Folha da Rua Larga Ed.21

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Sacha Leite

Homenagem ao grande boêmio da Vila O centenário do mestre Noel Rosa é lembrado com uma série de espetáculos gratuitos no Centro Cultural Light.

Alunos da UFRJ observam e representam monumentos do Centro

folha da rua larga

Pranchetas na mão: o professor de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ, Roberto Houaiss, propõe a sua turma uma aula de desenho na região da Rua Larga.

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folha da rua larga RIO DE JANEIRO | MAIO–JUNHO DE 2010

opinião

Um ponto de vista jovem e feminino sobre a Copa Raquel Terra analisa a Copa do Mundo de 20 anos para cá. A ensaísta percorre suas lembranças, passando por vitórias e derrotas do Brasil, pelos gestos marcantes de jogadores como Bebeto, por uma suposta convulsão de Ronaldo e pela esperança de 2010.

Revitalização da Rua Larga | Zona Portuária | Centro do Rio

DISTRIBUIÇÃO GRATUITA Nº 21 ANO III

Santiago Calatrava apresenta seu projeto para o Museu do Amanhã Humberto Teski

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cultura

Clássico de João do Rio é lançado em edição bilíngue Após 102 anos de lançamento, A alma encantadora das ruas ganha edição especial ilustrada por Waltercio Caldas. Trata-se da primeira vez em que a compilação de crônicas é traduzida para o inglês, abrindo uma coleção de autores que falam sobre a páginas 8 e 9 cidade.

gastronomia

Comida a peso para degustação página 14

O arquiteto Santiago Calatrava, conhecido por realizar obras de relevância internacional, esteve no Rio de Janeiro para lançar o projeto do Museu do Amanhã, na Zona Portuária do Rio. Previsto para 2012, o lugar será um centro de referência em Ciência e Ecologia. página 3 . Lielzo Azambuja

cidade

A febre do álbum de figurinhas de jogadores de futebol mistura idades e perfis O hobby de colecionar figurinhas não se restringe ao público infantil. Há até quem faça tabelas detalhadas para facilitar a troca. A reportagem foi conferir nos colégios as brincadeiras envolvendo a mania. O ponto de encontro, na Rua Uruguaiana, é frequentado inclusive pelo público da terceira idade que resolveu aderir à moda da Copa. página 13


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nossa rua

Se essa Rua fosse minha

cartas dos leitores Assalto na Avenida Chile

Fabiola Buzim

“Melhoraria as condições da Rua da Conceição, porque, quando chove, a via fica completamente alagada. É horrível ter que passar por ali. Além disso, faria algumas obras para reparar o esgoto e resolveria o recolhimento do lixo. ” Meirevani Salles de Souza Pipoqueira

Fabiola Buzim

“Restauraria os prédios transformando-os em Corredores Culturais como na Lapa. Isso com certeza diminuiria o índice de incêndios em prédios antigos. Afinal, de que adianta tombar um prédio como patrimônio e depois abandoná-lo?” Ronaldo da Costa Mello Contador

Fabiola Buzim

“Eu melhoria o trânsito da Avenida Marechal Floriano. Aqui existe um grande movimento de carros, então para atravessar a rua fica muito difícil. Colocaria mais sinais, aumentaria as calçadas e colocaria mais placas de sinalização. ” Jane Lizete Eufrázio Panfletista

Designer assistente - Jade Mariane e Mariana

Pousa, Francis Miszputen, João Carlos Ventura,

Valente

Mário Margutti, Mozart Vitor Serra

Diagramação - Suzy Terra

Direção Executiva - Fernando Portella

Revisão Tipográfica - Raquel Terra

Editora e Jornalista Responsável - Sacha Leite

Produção Gráfica - Paulo Batista dos Santos

Colaboradores - Ana Carolina Portella, Carolina

Impressão - Mávi Artes Gráficas Ltda.

Calvente Ribeiro, Carolina Monteiro, Fabio Nin,

www.maviartesgraficas.com.br

Fabiola Buzim, Lielzo Azambuja, Nilton Ramalho,

Contato comercial - Juliana Costa

Raquel Terra e Teresa Speridião

Tiragem desta edição: 5.000 exemplares

Projeto gráfico - Henrique Pontual e Adriana Lins

Anúncios - comercial@folhadarualarga.com.br

Paulo Moura Sinal quebrado na Senador Dantas Há mais de três meses, o sinal de pedestres na Rua Senador Dantas esquina com a Rua do Passeio não funciona. Várias pessoas quase já foram atropeladas, já que o sinal de pedestre não alerta que o tempo de travessia está acabando. Não é possível que isso continue assim! Quando vão consertar? Quando alguém for atropelado? Janaína Fernandes Barulho incômodo na São José É impossível trabalhar na Rua São José desde que a Copa começou. Os ambulantes que fazem ponto na rua não param de tocar corneta o dia inteiro. Está sendo

folha da rua larga Conselho Editorial - André Figueiredo, Carlos

Em frente ao número 500 da Avenida Chile, do outro lado da rua, na entrada de um estacionamento, esquina com Rua do Lavradio, quatro homens se fingem de dorminhocos durante o dia para fazer a limpa durante a tarde, roubando transeuntes desavisados. Esses bandidos já assaltaram à mão armada algumas pessoas que trabalham no entorno dessa localidade, mas não pudemos provar. Quando é que a polícia vai passar a dar a devida atenção à Avenida Chile?

Redação do jornal Rua São Bento, 9 - 1º andar - Centro Rio de Janeiro RJ - CEP 20090-010 - Tel.: (21) 2233-3690 www.folhadarualarga.com.br redacao@folhadarualarga.com.br

muito difícil conseguir trabalhar nesse barulho. Todos reclamam de dor de cabeça, falta de concentração, irritabilidade. Onde está a Guarda Municipal que só passa uma vez por dia? Ana Esteves Buraqueira na Buenos Aires A Rua Buenos Aires, no Centro, está uma buraqueira só, desde a Rua Primeiro de Março até a Avenida Rio Branco. Já liguei para o tapa-buracos da prefeitura e nada foi feito. Tem até obra de um prédio que fez a rua descer. Almir Santos Estacionamento irregular Diariamente, por volta das 12h, alguns carros de uma autoescola situada no Centro são estacionados irregularmente ao longo da Rua Sete de Setembro, ou na esquina desta com a Rua Uruguaiana. A cena é rotineira: os responsáveis costumam almoçar e até cochilar, impunemente, dentro dos veículos. Eles parecem velhos amigos dos guardas municipais que ficam no local, pois estes nada fazem para repreendê-los ou para multá-los. Choque de ordem ou ordem em choque? Flávio Condé

A Folha da Rua Larga acolhe opiniões de todos os temas. Reserva-se, no entanto, o direito de rejeitar acusações insultuosas ou desacompanhadas de documentação. Devido às limitações de espaço, será feita uma seleção das cartas e, quando forem concisas, serão publicados os trechos mais relevantes. As cartas devem ser enviadas para: Rua São Bento, 9, sala 101, CEP 20090-010, pelo fax (21) 2233-3690 ou através do endereço eletrônico leitor@folhadarualarga.com.br


nossa rua

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Técnica e inspiração Roberto Houaiss promove aulas externas de Arquitetura e Urbanismo no Centro do Rio Sacha Leite

Uma vez por semana o professor Roberto Houaiss, que ministra o curso de Desenho e Observação na UFRJ, traz seus alunos para uma aula externa. Quem caminhava pela Avenida Marechal Floriano nessa manhã de maio teve a oportunidade de acompanhar os alunos do primeiro período de Arquitetura e Urbanismo se esforçando para captar os traços rococós da Igreja de Santa Rita, erguida na região em 1721. Segundo o professor, a opção pelo Centro do Rio para as aulas externas se deve tanto aos aspectos históricos quanto à facilidade de transporte: “Os alunos moram em pontos dispersos no Estado do Rio, então o Centro é conveniente para todo esse pessoal, por estar no meio do caminho”, explica Houaiss. Ele disse que também costuma promover aulas na Avenida Chile entre Petrobrás e BNDES. Sobre a técnica proposta, Roberto explica que optou pela agilidade: “Tem dias que eles desenham a lápis. Propus hoje a caneta porque não quero que eles fiquem refazendo o esboço. “Quero que eles cheguem aos finalmen-

A Igreja de Santa Rita é um dos ícones escolhidos para desenho pelos alunos do 1º período Reprodução

Desenho de Maria de Miranda Lisboa, aluna do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ

tes”. O professor agendou também aulas na Igreja do Carmo, a fim de retratar o paço Imperial e o Chafariz do mestre Valen. A aluna Heloisa Silveira Pisa se animou: “A gente admira os edifícios, mas na faculdade a gente aprende sobre construções e começamos a aplicar conceitos. Nesta tarefa temos que nos adaptar à correria do Centro e ao mesmo tempo sermos pacientes para ficarmos desenhando”, explica.

“Passamos no Centro sempre para resolver problemas. Hoje começamos a ver de uma forma diferente o lugar por onde passamos sempre”, disse Maria de Miranda de Lisboa, também de 18 anos. Lívia Dutton, da mesma idade, finaliza: “O Roberto dá um norte para a gente. O bom é que vamos conhecendo o Rio”.

da redação redacao@folhadarualarga.com.br

Numa folha qualquer eu desenho o Museu do Amanhã Calatrava esboça em aquarela novo espaço de referência ambiental para a Zona Portuária O arquiteto espanhol Santiago Calatrava apresentou o desenho do projeto, assinado por ele, para o Museu do Amanhã. Com inauguração prevista para o final de 2012, o museu ocupará uma superfície de 13 km² e envolverá um investimento da ordem de 130 milhões de reais. O projeto, inserido nas ações para a revitalização do Centro do Rio será inaugurado na ocasião da Conferência de Desenvolvimento

Sustentável da ONU, a ser realizada no Rio de Janeiro daqui a dois anos. Calatrava apresentou para uma plateia de estudantes de Arquitetura e Urbanismo esboços e imagens dos projetos que já desenvolveu em cidades como Nova Iorque, Sevilha, Orleans e outras importantes cidades do mundo, citando a sua trajetória peculiar que o leva a ser considerado um dos maiores arquitetos da mo-

dernidade. Em seguida, pegou um lápis, uma aquarela e demonstrou seu momento de inspiração quando concebeu o projeto, fazendo ao vivo um croqui do que será o Museu do Amanhã. No espaço serão apresentadas exposições sobre ciência, tecnologia e conhecimento, com o objetivo de conscientizar sobre o futuro e a necessidade de adotar atitudes mais ecológicas. “A intenção é fazer um museu

com um impacto ambiental ínfimo, com materiais reutilizáveis e que seja energeticamente suficiente”, afirmou Calatrava, que espera que o edifício sirva de exemplo para uma filosofia de vida mais sustentável. Na maquete apresentada, o estilo do espanhol se percebe de imediato no exterior do museu, que lembra duas estruturas vegetais e tem “uma estrutura simples, fácil de reconhecer, mas,

acima de tudo, acessível”. O nível inferior estará rodeado por dois canais de água que chegarão até o mar, para refletir a importância deste bem, e ficará delimitado por duas zonas verdes que permitirão o acesso a qualquer parte da estrutura. O teto do piso superior, de onde se terá acesso por duas rampas, será composto por múltiplas placas solares que mudarão de posição durante o dia, oferecendo uma si-

lhueta mutante ao visitante. “Deve ser um edifício vital, porque é um museu sobre a vida”, assegurou o espanhol, que enfatizou a importância de a obra oferecer “uma pedagogia simples” às gerações futuras, para que sejam conscientizadas sobre a importância de conservar o meio ambiente.

da redação redacao@folhadarualarga.com.br


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boca no trombone

Cliques Rua Larga Sacha Leite

Deixa para Depois da Copa O professor Dunga entra na sala de aula, primeiro dia, inicia a chamada: Daniel Alves? – Ausente, está no Barcelona, Espanha. Doni? – Ausente, está no Roma, Itália. Elano? – Ausente, está no Galatasaray, na Turquia – e por aí vai. Presentes na primeira fila, com uniforme engomado, flor na mão para dar para o professor, apenas o Gilberto do Cruzeiro, Kléberson e o Robinho. No fundo da sala, fazendo tremenda bagunça: Adriano, Ronaldinho Gaúcho, Ronaldo Fenômeno, Romário e outros. Ganso e Neymar olham pela janela. Na segunda aula, chega quem estava fora. Sentam-se comportados nas primeiras carteiras e respondem à chamada direitinho: “Presente fessoooor”; “Tô aqui, Dunguinha”; “Olha eu aqui, amado mestre”, e por aí vai. Grafite, que ninguém esperava estar por ali, abaixa a cabeça e faz ponta no lápis. Dunga pede silêncio para a turma de trás e apresenta a Jabulani. Kaká levanta o dedo e diz: “Já conheço! Já conheço! Ela me patrocina!” A turma do fundo vaia. Dunga distribui a todos o manual da bola, com 670 páginas. “Leiam como dever de casa”. Elano pergunta se tem um manual em grego. Na aula seguinte: prova. A turma da frente tira média 8,35 e é aprovada. O pessoal do fundo é reprovado – estavam fazendo sexo no recreio. Adriano protesta: “Eu vou largar a boca no Rio de Janeiro e vou estudar no Boca, na Argentina, com o professor Maradona!”. Muita gente não gostou da convocação do Dunga, nem mesmo a Branca de Neve. Mas esta é a melhor equipe, segundo os padres do Colégio São Narciso. A escolha seguiu uma concepção disciplinar de bom comportamento, a tática da Ficha Limpa. Não pode festa, não pode sexo, não pode álcool. Se não beber, dirija

a seleção – esse foi o conceito da convocação. A questão agora é a seguinte: será que quem senta no fundo da sala e joga bolinha de papel nos alunos da frente é quem decide um campeonato? Eis a questão! A escalação de Dunga foi diferente do espírito brasileiro, da torcida que enxerga o futebol-arte. Não se optou pela cultura “brasilulista”, do diz o que quer, como bem entende, em qualquer país. A escalação de Dunga está mais para José Serra. Se ele perder a Copa, ficará na África do Sul, fundará a cidade de “Dunganda” e passará a ensinar “Cocobol” para os nativos mais aplicados. O negócio é vestir a camisa amarela e sair por aí, esquecer essa escalação. Estamos no clima da Copa do Mundo. Que se danem os problemas! O brasileiro está feliz. As melhorias prometidas para a Rua Larga, qualquer outra promessa – só depois da copa, da cozinha, do quarto da empregada... Agora é só encher o peito de esperanças mil, tomar todas e acreditar em tudo de bom que é este nosso Brasil de Zeca Pagodinho. A bola sobe lançada pela luva de Júlio César... Desce até os pés de Lúcio, brasiliense imune às doenças políticas, que dá dois passes no “terreiro” gramado, sacudindo as rezas baianas no candomblé e lança a Jabulani. Ela sobe redondamente elíptica no estádio do nosso coração. Os tambores africanos bombeiam adrenalina e cerveja no nosso sangue latino, fazendo descer a bola em catarata do Iguaçu pelo peito de Kaká, que puxa pra lá, traz pra cá e lança para Robinho, que rebola a bola, brinca, batuca um samba e chuta a Jabu... que vai... vai... (em câmera lenta)... É goooollllll!!!!!... Gol! – gritam todos os brasileiros irmanados na mesma e maravilhosa emoção.

gabriel provocador gabriel@folhadarualarga.com.br

Ao centro, o obelisco com a imagem de Nossa Senhora da Conceição, monumento que adorna a praça principal do Morro da Conceição, e à direita, os fundos do Palácio Episcopal, que está em plena reforma coordenada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Sacha Leite

Um morador do Morro da Conceição desce pela Pedra do Sal, considerada o berço do samba carioca. Acima e à direita, vê-se a fiação elétrica, que no momento passa sobre todo o Morro e grande parte do Centro do Rio. Há previsões de embutimento desses cabos, ação que transformará a paisagem local.


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entrevista

Um conto de fadas aos pés do Morro da Conceição Laércio e Tininha falam da história de amor que começou na infância e fazem planos para o futuro

Vocês sempre moraram na região? Cristina: Quando nasci, meus pais moravam na Rua Leandro Martins (já estávamos pertinho um do outro, viu?) e logo depois nos mudamos, moramos em outros bairros, até que, em 1962, nos mudamos para a Rua Major Daemon. Depois de casados, moramos no Lins e na Tijuca. Retornamos para a Ladeira da Conceição há aproximadamente 26 anos. Laércio: Sim. Quando nasci, meus pais moravam na Rua Acre.

que a vi descendo a ladeira conversando com outra menina. Eu achava que para Tininha eu iria ser sempre um amigo, o que já era muito importante para mim. Tininha sempre foi muito madura, responsável, estudiosa. Já eu, nem tanto: não era tão maduro quanto ela, só estudava o necessário para ficar um pouco acima da média, era moleque e adorava jogar pelada, ficar até tarde na rua. Talvez eu só me aproximasse dela, mas não muito, no quesito responsabilidade. Há um fato curioso no nosso relacionamento: o pai de Tininha confiava muito em mim, não sei por que, mas sempre que havia um baile ela desfiava os nomes de todas as pessoas que iriam para que ele a deixasse ir e ele não se manifestava, mas quando ele a ouvia dizer o meu nome, era o bastante para que fosse dado o “passe livre”. Nós só não estávamos juntos nas férias escolares, porque Tininha ia sempre para Minas. Confesso que nesses momentos sentia uma angústia imensa por não vê-la à janela ou no portão quando eu passava.

Com quantos anos se conheceram? Como foi essa convivência? Cristina: Com dez anos de idade. Sempre fomos amigos e mesmo quando ele começou a me paquerar (risos), não cedi aos pedidos de namoro , até que um dia, acredito que na hora certa, aconteceu, acho que estava escrito nas estrelas. Laércio: Viramos amigos muito rápido, houve uma empatia muito grande entre nós. Ficávamos horas conversando no portão da casa de Tininha, que é a mesma em que moramos atualmente, mas ainda não éramos namorados, nessa época eu nem tentei pedir para namorá-la, mas vontade não faltava, desde o dia em

Quando começaram a namorar? Foi iniciativa de quem? Cristina: Por volta dos 18 anos de idade. Acho que foi uma decisão em conjunto. Ele já queria fazia tempo (risos), mas eu tinha dito que só aceitaria quando sentisse por ele algo mais que amizade; nessa época vi que estava sendo boba em recusar o pedido, que no fundo já gostava dele de forma diferente de só como amigo e aceitei o namoro, felizmente. Laércio: Não sei como responder a essa pergunta, assim, tão diretamente. Eu sempre quis namorar com Tininha, cheguei a pedir a ela uma ou duas vezes, mas sem sucesso. Em uma das

Nascidos na região da Rua Larga, a amizade de infância de Laércio e Cristina evoluiu para um namoro que já dura quase quatro décadas. Eles contam como a história local se confunde com a história do casal: moradores da Rua Major Daemon, a três minutos a pé do Beco das Sardinhas, eles estudaram na Escola República da Colômbia, que ficava na Rua Camerino, comungaram diversas vezes na Igreja de Santa Rita e brincaram, por muitas festas juninas, na Ladeira da Conceição.

Arquivo

Cristina e Laércio hoje, na casa em que moram na região há aproximadamente 26 anos Arquivo

O que mais incomoda no outro? Cristina: Obstinação. Laércio: O fato de, às vezes, ela não reconhecer que é uma pessoa muito capaz e que se nem sempre consegue resolver alguma coisa, não é por falta de competência dela.

Na época dos bailes no Grajaú Country

vezes até começamos, mas durou poucos dias. Em algum momento, resolvemos “nos casar”, mas só de brincadeira, então compramos um par de alianças de prata e passamos a usá-las, mas namoro, nada ainda. Nessa época, algo começou a mudar e nos aproximamos mais. Nós frequentávamos bailes no Grajaú Country, e na época das férias, ela ia viajar como sempre, então combinamos que se Tininha resolvesse aceitar namorar comigo, ela voltaria de Minas a tempo de irmos ao baile. Achei que estava sonhando quando recebi um telegrama dela, dizendo que viria para o baile. Foi um dos momentos mais felizes da minha vida. O que um mais admira no outro?

Cristina: Caráter, bondade, honestidade, disponibilidade para ajudar a todos, dedicação à família, tudo... Laércio: Inteligência, determinação, censo prático, respeito ao próximo, honestidade (a qualquer preço), o carinho com os amigos, a total dedicação à família, o respeito e o zelo que sempre demonstrou ter pelas pessoas que a procuram em busca de auxílio, o apoio que sempre dá aos nossos filhos e a mim em todos os momentos em que precisamos, o jeito alegre e expansivo quando está com os amigos, a postura firme e até enérgica quando se faz necessário (com quem quer que seja) e, principalmente, o fato de continuar me amando e sendo minha amiga até hoje, porque sei que sou uma pessoa com quem é muito difícil de se conviver diariamente.

Há quanto tempo estão juntos? Juntos desde que nos conhecemos. Namorando há 37 anos e casados há 32 anos. Como a história do bairro se confunde com a história de vocês? Em quais lugares da região já se passaram capítulos importantes das vidas de vocês? Primeira comunhão na Igreja de Santa Rita, festas juninas na Ladeira da Conceição, Festa de N. Sra. da Conceição, Carnaval na Banda da Conceição. No primário, nós estudávamos na Escola República da Colômbia, na Rua Camerino, onde hoje funciona o Cedim. Não era raro eu ir esperá-la na porta do colégio, na época do ginásio. Eu estudava no Rivadávia Correa, na Av. Presidente Vargas, e ela, no Paulo de Frontin, na Rua Barão de Ubá,

Tijuca. Eu também ficava às vezes, esperando por ela na banca de jornal do Vavá, na Rua Uruguaiana esquina com Marechal Floriano, na porta da Casa Paladino. O ciúme deve ser evitado ou é recomendável em pequenas doses? Cristina: Evitado sempre, mas às vezes não dá para segurar, e aí o bom senso, a confiança e o respeito devem dar o tom do comportamento. Laércio: Eu vejo e sinto o ciúme como uma percepção de que alguém mais gosta da mesma pessoa de quem eu gosto. Mas consigo conviver bem com isso, não me sinto ameaçado, até porque não há nenhum motivo para isso. Qual é a receita da longevidade no casamento? Cristina: Amor, respeito e dedicação Laércio: No nosso caso, eu acredito que seja o fato de termos sido amigos em grande parte da adolescência, durante esse tempo nos mostramos um ao outro sem a necessidade de fingir ser o que não éramos, com isso criamos um vínculo de confiança, que é um fator importante na relação a dois. Eu não acredito em amor sem confiança, além de camaradagem, respeito, doação e amizade. O que vocês ainda não fizeram juntos que gostariam de fazer? Cristina: Muitas coisas (risos), mas o que mais gosto é de viajar e para Paris ainda não fomos. Laércio: Acredito que um cruzeiro marítimo seria muito bom, mas precisamos fazer um test-drive antes, porque Tininha enjoa com muita facilidade.

sacha leite sacha@folhadarualarga.com.br


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opinião

Memórias de uma jovem torcedora Nilton Ramalho

Minha primeira Copa do Mundo como torcedora foi em 1990. Uma participação tímida, confesso, já que eu não entendia quase nada de futebol naquela época e nem mesmo acompanhava os jogos com muita atenção. Mas das ruas enfeitadas e da febre do álbum de figurinhas da Copa que todo menino tinha que ter, eu lembro muito bem. Infelizmente, o meu entusiasmo inicial acabou precocemente, mais precisamente nas oitavas de final, quando a Argentina eliminou o Brasil. Eu sofria minha primeira decepção futebolística. A Copa de 94, por sua vez, foi a mais inesquecível da minha vida. Primeiro, por estarmos sob o forte abalo da perda do grande Ayrton Senna. Segundo, porque eu realmente acompanhei todas as partidas da seleção e torci apaixonada em cada uma delas. E, claro, porque foi a Copa do tetra,

após 24 anos sem título mundial. Dentre tantas cenas memoráveis, algumas me marcaram mais, como quando Bebeto comemorou um gol fazendo o movimento de embalar um nenê nos braços, ou o triunfo do desacreditado Taffarel depois de agarrar um pênalti na emocionante final contra a Itália. E o que dizer dos segundos angustiantes que antecederam a cobrança de pênalti desastrosa do Roberto Baggio? Ainda me lembro da gritaria ensurdecedora que tomou conta das ruas e da minha emoção por presenciar uma festa tão linda. Aquela vitória devolvia orgulho aos corações dos brasileiros. De 98, a única recordação forte que me resta é o episódio sombrio da final entre Brasil e França, quando estes venceram uma seleção brasileira impressionantemente apática, devido a uma suposta convulsão sofrida pelo Ronaldo horas antes da

decisão. Até hoje não se sabe se há mais por trás dessa história, mas é melhor virar a página... Sorte que 2002 estava logo ali para apagar os traumas do passado e trazer de volta o sonho do penta. Fui uma dentre os poucos que não se contagiaram pela onda de desconfiança e pressão da imprensa e de grande parte da torcida antes do início da Copa. Alguma coisa em Felipe Scolari me dava segurança quanto à conquista do título. Nem mesmo a rotina exaustiva de acordar de madrugada ou pela manhã bem cedo para acompanhar os jogos da seleção me desanimava em torcer pelo Brasil. A cada gol nosso, os gritos e fogos de artifício me garantiam que eu não estava sozinha, até a grande final, quando Ronaldo se consagrava de vez como um fenômeno. Quatro anos depois, o fantasma da derrota voltou a assombrar a seleção bra-

sileira. Apesar do elenco de jogadores excepcionais e do favoritismo indiscutível, o Brasil sucumbiu novamente diante dos franceses. E eu, às lágrimas. Mas 2010 chegou e uma nova história está prestes a ser escrita na Copa da África. O sonho do hexa está vivo. Nas ruas, um cenário colorido se revela como um convite a vivenciar tudo de novo: fitinhas verdes e amarelas tremulando no alto, bandeiras do Brasil debruçadas sobre os peitoris das janelas, chãos de asfalto pintados com figuras representativas do futebol, peitos ostentando, orgulhosos, a camisa da seleção de futebol. É o retrato dos sonhos e esperanças de quem busca na Copa do Mundo um caminho para sorrir e vibrar com um país tão carente de heróis.

raquel terra folha.rualarga@gmail.com

Revitalização experimental A região começa a experimentar os esperados investimentos com vistas na renovação urbana. O projeto de fechar a Avenida Rio Branco para pedestres já se iniciou: a Secretaria Municipal de Urbanismo fez uma prova de fechamento no sábado, 26 de junho. A população quer saber como ficará a organização do trânsito e como a ação se refletirá nos costumes do carioca. Investir na segurança e reformular o espaço urbano de maneira que ele volte a ter o brilho de outrora é o que propõem poder público e iniciativa privada nesse momento. São muitas as polêmicas em torno da revitalização, mas é possível perceber que as ações estão de fato ganhando corpo e os realizadores estão se comprometendo com a população através do estabelecimento de prazos publicamente. Esse é o caso do Museu de Arte do Rio e do Museu do Amanhã, ambos com abertura prevista para 2012. Em homenagem ao mês dos namorados, realizamos uma entrevista com um casal, Laércio e Cristina Cavalcanti, ele, analista de sistemas e ela médica. Ambos se conheceram na região há quase meio século, na época da infância. Apaixonaram-se e estão juntos até hoje. Laércio conta como foi a difícil conquista do amor de Tininha, que disse “sim” ao seu convite para o baile através de um telegrama. Com a chegada do inverno, o Rio se prepara para sediar mais uma Maratona do Rio, evento esportivo que divulga a cidade internacionalmente e recebe atletas de diversos lugares do mundo, aquecendo o turismo e a economia do município. Além de um hábito saudável, o Esporte é uma vocação nacional, incentivada por eventos de grande porte que terão o Rio como sede: Jogos Mundiais Milita-

res em 2011, Copa de 2014 e Olimpíadas de 2016. Além do Esporte, a Habitação é um tema em voga hoje no Centro do Rio. Enquanto antigamente moravam 100 mil pessoas nos bairros que compõem a região, estudos mostram que hoje apenas 30 mil permanecem no local. Fabio Nin entrevistou o professor Hélio Waizbort, que mora no condomínio Cores da Lapa e o designer Bernardo Peres, cuja residência se localiza na Avenida Beira Mar. Ambos disseram que a experiência de morar no lugar onde foi fundada a cidade, repleto de história, é muito gratificante. A jornalista Raquel Terra compartilhou suas memórias de torcedora fazendo uma retrospectiva da primeira Copa da qual ela tem memória – a de 1990 – até a atual. A ensaísta associa a energia extravasada a uma necessidade da população de ter esperança e eleger heróis para acreditar. Por falar em Copa, o fenômeno da troca das figurinhas é visto por especialistas como um importante instrumento de socialização. A reportagem entrevistou alunos da Escola Rivadávia Correia e do Colégio Pedro II a respeito desse costume, que desde 1970 envolve os amantes do futebol em uma energia de troca e amizade. Que esse espírito possa animar os torcedores e frequentadores do Centro do Rio, para que possam exercer a cidadania e dialogar com as diversas instâncias da sociedade, construindo, assim um processo de revitalização não meramente contemplativo, mas, sobretudo, participativo.

sacha leite sacha@folhadarualarga.com.br


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empresa

Seminário apresenta contrapartidas sociais e ambientais de Angra 3 Nos dias 12 e 13 de abril, a Câmara de Angra dos Reis realizou um seminário sobre as contrapartidas sociais e ambientais referentes a Angra 3, a pedido do vereador Dr. Ilson Peixoto, que é o presidente da Comissão Especial de Acompanhamento da Instalação das Condicionantes das Usinas Nucleares. O mesmo tinha como objetivo apresentar informações relativas à instalação da terceira usina no complexo nuclear de Angra dos Reis. Dr. Ilson Peixoto informou na reunião que a Comissão Especial em que preside tem o objetivo de acompanhar a instalação da nova unidade na Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto (CNAAA) e averiguar a execução das contrapartidas das Usinas 1 e 2. Já no seminário serão apresentados os respectivos dados para a população, garantindo que todos tenham acesso às informações e deem a sua opinião a respeito do assunto. Ao longo do seminário, foram apresentados os projetos e seus respectivos valores que serão implantados pelo Executivo com o montante de R$ 150 milhões recebidos pela Eletrobras Termonuclear – Eletronuclear. A verdadeira preocupação dos vereadores que estavam presentes, e da po-

Divulgação

Celso Badaró, Marco Aurélio Vargas, José Maria Justino e Ilson Peixoto

pulação que enviou perguntas, era em relação à possibilidade de mudança desses programas, tendo em vista a necessidade de reestruturar a cidade. Celso Badaró, supervisor de Assessoria de Responsabilidade Socioambiental da Eletronuclear, disse: “As alterações desse tipo envolvem negociações entre a prefeitura e a Eletronuclear. Se houver mudanças significativas, têm que estar ligadas às condicionantes e

emitidas pelo Ibama através das licenças prévias de instalação de Angra 3. Talvez seja possível fazer algum remanejamento, mas dentro do que já foi definido, mudando as prioridades dos projetos implantados e sem alterar valores”. Paulo Gonçalves, assessor de Responsabilidade Socioambiental da Eletronuclear, no dia 13 de abril, ressaltou a importância da manutenção do Hospital da Praia Bra-

va, localizado em uma das vilas residenciais da Usina, no qual serão aplicados mais 100 milhões de reais, quantia essa complementar ao acordo realizado com a Prefeitura de Angra dos Reis. Esse hospital além de atender os funcionários da Eletronuclear também atende a população das cidades do entorno da Central Nuclear. Representantes da Eletrobrás Termonuclear – Eletronuclear, da Prefei-

tura de Angra dos Reis e do Instituto Estadual do Ambiente (Inea) estiveram no evento, assim como a população, que participou ativamente enviando perguntas através de telefone e e-mail. Alguns fizeram perguntas sobre a fiscalização da implantação das condicionantes, e se chegou a sugerir a criação de uma comissão popular para acompanhar esse processo. Para permitir que a po-

pulação participe dessas discussões, serão realizados outros seminários: dia 3 de maio, no Parque Mambucaba, dia 17 de maio, na Escola Municipal Cacique Cunhambebe – Frade, dia 31 de maio, no Bracuí – Coconut, dia 14 de junho, no Guariba, e dia 28 de junho, no Plenário V Benedito Adelino – Centro.

carolina calvente ribeiro carola@eletronuclear.gov.br


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cultura

João do Rio para exportação A alma encantadora das ruas ganha edição bilíngue ilustrada por Waltercio Caldas Divulgação

O Instituto Cidade Viva, o Instituto Light e a Secretaria de Estado de Cultura do Rio de Janeiro lançaram em maio, nas comemorações do centenário da posse do escritor como membro da Academia Brasileira de Letras, a edição bilíngue do clássico A alma encantadora das ruas, de João do Rio. Pela primeira vez, a obra do escritor, um dos que melhor retrataram a essência da cidade, é traduzida para um outro idioma, nesse caso, a língua inglesa. Andar com arte pelas ruas do Rio de Janeiro, em especial pelo Centro da cidade, é marca registrada de Paulo Emílio Cristóvão dos Santos Coelho Barreto, escritor capaz de retratar o Rio do final do século XIX e início do XX de forma única. Graciliano Ramos disse certa vez que a Rua Paulo Barreto, em Botafogo, seria uma homenagem injusta ao autor, já que configura uma rua curta. Mesmo influenciado por franceses e ingleses, João do Rio, denominação literária pela qual ficou conhecido Paulo Barreto, buscava um texto brasileiro. Sua morte prematura atraiu mais de 100 mil pessoas para o cemitério São João Batista. O professor Antônio Edmilson Martins Rodrigues, especialista em João do Rio e professor de História da PUC-Rio, lembra que o autor fazia mais do que uma observação jornalística: “Ele mostrava o seu desencanto com a modernidade através da descrição de personagens que observava nas ruas, tais como vendedores de santinhos, prostitutas, mendigos...”. Antônio Edmilson ressal-

Waltercio Caldas e Mark Carlyon no lançamento do livro, na ABL

ta que, na visão de João do Rio, a alma da rua seria definida pelo tipo de gente que a frequenta. Mark Carlyon assinou a tradução desta que é a primeira obra de uma coleção de clássicos que tem como tema principal a cidade do Rio de Janeiro nos últimos 200 anos. O livro apresenta o texto integral em português, de João do Rio, e a versão em inglês, de Mark Carlyon. “A língua não é só a linguagem em si, mas a sonoridade, o ritmo, a herança. Queremos, através dessa coleção, promover a cidade de uma outra forma para as Olimpíadas”, divulga Carlyon. O tradutor nasceu na

Grã Bretanha e mora no Rio de Janeiro há mais de 30 anos: “O livro com certeza vai reatar o interesse de todos no autor. Em As religiões no Rio, ele saiu pelo Rio de Janeiro pesquisando as religiões, a igreja positivista”. Mark afirma que João do Rio é considerado o primeiro jornalista investigativo dos tempos modernos e a pessoa responsável pelo jornalismo se elevar a uma categoria literária. No universo de João do Rio, flanar é vagabundear com inteligência João do Rio escreveu para os periódicos Gaze-

ta de Notícias e Kosmos e fundou o seu próprio jornal, O Pátria. Antônio Edmilson Martins Rodrigues brinca dizendo que o jornalista quase foi dono da Rede Globo: “Ele emprestou dinheiro para o Irineu Marinho fundar o jornal A Noite e viajou para a Europa. Quando voltou, viu que o jornal tinha crescido e se tornado um grande veículo, futuramente as Organizações Globo”. Mark não conhecia a obra, mas ao longo da pesquisa se apaixonou por A alma encantadora das ruas: “Ele dizia que as pessoas se encontravam nas missas. Ele ia às cadeias, nas cabeças

de porco onde as pessoas fumavam ópio... Enfim, se embrenhava por todos os cantos das ruas da cidade”. Mark Carlyon ressalta que João do Rio nunca havia sido acessado pelo leitor internacional. A partir da coleção “River of January” o acesso não se limitará aos praticantes da língua portuguesa: “O tradutor é um veículo entre o escritor e o leitor. Ele tem que entender que o leitor não vai perdoar esquisitices e incoerências, captar o espírito do livro e estar a serviço do autor”. Mark lembrou ainda que João do Rio era um mulato latino, sendo “transposto” para uma

cultura sóbria e cinzenta, a anglo-saxã. Ainda sobre a tradução da versão original de A alma encantadora das ruas para o inglês, Mark especifica: ‘Bagunça’ é muito maior do que ‘mass’. Então, para mim, foi um enorme processo de aprendizagem. Fiz 310 notas de pé de página. Fiquei estafado, machuquei o dedo de tanto fazer anotações”. Carlyon compara João do Rio a Nelson Rodrigues: “É uma figura fascinante, inconfundível e como Nelson Rodrigues, sui generis”. Carlyon enfatiza a importância da obra traduzida para estimular o intercâmbio com outras culturas: “Este livro vai atender a um exército de pessoas mundo afora que tem conhecimento do português, mas não domina o idioma. São os amigos do Brasil”, se entusiasma o tradutor. “Eu vejo as ruas do Rio de Janeiro do início do século ao ler João do Rio. Ele foi o primeiro escritor a descrever os rituais de candomblé e os primeiros concursos carnavalescos. Foi o primeiro a tomar posse da Academia Brasileira de Letras usando o fardão”, compartilha Carlyon. Coleção traz história da cidade nos últimos 200 anos pela ótica de seus grandes escritores O artista plástico Waltercio Caldas se animou com o desafio de ilustrar a obra: “A alma encantadora das ruas é um livro-documento importantíssimo para a história do Rio de Janeiro. Eu não queria fazer apenas uma ilustração, mas algo que penetrasse no


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objeto-livro. Eu queria a tridimensionalidade. Não quero apenas a tradução da imagem no tempo.” O ilustrador afirma que impôs a si mesmo o desafio de fazer a presença de uma rua dentro de um livro. A questão, para o artista plástico, estava em como promover uma experiência diferenciada para quem lê: “Eu queria que o leitor atuasse na passagem das páginas de uma forma diferente”. E prossegue: “Vagar à noite, pelas ruas é a imagem recorrente em todos os contos desse livro”, explica o artista, que trabalha com vernizes para alcançar a tridimensionalidade nas ilustrações. Já Antônio Edmilson Martins Rodrigues lembra que João do Rio não deixou descendentes, doando todos os seus pertences para o Real Gabinete Português de Leitura. O professor conta que pouca gente sabe que ele criou uma revista chamada Atlântida, com o poeta

e escritor português João de Barros. O objetivo era aproximar o Brasil de Portugal. E explica o que é flanar no universo de João do Rio: “Flanar é vagabundear com inteligência. É ter que ir a algum lugar e, de repente, na rua, você seguir um circo que passa. É esse descompromisso que não gera sofrimento pelo que deixou de ser feito”. Antônio Edmilson lembra que João do Rio foi quem montou a Sociedade Brasileira de Autores Teatrais (SBAT), para valorizar o texto nacional e sair da regra de só se montar peças estrangeiras. A alma encantadora das ruas é um apanhado de crônicas nas quais João do Rio descreve o que vê em suas perambulações por prisões, hospitais, igrejas e ruas, utilizando-se bastante do texto em diálogos, como ocorre no Teatro. A coleção “River of January” apresentará um retrato da vida e dos costumes da cidade do Rio

de Janeiro, desde a instalação da corte até os dias de hoje. Na opinião de Jerson Kelman, atual presidente da Light, é fundamental mostrar as transformações da cidade. “É um orgulho patrocinar um projeto que retrata uma época em que a Light esteve frequentemente associada a importantes transformações de nossa cidade e do modo de viver de nossa gente”, complementa. Para o consultor do Instituto Light, Mozart Vitor Serra, garimpar os autores que retratam o espírito da cidade nos últimos 200 anos não é uma tarefa simples: “É um desafio escolher os textos mais representativos do que seria a experiência carioca, encontrar tradutores que além de dominarem as duas línguas tenham talento literário nos dois idiomas, e desenvolver um planejamento gráfico de excelência”, observa Mozart, organizador da coleção “River of January, o Rio de Janeiro visto por seus escritores”. Os próximos clássicos da série “River of January” serão: Memórias de Um Sargento de Milícias, de Manuel Antonio de Almeida, e Casa Velha, de Machado de Assis. Todos serão ilustrados por nomes de referência nas Artes Plásticas. “Essa coleção é uma homenagem à cidade quando de um alinhamento de forças pró-Rio que não se via há mais de meio século”, finaliza Fernando Portella, presidente do Instituto Cultural Cidade Viva.

Trecho da abertura de A alma encantadora das ruas Eu amo a rua. Esse sentimento de natureza toda íntima não vos seria revelado por mim se não julgasse, e razões não tivesse para julgar, que este amor assim absoluto e assim exagerado é partilhado por todos vós. Nós somos irmãos, nós nos sentimos parecidos e iguais; nas cidades, nas aldeias, nos povoados, não porque soframos, com a dor e os desprazeres, a lei e a polícia, mas porque nos une, nivela e agremia o amor da rua. É este mesmo o sentimento imperturbável e indissolúvel, o único que, como a própria vida, resiste às idades e às épocas. Tudo se transforma, tudo varia — o amor, o ódio, o egoísmo. Hoje é mais amargo o riso, mais dolorosa a ironia, Os séculos passam, deslizam, levando as coisas fúteis e os acontecimentos notáveis. Só persiste e fica, legado das gerações cada vez maior, o amor da rua. Ilustrações de Waltercio Caldas

da redação redacao@folhadarualarga.com.br


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social

Nós em todos os lugares Referência em projeto sociocultural, grupo multiplica seu ideal para além do Vidigal Divulgação

Está em cartaz na Casa do Mercado o espetáculo Barrela, do dramaturgo Plínio Marcos e com direção de Paulo Giannini. Muito elogiado pela crítica, a encenação revela de forma crua a realidade carcerária do país, enfocando a disputa por poder existente entre os presos. Com temporada prevista até o dia 19 de junho, de quinta a sábado, às 19h30, este espetáculo faz parte do repertório do grupo Nós do Morro, que há 24 anos funciona no Morro do Vidigal, atendendo os moradores da comunidade. O Nós do Morro é um centro de formação artística que se tornou referência cultural e social no Brasil e seus espetáculos já foram encenados no Rio e outras cidades, sendo contemplados com diversos prêmios, incluindo uma menção honrosa da Unesco em 2002. A reportagem da Folha da Rua Larga assistiu ao espetáculo e conversou com o diretor do projeto, Gutti Fraga, sobre a trajetória do grupo. Influenciado pelo pensamento de Paulo Freire e Augusto Boal, Gutti Fraga defende que a arte tem poder transformador. Um dos motivos que o levou a pensar o projeto foi que ele acreditava que os moradores da favela poderiam produzir arte de qualidade, independente de sua classe social. Uma prova disso é que o Nós foi o único grupo no Brasil a ser escolhido para participar da edição do Festival “The Complete Works”, realizado na Inglaterra pela Royal Shakespeare Company, em 2006. Esse festival visa apresentar toda a obra de William Shakespeare. Grupos de teatro do mundo inteiro foram convidados para o evento e o Nós participou com o espetáculo Dois Cavalheiro de Verona. De acordo com Gutti Fraga toda essa projeção se

O diretor do Nós, Gutti Fraga Arthur Sherman

Cena do espetáculo Barrela, de Plínio Marcos

deve à forma como é dirigido o projeto. “Exigimos disciplina, organização, responsabilidade. E isso é independente de classe social. Se a aula começa às 7h, os alunos devem chegar nesse horário. É somente com qualidade que se quebra o estereótipo”, explica. Um das exigências feitas aos alunos é estarem matriculados na escola e os adultos são incentivados a buscar uma formação superior e profissionalização. Na distribuição das vagas, 70% são destinadas à comunidade e os 30% restantes são voltadas para outras localidades. Com a repercussão do grupo, há pessoas de diversos estados que procuram os cursos. Atualmente, o projeto atende uma média de 500 alunos, oferecendo cursos nas áreas de Teatro e Cinema. O processo seletivo

ocorre sempre no inicio do ano, entre os meses de janeiro e fevereiro. Mas, além da questão cultural, o projeto se apresenta como uma opção que vai ao encontro da realidade da comunidade em que está inserido, dialogando e crescendo com ela. Difere-se por apresentar uma proposta concreta e compromissada de formar não apenas artistas, mas cidadãos. Em seu repertório há um número de espetáculos onde o texto reflete muito dos preconceitos e problemas enfrentados pela comunidade, mas há também um leque de texto de grandes autores nacionais e internacionais, como Shakespeare, Martins Penna, Plínio Marcos, entre outros. Além do grupo de teatro, o Nós do Morro criou um núcleo audiovisual, em que são produzidos roteiros,

filmes de longa e curta-metragem dos gêneros ficção e documentário. Com um pensamento de “multiplicar”, o Nós conseguiu chegar a outras cidades do interior do Estado e da Baixada Fluminense, graças a duas parcerias importantes. Uma com o Sesc/RJ, que atende as cidades de Japeri, Saquarema e Itaocara, capacitando grupos de teatro locais. A outra parceria é com a Petrobras e atende a cidade de Nova Iguaçu. Lá, em conjunto com a prefeitura, recebe alunos da rede municipal de educação, com oficinas de iniciação ao teatro e de levantamento da memória local. Os professores e monitores são os próprios alunos, formados nos cursos do Nós do Morro. Na própria comunidade do Vidigal, há alguns desafios e esperanças de ampliação do projeto. Atualmente, funciona outro projeto do Nós na parte mais alta do morro. Toda quarta-feira, o próprio Gutti apresenta o “Campinho Show”. É uma espécie de show de variedades e tem feito muito sucesso na comunidade. “A nossa filosofia é multiplicar. Multiplicar é somar. Trabalhamos no coletivo e com solidariedade. Multiplicar é ampliar as possibilidades”, defende ele. Com essa filosofia, o grupo apresenta uma nova forma de pensar o verbo estar. Podemos conjugá-lo da seguinte forma: “É o Nós estando em todos os lugares”. A temporada do espetáculo Barrela vai até 19 de junho, de quinta a sábado, às 19h30. O ingresso custa R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia). Endereço: Rua do Mercado, 45, Centro.

fabiola buzim fabiolabuzim@gmail.com


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comércio Rua Rua Larga Larga

Fórmulas que mantêm a tradição Há 140 anos no mercado, Granado explica como permanecer na moda Divulgação

A Pharmácia Granado, há 140 anos no mercado, preserva uma clientela fiel. No ano passado, a farmácia, que mantém o “ph” da ortografia antiga, surpreendeu seus clientes ao lançar uma loja virtual e utilizar o Facebook como mais uma ferramenta de atendimento. Issi Freeman, diretora de marketing da marca, conta que a empresa resolveu testar a mídia e o retorno foi surpreendente. Além de ser uma boa estratégia de marketing, pois na internet tudo se difunde muito mais rápido, foi também uma forma de aproximar os fãs e ampliar a clientela. “A partir disso, já fizemos um tour na loja virtual, divulgamos nossos cursos, parcerias e promoções. No perfil da farmácia temos mais de 300 amigos. O Facebook é uma rede que proporciona respostas mais diretas e há também a possibilidade de acompanhar a opinião do público sobre determinado produto”, afirma. Estar atento às novas tecnologias e mídias sociais não significa, segundo Issi, esquecer a tradição de mais de um século. Desde que a família Freeman assumiu a Granado, em 1994, houve uma preocupação em manter o mesmo referencial da marca. O inglês Christopher Freeman, atual diretor-geral, se apaixonou pelo conceito da empresa e resolveu comprá-la. Nessa época, a família Granado não possuía mais herdeiros que quisessem dar continuidade aos negócios, então resolveu vendê-la. Dessa forma, depois de três gerações, a farmácia recebeu nova administração. Issi Freeman explicou que as mudanças propostas pela nova diretoria não foram radicais, já que a família desejava manter o perfil original. Dentro de um mercado em que o ciclo de sobrevivência das organizações se modifica a cada dez anos, a Granado se sobressai se conservando viva e sempre original. “Nós ree-

Pharmacia captada por Marc Ferrez em 1888, e como se apresenta hoje, em 2010

ditamos as embalagens, atualizamos as fragrâncias, mas sem alterar muito a essência de cada um”. Ela ressalta também que o fato de manter o foco nos cosméticos, produtos farmacêuticos, perfumaria e sabonetes foi outra forma de diferenciá-los no mercado. A loja matriz, localizada na Rua 1º de Março, conserva ainda o mesmo charme de quando foi fundada. É um ambiente que tem o “cheirinho da vovó”, se assim podemos descrever. Prateleiras e vitrines de madeira, móveis originais, tapete de ladrilho e produtos com os modelos das embalagens antigas (mantendo o mesmo dourado, bronze e verde dos rótulos originais), muitos destes mantêm sua fórmula original, caso do tradicional Polvilho Antisséptico. A loja iniciou uma parceria com a Clínica Santa Helena e a Perinatal (de Laranjeiras e Barra da Tijuca). Lá, o primeiro banho do bebê é feito com os produtos da Granado e as mães recebem presentes das linhas terapêuticas e de bebê. Algumas posturas para a preservação do meio ambiente também servem para fortalecer o marketing da empresa. Nas lojas são oferecidas duas opções de sacolas: papel e lona. Sendo que o cliente que adquire a segunda opção recebe 5% de desconto em suas

compras. Além disso, a Granado é pioneira na fabricação de cosméticos formulados com extratos 100% naturais. A farmácia oficial da família real Fundada em 1870 pelo português José Antônio Coxito Granado, a farmácia era localizada na antiga Rua Direita (atual 1º de Março), no Centro do Rio de Janeiro. A rua era uma das mais movimentadas da época, onde se localizavam prédios administrativos do governo e das charmosas butiques e casas de chá. A loja se tornou ponto de encontro de figuras como Rui Barbosa, o abolicionista José do Patrocínio e o prefeito Francisco Pereira Passos. As plantas utilizadas para a fabricação dos medicamentos e produtos eram cultivadas no próprio sítio do Sr. Coxito. Além da fabricação própria, ele importava produtos da Europa, mas adaptava as fórmulas, personalizando os artigos de acordo com os padrões e as necessidades dos brasileiros. A qualidade e eficácia dos produtos da Granado logo tornaram a farmácia uma das fornecedoras oficiais da corte. Dessa aproximação com a família imperial, nasceu a amizade com Dom Pedro II, que,

em 1880, conferiu à Granado o título de Farmácia Oficial da Família Real Brasileira. Em 1912, a farmácia expandiu para um prédio na Rua do Senado, onde hoje ainda funciona uma das suas fábricas. Anos depois, foi adquirida a fábrica de Belém do Pará, lugar em que são produzidos os sabonetes em barra. A sua primeira filial foi inaugurada em 1930, na Tijuca. Atualmente, a Granado tem sete lojas, três no Rio e em São Paulo, uma em Brasília e outra virtual: www. granado.com.br. A loja foi ponto de encontro de importantes personalidades brasileiras da época. Era costume do Sr. Granado oferecer almoços a essa clientela na própria loja, e também disponibilizar o tônico para consumo, antes e depois dessas refeições. A Granado publicou o primeiro almanaque de farmácia, o Pharol da Medicina, que serviu de modelo para outros almanaques. O Pharol era uma publicação que visava promover e popularizar as drogas medicinais, artigos e cosméticos que competiam no mercado de saúde da época. A publicação está disponívelno site da Granado.

fabíola buzim fabiolabuzim@gmail.com

dicas da região

Que tal variar um pouco e tomar uma gostosa sopa na hora do almoço? O Estação Encontro do Café promove o Festival de Sopas e Caldos. São cinco opções de sopas ou caldos e a porção individual é servida por R$ 12,90. Para quem quer se aquecer neste inverno essa é uma boa alternativa. Além das sopas, há o restaurante com variedade de pratos quentes, frios e saladas, e também são servidos café, tortas, doces e chocolates finos. O restaurante funciona das 7h às 18h na Rua Visconde de Inhaúma, 105. Tel.: (21) 2253-1996. Pacote de papel A4 com 500 folhas a R$ 11,90 é na Papelaria Colúmbia. Lá você encontra materiais e artigos para escritórios a preços bem baratinhos. Por exemplo: a pasta sanfona A4 da Plasticore com 12 divisões sai a R$ 14 e a fita PVC 45m, a R$ 2,50 a unidade. Pimaco, Tilibra, Pilot, Faber Castell e Olivetti são algumas das marcas dos produtos oferecidos. Com 45 anos de existência, a papelaria fica na Rua da Quitanda, 190. Tel.: (21) 2253-9333. Já pensou almoçar todos os dias por apenas R$ 6? No Restaurante Prato Farto, isso é possível. Trata-se de um restaurante self-service “sem balança”. Lá você pode se servir à vontade e escolher duas opções de carne. Sempre oferecem uma variedade de saladas e guarnições. O ambiente é climatizado e tem TV e som. Para aqueles que preferem almoçar no escritório, é possível levar uma quentinha por apenas R$ 6,50. O Prato Farto fica na Rua Miguel Couto, 127.

Gosta de colecionar antiguidades? Na loja Antiguidades, é possível comprar objetos e móveis antigos. Eles têm em suas prateleiras muitas opções: bonecas de porcelanas, porta-joias, relógios de coluna, telescópio, espelhos, quadros pintados a óleo e esculturas. Além de comprar, você pode vender e trocar os seus objetos e móveis antigos. Tudo pode ser negociado e os pagamentos são realizados à vista. Se estiver interessado, procure a loja na Rua da Candelária, 87. Self-service após as 14h mais barato? No Restaurante Liberta, você encontra essa opção. Das 12h15 ás 13h30 você paga R$ 17,90 o quilo. Após as 13h30, o preço baixa para R$ 15,90. Para aqueles que só almoçam após as 14h, pode ser uma boa opção. São mais de vinte tipos de saladas e pratos quentes. O restaurante funciona de segunda a sábado e fica na Rua Teófilo Otoni, 58 (esquina com a Rua da Quitanda). Tel.: 2233-1174. Quer ficar bonita e pagar pouco? Procure o salão Atelier Hair, pois você vai encontrar um bom serviço e preços acessíveis. De 2ª a 4ª feira, há grandes promoções nos serviços oferecidos. Corte de cabelo a partir de R$ 15, escova e hidratação somente R$ 25, manicure e pedicure a R$ 15 e depilação a partir de R$ 10. O Atelier fica na Rua Dom Geraldo, 63, sl. 208, Praça Mauá. Tel.: 2233-6328.

da redação


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cidade

Qualidade de vida e contato com a história Moradores da Zona Central da cidade falam por que escolheram a região para viver Viver no Centro parece ser hoje uma experiência peculiar. Por enquanto, apenas uma pequena parcela da população prefere essa opção. A exemplo de muitas outras grandes cidades, o Rio de Janeiro sofreu um progressivo esvaziamento do Centro em detrimento de bairros mais distantes. Seguindo a própria expansão da cidade, logradouros como Catete, Glória, Flamengo, Botafogo, Tijuca, Maracanã, Copacabana, entre outros foram ganhando a preferência dos cariocas na escolha do lugar para se viver. Para efeito de comparação, a Tijuca conta hoje com cerca de 180 mil habitantes, número não muito diferente de Copacabana, do alto de seus 150 mil moradores. Nada parecido com a população fixa do Centro, que conta com apenas 40 mil habitantes. O Centro da nossa cidade é hoje fundamentalmente um local de trabalho ou negócios. Seus numerosos edifícios são ocupados por escritórios, consultórios e salas comerciais de todos os tipos. Quando a noite cai, o número de pessoas nas ruas diminui drasticamente. Mendigos, esparsos transeuntes e até mesmo travestis são os personagens mais vistos na região, com exceção da sub-região da Lapa. Nem sempre foi assim: um Rio menor e mais acolhedor pulsava e tinha a vida ancorada em sua zona central. O Centro da cidade concentrava as moradias, além do comércio, boemia, negócios. Pessoas circulavam diuturnamente pela Avenida Central. A porta de saída e entrada da cidade – e do país – era a Praça Mauá, também sede da onipresente Rádio Nacional. Cariocas ilustres

Carolina Monteiro

a escolha. Pode-se dizer, cam como vantagem adisem medo de errar, que o cional a proximidade da casal atualmente se sente Lapa com sua vida noturplenamente integrado à na. Mas nem tudo é um vida no Cenmar de rosas: tro. Segundo “Existe ainda uma graneles, viver de degradaaqui é uma ção urbana experiência em volta do única. Daniela exerce, meu edifíentre outras cio”, conta atividades, o Bernardo, cargo de viacrescentance-presidendo ainda que te do Polo o fato de não Novo Rio dispor de Antigo, órgaragem fez gão que está com que seu intimamente carro fosse ligado à reviarrombado talização da três vezes. Hélio Waizbort, “Em doze Lapa, entre professor anos, dá um outras ações. arromba“Gosto de mento a cada morar no Centro pelo valor históri- quatro anos. Pensando co, de saber que o Centro bem, acho que está na métem história, que aqui co- dia da cidade”, relativiza. Hélio observa que meçou tudo. Isso é prazeroso. O Centro reúne todos também, após a festa de os tipos de pessoas, todas cada noite, as manhãs as classes sociais. É o lu- da Lapa, especialmengar mais democrático do te antes da passagem da Rio”, conta Hélio Waiz- Comlurb, não têm nada bort, 40 anos, professor de de glamouroso, com lixo português da rede munici- e mau cheiro característipal. Depois de duas outras cos. Problemas como um experiências na região, edifício invadido próxicomprou um apartamento mo à sua casa, trazendo no disputado condomínio problemas de segurança Cores da Lapa, empreen- e falta de higiene, são dimento que vendeu todas fatores negativos, mas, as unidades em questão de segundo Hélio, não inviabiliza uma opção de horas. Junto com a esposa e vida feita de forma consum filho pequeno, Hé- ciente. E é importante lio – que, ao contrário de ressaltar que, sendo essa Bernardo, não deu chance uma tendência, ganham a ao acaso, planejando cui- cidade e seus habitantes, dadosamente sua mudan- que pouco a pouco vão ça – faz parte desse grupo recuperando, para o bem crescente de cidadãos que de todos, ruas, becos e preferem se embrenhar praças que contam a nosainda mais no “coração” sa própria história, que da cidade, indo na contra- continua sendo escrita mão daqueles que esco- aqui e agora. lhem dela se afastar, como na expansão rumo à Zona Oeste, a partir da década de 70. fabio nin Ambos os casais destafabionin@gmail.com

“Gosto de morar no Centro por saber que tem história, que aqui começou tudo. Isso é prazeroso”

O professor Hélio Waizbort, no condomínio onde mora, na Lapa

como Mário Lago e Jacob bém vivendo no Centro. São pessoas que fizedo Bandolim nasceram e ram uma escolha clara por cresceram na Lapa. A propósito, a mesma mudar seu estilo de vida, velha Lapa, que era o sua visão de cidade. Gente quartel-general da boemia como o designer Bernardo Peres, que, até os anos a partir da 30, retoma, insatisfação depois de com o desmuitos anos, conforto de seu posto, agora revitauma quase viagem dilizada, após ária desde amargar por sua Niterói décadas uma natal até o dolorosa deRio, resolcadência. A região dos Bernardo Peres, veu procufamosos Ardesigner rar moradia do lado de cos é uma cá da ponte. das grandes O acaso se responsáveis pela mudança que vem encarregou de colocar à ocorrendo ao longo dos sua frente, em 1998, um últimos anos: um número anúncio de apartamento cada vez maior de pesso- – sua moradia até hoje – as tem optado por fazer o localizado no Centro do caminho de volta, não só Rio, mais precisamente frequentando como tam- na Avenida Beira-Mar.

“Quando preciso ir à Zona Sul, vou pedalando”

Apesar de o Centro não estar entre as primeiras opções à época, Bernardo e sua esposa, a consultora Daniela Reis, resolveram fazer uma tentativa após pesar as vantagens e desvantagens de se morar na região. Para o casal, hoje a opção Centro ganha com larga vantagem. “Minha esposa trabalha no edifício ao lado. E eu gasto agora somente alguns minutos até o meu trabalho. Isso é um fator de qualidade de vida, além de uma grande economia. Quando eu preciso ir à Zona Sul, vou pedalando”, conta, se referindo à proximidade de sua residência com a ciclovia do Aterro do Flamengo. Como argumento final, a maravilhosa vista da Baía de Guanabara, a partir de sua sala de estar, se encarregou de selar


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morro da conceição Um coronel a serviço da cultura Hélio Gouveia Prado, coronel do exército da Fortaleza do Morro da Conceição, pretende presentear o lugar com o mais nobre presente que um bairro pode desejar: um centro cultural. Se o coronel de fato conseguir tudo que pretende, em pouco tempo teremos exposições, palestras, cursos e até concertos de música clássica. Ele explica que há algum tempo foi criado um Departamento de Ensino e Cultura no Palácio Duque de Caxias. Dentro desse órgão foi formado por Diretoria do Patrimônio Histórico e Cultural que é responsável pelo funcionamento de alguns museus e centros culturais, por exemplo: Museu Histórico do Exército, no Forte de Copacabana, Museu Conde de Linhares, em São Cristóvão, e Centro Cultural, na General Canabarro (próximo à escola técnica).

Ele esclarece que, onde há vida cultural intensa com cursos preparatórios para guias mirins e também esportes para as crianças, o tráfico não chega facilmente. É preciso que os órgãos governamentais cheguem antes do tráfico. Ele alerta para o problema e diz que o ambiente propício para o tráfico é a degradação. Quanto à discussão do tombamento, a Fortaleza e o Palácio Episcopal também são tombados, o exército não recebe recursos para o restauro porque, pelo orçamento da União, quem recebe os recursos é o Iphan. O coronel ressalta que, há algum tempo, havia atritos entre o exército e o Iphan, mas depois que o senhor Carlos Fernando de Souza Leão assumiu a superintendência do órgão houve bastante união e entendimento de ambas as partes e quem ganha com isso são os moradores. Não há dúvidas de que a tranquilidade que existe neste morro se deve à presença do exército, e não há dúvida também de que o empenho do coronel Gouveia o levará para a história como “O homem que mudou para melhor a vida dos moradores deste bairro”. Para terminar a entrevista, fiz uma pergunta surrealista: Se pudesse voltar no tempo, que personaliCoronel Hélio Gouveia Prado dade gostaria de ter conheInspirado nessas inicia- cido? Ele me respondeu que tivas que já deram certo, é gostaria de ter conhecido que o coronel Gouveia tenta o engenheiro francês Jean trazer para o Morro da Con- Massé, que projetou o muro ceição esse projeto cultural da Fortaleza e também o do que, com certeza, será rece- Morro do Castelo. Ele foi, na bido de braços abertos pelos verdade, grande arquiteto da moradores. época que mudou a cara da O coronel afirma que cidade. O coronel acrescenestá tentando criar uma tou também que, se ele puassociação cultural na for- desse, gostaria de voltar no ma da lei que possa gerir tempo para conhecer Pereira essas atividades, mas para Passos, que deixou para semisso deverá ser concedido pre um marco na história da cessão de uso. Assim, essa nossa cidade associação ganhará vida própria independente de quem quer que esteja no teresa speridião comando do exército. teresa.speridiao@gmail.com

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Colados na Copa Amor pelo futebol une torcedores na difícil tarefa de completar o álbum da Copa Fabíola Buzim

Alunos do Pedro II olham o que já está completo: além de informativo os álbuns ajudam na socialização

O velho adágio “todo brasileiro gosta de futebol” se confirmou, ao menos no sentido figurado, com a mania dos álbuns da Copa do Mundo. A redação da Folha da Rua Larga conferiu o encontro de colecionadores que ocorre aos sábados na Rua Uruguaiana. Lá pessoas de diversos perfis e faixas etárias trocam e compram os cromos, na ânsia de completar o álbum. O hobby envolve toda a família e é comum encontrar pais e mães acompanhando seus filhos no encontro. O representante comercial Júnior Carvalho, de 33 anos, levou o filho e a esposa. Para ele, o mais interessante é a socialização que o encontro possibilita: “Aqui a gente encontra várias pessoas, conversa, se identifica”, comenta. Há também algumas avós ajudando seus netos. A aposentada Marizia de Amorim, de 68 anos, começou a participar para agradar o neto e virou fã. Ela repassa as figurinhas em excesso para outras crianças, mas o álbum do neto é prioridade. Enquanto concedia a entrevista, ficava atenta às possibilidades de troca. Chegou a negociar com três pessoas ao mesmo tempo, e

se justificava: “Faltam só 15 figurinhas. Quero terminar hoje!”. Já o neto, contou ela, ficou em casa por ser ainda pequeno para isso. Como existem muitas possibilidades de troca, é necessário fazer um controle dos cromos que estão faltando. Alguns anotam na mão, outros em pedaços de papel e há o caso da engenheira Marcela Baver, de 30 anos, que levou uma tabela feita no Excel para seu controle. Superorganizada, além do seu álbum, ela negociava para mais duas colegas. “Se não fizer desse jeito, eu me perco. São muitas figurinhas!”, explica. O movimento é intenso nas bancas e para os vendedores ambulantes. Existe a possibilidade de adquirir as figurinhas que estão faltando e até a de comprar o álbum já montado. O vendedor Henrique Gomes Nascimento, de 37 anos, conta que a clientela chega cedo. “Tem gente que marca às 5h30 porque tem que trabalhar depois. Dependendo do movimento, às vezes saio daqui só às 23h”, explica. Ele começou a trabalhar na Copa de 2006 e não cogita parar. Os vendedores pensam nos lucros e os colecionadores

querem mesmo é completar o álbum, independente do valor. Uma pessoa pode gastar em média R$ 150. Um envelope com cinco cromos custa R$ 0,75. Fora da banca, uma figurinha considerada “rara” pode chegar ao valor de R$1. Há casos de o colecionador gastar R$ 100 em um dia. Produzido pela editora Panini, o álbum deste ano tem 640 cromos e o preço oficial é R$ 3,90. Cada seleção ocupa duas páginas no livro ilustrado. São 17 jogadores, mais o escudo e o time posado. Todos os 32 países participantes da Copa do Mundo têm o mesmo espaço. Bafo simples e à vera As escolas também são terrenos “férteis” para os colecionadores. No horário de intervalo nos colégios Pedro II e Rivadávia Correa, o movimento de troca é intenso. Daniel Henrique, de apenas 12 anos, começou a colecionar incentivado pela irmã. Ele ainda não conseguiu completar o álbum e reclama que o brasão do Brasil é a figurinha mais difícil de achar. Já Marcelo Monte, de 11 anos, não teve uma história feliz. Ele

montou o álbum em apenas duas semanas, mas foi roubado. “O ladrão não queria dinheiro, só levou o meu álbum”, lamenta. As meninas também gostam de colecionar. A estudante Lívia Oliveira Lima, de 11 anos, estava ajudando o irmão e acabou gostando do hobby. Para trocar não fica intimidada e até participa do jogo de bafo. É uma brincadeira muito comum entre colecionadores, e se o jogo for ao vale-tudo, a pessoa tem que entregar os cromos sem resmungar. “Meu colega já perdeu 40 figurinhas. Tentou voltar atrás, mas não podia, pois o jogo era à vera: se apostar você perde e não pode reclamar”, explica. Para o professor de matemática Marcelo Salvador, esta prática é valiosa, pois fortalece a socialização entre os alunos. Ele também coleciona junto com os filhos e gosta de observá-los negociando. “A troca é um aprendizado e comprar o álbum pronto não tem graça nenhuma. O legal mesmo é trocar”, defende. fabiola buzim fabiolabuzim@gmail.com


14 folha da rua larga

maio – junho de 2010

gastronomia

Quilo com jeito de bistrô

receitas carol

Baroa alia aconchego da comida caseira à sofisticação exigida pelos paladares apurados Divulgação

De meio-dia a duas da tarde é comum ver pessoas aguardando do lado de fora do Baroa Sabor Caseiro, na Rua da Quitanda, entre a Visconde de Inhaúma e a Rua São Bento. Os funcionários, munidos de walkie-talkies e crachás digitais a fim de agilizar a acomodação de todos, servem croquetes e outros salgadinhos para atenuar a espera. Esses e outros mimos são a marca do atendimento cuidadoso do Baroa. Escondidinho, bacalhau, batata rostie e arroz de funghi são alguns dos pratos mais pedidos pelos clientes. Os donos, Luís Carlos de Moura e Lúcia Regina da Silva, ressaltam a qualidade dos produtos utilizados citando como exemplo os peixes servidos: congro negro, linguado e truta. “Servimos peixes de primeira qualidade e sempre frescos”, afirma o dono do estabelecimento. Ele explica que a concepção dos pratos fica a cargo da esposa, responsável pela gastronomia e pela administração do negócio. Há um ano na região, o Baroa busca aliar o aconchego da comida caseira à sofisticação exigida pelos paladares mais apurados. O lugar, frequentado por trabalhadores das redondezas da Praça Mauá, prima pela associação da comida simples e saudável com o serviço de degustação. Luís Carlos de Moura, formado em Análise de Sistemas, diz que o desafio está na apresentação: “Em geral, a comida a quilo vem jogada em grandes vasilhames. Aqui procuramos fazer porções individuais. Então a apresentação do prato quando acaba de ser servido é semelhante a do à la carte”, explica Luís. E dá a receita: “Vasilhas pequenas, para reposição contínua, e funcionários encarregados somente desta tarefa – observar se está precisando repor e

Divulgação

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comunicar a demanda à cozinha – faz com que a comida esteja sempre quente e fresquinha”. Outro aspecto que chama atenção de quem entra no restaurante é a ambientação. Quadros criados por Toni Varella, diretor de arte e designer que se especializou pela Disney em Eatertainment – asso-

ciação de comida a entretenimento – e concebeu marcas brasileiras importantes, como Joe e Leo’s, Bob’s, Frontera e Galeria Gourmet, criou a identidade visual do lugar, os produtos relacionados e até opinou na música, conta Luís. Os frequentadores são embalados por bossa nova, jazz, chorinho, e artistas como Pu-

tumayo, em um ambiente de descontração e relaxamento. Luís Carlos explica que o Baroa não é um restaurante japonês, porém se destaca dos quilos que oferecem o gênero: “Não é o nosso carro-chefe, mas temos um sushiman. Geralmente, os restaurantes a quilo terceirizam isso, o que compromete um pouco o frescor desses alimentos, que são delicados”, esclarece. A partir da observação das necessidades das empresas da região, Luís passou a abrir a casa pela manhã: “Existem empresas que optam por reuniões com café da manhã. Estamos abertos para isso. Às vezes é indicado fugir um pouco do ambiente de trabalho, mudar os ares para dar margem a novas percepções e abordagens”. O café da manhã a quilo tem bastante procura: R$ 2,69 cada 100g. Pães multicereais, quiches, muffins, croissants e capuccinos são algumas das opções do serviço, disponível de segunda a sexta-feira, das 7h30 às 10h. As novidades do cardápio são o petit gâteau com sorvete (R$ 11,40) e a salsichinha alemã temperada com ervas, alho ou recheio de provolone (R$ 4,79 cada 100g). Além disso, todos os dias há um suco de fruta em promoção, por R$ 3,50: “Pedimos para os nossos atendentes perguntarem aos clientes ‘deseja um suco?’, em vez de perguntar ‘o que deseja beber?’. Sugestionamos dessa forma, porque sabemos dos benefícios que esse hábito pode trazer”, finaliza Luís Cláudio, que pretende abrir uma franchising da marca. Horário de funcionamento: 7h30 a 15h30. Horário promocional: 11h30 a 12h e após as 14h30.

sacha leite sacha@folhadarualarga.com.br

Recebi um texto esses dias por email, de autor desconhecido, que dizia como é bom ter mãe! É bom quando se é criança e também é bom quando adulto. Mãe é bom em qualquer idade. Um apoio sincero quando as coisas não vão bem, um olhar sem que nada precise ser dito, um colo num momento difícil. Um amor verdadeiro e desmesurado, que mima a gente sem querer nada em troca, bom, talvez só um pouco de atenção, mas elas merecem. E, depois que somos mães, passamos a dar mais valor para elas! Entendemos as preocupações excessivas e as mil recomendações diárias.

Pensando nelas, escolhemos uma sobremesa fina, de sabor suave, que conforta o paladar – a cheesecake é uma torta generosa e maternal! Aqui sugiro uma geleia de amora para acompanhar, mas morango, laranja e até chocolate iriam muito bem também. Que a sua casa seja que nem coração de mãe nesta Copa do Mundo. Enfeite toda a casa, se vista de verde e amarelo e receba os parentes e amigos para degustar salgados e doces gostosos como esta cheesecake. Esse é o verdadeiro espírito esportivo que une todo o mundo!

Cheesecake ACP

Ingredientes 700g de cream cheese 140g de açúcar branco 1 colher de sopa de baunilha 3 ovos 30g de chocolate meio amargo ½ xícara de geleia de amora Modo de Fazer Bata o cream cheese com o açúcar até ficar cremoso. Misture a baunilha nos ovos e acrescente aos poucos na batedeira; deixe misturar bem.

Derreta o chocolate em banho-maria e misture em uma xícara de massa. Na hora de montar, coloque a massa branca, espalhe a mistura de chocolate por cima e cubra com mais uma camada de creme branco. Asse em forno pré-aquecido a 200 graus por 30 minutos. Deixe esfriar na forma. Coloque em um prato e cubra com a geleia.

ana carolina portella carolnoisette@hotmail.comr


15 folha da rua larga

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esporte

Correr, superar e vencer Maratona do Rio coroa o espírito olímpico da cidade agregando 18 mil atletas Divulgação

A escolha do Rio de Janeiro como sede dos Jogos Olímpicos de 2016 esquentou as turbinas do esporte no cenário carioca. Nesse contexto, a Maratona Caixa da Cidade do Rio de Janeiro ganha outra dimensão de importância, alcançando posição privilegiada entre as principais competições do gênero no mundo. A prova, que faz parte do calendário oficial de eventos do município, acontecerá no dia 18 de julho. São 42km de percurso, disputados do Recreio dos Bandeirantes até o Aterro do Flamengo. Para os atletas de plantão, vale lembrar que as inscrições permanecem abertas até o dia 9 de julho e qualquer cidadão maior de 20 anos de idade pode participar. “Se pararmos para escutar cada participante falando sobre a prova, seja ele maratonista de primeira viagem ou atleta de elite, teremos exemplos de dificuldade, determinação e superação, pois o que há de mais valioso na maratona é que sem essas três características o atleta não completa a prova”, sintetiza Eduardo Magalhães, diretor executivo da Dream Factory Sports, empresa organizadora da Maratona do Rio. De acordo com Pedro Paulo Moreno, gerente de marketing esportivo da Caixa Econômica Federal, principal patrocinadora da prova desde 2004, o esporte é um setor capaz de gerar bem-estar econômico e social: “Um volume muito grande de recursos financeiros é movimentado, gerando milhares de empregos e oportunidades. Além disso, é uma das principais ferramentas de resgate social, contribuindo bastante para a diminuição dos níveis de violência”. Oscar Guerra, superintendente de Comunicação Empresarial da Light, fala das vantagens em se participar da Maratona Caixa da Cidade do Rio de Janeiro: “Ao

rem qualquer tarefa de forma mais disposta. A fim de incentivar a integração dos funcionários e a aquisição de hábitos saudáveis, muitas empresas estimulam a participação de seus colaboradores. Oscar Guerra cita o caso da Light: “Recentemente, inauguramos uma academia de ginástica e musculação completíssima, com aparelhos de última geração. É a academia corporativa mais bem montada que se tem conhecimento no Rio de Janeiro. E que este ano nossos funcionários atletas possam trazer medalhas”. Os realizadores afirmam que o Rio de Janeiro está caminhando a passos largos para se tornar um polo do esporte: “Além do cenário de prova mais bonito do mundo, a cidade do Rio de Janeiro passou a destaque no cenário esportivo mundial com a conquista do direito de sediar os Jogos Olímpicos em 2016, ser sede da final da Copa do Mundo de futebol em 2014, e dos Jogos Mundiais Militares em 2011”, comemora Eduardo Magalhães. Oscar Guerra citou o engajamento dos patrocinadores como fator fundamental para o sucesso do evento: “Hoje a Maratona tem apoiadores convictos e uma produção de primeiro mundo. Conta com o incentivo do governo do Estado e da prefeitura. A Ma-

ratona do Rio viajou o mundo em 2009 e 2010, divulgando a cidade maravilhosa por meio de feiras e convenções internacionais. A expectativa é termos recordes de inscrições sendo superados sistematicamente”. Apesar de não ser uma prova específica para deficientes físicos, a Maratona do Rio está aberta também para esse público: “Desde que começamos a organizar a prova, em 2003, a Maratona do Rio de Janeiro é acessível a portadores de deficiência. Em 2010, aumentamos a divulgação da acessibilidade, pois queremos aumentar o número de participantes com essa característica”. A premiação será feita em dinheiro para os cinco primeiros lugares, categorias masculina e feminina, e vencedores das faixas etárias. Haverá também troféu e premiação em dinheiro para os três primeiros na categoria especial, de portadores de deficiência. A organização informa ainda que as três equipes com maior número de inscritos receberão troféus e todos os inscritos que completarem a prova ganharão medalhas.

“Alem do cenário de prova mais bonito do mundo, a cidade do Rio de Janeiro passou a destaque no cenário esportivo mundial com a conquista do direito de sediar os Jogos Olímpicos em 2016”

Em 2009, 15 mil maratonistas disputaram os 42 Km de prova, na orla do Rio

esportista carioca, o desafio de vencer a mais bela competição do mundo, que, para ele, acontece em casa. Aos outros, a oportunidade de participar de uma competição internacional, reconhecida não apenas como evento esportivo, mas como evento turístico, econômico, de interação social. Além da chance de projeção do nome dos atletas que garantem boas colocações”, convoca. A maratona foi concebida em 1896, durante os primeiros Jogos Olímpicos da era moderna.. Nesse contexto simbólico e internacional,

Pedro Paulo Moreno universaliza: “O esporte permite, além da aproximação e confraternização dos povos, a divulgação de uma melhor imagem externa do país. Além disso, pode ser utilizado como elemento de motivação da educação tradicional, possibilitando uma maior interação com o meio ambiente”. Quando questionados a respeito do longo trajeto, os organizadores recomendam que os participantes se preparem adequadamente para a prova a fim de evitar acidentes: “É preciso, sim, uma

preparação, mas ela varia de acordo com o histórico esportivo de quem pretende correr a prova. O atleta que corre a Maratona deve ter alguma experiência. Alguns treinadores sugerem que se participe de uma primeira maratona após a prática em provas menores, como as de 10km, 15km e 21km. No entanto, ainda assim, todo atleta pode participar de uma maratona, desde que faça um treinamento específico para a prova de 42km”, recomenda Eduardo Magalhães. O esporte é capaz de motivar os cidadãos a exerce-

da redação redacao@folhadarualarga.com.br


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lazer

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dicas da cidade Um novo Festival da Canção As inscrições para o 1º Festiguá (Festival da Canção de Jacarepaguá), promovido pela Banda da Freguesia, vão até dia 10 de julho. A ideia é incentivar a criação de novas bandas e comemorar o aniversário de 416 anos do bairro. Uma comissão técnica irá escolher três vencedores que irão faturar prêmios em dinheiro. Cada participante poderá inscrever um número ilimitado

de composições inéditas, de qualquer gênero musical, nas categorias Composição, Intérprete ou Arranjo. A lista de finalistas será divulgada no dia 1º de agosto, através do site www.bandadafreguesia.org.br. Arte na parede O CCJF acolhe, até 8 de agosto, o Parede 2010 – II Festival Internacional de Pôster Arte do Rio de Janeiro. Eduardo Denne e Marco Antonio Teobaldo, organizadores do evento, afirmam que, este ano, o festival terá uma grande exposição coletiva com os artistas inscritos e convidados, como o paulistano

Ozi, um dos pioneiros da Street Art no Brasil. Além disso, o evento apresentará uma mostra de vídeos relacionados ao tema do festival nas galerias do CCJF. Durante o período de realização do Parede, exposições coletivas serão feitas simultaneamente em outros espaços como o Zero Grow e o 00. Fotopinturas A mostra “Distante / Far Away”, da artista plástica Katie van

Scherpenberg, fica no Paço Imperial até dia 25 de julho. Com curadoria de Paulo Herkenhoff, a exposição traz 14 séries de fotografias tiradas em lugares como Patagônia, Piauí, Amazônia, complementadas por vídeos e pinturas. Nascida no Brasil, a pintora passou grande parte de sua vida na Amazônia, depois morou na Alemanha, até se estabelecer no Rio, em 1973. “Distante / Far Away” é uma exposição com as intervenções feitas pela artista nos últimos trinta anos e pela primeira vez mostradas em conjunto.

da redação redacao@folhadarualarga.com.br

100 velas para Noel CCL presta homenagem ao boêmio que trouxe o samba para o asfalto Divulgação

2010 é o ano do centenário de nascimento do boêmio Noel Rosa, músico que produziu, em apenas 26 anos de existência, mais de 300 composições, tornando-se conhecido no Brasil e no exterior como um grande expoente da MPB. Para lembrar o brilho do artista e resgatar sua obra, o Centro Cultural Light receberá o espetáculo “Noel, feitiço do samba”, que trará 14 artistas, da nova e da velha guarda, para interpretar suas canções, cada qual ao seu modo, mostrando que a obra do artista é contemporânea. Monarco, Nelson Sargento e Elton Medeiros são alguns dos nomes que representarão os artistas mais antigos. Já da nova geração, Marcos Sacramento, Zé Renato, Anjos da Lua com Alfredo Del Penho, Galocantô, Batuque na Cozinha, Henrique Cazes, Cristina Buarque, Nilze Carvalho e Ana Costa darão o recado a quem aparecer no CCL às 12h30 em dia de show. O produtor Leonardo Conde, idealizador da homenagem, lembra da importância de mesclar as gerações: “Essa galera

O grupo Batuque na Cozinha é uma das atrações confirmadas no espetáculo “Noel, feitiço do samba”

da renovação cultural da Lapa tem tudo a ver com a energia do Noel, que frequentava o bairro”. Noel Rosa trabalhou no rádio e compôs muitos jingles (peças publicitárias em áudio) para lojas como O Dragão, a fera da Rua Larga. As canções do artista se assemelhavam a crônicas que retratavam os costumes e o dia a dia da época com muito humor e ironia. A reforma ortográfica de 1931, por exemplo, foi comentada

Centro do Rio retratado por Noel Dama do Cabaré (1936) Foi num cabaré na Lapa Que eu conheci você Fumando cigarro, Entornando champanhe no seu soirée Dançamos um samba, Trocamos um tango por uma palestra Só saímos de lá meia hora Depois de descer a orquestra Em frente à porta um bom carro nos esperava Mas você se despediu e foi pra casa a pé No outro dia lá nos Arcos eu andava À procura da Dama do Cabaré Eu não sei bem se chorei no momento em que lia A carta que recebi, não me lembro de quem Você nela me dizia que quem é da boemia Usa e abusa da diplomacia Mas não gosta de ninguém Foi num cabaré na Lapa...

na canção Picilone, em que Noel escreve sobre Yvone, a irmã de um amigo. Ele ficara preocupado, já que as letras K, W e Y haviam sido cassadas, após um acordo ortográfico entre Brasil e Lisboa: “Já reparei outro dia / Que o teu nome, ó Yvone / Na nova ortografia / Já perdeu o picilone”. O primeiro grande sucesso de Noel foi o samba Com que roupa, uma alusão à crise mundial iniciada com o crack da bolsa de valores de Nova Iorque: “Eu hoje estou pulando como sapo, pra ver se escapo / desta praga de urubu / Já estou coberto de farrapo, eu vou acabar / ficando nu”. A canção já foi regravada por grandes nomes da MPB, como Caetano Veloso. Noel Rosa estudou no Colégio de São Bento, escola até hoje exclusivamente masculina, situada na região da Rua Larga. “Sempre foi um aluno irreverente”, relata Leonardo Conde. “Prestou vestibular para Medicina e passou. Porém não cursou a faculdade. Preferiu investir no seu talento, dedicando-se inteiramente à música”, completa. O produtor responsá-

vel pelo projeto diz que Noel Rosa representou a validação do samba do morro no asfalto: “Na época, existia um grande preconceito social, maior ainda do que hoje. Noel ia à Mangueira e ficava lá no Zicartola, incorporando os elementos do samba e levando para o asfalto, numa época em que existia um preconceito em questão de samba do morro. Noel tinha uma personalidade muito forte”. A escola de samba Unidos de Vila Isabel, que homenageou o artista com o enredo “Noel, a presença do poeta da Vila”, no Carnaval 2010, também participará do projeto, em conjunto com o ator Rafael Raposo. O intérprete, que encarnou o compositor no filme Noel, poeta da Vila será o mestre de cerimônias do evento. O produtor Leonardo Conde se emociona com a valorização dos grandes ícones da música brasileira: “Temos feito diversos projetos de resgate da música brasileira. Ano passado fizemos Cartola”, se orgulha. Leonardo lembra a importância de se incentivar projetos de revitalização, resgate e democratização, como em “Noel, feitiço do samba”: “Os shows são gratuitos, com retirada de senha uma hora antes. O contato com artistas desse naipe é complicado, já que costuma ser feito por meio de espetáculos com ingressos muito caros”. Peças como Palpite Infeliz, Faixa Amarela, O orvalho vem caindo, As pastorinhas e Gago apaixonado fazem parte do repertório dos shows. Confira datas e horários no site www.light.com. br, na seção Programação, em Centro Cultural Light. da redação redacao@ folahadarualarga.com.br


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