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sumário

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Ano 2 | Número 6 | Maio de 2013

Michael Seufert: ‘Acho dramático que qualquer política de corte na despesa seja inconstitucional.' Tiago Loureiro

Diogo Pascoal Francisco Ancêde Joana Martins Rodrigues Lúcia Santos Luís Pedro Mateus Rafael Borges

Indefinições, tensões e novos rumos Rafael Borges

Grandes Discursos do Século XX Eduardo Pereira Correia e Maria Luísa Aldim

Eduardo Pereira Correia Maria Luísa Aldim Michael Seufert Miguel Pires da Silva Rui Albuquerque

O

não está de acordo com o novo acordo. Por isso, é escrito segundo a antiga ortografia.

Faz ainda algum sentido ser de ‘direita’?

A vida e a obra de Margaret Thatcher

Rui Albuquerque

Editorial Tiago Loureiro

Da eternidade dos muros Rafael Borges

Lg. Adelino Amaro da Costa, nº 5 1149-063 Lisboa goncalobegonha.org popcom.blogs.sapo.pt ge.goncalobegonha@gmail.com

Palavra de Presidente Miguel Pires da Silva

A insustentável indiferença

Sustentabilidade do Estado Social: que caminho?

Francisco Ancêde

Lúcia Santos


editorial

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Qual é a pressa? Tiago Loureiro

O

Partido Socialista vive num permanente estado de negação, representado fielmente na actuação do seu líder e do seu secretário-geral. Sócrates, o líder regressado com ar triunfante, qual D. Sebastião saído da névoa parisiense, vai cumprindo na RTP a exigente tarefa de negar as evidências, que ainda nos habitam a memória, dos seis anos em que o país, sob o seu governo, percorreu um caminho que quase nos fez chegar à bancarrota. Seguro, o secretário-geral, luta para cumprir uma tarefa mais difícil e esquizofrénica: ao mesmo tempo que também ele tenta negar que esses seis anos existiram, vai negando que teve, algum dia, alguma coisa a ver com eles e com o seu resultado. Uma das piores consequências desse estado de negação é uma postura de grave irresponsabilidade. A resposta que o PS tem na ponta da língua para os sérios problemas do país, para além de um discurso vago e demagógico, é uma constante tendência para a sacudir a responsabilidade para os outros. Seja a responsabilidade nas causas do actual estado de coisas, seja a responsabilidade de criar soluções para a resolução das suas consequências. É por isso que ver o PS envolvido num processo de reforma do Estado que implicará coragem, responsabilidade e, previsivelmente, um encontro doloroso impopularidade, é pouco esses seiscom anosa existiram, vai negando quemais teve,do que algum dia, alguma coisa a verEcom com de o seu um exercício de imaginação. isso eles não edeixa ser resultado. irónico, uma vez que foi o PS que, através do falhanço Umasuas das opções, piores consequências desse estado de das condenou o País à inevitável negação é uma de grave irresponsabilidade. necessidade de postura uma reforma virtuosa, regeneradora A resposta que o PS tem na ponta da língua para osao e capaz de oferecer um modelo eficaz e adequado sérios problemas do país, para além de um discurso funcionamento do Estado, constantemente adiada até vagoGoverno e demagógico, pelo actual.é uma constante tendência para a sacudir a responsabilidade para osdeoutros. Seja a Se levássemos a sério as palavras Seguro, o PS responsabilidade nas causas do actual estado de devia assumir a dianteira do processo. Afinal, "quem coisas, seja a responsabilidade de criar soluções para

A resposta que o PS tem na ponta da língua para os sérios problemas do país, para além de um discurso vago e demagógico, é uma constante tendência para a sacudir a responsabilidade para os outros.

A resposta que o PS tem na ponta da língua para os sérios problemas do país, para além de um discurso vago e demagógico, é uma constante tendência para a sacudir a responsabilidade para os outros. Seja a responsabilidade nas causas do actual estado de coisas, seja a responsabilidade de criar soluções para a resolução das suas consequências. É por isso que ver o PS envolvido num processo de reforma do Estado que implicará coragem, responsabilidade e, previsivelmente, um encontro doloroso com a impopularidade, é pouco mais do que um exercício de imaginação. E isso não deixa de ser irónico, uma vez que foi o PS que, através do falhanço das suas opções, condenou o País à inevitável necessidade de uma reforma virtuosa, regeneradora e capaz de oferecer um modelo eficaz e adequado ao funcionamento do Estado, constantemente adiada até pelo Governo actual. Se levássemos a sério as palavras de Seguro, o PS devia assumir a dianteira do processo. Afinal, "quem criou o problema que o resolva". O PS é hoje uma perigosa mão cheia de nada, de onde apenas emerge, cada vez com mais pressa, o dedo que ameaça apertar o gatilho para ajudar à morte do País. Por isso, a pergunta que António José Seguro fazia aos seus camaradas que o queriam ver pelas costas é a pergunta ideal para lhe fazer quando clama que quer ver o governo pelas costas: afinal, qual é a pressa? À esquerda do Governo, onde o sentido de estado impunha a presença de um partido com soluções, mora um partido vazio. Um verdadeiro zero à esquerda. 


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notícias

JP Braga e Distrital de Lisboa distinguidos Um dos pontos da ordem de trabalhos do último Conselho Nacional da Juventude Popular que reuniu em Vila Nova de Famalicão foi a entrega dos prémios Amaro da Costa, Krus Abecassis e Ricardo Medeiros. A concelhia de Braga da Juventude Popular venceu o Prémio Amaro da Costa que distingue a melhor concelhia do ano de 2012. Francisco Mota, presidente da concelhia bracarense, enalteceu o trabalho da sua equipa desde 2009, que culminou com esta distinção. O prémio Krus Abecassis, para a melhor Distrital, foi arrecadado pela Distrital de Lisboa. Artur Alvez, em representação da estrutura, realçou o facto de o prémio ter sito ganho pelo terceiro ano consecutivo pela Distrital lisboeta. Já Vera Rodrigues, Presidente da Mesa do Conselho Nacional da JP, foi galardoada com o Prémio Ricardo Medeiros para o militante do ano, e foi num tom emocionado que proferiu um discurso que mereceu uma ovação de pé de todo o auditório do Conselho Nacional.

Conselho Nacional da JP pronuncia-se sobre lei de limitação de mandatos A Juventude Popular aprovou no final do passado mês de Fevereiro, em Conselho Nacional, uma moção de repúdio à "discussão artificial" sobre a interpretação da lei de limitação de mandatos, defendendo que as candidaturas de autarcas que já atingiram esse limite descredibilizam os políticos e a política. "Repudiamos a discussão artificial que tem sido feita sobre a interpretação desta lei, criando incerteza e dúvida sobre a realidade do poder local, que é justamente aquele que, pela sua própria natureza, maior proximidade deverá ter junto das populações", lê-se na moção aprovada com seis votos contra e 15 abstenções. Os conselheiros nacionais da Juventude Popular exprimem, assim, "o seu profundo descontentamento, perante a polémica que tem vindo a ser suscitada, ao nível de cândidaturas autárquicas no país" e afirmam que "as candidaturas de autarcas que já cumpriram os três mandatos consecutivos, mudando de concelho para poderem candidatarse novamente, não só contornam o nosso entendimento sobre o verdadeiro espírito da lei, como constituem um defraudar das expectativas que esta criou na

se novamente, não só contornam o nosso entendimento sobre o verdadeiro espírito da lei, como constituem um defraudar das expectativas que esta criou na sociedade portuguesa, sob o ponto de vista da renovação de dirigentes locais, que a lei efetivamente pretendia fazer suscitar e justificou a iniciativa legislativa em si mesma". Para a JP, a "situação é agravada, pela nova questão de a lei ter um 'de' ou um 'da'", considerando que, "por significativo que isto eventualmente possa querer parecer a nível legal, não é de todo aceitável que se venha, nesta fase (para tentar resolver artificialmente o assunto), descobrir um 'suposto erro' na publicação da lei". Os jovens do CDS assinalam ainda que o erro seria "muito conveniente e cirúrgico" e "facilitaria hipoteticamente a resolução do 'problema'". O Conselho Nacional da JP, reunido em Vila Nova de Famalicão, definiu ainda um grupo de trabalho para levar a cabo uma proposta de revisão consctitucional.


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Miguel Pires da Silva contesta candidaturas de autarcas que atingiram o limite de mandatos O presidente da Juventude Popular e autarca em Ponte de Lima, Miguel Pires da Silva, contestou no final do passado mês de Janeiro que o CDS apoie cândidaturas de autarcas que atingiram o limite de mandatos, defendendo que é uma “chico-espertice”. “Não devemos arranjar esquemas para contornar a lei. A lei não foi feita com esse sentido e se foi mal feita não devemos usar isso”, afirmou Miguel Pires da Silva. O líder da Juventude Popular, que é vereador em Ponte de Lima desde 2009, escreveu na rede social Facebook depois de ser conhecido que o CDS-PP vai apoiar a candidatura de Fernando Seara a Lisboa, que não alinha em “chicoespertices”. “Eu não alinho em chico-espertices, como tal não apoiarei nenhum candidato a presipresidência de câmara que tenha já atingido o limite de mandatos numa outra autarquia. Espero que o povo saiba condenar nas urnas esses ditos chicos-espertos”, escreveu então na rede social. Miguel Pires da Silva afirmou ainda, em comunicação aos orgãos de comunicação social, que o tema seria objecto de um Conselho Nacional da Juventude Popular, convocado com o objetivo de os jovens da organização terem “uma posição clara e transparente” sobre a matéria. Questionado sobre se o apoio a Seara em Lisboa abre um precedente, Miguel Pires da Silva

posição clara e transparente” sobre a matéria. Questionado sobre se o apoio a Seara em Lisboa abre um precedente, Miguel Pires da Silva respondeu: “Não sei qual é a estratégia do coordenador autárquico e do presidente do partido, mas espero que não aconteça em mais lado nenhum”. “A lei foi feita para dar oportunidade a pessoas novas que queiram servir os seus concelhos. Portugal, apesar de inúmeras crises, não tem uma crise de talentos”, argumentou. Para o líder dos jovens do CDS é altura de credibilizar a polític: “são os políticos que fazem as leis, não devemos procurar contornar essas mesmas leis”, afirmou. Dirigentes do CDS como o antigo coordenador autárquico Hélder Amaral e o vice-presidente Nuno Melo pronunciaram-se contra a interpretação da lei segundo qual atingido o limite de mandatos num determinado concelho os autarcas podem candidatar-se a outro concelho. Nuno Melo chegou a advertir para o risco de essas candidaturas serem inviabilizadas pelos tribunais.

altura de credibilizar a polític: “são os políticos que fazem as leis, não devemos procurar contornar essas mesmas leis”, afirmou. Dirigentes do CDS como o antigo coordenador autárquico Hélder Amaral e o vice-presidente Nuno Melo pronunciaram-se contra a interpretação da lei segundo qual atingido o limite de mandatos num determinado concelho os autarcas podem candidatar-se a outro concelho. Nuno Melo chegou a advertir para o risco de essas candidaturas serem inviabilizadas pelos tribunais.


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JP Lisboa debate ‘O que mudou com o 25 de Abril?’

O que mudou com o 25 de Abril? Este foi o mote de discussão introduzido pela Juventude Popular de Lisboa (JP Lisboa), no passado dia 29 de Abril, numa das faculdades mais prestigiadas de Portugal, a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Através das doutas experiencias históricas pré e pós 25 de Abril dos Excelentíssimos Senhores Professores Marcelo Rebelo de Sousa e Pedro Pais de Vasconcelos, o recheado auditório pode conhecer outras realidades paralelas e informais deste marco histórico. Mas o objectivo capital deste evento não passava, apenas, pela discussão da data per si e das correlativas experiencias, mas sim, também, pelo impacto da mesma nos dias de hoje. Foi neste sentido que a JP Lisboa ouviu com deleite as palavras do Secretário de Estado do Turismo, Excelentíssimo Senhor Dr. Adolfo Mesquita Nunes, que tratou com optimismo as prepectivas de futuro. A História só é História se ficar na

Secretário de Estado do Turismo, Excelentíssimo Senhor Dr. Adolfo Mesquita Nunes, que tratou com optimismo as prepectivas de futuro. A História só é História se ficar na memória de quem a viveu e se se perpetuar nas gerações vindouras. Nesse sentido, a JP Lisboa pauta-se pela formação educada, informada e baseada em interpretações correctas da História, para assim conseguir imperar a meritocracia na política portuguesa. Política perante a qual a JP Lisboa não assume uma posição de pessimismo, de desconfiança e de conformismo. Não esqueçamos que foi o 25 de Abril que providenciou a pluralidade democrática que hoje assistimos. Aludindo à mensagem optimista passada pelo painel desta conferencia para os mais de cem jovens presentes naquele Auditório: devemos esquecer que a rigidez, a severidade, austeridade, muitas vezes, são condições necessárias para repor o país e a situação conjuntural económico-financeira.

não devemos esquecer que a rigidez, a severidade, austeridade, muitas vezes, são condições necessárias para repor o país e a situação conjuntural económico-financeira. Recordámos respeitosamente, também, os ensinamentos severos, patrióticos, rígidos, mas não menos humanos de Margaret Thatcher, os quais foram recordados em jeito de esperança para Portugal, na última conferência organizada pela JP Lisboa, no passado dia 6 de Maio, em memória da Baronesa que marcou o pensamento liberal e conservador que perfilhamos. Já dizia George R.R. Martin, a História é uma roda que se repete. Esperemos que os jovens de hoje façam renascer a liberdade com regras, na tentativa de fazer o melhor em detrimento do bom ou mau. Cátia Muchacho, JP Lisboa


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Tomar recebe Assembleia Distrital de Santarém Durante a manhã do passado dia 4 de Maio decorreu em Tomar a Assembleia Distrital de Santarém da Juventude Popular. O evento, que teve lugar no auditório da Junta de Freguesia de S. João Baptista, foi organizado pela JP Tomar, representando um marco importante no crescimento da estrutura distrital na região de Santarém, tendo sido convocado o I Congresso Distrital de Santarém da Juventude Popular, assim como foi aprovado por unanimidade o Regulamento para o I Congresso Distrital.

A Juventude Popular continua desta forma em clara expansão na região de Santarém, sendo cada vez mais os jovens que fazem parte das diferentes estruturas concelhias, sempre interessados em defender os interesses das suas localidades. O surgimento da estrutura distrital visa agilizar os contactos entre as diferentes concelhias e a nacional, tornando os processos mais rápidos e eficazes, contribuindo para um trabalho mais profícuo em prol da comunidade. João Ribeiro Vogal JP Tomar

A Juventude Popular continua desta forma em clara expansão na região de Santarém, sendo cada vez mais os jovens que fazem parte das diferentes estruturas concelhias, sempre interessados em defender os interesses das suas localidades. O surgimento da estrutura distrital visa agilizar os contactos entre as diferentes concelhias e a nacional, tornando os processos mais rápidos e eficazes, contribuindo para um trabalho mais profícuo em prol da comunidade. João Ribeiro, JP Tomar

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Distrital de Setúbal lança novo site e a primeira parte do seu Manual Autárquico No decorrer das últimas semanas, foi lançado o site da Distrital de Setúbal da Juventude Popular, com vista a manter os militantes informados sobre a realidade da Juventude Popular e do CDS no Distrito. Contando regularmente com artigos escritos tanto pelos militantes do Distrito bem como contribuições de outros militantes da Juventude Popular e do CDS, é um objectivo desta actual Distrital de Setúbal manter todos os interessados a par da realidade política distrital e nacional, nunca esquecendo porém, a necessidade da reflexão ideológica e política. É apresentado no site o primeiro volume do Caderno de Apoio ao Jovem Candidato Autárquico destinado a preparar a Juventude Popular para as Eleições Autárquicas que se avizinham e que conta com a contribuição de algumas figuras bem conhecidas. A Distrital de Setúbal da Juventude Popular convida todas os interessados a a visitarem o site em jpdistritalsetubal.wix.com/site Hélder Rodrigues, JP Distrital Setúbal


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JP Braga realiza tertúlia sobre “A Mulher na Sociedade” A Juventude Popular de Braga realizou no passado dia 8 de Março a tertúlia “A Mulher na Sociedade”, como forma de celebrar o Dia Internacional da Mulher, e contou com sala cheia na sede do CDS local. As oradoras convidadas para esta tertúlia foram Paula Remoaldo, professora associada do Departamento de Geografia da Universidade do Minho, Ana Maria Brandão, professora auxiliar do Departamento de Sociologia da Universidade do Minho e Vera Rodrigues, adjunta do Secretário de Estado do Turismo e Presidente da Mesa do Conselho Nacional da JP. A tertúlia debruçou-se em reflexões sobre as conquistas das mulheres em várias áreas, bem como o especial contributo das mesmas, com especial incidência nas áreas da saúde e na política.

JP Porto aposta nas políticas de formação e implantação

A concelhia do Porto da Juventude Popular trabalha a todo o vapor nas tarefas de formação dos seus militantes e de implantação da estrutura no concelho. Por isso, realizou já duas sessões da sua "Formação de 1ª". A primeira foi dedicada ao Marketing Político, com a presença do Dr.º Custódio Oliveira, consultor de comunicação, investigador de marketing político e docente universitário; a segunda debruçou-se sobre a oratória e a arte de falar em público, contando com a colaboração da Dr.ª Maria Luísa Malato, docente na Universidade do Porto. Já no que diz respeito à política de próximidade com os jovens portuenses, nos dias 6 e 9 de Maio, a estrutura concelhia, através do seu Departamento de Implantação, levou a cabo, no Externato Ribadouro, as sessões de "E TU, já sabes como vai ser o TEU futuro no Ensino

estrutura concelhia, através do seu Departamento de Implantação, levou a cabo, no Externato Ribadouro, as sessões de "E TU, já sabes como vai ser o TEU futuro no Ensino Supeiror?", projecto tem como objectivo aproximar os alunos do ensino secundário do concelho do Porto à estrutura da Juventude Popular local, proporcionando um evento onde alunos do ensino superior partilham os desafios e as oportunidades dos seus respectivos cursos. Numa primeira fase os alunos ouviram uma breve apresentação de cada curso e no final tiveram uma conversa informal com o aluno que representava o curso que lhe despertava mais interesse.


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Distrital de Leiria apresenta Cadernos Formativos nas Caldas da Rainha Realizou-se no passado dia 27 de Abril, nas Caldas da Rainha, a apresentação dos cadernos formativos da Distrital de Leiria da Juventude Popular. A iniciativa contou com a presença do secretário-geral da JP, José Miguel Lello, o presidente da Distrital da JP, Diogo Carvalho, e várias dezenas de jovens do distrito de Leiria. Foram apresentados o Caderno do Militante e o Caderno Super Militante, através dos quais se pretende contribuir para uma juventude esclarecida e consciente, que defenda valores e convicções de uma forma segura. O Caderno do Militante, apoiando-se naquilo que são o passado e as origens da JP, apresenta sucintamente os princípios e pilares ideológicos que sustentam a convicção política da Juventude Popular e sobre os quais a sua acção deve ser fundada. Neste caderno faz-se ainda um panorama da expansão da Juventude, num contexto do distrital, com o qual se percebe o crescimento sustentado que tem vindo a acontecer nas várias regiões desse mesmo distrito. No caderno Super Militante são identificados e explicados os trâmites legais para a criação de uma concelhia (bem como os seus órgãos constituintes), sugerindo aos jovens uma posição pro-activa e de iniciativa, que lhes permita intervir na vida do seu concelho. Ainda neste caderno são dadas sugestões e indicações sobre como comunicar com as pessoas e com a imprensa, e são identificados alguns lapsos

ideológicos que sustentam a comvicção política da Juventude Popular e sobre os quais a sua acção deve ser fundada. Neste caderno faz-se ainda um panorama da expansão da Juventude, num contexto do distrital, com o qual se percebe o crescimento sustentado que tem vindo a acontecer nas várias regiões desse mesmo distrito. No caderno Super Militante são identificados e explicados os trâmites legais para a criação de uma concelhia (bem como os seus órgãos constituintes), sugerindo aos jovens uma posição pro-activa e de iniciativa, que lhes permita intervir na vida do seu concelho. Ainda neste caderno são dadas sugestões e indicações sobre como comunicar com as pessoas e com a imprensa, e são identificados alguns lapsos comuns que podem e devem ser evitados. Fica mais uma vez presente a forte convicção e aposta da Distrital de Leiria na formação dos jovens que, segundo Diogo Carvalho, “podem ficar ainda mais esclarecidos sobre aquilo em que acreditam, sobre o que é comum a todos os presentes e sobre os caminhos que têm para se fazerem ouvir”. Durante a sua intervenção, José Lello salientou que "foi muito bom entrar e ver uma sala cheia de jovens, é um sinal de crescimento, de trabalho, e sobretudo de interesse por parte dos jovens naquilo que importa na vida de todos".

com a imprensa, e são identificados alguns lapsos comuns que podem e devem ser evitados. Fica mais uma vez presente a forte convicção e aposta da Distrital de Leiria na formação dos jovens que, segundo Diogo Carvalho, “podem ficar ainda mais esclarecidos sobre aquilo em que acreditam, sobre o que é comum a todos os presentes e sobre os caminhos que têm para se fazerem ouvir”. Durante a sua intervenção, José Lello salientou que "foi muito bom entrar e ver uma sala cheia de jovens, é um sinal de crescimento, de trabalho, e sobretudo de interesse por parte dos jovens naquilo que importa na vida de todos". Rodrigo Cipriano, JP Distrital Leiria


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opinião

Palavra de

Presidente Miguel Pires da Silva

C

omo é do conhecimento geral vivemos hoje uma das piores crises de sempre, fruto de inúmeras irresponsabilidades, de politicas desajustadas, de políticos fracos e cuja seriedade deixa muito a desejar. Nos últimos anos a corrupção e a política apareceram várias vezes de braço dado. É uma vergonha e é inaceitável que alguém que está na politica supostamente com o intuito de servir a população se preste a tal papel, mas na minha opinião é tão culpado o político como o cidadão que se dispõem a corromper, o que me leva a crer que este é um problema de base. Um problema para nós, uma banalidade para outros. Cabe-nos a nós a difícil tarefa de inverter esta situação, e de uma vez por todas encarar a politica como um verdadeiro serviço! É triste mas passados tantos anos após o golpe de estado de 25 de Abril, as maiores prioridades continuam a ser as aparências e o ‘show off’. Mergulhamos numa era do politicamente correcto, esquecendo muitas vezes o moralmente correcto. Assistimos no Parlamento, salvo honrosas excepções, a debates dignos de autenticas encenações teatrais onde todos querem brilhar, todos querem dar a conhecer o seu vasto vocabulário, esquecendo-se muitas vezes que o povo quer ouvir propostas, quer

Mergulhamos numa era do politicamente correcto, esquecendo muitas vezes o moralmente correcto. Assistimos no Parlamento, salvo honrosas excepções, a debates dignos de autenticas encenações teatrais onde todos querem brilhar, todos querem dar a conhecer o seu vasto vocabulário, esquecendo-se muitas vezes que o povo quer ouvir propostas, quer soluções e acima de tudo espera mais proximidade entre os políticos e a sociedade civil. Não é fácil estar hoje na política, os erros do passado dificultam a nossa acção, mas uma coisa é certa a democracia sem políticos não funciona. Neste sentido, é nossa obrigação de fazer diferente, dar o exemplo e recuperar a credibilidade política perante o Povo Português. Estamos preparados, estamos convictos e vamos lutar por um Portugal melhor. 



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Indefinições, tensões e novos rumos

Rafael Borges

I

tália

Poucos foram os indivíduos que, ao longo da história dos homens, foram capazes de assenhorear-se de nações inteiras. Silvio Berlusconi, exprimeiro-ministro italiano e magnata dos mídia, porém, foi um deles. E não há muito que possa sugerir à Itália e à Europa que o seu reinado tenha já chegado ao fim. Não é difícil compreender os motivos pelos quais a república transalpina se habituou a viver à sombra de Berlusconi. Chefe de governo entre 1994 e 1995, 2001 e 2006 e 2008 e 2011, 'Il Cavaliere' tornou-se no âmago da própria política italiana, no centro gravitacional à volta do qual tudo o resto gira. Durante os seus

2001 e 2006 e 2008 e 2011, 'Il Cavaliere' tornou-se no âmago da própria política italiana, no centro gravitacional à volta do qual tudo o resto gira. Durante os seus sucessivos consulados, porém, o país que dirigiu viveu anos de uma mediocridade económica que deveria ter sido suficiente para descredibilizar tanto o homem, como a agenda que propugnava. As eleições italianas do passado mês de Fevereiro foram, para os italianos, uma oportunidade de expressar esse exacto sentimento de exasperação. Com Silvio Berlusconi mais desgastado que nunca e 'Il Cavaliere' humilhado pelo golpe palaciano que viu, em 2011, a União Europeia afastá-lo do poder, o centro-esquerda tinha tudo para atingir um bom resultado eleitoral. Porém, se é verdade que um desemprego recorde, uma dívida galopante e um crescimento anémico tornavam provável o esmagamento eleitoral do centrodireita, a verdade é que, como sempre, Berlusconi foi capaz de reinventar-se. Liberto do ónus de três mandatos desastrosos, o líder do Povo da Liberdade apresentou-

esmagamento eleitoral do centrodireita, a verdade é que, como sempre, Berlusconi foi capaz de reinventar-se. Liberto do ónus de três mandatos desastrosos, o líder do Povo da Liberdade apresentouse como um homem novo, impoluto, sem responsabilidade no caos económico e financeiro em que mergulhou o país. Pior: os italianos deixaram-se ludibriar pela mudança de imagem e discurso. Já do lado do Partido Democrático, principal formação de centroesquerda do país, parece evidente que a oportunidade aberta pelas eleições de Fevereiro foi absurdamente mal aproveitada. Se em Janeiro de 2013 as sondagens se atreviam a conjecturar um resultado próximo dos 45% para os social-democratas, a verdade é que Bersani, líder do PD, não logrou persuadir mais que 29.5% dos italianos. Esbanjando uma vantagem que chegou a ser de quase 20%, Pierluigi Bersani deitou por terra qualquer esperança de estabilidade política para o seu país. O mau resultado do Partido Democrático, assim como o relativo sucesso – Berlusconi perdeu, apesar



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20%, Pierluigi Bersani deitou por terra qualquer esperança de estabilidade política para o seu país. O mau resultado do Partido Democrático, assim como o relativo sucesso – Berlusconi perdeu, apesar de tudo, perto de 17% do eleitorado – de 'Il Cavaliere' não foram, todavia, as grandes surpresas do sufrágio transalpino. Ainda mais inesperada foi a ascensão meteórica do Movimento 5 Estrelas, um partido de protesto formado em 2009. Fundada pelo célebre comediante Beppe Grillo, a nova plataforma partidária manifestou, até agora, apenas um objectivo primordial: o desmantelamento do sistema político vigente em Itália, a destruição daquilo que refere serem os “partidos do sistema” – i.e., o PD e o PDL – e o abandono da moeda única. Fora isso, não houve, nos inflamados discursos de Grillo, uma palavra sobre segurança, recuperação económica, posicionamento europeu ou política externa. Aí, como em quase tudo, o Movimento 5 Estrelas é omisso. A verdade, porém, é que os italianos não o penalizaram por isso. Beppe Grillo, um actor de 64 anos, é conhecido, sobretudo, pela sua retórica mordaz. Orador experiente e político astuto, afirmou-se como um 'Berlusconi anti-Berlusconi', um homem disposto a utilizar a política espectáculo de 'Il Cavaliere' contra o próprio. Surpreendente e, por vezes, chocante, Grillo não hesitou em afirmar que veria com bons olhos um “ataque da Al Qaeda” desde que isso auxiliasse a “extinguir os políticos do sistema.” Aparentemente, os italianos gostaram do que ouviram: com um dos mais baixos níveis de confiança popular na classe política, a Itália parecia destinada a recolher-se no leito da demagogia radical do M5S. O rescaldo das legislativas italianas,

Atirados para um limbo, votados a um contexto de incerteza e indefinição políticas, os italianos têm agora bons motivos para temer pelo seu futuro. E a União Europeia também. Com a chave do equilíbrio político agora nas mãos de Berlusconi, tudo parece ser possível. E, considerando o historial de desonestidade estratégica do ex-primeiroministro, há bons motivos para conjecturar um fim prematuro para o actual governo. baixos níveis de confiança popular na classe política, a Itália parecia destinada a recolher-se no leito da demagogia radical do M5S. O rescaldo das legislativas italianas, assim, não poderia ter sido mais inesperado. Entre as sondagens de Janeiro que garantiam aos socialdemocratas uma maioria absoluta em ambas as câmaras do parlamento italianos e o final de Fevereiro, Bersani perdeu cerca de 15% dos sufrágios. Berlusconi e Grillo, por outro lado, viram as suas intenções de voto subir paulatinamente. Quando chegou o dia das eleições, o país viu-se desprovido do único activo que ainda detinha: uma relativa estabilidade política. Pierluigi Bersani ficou-se pelos 29.5% dos votos, Silvio Berlusconi

eleições, o país viu-se desprovido do único activo que ainda detinha: uma relativa estabilidade política. Pierluigi Bersani ficou-se pelos 29.5% dos votos, Silvio Berlusconi recebeu 29.1% e Beppe Grillo, o novo político-sensação de Itália, atingiu a surpreendente marca dos 25.5%. Se as sondagens eram unânimes no 15-16% que davam a Grillo, o comediante foi capaz de dilatar enormemente essa projecção. Já Mario Monti, incumbente e candidato do statu quo, ficou-se por uns vexatórios 10.5%. As eleições de Fevereiro foram as primeiras, desde o colapso do regime fascista, a deixar o país sem um vencedor claro. Para além de uma população profundamente dividida, o presidente italiano


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primeiras, desde o colapso do regime fascista, a deixar o país sem um vencedor claro. Para além de uma população profundamente dividida, o presidente italiano Georgio Napolitano teve de enfrentar um parlamento igualmente incoeso. Se na Câmara dos Deputados, câmara baixa do Parlamento, Bersani logrou atingir uma maioria absoluta, o mesmo não sucedeu no Senado da República. Para resolver um diferendo que se manteve durante mais de um mês, Napolitano foi obrigado a recandidatar-se ao cargo de Presidente da República – para o qual foi rapidamente eleito –, e forçar um compromisso entre as partes discordantes. Face à recusa do centro-direita em coligar-se com um PD liderado por Bersani, o excomunista concordou em retirar-se de cena. Daí até à formalização de uma coligação PD-PDL liderada por Enrico Letta, ex-presidente da Juventude do Partido Popular Europeu e sobrinho de Gianni Letta, homem próximo de Berlusconi, foi uma questão de dias. A Itália tem já governo. Resta apenas saber quanto tempo durará. Atirados para um limbo, votados a um contexto de incerteza e indefinição políticas, os italianos têm agora bons motivos para temer pelo seu futuro. E a União Europeia também. Com a chave do equilíbrio político agora nas mãos de Berlusconi, tudo parece ser possível. E, considerando o historial de desonestidade estratégica do exprimeiro-ministro, há bons motivos para conjecturar um fim prematuro para o actual governo. Materializese isso, e a permanência da Itália na zona euro pode ter os dias contados.

Venezuela Igualmente conturbado foi o acto eleitoral venezuelano. Ainda na ressaca da morte de Hugo Rafael Chávez Frias, o decano dos ditadores da América do Sul, a República Bolivariana não poderia ter evitado um certo sentimento de orfandade. Para o bem, e para o mal. Para os seus defensores, o desaparecimento de Chávez relembrou-os de que, afinal, o regime que edificou não é algo inamovível, imune ao tempo. Lamentam o fim do homem que fez a Venezuela caminhar pela estrada do socialismo, nacionalizou boa parte da economia e posicionou a nação sulamericana ao lado de párias internacionais como a República Islâmica do Irão, a República Árabe da Síria, o Sudão ou a Coreia do Norte. Para os seus detractores, a morte de Chávez representou o fim da era a que emprestou o nome – e devolveu ao povo a oportunidade de reconsiderar o caminho por que optou. Chávez Frias não foi um caudillo sulamericano qualquer. Oficial do exército, tentou chegar ao poder pela primeira vez em 1992, ano em que liderou um golpe de estado contra o então presidente, Carlos Andrés Pérez. Andréz Pérez, um centrista, havia sido eleito com a promessa de cortar laços com o Fundo Monetário Internacional – a Venezuela beneficiava, na altura, de um resgate financeiro – e com os Estados Unidos. Na verdade, porém, fez o contrário daquilo com que se tinha comprometido. Renegando a intenção de abandonar a austeridade promovida pelo FMI, Pérez aprofundou-a; ignorando o desígnio de afastar-se de Washington, o presidente reforçou as relações com os Estados Unidos. Chocado com o 'U-turn'

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Norte. Para os seus detractores, a morte de Chávez representou o fim da era a que emprestou o nome – e devolveu ao povo a oportunidade de reconsiderar o caminho por que optou. Chávez Frias não foi um caudillo sulamericano qualquer. Oficial do exército, tentou chegar ao poder pela primeira vez em 1992, ano em que liderou um golpe de estado contra o então presidente, Carlos Andrés Pérez. Andréz Pérez, um centrista, havia sido eleito com a promessa de cortar laços com o Fundo Monetário Internacional – a Venezuela beneficiava, na altura, de um resgate financeiro – e com os Estados Unidos. Na verdade, porém, fez o contrário daquilo com que se tinha comprometido. Renegando a intenção de abandonar a austeridade promovida pelo FMI, Pérez aprofundou-a; ignorando o desígnio de afastar-se de Washington, o presidente reforçou as relações com os Estados Unidos. Chocado com o 'U-turn' presidencial, Chávez sentiuse impelido a removê-lo da chefia da nação. E, embora não tenha conseguido fazê-lo, Hugo Chávez afirmou-se, pelo menos, como principal opositor do consenso próausteridade então existente no país. Após uma sentença de prisão de dois anos, o oficial do exército lançou-se numa segunda tentativa para alcançar o poder. Fundou um partido de cariz comunista, o Movimento Quinta República, e concorreu a eleições. Venceu. Cansados de anos de corrupção, violência e austeridade, os venezuelanos dispuseram-se a confiar no homem que, há apenas alguns anos, havia tentado subverter o estado de direito democrático. Depois, já presidente, Hugo Rafael Chávez Frias iniciou um amplo programa de reformas. As principais empresas – bancos,


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aprofundou-a; ignorando o desígnio de afastar-se de Washington, o presidente reforçou as relações com os Estados Unidos. Chocado com o 'U-turn' presidencial, Chávez sentiuse impelido a removê-lo da chefia da nação. E, embora não tenha conseguido fazê-lo, Hugo Chávez afirmou-se, pelo menos, como principal opositor do consenso próausteridade então existente no país. Após uma sentença de prisão de dois anos, o oficial do exército lançou-se numa segunda tentativa para alcançar o poder. Fundou um partido de cariz comunista, o Movimento Quinta República, e concorreu a eleições. Venceu. Cansados de anos de corrupção, violência e austeridade, os venezuelanos dispuseram-se a confiar no homem que, há apenas alguns anos, havia tentado subverter o estado de direito democrático. Depois, já presidente, Hugo Rafael Chávez Frias iniciou um amplo programa de reformas. As principais empresas – bancos, indústria petrolífera e seguros – foram nacionalizados pelo governo, os dissidentes silenciados, o seu poder fortalecido. As prisões sucederam-se, as acusações de “golpismo” também. Em 2002, aproveitou uma tentativa de golpe de estado para enviar adversários políticos para a prisão. Um deles, Henrique Capriles Radonski, tornarse-ia depois no Governador do Estado de Miranda e candidato da oposição no último sufrágio que disputou. Na frente externa, Chávez aproximou-se de párias internacionais, desenvolveu amizades com ditadores e aprofundou laços com regimes totalitários. De Kim Jong Il – e, depois, Kim Jong Un - a Mahmoud Ahmadinejad, de Bashar al Assad a Fidel e Raúl Castro, poucos foram os tiranos com quem não privou. A principal dificuldade do regime foi

Mahmoud Ahmadinejad, de Bashar al Assad a Fidel e Raúl Castro, poucos foram os tiranos com quem não privou. A principal dificuldade do regime foi a economia. Sem dinheiro para pagar os inúmeros serviços sociais que facultou aos venezuelanos mais pobres, o regime chavista foi forçado a desvalorizar o Bolívar várias vezes. Em 2007, a moeda venezuelana encontrava-se já tão desvalorizada que Caracas se viu obrigada a trocá-la por outra: o Bolívar Fuerte. Carcomido por uma inflação galopante – que atingiu, em 2012, o valor astronómico de 31.6% -, o país foi ultrapassado economicamente pela maioria dos seus pares sul-americanos. À data das eleições de 14 de Abril, era esta a situação enfrentada pela República Bolivariana. Como dauphin de Chávez, avançou Nicolás Maduro. Motorista de profissão, Maduro iniciou a sua vida política como sindicalista. Depois disso, teve um papel preponderante na organização e fundação do partido de Chávez, o Movimento Quinta República. Com a vitória, em 1998, do seu mentor político, o exmotorista tornou-se deputado à Assembleia Nacional venezuelana – isto é, o parlamento do país. Tido como mais colérico que Chávez, Maduro cedo trouxe nervosismo à diplomacia norteamericana. Principalmente, quando se tornou óbvio que seria ele, e não o presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello Rondón, o candidato do PSUV, ou Partido Socialista Unido da Venezuela. Em Washington, temia-se que a assunção, por Maduro, da liderança do país levasse a um posicionamento internacional ainda mais extremista - assim como o aprofundamento de relações com países como o Irão, a Síria, a Coreia

como sindicalista. Depois disso, teve um papel preponderante na organização e fundação do partido de Chávez, o Movimento Quinta República. Com a vitória, em 1998, do seu mentor político, o exmotorista tornou-se deputado à Assembleia Nacional venezuelana – isto é, o parlamento do país. Tido como mais colérico que Chávez, Maduro cedo trouxe nervosismo à diplomacia norteamericana. Principalmente, quando se tornou óbvio que seria ele, e não o presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello Rondón, o candidato do PSUV, ou Partido Socialista Unido da Venezuela. Em Washington, temia-se que a assunção, por Maduro, da liderança do país levasse a um posicionamento internacional ainda mais extremista - assim como o aprofundamento de relações com países como o Irão, a Síria, a Coreia do Norte ou o Sudão. Mas Maduro, embora escolhido por Chávez como seu sucessor, é também menos carismático e conhecido que o anterior presidente. E terá sido isso, juntamente com outros factores, a ditar o mau resultado eleitoral que alcançou. Contra Maduro, a força do Estado, e o peso da memória de Hugo Chávez, avançou Henrique Capriles Radonski. Capriles, Governador do Estado de Miranda e opositor de longa data do regime venezuelano, havia já defrontado Chávez nas eleições de Outubro de 2012. Jovem (tem apenas 40 anos) e carismático, o candidato da Mesa de Unidade Democrática, ou MUD, arrancou a Chávez o melhor resultado da oposição em anos. Ainda assim, a votação que alcançou não foi suficiente para conquistar a presidência. Após o desaparecimento do chefe de estado e consequente repetição do acto

Contra Maduro, a força do Estado, e o peso da memória de Hugo Chávez, avançou Henrique Capriles, opositor de longa data do regime venezuelano. Jovem e carismático, arrancou o melhor resultado da oposição em anos.


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Chávez como seu sucessor, é também menos carismático e conhecido que o anterior presidente. E terá sido isso, juntamente com outros factores, a ditar o mau resultado eleitoral que alcançou. Contra Maduro, a força do Estado, e o peso da memória de Hugo Chávez, avançou Henrique Capriles Radonski. Capriles, Governador do Estado de Miranda e opositor de longa data do regime venezuelano, havia já defrontado Chávez nas eleições de Outubro de 2012. Jovem (tem apenas 40 anos) e carismático, o candidato da Mesa de Unidade Democrática, ou MUD, arrancou a Chávez o melhor resultado da oposição em anos. Ainda assim, a votação que alcançou não foi suficiente para conquistar a presidência. Após o desaparecimento do chefe de estado e consequente repetição do acto eleitoral, no entanto, as esperanças de Capriles – e, por isso, da oposição – ressurgiram. Agora sem o caudillo que havia liderado o país durante 14 anos, supuseram, os dissidentes estavam mais perto de reconquistar a chefia do Estado. O resultado eleitoral espelhou uma nação dividida ao meio. De acordo com a Comissão Eleitoral, Nicolás Maduro venceu com 50% dos sufrágios, ao passo que Henrique Capriles arrecadou 49% deles. Mas a proximidade entre as votações de ambos os candidatos, assim como os múltiplos relatos de fraude eleitoral, impediram um desfecho pacífico das eleições. Nos dias seguintes ao anúncio dos resultados, o país explodiu em indignação. Quando Capriles lançou dúvidas sobre a legitimidade do processo eleitoral, milhares de venezuelanos, defensores e adversários do regime, saíram às ruas. Daí até à eclosão de confrontos e à morte de 7 civis, pouco demorou.

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O resultado eleitoral espelhou uma nação dividida ao meio. Maduro venceu com 50% dos sufrágios, ao passo que Capriles arrecadou 49% deles. Mas a proximidade entre as votações de ambos os candidatos, assim como os múltiplos relatos de fraude eleitoral, impediram um desfecho pacífico das eleições. processo eleitoral, milhares de venezuelanos, defensores e adversários do regime, saíram às ruas. Daí até à eclosão de confrontos e à morte de 7 civis, pouco demorou. Suspeitando de uma fraude eleitoral generalizada, o candidato da oposição requisitou à Comissão Eleitoral que recontasse os votos. Maduro, porém, recusou fazê-lo – e essa é uma posição que manteve até agora. Sem uma aceitação pacífica do sufrágio de Abril, a Venezuela pode bem encontrar-se numa crise de consequências imprevisíveis. Já não são apenas os problemas económicos; a inflação galopante, o crescimento anémico ou os elevadíssimos níveis de pobreza já não, para os venezuelanos, o cerne das suas preocupações. Com um presidente-eleito que muitos – a maioria do povo venezuelano? – acham ser ilegítimo, o país está destinado a ter uns próximos seis anos particularmente difíceis. Na melhor das hipóteses, Nicolás

maioria do povo venezuelano? – acham ser ilegítimo, o país está destinado a ter uns próximos seis anos particularmente difíceis. Na melhor das hipóteses, Nicolás Maduro terá um mandato profundamente conturbado, em que a oposição generalizada ao seu governo o forçará à progressiva totalitarização do Estado. Na pior, as desconfianças que rodeiam o presidente poderão, a prazo, levar a um golpe de estado por oficiais extremistas do regime. Um outro cenário, porventura menos previsível, seria ainda a eclosão de uma guerra civil entre apoiantes e oponentes da República Bolivariana. Qual destas hipóteses se materializará, é ainda incerto. Isto, contudo, parece ser inquestionável: o futuro pouco trará de bom à nação sul-americana.


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Reino Unido Era um dos grandes testes à coligação governamental liderada por David Cameron. Forçado a pôr em marcha políticas draconianas de contenção orçamental, o governo britânico caminhou para as eleições locais de 2 de Maio com um irremediável sentimento de perda. Para eles, a batalha eleitoral acarretava um único objectivo: o de limitar, tanto quanto possível, as perdas que sofreriam. Os trabalhistas, por outro lado, viram-nas como o momento de afirmação política do seu líder, Ed Miliband. Nenhum dos dois, porém, alcançou os resultados que almejava. Primeiro-ministro desde 2010, o conservador David Cameron não tem tido um mandato fácil. No ano em que ascendeu à liderança do seu país, Cameron deparou-se com uma nação escravizada pela dívida e em severa depressão económica. Após treze anos de socialismo, a herança era pesada: o défice estrutural, que em 1997 – isto é, no último ano dos Conservadores no governo - não ultrapassava os 2.2% do PIB, aumentou entretanto para uns históricos 11%. O desemprego teve comportamento semelhante, ao passo que a dívida pública tocou, em 2010, a fasquia dos 7.8%. Confrontados com este cenário, os conservadores dispuseram-se a impor ao Reino Unido uma dolorosa receita de rigor orçamental. Isto, aliado à aparente irresolução do Governo britânico no palco europeu, tem causado uma séria perda de popularidade para a coligação entre Conservadores e Liberais. Mas nem por isso o futuro parece risonho para a oposição trabalhista. Embora os conservadores registem mínimos históricos de apoio nas sondagens, Ed Miliband aparenta ser incapaz de conquistar o público

risonho para a oposição trabalhista. Embora os conservadores registem mínimos históricos de apoio nas sondagens, Ed Miliband aparenta ser incapaz de conquistar o público britânico. Esse é, aliás, um dos dois aspectos em que todos os estudos de opinião logram convergir: por um lado, a derrota dos partidos do governo; por outro, a incapacidade de Miliband em afirmar-se como alternativa política. Estas eleições locais, realizadas num dos momentos de maior pressão para o executivo Con-Lib, forneceram, porém, uma oportunidade de ouro ao líder da oposição: arrasando o Partido Conservador, acharam os trabalhistas, a liderança de Miliband tornar-se-ia inquestionável. Não foi, todavia, isso que acabou por

ao líder da oposição: arrasando o Partido Conservador, acharam os trabalhistas, a liderança de Miliband tornar-se-ia inquestionável. Não foi, todavia, isso que acabou por verificar-se. A grande surpresa da noite eleitoral foi, não o resultado dos trabalhistas, mas o sucesso dos eurocépticos do UKIP. Liderado por Nigel Farage, um ex-conservador célebre pelos seus discursos entusiásticos no Parlamento Europeu, o United Kingdom Independence Party tem vindo a afirmar-se como a nova pedra angular da política britânica. E não sem bom motivo: partido novo com propostas inovadoras, o UKIP pugna pela saída da União Europeia, por um sistema contributivo de taxa proporcional – ou fixa – e pelo abandono dos


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partido novo com propostas inovadoras, o UKIP pugna pela saída da União Europeia, por um sistema contributivo de taxa proporcional – ou fixa – e pelo abandono dos grandes projectos de obras públicas que tanto os conservadores como os trabalhistas apoiam. Não menos relevante para o crescimento eleitoral do partido, é a personalidade do próprio Farage. Tribuno insigne, Nigel Farage alia à personificação da imagem do conservador inglês uma aura de intensa pugnacidade política. É aí que, afirma, o UKIP se distingue das restantes forças partidárias: na determinação com que se agarra aos objectivos com que se compromete. O esforço, compreende-se isso hoje, deu bons resultados. Apesar de uma incessante campanha mediática contra o partido, o UKIP tomou o lugar dos liberais como terceira força do país. Já lhe chamaram um pouco de tudo: Cameron, primeiroministro e líder dos conservadores, sugeriu que os eurocépticos – quantos deles, ex-membros do partido do governo – são “racistas de armário”. Acusações semelhantes – e.g., de homofobia, xenofobia e chauvinismo – choveram sobre o novo o UKIP. Mas isso não deteve Farage. Nada o logrou. E, contra tudo e contra todos, o combativo eurodeputado britânico fez-se dono de 23% do eleitorado. Não se fizeram esperar as reacções ao terramoto político britânico. Confrontados com a pior votação da sua história – um mero 25% dos votos -, os conservadores reiteraram o seu pedido por uma política externa mais firme. Ao primeiroministro, exigiram que o referendo à permanência britânica da União Europeia seja antecipado para a actual legislatura e mão forte contra a imigração ilegal. E, se Cameron não se vergou - pelo menos, por

permanência britânica da União Europeia seja antecipado para a actual legislatura e mão forte contra a imigração ilegal. E, se Cameron não se vergou - pelo menos, por agora – às exigências da ala mais eurocéptica do seu partido, a verdade é que foi já forçado a radicalizar a sua posição face aos imigrantes. Durante o próximo ano, anunciou já, serão postos em marcha projectos-lei com o anun-

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ciou já, serão postos em marcha projectos-lei com o objectivo de limitar o acesso de imigrantes provenientes da União Europeia a prestações sociais e serviços públicos – saúde e educação incluídos. Que influência isso terá na contenção eleitoral do UKIP, porém, é ainda uma incógnita. Uma coisa, ainda assim, é certa: há muitos anos que a política britânica não era tão interessante. 

Liderado por Nigel Farage, um ex-conservador célebre pelos seus discursos entusiásticos no Parlamento Europeu, o UKIP tem vindo a afirmar-se como a nova pedra angular da política britânica. Partido novo com propostas inovadoras, o UKIP pugna pela saída da União Europeia, por um sistema contributivo de taxa proporcional – ou fixa – e pelo abandono dos grandes projectos de obras públicas que tanto os conservadores como os trabalhistas apoiam.


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opinião

A insustentável indiferença Francisco Ancêde

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uando aceitei o desafio de participar neste Gabinete de Estudos – cujo trabalho muito me orgulha - prometi que não deixaria a minha opinião escorregar para o ziguezaguear quotidiano da politica nacional. Hoje não me sinto capaz de continuar a cumprir essa promessa. Os recentes desenvolvimentos na questão da limitação dos mandatos autárquicos obrigam-nos a todos a descer ao lamaçal onde se encontra a discussão. A Lei 46/2005 encontra-se publicada em Diário da República desde 29 de Agosto de 2005. A intenção legislativa era inquestionavelmente limitar a recandidatura pessoal dos membros dos órgãos aí referidos, ficando estes limitados a três mandatos consecutivos. Essa foi também a percepção pública à data da discussão e publicação da lei, tendo sido recebida com regozijo pela opinião pública. Mas afinal o que terá mudado? Qual a razão para que haja discussão nesta matéria? Qual é a dúvida? Em boa verdade, nada mudou, nem existe nenhuma dúvida. A lei é clara, transparente e ao alcance de qualquer ser humano capaz de ler um artigo com apenas três alíneas escritas em Português. Foi apenas a proximidade das eleições autárquicas a realizar no próximo mês de Outubro que trouxe à praça pública a discussão. Como todos sabemos vários Presidentes de Camara e de Juntas de Freguesia encontram-se legalmente impossibilitados de se recandidatarem, uma vez que atingiram o limite dos três mandatos previstos. Ora heis que nos bate à porta a Ética Republicana. Nunca percebi a necessidade de acrescentar à palavra Ética o adjectivo Republicana. Ética é e sempre será algo que se verifica ou espera-se que se verifique em qualquer circunstância, relação ou momento. Mas esta Ética é diferente, é a Republicana. Baseada no sagrado primado da Lei, verdadeira e única representação escrita da vontade da maioria, deveria ser argumento bastante para calar todos os que – para proveito próprio ou cumprindo mandato da sua matilha/vara - pretendem lançar a dúvida sobre uma Lei desta Republica. Mas não! A própria Republica conhece hoje uma Ética que permite aos seus guardiões, numa situação de alerta para o seu status quo, transformar,

sua matilha/vara - pretendem lançar a dúvida sobre uma Lei desta Republica. Mas não! A própria Republica conhece hoje uma Ética que permite aos seus guardiões, numa situação de alerta para o seu status quo, transformar, travestir e inverter qualquer Lei. A Ética Republicana hoje, permite aos autonomeados guardiões do espirito da Lei, a subversão, alteração e ultraje de Leis votadas na Assembleia com consagração de poder de ius imperium. Afinal a República Democrática, terreno da praça pública e emanação da vontade da maioria, tem dono. E desengane-se quem pense que este caso de grosseiro desrespeito à Lei é pontual. O caso é paradigmático ao estado a que chegou a política neste País. Os partidos políticos - com a humilhante excepção do Bloco de Esquerda - por conveniência financeira, aparelhista e eleitoral, principiaram a apresentar de ânimo leve candidatos em total desrespeito pela referida Lei. Rapidamente muitos foram os que se insurgiram contra esta situação, apresentando acções judiciais e promovendo a discussão pública. Face à constatação do problema gerado os interessados trataram rapidamente de ligar à corrente o 'Playmobil de Belém' que, sem voz, mas com caneta comandada, tratou de agradar aos seus fornecedores de permutas, bocejos e sorrisos, descobrindo um erro na redação da Lei. Não vou perder uma linha a discutir “de” e “da”, deixo isso para quem o desespero alimenta a imaginação. Mas não posso deixar de aproveitar este espaço para alertar que nunca como hoje se tornou público que a República Portuguesa tem sobre a sua alçada dois Países diferentes, a quem a Lei se aplica conforme o Estatuto, finança e poder. É verdadeiramente inexplicável que num estado de direito democrático europeu se possa assistir, com a conivência dos lideres dos partidos do arco governamental, aos piores defeitos do cacique eleitoral. O tacticismo político, a chicana, o desrespeito e a distância dos partidos políticos face à população Portuguesa são alarmantes, numa altura em que todos os partidos deveriam estar à altura da situação nacional. Ser líder é muito mais do que isto, ser politico não é seguramente isto. A podridão da discussão, a forma como se pretende abafar as críticas e o silêncio ensurdecedor dos que pretendem que tudo se passe com a calma de uma manhã serena, são o sinal da insustentável indiferença que a classe politica demonstra pelo povo Português e pela Lei aprovada em seu nome. Resta-nos acreditar que os Tribunais não deixarão passar pelo seu crivo este fasciculo negro do nosso já tão debilitado estado de direito democrático.



QUANTO VALE UM DISCURSO? ENTREVISTAMOS MARÍA LUÍSA ALDIM E EDUARDO PEREIRA CORREIA, autores do livro ‘grandes discursos do século xx’

Um grande discurso deve agitar a alma e inspirar uma nação. Esta inédita antologia reúne discursos completos e memoráveis, introduzidos pelas mais proeminentes figuras da política nacional, que através dos seus escritos e ao longo do tempo, marcaram Portugal. Por isso, e pelo facto de a ex-coordenadora do Gabinete de Estudos Gonçalo Begonha, Maria Luísa Aldim, ser co-autora deste livro, interessamo-nos por saber mais sobre a obra e o que pensam os seus autores da importância da palavra e da oratória na actividade política.



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entrevista

Qual a motivação para fazer este livro? Ao longo da nossa formação, apercebemo-nos que subsistia um vazio literário ao nível de uma antologia política, que reunisse os discursos completos e mais memoráveis do século XX, proferidos por figuras proeminentes da política nacional que, ao longo do tempo, a marcaram. Esta é uma prática comum em diversos países da Europa e do mundo, e muitos deles não têm metade da nossa história política. Sentimos que faltava na realidade uma investigação de cariz politológico, que soubesse seleccionar os momentos que contavam um século da história política de Portugal. O século passado espelhou uma série de mudanças, contando com um amplo debate sobre as linhas gerais e estratégicas do pensamento e da política externa portuguesa, o enigma das contas públicas portuguesas ao longo de cem anos, as múltiplas alterações ao sistema eleitoral mas também de governo, o período do Estado Novo marcado pela II Guerra Mundial e pelo reconhecimento dos territórios ultramarinos, a Revolução de Abril, e por fim o processo de democratização, com destaque na integração de Portugal no seio da comunidade europeia, entre muitos outros temas. Ao longo de cinco anos fomos reunindo com diversas personalidades que tinham uma memória histórica e política do século XX, o que culminou com uma rara selecção de discursos políticos notáveis, muitos deles inéditos, onde se apresentam questões transversais na política portuguesa. Como dizemos no livro, são discursos de D. Carlos I a Francisco Louçã, o que demonstra bem a nossa motivação em deixar bem

‘Esta é uma prática comum em diversos países da Europa e do mundo, e muitos deles não têm metade da nossa história política. Sentimos que faltava na realidade uma investigação de cariz politológico, que soubesse seleccionar os momentos que contavam um século da história política de Portugal.’ transversais na política portuguesa. Como dizemos no livro, são discursos de D. Carlos I a Francisco Louçã, o que demonstra bem a nossa motivação em deixar bem patente a diversidade de temas e actores políticos que marcaram o século XX em Portugal. A que grandes conclusões chegaram sobre o poder e a importância da palavra e do discurso no mundo da política? O discurso é o reflexo do pensa-mento político. Pela palavra, se transmite o pensamento e a emoção, mas sem o dom da oratória não seria possível mover uma nação. Claro que são muitos os factores que fizeram a nossa história, e o discurso foi o veículo de trans-missão do pensamento político dos seus actores. No caso português, o risco da compilação de um século da nossa história é de nos depararmos com algo que preferíamos não ter a percepção constante. Quando nos

No caso português, o risco da compilação de um século da nossa história é de nos depararmos com algo que preferíamos não ter a percepção constante. Quando nos vangloriamos da nossa posição neutral e não beligerante na segunda guerra mundial, esquecemo-nos que porventura perdemos muito mais ao longo de cem anos. Repare-se que num século, Portugal perdeu todo o império colonial português: Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Goa, Damão e Diu, São Tomé e Príncipe, Timor e Macau. Sentimos que ainda existe uma convivência difícil com esta matéria, como foi possível perdermos o lugar de destaque no mundo em tão pouco tempo, sobretudo desenvolvendo uma política paralela às grandes questões internacionais? Só percebendo a acção política durante o século XX, torna possível ter uma opinião formada.


entrevista

tões internacionais? Só percebendo a acção política durante o século XX, torna possível ter uma opinião formada. O que é necessário para estarmos perante um grande discurso político? Existem dois grandes tipos de discursos, que merecem ambos um destaque póstumo pela História. O primeiro é automaticamente reconhecido pela audiência, é um discurso que percepciona sem mácula o momento, capta a fé dos auditores e transmite uma mensagem que é totalmente esclarecida e aplaudida. Depois há discursos que passam despercebidos, motivados por um erro ou falta de divulgação, e só mais tarde são reconhecidos como palavras de grande sabedoria e poder. Um discurso político deve ser crítico e motivador, capaz de inspirar uma comunidade. Para além do texto político, um grande discurso obriga à oratória exemplar e à demonstração de um coração acelerado de paixão, que seja capaz de transformar batalhas, exaltando a crítica, reformando o mundo e inspirando um povo para um esforço excepcional. Os grandes discursos descrevem de forma exemplar a história de uma nação. Crêem que o poder da oratória já foi mais importante do que é hoje? Pelo contrário, cada vez mais a palavra atinge um poder que é em muito subestimado. Se associarmos o discurso político a uma vasta difusão, seja em comunicações ou em comícios, que são mais tarde transmitidos vezes sem conta através novas tecnologias de informação e das redes sociais, a palavra política é sem dúvida o meio privilegiado para abordar os cidadãos. Cremos que grande parte

através novas tecnologias de informação e das redes sociais, a palavra política é sem dúvida o meio privilegiado para abordar os cidadãos. Cremos que grande parte do processo de descredibilização da actividade política e das suas instituições deve-se sobretudo a um facilitismo precoce que foi atingindo uma geração de poder que menosprezou e considerou dispensável um discurso completo e organizativo das políticas defendidas. Não basta governar bem, é necessário fazer uma difusão política adequada para que esta possa ser julgada tão claramente como foi transmitida. De todos os discursos que incluíram no livro, qual vos marcou mais? É muito difícil escolher somente um discurso entre tantos, cada discurso marca um tempo, uma história, a vida de um autor e a sua posição naquele momento. Contudo, há discursos que por serem inéditos na sua forma e conteúdo, bem como por nunca terem sido publicados, despertam mais a atenção e a curiosidade, como o caso do discurso do deputado João Camoesas, em 1925. É um caso raro no mundo de um discurso de nove horas num parlamento, afim de garantir a hegada de diversos deputados do Porto para contrariar uma moção de censura. Na realidade os deputados chegaram, mas ainda assim os votos não foram suficientes e o governo caiu. Ficou para a história o discurso mais longo alguma vez realizado numa câmara em Portugal, e reflecte a história do nosso país desde a sua fundação. Em contrapartida, o discurso mais curto desta selecção pertence a António José de Almeida, quando em 1914 explica no Parlamento a razão de Portugal se

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discurso entre tantos, cada discurso marca um tempo, uma história, a vida de um autor e a sua posição naquele momento. Contudo, há discursos que por serem inéditos na sua forma e conteúdo, bem como por nunca terem sido publicados, despertam mais a atenção e a curiosidade, como o caso do discurso do deputado João Camoesas, em 1925. É um caso raro no mundo de um discurso de nove horas num parlamento, afim de garantir a hegada de diversos deputados do Porto para contrariar uma moção de censura. Na realidade os deputados chegaram, mas ainda assim os votos não foram suficientes e o governo caiu. Ficou para a história o discurso mais longo alguma vez realizado numa câmara em Portugal, e reflecte a história do nosso país desde a sua fundação. Em contrapartida, o discurso mais curto desta selecção pertence a António José de Almeida, quando em 1914 explica no Parlamento a razão de Portugal se envolver na Grande Guerra. Destas três páginas, escrevem-se ainda hoje centenas de livros. Certamente que tiveram de deixar alguns discursos de fora. Qual vos deu mais pena? A nossa investigação é fruto de uma análise exaustiva de mais de quinhentos discursos examinados, diversos singulares, com um carácter único e uma memória sólida que contam um século da história política de Portugal. Pese embora o livro seja somente de discursos políticos, podemos encontrar discursos de diversos poetas, pintores, para além de Reis, Presidentes da República, Primeiros-Ministros, e vários deputados. Porventura lamentamos não ter tido espaço para alguns discursos marcantes na sociedade


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fundação. Em contrapartida, o discurso mais curto desta selecção pertence a António José de Almeida, quando em 1914 explica no Parlamento a razão de Portugal se envolver na Grande Guerra. Destas três páginas, escrevem-se ainda hoje centenas de livros. Certamente que tiveram de deixar alguns discursos de fora. Qual vos deu mais pena? A nossa investigação é fruto de uma análise exaustiva de mais de quinhentos discursos examinados, diversos singulares, com um carácter único e uma memória sólida que contam um século da história política de Portugal. Pese embora o livro seja somente de discursos políticos, podemos encontrar discursos de diversos poetas, pintores, para além de Reis, Presidentes da República, Primeiros-Ministros, e vários deputados. Porventura lamentamos não ter tido espaço para alguns discursos marcantes na sociedade portuguesa, mas que repetiam excessivamente o autor ou simplesmente não respeitavam o princípio de compilar os discursos políticos fundadores de Portugal. E neste sentido fomos irredútiveis, nenhum discurso considerado imprescindível poderia ficar de fora, o que levou à edição de mais de setecentas páginas. Mas era impossível compilar as palavras que fizeram a história política de Portugal no século XX em menos do que isso, sobretudo porque existiu da nossa parte uma grande exigência no respeito ao equilíbrio histórico de cada período político.

O livro abrange os grandes discursos do século passado. Que discursos feitos já no século XXI destacam, no plano nacional e internacional? A última década tem sido bastante profícua ao nível de discursos políticos, sobretudo de acordo com as novas ameaças e desafios que se foram formando, sendo que a actual crise económica tem também dado lugar a muitos políticos profetas. Em Portugal fazem-se excelentes discursos. Na realidade, a língua portuguesa tem uma forte identidade e a memória linguística é propícia a discursos líricos. É possível vermos diariamente diversos oradores que têm ainda um espírito deestadistas, e com um cuidado muito especial de falar para a história e de capacidade imprescindível no enriquecimento da palavra no discurso político. No plano internacional há discursos marcantes que assinalaram a política internacional, o caso dos presidentes norte-americanos que são um exemplo paradigmático na condução da política norteamericana e consequentemente mundial. O mediatismo destes políticos bem como a diversidade de postura discursiva no tom expressado, ora humorístico, ora fatalista, ora paternal, ora crítico e severo, pretende sempre expressar as ideias e emoções para aproximar e convencer ouvinte. O marketing e a comunicação política, são cada vez mais usados como ferramenta para direccionar e potenciar o poder da palavra, pelo que assistimos cada vez mais à sua adopção por este mundo fora.

O livro abrange os grandes discursos do século passado. Que discursos feitos já no século XXI destacam, no plano nacional e internacional?

Podemos contar com um segundo volume em breve? Este livro foi muito bem recebido pelo público, tem sido uma surpresa para nós o destaque da

portuguesa tem uma forte identidade e a memória linguística é propícia a discursos líricos. É possível vermos diariamente diversos oradores que têm ainda um espírito deestadistas, e com um cuidado muito especial de falar para a história e de capacidade imprescindível no enriquecimento da palavra no discurso político. No plano internacional há discursos marcantes que assinalaram a política internacional, o caso dos presidentes norte-americanos que são um exemplo paradigmático na condução da política norteamericana e consequentemente mundial. O mediatismo destes políticos bem como a diversidade de postura discursiva no tom expressado, ora humorístico, ora fatalista, ora paternal, ora crítico e severo, pretende sempre expressar as ideias e emoções para aproximar e convencer ouvinte. O marketing e a comunicação política, são cada vez mais usados como ferramenta para direccionar e potenciar o poder da palavra, pelo que assistimos cada vez mais à sua adopção por este mundo fora. Podemos contar com um segundo volume em breve? Este livro foi muito bem recebido pelo público, tem sido uma surpresa para nós o destaque da comunicação social, e particularmente o vasto interesse que existe sobre esta matéria. Apesar de algum cepticismo inicial, o mercado livreiro aceitou o espaço necessário para tratar a nossa história política, e verificamos que existe uma especial atenção no tratamento destas matérias. Actualmente já é possível encontrar bons livros que descrevem a memória da política portuguesa. Da nossa investigação, evidentemente ficaram muitos discursos por


entrevista

são um exemplo paradigmático na condução da política norteamericana e consequentemente mundial. O mediatismo destes políticos bem como a diversidade de postura discursiva no tom expressado, ora humorístico, ora fatalista, ora paternal, ora crítico e severo, pretende sempre expressar as ideias e emoções para aproximar e convencer ouvinte. O marketing e a comunicação política, são cada vez mais usados como ferramenta para direccionar e potenciar o poder da palavra, pelo que assistimos cada vez mais à sua adopção por este mundo fora. Podemos contar com um segundo volume em breve? Este livro foi muito bem recebido pelo público, tem sido uma surpresa para nós o destaque da comunicação social, e particularmente o vasto interesse que existe sobre esta matéria. Apesar de algum cepticismo inicial, o mercado livreiro aceitou o espaço necessário para tratar a nossa história política, e verificamos que existe uma especial atenção no tratamento destas matérias. Actualmente já é possível encontrar bons livros que descrevem a memória da política portuguesa. Da nossa investigação, evidentemente ficaram muitos discursos por publicar e sobretudo novas ideias que, de acordo com outras perspectivas, poderá acolher o interesse do público.

palavra, pelo que assistimos cada vez mais à sua adopção por este mundo fora. Podemos contar com um segundo volume em breve? Este livro foi muito bem recebido pelo público, tem sido uma surpresa para nós o destaque da comunicação social, e particularmente o vasto interesse que existe sobre esta matéria. Apesar de algum cepticismo inicial, o mercado livreiro aceitou o espaço necessário para tratar a nossa história política, e verificamos que existe uma especial atenção no tratamento destas matérias. Actualmente já é possível encontrar bons livros que descrevem a memória da política portuguesa. Da nossa investigação, evidentemente ficaram muitos discursos por publicar e sobretudo novas ideias que, de acordo com outras perspectivas, poderá acolher o interesse do público.

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tratar a nossa história política, e verificamos que existe uma especial atenção no tratamento destas matérias. Actualmente já é possível encontrar bons livros que descrevem a memória da política portuguesa. Da nossa investigação, evidentemente ficaram muitos discursos por publicar e sobretudo novas ideias que, de acordo com outras perspectivas, poderá acolher o interesse do público. 

‘O discurso é o reflexo do pensamento político. Pela palavra, se transmite o pensamento e a emoção, mas sem o dom da oratória não seria possível mover uma nação. Claro que são muitos os factores que fizeram a nossa história, e o discurso foi o veículo de transmissão do pensamento político dos seus actores.’


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opinião

Da eternidade dos muros Rafael Borges

O

estado da realidade sobrepõe-se sempre à realidade do Estado. Em Janeiro de 1989, o secretário-geral do Partido Socialista Unido da Alemanha, Erich Honecker, asseverava o mundo de que “o muro [de Berlim] estará de pé daqui a 50, 100 anos, se as razões para a sua existência não forem removidas.” Apenas dez meses depois, os portões que haviam separado os filhos da Alemanha estavam abertos, milhões de famílias voltavam a encontrar-se e o regime comunista colapsava. Bastou a realidade para derrotar aquilo que Honecker julgava – ou esperava – ser eterno. O passado dia 9 não poderia senão ter-nos relembrado dos derradeiros meses do totalitarismo alemão. De Lisboa a Varsóvia, de Atenas a Helsínquia, a Europa lançou-se numa campanha de auto-enaltecimento. Frente ao parlamento romeno, foi depositado um estandarte comunitário de 140 metros. Por todo o continente, centenas de instalações e escritórios da União foram abertos ao público, numa tentativa de mostrar proximidade entre os cidadãos e as instituições europeias. Em Florença, o Presidente da Comissão Europeia, o português José Manuel Durão Barroso, falou do “Estado da União.” Na cidade italiana, um dia após ter-se pronunciado pela “inevitabilidade” da “intensificação da união política” continental, o exprimeiro-ministro pediu mais poderes para Bruxelas. Enquanto a economia europeia abeira o colapso, o seu desemprego atinge níveis históricos e a sua dívida aumenta desmesuradamente, o discurso dos 'apparatchiks' mantém-se incólume. A mensagem da Europa para si própria é a mesma que Honecker endereçava aos súbditos da Alemanha socialista: pesem ou não as dificuldades, este é um edifício que não ruirá. Valha o que valer. Custe o que custar. É um sentimento generalizado, o de Barroso. Como ele, abundam os intelectuais de algibeira que não hesitam

'apparatchiks' mantém-se incólume. A mensagem da Europa para si própria é a mesma que Honecker endereçava aos súbditos da Alemanha socialista: pesem ou não as dificuldades, este é um edifício que não ruirá. Valha o que valer. Custe o que custar. É um sentimento generalizado, o de Barroso. Como ele, abundam os intelectuais de algibeira que não hesitam em associar ao processo de amalgamação comunitária uma ideia de fatalidade. É o caso de Henrique Monteiro, comentador diário do Expresso. Para justificar o eurofanatismo que revela em “Pelo Euro, pela Europa”, Monteiro não tem qualquer pejo em ignorar tudo o que há de objectivo. Mas, diz-nos Ayn Rand, "podemos fugir à realidade, mas não às consequências de fugir à realidade." E essa é uma ideia tão válida para os indivíduos como para as nações. Como Barroso, Monteiro rejeita o papel que a NATO, verdadeira fonte da estabilidade continental, teve na preservação da paz europeia. Como o presidente da Comissão e demais eurocratas, Monteiro refere que, abandonar o projecto, seria “a confissão de que não somos capazes de pertencer ao que se chamou, um dia, o pelotão da frente.” Mas esse pelotão, a que tantos querem agrilhoar Portugal, é o mesmo que, de 25% do PIB mundial em 1973, passou a representar, em 2011, uns meros 15% da riqueza produzida no globo. O louvado clube é hoje um entrave ao crescimento mundial, exibe níveis recorde de desemprego e encontra-se em profunda recessão económica. Goste-se ou não do facto, o “pelotão da frente” está a ficar para trás. E Portugal não deve acompanhá-lo nesse processo. A Europa voltou à era das batalhas de produção: combate-se, não por causas, mas para não parar de combater. A peleja autojustifica-se. Os sacrifícios, talvez acrescentasse Henrique Monteiro, fazem-se por capricho – e não, como no caso português, por efectiva necessidade de passar por eles. Para o insigne colunista do Expresso, Portugal deve manter-se no Euro, não por


opinião

combate-se, não por causas, mas para não parar de combater. A peleja autojustifica-se. Os sacrifícios, talvez acrescentasse Henrique Monteiro, fazem-se por capricho – e não, como no caso português, por efectiva necessidade de passar por eles. Para o insigne colunista do Expresso, Portugal deve manter-se no Euro, não por ele ser economicamente viável, mas por dotar Lisboa de uma aura de “modernidade”. A palavra utilizada foi mesmo essa. Portugal deve abdicar da sua prosperidade futura pelo desígnio pueril de ser um país “moderno”. Deve esvaziar de poderes o seu parlamento, entregá-los a burocratas não eleitos e manter uma divisa que, taxativamente, teve efeitos perniciosos sobre a sua economia. Tudo para poder dizer-se mais moderno que estados como a Suíça, a Noruega, o Reino Unido, a Islândia, a Suécia ou a Dinamarca. Hoje, 63 anos após a Declaração de Schuman, a Europa encontra-se num limbo. Mas não, creio, por muito tempo. Os muros, lembra-nos o exemplo alemão, não duram para sempre – e a realidade não pode ser contida pela pompa dos Estados. Fora dos escritórios da Comissão Europeia, há uma Europa que definha. Com ou sem os receios dos burocratas, pesem ou não os desejos dos intelectuais de quarta categoria que pululam pelo continente, acabará por chegar o momento em que a Europa acordará para a realidade. Compreenderá nessa ocasião que, malgrado todos os seus esforços, o projecto comunitário não teve sucesso. E isso é aquilo de que o continente mais necessita neste momento: após a 'tragōidia', a catarse. O nosso futuro colectivo depende de como nos prepararmos para essa circunstância. 

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ideologia

Faz ainda algum sentido ser de ‘direita’?

Rui Albuquerque *

N

um tempo de diluição de fronteiras políticas e ideológicas, agravado pela queda do muro de Berlim e pela convicção generalizada de que, desde esse momento, o mundo vive numa panaceia de capitalismo liberal, questiona-se frequentemente a pertinência de se manterem as categorias de “esquerda” e “direita”, como se entre ambas, e dentro de cada uma delas, as diferenças fossem ténues, ou mesmo inexistentes. Está também muito em voga a moda de tentar criar novas categorias políticas que horizontalmente ocupem espaços à direita e à esquerda, sem verdadeiramente se poderem catalogar numa ou noutra posição. Para algumas pessoas, o liberalismo, o anarcocapitalismo

Num tempo de diluição de fronteiras políticas e ideológicas,

capitalismo e a social-democracia (da «terceira via» blairiana) são bons exemplos de teorias e práticas políticas que não se podem catalogar em nenhum daqueles dois campos tradicionais. Frequentemente, ouvimos figuras históricas da esquerda, como Mário Soares, acusarem correligionários seus, como Tony Blair ou mesmo José Sócrates, de cedências ao “mercado” e ao “capitalismo”, como ouvimos e lemos liberais e anarco-capitalistas a recusarem ser catalogados na direita. Fará, então, algum sentido manter ainda essa dicotomia fundadora da nossa modernidade política? A minha resposta é claramente afirmativa: mais do que nunca, faz agora sentido o aggiornamento político e ideológico à esquerda e à direita. E acrescento que esta diluição só prejudica aqueles que defendem uma ideia liberal da liberdade, o livremercado, a iniciativa privada, a redução do estado e os direitos naturais do indivíduo. É graças a essa diluição e à crescente falta de identidade política, que vemos a

mercado, a iniciativa privada, a redução do estado e os direitos naturais do indivíduo. É graças a essa diluição e à crescente falta de identidade política, que vemos a esquerda a condenar a direita e o “mercado” ou o “neoliberalismo” (que ela habilmente utiliza como sinónimos) dos resultados catastróficos das suas próprias políticas. Ou será que, por exemplo, não foram José Sócrates e o governo do PS os responsáveis pela crise económica portuguesa, mas sim os “mercados especulativos”, a “desregulamentação financeira”, enfim, o “neoliberalismo” os grandes responsáveis, como nos pretendem impingir? É da tradição católica dizer-se que o grande truque do diabo é negar a sua inexistência. Com a falta de demarcação entre direita e esquerda, esta última, que manieta habilmente a comunicação social e, por meio dela, a opinião pública, tem vindo a alijar as suas responsabilidades na crise dos últimos anos, endossando-as a quem elas não são devidas, nem poderiam nunca ser, desde logo, por ausência de responsabilidades


ideologia nacional

tem vindo a alijar as suas responsabilidades na crise dos últimos anos, endossando-as a quem elas não são devidas, nem poderiam nunca ser, desde logo, por ausência de responsabilidades governativas. Mas, a “explicação” oficial, é que os pobres governos de esquerda ficaram reféns dos grandes interesses dos criminosos mercados especulativos, inspirados por um desapiedado «neoliberalismo», que agora há que dominar com férrea regulamentação. As consequências disto, a não ser desmentido, poderão ser avassaladoras para a liberdade. Até porque, no meio desta intencional confusão, a esquerda não deixa para outros os seus próprios valores… Como poderemos, então, estabelecer uma demarcação entre esquerda e direita? Saliente-se, desde já, que se tratam de duas grandes famílias, de dois ramos separados de um enorme tronco comum – a das ideologias políticas modernas e democráticas, porque só destas faz sentido falar – que conhecem, dentro de cada uma delas, variações consideráveis. Tem que haver, todavia, um, ou vários,

comum – a das ideologias políticas modernas e democráticas, porque só destas faz sentido falar – que conhecem, dentro de cada uma delas, variações consideráveis. Tem que haver, todavia, um, ou vários, critérios de distinção, assim como elementos comuns em cada uma delas, para que a distinção possa manter-se e fazer sentido. O primeiro e mais significativo de todos os critérios diferenciadores é o da forma como esquerda e direita olham para o homem. Enquanto que a direita vê nele o indivíduo, a esquerda tem-no como cidadão. Nesta perspectiva, o homem é, para a direita, por si mesmo, sujeito e objecto de direitos face ao poder político, enquanto que, para a esquerda, ele existe essencialmente na sua relação com a coisa pública, sendo esta que lhe garante os direitos (e impõe as obrigações) que a direita vê como naturais e inerentes à sua condição. Esta distinção parte de uma perspectiva diferente da natureza humana. Para a direita, o homem não é naturalmente bom, tão-pouco é mau

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Esta distinção parte de uma perspectiva diferente da natureza humana. Para a direita, o homem não é naturalmente bom, tão-pouco é mau por ter sido corrompido pela sociedade. Mas também não é naturalmente mau, nem segue instintos que sejam anti-sociais ou destrutivos. Para a direita, o homem tem interesses e manifesta-os, defende-os e, se necessário for, conflitua por eles, mas consegue habitualmente compor as suas necessidades com as necessidades dos outros. É por isso que a direita acredita no princípio da cooperação como instinto social primário, e que acredita que as pessoas podem articular, entre si mesmas, os seus interesses fundamentais. Poderá dizer-se, a este respeito, que a direita varia entre uma confiança plena nas capacidades ordenadoras naturais dos indivíduos (o mercado) e uma confiança reservada quanto a essas capacidades, confiando ao governo e às instituições políticas e jurídicas (bem mais do que ao estado) os poderes necessários e suficientes para evitar, ou dirimir, conflitos mais acentuados. No


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ideologia

essas capacidades, confiando ao governo e às instituições políticas e jurídicas (bem mais do que ao estado) os poderes necessários e suficientes para evitar, ou dirimir, conflitos mais acentuados. No primeiro caso temos as posições liberais, no segundo teremos as posições ideologicamente mais conservadoras. Arriscaria, contudo, dizer que as segundas são, na prática, a face político-governativa das primeiras, e que não existe verdadeira antinomia política (que não teórica) entre ambas. Em contrapartida, para a esquerda o homem nunca é, por si só, suficiente. Ele é uma criatura indefesa, que carece de protecção. Seja pela via hobbesiana, que alguma direita ideologicamente mais conservadora também aceita, do perigo da conflitualidade social extremada, seja pela via mais esquerdista da dominância de exploradores – detentores do capital – dos pobres explorados – apenas detentores da força “bruta” do trabalho – a esquerda considera que o homem só será objecto de direitos se esses direitos forem reconhecidos e protegidos pelo estado (mais do que pelo governo). Por isso, para a esquerda, antes do homem está o cidadão. Melhor dizendo, o homem só o será em pleno se existir uma estrutura política que o proteja e lhe confira os direitos fundamentais à liberdade e à igualdade. Também na esquerda existem óbvias tonalidades de cores diferentes deste princípio, que vão dos que pretendem a conciliação entre um estado interventor e um mercado devidamente regulado, aos que pretendem que o mercado é sempre uma fonte de desigualdade e discriminação, pelo que só subsidiariamente, face ao poder público, poderá funcionar. A segunda distinção tem a ver com a

O mais significativo d os critérios diferenciadores é a forma como olham para o homem. Enquanto que a direita vê nele o indivíduo, a esquerda tem-no como cidadão. O homem é, para a direita, sujeito e objecto de direitos face ao poder político. Para a esquerda, ele existe essencialmente na sua relação com a coisa pública, sendo esta que lhe garante os direitos (e impõe as obrigações) que a direita vê como naturais e inerentes à sua condição. uma fonte de desigualdade e discriminação, pelo que só subsidiariamente, face ao poder público, poderá funcionar. A segunda distinção tem a ver com a forma como a direita e a esquerda vêem a sociedade. A direita considera a sociedade o resultado de forças que extravasam o político, podendo essas forças oscilar do indivíduo isolado no universo ao indivíduo como parte integrante de uma ordem transcendental. A esquerda entende que o “mundo” pode ser transfor-mado por golpes de vontade e é o resultado de forças inteligentes e direccionadas. Enquanto que a direita olha para a sociedade como o resultado da acção individual, e/ou da aprendizagem com tradição cumulativa, da eficácia das instituições comunitárias, ou

direita olha para a sociedade como o resultado da acção individual, e/ou da aprendizagem com tradição cumulativa, da eficácia das instituições comunitárias, ou mesmo da vontade superior de Deus, ela será sempre, de todo o modo, algo que não é transformável por actos direccionados da simples vontade humana, a esquerda olha para a sociedade como uma ideia moldável pelas convicções ideológicas de quem a dirige, isto é, do governo regulamentador e intervencionista, actuante sobre os indivíduos e a sociedade, ou mesmo de vanguardas ditas esclarecidas. Esta última distinção estabelece uma diferença subtil, mas substantiva, quanto à forma como a esquerda e a direita olham para a razão humana. Diferenciam, assim, o racionalismo político de uma e de


ideologia

uma diferença subtil, mas substantiva, quanto à forma como a esquerda e a direita olham para a razão humana. Diferenciam, assim, o racionalismo político de uma e de outra, isto para os ramos das duas famílias que adoptam o racionalismo como critério fundamental da natureza humana. Enquanto que para a direita a razão é sempre atributo do indivíduo, com o qual ele pode aprender, descobrir e tomar decisões para a sua vida, para a esquerda existe uma razão colectiva das coisas e dos movimentos da História que pode ser conhecida e manipulada por quem governa a sociedade e os homens. Como corolários destas duas essenciais diferenças, a esquerda e a direita abraçam valores políticos e filosóficos bem diferenciados. O primado do colectivo e do colectivismo, para as posições mais extremadas, é apanágio da esquerda. O primado do indivíduo, ou do indivíduo enquanto filho de Deus e centro do plano divino, para a direita mais próxima das religiões tradicionais, é apanágio da direita. A propriedade privada, enquanto direito a dispor de si mesmo ou enquanto direito fundamental a dispor do que é seu por legítima aquisição, versus a sujeição da propriedade privada a critérios de utilidade e finalidade pública, distinguem também a direita da esquerda. Os direitos naturais do indivíduo à liberdade e à propriedade, isto é, os direitos negativos sobre os quais o estado não poderá nunca dispor, reconhecidos por via da Constituição ou de outros instrumentos normativos que o protejam perante o poder público, é marca da direita. O estabelecimento, ou a criação, dos direitos dos indivíduos, não enquanto tal, mas como cidadãos,

normativos que o protejam perante o poder público, é marca da direita. O estabelecimento, ou a criação, dos direitos dos indivíduos, não enquanto tal, mas como cidadãos, isto é, os direitos que o estado atribui às pessoas na sua relação com o poder político é marca da esquerda. O respeito pela tradição, enquanto experiência acumulada pelas sucessivas gerações, é próprio da direita. A possibilidade de rupturas sociais, mais ou menos violentas, com pendor revolucionário ou simplesmente dirigista, é próprio da esquerda. E, last but not least, a função da política e do governo. Seja por acreditar numa ordem social espontânea, seja por duvidar da bondade do poder, seja por um certo cepticismo antropológico, seja, ainda, por crer que existem valores de ordem superior que não estão à disposição da simples vontade humana, a direita oscila entre as posições liberais do ideal do nãogoverno e do reconhecimento objectivo de um aparelho de poder público, que importa reduzir ao mínimo expoente possível, e as posições mais conservadoras, segundo as quais se aceita a necessidade de um governo concentrado nas funções tradicionais da soberania (justiça, segurança, negócios estrangeiros) e distanciado daquelas que pertencem ao domínio privado (economia, educação, ambiente, etc.). Em qualquer dos casos, a direita defende sempre um governo mínimo ou um governo com funções bem determinadas. Em contrapartida, o voluntarismo idealista da esquerda atira-a para um governo de amplas dimensões. Se o homem é um ser indefeso, se a sociedade é aquilo que nós quisermos que ela seja e se o destino está nas nossas mãos, então

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A possibilidade de rupturas sociais, mais ou menos violentas, com pendor revolucionário ou simplesmente dirigista, é próprio da esquerda. E, last but not least, a função da política e do governo. Seja por acreditar numa ordem social espontânea, seja por duvidar da bondade do poder, seja por um certo cepticismo antropológico, seja, ainda, por crer que existem valores de ordem superior que não estão à disposição da simples vontade humana, a direita oscila entre as posições liberais do ideal do nãogoverno e do reconhecimento objectivo de um aparelho de poder público, que importa reduzir ao mínimo expoente possível, e as posições mais conservadoras, segundo as quais se aceita a necessidade de um governo concentrado nas funções tradicionais da soberania (justiça, segurança, negócios estrangeiros) e distanciado daquelas que pertencem ao domínio privado (economia, educação, ambiente, etc.). Em qualquer dos casos, a direita defende sempre um governo mínimo ou um governo com funções bem determinadas. Em contrapartida, o voluntarismo idealista da esquerda atira-a para um governo de amplas dimensões. Se o homem é um ser indefeso, se a sociedade é aquilo que nós quisermos que ela seja e se o destino está nas nossas mãos, então faz todo o sentido que o político, este consubstanciado nos seus aparelhos de poder, o estado e o governo, tenha poderes suficientes para proteger o homem e transformar a sociedade. Num caso e no outro, significa isto que a função principal do político, segundo a esquerda, é promover a igualdade entre os homens, de modo, primeiro, a protegê-los

A direita considera a sociedade o resultado de forças que extravasam o político, podendo essas forças oscilar do indivíduo isolado no universo ao indivíduo como parte integrante de uma ordem transcendental. A esquerda entende que o “mundo” pode ser transformado por golpes de vontade e é o resultado de forças inteligentes e direccionadas.


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ainda, por crer que existem valores de ordem superior que não estão à disposição da simples vontade humana, a direita oscila entre as posições liberais do ideal do nãogoverno e do reconhecimento objectivo de um aparelho de poder público, que importa reduzir ao mínimo expoente possível, e as posições mais conservadoras, segundo as quais se aceita a necessidade de um governo concentrado nas funções tradicionais da soberania (justiça, segurança, negócios estrangeiros) e distanciado daquelas que pertencem ao domínio privado (economia, educação, ambiente, etc.). Em qualquer dos casos, a direita defende sempre um governo mínimo ou um governo com funções bem determinadas. Em contrapartida, o voluntarismo idealista da esquerda atira-a para um governo de amplas dimensões. Se o homem é um ser indefeso, se a sociedade é aquilo que nós quisermos que ela seja e se o destino está nas nossas mãos, então faz todo o sentido que o político, este consubstanciado nos seus aparelhos de poder, o estado e o governo, tenha poderes suficientes para proteger o homem e transformar a sociedade. Num caso e no outro, significa isto que a função principal do político, segundo a esquerda, é promover a igualdade entre os homens, de modo, primeiro, a protegê-los reciprocamente e a formar a sociedade justa, depois. Para isso, impõe-lhes direitos e deveres que os tornam cidadãos, isto é, iguais para e perante o estado, e promove as leis necessárias à igualdade material,

distribuindo recursos e desenvolvendo políticas de promoção económica e de igualdade social. Este conjunto de diferenças não esgotará a distinção entre esquerda e direita. Certamente que mais haverá a acrescentar e que certamente encontraremos algumas excepções a estas regras. Todavia, parecem-me suficientes para estabelecer critérios de diferenciação e para manter a utilidade da dicotomia.

belecer critérios de diferenciação e para manter a utilidade da dicotomia.

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* Rui Albuquerque é Doutor em Ciência Política e CEO do Grupo Lusófona Brasil. Este artigo foi originalmente publicado em oinsurgente.org

Seja por acreditar numa ordem social espontânea, seja por duvidar da bondade do poder, seja por um certo cepticismo antropológico, a direita oscila entre as posições liberais do ideal do não-governo e do reconhecimento objectivo de um aparelho de poder público, que importa reduzir ao mínimo expoente possível, e as posições mais conservadoras, segundo as quais se aceita a necessidade de um governo concentrado nas funções tradicionais da soberania. Em qualquer dos casos, a direita defende sempre um governo mínimo.




Michael

Seufert

‘‘

Acho dramático que qualquer política de corte na despesa seja inconstitucional.


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M

ichael Seufert tem 30 anos e é deputado do

CDS e da Juventude Popular à Assembleia da República. Natural do Porto, foi Coordenador do Gabinete de Estudos Gonçalo Begonha entre 2007 e 2009, e Presidente da Juventude Popular desde 2009 até 2011. Actualmente, desempenha as funções de Presidente da Mesa do Conselho Nacional da organização. Eleito deputado pelo círculo eleitoral do Porto em 2009 e em 2011, representa o CDS na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública e na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, na qual é o Coordenador do Grupo Parlamentar do partido.

O país vive uma grave crise financeira que tem provocado significativos problemas a nível social. Parece-te inevitável que o momento que vivemos provocará profundas mudanças na nossa forma de viver? Quais? Nem é preciso fazer futurologia para já ver as consequências imediatas da crise financeira: impostos muito elevadas e cortes na despesa pública – mesmo naquela que as pessoas consideram “boa” – que mudam o país todos os dias. Mais difícil é perceber o impacte a prazo mais longo. Eu gostaria de ter a esperança que houvesse o reconhecimento que não podem

que mudam o país todos os dias. Mais difícil é perceber o impacte a prazo mais longo. Eu gostaria de ter a esperança que houvesse o reconhecimento que não podem haver políticas despesistas e contas deficitárias como as dos últimos anos Sócrates e que é a consequência dessas políticas que hoje vivemos. Infelizmente para muitos “especialistas” e fazedores de opinião a austeridade é uma opção dos malvados direitistas do governo e não uma consequência lógica e expectável do que vivemos nos últimos anos. Globalmente, que avaliação fazes do


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e não uma consequência lógica e expectável do que vivemos nos últimos anos. Globalmente, que avaliação fazes do trabalho do Governo PSD/CDS até ao momento? Acho que o governo está, dentro das condicionantes que tem, a fazer um bom trabalho. Os números de redução da despesa e do défice são muito respeitáveis. No entanto há dois factores que são de difícil aceitação: por um lado só agora em Maio de 2013 é que aparecem verdadeiras medidas estruturais na despesa do estado (repare-se que até agora os cortes foram atendidos com reduções salariais que, quando não foram inconstitucionais tout court, eram sempre assumidas como temporárias). Por outro lado, e ainda que o efeito de reduzir o défice seja importante para futuro, a opção por mais impostos sempre que os cortes na despesa não bastavam era tomada, a meu ver, muito depressa. Vale a pena repisar no entanto que uma parte muito significativa dos impostos de hoje está a pagar políticas, despesa e dívida do passado – na exacta proporção do peso dos juros na despesa pública. Como classificas o papel do CDS no contexto da coligação governamental? Achas que o partido tem sido 'mal tratado' pelo PSD? Não acho que tenha havido “maus tratos” na coligação. Existem dois partidos que têm diferentes eleitorados e projectos e que por isso nem sempre têm de estar de acordo. Há em Portugal alguma dificuldade em lidar com governos de coligação, mas basta acompanhar a política na Inglaterra ou na Alemanha (para nem falar da Itália) para perceber que é normal noutros

‘Vale a pena repisar que uma parte muito significativa dos impostos de hoje está a pagar políticas, despesa e dívida do passado – na exacta proporção do peso dos juros na despesa pública.’


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dificuldade em lidar com governos de coligação, mas basta acompanhar a política na Inglaterra ou na Alemanha (para nem falar da Itália) para perceber que é normal noutros países que em coligações os dirigentes e até ministros de diferentes partidos assumam divergências. A lealdade mede-se na atitude e no momento dos votos nas diferentes matérias. Será justo para este governo que a dimensão da crítica que lhe é feita supere tantas vezes a que se fez a José Sócrates, quando é mais do que evidente que as respon sabilidades pela difícil situação do país se encontram mais no passado do que no presente? Não é certamente. Basta olhar para o que este governo enfrenta na gestão duma situação para a qual pouco ou nada contribuiu (o governo nada mesmo, os partidos que a sustentam já a doutrina divergirá) e o branqueamento a que se assiste do anterior executivo, cujo responsável tem até direito a tempo de antena no “serviço público”. No entanto é razoável dizer que houve, na campanha eleitoral e nos iniciais momentos do governo uma péssima gestão de expectativas. Portugal viveu anos a fio com 4%, 5% e até 9% e 10% de défices públicos. Ou seja, o estado endividava-se ano após ano para pagar serviços públicos, salários, etc, sem que se sentisse no imediato o verdadeiro custo dessas políticas. Ora com metas exigentes – e bem! – de redução desse desequilíbrio (que, tirando a despesa com juros, ate já ocorreu!) a economia ressente-se porque se vê privada de recursos que circulavam por via da dívida que hoje já não podemos mais contrair. O governo e os partidos não avaliaram bem o impacte destas políticas e portanto

recursos que circulavam por via da dívida que hoje já não podemos mais contrair. O governo e os partidos não avaliaram bem o impacte destas políticas e portanto houve a ideia de que o ajustamento seria simples e rápido o que nunca seria o caso. Ao mesmo tempo o enquadramento constitucional impede o recurso a medidas menos dolo-osas e mais rápidas – e com isso temos de viver e a isso temos de responder. Foste deputado na oposição e agora és deputado num Grupo Parlamentar que apoia o governo. Quais as principais diferenças? Claramente a diferença é que do ponto de vista do governo se tem acesso à realidade em primeira mão. Por outro lado não temos tantos graus de liberdade na nossa acção

Claramente a diferença é que do ponto de vista do governo se tem acesso à realidade em primeira mão. Por outro lado não temos tantos graus de liberdade na nossa acção porque, até em coligação, há realidades que temos de acomodar. No entanto, os partidos como os entendo existem para governar e não para estar na oposição, por muito bons que sejam nisso, é claramente no governo que podemos desenvolver a nossa vocação. Se é nesta altura ou com esta herança que queremos, já é outra questão. Tem-se verificado no interior do CDS e no seio do seu eleitorado, manifestações de desagrado com algumas medidas do governo, nomeadamente as que têm incidência no aumento da carga fiscal, e que vai contra algumas


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manifestações de desagrado com algumas medidas do governo, nomeadamente as que têm incidência no aumento da carga fiscal, e que vai contra algumas orientações do partido no passado. Reves-te nessa crítica ou encontras alguma 'atenuante' para essa postura? Acho que é preciso ver que o Memorando de Entendimento prevê expressamente aumentos de receita fiscal e que o CDS sabia disso e que por isso, no seu manifesto eleitoral, deixa de assumir a necessidade da redução da carga fiscal no imediato - justamente porque isso estava vedado pelo memorando. Mas claro que não é do dia para a noite que isso muda na cabeça das pessoas – e ainda bem, porque acho que não devemos perder esse património. Percebo no entanto e apesar dessas atenuantes que haja um impacte negativo nos nossos apoiantes dos sucessivos aumentos da carga fiscal que o CDS tem apoiado. Mas chamo também a atenção para outra barricada que olha apenas para o défice como a variável a combater e que mesmo com aumentos da carga fiscal importa é reduzir o défice presente para permitir menos impostos futuros. Creio que, por não termos moeda própria o que permitiria o recurso a medidas igualmente dolorosas mas menos visíveis como a inflação, o ajustamento que estamos a fazer é absolutamente original. Além disso, como já disse, muitas medidas de corte na despesa (e as mais estruturais e definitivas) são infelizmente inconstitucionais; pelo que não se adivinha grande solução que não passe pelo aumento de impostos.

‘Os partidos como os entendo existem para governar e não para estar na oposição, por muito bons que sejam nisso, é claramente no governo que podemos desenvolver a nossa vocação. Se é nesta altura ou com esta herança que queremos, já é outra questão.’ Nos últimos tempos, o PS tem radicalizado a sua ruptura com o governo, pondo em causa o consenso político de que o país tem


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que o CDS tem apoiado. Mas chamo também a atenção para outra barricada que olha apenas para o défice como a variável a combater e que mesmo com aumentos da carga fiscal importa é reduzir o défice presente para permitir menos impostos futuros. Creio que, por não termos moeda própria o que permitiria o recurso a medidas igualmente dolorosas mas menos visíveis como a inflação, o ajustamento que estamos a fazer é absolutamente original. Além disso, como já disse, muitas medidas de corte na despesa (e as mais estruturais e definitivas) são infelizmente inconstitucionais; pelo que não se adivinha grande solução que não passe pelo aumento de impostos. Nos últimos tempos, o PS tem radicalizado a sua ruptura com o governo, pondo em causa o consenso político de que o país tem benefíciado. Que importância tem esse consenso? Como classificas essa atitude do maior partido da oposição? O consenso tem interesse relativo. É importante para a nossa credibilização externa e para o nosso programa, até porque foi negociado pelo PS. Mas por outro lado é claro que há políticas que têm de ser de ruptura com o passado e com as políticas de endividamento público. Eu diria que é importante o governo ter uma porta aberta e que tente negociar o possível. Para lá disso não há que ter medo em avançar.

governo, pondo em causa o consenso político de que o país tem benefíciado. Que importância tem esse consenso? Como classificas essa atitude do maior partido da oposição? O consenso tem interesse relativo. É importante para a nossa credibilização externa e para o nosso programa, até porque foi negociado pelo PS. Mas por outro lado é claro que há políticas que têm de ser de ruptura com o passado e com as políticas de endividamento público. Eu diria que é importante o governo ter uma porta aberta e que tente negociar o possível. Para lá disso não há que ter medo em avançar. Que consequências práticas temes possam vir a resultar das recentes decisões do Tribunal Constitucional a respeito do Orçamento de Estado? Acho dramático, ainda que compreenda no nosso enquadramento constitucional, que qualquer política de corte na despesa seja inconstitucional. Ainda para mais invocando princípios universais e constituicionais como o da igualdade e o da proporcionalidade. É de assinalar, no entanto que 5 a 6 juízes do TC não fazem essa leitura – dependendo dos artigos em causa – e que por isso cai por terra o discurso de que “era óbvio que era inconstitucional”. A leitura que se faz dos ditos princípios é necessariamente subjectiva e muitas vezaes circunstancial. As consequências orçamentais práticas são o encontrar de novas medidas – e em boa hora o governo desta vez exclui novas subidas de impostos – que substituam a poupança intencionada no Orçamento de Estado. Fundamentalmente foram as medidas anunciadas no início deste mês passada pelo primeiro-ministro que até são

‘Passados 37 anos desta Constituição, ela cumpre com muita dificuldade um propósito fundamental que é o de enquadrar a acção do governo de modo a promover a defesa dos cidadãos face aos poderes do estado. Defendo um regime que limite a acção e o poder do estado frente às liberdades dos indivíduos.’ Que consequências práticas temes possam vir a resultar das recentes decisões do Tribunal Constitucional a respeito do Orçamento de Estado? Acho dramático, ainda que compreenda no nosso enquadramento constitucional, que qualquer política de corte na


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Orçamento de Estado? Acho dramático, ainda que compreenda no nosso enquadramento constitucional, que qualquer política de corte na despesa seja inconstitucional. Ainda para mais invocando princípios universais e constituicionais como o da igualdade e o da proporcionalidade. É de assinalar, no entanto que 5 a 6 juízes do TC não fazem essa leitura – dependendo dos artigos em causa – e que por isso cai por terra o discurso de que “era óbvio que era inconstitucional”. A leitura que se faz dos ditos princípios é necessariamente subjectiva e muitas vezaes circunstancial. As consequências orçamentais práticas são o encontrar de novas medidas – e em boa hora o governo desta vez exclui novas subidas de impostos – que substituam a poupança intencionada no Orçamento de Estado. Fundamentalmente foram as medidas anunciadas no início deste mês passada pelo primeiro-ministro que até são

pança intencionada no Orçamento de Estado. Fundamentalmente foram as medidas anunciadas no início deste mês passada pelo primeiro-ministro que até são globalmente bem-vindas e pecam por tardias. Ainda a esse propósito, defendeste recentemente que o melhor a fazer à actual Constituição seria porventura revogá-la e “escrever uma nova”. Onde é que te parece que a actual constituição falha de forma mais grave, e porque é que este texto já não serve o país? É evidente que passados 37 anos de regime desta Constituição, ela cumpre com muita dificuldade um propósito fundamental que é o de enquadrar a acção do governo de modo a promover a defesa dos cidadãos face aos poderes do estado. É sabido e digo-o sem medo – ainda que encontrando muitas vezes uma ignorante incompreensão dos princípios de

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cidadãos face aos poderes do estado. É sabido e digo-o sem medo – ainda que encontrando muitas vezes uma ignorante incompreensão dos princípios de liberdade que subjazem a este pensamento – que defendo um regime que limite a acção e o poder do estado frente às liberdades dos cidadãos e dos indivíduos. E olhando para três bancarrotas públicas, pagas com as poupanças ou o trabalho dos contribuintes (os “impostados”, como alguém escreveu), é evidente que temos de pôr um travão aos ciclos socialistas da insustentabilidade das contas públicas. Ao mesmo tempo, quem hoje nasça já tem a seu cargo uma dívida de mais de 18000€ de dívida pública. Há algo de profundamente injusto nisto com uma solidariedade intergeracional de sentido único e há uma imoralidade subjacente no sistema que o permite. 'No taxation without representation' é um lema fundamental do estado de direito


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geracional de sentido único e há uma imoralidade subjacente no sistema que o permite. 'No taxation without representation' é um lema fundamental do estado de direito que não vale para os futuros contribuintes. Assim não vejo outra solução que não seja introduzir garantias de defesa dos mais fracos e dos sem voz – que são as crianças e os que ainda não nasceram – nomeada e principalmente na limitação dos endividamentos públicos. Não há nada pior para um regime que ver uma geração a apontar à anterior o dedo e a viver um conflito geracional. Aconteceu nos anos 60, na sequência da segunda guerra mundial, na Alemanha e na França onde levou ao terrorismo armado de extrema-esquerda e ao Maio de 68, respectivamente. Portugal não precisa nem deve procurar um conflito geracional, mas devemos reconhecer que para o evitar devemos (a nossa geração) tudo fazer para entregar aos nossos

Portugal não precisa nem deve procurar um conflito geracional, mas devemos reconhecer que para o evitar devemos (a nossa geração) tudo fazer para entregar aos nossos filhos um país mais solidário. As gerações mais novas parecem ser as mais prejudicadas pelas decisões que nos conduziram à infeliz situação actual, ao mesmo tempo que foram os que menos contribuiram para ela. Como fazer- lhes justiça e salvaguardar o seu futuro? É muito importante, do meu ponto de vista, perceber que o sucessivo acumular de dívida levaria sempre a uma situação de dificuldade como a que hoje vivemos. E que no momento em que rebentasse – que é relativamente imprevisível, diferente de país para país, ainda que se acelerem mutuamente os efeitos num espaço de moeda único – seriam sempre os mais novos e os mais velhos (que mais dificuldade têm em entrar no mercado de

acelerem mutuamente os efeitos num espaço de moeda único – seriam sempre os mais novos e os mais velhos (que mais dificuldade têm em entrar no mercado de trabalho) os mais prejudicados. No caso dos jovens é particularmente injusto porque não tiveram voz nas decisões políticas que aqui levaram. Mas é nisto que dão políticas quando se acredita que “no longo prazo estamos todos mortos”. Por isso volto a repetir: porque são os jovens de hoje que sentem na pele e de forma particular as consequências do descalabro das políticas de mais de 30 anos de desgoverno são também os jovens que têm de dar um sinal de que não querem que isso se repita com os seus filhos. Com a experiência que tens enquanto deputado da Juventude Popular e seu ex-Presidente, que análise fazes da participação dos jovens na política? O que esperar do futuro? Os jovens têm por vezes o “vício” de


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Popular e seu ex-Presidente, que análise fazes da participação dos jovens na política? O que esperar do futuro? Os jovens têm por vezes o “vício” de politicamente intervirem de forma fechada em temas “de juventude”, o que eu acho um erro. Acho que é importante intervirem de forma transversal, transmitindo a sua visão (igual ou diferente, mas sempre própria) sobre o que está na agenda. Isso obriga, ao nível das organizações políticas de juventude, à constituição de equipas multifacetadas o que na JP sempre se fez com bastante sucesso – hoje vejo muitas pessoas das equipas do João Almeida e do Pedro Moutinho a intervirem politica ou empresarialmente duma forma directa nas áreas que acompanhavam na direcção nacional da JP. O que vejo hoje directamente na JP é uma grande importância na formação e na produção de documentos de imensa qualidade sobre o pensamento político e os temas mais quentes. Acho que isso indica um futuro muito saudável, se esses documentos chegarem aos militantes e forem debatidos internamente. Ainda este ano, o país será chamado a um novo acto eleitoral: as eleições autárquicas. Parece-te que a reforma administrativa levada a cabo era fundamental e foi bem feita? Qual a tua opinião sobre a questão da limitação de mandatos autárquicos, que muita polémica tem causado? Sou contra a limitação de mandatos – acho que os eleitores não precisam duma tutela sobre em quem votar. Se havia vontade de combater a corrupção, era mais útil criar meios e legislação que ajudasse ao seu combate “no acto”. Quanto à reforma, poderia ter ido

quem votar. Se havia vontade de combater a corrupção, era mais útil criar meios e legislação que ajudasse ao seu combate “no acto”. Quanto à reforma, poderia ter ido mais longe com, por exemplo., um debate sobre as competências e atribuições das freguesias em meio urbano (que hoje em dia e não obstante alguns grandes autarcas pouco fazem). A fusão de municípios que muitas vezes é chamada a este debate poderia ter existido nalguns sítios (nas áreas metropolitanas de Porto e Lisboa, p.ex.) mas trariam provavelmente a necessidade de criar algum tipo de outra estrutura intermédia.

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Que mensagens deixas aos nossos leitores, em especial os militantes da Juventude Popular? Digo que, apesar de ser a altura mais difícil do país desde o 25 de Abril, sermos chamados a governar é um desafio que temos de enfrentar com grande responsabilidade e resiliência. E que no entanto saibamos sempre questionar e avaliar com espírito crítico. A JP deve servir para juntar todos os que dizem não aos socialismos em Portugal e criticar, nesse espírito, os socialismos também no governo e assumir-se como a grande força juvenil de direita em Portugal. 

O que vejo hoje na JP é uma grande importância na formação e na produção de documentos de imensa qualidade sobre o pensamento político e os temas mais quentes. Acho que isso indica um futuro muito saudável, se esses documentos chegarem aos militantes e forem debatidos internamente.

Que mensagens deixas aos nossos leitores, em especial os militantes da Juventude Popular? Digo que, apesar de ser a altura mais difícil do país desde o 25 de Abril, sermos chamados a governar é um desafio que temos de enfrentar com grande responsabilidade e resiliência. E que no entanto saibamos sempre questionar e avaliar com espírito crítico. A JP deve servir para juntar todos os que dizem não aos socialismos em Portugal e criticar, nesse espírito, os socialismos também no governo e assumir-se como a grande força juvenil de direita em Portugal.



A VIDA E a OBRA da

Margaret thatcher D

urante os seus mandatos, Thatcher reformulou quase todos os aspectos da política britânica, reavivando a economia, reformando as instituições ultrapassadas e revigorando a política externa do país. Desafiou e contribuiu decisivamente para derrubar a mentalidade de declínio que se enraizara no país desde a Segunda Guerra Mundial, procurando a recuperação nacional com uma energia e uma determinação impressionantes. Nesse processo, Margaret Thatcher tornou-se, juntamente com Ronald Reagan, um dos fundadores de uma escola de políticos de convicções conservadoras, o que teve um impacto poderoso e duradouro

mente com Ronald Reagan, um dos fundadores de uma escola de fundadores de uma escola de políticos de convicções conservadoras, o que teve um impacto poderoso e duradouro sobre a política na Grã-Bretanha (bem como nos Estados Unidos) e lhe rendeu uma maior visibilidade internacional do que qualquer político britânico tivera desde Winston Churchill. Com a progressiva – e bem sucedida – mudança da política britânica em termos económicos e de política externa para a direita, os seus governos ajudaram a incentivar outas tendências internacionais que alargaram e aprofundaram, durante os anos 1980 e 1990, como o fim da Guerra Fria, a

seus governos ajudaram a incentivar outas tendências internacionais que alargaram e aprofundaram, durante os anos 1980 e 1990, como o fim da Guerra Fria, a propagação da democracia e do crescimento de mercados livres e o reforço da liberdade política e económica em todos os continentes. Margaret Thatcher tornou-se um dos líderes políticos mais influentes e respeitados em todo o mundo, bem como um dos mais controversos. Um ponto de referência para os amigos e os inimigos.


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1925-1947 GRANTHAM E OXFORD O início da vida de Margaret Thatcher em Grantham desempenhou um grande papel na formação das suas convicções políticas. Os seus pais, Alfred e Beatrice Roberts, eram metodistas. A vida social da família foi vivida, em grande parte, dentro da comunidade perto da congregação local, definida por fortes tradições de auto-ajuda, o trabalho de caridade e a honestidade pessoal. A família Roberts geria uma loja e criava as suas duas filhas num apartamento por cima da loja. Margaret Roberts frequentou uma escola pública local e, posteriormente, conseguiu um lugar na Universidade de Oxford, onde estudou química na Somerville College (1943-1947). O seu tutor foi Dorothy Hodgkin, um pioneiro da cristalografia de raios X, que ganhou o Prémio Nobel em 1964. A sua visão foi profundamente influ-enciada pela sua formação científica. Mas a química ficou em segundo plano, perdendo o primeiro para a política nos planos de Margaret Thatcher para o futuro. Política conservadora sempre foi uma característica da sua vida: o seu pai desempenhara funções políticas em Grantham e partilhava com ela as questões do dia-a-dia. Margaret foi eleita presidente da Associação de Estudantes Conservadores em Oxford e conheceu muitos políticos proeminentes, tornando-se conhecida para as figuras mais relevantes do seu partido no momento da derrota devastadora frente ao Partido Trabalhista nas eleições gerais de 1945.

1950-1951: DARTFORD

CANDIDATA

POR

Margaret Thatcher nasceu no seio de uma família de comerciantes, na pequena localidade de Grantham. A educação e a vivência da infância haveriam de marcar decisivamente o seu futuro político.

1950-1951 CANDIDATA POR DARTFORD Com vinte e poucos anos, Margaret concorreu como candidata conservadora par o lugar de Dartford, um bastião trabalhaista, nas Eleições Gerais de 1950 e 1951, ganhando notoriedade nacional como a mulher candidata mais jovem do país. Perdeu as duas vezes, mas contribuiu para reduzir a maioria do Partido Trabalhista de forma acentuada e gostou extremamente da experiência de campanha. Alguns aspectos do seu estilo político foram forjados em Dartford, perante um eleitorado em grande parte constituído por operários, que sofreram com os traumas do pós-guerra, bem como com o aumento do nível de tributação e regulação estatal. Ao contrário de muitos conservadores na época, tinha facilidade em

com os traumas do pós-guerra, bem como com o aumento do nível de tributação e regulação estatal. Ao contrário de muitos conservadores na época, tinha facilidade em conseguir a atenção de qualquer audiência e falando de forma simples e directa, com força e confiança, em questões que eram importantes para os eleitores. 1951-1970 FAMÍLIA E CARREIRA Foi também em Dartford que Margaret conheceu o seu marido, Denis Thatcher, um empresário local, que geriu a empresa da sua família antes de se tornar um executivo da indústria do petróleo. Casaram em 1951. Em 1953 foram pais pela primeira vez, dos gémeos Mark e Carol. Na década de 1950, Margaret


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indústria do petróleo. Casaram em 1951. Em 1953 foram pais pela primeira vez, dos gémeos Mark e Carol. Na década de 1950, Margaret Thatcher estagiou como advogada, particularmente em matéria relacionadas com fiscalidade. Foi eleita para o Parlamento em 1959 por Finchley, um circunscrição no norte de Londres que continuou a representar até ser eleita membro da Câmara dos Lordes (como Baronesa Thatcher) em 1992. Em de dois anos, foi-lhe dado um pequeno cargo no governo de Harold Macmillan e entre 1964-1970 (quando os conservadores estavam novamente em oposição), estabeleceu o seu lugar entre as figuras séniores do partido, servindo continuamente como um dos ministros sombra. Quando os conservadores voltaram ao poder, em 1970, sob a liderança de Edward Heath, Thatcher manteve a sua temdência ascendente e chegou a ministra da Educação.

1970-1974 MINISTRA DA EDUCAÇÃO Margaret Thatcher passou um mau bocado como ministra da Educação. No início dos anos 1970 viveu o pico do radicalismo estudantil, bem como enormes tumultos em termos sociais. Manifestantes interrompiam os seus discursos, a imprensa ligada à oposição difamava-a, e a política de educação em si parecia caminha inexoravelmente para a esquerda sem que ela o conseguisse travar, o que a deixou muito desconfortável. O próprio governo de Heath teve vida difícil durante o seu mandato (19701974) e decepcionou muita gente. Eleito com promessas de recuperação económica através do controlo dos sindicatos e da introdução de políticas de mercado livre, executou uma série de políticas

Eleito com promessas de recuperação económica através do controlo dos sindicatos e da introdução de políticas de mercado livre, executou uma série de políticas contrárias - apelidadas de 'U-Turns' para se tornar um dos governos mais intervencionistas da história britânica. A negociação com os sindicatos para introduzir um controlo detalhado dos salários, preços e dividendos, foi disso exemplo. Derrotado nas eleições gerais em Fevereiro de 1974, o governo Heath deixou um legado de inflação e conflito industrial.

1975: LÍDER CONSERVADOR

DO

PARTIDO

Muitos conservadores estavam prontos para uma nova abordagem depois do governo de Heath e quando o partido perdeu uma segunda eleição geral em Outubro de 1974, Margaret Thatcher concorreu contra Heath para a liderança. Para surpresa geral (ela próprio incluída), em Fevereiro de 1975, Thatcher derrotou Heath, embora contestada por meia dúzia de colegas mais velhos. Ela tornou-se, assim, a primeira mulher a liderar um partido político ocidental e a servir como líder da oposição na Câmara dos Comuns.

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1975 LÍDER DO PARTIDO CONSERVADOR Muitos conservadores estavam prontos para uma nova abordagem depois do governo de Heath e quando o partido perdeu uma segunda eleição geral em Outubro de 1974, Margaret Thatcher concorreu contra Heath para a liderança. Para surpresa geral (ela próprio incluída), em Fevereiro de 1975, Thatcher derrotou Heath, embora contestada por meia dúzia de colegas mais velhos. Ela tornou-se, assim, a primeira mulher a liderar um partido político ocidental e a servir como líder da oposição na Câmara dos Comuns.

1975-1979: LÍDER DA OPOSIÇÃO

O Governo trabalhista de 1974-1979 foi um dos mais profícuos em crises na história britânica, levando o país a um estado de falência técnica em 1976, quando um colapso no valor da moeda nas bolsas estrangeiras forçou o governo a negociar crédito do Fundo Monetário Internacional (FMI). O FMI impôs controlos rigoroso da despesa do Estado como condição para o empréstimo, que, ironicamente, melhorou a opinião pública sobre o Partido Trabalhista. No verão de 1978, ainda parecia a reeleição ainda parecia possível. Mas durante o inverno de 1978/79, a 1975-1979: LÍDER DA OPOSIÇÃO sorte do governo esgotou-se. As reivindicações sindicais conduziram O Governo trabalhista de 1974-1979 Após uma experiência no governo como Ministra da a uma epidemia de greves e mostrou foi um dos mais profícuos em crises Educação, Tatcher concorre àque liderança do Partido o governo pouca influência na história britânica, levando o país a Conservador em Fevereiro de 1975 derrota o adversário, conseguiu exercer sobre os seus um estado de falência técnica em aliados no movimento sindical. A Edward Heath. 1976, quando um colapso no valor opinião pública virou-se contra o da moeda nas bolsas estrangeiras Partido Trabalhista e os forçou o governo a negociar crédito Conservadores conquistaram a do Fundo Monetário Internacional maioria parlamentar na eleição geral (FMI). O FMI impôs controlos de Maio de 1979. No dia seguinte, rigoroso da despesa do Estado como


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primeira mulher a liderar um partido político ocidental e a servir como líder da oposição na Câmara dos Comuns.

1975-1979 LÍDER DA OPOSIÇÃO O Governo trabalhista de 1974-1979 foi um dos mais profícuos em crises na história britânica, levando o país a um estado de falência técnica em 1976, quando um colapso no valor da moeda nas bolsas estrangeiras forçou o governo a negociar crédito do Fundo Monetário Internacional (FMI). O FMI impôs controlos rigoroso da despesa do Estado como condição para o empréstimo, que, ironicamente, melhorou a opinião pública sobre o Partido Trabalhista. No verão de 1978, ainda parecia a reeleição ainda parecia possível. Mas durante o inverno de 1978/79, a sorte do governo esgotou-se. As reivindicações sindicais conduziram a uma epidemia de greves e mostrou que o governo pouca influência conseguiu exercer sobre os seus aliados no movimento sindical. A opinião pública virou-se contra o Partido Trabalhista e os Conservadores conquistaram a maioria parlamentar na eleição geral de Maio de 1979. No dia seguinte, Margaret Thatcher tornou-se PrimeiraMinistra do Reino Unido. 1979-1990 OS ANOS EM DOWNING STREET 1º Mandato O novo governo liderado por Margaret Thatcher comprometeu-se a analisar e inverter o declínio económico do país. A curto prazo, medidas dolorosas foram necessárias. Embora os impostos directos tivessem sido cortados, para restaurar os incentivos, o orçamento

de que faria o que fosse necessário económico do país. A curto prazo, para mantê-la baixa. O orçamento da medidas dolorosas foram necesPrimavera de 1981, com um sárias. Embora os impostos directos aumento de impostos no ponto mais tivessem sido cortados, para baixo da recessão não pareceu o restaurar os incentivos, o orçamento mais convencional, mas permitiu um teve de ser equilibrado, e os corte nas taxas de juro e reiterou a impostos indiretos foram aumendeterminação férrea das convicções tados. A economia já estava a vias de do governo. A recuperação econóentrar numa recessão, mas a inflação mica iniciada no mesmo trimestre e subia e as taxas de juro tiveram que foi seguida de oito consecutivos anos ser aumentadas para a controlar. Até de crescimento. O apoio político o final do primeiro mandato de aumentou com as conquistas, mas a Margaret Thatcher, o desemprego no reeleição do governo só foi Reino Unido representava três determinada por um evento impremilhões de pessoas e começou a cair visível: a Guerra das Falkland. A somente em 1986. Uma grande parte invasão argentina das ilhas em Abril da ineficiente indústria britânica de 1982 encontrou uma Margaret estava a fechar. Ninguém previra a Thatcher firme e determinada na gravidade da crise. Mas ganhos de direcção certa. Embora tenha trabalongo prazo fundamentais foram lhado com os EUA na busca de uma conseguidos. A inflação foi controsolução diplomática, um contingente lada e o governo criou a expectativa militar britânico foi enviado para de que faria o que fosse necessário tomar as ilhas de volta. Quando a para mantê-la baixa. O orçamento da diplomacia falhou, a ação militar foi Primavera de 1981, com um rápida e bem sucedida e as Ilhas aumento de impostos no ponto mais Falkland estavam novamente sob baixo da recessão não pareceu o controlo britânico em Junho de 1982. mais convencional, mas permitiu um O eleitorado ficou impressionado. corte nas taxas de juro e reiterou a Poucos líderes britânicos ou determinação férrea das convicções europeua teriam lutado por ilhas tão do governo. A recuperação pequensa e distantes. Ao fazer isso, económica iniciada no mesmo Margaret Thatcher lançou as bases trimestre e foi seguida de oito para uma política externa muito mais consecutivos anos de crescimento. O vigorosa e independente durante o apoio político aumentou com as resto do 1980s. Nas eleições gerais conquistas, mas a reeleição do de Junho de 1983, Thatcher foi governo só foi determinada por um reeleita e a maioria parlamentar dos evento imprevisível: a Guerra das Conservadores mais do que triplicou Falkland. A invasão argentina das (144 lugares). ilhas em Abril de 1982 encontrou uma Margaret Thatcher firme e 2º MANDATO determinada na direcção certa. Em Maio de 1979, Margaret Thatcher e o Partido Embora tenha trabalhado com os Conservador obtém uma significativa vitórias O segundo mandatonadeEleição Thatcher EUA na busca de uma solução Geral. Thatcher sobe ao cargo de Primeira-MInnistra, começou com quase tantas diplomática, um contingente militar comodeo rastos. primeiro. O herdando um país economica socialmente britânico foi enviado para tomar as edificuldades governo viu-se desafiado pelo ilhas de volta. Quando a diplomacia sindicato dos mineiros, que pôs em falhou, a ação militar foi rápida e marcha uma greve de um ano de bem sucedida e as Ilhas Falkland duração em 1984-85. O movimento estavam novamente sob controlo sindical como um todo tentava britânico em Junho de 1982. O


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militar britânico foi enviado para tomar as ilhas de volta. Quando a diplomacia falhou, a ação militar foi rápida e bem sucedida e as Ilhas Falkland estavam novamente sob controlo britânico em Junho de 1982. O eleitorado ficou impressionado. Poucos líderes britânicos ou europeua teriam lutado por ilhas tão pequensa e distantes. Ao fazer isso, Margaret Thatcher lançou as bases para uma política externa muito mais vigorosa e independente durante o resto do 1980s. Nas eleições gerais de Junho de 1983, Thatcher foi reeleita e a maioria parlamentar dos Conservadores mais do que triplicou (144 lugares). 2º Mandato O segundo mandato de Thatcher começou com quase tantas dificuldades como o primeiro. O governo viu-se desafiado pelo sindicato dos mineiros, que pôs em marcha uma greve de um ano de duração em 1984-85. O movimento sindical como um todo tentava colocar uma dura resistência às reformas que o governo tentava introduzir no mundo sindical, que começaram com a legislação em 1980 e 1982 e continuou após a eleição geral. A greve dos mineiros foi uma das mais violentas e de longa duração na história britânica. O resultado era incerto, mas depois de muitas voltas, o sindicato foi derrotado. Este acontecimento veio a revelar-se um desenvolvimento crucial, pois assegurou que as reformas de Thatcher teriam viabilidade. Nos anos que se seguiram, a oposição trabalhista tranquilamente aceitou a popularidade e o sucesso da legislação sindical e comprometeram-se a não reverter as suas principais características. Em outubro de 1984, quando a greve ainda estava em andamento, o Exército Republicano Irlandês (IRA) tentou assassinar

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Um dos acontecimentos mais marcantes do seu primeiro mandato em Downing Street foi a Guerra das Falkland. A invasão argentina das ilhas em Abril de 1982 encontrou uma Margaret Thatcher firme e determinada. reverter as suas principais características. Em outubro de 1984, quando a greve ainda estava em andamento, o Exército Republicano Irlandês (IRA) tentou assassinar Margaret Thatcher e muitos elementos do seu gabinete, bombardeando um hotel em Brighton durante a conferência anual do Partido Conservador. Embora ela tenha saído ilesa, alguns de seus colegas mais próximos estavam entre os feridos e mortos e o quarto ao lado do dela foi severamente danificado. No século XX, nenhum outro primeiro-ministro britânico chegou perto de ser assassinado. A política britânica na Irlanda do Norte tinha sido uma fonte permanente de conflitos para cada primeiro-ministro desde 1969, mas Margaret Thatcher despertou um ódio especial do IRA devido À sua recusa em atender as pretensões políticas da organização, nomeadamente durante as greves de fome nas prisões em 1980-1981. A sua política era implacavelmente hostil face ao terrorismo, o que não a impediu de negociar o Acordo Anglo-Irlandês de

as greves de fome nas prisões em 1980-1981. A sua política era implacavelmente hostil face ao terrorismo, o que não a impediu de negociar o Acordo Anglo-Irlandês de 1985, com a República da Irlanda. O acordo foi uma tentativa de melhorar a cooperação de segurança entre o Reino Unido e a Irlanda e de dar algum reconhecimento para a visão política dos católicos na Irlanda do Norte, uma iniciativa que ganhou o apoio da Administração Reagan e do Congresso dos EUA. A economia continuou a melhorar durante 198387 com as políticas de liberalização económica que até foram prorrogadas. O governo começou a adoptar uma política de venda de activos estatais, que haviam totalizado mais de 20 por cento da economia quando os conservadores chegaram ao poder em 1979. As privatizações britânicas dos anos 1980 foram o primeiro do seu género e veio a ter grande influência em todo o mundo. A ala esquerda do Partido Conservador sempre se mostrara desconfortável com esta líder. Em Janeiro de 1986, as divisões duradoura entre


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influência em todo o mundo. A ala esquerda do Partido Conservador sempre se mostrara desconfortável com esta líder. Em Janeiro de 1986, as divisões duradoura entre esquerda e direita no gabinete de Thatcher foram expostos publicamente pela renúncia súbita do ministro da Defesa, Michael Heseltine, devido a uma disputa sobre os problemas de negócios da fabricante de helicópteros britânicos, Westland. A precipitação do "Caso Westland 'desafiou a liderança de Margaret Thatcher como nunca. Ela sobreviveu à crise, mas seus efeitos foram significativos. Thatcher foi submetida a fortes críticas dentro do próprio partido devido à decisão de permitir que aviões dos EUA voassem a partir de bases britânicas para atacar alvos na Líbia (Abril de 1986). Houve rumores de que o governo e a sua líder estariam 'cansados' depois de tanto tempo no poder. A sua resposta foi característica: na conferência anual do Partido Conservador, em Outubro de 1986, o seu discurso prenunciou uma massa de reformas para um terceiro governo Thatcher. Com a economia tão forte, as perspectivas eram boas para uma eleição e o governo foi reconduzido com uma nova maioria parlamentar em Junho de 1987. 3º Mandato A plataforma legislativa do terceiro mandato de Thatcher esteve entre os mais ambiciosos alguma vez apresentados por uma administração britânica. Houve medidas para reformar o sistema de ensino (1988), a introdução de um programa nacional para a primeira vez. Implementou-se um novo sistema fiscal para o governo local (1989), a Comissão de Comunidade, ou "imposto de votação", como foi apelidado pelos adversários. E não

Implementou-se um novo sistema fiscal para o governo local (1989), a Comissão de Comunidade, ou "imposto de votação", como foi apelidado pelos adversários. E não havia legislação para compradores e fornecedores distintos dentro do Serviço Nacional de Saúde (1990), abrindo o serviço a uma medida de competição pela primeira vez, que aumentou as possibilidades de uma gestão eficaz. A maior parte das medidas foi profundamente controversa. A Comissão de Comunidade, em particular, tornou-se um sério problema político, com conselhos locais a aproveitarem a introdução de um novo sistema para aumentar os impostos, responsabilizando por esse aumento o governo Thatcher (o sistema foi abandonado pelo sucessor de Margaret Thatcher, John

Major, em 1991). Por outro lado, as reformas na educação e na saúde mostraram-se duradouras. Dentro

Major, em 1991). Por outro lado, as reformas na educação e na saúde mostraram-se duradouras. Dentro do Partido Conservador e do próprio governo havia uma discordância profunda sobre a política europeia. Thatcher encontrava-se cada vez mais em desacordo com seu ministro das Relações Exteriores, Sir Geoffrey Howe, sobre todas as questões que diziam respeito à integração europeia. O seu discurso em Bruges, em Setembro de 1988, começou o processo pelo qual o Partido Conservador - ao mesmo tempo em grande parte "pró-europeu" - se tornou predominantemente "eurocéptico". Paradoxalmente, tudo isso aconteceu em um cenário de eventos internacionais profundamente úteis à causa conservadora. Margaret Thatcher, desempenhou um papel importante na última parte na última fase da Guerra Fria, tanto no fortalecimento da aliança ocidental contra os soviéticos no início de 1980, como no sucesso da vitória


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Em 1990, Margaret Thatcher abandonou Downing Street, deixando o Reino Unido numa situação económicao e financeira melhor do que a tinha encontrado. Foi uma grande estadista, responsável pela recuperação do respeito internacional pelo Reino Unido e pela queda do comunismo. A 'Dama de Ferro' deixou uma marca inigualável na política do século XX.

importante na última parte na última fase da Guerra Fria, tanto no fortalecimento da aliança ocidental contra os soviéticos no início de 1980, como no sucesso da vitória nesse conflito. Os soviéticos haviam apelidado Thatcher de "Dama de Ferro" – algo que ela adorou – inspirados pela dureza dos discursos que proferira contra eles pouco depois de se tornar líder do Partido Conservador em 1975. Durante os anos 1980, Thatcher ofereceu um forte apoio às políticas da Administração Reagan. Mas quando Mikhail Gorbachev surgiu como um potencial líder da União Soviética, Thatcher convidou-o a ir ao Reino Unido em Dezembro de 1984 e anunciou que aquele seria um homem com o qual ela estaria disposta a negociar. Por isso, Thatcher desempenhou um papel construtivo na diplomacia que tornou mais suave o desmembramento da União Soviética. No final de 1990, a Guerra Fria acabou e capitalismo venceu. Mas

nhou um papel construtivo na diplomacia que tornou mais suave o desmembramento da União Soviética. No final de 1990, a Guerra Fria acabou e capitalismo venceu. Mas esse evento desencadeou a fase seguinte da integração europeia, uma vez que a França retomou o projecto de uma moeda única europeia, com a esperança de controlar o poder de uma Alemanha reunificada. Como resultado, as divisões sobre política europeia no seio do governo britânico que foram aprofundadas até o final da Guerra Fria, agora tornar-se-iam prozfundamente agudas. No dia 1 de Novembro de 1990, Sir Geoffrey Howe fez um discurso de renúncia amargo e precipitou um desafio à liderança de Margaret Thatcher do seu partido por Michael Heseltine. Na votação que se seguiu, Thatcher conquistou a maioria dos votos. No entanto, sob as regras do partido a margem era insuficiente, e um segundo escrutínio foi exigido. Tendo recebido a notícia numa conferência

conquistou a maioria dos votos. No entanto, sob as regras do partido a margem era insuficiente, e um segundo escrutínio foi exigido. Tendo recebido a notícia numa conferência em Paris, ela imediatamente anunciou a sua intenção de lutar pela vitória. Mas um terremoto político aproximava-se . Após o seu regresso a Londres, quando muitos colegas do seu gabinete - insensíveis sobre a sua posição sobre a Europa e duvidando que ela poderia ganhar uma quarta eleição geral – abandonaram abruptamente Thatcher deixando-a sem apoio e sem outra escolha que não a retirada. Thatcher renunciou ao cargo de Primeiro-Ministro em 28 de novembro de 1990. John Major sucedeu-lhe, tendo ficado no cargo até a eleição esmagadora do governo trabalhista de Tony Blair em Maio de 1997. 


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especial

Sustentabilidade do Estado Social: que caminho? Lúcia Santos

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mbora imperfeito e com inúmeras contradições, o Estado Social é uma conquista civilizacional que tem contribuído para a coesão social e a correcção de desequilíbrios, assentando na ideia de uma forma organizativa de sociedade que dá uma resposta colectiva às necessidades de cada uma das pessoas. Mas sem colocar em causa nenhum destes pressupostos, nem a sua importância, a verdade é que estamos perante um cenário crítico, no qual as economias europeias e, em especial, a portuguesa, não se desenvolvem a um ritmo suficiente para assegurar a sustentabilidade financeira deste modelo, ao mesmo tempo que os gastos com os sistemas sociais e de saúde aumentam para níveis dificilmente suportáveis. Apesar da criação do Ministério do Trabalho e Previdência Social em 1916, extinto nove anos depois após várias alterações orgânicas, foi durante o período do Estado Novo, com a criação do modelo da Previdência Social, que se formaram as bases institucionais em que assenta o actual Estado Social em Portugal. As decisões políticas sobre a previdência tomadas no período entre 1933 e 1973, em particular a Reforma da Previdência de 1962, constituíram marcos significativos na história desta construção. As etapas ultrapassadas durante este período foram muito relevantes, mas a grande transformação na Previdência Social ocorreu na década de 70, com a criação das bases para a concretização de um verdadeiro sistema de Segurança Social, o qual apenas foi concluído na década seguinte. Ao longo de todos estes anos, e segundo as políticas definidas por cada Governo, o sector governamental das vulgarmente chamadas “áreas sociais” tem vindo a sofrer sucessivas alterações a nível da designação e da respectiva orgânica. Actualmente, com a entrada em funções do XIX Governo Constitucional, foi extinto o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e criado o Ministério da Solidariedade e da Segurança

sofrer sucessivas alterações a nível da designação e da respectiva orgânica. Actualmente, com a entrada em funções do XIX Governo Constitucional, foi extinto o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e criado o Ministério da Solidariedade e da Segurança Social, transitando as áreas do trabalho, emprego e formação profissional para o Ministério da Economia e do Emprego. Mas as transformações que foram ocorrendo não foram apenas no nome e na estrutura, que não representam mais do que a simples adaptação ao evoluir dos tempos e das necessidades, as verdadeiras modificações aconteceram ao nível das condições sobre as quais assentou a construção do Estado Social como hoje o conhecemos, que se alteraram por completo, tornando a discussão do seu modelo de financiamento um tema actual e urgente. A composição etária da população portuguesa entre 1970 e 2011 mudou radicalmente. Em 1970 a população portuguesa tinha mais jovens (28,47%) do que idosos (9,67%), sendo os adultos o grupo predominante (61,86%). Duas décadas passadas, no ano de 1991, o povo português continua a registar mais jovens (19,99%) do que idosos (13,61%), embora já seja evidente o decréscimo da população entre os 0 e os 14 anos, e os adultos permanecem como grupo predominante (66,40%). Mais vinte anos depois esta realidade assume contornos dramáticos. No final da primeira década do século XXI o grupo maioritário continua a ser o dos adultos (66,08%), mas os idosos cresceram de forma preocupante (19,03%), o que seria apenas um sinal positivo resultante do aumento da esperança média de vida, reflexo da grande evolução ao nível das condições de vida, se este não fosse acompanhado por uma igualmente forte redução do número de jovens (14,89%), fruto da diminuição do número de nascimentos. Em cerca de 40 anos, o país e o seu território mudaram profundamente. A população activa manteve-se o grupo maioritário, verificando um acréscimo de 31,04%, passando de 5 326 435 a 6 979 785 habitantes. Por sua vez, a população jovem registou um decréscimo de -35,87%, passando de 2 451 850 a 1 572 329 habitantes, enquanto a população idosa observou um aumento de 141,35%, passando de 832 840 a 2 010 064 habitantes.




opinião

população jovem registou um decréscimo de -35,87%, passando de 2 451 850 a 1 572 329 habitantes, enquanto a população idosa observou um aumento de 141,35%, passando de 832 840 a 2 010 064 habitantes. A realidade é que, numa Europa em contínuo e crescente declínio demográfico, Portugal sobressai pela velocidade a que este envelhecimento populacional acontece. Em 2012 nasceram 90 026 bebés e morreram 107 287 pessoas, valores que se traduzem em mais 17 261 funerais do que partos. Esta situação ganha outra dimensão quando se verifica que em 2008 o saldo era positivo em 314 indivíduos. Foram necessários apenas quatro anos para que estes valores atingissem uma discrepância com esta ordem de grandeza. Quando se analisa a evolução do número de beneficiários de pensões, principal prestação social, facilmente se percebe o custo social deste envelhecimento demográfico. Em apenas uma década (2001-2011) o número de pensionistas sofreu um acréscimo de 18,55%, passando de 2 074 443 a 2 459 338 beneficiários. O mesmo tem vindo a acontecer com a saúde, embora em menor escala. Este cenário torna-se ainda mais dramático quando considerados os valores das projeções demográficas para o ano de 2050, que tornam possível constatar que o envelhecimento populacional se vai manter e agravar, prevendo-se atingir um total de 243 idosos para cada 100 jovens em 40 anos. Considerando que o Estado Social tem como um dos seus pilares de sustentação a população activa suportar a dependente, facilmente se percebe que, com uma demografia que desequilibra as transferências intergeracionais e aumenta a despesa com a protecção social e a saúde, estamos perante uma equação de difícil resolução. Mas este não é o único problema que assombra o Estado Social. A verdade é que outros factores há que tornam o sistema actual ainda mais desequilibrado. A actual conjuntura socio-económica tem favorecido o crescimento gravoso do desemprego e a consequente degradação do poder económico da população. Este acréscimo da população em situação de grave carência económica e em risco de exclusão social, que se traduz num aumento do recurso a subsídios de desemprego e a outras medidas de protecção social, como o rendimento social de inserção, é um contributo desestabilizador decisivo em todo este processo. Analisando novamente apenas a evolução na primeira década do século XXI é possível constatar que o número de beneficiários do subsídio de desemprego cresceu 57,06% em

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inserção, é um contributo desestabilizador decisivo em todo este processo. Analisando novamente apenas a evolução na primeira década do século XXI é possível constatar que o número de beneficiários do subsídio de desemprego cresceu 57,06% em apenas 10 anos, passando de 190 463 a 299 147 beneficiários. Por sua vez, o número de beneficiários do rendimento social de inserção verificou um acréscimo de 128,47%, passando de 46 357 a 105 911 habitantes. De facto, a seguir ao aumento dos gastos do Estado com as pensões, a subida da despesa com o subsídio de desemprego, segunda mais importante prestação social, provocou um impacto social profundamente negativo, pelo custo adicional que introduziu na equação. Perante este cenário a questão que se impõe é como poderemos nós assegurar a manutenção do Estado Social em Portugal. Em qualquer situação que se possa colocar, a distribuição depende sempre da criação de riqueza, pelo que a sua garantia tem obrigatoriamente de significar, sempre e em primeiro lugar, gerar os recursos necessários para a sua preservação. Mas a verdade é que o modelo está assente num pressuposto que já não se observa. A deterioração do ratio de dependência entre os que pagam e os que recebem é uma realidade e perante esta restam apenas duas opções: ou temos a coragem de desenhar um novo sistema adequado à nossa estrutura social ou deixamos que a demagogia leve a melhor e por um simples populismo eleitoral nada fazemos. Esta segunda opção apenas tem um desfecho possível, o colapso do Estado Social. Nós, enquanto jovens, temos a obrigação de exigir a coragem necessária para a mudança. Que a esquerda radical não assuma este problema em nada surpreende. A novidade é ver o Partido Socialista (PS) recusar participar neste debate, mas o momento em que os socialistas olham para o lado procurando o eleitoralismo fácil está registado. Fica assim claro que, apesar da coragem demostrada pelo Governo em trazer esta discussão fundamental para a ordem do dia, a esquerda se demitiu da sua obrigação de encarar estes factos e de apoiar na construção de um modelo adequado aos nossos dias. O PS arruinou o nosso presente e está com vontade de destruir o nosso futuro. Vamos deixar? 



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