Oakham's Adventure

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, a a a l h h Pe u al p an r n Es o C ae ç n a Fr

ISSUE 02 | OAKHAM’S ADVENTURE | OCTOBER 2010

PERSONAL MOTOGRAPHIC

Oakham’s

Adventure2010


Oakham’s

‘10 Adventure The End of Land’s End

Ireland

England Oakham Lynmouth

In circles of stone

Avebury

Land’s End Ferry Ferry

France El Estafeta Bretagne

Bordeaux

Cosgaya Santiago Pamplona

España Portugal Picos de Europa

Camiño de Santiago

Casa


Oakham’s Adventure

3

Primei ras

ten tat iv

as de le

v antar

v ôo

ESTA VIAGEM É MAIS DO QUE APARENTA. Uma moto nova, companhe ira de viagens futuras, passadas inúmeras vezes na minha cabeça. A decisão entre o novo e seguro pelo usado e incerto, longínquo e m isterioso. Embarcar na compra remota significa vence r os medos, dis por-me a fazer a estrada que me ligará às aventuras idealizadas. Procuro racionalizar a decisão, escudando-me nos números: “É mais barato. Vale a pena!”, ouço-me pensar, enquanto me rode io daqueles que à pe rgunta “E tu? Que farias?” lhes adivinho a resposta. Mas na realidade o que vale realmente a pena é a lição aprendida: ultrapassar os obstáculos no caminho das viagens; desmitificar dem ónios e seres de outros mundos. Viajar é vence r o medo. Esta relação paradoxal é m ilenar e impele descobridores para lá do alcance do braço e da vista. O que assusta e intimida é também o que atrai e seduz.

Nessa sedução, imagino uma silhueta de moto carregada de saco-cama e tralha, encostada sobre o flanco, de guarda a uma te nda em contraluz num fundo de alvorada. As cores são as de África. Tento reanimar a fogueira da noite, sobre a qual se levanta um último suspiro de fumo, pa ra aquece r o café. Em casa este café seria hediondo; aqui nã o o venderia por nada. E é no meio do nada, sozinho no raia r do dia, que as peque nas coisas ganham novas perspectivas. Viajamos para nos encontrar. Sacudo a cabeça e eme rjo deste anúncio vulgar de uma qualque r marca de tabaco. Ajeito os papéis e os mapas, faço lista de ta refas a tra tar: voo a reservar, contas a fazer.

[…] emerjo deste anúncio vulgar de uma qualquer marca de tabaco.


Viagemd

Começar de comboio, chegar de avião, rolar de moto e navegar pelo Canal da Mancha.

O des colocad da Ing desde Faro e baixo c

Quem gens d ao en combo ve na obras d ça, abs nas pe bolso, preto e tilhado Escrev


mde quê?

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stino é perto de Nottingham, ado a regra e esquadro no centro glaterra. Para lá chegar voando Portugal, as opções são poucas: e com uma única ope radora de custo.

m nos vê equipados com as roupade motociclis tas, surpreende-se ncontra r-nos numa estação de oio, com um bilhete para o Algarmão. Ainda com as leituras das de Paul T heroux frescas na cabebsorvo as pequenas coisas, reparo essoas, atento nas conversas. No carrego um pe queno caderno e, entre as páginas vazias, engaos os ensinamentos da Escrever ver.

Vista do interior do comboio até ao Algarve


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Estação da Funcheira, o Entroncamento do Alentejo


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7 O Agosto gasta os últimos cartuchos em tiros de 36ºC. Com o Sado e o Sol a minguarem desde Poente, rolamos entre a rrozais e montado. O final de dia dardeja feixes de luz entre os vultos dos sobreiros. O efeito é de um caleidoscópio, ensopado em verdes das cortinas e laranjas, sobre os azuis dos bancos. Sentimonos Buck Roge rs na rampa de lançamento, em aceleração pa ra novas aventuras espaciais. Estes já não são dias de carruagens cheias. Connos co viajam duas alemãs, um condutor de comboios reformado e poucos mais. As primeiras parecem confiar cegamente no bom coração e honestidade dos Portugueses, deixando sozinhas ca rteira e m ochila a totalidade da viagem enquanto se espraiam no vagãorestaurante, duas carruagens atrás. O reformado da CP, num sotaque ale ntejano carregado ao telemóvel, prome te chegar a horas de ir ver a bola à Socie dade. Chegamos à Funcheira, o Entroncamento do Sul do País. A estação, bem conservada, procura manter a dignidade. Finge estar ocupada, mas ninguém sai ou entra do com boio. Ao mergulhar na Serra desaparece o Sol no horiz onte e, com ele, a re de de telemóvel. Na estação de Tunes, la rgamos o comboio. Amanhã, espera-nos a viagem de avião. -§Entramos no Aeroporto de Faro. Centenas de lagostas britânicas rodeadas dos se us pequenos lagostins esgotam os ba ncos e e nchem os balcões de check-in. Desde que começámos a planear a viagem que, num estado de ansiedade desmesurado, construo cenários e hipóteses para o que pode corre r mal. Em cada ponto de controlo receio as dimensões das malas com os capa cetes; nunca irão cabe r na minúscula bitola de bagagem de mão, concebida para Liliputianos. Enquanto aguardamos a abertura do nosso voo, desenvolvo uma fixação doe ntia na pequena armação metálica azul. Junto a ela, lê-se a ameaça: “If it doesn’t fit, it stays!”. Bolas; …posso sempre fingir que não pesco nada de inglês. Discretamen-

te, decido expe rimenta r. Nem assim, nem assado, de pantanas ou de esgue lha, a mala recusa-se a sucumbir à exiguidade da estrutura metálica. Já de gota de suor a escorre r pe la testa, descubro uma cara sorridente, desde a fila de es pera. Uma das luzidias lagostas tranquiliza-me: “Don’t worry. If they ask just say it fitted nicely”. Despede-se com um piscar de olhos cúmplice, de quem já passou por isto inúmeras vezes.

Agosto gasta os últimos cartuchos em tiros de 36ºC.

Como dois hipopótamos de mochila volum osa às costas, vamos saltando de nenúfar em nenúfar. Em ca da posto de controlo, encolhemos o peito, sustemos a res piração. O ar de descaso e indife rença do pessoal contrasta com a nossa preocupação. Na porta de embarque, a uma centena de metros avista-se a harpa verde em fundo azul, pintada na cauda do nosso Boeing. Mas a dois metros regressa o cartaz intim idador, e com ele cada m inuto de espera até ao embarque arrasta-se, lento, pesado. Já no interior do avião empurramos as m ochilas na arrumação por cima das cabeças e soltamos um suspiro. Nesta cápsula de aço, tudo lembra: “Low Cost”. Os bancos que não reclinam, os amendoins ausentes, a publicidade que flutua por toda a parte. Até a aterragem dura pa rece recordar: “Que res melhor? Paga!”.


[…] aprendemos a reconhecer os radares, nas suas caixas amarelas

T

emperaturas de um único dígito gelam-nos as pernas à chegada no trajecto até à Alfândega do aeroporto de East Midlands.

À saída, encontramos o me u nome escrito num papel em letras garrafais. Quem o segura é Malcolm, com um s orriso. O trajecto até casa duraria uma hora. Durante a boleia, tivemos oportunidade de nos conhece r melhor. As conversas começam pelo tema das m otos, mas facilme nte chegam às insatisfações sentidas pe los Ingleses, e como circular nas es tradas é difere nte nesta Ilha. Com ele aprendem os a re conhe cer os radares, nas suas caixas amare las elevadas em postes na be rma da es trada.

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Ao longo de Fossa Way, a fotógrafa torna-se fotografada.


uco po r to da a mizades um po Viajar é deixar a dife rente. alcolm, nã o foi parte. Com o M

O s primeiros m etros na Adve nture capturados ai nda em O ak ha m

ana, a auto carav &B. Não foi n o, B eit iro dir e r rim su perio O nosso p ha no can to lin ne ja a el mas naqu ta a Nélia. onde esp rei

“ “Pick-a-boo, I see you”

Com os conselho melhores estrad Avebury no bols partimos.

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Isle of Man

SCOTLAND

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IRELAND

11 Snowdonia

Oakham

WALES London Avebury

Calais Cornwa ll

hos das das até so,

Como Tomás de Aquino, ainda passamos pela garagem para espre itar a moto, para confirmar que exis te. Seguimos caminho para Leeksvine, o nosso B&B para esta noite. Na morada e ncontramos uma caravana à porta e depois de várias insistê ncias trocamos a campainha pelo telemóvel. Do outro lado da linha, Kevin desculpa-se e promete junta r-se a nós num instante. Chega esbaforido de bicicleta até nós, com o blaze r e cabelos grisalhos compridos, ambos s oltos a esvoaçar. Parece saído de um e pisódio da Britcom, em contraste com a vida séria que leva a ensinar Matemática a adolescentes. As lentes espessas reforçam a caricatura e o estere ótipo. Por ora apenas tem tempo para nos indicar o quarto, deixa r a chave e marcar o pequeno-alm oço para amanhã. “I don’t even want to ear anything regarding continenta l breakfasts”, sugiro-lhe. “In England we’re looking for Englis h breakfasts”. Atira-nos a lgumas opções para jantar na aldeia e precipita-se para as escadas. No pub, imaginam os os pa rceiros de Quiz a bate r o pé, impacie ntes pelo regresso de Kevin e do retomar do jogo.

am tea, any on e? ”

Em Leeksvine, o chão alcatifado queixase em cada passo rangido. As pare des são forradas em papel de pare de, incluindo

FRANCE

as da sala de banho. A cama algo nodosa não compromete o des canso. Enxoto os cobertores; apesar do calor de Agosto os aquecimentos da casa estão em força. -§É manhã cedo e Kevin já anda atarefado com as panelas e frigideiras. Na cozinha comemos um cooked breakfast: o bacon frito, os feijões coz idos, o tomate gre lhado, o ovo estrelado, os cogumelos salteados. A festa de che iros irá viaja r connosco, entranhados na roupa. Malcolm apanha-nos para tratarm os da papelada da moto. Conhecemos a fam ília e até mesmo o Ben, o border collie. Tempo ainda para pe rcorre r os botões e funcionalidades todas da moto, testar a posição, embalar o banco original pa ra seguir pelo corre io postal. À partida para a viagem de moto o ambiente é descontraído. Tudo corre u bem no negócio e isso pa rece aliviar alguma te nsão que inevitavelmente exis tiria. Tempo ainda para uma fotografia de grupo com Ben à porta de casa. Deixamos o convite pa ra visitar Portugal, com ofe rta de es tadia em nossa casa. Com os conselhos das melhores estradas até Avebury no bolso, pa rtimos.


N

ão está a ser fácil. Começo a se ntir os s intomas de privação. A mente, habitua da ao pla neamento e às reservas antecipadas, parece estar a perde r a ba talha.

O objectivo principal em prescindir do planeamento pormenorizado é de ixar es paço pa ra o inesperado. Já o argumento de que a informação tem me lhor qualidade e em abundância quando recolhida no local, começa a nã o ser bem verdade. Chegámos a Avebury no dia seguinte ao fe riado nacional (Bank Holiday) que havia prolongado o fim-de-semana. Confiámos que seria mais simples encontrar um alojamento, te rmina do esse pe ríodo. A aldeia não terá ma is de duas dezenas de casas e, com alguma razoabilidade, nem todas ofe recerão serviços de alojamento. Tendo isto em me nte, percorremos a rua principal (e única). Procuramos o sinal com as letras B&B. “We’re full. Sorry” foi a respos ta que obtivemos nas primeiras tentativas. Uma ardósia de metro e ncosta-se ao alpendre da terceira e penúltima opção. Orgulhosamente proclama ser o único sítio onde se servem apenas jantares vegetarianos. Duas pancadas secas na porta trazem-nos o anfitrião. Andrew, o sim pático gigante recebe-nos com um “Hello” desenhado num sorriso. Convida-nos a ver o quarto disponível, talvez para recpuerarm os do susto

com o valor da diária. Subim os uma escada fofa, passando o anúncio “Shoes off, please”; a proxim idade das ovelhas e o piso alcatifado não com binam. O qua rto é privilegiado, na vis ta e no aprum o. O chão é irregular, talvez para fazer companhia aos tectos. Uma cama de dossel com pesadas cortinas é a peça central, não fora esta divisão um quarto. Aos pés uma senhorinha convida: recostado com um livro aberto no colo, a admirar o campo relvado onde as pedras cres cem em círculos. A estadia parece merece dora do esforço. Assim, o receio de não encontrar mais nada faz a sua prime ira vítima: ficamos.

Descemos até ao pub Wagon&Horses para janta r. Aí encontramos uma família inglesa que, dura nte o Verão, prefere deixa r Portugal. No res to do ano dedica-se a conhecer mais do nosso País que nós, Portugueses. Começamos a refeição com swee t peppers with feta, um prato que vai para lá das fronteiras dos ilhéus. Já o prato principa l (Steak Kidney Pie with potatoes) e a sobremesa (Spotted dick with custard) tresandam a cozinha inglesa. Nos balcões dos pubs ingleses encontramos uns ganchos para prender as tre las dos cães, enquanto emborcam pints de lagers. Este parece se r o reconhecimento pela nobre missão que consiste em encontrar o caminho pa ra casa depois do final de dia regado do dono.


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inof circles

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Stone “

Começo a sentir os sintomas de privação

“I wonder why? ”

os a foto e não tirám rqu o p em rgunt rumado Não me pe da estava ar quando ain


Andrew mantém-nos à distância de um braço e […] ficamos mais longe de conhecer Avebury.

Acordamos ce do. Espre ito pela jane la para não descobrir as pedras de ontem. Um nevoeiro rasteiro começa a levantar. Tempo para um passeio pelos relvados. A esta hora, somos apenas nós, as ovelhas e um fotógrafo profissional à procura daquela foto. Para o pe queno-alm oço, escolhemos a mesa no avanço envidraçado da casa. A porce lana brilha nos prime iros raios de Sol e o efe ito é feliz. Somos surpreendidos pelas salsichas vegetarianas, de produção caseira. O cozinheiro e anfitrião, Andrew, pa rece condime ntar tudo o que diz com uma piada, mesmo os pontos que parece levar muito a sério. Não encoraja aproximações maiores e as conversas ficam-se pela supe rfície. Supomos que por uma única noite não é jus to espe rarmos que se predis ponha a a profundar temas mais íntimos ou pess oais. O mais próximo que conseguimos foi sabermos que um antecessor seu instaurou os Bank Holidays. Este é uma representação fre quente nas gravuras pe nduradas pelos corre dores.

Já estava assim quando chegámos. Juro!


Quando optamos por ficar em Bed & Breakfast (B&B) fazemo-lo porque procuramos o contacto mais próximo. Encorajamos conversas mais prolongadas, conhece r melhor as pessoas e, através delas, o local. Andrew mantém-nos à distância de um braço e, nesse espaço vazio que nos separa, ficamos mais longe de conhe cer Avebury. O serviço foi impecável, mas está mais próximo daquilo que espera ríamos de um Hotel.

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Os lendários círculos de Stonehenge: um de pedra e um de turistas

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Stonehenge

Lamento, mas não se tem isto...

Tunnel vis ion or mirag e?

apach inho as casas usam c Inglaterra: onde


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S

tonehenge fica apenas a 25 milhas de Avebury ou Caer Abiri, como os Druidas lhe chamam. Estando no alinhamento geomântico Ley Line confe relhe à partida uma maior importância que Stonehenge. A UNESCO não entra em discussões e classifica ambos como Património Mundial. Mantemos a rota dos ca lhaus apontadas para o cé u e, de caminho, visitamos o mais mediático dos pontos de e ncontro de druidas. O parque de es tacionamento, a uma centena de jardas do círculo, está organizado com o aprumo custome iro britânico. Neste um druida trajado a rigor de vestes e

barba brancas e igualme nte compridas, aproveita o afluxo dos visitantes para juntar gente à sua causa. Pertence à The Order of Bards, Ovates and Druids e defende que os druidas sejam devolvidos às suas campas originais. A multidã o desencoraja e acabamos por visitar do lado de fora. Mesmo o lado de dentro obriga a mante r uns bons 100 pés de distância venerável. O rebanho segue uma fila com prida ao longo de um corredor marcado por cordas. Descarregam a frustração no botão da má quina fotog ráfica.

...sem isto

Daquelas coisas que são melhor apreciadas do lado de fora “Rest your head on m y boulder…”


“ Somerset: o ladoB As B-roads, longe das enchentes de carros, são a melhor opção

No caminho para Lynmouth atravessamos o Parque Naciona l de E xmoor, num percurso sinuoso ladeado de muros forrados de se bes luxuriantes.

Avebury

Lynmouth SOMERSET

Stonehenge

Exmoor Nationa l Park

DEVON

CORNWALL

Quando as estra das nos criticam

Um Pub, um a cabine te lefónica e n não fossem uvens: os esquece r onde estam os


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Quem reparou que a fotografia está ao contrário levante o braço

as não V erdade; m

s p raias. viemos pela

O porto visto do quarto do Rising Sun em Lynmouth


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20 Chegamos à aldeia sem ma rcações nem expectativas. Para ir lá dar, percorre-se uma das serpenteantes estradas estre itas, envoltas em arvoredo alto e de nso. Apenas nas derrade iras ja rdas nos é revelada o amontoado de casas, disposto em volta do porto, numa baía natural es cavada pelos rios East Lyn e West Lyn, dando-lhe o nome (LynMouth: Foz dos rios Lyn). As praias são de pedra, negra e rolada no vaivém das ondas. Como todas as povoações com uma rela ção próxima com o mar, são muitas as histórias e os percalços. Aqui está um dos postos avançados de socorro marítimo e os memoriais aos bravos que para salvar outros pe rderam a vida são uma consta nte. É uma terra dada às relações pe rturbantes. Para além do mar, o rio também lhe fez das suas. A mais recente e traumática envolveu a morte de 34 pess oas nos anos 50, arrasando numa cheia fluvial pontes, casas e estradas.

Chegamos à aldeia sem marcações nem expectativas.

Apesar da ofe rta de a lojamento ser bastante, ficamos na primeira que vimos. O piso superior do pub Rising Sun ofere ce uma linha de quartos com vista pa ra o mar e para o porto. O che iro a bebida infes ta o ar do piso inferior. O res taurante e os quartos são de uma classe à pa rte, com direito ao Chef Oliver.

. Oink Oink! Mais um “Cream tea”


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The East Lyn river

Q uem me d era ser uma mosqu inha ...


Travessia pedonal do East Lyn

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England’s Little Switzerland


Oakham’s Adventure A janela aberta do nosso quarto no Rising Sun Hotel

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Lynmouth

SOMERSET Exmoor Nationa l Park DEVON

Tintagel

CORNWALL

St.Ives St.Just

Land’s End

F

inalmente percorremos a Cornualha na ponta Sudoeste de Inglate rra. Espre itamos St.Ives e, apesar de re conhe cermos as virtudes que leva aí tanta gente, damos meia volta e fugimos. Evitamos as estradas principais e me rgulhamos nas B-roads.

Pelo caminho paramos em Tintagel, associada à le nda do Rei Artur e dos Cavaleiros da Távola Redonda. Os restos das estruturas do caste lo começam por ser uma desilusão; contudo, talvez por res tarem apenas fragmentos, soltamos a imaginaçã o e Tintagel pode ser tudo aquilo que cada um gostava que fosse.

O vento do mi nante subjuga as ár vores da C or nualha


Evitamos as estradas principais e retomamos as B-roads

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End of the

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Land’s End? O desapontamento, causado pe la pressão comercial em redor de Land’s End, domina-nos. O atractivo dos pontos mais remotos deveria se r a sua propensão para a reflexã o que vem do is olamento, da calma e do silêncio para nos ouvirmos. Depois de calcorrea r os alojamentos pe rto de Land’s End, no qual havíamos pe rdido completamente o inte resse, rumamos a Cape Cornwall, algumas milhas a Norte. Em St. Jus t encontramos guarida no B&B da Marlene.

cabelo branco, bem cuidado, move-se com a dificuldade que o excesso de peso traz. O marido está reformado por invalidez, depois de anos a traba lhar nas minas de estanho e cobre. O processo de extracçã o dos m inérios é consta ntemente aspergido com água para fixar as poeiras, evitando doe nças res piratórias graves pela aspiração de micas que perfuram os pulmões. Mas a humidade e xcessiva não é inofens iva e surgem os reumatismos incapacitantes.

Marlene aparenta estar próximos dos 60 a nos. De

Nem acredito que é mais mante iga… ….Piggy, piggy, piggy!


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South Cornwall Mantemos a prefe rência pelo Lado B de Inglaterra. No final do Verão, os tractores ca rregados de enormes rolos de palha espre itam em ca da saída de quinta. E podem surgir no vira r de qualque r uma das curvas ao longo das es tradas estreitas e ladeadas de altas sebes opacas. Ainda assim, preferimos a calma ao reboliço.

“ marties, Na praia d os S Mount a S t.M ichael’s com vist a par

Mantemos a preferência pelo Lado B da Inglaterra


O banquinho

para descal ça

r as b otas.

A povoação de S t.Mawes


Paramos em Marazion cuja principal atracção é o vizinho St. Michael Mount. Com o passar das horas e das ondas, o acesso à ilha m uda. Nas marés baixas uma calçada pe rmite chegar lá a pé. Com a subida das águas, apenas de barco é possível. E são inúmeras as ligações comerciais. Mesmo que se opte por ir a pé para lá, dificilmente se aproveita a ida e se dispensa o barco no regresso. Mas a vila de Marazion é apetitosa o suficiente para e ntre ter quem prefere as vistas da ilha à visita. Linda flor a o vento...

Baía d

SOMERS

L’homme fatal

DEVON

Dartmoor Nationa l Park

CORNWALL Plymouth

St. Just

Marazion St.Mawes St.Michael’s Mount

Ferry to Roscoff


de S t.M aw es

RSET

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Dartmoor

Talvez pelo nome lembrar uma personagem saída do Harry Potter, algo mágico sucede


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as n Podia ser S intra, m

ão é.

“Evita r die t a exc lusiva

Chegamos algo cedo a Plymouth, demasiado cedo para o ferry das 23:00. Imediatamente a Norte fica o Pa rque Nacional de Da rtmoor, recheadinho de es tradas ondulantes. Envolvidos na floresta permitimos que a moto estique as perninhas e saboreie a lgo dife rente do alcatrão.

de estra das

al catroadas


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32 Os ferries são funis. A travessia de um braço de água obriga a que os pe rcursos de muitos se reúnam num único ponto. E esta é uma oportunidade excele nte pa ra trocar histórias e experiê ncias. Ao viajar de moto estamos mais expostos, sem uma carcaça metálica a envolver-nos. E, com um simples roda r da cabeça para o lado, damos por nós à conversa com o viajante do lado, num dos inúmeros momentos de es pera, seja embarque, estacionamento no porão, ou partida.

Ferries

Vivemos na geração dos fóruns de inte rnet, dos chats e Facebooks. Mas a melhor maneira de trocar e xperiências e fazer amizades continua a se r em ca rne e osso. E

o ferry é um porta l de passagem pessoal onde se pa rtilha. À saída de Plymouth, na enorme “sala de espe ra” para o embarque ao relento, descobrim os uma lua nova. Aprendemos com os nossos vizinhos que a ausência de vento nos reserva uma viagem calma. A aparência des tes dois viajantes de moto faz imaginar uma vida na faina do mar, nas suas fartas suíças e pele gretada do vento salgado. Abandonam a Cornualha com os olhos postos em Espanha e nos Pirenéus, com o despre ndimento de quem não tem, nem que r, um plano muito bem definido. Confessam-se avessos a expe rimenta r

Plymouth, England

d l n a a h a C n c a M

a

O ferry é mais que um nobre gigante de aço.

Roscoff, France O berço em

bala


ado nas on das do Cana l da M anch a

e aço, as barriga do g igante d Na ent rada para a s. motos são ape ritivo

Nachos e cerveja an tes da caminha?!

outras línguas, irredutíveis no inglês, língua franca do viajante. A abertura dos espaços da Europa contine ntal é a atracção principal, fartos do excesso de pessoas numa ilha que insiste em ficar mais pequena, demasiado peque na. No fundo da fila de viajantes, entoamse cânticos. Um grupo ruidoso e animado de m otociclistas, trajados a rigor de coletes de cabedal pre to, parece dar por bem-vinda a oportunidade de durante algumas horas pode r emborca r umas cervejas e avolumar os cantares e gargalhadas.

Chegado o m omento do embarque, para encher a e norme barriga, o gigante de aço prefere começar com as e ntra das. As motos são os acepipes ou “hors oeuvres”. Depois, inevitavelmente empanturra-se com os ca rros, pãezinhos sem sal. Finalmente o prato principal: os camiões com acompanhamento de atrelados recheados de coisas boas e surpresas.

No desemba rque, com o num copo de dados de poker, lançam-se os viajantes à sua sorte, ce rtos de que dificilme nte lhes sairão apenas ases.


C a

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l

d a

M

n c h a

a

Roscoff

BRETAGNE

N

a cabine do ferry, e enquanto nos refrescamos num ba nho revigorante, ocorre-me que não faço ide ia do caminho que nos levará amanhã por terras francesas. Nem um mapinha Michelin. Nada!

“Pânico!” Os olhos encontram nos escaparates das boutiques a bordo um pequeno livro azul. No seu interior, cartas das me lhores estra das na França pa ra percorre r de m oto. A sere ndipidade colhe frutos. Se tivesse planeado tudo à cabeça, provavelmente não teríamos procurado nem encontrado estas rotas.

Ao longe, oiço uma ha rpa e um alaúde. Primeiro uma sugestão, quase inaudível. Depois cres ce, apenas para se ca lar. Regressa agora com mais força. Depois de enxotar os duendes do sono e dar corda ao cére bro, ape rcebo-me que se trata do serviço de desperta r do ferry. Na última travessia essa função foi assegurada por 3 curtos apitos estride ntes seguidos de uma voz entarame lada. Desembarcamos a poente da Normandia. Seguimos o rasto cor-de-rosa, desenhado na noite ante rior a bordo, juntando os fragmentos num itinerário lógico que nos leve até a Espanha. Na primeira tableta que encontramos em França lê-se “Lem bre-se de conduzir pela direita”, algo que noutro conte xto e local se ria algo es tranho.

G o l f o B i s c a

la

Bordeaux

y

d e a

s linhos, pontes e lago A F rança dos caste

“Baratte ” não é barata nem de barata.

Ne da Pâ


Ce n’est pas a Grand

Nem um mapinha a Michelin. Nada! ânico!

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Bretagne c’est la Meilleuer


“ Ao longo de estradas secundá rias pe rcorremos a Bretanha. Tudo corre bem até chegarmos às vilas. Invariavelmente as indicações desapare cem ou confundem mais do que escla recem. E a tra dição mantém-se: é no pico do calor que nos pe rdemos à séria, às voltinhas em ruas e rotundas que vimos e revimos várias vezes, minutos a trás: “Aarrgh!” Costumamos viaja r com uma mala de depósito. Na bolsa transparente de topo cos tuma acompanharnos as cartas e mapas. Sem esta, nem GPS por opção, cabe à pe ndura navegar. Pois… não correu bem. Desesperada com as indicações ausentes e nada coope rantes, “atira com o mapa ao chão” e desiste. Paramos pa ra almoço e de cidim os seguir o resto do dia por auto-estradas a té Bordeaux. Em ligações mais longas as auto-es tradas podem parecer a lternativas inte ressantes. Mas assemelham-se a túne is, assépticos e normalizados. Pri-

o S ul da Bre tanha Vila de Malestroit n

É na carne junto aos ossos que está ao melhor.

vam-nos das particula ridades de cada região; entramos no ponto A e saímos no B. Pelo caminho, nada de especial; podia se r França, Alemanha ou Cochichina. Nas estradas secundárias pontuam as rotundas, passadeiras, travessias de povoações, camiões e tractores. Mas em cada um des tes obs táculos está uma oportunidade. De ate ntar na forma de vestir, na jovem que a travessa a estrada de baguete de baixo do braço, na boina basca do velhote sentado no poial do café da aldeia, no cheiro da adega e das uvas, no aroma da alfafa ou do feno com alfazema ou mesmo da relva re cém-aparada. E desde quando apanhar camiões é chato pa ra quem viaja de mota? Curvas e ultrapassagens é te rritório de motos. Demora mais tempo e custa mais? Sim. Mas para saborear tem de se mastigar. É na carne junto aos ossos que es tá o melhor.

Ao longo da D 3, a Sul de Bubr y


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Estafeta Pamplona

la

Imaginem que, por m omentos, enfiavam a cabeça dentro de uma colmeia. Imaginem um zumbido de tal forma intenso que tudo palpita. Na confusão as formas, apesar de familiares, são indistintas. Volvido o pasmo e o espanto de ninguém dar por vós, reparam que se sentem tra nsparentes. Olham para o vosso corpo. Onde esta riam as mãos descobrem asas e, no lugar de algo humano, um felpudo abdómen amarelo em riscas pretas.

r rá não se rawl pode c r uro a to ad o N ugi r d orma de f f or lh e am

Como se tapa uma multidão


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40

[…] um País enorme que se alimenta de coisas pequenas.

Acabei de descrever a sensação de me rgulhar na rua mais movimentada de Pamplona durante a noite. Na es treita Calle de la Estafeta encontra-se toda a gente. Entre ca rrinhos de bebé, velhos e novos, casais e solte iros, grupos de adolesce ntes, turis tas, ricos e pobres, bem e mal vestidos.

Tapar a fome em

cores e sabores

Mas o mais impressionante é o s om. Ou melhor, o barulho. Não é segre do que os es panhóis falam em ruidosas frases. Também se sabe que quanto maior o nível de ruído, mais alto se tenta fa lar por cima dos demais. O que tem es capado aos cientistas é o nível a que tal ba te-papo pode chegar. Seria de imaginar, à entrada da rua, um sinal de perigo com um protectores de ore lha.

A in g E d n e p m d e m p u

A T m


O quarto no Palácio Guendolain

Este ca sal teve de nos a a ma b tomar ilidade conta d o quart o du ra nte o ja ntar

Está quase: só faltam 304 dias para as festas de San Ferm ino

A máquina fabulosa que é o cérebro demora alguns instantes a adaptar-se. E, se a cabeça nã o inchar e uma gota de sangue escorre r do ouvido, continuamos. Esgueiramo-nos por entre a massa de gente. Pa ra lá dos corpos bem re nte às pa redes, começam a adivinhar-se portas. E lá dentro, mais gente. De braços no a r e palito na boca, gritam virados pa ra onde está (só pode esta r) o balcão. Furamos ainda mais e perce bemos sobre o balcão de vidro um alinhamento de tapas de todas as cores, empilhadas em pratos brancos. E esta é a razão da confusão. Pa rece mesmo que é o que move Espanha. Poder es tar aqui, de caña numa mão e palito na outra. E, quando a boca não se e ntre tém com um pimento relleno, fala-se. Muito!

A Movida não é segredo. Nunca pode ria ser. É cartaz de Turismo; é prom oção de um País e norme que se alimenta de coisas pequenas.

FRANCE

Bordeaux

G o l f o B i s c a

d e y a PAYS BASQUE

PAIS BASCO ESPAÑA

PIRENÉUS Pamplona


Oakham’s Adventure

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N

enhum trajecto de moto pelo Norte de Espanha fica completo sem uma passagem pelos Picos de Europa. Em 2007 dedicámos-lhe as nossas férias. Foi especialmente marcante pois foi a primeira vez que nos aventurámos de moto fora de Portugal. Os atractivos de hoje são os mesmos de há 3anos: uma envolvência de exce pção com es tradas a condize r. Da experiência ficou alguns sítios para dormir que havíamos re parado e ntão. Apontamos para Cosgaya, na estrada entre Potes e Fuente Dé. Pelo caminho a cos ta Norte de Espanha, num dia de Sol e curvas.

estar em

Picos “

Os atractivos de hoje são os de sempre: envolvência e estradas de excepção

A aldeia encarrapi tada de Potes



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Los Beyos ASTÚRIAS PAIS BASCO

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Pamplona ESPAÑA


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A caminho de Fuente Dé, logo após Potes: Cosgaya.


G o l f o

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46 A Coruña

PICO S DE EU RO

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Los Beyos

Riaño Santiago de Com postela Ponferrada

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GALICIA

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uma liçãodesde

O Caminho de Santiago ensinado em hebraico entre viajantes

Judeia

á 3 anos pe rcorríamos este mesmo Desfilade iro, o de los Beyos, no e xtremo poente dos Picos da E uropa. Regressamos em busca da imagem forte nostálgica de um nascer tardio de Sol esprem ido e ntre as paredes a bruptas da garganta do rio Sella. À mesa depe nicávamos uma tábua de queso cabrales e um cappucino.

Quando chegamos ao pequeno café, encontramos estacionados à porta 2 automóveis clássicos de 1920. Debaixo do capot dois motores Bentley de 3 litros. Metemos conversa com uma senhora inglesa, encaixada no minúsculo habitáculo. É uma das pa rticipantes entusiastas do rally “Paso Doble”, numa alusão a ambos os passos de montanha do circuito. Octagenária, de grandes óculos de sol e um farfalhudo chapéu de cossaco na cabeça, confide ncia-nos no se u sotaque de Southampton: “Há 50 anos era eu quem o conduz ia. A vis ta direita já des istiu há alguns anos e a direita segue o mesmo caminho”, lamenta. É assim, triste e saudosa, que entrega o volante ao se u com panheiro. Este deba ixo de um chapéu azul de skipper, não disfarça o sorriso estampado. Com um ronco de outros tempos, partem pa ra apanhar os demais, enquanto chegam duas motos, com o habitual pe rfil das cabeças de motor boxer, o bico de pa to protuberante e uma ocular assimétrica. Os autocolantes nas malas prome tem his tórias de lugares dis tantes como Roménia, Rúss ia ou Noordkapp. A carga em cima de cada moto deixa adivinhar um itinerário longo. Che gam desde Israel, numa viagem que apelidaram de

a

“Mediterranean 2 Atlantic”.

Convidamos a pa rtilhar a nossa mesa de queijos e, à volta de ce rvejas, trocamos histórias. Kobi é comerciante de arte em Telavive e, todos os anos durante 2 meses, fecha as portas da galeria, larga a família na Grécia com os sogros e parte em aventuras com o seu amigo. Mais uns dias, e propõem-se a a travessar Portugal no caminho para Marrocos. O nosso e ncontro é feliz pois fortalece o seu estilo de planear a viagem, ao sabor das conversas nos locais e em be rmas de estrada. Ambos rumamos em direcção a Santiago de Compostela e os nossos caminhos tem-se cruzado com o dos pe regrinos ao longo das estradas desde França. “Sabem a história de Santiago?”, desafiam-nos. Com alguma vergonha confessamos que não. “Não há vergonha em aprender”, conforta-nos enquanto coloca os óculos. Folhe ia um livro verde algo familiar e ao mesmo tem po estranho. Dem oro a reconhecer o Guia Michelin de Espanha, impresso da direita para a esquerda em hebraico. E é assim que, reunidos à volta de que ijo de ovelhas asturianas, quatro viajantes aprendem o Caminho de Santiago. Despedimo-nos a rir, tamanha a bizarria de um ritual católico cristão se r-nos e nsinado por judeus de Israel, a partir de um livro desenhado em caracteres hebraicos.

A ine


evitável conv

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ersa à volta da

mo to


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a caminho de

Santiago Compostela O

caminho parece term inar a qui. Ne le re pousam sandálias, sapatos e botas. Partilham o triunfo da caminhada conseguida, agora comple ta. O mau tempo de hoje não esmorece o entusiasmo. Lembra que há algo maior, que somos pequenos.

Apesar de esta nã o ser terra de tapas, reincidimos. Movia-nos a nostalgia das anteriores em Pamplona. Mas, como a criança que revê em adulto o Conan ou as Merveilleuses Cites d’Or, o desencanto acontece. No dia seguinte rum o a casa idealizamos o recorte da costa galega feito em moto. Mas a chuva intens ifica e as estradas vivem o lufa-lufa de mais um dia de trabalho. Fixamos o meridiano e, de baixo de chuva, desejamos a chegada. Paramos várias vezes. para espreme r meias, trocar luvas e secar o corpo, olhar pela janela e a desejar abe rtas no céu. Apenas após 5 horas de chuveiro, por altura da Serra de Aires e Ca ndeeiros, reveríamos o céu e o Sol. Há dias assim, mas faz parte da aventura que é viajar de moto.


“

A espremer meias, trocar de luvas e secar o corpo desejamos abertas no cĂŠu.

Tapar a fome em

cores e sabores


2

1

1. Cape Cornwall Passeio em final de dia desde St.Jus t 2. Vila de Lynton Saída do porto, visto do Rising Sun Hotel 3. Silbury Hill A caminho de Be ckhampton para jantar no pub “Wagon & Horses” 4. Avebury Stone Circles Passeio para abrir o ape tite 5. Avebury Manor & Garden Jardins da igre ja 6. St.Michael’s Mount Foto desde Maraiz on 7. St.Teath Pela rural B3267, a sul de Tintagel

6

9

10

3

7


4

5

8. St.Mawes Nas encostas floridas do castelo 9. Dartmoor Nationa l Park Encaixados nas sebes de Newbridge Hill 10. Cathédrale Saint-André de Bordeaux Manhã deambulando nas ruas de Bordeaux 11. Desfila dero de los Beyos Ao longo da N-625, a norte de Oseja 12. Tapas Coisas pequenas para grandes ape tites 13. Santiago de Compos tela Indigente em cade irão de lorde 8

11

12

13


alcatrĂŁo termina

quando o

...tudo começa


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a Mo toXp lore rs À saída para o passeio d

Banco de pend

ura dá lugar à t ral ha do campi smo

Dou por ela em ple no Alentejo. Descansa s obre a esque rda como o pastor no cajado. Olha o espelho de água do Maranhão, enquanto lambe as feridas. Sente que lhe falta algo mas, de peito cheio, adivinha-se um sorriso.

A aventura espreita em cada caminho, trilho e pista

Na noite ante rior sofria por antecipação. De um lado prometiam aventura e um pe rcurso sim ples com alguma areia. Outros ventos anunciavam maiores desafios, perante os quais os receosos mirrados se rão ausentes na manhã seguinte, à partida pa ra a verdasca. Deixei as malas em casa, junto ao assento da pe ndura que deu lugar ao equipamento de campismo, entre te nda e saco-cama. A idade exigiria confortos cresce ntes; com igo, parece ser o inverso. Troco o SPA pelo duche comunitá rio onde a torne ira da água quente nem sempre apare ce.


Oakham’s Adventure

54 No preâmbulo da saída para o percurso fora-de-estrada anuncia-se o trajecto. Pareço ouvir com o estômago as dificuldades antecipadas. Saímos. À minha fre nte, Daniel, o meu companhe iro por es tes caminhos, segue na sua GS Dakar e persigo-o no caminho. A fila ruidosa encontra o caminho após a curta ligação por es trada e transforma-se numa coluna de poeira. Seguimos apertados, demasiado próximos, e assim chegam os troços de areia funda. Engulo em seco e olho em frente, atirando-me pa ra a estreia em terrenos are nosos. Nisto, enquanto o guiador dança e a frente se contorce, penso: “Pronto! Já estás no chão!”. Rodo o pulso e em aceleraçã o saímos em frente, com a cabeça e rguida, bem levantada. Depois de algumas passagens por linhas de água teimosas, tempe radas com lama, surge a primeira queda. E com ela ape rcebi-me de quão difícil pode se r levantar o bisonte bi-cilíndrico s ozinho. Mantive a calma mas apressei-me a mentalizar-me que poderia ser a primeira de muitas. Na verdade as protecções desta mota pare cem resis tir estoicamente em cada tropeção fora de estrada. Olhando pa ra a moto come ço a ter dificuldade em perce ber-lhe a côr original. Nas seguintes quedas, sucumbem o retrovisor e uma das luzes auxiliares. Olhando pa ra trás, nem e u pe rcebo bem que razão, além de inexperiê ncia, me levou a não os deixar na tenda. Deba to-me com a electrónica e, já na tenda com a leitura a turada do manua l da moto, apercebo-me que nunca consegui realmente desligar o ABS. Tempo ainda para falha r uma bifurcação, quando o cansaço começa a sentir-se na tensão excessiva nos braços. As pontas dos pés doem-me e um formigue iro na mão direita lançam-me um ultimato. A pausa desejada chega numa descida íngreme de rocha descobe rta, ensombrada por sobreiros e azinheiras. Faço uso dos e nsinamentos do curso de condução fora-de-estrada de há 5 meses e ignoro que tenho travões. Abro o pe ito, engre no a primeira e com o corpo bem para trás, junto-me aos demais. Após uma pausa junto ao espe lho de água admirado desde o poial de pedra, procuramos hidratar-nos. Sentimos que seria es ticar demasiado continua r no último troço e tomamos o caminho pavimentado no regresso.

esassossego: escans o e d o d o d s d s olo mb Sí enturas futu ra paráv eis de av nse i as ig am as


Numa pausa pa r a sa

É tudo novo: a moto, o terreno, a experiência. Mas e o corpo? começará a ficar velho?

cudir a poeira e be be r água

Um retroviso r a me no s, u m s orriso a mais



’s 10: am 20 o h k e t Oa n tur men ve ple d A Su

eu acredito em

mercados globais “ o que fazer para comprar lá fora uma moto… e não se esquecer de nada

A

decisão estava tomada: “Vou trocar de estilo de moto”. Tinha de ser algo que me pe rmitisse continuar a viajar com pendura em longas distâncias, ser a minha companhe ira na centena de quilómetros diários entre casa e o trabalho. Para mim, a qualidade de construção e a confiança são chave para uma moto. Na última ida a Marrocos e no curso de OffRoad fique i com vontade de da r uma oportunidade ao conce ito de viagens de Aventura, muito em voga nos dias actuais. A opção óbvia seria algo entre as bávaras R1200GS e a Adventure, a irmã mais velha e voluptuosa. Apressei-me a ver o mercado das novas. Nas rondas pe los concessionários deparei-me com algo extraordiná rio: nenhum dos vendedores pa rece esta r genuinamente

Comprar novo [em Portugal] não é vantajoso.

empenhado em convence r-me a compra r a moto. E quando se fala de descontos ou “ate nçõesinhas” como se diz em Portugal, o caso roça o insulto, de tão mise ráveis. É o problema de que rer o mesmo que todos procuram. Os valores para a configuração que procuro tocam os 19 mil euros. Não vá eu estar a le r esta crónica à la reira quando for velhinho e não me lembrar bem o que isso significa, ronda os 7 meses de orde nado. Para a Adventure basta s omar 2m il…

Uma das vantagens de com prar uma moto nova (para lá das óbvias) é a valorização na re toma da minha moto actual. A VFR tem sido útil nos 3 a nos que passou connosco, o que se traduz em 62 mil kms percorridos entre viagens, cursos de condução e uso diário. Com estes valores, o com prador encarquilha-se independentemente de ser razoável admitir que há motores V4 com 3 milhões de kms feitos. Resumindo: é lícito antecipar dificuldades em obter o valor (continua… »)


1: COMO PREPARAR: A COMPRA, A VIAGEM E A LEGALIZAÇÃO Volvida a negociação do valor e estabelecido o compromisso de compra, este foi o procedime nto seguido: 1.Trocar impressões com quem já passou por isto. Nada bate uma boa conversa e é uma oportunidade para fazer amigos; 2.Recolhe r dados do vendedor (nome e morada, se possível) e da viatura, em concre to o n.º de chassis e motor, regis to, matrícula, marca, modelo e cilindrada. 3.Com essa informação pode se r inteligente confirmar que não existem financiamentos pe ndentes. No Re ino Unido, exis te um serviço online que, por £12, dá o historial da viatura, desde créditos, acidentes, pa rticipações e registos; 4.Caso se pre tenda vir a rolar na moto, é preciso tra tar do seguro temporá rio para a matrícula original. É melhor fazê-lo a través de um mediador de seguros; directamente com as seguradoras o mais provável é re ceber recusas. No meu caso, acabei por conseguir junto da Tranquilidade;

real na venda por m im mesmo, e deverá ser esgotante. Em conversas com quem anda nisto das motos de aventura há algum tempo, uma conclusão parece unânime: “Não se jas parvo. Com prar novo em Portugal é uma péssima opção.” O mercado usado do Reino Unido afirm ou-se como o mais dinâmico e que avança mais garantias de bons negócios. Ajuda também o facto da libra esterlina esta r (continua… »)

5.Tratar da viagem e acordar forma de pagamento. No caso de ser em numerário e for em divisa estrangeira, levar dinheiro; 6.Preparar uma declaração de venda, acordada por e-mail com o vendedor. Convém incluir uma descrição da moto (chassis, motor, matrícula, modelo e marca), os dados de identifica ção de ambos (nome e documento de identificação). Indica r também que a transacção é fe ita sem quaisquer encargos finance iros pendentes e de livre vontade. Levar 2 impressões já preenchidas para assinar no m omento da troca de documentaçã o; 7.Pedir antecipadamente ao vendedor que a rranje o Certificate of Conformity (COC) junto do Concessionário onde com prou a moto. No caso da BMW deve ser uma folha com holograma da marca, em formato de pa nfleto, indicando que aquela viatura es tá dentro dos parâmetros legais de emissão de gases e ruído, entre outros. 8.Pedir a o vendedor cópias do seu docume nto de identificação (passaporte ou Ca rtão do Cidadão, dependendo do país). Este elemento é importante para reconhe cimento de assinatura da declaração de venda.

A 3: O QUE FICDEDOR COM O VEN to; 1. Pag amen assinada o de v enda 2. Declaraçã ossa e C ópia da n por ambos o pessoal; identif icaçã s da moto. 3. Saudade

2: O QUE DEVE VIR JUNTO COM A MOTO Resumindo, no mome nto do levantamento da m oto e conclusão do negócio devemos trazer connosco: 1.A moto, com chaves e token para codificação de eventuais futuras réplicas; 2.Idealmente, livro de Serviço da moto e Manual de Proprietá rio; 3.COC; 4.Documento único da viatura. No Re ino Unido, este chama-se V5 e é bastante difere nte do nosso. O formato é de uma folha A3 dobrada em dois e inclui secções para preencher na transmissão de propriedade, assinado pelo dono. Contém igualmente uma secção vermelha que deve ser pree nchida, assinada e enviada pelo vende dor à DMV lá do sítio (DVLA, no caso do Re ino Unido); contudo, deve ser enviada apenas após concluída a viagem de regresso, caso e la ocorra. 5.Declaração de venda assinada por ambos; 6.Se planearmos vir a rolar na moto até Portugal, pode ser boa ideia uma de claração do vendedor autorizando a utilização da moto por m im; são “cintos e suspensórios” pois em princípio se rá redunda nte à informação do documento único, mas mal não faz; 7.Cópia do documento de identificação do vendedor; 8.Caso a garantia ainda este ja a decorrer, tragam a transmissão de garantia (normalme nte, faz parte dos livrinhos da moto) assinada pelo proprie tário original.


Oakham’s Adventure

59 4: O RALLY-PAPER DA PAPELADA, JÁ EM PORTUGAL Depois da me lhor parte do processo (a viagem na moto), chegando a Portugal o processo de legalização que passei foi o seguinte: 1.Se não for o próprio a tra tar, devem levar uma procuração para apresentar em todos os serviços (e uma cópia pa ra deixar em cada um); 2.Ir ao IMTT (antiga DGV) para inicia r o processo. Vão pedir a papelada (administrativa) toda que trouxe ram, tirando os manuais da moto e afins; Desta 1ª visita trarão convosco o número de homologação do processo. Este acto é gratuito; 3.Ir (na moto, idealmente) à Alfândega com o processo e número de homologação. Levar cópias de TODOS os documentos, pois lá não tiram cópias, incluindo da identificação do novo proprietário; 4.Aqui depois de comprar, pagar e preencher o formulá rio apropriado (Decla ração Aduane ira de Veículo, ou DAV) eles fazem uma inspecção visua l da moto e confirmam o odóme tro. Abaixo de 6mil kms há acerto de impostos para viaturas oriundas de Países dentro do espaço Sche ngen. Fora deste (ex. Suíça) não interessam os kms: paga-se sempre! Este acto cus tou-me cerca de 85€ (mais o formulário DAV) mas creio que depende dos anos da moto. Com o a minha apenas

tinha 1 ano, será difícil ser mais caro que isto. 5.No dia seguinte (pode até ser no mesmo dia, com sorte), regressa-se à Alfândega para saber qual a matrícula atribuída. O original do docume nto único fica nos se rviços, trazendo uma cópia. 6.Com a DAV preenchida, carimbada e benzida pela Alfândega (em rigor, as lojinhas nem o pedem) vão à loja da esquina gravar a matrícula e cravá-la na moto; Nes ta altura é habitual (mas não obrigatório) dar um passo para trás e sorrir de ore lhaa-orelha. A circulação com o documento da Alfândega é legal durante 60 (ou seria 30?) dias; 7.De seguida, regresso ao IMTT para concluir o processo e ser emitido o Certificado de Matrícula, pagando 33€; 8.Volvido um m ínimo de 2 dias úteis pa ra os sis temas do IMTT falarem com a Conse rvatória do Registo Automóvel (CRA), dirigem-se a esta última com o processo para solicitar a em issão do Documento Único (DU); E aqui ocorre a situação mais bizarra: no caso de Setúbal, o IMTT ocupa 3 das 4 secretá rias do atendimento; a 4ª é da Conse rvatória. E, apesar de ficarem costas com costas (literalmente), temos de aguardar pelos 2 dias e volta r noutro dia... A emissão do DU custa 50€ sendo comum não haver multibanco, por isso levar dinheiro é prudente. O ce rtificado provisório pe rmite circula r com a moto até 60 dias, enqua nto não chega o DU a casa, uma semana depois.

bastante desvalorizado face ao euro, apesar de já te r estado mais. Em dada altura 1£ comprava 1,6€; no início de 2010 estavam equipa radas e hoje está a 1,2€. Em cima disto, o valor novo lá é mais baixo pois os impos tos são muito menores, e o mercado de usados reflecte inevitavelmente isso. Decido-me a espreitar a ofe rta na inte rnet e fico side rado com as dife renças; se eu for péssimo a negociar, ganho ce rca de 5mil euros. Se tiver algum sangue de mercador de souk pode chegar aos 7mil. Acabo por decidir com prar uma R1200GS Adventure do ano passado com 1 ano de garantia, equipada com todos os extras, o conjunto completo das malas, 5 pequenas prote cções da Toura tech e suporte para GPS. O valor pedido é 12mil e acordamos nos 11,6mil. Valor de mercado em Portugal: 18mil (e acre dito es tar a se r conservador).

A diferença de valores pode representar 25 a 35%

Um dos receios para quem se estreia nes tas aquisições prende-se com o processo de legalização e de se familiariza r com as particularidades dos proce dimentos estrangeiros. Aqui descrevo quais os documentos e passos a tomar, bem como algumas decisões aconselháveis. Faço-o na perspectiva individual, sendo que em algumas situações variará consoante o me rcado onde se compra, os se rviços onde se trata da legalização em Portugal ou mesmo o mode lo e a no da m oto.



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