Hidrologia resumo luis mendes

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ISEL - HIDROLOGIA Objectivo: Proporcionar aos alunos uma boa compreensão dos fenómenos que integram o ciclo hidrológico, de modo a permitir a constituição de uma base sólida para as diferentes aplicações na área da Hidrologia em Engenharia Civil.

Programa: Definição, metodologia e âmbito da Hidrologia. O ciclo hidrológico. Distribuição da água na Terra. A água em Portugal. Bacias hidrográficas. Definição e características morfológicas. Balanço hidrológico e ano hidrológico. Medição da precipitação. Distribuições espacial e temporal da precipitação. Distribuições espacial e temporal do escoamento. Curvas de duração do escoamento diário. Evaporação e evapotranspiração. Fórmulas empíricas. Evaporímetros. Água no solo e nas reservas subterrâneas. Infiltração. Avaliação do escoamento anual a partir de elementos climáticos. Precipitações intensas. Período de retorno. Linha de possibilidade udométrica. Tempo de concentração. Fórmulas empíricas para avaliação do caudal de ponta de cheia. Conceitos básicos de recursos hídricos.


Programa dos Trabalhos Práticos: 1 - Caracterização morfológica de uma bacia hidrográfica. 2 - Método da dupla acumulação. 3 - Precipitação anual média sobre uma bacia hidrográfica. 4 - Precipitações intensas. Linha de possibilidade udométrica. 5 - Escoamento anual médio e curva de duração. 6 - Evapotranspiração e dotações de rega. 7 - Infiltração. 8 - Caudal de ponta de cheia.

Métodos de Avaliação: Trabalhos práticos (20%). Exame final (80%): Épocas normal e de recurso.

Bibliografia: Base: QUINTELA, A. (1996) Hidrologia e Recursos Hídricos. Associação de Estudantes do Instituto Superior Técnico, Lisboa.

Complementar: CUNHA, L. et al (1980) - A Gestão da Água. Fundação Gulbenkian, Lisboa. LENCASTRE, A. e FRANCO, F. (1984) - Lições de Hidrologia. Universidade Nova de Lisboa. LINSLEY, R. et al (1982) - Hydrology for Engineers. MacGraw-Hill. LINSLEY, R. e FRANZINI, J. (1964) - Engenharia de Recursos Hídricos. MacGrawHill do Brasil.


Hidrologia A Hidrologia é a ciência que trata das águas da terra, da sua ocorrência, circulação e distribuição das propriedades físicas e químicas e da sua interacção com o ambiente, incluindo a relação com os seres vivos. Num âmbito mais restrito a Hidrologia estuda ocorrência, circulação e distribuição da água na terra (continentes e ilhas), à superfície e debaixo do solo. Um dos objectivos principais da Hidrologia é servir de base à adequada gestão dos recursos hídricos nas suas múltiplas vertentes.

Ciclo Hidrológico

Ciclo Hidrológico (ou ciclo da água) é o contínuo movimento da água entre os continentes, oceanos e a atmosfera

A energia solar é a fonte de energia térmica necessária para a passagem da água das fases líquida e sólida para a fase do vapor; é também a origem das circulações atmosféricas que transportam vapor de água e deslocam as nuvens.


DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NA TERRA

Volume (1012 m3) Oceanos

Tempo médio de residência

%

1338000

96,6

2500 anos

Calotes polares e glaciares

24000

1,73

1400 anos

Água subterrânea

23000

1,66

9700 anos

Lagos e pântanos

190

0,014

10 anos

Humidade no solo

17

0,001

1 ano

Atmosfera

13

0,001

8 dias

Rios

2

-

16 dias

Biosfera

1

-

poucos dias

1385223

100

(50% salgada)

Total

Volume de água doce: Volume de água salgada: Volume total:

35 x 1015 m3 ( 2,5% ) 1350 x 1015 m3 ( 97,5% ) 1385 x 1015 m3

( = 1385000000 km3 )


CICLO HIDROLÓGICO NA TERRA

Atmosfera: 13 x 1012 m3 ( 0,025 m)

Precipitação nos oceanos: 458 x 1012 m3/ano (1270 mm/ano)

Precipitação nos continentes: 119 x 1012 m3/ano (800 mm/ano)

Evapotranspiração nos continentes: 72 x 1012 m3/ano (485 mm/ano) Evaporação nos oceanos: 505 x 1012 m3/ano (1400 mm/ano)

Escoamento superficial e subterrâneo: 47 x 1012 m3/ano Continentes: 47000 x 1012 m3 ( 315 m)

Oceanos: 1338000 x 1012 m3 ( 3700 m)

Área dos continentes:

150 x 106 km2 (29,4%)

Área dos oceanos:

360 x 106 km2 (70,6%)

Área total:

510 x 106 km2


BALANÇO HIDROLÓGICO EM PORTUGAL (Valores anuais médios em mm)

Precipitação Norte do Tejo Sul do Tejo Total Nacional

Evapotranspiração

Escoamento

1230

710

520

700

535

165

1000

630

370

ESCOAMENTO ANUAL MÉDIO:

Volume (109 m3)

Altura (mm)

Com origem em Portugal

33

370

Proveniente de Espanha

31

350

Total

64

720


O processo de escoamento Designa-se genericamente por precipitação toda a água que atinge a superfície do globo terrestre, proveniente da condensação do vapor de água da atmosfera. No início de uma precipitação, parte da água pode ser retida pela cobertura vegetal e por outros obstáculos que a impeçam de atingir o solo, voltando à atmosfera sob a forma de vapor. Chama-se a este fenómeno intercepção. Se a precipitação se prolonga no tempo, a água atinge o solo e fica inicialmente retida nas depressões do terreno, iniciando-se a infiltração. Durante este período inicial, o aumento do caudal nos cursos de água é nulo ou muito pequeno (produzido apenas pela precipitação directa na rede hidrográfica). Se a precipitação continua, ultrapassando a capacidade das depressões do terreno e da infiltração, a água transborda das depressões e forma uma película que se escoa sobre o solo e se encaminha para a rede hidrográfica, dando origem ao escoamento superficial. Quando se inicia uma precipitação e o solo se encontra seco (com défice de água relativamente à sua capacidade de retenção, toda a água infiltrada fica retida no solo. À medida que aumenta o teor de água no solo, velocidade de infiltração diminui e aumenta a quantidade de água que se escoa à superfície do terreno para os cursos de água. Quando o solo atinge a sua capacidade máxima de retenção, a água infiltrada circula para maiores profundidades por acção da gravidade, podendo reaparecer à superfície noutro local, com algum diferimento no tempo – escoamento sub superficial - ou ir alimentar as reservas de água subterrâneas, as quais alimentarão os cursos de água também com diferimento no tempo – escoamento subterrâneo.. O escoamento nos cursos de água deve-se assim ao escoamento superficial, ao escoamento sub superficial e ao escoamento subterrâneo. Quando cessa a precipitação o escoamento superficial termina rapidamente, passando o curso de água a ser alimentado pelos escoamentos sub superficial e subterrâneo, os quais se vão esgotando com o passar do tempo, rapidamente o primeiro e mais lentamente o segundo.


Bacias Hidrográficas

Definição Define-se como bacia hidrográfica de um curso de água, relativa a uma dada secção, à área de terreno que contribui com as águas que nela se precipitam, para alimentar o caudal desse curso de água na secção considerada (secção de fecho da bacia). Uma bacia hidrográfica é sempre referida a uma secção qualquer de um curso de água. Quando não se indica a secção em estudo, supõe-se que se trata da totalidade da bacia, em relação à foz ou à confluência com outro curso de água mais importante. ex. bacia hidrográfica do rio Zêzere, bacia hidrográfica do rio Mondego, ou bacia hidrográfica do rio Tejo na ponte de Santarém. A delimitação de uma bacia hidrográfica faz-se de acordo com a topografia, pelas linhas de cumeada que a separam das outras bacias anexas, tendo em conta também a geologia do terreno. Por vezes, a área da bacia real não coincide com a bacia topográfica por razões de natureza geológica relacionadas com a permeabilidade dos solos e influência dos escoamentos subterrâneos (fuga da linha divisória)

Na prática, a delimitação das bacia hidrográficas faz-se apenas pela linha divisória topográfica, por ser difícil conhecer com rigor a linha divisória freática, e também porque a influência do escoamento subterrâneo é geralmente pequena, quando comparada com o escoamento superficial (salvo casos especiais de formações cársicas ou vulcânicas).


Característica morfológicas Forma A forma planimétrica da bacia pode exercer grande Influência no regime do curso de agua, principalmente nos caudais de cheia. Uma bacia alongada ou longitudinal é constituída por uma única linha de água principal, de grande desenvolvimento mas de pequena largura, recebendo linhas tributárias de pequena importância.

Uma bacia arredondada é formada por várias linhas de água de importância sensivelmente igual que se reúnem concentricamente para dar origem a uma linha de água final, relativamente curta.

Uma bacia radial ou ramificada apresenta várias bacias parciais alongadas que se reúnem numa linha de água final.


Verificando-se a igualdade de todas as outras condições, o caudal de cheia das bacias mais alongadas será menor do que o das bacias mais arredondadas. Nas bacias arredondadas a concentração das águas faz-se multo mais rapidamente, dando origem a um caudal máximo de cheia maior, embora de menor duração. Para traduzir a forma de uma bacia por meio de um índice numérico, pode usar-se o índice de compacidade de Gravelius (Kc), definido como sendo a relação entre o perímetro da linha divisória da bacia e o perímetro da circunferência que limita uma área igual à da bacia.

Kc =

P 2 πA

P – perímetro da bacia A – área da bacia O valor de Kc é tanto mais próximo da unidade quanto mais a bacia se aproximar da forma circular.

Relevo e altitude O relevo e a altitude do terreno representam-se em cartas hipsométricas (cartas com a representação das curvas de nível do terreno) e têm uma acentuada influência no processo de escoamento das bacias hidrográficas. Duas bacias que apresentem características geológicas e planimétricas semelhantes mas altimetrias diferentes terão regimes de escoamento diferentes, sendo de esperar um caudal de cheia mais importante naquela cuja altimetria varia mais rapidamente e que tenha maiores altitudes. A caracterização do relevo e altimetria de uma bacia hidrográfica pode ser obtida a partir da respectiva curva hipsométrica, que relaciona as altitudes da superfície do terreno (em ordenadas), com as áreas da bacia situadas acima dessas altitudes (em abcissas). A curva hipsométrica revela o aspecto altimétrico da bacia, isto é, se apresenta grandes extensões de zonas planas ou de regiões montanhosas, inclinações sempre suaves ou troços com inclinação acentuada, etc. Por exemplo, um patamar na curva hipsométrica revela a existência de uma zona planáltica. A ordenada média da curva hipsométrlca, dá-nos a altitude média da bacia. Corresponde à altura do rectângulo cuja área é igual à compreendida entre a curva e os eixos. A diferença entre a altitude média e a altitude mínima (na secção de fecho da bacia), é designada por altura média da bacia. A altitude mediana é a ordena da correspondente a 50% da área total da bacia, isto é a cota da curva de nível que divide ao meio a área da bacia hidrográfica. Geralmente, a altitude média é mais elevada que a altitude mediana.


No traçado da curva hipsométrica o eixo das abcissas pode graduar-se com a área em valor real ou em percentagem do total.

Declive dos cursos de água O declive dos cursos de água de uma bacia hidrográfica influenciam muito o seu comportamento no que se refere aos caudais de cheia, porque condicionam as velocidades de escoamento. Geralmente considera-se apenas o curso de água principal, para o qual se traça o respectivo perfil longitudinal.

Perfil longitudinal do rio Mondego, da nascente à foz


O declive médio (dm) do curso de água é dado pela diferença de cotas extremas a dividir pela sua extensão. Este parâmetro traduz mal a influência do declive, porque em muitos casos os troços de cabeceira apresentam grandes declives mas drenam áreas relativamente pequenas. O declive equivalente (de) corresponde ao declive da recta que subtende com o eixo das abcissas uma área igual à limitada pelo perfil longitudinal do curso de água O declive d10;85.é o declive médio do trecho entre as secções às distâncias da secção de fecho iguais a de 10% e 85% do comprimento total do curso de água.

Densidade de drenagem A. densidade de drenagem D é a relação entre o comprimento total (L) dos cursos de água perenes e intermitentes de uma bacia hidrográfica e a área da bacia A.

D=

L A

A – área da bacia; L – Comprimento total dos cursos de água perenes e intermitentes da bacia

A densidade de drenagem varia na razão inversa da extensão do escoamento superficial e, portanto, fornece uma indicação da eficiência da drenagem da bacia. Se a densidade de drenagem é alta, está-se em geral na presença de uma bacia impermeável e de relevo acentuado. No caso contrário, o terreno da bacia será mais permeável e o relevo suave. O percurso médio do escoamento superficial LP representa a distância média que a água da chuva teria que percorrer sobre o terreno, caso se escoasse em linha recta desde o ponto onde cai até ao curso de água mais próximo

LP = sendo D a densidade de drenagem

1 4× D


Balanço hidrológico

Chama-se balanço hidrológico de uma bacia hidrográfica (ou região), ao cômputo dos ganhos e perdas de água que os processos hidrológicos e, eventualmente a acção humana, provocam nessa bacia (ou região).

Numa bacia hidrográfica em que os limites do escoamento superficial e subterrâneo coincidam, se considerarmos com sinal positivo os ganhos de água e com sinal negativo as perdas, será:

P − H − E − ∆S P − ∆S − ∆SU − E X + R = 0 em que: P – Precipitação sobre a bacia; H – Escoamento na secção de fecho da bacia; E – Evapotranspiração na bacia; DSP - Variação da quantidade de água devida à intercepção, à detenção superficial e ao armazenamento nos leitos; DS - Variação da quantidade de humidade do solo (zona não saturada); DSu - Variação da quantidade de água das reservas subterrâneas; EX – Quantidade de água extraída para fora da bacia pela acção humana; R – Quantidade de água lançada na bacia pela acção humana Se EX e R forem nulos (ou desprezáveis) e se o intervalo de tempo a que se refere o balanço for escolhido de modo a que as quantidades relativas aos vários tipos de armazenamento (DSP, DS, DSu) tenham pequeno significado face aos restantes termos, será:

P−H −E =0 Nestas condições (EX R DSP DS DSu 0) a diferença entre a precipitação e o escoamento representa a perda de água da bacia por evapotranspiração (E), durante o intervalo de tempo considerado e designa-se também em hidrologia por défice de escoamento (D):

P − H = E = D (défice de escoamento)


Ano hidrológico A equação do balanço hidrológico na forma

P−H −E =0 pode ser aplicada a intervalos de tempo iguais a 1 ano (ano hidrológico), desde que se cumpra a hipótese anterior, isto é, que no início de cada um desses intervalos de tempo o armazenamento de água na bacia seja praticamente constante (e não haja transvases entre bacias). Em Portugal, convencionou-se que o ano hidrológico se inicia a 1 de Outubro e termina a 30 de Setembro, porque no final do período de verão, as reservas de água no solo estão próximas do seu limite mínimo e são semelhantes de ano para ano, isto é, cumpre-se a condição DSP DS DSu 0 A adopção do ano hidrológico permite: -

escrever a equação do balanço hidrológico de forma a que se podem correlacionar valores anuais da precipitação e do escoamento (desde que seja possível avaliar o valor da evapotranspiração);

-

obter séries de valores do escoamento anual estatisticamente independentes uns dos outros (considerando que o caudal que se escoa num rio, entre 1 de Outubro e 30 de Setembro de cada ano, depende quase exclusivamente da precipitação ao longo desse ano e pouco tem a ver com a precipitação do ano anterior).

Em países africanos de expressão portuguesa: Cabo Verde – 1 de Julho a 30 de Junho Guiné – 1 de Maio a 30 de Abril São Tomé e Príncipe – 1 de Setembro a 31 de Agosto Angola e Moçambique – 1 de Outubro a 30 de Setembro


PRECIPITAÇÃO Precipitação é toda a água que atinge a superfície do globo, proveniente da condensação do vapor de água da atmosfera. Geralmente considera-se apenas a precipitação meteórica sob a forma de chuva, neve e granizo, desprezando-se a deposição de água na superfície devida a nevoeiro, orvalho ou geada (precipitação oculta) MEDIÇÃO DA PRECIPITAÇÃO Quantidade de precipitação – é a altura de água acumulada sobre uma superfície horizontal relativa a um certo intervalo de tempo. Exprime-se em milímetros ou metros. Intensidade de precipitação - é a quantidade de precipitação referida à unidade de tempo. Exprime-se em mm/h ou l/s/ha. (1 mm/h = 2,78 l/s/ha) A medição da precipitação faz-se com aparelhos chamados udómetros (ou pluviómetros) e udógrafos (ou pluviógrafos), situados em pontos localizados no terreno (postos udométricos). Nos udómetros mede-se a quantidade de precipitação que ocorreu ao fim de um determinado intervalo de tempo (por exemplo 1 dia), expressa em altura. Nos udógrafos mede-se e regista-se num gráfico (udograma), de forma contínua, a precipitação caída, permitindo assim conhecer-se a intensidade de preciptação em qualquer momento.

Fig. 1 - Udómetros


Fig. 2 – Udógrafo de receptáculos basculantes

Fig. 3 – Udógrafo de sifão

Fig. 4 - Udograma



SÉRIES HIDROLÓGICAS. HOMOGENEIDADE E CONSISTÊNCIA Séries hidrológicas são os dados resultantes da observação de grandezas hidrológicas (p.e. precipitações, caudais, etc,). A uma mesma grandeza podem corresponder diferentes séries hidrológicas, consoante o intervalo de tempo ou outra característica que as defina. Por exemplo, para os registos de um posto udométrico, podem ter-se séries de valores da precipitação máxima diária, ou da precipitação média anual. Para o escoamento numa dada secção de um rio podem ter-se séries de valores do caudal médio diário, do caudal instantâneo máximo anual, etc. Para poderem ser utilizadas em estudos hidrológicos as séries hidrológicas devem possuir homogeneidade e consistência. Uma série hidrológica diz-se homogénea quando, ao longo do período de observação, não existem alterações nos factores que condicionam o fenómeno traduzido por essa grandeza. A deflorestação de uma bacia hidrográfica ou a criação de uma albufeira podem originar quebra de homogeneidade das séries de valores do escoamento liquido e do escoamento sólido no respectivo curso de água, porque constituem uma alteração nos factores de que o fenómeno depende. Uma série hidrológica diz-se consistente se ao longo do respectivo período de observação não existe alteração do erro sistemático de medição da grandeza. A mudança do local da instalação de um udómetro ou a alteração da secção de vazão onde se mede o caudal escoado num curso de água, podem originar quebra de consistência nos dados obtidos, por alteração do erro sistemático da leitura.


ENSAIO DOS VALORES DUPLAMENTE ACUMULADOS A quebra de homogeneidade ou de consistência de séries anuais pode ser detectada em muitos casos, mediante um ensaio de valores duplamente acumulados Para se verificar a consistência da série de precipitações anuais num dado posto udométrico marcam-se, num sistema de eixos cartesianos, sobre um dos eixos, os valores acumulados da precipitação anual nesse posto, e no outro eixo os valores acumulados da soma (ou da média aritmética) da precipitação anual num grupo de postos vizinhos. Se a série de valores da precipitação anual no posto em causa for consistente, obtêm-se pontos sensivelmente alinhados segundo uma recta. Se a série no posto em estudo for inconsistente, obtém-se em geral dois segmentos de recta, com quebra no ponto correspondente ao ano em que se verificou uma alteração significativa nas condições de exploração do posto.

Fig. 5 – Ensaio de valores duplamente acumulados Se um ensaio revelar inconsistência dos dados e se for encontrada a respectiva explicação, os valores da precipitação correspondentes ao intervalo de tempo em que se verifica o desvio podem ser ajustados em relação aos do intervalo de tempo considerados correctos.


O ajustamento é feito a partir da proporcionalidade dos coeficientes angulares dos segmentos de recta do gráfico de valores duplamente acumulados:

P=

b0 × P0 b

sendo: P - precipitação ajustada; P0 - precipitação medida, b0 - coeficiente angular no intervalo de tempo tomado como referência para o ajustamento; b - coeficiente angular correspondente às observações a ajustar. Os coeficientes angulares dos segmentos de recta podem determinar-se com base no gráfico traçado, ou pelo ajustamento de rectas de mínimos quadrados aos pares de valores em causa.

y = ax + b

a=

y 2 − y1 x 2 − x1

a – declive da recta; b – ordenada na origem Os registos do grupo de postos utilizados no ensaio dos valores duplamente acumulados devem ser individualmente analisados, eliminando-se do grupo os postos com registos inconsistentes. Quando se procede a um ensaio de valores duplamente acumulados, podem ocorrer mudanças do alinhamentos dos pontos, apenas devido à própria aleatoriedade dos fenómenos hidrológicos. Alguns autores ignoram, as mudanças que não persistem durante mais de cinco anos, por considerarem que podem ser devidas ao acaso.


PREENCHIMENTO DE FALHAS / MÉTODO DA PONDERAÇÃO REGIONAL Frequentemente os registos da precipitação num posto udométrico apresentam falhas durante um ou mais dias, sendo .de interesse obter as correspondentes estimativas para tornar possível o cálculo dos totais mensais e anuais. As causas mais comuns de falhas nas observações são a) preenchimento errado dos dados observados; b) valor estimado pelo observador, por não se encontrar no local da amostragem; c) danos no aparelho, problemas mecânicos no registrador gráfico. O método da ponderação regional é um método simplificado para o preenchimento de falhas num posto, através de uma ponderação dos dados desse posto com os dados de pelo menos três postos vizinhos que não apresentem falhas na mesma altura. Os postos em análise devem pertencera regiões climatológicas semelhantes e ter um mínimo de 10 anos de registos de dados. Seja X o posto que apresenta falhas e A, B e C os postos vizinhos, com os quais se vai fazer a ponderação. Pode-se determinar a precipitação PX em falta no posto X através da seguinte equação:

PX =

P P 1 PX × PA + X × PB + X × PC 3 PA PB PC

em que:

PX , PA , PB e PC são as precipitações médias anuais nos postos X, A, B e C PA, PB e PC são as precipitações verificadas nos postos A, B e C, na altura da falha PX verificada no posto X A apresentação de valores mensais ou anuais da. precipitação que exigiram o preenchimento de falhas deve ser sempre acompanhada da indicação da existência desse preenchimento.


DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DA PRECIPITAÇÃO / PRECIPITAÇÃO SOBRE UMA ZONA O conhecimento das precipitações pontuais, por si só, tem pouco interesse. Geralmente interessa-nos conhecer a precipitação ponderada sobre uma determinada zona (uma bacia hidrográfica por exemplo, ou um perímetro de rega) Existem 2 métodos principais para se obter a precipitação ponderada sobre uma zona, a partir dos registos de precipitações em postos udométricos: Método das áreas de influência (ou de Thiessen) O método de Thiessen baseia-se no princípio de que a precipitação pode ser ponderada para uma determinada zona, admitindo que cada ponto no interior dessa zona tem uma precipitação uniforme e igual à que se verifica no posto udométrico que lhe está mais próximo (área de influência do posto).

Fig. 6 – Traçado das áreas de influência O traçado das áreas de influência faz-se traçando polígonos definidos pelas mediatrizes dos segmentos de recta que unem os postos udométricos. Designando por Ai , e Pi , respectivamente a área de influência e a precipitação do posto i, a precipitação ponderada sobre a área em estudo será: n

Pp =

i =1

Pi × Ai A

em que A =

n i =1

Ai


Método das isoietas Isoietas são isolinhas de precipitação. Representam, sobre o terreno, os lugares geométricos dos pontos de igual precipitação, durante um certo intervalo de tempo (minutos, horas, dias, meses ou anos). Uma carta de isoietas fornece uma visão clara e sintética da distribuição espacial da precipitação

Fig 7 – Carta de isoietas em ano médio, em Portugal Continental


Para traçar isoietas procede-se da seguinte forma: a)

marcam-se sobre uma planta da zona em estudo os postos udométricos existentes no seu interior ou nas proximidades, e a precipitação verificada em cada um deles

b)

Por interpolação entre os pontos de precipitação conhecida, determinam-se os pontos de igual precipitação, correspondentes a uma determinada isoieta; Consideremos (Fig. 8) dois pontos A e B, à distância L, cujas alturas pluviométricas são, respectivamente, hA e hB. A posição do ponto C, situado no segmento AC à distância x do ponto A e onde a altura pluviométrica é hC, é dada por:

x L = h A − hC h A − hB

x = L×

h A − hC h A − hB

Fig. 8 – Interpolação de valores da precipitação pontual c)

unem-se os pontos da igual pluviosidade (fig. 9);

d)

tiram-se as bissectrizes dos ângulos formados por estas linhas de união;

e)

traçam-se, pelos pontos considerados, as perpendiculares a estas bissectrizes;

f)

desenham-se, finalmente, as isoietas, que são tangentes a estas perpendiculares nos referidos pontos.

Fig. 9 – Traçado das isoietas


A precipitação ponderada sobre uma bacia obtém-se da carta de isoietas exactamente do mesmo modo que a altitude média se obtém de uma carta hipsométrica.

Fig. 10 – Cálculo da precipitação média numa bacia A partir da carta de isoietas, se designarmos por Ai (A1, A2,...An,) as áreas entre isoietas adjacentes, e por Pi ( P1 P2 ... Pn ) as precipitações médias correspondentes a cada uma dessas áreas parciais, o valor da precipitação ponderada (PP) sobre a área total será dado pela expressão: n

Pp =

Pi × Ai

1

A

O método das isoietas fornece resultados mais correctos do que o método de Thiessen, mas é mais trabalhoso, pois exige o traçado das isoietas para cada caso analisado, ao contrário do método de Thiessen, em que as áreas de influência são sempre as mesmas.


DISTRIBUIÇÃO TEMPORAL DA PRECIPITAÇÃO Precipitação anual Os valores da precipitação horária, diária, mensal ou anual (séries de valores da precipitação) observadas num posto udométrico ou calculados sobre uma zona ao longo de vários anos, formam um conjunto de informações aleatórias de pouca utilidade, se não forem devidamente analisadas por meio de um tratamento estatístico A precipitação anual medida num posto (ou calculada sobre uma determinada zona) é uma variável aleatória cuja distribuição estatística é aproximadamente simétrica e pode ser traduzida pela lei normal, ficando completamente caracterizada pela estimativa x da média e pela estimativa s’ do desvio padrão.

EXEMPLO Conhecendo os valores da precipitação anual ponderada na bacia do Mondego: Ano 1955 1956 1956 1957 1957 1958 1958 1959 1959 1960 1960 1961 1961 1962 1962 1963 1963 1964 1964 1965 1965 1966 1966 1967 1967 1968 1968 1969 1969 1970 1970 1971 1971 1972 1972 1973 1973 1974 1974 1975 1975 1976

P (mm) 1609,8 779,5 1035,1 1236,5 1852,7 1482,0 1192,6 1347,8 1568,8 877,7 1953,6 1075,8 989,4 1700,4 1135,2 1203,1 985,6 1122,8 1196,7 835,7 685,7

Determine, pela lei de Gauss, os valores de precipitação com probabilidade F(x)=0,01 e G(x)=0,01


n

x=

i =1

n n

s' =

xi

i =1

=1232 mm

( xi − x ) 2 n −1

=350 mm

A - Para o cálculo da precipitação x com probabilidade de 0,01 de ser X x 1º - Como F(x) = (u)<0,5, calcular 1- (u)= 1-0,01=0,99 2º - u =

x−x s'

u=-2,326

x = us ' + x = 350 × (−2,326) + 1232 = 418 mm

B - Para o cálculo da precipitação x com probabilidade de 0,01 de ser X x 1º - G(x)=0,01 2º - u =

x−x s'

F(x)= (u)= 1-0,01=0,99

u=2,326

x = us ' + x = 350 × 2,326 + 1232 = 2046 mm

Precipitação mensal A distribuição da precipitação mensal (num posto ou sobre uma zona) é usualmente caracterizada por um gráfico com os valores médios da precipitação em cada mês do calendário, calculados para o período de estudo (Fig. 11)

Fig 11 - Distribuição mensal das precipitações na bacia do rio Mondego em Ponte de Tábua.


Podem também construir-se gráficos com os valores que são excedidos com determinada frequência na amostra, nos meses respectivos. Por exemplo, o gráfico correspondente à frequência de 20% fornece, para cada um dos meses do calendário, o valor da precipitação nesse mês que ao longo do período de estudo de n anos é ultrapassado em 20% dos anos (0,20 n vezes). O gráfico (diagrama) da média dos valores da precipitação em cada mes do calendário, ao longo do período de estudo, é designado por diagrama da precipitação mensal em ano médio. O conceito de ano médio pode ser concretizado pelo seguinte exemplo: o valor da precipitação no mês de Novembro do ano médio é igual à média aritmética dos valores da precipitação observado: nos meses de Novembro ao longo dos vários anos do período utilizado para definir o ano médio. O diagrama de valores correspondentes ao ano de características médias obtém-se da seguinte forma: -

cria-se uma matriz com 12 linhas e n colunas, sendo as linhas correspondentes aos 12 meses do ano e as colunas aos n anos do período de estudo.

-

ordenam-se em cada uma das n colunas, os 12 valores da precipitação mensal por ordem decrescente, independentemente dos meses em que ocorre

-

calculam-se as médias dos valores de cada linha da matriz (segundo a horizontal)

-

atribuem-se as médias assim calculadas aos vários meses do ano pela mesma ordem de grandeza dos valores do ano médio, criando-se assim um ano fictício, a que se chama ano de características médias.

O ano de características médias é mais representativo do que o ano médio no que respeita à variabilidade da precipitação mensal num posto ou numa região, porque no ano médio os valores extremos perdem a visibilidade com o cálculo da média.


ESCOAMENTO Escoamento é a quantidade de água que atravessa uma secção de um curso de água num dado 3

intervalo de tempo. Pode ser expresso em volume (m ) ou em altura de água (mm) uniformemente distribuída sobre a área, em planta, da correspondente bacia hidrográfica. O escoamento em volume num dado intervalo de tempo obtém-se pela integração dos valores do caudal observados ao longo desse intervalo de tempo. Por ser mais intuitivo, é corrente usar, em vez do escoamento num dado intervalo de tempo, o correspondente caudal médio: caudal fictício, uniforme, que no mesmo intervalo de tempo produz um volume de escoamento igual ao da sucessão real do caudal. Define-se deste modo: - caudal médio diário (num dado dia); - caudal médio mensal (num dado mês); - caudal médio anual ou modulo anual (num dado ano ) ; - caudal médio plurianual ou modulo (num período de vários anos). A recolha de dados relativos à evolução do caudal ao longo do tempo numa determinada secção de um curso de água é feita com recurso a estações hidrométricas, onde se medem as alturas de água (alturas hidrométricas), que posteriormente se transformam em valores de caudal, através de curvas de vazão As estações hidrométricas (ou postos hidrométricos), podem ser constituídas por simples réguas verticais, graduadas, conhecidas por limnímetros, que se colocam nas margens dos cursos de água, em locais convenientemente escolhidos, onde se pode ler, periodicamente, a altura da água.


As estações hidrográficas são instalações munidas de hidrógrafos (ou limnígrafos) que registam continuamente as alturas da água na secção considerada.

Nas estações de medição obtêm-se as alturas hidrométricas e não os caudais. A determinação dos caudais faz-se por intermédio das curvas de vazão, traçadas para as secções de medição, que relacionam as alturas com os caudais respectivos.


As curvas de vazão são obtidas experimentalmente, ou construindo estruturas especiais cuja vazão possa ser estabelecida teoricamente ou por modelo reduzido. A medição (directa) do caudal para o estabelecimento de uma curva de vazão pode ser feita por processos de medição de velocidades, utilizando molinetes ou flutuadores e por traçadores (químicos ou radioactivos).


DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DO ESCOAMENTO Para representar a distribuição espacial do escoamento podem elaborar-se cartas de isolinhas do escoamento: lugares geométricos dos pontos que, por unidade de área em planta, contribuem para a rede hidrográfica com igual quantidade de água. As cartas de isolinhas do escoamento referem-se mais frequentemente ao escoamento anual (num ano particular) e ao escoamento anual médio (média de vários anos). Na figura seguinte apresenta-se a carta de isolinhas do escoamento anual médio em Portugal.

I s o l i n h as do e s c o a m e n t o anual médio em P o r t u g a l


DISTRIBUIÇÃO TEMPORAL DO ESCOAMENTO Séries do escoamento anual e mensal As distribuições de valores, quer do escoamento anual, quer do escoamento mensal podem ser analisadas de modo análogo ao indicado para os correspondentes valores da precipitação. As amostras de valores do escoamento anual - embora por vezes também sejam razoavelmente ajustada pela lei normal - tendem a apresentar apreciável assimetria positiva. As estimativas do coeficiente de assimetria obtidas a partir de amostras que não contenham muito mais de 30 elementos (como é o caso das amostras do escoamento anual) estão sujeitas a grande erro, motivado pelas flutuações da amostragem. Foram obtidas por Quintela, (1967) estimativas do coeficiente de assimetria do escoamento anual em dez cursos de água portugueses, as quais variam entre 0,06 e 1,75, sendo a sua média aritmética aproximadamente igual a 0,70. As distribuições do escoamento anual n e s s e s dez cur sos de água são representadas com boa aproximação, para valor es de F(x) superiores a 0,10, pela lei de Pearson III com o c o e f i c i e n t e de assimetria de 0,70, valor que assim se julga poder ser adoptado para os cursos de água portugueses. No que respeita à distribuição do escoamento dentro do ano, verifica-se que os semestres de maior escoamento em cada ano se situam nos períodos Outubro-Março, Novembro-Abril, Dezembro-Maio e Janeiro-Junho, com maior frequência no período Dezembro-Maio. O atraso na localização dos semestres de maior escoamento em relação aos semestres mais chuvosos, é devido, principalmente, ao efeito da deficiência de humidade no solo nos meses do Outono, em que uma precipitação mesmo elevada produz escoamento escasso e, em muito reduzida escala, ao diferimento no tempo com que as reservas de água do subsolo restituem a água aos rios. As médias dos quocientes entre o escoamento no semestre de maior escoamento de cada ano e o escoamento nesse ano variam aproximadamente entre 0,85 e 0,95. O facto de a concentração semestral do escoamento ser mais elevada do que a da precipitação é devido ao efeito combinado na retenção da água no solo e da evapotranspiração e à fraca regularização das reservas subterrâneas. Em virtude do primeiro efeito, é pequeno o escoamento, quer nos meses do Outono, quer nos meses posteriores a Maio: nos meses do Outono a precipitação, por vezes abundante, encontrando o solo em estado de deficiência de humidade, infiltra-se em grande parte, e nos meses posteriores a Maio a precipitação é em regra escassa e a evapotranspiração potencial elevada.


Escoamento diário A dist r ibuição do escoamento diário (ou do caudal médio diário), numa dada secção de um curso de água pode ser representada numa curva cronológica de caudais, que relaciona os valores do caudal, em ordenadas, com o tempo, em abcissas, pela ordem em que ocorreram. O diagrama cronológico anual dos caudais constitui uma representação gráfica muito sugestiva.

Curva cronológica de caudais O andamento dest e diagrama modif ica-se de ano para ano devido às variações da precipitação anual, mas pode apresentar algumas características comuns ao longo dos vários anos, determinadas pelo clima da região e por características fisiográficas da bacia hidrográfica. Quando o clima da região se caracteriza por existir uma época anual sem precipitação ou com precipitação muito pequena, os valores do caudal médio diário nessa época podem ser importantes ou atingem valores próximos de zero (ou mesmo nulos) consoante a alimentação que o rio receba de mantos aquíferos. Se a bacia hidrográfica ê pequena ou média e a capacidade de armazenamento superf icial e subterrâneo é baixa, o diagrama cronológico do caudal médio diário mostra pontas acentuadas, quando ocorrem precipitações intensas, devido à rápida resposta da bacia à precipitação (regime torrencial). Em rios com bacias de grande área (da ordem da centena de m ilhar es de q u i l ó m e t r o s q uadr ados ou superior) ou com grande capacidade de armazenamento s u p e r f i c i a l ou subterrâneo, o d i a g r a m a cronológico do caudal médio diár io não apresenta a irregularidade do caso anterior; a relação entre caudais de ponta e o m ó d u l o é então muito m ais baixa.


A curva integral da curva cronológica dos caudais é a curva dos caudais acumulados. Dá, para a secção considerada, e eu cada instante, o volume total de água que passou nessa secção desde a origem dos tempos.

Curva de caudais acumulados As curvas de duração do caudal médio diário sintetizam bem a distribuição de valores do caudal nédio diário, embora não dêem informação sobre a sua sucessão cronológica

Curva de duração média anual do caudal médio diário.


Numa secção de um rio define-se, para cada ano hidrológico, a respectiva curva de duração do caudal médio diário e, para um intervalo de vários anos, a curva de duração média anual do caudal médio diário. Por duração de um dado caudal médio diário num ano hidrológico entende-se o número de dias em que, nesse ano, aquele caudal foi igualado ou excedido. Por duração média anual de um dado caudal médio diário, no intervalo de vários anos, entendese o número médio de dias por ano em que esse caudal foi igualado ou excedido (número total de dias no intervalo de tempo considerado a dividir pelo número de anos) . Uma curva de duração obtém-se marcando em ordenadas os valores do caudal, e em abcissas o número de dias do ano em que esses valores foram igualados ou excedidos A curva de duração media anual do caudal médio diário é muitas vezes designada, mas impropriamente, por curva de duração do caudal médio diário em ano médio. A duração de um dado caudal médio diário em ano médio seria a duração desse caudal num ano fictício em que o valor do caudal médio diário num dado dia do calendário fosse igual à média dos valores do caudal médio nos correspondentes dias dos vários anos. O caudal médio diário com a duração de 180 dias num dado ano é o caudal semi-permanente anual ou mediano anual (correspondente a esse ano). O caudal com a m e s m a d u r a ç ã o média anual num intervalo de vários anos e o caudal semi- per m anent e ou mediano. O m ó d u l o é sem pr e s u p e r i o r ao c a u d a l mediano e tanto mais q uant o m a i s irregular for a d i s t r i b u i ç ã o do caudal médio diário. A comparação das curvas de dur ação média anual do caudal médio diário de diferentes cursos de água portugueses e a simultânea consideração das características das r espect ivas bacias p e r m i t e m o traçado apr oxim ado das correspondentes curvas, para cursos de água em que se não d i s p o n h a de o b s e r va ç õ e s do caudal. A comparação d a q u e l a s curvas, em d i f e r e n t e s secções, é d i f i c u l t a d a pela dif erença dos volumes do escoamento anual médio nas r e f e r i d a s secções, que depende, em cada caso, da área da bacia e do valor do escoamento anual médio expresso em altura de água uniforme sobre a bacia. Para possibilitar essa comparação, recorre-se a curvas de duração do caudal médio diário, expresso em relação ao respectivo módulo, nas quais as ordenadas são os quocientes entre os valores do caudal médio diário e do módulo.


Nas figuras seguintes estão representadas as curvas de duração média anual do caudal médio diário, expresso em relação ao módulo, para doze cursos de água de Portugal, indicando-se ainda as respectivas estimativas do escoamento anual. Estas figuras mostram que a influência pr edom inant e no andamento das curvas de duração m édia anual é a da m é d i a do escoamento anual, expresso em altura. As características geológicas das bacias também influenciam a forma da curva (embora menos que a média do escoamento anual) Se as formações geológicas não p e r m i t e m a constituição de reservas subterrâneas, o regime será do tipo torrencial, com a rápida diminuição do caudal pouco tempo após o fim da precipitação. Se as formações geológicas p e r m i t e m a constituição de reservas subterrâneas que alimentam o rio nos períodos sem pr ecipit ação, a d i s t r i buição do caudal diário será mais r eg ular .


C u r v a s de d u r a ç ã o média a n u a l do c a u d a l médio d i á r i o em rios p o r t u g u e s e s


C u r v a s de d u r a ç ã o m é d i a anual do caudal médio diário em r i o s p o r t u g u e s e s


É d e v i d o às reservas de água subt er r âneas que a curva correspondente à r ibeir a de Raia (escoamento anual m édio de 129 mm) se situa, para um c a u d a l inferior ao modulo, acima ou m u i t o próximo da c u r va correspondente à r i b e i r a de Arade, que apresenta maior escoamento anual m é d i o (230 mm). Com base nas figuras apresentadas é possível estabelecer, de forma aproximada, a curva de duração m é d i a anual do c a u d a l m é d i o d i á r i o num curso de água em Por t ug al Continental em que se não disponha de observações do caudal, desde que se tenha avaliado o escoamento anual médio.


EVAPORAÇÃO E EVAPOTRANSPIRAÇÃO Conceitos e factores A evaporação é o processo pelo qual a água passa do estado líquido para o estado de vapor. A passagem directa da água do estado sólido ao estado de vapor designa-se por sublimação. A transpiração é o processo envolvido na transferência do vapor de água das plantas para a atmosfera. A evapotranspiração é o conjunto dos processos de evaporação e de transpiração. Inclui a transpiração das plantas e a evaporação a partir de superfícies de água e de solos húmidos, da vegetação e de outros obstáculos que interceptam a água. A passagem de água do estado líquido ao estado de vapor faz-se, nos fenómenos hidrológicos, com consumo de energia de origem solar. A evaporação e a evapotranspiração exprimem-se em milímetros (altura de água sobre a superfície). Designa-se por evapotranspiração potencial (ou de referência) a quantidade de água que poderá passar para a atmosfera, directamente ou através das plantas, admitindo o solo se encontra sempre completamente saturado e coberto de vegetação em condições padronizadas (relva). Evapotranspiração real é a quantidade de água que efectivamente passa para a atmosfera sob a forma de vapor, nas condições reais do terreno. Depende não só do valor da evapotranspiração potencial, mas também do tipo de cobertura vegetal, do aprovisionamento em água do solo (que representa a oportunidade para a evapotranspiração) e da própria natureza do solo.


Determinação da evaporação com evaporímetros A avaliação da evaporação pode ser feita por meio de evaporímetros - aparelhos onde se observa e mede a evaporação. Tinas evaporimétricas ou tanques evaporimétricos – usam-se para avaliação da evaporação em lagos:

Tina da classe A (americana) A tina da classe A assenta sobre uma grade de madeira colocada sobre o solo; é construída de chapa de aço galvanizada e tem forma cilíndrica, com 1,219 m (4 pés) de diâmetro e 0,254 m (10 polegadas) de altura

A tina GGI-3000 (soviética) é do tipo enterrado, de forma cilíndrica e fundo cónico, com a área de 3000 cm2 à superfície e uma altura da parte cilíndrica de 0,60 m. O tanque soviético de 20 m2 é do tipo enterrado, cilíndrico, com uma área a superfície de 20 m2 e uma profundidade de 2,00 m.


O valor da evaporação medido nas tinas ou nos tanques deve ser afectado de um coeficiente C, designado por coeficiente da tina ou do tanque. Este coeficiente define-se como a relação entre a evaporação no lago, E, e a evaporação na tina ou no tanque, Et

C=

E Et

O coeficiente de uma tina evaporimétrica é, em geral, referido a uma base anual. O seu valor varia com o clima, sendo maior em zonas húmidas e menor em zonas áridas. O valor médio do coeficiente anual de uma tina classe A é de 0,70 e o de uma tina GGI-3000 é de 0,80.

Os factores que podem influenciar o coeficiente de um evaporímetro de tina (.ou de tanque) são: - o efeito de oásis que consiste na influência do transporte horizontal, de energia calorífica por massas de ar provenientes da zona circundante; - a radiação sobre as paredes e as trocas de calor entre o meio exterior e a tina (água e paredes); - o efeito do bordo da tina na velocidade e turbulência do vento. Estes factores para um mesmo tipo de tina variam com as condições climáticas.


O evaporímetro de Piche é constituído por uns tubo cilíndrico da 25 centímetros de comprimento e 1,5 centímetros de diâmetro, graduado e fechado na extremidade superior; a extremidade inferior é obturada por uma folha circular de papel de filtro normalizado de 30 milímetros de diâmetro a 0,5 milímetros de espessura, fixado por capilaridade e mantido por uma mola.

Evaporímetro de Piche (atmómetro) O aparelho é cheio de água destilada que se vai evaporando progressivamente através do papel de filtro; a diminuição do nível da água no tubo permite calcular a taxa de evaporação (em milímetros por 24 horas, por exemplo). O processo da evaporação está ligado essencialmente ao "deficit" higrométrico do ar. O aparelho é instalado num abrigo, para o proteger da chuva. A relação entre valores médios anuais da evaporação medida num mesmo local, em evaporímetros Piche e em tinas da classe A varia entre cerca de 0,80 e 1,20.


Medição da evapotranspiração com evapotranspirómetros Os evapotranspirómetros (lisímetros) são recipientes contendo solo em que a perda de agua por evapotranspiração é medida pela diferença entre a quantidade de água que atinge o evapotranspirómetro e a que o abandona, sob a forma líquida, pelo fundo e por escoamento à superfície. Um lisímetro é constituído por uma caixa estanque enterrada, de paredes verticais, aberta na parte superior e cheia do solo cuja evaporação se pretende estudar. A superfície do solo é submetida aos agentes atmosféricos e recebe as precipitações que são medidas num pluviómetro. O solo contido no lisímetro é drenado e a água drenada é recolhida num reservatório e medida com um limnímetro. A evapotranspiração do solo durante determinado período pode ser calculada, desde que se conheçam as precipitações ocorridas nesse período, o caudal recolhido por drenagem e a variação da quantidade de água acumulada no lisímetro (balança)

A

finalidade

da

instalação

de

evapotranspirómetros

pode

ser

a

determinação

da

evapotranspiração potencial ou da evapotranspiração em determinadas condições. No primeiro caso, os evapotranspirómetros são cobertos de relva e faz-se adição de água, para que estejam sempre saturados. No segundo caso a cobertura vegetal poderá ser de tipos diversos ou não existir, e poderá ou não proceder-se a adição de água.


Fórmulas empíricas para avaliar a evaporação e a evapotranspiração PENMAN propôs uma fórmula semi-empírica para avaliar a evaporação E de superfícies de água, (milímetros por dia):

E=

∆E m + γ × E a ∆+γ

em que: Em - evaporação equivalente à energia disponível para a evaporação (mm por dia); Ea - função da velocidade do vento V e do défice de saturação (e*a - ea ) do vapor de água à temperatura do ar (mm por dia):

*

E a = (a + bV ) × (ea − ea ) sendo: V = velocidade do vento medida a 2,0 m do solo, expressa em milhas/dia ea* e ea a tensão de saturação e tensão actual do vapor de água à temperatura do ar T - tangente trigonométrica da curva da tensão de saturação do vapor de água em função da temperatura, para a temperatura do ar Ta (mm de Hg °C-1) - constante psicométrica ( = 0,485 mm Hg °C-1) a = 0,35 b = 0,0035 A evaporação equivalente à energia disponível R (cal cm-2 min-1 ) é dada por

Em =

24 × 60 × R L

onde L e o calor latente de evaporação de 0,1 cm3 de água ( 0,59 cal) e R pode ser calculado a partir da expressão


R = Rc (1 − r ) − σTa (0,56) − 0,09 ea ) × (0,10 + 0,90 4

n N

em que: -2

-1

Rc - radiação global (cal cm min ); r - coeficiente de reflexão (para a água r = 0,0 -10

- constante te Stefan-Boltzmann ( c= 0,8132 x 10

-2

-1

-4

cal cm min °K );

Ta - temperatura absoluta do ar (°K ); ea - tensão do vapor de água do ar (mm de Hg); n - número de horas de sol descoberto; N - insolação astronómica. Quando não se disponha de observação directa da radiação global, a sua estimativa pode obterse da insolação (n/N) por meio da equação de regressão estabelecida com base em observações noutros locais (equação de Angstrõm)

Rc = (α + β

n RA N)

em que = 0,18 = 0,55 RA é a radiação extraterrestre (cal cm-2 min-1 ) tabelada em função da latitude (Quadro 6.1). Para a aplicação da fórmula de Penman são necessárias observações de: - radiação global (ou da insolação que permita estimar a radiação global por meio da equação de Angstrõm) , - temperatura e humidade do ar, - velocidade do vento. QUINTELA (1967) apresentou, com base na análise de regressão, equações para avaliar a radiação global a partir da insolação em quatro estações meteorológicas portuguesas:


Porto (Serra do Pilar) Rc/RA =0,18 + 0,66 n/N Coimbra Rc/RA =0,27 + 0,55 n/N Lisboa Rc /RA =0,20 + 0,60 n/N Faro Rc /RA = 0,10 + 0,80 n/N

PRIESTLY e TAYLOR (1972) propuseram a seguinte formula para avaliar a evaporação de superfícies de água

E =α

∆E m ∆+γ

a qual resulta da fórmula de Penman desde que se considere que o seu segundo termo é igual ao primeiro multiplicado por uma constante. O valor de sugerido pelos autores é de 1,26. A evapotranspiração potencial pode ser obtida da evaporação calculada pela fórmula de Penman pela multiplicação por um coeficiente. A fórmula de THORNTHWAITE (1948) é uma das mais divulgadas para avaliar a evapotranspiração potencial com vista à classificação climática e à determinação de dotações de rega. Esta fórmula fornece a evapotranspiração potencial mensal a partir de dois índices: índice térmico mensal (i) e índice térmico anual (I)

t i = ( )1,514 5 I=

12

i

1

em que t é a temperatura media mensal (°C). A evapotranspiração potencial, em cm, para um mês de trinta dias, cada um deste com a insolação astronómica de 12 h; é calculada por

t E = 1,6 × (10 ) a I em que

a = 675 × 10 −9 × I 3 − 77,1 × 10 −6 × I 2 + 17,92 × 10 −3 × I + 492,39 × 10 −3 A evapotranspiração potencial de um dado mês obtêm-se aplicando um factor correctivo ao valor anterior, dependendo esse factor da latitude do local e do número de dias do mes .


TABELA DE INSOLAÇÃO ASTRONÓMICA DIÁRIA, EXPRESSA EM UNIDADES DE 12 H, DE UM MÊS COM 30 DIAS

Mês


TURC, em 1961 (TURC et alia, 1963), estabeleceu uma fórmula para o cálculo da evapotranspiração potencial mensal

E = 0,40

t × ( RC + 50) t + 15

em que é : E - evapotranspiração potencial mensal (mm), t - temperatura média mensal do ar ( °C), RC - radiação global média diária durante o mês (cal cm-2 dia-1). Para o mês de Fevereiro, o valor de 0,40 do coeficiente deve ser substituído por 0,37. Se a humidade relativa do ar tiver durante o mês um valor médio inferior a 50%, o valor da evapotranspiração potencial fornecido pela formula anterior deve ser corrigido do factor

1+

50 − hr 70

em que hr é o valor médio mensal da humidade relativa do ar (%) . Desde que hr seja superior a 50%, pode utilizar--se a fórmula anterior para o cálculo da evapotranspiração potencial em decendios, substituindo o coeficiente 0,40 por 0,13. A fórmula foi estabelecida tendo em conta experiências realizadas em diferentes países sujeitos a climas muito variados (Dinamarca, Marrocos, Iraque, Congo e Ceilão). Como se referiu anteriormente, a radiação global, que só é observada num escasso número de rotações meteorológicas, pode ser estimada a partir da insolação medida e da radiação extraterrestre.


TABELA DA RADIAÇÃO EXTRATERRESTRE (R) -2 -1 (cal cm dia ) Lat.(°)

J

F

M

À

M

J

J

A

S

0

N

D

60N

85

210

405

650

865

970

925

750

510

280

120

55

50

215

355

540

745

905

980

950

820

625

425

260

185

40

365

495

655

815

935

985

965

870

720

550

400

325

30

505

620

750

870

950

975

960

905

800

665

545

675

20

640

730

825

895

930

935

930

910

855

760

665

615

10

760

829

875

895

890

875

880

890

880

849

780

740

0

860

890

895

870

825

795

805

840

880

890

860

845

10S

935

930

895

829

730

695

710

770

850

910

930

930

20

990

945

860

745

635

575

595

680

800

900

965

965

30

1020

930

800

645

515

445

470

575

725

870

985

1035

40

1020

895

720

530

380

305

330

450

625

810

970

1050

50

1005

835

620

400

245

170

195

315

510

735

940

1045

60

975

755

495

260

110

55

75

180

330

640

890

Í030


Fórmula de BLANEY-CRIDDLE A fórmula de Blaney-Criddle para o cálculo da Evapotranspiração potencial é da forma:

E p = p (0,46T + 8)

Ep - Evapotranspjração potencial num dado mês, (mm/dia). T - Temperatura média do mês considerado (°C). p - Valor médio diário do número de horas de sol, em percentagem do valor anual, para o mês em causa. VALORES MÉDIOS DIÁRIOS DO NÚMERO DE HORAS DE SOL, EM PERCENTAGEM DO VALOR ANUAL, PARA DIFERENTES LATITUDES Latitude

Norte Sul (*)

Jan. Jul.

Fev. Ago.

Mar. Set.

Abr. Out.

Mai. Nov.

Jun. Dez.

Jul. Jan.

Ago. Fev.

Set. Mar.

Out. Abr.

Nov. Mai.

Dez. Jan

60°

0.15

0.20

0.26

0.32

0.38

0.41

0.40

0.34

0.28

0.22

0.17

0.13

58

0.16

0.21

0.26

0.32

0.37

0.40

0.39

0.34

0.28

0.23

0.18

0.15

56

0.17

0.21

0.26

0.32

0.36

0.39

0.38

0.33

0.28

0.23

0.18

0.16

54

0.18

0.22

0.26

0.31

0.36

0.38

0.37

0.33

0.28

0.23

0.19

0.17

52

0.19

0.22

0.27

0.31

0.35

0.37

0.36

0.33

0.28

0.24

0.20

0.17

50

0.19

0.23

0.27

0.31

0.34

0.36

0.35

0.32

0.28

0.24

0.20

0.18

48

0.20

0.23

0.27

0.31

0.34

0.36

0.35

0.32

0.28

0.24

0.21

0.19

46

0.20

0.23

0.27

0.30

034

0.35

0.34

0.32

0.28

0.24

0.21

0.20

44

0.21

0.24

0.27

030

0.33

0.35

0.34

0.31

0 .28

0.25

022

0.20

42

0.21

0.24

0.27

030

0.33

0.34

0.33

0.31

0.28

0.25

0.22

0.21

40

0.22

0.24

0.27

0 .30

0.32

0.34

0.33

0 .31

0.28

0.25

0.22

0.21

35

0.23

0.25

0.27

0.29

0.31

0.32

0.32

0.30

0.28

0.25

0.23

0.22

30

0.24

0.25

0.27

0.29

0.31

0.32

0.31

0.30

0.28

0.26

0.24

0.23

25

0.24

0.26

0.27

0.29

0.30

0.31

0.31

0.29

0.28

0.26

0.25

0.24

20

0.25

0.26

0.27

0.28

0.29

0.30

0.30

0.29

0.28

0.26

0.25

0.25

15

0.26

0.26

0.27

0.28

0.29

0.29

0.29

0.29

0.28

0.27

0 .26

0.25

10

0.26

0.27

0.27

0.28

0.28

0.28

0.29

0.28

0 .28

0.27

0 .26

0.26

5

0.27

0.27

0.27

0.28

0.28

0.28

0.28

0.28

0.28

0.27

0.27

0.27

6

0.27

0.27

0.27

0.27

0.27

0.27

0.27

0.27

0.27

0.27

0.27

0 .27


HUMIDADE DO SOLO E ÁGUA DO SUBSOLO (OU DAS RESERVAS SUBTERRÂNEAS) O processo de escoamento Quando se inicia uma precipitação, parte da água pode ser retida pela cobertura vegetal e por outros obstáculos que a impeçam de atingir o solo, voltando à atmosfera sob a forma de vapor. Chama-se a este fenómeno intercepção. Se a precipitação se prolonga no tempo, a água atinge o solo e fica inicialmente retida nas depressões do terreno, iniciando-se a infiltração. Se a precipitação continua, ultrapassando a capacidade das depressões do terreno e da infiltração, a água transborda das depressões e forma uma película que se escoa para a rede hidrográfica, dando origem ao escoamento superficial. Designa-se por retenção superficial a parcela de água que não se infiltra nem dá origem a escoamento superficial. Inclui a água interceptada, a água armazenada nas depressões que não se infiltra e a que passa directamente ao estado de vapor durante a precipitação Designa-se por detenção superficial a água do escoamento superficial em trânsito sobre o terreno, que representa um armazenamento temporário, rapidamente variável no tempo. No que respeita à água que se infiltra no solo, definem-se: zona de água do solo – corresponde à camada de solo superficial, na qual a água retida por forças de atracção molecular pode ainda ser reenviada para a atmosfera por evaporação ou pela transpiração das plantas. zona intermédia – situa-se imediatamente abaixo da zona de água do solo. A água desta zona encontra-se retida por acção de forças de atracção molecular, mas já não pode voltar à atmosfera por evaporação ou transpiração; zona de saturação – camada inferior, na qual os vazios do terreno estão totalmente preenchidos com água (manto freático). A água desta zona designa-se por água do subsolo, ou das reservas subterrâneas; franja capilar – situada imediatamente acima da zona de saturação, corresponda e uma pequena camada onda a água sobe por acção da capilaridade; À quantidade de água retida no solo pelas forças de atracção molecular chama-se capacidade de campo. Quando se inicia uma precipitação e a zona de água do solo apresenta défice de água relativamente à capacidade de campo, toda a água infiltrada fica retida naquela zona. À medida que aumenta o teor de água na zona de água do solo, velocidade de infiltração diminui e aumenta a quantidade de água que se escoa à superfície do terreno para os cursos de água. Quando a zona de água do solo atinge a capacidade de campo, a água infiltrada deixa de ser aí retida e circula para maiores profundidades por acção da gravidade, podendo reaparecer à superfície noutro local, com algum diferimento no tempo, antes da atingir a camada de saturação – escoamento subsuperficial - ou atingir a zona de saturação e aumentar as reservas de água subterrâneas, as quais alimentarão também os cursos de água com diferimento no tempo. O escoamento nos cursos de água deve-se assim ao escoamento superficial, ao escoamento subsuperficial e ao escoamento subterrâneo.


Quando cessa a precipitação termina rapidamente o escoamento superficial, sendo o curso de água alimentado pelos escoamentos subsuperficial e subterrâneo, os quais se vão esgotando com o passar do tempo, rapidamente o primeiro e mais lentamente o segundo.

HUMIDADE DO SOLO A humidade do solo é a agua retida no solo, acima da zona de saturação, pelas forças de atracção molecular. A água armazenada sob a forma de humidade do solo, é submetida posteriormente à evapotranspiraçao. O armazenamento de humidade no solo, contribuindo para a evapotranspiraçao real, é responsável pela diminuição do escoamento. A evaporação de um solo nu provoca a sua secagem, mas somente numa profundidade reduzida, em virtude de a camada superficial, que fica em equilíbrio de humidade com a atmosfera, funcionar como um tampão e de o movimento ascensional da ãgua no solo, nas fases liquida ou de vapor, ser, nessas condições, muito lento. No caso do solo estar coberto de vegetação, a secagem pelo efeito de transpiração prossegue graças ã absorção radicular e o teor de humidade do solo pode reduzir-se ate ao coeficiente de emurchecimento, à parte alguns centímetros superiores do solo, em que pode ainda ser mais baixo, devido ã evaporação directa. A espessura da zona de secagem varia com a espécie vegetal e o tipo de solo. Para plantas herbáceas anuais é da ordem de 0,5 a 0,6 m, podendo no entanto atingir 1,5 m no fim duma estação particularmente seca; para pomares e em solos profundos pode avaliar-se em mais de 2 m.


O coeficiente de emurchecimento (alguns autores acrescetam-lhe a designação permanente) é a percentagem de humidade dum solo quando as plantas atingem o estado de emurchecimento permanente. Este coeficiente é praticamente independente da natureza da planta e depende do tipo de solo. Define-se como capacidade utilizável de um solo a diferença entre a capacidade de campo e o coeficiente de emurchecimento. A. capacidade de campo é a percentagem de humidade que um solo, inicialmente saturado, retém depois de ter praticamente cessado a drenagem da água pela acção da gravidade. O coeficiente de emurchecimento e a capacidade de campo são constantes do solo que correspondem a condições nao rigorosamente definidas e exprimem-se pela relação, em percentagem, entre pesos de agua e de solo seco; De modo geral, a capacidade de campo e o coeficiente de emurchecimento variam de um solo para outro, no mesmo sentido; para os solos de textura média a capacidade utilizável é da ordem de 10%. Assim, é de cerca de 100 mm a altura de água equivalente à capacidade utilizável de 10% para uma espessura de 0,70 m de um solo com uma densidade de 1,5; é de 375 mm, para a espessura de 2,5 m. A ordem de grandeza destes valores justifica a influência exercida no balanço hidrológico pelo armazenamento sob a forma de humidade do solo, a qual se traduz por forte redução da quantidade de água que atinge a rede hidrográfica. Com efeito, aquele armazenamento, por um lado, põe a água à disposição da evapotranspiração nos períodos sem precipitação e, por outro lado, provoca um escoamento muito pequeno quando a precipitaçao se segue a uma época seca em que aquele armazenamento se tenha reduzido substancialmente. A dist r ibuição na ver t ical do teor de humidade de um solo condiciona a capacidade de infiltração, f, a qual, por sua vez, associada à intensidade da precipitação, i, determina a repartição entre quantidade de água infiltrada, F, e escoamento superficial. Durante um acontecimento pluvioso, a capacidade de infiltração, f, diminui a partir do seu valor máximo no inicio, f0, e tende para o limite f correspondente a saturação do solo. Horton em 1933 propôs uma lei de variação de f do tipo

f = f C + ( f 0 − f C )e − kt que se traduz pela Fig. 8.1 e na qual é: e = base das logaritmos neperianos; k = constante empírica; t = tempo contado a partir do inicio da precipitação .


Curva de capacidade de infiltração Consoante a intensidade de precipitação excede ou nao a capacidade de infiltração i>f ou i<f há escoamento superficial e infiltração ou só infiltração (sem contar com o escoamento produzido pela precipitação que atinge directamente a rede hidrográfica). Água do subsolo ou das reservas subterrâneas Por água do subsolo ou das reservas subterrâneas entende-se a agua situada na zona de saturação, onde os vazios da rocha (esta tomada no sentido mais lato) estão preenchidos por água sob pressão hidrostática. As reservas de água subterrânea actuam como regulador do escoamento dos cursos de água. Durante os períodos de chuva, a água, que se infiltra e alimenta as reservas subterraneas, é subtraída aos cursos de água, podendo ser-lhes restituída com diferimento no tempo A capacidade de uma rocha para permitir a circulação da água é designada por permeabilidade; uma formação porosa (porosidade intersticial) em que a circulação se faz através de pequenos canalículos tem permeabilidade em pequeno, fazendo--se normalmente o escoamento em regime laminar; uma formação em que a circulação se faz através de litoclases (em regime laminar ou turbulento) ou através de cavidades de dimensões apreciáveis (em regime turbulento no caso dos calcários carsificados) tem permeabilidade em grande. As leis do movimento laminar nos meios porosos derivam da lei de Darcy. As águas subterrâneas são tratadas na disciplina de Hidrologia de Aguas Subterrâneas, pelo que se faz referência a seguir unicamente a um aspecto muito ligado às águas superficiais. Trata-se da variação do caudal dos rios com o tempo durante as épocas secas, em que o caudal provém do esgotamento das reservas subterrâneas (cuja representação gráfica recebe a designação de curva de esgotamento). Tem sido propostas para traduzir aquelas curvas equações do tipo


Q1 = Q0 × e −αt

Q1 =

Q0 (1 + β × t ) 2

em que Q e Q0 são os valores do caudal respectivamente no início do esgotamento e decorrido um período t após aquele inicio, e

e

são parâmetros.

A primeira -equação corresponde ao esvaziamento de um manto artesiano, homogéneo, em que o comprimento da percolação se pode c o n s i d e r a r constante (SHOELLER, 1962) . O valor de

varia na razão d i r e c t a do c o e f i c i e n t e de permeabilidade e na r a z ã o

i n v e r s a do rendimento e s p e c i f i c o e das dimensões do manto, sendo o . rendimento específico a relação, em percentagem, entre o volume de água que uma amostra de rocha, depois de saturada, deixa drenar sob a acção da gravidade e o volume da amostra. A segunda equação corresponde ao esvaziamento de um manto f r e á t i c o , homogéneo, com fundo h o r i z o n t a l , ligeiramente abaixo do nível de água no canal alimentado pelo manto (SCHOELLER, 1962; ROCH.E, 1963). Numa bacia hidrográfica e x i s t i r ã o , em geral, v á r i o s mantos aquíferos e não um manto único. Se a lei do esgotamento dos diferentes mantos f o r exponencial com o mesmo valor de , o caudal do rio decrescerá segundo uma lei exponencial a que corresponderá aquele valor de . Embora os modelos sejam demasiado esquemáticos para corresponder ãs situações reais, temse verificado em muitos casos que as equações referidas traduzem a lei de variação do caudal nos rios em períodos de esgotamento das reservas subterrâneas (CASTANY, 1963). A lei exponencial tem ainda sido adoptada em vários modelos de balanços hídricos. As duas equações serão representadas por rectas em gráficos em que seja marcado o tempo numa escala de graduação linear e o caudal numa escala funcional (logarítmica para a primeira equação e proporcional ao inverso da raiz quadrada do caudal para a segunda). A partir do conhecimento da equação da curva de esgotamento pode fazer-se uma estimativa do armazenamento subterrâneo que dará origem a escoamento no curso de água. Aquele armazenamento no início do esgotamento das reservas (admitindo que nao são afectadas pela evapotranspira-çao) e o armazenamento que subsiste ao fim do tempo t após aquele início podem calcular-se pelas expressões ∞

V0 = Qdt 0


Vt = Qdt t

e, para os dois tipos de equação anterior, vem

V0 =

V0 =

Q0

α

Q0

β

Vt =

;

Vt =

Q0 × e −αt

α

=

Qt

α

Q0 (1 + β × t )Qt = β (1 + β × t ) α

Segundo a lei exponencial anterior, o caudal num dado instante é proporcional ao armazenamento superficial nesse instante e os volumes escoados durante os sucessivos intervalos de tempo são proporcionais aos armazenamentos no início desses intervalos

H i = Vi − Vi +1 = Vi (1 − e −α∆t ) em que os índices i e i+1 se referem, respectivamente, aos instantes no início, ti.,e no fim, de cada intervalo t i+1 =t i + t


INSTITUTO SUPERIOR DE ENGENHARIA DE LISBOA MESTRADO EM ENGENHARIA CIVIL

CONCEITOS BÁSICOS DE PROBABILIDADES E ESTATÍSTICA UTILIZADOS EM HIDROLOGIA

INTRODUÇÃO Os fenómenos hidrológicos dependem de leis físicas, mas são sujeitos à acção de múltiplos factores fortuitos (casuais), sendo necessário em muitos casos recorrer à Teoria das Probabilidades e aos Métodos Estatísticos, para prever o seu comportamento. Teoria das probabilidades - para construir um modelo de distribuição dos resultados das observações desses fenómenos. Métodos estatísticos - para inferir, com maior ou menor incerteza, os resultados que poderão ocorrer no futuro a partir das observações do fenómeno, e obter uma medida dessa incerteza


VARIÁVEL ALEATÓRIA, FREQUÊNCIA E PROBABILIDADE Considere-se uma experiência constituída pelo lançamento de um dado perfeito (sem vícios). Neste caso, conhece-se o conjunto dos resultados possíveis da experiência (1,2,3,4,5,6), mas desconhece-se sempre à partida qual o resultado que ocorrerá em cada execução da experiência. Chama-se experiência aleatória a uma experiência em que: - é conhecido o conjunto de todos os resultados possíveis; - não é possível conhecer, antes da experiência, o resultado que ocorrerá. Chama-se frequência de um dado acontecimento (saída da face 6, por exemplo): - quociente entre o n.º de vezes que ele ocorre pelo nº total de repetições da experiência. Chama-se probabilidade de um dado acontecimento: - limite para que tende a frequência do acontecimento quando o nº de repetições tende para o infinito Ao conjunto

dos resultados possíveis da experiência (1,2,3,4,5,6) chama-se população (ou

universo). Amostra da população

é qualquer arranjo finito de elementos de

. Os elementos de uma

amostra designam-se por observações Ao número de observações que constituem a amostra chama-se tamanho ( ou dimensão ou comprimento) da amostra Os resultados da experiência, cujos valores se desconhecem à partida, constituem uma variável aleatória Uma variável aleatória diz-se discreta se só pode tomar valores descontínuos: por exemplo, o número de dias que chove em cada ano. Uma variável aleatória diz-se contínua quando pode tomar qualquer valor x dento de um intervalo de valores, limitado ou não: por exemplo, a precipitação média anual num posto udométrio. DISTRIBUIÇÕES DE FREQUÊNCIA


Para resumir grandes quantidades de dados é usual distribui-los em classes e determinar o número de indivíduos pertencentes a cada classe, que se designa por frequência absoluta da classe. A razão entre a frequência da classe e a frequência total chama-se frequência relativa, sendo a soma de todas as frequências relativas igual a 1. À distribuição dos dados em classes com as respectivas frequências chama-se distribuição de frequência. A representação gráfica de uma distribuição de frequências designa-se por histograma.

Histograma da precipitação anual (mm), num posto udométrico, no período de 1914 a 2000.

FUNÇÕES DE DISTRIBUIÇÃO E DE DURAÇÃO


Suponha-se que se dispõe de uma amostra com um grande número n de observações de um dado fenómeno X (por exemplo a precipitação anual numa bacia hidrográfica), e classifiquem-se os seus valores por ordem crescente: Amostra: x1, x2, x3, x4, x5, ..., xi, ..., xn

(xn é valor mais elevado da amostra)

A frequência de não ser ultrapassado o valor do acontecimento de ordem i da amostra será i/n.

F ( xi ) =

i n

i é n.º de ordem dos elementos da amostra classificados por ordem crescente n é nº total de elementos da amostra A função assim definida chama-se função de distribuição empírica (ou função de frequência empírica), e é designada por F(x):

F ( x) = P( X ≤ x) (probabilidade de X

x)

Se os valores da amostra forem classificados por ordem decrescente, define-se a frequência de ser igualado ou excedido o valor x do acontecimento de ordem i, como:

G ( x) = P( X ≥ x) (probabilidade de X

x)

A função G{x) é conhecida por função de duração empírica. Note-se que quando aplicamos este conceito a variáveis aleatórias discretas, a soma das funções F(x) + G(x) é sempre superior a 1. por exemplo, ordenem-se 10 valores por ordem crescente. A probabilidade de não ultrapassar o valor de ordem 7 é 7/10. Ordenem-se agora os valores por ordem decrescente. o mesmo valor ocupará a posição 4, pelo que a probabilidade de ser igualado ou excedido é de 4/10. A soma será 7/10 + 4/10 = 1,1 1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

10

9

8

7

6

5

4

3

2

1


Por isso, na prática, para o cálculo da “probabilidade empírica”, em vez de F ( xi ) =

F ( xi ) =

i utiliza-se n

i (pode demonstrar-se que esta expressão dá o valor médio da função de n +1

distribuição nas diversas amostras retiradas de uma mesma população). exemplo: Amostra: Precipitações mensais no mês de Janeiro entre 1978 e 1997 (20 anos)

78

79

80 81 82

83

84 85 86 87

88 89 90

91

92 93 94

5

96

97

158. 120. 166. 80. 162. 126. 274. 55. 10. 173. 144. 78. 148. 114. 188. 82. 186. 233. 138. 194. 4 1 8 8 1 2 4 6 4 7 7 4 6 8 0 1 6 6 9 2

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 10. 55. 78. 80. 82. 114. 120. 126. 138. 144. 148. 158. 162. 166. 173. 186. 18 194. 233. 274. 4 6 4 8 1 8 1 2 9 7 6 4 1 8 7 6 8 2 6 4 x15 = 173,7 mm P (x)

173.7 mm = 15/21 = 0,71

No caso de uma variável aleatória continua define-se densidade de probabilidade como sendo a função:

f ( x) = limδx → 0

δF ( x) dF ( x) = δx dx

donde resulta a função de distribuição

F ( x) =

x

f ( x)dx −∞

e a função de duração

G ( x) =

+∞

f ( x)dx x

donde

F ( x) + G ( x) =

+∞

f ( x)dx = 1

−∞

Nas figuras seguintes mostra-se um exemplo de funções de densidade, distribuição e duração, de uma variável aleatória contínua.


FUNÇÃO DENSIDADE DE PROBABILIDADE

FUNÇÃO DENSIDADE DE PROBABILIDADE

FUNÇÕES DE DITRIBUIÇÃO E DE DURAÇÃO DE PROBABILIDADE

FUNÇÕES DE DITRIBUIÇÃO E DE DURAÇÃO DE PROBABILIDADE

Para uma variável contínua A probabilidade de X estar compreendido entre x e x+ x é:

P ( x ≤ X ≤ x + δx) = f ( x)dx A probabilidade de X tomar um valor compreendido entre a e b é:

P(a ≤ X ≤ b) = F (b) − F (a) =

b

f ( x)dx a


PERÍODO DE RETORNO E RISCO Período de retorno Para valores anuais das variáveis hidrológicas é mais cómodo associar a um dado valor x dessa variável o período de retorno T(x), em vez da probabilidade de ocorrência F(x)

Sendo G(x) a probabilidade de o valor x da variável X ser ultrapassado num dado ano G(x) = 1- F(x), define-se como período de retorno (ou intervalo de recorrência), T(x), expresso em anos, o inverso dessa probabilidade:

T ( x) =

1 1 = G ( x) 1 − F ( x)

O período de retorno de um determinado valor x traduz o número de anos que separa, em média, as ocorrências de valores da variável superiores a x. É indispensável ter bem presente que o conceito de período de retorno não está associado a qualquer ideia de repetição cíclica. Assim, podem ocorrer em dois anos sucessivos valores da variável que ultrapassem o valor x100 correspondente a um período de retorno de 100 anos; essa ocorrência é muito pouco provável, mas não é impossível. O que define o período de retorno é o intervalo médio que separaria a ocorrência de valores da variável superiores a x100 se houvesse a possibilidade de dispor de um número de anos de observação da variável suficientemente longo. Risco Sendo F(x) a probabilidade do valor x não ser ultrapassado num dado ano, pode definir-se a probabilidade de x não ser ultrapassado em n anos sucessivos por:

1 F1 ( x) × F2 ( x) × F3 ( x) × ⋅ ⋅ ⋅ × Fn ( x) = F n ( x) = (1 − ) n T Define-se como risco, R, do acontecimento x ser excedido, a probabilidade de que x seja excedido pelo menos uma vez em n anos sucessivos:


1 R ( x) = 1 − F n ( x) = 1 − (1 − ) n T Sendo R função de T e de n, pode construir-se uma tabela que relacione estes valores:

Exemplo: Determinar o período de retomo da cheia para que deve ser dimensionado um dique de protecção marginal, se desejarmos que nos próximos 10 anos o risco (probabilidade) de ser galgado não exceda 0,20. Dado que n = 10 e R = 0,20, do Quadro anterior vem T = 45 anos.

PARÂMETROS ESTATÍSTICOS DE POPULAÇÕES E AMOSTRAS


Os principais parâmetros que se consideram nas distribuições estatísticas e as expressões para o cálculo dos valores correspondentes em amostras, são os seguintes a) Medidas da tendência central Média (valor esperado ou média aritmética) É definida em distribuições contínuas por:

µ=

+∞

xf ( x)dx −∞

Numa amostra finita com n elementos é definida por: n

x=

i =1

xi

n

Mediana ( ) Numa distribuição contínua é definida pela equação: µ~

f ( x)dx =

+∞

F ( µ~ ) = G ( µ~ )

f ( x)dx µ~

−∞

Numa amostra finita o seu valor é dado por xm, tal que:

m i =1

P ( xi ) =

n i=m

P ( xi )

Moda (ou valor mais frequente) Corresponde ao máximo da função densidade de probabilidade. Obtém-se fazendo:

df ( x) =0 dx Numa amostra finita o seu valor x é tal que:

P ( x ) = máxP( xi ) b) Medidas de dispersão


Variância (momento central de 2ª ordem) Para uma função contínua, a variância define-se como: +∞

σ = ( x − µ x ) 2 f ( x)dx 2

−∞

Numa amostra o seu valor é calculado por: n

s2 =

i =1

( xi − x ) 2

n −1

Desvio padrão ( ) É a raiz quadrada da variância: n

σ = σ2

s′ =

i =1

( xi − x ) 2

n −1

n

=

i =1

xi

2

n −1

(

n i =1

xi ) 2

n(n − 1)

coeficiente de variação (cv) É o quociente entre o desvio padrão e a média

ηv =

σ µ

cv =

s x

O Cv relativiza (e adimensiona) o valor do desvio padrão, dividindo-o pelo valor médio da grandeza. Na figura seguinte pode-se observar a diferença entre duas distribuições do mesmo tipo com a mesma média, mas desvio padrão (e consequentemente coeficiente de variação) diferente.

c) Medidas de assimetria


Assimetria ( 3) (momento central de 3ª ordem) É definida por: +∞

µ 3 = ( x − µ x ) 3 f ( x)dx −∞

Numa amostra a seu valor é calculado por:

m3 =

n (n − 1)(n − 2)

n i =1

( xi − x ) 3

coeficiente de assimetria É definido por:

γ =

µ3 σ3

e numa amostra por:

Ca =

m3 s3

Um coeficiente de assimetria nulo indica uma distribuição simétrica, com coincidência da média e da mediana: = , como se indica na figura seguinte:

Um coeficiente de assimetria positivo indica uma distribuição com assimetria positiva, em que o valor da média é superior ao da mediana:

> .

Um coeficiente de assimetria negativo indica uma distribuição com assimetria negativa, em que o valor da média é inferior ao da mediana: < . MODELOS DE DISTRIBUIÇÕES (LEIS DE PROBABILIDADE)


Existem várias funções de distribuição (também conhecidas como leis de probabilidade), que procuram descrever as frequências dos resultados experimentais. Para esta disciplina de Hidrologia interessam-nos as seguintes leis de distribuições contínuas: - distribuição normal (Gauss) - distribuição logarítmico-normal (Galton) - distribuição de Gumbel - lei de Pearson III. Distribuição normal (ou lei de Gauss) É a distribuição estatística mais comum e importante. Adapta-se bem a um grande número de fenómenos naturais, nomeadamente alguns parâmetros hidrológicos, como por exemplo a precipitação anual e o caudal médio anual. Esta lei de distribuição estabelece que os valores mais frequentes (isto é, aos quais correspondem as maiores probabilidades) se encontram em torno da média da variável aleatória; quanto mais afastados os valores estão da média, menos frequentes são. Uma variável aleatória X tem uma distribuição normal se a função de densidade de probabilidade é dada por:

f ( x) =

em que os parâmetros µ e

1

σ 2π

e

( x− µ )2 2σ 2

são, respectivamente, a média e o desvio padrão da distribuição.

Esquematicamente, esta distribuição tem uma curva de densidade de probabilidade em forma de sino, simétrica em torno da média, com assintota horizontal no eixo das abcissas.

f(x)

σ µ : média σ: desvio padrão

µ

x

Sendo a lei normal uma lei simétrica, é nulo o seu coeficiente de assimetria. A função de distribuição é o integral da função de densidade de probabilidade:


F ( x) =

1

σ 2π

x

e

( x−µ )2 2σ 2

dx

−∞

Na figura seguinte mostra-se a curva de densidade de probabilidade da lei normal e a respectiva função de distribuição, para algumas combinações de e ². O parâmetro

"localiza” a curva sobre o eixo dos x e o parâmetro

Considerando uma variável u = toma a forma:

x−µ

σ

define a "forma” da curva.

(chamada variável reduzida), a função de distribuição


F ( x) = ϕ (u ) =

u

1 2π

e

u2 2

du

−∞

Distribuição normal padrão é a distribuição normal com média nula e desvio-padrão unitário, isto é,

= 0 e

= 1 (na figura anterior corresponde às curvas de linha contínua e em cor

vermelha). Esta distribuição normal padrão pode ser tabelada, com os valores de (u) em função de u, permitindo assim calcular de forma expedita o valor de F(x) (probabilidade de a variável X tomar um valor

x), desde que se possam estimar valores para a média µ e para o desvio padrão , a

partir da amostra. A estimativa x da média µ e a estimativa s’ do desvio padrão

da distribuição são calculadas a

partir dos valores da amostra por: n

x=

xi

1

n

n

s' =

( x i − x )2

1

n −1

Em vez de tabelas, também pode ser utilizado o cálculo numérico, utilizando uma expressão que fornece o valor aproximado de (u):

ϕ (u ) = 1 − f (u )(0,4361836t − 0,1201676t 2 + 0,9372980t 3 )

f (u ) =

t=

1 2π

e

u2 2

1 1 + 0,33267 u

FUNÇÃO DE DISTRIBUIÇÃO DA LEI NORMAL (µ = 0; VALORES DE (u) = F(x)

= 1)


u 0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 1,1 1,2 1,3 1,4 1,5 1,6 1,7 1,8 1,9 2,0 2,1 2,2 2,3 2,4 2,5 2,6 2,7 2,8 2,9 3,0 3,1 3,2 3,3 3,4

0,00 0,5000 0,5398 0,5793 0,6179 0,6554 0,6915 0,7257 0,7580 0,7881 0,8159 0,8413 0,8643 0,8849 0,9032 0,9192 0,9332 0,9452 0,9554 0,9641 0,9713 0,9772 0,9821 0,9861 0,9893 0,9918 0,9938 0,9953 0,9965 0,9974 0,9981 0,9987 0,9990 0,9993 0,9995 0,9997

0,01 0,5040 0,5438 0,5832 0,6217 0,6591 0,6950 0,7291 0,7611 0,7910 0,8186 0,8438 0,8665 0,8869 0,9049 0,9207 0,9345 0,9463 0,9564 0,9649 0,9719 0,9778 0,9826 0,9864 0,9896 0,9920 0,9940 0,9955 0,9966 0,9975 0,9982 0,9987 0,9991 0,9993 0,9995 0,9997

0,02 0,5080 0,5478 0,5871 0,6255 0,6628 0,6985 0,7324 0,7642 0,7939 0,8212 0,8461 0,8686 0,8888 0,9066 0,9222 0,9357 0,9474 0,9573 0,9656 0,9726 0,9783 0,9830 0,9868 0,9898 0,9922 0,9941 0,9956 0,9967 0,9976 0,9982 0,9987 0,9991 0,9994 0,9995 0,9997

0,03 0,5120 0,5517 0,5910 0,6293 0,6664 0,7019 0,7357 0,7673 0,7967 0,8238 0,8485 0,8708 0,8907 0,9082 0,9236 0,9370 0,9484 0,9582 0,9664 0,9732 0,9788 0,9834 0,9871 0,9901 0,9925 0,9943 0,9957 0,9968 0,9977 0,9983 0,9988 0,9991 0,9994 0,9996 0,9997

0,04 0,5160 0,5557 0,5948 0,6331 0,6700 0,7054 0,7389 0,7704 0,7995 0,8264 0,8508 0,8729 0,8925 0,9099 0,9251 0,9382 0,9495 0,9591 0,9671 0,9738 0,9793 0,9838 0,9875 0,9904 0,9927 0,9945 0,9959 0,9969 0,9977 0,9984 0,9988 0,9992 0,9994 0,9996 0,9997

0,05 0,5199 0,5596 0,5987 0,6368 0,6736 0,7088 0,7422 0,7734 0,8023 0,8289 0,8531 0,8749 0,8944 0,9115 0,9265 0,9394 0,9505 0,9599 0,9678 0,9744 0,9798 0,9842 0,9878 0,9906 0,9929 0,9946 0,9960 0,9970 0,978 0,9984 0,9989 0,9992 0,9994 0,9996 0,9997

0,06 0,5239 0,5636 0,6026 0,6406 0,6772 0,7123 0,7454 0,7764 0,8051 0,8315 0,8554 0,8770 0,8962 0,9131 0,9279 0,9406 0,9515 0,9608 0,9686 0,9750 0,9803 0,9846 0,9881 0,9909 0,9931 0,9948 0,9961 0,9971 0,9979 0,9985 0,9989 0,9992 0,9994 0,9996 0,9997

0,07 0,5279 0,5675 0,6064 0,6443 0,6808 0,7157 0,7486 0,7794 0,8078 0,8340 0,8577 0,8790 0,8980 0,9147 0,9292 0,9418 0,9525 0,9616 0,9693 0,9756 0,9808 0,9850 0,9884 0,9911 0,9932 0,9949 0,9962 0,9972 0,9979 0,9985 0,9989 0,9992 0,9995 0,9996 0,9997

0,08 0,5319 0,5714 0,6103 0,6480 0,6844 0,7190 0,7517 0,7823 0,8106 0,8365 0,8599 0,8810 0,8997 0,9162 0,9306 0,9429 0,9535 0,9625 0,9699 0,9761 0,9812 0,9854 0,9887 0,9913 0,9934 0,9951 0,9963 0,9973 0,9980 0,9986 0,9990 0,9993 0,9995 0,9996 0,9997

0,09 0,5359 0,5753 0,6141 0,6517 0,6879 0,7224 0,7549 0,7852 0,8133 0,8389 0,8621 0,8830 0,9015 0,9177 0,9319 0,9441 0,9545 0,9633 0,9706 0,9767 0,9817 0,9857 0,9890 0,9916 0,9936 0,9952 0,9964 0,9974 0,9981 0,9986 0,9990 0,9993 0,9995 0,9997 0,9998

Para valores negativos de u, utilizar o complemento aritmético para 1 dos valores de (u) correspondentes ao valor positivo: (-u) = 1 – (u) Ex.:

(-1) = 1 –

Para valores de negativo.

(1) = 1 - 0,8413 = 0,1587

(u) < 0,5, calcular 1 -

(u), ler o valor de u e afectar esse valor de sinal

Ex.: (u) = 0,0668; 1 - (u) = 0,9332; u = - 1,5 EXEMPLOS TÍPICOS DE APLICAÇÃO DA LEI NORMAL


Dispondo, por exemplo, de uma série de valores da precipitação anual: A - Calcular a probabilidade de ocorrência de uma precipitação anual x

750 mm

1º - calcula-se a média e o desvio padrão da amostra: n

x=

n

xi

s′ =

1

n

2º – calcula-se u =

i =1

( xi − x ) 2

n −1

n

=

i =1

xi

2

n −1

(

n i =1

xi ) 2

n(n − 1)

750 − x s'

3º – lê-se na tabela (u)=F(x) 4º – Como se pretende a probabilidade de (X

x), calcula-se G(X) = 1-F(x)

B – Calcular o valor da precipitação anual com 1% de probabilidade de ser excedida 1º - G(x) = 0,01

F(x) = 0,99

2º - da tabela u = 2,3263 3º - 2,3263 =

x−x s'

x = 2,3263 × s ' + x

C – Calcular o valor da precipitação anual com um risco de 5% de ser excedido 1 vez em 50 anos Se R = 1 − (1 −

1 n ) T

1 − (1 − R )

1

1º - T ( x) =

1 − (1 − 0,05) 2º - T ( x) =

1 50

1 1 − F ( x)

x−x s'

1 n

= 975anos

F ( x) = 1 −

3º - da tabela F(x)= 0,9988 4º - 3,04 =

1

T=

1 1 = 1− = 0,9988 T ( x) 975

u = 3,04

x = 3,04 × s ' + x

Distribuição logarítmico-normal (Galton) Uma variável segue a lei de Galton ou lei logarímico-normal, quando a sua transformada y, definida por y = log x apresentar uma distribuição normal.


A função de distribuição da variável X é

F ( x) =

y

1

σ y 2π

e

( y−µ y )2 2σ y 2

dy

−∞

Esta variável X poderá tomar valores entre zero e correspondentes ao campo da variável transformada (- , + ), sendo a variável normal reduzida definida por:

u=

y − µy

σy

A lei logarítmico-normal pode ser representada, por uma recta num gráfico designado por logaritmico-normal, com o eixo das probabilidades de graduação normal e o segundo eixo de graduação logarítmica, em que se marca x. Os estimadores M e S dos parâmetro n

M =

i =1

log xi n

y

e

y

têm as expressões seguintes: n

S=

i =1

log 2 xi n −1

( −

n i =1

log xi ) 2

n(n − 1)

e a estimativa x de um valor de probabilidade F(x) é tal que

log x = M + uS em que u é o valor da variável reduzida normal correspondente à probabilidade F(x). Em resumo, a aplicação da lei logarítmico-normal aos valores de uma amostra da variável X coincide com a aplicação da lei normal aos logaritmos daqueles valores.


Lei de Gumbel A lei de Gumbel tem sido adoptada para representar a distribuição dos valores máximos anuais do caudal de ponta de cheia (ou do caudal máximo diário anual) ou de precipitações intensas com determinada duração. A função de distribuição é da forma: −0 , 577−

F ( x ) = e −e

kπ 6

Se os parâmetros da distribuição são estimados de acordo com o método dos momentos, a lei exprime-se por.

x = µ + kσ em que µ e

têm o significado habitual e são estimados por x e s’, e k é o factor de

probabilidade, dependente de F(x), e com significado análogo ao da variável reduzida u da lei normal. O factor k calcula-se por k =

6

π

(ln ln

1 − 0,577216 e encontra-se tabelado no quadro seguinte F ( x)

TABELA DO FACTOR DE PROBABILIDADE K DA LEI DE GUMBEL

x = µ + kσ


Exemplo de aplicação da lei de Gumbel Para uma bacia hidrográfica, determinar a precipitação máxima diária correspondente aos períodos de retorno de 20 anos e de 100 anos, com base na série hidrológica das precipitações máximas diárias anuais no posto udométrico mais próximo da bacia: Anos 1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 Total Média ( x ) Desvio Padrão (s)

Prec. Máxima diária anual (mm) 39.2 29.5 47.5 43.3 118.4 40.6 42.1 35.7 50.0 46.1 64.9 38.6 29.0 26.9 60.6 21.3 79.2 40.4 48.2 47.5 63.3 70.8 40.8 1123.9 48.9 20.8

T(x)

F(x)= 1-1/T

K (tabela)

P = x + ks’ (mm)

20

0.95

1.866

66.87

100

0.99

3.137

114.1


Lei de Pearson tipo III A lei de Pearson tipo III é uma lei de três parâmetros que se exprime por

x = µ + kσ em que os parâmetros µ e são estimados por x e s’ e o factor de probabilidade K depende, além de F(x), do terceiro parâmetro, o coeficiente de assimetria. No quadro seguinte apresentam-se os valores de k em função de F(x) e do coeficiente de assimetria. A estimativa do coeficiente de assimetria calcula-se a partir dos valores da amostra por n

n Ca = × (n − 1)(n − 2)

1

( xi − x ) 3 s′3

recomendado alguns autores que a estimativa assim obtida seja multiplicada por 1 +

8,5 n

TABELA DO FACOR DE PROBABILIDADE K DA LEI DE PEARSON TIPO III

x = µ + kσ Coeficiente de assimetria


ANÁLISE ESTATÍSTICA DE VARIÁVEIS HIDROLÓGICAS ALEATÓRIAS Os métodos estatísticos só são aplicáveis a variáveis a aleatórias. Estão nestas condições, entre outras, as seguintes séries de valores: Com distribuição aproximada à lei normal - precipitação anual, - precipitação num determinado mês do calendário. - escoamento anual, - escoamento num determinado mês do calendário, Com distribuição aproximada à lei de Gumbel - precipitação máxima anual com determinada duração. - caudal instantâneo máximo anual - caudal médio diário máximo anual.


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