Alice a Lés

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ISSUE 07+08 | ALICE A LÉS | JUNE 2011

PERSONAL MOTOGRAPHIC

Neste número: Portugal de Lés-a-Lés 2011 » Manique Maniacs I » Alice prefere Sagres » Sand’in on a SOS »


Ficha técnica Publicação: Personal Motographic Séries: “Alice in Lands of Wonder”, “Alice: Madness Returns” Edição: 7 e 8 Título: “Alice a Lés” Fotos: Daniel Almeida, Jorge Ferreira Textos e montagem: José Bragança Pinheiro A série “Alice in Lands of Wonder” é composta de aventuras mais suaves, quase pastorais ou bucólicas. Passeios com pendura em fundo de paisagem de antologia, rolando sobre alcatrão.

A série “Alice: Madness Returns” é feita do lado negro de Alice, onde a apanhamos de sorriso trocista, aos trambolhões na terra, a abanar a anca na areia, ou mesmo rebolando na lama.


Esta edição é especial. E (para começar com um paradoxo) como todas as outras, aliás . É especial porque é a mais recente mas também aquela em que aderi a um evento de massas, mesmo sem ter havido nenhuma refeição italiana. É especial na medida em que juntamos à história principal outras pequenas aventuras, como algumas saídas pela areia, em circuitos semi-urbanos de fora-de-estrada ou em viagens com pendura. É especial porque, depois do lançamento da série “Alice in Lands of Wonder”, estreia uma nova série da Personal Motographic: “Alice Madness Returns”. É especial porque cada experiência de moto é única. ...Mas isso, já vocês sabem.

Alice a

Lés


Alice a Lés

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Alice a

Lés

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Começamos pelo princípio, esgotamos as fotos da praxe, fazemos as pateƟces que os caloiros fazem e deixamos cair o queixo com a quanƟdade de gente.

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7

Qualquer aventura existe para além de ela mesma, nos preparaƟvos, nos antes e nos depois. Aqui fala-se da viagem até lá, das expectaƟvas e do que nos vai na cabeça.


16 p.24

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10 p.18 p.26 p.

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Cada dia é vivido com a intensidade da nação pulsante que é Portugal. Ficam os pormenores que escapam nas travessias apressadas.

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Navegar por road-book foi uma estreia. Começar com um desta categoria, um privilégio.

Há coisas que gostámos, outras adorámos. Mas há espaço para o que não se tem pachorra, para aquela ur<cária que apetece coçar.

Sandin’ out an SOS

Alice drinks Sagres

Manique Maniacs

Na Apos<ça Alice contacta com a areia. E não gosta. Tanto que em cada ocasião que tem, dispara dois coices. Num instante, dou por mim sentado em cima de um pinheiro ou espojado no chão.

Quando o Sol se desmaia e as sombras correm para longe, Alice persegue-as pelas arribas de Sagres. Como um cachorro enfim solto, corre, salta. E quando regressa, uma enorme língua de fora e um sorriso estampado.

“A culpa são as más companhias”, ouve-se pelas ruas de Manique. Aos gritos, Alice segue a DRZ amarela ainda acelerada pela cabriolagem em terrenos diabólicos.

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E o menu do dia é...


PEPPER &CHILI

Tocamos os punhos fechados para a fotografia ensaiada, capturada em duas câmeras. A animação é evidente.


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Pepper and Chili, são as alcunhas de Fiona e Alice quando se juntam em provas por equipas. Foi assim no Lés-a-Lés, será no Waypoint Trail Challenge e nas demais que virão. “Ah, e tal, mas porquê Pepper and Chili?” Sendo eu assim a puxar para o daltónico, para mim a moto do Daniel é verde (vou dar-vos um momento para afinarem o vosso cérebro para o meu registo cromá<co). Que a minha é vermelha, parece ser consensual. Ora então, Verde e Vermelho o que é que anda por aí nesse Mundo? Pepper and Chili.

“Certo... pois...”, dirá o leitor, tentando ser simpá<co e não querendo antagonizar o autor “...e Fiona? Ou Alice? Qual a razão?” Bem, Fiona porque sendo verde ou era o Cocas ou o Shrek. Mas são ambos machos; e para ser montado pelo Daniel ele faz questão que assim não seja... Manias! Portanto, Miss Piggy não é verde, logo terá de ser Fiona, a noiva do Shrek. Para além da correspondência da cor (façam-me a vontade nesta, vá lá) é a puxar para o gorducho. Houve algumas referências sobre eu ser o Burro do Shrek, mas isso não é assunto que se fale aqui. Last, but not least: Alice! É uma personagem que figura em sonhos; parece encaixar, já que se diz “viajar é sonhar”.

E, em boa parte das vezes, por Países das Maravilhas. E, para o caso de Portugal, percorrido de Lés-a-Lés, não foi excepção.


Alfândega da Fé

Vila Flor

Seixo de Ansiães

Sra. da Ribeira

Guarda & Companhia

Caixa dos factos I Extensão: 433+118 km I Duração: 5+3 horas I Al<tude máxima: 929m I Declive máximo: 36%


9 Mogadouro

DIA D–1 SEIXO DE ANSIÃES E SENHORA DA RIBEIRA Degrau a degrau, vamos conquistando o Douro Vinhateiro ao amanhecer. Ladeamos fileiras de vinha, entre o Rio e um céu azul, de Sol limpo.

No final do dia anterior, subimos por Portugal na esperança de ainda apanhar o Douro com luz do dia, sem sucesso. Conseguimos chegar à Barragem de XXX com noite escura, onde as instalações da hidroeléctrica projectam um cone de luz brilhante sobre o rio e para o céu. O cenário podia ser o de um filme de encontros imediatos de 3º grau. Mergulhamos no vale, primeiro, para num gancho sobre o paredão começarmos a subida, de curva em curva. Chegados a Seixo de Ansiães estacionamos as motos ao relento, no Largo João de Almeida, avô do Daniel. Sobre o lagar de azeite, na habitação espera-nos a dormida. Demoramo-nos a repenicar um vinho generoso branco sobre um lençol de estrelas, daquelas que não se mostram na cidade. Brindamos à aventura dos próximos dias.


Amanhecemos para apontar à Senhora da Ribeira, bem junto ao Douro. As verificações técnicas em Mogadouro desenrolam-se ao longo do dia. Nas 600 equipas, o nosso número 440 chuta-nos para as 14h, antes da par<da para o prólogo desde o palanque. Tempo para aproveitar as estradas desertas e as vistas matu<nas das encostas íngremes vinhateiras.

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O Douro vinhateiro visto do Miradouro da Rota do Douro junto Ă Sra. da Ribeira


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DIA ZERO PRÓLOGO

Ao redor de Mogadouro, as gentes saúdam as motos que passam, as que buzinam e as que rugem. Mesmo aquelas cujos pilotos de cabeça enterrada nos “road books” nem se apercebem da animação e da moldura humana.

Off-road Sanhoane

Penas Róias Azinhoso

Urrós Off-road Mogadouro

Clima de festa A cidade de Mogadouro oferece-se ao LaL, num clima de gente e motos. Mesmo no centro, revolvido em obras, perfilam os viajantes. Lá ao fundo, ouve-se a voz que anuncia, uma por uma, as equipas que vão gotejando para o prólogo. E para todas, o anunciante personaliza as boas-vindas, graceja e anima, tentando arrancar algumas palavras sempre que sobem ao palanque.

Bemposta Algosinho Nós, por enquanto, ainda estamos espraiados num relvado à sombra. Devoramos uma alheira de Mirandela grelhada no momento, de fa<a de pão numa mão e canivete noutra. Acompanhamos o desfile sem fim nem princípio, bem à nossa frente. As verificações técnicas, essas apenas após


Povoações

I

Vale da Madre

I

Castanheira

I

Bemposta

I

Soutelo

I

Sanhoane

I

Lamoso

I

Viduedo

I

Figueirinha

I

Algosinho

I

Azinhoso

I

Travanca

I

San<ago

I

Penas Roias

I

Urrós

I

Mogadouro.

Caixa dos factos I 86km (~5 off-road) I Duração: 3,5 horas I Al<tudes: 500-800m I Temperatura: 19-32ºC


levantarmos o material, dorsais, chapéu, bandeira do patrocinador e road-book e quando no relógio marcar a hora da nossa equipa. Enquanto não chega o chapéu de abas sobe às cabeças de quase todos. Mogadouro parece ter sido invadida de uma horda de australianos, não fora a bandeirinha verde de uma empresa de mobiliário. Colamos as páginas do road-book para como mortalhas o enrolarmos, desejosos de o acender e experimentar.

Verificações técnicas O sotaque britânico de Alice não passa despercebido. “Ah, isto assim em milhas por hora


Colamos as páginas do road-book para, como mortalhas, o enrolarmos desejosos da 1ª fumaça não pode ser”, diz com ar muito sério. “Não está homologado”, brinca enquanto folheia a documentação da moto e pergunta pelo kit de reparação de furos. Nas instruções leio que rolar em grupo nos desgasta; nessa altura estava longe de apreciar ou reconhecer a sabedoria nestas palavras. Já com a pulseira colocada, dorsais ves<dos e de 440, número de equipa, colado nas motos engrossamos a fila dupla de ansiosos que desejam a par<da de hoje. Todos apontam ao palanque, bem desde lá do fundo, junto à Ermida. Inscritos pelo Motoclube do Estoril o nosso serviço personalizado na subida ao palanque pergunta-me se costumamos ajudar na preparação do Grande Prémio. “Não.” foi a única resposta que me arrancou, perplexo e sem relacionar a pergunta ao motoGP no Estoril... Ainda tento remediar mas é


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tarde demais; os meus segundos de microfone expiraram e se foram mal aproveitados. Se não <vesse o capacete posto o meu embaraço seria ainda mais evidente.

Demasiado rápido ou irremediavelmente atrasados? Afinar o ritmo é o nosso primeiro desafio; o que é demasiado rápido e quanto é ser muito lento. Ao contrário de outras edições, esta não permite controlar os pontos antes da hora definida. Quem chegar adiantado, fica à espera. E foi o que nos aconteceu logo na primeira ocasião.

Entre paredes de xisto e muros de pedra, a cavalgada triunfante desfila.


O prólogo, pouco menor que a centena de kms, é equilibrado e leva-nos por vários <pos de estrada e caminho. Como um quebra-gelo na Gronelândia, devagar vamos trilhando uma abertura por entre o rebanho de ovelhas que regressa à protecção coberta para passar a noite. 3 horas e, como as ovelhas, estamos de regresso à cidade de Mogadouro, ves<ndo a máscara oficial do Lés-a-Lés: sorriso rasgado e cobertos de uma fina camada de pó.

[...] vestindo a máscara oficial do Lés-a-Lés: sorriso rasgado sob uma fina camada de pó.


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“GOSTO!”

+

TOP 10(+2) DAS COISAS QUE + GOSTÁMOS

Um Top + tem tanto de prá.co, quanto de subjec.vo e pessoal.

Numa organização desta dimensão temos por vezes a tendência em procurar e apontar os defeitos. Mas esta edição teve mais pontos a favor que contra. Esta lista ordenada de preferências ou boas impressões acaba por ser uma homenagem à equipa que põe de pé o Lés-a-Lés (LaL). O lugar cimeiro pertence ao road-book que nos é dado para seguir os caminhos. Ficámos tão bem impressionados com a qualidade que lhe dedicamos uma secção da reportagem. Por isso, passemos já para o 2º classificado. Que o Lés -a-Lés é feito da soma dos contributos individuais de cada motoclube, já sabíamos. Que estes se empenhariam de forma tão original e variada, já foi uma surpresa. Desde o agricultor de picareta em punho e casaco com os botões desencontrados, aos banhistas no Alentejo, todos eles encontraram forma de nos surpreender. Na maioria das vezes, e com tanto cansaço, pareceunos que são ignorados ou que não se lhes dá o devido valor.

Há muitas maneiras de se acolher milhares de motos na nossa aldeia. Podemos optar por espernear e pontapear, disparando impropérios e palavras fortes e cabeludas. Ou inspirar-nos nas gentes que encontrámos ao longo do percurso; de sorriso en-

ga<lhado, estes candidatos a ganharem tendinites e outras bracites de tanto acenarem a quem passa, não desistem. A razão de ser do LaL é esta: promover as estradas recônditas e menos conhecidas, de preferência em cima do melhor veículo à face da Terra. Vá, pronto: um dos melhores. Há anos que faço viagens ao Algarve e em todos eles me escaparam as estradas do Barrocal. Como é possível? Depois desta prova, sinto-me mais capaz de acolher estrangeiros e lhes indicar rotas de moto de primeira apanha.


Top 10 (+2)

Sinto-me capaz de acolher gente de fora e indicar-lhe estradas de primeira apanha

I

O Road-book do Lés-a-Lés;

I

Empenho dos moto-clubes nos pontos de controlo;

I

As gentes na rua em festa;

I

Estradas “escondidas”;

I

Uma Harley a descer um “caminho de cabras”;

I

À conversa com velhotes no jardim central de Monsanto;

I

Serpentear por ruas apertadas (Monsanto, Pero Garcia, Castelo de Vide, Ferragudo);

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Estradas do Barrocal entre Ourique e Silves;

I

Rolar aos pares;

I

A descoberta;

I

Alto Alentejo;

I

Douros, vinhateiro e Internacional.

No primeiro dia, o caminho bifurca: pela Opção 1 segue quem lhe apetece trilhar grãos de poeira nos dentes; pela Opção 2, quem não quer prescindir duma estrada alcatroada panorâmica. O que gostámos de ver foi uma Harley (das gorduchas) propor-se a fazer a primeira. Por isso, não me venham com histórias: é possível. Apetece-me destacar também a sensação de rolar em pares. Acaba por dar um aroma de aventura, que não é fácil de descrever mas que me dá uma sensação de plenitude e bem-estar. Andar sozinho desperta outras sensações e andar em grupo não é para mim. Adorei estar á conversa com os velhotes, sentados num banco de pedra debaixo de uma cerejeira em Monsanto. São muitas as boas razões para exis<r o LaL; basta escolher as nossas.


Esta estrada não a fizemos: fazia parte da Opção 2 (alcatroada) e à Alice apetecia-lhe terra.

Caixa dos factos I 205km I Al<tude: 145-825m I Temperatura: 12-36ºC


Mogadouro 21 Gouveia

Off-road

Carvalhal

Barca d’Alva

Malpar<da

DIA

Almeida

D+1

MOGADOURO-SABUGAL

O caminho desce. Muito. O chão fazse de pedras e terra. Ligeiros regos, secos, não correspondem aos avisos do dia anterior. Numa fileira demasiado cerrada, movem-se motos. Aquelas cujos pilotos optaram por ignorar os avisos e recusar a estrada panorâmica, a opção alcatroada. À nossa frente, uma Harley das gordas. Tão inesperada quanto desajeitada. Feita para outras andanças e aventuras, move-se com o cuidado que o desnível do terreno lhes permite. Numa palavra, resumimos a nossa sensação: respeito. Já os pneus cardados da Alice e a escola MotoXplorers fazem com que esta opção saiba a passeio. Ponte de Sequeiros

Vila do Touro

Sabugal

Quando os caminhos de ambas as opções se voltam a encontrar, não se dis<nguem os grupos pelos sorrisos. Talvez apenas uma camada fina de poeira sobre cada uma, ou numa barba polvilhada.


Sabugal

DIA

D+1

SABUGAL— CASTELO DE VIDE

A manhã quente num ritmo hesitante do grupo e pontuado com esperas, esgotou-me. O ape.te para a salada russa não era muito, mas isso nem se estranha.

Monsanto

Penha Garcia Não podia dar mais razão à Organização; andar em grupo deu cabo de mim. Começo a sen<r os primeiros sintomas de desidratação, mesmo com o Camelback à disposição. Enjoado que nem um perú, olho para o prato enquanto remexo a mesma ervilha vezes sem conta. Despejo uma garrafa de litro de refrigerante e deixo a mesa para me encostar na árvore do jardim. Algo teria de mudar durante a tarde. Decidimos separar as equipas e rolar em pares. O ritmo de cada equipa melhora e as esperas esfumam-se.

Escalamos as aldeias de Monsanto e Penha Garcia. Em curvas apertadas de empedrado são um mimo.

Alcântara (ESP)

Marvão Castelo de Vide



Há coisas que me fazem comichão. Por isso, preparem-se que agora vou-me coçar.

Top I

Os “fuções”;

I

Jardineira;

I

Andar em grupo;

I

O Calor;

I

Andar carregado com a tralha da moto;

I

Grandes filas para comer;

I

Acidentes;

I

Malta que liga o alarme das motos... sempre;

I

Preço da gasolina;

I

Restaurantes sem nada para oferecer;

I

Andar atrasado;

I

Estradas do Baixo Alentejo.


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“PASSO!”

-

TOP 10 DAS COISAS QUE NÃO GOSTÁMOS

Não é fácil organizar grandes eventos. E onde há muita gente, vai haver muitos gostos e preferências dis.ntas. Mas quando há consenso no descontentamento em torno de um ou outro aspecto, se calhar vale a pena repensar.

Admito que não sou uma pessoa fácil. Há coisas que me fazem muita comichão. Por isso, preparem-se que agora vou-me coçar. Fuções: bem sabemos que quem está mesmo, mesmo farto do trânsito <ra a carta de moto, põe um capacete e lá vai ele. E a expecta<va de quem vai no carro é que muitas motos se esgueiram pelos buracos e assim vão progredindo. Mas, quando estamos num evento de motos com tanta gente fará sen<do, fuçar para ocupar todo o milímetro vago? Alarmes: a sério? Ligar o alarme numa aldeia com 3 velhotes só para ir dentro da capela e voltar: valerá mesmo a pena? Minha Nossa Senhora... Jardineira: Este é talvez o ponto fraco mais consensual. Não é possível ter uma conversa sobre o Lés-aLés sem que esta palavra surja. E não se rodeia de elogios. Em alguns casos, é com irritação pela insistência na ementa. A maior parte dos passeios que se organizam de moto, gira em torno de uma só coisa: comer. E comer bem. Que fique escrito: jardineira NÃO É comer bem. Isto associado a longas filas para comer, agrava a situação. Esperar muito para comer jardineira é matéria para muito

boa gente subir ao campanário mais próximo, com carabina e mira telescópica a <racolo. Já o andar em grupo, não se pode dizer que seja imputável à Organização. Aliás, a bem da verdade, está escarrapachado no kit de boas vindas que fazê-lo, desgasta. No 1º dia isso provouse com uma grande verdade. No 2º dia decidimos rolar apenas com a equipa e creio que todos nos diver<mos mais assim. O calor agrava tudo: as filas, o carregar a tralha, o andar em grupo. Mas também foi azar apanhar o fim-de-semana mais quente do ano. De acidentes, ninguém gosta. Tirando os no<ciários quando dedicam tempo a falar dos eventos com motos. Não foram muitos, mas um ou outro foram cabeludos. Do preço da gasolina, já tudo terá sido dito. Eu cá prefiro os preços baixos, mas não sou imparcial.

Dito isto, importa reforçar que o balanço foi claramente posi<vo e reconheço que existe muito bom trabalho e capacidade de organização. Mas há poucas coisas que sabem melhor que uma boa coçadela.


Póvoa e Meadas Castelo de Vide

Portalegre Ribeira de Seda

DIA

D+2

CASTELO DE VIDE VIDIGUEIRA

Par.r de Castelo de Vide pela manhã é um privilégio. Neste dia passamos pela Herdade do Monte Redondo, cortesia da MotoXplorers. Igrejinha

Évora

Torre de Coelheiros

Vidigueira

Habituados a grupos mais pequenos em turmas de formação mais dedicadas, recebem-nos com a habitual simpa<a e uma garrafa de água fresca na mão. Tempo ainda para molhar os pés numa (pequena… mínima, vá) passagem de ribeira. Anda uma pessoa centenas e centenas de kms com pneus de offroad, para alguma coisa hão-de servir.



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Vidigueira

DIA

D+2 VIDIGUEIRA— LAGOA

42°C. Ou serão 43? A gota de suor escorre desde a testa para arder nos olhos. Estamos no caminho errado. Em frente, uma grade de contenção de gado separa-nos de um trilho, duro e suspeitamente selvagem. No chão não há marcas de mais motos terem passado por aqui. Olhando para a direita um outro caminho desenrola-se. Mas que não devia ali estar. Nem a grade de gado, para esse efeito. Nem nós, aparentemente.

Ourique

Silves

Lagoa Ferragudo



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ROADBOOK Correndo o risco de ser injusto para os demais no Top 3, para nós este é o vencedor do troféu “O Melhor do Lés-a-Lés.”

r do o h l e OM és! L a s Lé


Mesmo a rolar numa das estradas mais belas de Portugal, o “Road Book“ cativa-nos.

Ao abrir o saco distribuído com o nosso material, as mãos inquietas atrapalham -se até se acalmarem quando tocam finalmente a pièce de resistance: o famoso Road-Book do Lés-a-Lés.

am os pormenores, ilustrados a gosto, ora com um toque de humor, ora com um travo a cultura ou sensibilidade social e ambiental.

Em folhas A4 cortadas em duas mais pequenas, desenham-se os caminhos. Encerram as surpresas e a ansiedade dos trilhos ávidos em percorrer. Pontu-

Em dois dias, poucos serão os que o ignoram. Alguns desferem-lhe impropérios ocasionais, outros soltarão risadas abafadas dentro dos capacetes. O risco maior: deixar que o magne<smo desta peça de navegação ofusque a realidade.


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“Are you talking to me?”


Sobrolho levantado e olhos esbugalhados são sinais exteriores de loucura. Con.da, muitas vezes. Mas nem sempre.

Andar na areia tem que se lhe diga. E nem todas as montadas se revelam as melhores opções. Contudo, Alice precisa de saber lidar com qualquer terreno. Um pequena parte é técnica; o resto é treino, insistência. Esta primeira experiência nas areias deixou cavaleiro e corcel exaustos e maltratados. Mas valeu a pena.

Sagres parece ser um Algarve de que se tem saudades. Com praias amplas e pouco povoadas, e arribas cobertas por uma rede abundante em trilhos e estradões de terra, as opções são imensas. Tempo ainda para uma primeira aula de surf e uma perninha de fora-deestrada.

Onde uma DRZ vai, nem sempre uma GSA lhe segue a peugada. Mas os nossos ritmos não se aproximam dos limites. Alice consegue perseguir a amiga amarela, japonesa de origem, mas bem la<na de coração. Enquanto esta pula e esperneia, Alice rola pesada mas certeira. Uma aventura de treino em circuito fechado de terra, subidas e descidas, regos e pequenas rampas para vôos rasteiros.


[...] a melhor maneira de nĂŁo temer algo ĂŠ tornĂĄ-lo familiar, mundano.


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Sandin’ out an

SOS

E lá diz o povo: “Quem tem medo, compra um cão”. Não, espera, não é este o ditado. Bem, o que interessa reter é que a melhor maneira de não temer algo é torná-lo familiar, mundano. Ora, para isso, é preciso baixar a cabeça (ou no caso da moto, levantar a cabeça), olhar em frente e dizer de forma convicta: “Vamos lá; não há-de ser nada!”.

A perspec.va de andar de moto em areia, a mim, deixa-me com um nózinho algures no tracto diges.vo. E se for a cavalgar um bisonte (dir-se -á bisontar?), pior ainda. Comigo levava algumas orientações: 1) Manterme em movimento; 2) Deixar a frente sacodirse; é a traseira que leva a moto para a frente. E pouco mais sabia. E assim, alegre e ingenuamente, elegemos a Herdade da Apos<ça para estas aulas auto-didactas em “Como rolar na areia”. Ao princípio, esta escolha de termos (rolar, em específico) pode ter sido mal interpretada, tal a quan<dade de trambolhões que eu e a Alice demos. Lição nº1: “Quem rola são as rodas da moto, e não eu”: check! Para manter a moto em movimento há que acelerar, mas existe algo que se chama acelerar demasiado. Existe sempre uma alterna<va segura que passa por “pedalar” mas que, em cima da Alice, facilmente se torna num atascanço de antologia.

Há muitas mais lições para aprender e várias sessões de algumas horas para insis<r. Mas valerá a pena aprender da maneira mais dura? Não compensará combinar com alguém que pelo mesmo já tenha passado e já nos posso dar dicas? A pergunta é retórica e serve apenas para deixar a ideia em quem quer que esteja a ler e saiba bisontar na areia. Na verdade, já nos haviam oferecido uma lições dedicadas mas à falta de alterna<vas nas nossas agendas, aventurámo-nos sozinhos. Ainda assim, aprendi algumas coisas. Uma delas foi que bem posso deixar o pará-brisas em casa, já que regressei com ele par<do nos apoios. Mar.2011


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Alicedrinks

Sagres Sagres parece ser um Algarve de que se tem saudades. Com praias amplas e pouco povoadas, e arribas cobertas por uma rede abundante em trilhos e estradões de terra, as opções são imensas. Em Sagres muito pode acontecer. Pode ser que algum amigo nos ofereça a nossa primeira aula de surf. Ou mesmo que nos divirtamos de moto em caminhos desavindos. Podemos tropeçar numa aldeia ape<tosa como Pedralva. E, em cada uma destas pequenas histórias que se revelam, constroem-se vidas, grandes, imensas.

Onde nascem as nuvens? E se, do nada, alguém lhe oferecesse uma nuvem?

Para onde fogem as sombras? Corremos atrás das sombras que fogem no final do dia. Não têm medo; Fogem para se juntarem na maior de todas: a noite.

Viver em ondas Histórias de uma prancha de surf que se imaginava velha e pesada. Até que encontrou alguém. ...Talvez demasiado velho e pesado para ser surfista?


Como duas crianças na Feira Popular, havíamos deparado com a barraquinha do algodão doce.

DE CIMA PARA BAIXO 1. Na Praia do Beliche, embasbacados com quão bem se está em Portugal também. 2. A vida entre amigos na Aldeia de Pedralva é como as cores, vivas e vibrantes. 3. O verão é delas, das loiras na Baleeira e dos percebes. 4. Pedralva enche-se na festa popular, entre sal<mbancos e vendilhões, vista desde a varanda sobranceira da imperdível Pizza Pazza.


Azul. Muito azul. Em todo este azul cerúleo, um farrapo, mínimo, quase impercepBvel, uma mera sugestão de nuvem. O vento insistente refresca-me a face direita. O suficiente para ser suportável estar deitado debaixo do Sol de Sagres na Praia do Beliche. Derretemo-nos sobre a areia, com os olhos perdidos no céu. Mesmo por cima, uma das fofas e brancas desculpanos o esquecimento do guarda-sol. Mas, com o vento que a empurra para Sul, cedo par<rá e o Sol cairá impiedoso. Mas, pelo canto entreaberto do olho, semicerrado na agressão do Sol a pino, não há uma única nuvem a Norte. Nem uma pequena, insignificante; nada.

O mistério adensa-se. Se não há nuvens a Norte, de onde o vento sopra, porque está aqui uma e outra, e mais outra sombra por cima de nós? Como duas crianças na feira popular, havíamos deparado com a barraquinha do algodão doce. Aqui, nascem nuvens. E, como na feira, são doces na sombra fresca que oferecem para deleite destes quatro pirralhos no Verão. E ainda assim, ali, naquele momento e em mais de uma forma, a vida é brilhante.



Perseguimo-las. Uma após a outra. Na forma das sombras reconhecemos o familiar; somos nós que fugimos. Vamos também ali à frente, esparramados e cada vez mais compridos. E, neste jogo do rato e do gato, em cada inves<da para o Atlân<co a presa torna-se predadora. Pressen<mo-la nas nossas costas; quase que se ouve o respirar, ofegante de tanta corrida. Na sombra, negra, percebe-se muito de quem a persegue. Um capacete de queixeira aberta, um guiador bem amplo, um peito farto de uma moto que anseia por viagens longas para des<nos longíquos. Mas em toda a negridão, não se lhe adivinha a alegria; aquela que se tem num final de dia com sabor a Verão; a mesma que se <ra em poder andar de moto em caminhos de terra, pedra e areias. Naqueles momentos, não parece haver mais nada: um amigo e duas motos. Jun. 2011


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Manique

Maniacs

Alguma razão deve exis.r para os fabricantes de motos terem mais de um modelo. Uma Suzuki DRZ não é igual a uma BMW GS Adventure. E nem é preciso ser um cromo das motos para vos dizer isso. Mas para levar uma Adventure onde a DRZ se propõe a ir, isso sim, já precisa de pelo menos um cromo. É verdade que os terrenos nem eram de grande dificuldade técnica, mas isso só soubemos depois de lá estarmos. Mas comecemos pelo princípio. O Daniel arranjou uma DRZ. É um bicho irrequieto (a moto) e é daquela cor que podem ver nas imagens—mais uma vez, não me arrisco com as cores. Eu não arranjei uma DRZ; quando Alice veio comigo, trazia pendurado do pescoço uma brochura comercial: “Unstoppable”, dizia em letras garrafais. E eu acreditei.

O início fez-se de hesitação, sacudida com as primeiras centenas de metros percorridos.



Edições anteriores: HighBerian Experience Picos de Europa 2007 Honda VFR800

L’Ile de la Beauté

Sorriso em Rosto Duro Marrocos 2010 BMW 1150GS

Oakham’s Adventure

Córsega 2008 Honda VFR800 VTec

Cornualha 2010 BMW 1200GS Adventure

HighBerian Experience

Outono Colorido

Alpes Ocidentais 2009 Honda VFR800 VTec

Montesinho e Sanabria 2010 BMW 1200GS Adventure

Mastering Classes Autódromo Estoril 2007-09 Honda VFR800 VTec

NeDuro Dual-Sport Riding Course, by motoXplorers Adventure Riding Center 2011 BMW 1200GS Adventure

MotoXplorers OffRoad Training

Waypoint Trail Challenge II

Adventure Riding Center 2010 Honda Dominator

Figueiró dos Vinhos 2011 BMW 1200GS Adventure

http://2wt.weebly.com


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