Guia Aluno

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Conselho Administrativo Presidente Pedro Moreira Salles Vice-Presidente Pedro Sampaio Malan Conselheiros Antonio Matias Cláudio de Moura Castro Cláudio Luiz da Silva Haddad Marcos de Barros Lisboa Ricardo Paes de Barros Thomas Souto Corrêa Netto Tomas Antonin Tomislav Zinner Diretoria Executiva Fernando Marsella Chacon Ruiz José Castro Araújo Rudge Leila Cristiane B. B. Melo Marcelo Luis Orticelli Superintendência Executiva Superintendente Wanda Engel Aduan Gerente de Administração e Finanças Fábio Santiago Gerente de Projetos Valéria de Souza Coordenação Nacional de Validação Vanderson Berbat Coordenação Nacional de Transferência Graciete Santa Anna do Nascimento


Universidade Federal de Juiz de Fora Reitor da Universidade Federal de Juiz de Fora Henrique Duque de Miranda Chaves Filho Vice-Reitor José Luiz Rezende Pereira Faculdade de Educação Déa Lúcia Campos Pernambuco — Diretora Fadepe Hélio Antônio da Silva — Presidente Coordenação Geral Lina Kátia Mesquita Oliveira Coordenação de Planejamento e Controle Manuel Fernando Palacios da Cunha e Melo Coordenação da Unidade de Formação Beatriz de Basto Teixeira Coordenação de Material Didático Mariana Vieira Teixeira Assessoria Técnica Fernanda Gomes Autora Begma Tavares Barbosa Colaboração Marilda Clareth Bispo de Oliveira Coordenação de Produção Visual Hamilton Ferreira Equipe de Editoração Bruno Carnaúba Carlos Eduardo Castro Clarissa Aguiar Henrique Bedetti Marcela Zaguetto Raul Furiatti Vinícius Peixoto


S

umário

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Oficina 1 – O valor do conhecimento

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Oficina 2 – A leitura

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Oficina 3 – O beijo

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Oficina 4 – Namoro

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Oficina 5 – Corpo, saúde e beleza

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Oficina 6 – Corpo, saúde e beleza

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Oficina 7 – Modernidade e tecnologia

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Oficina 8 – O jovem e a tecnologia

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Oficina 9 – A violência

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Oficina 10 – Drogas e violência



GUIA DO ALUNO

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O valor do conhecimento

1. ATIVIDADES DE LEITURA O primeiro texto que você vai ler resume as histórias de vida de dois brasileiros. Leia-o atentamente e, a seguir, resolva as questões de leitura.

GILBERTO

DIMENSTEIN

Ensinando a voar

O

Cearense Expedito Resende, 66, conseguiu atrair a atenção mundial ao inventar um combustível para avião feito à base de óleo de babaçu, atualmente em testes avançados nos laboratórios da Boeing, acompanhados pela Nasa, a agência espacial dos Estados Unidos. Mudar o jeito como os aviões voam, usando o chamado “bioquerosene”, não seria sua mais importante descoberta. Professor de engenharia química da Universidade Federal do Ceará, Expedito criou, nos anos 70, o biodiesel. Usando plantas comuns no Nordeste, viu que o combustível servia, sem nenhum problema, nos motores como substituto do petróleo. Mas, na época, não havia tanta consciência ecológica, o preço do petróleo ainda não estava nas alturas e não se sabia como dar escala comercial à sua invenção. Em 1991, alemães e austríacos

resolveram usar a descoberta para produzir energia limpa. Nos últimos tempos, Expedito vem ganhando prêmios internacionais e ajudando a implantar centenas de usinas de biodiesel. Isso significa a perspectiva de criação

Repetia, como se fosse mantra: “o gosto pelo conhecimento é a melhor herança que posso deixar” de empregos, especialmente no Nordeste, e de um recurso contra o aquecimento global. Por trás dessa tecnologia há uma história não menos interessante sobre quem ajudou a inventar esse inventor. Chama-se José Parente, pai de Expedito - é uma criação muito mais do que biológica. 

José Parente tinha 12 anos quando deixou um povoado nas proximidades de Sobral (CE), onde vivia, e mudou-se para Fortaleza. Era o caçula entre seus 28 irmãos, sustentados pelo pai agricultor. Fez o trajeto a pé, sozinho, alimentando-se com o que encontrava no caminho. Tinha dois projetos: obter um emprego e entrar numa escola. Matriculou-se para o período noturno de uma escola, mas, com o excesso de trabalho, acabou desistindo. Tentou por várias maneiras continuar estudando. Pediu ajuda a seu patrão e ouviu a seguinte frase: “Menino pobre não precisa de escola”. Praticando, José Parente aprendeu as artes do comércio. Adulto, tornouse empresário, casou, teve nove filhos, todos entraram na faculdade. Repetia algumas frases como se fossem mantras: “o gosto pelo


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conhecimento é a melhor herança que posso deixar” ou “a maior riqueza está dentro da cabeça”  Nas conversas familiares, sempre vinham as histórias do menino de 12 anos, caminhando sozinho pelas estradas de terra, a frustração pela impossibilidade de estudar compensada pelas habilidades autodidatas. Já empresário próspero (depois teve um banco), José Parente tratou de ajudar aquela escola em que tentou, mas não conseguir estudar. Expedito cresceu ouvindo esses casos. “Ficou arraigada em todos nós aquela reverência pelo saber”, conta Expedito. Essa reverência estava por trás de sua decisão de sair de casa para estudar, como tinha feito seu pai. “Só que, desta vez, sem desconforto”, diz ele.

Mudou-se para o Rio, onde se formou em engenharia química e, depois, aprimorou-se nos Estados Unidos e na Europa. Voltou para o Ceará, fascinado pelo encanto dos experimentos químicos. Uma de suas criações foi a “vaca mecânica” para a produção de leite de soja, disseminada em centenas de cidades brasileiras.  Testou motores com álcool, mas preferiu investigar melhor o poder de plantas como o babaçu. Em 1984, um Bandeirante, da Embraer, voou de São José dos Campos até Brasília, movido a bioquerosene, desenvolvido por Expedito - apesar do sucesso do vôo, o projeto foi arquivado pelos militares. Foram necessários mais 20 anos para que levassem a sério sua experiência, agora em apreciação

pelos americanos - certamente seria impossível se o inventor não tivesse como um de seus professores um menino de 12 anos, andando a pé pelo interior do Nordeste, com o sonho de aprender.  PS - O caso de José Parente mostra os caminhos para se evitar a marginalidade, gerando inventores e não criminosos - envolvimento familiar na vida dos filhos, culto ao empreendedorismo e reverência ao aprendizado. Nosso problema não é de maioridade penal, mas a de menoridade dos adultos. Fonte: Folha de São Paulo, 25 de fevereiro de 2007, domingo, Caderno Cotidiano. Gilberto Dimenstein, colunista e membro do Conselho Editorial da Folha de S.Paulo e comentarista da rádio CBN, é fundador da Associação Cidade Escola Aprendiz

ATIVIDADES DE LEITURA 1. Preencha o quadro abaixo com as informações pedidas:

Título do texto Autor Fonte Data

Ensinando a Voar


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2. O texto de Gilberto Dimenstein reúne histórias de vida, histórias reais de dois brasileiros. Preencha o quadro abaixo com informações sobre os “personagens” e suas histórias.

Personagens apresentados

Profissão

Qualidades/ações destacadas no texto

Expedito Resende

José Parente

3. Releia: “Por trás dessa tecnologia há uma história não menos interessante sobre quem ajudou a inventar esse inventor”

3.1. O trecho em destaque faz referência às tecnologias inventadas pelo cientista Expedito Resende. A que invenções o trecho se refere?

3.2. Qual é a importância dessa tecnologia?

3.3. Quem, segundo o texto, ajudou a “inventar o inventor” Expedito Resende?

3.4. Como você entende a expressão “inventar esse inventor” utilizada acima?

4. O texto afirma que José Parente tinha “habilidades autodidatas”. A palavra autodidata é formada pelo prefixo auto (que significa por si próprio) e pela palavra didata (pessoa que instrui, ensina). 4.1. Procure explicar o sentido da palavra autodidata, considerando a frase em que essa palavra aparece no texto.


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4.2. Você conhece outras palavras que se formam a partir do mesmo recurso, o prefixo auto? Cite algumas.

5. “Ficou arraigada em todos nós aquela reverência pelo saber.” 5.1. Tente descobrir o significado de “arraigada” e discuta a escolha dessa palavra.

5.2. No trecho acima, a palavra “reverência” tem o sentido de: a) desejo b) respeito c) curiosidade d) desconfiança 5.3. A frase de Expedito Resende, citada no texto e em destaque acima, quer dizer que: a) A família de José Parente aprendeu com ele a valorizar o conhecimento. b) Apenas o cientista Expedito aprendeu com o pai a valorizar o estudo. c) José Parente sempre estimulou seu filho Expedito a estudar. d) Toda a família de Expedito teve o mesmo destino do pai. 6. Releia: “Repetia, como se fosse mantra:´o gosto pelo conhecimento é a melhor herança que posso deixar’”. Você sabe o que significa “mantra”? A palavra mantra vem do sânscrito e pode ser definida como “um instrumento para conduzir o pensamento”. Os mantras, que podem ser palavras ou frases, são entoados e repetidos como orações. Comente a utilização dessa palavra no texto.


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7. Observe que o texto de Gilberto Dimeinstein está organizado em cinco partes. Indique, no quadro abaixo, a ideia central de cada parte. Observe o exemplo:

1ª parte

O cearense Expedito Resende, inventor do biocombustível.

2ª parte 3ª parte 4ª parte 5ª parte

8. Releia com atenção a última parte do texto. Após os relatos feitos, o autor Gilberto Dimenstein tece uma breve argumentação. 8.1. Sobre o que ele argumenta?

8.2. Que tese o autor defende?

9. O título do texto contém uma metáfora. Explique esse título.

Você vai ler agora dois outros textos. São duas narrativas em quadrinhos, duas tirinhas de MAFALDA, do autor argentino Quino. Texto 2


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Texto 3

ATIVIDADE EM GRUPO Após refletir sobre a importância do conhecimento na vida das pessoas, leia com atenção as duas tirinhas, observando as imagens dos quadrinhos, principalmente a expressão facial dos personagens. Em seguida, discuta com seus colegas as seguintes questões: 1. Que expectativas as personagens Mafalda e Manolito têm da escola e do conhecimento?

2. Com qual das personagens você mais se identifica?

DEBATENDO O TEMA DA OFICINA A leitura é uma atividade que nos possibilita participar da vida social, porque nos ajuda a pensar e a formar opinião sobre assuntos importantes. Depois de ler os textos desta oficina, você vai debater com seus colegas o tema “Juventude, escola e conhecimento”. Considere as perguntas abaixo para começar esse debate: »» Você conhece histórias como a da família de José Parente? »» Você acredita que o conhecimento pode transformar a vida das pessoas? »» Na sua opinião, o jovem valoriza o conhecimento? »» A escola contribui para que os jovens aprendam a valorizar o conhecimento? »» O que deveria ser mudado na escola para que o jovem aprendesse a valorizar mais o conhecimento? »» Que aspectos positivos e negativos você aponta na sua escola?


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A LEITURA

1. ATIVIDADES DE LEITURA A primeira atividade desta oficina propõe que você “leia” algumas imagens. Comecemos com o texto publicitário abaixo, publicado no jornal Folha de São Paulo, Caderno Ilustrada, em 15 de março de 2009. Considere-o atentamente.


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Agora, pense sobre as questões abaixo. Faça anotações no seu caderno. Em seguida, você vai conversar com seu grupo sobre a leitura que você fez. Antes, porém, considere o significado da expressão:

“pás de deux”- do francês, a expressão faz referência a um passo de dança, a uma coreografia feita para duas pessoas.

1. O que a imagem da propaganda “diz” sobre a leitura?

2. Como você interpreta a afirmação: “O livro e você: um pas de deux perfeito.”?

3. Na sua opinião, com que objetivo essa peça publicitária foi publicada no jornal?


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LENDO IMAGENS Vamos ler as imagens abaixo? São fotografias, pinturas, desenhos que se relacionam ao tema desta oficina. Procure observar as imagens atentamente, capturando detalhes. O que esses “textos” nos dizem? Faça anotações no seu caderno para serem compartilhadas com o grupo. Quarto de hotel – pintura de Edward Hopper.


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A Dama do livro – pintura de Roberto Fontana

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Leitores leem na rua - fotografia

http://www.trekearth.com/gallery/South_America/Brazil/Southeast/Minas_Gerais/Juiz_de_Fora/photo711529.htm


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Crianças lendo, juntas, um livro – desenho

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Você vai ler agora um poema que o escritor Machado de Assis escreveu, inspirando-se no quadro “A dama do livro”, que ganhou de seus amigos.

SONETO CIRCULAR A bela dama ruiva e descansada, De olhos lânguidos, macios e perdidos, Co’um dos dedos calçados e compridos Marca a recente página fechada. Cuidei que, assim pensando, assim colada Da fina tela aos flóridos tecidos, Totalmente calados os sentidos, Nada diria, totalmente nada. Mas, eis da tela se despega e anda, E diz-me: - “Horácio, Heitor, Cibrão, Miranda, C. Pinto, X. Silveira, F. Araújo, Mandam-me aqui para viver contigo.” Ó bela dama, a ordens tais não fujo. Que bons amigos são! Fica comigo. Machado de Assis

ATIVIDADES DE LEITURA 1. Como o poeta descreve a mulher do poema, na primeira estrofe?

2. Considere o verbete de dicionário abaixo. lânguido [Do lat. languidu.] Adjetivo. 1.Sem forças; sem energia; frouxo, fraco, abatido, debilitado, extenuado, langoroso. 2.Mórbido, doentio. 3.Voluptuoso, sensual, langoroso: olhares lânguidos. [Var. pros.: lânguido. Sin.: langue, languente.] Fonte: Dicionário Aurélio, versão digital.

Qual é o melhor significado para a palavra “lânguidos”, na primeira estrofe?


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3. Releia a segunda estrofe do poema e responda: o que o poeta pensou em relação à mulher do quadro?

4. Releia: “ Mas eis que da tela se despega e anda, E diz-me: “ __Horácio, Cibrão, Miranda, C. Pinto, X. Silveira, F. Araújo, Mandam-me aqui para viver contigo.” ( 3ª estrofe) 4.1. No primeiro verso da estrofe acima - “ Mas eis que se despega e anda”- o verbo despegar-se, em destaque, significa. a) Despregar-se da tela. b) Separar-se do livro. c) Apegar-se à tela. d) Mover-se na tela. e) Desapegar-se da tela. 4.2. Quem se despega da tela?

4.3. O conector MAS expressa uma relação de: a) causa b) consequência c) tempo d) lugar e) oposição

4.4. Observe, ainda, que o conector MAS relaciona a primeira e a segunda estrofes do poema, sinalizando uma quebra de expectativa, um acontecimento inesperado. Qual era a expectativa do poeta e o que aconteceu?

5. Horácio, Cibrão, Miranda, C Pinto, X. Silveira, F. Araújo são os amigos que deram ao poeta, como um presente, o quadro da dama ruiva. Retire do texto o verso que corresponde ao recado que eles mandaram através da senhora do quadro?

6. Que resposta o poeta dá para a bela dama ruiva.?


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7. O poeta usou dois recursos para construir o sentido do poema, a descrição da figura feminina e o diálogo. Com que objetivo o poeta usa tais recursos?

8. Ao discutirmos o tema da leitura, vimos que “ler é dialogar” com o texto, buscando construir um sentido para ele. A compreensão da leitura como um diálogo está presente no soneto de Machado de Assis? Justifique sua resposta.

Agora, você vai ler um conto de Clarice Lispector, publicado no livro Felicidade Clandestina, p.9-12, Rocco, 1989.

Felicidade Clandestina Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos, meio arruivados. Tinha um busto enorme, enquanto nós todas ainda éramos achatadas. Como se não bastasse, enchia os dois bolsos da blusa, por cima do busto, com balas. Mas possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de livraria. Pouco aproveitava. E nós menos ainda: até para aniversário, em vez de pelo menos um livrinho barato, ela nos entregava em mãos um cartão-postal da loja do pai. Ainda por cima era de paisagem do Recife mesmo, onde morávamos, com suas pontes mais do que vistas. Atrás escrevia com letra bordadíssima palavras como “data natalícia” e saudade”. Mas que talento tinha para a crueldade. Ela toda era pura vingança, chupando balas com barulho. Como essa menina devia nos odiar, nós que éramos imperdoavelmente bonitinhas, esguias, altinhas, de cabelos livres. Comigo exerceu com calma ferocidade o seu sadismo. Na minha ânsia de ler, eu nem notava as humilhações a que ela me submetia: continuava a implorar-lhe emprestados os livros que ela não lia. Até que veio para ela o magno dia de começar a exercer sobre mim um tortura chinesa. Como casualmente, informou-me que possuía As reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato. Era um livro grosso, meu Deus, era um livro para se ficar vivendo com ele, comendo-o, dormindo-o. E, completamente acima de minhas posses. Disse-me que eu passasse pela sua casa no dia seguinte e que ela o emprestaria.

Até o dia seguinte eu me transformei na própria esperança de alegria: eu não vivia, nadava devagar num mar suave, as ondas me levavam e me traziam. No dia seguinte fui à sua casa, literalmente correndo. Ela não morava num sobrado como eu, e sim numa casa. Não me mandou entrar. Olhando bem para meus olhos, disse-me que havia emprestado o livro a outra menina, e que eu voltasse no dia seguinte para buscá-lo. Boquiaberta, saí devagar, mas em breve a esperança de novo me tomava toda e eu recomeçava na rua a andar pulando, que era o meu modo estranho de andar pelas ruas de Recife. Dessa vez nem caí: guiava-me a promessa do livro, o dia seguinte viria, os dias seguintes seriam mais tarde a minha vida inteira, o amor pelo mundo me esperava, andei pulando pelas ruas como sempre e não caí nenhuma vez. Mas não ficou simplesmente nisso. O plano secreto da filha do dono da livraria era tranquilo e diabólico. No dia seguinte lá estava eu à porta de sua casa, com um sorriso e o coração batendo. Para ouvir a resposta calma: o livro ainda não estava em seu poder, que eu voltasse no dia seguinte. Mal sabia eu como mais tarde, no decorrer da vida, o drama do “dia seguinte” com ela ia se repetir com meu coração batendo. E assim continuou. Quanto tempo? Não sei. Ela sabia que era tempo indefinido, enquanto o fel não escorresse todo de seu corpo grosso. Eu já começara a adivinhar que ela me escolhera para eu sofrer, às vezes adivinho. Mas, adivinhando mesmo, às vezes aceito: como se quem quer me fazer sofrer esteja precisando danadamente que eu sofra.


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Quanto tempo? Eu ia diariamente à sua casa, sem faltar um dia sequer. Às vezes ela dizia: pois o livro esteve comigo ontem de tarde, mas você só veio de manhã, de modo que o emprestei a outra menina. E eu, que não era dada a olheiras, sentia as olheiras se cavando sob os meus olhos espantados. Até que um dia, quando eu estava à porta de sua casa, ouvindo humilde e silenciosa a sua recusa, apareceu sua mãe. Ela devia estar estranhando a aparição muda e diária daquela menina à porta de sua casa. Pediu explicações a nós duas. Houve uma confusão silenciosa, entrecortada de palavras pouco elucidativas. A senhora achava cada vez mais estranho o fato de não estar entendendo. Até que essa mãe boa entendeu. Voltou-se para a filha e com enorme surpresa exclamou: mas este livro nunca saiu daqui de casa e você nem quis ler! E o pior para essa mulher não era a descoberta do que acontecia. Devia ser a descoberta horrorizada da filha que tinha. Ela nos espiava em silêncio: a potência de perversidade de sua filha desconhecida e a menina loura em pé à porta, exausta, ao vento das ruas de Recife. Foi então que, finalmente se refazendo, disse firme e calma para a filha: você vai emprestar o livro agora mesmo. E para mim: “E você fica com o livro por quanto tempo quiser.” Entendem? Valia mais do que me dar o livro: “pelo tempo que eu quisesse” é tudo o que uma pessoa, grande ou pequena, pode ter a ousadia de querer.

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Como contar o que se seguiu? Eu estava estonteada, e assim recebi o livro na mão. Acho que eu não disse nada. Peguei o livro. Não, não saí pulando como sempre. Saí andando bem devagar. Sei que segurava o livro grosso com as duas mãos, comprimindo-o contra o peito. Quanto tempo levei até chegar em casa, também pouco importa. Meu peito estava quente, meu coração pensativo. Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre ia ser clandestina para mim. Parece que eu já pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar... Havia orgulho e pudor em mim. Eu era uma rainha delicada. Às vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo. Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante.

ATIVIDADES DE LEITURA 1. Em poucas linhas, resuma a história narrada no conto. Qual seria o tema desse conto?

2. Descreva a filha do dono da livraria. Qual é o papel dessa personagem na história?

3. Identifique o tipo de narrador e justifique a escolha deste recurso.


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4. Releia: “Até que veio para ela o magno dia de começar a exercer sobre mim uma tortura chinesa. Como casualmente, informou-me que possuía As reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato.”

4.1. Explique o sentido da expressão destacada, “uma tortura chinesa”.

4.2. A expressão “ magno ” pode ser substituída sem alterar o sentido do texto por a) terrível b) inesperado c) feliz d) grande e) triste 4.3. É um magno dia, porque a) a filha do dono de livraria poderia ser gentil com a sua pobre amiga. b) a filha do dono de livraria descobriu como torturar a menina leitora. c) a inveja da filha do dono de livraria se transformaria em amizade. d) as meninas iniciaram um pequeno diálogo, uma troca de livros. e) a crueldade da invejosa teria fim, não mais faria a outra sofrer. 5. Como se resolve o conflito dessa narrativa? Resuma seu desfecho.


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O BEIJO

1. ATIVIDADES DE LEITURA O texto que você vai ler é uma crônica, publicada no Jornal O Globo, no ano de 2007. Texto 1

O beijo Martha Medeiros Na primeira página de um site, o convite: “Você viu? Mulheres fazem fila para beijar rapaz!” Adivinha se não era carnaval em Salvador. Estavam lá diversas fotos do garanhão beijando uma, depois a outra e a mulherada em fila aguardando a vez. Parece divertido, mas não é novidade: acontece em tudo o que é festa aberta, em qualquer época do ano. Todo mundo beijando todo mundo, uma delícia de descomprometimento. Nem evolução, nem involução, apenas mais uma coisa que se dessacraliza diante dos nossos olhos. O beijo. Dizem que o primeiro beijo não se esquece, e eu realmente nunca consegui esquecer do meu primeiro, e olha que eu tentei. Foi um desastre, um desacerto, uma tentativa malograda de encaixe, até que veio o segundo e, aí sim, choveram estrelas. Desde então, o beijo passou a fazer jus à sua fama de grande astro de um encontro amoroso. Para quem, como eu, não chegou a viver esta onda de banalização do beijo, para quem beijava só quando estava apaixonado, ou, vá lá, com um ficante de vez em quando (e não mais de um

por noite, e tampouco ficar todas as noites, pois tínhamos que sossegar o pito, como diziam nossos pais), enfim, para quem não viveu este oba-oba, o beijo segue sendo a confirmação de uma atração recíproca. E personalizada. Especial como raros momentos o são. Paixões se iniciam de repente. Você troca e-mails com alguém sem a menor intenção de rolo, e então, sem mais nem menos, passam a flertar um com o outro, o jogo da sedução começa. Ou você é amiga de um cara sem jamais passar pela cabeça ir além da amizade, mas um belo dia, do nada, pinta um clima, que confusão. Ou então você é apresentada a uma pessoa numa festa e se encanta à primeira vista, e a partir daí fica mentalizando estratagemas para um segundo encontro e, quem sabe, um terceiro e um quarto. Principalmente um quarto. Bom, há várias maneiras de se iniciar um romance, mas enquanto o primeiro beijo não acontece, existe apenas uma intenção, uma possibilidade, um quem sabe. Olhares, telefonemas, torpedos, tudo isso não passa de aquecimento, e pode esfriar antes mesmo que aconteça alguma coisa. Que alguma coisa? Ora, do que estamos falando aqui, criatura?


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Do beijo!!!! Quem não se lembra do final de Cinema Paradiso? Nenhuma cena de sexo nos emocionaria daquele jeito. O primeiro beijo de uma nova relação: quando será, e onde? Quando ele vier me deixar em casa? Dentro do cinema? No meio de um papo, inesperadamente? Ah, que cruel e excitante é esta vida. Aguardar pelo primeiro beijo, aquele beijo que vai atestar: sim, não era uma fantasia, ele estava mesmo a fim de mim todo este tempo, e eu, nem se fala. Se não estava, fiquei. O beijo, uau! O detonador de toda história de amor, ou de uma ilusão de amor, que seja.

Depois vinha o desenrolar dos acontecimentos, mas deixemos pra lá o depois. Não é importante. O que nos deixava ligadinhas era a expectativa do primeiro beijo, que valia por um carimbo, um atestado, um apito do juiz: começou, tá valendo. Então algo se iniciava. Sou ficcionista, mas não a ponto de delirar. Era bem assim, crianças.

MEDEIROS, Martha. O Globo. 2007.

ATIVIDADES DE LEITURA 1. A palavra crônica é de origem latina e está relacionada a chronos, que significa tempo. O dicionário Aurélio, em sua versão digital, apresenta alguns significados para a palavra crônica, dentre os quais destacamos o seguinte:

Texto jornalístico redigido de forma livre e pessoal, e que tem como temas fatos ou ideias da atualidade, de teor artístico, político, esportivo, etc., ou simplesmente relativos à vida cotidiana.

1.1. O texto lido pode ser considerado uma crônica? Justifique sua resposta.

1.2. De que assunto trata essa crônica?

1.3. Que fato acontecido na época motivou a autora a escrever sobre o assunto?

2. Após expor o fato motivador da crônica, Martha Medeiros faz o seguinte comentário: “Todo mundo beijando todo mundo, uma delícia de descomprometimento.”

2.1. Explique o sentido da expressão negritada.


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3. Releia: “Nem evolução, nem involução, apenas mais uma coisa que se dessacraliza diante dos nossos olhos.”

3.1. A palavra involução é formada a partir do acréscimo do prefixo IN, um prefixo de negação (como na palavra infeliz = in + feliz). Procure explicar o significado da palavra “involução” no trecho acima.

3.2. A palavra dessacralizar, destacada acima, é formada pelo acréscimo do prefixo DES à palavra sacralizar (de sacro = sagrado). Procure explicar o significado da palavra “dessacralizar” no trecho acima.

3.3. A frase destacada acima sinaliza que a autora concorda ou discorda do comportamento daqueles que “beijam todo mundo”?

4. Martha Medeiros fala sobre o comportamento de sua geração, para a qual o “primeiro beijo” estava carregado de significados. O beijo era:

I) “o grande astro de um encontro amoroso” II) “a confirmação de uma atração recíproca e personalizada; III) “o detonador de toda uma história de amor, ou de uma ilusão de amor; IV) “um carimbo, um atestado, um apito do juiz.”

O que você entende por cada uma dessas expressões?

5. Releia: “Sou ficcionista, mas não a ponto de delirar. Era bem assim, crianças.”

5.1. Ao usar o vocativo “crianças”, a quem a autora estaria se dirigindo de modo especial?

5.2. O que significa ser “ficcionista”?


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5.2. Explique o sentido da frase em destaque acima, considerando o valor de oposição do conector mas, presente na frase.

6. Na sua opinião, qual seria a intenção da autora ao escrever esse texto?

7. Martha Medeiros compara duas formas diferentes de lidar com o beijo: a da sua geração e a das gerações mais jovens. O que você pensa sobre as considerações feitas pela autora?

Agora você vai ler outro texto que trata do mesmo tema, o beijo”. Clarice Lispector, importante escritora brasileira, é a autora deste conto.

O PRIMEIRO BEIJO Os dois mais murmuravam que conversavam: havia pouco iniciara-se o namoro e ambos andavam tontos, era o amor. Amor com o que vem junto: ciúme. – Está bem, acredito que sou a sua primeira namorada, fico feliz com isso. Mas me diga a verdade, só a verdade: você nunca beijou uma mulher antes de me beijar? Ele foi simples: – Sim, já beijei antes uma mulher. – Quem era ela? perguntou com dor. Ele tentou contar toscamente, não sabia como dizer. O ônibus da excursão subia lentamente a serra. Ele, um dos garotos no meio da garotada em algazarra, deixava a brisa fresca bater-lhe no rosto e entrar-lhe pelos cabelos com dedos longos, finos e sem peso como os de uma mãe. Ficar às vezes quieto, sem quase pensar, e apenas sentir – era tão bom. A concentração no sentir era difícil no meio da balbúrdia dos companheiros. E mesmo a sede começara: brincar com a turma, falar bem alto, mais alto que o barulho do motor, rir, gritar, pensar, sentir, puxa vida! como deixava a garganta seca. E nem sombra de água. O jeito era juntar saliva, e foi o que fez. Depois de reunida na boca ardente engulia-a lentamente, outra vez e mais outra. Era morna, porém, a saliva, e não tirava a sede. Uma

sede enorme maior do que ele próprio, que lhe tomava agora o corpo todo. A brisa fina, antes tão boa, agora ao sol do meio dia tornara-se quente e árida e ao penetrar pelo nariz secava ainda mais a pouca saliva que pacientemente juntava. E se fechasse as narinas e respirasse um pouco menos daquele vento de deserto? Tentou por instantes mas logo sufocava. O jeito era mesmo esperar, esperar. Talvez minutos apenas, enquanto sua sede era de anos. Não sabia como e por que mas agora se sentia mais perto da água, pressentia-a mais próxima, e seus olhos saltavam para fora da janela procurando a estrada, penetrando entre os arbustos, espreitando, farejando. O instinto animal dentro dele não errara: na curva inesperada da estrada, entre arbustos estava... o chafariz de onde brotava num filete a água sonhada. O ônibus parou, todos estavam com sede mas ele conseguiu ser o primeiro a chegar ao chafariz de pedra, antes de todos. De olhos fechados entreabriu os lábios e colouos ferozmente ao orifício de onde jorrava a água. O primeiro gole fresco desceu, escorrendo pelo peito até a barriga.


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Era a vida voltando, e com esta encharcou todo o seu interior arenoso até se saciar. Agora podia abrir os olhos. Abriu-os e viu bem junto de sua cara dois olhos de estátua fitando-o e viu que era a estátua de uma mulher e que era da boca da mulher que saía a água. Lembrou-se de que realmente ao primeiro gole sentira nos lábios um contato gélido, mais frio do que a água. E soube então que havia colado sua boca na boca da estátua da mulher de pedra. A vida havia jorrado dessa boca, de uma boca para outra. Intuitivamente, confuso na sua inocência, sentia intrigado: mas não é de uma mulher que sai o líquido vivificador, o líquido germinador da vida... Olhou a estátua nua. Ele a havia beijado. Sofreu um tremor que não se via por fora e que se iniciou bem dentro dele e tomou-lhe o corpo todo estourando pelo rosto em brasa viva. Deu um passo para trás ou para frente, nem sabia

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mais o que fazia. Perturbado, atônito, percebeu que uma parte de seu corpo, sempre antes relaxada, estava agora com uma tensão agressiva, e isso nunca lhe tinha acontecido. Estava de pé, docemente agressivo, sozinho no meio dos outros, de coração batendo fundo, espaçado, sentindo o mundo se transformar. A vida era inteiramente nova, era outra, descoberta com sobressalto. Perplexo, num equilíbrio frágil. Até que, vinda da profundeza de seu ser, jorrou de uma fonte oculta nele a verdade. Que logo o encheu de susto e logo também de um orgulho antes jamais sentido: ele... Ele se tornara homem.

ATIVIDADES DE LEITURA 1. O texto de Clarice Lispector pode ser dividido em duas partes. No quadro abaixo, sugerimos um título para cada parte. Resuma cada uma delas e, em seguida, indique os parágrafos correspondentes a cada parte.

Título

Resumo

Parágrafos

O diálogo dos namorados A história do primeiro beijo

2. Explique a ligação entre as duas partes do conto.

3. Releia a primeira parte do conto. Que pistas confirmam que a namorada tinha ciúmes do namorado?


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4. Considere agora a segunda parte do conto. Consulte o texto e responda: 4.1. Onde e quando ocorrem os fatos? 4.2. Quem é o personagem principal dessa história? 4.3. Como esse personagem se sentia? Descreva seu comportamento. 4.4. Qual é o conflito da narrativa? Como esse conflito se resolve? 5. O texto de Clarice Lispector procura: a) descrever as ações do personagem principal. b) comentar as ações do personagem principal. c) descrever as emoções do personagem principal. d) discutir as atitudes do personagem principal. 6. Releia: “Era morna, porém, a saliva, e não tirava a sede. Uma sede enorme maior do que ele próprio, que lhe tomava agora o corpo todo.” (parágrafo 9)

Como você entende a expressão “uma sede que lhe tomava agora o corpo todo”?

7. Indique, abaixo, a alternativa em que há uma metáfora: a) “...deixava a brisa fresca bater-lhe no rosto e entrar-lhe pelos cabelos com dedos longos, finos e sem peso...” b) “E se fechasse as narinas e respirasse um pouco menos daquele vento de deserto?” c) “De olhos fechados entreabriu os lábios e colou-os ferozmente no orifício de onde jorrava a água.” d) “...e viu que era a estátua de uma mulher e que era da boca da mulher que saía a água.” 8. “Ele se tornara homem”

Essa afirmação, ao final do texto, pode sugerir que o conto de Clarice Lispector fala não apenas da experiência do primeiro beijo, mas da experiência da descoberta da sexualidade por um adolescente. Retire do texto frases que, na sua opinião, confirmam essa hipótese de leitura.


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NAMORO

1. ATIVIDADES DE LEITURA As leituras feitas em nossa oficina anterior permitiram que iniciássemos uma discussão sobre o tema dos relacionamentos entre os jovens. Na oficina de hoje, vamos ampliar essa discussão, lendo dois textos que falam do “namoro”. O primeiro texto é uma outra crônica da autora Martha Medeiros; o segundo é um poema de nosso grande poeta, Carlos Drummond de Andrade.

Dos ficantes aos namoridos Martha Medeiros Se você é deste século, já sabe que há duas tribos que definem o que é um relacionamento moderno. Uma é a tribo dos ficantes. O ficante é o cara que te namora por duas horas numa festa, se não tiver se inscrito no campeonato “Quem pega mais numa única noite”, quando então ele será seu ficante por bem menos tempo — dois minutos — e irá à procura de outra para bater o próprio recorde. É natural que garotos e garotas queiram conhecer pessoas, ter uma história, um romance, uma ficada, duas ficadas, três ficadas, quatro ficadas... Esquece, não acho natural coisa nenhuma. Considero um desperdício de energia. Pegar sete caras. Pegar nove “mina”. A gente está falando de quê, de catadores de lixo? Pegar, pega-se uma caneta, um táxi, uma gripe. Não pessoas. Peguee-leve, pegue-e-largue, pegueeuse, pegue-e-chute, pegue-e-conte-para-os-amigos. Pegar, cá pra nós, é um verbo meio cafajeste. Em vez de pegar, poderíamos adotar algum outro verbo menos frio. Porque, quando duas bocas se unem, nada é assim tão frio, na maioria das vezes esse “não estou nem aí” é jogo de cena. Vão todos para

a balada fingindo que deixaram o coração em casa, mas deixaram nada. Deixaram a personalidade em casa, isso sim. No entanto, quem pode contra o avanço (???) dos costumes e contra a vulgarização do vocabulário? Falando nisso, a segunda tribo a que me referia é a dos namoridos, a palavra mais medonha que já inventaram. Trata-se de um homem híbrido, transgênico. Em tese, ele vale mais do que um namorado e menos que um marido. Assim que a relação começa, juntam-se os trapos e parte-se para um casamento informal, sem papel passado, sem compromisso de estabilidade, sem planos de uma velhice compartilhada — namoridos não foram escolhidos para serem parceiros de artrite, reumatismo e pressão alta, era só o que faltava. Pois então. A ideia é boa e prática. Só que o índice de príncipes e princesas virando sapo é alto, não se evita o tédio conjugal (comum a qualquer tipo de acasalamento sob o mesmo teto) e pula-se uma etapa quentíssima, a melhor que há. Trata-se do namoro, alguns já ouviram falar. É quando cada um mora na sua casa e tem rotinas


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distintas e poucos horários para se encontrar, e esse pouco ganha a importância de uma celebração. Namoro é quando não se tem certeza absoluta de nada, a cada dia um segredo é revelado, brotam informações novas de onde menos se espera. De manhã, um silêncio inquietante. À tarde, um malentendido. À noite, um torpedo reconciliador e uma declaração de amor. Namoro é teste, é amostra, é ensaio, e por isso a dedicação é intensa, a sedução é ininterrupta, os minutos são contados, os meses são comemorados, a vontade de surpreender não cessa — e é a única relação que dá o devido espaço para a saudade, que

é fermento e afrodisíaco. Depois de passar os dias se vendo só de vez em quando, viajar para um fim de semana juntos vira o céu na Terra: nunca uma sextafeira nasce tão aguardada, nunca uma segunda-feira é enfrentada com tanta leveza. Namoro é como o disco “Sgt. Peppers”, dos Beatles: parece antigo e, no entanto, não há nada mais novo e revolucionário. O poeta Carlos Drummond de Andrade também é de outro tempo e é para sempre. É ele quem encerra esta crônica, dando-nos uma ordem para a vida: “Cumpra sua obrigação de namorar, sob pena de viver apenas na aparência. De ser o seu cadáver itinerante”.

ATIVIDADES DE LEITURA 1. Releia: “Se você é deste século, já sabe que há duas tribos que definem o que é um relacionamento moderno.”

O texto de Martha Medeiros, conforme indica o primeiro parágrafo, fala das “duas tribos que definem um relacionamento moderno”. 1.1. Destaque do texto as definições de: a) ficante

b) namorido 1.2. Além de definir cada uma das tribos, a autora também descreve seu comportamento. Explique, com suas palavras, como o texto caracteriza o relacionamento dos: a) ficantes

b) namoridos

2. O que há de semelhante no comportamento dessas tribos?


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3. Releia: O ficante é o cara que te namora por duas horas numa festa, se não tiver se inscrito no campeonato “Quem pega mais numa única noite”.

Observe que, ao descrever o comportamento dos ficantes, a autora os compara aos competidores de um campeonato. Por que ela faz essa comparação?

4. Você sabe o que é um verbete de dicionário? Um verbete corresponde a cada um dos itens de um dicionário, onde estão colocados os vários significados de uma palavra, seguidos de exemplos. No quadro abaixo, temos um verbete que traz alguns dos vários significados do verbo pegar. Leia-o atentamente:

pegar [Do lat. picare, ‘untar de pez’.] Verbo transitivo direto. 1.Fazer aderir; colar, grudar: Pôs a carta no correio sem pegar os selos. 2.Agarrar, prender, segurar: Pegou descuidado a louça, deixando-a cair; Correu e pegou o fugitivo; O goleiro pegou a bola tranquilamente. 3.Adquirir (enfermidade) por contágio, por debilidade orgânica, etc. 4.Adquirir, contrair, criar: pegar um mau hábito. DICINÁRIO AURÉLIO – VERSÃO DIGITAL

Considere, agora, a seguinte frase:

“Pegar sete caras. Pegar nove “mina”.”

4.1. Construa uma definição para o verbo pegar utilizado nessa frase:

4.2. Por que a autora afirma que “pegar é um verbo meio cafajeste”?

4.3. Explique o uso das aspas na palavra “mina”.


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5. Além de descrever e caracterizar o comportamento das duas tribos, Martha Medeiros também expressa sua opinião sobre esses novos modelos de relacionamento moderno. 5.1. O que a autora pensa sobre os ficantes? 5.2. O que a autora pensa sobre os namoridos?

6. Sobre o comportamento dos ficantes e sobre o verbo “pegar” utilizado por eles, a autora afirma: “No entanto, quem pode contra o avanço (???) dos costumes.” As interrogações entre parênteses podem ser interpretadas como um sinal de que: a) a autora teve dúvidas ao escolher a palavra “avanço”. b) a autora não vê o comportamento dos ficantes como um avanço. c) a autora considera o comportamento dos ficantes como um avanço. d) a autora não concorda com a forma de falar vulgar dos ficantes. 7. Vamos voltar ao título do texto: DOS FICANTES AOS NAMORIDOS. 7.1. Compare o título escolhido pela autora com esta outra possibilidade: “Os ficantes e os namoridos”. Na sua opinião, eles têm o mesmo significado? Explique o título escolhido pela autora.

8. O texto também descreve e caracteriza um outro tipo de relacionamento: o namoro. 8.1. Destaque do texto definições de namoro.

8.2. Para caracterizar esse tipo de relacionamento, a autora utiliza uma metáfora: “Namoro é teste, é amostra, é ensaio”. Explique essa metáfora:

8.3. O que diferencia o namoro dos outros tipos de relacionamento “modernos” descritos no texto?


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9. Considere este outro verbete:

ironia [Do gr. eironeía, ‘interrogação’, ‘dissimulação’, pelo lat. ironia.] Substantivo feminino. 1.Modo de exprimir-se que consiste em dizer o contrário daquilo que se está pensando ou sentindo, ou por pudor em relação a si próprio ou com intenção depreciativa e sarcástica em relação a outrem: Voltaire foi um mestre da ironia. 2.Contraste fortuito que parece um escárnio: ironia do destino. 3.Sarcasmo, zombaria. Dicionário Aurélio – versão digital

Considerando os significados de ironia, encontre no texto exemplos desse recurso.

TEXTO 2 Leia, agora, o poema de Drummond, mencionado no texto de Martha Medeiros. Sinalize, no texto, os versos, metáforas, estrofes de que você mais gostou.

AOS NAMORADOS DO BRASIL Carlos Drummond de Andrade

Dai-me, Senhor, assistência técnica para eu falar aos namorados do Brasil. Será que namorado algum escuta alguém? Adianta falar a namorados? E será que tenho coisas a dizer-lhes que eles não saibam, eles que transformam a sabedoria universal em divino esquecimento? Adianta-lhes, Senhor, saber alguma coisa, quando perdem os olhos para toda paisagem, perdem os ouvidos para toda melodia e só vêem, só escutam melodia e paisagem de sua própria fabricação?

Cegos, surdos, mudos - felizes! - são os namorados enquanto namorados. Antes, depois são gente como a gente, no pedestre dia-a-dia. Mas quem foi namorado sabe que outra vez voltará à sublime invalidez que é signo de perfeição interior. Namorado é o ser fora do tempo, fora de obrigação e CPF, ISS, IFP, PASEP,INPS.


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Os códigos, desarmados, retrocedem de sua porta, as multas envergonham-se de alvejá-lo, as guerras, os tratados internacionais encolhem o rabo diante dele, em volta dele. O tempo, afiando sem pausa a sua foice, espera que o namorado desnamore para sempre. Mas nascem todo dia namorados novos, renovados, inovantes, e ninguém ganha ou perde essa batalha. Pois namorar é destino dos humanos, destino que regula nossa dor, nossa doação, nosso inferno gozoso. E quem vive, atenção: cumpra sua obrigação de namorar, sob pena de viver apenas na aparência. De ser o seu cadáver itinerante. De não ser. De estar, e nem estar. O problema, Senhor, é como aprender, como exercer a arte de namorar, que audiovisual nenhum ensina, e vai além de toda universidade. Quem aprendeu não ensina. Quem ensina não sabe. E o namorado só aprende, sem sentir que aprendeu, por obra e graça de sua namorada. A mulher antes e depois da Bíblia é pois enciclopédia natural ciência infusa, inconsciente, infensa a testes, fulgurante no simples manifestar-se, chegado o momento. Há que aprender com as mulheres as finezas finíssimas do namoro. O homem nasce ignorante, vive ignorante, às vezes morre três vezes ignorante de seu coração e da maneira de usá-lo. Só a mulher (como explicar?) entende certas coisas que não são para entender. São para aspirar como essência, ou nem assim. Elas aspiram o segredo do mundo.

Há homens que se cansam depressa de namorar, outros que são infiéis à namorada. Pobre de quem não aprendeu direito, ai de quem nunca estará maduro para aprender, triste de quem não merecia, não merece namorar. Pois namorar não é só juntar duas atrações no velho estilo ou no moderno estilo, com arrepios, murmúrios, silêncios, caminhadas, jantares, gravações, fins-de-semana, o carro a toda ou a 80, lancha, piscina, dia-dos-namorados, foto colorida, filme adoidado,, rápido motel onde os espelhos não guardam beijo e alma de ninguém. Namorar é o sentido absoluto que se esconde no gesto muito simples, não intencional, nunca previsto, e dá ao gesto a cor do amanhecer, para ficar durando, perdurando, som de cristal na concha ou no infinito. Namorar é além do beijo e da sintaxe, não depende de estado ou condição. Ser duplicado, ser complexo, que em si mesmo se mira e se desdobra, o namorado, a namorada não são aquelas mesmas criaturas que cruzamos na rua. São outras, são estrelas remotíssimas, fora de qualquer sistema ou situação. A limitação terrestre, que os persegue, tenta cobrar (inveja) o terrível imposto de passagem: “Depressa! Corre! Vai acabar! Vai fenecer! Vai corromper-se tudo em flor esmigalhada na sola dos sapatos...” Ou senão: “Desiste! Foge! Esquece!” E os fracos esquecem. Os tímidos desistem. Fogem os covardes. Que importa? A cada hora nascem outros namorados para a novidade da antiga experiência. E inauguram cada manhã (namoramor) o velho, velho mundo renovado.


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ATIVIDADES DE LEITURA 1. Drummond inicia seu poema dirigindo um pedido ao “Senhor”: “Dai-me, Senhor, assistência técnica para falar aos namorados do Brasil.” 1.1. Que significado você apontaria para a expressão “assistência técnica” no verso em destaque? 1.2. Por que o poeta faz esse pedido? 2. Releia, agora, a segunda estrofe do poema. 2.1. Grife nela frases, expressões que o poeta usa para definir os namorados. 2.2. Como você entende essas definições? 2.3. Observe que Drummond, nessa estrofe, diferencia as pessoas que namoram das pessoas que não namoram, quando afirma: “Antes, depois são gente como a gente, no pedestre dia a dia.” Como você interpreta essa afirmação? Você concorda com ela? 3. O texto de Drummond, como estamos percebendo, é um elogio, uma exaltação aos namorados, que são tratados como seres especiais, diferentes dos demais. Grife no texto frases que demonstram isso. 4. Releia: A cada hora nascem outros namorados para a novidade da antiga experiência. E inauguram cada manhã (namoramor) o velho, velho mundo renovado. Observe a palavra namoramor. “Namoramor” é um neologismo, ou seja, uma palavra que não existe, foi inventada pelo poeta. 4.1. Como essa palavra foi formada? 4.2. Comente a presença desse neologismo na estrofe que finaliza o poema.


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APROFUNDANDO A LEITURA DO POEMA Atividade em grupo Você teve oportunidade de ler o poema de Drummond e observar mais atentamente algumas de suas estrofes. Sugerimos, agora, que você aprofunde essa leitura, tentando explicar os versos abaixo, interpretando suas metáforas e outros recursos semânticos de construção do poema. Mas quem foi namorado sabe que outra vez voltará à sublime invalidez que é signo de perfeição interior.

Os códigos, desarmados, retrocedem de sua porta, as multas envergonham-se de alvejá-lo, as guerras, os tratados internacionais encolhem o rabo diante dele, em volta dele.

O tempo, afiando sem pausa a sua foice, espera que o namorado desnamore para sempre. Mas nascem todo dia namorados novos, renovados, inovantes, e ninguém ganha ou perde essa batalha.

A limitação terrestre, que os persegue, tenta cobrar (inveja) o terrível imposto de passagem: “Depressa! Corre! Vai acabar! Vai fenecer! Vai corromper-se tudo em flor esmigalhada na sola dos sapatos...” Ou senão: “Desiste! Foge! Esquece!”


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E os fracos esquecem. Os tímidos desistem. Fogem os covardes. Que importa? A cada hora nascem outros namorados para a novidade da antiga experiência. E inauguram cada manhã (namoramor) o velho, velho mundo renovado.

DEBATE FINAL Martha Medeiros cita, em seu texto, o poema de Carlos Drummond, que você acabou de ler. Você poderá, agora, discutir com seu grupo as opiniões dos autores sobre o tema desta oficina. Dialogue com esses escritores. O que você pensa sobre o assunto em discussão?



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CORPO, SAúDE E BELEZA

1. ATIVIDADES DE LEITURA O primeiro texto desta oficina foi retirado da Revista de Domingo do Jornal do Brasil, ano 2004, coluna “Mascando Clichê”. É um texto argumentativo. Leia-o atentamente para responder às questões de leitura.

O sarado e o doente Sérgio Rodrigues

Sarado é o que o nome está dizendo, aquele que se curou. Mas se curou de quê? Do seu próprio corpo, ora. O cara (ou a cara, talvez; até mais ela do que ele) matricula-se numa academia, submete os tímpanos a uma dieta de música tecno, o estômago a um tratamento à base de aveia, banana, açaí e complementos alimentares, e começa a malhar os próprios músculos; isto é, castigá-los, descer o cacete neles, exatamente como o ferreiro faz com seu lingote em brasa e as crianças de subúrbio com seus judas de palha e pano – pois é daí mesmo que vem a palavra malhação, de onde mais? Então, se repetir esse ritual com bastante afinco por meses, anos, o indivíduo, finalmente, sara. Sara tanto que às vezes acaba doente, mas esse paradoxo vamos comentar depois. Por enquanto, basta ter em mente que sarado é aquele que se curou como se cura um paciente crônico ou um queijo minas, que nesse processo troca sua textura molhada, molenga

e fofinha (de frescal) por uma constituição seca e rija (de curado), mais ao gosto do nosso tempo. Não que sarado seja uma invenção do nosso tempo. Sei que é difícil acreditar, mas a gíria preferida dos malhadores de hoje, com seu jeitão tão atual quanto um pote colorido de Megamass 2000, é antiguinha. O Aurélio a registra há décadas, com o sentido, senão exatamente de malhado, de “forte, rijo, resistente”. Sua origem é incerta, mas não pode haver dúvida sobre o que quer dizer. Como exemplo, o dicionário traz um curioso texto de sabor regionalista tirado de um livro chamado Tiziu e outras estórias, de Nelson de Faria: “Seu Maneco, cabra sarado, duro que nem uma aroeira...”. Como não é lícito supor sem forçar demais a barra que o Seu Maneco bombeasse um Nautillus, acabamos por chegar à conclusão de que também se fica sarado na lavoura. Fisiculturismo e enxada. O que prova duas verdades complementares:


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algumas palavras hiber­ nam; somos menos mo­ dernos do que gostamos de imaginar. Uma primazia, po­rém, ninguém tira de nossa época: nunca se atribuiu tanto valor a músculos. Houve um tempo - meninos, eu vi - em que um homem de musculatura apenas funcional ou uma mu­lher de popô meio gela­tinoso podia sobreviver muito bem na selva social com armas arcai­cas: bom papo, senso de humor, informação ge­ ral, elegância, tiradas espirituosas, bons den­ tes, gosto no vestir. Co­ mo garruchas da Guerra do Paraguai, porém, es­ sas armas caíram em desuso: qualquer dia o governo do estado as junta no Aterro e passa um rolo compressor em cima. No má­ximo, ainda que raramente, são usadas como acessó­rios curiosos por saradinhas e saradões, no papel de pálidos coadjuvantes de seus peitorais, glúteos e del­tóides. Mas, como não costumam combinar com tais protagonistas, aos poucos vão saindo de cartaz.

Até aí tudo bem --- ou tudo mal, depende - mas resta a pergunta: o sarado sara de quê? Vamos à tese. O escri­ tor Thomas Mann - um alemão com menos músculos que um gafanhoto - escreveu, em A montanha mágica, essa frase intrigante: “A doença torna os homens mais físicos, privando-os de tudo o que não seja corpo”. Pois então. Se a irremediável decadência de todos os seres vivos é, como parece ser, a grande inimiga da humanida­de nos dias atuais, sua moléstia de eleição, então está justificado o egoísmo generalizado de mergulhar no pró­prio corpo e paparicá-lo, como se paparica um enfermo, não está? Ninguém sara para sempre, mas isso não im­porta: importa fazer tudo o que for possível, remar com todas as forças nesse sentido. Para os radicais, vale até tomar anabolizante de cavalo e, aí sim, ficar doente, muito doente, mortalmente doente. Mas saradíssimo.

ATIVIDADES DE LEITURA 1. Observe primeiramente o título e a imagem que acompanha o texto. O que essas duas pistas sugerem a você sobre o assunto do texto? 2. O texto de Sérgio Rodrigues é um texto argumentativo. Textos argumentativos são textos escritos para se expressar uma opinião a respeito de um acontecimento ou de um tema. Qual é o tema do texto? 3. Sérgio Rodrigues escreve esse texto para argumentar que: a) malhar o corpo em academias é bom para a saúde. b) as pessoas devem cuidar do corpo, pois vivemos numa época que valoriza o corpo perfeito. c) o termo “sarado” não é uma invenção do nosso tempo. d) o exagero da malhação não é sinal de saúde, mas de doença. 4. Releia: “Sarado é o que o nome está dizendo, aquele que se curou. Mas se curou de quê? Do seu próprio corpo, ora.”

Explique, com suas palavras, essa afirmação do autor.


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5. Argumentos são evidências que o autor apresenta para sustentar sua opinião, seu ponto de vista. Que argumentos o autor apresenta no texto para confirmar sua tese de que a moda da malhação pode transformar-se numa doença. 6. Releia: “O cara (...) matricula-se numa academia de ginástica (...) e começa a malhar os próprios músculos, isto é, castigá-los, descer o cacete neles, exatamente como o ferreiro faz com o seu lingote em brasa e as crianças de subúrbio com seus Judas de palha e pano...” Para explorar o sentido do termo “malhado”, o autor utiliza duas comparações. 6.1. A quem os malhadores são comparados? 6.2. Por quê?

7. Releia: “Sarado é aquele que se curou como se cura um paciente crônico ou um queijo minas...” O corpo dos malhadores é também comparado a um queijo curado, porque: a) tem aparência fresca. b) é firme. c) é fofinho. d) tem textura molhada. 8. Releia: “Sara tanto que às vezes acaba ficando doente”. A frase em destaque acima é um PARADOXO. Segundo o Dicionário Aurélio, um paradoxo é “uma contradição, pelo menos na aparência”. Encontre no texto uma outra afirmação paradoxal.


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9. Releia: “O cara (ou a cara, talvez mais ela do que ele) matricula-se numa academia de ginástica...”

9.1. O que significa a expressão “a cara”? Comente essa escolha do autor e sugira uma expressão equivalente que possa substituí-la. 9.2. Você concorda com a afirmação entre parêntese?

10. Após a leitura do texto de Sérgio Rodrigues, podemos melhor compreender o seu título. Como você compreende o título do texto?


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Você agora vai ouvir uma música de um grande compositor brasileiro, que pode nos levar a refletir sobre questões que o texto 1 nos coloca.

Salão de Beleza Composição: Zeca Baleiro Se ela se penteia Eu não sei! Se ela usa maquilagem Eu não sei! Se aquela mulher é vaidosa Eu não sei! Eu não sei! Eu não sei!... Vem você me dizer Que vai num salão de beleza Fazer permanente Massagem, rinsagem, reflexo E outras “cositas más”...(2x) Oh! Baby você não precisa De um salão de beleza Há menos beleza Num salão de beleza A sua beleza é bem maior Do que qualquer beleza De qualquer salão... Baby você não precisa De um salão de beleza Há menos beleza Num salão de beleza A sua beleza é bem maior Do que qualquer beleza De qualquer salão... Mundo velho E decadente mundo Ainda não aprendeu A admirar a beleza A verdadeira beleza A beleza que põe mesa

E que deita na cama A beleza de quem come A beleza de quem ama A beleza do erro Do engano Da imperfeição... Belle! Belle! Como Linda Evangelista Linda! Linda! Como Isabelle Adjani...(3x) Veja como vem! Veja bem! Veja como vem Vai! Vai! Vem! Veja bem! Como vai! Vem! Veja como vai! Veja bem! Veja bem como vem! Vai! Vem! Se ela vai também! Aí! Bela Morena Aí! Morena Bela Quem foi que te fez tão formosa? És mais linda que a rosa Debruçada na janela...(2x)


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ATIVIDADES DE LEITURA 1. Na sua opinião, qual é o tema dessa letra de música?

2. Releia os versos abaixo: “Mundo velho e decadente mundo ainda não aprendeu a admirar a beleza/ a verdadeira beleza/ a beleza que põe mesa/ e que deita na cama./ a beleza de quem come/ a beleza de quem ama./ a beleza do erro, do engano e da imperfeição.”

Por que o autor diz que o mundo está velho e decadente?

3. Considerando o tema da beleza, em que os dois textos lidos se assemelham?


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Corpo, Saúde e Beleza

1. ATIVIDADES DE LEITURA O texto que você vai ler agora é uma reportagem sobre ANOREXIA, uma doença que atinge cada vez mais os jovens. Observe que essa reportagem se organiza em várias partes. Faça uma primeira leitura de toda a reportagem.

Doente há 11 anos, jovem diz que seu peso ideal é 41 kg Alex, 27, desenvolveu anorexia na adolescência e sabe que está doente; ele relaciona o transtorno a conflitos familiares

Supervisor de alimentos, o baiano não suporta o cheiro de comida e quer se curar; atualmente, está internado para tratamento em SP DA REPORTAGEM LOCAL

O baiano Alex desenvolveu anorexia durante a adolescência. Apesar de sempre ter sido magro, aos 16 anos passou a restringir os alimentos. Atribui a origem do transtorno alimen­ tar a conflitos familiares. Hoje, aos 27 anos, 46 kg dis­tribuídos em 1m70 de altura, Alex continua insatisfeito com o corpo. “Por mim, o ideal seria estar com 41 kg”, afirma. Ele chegou a pesar 39 kg e ainda as­sim queria emagrecer mais. Nos últimos meses, o ex-estudante de filosofia passava dias sem comer nada, mesmo sendo supervisor de alimentos em uma lanchonete em São Paulo. Quando conseguia inge­rir algo, vomitava. Há quase um mês, após su­ cessivos desmaios provocados por um quadro grave de desnu­ trição e com medo de morrer, ele foi internado no Ambulatório do HC de São Paulo. Recebe cinco porções de alimentos por dia, mas precisa ser vigiado pa­ra não provocar vômitos. A se­guir, trechos da entrevista. (CLÁUDIA COLLUCCI)

ENTREVISTA folha - Quando e como você de­senvolveu anorexia? alex - Desde os 16 anos, mas a doença veio se agravar na fase adulta. Comecei a restringir os alimentos porque meu pai achava que eu comia muito, da­va bronca. Fiquei com isso na cabeça e fui perdendo a vonta­de de comer. Quando comia, sentia-me culpado e vomitava. folha - Nessa época você já se sentia gordo? alex - Não. A distorção da mi­ nha imagem começou por volta dos 18 anos. Olhava no espelho e me achava gordo, tinha pavor de engordar mais. Cheguei a pesar 39 kg e ainda me sentia gordo. Nessa época, meu pai e minha mãe brigavam muito, meu pai batia nela. Quando eu presenciava as cenas, corria pa­ra vomitar. folha - Quando você sentiu que havia perdido o controle da doença? alex - Quando me mudei para São Paulo, há cinco anos. Eu não tinha mais ninguém para me vigiar. Antes, meus amigos me policiavam. Aqui em São Paulo cheguei a ficar dias sem comer, às vezes, nem água eu bebia. Quando conseguia, o pouco que eu comia botava para fora em seguida. Por fim, co­mecei a desmaiar. Uma vez, roubaram o meu celular.


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folha - Como você se sente traba­ lhando com alimentos? alex - É horrível. Onde eu tra­balho tem doce, salada, lanches, pizza e eu tenho de super­visionar tudo. É estressante olhar para a comida. Abrir o forno e sentir o cheiro é uma tortura para mim. Tenho a sen­sação de que até o cheiro vai me engordar. Sinto-me gordo, acho que tenho barriga. Por mim, o ideal seria estar com 41 kg e não com 46 kg. Sei que é uma doença, que meu peso atual está bem abaixo do ideal. Meu sonho é ficar curado.

+ DEPOIMENTO Aos 16, garoto anoréxico teve dez recaídas DA REPORTAC EM LOCAL

Alisson, 16, cursa o 1° ano do ensino médio em uma escola pública de São Paulo e luta contra a anorexia e bulimia. Leia o seu depoimento: “Eu pesava 72 quilos. Sen­tia que as pessoas se afasta­vam de mim e achava que era porque eu era gordo. Gordo era a pior palavra que eu po­dia ouvir, morria de vergo­nha de ir a praias, clubes, sentia muita vergonha de mostrar meu corpo. Muitas pessoas falavam para eu tomar vergonha na cara e fazer um regime. Aqui­ lo ficou na minha cabeça e foi aí que resolvi fazer um regi­ me rigoroso, sem aconselhamento de médicos. Tomava sopas de baixíssimas calo­rias, comia apenas frutas, le­gumes e verduras. Mas, no dia 9 de julho [de 2006], minha mãe fez uma comida magnifica e eu comi excessivamente. Depois fui ao banheiro vomitar tudo. E daí não parei mais. Todos os dias vomitava umas cinco ve­zes. Em 20 dias, emagreci quase 15 kg. Depois de quatro meses, estava com 52 kg e doente. Não sentia gosto dos alimentos, tinha mau hálito muito forte, muita fraqueza e dores fortes no estômago. No dia 6 de novembro, meu amigo me viu vomitan­do no banheiro da escola e contou para a professora, que contou para minha mãe. Quando soube da notícia, minha mãe chorou muito e eu prometi que ia parar. Só que não foi tão simples. Já ti­ve umas dez recaídas.”

+ DEPOIMENTO ‘O preconceito com homens é bem maior’ DA REPORTAGEM LOCAL

A seguir, o depoimento do estudante Vítor Adrien, 20, que há três anos chegou a pe­sar 40 kg. “Sempre fui magro mas, em 2003, cheguei a 58 kg. Comecei a me sentir estra­nho. A coisa piorou em 2004, quando descobri que tinha transtorno bipolar. Os remé­dios do tratamento me en­gordavam. Comecei a passar dias sem comer ou comendo pouco, chegando a pesar 40 kg, IMC de 13,8. Como já fazia tratamento para o transtorno, apenas al­ teraram para um remédio que me dava apetite. Cheguei a 64 kg, e, no início de 2006, abandonei o tratamento. Fiquei bem até dezembro, quando começaram as recaí­das, quatro no total. Atualmente, estou numa delas. Nesta semana, perdi 3 kg, fi­quei com 52 kg, IMC de 18. Minha família sabe, mas não comenta muito a respei­ to. No início, só faziam comi­ das gordurosas e eu ficava sem comer. Então, preferi­ram mudar para uma ali­mentação menos calórica e toda hora me oferecem algo. Já conheci dois garotos com o problema. Um deles até ajudou a desmentir que a tal anorexia só recai em mu­ lheres e homossexuais. Na última vez que tivemos contato, ele, que tem 1,78m de altura, estava com 46 kg. A mídia tem colocado esse pro­blema como algo restrito às mulheres. Mas existem sim homens anoréxicos e o pre­conceito é bem maior.”


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SAIBA MAIS SOBRE A ANOREXIA

FASES DA DOENÇA O que é? A anorexia é um transtorno alimentar no qual a busca implácavel por magreza leva a pessoa a recorrer a estratégias para perda de peso, ocasionando importante emagrecimento. Tem cunho psiquiátrico.

Cuasa Não é conhecida. As hipóteses vão de distúrbios psiquiátricos causados por alterações neuroquímicas cerebrais, predisposição genética e até o conceito atual de moda que determina a magreza como símbolo de beleza e elegância.

OS ÍNDICES DA DOENÇA 1

O menino começa uma dieta por achar-se gordo. Amigos e parentes dizem que já está magro, mas ele não acredita e mantem a dieta.

2

Tem início a rejeição a eventos sociais que incluam comida, como jantares, festas de casamento. Surgem os vômitos depois das refeições para livrar a culpa.

3

O organismo dá os alertas: sensação frequente de frio, esquecimentos, queda de pressão, irritabilidade e desmaios. O índice de massa corpórea fica abaixo de 16; cresce o risco de internação em hospital.

9 a 24 = peso ideal 25 a 29 = sobrepeso 30 a 34 = obesidade em grau 1 35 a 39 = obesidade em grau 2

40 a 49 = obesidade mórbida 50 a 59 = superobeso + de 60 = super-superobeso

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COMO TRATAR »

É preciso procurar ajuda psiquiátrica; um grupo de várias especialidades médicas tem de atuar, com endocrinologista, nutricionista, psiquiatra e clínico geral.

»

Há a ingestão de medicamentos para estimular o apetite.

»

O tratamento, em pacientes ainda no início da doença, dura no mínimo, seis meses; em muitos casos, dura anos.

»

Nunca mais a pessoa poderá fazer dieta.

O QUE OCORRE NO ORGANISMO Desequilíbrio de sais, anemia profunda, diminuição de massa em órgãos como cérebro, fígado, rim e coração.

Dificuldade de atenção, esquecimento e desmaios. Surgimento de uma penugem comum nos recén-nascidos, para proteger do frio. Hemorragia no esôfago, provocada pelo excesso de vômito. Há mudança na pele, cabelo e unhas por causa da falta de cálcio e vitaminas. Gastrite e úlcera. Perda da libido, atrofia dos testículos e redução dos níveis de testoterona.

21%

Dos que são internados morrem

21%

...desses

»

50% são vítimas de complicações da doença, como parada cardíaca e pneumonia.

»

27% cometem suicídio.


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ATIVIDADES DE LEITURA Você vai ler apenas o primeiro texto dessa reportagem, uma breve notícia.

Notícias e reportagens costumam apresentar um título seguido de um subtítulo, ou olho da notícia. Há também o lead. Lead é uma palavra de origem inglesa que significa “resumo”. Os leads correspondem ao primeiro parágrafo da notícia. Se prestarmos atenção aos títulos, subtítulos e leads das notícias que aparecem nos jornais podemos tomar conhecimento de grande parte de seu conteúdo antes mesmo de lê-las.

1. Considere os quadros abaixo. No primeiro temos o título e, nos outros dois, subtítulos.

DOENTE HÁ 11 ANOS, JOVEM DIZ QUE SEU PESO IDEAL É 41 KG. Alex, 27, desenvolveu anorexia na adolescência e sabe que está doente; ele relaciona o transtorno a conflitos familiares. Supervisor de alimentos, o baiano não suporta o cheiro de comida e quer se curar; atualmente, está internado para tratamento em SP.

Responda: 1.1. Sobre o que fala a notícia?

1.2. Sobre quem fala a notícia?

1.3. Quando ele adquiriu a doença?

1.4. Por que Alex adquiriu a doença?

2. Considere, agora, toda a notícia. Que outras informações sobre o rapaz podem ser encontradas nessa parte da reportagem?


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3. Além da notícia do fato, a reportagem lida inclui uma pequena entrevista com Alex. Observe que, nessa entrevista, Alex explica melhor como, quando e por que ele desenvolveu a doença. Retire, da entrevista, trechos que detalham:

3.1. Como ele foi ficando doente. 3.2. Quando ele desenvolveu a doença. 3.3. Por que ele desenvolveu a doença.

4. Que informações novas a entrevista acrescenta à notícia?

5. Leia, agora, os dois outros depoimentos incluídos nessa reportagem. 5.1. Qual seria a finalidade dessa parte da reportagem? 5.2. Releia, do depoimento de Alex:

“A distorção da minha imagem começou por volta dos 18 anos.”

A sensação descrita por Alex, bastante característica da doença anorexia, pode ser observada nos depoimentos dos outros garotos. Retire de cada um dos depoimentos uma frase que demonstra isso. 5.3. Uma causa comum aos três casos de anorexia citados é: a) o conflito familiar. b) a magreza como modelo de beleza. c) um transtorno psíquico. d) a rejeição dos amigos. 5.4. Observe o título do último depoimento: “O preconceito com homens é bem maior”. Por que, na sua opinião, o preconceito com homens que sofrem de anorexia seria maior?


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6. Além da notícia, da entrevista e de dois depoimentos, a reportagem sobre anorexia exibe um texto que se organiza em tópicos, intitulado: SAIBA MAIS SOBRE ANOREXIA. 6.1. A finalidade dessa parte da reportagem é: a) resumir os depoimentos dos três garotos. b) reunir informações diversas sobre a doença. c) ensinar como se deve tratar a doença. d) descrever os sintomas da doença. 6.2. Releia o texto com atenção e relacione as duas colunas abaixo: (1) Causa da doença (2) Consequência da doença (3) Sintoma da doença. (4) Tratamento ( ) Aparecimento de doenças como anemia profunda, gastrite e úlcera. ( ) Rejeição a festas que ofereçam comida. ( ) Ingestão de medicamentos para estimular o apetite. ( ) Distúrbios psiquiátricos e pressão do meio social. Agora, assinale o item que contém a sequência adequada: a) 2- 3- 4- 1. b) 4- 3- 2- 1. c) 3- 2- 1- 4. d) 3- 4- 1- 2. 7. Considere, agora, o quadro que contém uma fórmula para medir o índice de massa corporal. 7.1. Que dados são necessários para se medir o índice de massa corpórea de uma pessoa?

7.2. Qual é a finalidade desse quadro no texto “Saiba mais sobre anorexia.”?

8. Observe uma última informação veiculada pela reportagem: um dado percentual relativo ao número de mortes por anorexia. Qual é a importância dessa informação ao final do texto?


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DEBATE FINAL E ATIVIDADE ESCRITA Após ler os textos das oficinas 5 e 6, o que você pensa sobre as questões abaixo? Rascunhe seus posicionamentos por escrito antes de discutir o tema com seus colegas. »» Você se sente atingido pela “ditadura da magreza”? Que experiência pode relatar a esse respeito? »» Você concorda haver preconceito contra quem não se enquadra num modelo de beleza? Já viu isso acontecer na sua escola ou na sua comunidade? »» O que é o belo para você? O que você observa e admira nas pessoas? »» Será verdade que homens preocupam-se menos com estereótipos físicos que mulheres? »» Os jovens têm colocado em risco sua saúde em função de adequar-se a padrões de beleza masculina ou feminina?


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Modernidade e tecnologia

1. ATIVIDADES DE LEITURA Nesta oficina você vai ler dois textos publicitários, duas propagandas. Textos publicitários costumam ter como objetivo principal vender produtos e precisam apresentar bons argumentos para convencer os consumidores a comprá-los. Leia com atenção o texto 1.


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Atividades de leitura 1. Observe, atentamente, a imagem e os textos verbais que a acompanham. 1.1. O que o homem está fazendo?

1.2. Como você interpreta seu gesto com a mão esquerda?

1.3. Por que ele tem a cabeça de um dinossauro?

2. O objetivo dessa propaganda é: a) mostrar que aqueles que trabalham demais são como dinossauros. b) apresentar aos consumidores um novo produto da Microsoft, o Office 2003. c) argumentar que quem não sabe enviar e-mails está muito desatualizado. d) comparar dois programas da Microsoft, o Office 2000 e o 2003. 3. A frase “Essa era já era” sugere que: a) os dinossauros são seres que não existem mais. b) o homem-dinossauro precisa trocar seu computador por outro mais moderno. c) o programa utilizado pelo homem-dinossauro já está superado. d) aqueles que não sabem lidar com computadores estão na era dos dinossauros.

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Leia agora o texto 2, uma propaganda bem mais antiga que a anterior.


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Atividades de leitura 1. O que o homem da propaganda está fazendo? 2. Como você interpreta seu gesto com a mão direita e sua expressão facial? 3. Que outras imagens, além do homem em sua mesa de trabalho, compõem esse texto propaganda? O que essas imagens sugerem? 4. Considere o verbete abaixo, extraído do Dicionário Aurélio, versão digital:

tônico [Do gr. tonikós] Adjetivo. 1.Relativo a tom (1). 2.Que tonifica ou dá energia. 3.E. Ling. Diz-se do elemento (vogal, sílaba) que recebe o acento de intensidade. Substantivo masculino. 4.Medicamento supostamente revigorante.

Qual dos significados listados aplica-se ao sentido da palavra tônico na frase “NEUROBIOL – O TONICO DO CEREBRO”? 5. Considere, agora, o nome do produto que a propaganda quer vender – NEUROBIOL. Esse nome foi composto a partir dos radicais NEURO + BIO. Antes de responder às questões abaixo, observe o significado de outras palavras que também possuem, em sua formação, esses radicais. Biologia – estudo dos seres vivos. Biografia – descrição ou história da vida de uma pessoa. Neurônio – célula fundamental do tecido nervoso. 5.1. Qual seria o significado do nome NEUROBIOL?

5.2. Procure explicar o significado das seguintes palavras:


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6. Considere, ainda, esta outra frase da propaganda: “No turbilhão da vida moderna, a vitória cabe aos cérebros fortes.” Na frase acima, a palavra turbilhão significa: a) agitação b) competição c) violência d) tranquilidade 7. Tendo em vista o significado de “turbilhão”, procure lembrar-se de outras palavras cognatas, ou seja, da mesma família da palavra em destaque: 8. A finalidade do texto 2 é: a) argumentar que a vida nas cidades grandes é sempre muito agitada. b) mostrar que as pessoas inteligentes e esforçadas conseguem vencer na vida. c) vender um fortificante para o cérebro, que ajuda a enfrentar a agitação da vida moderna. d) argumentar que as pessoas que trabalham demais podem sofrer de stress. 9. Para convencer os consumidores a respeito da qualidade dos produtos anunciados, os textos publicitários se valem de argumentos. Que argumentos os dois textos lidos utilizam para convencer os consumidores a adquirirem seu produto?

10. Embora as propagandas sejam de épocas diferentes e vendam produtos diferentes, há semelhança na construção do argumento. Que semelhança você consegue perceber entre eles?

ATIVIDADE ORAL As duas propagandas discutem o tema da modernidade e da tecnologia. Considere os dois personagens da propaganda e procure discutir a seguinte questão: para executar seu trabalho, qual dos dois personagens é mais dependente da tecnologia? Na sua opinião, as pessoas utilizam as tecnologias disponíveis hoje de forma equilibrada?


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DEBATE FINAL Vamos ampliar nosso debate sobre o tema da oficina, ouvindo a música abaixo, do compositor Zeca Baleiro. Converse sobre essa letra com seu grupo.

Kid Vinil quando é que tu vai gravar cd? Kid Vinil quando é que tu vai gravar cd? Tecnologia existe Pra salvar o homem do fim Se você estiver triste Delete a tristeza assim E se quiser conversar Passe um fax pra mim Time is money god is dead Have you a nice dream Acessando a internet Você chega ao coração Da humanidade inteira Sem tirar os pés do chão reza o pai-nosso em hebraico filosofa em alemão Descobre porque que o michal Deu chilique na televisão Milhares de megabytes Abatendo a solidão Com a graça de Bill Gates Salve a globalização Se homem já foi a lua Vai pegar o sol com a mão Basta comprar um pc E aprender o abc da informatização



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O jovem e a tecnologia

1. ATIVIDADES DE LEITURA Dando continuidade à discussão iniciada em nosso encontro anterior, a respeito da relação do homem com a tecnologia, vamos ler um texto do escritor brasileiro José J. Veiga. Leia com atenção esta “estranha história”.

A MÁQUINA EXTRAVIADA José J. Veiga Você sempre pergunta pelas novidades daqui deste sertão, e finalmente posso lhe contar uma importante. Fique o compadre sabendo que agora temos aqui uma máquina imponente, que está entusiasmando todo o mundo. Desde que ela chegou - não me lembro quando, não sou muito bom em lembrar datas - quase não temos falado em outra coisa; e da maneira que o povo aqui se apaixona até pelos assuntos mais infantis, é de admirar que ninguém tenha brigado ainda por causa dela, a não ser os políticos.

num botequim do largo para comer e beber. Muita gente se amontoou na porta mas ninguém teve coragem de se aproximar dos estranhos porque um deles, percebendo essa intenção nos curiosos, de vez em quando enchia a boca de cerveja e esguichava na direção da porta. Atribuímos essa esquiva ao cansaço e à fome deles e deixamos as tentativas de aproximação para o dia seguinte; mas quando os procuramos de manhã cedo na pensão, soubemos que eles tinham montado mais ou menos a máquina durante a noite e viajado de madrugada.

A máquina chegou uma tarde, quando as famílias estavam jantando ou acabando de jantar, e foi descarregada na frente da Prefeitura. Com os gritos dos choferes e seus ajudantes (a máquina veio em dois ou três caminhões) muita gente cancelou a sobremesa ou o café e foi ver que algazarra era aquela. Como geralmente acontece nessas ocasiões, os homens estavam mal-humorados e não quiseram dar explicações, esbarravam propositalmente nos curiosos, pisavam-lhes os pés e não pediam desculpa, jogavam pontas de cordas sujas de graxa por cima deles, quem não quisesse se sujar ou se machucar que saísse do caminho.

A máquina ficou ao relento, sem que ninguém soubesse quem a encomendara nem para que servia. É claro que cada qual dava o seu palpite, e cada palpite era tão bom quanto outro.

Descarregadas as várias partes da máquina, foram elas cobertas com encerados e os homens entraram

As crianças, que não são de respeitar mistério, como você sabe, trataram de aproveitar a novidade. Sem pedir licença a ninguém (e a quem iam pedir?), retiraram a lona e foram subindo em bando pela máquina acima, até hoje ainda sobem, brincam de esconder entre os cilindros e colunas, embaraçam-se nos dentes das engrenagens e fazem um berreiro dos diabos até que apareça alguém para soltá-las; não adiantam ralhos, castigos, pancadas; as crianças simplesmente se apaixonaram pela tal máquina.


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Contrariando a opinião de certas pessoas que não quiseram se entusiasmar, e garantiram que em poucos dias a novidade passaria e a ferrugem tomaria conta do metal, o interesse do povo ainda não diminuiu. Ninguém passa pelo largo sem ainda parar diante da máquina, e de cada vez há um detalhe novo a notar. Até as velhinhas de igreja, que passam de madrugada e de noitinha, tossindo e rezando, viram o rosto para o lado da máquina e fazem uma curvatura discreta, só faltam se benzer. Homens abrutalhados, como aquele Clodoaldo seu conhecido, que se exibe derrubando boi pelos chifres no pátio do mercado, tratam a máquina com respeito; se um ou outro agarra uma alavanca e sacode com força, ou larga um pontapé numa das colunas, vê-se logo que são bravatas feitas por honra da firma, para manter fama de corajoso. Ninguém sabe mesmo quem encomendou a máquina. O prefeito jura que não foi ele, e diz que consultou o arquivo e nele não encontrou nenhum documento autorizando a transação. Mas mesmo assim não quis lavar as mãos, e de certa forma encampou a compra quando designou um funcionário para zelar pela máquina. Devemos reconhecer—aliás todos reconhecem— que esse funcionário tem dado boa conta do recado. A qualquer hora do dia, e às vezes também de noite, podemos vê-lo trepado lá por cima espanando cada vão, cada engrenagem, desaparecendo aqui para reaparecer ali, assoviando ou cantando, ativo e incansável. Duas vezes por semana ele aplica caol nas partes de metal dourado, esfrega, esfrega, sua, descansa, esfrega de novo—e a máquina fica faiscando como jóia. Estamos tão habituados com a presença da máquina ali no largo, que se um dia ela desabasse, ou se alguém de outra cidade viesse buscá-la, provando com documentos que tinha direito, eu nem sei o que aconteceria, nem quero pensar. Ela é o nosso orgulho, e não pense que exagero. Ainda não sabemos para que ela serve, mas isso já não tem maior importância. Fique sabendo que temos recebido delegações de outras cidades, do estado e de fora, que vêm aqui para ver se conseguem comprá-la. Chegam como quem não quer nada, visitam o prefeito, elogiam a cidade, rodeiam, negociam, abrem o jogo: por quanto cederíamos a

máquina. Felizmente o prefeito é de confiança e é esperto, não cai na conversa macia. Em todas as datas cívicas a máquina é agora uma parte importante das festividades. Você se lembra que antigamente os feriados eram comemorados no coreto ou no campo de futebol, mas hoje tudo se passa ao pé da máquina. Em tempo de eleição todos os candidatos querem fazer seus comícios à sombra dela, e como isso não é possível, alguém tem de sobrar, nem todos se conformam e sempre surgem conflitos. Mas felizmente a máquina ainda não foi danificada nesses esparramos, e espero que não seja. A única pessoa que ainda não rendeu homenagem à máquina é o vigário, mas você sabe como ele é ranzinza, e hoje mais ainda, com a idade. Em todo caso, ainda não tentou nada contra ela, e ai dele. Enquanto ficar nas censuras veladas, vamos tolerando; é um direito que ele tem. Sei que ele andou falando em castigo, mas ninguém se impressionou. Até agora o único acidente de certa gravidade que tivemos foi quando um caixeiro da loja do velho Adudes (aquele velhinho espigado que passa brilhantina no bigode, se lembra?) prendeu a perna numa engrenagem da máquina, isso por culpa dele mesmo. O rapaz andou bebendo em uma serenata, e em vez de ir para casa achou de dormir em cima da máquina. Não se sabe como, ele subiu à plataforma mais alta, de madrugada rolou de lá, caiu em cima de uma engrenagem e com o peso acionou as rodas. Os gritos acordaram a cidade, correu gente para verificar a causa, foi preciso arranjar uns barrotes e labancas para desandar as rodas que estavam mordendo a perna do rapaz. Também dessa vez a máquina nada sofreu, felizmente. Sem a perna e sem o emprego, o imprudente rapaz ajuda na conservação da máquina, cuidando das partes mais baixas. Já existe aqui um movimento para declarar a máquina monumento municipal—por enquanto. O vigário, como sempre, está contra; quer saber a que seria dedicado o monumento. Você já viu que homem mais azedo? Dizem que a máquina já tem feito até milagre, mas isso—aqui para nós—eu acho que é exagero de gente supersticiosa, e prefiro não ficar falando


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no assunto. Eu—e creio que também a grande maioria dos munícipes—não espero dela nada em particular; para mim basta que ela fique onde está, nos alegrando, nos inspirando, nos consolando. O meu receio é que, quando menos esperarmos, desembarque aqui um moço de fora, desses despachados, que entendem de tudo, olhe a máquina por fora, por dentro, pense um pouco e comece a explicar a finalidade da máquina, e para mostrar que é habilidoso (eles são sempre

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muito habilidosos) peça na garagem um jogo de ferramentas, e sem ligar a nossos protestos se meta por baixo da máquina e desande a apertar, martelar, engatar, e a máquina comece a trabalhar. Se isso acontecer, estará quebrado o encanto e não existirá mais máquina.

(In: Os cem melhores contos do século XX. Rio de Janeiro. Ed. Objetiva, 2000, p. 229.)

Atividades de leitura 1. No conto de José J. Veiga, o narrador dirige-se a um interlocutor distante. Essa estratégia assemelha o conto a uma carta. Demonstre isso com uma frase do texto.

2. Qual é o conflito da narrativa?

3. Onde se passa o episódio narrado? Procure descrever o cenário da narrativa.

4. Quem são os personagens envolvidos na história?

5. Procure construir uma breve descrição da máquina e do lugar onde ela foi colocada na cidade.

6. Que tipo de narrador temos nessa história?

7. O título do conto, “A máquina extraviada”, sugere que a máquina: a) foi encomendada pelo prefeito. b) foi doada à cidade por um desconhecido. c) chegou ali por engano. d) foi comprada pela prefeitura.


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8. A relação que a maior parte dos moradores da cidade estabelece com a máquina é de: a) medo. b) admiração. c) desconfiança. d) indiferença. 9. O personagem do vigário estabelece com a máquina uma relação de: a) espanto. b) aproximação. c) admiração. d) rivalidade. 10. Retire do texto fragmentos que mostram que a presença da máquina modificou o comportamento das pessoas daquele lugar. 11. Há no conto uma série de fatos misteriosos. Cite alguns episódios, ações ou comportamentos que você julga estranhos, absurdos.

12. A história da máquina extraviada pode ser lida como uma alegoria da relação do homem com a tecnologia. Na sua opinião, o que essa história nos diz sobre isso?


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Vamos ler agora a charge de Bruno Drummond. Observe atentamente todas as informações e pistas textuais.

ATIVIDADES DE LEITURA 1. Quem são os personagens da charge? Descreva-os detalhadamente. 2. O que a mãe estaria querendo dizer à filha no primeiro quadro? 3. A filha compreendeu o que a mãe queria lhe dizer? Confirme sua resposta com pistas do texto.


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4. Na sua opinião, qual é o objetivo dessa charge?

5. A charge nos coloca o tema da relação do jovem com a tecnologia. O que ela nos sugere?

6. Levando em conta a fala da menina, que relação você faria entre a charge de Bruno Drummond e o texto de José J. Veiga?

ATIVIDADE ESCRITA JUVENTUDE E TECNOLOGIA: o que você pensa sobre isso? Escreva um texto, posicionando-se sobre o tema desta oficina. É hora de dar sua opinião. Pense sobre as questões abaixo, elas podem ajudar você a organizar seu texto.

»» Como o jovem se relaciona com a tecnologia? »» Você concorda com a afirmação de que o jovem é muito dependente dela? »» Que aspectos positivos você apontaria na internet como tecnologia para juventude? Que aspectos negativos apontaria? »» Que outra tecnologia, além da internet, o jovem valoriza? Por quê? »» Na sua opinião, a inclusão digital está avançando no Brasil?


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A violência

1. ATIVIDADES DE LEITURA O primeiro texto que você vai ler foi publicado no Jornal do Brasil, em 24/05/2003. Leia-o atentamente para responder às questões seguintes.

A violência Leandro Konder Bertolt Brecht já se perguntava por que chamamos de violento um rio que na época das chuvas enche demais e transborda, provocando uma enchente, e por que não prestamos atenção a violência das margens, que impõem ao rio a obrigação de ficar limitado permanentemente ao seu leito, a um caminho predeterminado. A enchente é um momento excepcional, tem efeitos imediatos que nos causam forte impressão. A transformação do leito do rio num cárcere, por obra e graça de suas margens, é mais discreta, passa por “natural”. O que se repete, o que perdura, o que se incorpora à aparente “normalidade” do movimento da sociedade, não é reconhecido como problemático. Hegel diz isso numa de suas melhores frases: o que é notório, exatamente porque é tido e havido por sabido, não é efetivamente reconhecido. Nos povos pré-históricos, na idade da pedra polida, a representação da realidade se fazia em termos que hoje nos parecem confusos. Os caçadores achavam que se um mágico-pintor conseguisse reproduzir fielmente um animal, esse domínio da forma do bicho lhes daria algum poder sobre o animal real. No entanto, essa mistura da forma do animal real com a forma representada não era uma mistura ilimitadamente válida: os caçadores neolíticos sabiam que não podiam comer o bicho pintado na pedra e podiam devorar (com gosto) o bicho que ficava na

floresta. E sabiam, também, que havia uma diferença entre o golpe da lança real que estava na mão deles e o golpe da lança pintada no teto da gruta. Isso quer dizer que, desde os tempos da pedra polida (e provavelmente desde os tempos da pedra lascada), os nossos antepassados já eram bastante complicados e divididos. E ao menos um lado deles já distinguia entre modos diversos da violência: a violência da caçada na vida e a da caçada representada pelo mágico-pintor. De lá para cá, as distorções ideológicas na construção do conhecimento se agravaram e se tornaram mais sutis. Essa pode ter sido uma das causas das atuais abordagens do fenômeno da violência. O homem contemporâneo sabe que são diferentes as violências que ele vê na tela do cinema e aquela que ele vê em frente de casa, ameaçando sua família. Mas nem sempre a distinção é clara: às vezes somos tão confusos como os nossos antepassados neolíticos. A confusão aparece, por exemplo, quando se exagera a influência da violência difundida pela televisão sobre a violência que vem crescendo na nossa vida cotidiana. A influência é inegável, já foi comprovada em pesquisas sérias. Daí a se afirmar que a primeira é causa da segunda, entretanto, vai uma distância considerável: um passo que a meu ver não deve ser dado.


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Na verdade, essa onda de violência que tanto nos angustia tem várias matrizes, diversos geradores. As causas interferem umas nas outras. As frustrações, a multiplicação dos ódios, a agressividade crescente, as mágoas, as manifestações de medo e desespero estão espalhadas por toda parte e se alimentam de estímulos culturais, mas se alimentam sobretudo das experiências vividas pelas pessoas na realidade material, na vida pratica da sociedade, tal como está organizada. A crise atual tem a ver com distorções culturais, deformações políticas, perversões éticas, porém nenhuma análise dela pode se aprofundar sem se defrontar com os problemas derivados da economia. A economia, não devemos esquecer, é uma esfera na qual os homens fazem escolhas, tomam decisões. Existem alternativas: o econômico não pode ser considerado um quadro tão inevitável como se fosse “natural”. E, tal como o vemos hoje, é um quadro muito insalubre, que dificulta muito qualquer esforço para reduzir os índices de violência.

Altos índices de desemprego, por exemplo, geram violência. Extrema desigualdade social, abismo crescente entre ricos e pobres, exagerada concentração de renda também geram violência. Casos de corrupção em altas esferas, ao permanecerem impunes, criam tensões e impulsos de revolta (ou cinismo) que constituem um caldo de cultura propício a violência. A violência, como já foi dito, cresce em função de muitas causas. Mas as causas econômicas - que, afinal, são fundamentais - deviam merecer uma atenção muito especial, tanto por parte da mídia como por parte do governo. E o que se vê é uma certa fraqueza da presença das desgraças estruturais da nossa economia nas grandes discussões a respeito da violência.

ATIVIDADES DE LEITURA 1. O principal objetivo do texto de Leandro Konder é: a) discutir soluções para o problema da violência na sociedade brasileira. b) discutir as causas da violência na sociedade brasileira. c) discutir a influência da violência difundida pela televisão sobre o comportamento dos brasileiros. d) discutir as ideias de Bertolt Brecht sobre a violência. 2. Numere os parágrafos do texto. Em seguida, indique: 2.1. Em que parágrafos o autor enumera as causas da violência?

2.2. Em que parágrafos o autor discute a influência da violência da televisão no comportamento cotidiano?

3. Para o autor, qual é a principal causa da violência que cresce entre nós?

4. Que outras causas são apontadas para a violência?


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5. Releia: “A confusão aparece, por exemplo, quando se exagera a influência da violência difundida pela televisão sobre a violência que vem crescendo em nossa vida cotidiana. A influência é inegável, já foi comprovada em pesquisas sérias. Daí a se afirmar que a primeira é causa da segunda, entretanto, vai uma distância considerável(...)”

5.1. A que se refere a expressão “a primeira”?

5.2. A que se refere a expressão “a segunda”?

5.3. Na sua opinião, a violência da televisão pode ser uma causa da violência que vemos no nosso dia-a-dia?

5.4. O que o autor Leandro Konder pensa sobre isso?

6. Releia os dois primeiros parágrafos do texto. O que a imagem do rio que transborda tem a ver com a argumentação do autor?

Leia agora um outro texto sobre o mesmo tema, escrito pelo educador Luis Carlos de Menezes. Este texto foi publicado em 10/04/2007, época em que os meios de comunicação brasileiros discutiam intensamente a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos.


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A violência e os jovens que não estão na escola Fala-se muito em diminuir a maioridade penal, mas a verdadeira questão que se coloca para o país é aumentar a “maioridade educacional” Crimes brutais envolvendo jovens, sua repercussão na mídia e as discussões no Congresso mostram, há semanas, nossa sociedade se preparando para se proteger de seus jovens, não para protegê-los. Aceita-se com naturalidade um mundo em que criança não é esperança, é problema. Se parece exagero, conto três episódios que vivi recentemente: Terça-feira, 13 horas, restaurante universitário. Um colega diz: “Não importa a idade. Envolveu-se em crime? Cadeia!” Outro responde: “Vai se aperfeiçoar no crime, nas cadeias que temos...” O primeiro replica: “Será mais negócio mandar pras escolas que temos?” Afasto-me. Se cadeia e escola não são “negócio”, nessa conversa entre acadêmicos alguém pode chegar a propor a pena capital... Quinta-feira, 16 horas, rua de comércio. Dormindo na calçada, um menino “atrapalhando o tráfego”. Tento falar com ele e alguém me adverte: “Não perca tempo. Ele ta chapadão de crack!” Pergunto: “Um policial não poderia levá-lo a um hospital?” O comerciante responde: “Passou um agorinha e nem ligou. Tem dúzias deles largados assim aqui, no centro”. Sigo em frente, buscando conserto para um velho computador... Sexta-feira, 18h30, semáforo. Só vejo as mãos dela, vendendo balas. A cabeça não alcança o vidro do carro. Lembro da notícia do bebê abandonado, mas penso que, se a criança já sabe andar na rua, isso não nos choca nem é notícia. Abre o sinal e sigo. Pelo retrovisor, vejo a menina driblando os automóveis... Bertolt Brecht, em seu teatro pedagógico, propõe que não nos emocionemos, mas pensemos. Só que aqui nem é teatro. Sou eu, cúmplice dessa cidade que abandona suas crias. O Brasil não é só isso, e sei de muitos lugares que nem fazem ideia do inferno das metrópoles, mas as notícias envolvem todos e discutir as soluções também. Discutamos, pois. No debate sobre se é mais barato prevenir ou remediar, ouve-se que cada presidiário custa por mês mais do que dez alunos na escola e que

cada menor infrator confinado custa mais do que 20 crianças na escola. E se cadeia não adianta e preso é tão caro, há quem diga que pena de morte barateia... Não é preciso ser jurista para se chocar. Todos sabemos que preso é responsabilidade do Estado, a qualquer custo. Mas criança na escola não é responsabilidade do Estado? E a que custo? Um décimo do que gastamos com os presos e um vigésimo do que custa um infrator? Há milhões de jovens sem trabalho, escola e vida social decentes - entre eles, milhares de crianças de rua e outras tantas viciadas, prostituídas ou envolvidas com a contravenção e o crime. Cuidar desses últimos é essencial, mas sem solução para os demais equivale a enxugar gelo... Como é impossível arranjar de repente ocupação para milhões (ainda mais milhões que não completaram a escola básica), mais urgente do que discutir a maioridade penal é aumentar a maioridade educacional, com formação geral ou profissional mais vida cultural, música, esportes etc. Porém quem cuidará disso? Assim como para evitar crimes as leis são importantes, mas não bastam, é preciso olhar cada criança como responsabilidade nossa e “desnaturalizar” a miséria. Se no lugar do menino largado na rua estivesse eu caído, com óculos e computador portátil, em minutos seria socorrido. Mas um menino drogado, descalço, traz menos riscos dormindo no chão do que em pé... Como aconselha Brecht, não é para se emocionar, é para pensar.

“Nossa sociedade está se preparando para se proteger de seus jovens, não para protegê-los. Como disse Brecht, não é de emocionar, é para pensar.” LUIS CARLOS DE MENEZES é físico e educador da Universidade de São Paulo e sabe que não se resolve a violência só com Educação, mas que sem Educação não se resolve nada. http://revistaescola.abril.com.br/edicoes/0201/aberto/mt_221039. shtml


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1. Observe que o título do texto expressa uma relação de causa e consequência. Explique o título.

2. Releia: “Crimes brutais envolvendo jovens, sua repercussão na mídia e as discussões no congresso mostram, há semanas, nossa sociedade se preparando para se proteger de seus jovens, não para protegê-los.”

Explique, com suas palavras, a frase grifada acima.

3. O texto 2 foi escrito numa época em que se discutia, no Brasil, a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. O que pensa o autor a respeito desse assunto? Destaque, no texto, frases que correspondem à tese do autor.

4. Nos parágrafos 2, 3 e 4, o autor relata três episódios que ele viveu. Qual é a função desses relatos no texto?

5. Releia: “Bertolt Brecht, em seu teatro pedagógico, propõe que não nos emocionemos, mas pensemos.” Por que o autor cita Brecht?

6. Releia o período abaixo, retirado do 5° parágrafo: “O Brasil não é só isso, e sei de muitos lugares que nem fazem ideia do inferno das metrópoles, mas as notícias envolvem todos e discutir as soluções também. Discutamos, pois.

O conector negritado acima tem o mesmo sentido que: a) porém. b) portanto. c) porque. d) no entanto.


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7. Releia: “Todos sabemos que preso é responsabilidade do Estado, a qualquer custo. Mas crianças na escola não é responsabilidade do estado? E a que custo? Um décimo do que gastamos com os presos e um vigésimo do que custa um infrator.”

O trecho destacado é um argumento no texto. Por quê?

8. Para o autor, qual é a melhor solução para o problema do envolvimento do jovem com a criminalidade?

ATIVIDADE ORAL Vamos conversar sobre os dois textos lidos. Compare-os. Em que eles concordam. Você observa mais semelhanças ou diferenças entre as argumentações lidas? Dê sua opinião sobre o tema em discussão.


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Drogas e violência

1. ATIVIDADES DE LEITURA Nesta oficina, vamos ler outros dois textos argumentativos que discutem o tema da “violência” e sua relação com as drogas. O texto abaixo foi publicado no jornal O Globo, em maio de 2002. Leia-o atentamente, para responder às questões que se seguem.

Aos jovens do Rio de Janeiro Alba Zaluar

O

negócio ilegal, baseado em intimidação, extorsão e terror, opera em redes. São múltiplas as fraturas em comandos, quadrilhas, bondes, justiceiros e pistoleiros. Por detrás, pouco investigado e punido, o capitalismo das sombras que opera no mercado das armas e drogas, misturando o legal e o ilegal, a polícia e o bandido. Ele é transnacional, como o terror que o preside. Diante disso, é prioritário impedir que se destrua o estado de direito. Qualquer intervenção deve ser feita dentro da lei, de modo a evitar um dos seus efeitos mais perversos: a confusão entre polícia e bandido. Por isso, escrevi para os jovens, apostando que a razão pode impedir que, no desespero, se afundem mais na barbárie. Um dos argumentos mais repetidos para os jovens pobres é o de que vender drogas é um bom negócio, pois paga melhor que o emprego e dá para sair da pobreza. Dizem que otário é quem trabalha por salário. O que não se diz é que este negócio deixa a vida no fio; que o dinheiro que entra fácil sai fácil; que o vício pode pegar; que a guerra entre comandos se torna interminável e as armas, caras; que são grandes os prejuízos para todos.

Quando um jovem começa a se envolver com as quadrilhas, adota o modo de viver dela. Tem que gastar mais com roupas, festas, mulheres, drogas para mostrar que está com o bolso cheio. Assim ele pretende ser aceito entre os outros homens que agem igual. Impressiona e mete medo. Por pouco tempo. Tem que comprar armas e munições; pagar propinas a policiais corruptos que podem prendê-lo mais facilmente; pagar advogados para defendê-lo. Acaba duro, preso ou morto. Jovens se aproximam da boca procurando “consideração”; porque acham bacana usar drogas ilegais; porque os colegas chamaram. Pensam que nunca serão prisioneiros nem das drogas nem das quadrilhas. Mas cocaína pode viciar de 30% a 40% dos que a usam. A sensação de estarem ligados que ela traz é seguida pela fossa depois que o efeito some. Sentem a fissura de usar para ficarem “a mil” de novo. Caem num círculo vicioso. Uns começam a repassar drogas para pagar o vício; outros, a usá-las quando viram traficantes. Se vendem sem permissão, podem ser mortos. Se ganharem muito, mesmo com permissão, atraem a desconfiança e a cobiça dos poderosos. A cocaína pode fazê-los paranóicos, cercados de inimigos imaginários. Depois que se envolvem, têm que obedecer às ordens dos chefes. Sair fica cada vez mais difícil.


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Quando é considerado e entra para a quadrilha, o jovem vira inimigo dos inimigos da quadrilha e tem que andar armado. Por ser jovem e se recebeu treino militar, é obrigado a fazer parte do “bonde” para defender a “boca” do chefe ou o “morro” do comando. Os comandos estão sempre em guerra, que parece não ter fim. A probabilidade de morrer é enorme, mas a guerra também atinge quem não tem nada a ver, mesmo quando policiais invadem favelas para prender bandidos. Como a menina que chega ao portão quando eles trocam tiros. Os amigos e colegas desaparecem. Todas as mães choram. Todos têm medo. O lugar fica sinistro. A vida na comunidade pobre, mais dura ainda. A guerra está destruindo comunidades e bairros da cidade. Quando as pessoas têm medo, elas se trancam em casa e não querem mais participar das diversões, das reuniões, das festas. As armas vão parar nas mãos de quem nunca as viu antes, de meninos que começam a usá-las para fazer “onda” e acabam assassinando gente. As ruas ficam vazias. Muitos vão embora dos locais onde nasceram e viveram a maior parte de suas vidas. Os que não conseguem, vivem aterrorizados. Nas favelas, famílias inteiras tentam se proteger dos tiroteios embaixo da cama, dentro de casa. As paredes são finas demais para os tiros. Como a violência e a cobiça são contagiosas, pessoas inocentes são roubadas, espancadas, torturadas e assassinadas. O empregado de loja que vai entregar mercadoria em favela de comando deferente da sua é morto se for reconhecido. Escolas, postos de saúde, quadras de

esporte e vilas olímpicas têm que ser fechados por causa da guerra. Professores, médicos, enfermeiros, treinadores são ameaçados no seu trabalho. Jovens armados querem dar ordens a eles. Crianças e jovens ficam sem escola e sem lazer. Doentes, sem médico. Com tanto estresse, doenças cardíacas crescem muito entre moradores e funcionários desses centros, construídos e mantidos com os impostos pagos por todos. Muitas das vítimas da guerra e do estresse terminam em hospitais. Os custos hospitalares aumentaram várias vezes desde que a guerra de quadrilhas começou no final dos anos 70. Os custos no sistema de Justiça, idem! Mais verbas foram dadas às polícias, mais prisões construídas, mais vagas criadas para juizes e promotores. No final, todos — pobres, remediados e ricos — pagam a conta da ambição desmesurada de poucos. A guerra apenas serve para fazer mais ricos os ‘’donos’ dos morros, mas sobretudo os traficantes e lavadores de dinheiro sujo que moram longe, gozando do lucro obtido nessa guerra. Otário é o jovem que se arrisca repassando drogas, pegando em armas para formar o bonde, enriquecendo quem ele nunca viu. Esperto é quem se une para melhorar a vida e defende os equipamentos públicos que dão aos jovens pobres melhores oportunidades de trabalho. Sem ter a vida por um fio.

O GLOBO, domingo, 26 de maio de 2002

ATIVIDADE DE LEITURA 1. O objetivo desse texto de opinião é: a) descrever a guerra provocada pelo narcotráfico na cidade do Rio de Janeiro. b) propor soluções para o combate aos narcotraficantes que atuam em algumas comunidades do Rio. c) alertar os jovens do Rio de Janeiro sobre os riscos de entrarem para o narcotráfico. d) argumentar que a cocaína pode viciar.


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2. Normalmente, os títulos remetem ao assunto do texto. Entretanto, o título escolhido por Alba Zaluar não nos oferece informação alguma sobre o tema discutido no texto. Na sua opinião, com que intenção a autora intitulou seu texto “Aos jovens do Rio de Janeiro”?

3. Todo texto argumentativo está voltado para a discussão de um problema que merece ser debatido. Que problema motivou a autora a escrever seu texto?

4. O texto lido é uma contra-argumentação. Contra-argumentar é argumentar para combater uma opinião com a qual não concordamos. Em outras palavras, ao contra- argumentarmos, estamos derrubando uma outra opinião, uma opinião que não está de acordo com o nosso modo de pensar. Releia com atenção o 2° parágrafo do texto e retire dele a opinião com a qual a autora não concorda.

5. Agora releia o último parágrafo do texto. Retire dele o posicionamento da autora, sua contra-argumentação.

6. Retire, também do 2° parágrafo, os argumentos que a autora utiliza para rebater a opinião de que “Vender drogas é um ótimo negócio”.

7. Com os argumentos destacados na questão acima, a autora tenta convencer os jovens a não entrar no narcotráfico. Observe que a autora reforça esses argumentos ao longo do texto. Grife no texto trechos que reforçam cada um dos argumentos. Para fazer as marcações em seu texto, considere a numeração do quadro abaixo: Argumentos para convencer os jovens a não entrar no narcotráfico: 1- Quem entra no narcotráfico corre sério risco de morrer. 2- Entrar no narcotráfico não dá dinheiro. 3- Quem entra no narcotráfico pode ficar prisioneiro do vício. 4- Ao entrar no narcotráfico o jovem acaba contribuindo para transformar a vida de sua comunidade numa verdadeira guerra.


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8. Releia, atentamente: “Jovens se aproximam da boca procurando “consideração”; porque acham bacana usar drogas ilegais; porque os colegas chamaram. Pensam que nunca serão prisioneiros nem das drogas nem das quadrilhas. Mas a cocaína pode viciar de 30% a 40% dos que a usam. A sensação de estarem ligados que ela traz é seguida pela fossa depois que o efeito some.”

8.1. Qual é o sentido da palavra “consideração” no fragmento em destaque?

8.2. Qual é o sentido e a função da palavra “mas” no fragmento em destaque?

9. Releia: “A guerra está destruindo comunidades e bairros da cidade.” A frase em destaque contém uma metáfora. 9.1. Explique essa metáfora.

9.2. Retire do texto pelo menos duas evidências de que o narcotráfico pode ser comparado a uma guerra.

10. Releia: “Esperto é quem se une para melhorar a vida e defende os equipamentos públicos que dão aos jovens pobres melhores oportunidades de trabalho. Sem ter a vida por um fio.”

10.1. A que se refere a expressão equipamentos públicos em destaque acima?

10.2. No quadro acima também há uma metáfora. Identifique-a e explique seu significado.


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O texto abaixo, publicado no Jornal do Brasil, em 24 de maio de 2003, também discute o tema das drogas. Leia-o atentamente antes responder as questões. JORNAL DO BRASIL

SÁBADO, 24 DE MAIO DE 2003

Liberar não resolve PEDRO DO COUTTO JORNALISTA

R

ecentemente, o senador Como se poderia se vê quase todos os dias. UTIS são instaladas da forma mais precária, Jefferson Peres, um político permitir a venda até nos corredores dos hospitais. respeitável, admitiu a hipótese de ser melhor a lei brasileira liberar o aberta de drogas? Ainda sobrecarregá-los com mais um encargo enorme? É simplesmente uso de certas drogas como forma não só de combater o próprio vício, mas também de conter impossível. Não só no Brasil, mas em qualquer ou reduzir a corrupção que atinge parte do aparelho país. Não funciona. Liberar, no fundo, é agravar o policial e a que ocorre em aeroportos, fronteiras, problema, já por si gravíssimo. Isso de um lado. portos e rodovias, áreas através das quais ingressam De outro, recorrendo-se à lógica, verifica-se que, no país tóxicos, armas e munições que abastecem os além do aspecto médico, em primeiro lugar, o crime criminosos. O parlamentar do Amazonas, embora de e o tipo de corrupção que produz não vão acabar só boa-fé, cometeu um equívoco que, se colocado em pelo fato de que a legislação seria extremamente prática, acarretaria problemas ainda maiores do que liberal. Os que atuam fora da lei encontram sempre os já causados pelo consumo de entorpecentes. diversos meios para manter sua atividade. Em Ora, se existem medicamentos de venda controlada, segundo lugar, a liberação teria de ser acompanhada que exigem retenção da receita, e cujas dosagens de autorização, por parte do poder público, para um variam a critério médico, como se poderia permitir novo comércio. Como seriam licenciados e montados a venda aberta de drogas, deixando a dosagem os postos de venda? Teriam de pagar impostos. Em à vontade do usuário? Lembra o médico Pedro terceiro lugar, como poderia ser feita a fiscalização? Campelo, psiquiatra, que o efeito de um remédio Em quarto lugar, pelo volume de vendas, haveria ou de um tóxico não é igual para todas as pessoas. necessidade de esquemas especiais de segurança, Há reações diversas quanto aos tóxicos, umas os quais acrescentariam um panorama dramático a pessoas são mais vulneráveis do que outras. E se mais nos centros urbanos, a começar pela cidade o efeito de um remédio varia pela dosagem e pela do Rio de Janeiro. Os atuais revendedores ilegais pessoa a que se destina, quanto mais o das drogas seriam mantidos ou substituídos por indicação que andam por aí. Comparando-se os reflexos dos de que setor? Neste segundo caso, o conflito se medicamentos necessários com o dos tóxicos, é agravaria profundamente. importante reconhecer que, no caso da liberação O fato é que boa vontade e boa-fé não são suficientes destes, teria de haver não só aconselhamento como para mudar a realidade, transformando-a, em acompanhamento clínico. Mas a questão também passe de mágica, numa situação ideal. E quais não termina aí. Até porque o objetivo não é o de seriam os preços cobrados, ou a distribuição seria manter as pessoas praticando tal consumo, para paga pelo governo? Se programas que incluem assim diminuir a corrupção e a violência. Criar a distribuição de qualquer coisa exigem custos uma estrutura administrativa de acompanhamento administrativos altos, imagine-se a distribuição de médico, que teria de resultar em diversos tóxicos. Não é possível. Quem parar para pensar receituários, torna o projeto inexequível. Os serviços chegará a essa conclusão. brasileiros de saúde pública já são deficientes, como


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ATIVIDADES DE LEITURA 1. O texto “Liberar não resolve” também é um texto contra-argumentativo. Ao defender sua opinião sobre a liberação das drogas no Brasil, o autor contesta uma outra opinião. De quem o autor discorda?

2. Qual é a tese e os argumentos defendidos pelo senador Jefferson Peres?

3. Qual é a tese do autor do texto?

4. Como o autor do texto rebate a argumentação do senador Jefferson Peres?

5. Para sustentar sua tese, o autor Pedro do Couto utiliza dois conjuntos de argumentos. 5.1. Em que parágrafos estão os argumentos?

5.2. Identifique o primeiro conjunto de argumentos.

5.3. Identifique o segundo conjunto de argumentos.

6. Observe que o autor utiliza muitas perguntas em sua argumentação. Considere as perguntas abaixo, retiradas do parágrafo 3. “Como seriam licenciados e montados os postos de venda? Teriam que pagar impostos” “Como poderia ser feita a fiscalização?” “Os atuais revendedores ilegais seriam mantidos ou substituídos por indicação de outro setor?”

6.1. Qual seria a função das perguntas acima?


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6.2. Qual é o tempo verbal grifado nas frases acima?

6.3. Por que esse tempo verbal aparece tantas vezes no texto?

7. Qual é a função desta outra pergunta que aparece no texto? “Como se poderia permitir a venda aberta de drogas, deixando a dosagem à vontade do usuário?” (2° parágrafo)

8. Para fortalecer sua argumentação, o autor do texto utiliza um “argumento de autoridade”. Usamos argumentos de autoridade quando citamos um especialista no assunto sobre o qual estamos argumentando. Identifique no texto um argumento de autoridade.

VAMOS ESCREVER Nas duas últimas oficinas, discutimos um grave problema social brasileiro: a violência urbana e sua associação com o uso e o tráfico de drogas. Vamos, agora, escrever sobre o assunto. »» Como a violência manifesta-se entre nós? »» Como esse problema tem afetado a juventude? »» O que leva (causas) o jovem a envolver-se com a criminalidade e/ou com as drogas? »» O que deveria ser feito para evitar o envolvimento do jovem com o mundo do crime e das drogas?

As perguntas acima servem para ajudar você a pensar sobre o assunto. Planeje sua argumentação organizando os tópicos e parágrafos do texto.





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