o coordenador cionar no mundo através da apresentá-los nesse evento. da Quarta. dança.” Alder Augusto E inesperadamenEntão, expliquei te ele me perguntou: que precisava ser “Você sabe o que é orgucom ela, por causa do ral da galera. Com a mediação de lho?” contato direto com o gruRespondi que sim com Lorena o meu enconpo de dança. Foi quando me con- tro com Alder aconteceu a cabeça, e permiti que tou que Alder Augusto, o na faculdade também, ele continuasse. As propostas de resiscoordenador da Quarta ele chegou brincando, já dos Tambores, continua- imaginei que ele fosse tência, combate ao racis-

mo e intolerância religiosa expressos na Quarta, estavam também presentes naquele grupo. Ele me contou que vê o GAMGE street dance defendendo e perpetuando as identidades negras é realizador, pois cultura negra não é apenas o samba de roda, a capoeira, o candomblé, e esses adolescentes mostram a sua cultura de um jeito moderno e isso é impresso no reggae, no hip hop, e no rap. “São jovens como eu fui, que vêem no street dance a possibilidade de expressar as suas identidades, de se posicionar no mundo através da dança.” Depois de algum tempo de conversa, avisei que estava satisfeita com

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a entrevista, ele se despediu de mim, correu até a bicicleta, que havia estacionado no CAHL, e gritou: “Tenho que correr pra outro compromisso” e foi. Sinto-me feliz de ter conhecido um pouco dessas duas entidades que a cada dia conquistam mais reconhecimento e respeito. Percebo, que o GAMGE street dance e a Quarta dos Tambores integram um pensamento comum, o de perpetuar e não deixar morrer a cultura e identidade negra, cada um com seu jeito, é claro! Mas, ainda bem que tem gente fazendo alguma coisa. O que me leva a persistir na fé que tenho nessa humanidade.


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PERFIL

Alice Velame

Nascido em Salvador, no ano de 1958, e criado na cidade de Castro Alves-BA, Balbino Azevedo contou em entrevista sua trajetória de vida como Artista Plástico e também Arte Educador. Desde pequeno rabiscava, desenhava quadrinhos e fazia pinturas, começava assim o gosto pela Arte. Seus pais trabalhavam na construção de jornais, e assim Balbino começou também a gostar da área de jornalismo. Na década de 70, devido à influência de jornais feitos pelos próprios moradores da cidade de Castro Alves, Balbino resolveu junto com alguns colegas criar “O espelho”, um jornal mimeografado, que em plena ditadura militar era rotulado como um produto subversivo. Passado algum tempo, trabalhando em matérias

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para o jornal, finalmente, depois de 10 anos de espera, o artista plástico conseguiu concretizar o sonho de fazer a “I Exposição de Artes de Castro Alves” no Colégio Polivalente, em 1980, onde reuniu trabalhos dele e de outros artistas da cidade. “Organizei uma grande exposição, foi uma das melhores que eu fiz até hoje, mesmo depois tendo participado de outras exposições importantes, em espaços nobres. Mas a primeira ficou marcada.” Disse. Perguntado se já havia organizado ou participado de algum projeto ligado à Arte, o artista plástico falou sobre o recente “Arte na Rua”, que é um projeto onde ele procura paredes da cidade onde estão desgastadas e faz pinturas, normalmente de personagens que marcaram o mundo como Charlie Chaplin e Che Guevara, assim, transformando o que antes era apenas um espaço sujo, em Arte. Além desse, existe também o Arte nas Escolas e o Arte nas Casas. Outro projeto importante foi intitulado como O Cinema vai à Escola, “Eu escolhia um filme de curta metragem, instalava o projetor na escola e passava para os alunos, comecei com esse projeto em castro Alves, depois fui pra salvador, de salvador para Alagoas. Fiquei trabalhando nisso durante 15 anos”, relatou. Também já foi membro

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do Movimento Cineclubista, contribuição de grande importância, que trazia uma perspectiva de renovação democrática no campo do audiovisual. Sobre a carreira acadêmica, ele relatou que teve Fotos: Acervo Pessoal certa resistência em exercer o papel de professor, começou a ensinar à oito O Projeto Arte na Rua, realizado em Castro Alves, anos. Ele acabou perce- transforma o que antes era sujo, em Arte. bendo que instruindo, daria chance para que outras pessoas chegassem aonde ele chegou. Através do ensino, ofereceria oportunidades para jovens que se identificam com algum tipo de arte a estimular o dom e levá-lo para frente. O artista não está com um projeto ativo no momento, mas pensa em fazer uma exposição didática no Colégio Polivalente de Castro Alves.


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POESIA

Individualidade

Geisa Lima dos Santos*

Eles não entendem meu sonho de menina moleca de querer estudar, trabalhar e ser independente, morar sozinha, não casar, nem ter filhos; Não são estas emoções que quero viver, pretendo outras coisas fazer; Ser reconhecida por minha arte, de desenhar, pintar ou escrever, viver do meu sonho e fazer ele acontecer; Inscrever meu futuro com o suor do meu rosto com o pincel do meu coração, não quero o que não seja meu, vou ser teimosa e lutar para minhas realizações alcançar.

Já sofri calada, já sorri calada, sou um tanto o quanto reservada, mas já vivi muitas felicidades em minhas caminhadas;

Não adianta reclamar, não sou mulher de cabrestos usar, gosto de sentir a liberdade em meu peito pulsar, E poder em liberdade voar;

Para que falar do que faz doer? para que falar de quem me fez sofrer? para que falar de quem amo e quero ter?

Sou mulher das palavras, sou mulher dos desenhos, sou mulher de pintar com empenho, o que quero ter em minhas mãos;

Coisas indivisíveis coisas de artista; Faço da minha vida uma arte a ser vivida; Liberdade meu grito preferido.

* Estudante de Artes Visuais

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eNSAIO FOTOGRテ:ICO

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Flores, Imagens, Cores Modelo e conceito: Baga de Bagaceira Produテァテ」o: Ilze Melo e Baga de Bagaceira Fotos: Naiara Moura

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