CAMPUS ANO 40 - Edição 345

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Campus Jornal-laboratório da Universidade de Brasília v

Faculdade de Comunicação

ANO 40 - Edição 345

Brasília, de 4 a 17 de maio de 2010

v www.fac.unb.br

Thiago Borges

CALDAS NOVAS EM TOTAL APATIA

Moradores da cidade não reagem às constantes trocas de prefeito nos últimos quatro anos v páginas 4 e 5 Vivian Rodrigues

Paralisação pela URP altera calendário da UnB Quase dois meses de greve empurram o recesso para o mês de setembro página 3

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Catadores de Santa Maria alcançam a Europa v

Faltam vagas para crianças de baixa renda Das 30 regiões administrativas do DF, apenas 11 contam com creches gratuitas para atender a familias como a de Nilzete Pereira (foto) v

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Movimentos incentivam o voto adolescente v

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A segunda edição de 2010 do Campus foi pensada em meio ao contexto de crise do Distrito Federal. Falar sobre corrupção envolvendo personagens demasiadamente explorados pelos grandes jornais não constituiria uma apuração real nem traria nada de novo para o nosso público. Resolvemos, então, lançar nosso olhar sobre o DF e seu entorno para descobrir como anda a situação das pessoas, das famílias e dos jovens daqui.

Charge

Carta da editora

Chove lá fora e aqui...

Questão de opinião

Opinião

Liberdade de expressão pra quem?

Henrique Teles

Como resultado desse olhar, trazemos o esforço de jovens para estimular os adolescentes a participar da vida política da capital por meio do voto. Além disso, mostramos cidadãos de Caldas Novas que não acreditam mais no poder de transformação do voto na política da cidade. Como história de sucesso, temos uma associação de papeleiros de Santa Maria que conseguiu chegar ao mercado internacional com a produção de acessórios fabricados com câmaras de pneus. Para finalizar, uma matéria a respeito de Dona Diná, uma senhora que benze aqui em Brasília desde a fundação da cidade. Espero que todos aproveitem a leitura e sintamse à vontade para enviar críticas e sugestões para o nosso e-mail. Até a próxima!

Envie sua opinião para campus@unb.br

Campus 40 Anos

A

edição do Campus de junho de 1982 trazia em suas páginas uma matéria a respeito do voto de eleitores de outros estados. Agora , trazemos a matéria “Cadê o título?”, falando sobre o projeto Vote pra Mudar, que, além de estimular o voto adolescente, sugere que as pessoas mudem seus títulos de eleitor para o DF.

Juliana Cézar Nunes Controle social. Duas palavras que causam repulsa aos donos dos grandes veículos de mídia no Brasil. Por causa delas, boa parte das empresas privadas se negou a participar da 1ª Conferência Nacional de Comunicação, em dezembro de 2009. Temendo que qualquer mecanismo de controle social fosse implementado uma série de editoriais e matérias foram publicados classificando a terceira edição do Programa Nacional de Direitos Humanos como uma ameaça à liberdade de expressão. Os espaços de democracia participativa, como as conferências nacionais, têm sido ignorados por jornais, emissoras de TV e rádio que classificam essa forma de consulta popular como autoritária e restrita, apesar do seu caráter descentralizado e aberto a participação de toda a sociedade. Até mesmo o debate sobre temas nacionais e de interesse público, como ações afirmativas e cotas para estudantes negros/negras nas universidades, recebem a pecha de segregacionista e radical. Os fantasmas da ditadura e da censura são evocados como justificativa permanente para “ações preventivas” visando impedir que o controle social saia do âmbito das políticas públicas de saúde e educação para tratar de direitos como o direito humano à comunicação e à informação.

Erramos

Afinal, o que a mídia brasileira considera como liberdade de expressão? O direito unilateral de alguns setores da sociedade afirmarem o que pensam e como esperam que as leis sejam aplicadas? A prática da interatividade como restrita ao controle remoto, às

Expediente Editora-chefe: Raio Gomes Editores: Felipe Müller, Felipe Matheus Pineda, Gustavo Aguiar, Mai Dornelles, Mariane Rodrigues e Rodrigo Vasconcelos Repórteres: Cecília Garcia, Felipe Giacomelli, Flávio Botelho, Lílian Pessoa, Marcela Mattos, Naiara Lemos, Nayra Thyemi, Rudá Moreira,Thaís Regina, Thalita Carrico, Thiago Borges e Vivian Rodrigues Fotógrafos: Jeronimo Calorio, Juliana Figueiredo, Klaus Barbosa e Vinícius Pedreira Diagramadores: Jeronimo Calorio e Vinícius Pedreira Projeto gráfico: Gustavo Aguiar, Juliana Reis, Jeronimo Calorio, Mateus Rodrigues e Vinícius Pedreira Diretor de arte: Mateus Rodrigues Secretária de redação: Clara Araújo Ilustrações: Clara Araújo, Felipe Matheus Pineda, Lílian Pessoa e Henrique Teles Monitora: Juliana Reis Professores: Sérgio de Sá e Solano Nascimento Jornalista: José Luiz Silva Suporte técnico: Pedro França

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Ombudskvinna

Ao contrário do publicado na última edição (pág. 8), Elenita Rodrigues foi apenas professora substituta da UnB.

enquetes e aos comentários virtuais mediados? A revolta da sociedade com conteúdos racistas e homofóbicos destinada apenas às centrais de atendimento ao telespectador-consumidor? Ativistas, educadores, comunicadores e líderes comunitários mostram que desejam um novo patamar de relação com esse campo de direitos. Exigem do Estado, por exemplo, a garantia de concessões para rádios comunitárias, financiamento público para mídia jovem, negra e indígena, monitoramento e punição de programas que violentam o corpo de mulheres e crianças. Por meio do ciberativismo diário, jovens afirmam que seu espaço não é o noticiário policial, onde aparecem algemados ou dilacerados. Eles ocupam a rede mundial de computadores com sites, podcasts, fotos e vídeos que trazem um novo olhar sobre o país, as cidades, os bairros, as comunidades e, acima de tudo, sobre si. Longe das gráficas e do espectro eletromagnético, exercem o que há de mais genuíno e transformador: a liberdade de expressão. v

Juliana Nunes é jornalista. Trabalha na Radioagência Nacional (EBC). Faz parte da Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial (Cojira-SJPDF) e do Fórum de Mulheres Negras do DF. Graduada em Comunicação Social e especialista em Bioética pela Universidade de Brasília (UnB).

Para além dos trocadilhos Mel Bleil Gallo Parabéns à escolha dos temas – todos bem relevantes dentro e fora da universidade. Greve, aniversário de Brasília, Big Brother e problemas no sistema de saúde público... Só faltou a novidade. “O Campus não entra em greve – ele cobre a greve.” Mas o que ainda não foi dito sobre o tema? O enfoque de “O dilema dos novatos” é interessante. Traz uma preocupação legítima com explicações satisfatórias do ponto de vista legal. Já a matéria “Greve, a primeira a gente nunca esquece” – trocadilhos infames à parte – talvez não merecesse tanto espaço. Se esta é a primeira vez que todos os quatro campi estão em greve, é porque é a primeira greve após sua inauguração. Chamá-los de “Estreantes na paralisação” é complicado. Apesar de o título se referir aos novos cursos e professores, fica a sensação de que os grevistas são inexperientes – algo longe de ser verdade. A reportagem poderia ter dedicado mais atenção às reivindica-

ções para além da URP e à mobilização dos demais servidores da universidade – completamente esquecidos no texto. Já o espaço para jornalismo investigativo em “Abandonados” foi bem aproveitado. O tema não é novo – mas os dados são bons. Seria ainda melhor se os valores reais dos remédios em falta tivessem sido apresentados, para sentirmos seu peso em uma aposentadoria. Por fim, à importante reportagem “José, a festa não acabou”, apenas uma crítica. Movimentos culturais independentes valorizam a produção local e isso é “culpa” da crise política? Se era para ser uma ironia, não ficou clara o suficiente. v Mel Bleil Gallo é estudante do sétimo semestre de Jornalismo. Ombudskvinna é o feminino de Ombudsman e tem como função criticar e analisar o trabalho do Campus.


Política

FÉRIAS SÓ NA PRIMAVERA Plano da reitoria cancela disciplinas de verão, não prevê aulas em finais de semana e dias de jogo do Brasil e garante apenas recesso no Natal Nayra Thyemi Vivian Rodrigues Não são apenas os contracheques dos grevistas e os ânimos de professores, alunos e funcionários que sofrem alterações por conta da greve na Universidade de Brasília (UnB). Quando a paralisação acabar, o calendário acadêmico será modificado para compensar as aulas perdidas. O plano já traçado pela reitoria transfere as férias de julho para setembro e outubro e prevê que o segundo semestre se estenda até janeiro ou fevereiro do próximo ano, o que inviabiliza a oferta de disciplinas para os cursos de verão de 2011. Quando professores e servidores decidirem retornar ao trabalho, a Secretaria de Administração Acadêmica (SAA) vai elaborar uma proposta de calendário levando em conta todas as adaptações necessárias, incluindo-se aí os jogos da Copa do Mundo. Esta proposta será enviada para o Decanato de Ensino de Graduação (DEG) e, se aprovada, seguirá para a homologação do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe). Embora grevistas tenham aprovado em assembleia uma proposta de cancelamento do semestre, o diretor da SAA, Arnaldo Carlos Alves, descarta a possibilidade. “Nunca houve e não é a nossa tradição.”

Segundo ele, a intenção é que as aulas sejam retomadas e transcorram por 17 semanas sem interrupção ou aulas extras em finais de semana. Em seguida, haverá um intervalo de três a quatro semanas para descanso e realização de procedimentos acadêmicos. Logo terá início o segundo semestre, com paralisação prevista para o dia 18 de dezembro de 2010 e retomada no dia 10 de janeiro de 2011. “Haverá intervalo apenas para as festas de fim de ano”, afirma Paulo César Marques, assessor do reitor da UnB, José Geraldo de Sousa. Inevitavelmente, os reflexos da greve levarão muitos alunos a rever o futuro. É o caso do estudante do 9° semestre do curso de Engenharia Mecatrônica Ariel Caleb, 22, que previa se formar no final do ano. Caleb planejava concluir seu estágio curricular ainda em 2010 para, então, iniciar outras atividades. “Não poderei viajar ou ingressar em cursos de aperfeiçoamento profissional, como eu gostaria”, diz.

Formandos que foram aprovados em concursos públicos também podem ser prejudicados. “A gente acaba sonhando com uma coisa que não sabe se vai acontecer”, diz Vitor Hugo de Abreu, 23, estudante do 10° semestre de Engenharia Florestal. Aprovado nos concursos públicos da Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb-DF) e da Companhia Energética do Distrito Federal (CEBDF), ele aguarda sua convocação com preocupação. “Preciso de 28 créditos para me formar, e a greve pode atrapalhar minha nomeação”, teme. A estudante do 9° semestre de Geologia Karina Medeiros, 23, não pretende se abalar com os transtornos da greve. Ela foi aprovada no último concurso público do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), mas não teve sucesso ao pedir a abreviação da conclusão do curso junto ao Colegiado de Graduação. Ainda assim, vai lutar por sua vaga. “Vou acionar a Justiça e pedir uma liminar de prorrogação do prazo de posse dos cargos”, garante. v

Resoluções No dia 22 de abril a folha de pagamento da UnB foi homologada, garantindo aos professores a URP integral do mês. Foi definido que os funcionários técnico-administrativos admitidos após outubro de 2008 não receberão o valor, enquanto para o restante a quantia será reduzida. Com a decisão do Ministério do Planejamento, os funcionários interditaram o prédio da reitoria por dois dias. No dia 28, o Tribunal Regional Federal (TRF) decidiu que os 204 funcionários aposentados não têm direito à URP e devem devolver valores já recebidos. Os desembargadores não entraram em consenso se a devolução deve ser feita a partir dos ganhos de 2005, ou dos de 2008, ano da última reestruturação salarial da categoria. Os mais de 2 mil funcionários que trabalham na UnB não estavam incluídos nesse processo. Até o fechamento desta edição, a greve de professores e servidores continuava. (V.R.)

CADÊ O TÍTULO?

Vinícius Pedreira

Para renovar o cenário político do Distrito Federal, movimentos incentivam jovens a votar em 2010

Cecília Garcia Na 908 Sul, estudantes do Centro de Ensino Médio Elefante Branco (Cemeb) deixam suas atividades normais para peregrinar de sala em sala. À porta de cada turma e com a licença dos professores, explicam a importância do voto, ainda que facultativo, dos adolescentes com menos de 18 anos. Na 605 sul, alunos e ex-alunos da Universidade de Brasília (UnB) vão ao Colégio Dínatos/ COC em nome do movimento Vote pra Mudar. Munidos de panfletos feitos com metade de uma folha A4, distribuem informações sobre o que adolescentes de 16 e 17 anos devem fazer para tirar o título de eleitor. Às vésperas do final do prazo para alistamento nas eleições deste ano, a caça a novos eleitores está cada vez maior. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que no Distrito Federal vivem cerca de 85 mil jovens com 16 ou 17 anos. Números atualizados do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-DF) apontam que apenas 17,9 mil desses adolescentes possuem título de eleitor, o que equivale a 21% do total. Para Talitha Selvati,

integrante do Vote pra Mudar, apenas um voto não muda o cenário político, mas o esforço vale a pena. “Somados, eles fazem, sim, a diferença”, afirma. Não dispondo de recursos financeiros para produzir panfletos, o grêmio estudantil do Cemeb, além de ir de sala em sala, colocou no mural de avisos da escola a lista dos cartórios eleitorais em que os alunos podem tirar o título de eleitor. O estudante Scotty Kynbw faz parte do grêmio e conta que alguns colegas mostram interesse e o procuram. “São poucos, mas já é um começo”, comenta. “A primeira vez que votei me senti muito bem”, lembra o estudante. Ele incentiva os colegas a votar justamente por conta desta experiência, adquirida com a idade que preferiu não revelar. No entanto, não ficou satisfeito com o candidato que escolheu na primeira vez que votou. Já na segunda eleição de que participou, Kynbw não se arrependeu. “É importante fazer parte de uma eleição para desenvolver análise crítica, para se tornar um eleitor consciente”, explica. Sara Figueiredo, também estudante do Cemeb, tem 16 anos e foi convencida pelo grêmio a votar nas eleições deste ano. A aluna ressalta a importância que

Alunos do Elefante Branco se mobilizam

vê no voto: “Eu quero decidir quem vai estar no poder, e não que outros façam isso por mim”. Eleitores de outros estados também são alvo do movimento Vote pra Mudar. A preocupação é justificada. Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apontam que em 2006, quando houve eleições para presidente, governador, senador, deputado federal e distrital, 167,8 mil pessoas justificaram seus votos porque estavam em Brasília. Em 2008, quando ocorreram votações no restante do país para eleger prefeitos e vereadores, foram 125,4 mil justificativas. Para conseguir mais adeptos, os integrantes do Vote pra Mudar montam bancas de alistamento. Munidos de computadores portáteis e internet móvel, o grupo preenche o requerimento de transferência do título que está no site do TRE-DF.

Um dos alistados foi o estudante de Direito Marcel Fortes. O piauiense conta que se juntou ao Vote pra Mudar porque acredita que vai morar em Brasília durante muito tempo. Para ele, não vale a pena viajar somente para votar. “Até porque eu não acompanho mais o jogo político de lá”, explica. Além disso, não quer ter que justificar o voto toda vez que houver uma eleição. “Não acredito que o meu voto faça alguma diferença substancial, mas ainda assim me sinto no dever de votar”, afirma Fortes. Fábio de Sá e Silva, um dos fundadores do movimento, fazia parte das estatísticas de justificação de falta a eleições. Em Brasília desde 2003, o servidor público, que veio para fazer mestrado e trabalhar, sempre adiou a transferência do título. Mas nas eleições de 2010 seu domicílio eleitoral será o DF. “É onde eu moro, onde está toda minha vida, minha família, meus amigos”, afirma. “Sou cidadão daqui.” v

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A MALDIÇÃODE CALDAS NOVAS Thiago Borges Enviado especial

O chapéu. O sotaque. A simpatia. O carpinteiro Lourenço de Souza leva uma típica vida de morador do interior. Foi só surgir uma folga que ele levou alguns familiares para tirar fotos em frente à fonte de água de uma pracinha do centro da cidade, em um final de semana de abril. Quando o assunto é a instabilidade no governo municipal, ele e outros caldasnovenses mantêm a mesma passividade. “Eu não sou muito chegado em política. O que acontece a gente acaba sabendo, mas não gosto muito de mexer com isto de manifestar”, justifica o carpinteiro. Se a população não se manifesta, poderia então mudar o cenário político da região por meio do voto. Mas nem todos têm esse anseio. Breno Diniz trabalha em uma farmácia, tem 25 anos, ainda não tirou o titulo de eleitor e diz que irá votar “apenas em último caso”. A administração local não tem sido convencional. Só de prefeitos, a cidade teve sete trocas nos últimos quatro anos. Isso sem contar vices que também foram cassados. “É tanto nome que fica difícil até saber o que aconteceu e quem são alguns políticos”, revela a empresária Cirley Moreira. Acusada de compra de votos, a ex-prefeita Magda Moffato foi a primeira a ser cassada, em abril de 2006. Foi o primeiro de uma série de três escândalos políticos que iriam derrubar outros prefeitos e vices (veja infográfico) e levar à

Thiago Borges

Moradores da cidade goiana, que teve sete trocas seguidas de prefeito em quatro anos, não se manifestam contra a desordem política e até deixam de votar

Se aconteceu algo para tirar o prefeito, eu não estou sabendo. Tenho muito mais o que fazer!” Jaqueline de Jesus, vendedora

convocação de uma eleição extemporânea em fevereiro de 2008. As urnas registraram a maior reação popular aos fatos, que infelizmente foi a ausência do eleitorado. Do total de 43,4 mil votantes, mais de 11,5 mil se abstiveram do direito do voto. Do restante que compareceu às urnas, 9% votou nulo ou branco. Ou seja, não mais de 55% dos eleitores se envolveram efetivamente na

escolha do novo prefeito. O vendedor de remédios Antoni Carneiro foi um dos que não participaram desse pleito. “Estava com problemas de família”, lembra. Ao cruzar dados do Instituto Brasileiro de Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o Campus concluiu que pelo menos 10% dos jovens entre 18 e 24 anos não possuem

título de eleitor. De acordo com a contagem populacional de 2007, havia 8.073 moradores dessa faixa etária na cidade. Já os eleitores com a mesma idade somavam 7.277. Portanto, aproximadamente 800 jovens, que pela legislação eleitoral eram obrigados a votar, não participaram do pleito em um município no qual o vereador mais votado, em outubro de 2008, recebeu pouco mais de 1.600 votos v

Abril de 2006

Acompanhe a cronologia da crise política em Caldas Novas

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Wiris Arantes (PL), presidente da Câmara de Vereadores, assumiu a prefeitura, mas ficou no posto só por cinco dias, quando Magda (PTB) voltou ao cargo por determinação da Justiça.

Abril de 2006

Junho de 2007

Magda Mofatto (PTB) e a vice Silvânia Fernandes, que haviam sido eleitas em 2004 e tomado posse no ano seguinte, foram afastadas sob acusação de compra de voto.

Cassada pelo TRE, Magda (PTB) deixou o cargo novamente e foi substituída por José Araújo (PPS), segundo colocado na eleição de 2004.

População segue vida alheia ao troca-troca

José por ab ral, co de co de com por A dente


O cientista político e professor da UnB Ricardo Caldas, com base no livro clássico de Sergio Buarque de Holanda, Raízes do Brasil, explica que essa apatia faz parte da cultura política brasileira. “A população apenas aceita e cumpre as ordens impostas de cima, do Estado”, teoriza. “Além disso, o perfil do brasileiro foi formado de tal forma que ele só se mobiliza em causa própria, por exemplo, por questões salariais.”

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As poucas movimentações populares que ocorreram na cidade foram pró-governo. A atendente de hotel Lucilene Pereira conta que, em fevereiro, “o povo foi para a porta da Câmara Municipal de Vereadores defender o atual prefeito”. Nessa mesma época, alguns moradores convocaram – por meio do programa de Edson Arantes na Rádio Cidade FM 98,7 – a população para uma novena na praça em frente à Igreja Matriz. A oração começava por volta das seis da manhã e pedia para que o prefeito Ney Viturino não fosse cassado. No começo, a reza não deu muito certo, o prefeito foi afastado, mas acabou voltando ao cargo após cinco dias. Moradores também admiram a ex-prefeita Magda Moffato. “Se ela fosse uma pessoa ruim, não estaria onde está hoje, como vereadora”, analisa o Welton Souza, aquele que diz que Caldas Novas só tem gente “comportada”. Magda foi a candidata mais votada nas eleições de outubro de 2008 para assumir uma vaga na Câmara.

ulação segue vida normal, eia ao troca-troca político

Segundo Ricardo Caldas, este caso é comum no país. “A maioria dos políticos no Brasil chega ao poder via compra de votos ou clientelismo, oferecendo empregos, dentaduras, e outros favores em geral”, explica o cientista político. “Por isso, eles são bem vistos pela população, especialmente a de baixa renda, muito desassistida no país.” Um bom exemplo dessa análise é a história da Maria José Barbosa. Durante a campanha eleitoral de 2008, o próprio Ney Viturino bateu à porta da casa da aposentada, enquanto ela assava pão de queijo. O motivo da tal visita? Pedir votos. Entre uma xícara e outra de café, ela garantiu que a família votaria em Viturino se ele mantivesse o emprego de uma parente próxima que trabalhava na prefeitura. A promessa foi cumprida, e os votos foram dados. v

O corretor de imóveis Paulo Roberto reclama: “Entra e sai prefeito. Começa uma obra, ela para. Começa um asfalto, depois para. Perde serviço, perde tempo, perde dinheiro”. A opinião da agente de saúde

Maria Francisca Pereira é a mesma. Para ela, “a cidade era para ter-se desenvolvido mais, se não fosse por essas trocas de prefeito” O aposentado José Pierre se queixa. “A saúde, aqui, é um caos”, afirma. “O meu plano de saúde é o exercício físico, porque, se depender da saúde daqui, já tinha morrido há muito tempo”. Quando o assunto é saúde, ele tem péssimas lembranças: a mulher morreu ao perder a luta para continuar o tratamento contra diabetes pelo serviço público. (T.B.)

Thiago Borges

Em um banco improvisado de dois tocos de madeira e uma tábua por cima, Welton Souza e Carliane Pereira, funcionários de um hotel, observam o movimento da cidade. Sobre a ausência de manifestação política, ele explica: “Aqui não tem disso, não. Aqui o povo é comportado”. Logo em seguida, ela reflete: “Até que deveria ter. A população deveria ter feito algo”.

População desamparada

Apáticos assumidos

Os serviços públicos prestados pela prefeitura sofreram grandes efeitos com a instabilidade política. A saúdepiora a cada ano e as obras não são concluídas. O anel viário na saída para São Paulo e a infra-estrutura de bairros, como o Jequitimar e o Jardim Serrano, são projetos que se prolongam ao longo destes anos conturbados.

Aqui é cobra comendo cobra. Todo prefeito que entra eles querem cassar. Tinha que acabar com isso.” Osmar Silva, aposentado

Aposentado José Pierre não confia nos serviços prestados pela prefeitura

Empresariado político Dois dos seis ocupantes da cadeira de prefeito de Caldas Novas nos últimos quatro anos têm negócios no ramo de turismo. A ex-prefeita Magda Mofatto, a primeira a ser cassada, é empresária do Grupo Di Roma, que possui hotéis, clubes e empresas de promoção de eventos. José Araújo, o segundo prefeito a ser cassado, pertence ao Grupo Tropical, também proprietário de clubes. No Legislativo, o vereador Waldo Palmerston, o Waldinho, é empresário do Grupo Privê, cujos negócios estão dissolvidos no setor imobiliário e de clubes da região das Aguas Quentes. (T.B.)

Clara Araújo

Agosto de 2007 José Araújo (PPS) foi cassado por abusos na campanha eleitoral, como uso indevido de meios de comunicação e distribuição de combustíveis. Foi substituído por Arlindo Luiz Vieira, presidente da Câmara.

Fevereiro de 2010 Fevereiro de 2008 Ney Viturino (PSC) foi eleito em pleito convocado pelo TSE e assumiu o cargo. Reeleito em outubro daquele ano, seguiu no posto. Ele teve o mandato cassado em 2009 – por acusações que incluíam superfaturamento na compra de remédios –,mas conseguiu reverter a decisão antes de ser substituído.

Ney Viturino (PSC) e o vice foram afastados pela Câmara por improbidade administrativa. Mauro Henrique Palmerston (PMDB), presidente da Câmara, assume.

Março de 2010 Viturino (PSC) volta ao cargo cinco dias depois, por decisão da Justiça.

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Educação Vivian Rodrigues

À ESPERA DE UMA VAGA Sem creches gratuitas para suprir a demanda do DF, tempo na fila pode chegar a oito anos No Itapoã, mães cuidadoras suprem a falta de creches

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jovem de sorriso tímido e aparência simples, moradora da cidade-satélite do Itapoã, traz no rosto sinais que contradizem o tempo, mas são fiéis às circunstâncias. Pobre e desempregada, Nilzete Pereira, 29, tem seis filhos pequenos, um exmarido preso, um barraco de dois cômodos, um ganha-pão com bicos pela vizinhança e uma preocupação diária: seus três filhos mais novos, Isaque, 5, André, 3, e Bianca, 1, passam o tempo ociosos em casa ou expostos na rua, sob os cuidados dos irmãos maiores. No Itapoã, não há creches gratuitas a serviço da população. Vivian Rodrigues A vida dos filhos de Nilzete caminha sobre as ruas estreitas e de terra vermelha, que ainda lembram a invasão convertida em cidade-satélite do Distrito Federal (DF). Ela não tem dinheiro para pagar as creches particulares do Itapoã, cujos preços atingem R$ 180 mensais. Também não tem condições de garantir que outra moradora cuide dos filhos, fenômeno comum na região e igualmente oneroso. “Eu nunca consegui uma ajuda para colocar as crianças em uma creche”, lamenta. A situação da jovem mãe do Itapoã lembra a de outras milhares que não conseguem vagas para seus filhos em creches gratuitas do DF, sejam elas públicas ou conveniadas. Dados publicados pela última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD-IBGE) mostram que, considerando-se todas as crianças de zero a quatro anos em situação de baixa renda no DF, pelo menos 14 mil não têm acesso a creches gratuitas. São crianças que passam a ser cuidadas por pessoas próximas das mães empregadas ou, em situações mais graves, que as acompanham no trabalho. No DF existem apenas 14 creches públicas, situadas em 11 de suas 30 regiões administrativas. Atualmente, elas atendem 925 crianças de zero a três anos de idade. Além do Itapoã, regiões como Planaltina, Guará, Samambaia, Varjão e Riacho Fundo não possuem creches públicas. Para amenizar o problema, 35 creches particulares, que atendem cerca de 7 mil crianças de zero a seis anos, têm convênio com o Governo do Distrito Federal (GDF) e recebem recursos que asseguram o atendimento gratuito. O governo também implantou o programa Lares de Cuidados Diurnos (LCD), que cuida de quase 900 crianças da mesma faixa etária. São mães que recebem R$ 200 mensais para cuidar de até quatro crianças.

Casos e descasos As alternativas à escassez de creches públicas no DF são insuficientes para resolver a situação da demanda reprimida. Em Sobradinho, de acordo com o Centro de Referência de Assistência Social (Cras), órgão responsável por cadastrar as crianças que solicitam

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atendimento em creche, há 192 crianças esperando por vagas. No Itapoã, o Cras interrompeu o cadastro porque não consegue vagas para as 400 famílias inscritas. Já em Samambaia, segundo a coordenadora administrativa da creche Casa Azul, Alexandra Lourenço, só nesta creche cerca de mil crianças e jovens aguardam na fila de espera.

Desde agosto de 2008, Marelze solicita o registro da Recomeçar junto ao Conselho de Assistência Social (CAS-DF) para pagar as seis funcionárias que exercem atividades voluntárias na creche. “Alegam que o Conselho demora a se reunir e que a crise do governo Arruda atrasará o registro”, revela Marelze. Procurado pelo Campus, o órgão negou a influência da crise política, mas admitiu que a falta de um automóvel durante seis meses impediu a vistoria nas creches, protelando o processo.

O problema da falta de vagas nas creches de Samambaia é tão alarmante que o Cras da cidade se recusa a informar o número oficial de crianças na fila de espera. O impossível é esconder a indignação de mães como Lúcia Alves, 42, que aguarda uma vaga na Casa Azul para a filha Caroline, 10, há quase oito anos. “Estou

A única creche gratuita existente na cidade-satélite do Varjão é a Creche Comunitária, que atende cerca de cem crianças e foi fundada em 1982 pela Associação de Moradores. Até o final do ano passado, a creche recebia 250 crianças, mas a falta de verbas impediu a continuidade do trabalho. Quase 200 crianças foram dispensadas na época. “Foi triste. Várias dessas crianças voltaram para as ruas para se tornar ‘aviõezinhos’ do tráfico de drogas”, denuncia o atual presidente da creche e conselheiro tutelar, José Maria Martins. Atualmente, a creche é mantida pelas doações dos 120 membros da Associação de Moradores e pelo investimento pessoal de Martins. Ela não tem condições de oferecer almoço para as crianças e os seus seis funcionários recebem uma remuneração simbólica.

A importância das creches

Lúcia Alves, mãe desanimada”, lamenta. Ela conta que já recusou alguns empregos para cuidar das filhas. Lúcia não teve a mesma sorte que a vizinha Sandra Alves, 32, que esperou dois anos, mas fez a matrícula da filha: “Aqui, conseguir uma vaga é igual a ganhar na loteria”. Há seis anos, a Ação Social Recomeçar, creche privada e gratuita de Samambaia, cuida, durante a semana, de 40 crianças com até cinco anos de idade e em situação de baixa renda. Nos finais de semana, atende a 110 crianças em turmas alternadas. A instituição sobrevive dos recursos doados por amigos e familiares da professora Marelze Rigueira, 59, fundadora e presidente da creche. Envolvida em projetos sociais há 14 anos, ela não ganha qualquer colaboração governamental. “Contamos com a ajuda de pessoas de boa vontade”, ressalta.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) diz que a educação infantil – que engloba as creches e o ensino pré-escolar – não é obrigatória como o ensino fundamental e o médio. Ainda assim, é considerada um direito amparado pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A própria Conferência Nacional de Educação (Conae), realizada entre os meses de março e abril deste ano em Brasília, reiterou o dever do Estado ao aprovar a proposta que extingue o sistema de creches conveniadas no país, “tendo que ser obrigatoriamente assegurado o atendimento da demanda diretamente na rede pública”. “Se a mãe não tem condições de cuidar do filho, a creche tem um papel importantíssimo”, afirma a presidente da Sociedade de Pediatria do Distrito Federal (SPDF) e professora titular de Pediatria da Faculdade de Medicina da UnB, Vera Bezerra. No entanto, a pediatra pondera: “O ideal é que, nos primeiros seis meses de vida, os filhos fiquem com as mães em casa, pois estão mais susceptíveis a adquirir infecções”. Vera, que foi a primeira pediatra da primeira e única creche da UnB (1973-1978), modelo de gestão para as creches de todo o Brasil, explica: “As creches são lugares de fácil disseminação de doenças infecciosas. É importante que tenham estrutura adequada e atendimento médico”. v


Papeleiros da cidade-satélite transformam câmaras de pneu em bolsas de luxo e chegam ao mercado italiano por meio do Capital Fashion Week Nayra Thyemi Ainda pouco valorizados no Brasil, produtos feitos com materiais reciclados são artefatos de luxo nos mercados europeu, asiático e norte-americano. Roupas confeccionadas com lacre de latinhas, lona de caminhão e tecidos artesanais feitos com sobras de confecções fazem parte de uma tendência que tem ganhado força no mundo da moda, impulsionada por consumidores atentos aos impactos sociais e ecológicos das grifes que usam. Associações de artesãos do Distrito Fe-deral e Entorno estão ganhando visibilidade nesse nicho. Um exemplo é o da Associação de Trabalho dos Recicladores, Desenvolvimento Agrícola e Ambientalista de Santa Maria (Astradasm), que mostrou seu trabalho em março, na última edição do Capital Fashion Week (CFW), principal evento de moda em Brasília. O próprio evento tem apostado na tendência e pretende transformar Brasília na capital da moda com vertente de inclusão social e sustentabilidade. Francesco Quartulli é distribuidor de moda em Milão e veio a Brasília pela segunda vez, atraído pela produção local das associações artesãs. Encontrou, por meio do CFW, a novidade de Santa Maria com potencial para o mercado italiano: bolsas e acessórios de câmaras de pneu, que combinam criatividade, materiais reciclados e um sonho de transformar vidas por meio do artesanato. A associação de Santa Maria é formada por mais de 300 catadores, dos quais 70, além de trabalhar com a coleta, fazem artesanato com o material que recolhem, dentro do projeto Reciclando Vidas. “Queremos mudar a vida de algumas pessoas que têm dom, mas não têm oportunidade”, afirma a coordenadora de artesanato da associação, Aliomar Souza. O ponto forte do grupo é o trabalho de reciclagem de papel e a criação de bijuterias de papel machê. Os artesãos, porém, foram desafiados pelo CFW a desenvolver um produto diferente feito com materiais reaproveitados. Fizeram vários testes com papel reciclado e se deram conta de que a matéria-prima precisava de mais flexibilidade. Testaram câmaras de ar, e do trançado de várias tiras de borracha surgiram protótipos de bolsa, cinto e pulseira.

Desafios e sonhos

Uma bolsa média é feita com 280 peças

Vinícius Pedreira

MADE IN SANTA MARIA

Moda sustentável

Esses modelos foram selecionados por Francesco Quartulli. “O consumidor quer um produto bonito, com estilo, de alta qualidade e com um valor a mais de conteúdo ético”, explica o italiano. “Se o produto tem um conteúdo ético, o consumidor sente menos culpa de gastar.” Ele viaja por vários países à procura de produtos “éticos”. O olheiro tem interes-se no processo de produção das peças que comercializa. Verifica como e por quem foi feita cada uma delas para garantir que o processo não envolva nenhum tipo de exploração.

Em sua casa, Aliomar Souza criou a primeira bolsa de pneus

O desafio agora é adequar os produtos às exigências do mercado da moda internacional. De acordo com o italiano, os artesãos terão de fazer adaptações de tamanhos e melhorias nos acabamentos, além de enviar um mostruário com sete itens. Ele pretende comercializar os produtos na Europa e na Ásia, principalmente no Japão. As peças do mostruário serão vendidas a preço de custo para o distribuidor italiano. Uma bolsa média, por exemplo, custará R$ 90 e, provavelmente, será revendida em alguns meses por US$ 150 (R$ 270). Das exigências a cumprir, a principal é retirar o cheiro característico da borracha. Depois de três dias e várias tentativas, o presidente da associação, Lindon Jhonson, resolveu aplicar à borracha uma substância usada na indústria automobilística. “No início o produto tem um perfume suave de eucalipto, mas quando seca, fica neutro”, conta. Além de descobrir o tratamento, Lindon está construindo uma máquina para cortar as câmaras de ar e reduzir os custos de produção. A borracha passa por vários processos de esterilização, tratamento, corte em gráfica e, por fim, chega à montagem artesanal. Como os custos são altos, mesmo utilizando material reciclado, Aliomar e Jhonson estão à procura de parceiros para desenvolver a tecnologia e conseguir recursos financeiros para a fabricação.

Mercado para o exótico A Companhia do Lacre, associação com cerca de 90 artesãs do Riacho Fundo, produz acessórios e roupas com lacres de latinha e os exporta há sete anos para o resto do mundo. As Panteras do Lacre, do Riacho Fundo II, é outro exemplo bem sucedido. Uma bolsa de mão, feita pela artesã Francisca Ribeiro de Souza, é vendida hoje por U$ 145 (R$ 255) na loja do Museu de Arte Moderna de São Francisco, nos Estados Unidos. O Capital Fashion Week (CFW) recebe apoio da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), que garante a presença de empresários internacionais no Capital Fashion Business, evento paralelo aos desfiles que une associações e possíveis compradores estrangeiros e nacionais. O produto made in Brazil expressa a cultura e a criatividade do povo, é ético e socialmente justo. “Não estamos competindo com a China, não estamos vendendo nada por um dólar”, afirmou a coordenadora de negócios do CFW, Walquíria Aires. (N.T.)

Dependendo da aceitação do mercado, o grupo enviará ao exterior cerca de 100 peças por mês nas primeiras remessas, o que renderá aos artesãos R$ 8 mil. Inicialmente, três pessoas irão se dedicar com exclusividade ao pro-cesso, pois os demais catadores artesãos precisam trabalhar na coleta, que é a fonte garantida de renda. A expectativa é que a exportação torne o processo sustentável e beneficie as 70 famílias de catadores cadastrados no projeto. Assim, elas poderão se dedicar exclusivamente ao artesanato. Além disso, pretendem a-trair mais catadores para participar do Reciclando Vidas, principalmente mães solteiras, que possuem renda mensal menor do que um salário mínimo. Aliomar sonha em proporcionar a essas catadoras mais qualidade de vida e dignidade. “A gente vai mostrar para elas que tem, sim, um universo diferente, que elas podem trabalhar de uma maneira mais saudável”, afirma. v

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Saúde

REZA QUE A DOR PASSA A modernidade de Brasília convive com a fé na atividade das benzedeiras como possibilidade de cura para doenças de pele e outros males conselhos. Um misto de enfermeira e psicóloga para aqueles que a buscam na 715 Sul.

Thalita Carrico Todos os dias, uma média de 15 pessoas procuram a casa de Dona Diná, benzedeira de 83 anos que atende na capital federal desde 1960. O esclarecimento para essa peregrinação, ela tem na ponta da língua. “Não faço milagre, é a fé das pessoas na minha reza que cura”, afirma. Segundo pesquisadoras da Universidade de Brasília que estudam “cuidados populares”, ela tem mesmo razão no que diz. O fator determinante para a cura é a crença que as pessoas depositam nesse tipo de tratamento. Para a professora do Departamento de Enfermagem da UnB Moema Borges, que estuda práticas populares de saúde no DF há mais de 10 anos, “a fé nas orações resgata a esperança, o sentido da vida que muitas vezes se perde em meio ao sofrimento humano. O modo de cuidar pela benzeção, baseado na solidariedade, no compromisso com o bem-estar individual e social, favorece a reconexão com a essência divina do homem”. Esta crença popular pode parecer um contrassenso à ideia de Brasília como uma cidade moderna. Contudo, como afirma a professora do Departamento de Antropologia da UnB Soraya Fleischer, estudiosa do assunto desde 2004, “a capital possui vários cuidadores populares pelo fato de ter sido o destino de imigrantes desde a sua construção. As pessoas trouxeram consigo não apenas os móveis e os pertences materiais, mas também suas crenças e costumes”. Dona Diná é um bom exemplo destas pessoas vindas de fora. Vinda do Rio de Janeiro com o marido, a rezadeira benze, corta cobreiro, erisipela, mau olhado, espinhela caída, além de fazer massagens, curativos, auxiliar mulheres grávidas e dar

Reza x medicina Um dos motivos das benzedeiras ainda serem tão procuradas está na ausência de explicações para alguns males ou mesmo na falta de serviços básicos de saúde. Nas palavras de Moema Borges, “em sociedades mais carentes a benzeção ajuda a assegurar as condições necessárias para manter o tecido da vida social e individual”. A cabeleireira Maria de Fátima Raposo sabe bem o que é não ter diagnóstico médico. Ela conta que há 20 anos tinha uma ferida na mão que nenhum especialista descobria o que era. “Era coisa feita”, diz ela. A solução, então, foi pedir ajuda a Dona Diná. A benzedeira rezou com um talo de mamona e depois disso a “ferida melhorou bastante”, assegura Maria de Fátima. Padre Mário, da Paróquia Santo Cura D’Ars, frequentada por Dona Diná e onde ela pega a água benta, afirma que a benzedeira “criou a própria religião. A fé é subjetiva, pode influenciar para que a pessoa sinta-se bem ou então ela mesma se cura com a fé divina”. Ele diz ainda que, “se ela curasse, os hospitais estariam vazios”. Dona Diná é expressão pura e simples da mistura religiosa que existe no país. Ela se diz católica, mas com os pés no espiritismo. Para Soraya Fleischer, “os brasileiros creem em várias coisas tanto em relação aos cuidados da saúde quanto nas suas práticas religiosas. As pessoas, muitas vezes, procuram o mais alto nível de cuidado biomédico e, ao mesmo tempo, continuam suas orações em busca de milagres”. Em Brasília, não seria diferente. v

Seleção de frases notáveis publicadas no Twitter

Twittando

“Nos deixou Juan Antonio Samaranch, uma grande pessoa e um exemplo para todos no mundo do esporte.” Andrés Iniesta, sobre a morte do presidente de honra do Comite Olímpico Internacional

Tirinha

por Felipe Matheus Pineda

“Não vou fazer muito discurso por aqui. Quero trocar ideias, ouvir sugestões. Vou me abastecer com os twiteiros. Vocês saberão por aqui onde estou.” Dilma Rousseff, pré-candidata à presidência pelo PT

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Thalita Carrico

“Depois de ser campeão carioca, o Botafogo pode ganhar ou perder todos os campeonatos que disputar de agora em diante.” Cléber Machado, personagem fake do narrador homônimo da Rede Globo “Sei que a torcida está um pouco desapontada com tudo que aconteceu, mas a Nação precisa apoiar o Fla nesse momento decisivo!” Patrícia Amorim, presidente do Flamengo

Dona Diná mostra o pé de mamona que usa para benzer

“Entendo que Brasília passa por um momento difícil. Estamos trabalhando muito para que a situação se normalize. Só o que peço: um voto de confiança.” Rogério Rosso, governador do Distrito Federal “Não será a força das máquinas que ganhará as eleições, mas a legitimidade das ideias.” Marina Silva, pré-candidata à presidência pelo PV “A partir de agora então vocês seguem um pré-candidato à presidência da República. Boa noite a todos.” José Serra, no dia em que foi escolhido pré-candidato à presidência pelo PSDB “Os seis meninos de Luziânia foram mortos a pauladas por um pedreiro (ex-presidiário) a troco do quê? Meu Deus, como isso me doeu!” Fernanda Paes Leme , atriz


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