Folha da Rua Larga Ed.30

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Carolina Monteiro

Hora de desdobrar os fios de Adrianna

Redescoberta do Cais do Valongo vira filme

Teresa Speridião apresenta mais um perfil de parceiros profissionais que têm ateliês no Morro da Conceição. Desta vez, a escolhida é a artista plástica Adrianna eu.

folha da rua larga

Docudrama de Wavá de Carvalho, historiador e diretor de audiovisual do Instituto Pretos Novos, mostra encenações e depoimentos de estudiosos a respeito do passado negro na região. Página 5

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folha da rua larga RIO DE JANEIRO | NOVEMBRO – DEZEMBRO DE 2011

opinião

O que se escreve sobre os moradores da região

Revitalização da Rua Larga | Zona Portuária | Centro do Rio

DISTRIBUIÇÃO GRATUITA Nº 30 ANO IV

Rio ganhará circuito de visitação para memória contínua da cultura africana

Eduardo Rudge

O antropólogo e residente do Morro da Conceição Tomas Martin Ossowicki discorre sobre os trabalhos acadêmicos de duas etnógrafas, que inspiraram um seminário organizado por ele para debater o bairro. página 6

boa vida

Festas regadas a bebida gelada e borbulhante Nei Passos estreia coluna sobre vinhos na editoria Boa Vida, em que aborda peculiaridades, mistérios e dicas sobre a festejada bebida. Nesta edição, o sommelier revela nuances entre os diversos espumantes e fala da expressividade dos nacionais. página 11

gastronomia

Cinema e botequim em um só espaço página 14

O subsecretário de patrimônio, Washington Fajardo, apresenta o Circuito Histórico e Arqueológico de Celebração da Herança Africana. Lideranças culturais e relacionadas ao movimento negro foram convidadas para compor um comitê do percurso, que inclui seis pontos históricos. páginas 12 e 13 Lielzo Azambuja

cultura

Porto e Morro da Conceição no Centro Cultural Correios Duas exposições revelam abordagens diversas acerca da região: Um século de vivências num porto moderno e Morro da Conceição pelas lentes de Marcelo Frazão e Luis Christello. O curador Fernando Dumas fala sobre a importância social da mostra e Frazão versa sobre a arte de registrar o tempo. páginas 8 e 9


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nossa rua espaço dos leitores

O que não pode faltar na nova região portuária?

Prevenção de incêndios no Morro da Conceição

Fabiola Buzim

“Deveriam construir mais ciclovias para incentivar os moradores e frequentadores da região a utilizarem bicicletas como meio de transporte alternativo, inclusive para o lazer, como está sendo feito em outros bairros da cidade.” Michele Martins de Souza, consultora de vendas

Fabiola Buzim

“Imagino que o bairro ficará muito melhor do que está, mas espero que, depois que terminarem todas as obras, eles tenham a consciência de manter uma fiscalização e manutenção do que foi feito, como a limpeza das praças.” Luiz Antônio Barbosa, zelador

Acabo de vender meu apartamento na Rua do Jogo da Bola, onde morei desde que nasci, há 82 anos. Acompanho os projetos de obras no Morro da Conceição e compareci a diversas reuniões do projeto Porto Maravilha. Há muito tempo os moradores do Morro estão preocupados com o fato de que há somente um hidrante no local. Já presenciei três situações em que os bombeiros tiveram dificuldades. Isso precisa mudar. O incêndio não avisa quando vai chegar. Moacyr Rodrigues Segurança para quem trabalha na região portuária Uma cracolândia se instalou na Av. Barão de Tefé, ao lado do sítio arqueológico descoberto durante as obras, bem em frente ao armazém onde trabalho. Hoje saí escoltada por um segurança até a Av. Venezuela, porque a área estava bem perigosa, pessoas discutindo, gritando, agressivas, visivelmente drogadas. Ontem uma mulher invadiu o armazém gritando, porque um homem, com uma pedra na mão, corria atrás dela dizendo que ia matá-la. Foram contidos por um segurança, isso ainda à luz do dia. Legal fazer a obra, revitalizar a área do porto, etc., mas seria legal também garantir a segurança de quem trabalha ou mora por lá, com um policiamento mais ostensivo à noite. Andrea Barreto (enviado por leitor)

Fabiola Buzim

“Eles deveriam criar um corredor exclusivo para os ônibus e táxis, assim como foi feito em Copacabana, além de criar um sistema de rodízio de carros. Isso porque esta região é histórica e merecia maior funcionalidade nesse aspecto.” Cristian Alves, gerente de projetos

A passagem para carros na Sacadura Cabral, em obras, está mais restrita e com enormes buracos.

folha da rua larga Conselho Editorial - André Figueiredo, Carlos Pousa,

Tomas Martin Ossowicki

Francis Miszputen, João Carlos Ventura, Mário

Projeto gráfico - Henrique Pontual e Adriana Lins

Margutti, Mozart Vitor Serra

Diagramação - Suzy Terra

Direção Executiva - Fernando Portella

Revisão Tipográfica - Raquel Terra

Editora e Jornalista Responsável - Sacha Leite

Produção Gráfica - Paulo Batista dos Santos

Colaboradores - Ana Carolina Portella, André Calazans,

Impressão - Maví Artes Gráficas Ltda.

Carolina Monteiro, Danielle Silveira, Eduardo Rudge,

www.maviartesgraficas.com.br

Fabiola Buzim, Fernando Portella, Izabella Jacobina,

Contato comercial - Teresa Speridião

Lielzo Azambuja, Mário Margutti, Teresa Speridião,

Tiragem desta edição: 6.000 exemplares

Redação do jornal Rua São Bento, 9 - 1º andar - Centro Rio de Janeiro RJ - CEP 20090-010 - Tel.: (21) 2233-3690 www.folhadarualarga.com.br redacao@folhadarualarga.com.br

A Folha da Rua Larga recebe opiniões sobre todos os temas. Reserva-se, no entanto, o direito de rejeitar acusações insultuosas ou desacompanhadas de documentação. Devido às limitações de espaço, será feita uma seleção das cartas e, quando não forem concisas, serão publicados os trechos mais relevantes. As cartas devem ser enviadas para a Rua São Bento, 9 sala 101 CEP: 20090-010, pelo fax (21) 2233-3690 ou através do endereço eletrônico leitor@folhadarualarga.com.br.


nossa rua

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Providência receberá espaço de leitura Maurício Hora

Para estabelecer uma mediação entre os jovens da comunidade e o universo literário, o Sarau Providencial, realizado há dois anos no Morro da Providência, desenvolve atividades lúdicas de incentivo à leitura. Pois o projeto acaba de receber apoio do governo federal, através do edital Microprojetos para territórios de paz, o que possibilitará a estruturação de um espaço físico de leitura. A proposta apresentada pelo núcleo voluntário do Sarau amplia as ações do grupo iniciadas anteriormente à instalação da UPP na comunidade. Assim que erguido, o local será batizado “Espaço de Leituras Ana Maria Machado”. O motivo da homenagem é que, em 2010, a acadêmica doou exemplares de todo o seu catálogo infanto-juvenil para o acervo do Sarau Providencial.

Realizado na Casa Amarela, espaço cultural dirigido pelo fotógrafo Maurício Hora, da ONG FavelArt, o Sarau Providencial é viabilizado por voluntários que dedicam parte do seu tempo, um sábado por mês, para a facilitação e o estímulo da leitura. A dinâmica do Sarau é a seguinte: um tapete de plástico de quatro metros quadrados é estendido pelos próprios jovens, no chão da praça. Em seguida, os livros de poesia são espalhados pelo tapete, e cada criança ou jovem escolhe a sua poesia a ser lida. Atualmente, quatro voluntários colaboram com o projeto: Gabriella Russano, João Guerreiro, Maurício Hora e Nivea Andrade. Eles estimulam e ajudam as crianças e os jovens a ensaiarem a sua apresentação de poesia. Os participantes são chamados ao microfone para

O Sarau promove atividades de estímulo à leitura com crianças no Morro da Providência

mostrar o que foi ensaiado. A regra é a seguinte: toda criança ou jovem que ler um trecho de poesia ganha um livro de presente. “Com o desenvolvimento do projeto, pretendemos, além das declamações de poesia, orga-

nizar contações de histórias para as crianças e rodas de leituras com os adolescentes, e ampliarmos as atividades para os dias de semana”, conta Nivea Andrade, coordenadora pedagógica da proposta. Segundo o coordenador

de projetos culturais João Guerreiro, o Sarau acontece de acordo com alguns princípios: para a leitura não existe lugar adequado ou melhor postura. Todos os que quiserem podem ler uma ou mais frases de poesia. Os jovens

que não sabem ler são incentivados a memorizar poesias. “Lemos no Largo da Igreja, no alto do Morro da Providência. Em pé, sentados ou deitados, não existe postura ou pessoa ideal para ser leitora. Procuramos dessacralizar a atividade, torná-la cotidiana”, garante. Em janeiro, o núcleo do Sarau Providencial deverá se reunir com os jovens participantes para organização do espaço de leituras. “Faremos mutirão, solicitaremos ajuda (como sempre) e definiremos os livros a serem comprados. Agora que fomos certificados pelo MinC, quem sabe não surgem parceiros públicos e privados interessados em incentivar o Sarau?”, torce João Guerreiro.

da redação redacao@folhadarualarga.com.br


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boca no trombone

Cliques Rua Larga Sacha Leite

Brilha no céu do Rio um ovo estrelado

A imagem do nosso Rio de Janeiro nunca esteve tão saborosa, bem feijoada, gingada de sol e samba, bronzeada, antes mesmo do verão. É claro que há muito que fazer, mas a diferença é que agora temos mais esperanças de que (a gente) pode mudar. Precisamos adquirir novos hábitos, deixar certas manias de falar mal de tudo e de gostar de sangue nas manchetes dos jornais. Eram 9 horas da noite. Um amigo meu, desses que viram a noite bebendo, pediu licença, deixou sua parte da conta e disse que tinha que ir cedo para casa. Ninguém entendeu! “Algum problema?”. “Não, pelo contrário, quero acordar às 4 horas da manhã, pegar um lugar em cima do túnel da Rocinha para assistir a ocupação.” Dois dias antes, quatro rodas de um carro elegante rolaram descida, buraco abaixo, favela cercada. Uma mão de guarda se estendeu, rodas pararam, gravatas saltaram, documentos daqui e dali... “Abram o porta-malas!”. Não abriram, foram conduzidos entre euros e dólares para a Federal. Nova parada no caminho, mais oferta de grana, agora em reais. A carteira do guarda excitou, pensou na família, em Deus e não cedeu – milagre! – veio a confissão... Numa posição fetal, prenderam o bandido mais procurado do Rio de Janeiro, o traficante “Neném”. NEM uma arma, chupeta, canivete, fralda, AR-15, mamadeira. NEM uma reação, a criança é algemada: “Mãe, não deixe os meninos faltarem à escola!” foram suas últimas palavras em liberdade. Dias depois, reencontrei o meu amigo e perguntei: “Como foi a ocupação?”. “Sem graça, acabei dormindo, quase caí lá de cima do túnel. No início, até que foi emocionante: tanques, blindados, helicópteros, muitos soldados. Tudo indicava que seria uma bela operação de guerra, mas não houve tiros, mortes, prisões, nenhuma bala perdida, nada. Acho que tem alguma coisa errada.” Antes: pés descalços, 12 anos, corre, sobe o muro, cai do outro lado. Botas atrás pulam o muro, perseguem... Pés descalços viram esquina, derrubam latas, foge o gato pelo esgoto a céu aberto, portas trancadas, sem saída. Revólver aponta, tiro certeiro, morre João, filho da cachaça desempregada, da mãe que não se sabe aonde, perdido de nós. Agora, quem sabe Rocinha, Vidigal, Chácara do Céu e tantas outras pacificadas... Agora, quem sabe a pipa possa voltar a subir e a bola possa rolar entre sorrisos de ingenuidade.

fernando portella cottaportella@globo.com

O Moinho Marilu, na Gamboa, em frente à Rua Pedro Ernesto, está sendo revitalizado. O destino da antiga e monumental construção ainda não foi divulgado. Sacha Leite

Placa da Rua Sacadural Cabral, no Largo de São Francisco da Prainha. O lugar entrou em reforma e o bloco Escravos da Mauá irá definir outro local para os ensaios.


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entrevista

Cais sobre cais Docudrama traz encenações e falas de pesquisadores sobre a redescoberta do Valongo Carolina Monteiro

O historiador Wavá de Carvalho recebeu a reportagem da Folha da Rua Larga no Instituto Pretos Novos, na Gamboa, onde trabalha como diretor de audiovisual. Também diretor de teatro e vídeo, ele acaba de lançar o filme Cais do Valongo, sangra da terra, exibido no 5º Encontro de Cinema Negro: Brasil, África e Caribe, no Centro Cultural Justiça Federal, em novembro. O longa-metragem narra o processo de redescoberta de um capítulo da história da cidade que está sendo registrado apenas neste momento. O Cais por onde entraram milhares de escravos trazidos da África desde 1811 foi coberto pelo Cais da Imperatriz, em 1843. A redescoberta, 200 anos após sua construção, mobiliza a comunidade negra carioca e exige uma espécie de reparação simbólica da população. Como surgiu a ideia do filme? Fui convidado pelo Zózimo Bulbul para o 5º Encontro de Cinema Negro: Brasil, África e Caribe realizado no Centro do Rio, em novembro. A partir desse convite e dos achados arqueológicos emergentes com as obras de revitalização na região, decidi me debruçar sobre esse tema, porque isso não é algo que se aprende nas escolas, ainda. O material bibliográfico e científico sobre o Cais do Valongo está sendo gerado agora, nunca se falou sobre o assunto no Brasil. Esse foi um episódio que ficou 200 anos silencioso e somente em 2011, ressurgiu e não deverá ser esquecido jamais. O cemitério de Pretos Novos, vizinho ao Valongo, é o que chamamos de holocausto negro. Qual foi o gênero selecionado?

Como tem sido a reação do público? Fica um silêncio absoluto na hora em que são mostradas as ossadas. Queriam esconder essa mancha da história do Brasil, por isso construíram o Cais da Imperatriz sobre o Valongo. Existia uma pressão política para a abolição da escravatura. Vários estados aboliram antes do Rio de Janeiro. Planeja algum filme para o futuro?

Wavá de Carvalho, diante de material arqueológico, no IPN

Escolhi o docudrama porque sou diretor de teatro, então para mim é natural a abordagem da ficção. Mas não abri mão das entrevistas porque é um tema que merece respaldo científico para as pessoas conhecerem a seriedade das informações. Trazemos depoimentos de professores, doutores, PHDs, mas exibimos no Complexo do Alemão, em Realengo e aqui na Zona Portuária. Queremos democratizar essa informação. A construção do Valongo, há dois séculos, foi uma solução para “limpar” a Praça XV. Aqui ficava concentrada a parte pobre do Rio. Minha linhagem afrodescendente pede para que eu divulgue esse tema, aqui também está minha raiz. O que mais o impressionou ao longo da pesquisa? A prefeitura liberou agora três funcionários para fazer a demarcação e mapear até onde há material arqueológico. Mais de uma tonelada de contas, anéis, pedras, búzios, cachimbos foram encontrados. A arqueóloga Tânia Andrade Lima precisou convi-

dar babalorixás para interpretar o significado desses achados. Eles esclareceram: ‘isso é um orixá, você tem que colocar na água. Ele gosta de água, é vivo’. Tem esse lado lúdico e cultural que, mesmo a pessoa não acreditando, deve respeitar. Quem faz parte do elenco? Dez atores da Cia Bem Brasil, o jornalista Mauro Vianna, o músico Luiz Melodia, a arqueóloga e professora Tânia Andrade Lima e o professor Carlos Eugênio Líbano, cuja tese de doutorado foi sobre a capoeira. Ele foi responsável pela parte de pesquisa do filme. Muitos dados do Valongo estão sendo acessados neste momento. Só agora essas informações estão indo para os livros. Por que convidar Melodia? Pensei em Jorge Ben Jor, Gilberto Gil e Luiz Melodia. Escolhi o Melodia porque é um artista que admiro muito, nasceu aqui na região – no Estácio – é carioca, negro, e tem vida pública. Gostaria de transmitir a visão de uma pessoa pública sobre o tema.

Um documentário sobre a Pequena África, em fase de roteirização. André

Rebouças se formou engenheiro e fez coisas incríveis, como o armazém que hoje abriga o galpão da Cidadania. Machado de Assis nasceu no Livramento. É uma região muito rica. Quero começar essa filmagem nos portos de Gore, no Senegal e Uidá, em Moçambique. Será interessante começar pela porta de saída. O griô será o fio condutor que vai revelar essa história para o mundo. Quais aspectos da vinda dos escravos pretende detalhar? Algumas curiosidades: antes de entrar no navio ne-

greiro, as africanas davam sete voltas em torno de uma árvore e os africanos, oito, para se esquecer de onde vieram. Ou então comiam terra para lembrar sua origem. Havia também aqueles que se matavam com as correntes antes mesmo de sair da África. Darwin colocou a evolução negra à parte da evolução humana. Com isso, ele justificou a escravidão e o silêncio da comunidade diante desse fato.

sacha leite sacha@folhadarualarga.com.br


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opinião O que se escreve sobre ‘nós’ Sacha Leite

Que venha 2012

Em tempos de preparação para megaeventos mundiais, reordenamento das formas de administrar as populações, pacificações, controles urbanos, revitalizações e tantos outros projetos de transformação social e urbana, o Rio de Janeiro passa por época também de grande produção de conhecimentos. Trata-se de um conjunto imenso de saberes díspares que vão desde inventários, mapeamentos, estudos técnicos e de viabilidade financeira, até pesquisas acadêmicas motivadas por políticas públicas pouco transparentes, interesses diversos do setor privado e pelos conflitos e impactos socioespaciais gerados. Na contramão dos saberes destinados ao controle das populações, e no avesso dos renovados interesses pelo passado, pode-se encontrar também a produção de conhecimentos de outro tipo.

Assim, quem andava pelas ruas do Morro da Conceição entre 2007 e 2009 não só encontrava moradores, mas também podia esbarrar com uma ou duas etnógrafas fazendo suas pesquisas de campo. Flávia Carolina da Costa, autora da dissertação de mestrado Morro da Conceição: uma etnografia da sociabilidade e do conflito numa metrópole brasileira, apresentada na Universidade Federal de São Carlos, em 2010, e Roberta Sampaio Guimarães, autora da tese de doutorado A Utopia da Pequena África: os espaços do patrimônio na Zona Portuária carioca, defendida na Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 2011. Esses estudos se diferenciam de outros saberes produzidos sobre a região onde vivemos. Se a experiência etnográfica de Costa a permitiu entender de que maneira os discursos sobre a revitalização

da Zona Portuária problematizavam o território do Morro, também nos mostra de que forma os conflitos apareceram como constitutivos das sociabilidades locais e como estes conflitos se encontravam misturados nas mais “triviais” relações. A etnografia de Guimarães, ao evidenciar conflitos entre concepções sobre o mesmo espaço, direcionou sua pesquisa a grupos que se contraposicionavam às propostas e classificações da prefeitura, se autoidentificando herdeiros de um patrimônio “negro” (e) operando uma cosmologia e imaginário próprios. Trata-se de pesquisas baseadas numa aproximação cotidiana com moradores de diversos segmentos do bairro e entorno, possibilitada pelo trabalho etnográfico e o estabelecimento de relações mais ou menos íntimas de convivência. Nesse sentido, também se trata, literalmente, O que

se escreve sobre “nós”, o nome de um seminário organizado por mim, antropólogo e morador do Morro da Conceição, que aconteceu na edição 2011 do Projeto Mauá, no dia 3 de dezembro. A proposta, por um lado, está em criar um debate público, incluindo as pesquisadoras, os moradores e outros convidados, sobre saberes que dificilmente escapam dos muros da academia. Por outro e mais especificamente, procura-se perguntar quais as dimensões éticas e políticas dos textos e sua circulação. Afinal, estamos vivendo um período que, para muitos de “nós” (os sujeitos-objeto das etnografias), envolve grandes mudanças e, às vezes, lutas políticas.

Tomas Martin Ossowicki tm.ossowicki@gmail.com

Fechamos o ano de 2011 com as artes plásticas em alta na região. Além do Dia da Conceição, comemorado em dezembro, quando os artistas residentes no Morro da Conceição abrem seus ateliês, há duas exposições convidativas sobre aspectos sociais locais, descritas em matéria das páginas centrais dessa edição. Uma expõe fotos do Morro da Conceição e a outra conta a história da Zona Portuária, fazendo uma comparação entre o tempo atual e o antigo. A coluna de Teresa Speridião traz o perfil de Adrianna eu, artista visual que também tem ateliê no Morro da Conceição. O texto carinhoso revela a afinidade entre as duas artistas que se debulham em costurar, tecer e bordar corações. Como se não bastasse, André Calazans dá o seu toque pictórico ao jornal com a sua Poesia Pintada, em que compõe poemas inspirados em pinturas e fotografias, o que nos ajuda a sair um pouco da rotina do dia a dia e refletir de forma mais livre. A tirinha de Daniel Gnatalli vem para trazer um olhar ao mesmo tempo crítico e lúdico para este periódico, que se propõe a acompanhar os diversos aspectos relacionados ao atual processo de revitalização na região portuária. O artista visual estudou as principais dificuldades citadas em fóruns sobre o tema e apresentou um olhar sobre a dificuldade de se estimular a participação. A charge de Lielzo Azambuja, publicada na capa desta edição, faz analogia com as alterações urbanas de forma bem-humorada. Nesta edição de fim de ano, o antropólogo Tomas Martin relata, aqui ao lado, sua experiência de trazer ao Morro da Conceição e adjacências, intelectuais

que produziram estudos sobre a região nos últimos dois anos. O objetivo dele é romper o robusto muro da comunidade acadêmica e permitir que os indicadores produzidos a partir das pesquisas sejam usufruídos e debatidos também pelos próprios moradores. Fernando Portella, em sua coluna Boca no Trombone, fala sobre o processo de pacificação na Rocinha. Ele cita o fato de a ocupação ter ocorrido sem se disparar um tiro sequer. Esse tema vem se mostrando completamente atual, já que se reflete nas ruas repletas de turistas. Seja lá por que motivo for, as pessoas têm sentido mais confiança em andar tranquilamente pela cidade. Isto prova o poder dos meios de comunicação, que transmitiram todo o passo a passo. Outra questão de destaque, também tratada nesta edição, é a busca por valorizar o patrimônio cultural ao longo das obras de revitalização. A criação do Circuito Histórico e Arqueológico da Celebração da Herança Africana é um exemplo nesse sentido. No dia 29 de novembro, essa criação foi publicada no Diário Oficial, delimitando tanto o espaço físico que abrangerá quanto o grupo de trabalho que se estabelecerá para conceituar e estruturar as atividades, composto por convidados fixos e variáveis. Uma preocupação pertinente para garantir que se acesse, de forma mais ampla, os inúmeros bens culturais locais. O filme de Wavá de Carvalho também aborda a importância do resgate da cultura negra, sob a ótica emocionada de um afrodescendente, em leitura original.

sacha leite sacha@folhadarualarga.com.br



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cultura

Morro da Conceição e região portuária: costumes e imagens através do tempo Fotografias antigas se unem a cliques digitais contemporâneos em duas mostras nos Correios Marcelo Frazão

A diversidade humana, cultural e arquitetônica da Zona Portuária é o grande atrativo de duas exposições que estão em cartaz no Centro Cultural Correios (Rua Visconde de Itaboraí, 20, Centro). Uma delas enfoca apenas uma parte da região: o Morro da Conceição, mostrado ao público através de fotografias de Marcelo Frazão e desenhos digitais de Luis Christello. Já a outra, mais abrangente, exibirá cerca de 200 fotografias, mapas, cenários interativos, vídeos, projetos urbanísticos, maquetes e objetos arqueológicos. O historiador e pesquisador Fernando Dumas (Fiocruz), curador da mostra, e Cezar Honorato (UFF), especialista em políticas públicas, organizam, ainda, um seminário e uma oficina para discutir o tema com o público. Marcelo Frazão mora no Morro da Conceição há 14 anos e é um dos fundadores do Projeto Mauá, evento marcado pelos ateliês de portas abertas dos artistas plásticos que habitam a região. “Esse é o lugar onde eu moro e quero passar o resto dos meus

Casario na Ladeira João Homem, Morro da Conceição

dias. É como uma cidade do interior no Centro do Rio, onde sou muito feliz”, diz. Nessa perspectiva, algumas de suas fotos transbordam afetos, projetados em pequenos detalhes do cotidiano: o interior do seu ateliê, o desfile da Banda da Conceição, as visões de passeios noturnos pelas ladeiras centenárias. O superintendente do Iphan, Carlos Fernando de Andrade, realça no texto de apresentação da mostra que o Morro

da Conceição é especial porque é o único remanescente dos quatro morros que demarcavam o pequeno quadrilátero da cidade no início do século XIX. Frazão conta que documentou em fotos todas as etapas da demolição de um prédio do Banco do Brasil na vizinhança, e também todo o processo de construção do prédio que foi erguido em seu lugar: “Eu registro o espaço/tempo, os elementos da paisagem que,

um belo dia, podem não estar mais ali...”. Assim ele faz da imagem fotográfica uma arma contra a corrosão do tempo. Gravuras com tecnologia digital O pintor e desenhista Luis Christello conheceu Marcelo Frazão numa exposição na Academia Brasileira de Letras, intitulada Sístole, em novembro de 2010. Christello estava recém-chegado de Lisboa e,

por causa dos casarios portugueses que pintou, Frazão convidou-o ao Morro da Conceição. Conta o desenhista: “Na mostra Sístole, eu mostrei um processo expressionista, de dentro para fora. Esta mostra sobre o Morro da Conceição batizei como Diástole, por ser mais contemplativa, de fora para dentro”. Christello não produziu nada por encomenda: “Não consigo marcar um encontro com o desenho. Às vezes eu ia ao Mor-

ro e não dava um risco sequer no papel. Preciso que o desenho me convide. Quando isso acontece, fico ansioso, até peço canetas emprestadas...” Ele parte do desenho para em seguida escanear e transformar as imagens no computador. Usando programas como Photoshop e Painter, trabalha contrastes, luminosidades e texturas. É uma espécie de gravador da era digital: “Meu trabalho se realiza no ato da impressão, como nas gravuras. Não há obras únicas, faço de três a cinco exemplares de cada, para democratizar a arte. São desenhos digitais que ‘respiram’ gravura: a força do desenho e a materialidade da tinta como meio de expressão”. As muitas histórias do Porto A segunda exposição em cartaz no Centro Cultural Correios é Um século de vivências num porto moderno. Com curadoria do historiador Fernando Dumas, narra através de fotos antigas e atuais a transformação da região, dos antigos cais em que chegavam

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cultura

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Thony Serdoura

Conferências Um século de vivências num porto moderno

25/11: Palestra de Carlos Lessa – Centro Cultural dos Correios – 17h 29/11: Mesa-redonda O futuro resgatando o passado – Auditório do Instituto Nacional de Tecnologia (Avenida Venezuela, 82 – Pça Mauá) – 18h30 02/12: Palestra de Ricardo Holanda - Centro Cultural Correios – 17h 06/12: Mesa-redonda Cidadania e assistência social na região portuária – Fundação Darcy Vargas (Rua Sousa e Silva, 112 – Saúde) – 18h30 09/12: Palestra de Cezar T. Honorato – Centro Cultural dos Correios – 17h 13/12: Mesa-redonda Responsabilidade social – Auditório do Instituto Nacional de Tecnologia (Avenida Venezuela, 82 – Pça. Mauá) – 18h30 16/12: Palestra de Antonio Edmilson Rodrigues – Centro Cultural dos Correios – 17h

Parte da Igreja de Santa Rita e Beco das Sardinhas, na antiga Rua Larga

os escravos até as obras atuais do Porto Maravilha, passando pelo aterramento feito reforma urbana encetada por Rodrigues Alves. Nas fotos amarelecidas pesquisadas em arquivos públicos, o espectador aprende que o Moinho Fluminense possuía seu próprio cais, que a Igreja Madre de Deus do Morro do Livramento foi demolida e que nas docas do Lloyd Brasileiro começou a ser gestado um novo território cultural na cidade. Com o modelo inglês, os moradores do Porto passaram a habitar trapiches e sobrados, para dar lugar a armazéns e prédios modernos. Nesse contexto, aprende-se que a Rua Sacadura Cabral passou a ser uma ‘fronteira’ que separa o casario antigo do moderno. Tiago Vinicius, estudante de História da

UFF, que participou do processo de pesquisa das fotos, declarou: “uma história não soterra a outra. Na região há grande mistura de tempos históricos”. Ele diz que é importante mostrar que o Porto tem uma vida que independe do trabalho, na qual reina o lazer, expressões culturais fortes e toda uma religiosidade. Na legenda de uma foto da Avenida Rodrigues Alves, lê- se: “A população acostumou-se a passar pela cultura dos moradores da Saúde, Gamboa e Santo Cristo, sem vê-la”. Oportunamente, a exposição mostra essa cultura popular esquecida, em cenas como as festas e bailes da Sociedade Dramática Particular Filhos de Talma, fundada em 1879, na Saúde, a primeira escola de arte dramática do país. E onde nasceu, em 1964, o bloco carnavalesco Coração das Meninas,

que hoje rivaliza com grupos consagrados como Bafo da Onça e Cacique de Ramos. Além de fotos, a exposição reúne material inédito: mapas, cenários e vídeos com várias histórias de vida, tendo como base pesquisas de Fernando Dumas (Fiocruz) e do historiador Cezar Honorato (UFF). Em depoimento para a Folha da Rua Larga, Dumas alerta: “Procuramos mostrar que existe vida cotidiana, com tradições consolidadas, para além dos projetos do poder público. Por trás do anel rodoviário há 34 gerações de famílias. Isso imprime à exposição todo um sentido de resistência cultural”. As duas mostras ficam em cartaz até 8 de janeiro.

mário margutti mfmargutti@gmail.com



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boa vida

A bebida ideal para saudar o ano novo Nei Passos explica que alguns espumantes nacionais são a melhor opção para os festejos O brilho e as borbulhas de champanhes, espumantes e prossecos tem tudo a ver com a alegria do brasileiro. É nas comemorações de Ano Novo que eles ganham uma importância especial nas reuniões de família e amigos. Harmonizar um champanhe ou espumante é bem fácil, já que a bebida combina com quase todo tipo de entradas, pratos e sobremesas, além de encaixar bem com o verão típico dessa época. O que tive a oportunidade de descobrir nesses 16 anos como sommelier é que muita gente não sabe,

mas os espumantes brasileiros não deixam nada a dever para os estrangeiros, mesmo os italianos e franceses. Primeiramente, é interessante esclarecer que podemos chamar de champanhes os vinhos produzidos na região francesa de Champagne, com as uvas pinot noir, pinot meunier e chadornnay, pelo método clássico (fermentação dentro da garrafa). Já os espumantes são vinhos feitos também pelo método clássico ou charmat (fermentação em cuba de inox), porém produ-

Sacha Leite

zidos em outras regiões do mundo. Então champanhes são espumantes, mas não necessariamente espumantes são champanhes, já que estes, como dito antes, precisam ser necessariamente produzidos na região de Champagne, norte da França. Algumas palavras são de difícil identificação para quem não está acostumado a ouvir sobre vinho. Alguns exemplos são as denominações: brut, que remete a pequena quantidade de açúcar na bebida, variando de 5g a 15g por litro. Já os extra-dry recebem entre

Fábio Soares, Nei Passos e Cláudio Faria na Inauguração da Enoteca DOC, nova casa de vinhos da região

15g e 25g de elementos doces, os demi-sec, de 25g a 35g, e acima dessa quantidade, passam a ser chamados de vinho doce ou moscatel. No entanto, como disse acima, para quem procura um bom preço sem abrir mão da qualidade, os espumantes nacionais são uma excelente opção. Poucos têm o conhecimento de que a categoria é considerada a melhor do mundo em degustações cegas internacionais. Entre eles, destaco Casa Valduga 130 anos (R$ 60), Don Giovanni Anquier (R$ 50), Cave Geisse (R$ 45), Salton Volpi (R$ 35), Casa Perini (R$ 30) e Don Guerino

(R$ 27). Todos esses vinhos são uma verdadeira pintura. Trata-se de espumantes brasileiros singulares e acessíveis. Poucos conhecem, até pela falta de informações a respeito e pela tradicional ode aos produtos importados. No entanto, vale a pena degustar, de preferência de 5ºC a 8ºC, para sentir melhor a presença dos aromas. Sobre mim: especializei-me em vinhos na Associação Brasileira de Sommeliers, bem como segui cursos na Chandon, treinamentos de imersão na Casa Valduga, Casa Perini, Vinícula Aurora e Barão de Lantier. Minis-

trei cursos na Universidade Veiga de Almeida, SindRio, Castelo dos Vinhos, além de prestar consultoria, como sommelier, para 20 restaurantes e diversas importadoras. O que me encanta no vinho são suas múltiplas possibilidades, já que conseguimos produzir, na mesma região e com a mesma uva, bebidas muito distintas. Existem mistérios instigantes em cada taça, que desvendaremos de forma saborosa nas próximas edições. Bom proveito!

nei passos nei.passos@enotecadoc.com.br


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cidade

Lembrança permanente da influência negra na região portuária Começa construção do Circuito Histórico e Arqueológico da Celebração da Herança Africana Eduardo Rudge

A descoberta de vestígios arqueológicos durante as obras do Porto Maravilha, na região portuária do Rio, em março, mudou o rumo das intervenções urbanas programadas. Com vistas a sinalizar e valorizar a contribuição negra na região, onde aportaram cerca de um milhão de negros escravos ao longo do século XIX, a prefeitura inaugurou, no dia 16 de novembro, as obras de restauro do Centro Cultural José Bonifácio e deu início à construção do Circuito Histórico e Arqueológico da Herança Africana. De acordo com Washing-

ton Fajardo, subsecretário municipal de Patrimônio, a partir dessa descoberta, a prefeitura interrompeu as obras a fim de estudar a melhor solução para os achados: “Fazia-se cidade em cima de cidade. Agora essa dinâmica mudou. Hoje a gente resgata o passado”. Observando as escavações, pode-se identificar três períodos históricos diferenciados, separados por um século cada. O Brasil Colônia, representado pelos pés de moleque, Império, pelos paralelepípedos, e República. Ele explica que a ideia é que a Avenida continua na página 13

O subsecretário do Patrimônio Histórico municipal, Washington Fajardo, no antigo Largo do Depósito


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Reprodução

morro da conceição Há um fio do céu descido em seu coração Adrianna eu é artista plástica e mora no Morro da Conceição. Nasceu em Vila Isabel e com muito orgulho fala de sua infância no bairro de Noel. Viveu entre a Vila e Petrópolis. Mais tarde, mudou-se para a Urca e só saiu de lá quando conheceu o Morro da Conceição. Ela define o que sentiu quando conheceu o Morro: “Como assim? Eu sou carioca e não conhecia esse lugar?” E ri, dizendo que não conhecer o Morro da Conceição é falta gravíssima. Em compensação, para se redimir da culpa, pouco tempo depois deixou a Urca, vindo morar no número 102 da Rua Jogo da Bola. A origem do “eu” minús-

corações, Adrianna utilizou a lã feita pelas jordanianas. Hoje sua obra Mil Corações encontra-se num museu em Amã, ocupando lugar de destaque. Ela conta que vários artistas do mundo participaram dessa residência, mas ela foi não só a única brasileira como também a única mulher do grupo. O bate-papo continua e Adrianna eu fala de um momento muito especial em sua vida: foi aos EUA conhecer Louise Bourgeois. A emoção foi tanta que eu e Adrianna choramos (sempre gostei de Louise também). Louise a recebeu e se encantou pela sua obra de tal forma que a convidou para voltar na semana Divulgação

Corações de linhas, obra de Adriana eu

culo em seu nome vem do desejo de compartilhar o seu eu com o outro, uma forma de doação afetiva. Sua formação, além de cursos livres de filosofia, foi no Parque Lage, onde teve o incentivo da professora Malu Fatorelli. Adrianna não deixou por menos. Sua primeira exposição foi uma individual no Paço Imperial (uau!). Uma marca do seu trabalho é o Coração Puro. Essa obra não pode ser vendida, apenas doada por afeto. Ela fala que é uma brincadeira com uma subversão do mercado. Caso esses corações façam parte de uma instalação, aí sim podem ser comercializados e então a instalação passa a se chamar Mil Corações. A ideia Coração Puro já lhe rendeu uma residência de três meses em Amã, na Jordânia. Para confeccionar os

seguinte. Houve um grande transtorno para permanecer mais uma semana nos EUA, porém não teve arrependimento algum. Adrianna já fez várias exposições e instalações, vídeos, e, inclusive, esteve presente na ArtRio em setembro. Atualmente seus trabalhos estão na Galeria Inox. Sua obra é impactante, bela e consistente. Ela sabe tocar a emoção e os corações das pessoas. Confesso que estou fascinada pela obra dela. Tu, Ele, Nós, Vós, Eles também sentirão o mesmo que eu. Como disse Louise Bourgeois, “Não há costura sem corte”. O meu é obvio.

teresa speridião teresa.speridiao@gmail.com

Barão de Tefé se torne um grande largo de pedestres onde se iniciará o tour histórico e arqueológico. O circuito será formado pelo Cais do Valongo, Jardins do Valongo, Largo do Depósito (atual Praça dos Estivadores), Pedra do Sal, Instituto Pretos Novos e pelo próprio Centro Cultural José Bonifácio. Para o subsecretário, a menção à presença da cultura negra deve ser feita de forma permanente, e não somente uma vez ao ano: “Vamos identificar esses espaços para que pessoas de todas as etnias, brasileiros ou estrangeiros, reconheçam essa importante influência”. Fajardo explica que todo o trajeto será identificado com placas circulares de linguagem acessível, de forma que alunos de escolas municipais e turistas tenham fácil compreensão. Segundo ele, Brasil e Estados Unidos teriam avanços a apresentar com relação às ações afirmativas para inclusão de afrodescendentes, como as cotas para negros. No entanto, o congraçamento no Brasil seria maior: “Aqui somos todos juntos e misturados”. O subsecretário informou que está sendo montado um grupo de trabalho com lideranças atuantes na região ligadas ao movimento negro, para que todos os cuidados que garantam respeito à cultura afrodescendente sejam tomados. Diretor-executivo da Incubadora Afro Brasileira, Giovanni Harvey é um dos nomes confirmados no comitê: “O circuito deve resgatar a contribuição africana na cidade, reposicionar o Rio com relação a ¼ da população africana no mundo que aqui desembarcou e foi explorada”. Harvey declara que participou de algumas reuniões com a Secretaria Municipal de Patrimônio e percebeu uma preocupação com o título do circuito: “A expressão precisava ser positiva, mas que não fosse excludente no sentimento de dor. A ‘celebração’ tem tanto o sentido de homenagem quanto a lembrança da dor, por isso é adequada”. Ele

O circuito de visitação inclui seis pontos da Zona Portuária que remetem à cultura afro-brasileira

ressalta que o tour não estava incluído inicialmente no projeto Porto Maravilha, mas foi abarcado a partir dos achados arqueológicos do Valongo. Ele citou, ainda, que teve a oportunidade de viajar para Cabo Verde e para o Senegal, na Ilha de Goré, quando observou dois entrepostos de escravos africanos das Américas reconhecidos como patrimônio histórico da humanidade. Daí, questionou: “Por que o Rio também não poderia se tornar uma referência nesse sentido?”. E concluiu: “Espero que esse circuito seja mais um elemento constitutivo da identidade da cidade do Rio de Janeiro, que também é negra e perdure para além das Olimpíadas”. Segundo Washington Fajardo, a exploração da mão de obra negra também será lembrada ao longo do circuito: “Não vamos tapar o sol com a peneira, entretanto os coordenadores buscarão revelar as referências positivas trazidas pela influência da cultura africana”.

O circuito celebra a herança africana presente na região

Fajardo citou também a preocupação com a noção negativa de utilização do espaço público que precisa ser modificada: “O chafariz do Valentim, na Praça XV, é tratado como se fosse um fosso, onde as pessoas jogam butuca de cigarro”. De acordo com

ele, o Circuito Histórico e Arqueológico da Celebração da Herança Africana está sendo projetado de forma a criar outro tipo de relação com o público.

sacha leite sacha@folhadarualarga.com.br


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gastronomia

Boteco com jeito de cinema

receitas carol

O Cine Botequim se inspira na sétima arte para trazer mais charme ao Centro Divulgação

Localizado à Rua Conselheiro Saraiva, 39, o Cine Botequim apresenta uma original mistura de cinema, drinks e boa mesa, harmonizados da decoração ao cardápio. O casarão antigo, com piso original e paredes descascadas, constitui um ambiente íntimo e acolhedor. Pôsteres de filmes, como Tudo sobre minha mãe, Pulp fiction, O poderoso chefão e Casa Blanca, dividem espaço com bonecos de personagens famosos nas telonas – Darth Vader, Super Homem e ET. Um toque charmoso fica por conta das poltronas de cinema, que criam um aspecto curioso em contraste com as típicas mesas de bar. Nem os garçons escaparam da invasão cinematográfica: seus uniformes lembram os lanterninhas, antigos funcionários das salas de cinema. “Nós queremos sempre surpreender os fregueses. Até mesmo clientes fiéis, quando estão parados na fila do caixa, por exemplo, acabam notando um novo detalhe na decoração. Isso é muito legal”, conta o sócio-gerente Felipe Trotta. O telão é a parte mais importante da decoração da casa, e não costuma exibir jogos de futebol ou clipes de música, mas filmes escolhidos a dedo por Felipe, com a ajuda dos clientes, que sempre enviam sugestões. As sessões acontecem ao meio-dia, 18h e 20h. O cardápio do Cine Botequim é um espetáculo à parte. Além de bar e happy hour, a casa funciona na hora do almoço, adotando um serviço diferente para cada horário. Há um menu com sugestões fixas encontradas todos os dias, os chamados Clássicos, em que o cliente escolhe uma carne acompanhada de arroz, feijão, fritas e farofa. Para deixar os pratos ain-

Mais um ano chegando ao fim! Agora é hora de avaliar como foram os meses que se passaram, pesar o que foi bom, o que podemos fazer diferente e nos organizar para o próximo ciclo que vai começar. É um momento de reflexão, promessas e festas. A agenda anda lotada, toda semana tem um evento, os shoppings já estão decorados de vermelho e verde, a cada ano parece que o Natal chega mais cedo. Na cozinha é a mesma

coisa. Todo dia é dia de assados e sobremesas. Tento ficar de bem com a balança e usar a criatividade para fazer pratos saudáveis e que impressionem, afinal são jantares, almoços, mais jantares e muita comida. Neste calor nada melhor do que uma salada, adoro! Quinoa está na moda há alguns anos, e eu sou fã! Mais uma receita de baixa caloria que pode nos ajudar a manter a boa forma e não fazer feio com os amigos!

Salada completa de quinoa

ACP

Divulgação

Em ambiente acolhedor, antigos equipamentos de cinema compõem cenário original Daud Pacha

Ingredientes: A coxinha Cidade de Deus, com molho picante, é um dos petiscos mais pedidos da casa

da mais atraentes, eles foram batizados em homenagem a grandes atores e atrizes do cinema. Risoto de Camarão Marieta Severo, Parmegiana Marilyn Monroe e Escondidinho Lázaro Ramos são alguns exemplos. O Picadinho do Cine, o Estrogonofe de Niro e a Feijoada Grande Otelo estão na lista dos pratos que fazem mais sucesso. Também entre os mais pedidos estão os petiscos Cidade de Deus, uma coxinha servida com molho picante, item incluído há pouco tempo no cardápio, e Oito e Meio, um sonho sal-

gado recheado com camarão, catupiry e alho-poró, inspirado no filme de Federico Fellini. A carta de cervejas artesanais é bastante diversificada. Para os amantes da caipirinha, há cinco opções clássicas e outras opções sugestivas como o Amnésia (vodca, gim, rum, tequila, triple sec, suco de limão e Coca-Cola) e A Malvada (batida com cachaça, suco de maracujá e leite condensado). Inaugurado há pouco mais de um ano, o Cine Botequim ganhou recentemente sua primeira expansão:

um segundo andar novinho em folha! Bem parecido com o térreo, o novo piso também conta com um telão no qual são exibidos os filmes, porém funciona apenas no horário do almoço. O espaço é ideal para a realização de eventos, aproveitando o ambiente informal e despojado para dar um clima especial a festas de final de ano, treinamentos ou bonificações. O salão comporta confortavelmente até 80 pessoas.

danielle silveira daniellethamires@hotmail.com

1 ½ xícara de quinoa 1 xícara de milho cozido debulhado ½ xícara de cebola roxa picadinha 1 xícara de feijão preto cozido 2 xícaras de tomatinho

partido na metade ½ xícara de salsa picada ½ xícara de aipo picado 1 colher de chá de sal 3 colheres de sopa de vinagre balsâmico 6 colheres de sopa de azeite

Modo de preparo: Cozinhe a quinoa em 2 2/3 xícaras de água fria. Quando secar, está pronta. Misture os ingredientes do molho e junte a quinoa cozida. Una os legumes e as ervas. Conserve na geladeira até a hora de servir. Acompanha muito bem

um prato de carne ou ave assada. Bon appétit!

ana carolina portella carolnoisette@hotmail.com Confira outras receitas da Carol no blog nacozinhacomcarol. blogspot.com


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lazer

Poesia Pintada Reprodução

Reprodução

Sem título

Ausência

Tarde ensolarada Ela sorri a paisagem Senhora do tempo

Tão longe, tão perto, tão dentro de mim. Sou norte, sou forte, mas não faz assim. Pois quando desperto nasce mais um corte. Eu luto de luto num mundo tão bruto.

Fotografia: Leticia Hasselmann / André Calazans Reprodução

Saudade – Almeida Júnior

De manhã

Até mesmo o sofrimento um dia deixa de sê-lo, tornando-se só um sonho. Lembrarei desse lamento como fosse um pesadelo: de manhã me recomponho.

Livro Poesia Pintada no Movere Fica a dica para os que acompanham esta seção: André Calazans está divulgando o livro Poesia Pintada até o dia 4 de janeiro, no site www.movere.me. É uma boa oportunidade para quem se encanta com o casamento pintura e poesia ter na estante esse lançamento da Torre Editorial. A promoção do Movere possibilita que os leitores recebam o livro autografado, camisetas, almoços, passeios-surpresa e até análise de seu próprio texto pela Torre Editorial. Participe!

andré calazans poesiapintada@gmail.com

A Refeição do Cego – Picasso

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dicas da cidade Presépio gigante e esculturas díspares O carioca Roberto de Oliveira Costa apelidou Anima (alma, em italiano) a mostra que exibe suas esculturas no Centro Cultural Correios. A exposição chama a atenção pelo contraste de materiais díspares e reúne, além de 13 obras, um presépio em grande dimensão. Uma quase versão visual das teorias do escritor italiano Luigi Pirandello, segundo as quais “assim é, se lhe parece”. Até 8 de janeiro, entrada gratuita. Rua Visconde de Itaboraí, 20. Sanduíches de primeira na Rua Acre Surgiu um novo bistrô em frente ao Tribunal Regional Federal. Com mais de vinte opções de sanduíches inspirados na Itáia, saladas variadas e antepastos, o Focaccia entra no hall das opções ágeis da região. Com grande vitral e fachada tipo antiga, o restaurante também oferece quatro opções de refeição por dia, sendo duas massas e carnes tipo vermelha ou branca, que variam de R$ 26 a 35. Há também bons vinhos e espumantes para acompanhar, em taça ou garrafa.

da redação redacao@folhadarualarga.com.br

Solte suas imagens na rede e seja curtido Celebração dos cem anos da sede da Light inclui concurso de fotografia Izabella Jacobina

A Light abre as comemorações do centenário de sua sede com o lançamento do concurso cultural InstaLight. Os interessados, usando como plataforma o aplicativo Instagram, podem fazer fotos criativas com o tema “eletricidade”, que retratem a presença da companhia no estado do Rio de Janeiro. Além disso, precisam publicar as imagens em seu perfil do Facebook e incluir nos títulos das fotos a hashtag #instalight. A imagem será automaticamente direcionada para a galeria do concurso na fan page do Conexão Light na rede social. A escolha das melhores fotos será feita por júri popular, dentro da própria página, e por júri Light, em que uma banca de avaliação selecionará a me-

Os interessados devem postar suas fotos no Facebook

lhor imagem entre as 30 mais curtidas na votação popular. Os vencedores das duas categorias receberão Ipads. As 30 fotografias eleitas pela votação popular ganharão uma exposição nas vitrines do Centro Cultural Light, a partir do dia 21 de dezembro. Será feito

também um concurso para funcionários da empresa, com o tema “A Rua Larga de nossos tempos”. A mostra será projetada em forma de videoinstalação, proporcionando uma experiência sensorial e moderna. As fotos também ficarão expostas em uma galeria criada espe-

cialmente para o concurso no site www.conexaolight. com.br. Nos dias 21 e 22 de dezembro, a nova fachada do prédio da Light será iluminada com uma projeção mapeada de Natal. A exemplo do que aconteceu em maio deste ano na Igreja de Santa Rita, o prédio será usado como superfície para a projeção tridimensional de imagens que ajudarão a mostrar a beleza e a arquitetura do prédio histórico da companhia. As comemorações pelo centenário continuam em 2012, com o projeto Animando a Rua Larga, que trará diversas atrações culturais para a região.

da redação redacao@folhadarualarga.com.br


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