Jornal coletivo sÓ - quarta edição, outubro de 2008

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quarta edição, outubro de 2008, distribuição gratuita


EXPEDIENTE: ANDRÉ MAINARDI (comercial, reportagem e textos) CHUCK DEDO AMARELO (arte e comercial) LUCAS RODRIGUES DE CAMPOS (comercial, diagramação, edição, reportagem e textos) TATIANE KLEIN (revisão) As matérias não creditadas são de autoria de André Mainardi e Lucas Rodrigues de Campos Contato: so.contato@gmail.com, 9899-6785, 2218-0796

Abaixo o tédio musical!

assim anunciamos a quarta edição de nosso jornal. Este número desvenda o underground paulistano dos anos 70 através da figura de Edu Viola e da primeira fase do Joelho de Porco. Os sopros de Freddie Hubbard dividem espaço com o arrojo do grupo israelense Ktzat Acheret. Mais uma de nossas coberturas traz a festa de seis anos do Simplão Camping Rock Bar, retiro que abrigou dúzias de malucos e música de qualidade. O especial com o Terreno Baldio relembra o surgimento do grupo e repercurte sua celebrada volta aos palcos. Estendendo o leque cultural do coletivo só, apresentamos uma nova sessão: com só-letrado, indicações e críticas literárias passam a fazer parte de nosso menu. Com um mês de atraso este número foi feito em meio a preocupações diversas, mas o resultado final tem como único intento sepultar os problemas e agradar nossos leitores. Agradecimentos: Amarílis Gibelli, Diógenes Burani (Moto Perpétuo e O Bando), Roberto Lazzarini e João Kurk (Terreno Baldio), Rodolfo Ayres Braga (Joelho de Porco), Shlomo Ydov (Ktzat Acheret), Edu Viola, Marcelo Bacha, Grace Lagôa, André Cristóvam e Fábio Zaganin, Movimento Psicodália, toda turma do Rock da Cantareira, Carlos e Kátia Suarez e aos nossos anunciantes.

ERRATA: Na capa do número anterior, edição e data corretas são “terceira” e “julho de 2008”, respectivamente. Na 11ª página, seção Udigrudi, o nome da banda Saunoflex foi grafado incorretamente.


Eu os vejo rindo, rindo, rindo...

por andré mainardi

Você já ouviu falar de Edu Viola? Os mais de trinta e cinco anos de carreira deste cantor, compositor, liutáio - construtor de instrumentos musicais, escola italiana. - e descendente de índios cariri, se confundem com a história do underground e da vida cultural paulistana. Vale lembrar que compilar, catalogar e levar ao conhecimento de um grande público todo o acervo de Edu seria um desafio homérico até mesmo para pesquisadores experimentados. Eduardo Rodrigues de Oliveira e Silva é de origem humilde. O pai era artesão e a mãe, uma mulher que adorava cantar - que foi amiga de Mário de Andrade, cantou para Villa-Lobos e deu aulas para Milton Nascimento. “Quando eu era menino minha mãe me escolheu pra ser cantor”, conta Edu, explicando que era assim que mestre Mozart recomendava que se fizesse, o aprendiz deveria ser escolhido na mais tenra idade. A falta de

especialização com algum instrumento fez com que ele se lançasse no ofício de liutáio. “São meras ferramentas. Ser cantor me tirou o medo dos instrumentos.” Além de exercer o curioso ofício de inventar e construir instrumentos ele é autor e diretor musical, compõe para cinema e tv. Transita pelos meios musical e o teatral, tendo trabalhado com os maestros Paulo Herculano e Jamil Malufi; diretores como Ademar Guerra, Silney Siqueira e Bibi Ferreira; atores como Sônia Braga, Lima Duarte, Paulo Autran e Tônia Carrero; e músicos como Milton Nascimento, Hermeto Pascoal e Renato Russo.Gravou dezenas de compactos e LPs, conheceu os tropicalistas e se apaixonou pela guitarra elétrica. Lutou contra ditadura enquanto cursava arquitetura na USP, participou da famosa adaptação brasileira do musical Hair, flertou com os roqueiros por influência de Zé Brasil (músico, compositor e baterista do Apokalypsis) e, ainda nos “anos de

chumbo”, tocou guitarra e viola no lendário grupo Sindicato com Ricardo Petraglia e no Alpha Centauri com mestre Dinho Gonçalves, um dos grandes nomes da percussão brasileira. Em 1980 lança seu LP em Brasília “O Direito ao Avesso”, no teatro Galpão. De 1980 a 1985, ainda em Brasília, trabalhou como autor e diretor em vários espetáculos com elenco da cidade: “A Hora e a Vez do Jumento” de Orlando Tejo; “Os Interesses Criados”, de Jacinto Beneventti, “Uma Tragédia Atual”, de Peterson Diesel, e outras duas do mesmo autor: “O Último Rango” e o “Pau do Homem”. Regressa a São Paulo em 1986, dirige o musical “Os Últimos Dias de Robson Crusué”, de Jerome Savari. Funda então, com o maestro Tadeu Passarelli e a arquiteta e artista plástica Lourdes Calheir,o grupo Toda Ópera, oficina permanente de construção de instrumentos musicais e instrumentalização para o teatro, quando promovem um fórum de debates sobre a língua nacional

cantada, dando origem a vários espetáculos e congregando elencos variados: “Bandeira em Pessoa” com Mário nos lábios, ópera “Café” e “Meu Tiête”de Mario de Andrade. Do encontro em 2000 com o poeta Rodolfo de Souza Dantas nasce a oficina Orquestra Mário de Andrade, encontro entre música, poesia e artes plásticas, com dança, em busca da cidadania. Atualmente Edu vive com sua esposa, a irlandesa Maureen e com sua parceira artística Lou Callheiros em uma centenária casa no bairro do Paraíso onde sempre morou e trabalhou; palco de inúmeras farras, ensaios e gravações musicais transformado hoje na Fundação Cultural “Constança Guedes”, em homenagem a sua mãe. Ele ainda continua tocando, compondo músicas e trilhas sonoras, se dedicando a invenção, conserto e restauração de relíquias como a coleção de violas e flautas de Mario de Andrade.


Eu os vejo rindo, rindo, rindo...

Rodávamos calmamente pelas desertas ruas do bairro do Paraíso. O motorista, apocalíptico, com um sorriso malicioso, dissertava acerca da figura do velho amigo. “Hoje vocês estarão entrarão em contato com o que havia de mais underground na São Paulo dos anos setenta”.

Entramos numa travessa qualquer da Rua Tutóia, próxima às instalações do antigo DOICODI, e estacionamos em frente a uma simpática casinha branca de porta, janelas e portões caiados de verde cercada de um pequeno jardim à entrada. “É aqui!”, anunciava, enquanto Edu Viola vinha ao nosso encontro acompanhado de um jovem e de uma mulher. Um homem sexagenário, rosto duro, moreno, marcado e caprino, contornado por barbas e cabelos longos e grisalhados. Nos cumprimentou timidamente pondo à mostra seus dentes amarelados por longos anos de militância tabagista. Trazia uma viola battenda debaixo do braço e nos convidou a entrar juntamente com seus dois acompanhantes. Adentramos uma pequena sala adornada de candelabros, velhas estantes abarrotadas de imagens de santos, adereços e amuletos indígenas além de toda a sorte de instrumentos musicais. Velhas violas e rabecas, cor de moldura de quadros antigos, guitarras elétricas, berimbaus e flautas de todos os tipos e tamanhos empilhados à entrada e por toda sala em estrados e móveis de anamórfica irregularidade. Do lado esquerdo, tínhamos o corredor com dois cômodos à direita, provavelmente uma oficina, um quarto de dormir e um banheirinho o qual, por alguma misteriosa razão, fomos admoestados a “não trancar por dentro” ao usar. Tal corredor nos levava à

vetusta cozinha semelhante a uma verdadeira tenda indígena. Uma grande mesa de madeira ao centro e cada vez mais objetos antigos e instrumentos musicais ímpares entulhados em uma confusão de cores e poeira temperadas com um forte odor de pimenta, incenso indiano, café torrado e adocicado aroma que indicava o uso recente de la yierba buena. Nosso anfitrião nos jogava às mãos tutti quanti e ia contando a história de cada um daqueles cacarecos. — coisas curiosas como revistas dos anos vinte, baionetas e capacetes da datados da Revolução Cons-titucionalista, flâmulas da FEB e instrumentos de sua própria invenção, como a fantástica Violétrica, uma espécie de guitarra elétrica com braço de viola caipira adaptado, que ele utilizava nos tempos do Alpha Centauri. Café passado...Let’s roll another joint! Começava a noitada na casa do Edu Viola. Cabeças feitas a rolar na névoa das intensas fumigações, um maço de folhas secas pendia mumificado, da abóbada do recinto, oscilando levemente à brisa da noite, ao fosco clarão de uma só lampada elétrica ou de muitas ou de nenhuma. Ao centro diante da mesa Edu, na presença de nós roqueiros, atacava seus velhos rocks dedilhando com um cão danado, um violão Del Vecchio dos anos quarenta e balbuciando sem cessar, como um rabino velho a murmurar de forma blasfêmica os setenta e dois nomes de Deus. Melodias em harmonias modais, causos sobre espíritos antigos, guerreiros atemporais marchando para fora do plano astral invadindo nossas Trompas de Eustáquio.


só-letrado a estante do coletivo Dois registros diferentes e marcantes para a história socialista. do ascenso vitorioso em 1917, à megalomonia stalinista. Serge e Steinbeck desmistificam a idéia do “terror comunista” e, com relatos verídicos, expõem feridas, reconhecendo as virtudes do sistema. O Ano 1 da Revolução Russa Um diário Russo

Victor Serge, Boitempo

John Steinbeck e Robert Capa, Cosac Naify

andré mainardi

Longe de ser brilhante como As Vinhas da Ira de Steinbeck e muito menos de trazer as melhores chapas fotográficas de Capa, o livro, como sugere o título, é o retrato preciso da viagem destes dois intrépidos correspondentes do Herald Tribune, de New York, pela URSS do pós-guerra. Em quarenta dias percorreram a fria e neurótica capital Moscow, Leningrado, Stalingrado − devastadas pela fúria insana dos nazistas −, regiões agrícolas da Ucrânia e pela ensolarada Georgia, terra natal do ditador Stálin. Mantendo cautelosa distância do Krêmlin, dos militares e da política internacional, o olhar clínico e imparcial do autor é lançado sobre o povo soviético comum, esmiuçando seus dramas, glórias, esperanças e sua ancestral desconfiança com estrangeiros e câmeras fotográficas, apesar da cortês hospitalidade. Escrita em tom ameno, a reportagem traz a sinistra exuberância das fotos de Robert Capa, um dos maiores fotojornalístas do século XX. Jonh Steinbeck publicou dezenas de reportagens, ensaios e romances entre eles Tortilla Flat de 1935 e In a Dubbious Battle de 1943, morreu em 1968, seis anos depois de ser agraciado com o prêmio Nobel de literatura. Capa lançou cinco livros de fotoreportagem, em sua maioria fotos das guerras que cobriu. Morreu ainda jovem, vítima de uma mina terrestre, enquanto registrava o confronto na Indochina Francesa em 1952.

lucas rodrigues de campos

Como de costume, a Boitempo Editorial lança mais um livro que caracteriza uma vocação: O debate sobre os rumos da Esquerda em cima da recuperação de fatos e teorias vitais sem deixar de lado a contemporaneidade do tema. A última empreitada da editora é a publicação de uma obra inédita de Victor Serge no Brasil sobre “O ano 1 da Revolução Russa”, relato vivaz do fato político de maior impacto do século XX. Serge, um dos militantes preteridos pela história vermelha, consegue transportar o leitor para as praças russas com narrativas emotivas e aliadas a uma escrita mais crítica - ao tratar das disputas e polêmicas que marcaram a ascensão do regime soviético, notado, entre outros, nos relatos sobre a Constituinte. De editor do jornal Anarchie e cárcere acusado de instigar ações de uma quadrilha a secretário da Internacional Comunista, o autor fez o curso exemplar de um revolucionário, adquirindo uma formação baseada no anarquismo. A herança dos tempos em que militou ligado a esta teoria política, por vezes, trazia indagações. Mas ao pisar no solo de lutas de 1919, teve a percepção de que o partido bolchevique respondia aos anseios do proletariado, fortalecendo a crença no sucesso da revolução. Sempre leal às suas idéias, Serge não se deixou abater nem pela euforia de entusiastas como Trotski, nem pelo

pessimismo daqueles que romperam com a estratégia socialista. A sobriedade dos relatos, apoiados em documentos recuperados, e o tato com as palavras mantêm o já natural tom épico de alguns episódios da Revolução Russa; mas estes episódios não perdem a veracidade ou o peso histórico. É assim que o autor consegue pintar o quadro, em suas próprias palavras, “verídico, vivo e racional” que compreende os anos entre a tomada do Palácio de Inverno e a expansão da revolução para o centro europeu, período de maior êxito dos proletários na busca da constituição de uma nova sociedade. O Ano 1 constitui um trabalho árduo de pesquisa, que se alimentou não somente dos debates políticos: procura retratar o nascimento de uma nova dinâmica do cotidiano, por isso o autor reserva espaço para trazer à tona a casa, a educação, a cultura do revolucionário. Esse esforço surge diante da importância em que se coloca a insurreição do proletário russo naquele Outubro e sua organização posterior, período fundamental para o desenvolvimento do corpo soviético e subsídio para quem pretende compreender os dilemas do socialismo. Resignado e profundamente preocupado com os traços totalitários do governo de Stalin, Victor Serge, ao escrever este livro em 1930, sentia a necessidade de fazer uma historiografia proletária capaz de “mostrar a maneira como os que fizeram a revolução a entendiam e a entendem ainda hoje”; Uma tentativa de recuperar o corpo então dominado por uma cabeça contraditória, que sufocou qualquer possibilidade de um regime democrático na URSS, capaz de tentar apagar da história nomes fundamentais para o estabelecimento do processo revolucionário.


O Rock Matreiro do Joelho de Porco A Pompéia deveria ser tombada como patrimônio histórico-cultural da cidade de São Paulo. Do grande centro difusor do rock paulistano, emergiram Os Mutantes, Made in Brazil e Tutti-Frutti. Oswaldo Vecchioni conta que era raro uma “garagem não-eletrificada”; Um simples passeio pelo bairro denunciava a devoção roqueira e o amor pelas guitarras elétricas. Rodolfo Ayres Braga, mais um grande fanático pelas seis cordas, optou pelo contrabaixo diante da falta de instrumentistas desse ofício, quando fundou, com Daniel Raar, o conjunto Os

Febris, em1967, ano em que o iê iê iê dominava as rádios e a cultura juvenil. Mais maduro, em 1972, Rodolfo apostou em uma sonoridade mais pesada: Islanders – pré Terreno Baldio com Lazzarini e Kurk, ( ver matéria nesta edição) – e US-Mail, com o vocalista Percy Weiss. Do rock quente às primeiras joelhadas Ponto de encontro de músicos e aficionados por som, a loja Bip Bip, importadora que se transformou na renomada Transasom, foi palco do primeiro encontro entre o batera Próspero Albanese e Rodolfo, então representante comercial da loja, responsável por vender equipamento para os lendários grupos Blow Up e Stillus Set. Uma boa conversa e a paixão por rock pesado ligou rapidamente os dois músicos. Estava armado o lance do Hot Rock que tinha como proposta um som a la Cream. As guitarras ficaram a cargo de Carlos Alberto Bogossiam, “O Bogô” dos Beatnicks, banda que gravou um compacto em 1968. A breve história do Hot Rock se resumiu a alguns ensaios e uma histórica apresentação no TUCA – dividindo o tablado com o Mona de Fábio Gasparini e o exótico Makku Shark – que teve como atração a mais, o extravagante e pomposo visual dos caras, fiel retrato da época. A saída de Bogô pôs fim a banda e abriu espaço para o surgimento do primeiro Joelho, com Conrado Ruiz, multi-instrumentista amigo de Albanese ao piano e Gerson Tatini, declarado fã do Yes (Moto Perpétuo, mentor da banda-tributo Yessongs), como solista. Um parêntese deve ser reservado para Tico Terpins, figura ímpar, letrista de alma rebelde “sujeito que aparentava muita

experiência apesar da pouca idade”, lembra El Captain Braga. Jucalemão; A taverna recebia periodicamente a faminta turma de Próspero, a procura do Einsbein, receita germânica a base de joelho de porco. O baterista recordou o nome do prato, às pressas, antes de subir ao palco com um grupinho nos tempos de colegial. O desbundado nome casava perfeitamente com o recém nascido projeto. Em ritmo alucinante, a banda começou suas atividades; “Oito ensaios por semana” segundo Rodolfo. Com as bases do novo time prontas, Tatini consegue esquematizar com o selo Sinter, subdivisão ligada à Phonogram, a gravação de um compacto simples.

após o lançamento oficial do disco sete polegadas, no programa televisivo Almoço com as Estrelas, Tatini, cada vez mais fissurado em Chris Squire e cansado da guitarra, abandona o grupo. A entrada de Mozart Mello chegou a ser ventilada, mas quem ficou com o cargo foi o lendário Walter Baillot, in memorian, que acompanharia o Joelho na sua fase de maior sucesso comercial. Com o Joelho na estrada

O gás novo oferecido pelos riffs de Waltão fez rapidamente o Joelho cair na estrada. Com esta formação, participaram, com Os Mutantes, do festival Primeira Colher de Chá em Cambe, homérica “maconhada” onde a Repressão baixou, mas não teve meios para prender tanta gente. Ainda marcaram presença na Rádio Clube de Arnaldo e Nona Sinfônia Santos, fizeram uma curta temporada no Teatro Brasileiro de Comédia e, junto com o grupo Ao contrário do que reza a lenda, Arnaldo Kapta e Tony Ozana, tocaram em um histórico Baptista não produziu esse primeiro registro festival no estádio Moringão, em Londrina. do Joelho de Porco; Presente no estúdio Scat- “Teve também um show com Os Mutantes e ena durante a sessão, o mutante chapadão, par- Sá, Rodrix e Guarabyra na Vila Belmiro, estádio do Santos FC. ticipou da gravação e o Não chegamos a totempo todo foi vítima car porque não dedas gozações do gruixaram a gente usar po. “Ele era um bom o PA que era dos sujeito... Bem intencioMutantes. Ficamos nado. Apoiou bastante bem chateados seria a gente naqueles temuma ótima oporpos”. Com o cabelo tunidade pra nós”, bicolor e em profunlamenta Rodolfo. das viagens lisérgicas A agitada vida na Arnaldo viu suas inestrada começou a tenções transmutaremgerar conflitos que se em engodo; Sua culminaram com a divertida participação saída de Conrado resumiu-se à execução e a decisão de Rodo tema principal da dolfo de partir para Nona de Beethovem New Orleans no fiao final de “Fly Amérinal de 1973, pondo ca”, atacada num gifim à primeira fase gantesco sintetizador de um dos princiHarpschord, especial Tico Terpins e Rodolfo pais grupos do rock para estudos de Música Eletrônica. A toccata foi encerrada com um tupiniquim. Os sobreviventes, Rodolfo, Conbend e com o inevitável “apagão” do músico, rado e Próspero, atualmente, mantêm constante que capotou no assoalho do estúdio. O lado contato e cultivam esperanças de encontrarem B do disquinho foi preenchido com “Se você espaço nas suas muitas ocupações para uma vai de Xaxado, Eu vou de Rock’n’Roll”. Logo possível reunião do Joelho de Porco.


câmara

de

eco

Ktzat Acheret Nonames Isradisc - 1974

Shlomo Gronich: Piano, Fender Rhodes, Orgão Hammond, Mellotron, percussão, vozes e arranjo de cordas. Shem Tov Levy: Flautas, piano, bateria, percussão, vozes e aranjos de corda. Shlomo Ydov: Violões (folk e clássico), guitarras, contrabaixo, percussão, vozes e arranjos de corda. andré mainardi

Através dos 70, o fenômeno Sgt. Peppers ainda ditava regras no cenário pop ao redor do globo. Servindo-se de alucinógenos, contracultura e da receita “georgemartiana” – mesclar rock’n’roll, Erudito a elementos da música e cultura locais – jovens do mundo inteiro construíram a história da música que marcou a década. Foi assim aqui no Brasil, com a Tropicália, na Alemanha, com o Krautrock, e até mesmo em países do bloco comunista como Cuba, Tchecoslováquia e Romênia. A coisa não foi diferente na Israel de 1974. Após a traumática guerra do Yom Kippur, três prodigiosos multi-instrumentistas e arranjadores, Shlomo Ydov, Shem Tov Levy e Shlomo Gronich, voltando do serviço militar, reuniram-se e formaram o grupo que viria ser à pedra fundamental da pequena e tacanha cena progressiva na Terra Santa. Gronich, inveterado amante dos Beatles, gravou seu primeiro disco em 1971, antes da eclosão do “arranca-rabo” nas Colinas de Golã. Why Didn’t You Tell Me foi considerado o primeiro trabalho de música jovem de vanguarda no país. Este seria o grande laboratório para misturas sonoras

que amadureceriam, três anos mais tarde, no Ktazt Acheret. Ao rodar na agulha o único LP gravado pelo trio, logo percebe-se uma sonoridade Abbey Road, porém muito mais sofisticada, com requintado tempero er udito-jazz-avant garde, funcionado como roupagem nova, catalisadora da música tradicional judaica, sendo de origem semita, com semelhanças nítidas de música árabe, mesmo não sendo modal. Durante a sequência, os vocais, em hebraico e inglês, são executados com dinâmica e perfeito equilíbrio. O instrumental é sinfônico; A gama de sons usada nos arranjos é grande e não há uma predominância de timbres datados como os do Fender Rhodes, Hammond ou Mini-Moog. O grupo se dissolveu ao término das gravações, com a partida de Gronich para os EUA. Shlomo Ydov, argentino de origem, se tornaria posteriormente o grande astro do pop israelense, emplacando vitoriosa e lucrativa carreira solo na “Terra das Doze Tribos”.

Ler discos, ouvir letras Ler discos, ouvir letras Ler discos, ouvir letras

lucas rodrigues de campos

First Light, Freddie Hubbard Hidratado por algumas cervejas e uma dose de suco, num ambiente decorado por ares que escapam do meu controle e dançam numa valsa psicodélica, talvez funk. Recostado, em meio a um horizonte que não me pertence, de cômodos grandes e vazios. Situado num antro de senhores que passeiam com seus belos cães em busca de uma felicidade falida. A minha felicidade busco num vinil já estacionado na pick-up e no swing sincopado de um “negão” que acaricia seu trumpete, com êxtases que gozam junto à toada de um baixo da marca Ron Carter, aqui sem amarras. O som remete aos que dormem logo em frente e são de fatos meus vizinhos - de forma fria, não tanto - a orquestra de Sebesky repousa em meus ouvidos e acomoda as loucuras de uma gang jazzista, acuada, mas sensível e triste, amargurada de torturas e esperançosa de libertação. Estou abaixo de um pôster de Che, ao lado de outro de Florestan e avisto Evo no mesmo formato. Certamente os músicos que idolatro não estão atrás de nenhum deles no quesito revolução. O vazio de minha mente impede que consiga desenvolver,

ou melhor, criar sentido nestas parcas palavras, estou ao som da orquestra que ritma uma trilha obscura e sombria, com cordas e sopros chorados e que coroam as minhas ânsias. Há uma tentativa de tornar o aqui mais vivo, por enquanto tímida. O mais vivo traduz-se em conforto agudo, acompanhado de Hubert Laws e sua flauta. Surge um teclado, que deixa mágoa. Batidas de uma bateria singela. Liberta-se Freddie, o show é seu; você é o “First Light” – pára e permite a seus camaradas um pouco dela, a luz, com a paixão de teclas eletrônicas – Logo volta e domina com uma pseudo bossa, que trava e demonstra um percalço. Assusta-me, um buraco, um risco. Um passo para trás. Conserto mal-ajambrado para os que têm direito a concertar. Fim de morte anunciada – sopros em que falta ar, secos, como garganta velha. A orquestra, solene, acompanha o réquiem.


p i n g av i o l a c a f és o m r o c km a t o

por lucas rodrigues de campos contribui; chuck dedo amarelo

Impressionado com novas paisagens aparecidas na linha de trem desconhecida – do Brás até Rio Grande da Serra – ele constatou ser um “Hippie de Cimento” e da correria, espantandose com a mata atlântica rodeando poucas chácaras, e alguns pólos industriais, quando rumou à Paranapiacaba.

Um “apartamentista” de 19 anos, meio mole, tomou coragem e foi ao encontro do legítimo registro contemporâneo da psicodelia. Ainda dentro de territórios metropolitanos/centrais (estação Rio Grande da Serra), encontrou o ilustrador viajante, em um agendamento sinérgico. O ônibus aportou logo no vilarejo símbolo do progresso industrial do começo do século, uma hospedagem entre capital e litoral. “Paranapiacaba representa o panóptico” – teoriza um proto-sociólogo, rockeiro de profissão. O olho sobre a cidade aponta o casarão no ponto mais ao alto. Teoria testada pelo grupo que aportava na vila, alvejado por um estúpido candidato a vereador com “dor na roela”, sem perder a pose coronelista. Da sacada inglesa, uma senhora emenda: “Esse é o sal de fruta Ênio”. Sem guia fardado, mas com um viajante com três anos de estradas brasileiras nas costas, os pouco mais de 5 km não eram empecilho. Ponto de partida: Paranapiacaba; Ponto de chegada: Simplão de Tudo, em Mogi das Cruzes, próximo à sub-estação de Furnas, conhecida como Tijuco Preto. Qualquer tensão foi aliviada previamente, quando encontramos um grupo de Funiculeiros capitaneados por uma recente ex-militar. Levemente fechada, a mata amenizava o calor. Com o tempo, o sol parecia enraivecer - nos atingia as costas por entre os clarões abertos para as plantações de eucalipto, ameaça real do barões da celulose. A prova ficava por contas dos montes

de entulho e terra, que pareciam desenhar uma trilha por entre subidas e descidas. Alterado, mas não pela indústria do papel, um cânion surge e denuncia que ali havia um rio. O vale devia ter uns 20 metros de altura e os paredões recordavam a corrida de uma cachoeira. Alguns metros a frente, uma aparente entrada de trilha dava numa pequena cachoeira, quase piscina. Os ornamentos logo pintaram o terreiro de macumba. Para receber a comitiva, uma dúzia de velas, um cesto tombado junto à água e flores se espalhando por ela; levantando a vista, restos de tecido e um quase vestido prendiam-se

aos galhos. Menos de um quilômetro, destino alcançado. A pequena chácara é composta por um palco assentado na garagem, um bar, uma cozinha caipira com forno a lenha: tudo despencado num declive, espaço para mais uma piscina natural. O recolhimento veio em forma de música e todo ar oferecido pela Mata Atlântica nativa. Por volta de trinta barracas acolhiam uns cem malucos, reunidos a espera de boa música.

Ao vivo

O cast atraiu o público e a atenção dos loucos por música. A seleção, na qual destacaram-se Cosmo Drah, Banda Vuô,

cobertura

Mud Shark e Jazz CO (não confundir com o combo jazzístico da década de 70, e que ainda está na ativa, capitaneado por Amador Bueno), foi convocada por Chris. A proprietária do Simplão Camping Rock Bar recebeu a romaria para comemorar seis anos de resistência rockeira, sempre oferecendo um canto, goró e boa música. O repertório hard progressivo do grupo COSMO DRAH abriu bem a noite. É a quarta vez que acompanho o grupo e o progresso e refinamento na execução dos tributos surpreende a cada apresentação. O equilíbrio dos integrantes Elton (baixo), Renato (bateria), Ziemmer (guitarras) e Rubens (vocal) é ponto destacável. Sinergia no palco e com o público que teve o privilégio de escutar versões de Captain Beyond, Aeroblues e Cactus. O quarteto prometia o lançamento do compacto com gravações inéditas e autorais no Simplão; o feito veio semanas depois. Para um aficionado em música, a busca pelo material vale a pena: “Cosmo Drah”, “Mágica do Tempo” e “Nova Estação” são hard de qualidade, prova de que nostalgia na medida certa resulta em grandes trabalhos. A apresentação do Cosmo Drah no Simplão e o lançamento do compacto anunciam os galopes que a melhor banda de hard paulistana está prestes a dar. Boa receita para fazer um rock agradável é disposição e coragem para executar repertórios pouco comuns e, porque não, tocar o que o público pede de vez em quando. Há momentos em que um “Toca Raul!” é respondido com classe: foi o que aconteceu com a BANDAVUÔ, grupo de Paranapiacaba que aposta no rock nacional. A Vuô interpreta o “maluco beleza” de forma visceral, rockeando mais suas músicas, realçando nas canções um peso até então imperceptível para este jornalista. Primavera nos Dentes e Lua cheia foram a cereja do bolo; os “lados b” de Secos e Molhados foi mais um ponto alto da Vuô.


A escola psicodélica também tem seu representante na Cidade de São Paulo. Se há rótulo para a música esse é o que melhor define o trio MUD SHARK. Erich Jones (Baixo / Voz / Violão), Alex Cabral (Bateria / Voz / Percussão) e Léo Chaves (Guitarra / Voz / Teclado) desenvolveram Mutantes, percorreram os caminhos londrinos do Cream e mostraram ao público como se dança rock. Erich Jones se esparrama no palco, e quem presenciou as cenas do baixista durante o show seguinte (Jazz CO) pode atestar essa afirmação. No tocante à música, as viagens do trio são convidativas, com canções autorais que legitimam o rock brazuca. Durante a trip musical no Simplão, grupo e público elegeram a musa do Mud Shark: Dona Maria Joana, deve ter ficado lisonjeada. A performance continuou no dia seguinte por parte de Léo e Erich que nas rodas de viola apresentaram embriões para versões de Genesis, fase Tresspass, e Mutantes, fase Tudo Foi Feito Pelo Sol. O projeto jazzístico/experimental JAZZ CO, proveniente da zona leste paulistana, baseia-se na formação rotativa, dos integrantes e freqüências sonoras; Em trio desta vez, a confraria musical é iniciativa de André Martinelli. As polaróides sonoras geraram energia e sintonia com os remanescentes do começo da manhã, que antes da alvorada piraram com solos de bateria fritados , vísceras do contra-baixo acústico e boas bases na guitarra. Duas horas de som ininterruptos chamaram o sol que entrou no palco anunciando a hora de achar um tanto de lenha, atiçar o fogo, largar a pinga com mel e passar um café.

Clariô

Cantoria e igarapê atlântico reabasteceram o fôlego; café torrado, uns remendos alimentares, e cana sem adulteração serviram de excelente combustível para retornar ao pó da estrada. No retorno, os “Cadernos Viagem” foram escritos com Sá e Guarabira, entoando a despedida do sol e o encontro taciturno com a noite. A comitiva somou vinte pessoas, uma parada rápida e versos perdidos de Beatles e “Balada do Louco” – o vilarejo se chama Taquarassu, uma vila discreta, um lago, um casarão e a

udigrudi trêm fantasma A cena mod invadiu Curitiba há al-

Igreja no centro; Uma família coreana comprou a região e a ocupa há 50 anos. A cerveja no estaleiro Paranapiacaba aconteceu por volta das 21h, horário de pegar o ônibus, seguido do trem; a locomotiva foi musicada pelo incidental encontro com Fernando, compositor ferroviário, e de sua amiga anglo-brasileira que fez a conexão da sÓ com terras londrinas.Acrescido com um pandeiro de origem desconhecida, a música tornou-se parte da viagem trazendo à tona Odair Cabeça de Poeta. Da estação Rio Grande da Serra até o Brás, o som imperou dentro dos vagões quebrando o gelo dos rostos transeuntes. Da estação da Luz para frente versos anunciavam que “tudo corre tão depressa, se você tropeça, não vai levantar”: o dia seguinte era uma segunda-feira.

por geraldo malta

infront O Coletivo viajou, através da web, (Rússia)

guns anos; De repente virou uma febre camisetas listradas, terninhos e cabelos crescidos abaixo das orelhas. Mesmo tendo surgido dentro desse frenesi, o Trem Fantasma foge a esse tradicionalismo, pegando aquela sonoridade de transição 69/70 de maneira despojada e adaptada a sua realidade. Formado por Leonardo Montenegro, (Guitarra e vozes), Rayman Juk, (Baixo e voz principal) e Yuri Vasselai, (Bateria e vozes), no início deste anno domini, o trio logo entrou em plena atividade na capital e interior do Paraná, se apresentando sempre em locais inusitados. Um registro fonográfico, com quatro músicas, já está sendo providenciado - O som do Trem em breve poderá ser ouvido nos trilhos da web – por enquanto os udigrudentos na órbita do sÓ poderão conferir a performance da molecada através do You Tube, destaque para “Sua otária”, fazendo uma conexão mutantológica, e “Não precisei mais de ninguém” com seus riffs desbundados.

http://www.fotolog.com/otremfantasma Este maluco acaba de sair de um festival, e está vendo três labirintos. Ajude-o a encontrar sua brisa matinal.

até Moscou para falar desse excelente trabalho fusion. Fundado no final do último século, o Infront, investe nas fórmulas “Frippianas” explodindo num prog instrumental com duas guitarras e sem sintetizadores; Sonoridade meio Red, meio King Crimson atual. Igor Uporov, (guitarra), Dmitri Chernishev, (guitarra), Alex Mshcheryakov, (baixo) e KS, (bateria) já acumulam a experiência de dois discos lançados e diversas resenhas positivas nos prog-sites ao redor do globo. Podem-se conferir seis músicas na página do Myspace; “Autumn Velvet”, “Invisibly Join” e “Mensura Zoli”, chamam a atenção pelo capricho composicional e são altamente recomendadas. http://www.myspace.com/infront


Parafernália montada! Do outro da rua, a Igreja do Calvário, antiga tenda, oferecia o cenário propício. Confusão de câmera, gravador, cabos, bloquinhos e laptop para iniciar a entrevista exclusiva com Roberto Lazzarini e João Kurk, teclas e voz do grupo mais vanguardista do prog nacional. Numa animada troca de idéias de duas horas, eles revelaram algumas das pitorescas histórias de seus 42 anos de amizade e da trajetória do Terreno Baldio da “bélle epoque” dos anos 70 até nossa atual “belle merde” Islanders, do hard ao progressivo Divergindo da maioria dos grupos de baile da época que tinham em seu set músicas radiofônicas, o Islanders - formado por Rodolfo Ayres Braga e Joaquim Correa, além de Lazzarini e Kurk - se orgulhava de tocar o lado B dos discos importados que colecionavam. “No dia em que morreu o Hendrix a gente fez uma homenagem. Coitado do cara que foi lá pra dançar”, nos diz entre risos Lazarini possuidor da coleção inteira de LPs do renomado guitarman, declaradamente sua maior influência, independente de ser pianista. Kurk ressalta que importava os discos que não chegavam aqui, e ao rodar a bolacha logo procurava as músicas “mais ferradas” e que viriam a ser parte do set list dos Islanders. Grande era a euforia entre os músicos freqüentadores de bailes como o do Círculo Militar, que esperavam pra ouvir o melhor do hard e do progressivo - tal agitação já punha o Islanders no caminho da troca de sonoridade. “Tudo foi muito rápido de 72 a 76”, Lazzarini se refere às mudanças e assimilações de um som pesado, mas já experimental de Hendrix, rumo às sendas da fusão do rock, jazz e música erudita. Outro fator que direcionou tais mudanças foi a audição do álbum Three Friends do Gentle Giant, emprestado pelo baterista de um projeto de Egídeo Conde junto de João Kurk – um rock direcionado por Free

e Jeff Beck. A audição “era uma coisa diferente e me bateu muito forte. Ali eu quis me embrenhar no mundo progressivo”, recorda Kurk. Logo o guitarrista Mozart Mello e o baixista João Ascenção foram recrutados junto a banda Fush; Deu-se asas a criatividade e iniciou-se o mito do Gentle Giant brasileiro! Preparando o Terreno Já como Terreno Baldio, o grupo fez parte do festival do Colégio Objetivo. “Eram seis bandas. Depois da gente ninguém mais quis tocar” lembra Lazzarini; “Não queríamos fazer um som na linha do Pink Floyd,com atmosferas e sintetizadores, o lance era tocar de verdade, usar contraponto, fuga e polirritmia.” Não só o publico do colégio se impressionou com as composições terrenistas; Césare Benvenuti, empresário italiano, estava na platéia e se apressou em convidar o grupo pra gravar um disco. “Os shows eram concorridos, a galera estava a fim de algo diferenciado.” Distribuídos em três contos, a trajetória do ser vigilante e os traços do terreno baldio eram contadas: Aquelôo, Pássaro Azul e Terreno Baldio. “A gente queria fazer rock com substância, algo com começo, meio e fim”. Os capítulos dos temas desenvolvidos pela banda necessitariam de, no mínimo, dois discos, sendo o debut um recorte dos três shows; Ficaram de fora peças importantes como “Relógio de Sol”, “Velho Espelho” e “Aquelôo”,


Qualquer crítico desprovido Terreno Baldio da síndrome de inferioridade 1975, Pirata brasileira reconhece este como um dos registros fundamentais do mundo conhecido como rock progressivo. A opulenta seqüência é apenas cinqüenta por cento do vasto set do grupo naqueles anos. Gravado em quatro canais por Alan Krauss, que segundo a lenda, operou som em Woodstock, o disco traz o repertório que caracteriza o som do Terreno. “Pássaro Azul”, “Grite”, “Água que Corre”, “Este é o Lugar” compõe maior parte do show atual. O disco foi regravado em 1994 em inglês; Mais uma vez Cesare Benvenuti cuidou (e desta saiu nos créditos), da produção em seu estúdio na Itália, e as adaptações das letras ficaram a cargo de Kurk e do bluesman André Cristóvam; As novidades são as músicas Aquelôo e Elder Mirror, engavetadas desde 1976. Até o final deste ano, o selo Rock Symphony, deve prensar mais 1.000 cópias da primeira versão do álbum, relançada em 2003.

Além das Lendas Brasileira 1977, Continental

Fruto das pesquisas folclóricas de Lazzarini e da fantasia de Orlando Beghelli, a temática do segundo disco do Terreno gira em torno do folclore brasileiro. Boatos de que foi concebido na intenção de ser trilha sonora do Sítio do Pica-pau Amarelo foram desconfirmados pela banda. A entrada de Rodolfo Ayres Braga, a“capitão das quatro cordas”, adicionou mais balanço na turma. As melodias típicas contribuíram para transformá-lo em trabalho de Música Popular Brasileira, assimilando grupos como Quinteto Violado e A Barca do Sol. Um grande número de overdubs desnuda os arranjos esmerados de um grupo em fase de transição, porém atento à excelência musical; “Caipora”, “Saci Pererê”, “As Amazonas”, retratam bem o período. retomadas na regravação do primeiro disco em 94, com letras em versão inglesa, e contando com a contribuição do blueseiro André Christóvam na transcrição. Naquela época era grande a procura de empresários e produtores por bandas que faziam rock em português, visando atender a demanda do novo mercado que surgia. Correndo atrás de um contrato, Césare esquematizou uma gravação no então novo e bem equipado estúdio Pirata, de Aurino Araújo, fazendeiro irmão de Eduardo Aráujo.“Mesmo em meio a dúvidas faltei numa prova de Resistência de Materiais na faculdade de Engenharia para participar das sessões de gravação”, conta Lazzarini que chegou a formar-se na área. O disco foi

gravado dentro dos padrões setentistas: ao vivo em 4 canais e com poucos overdubs. Quem operou a mixagem foi Alan Krauss, (Space Patrol, ver sÓ # 1), “um gênio, um crânio”, segundo Lazarini. Na música Loucuras de Amor, “faça-me sofrer, mais uma vez”, um aparente delay programado surge nas repetições de “uma vez”; Aparente, pois esse efeito foi produzido a partir de corte e colagem nas fitas de rolo, manualmente. A “bolacha” saiu pelo selo Pirata Gravações Musicais e Benvenuti não pode assinar a produção por problemas contratuais (na época ele trabalhava para a Continental), quem figura no encarte é Arnaldo Sarcomani mesmo sem ter tido participação no primeiro álbum do grupo.

Festival de águas Claras e Teatro 13 de Maio: shows fundamentais! A apresentação do Teatro 13 de Maio é tida como pedra fundamental na carreira do prog-grupo. “Sempre tivemos boa média de público, e nem tínhamos Internet, a divulgação era no boca a boca.” se envaidece Kurk. Com a casa lotada e super produção de figurino e efeitos visuais cuidadosamente preparados pela própria banda, se desenvolveu o show Aquelôo. Os desenhos do mítico vigilante do terreno baldio, projetados no palco, eram uma grande inovação e a filipeta contendo o programa da noite, feita de papel de seda, tornou-se

rara, ao ser sumariamente consumido pela “turma da fumaça”. Em Iacanga, nosso Woodstock, o Terreno recebeu a regalia de ser uma das atrações principais, junto com Os Mutantes, O Som Nosso de Cada Dia e Apokalypsis. A celebração do sol suprimindo a chuva torrencial se deu nas primeiras horas do sábado, segundo dia de festival, um momento mágico - muito citado pelos dois velhos companheiros – que superou toda a precariedade do evento. João Kurk aliava dois momentos importantes da sua vida, de Fusca ele e sua recente esposa rumaram à Iacanga com Lazzarini, proprietário do pequeno “beatle”. Nos bancos da frente do automóvel João e a mulher repousavam em lua de mel, até


serem alertados por “umas pancadas no vidro” de Peninha Schimidit, já que era hora de levantar acampamento. Doze pessoas em comitiva partiram pra Agudos, o capitão da romaria foi João. A pequena cidade era reduto de familiares do vocalista sendo a geladeira real intenção do Terreno Baldio e sua trupe, que a deixaram vazia. Muito Além Brasileiras

das

Lendas

Mais uma vez Benvenuti aparece na história do grupo e os leva para gravadora a Continental em 1976. Conseguindo lançar um grupo que fizesse sucesso ele teria mais espaço dentro da empresa para trabalhar com gru-

teve participação de Nelson Gerab no violino, Fabio Gasparini no cello e Claudio Bernardes no baixo acústico. Segundo disco na mão, e seis meses de espera pra um show de lançamento. O empresário de Belchior, Jorge Mello, se encarregou de trabalhar com o Terreno Baldio, o fato imprevisível foi o cantor - até então desconhecido - ter estourado junto de Elis Regina em “Como nossos pais”; o resultado disso foi o sumiço de Jorge e o conseqüente arquivamento do material de Além das Lendas Brasileiras. Tanto tempo parado não prejudicou o bom lançamento do disco, ocorrido no Teatro Ruth Escobar, auxiliado pelo empréstimo dos equipamentos de Eduardo Araújo. Existe um registro do espetáculo, em fita K7, guardado com Rodolfo Braga, que comprova a qualidade do mesmo.

pos mais arrojados, de praxe, o Terreno entrou nesta última categoria. Falar da mitologia brasileira foi projeto de Lazarini que pesquisava, na época, o tema. Dentro da banda, as mudanças eram profundas. A urgência de mesclar o som progressivo com elementos da música brasileira e a saída de João Ascenção, substituído por Rodolfo Ayres Braga, eram dificuldades a ser superadas para a realização do segundo registro. Orlando Beghelli, escritor indicado pela gravadora, ajudou no desenvolvimento das letras do disco, nomeado por Kurk. O processo de gravação em 16 canais, no Vice Versa, abriu novas possibilidades de arranjos e overdubs, confundindo os rapazes, acostumados aos 4 canais. Mesmo não satisfeitos com o resultado da mixagem final, Kurk e Lazarini apreciam o disco que ainda

Marcante, o concerto recebeu convidados de pompa: “Puta som hein, garotos?”, reagiu Elis Regina frente ao arquitetado som. Ainda divulgando o LP, fecharam com um empresário da Traipú Produções uma série de shows com os Tarântulas, um grupo de samba e Lee Jackson, que “era um cara que fazia um rock bem chocolate”, palavras de Lazzarini. A “salada sonora” e a junção de diferentes tribos resultava num desagrado geral, mas rendeu divertidas histórias, esta uma lembrança de João Kurk: “Certa vez tocamos no Clube Alemão de Pirituba, na platéia, tinha uma moça dançando Quando as coisas ganham vida, que é uma música que não dá nem pra bater o pé, tamanha a mudança das fórmulas de compasso.

..

30 anos depois.

O sonho de por o grupo novamente na estrada e produzir material novo não é velado pelos integrantes do Terreno. “A gente tem vontade de voltar a trabalhar com grupo, mas temos constantes problemas com horário; A coisa vai ter que ser devagar.” , confessa Kurk. Lazzarini trabalha como produtor musical da Rede Record, Mozart é diretor do conservatório Souza Lima e Kurk viaja todo estado com seu trabalho cover, pouco tempo sobra para ensaiar as complicadas composições o que não impediu o grupo de realizar dois excelentes shows três decênios depois da grande época: Na Virada Cultural, (resenhado na edição passada), o Terreno realizou “um concerto épico”, nas palavras de Kurk e Lazzarini, “onde todos estavam imbuídos”. Sem tocar juntos desde o show de 94, no Centro Cultural São Paulo, comprovaram sua competência aprontando o repertório com apenas cinco ensaios. Concerto com direito a entortada nos headbangers que se embasbacaram com o som progressivo. Teatro, público totalmente rockeiro, “toca Raul”, expectativa. A Biblioteca Cassiano Ricardo, na zona leste da cidade, perdia-se numa nostálgica atmosfera. O equipamento e equipe de som não contribuíram com o show. A caixa do baixo parou de funcionar, quase não se ouvia o violino durante grande parte do show e João Kurk não tinha retorno. Pouco preparados - avaliação de Kurk e Lazzarini -, o grupo não deixou dúvidas de suas qualidades mesmo com tantas adversidades, “Emerson, Lake and Palmer? Conheci um melhor hoje!” afirma um alcoolizado fã, entre cusparadas e apertando efusivamente as mãos do tecladista.


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