Número 7 - Ano I

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Paulo Kasseb

É COMUM OS governantes, não só brasileiros, passarem o primeiro biênio de sua administração aprontando planos, afinando projetos e fazendo caixa para, na segunda metade do mandato, deslanchar as realizações que consideram essenciais ao país. Sem perder de vista o estímulo representado pela proximidade das eleições. Se os feitos forem de fato relevantes, podem garantir a permanência do governante ou de um sucessor do mesmo partido. A presidente Dilma Rousseff está concluindo seu segundo ano no Palácio do Planalto. A economia tropeçou na recente queda do PIB, desanimando os empresários, mas as previsões para 2013 indicam rápida recuperação: crescimento para o ano que vem de 3%-3,5%, segundo economistas independentes, ou 4%, segundo o ministro da Economia, Guido Mantega. Talvez não dê certo, como aconteceu no terceiro trimestre de 2012, até porque muito depende do estado das finanças dos Estados Unidos e das nações da União Europeia. Daí o sentido dos discursos da presidente brasileira em suas viagens, conclamando seus pares a evitar a paralisia

na crise e apresentando o país como um ambiente seguro e convidativo para o capital estrangeiro produtivo. Falando palavras e números mágicos, como “trem-bala”, “800 aeroportos regionais”, “15 mil quilômetros de ferrovias”, “eficiência portuária”, ela faz brilhar olhos por onde passa. Inclusive os nossos, pois a depauperada infraestrutura do país é uma de suas heranças mais pesadas, com graves reflexos na vida das pessoas e na economia nacional. No campo da defesa, o Brasil tem conquistado avanços como em poucos momentos da sua história. As Forças Armadas estão com melhor aparelhamento e expectativas de crescimento ainda maior, pois Marinha, Exército e Força Aérea têm projetos e programas da mais alta importância estratégica para consolidar nos próximos anos. Em paralelo a essa realidade, a indústria nacional do setor encontra-se estimulada a produzir e conquistar novas tecnologias. Para isso, o apoio do governo tem sido crítico, fundamental, assim como para vencer os desafios da geração de capacidades humanas e técnicas necessárias ao setor produtivo.

Os desafios são grandes. A inflação está dentro da meta, mas na faixa mais alta. A desvalorização do real e a queda do PIB fizeram o país cair do 6º para o 7º lugar entre as maiores economias do mundo. A imprensa – até mesmo a estrangeira – não poupa críticas. Mas a presidente, como se sabe, não é de aceitar pressões. Por outro lado, ela goza de enorme aprovação popular, até porque, como demonstram os números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), cai o analfabetismo, sobe a renda dos mais pobres, aumenta o número de trabalhadores com carteira assinada. E a chamada “nova classe média” tornou-se a principal força motora da resistência do Brasil à crise mundial. Ou seja, ela tem legitimidade de sobra para fazer o que falta e o que é preciso – talvez até mudanças no corpo do governo, nos cargos em que a população espera maior dinamismo e soluções. A hora é agora, quando tem início o segundo biênio de Dilma Rousseff na Presidência do Brasil. Mirian Paglia Costa Editora

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DEFESA LATINA Ano 2 Nº 7 Editora Mirian Paglia Costa MTB Nº 12.637 mirianpaglia@gmail.com Diretor de Redação Cosme Degenar Drumond degenar@terra.com.br Diretora de Marketing e Publicidade Helena Maria Alves helena@editoradecultura.com.br Diretor de Arte Yves Ribeiro Filho Conselho Editorial João Lins de Albuquerque, Maura SylviaPasculli de Curci, Tenente-brigadeiro Sérgio Xavier Ferolla Impressão Assahi Distribuição Fernando Chinaglia Distribuidora Ltda.

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Foto de capa Heliobras / Divulgação

Helicóptero na linha de produção em Minas Gerais, onde a Helibras ampliou suas instalações

3 EDITORIAL 6 RADAR 16 AVIAÇÃO MILITAR

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O complexo da Base Aérea de Campo Grande e seus esquadrões de salvaguarda da vida e do território brasileiro CAPA Nova fábrica da Helibras em Minas Gerais fará helicópteros progressivamente mais brasileiros e atrai polo industrial de asas rotativas

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SEGURANÇA PÚBLICA Belas mulheres, ótimos equipamentos e bom comportamento não bastam para a população ficar contente com a Polícia Sueca

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PROGRAMA ANTÁRTICO Pesquisas continuam enquanto se monta a estação provisória e se retiram os escombros da incendiada Estação Antártica Comandante Ferraz

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INTERNACIONAL Depois de exibir porta-aviões feito em casa, China chama imprensa para mostrar autossuficiência em helicópteros armados

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DEPOIMENTO O coronel Gustavo Borges fala dos inícios aventurosos da aviação nacional e de sua participação pioneira na tecnologia de controle do espaço aéreo

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HISTÓRIA Relembrando o grande incêndio que quase impediu o Aeroclube de São Paulo de se tornar o mais destacado centro de formação de pilotos da América Latina

CULTURA.música O sucesso das bandas militares brasileiras

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CULTURA.livros Pesquisador apresenta em livros todos os blindados do Brasil e lança coleção para analisar os de atuação mais marcante no país. E mais: animais e micro-organismos como armas.

60 CULTURA.cinema

Completada trilogia que documenta atuação das Forças Armadas do Brasil na Segunda Guerra Mundial

62 EFEMÉRIDES

Centenário do Campo dos Afonsos DEFESA LATINA

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Otimismo voa alto

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tinuará sendo uma ferramenta vital para os negócios e o comércio global no gerenciamento de cadeias de suprimento e colocação de bens críticos no mercado”. O maior crescimento deverá ocorrer nos mercados conectando a Ásia-Pacífico. O mesmo otimismo frequenta as análises sobre a aviação comercial, que reconhecem quedas expressivas no passado, mas sempre seguidas de retomadas para o nível de crescimento de longo prazo, em torno de 5% ao ano. “Apesar das incertezas”, registra o Current Market Outlook, “o tráfego de passageiros cresceu 6% em comparação com 2010. Esperamos que esta tendência continue pelos próximos 20 anos.”

Quanto ao transporte de carga, que caiu 2,4% no ano passado, a expectativa, baseada nas necessidades de movimentação rápida e eficiente de produtos dos países emergentes, é de 5,2 % de crescimento anual até 2031. Quem quiser conhecer mais sobre a Boeing tem agora a possibilidade de visitar seu site brasileiro, inaugurado em outubro. Quem acessar www.boeing. com.br encontrará informações sobre a empresa e suas divisões – Aviação Comercial, Defesa, Espaço e Segurança, Pesquisa e Tecnologia, Satélites, Biocombustíveis e Parcerias –, além de novidades em vídeos, imagens e notícias sobre os mais recentes aviões lançados no mundo. Fonte: Boeing

Com dois estudos de grande abrangência, a Boeing procura iluminar os caminhos para tomar suas decisões estratégicas. O Current Market Outlook é a previsão de longo prazo sobre volume do tráfego aéreo e demanda de aeronaves. Já o World Air Cargo Forecast (WACF), publicado bienalmente, diz respeito a previsões sobre transporte aéreo de cargas. Iniciado em 1986, este último estudo focaliza os países mais importantes para a atividade aeronáutica, identifica tendências predominantes e lê o futuro da indústria em termos de desempenho e desenvolvimento dos mercados, incluindo o capítulo da frota de aviões de carga. Ambos foram dados a público pela empresa neste ano, o WACF cobrindo 2012-2013 e o Current Market Outlook com abrangência de 2012 a 2031, consagrando a tradição da empresa de compartilhar conhecimento com o mercado desde 1964, de modo a auxiliar companhias aéreas, fornecedores e comunidade financeira a decidir com conhecimento de causa. A despeito do ambiente econômico negativo em termos globais e de um desempenho frágil do mercado específico, os especialistas da Boeing apostam no crescimento do tráfego de carga aérea no longo prazo. Tom Crabtree, diretor regional de Desenvolvimento de Negócios e Integração Estratégica da Boeing Commercial Airplanes, justifica: “A carga aérea é e con-

América Latina Aumento incrível de ordens de aeronaves

747 e maior 2 corredores

1 corredor Jatos regionais

Current Market Outlook 2012-2031 Os dois estudos podem ser acessados em: www.boeing.com/commercial/cmo/pdf/Boeing_Current_Market_Outlook_2012.pdf www.boeing.com/commercial/cargo/


Armas leves Arma básica da Polícia de Israel, a família de pistolas 9 mm Jericho tem a preferência de esquadrões de segurança pelo mundo afora devido a seu desempenho e confiabilidade. Depois de exibir o portfólio de seu produto de 31 de outubro a 2 de novembro na Expodefensa III, na Colômbia, a Israel Weapon Industries (IWI) marcou encontro com o público norte-americano na feira Shot Show, que acontece de 15 a 19 de janeiro de 2013 em Las Vegas. Apesar das constantes crises que a indústria e o comércio de armas atravessam nos Estados Unidos, devido a seguidos episódios de violência de atiradores em escolas, a população do país, em geral, é avessa ao controle de armas, defendendo o direito de armar-se que consta da Constituição dos EUA. Assim, a IWI espera atrair boa audiência para seu estande. Com razão: seu sistema de armas inclui a famosa submetralhadora Uzi, as pistolas Barak e Jericho, o rifle compacto de assalto Galil e, entre outros, a metralhadora leve Negev – que tem um modelo novo lançado em março, a Negev NG7, que dispara 700 tiros por minuto e também pode ser operada em semiautomático. Motivo a mais para a relação especial dos norte-americanos com a IWI: nos anos 1980, a Magnum contratou a fabricante israelense para redesenhar e produzir uma pistola semiautomática para a marca, de que resultou a Desert Eagle. Esta, por ser uma pistola imponente, com ruído distinto, se tornou a arma de mão mais poderosa em jogos e filmes de ação.

Cowboy Bebop

A pistola Jericho 941, da israelense IWI, é a preferida de Spike, personagem da anime Cowboy Bebop

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Demandas militares Exército e Marinha estão trabalhando para aumentar a transparência de suas negociações com fornecedores. Em outubro, o Escritório de Projetos do Exército anunciou as principais necessidades materiais de interesse da Força, buscando criar ambiente favorável para que as empresas possam apresentar suas potencialidades tecnológicas e de inovação, de acordo com normas especiais de compras, contratações e desenvolvimento de produtos e de sistemas de defesa estabelecidas pela Lei nº 12.598/2012. A Marinha do Brasil, por sua vez, convidou empresários para um evento em São Bernardo do Campo (SP) no qual, além de anunciar as áreas de suas necessidades, deu orientações para ensinar-lhes os passos para negociar com êxito com o poder público. Desse modo, as compras de 2013 deverão ser facilitadas para os dois lados.

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Exército As demandas do Exército Brasileiro relacionadas aos projetos estratégicos conduzidos pelo Escritório de Projetos do Exército concentram em processamentos de imagens; comando e controle (fixos e móveis); equipamentos militares de uso individual e coletivo; ferramental para manutenção; fusão de dados; grupos motogeradores; integração de sistemas; optrônicos para vigilância; placas para blindagem adicional; pneus à prova de bala; produção de aço balístico; radares de vigilância de baixa altitude; scanner de carga e de bagagem; sensores de sinais eletromagnéticos; sistemas de armas de precisão (excluídas as nucleares); sistemas de comunicação, de defesa cibernética e de atuação geral no ciberespaço, de posicionamento por satélite, de simulação; e de visão noturna; terminais de comunicações via satélite; veículo aéreo não tripulado (categoria 1) e, entre outros; veículos terrestres, aéreos e de navegação (especialmente fluvial). As empresas interessadas em participar de processos seletivos devem procurar:

Marinha Foi marcado para 6 de dezembro, em São Bernardo do Campo, o evento de aproximação entre Marinha e industriais interessados em atender às necessidades da Força, que se concentram nas seguintes áreas: metalmecânica (máquinas, motores e eletrônica), alimentos (gêneros), têxtil (uniformes), material cirúrgico-hospitalar, material de expediente, de marinharia (componentes de um navio) e de combate a incêndio. No evento, programado para o Senai Mario Amato, depois da abertura, pelo prefeito de São Bernardo, Luiz Marinho, haverá palestra do vice-almirante Edesio Teixeira Lima Junior sobre a Estratégia Nacional de Defesa e os grandes projetos da Marinha, seguida por outra, intitulada “Seja um fornecedor da Marinha”, do contra-almirante José Ricardo Campos Vieira, assessor de Logística da Diretoria de Abastecimento da Marinha. Depois, haverá uma rodada de relacionamento entre oficiais da Marinha responsáveis pelo setor de compras e empresas da região. Mais informações:

Escritório de Projetos do Exército, por intermédio do chefe da Seção de Comunicação Social, tenente-coronel Gilson de Moura Freitas, no telefone (61) 3415-4360 e e-mail: freitasgilson@hotmail. com, ou recorrer ao chefe desse escritório, que é o general-de-brigada Luiz Felipe Linhares Gomes.

Flávia Beltran, na Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo de São Bernardo do Campo, telefone (11) 4348-1000, ramal 2097, ou pelo e-mail flavia.beltran@saobernardo. sp.gov.br.

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Ela é general

Contra-almirante Dalva Maria Carvalho Mendes recebe cumprimentos do ministro da Defesa, Celso Amorim

Felipe Barra

Por meio de decreto assinado no dia 23 de novembro, a presidente Dilma Rousseff promoveu ao generalato a primeira mulher pertencente às Forças Armadas do Brasil. A capitão de mar e guerra Dalva Maria Carvalho Mendes passa a contra-almirante – patente que equivale à de general de brigada no Exército e à de brigadeiro na Aeronáutica. A promovida é médica e dirige a Policlínica Naval Nossa Senhora da Glória, no Rio de Janeiro. Pioneira entre as Forças a admitir mulheres em suas fileiras, a Marinha é também a primeira a lhes abrir caminho para os postos mais altos da hierarquia militar. Dalva Maria ingressou na Marinha em 1981, no Corpo Auxiliar Feminino da Reserva, como médica anestesiologista. Além de exercer atividades na área assistencial, trabalhou também como docente no Hospital Naval Marcílio Dias, no Rio de Janeiro, antes de assumir a direção da Unidade Integrada de Saúde Mental da Marinha (UISM) A solenidade de troca de platinas foi realizada pelo diretor de Saúde da Marinha, vice-almirante (Md) Celso Barbosa Montenegro, no dia 26 de novembro. Aos 56 anos, a contra-almirante Dalva Maria tem 31 anos de carreira. A promoção trouxe à baila a possível abertura da Academia das Agulhas Negras às mulheres, que, segundo se comenta nos meios militares, deve ser feita pelo Exército já em 2013. Se isso ocorrer, é provável que a Marinha decida aceitar candidatas à Escola Naval e ao Colégio Naval. Desse modo, as duas Forças seguiriam o caminho já trilhado pela Força Aérea, que abriu seu exame de admissão às mulheres desde 1992 e, portanto, já formou duas turmas mistas de pilotos na Acadamia da Força Aérea em Pirassununga (SP).

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Guerra cibernética No dia 22 de novembro, com a presença do tenente-coronel Marcio Ricardo Souza Fava, novo comandante do Centro de Instrução de Guerra Eletrônica (Cige), em Brasília, o Exército recebeu o simulador de operações de guerra cibernética (Simoc) da empresa Decatron. Trata-se de um software de apoio à especialização de recursos humanos em análise de vulnerabilidades de redes, permitindo a execução de ações, em ambiente controlado, de proteção cibernética e defesa ativa, além do treinamento baseado em cenários reais de catástrofes e comprometimentos de infraestruturas críticas nacionais. O Simoc, idealizado pelo Cige e desenvolvido pela Decatron, empresa 100% brasileira, é um recurso de uso dual, que integra componentes reais e ativos de rede virtuais, utiliza prioritariamente software livre

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e permite o acompanhamento e a avaliação de todas as atividades executadas pelos alunos em tempo real, otimizando o resultado dos treinamentos. Será um complemento importante ao trabalho do corpo docente da Divisão de Ensino do Cige, composto por militares com especialização em instituições de ensino de prestígio, como o Instituto Militar de Engenharia (IME) e o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), empenhados em manter permanentemente atualizadas as atividades de ensino de guerra eletrônica. A mesma divisão trabalha pela difusão do conhecimento na área, o que é feito por meio de seminários, revistas eletrônicas e encontros dos Centros de GE das Forças Armadas. Na oportunidade, foram apresentadas as possibilidades do Simoc, mediante demons-

tração de seu emprego, durante exercício conduzido no Cige como coroamento do Curso de Guerra Cibernética, que reuniu alunos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica e foi a primeira atividade de ensino dessa natureza no âmbito das Forças Armadas do país. Objetivo: habilitar os militares para empregar técnicas e ferramentas de guerra cibernética, visando à preservação do sigilo das informações transmitidas ou armazenadas em meios que utilizam tecnologia da informação. As atividades caracterizaram a importância dada pelo Exército à defesa de seus ativos na área de tecnologia da informação, à capacitação de seus recursos humanos nesse complexo domínio do conhecimento e à parceria com o setor privado na importante e inovadora produção do Simoc. Criado em 1983, o Cige iniciou atividades no começo de 1989 e, já em novembro, formava a turma pioneira de especialistas em guerra eletrônica. Desde então, tem formado integrantes das três Forças e também militares de nações amigas. O evento foi prestigiado pelo Chefe do Departamento de Ciência e Tecnologia, General de Exército Sinclair James Mayer, e por autoridades do Ministério da Defesa, da Marinha, do Exército e da Aeronáutica.


Foi instalado na Espanha um novo radar projetado para testar métodos de detecção de restos de naves e lixo na órbita da Terra. O equipamento será usado para desenvolver futuros serviços de alerta sobre lixo espacial em prol da segurança de operadores de satélites. A iniciativa foi anunciada em 15 de outubro pela Agência Espacial Europeia (ESA na sigla em inglês), que dedicou 18 meses de trabalho para projetar e desenvolver o radar, cuja construção coube à espanhola Indra Espacio, ao custo de € 4,7 milhões, e já está instalado a 30 quilômetros da capital, Madri. Que a detecção precoce é crucial para evitar o risco de colisão tornou-se mais evidente do que já se sabia em 28 de janeiro deste ano, quando a Estação Espacial Internacional precisou queimar um bocado de combustível para alterar sua órbita e evitar choque com lixo perdido no espaço. A Indra Espacio fez o transmissor do radar e subcontratou o Fraunhofer Institute, de Wachtberg, Alemanha, para fazer o receptor. A importância do serviço de alerta, segundo a ESA, é que, com as informações que ela vai produzir, a Europa poderá utilizar e acessar o espaço de forma autônoma, sem depender de outras fontes. De acordo com a agência, sistemas baseados no espaço já se tornaram indispensáveis a muitos serviços essenciais dos países europeus, como economia, administração e segurança, entre outras funções, e isso vai apenas se aprofundar no futuro, o que torna a autonomia europeia nesse campo um passo obrigatório.

Afinando o kc-390 A equipe de desenvolvimento do avião KC-390, da Embraer, reuniu-se com militares da Força Aérea Brasileira para a revisão preliminar do projeto, ação conhecida pela sigla PDR, de preliminary design review. O encontro ocorreu em final de agosto, quando foram apresentadas as soluções de engenharia adotadas pela Embraer para a estrutura e para os diversos sistemas da nova aeronave. Na ocasião, a equipe de especialistas da Embraer demonstrou a maturidade do projeto a partir de componentes e interfaces que já estão definidos. Os militares da FAB puderam conhecer como será a cabine de pilotagem do KC-390, que tem um simulador de engenharia pronto. Em março de 2013, mais um encontro irá congelar a configuração do KC-390 e liberar os desenhos de produção, última fase antes da construção dos protótipos. O novo avião deverá fazer seu voo inaugural em 2014, e as primeiras entregas para a Força Aérea estão programadas para 2016, quando a aeronave começará a substituir os C-130 Hércules em missões de transporte e reabastecimento em voo.

Agência Força Aérea / Copac

Radar contra lixo espacial

A 1º tenente aviadora Joyce de Souza Conceição, do 1º/1º Grupo de Transporte, avalia a ergonomia da cabine de pilotagem do KC-390; ela é a primeira mulher da FAB a pilotar os C-130 Hércules, que serão substituídos pelo novo gigante

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Denel Brasll

Representação do A-Darter equipando o caça Gripen da África do Sul durante testes

Míssil afro-brasileiro O fechado clube dos produtores de mísseis ar-ar de última geração está prestes a receber mais uma dupla de sócios: a África do Sul e o Brasil. Ambos os países, associados para desenvolver o A-Darter, passarão a ombrear com Estados Unidos, Reino Unido, Israel e o consórcio europeu liderado pela Alemanha, que são atualmente os únicos nesse campo tecnológico. Todos eles impõem restrições para vendas desse tipo de míssil e não disponibilizam dados de projeto aos países compradores. Aliás, foram as restrições ao fornecimento de armas, determinado pelo embargo das Nações Unidas ao regime do Apartheid a partir dos anos 1960, e a guerra de fronteira com Angola, de 1966 a 1989, que levaram a África do Sul a adentrar o campo da produção local de armas, começando a desenvolver tecnologia nos diversos campos da defesa. O A-Darter deve chegar para a Força Aérea Brasileira a partir

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de 2015, segundo informou no dia 6 de dezembro a alta direção da Denel do Brasil. Foi por ocasião da assinatura de contrato com o Comando da Aeronáutica, pelo qual, por R$ 1,4 milhão, a empresa sul-africana deverá preparar o parque industrial de São José dos Campos (SP) para a construção do míssil. O diferencial do A-Darter é ser um míssil capaz de manobrar até 10 vezes mais rápido do que um avião de combate e não se limitar a ataques frontais, como os de gerações anteriores. Na FAB, ele deverá equipar a versão modernizada do caça A-1 e o futuro F-X2. Será utilizada também pela Marinha. O Brasil entrou no desenvolvimento do A-Darter em 2006, sendo, portanto, sócio da África do Sul nos direitos de propriedade intelectual e industrial do míssil. A nova tecnologia, desenvolvida pelos dois países, está no final da fase de testes – no primeiro semestre, foram

lançados do Gripen sul-africano – e perto do início da produção em larga escala. Dessa fase, deverão participar as empresas nacionais Mectron, Avibras e Opto Eletrônica, que são beneficiárias dos projetos de transferência de tecnologia em áreas como sistemas ópticos, navegação, sensores e processamento de imagens. De acordo com o gerente técnico da Denel do Brasil, Everton de Paula, além de fabricar todos os mísseis que a FAB irá adquirir futuramente, o parque industrial brasileiro também deve fabricar componentes de unidades que venham a ser exportadas pelo Brasil e pela África do Sul para outros países. “Este contrato representa mais um passo no sentido da concretização da transferência de tecnologia. A tecnologia que nós tínhamos ainda era de terceira geração. Este é um salto: vamos para mísseis de quinta geração”, afirmou.


Com 2,98 metros de comprimento e 90 quilos de peso, o A-Darter é um míssil ar-ar dotado de sensor que detecta o calor de aviões e helicópteros para guiagem. Com isso, um caça equipado com o A-Darter pode atingir alvos que não estejam só na frente, mas também dos lados e até atrás da aeronave. Outra tecnologia inédita no Brasil é o empuxo vetorado, que é o direcionamento do jato do motor do foguete. Somado ao movimento das quatro pequenas “asas”, o empuxo vetorado confere ao míssil a possibilidade de fazer manobras que alcançam até 100 vezes a força da gravidade (100G), enquanto os aviões de combate não passam de 9 vezes (9G). Por produzir menos fumaça que modelos mais antigos, o ADarter é mais difícil de ser visualizado. O presidente da Comissão Coordenadora do Programa Aeronave de Combate (Copac), brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior, elogiou as características do míssil durante a solenidade de assinatura de contrato com a Denel do Brasil. “Ver o início da produção no Brasil de um míssil de quinta geração é a certeza de que nós estamos dando aos nossos pilotos aquilo de mais moderno”, afirmou.

O Correio Aéreo Nacional (CAN), operado pela Força Aérea Brasileira (FAB), foi criado em 12 de junho de 1931. Desde então, presta relevantes serviços ao país, em especial às comunidades mais carentes do interior. Com o objetivo de homenagear esse importante instrumento de alcance social, um grupo de empresários-pilotos de São Paulo reeditou, de 25 de agosto a 2 de setembro, uma das primeiras rotas do serviço no Centro-Oeste brasileiro, inaugurada em 1932. Participaram da jornada quatro aviões clássicos dos anos 1940-50 – Aeronca, Luscombe, Paulistinha e Cessna 170B, todos equipados com sistema de navegação moderno, como GPS, radiocomunicação e transponder – e um helicóptero Robinson R-44, matrícula PT-YAB. Os sete pilotos da aventura são engenheiros com média de idade de 69 anos e grande experiência de voo, secundados por quatro coordenadores do projeto. A longa jornada percorreu 4.600 quilômetros da decolagem no Campo de Marte (SP) até Vilhena (RO) e São Paulo de novo. Nas escalas feitas, incluindo Bauru e Penápolis (SP); Três Lagoas, Campo Grande e Coxim (MS); Cuiabá e Tangará da Serra (MT), o grupo fez palestras sobre a aviação e realizou voos locais com estudantes, manteve contato com veteranos pilotos do Correio Aéreo, recebeu homenagens e doou livros sobre aviação a escolas e instituições culturais. Batizado de “Asas do CAN”, o reide teve o apoio em terra do Comando da Aeronáutica para segurança de voo, meteorologia, tráfego aéreo e guarda das aeronaves. E já tem programação para 2013: a primeira rota internacional do CAN, inaugurada em 1936 na linha de São Paulo a Assunção, no Paraguai, com escalas em Bauru (SP); Três Lagoas, Campo Grande e Ponta Porã (MS); e Concepción já em solo guarani. Acervo DL

Características

Refazendo antiga rota do can

Os empresários-pilotos festejam a homenagem ao CAN, que realizaram de 25/08 a 2/09, fazendo a rota São Paulo (SP)-Vilhena (RO)

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Zoológico de Brasília

Feras clonadas Está repercutindo pelo mundo o anúncio, feito no início de novembro, de que o Jardim Zoológico de Brasília, em parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), passará à segunda fase de um ambicioso programa de clonagem de animais silvestres. Coincidentemente, no mesmo período, a Universidade de Nottingham, do Reino Unido, noticiou a morte do biólogo Keith Campbell, que se destacou no primeiro experimento bem-sucedido de clonagem da história, o da ovelha Dolly, em 1997. Os cientistas brasileiros envolvidos no projeto estão trabalhando para adaptar técnicas de clonagem a mamíferos silvestres de espécies ameaçadas. A primeira fase envolveu a coleta do material genético, formando-se um banco de germoplasmas. Inicialmente, foram colhidas células de animais do Cerrado, como taman14

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duá-mirim (Tamandua tetradactyla), veado-cinzento (Mazama gouazoubira), onça-pintada (Pantera onca) e lobo-guará (Chrysocyon brachyurus). Este último, provavelmente, será o escolhido para o primeiro experimento do gênero no país. Dos 420 germoplasmas do banco de espécies, a maioria está na Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas do Instituto Chico Mendes. O maior problema para essas e outras espécies é a destruição contínua de seu hábitat natural. A nova fase deverá começar em janeiro de 2013, com o treinamento do pessoal do Zoológico de Brasília e a expansão da coleta para outros biomas. O convênio de cooperação técnica entre os parceiros consiste em transferir para o zoológico a tecnologia de clonagem de mamíferos que a Embrapa domina desde 2000. Em 2001, nasceu o primeiro clone produzido pela instituição de pesquisa

Os genes da majestosa onça-pintada estão entre os que formam o banco de germoplasmas da Embrapa para futura clonagem

do governo, a vaca Vitória, que viveu até 2011. Desde então, segundo fontes da Embrapa Cerrado, já foram clonados mais de 150 bovinos em pelo menos três laboratórios do país. Que a clonagem de mamíferos silvestres é viável foi comprovado em 2007 por pesquisadores da Coreia do Sul, que replicaram um lobo-cinzento com sucesso. Igual pesquisa se desenvolve nos Estados Unidos. No Brasil, o recurso não será usado para a política de conservação – ou seja, os clones não serão soltos na natureza –, mas para repor animais de zoológico. Os brasileiros tampouco vão recorrer a pesquisas ou pesquisadores estrangeiros. Assim como no setor de defesa, é importante que a tecnologia seja conquistada in totum, garantindo a autonomia do país nas áreas que dizem respeito à proteção do território e de suas riquezas.


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aviação militar

Sentinela alada do pantanal Na encruzilhada do Centro-Oeste brasileiro, um esteio de cidadania e de vigilância do espaço aéreo está sempre alerta: a Base Aérea de Campo Grande Gabriel García Márquez, o Nobel de Literatura da Colômbia, escreveu certa vez que, quando um recém-nascido estende a mãozinha e aperta pela primeira vez o dedo do pai, o agarrou para sempre. Com a Força Aérea Brasileira foi assim. Criada para proteger o espaço aéreo, ao voar pelo interior do país e incorporar as comunidades carentes e isoladas ao processo de integração do território nacional, agarrou o ideal do Correio Aéreo Nacional (CAN) de levar cidadania e ajuda material às populações mais carentes e isoladas. As tripulações do passado também identificaram os pontos estratégicos do território, onde a presença do poder aeroespacial seria obrigatória na defesa da soberania, lado a lado com o Exército e a Marinha. Um exemplo clássico disso é a cidade de Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul, escala da cruzada migratória do sul para o norte, situada num planalto de terra roxa perto da fronteira com a Bolívia e o Paraguai. Com mais de 8 mil quilômetros quadrados de área, a cidade ganhou status de capital em 1977, com o desmembramento do antigo estado do Mato Grosso. Hoje, abriga 802 mil habitantes e apresenta indicadores econômicos expressivos, como Produto Interno Bruto 16

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(PIB) de R$ 11,6 bilhões e PIB per capita de R$ 15,6 mil , conforme dados do IBGE de 2009. Sua topografia é entrecortada por cerrados, florestas e campos, e sua economia é largamente fundamentada na agropecuária. A origem de Campo Grande remonta a 1872, quando lá chegaram os primeiros imigrantes em busca de solo fértil e de boas pastagens. Era o Arraial de Santo Antônio de Campo Grande, que conquistou autonomia administrativa em 1899. Em 1932, o então Correio Aéreo Militar iniciou sua expansão pelo Centro-Oeste brasileiro, inaugurando a linha Rio de Janeiro-Cuiabá. Numa das etapas intermediárias, na cidade de Três Lagoas, havia uma densa floresta virgem que os pilotos levavam horas para cruzar. A escala seguinte, Campo Grande, se tornaria parada obrigatória e importante ponto de apoio da aviação no coração do Brasil. Naquele mesmo ano, o Exército implantou em Campo Grande um destacamento de aviação, iniciado com quatro militares que instalaram, com ajuda nativa, uma primeira pista de 600 metros de comprimento por 60 metros de largura, ampliada em 1933 para 1.400 m x 100 m. No ano seguinte, o comando do destacamento era exercido pelo te-

Cosme Degenar Drumond

nente aviador Hortêncio Pereira de Brito, que havia inaugurado a rota pioneira de Cuiabá e, em 1936, abriria a primeira linha do serviço aeropostal para Assunção, no Paraguai. O rápido crescimento da cidade influenciou as demandas da aviação. Em 1940, o Exército adquiriu uma fazenda nos arredores do destacamento, cuja topografia era mais adequada à infraestrutura aeroportuária. Ali nasceu a Base Aérea de Campo Grande, em 21 de agosto de 1944, já então na hierarquia do Ministério da Aeronáutica e compondo a estrutura da Força Aérea Brasileira (FAB), criados ambos em 1941. Durante anos, a nova unidade funcionou em apoio ao Correio Aéreo e à aviação civil. Em 1965, a base passou a sediar a Esquadrilha de Reconhecimento e Ataque 42 (ERA 42), com aeronaves NA AT-6 para vigilância aérea do Cerrado meridional. As operações ganharam vulto. Hoje, a grande unidade abriga os grupos de aviação 1º/15º, 2º/10º, o 3º/3º – esquadrões Onça, Pelicano e Flecha, respectivamente –, o Esquadrão Aeroterrestre de Salvamento Para-SAR e o Destacamento de Controle do Espaço Aéreo, responsável pela proteção ao voo e pelo controle do tráfego aéreo no estado.


Trabalhos relevantes A Base Aérea de Campo Grande é um complexo militar de envergadura. Dispõe, inclusive, de hospital próprio, configurando uma pequena cidade dentro da capital sul-matogrossense. Mensalmente, injeta na economia local cerca de R$ 17 milhões. Comandada por um coronel aviador, sua estrutura está voltada ao apoio da aviação, compartilhando espaço com o Aeroporto Internacional de Campo Grande, a apenas 7 quilômetros do centro da cidade. Todos os anos, o complexo realiza os eventos chamados “Portões Abertos”, recebendo a população, em especial nas datas do calendário festivo da aviação. Multidões são atraídas por apre-

sentações da Esquadrilha da Fumaça, demonstrações de resgate com helicópteros, saltos de paraquedistas, exposição de equipamentos militares e um animado encontro de automóveis antigos, tradicional na cidade. Cerca de 6 mil pessoas visitam anualmente suas instalações. A interação com a população civil é forte. São parcerias com instituições de ensino, que possibilitam aos alunos conhecer a infraestrutura do local e acompanhar a história da Força Aérea. Além disso, a espaçosa sala dedicada à preservação de um acervo aeronáutico de alto valor histórico é aberta permanentemente ao público, servindo de referência para trabalhos de pes-

Cap Drozdz/BACG

Super Tucanos no ar: vigilância e prontidão permanentes

quisa temática dos estudantes. Um “historiador de dia”, cargo ocupado por militares da reserva, dinamiza o convívio das gerações. A Associação das Senhoras da Aeronáutica, por sua vez, dirigida por esposas de militares, pratica ações humanitárias. Para ideia do alcance desse trabalho, nos últimos anos, mais de 65 toneladas de alimentos foram distribuídas à população carente, além dos donativos arrecadados pela grande unidade. Seja no apoio à aviação, seja nas ações sociais ou na defesa da soberania, o trabalho da Base Aérea de Campo Grande é relevante, como mostram as missões que seus esquadrões de elite cumprem em todo o país e no exterior. DEFESA LATINA

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Esquadrão Onça Nos anos 1960, a Força Aérea Brasileira iniciou sua primeira fase de renovação material. A frota que operava, recebida pelos acordos de cooperação militar assinados com os Estados Unidos por ocasião da Segunda Guerra Mundial, entrava em obsolescência. Do material de primeira linha, os equipamentos que exigiam substituição concentravam-se na aviação de caça e transporte tático, dois pilares de sustentação de qualquer força aérea. O Estado-Maior da Aeronáutica requisitou aeronaves de alto conteúdo tecnológico, maior capacidade de carga útil, melhor alcance e economia para substituir a frota. Foram então adquiridos materiais modernos. Nesse processo, a aviação de transporte deu um salto de qualidade. O pesado Fairchild C-82A “Vagão Voador”, empregado desde 1955 no 1º Grupo de Transporte de Tropa, no Campo dos Afonsos (RJ), foi aposentado. Sua versão mais nova, o C-119G “Flying Boxcar”, tinha alguns anos de vida útil pela frente e continuou voando, inclusive em apoio à Brigada de Paraquedistas do Exército. A chegada do robusto americano Lockheed C-130E Hércules, prateado e com teto branco, apelidado pelos pilotos brasileiros de “O Gordo”, e do canadense DH C-115 Buffalo (designação no Brasil), mudaram as feições no transporte tático. O Hércules deu maior eficiência às operações; o Búfalo adequou-se, indo além das expectativas no serviço pelo interior do país. Parecia ter sido feito sob encomenda do Brasil. Ao lado dos cansados C18

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119G e Douglas C-47, também à beira da extinção, as duas aeronaves deram um empuxo formidável aos esquadrões. Por essa época, já transitava nas pranchetas de São José dos Campos o bimotor Bandeirante, da Embraer, destinado a substituir o C-47. Em setembro de 1970, um novo esquadrão de transporte foi criado no Centro-Oeste. Simbolizado pela figura de um felino tipicamente brasileiro, que se distingue pela força com que domina seu hábitat, nasceu o Esquadrão Onça, que logo se destacou até em missões inusitadas. Durante a criação dos municípios de Vera (criado como homenagem às mulheres) e Sinop (onde radares do Sivam monitoram a Amazônia Legal), por exemplo, no norte do Mato Grosso, o C-115 Búfalo transportou de tudo, desde casas pré-fabricadas a rebanhos bovinos. Em Aripuanã, outro município ao lado de rios em região de difícil acesso, os pilotos se valeram de suas habilidades e experiência de voo para operar, utilizando como única referência de pouso a névoa da cachoeira de Dardanelos, no rio que deu o nome à cidade. Assim ocorreu também na construção da Transamazônica, de campos de pouso e no levantamento cartográfico do Brasil Central. Mas, como a evolução é inevitável, o Búfalo deixou saudades. Em janeiro de 1981, o novo produto da engenharia aeronáutica brasileira, que alcançaria tremendo sucesso comercial, com 500 unidades vendidas no mundo, desceu em Campo Grande: o Emb C-95B Bandeirante, versão militar. O

pequeno cargueiro demonstrou a acertada decisão da Força Aérea de requisitá-lo. Com quatro meses de operação, fez sua primeira missão internacional no Chile e na Argentina. No Brasil, voou na fronteira com a Bolívia e o Paraguai, levando suprimentos aos destacamentos de fronteira do Exército. Cumpriu missões na divisa do país com a Venezuela e a Colômbia. No Rio de Janeiro, apoiou a Brigada de Paraquedistas do Exército no Campo dos Afonsos. Em Goiânia, apoiou a Brigada de Operações Especiais. Em 1998, de uma única passagem aérea, lançou 11 fardos de 770 quilos de água e ração, uma operação de lançamento múltiplo de carga pioneira no Centro-Oeste, a serviço do Esquadrão Onça. Também realizou Missões de Misericórdia (MMi) – remoções de enfermos, feridos ou acidentados. Em 10 de setembro de 1985, por exemplo, sua tripulação teve que adotar recursos de improviso para pousar numa pista rudimentar de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, numa operação noturna destinada a socorrer e transportar para a capital gaúcha uma senhora com crise de insuficiência hepático-renal aguda, agravada por infecção. Diversos automóveis foram posicionados na pista, com os faróis acesos, e latas queimando gasolina, distribuídas nas laterais do campo, para orientação aos pilotos. A missão foi bem-sucedida. Em novembro de 2009, o C-95B se despediu de Campo Grande, transferido para o 4º Esquadrão de Transporte Aéreo, em São Paulo. Dois meses


SC-105 Amazonas do Esquadrão Pelicano, cuja missão típica é de resgate e salvamento

antes, o grupo campo-grandense havia recebido o novíssimo C-295 espanhol, chamado no Brasil de C-105 Amazonas. Com maior capacidade de carga útil e raio de ação, além de avançada aviônica embarcada, no início, o Amazonas teve dificuldade de adaptação às condições amazônicas. O trem de pouso frontal mostrou-se frágil em manobra de aterrissagem na região. A engenharia solucionou o problema. Desde então, C-105 tem se mostrado um excelente vetor da FAB. Agora em outubro de 2012, com cerimônia realizada no “Domingo Aéreo” do Parque de Material Aeronáutico (Pama) de São Paulo, foram comemoradas as 25 mil horas de voo da frota de doze unidades dessa aeronave, nos quadros da Força Aérea Brasileira desde 2007. De configuração versátil, é adaptável para missões ae-

romédicas, com capacidade de acomodar até 27 macas, e pode transportar 44 soldados equipados ou mais de 7 toneladas de carga útil. Opera como transporte VIP, para atender a autoridades em locais onde os campos de pouso são restritos ou inviáveis para jatos. Capaz de cobrir longas distâncias sem necessitar de pousos interme­ diários, transportou, em agosto de 2009, carga e pessoal militar para a África do Sul, onde o Brasil mantém interesses junto à indústria de defesa local na área de mísseis. Sua extraordinária tecnologia embarcada permite-lhe atuar no espectro da guerra eletrônica, em ambientes de condições precárias de luminosidade, voando a baixa altitude. Neste caso, a tripulação utiliza o sistema NVG (Night Vision Googles/óculos de visão noturna). As luzes externas da aeronave são controladas para voos de formação noturna.

O C-105 conta ainda com modo de comunicações seguro e sistemas de transmissão VHF com recursos de criptografia e saltos de frequência, permitindo à tripulação conversar com outros aviões de configuração semelhante, sem o risco de ter as conversas interceptadas e coletadas pelo inimigo em situações de conflito ou em ambientes hostis. Além desses sofisticados recursos, um eficiente sistema de autodefesa detecta se a aeronave está sendo rastreada, pois o Radar Warning System (RWR) informa à tripulação sobre rastreamento de cobertura radar. Dessa maneira, quando o RWR registra um pulso emitido por antena radar, imediatamente detecta o posicionamento da fonte emissora. Os recursos chaff and flares entram em cena, garantindo a autodefesa contra mísseis e radares diretores de tiro. Esse recurso são tiras metálicas que ficam suspensas no ar, emitindo DEFESA LATINA

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calor e funcionando como barreira mecânica ao pulso radar. Com isso, o sistema de guiamento do míssil é atraído pelo calor dos dispositivos, desviando-se da aeronave. Tudo isso deu ao Esquadrão Onça um novo patamar operacional e doutrinário. O avião parceiro do Amazonas no esquadrão é o C-98A Grand Caravan, empregado mais especialmente para missões administrativas e apoio aos destacamentos do Exército e da Marinha no Pantanal. Recebido em novembro de 2009, é equipado com aviônica de ponta e sistema de instrumento de voo integrado Garmin 1000, no qual telas de LCD substituem quase todos os instrumentos de voo convencionais. Os dados de voo são interpretados pelos pilotos de modo limpo e preciso. Em termos de transporte de carga, seu desempenho é similar ao do Bandeirante, podendo pousar e decolar de pistas curtas e não preparadas. O Cessna C-98A ainda serve de transição para o voo no Amazonas. O Esquadrão Onça tem um rico histórico de missões humanitárias. Em novembro de 2008, socorreu vitimas das enchentes em Santa Catarina, desempenhando igual missão no terremoto do Haiti, em janeiro de 2010, onde funcionou ainda como alerta para a ação continuada aos C-130 Hércules. Seu lema é Lançar, Suprir e Resgatar. Esquadrão Flecha O Brasil tem 16.886 quilômetros de fronteiras terrestres. Nessa faixa de divisa, estão situados dez países, 588 municípios e 11 estados brasileiros. Somente no Mato Grosso, são 750 quilô20

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metros de fronteiras. Sete destacamentos do Exército, do 2º Batalhão de Fronteiras, fazem o patrulhamento da linha matogrossense. Suas rondas são influenciadas pelo clima regional. Na época das cheias, o patrulhamento é feito de barco. A missão de proteger o espaço aéreo brasileiro no CentroOeste é do 3º/3º Grupo de Aviação, o Esquadrão Flecha. Até pouco tempo atrás, seus pilotos quase nada podiam fazer diante de alguma aeronave invasora, a não ser escoltá-la até a linha de fronteira. Isso mudou. Hoje, as tripulações têm poder de polícia em missão, podem disparar tiros de advertência para obrigar o avião clandestino a pousar e até abater o intruso, se necessário. Isso se tornou possível com base no Decreto nº 5.144/2004, que regulamentou o artigo 303 do Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei nº 7.565/1986). Desde então, têm sido muitas as apreensões de aeronaves voando no Brasil Central, transportando drogas e contrabando. A história do Esquadrão Flecha começou em 2004. É a aviação de caça no Centro-Oeste. Sua missão é a defesa aérea na região. Para isso, mantém-se permanentemente em estado de prontidão, pronto para decolar assim que acionado pelo Sistema de Defesa Aeroespacial Brasileiro. Nesses casos, em poucos instantes, uma aeronave armada A-29 Super Tucano decola para interceptar aeronave voando ilicitamente no Brasil. No campo do adestramento, suas tripulações participam de operações conjuntas com a Marinha e o Exército e com forças dos

países vizinhos. Entre os dias 22 e 27 de julho último, por exemplo, atuaram em conjunto com a Força Aérea da Bolívia na Operação Bolbra II. No lado brasileiro, as operações da Bolbra II partiram de Campo Grande. A força boliviana concentrou-se em Puerto Suárez, na fronteira com o Brasil, nos arredores de Corumbá (MS). Foram cinco dias de manobras, durante os quais as tripulações brasileiras operaram aeronaves Super Tucano, E-99, C-98 e C-97, atuando lado a lado com as aeronaves Cessna C-210, Pilatus PC-7 e Krarakorum K-8 dos bolivianos. O general de brigada aérea Weber Gonzalo Quevedo Peña, chefe do Departamento III de Operações do Estado-Maior General da Força Aérea Boliviana (EMGFAB), declarou na ocasião: “Todos os esforços destinam-se à defesa da sociedade, por meio de mecanismos de dissuasão a tráfegos irregulares. Isto serve para que a sociedade se sinta cada vez mais segura”. Os exercícios são importantes para aferir e aperfeiçoar o desempenho das tropas brasileiras e as das forças vizinhas. Em outro evento na região, a Operação Ágata 6, em outubro, foram patrulhados 4,2 mil quilômetros de fronteiras na divisa com a Bolívia e o Peru, entre Corumbá e Mâncio Lima, no Acre. Sob coordenação do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas, as manobras para combate a ilícitos fronteiriços, envolveram 7.500 homens das três forças em aviões de caça, helicópteros de combate, navios-patrulha, veículos blindados e outros equipamentos de ação em terra.


para hospitais. Participa ainda de campanhas de vacinação civil, mais frequentemente no Pantanal e na Amazônia. No início, operou aeronaves SA-16 Albatroz e helicópteros SH-19 Chicksaw, em apoio a comunidades carentes e prestando socorro a vítimas de calamidades públicas. Em 1967, recebeu helicópteros Bell UH-1H e aviões SC-95B Bandeirante SAR. Desde 2009, opera o SC-105 Amazonas e helicópteros UH-1H. As tripulações são treinadas em cenários difíceis e exaustivos. Onde houver a mais remota possibilidade de salvamento de vidas, na terra ou no mar, lá está o Esquadrão Pelicano. Em sua folha de serviços, constam buscas e resgates de vítimas do grande terremoto de maio de 1972 no Peru. Atuou

ainda em calamidades naturais na Bolívia, no Suriname e na costa da Argentina, em missões SAR. No histórico do esquadrão, são destaques as buscas ao C-47 2068 da Força Aérea Brasileira que, em junho de 1967, voando de Belém a Cachimbo, caiu próximo a Tefé. Atuou na dramática situação de enchente em Tubarão (SC), em 1971, e nas calamidades causadas pela chuva em Florianópolis, dois anos depois. Outro caso de repercussão que exigiu o concurso do Esquadrão Pelicano aconteceu em 1989, quando o Boeing 737-200 PPVMK da Varig, que se dirigia à capital paraense, perdeu o rumo e caiu na selva, na região de São José do Xingu (MT). O esquadrão teve também participação ativa nas buscas e no resgate dos cor-

Johnson Barros/BACG

Esquadrão Pelicano Originalmente, o Esquadrão Pelicano foi criado na Base Aérea de São Paulo, em Guarulhos, em 6 de dezembro de 1957. Quinze anos depois, foi transferido para a Base Aérea de Florianópolis (SC), onde permaneceu até janeiro de 1981. Fixou-se, desde então, em Campo Grande. Sua missão é tipicamente busca e resgate no Brasil e em países signatários dos tratados de busca e salvamento internacionais. Coleciona mais de 3 mil operações desse tipo, 30 mil horas de voo e 1.500 pes­ soas resgatadas. Mantém equipe em permanente prontidão para atender a chamados de socorro a qualquer hora, inclusive para atuar em catástrofes naturais e realizar remoções de emergência de pacientes em estado grave

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Salvar vid O currículo do comandante do Esquadrão Pelicano chama a atenção. Carioca, o tenentecoronel aviador Daniel Cavalcanti de Mendonça tem mais de 4 mil horas de voo no comando dos mais diversos tipos de aeronaves, desde Universal e Tucano, nos quais se graduou em novembro de 1993, a jatos HS125 e Boeing 737, de transporte de autoridades. É também piloto de helicópteros. Aprimorou a carreira em cursos operacionais (Tática Aérea, Busca e Salvamento, Tráfego Aéreo Internacional) e de especialização técnicoadministrativa (Comunicação Social, Economia e Finanças, Negociação de Contratos, Acordos de Compensação, entre outros). Tem certificado de Basic Financial Management Officer em curso feito nos EUA.

Nessa linha de formação profissional, o jovem comandante é formado em Educação Física pela escola do Exército, participou dos cursos obrigatórios inerentes aos postos que ocupou, como Aperfeiçoamento de Oficiais e Comando e Estado-Maior, cursou Cerimonial e Eventos na FAAP/SP e Gerenciamento de Projetos na Escola Nacional de Administração Pública (Enap). Instrutor de voo, é fluente nos idiomas francês, inglês e espanhol. Falando a Defesa Latina, o tenente-coronel Daniel conta um pouco do dia a dia do esquadrão. 22

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DL: Como reza o lema do Esquadrão Pelicano, sua missão é salvar vidas. Que tipo de operação é o mais frequente para os seus pilotos? TCel Daniel: A preparação para cumprir a missão destinada à unidade é diuturna e envolve os esforços de todo o efetivo. O Sistema SAR contempla a participação não só dos integrantes do Esquadrão Pelicano, mas de todas as unidades aéreas subordinadas à Segunda Força Aérea – II FAE. As ações de busca e salvamento são por ela coordenadas, sendo este comando operacional o responsável pela alocação dos meios SAR que melhor atendam às demandas surgidas. De acordo com as necessidades e com o cenário que se apresenta, são destinados os meios para atender à missão. Como integrante do sistema SAR brasileiro, o Esquadrão Pelicano realiza missões de localização e resgate de qualquer acidente ou necessidades afins em nosso país, na terra e no mar, com o objetivo de salvaguardar a vida humana. São também desenvolvidas ações de ajuda humanitária. Nessas ocasiões, é prestado apoio às vítimas de desastres naturais.

DL: Que tipo de especialização têm os integrantes do esquadrão? TCel Daniel: As qualificações dos militares da unidade são atreladas às missões que realizam. Dessa forma, os tripulantes do Amazonas dividem-se entre pilotos, mecânicos de voo, operadores de equipamentos de radionavegação e observadores SAR. Já os relacionados ao H-1H são pilotos, mecânicos de voo, operadores de equipamentos especiais e homens de resgate. Convém ressaltar, no caso particular dos homens de resgate, que seu treinamento lhes permite atuar como paraquedistas, mergulhadores e especialistas em ações de resgate e sobrevivência em ambientes hostis. Significa que eles podem atuar com propriedade no suporte às vitimas, vindo a ser fundamentais na viabilização da sobrevivência dos que necessitam de socorro. No efetivo, há ainda a presença do médico do esquadrão e de enfermeiros, que também têm capacidade e preparo para atuar nas funções de homens de resgate, além da formação específica de suas especialidades. É importante frisar que uma missão de Busca e Salvamento é fundamentalmente um trabalho de equipe. Cada integrante da tripulação precisa ter pleno conhecimento em sua área de atuação e passar por formação específica para atender a essa finalidade. A chave para o sucesso é o treinamento diuturno, aliado a uma doutrina sedimentada, fatores que, potencializados pelo envolvimento e comprometimento dos militares da unidade, são determinantes para que a missão seja levada a bom termo em quaisquer circunstâncias. DL: Embora com as missões se realizando no território nacional, já aconteceu de o esquadrão ter sido chamado para socorros internacionais? TCel Daniel: Em face de o Brasil ser signatário do Anexo XII da Organização da Aviação Civil Internacional (Icao), o Esquadrão Pelicano


idas

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pode ser engajado para atuar em apoio às nações amigas, mormente em países vizinhos da América do Sul, em ações de apoio a catástrofes naturais. Situações como estas ocorreram em 1972, no Peru, quando aquele país foi apoiado por ter sido vítima de um terremoto de grandes proporções, bem assim na Bolívia, em 2007, nas enchentes que assolaram aquele país. DL: Há treinamento para atendimento específico a catástrofes? TCel Daniel: Para fazer frente a esses e outros desafios, assim como para todos os outros envolvimentos da unidade, os treinamentos são diários e a prontidão é constante. Há equipe escaladas, em permanente alerta, 24 horas por dia, 7 dias por semana, para atender a quaisquer necessidade que possam surgir, tanto no nosso país, como no exterior. DL: Existe alguma diferença na essência das missões de busca e salvamento em comparação com os serviços sociais e humanitários prestados pelo Correio Aéreo Nacional? Tcel Daniel – Fazer menção ao Correio Aéreo Nacional é ter a satisfação de exaltar a coragem e o pioneirismo de dois homens: Casemiro Montenegro Filho e Nelson Freire Lavenère-Wanderley. Foi graças à perspicácia e ao destemor desses verdadeiros heróis nacionais que a integração dos mais longínquos rincões do nosso país se tornou possível. Como não admirar os feitos desses e de tantos outros abnegados? Como não valorizar os serviços prestados à Nação brasileira nos campos humanitário e social? As ações desenvolvidas por todos os que labutaram e labutam em missões do CAN e nas ligadas a busca e salvamento são, indubitavelmente, complementares. Não há como destacar uma ou outra atividade. Cada qual na sua esfera de atuação, foram e continuam sendo fundamentais para a consecução da mais nobre das missões: ajudar e, por que não dizer, salvar vidas humanas. As prementes e permanentes buscas por integrar e salvar, caminham ombreadas e exponenciam os benefícios apresentados à sociedade brasileira.

Com formação aprimorada, o tenente coronel Daniel tem várias especializações em comunicação

DL: Como o senhor avalia a presença feminina em funções que até bem pouco tempo eram ocupadas apenas por homens? Tcel Daniel: A presença das mulheres nas fileiras da Força Aérea Brasileira tem sido motivo de grande orgulho. Em todas as situações, a competência do corpo feminino foi característica marcante ao longo dos anos. Mais especificamente no que tange à aviação militar, nossos pilotos do corpo feminino têm se mostrado extremamente capazes, cumprindo missões em todas as aviações, estando entre elas as responsáveis pela condução das missões de busca e salvamento. O Esquadrão Pelicano conta atualmente com três pilotos militares do quadro feminino de oficiais, militares de grande capacidade, que operam nossos vetores com inequívoca competência, inclusive comandando missões, com especial destaque à aviação de asas rotativas. DEFESA LATINA

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em inglês de search and rescue, busca e salvamento). O aluno é preparado para tudo, inclusive resgatar corpos em decomposição ou fragmentados. Durante quase três meses, em cenários profundamente estressantes, o aprendizado chega ao limite físico e psicológico. Além disso, visitam institutos médico legais para aprender a lidar emocionalmente com as situações reais. O rigoroso treinamento inclui modos de acessar aviões sinistrados, combate a incêndio, operação de máquinas e instrumentos afins, mergulho livre, sobrevivência no mar e na selva, táticas de combate SAR, operações em ambientes de montanha e por aí afora. O Pelicano conta em seu efetivo com quatro militares do corpo feminino: as tenentes Márcia, Débora e Malta, pilotos

operacionais, e a sargento Rosana, da área de estatística. A tenente Márcia é instrutora do SC105 Amazonas; suas colegas são pilotos de helicóptero UH-1H. O Amazonas deu maior eficiência às missões de busca, por sua autonomia superior a 10 horas de voo sem reabastecimento, fator exponencial no sucesso das missões de localização de sobreviventes. Em breve, o helicóptero H-1H será substituído pelo H-36 Caracal, possibilitando ao esquadrão maior versatilidade e maior capacidade de operação. Reza a lenda que o pelicano, ave com enorme pescoço, quando não encontra alimento, rasga o próprio peito para oferecer carne e sangue aos filhotes. O lema do Esquadrão Pelicano é bem assim: “Para que outros possam viver!”.

Paulo Kasseb

pos dos passageiros do Boeing 737-800, prefixo PR-GTD, da Gol Transportes Aéreos, que caiu em 2006 no norte do Mato Grosso, quando voava de Manaus para Brasília e se chocou com o jato Legacy 600, prefixo N600XL, que fazia a rota inversa. O Legacy pousou em Cachimbo (PA); o Boeing desintegrou-se no ar. Em 2009, as equipes do esquadrão fizeram buscas ao Airbus A330203 F-GZCP, da companhia francesa Air France, o voo 447, que desapareceu no Atlântico, já fora do alcance dos radares brasileiros, quando voava na rota Rio de Janeiro-Paris. As equipes são dotadas de alto profissionalismo. Para recompletar as equipagens e aprimorar os conhecimentos, a Força Aérea forma especialistas em cursos regidos por regras internacionais do sistema SAR (sigla

O SC-105 Amazonas, em dia de “Portões Abertos” 24

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capa.indústria

Helicópteros mais brasileiros Fotos Helibras / Divulgação

Cosme Degenar Drumond

Inauguração em Itajubá: da esquerda, ministro Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; Eduardo Marson Ferreira, presidente da Helibras; Antonio Anastasia, governador de Minas Gerais; ministro Celso Amorim, da Defesa; Lutz Bertling, presidente da Eurocopter

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A Helibras, única integradora de aeronaves de asas rotativas do hemisfério sul, dá salto de qualidade para fabricar helicópteros de projeto brasileiro Com a presença de autoridades civis e militares e investimentos de R$ 420 milhões, a Helibras inaugurou em 2 de outubro, em Itajubá (MG), sua linha de produção para helicópteros modelos EC 725 (versão militar) e EC 225 (versão civil). Os investimentos são originários do contrato assinado em 2008 pelo consórcio HelibrasEurocopter com o Comando da Aeronáutica, no valor de € 1,9 bilhão, destinados à compra do EC 725 para as três Forças Armadas. Pelo acordo, a Helibras produzirá no Brasil 50 helicópteros multimissão de grande porte, agregando paulatinamente às aeronaves 50% de conteúdo brasileiro, de modo a atender às exigências da Estratégia Nacional de Defesa. A Helibras nasceu em 1978 no Vale do Paraíba paulista e mantém instalações em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, além da presença em Minas Gerais. Hoje, com participação superior a 50% na frota brasileira de helicópteros a turbina, a Helibras emprega um plantel de mais de 700 funcionários e produz de três a quatro dezenas de aeronaves por ano, de vários modelos, que fornece para os mercados civil, governamental

e militar. Seus produtos são de origem francesa. Mais de 600 helicópteros foram produzidos na fábrica da Helibras, com destaque para o Esquilo, modelo de larga aceitação comercial. Em 2011, o faturamento da empresa somou R$ 288 milhões. Quanto aos EC 725, quatro unidades do helicóptero militar já foram entregues – três em dezembro de 2010 e uma em julho de 2012. Para as próximas entregas, as aeronaves já se encontram na fábrica de Itajubá para apronto final, estando entre eles o modelo que servirá como referência para o desenvolvimento e a integração de sistemas. É também dessa leva a aeronave EC 225 utilizada pela presidente da República, Dilma Rousseff, em seus deslocamentos. De acordo com o cronograma de trabalho, a totalização da encomenda será finalizada em 2017. E até 2020, anunciam executivos da Eurocopter e da Helibras, deverá sair da linha de produção inaugurada em Minas o primeiro helicóptero 100% brasileiro. Apesar do compromisso recente da empresa de atender a exigências de transferência tecnológica e participação da indústria brasileira no projeto, a


O EC 725 adquirido pelo Brasil: aqui na vers達o militar

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Helibras conhece o tamanho e as complexidades do desafio de aumentar o nível de nacionalização de peças e componentes. Um dos motivos que impediam a agregação de conteúdo brasileiro expressivo às aeronaves era a falta de capacitação tecnoindustrial dos fornecedores. No passado, por exemplo, uma grande empresa nacional se interessou pelo negócio, mas desistiu depois de analisar detidamente os complexos desafios da engenharia aeronáutica nesse campo. A insuficiência de capital humano especializado era outro fator impeditivo. Além disso, não havia ainda no Brasil uma política de estímulo à nacionalização de partes de helicópteros. Assim, a Helibras permaneceu como montadora, diretamente vinculada ao grupo Eurocopter francês, que, por sua vez, integra a multinacional European Aeronautic Defence and Space Company (EADS). No controle acionário da Heli-

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bras, o Brasil tem participação minoritária: 25%, detidos pelo governo de Minas. Novos tempos Nos últimos anos, o pensamento político em relação à indústria estratégica mudou no Brasil. A Estratégia Nacional de Defesa, aprovada em dezembro de 2008, estabeleceu importantes diretrizes de reorganização do setor produtivo, priorizando a obtenção de autonomia tecnológica. Nesse mesmo ano, o governo federal contratou com a Eurocopter o fornecimento de dezenas de helicópteros multimissão EC 725 para as Forças Armadas e várias unidades do modelo civil da aeronave, o EC 225, destinados à Petrobras. A meta proposta seria produzir a maior parte da encomenda na fábrica da Helibras, com participação de empresas brasileiras no programa, desde a fabricação até o ciclo de vida das aeronaves. O empreendimento recebeu apoio

de lideranças políticas, empresariais e governamentais. A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) reuniu uma centena e meia de industriais de setores variados durante a apresentação das oportunidades oferecidas pelo programa. Como facilidade para a adesão industrial, o BNDES disponibilizou uma linha de financiamento às empresas interessadas, para a aquisição de maquinário e capacitação técnica. O processo de seleção já definiu vários parceiros da Helibras. A Eurocopter é autossuficiente em tecnologias de helicópteros. É também pioneira nas áreas de turbina, materiais compostos e inovações como os sistemas Fly by Night e Fly by Wire de suas aeronaves. Antigo fornecedor no mercado brasileiro, o grupo manifestou-se favorável a transferir para o país algumas tecnologias de alto valor, as operações de manutenção e as evoluções futuras dos helicópteros, até o


Fotos Helibras / Divilgação

máximo de 50% de conteúdo de fabricação. A EADS, fortalecida no país através da subsidiária EADS Brasil, ratificou a decisão de sua controlada e desenvolveu um trabalho de ajustes de suas conveniências empresariais e comerciais à proposta brasileira. O executivo Eduardo Marson Ferreira, então diretor da EADS Brasil, foi um dos condutores dessa operação. Com excelente trânsito nas esferas política, militar e governamental, Marson destacouse também em outras conquistas contratuais da EADS no Brasil – a venda do transportador tático militar espanhol (SC-95 Amazonas, no Brasil), a modernização de plataformas de patrulhamento marítimo (P-3), ambos para a Força Aérea Brasileira, entre outros negócios na área civil. Alçado à presidência da Helibras, caberia a ele conduzir o empreendimento dos helicópteros pesados, de cujas negociações também havia participado. O passo dado em 2 de outubro, com a inauguração da

nova linha de produção para os helicópteros militares e sua versão civil EC 225, destinada ao transporte entre o continente e as plataformas de exploração de petróleo em alto-mar, foi marcante. A cerimônia não deixou dúvidas sobre a importância de uma Helibras mais brasileira. Empresários, ministros, governadores, prefeitos, parlamentares e comandantes militares compareceram ao evento. Discursos inflamados, de elogios e de otimismo, reverberaram pelo enorme pavilhão da fábrica momentos antes do corte da fita inaugural. Este salto de qualidade da Helibras acarretou investimentos em infraestrutura, incluindo obras e inovações essenciais à manufatura, que implica cinco grandes etapas – montagem, instalação elétrica, pintura, testes e manutenção –, implicando 18 mil horas ou dois anos de trabalho para aprontar cada aeronave, e também programas de treinamento. O conteúdo nacional agregado subirá gradualmente para 50%, havendo já 14 fornecedores brasileiros de partes, peças e serviços devidamente credenciados e contratados. Há ainda técnicos, mecânicos e en-

genheiros brasileiros em treinamento na França e no Brasil, em processo acompanhado pelo governo federal. Inovações A inauguração da nova fábrica é um marco para a indústria brasileira, devendo representar um polo gerador de conhecimentos de ponta e de capacitação tecnológica para empresas, governo e Forças Armadas. Na opinião do presidente da Helibras, as novas instalações permitirão à empresa adquirir maior autonomia na fabricação de helicópteros. “Com o apoio do governo federal e do estado de Minas Gerais, um Centro de Engenharia será construído em Itajubá e convênios serão firmados com instituições mineiras de pesquisa e desenvolvimento”, diz Eduardo Marson. A fábrica foi construída a partir de técnicas avançadas de engenharia. Os materiais usados na construção das instalações atendem a modernos conceitos de sustentabilidade, desde a preparação do terreno de 12 mil metros quadrados. Os materiais das estacas não usadas, por exemplo, foram doados à Prefeitura de Itajubá para utilização em obras locais. A arquitetura do prédio principal privilegia o con-

A edificação é baseada em sustentabilidade; dentro dela, já estão todos os helicópteros a serem entregues às Forças Armadas até 2017 DEFESA LATINA

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Parcerias nacionais já firmadas

Inbra Aerospace participa com hardware Em mais um passo importante para ampliar o conteúdo brasileiro dos helicópteros EC 725, a Inbra Aerospace assinou novo contrato com a Helibras para fornecimento da blindagem das aeronaves. A Inbra já havia sido contratada para fornecimento de capôs e carenagem do cone de cauda e estrutura intermediária em material composto para o EC 725, tecnologia até agora inexistente no Brasil. Após rigoroso processo de seleção, que durou seis meses e do qual participaram empresas brasileiras e europeias, a Inbra foi a escolhida por já dispor da tecnologia exigida pela Helibras e por ser uma fornecedora qualificada pelo consórcio com a Eurocopter. “A proximidade com a Helibras para desenvolvimento das blindagens disponíveis no modelo Esquilo e o domínio da tecnologia nos modelos EC 725 foram fundamentais para a escolha da Inbra, além do fato de todo o trabalho ser realizado no Brasil. Com isso, a Helibras poderá acompanhar de perto tanto o desenvolvimento como a integração com os demais sistemas a serem instalados nos helicópteros”, diz Eduardo Mauad, vice-presidente executivo da Helibras, responsável pela cooperação industrial. Para o presidente da Inbra Aerospace, Jairo Cândido, a transferência de tecnologia da Eurocopter para a Inbra Aerospace representa importante mudança de patamar na capacidade tecnológica, proporcionando conhecimento para a empresa avançar na produção de peças simples, como acabamentos internos, de nível 2 e 3, já que produz atualmente peças complexas integrantes da estrutura da aeronave, de nível 1. “A parceria é uma oportunidade excepcional de evolução dentro do mercado aeroespacial”, completa o presidente da Inbra Aerospace. Este novo contrato não será limitado ao desenvolvimento de soluções específicas para os helicópteros EC 725. Como a Inbra já é fornecedora da Helibras em outros projetos, novas oportunidades de negócio envolvendo a tecnologia de blindagem serão estudadas pelas duas empresas.

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trole da temperatura ambiente, com uso de luz solar na parte interna, inclusive para aquecimento da água dos chuveiros. A ventilação funciona em conjunto com as tecnologias adotadas na edificação, permitindo economizar energia. Outra inovação relaciona-se com a água da chuva no perímetro do hangar, a ser recolhida e usada nos processos industriais. Os conceitos de sustentabilidade adotados beneficiam ainda o programa de coleta seletiva de material reciclável, cerca de quatro toneladas/mês de materiais diversos. Quanto ao capital humano, o crescimento da demanda de helicópteros nos últimos três anos teve como consequência a multiplicação por seis vezes do número de engenheiros empregados, que saltou de 9 para 70 profissionais. Segundo o presidente da Eurocopter, Lutz Bertling, o grupo está pronto para iniciar entendimentos sobre a possibilidade de, no futuro, construir um helicóptero de projeto brasileiro. Para Eduardo Marson, o programa de expansão da empresa demonstra a maturidade do Brasil no setor aeronáutico e de defesa. O Centro de Engenharia recebeu o Design Authorized Organisation Certificate – Nível1, certificado concedido pela Eurocopter, que elevou a Helibras ao quarto pilar de engenharia do grupo, juntamente com a França, a Alemanha e a Espanha. Ele explica: “Isso significa que, em breve, a empresa terá condições de oferecer seus produtos em muitos outros mercados, com atenção especial para potenciais clientes entre os pa-


Marcelo Kahn/Atech

Muta: administrando a capacidade de absorção e desenvolvimento de novas tecnologias da Atech

Atech entra com software A brasileira Atech, empresa do Grupo Embraer, e a Cassidian, da divisão de defesa e segurança da EADS, uniram-se para formar o consórcio internacional que responderá pelo fornecimento do sistema de gestão tática de dados para oito dos 50 helicópteros contratados pelo Brasil – no caso, os EC 725 destinados à Marinha Brasileira –, anunciaram as conveniadas no início de novembro. As aeronaves fazem parte do Programa H-XBR conduzido pelo consórcio Helibras-Eurocopter, cujo cerne é a contratação conjunta de fornecedores para as Forças Armadas e guarda relação com a visão da Estratégia Nacional de Defesa (END) para a indústria, compreendendo a criação de estrutura e capacitação nacional para produção local da tecnologia necessária, inclusive aeronaves de asas rotativas. “Participar desse consórcio, atuando no programa do Ministério da Defesa do Brasil, coordenado pela Força Aérea, é uma grande honra e responsabilidade para uma empresa que tem se dedicado ao domínio da chamada ‘tecnologia crítica’”, afirma Tarcísio Takashi Muta, presidente da Atech, destacando a capacidade e a experiência da empresa na absorção de tecnologia de defesa, sistemas embarcados em aeronaves e comunicações táticas de alto desempenho. Sob supervisão do novo Centro de Engenharia da Helibras, a empresa do Grupo Embraer também responderá pela integração de sistemas e apoiará os testes em solo e em voos na fábrica da empresa, em Itajubá (MG). “A exemplo do que já faz em relação ao helicópteros militares, como o Esquilo e o Pantera, a Helibras tem expertise no acompanhamento de processos de integração de sistemas”, explica Eduardo Marson, presidente da empresa, que ressalta os pesados investimentos feitos pela Helibras no desenvolvimento dessa especialidade para atender ao programa de fabricação dos EC 725. Convém não esquecer a larga experiência da Cassidian em aviônica, inclusive como fornecedora de diversas plataformas operadas pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Daí a segurança do CEO da Cassidian, Rolf Wirtz, ao afirmar que, juntas, as duas empresas irão “prover a Marinha do Brasil com um sistema confiável e versátil, que irá capacitá-la para desempenhar suas missões de vigilância marítima”, apoiando também a e segurança das tripulações. É que o sistema de gestão tática de dados (TDMS na sigla em inglês) a ser desenvolvido aqui pela Atech é baseado no sistema de gerenciamento de missão (Samsara) da Cassidian. Por outro lado, o currículo da Atech, especializada em soluções de comando e controle, lidando com sistemas tecnológicos complexos, é um dos mais destacados na área de defesa e segurança no país. Tendo participado de um dos maiores e mais importantes projetos brasileiros, o Sivam / Sipam (Sistema de Vigilância e Proteção da Amazônia), atuou também no projeto P-3 na Espanha, em programa da FAB de transferência de tecnologia. Selecionada para o delineamento arquitetônico do Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (Sisfron), do Exército Brasileiro, além de participar em outros programas do governo e das Forças Armadas, a Atech vem se posicionando como empresa estratégica para garantir a autonomia tecnológica desejada pelo país. Uma das atividades atuais da empresa nesse sentido é o desenvolvimento do sistema de instrumentação e controle do futuro reator nuclear do Laboratório de Geração de Energia Nucleoelétrica (Labgene), para o que foi contratada pelo Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP).

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Um dos EC 725 da Marinha que terão sistema de gestão tática de dados fornecido pelo consórcio Atech-Cassidian

íses circunvizinhos, os quais, a meu ver, também serão beneficiados com a transferência de tecnologia, que capacita empresas e profissionais. Tratase de um momento único, que trará benefícios estratégicos para a indústria aeronáutica e para a defesa regional”.

Além da parceria com a indústria, a Helibras assinou convênios com instituições acadêmicas. Com a Universidade Federal de Itajubá (Unifei), definidas as áreas de estudos e de pesquisas conjuntas entre técnicos da empresa e estudantes de en-

genharia, a parceria estará focada em desenvolvi­mento de aviônicos, especialização em matérias-primas para fabricação de materiais compostos, viabilização de uso de novas ligas metálicas e aplicações de simulação computacional nas linhas de montagem, entre outros temas estratégicos. Para os estudantes, os benefícios são significativos, como oportunidades de estágio e de estar em contato com o que há de mais atual em tecnologia, produtos e processos, já que serão capacitados para trabalhar em qualquer empresa aeronáutica. Poderão ainda usar o Centro de Treinamento da Helibras para realizar tarefas práticas e provas. Já as definições da parceria com a Unifei foram estabelecidas durante um seminário de oportunidades realizado em Itajubá no início do ano. O processo continuará realizando a triagem das propostas apresentadas para o estabelecimento de novas prioridades.

Em Itajubá, a Helibras deverá funcionar como âncora de um polo de tecnologia de asas rotativas

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Holger-Ellgaard

segurança pública

Polícia sueca gentil e ineficiente

Por não resolver a maioria dos crimes praticados no país, a corporação pode estar às vésperas de uma reforma estrutural

As agentes femininas são numerosas na Polícia Sueca, que já foi dirigida por uma mulher

João Lins de Albuquerque

A moderna polícia sueca (Svenska Polisen), uma das mais bem aparelhadas da Europa e, de acordo com o índice da organização Transparência Internacional, a quarta menos corrupta do mundo, chegou ao século XXI apoiando-se num inseparável pensamento sistêmico: a imagem da polícia, que em grande parte depende da mídia, é o ponto inicial para a comunicação e a aceitação da instituição pela população. Na Suécia, onde a história da corporação pode ser acompanhada desde 1820, a polícia é uma das autoridades públicas mais visíveis e escrutináveis da sociedade. Embora o país apresente baixos índices de criminalidade em comparação com outras nações – inclusive as europeias –, sua polícia não é poupada de críticas sobre abusos e ineficiências, que são prontamente denunciados pela 34

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sociedade. O crime, como em outras regiões de mundo, cria muitas manchetes, e os esforços da própria polícia são, invariavelmente, questionados pelos veículos de comunicação. Por isso, parte-se do princípio de que, para ter credibilidade e ser respeitada, a polícia deve ser visível, estar presente e servir indistintamente todos os segmentos da sociedade da melhor forma profissional possível. A colaboração com a sociedade civil, aliás, começa nas praças públicas, como podem constatar os visitantes da capital, Estocolmo, no período de temperaturas amenas de junho a setembro. Nos eventos públicos mais destacados do período, como os festivais para a juventude, a polícia sueca se faz presente – assim como as Forças Armadas – com suas tendas de informação, seus equipamentos mais modernos, jogos e com-


Bengt Nyman

Montando guarda em um parque de Estocolmo

petições variadas. O objetivo é aproximar-se do povo e atrair jovens de ambos os sexos para seus quadros. Como resultado desses esforços, em 2011, cerca de 17 mil jovens candidataramse para a Academia de Polícia, 670 dos quais foram admitidos. Mas as forças de segurança suecas não limitam suas estratégias de recrutamento a fazer charme em iniciativas de relações públicas. Está presente também nas escolas primárias e secundárias, em palestras universitárias, nos centros de serviço social, nos hospitais, no rádio e na televisão. Além disso, utiliza as exposições do Museu da Polícia para ir além do histórico e dinamizar ainda mais o diálogo com a população, em particular em programas direcionados aos jovens e às crianças. O Museu da Polícia, em Estocolmo, tem mais de 10 mil itens em seu acervo e, apesar de ser pago (cerca de

R$ 12 por pessoa), atrai semanalmente quantidade surpreendente de curiosos e de crianças em idade escolar. De acordo com as autoridades suecas, se não conhecer como a população percebe as ações dessa autoridade, ficaria difícil para o Estado “desenhar a comunicação da autoridade policial”. Esse conhecimento é importante também para todas as tomadas de decisão dentro da própria polícia, que não perde oportunidades de apresentar uma imagem clara e relevante de suas tarefas, operações e resultados, sem perder de vista a transparência na execução de suas atribuições. Ordem pública e combate ao crime Historicamente, o princípio político que dá sustentabilidade à segurança pública é o bom desempenho dos efetivos poli-

ciais, através de mecanismos de prevenção e repressão ao crime. Nesse sentido, parte importante dos objetivos é atingida por meio de colaboração da sociedade civil mobilizando vários atores, como escolas municipais, centros de atividades pósescolares, serviços de assistência social, entre outros, que podem influenciar na redução da criminalidade e contribuir para o aumento da segurança pública. Nas principais cidades do país, são realizados com frequência “fóruns de colaboração”, envolvendo jovens e a polícia, tendo em vista o combate ao crime, o fortalecimento dos serviços de segurança e ações de contingência para situações emergenciais. Outra forma de liaison é o trabalho voluntário de pessoas que atuam em províncias, comunidades e bairros, em variadas tarefas e em diferentes graus de envolvimento, que vão desde entrega DEFESA LATINA

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Albin Olsson

Desenho do cartunista brasileiro Carlos Latuff, publicado no jornal alternativo Lasarnas Fria Tidning, critica a polícia sueca por ter detido ativistas que protestavam contra uma passeata pró-nazismo

Michael Kazarnowski

O blindado Sandcat, da polícia de Gotenburgo

Na Parada Gay de Estocolmo, policiais têm grupo de representação e desfilam de uniforme

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de panfletos sobre prevenção criminal até intervenção pessoal em áreas difíceis, onde a incidência de problemas sociais ou de crimes é maior. Para além das missões tradicionais, comuns às forças de segurança em geral, a polícia sueca inclui atividades como socorro em situações de acidentes ou catástrofes, planejamento urbano, educação de menores e assistência social. A polícia – na ausência do Corpo de Bombeiros – não se recusa a atuar no salvamento de animais, como cães e gatos, em perigo, ou na proteção dos direitos das minorias. Nesse item, como uma das sociedades mais avançadas em garantia dos direitos civis, os suecos admitem normalmente a presença de policiais gays nas fileiras da força. Muitos desses comparecem uniformizados na Parada Gay de Estocolmo, que reúne milhares de pessoas dos mais diferentes segmentos sociais. Outra evidência desse traço é a participação feminina em seus quadros, uma tradição iniciada em 1904, quando elas tratavam principalmente de casos envolvendo mulheres e crianças. Hoje, a polícia sueca emprega cerca de 28,5 mil pessoas, das quais 40% são mulheres. Descontando o pessoal civil, que trabalha com a burocracia, 21 mil são agentes uniformizados, sendo 30% mulheres. Esse é o tamanho da força responsável por prevenir, combater e investigar crimes em âmbito nacional e local nas 21 províncias da Suécia, cuja população é estimada em 9,5 milhões de habitantes. Comparando: São Paulo, com 93 mil policiais, atende a aproximadamente 41 milhões de habitantes no estado.


Salomon Abresparr

População cidadã protesta e dá trabalho à polícia até na terceira idade

Em 1981, uma mulher assumiu pela primeira vez a função de comandante da força. Estrutura moderna e aparência impecável A Junta Nacional de Polícia, Rykspolisstyrelsen, é a autoridade administrativa central e de supervisão do serviço policial sueco. Ela controla o Laboratório Nacional de Ciências Forenses e responde pela modernização dos métodos de trabalho, pelo apoio administrativo e pelo desenvolvimento tecnológico da atividade, além de se ocupar da formação profissional, através da Academia Nacional de Polícia.

O Birô Nacional de Investigação (BNI), Rykskriminalpolisen, sendo o órgão encarregado de combater o crime organizado, é responsável pelos contatos para a cooperação policial internacional. Assumindo a administração das operações policiais em caso de crise, o BNI tem cinco divisões: gabinete do comandante-geral da Polícia, Divisão de Controle de Fronteiras, Divisão de Cooperação Policial Internacional, Divisão de Inteligência Criminal e Divisão de Operações Especiais. A Polícia Secreta, Säkerhetspolisen (Säpo), com cerca de mil funcionários, responde pelo

Departamento de Segurança da Suécia e atua em contraespionagem, combate a atividades terroristas, defesa da Constituição, proteção a questões políticas, reais e confidenciais. É dela a obrigação de detectar e tomar medidas diante de qualquer ameaça ou atentado contra a segurança nacional. Quanto às operações de inteligência militar, elas são legalmente restritas às Forças Armadas Suecas (Must). As três maiores cidades do país – Estocolmo, Gotemburgo e Malmo – contam ainda com uma polícia especial (Swat) para as operações de emergência. Outra preocupação envolvendo a imagem da polícia sueca é a DEFESA LATINA

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Quase todos os policiais portam cinto, equipado com uma arma de serviço com carregador monofilar (em geral do tipo SIG Sauer P226, P228 e P239), bastão expansível, algemas, um rádio Sepura, um celular Nokia, spray de pimenta, chaves e luvas. Carregam ainda uma mochila desdobrável com equipamento adicional, incluindo máscara contra gás e colete de segurança. A maioria porta ainda um rádio Rakel de comunicação. Como os sistemas de rádio podem ser invadidos, a corporação usa, para comunicações mais sensíveis, um tipo de telefone celular praticamente impossível de ser interceptado.

Press Euro

apresentação pública de seus veículos e equipamentos. Aparelhados com as armas mais modernas e eficientes da atualidade, os policiais suecos são orientados a não exibi-las gratuitamente, para não intimidar a população civil. Todos os equipamentos de repressão ao crime devem ser utilizados somente em caso de necessidade. Para todas as funções, do patrulhamento urbano às intervenções mais complexas, o agente deve apresentar-se impecavelmente vestido em seu uniforme azul, como parte da imagem positiva que a corporação procura instilar na sociedade. Todos são obrigados a levar sobre o uniforme uma identificação visível, além do símbolo heráldico da organização: as três coroas de ouro que são o emblema do reino da Suécia.

Em 2011, o Svenska Dagbladet reproduziu sua manchete de 28 de fevereiro de 1986, que noticiou o assassinato de Olof Palme, salientando que isso “apagou para sempre a imagem da Suécia como país seguro"

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Educação e aprimoramento profissional Para admissão nos quadros da polícia sueca, a pessoa deve demonstrar competência social, tem­peramento estável e ser capaz de responder com tranquilidade e autoconfiança às situações mais difíceis. Sem essas três qualidades básicas, o candidato tem pouca chance de ser aprovado. Além disso, os aspirantes devem ter estudos secundários completos, dominar o idioma sueco, demonstrar conhecimentos sobre história e ciências sociais. Outros pré-requisitos incluem: habilidade para línguas estrangeiras, experiência, habilidades técnicas em outros ramos de ocupação (como enfermagem, por exemplo), ou ter ocupado cargos de confiança. A Academia de Polícia abre o processo seletivo para seus quadros duas vezes ao ano,

uma em cada semestre. Se aceito, o aspirante à carreira policial é submetido a treinamento intensivo por seis meses, depois do que passa a trabalhar na corporação, podendo participar de operações de emergência. Durante o processo educativo, o aspirante é também submetido a um curso de estratégia de liderança (direta e indireta). Isso porque uma das áreas mais importantes no ambiente de trabalho é o apoio interno a policiais expostos a violência ou que sofreram ameaças no desempenho de suas funções. Após ter superado todas essas exigências – incluindo exames médicos, testes físicos, psicológicos e de conversação – o aspirante é admitido nos quadros da polícia, sendo testado por mais seis meses. Se aprovado nessa última etapa, passa a trabalhar imediatamente como “policial assistente”, com um salário inicial de 26 mil coroas (aproximadamente R$ 8 mil). Depois de 8 anos de carreira, é automaticamente convidado a ocupar o posto de inspetor. Passada mais essa jornada, pode candidatar-se a comissário, que é o cargo mais alto na hierarquia da Polícia Sueca. Baixa eficiência na solução de crimes Estudos divulgados neste ano de 2012 indicam que as autoridades policiais da Suécia continuam gozando de alto respeito entre a população do país. Além do quarto lugar entre as polícias menos corruptas, atrás apenas de Finlândia, Dinamarca e Nova Zelândia, é também a que apresenta o menor número de pes-


Holger-Ellgaard

Museu da Polícia: atraindo adultos e crianças

soas mortas por seus quadros. Comparando: o Brasil ocupa, segundo a mesma Transparência Internacional, o 72º lugar. Apesar dessa posição confortável, a polícia sueca vem sendo severamente desaprovada, sobretudo por sua ineficiência em solucionar boa parte dos crimes cometidos na Suécia. Por causa disso, Leif G.W. Persson, respeitado professor de Criminologia do país e celebridade internacional na área, advoga uma profunda reforma nos quadros e serviços policiais. Diz ele que, se 25% dos policiais suecos fossem demitidos, o país não sentiria nenhuma diferença. O catedrático, autor de uma dezena de livros, foi um dos mais severos críticos à atuação da polícia no assassinato do primeiro-ministro Olof Palme, em 1986. Até

hoje, ninguém sabe quem disparou contra Palme e ninguém foi processado pelo homicídio, cometido em plena rua, quando o governante saía de uma sessão de cinema com sua mulher. Em 2007, a TV sueca ouviu 2.500 pessoas sobre a imagem e o desempenho da polícia. Resultado: 70% dos respondentes criticavam o desempenho policial em várias de suas atribuições. Em 2012, de acordo com o jornal Dagens Nyheter, apenas 17% de todos os crimes foram solucionados – a cifra mais baixa em 80 anos. Críticas internas registram ainda problemas de corporativismo na força, destacando que a maioria dos policiais teria dificuldade de reportar crimes ou irregularidades praticadas por seus colegas durante o desempenho de suas funções.

Em 2008, a mídia denunciou brutalidade policial “desnecessária” no caso de um jovem de 24 anos que foi morto depois de preso em Gotenburgo. Um relatório de 2010 da Escola de Polícia (Polishögskolan) revela que, nos últimos anos, pelo menos 30 pessoas perderam a vida em conexão com intervenções da polícia, de seguranças privados e em clínicas para pessoas com problemas psíquicos. A recíproca não é verdadeira: desde 1900, apenas 31 policiais suecos perderam a vida no cumprimento do dever. A pior década foi a de 1920, quando seis policiais foram mortos. Assim, não é de admirar que a própria ministra da Justiça, Beatrice Ask, não poupe críticas à atuação da polícia e a sua atual estrutura operacional. DEFESA LATINA

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HISTÓRIA programa antártico

Trabalhos ininterruptos Como é o continente mais frio, mais seco, com maior média de altitude e maior índice de ventos fortes do planeta, a Antártica, ou Antártida, é considerada uma das localidades mais inóspitas à vida humana. Ali se registrou a temperatura mais baixa da Terra: -89,2º C. Por isso mesmo, os cientistas que trabalham na região esperam a chegada do verão para suas pesquisas de campo. O grito de “avançar” foi dado por eles no início de outubro, depois de grandes preparativos. Hoje, 29 países possuem bases científicas na Antártica: África do Sul, Alemanha, Argentina, Austrália, Bélgica, Bulgária, Chile, China, Coreia do Sul, Equador, Espanha, Estados Unidos, Federação Russa, Finlândia, França, Índia, Itália, Japão, Nova Zelândia, Noruega, Peru, Polônia, Reino Unido, República Checa, Romênia, Suécia, Ucrânia e Uruguai. E o Brasil, naturalmente, para o qual as atividades foram mais frenéticas, porque, dado o incêndio de 25 de fevereiro, que destruiu boa parte da Estação Comandante Ferraz, os desafios neste ano vão além das dificuldades para pesquisar e se alojar, pois estão programadas a instalação de módulos polares emergenciais e a desmontagem e remoção dos escombros, que preocupam em termos de preservação do meio ambiente. Apesar de tudo, para aproveitar a boa temperatura na costa, que é de -10º C (é de -40º C no interior do continente), suspen40

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deu do Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro no dia 6 de outubro o navio polar (NPo) Almirante Maximiano, para dar início à Operação Antártica XXXI (Operantar 31), que dura de novembro até março do ano que vem. Na mesma data, decolaram do 1° Esquadrão de Helicópetros de Emprego Geral (HU-1) para embarque no navio as aeronaves Águia 7062 e Águia 7063, que participarão da temporada de trabalhos com sua tripulação de quatro oficiais e nove praças, como helicópteros orgânicos do “Tio Max”, como é chamado desde sua incorporação à MB, em fevereiro de 2009. Na partida, com parentes e amigos cercando os viajantes, o comandante do navio, capitão de mar e guerra Newton Calvoso Pinto Homem, acentuou: “Fizemos uma excelente preparação para a viagem, tanto na parte de equipamentos quanto no psicológico de nossos militares”. Medidas importantes, pois todos, assim como os cientistas e pesquisadores das universidades associadas ao Programa Antártico Brasileiro (Proantar), ficarão sete meses fora, em condições menos satisfatórias do que de hábito e com o fantasma do incêndio para assombrar as noites solitárias e geladas da Antártica. Até chegar ao destino, o navio passou pelos portos de Rio Grande (RS), Buenos Aires e Ushuaia (Argentina) e Punta Arenas (Chile). Depois, se unirá a mais duas naves da Marinha

do Brasil, o Ary Rongel, de apoio oceanográfico, e o Felinto Perry, de socorro submarino. Participarão ainda da Operantar 31 o navio de apoio logístico ARA San Blas, da Marinha Argentina, e o mercante Germania, alugado pela Marinha para apoiar o desmonte da Estação Antártica Comandante Ferraz (EACF) e a instalação dos módulos antárticos emergenciais. A operação vai ter participação do Ministério do Meio Ambiente, cujos técnicos farão a análise de impacto ambiental do desmonte, e da Força Aérea Brasileira, que dará apoio com 10 voos das aeronaves de transporte C-130 Hercules. Neste ano, todos os 18 projetos apresentados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTI) foram aprovados para realização em campo na Antártica. Entre os recursos que serão usados para apoiar as pesquisas brasileiras no mar e em terra, além dos navios brasileiros mencionados, serão usados refúgios, acampamentos, aeronaves, a base local do Chile e a Estação Antártica Argentina Cámara. Este foi, aliás, o ponto de chegada do primeiro grupo do Programa Antártico Brasileiro, que desembarcou na Estação Cámara no dia 8 de novembro, na ilha de Half Moon (Meia-Lua). Ali, pesquisadores brasileiros e militares de ambos os países realizarão atividades durante um mês, em esforço de integração e cooperação entre a Marinha do Brasil e a Armada da República Argentina.


Começa a temporada de pesquisas e de reconstrução da estação brasileira no verão gelado da Antártica

externa composta por PVC polar, que resiste à ação de raios ultravioleta e podem suportar ventos de até 200 quilômetros por hora – ou seja, um furacão de categoria 3 –, que não são incomuns no local. Em paralelo, os trabalhos de remoção dos escombros da estação incendiada, sob a responsabilidade de fuzileiros navais e do Arsenal de Marinha, deverão terminar em março de 2013. Segundo informe da Agência Brasil, o ministro da Defesa, Celso Amorim, pretende ter uma nova estação antártica permanente funcionando para o verão 2013-2014.

KING GEORGE/Brasil

HALF MOON/ARGENTINA

Foto: Porto do Rio Grande

Enquanto as pesquisas avançam, os módulos emergenciais serão instalados por uma empresa canadense, a Weatherhaven Canada Resources, na Ilha King George, no local onde ficava o heliponto da Estação Comandante Ferraz. Quando começar a operar, em fevereiro de 2013, de acordo com as previsões, a estação provisória terá capacidade para abrigar 65 pessoas e terá dormitórios, banheiros, refeitórios, cozinha, laboratórios, enfermaria, geradores, estações de tratamento de esgoto e área de armazenamento de resíduos sólidos. Os módulos têm parede

Foto: Agência Brasil

Bandeiras hasteadas pelo chefe da Estação Cámara, da Argentina, pelo Comandante do NPo Almirante Maximiano e pelo coordenador do Proantar. Abaixo o mapa de localização

Plataforma de pesquisa O NPo Almirante Maximiano – aqui, no Porto do Rio Grande (RS) – funciona como plataforma flutuante para pesquisadores de diversas instituições de ensino e investigação científica. Entre seus equipamentos, destacam-se guincho oceanográfico (capaz de recolher amostras de água em profundidades de até 8 mil metros); cinco laboratórios; estação meteorológica; sistema de posicionamento dinâmico, que permite ao navio manter-se parado em determinada latitude/longitude; ecobatímetro multifeixe (possibilita elaborar imagens em 3D do fundo do mar); perfilador de corrente marinha; perfilador de sedimentos do subsolo; quatro embarcações infláveis; dois helicópteros e um recém-instalado guincho geológico.

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internacional

China exibe autossuficiência Imprensa estrangeira vê helicóptero militar chinês em inédita política de portas abertas Com um complicado histórico de intenções de compra de helicópteros de ataque desde o início dos anos 1980, a China quebrou sua política de segredo em torno de assuntos militares em 24 de julho passado. Pela primeira vez na história recente, chamou repórteres locais e da imprensa mundial para mostrar o helicóptero de reconhecimento Z-9WZ, sua série de armamentos e ainda permitiu que tudo fosse fotografado. A sigla WZ é de Wuzhuang Zhi­shengji, literalmente, “helicóptero armado”. Os jornalistas foram recepcionados pelo general Zhang Zhilin, comandante da base do 4o Regimento de He-

licópteros do Exército de Tongzhou, nas imediações de Pequim. Mais do que atender aos insistentes chamados dos Estados Unidos e de outros países para que a China aja com maior transparência em torno de suas capacidades de defesa, os analistas consideram que o gesto diplomático tem mais a ver com as constantes queixas dos vizinhos da China no quadrante Sul, que sentem sua segurança ameaçada pelo crescente reforço militar do país. No próprio mês de julho, dias antes do evento, o ministro da Defesa, Liang Guanglie, havia semeado preocupações na região ao anunciar a inten-

ção de instalar uma guarnição específica para cuidar dos assuntos do Mar do Sul da China. Por outro lado, o segundo homem na estrutura do poder no país, Xi Jinping, que deverá assumir a Presidência em 2013, deu apoio a essa idéia em setembro. Foi um recado bem negativo para os vizinhos queixosos – Brunei, Malásia, Taiwan e sobretudo Filipinas e Vietnã, que disputam a posse de uma profusão de ilhas na região, a maioria delas despovoada. Se queres paz... Os jornalistas estrangeiros puderam dialogar com oficiais da base sobre variados temas, como o

Jornalistas fotografam o helicóptero Z-9WZ em voo na base de Tongzhou, China

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equipamento do regimento, que dispõe de cerca de trinta aeronaves, entre elas, vários helicópteros de origem russa e uma dúzia de aparelhos Z-9WZ, e seus ocupantes – cerca de mil militares, sendo metade deles pilotos qualificados. Uma das missões desse regimento de elite é buscar os astronautas chineses no Cazaquistão quando estes retornam à Terra. Assuntos sensíveis foram evitados pelos militares chineses, assim como nada foi dito nem mostrado sobre os helicópteros de ataque Z-10, em uso pelo Exército do Povo desde 2010, mas ainda em desenvolvimento pelos próprios chineses para se tornar um dos mais modernos do mundo. Perguntado sobre os movimentos do país para

Fotos: Chinese Military Review

O Z-9WZ com seus armamentos

assegurar sua superioridade no Mar do Sul da China, o general Zhang garantiu aos jornalistas estrangeiros que sua finalidade é apenas “assegurar a paz”. A visita ao helicóptero Z9WZ, cujo desenho tem por base o Dauphin da Eurocopter,

foi também uma ocasião sob medida para os chineses afirmarem sua autossuficiência tecnológica na fabricação de sua frota de asas rotativas. Em resumo: acabaram-se os problemas para os chineses terem o poder de fogo que quiserem. DEFESA LATINA

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depoimento

Protagonista da história Cosme Degenar Drumond

O coronel Gustavo Borges tem a mesma idade do Levante do Forte de Copacabana e participou do desenvolvimento da aviação militar brasileira Em 1973, o brigadeiro Deoclécio Lima de Siqueira (1916-1998), em missão no Japão, presenciou um fato curioso: várias pessoas estavam à porta do Palácio Imperial, em Tóquio, de repente, a multidão abriu passagem para um homem de cabelos brancos, barbicha oriental da mesma cor, bem trajado, que descera de um automóvel. Impressionado com a reverência, o brasileiro indagou a um dos populares: “Quem é ele?”. A resposta foi óbvia: “É um velho”. A partir de então, ele pôde entender melhor por que a experiência de vida é levada em alta conta pelo povo japonês: os idosos são modelo para os moços, que tiram proveito da sabedoria por eles acumulada com o passar do tempo para enfrentar os desafios do presente e formatar o futuro. Gustavo Borges é um veterano piloto militar nascido em 1922. Coronel reformado da Força Aérea Brasileira, desde o ano passado, por decisão voluntária, vive com a esposa na Casa Gerontológica de Aeronáutica Brigadeiro Eduardo Gomes. Como os demais residentes, o casal recebe ali assistência e tratamento médico, pratica atividades recreativas e de lazer adequadas à idade e passeia pelos pontos turísticos da cidade. Frequentemente é visitado por parentes e amigos. Criada em novembro de 1984, como Clínica Geriátrica para os militares da reserva e reformados em situação de abandono e risco social ou de doenças do envelhecimento, a Casa Gerontológica de Aeronáutica está localizada no Galeão, na Ilha do Governador, Rio de Janeiro. Quando jovem, Gustavo Borges queria ser piloto da Marinha. Ingressou no Colégio Naval, mas saiu oficial aviador, em 1942, pela Escola de Aeronáutica, para a qual se transferiu com a criação da Força Aérea Brasileira. Era tempo de guerra e ele fez patrulhamentos aéreos do litoral brasileiro, no Nordeste. Foi ainda um dos responsáveis pela introdução do primeiro Sistema de Controle de Tráfego Aéreo brasileiro e voou pelo Correio Aéreo Nacional. Nos anos 1950, ingressou na política. Foi secretário de Segurança do antigo Estado da Guanabara (RJ), no governo Carlos Lacerda. Em 2003, lançou o livro 1964, no qual narra os bastidores do regime militar. Em novembro do ano passado, o coronel Borges foi indicado pelo Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea) para a sexta versão do Walter Binagui Air Navigation Commission Laurel Award, premiação da Organização de Aviação Civil Internacional (Oaci). A indicação, de imediato aceita pela Oaci, serviu para a rememoração de seus anos no Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro (SISCEAB), em que exerceu diversos cargos na Diretoria de Rotas Aéreas (DR), hoje Decea, no período de 1945 a 1955; e das atividades internacionais, de 1955 a 1957, como delegado do Brasil no Conselho da Oaci, em Montreal, Canadá. Uma de suas iniciativas de destaque data de 1953, quando elaborou a concepção (até então inédita) de um sistema de aerovia unidirecional, entre os polos geoeconômicos mais movimentados do Brasil: Rio de Janeiro e São Paulo. Esse trabalho viabilizou a implementação da Ponte Aérea entre as duas cidades.

Gustavo Borges recebeu Defesa Latina no Galeão. Do alto de sua longevidade, rememorou casos e fatos notáveis que protagonizou. 44

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Carreira militar Eu estava no segundo ano do Colégio Naval quando o governo criou a Força Aérea Brasileira. Resolvi me transferir para a FAB, juntamente com outros 130 cadetes da Marinha. A FAB precisava de aviadores. Nosso curso foi abreviado em seis meses. Depois de formado, fiquei inicialmente na Escola de Aeronáutica, como instrutor de voo. Meses depois, fui servir na aviação de caça, em Santa Cruz, e, em seguida, em Natal (RN), onde cumpri missões de patrulhamento e vigilância no litoral brasileiro. Aviões que voou Em patrulha antissubmarina, em Natal, voei o North American NA-T-6, que tinha como arma apenas uma metralhadora de 7 mm e duas bombinhas de 20 quilos. Disseram-me que o importante era fazer barulho, pois o serviço de inteligência descobrira que os submarinos alemães tinham microfone no periscópio e evitavam subir à tona quando ouviam o ronco do motor de um avião. Por conseguinte, não atacavam os comboios de navios. Então, brincávamos, dizendo que éramos da FAB, a Força Aérea do Barulho. Voei também o P-40 [Curtiss], mas, quando chegaram os B25 [bombardeiros North American], a conversa com os alemães foi outra. O B25 era um avião formidável do ponto de vista de pilotagem e tinha um poder de fogo excelente – seis bombas de 300 quilos, inclusive de profundidade, para combater submarinos. Tinha ainda 13 metralhadoras calibre .50, arma respeitável. Passei a voar este avião em patrulha dos comboios no litoral potiguar. A Base Aérea do Recife patrulhava os navios até a divisa com a Paraíba. Dali em diante, os aviões de Fortaleza assumiam a função até a vizinhança de Belém, no Pará, de onde aviões norteamericanos escoltavam os navios até a África.

Controle do Tráfego Aéreo Eu era radioamador. Em Natal, quando cheguei, não havia estação de rádio. Então, montei uma na base. Antes, os pilotos decolavam e não tinham com quem falar durante o voo. Certo dia, o brigadeiro Eduardo Gomes esteve na base em inspeção rotineira. Ao ver a estação de rádio funcionando, perguntou: “Ué, quem montou essa estação?”. Disseram-lhe que tinha sido eu. Ele ficou calado e continuou a inspeção. Em Recife, onde ficava seu quartel-general, incluiu meu nome numa lista de oficiais que seriam mandados aos Estados Unidos fazer o curso de Comunicações. Fui e fiz um ano de Eletrônica e Telecomunicações. Cada um dos cinco oficiais dessa turma especializou-se numa área. A mim coube a de Controle do Tráfego Aéreo, que não existia no Brasil. Eu cheguei da América com toda aquela bagagem de formação profissional. O Brigadeiro me designou para organizar o controle de tráfego aéreo no Brasil. Eu falava dois idiomas estrangeiros: o francês e o inglês. Para tudo quanto era congresso sobre proteção ao voo, controle de tráfego aéreo, telecomunicações aeronáuticas, eu era chamado para representar o Brasil. E falava diretamente com os representantes dos países membros da Organização da Aviação Civil Internacional (Oaci). Política Eu era major quando fui realizar o curso de EstadoMaior na Escola de Comando e Estado-Maior da AeroAcervo DL

Origens Nasci em Botafogo, no dia 22 de junho de 1922, duas semanas antes do levante militar de Copacabana [5 de julho]. Estudei no Colégio Santo Inácio e concluí o segundo grau em Petrópolis. Por circunstâncias familiares, minha mãe mudou-se para a Suíça, onde passamos dois anos.

Gustavo Borges, figura pioneira em tecnologia nas áreas de comunicação e segurança de voo no país

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Cultura Aeronáutica

Epopéia dos PT-19 da FAB: em 1942, o coronel Borges participou da aventura de trazêlos em voo de 25 dias entre EUA e Brasil; serviram até 1960, quando os melhores foram desativados e doados a aeroclubes, como esses, em Juiz de Fora (MG)

Arquivo DL

A Casa Gerontológica de Aeronáutica Brigadeiro Eduardo Gomes, onde o coronel Borges vive com a esposa

náutica (Ecemar), na ilha do Governador. Ao término do curso, o oficial cumpria estágio de Estado-Maior; depois voltava à Ecemar para o Curso Superior de Comando. Com o episódio do atentado ao jornalista Carlos Lacerda, em Copacabana, no qual faleceu o major aviador Rubens Vaz [agosto de 1954], participei da caçada ao assassino do major Vaz. A partir daí, minha vida mudou. Quando saí da FAB, ingressei na política. Correio Aéreo Nacional Esta foi uma fase interessante. Todo aviador da FAB participava da escala de voo do Correio Aéreo, mesmo se estivesse em curso no Brasil. Era ordem do brigadeiro Eduardo Gomes – ele queria que os pilotos contribuíssem com a integração do país e ganhassem experiência de voo. Fiz mais de 3 mil horas de voo pelo Correio Aéreo no Brasil e no exterior. Voei desde lá de cima, do Tumucumaque, no Norte, até Uruguaiana, no Sul, e também para o Peru e o Paraguai. No início, voei o Beechcraft monomotor, um avião cujas asas eram desencontradas: a superior ficava mais para trás em relação à inferior. Quando o Beechcraft bimotor chegou ao Brasil, voei muito esse avião, inclusive para o Paraguai. Fui um dos pilotos mandados aos Estados Unidos para trazer o C-47 [Douglas]. Voando esse avião, instalei no Acre as primeiras estações de radiofarol, para dar condições aos sargentos especia46

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listas de falar com os pilotos em voo na região, emitir boletins de tempo, informar as condições de vento etc. Na época, os voos dependiam do tempo, da temperatura e da visibilidade horizontal. Ajudei a implantar também estações de radiofarol em outras regiões, junto com o Aldo Vieira da Rosa, um homem sábio, de incrível capacidade intelectual. Fato pitoresco Quando a gente pousava, logo vinha o guarda-campo rolando os tambores de gasolina para reabastecer o avião. Certa vez, em Cariranha, no Acre, o guardacampo veio e ficou do meu lado, observando um camarada dar ordens ao pessoal do local para rolar os tambores e tocar a manivela da bomba para reabastecer o avião. Estranhei aquilo. Perguntei ao guardacampo por que o homem estava cuidando do abastecimento, e não ele, responsável pelo aeródromo. “Ah, tenente, ele manda aqui na cidade. E como manda! É irmão da amante do cabo de polícia daqui. Ele é uma ‘otoridade’” (risos). O Correio Aéreo tinha histórias assim, simples e engraçadas. Trasladando aeronaves Alguns navios traziam aviões desmontados e encaixotados. Mas muitos deles foram afundados pelos submarinos alemães. O ministro da Aeronáutica decidiu então enviar à América grupos de pilotos para trazer os aviões em voo. Numa primeira leva, trouxemos o PT-19 [Fairchild], de instrução primária, para a Escola de Aeronáutica. Era um quase teco-teco, com duas naceles em tandem, que não tinha nenhum recurso de navegação. Sua autonomia permitia voar apenas quatro horas seguidas. Para aumentar o alcance, um oficial brasileiro projetou e construiu um tanque de gasolina suplementar, que levávamos na cabine da frente para suportar o longo voo. O tanque tinha uma mangueira que ia até a nacele de trás; por meio de uma torneirinha, o piloto repassava o combustível para o reservatório principal tão logo este dava sinal de que a gasolina estava no fim. Assim, a gente voava durante seis horas seguidas. Nós vínhamos em pequenas esquadrilhas de cinco aviões, comandadas por um capitão ou major. Pela manhã, decolávamos de San Antonio, no Texas, percorríamos toda a América Central, ciscando pelos países até a Colômbia. Entrávamos pela Venezuela para fugir do litoral e saíamos em Caiena, na Guiana Francesa. Dali, voando pelo litoral, chegávamos ao Rio de Janeiro. A viagem durava em média um mês. Além das inúmeras escalas, quan-


do ocorria mau tempo, o comandante determinava overnight e dormíamos em qualquer parada, já que o avião não tinha radionavegação nem condições de enfrentar mau tempo. A cabine do PT-19 era aberta, o que nos obrigava a voar com o tronco exposto ao sol. Eu descasquei a pele duas vezes. Era um verdadeiro desafio. Sofremos apenas três acidentes. Assim mesmo, só um avião quebrou. Os outros fizeram pouso de emergência. E não tivemos perda humana. Nascido para voar A história dos T-6 é outra história interessante. Nos Estados Unidos, o pessoal preferiu que seus próprios pilotos trouxessem o T-6, um aparelho mais sofisticado. Na verdade, os norte-americanos achavam que os brasileiros não teriam condição de trazer o avião em voo. Então, na primeira leva, decolaram oito aviões conduzidos por pilotos norte-americanos. Resultado: nenhum deles foi entregue à FAB; todos caíram pelo meio do caminho. Eles estavam acostumados a voar em campos modernos, cheios de facilidades, pistas de concreto de 2 quilômetros de extensão, radiofaixa por todos os lados. Pelo rádio, navegavam nos Estados Unidos. Mas, quando entraram na selva amazônica, a coisa mudou. Eles não tinham a nossa tarimba, adquirida com os voos do Correio Aéreo. Naquele tempo, a gente voava com referência ferrodrômica, praiadrômica e riodrômica (risos). Só tínhamos essas orientações; os mapas eram péssimos. Eu voei pela primeira vez para o Acre orientando-me por um Guia Rex, um mapa de 30 centímetros por 30 centímetros. Antes de decolar, disseramme: “Esse é o mapa que você tem para chegar lá no canto do Brasil” (risos). E eu cheguei. Brigadeiro Eduardo Gomes Era um homem extraordinário, inteligente, disciplinador, um líder. Tinha demonstrado coragem no Levante do Forte de Copacabana. Em 1935, enfrentou os comunistas de peito aberto. Por sorte não foi morto. Deu demonstrações de patriotismo e de amor à aviação. Num dado momento, a Pan American pleiteou um voo do Rio para Assunção, no Paraguai, o que não era permitido pela legislação brasileira. Mas a PanAm usou de sua influência política e obteve do Ministério dos Transportes e Obras Públicas autorização para fazer o voo. O brigadeiro Eduardo Gomes soube disso, procurou o DAC e falou que a concessão era ilegal. Mas o DAC insistiu e autorizou a empresa a realizar o voo. Na manhã seguinte, o avião norte-americano estava sendo reabastecido no Santos-Dumont para

embarcar os passageiros e decolar para o Paraguai. Eduardo Gomes desceu dos Afonsos à frente de sua tropa, cercou o avião e ordenou: “Não decola; se insistir, mando furar os pneus do avião”. O avião não decolou. O ministro da Guerra, ao qual a aviação era subordinada, nada comentou; a posição do Brigadeiro era patriótica, era correta, legal e benéfica para a aviação comercial brasileira. Isso ocorreu no final dos anos 1930. Ele não era contra os Estados Unidos ou qualquer outra nação, apenas defendia a ordem jurídica do Brasil. No Recife, quando a guerra acabou, ele não permitiu aos norte-americanos permanecer no Brasil nem consentiu que administrassem as unidades militares no Nordeste. Na época, a Lufthansa e a Alitalia foram acusadas de transmitir informações estratégicas brasileiras para os militares de seus países. O governo brasileiro interveio nas empresas. A Lufthansa foi então transformada na Cruzeiro do Sul, que passou a voar no Brasil usando a infraestrutura construída pela empresa alemã. Empresários brasileiros passaram a administrar a Cruzeiro do Sul. No primeiro voo da empresa para o Norte, o avião pousou no Recife. A Standard Oil [Esso] recusou-se a reabastecer o avião, porque recebera ordens de Washington nesse sentido. Para os norte-americanos, a Cruzeiro ainda era uma empresa alemã, ou seja, patrimônio do inimigo de guerra. Eduardo Gomes não teve dúvida: determinou que seus soldados tomassem as bombas de gasolina da Standard Oil e reabastecessem o avião da Cruzeiro. A partir daí, os aviões da Cruzeiro passaram a ser reabastecidos normalmente pela companhia estrangeira. Ele jamais permitiu que estrangeiros dessem as cartas no Brasil. Sobre o atentado a Carlos Lacerda O brigadeiro Eduardo Gomes nos deu total apoio. Nós, que eu digo, são os dez majores da Aeronáutica que, voluntariamente, acompanhavam Lacerda nos comícios, para garantir-lhe a integridade física, pois o jornalista havia sofrido outros atentados. O ministro Nero Moura mandou abrir inquérito policial militar para apurar as responsabilidades pelo atentado, já que a arma usada no crime era de uso exclusivo das Forças Armadas. Nós trabalhamos nas investigações e chegamos aos autores do atentado: Climério e Gregório, que trabalhavam no Palácio do Catete, na segurança do presidente Getúlio Vargas. No final, deu no que deu [o suicídio de Vargas, em 24 de agosto de 1954]. DEFESA LATINA

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HISTÓRIA história

O grande incêndio do Aeroclube de São Paulo

Como os sócios fizeram o aeroclube ressurgir das cinzas para se tornar uma das maiores escolas de aviação civil da América do Sul social do Aeroclube de São Paulo funcionou na Rua Xavier de Toledo, centro da capital. Seus primeiros aviões foram abrigados provisoriamente no destacamento de aviação do Exército até o ano de 1937. Na década de 1940, empregava aviões modernos, uma numerosa frota composta de CAP-4 e P-56 Paulistinha, aviões que, por anos a fio, formaram muitas gerações de pilotos civis pelo Brasil afora.

da a partir de 1906, foi campo de treinamento da infantaria e da cavalaria da Força Pública de São Paulo (atual Polícia Militar). Depois, nos anos 1920, o Exército lá instalou um destacamento de aviação que deu lugar ao atual Parque de Material Aeronáutico de São Paulo, unidade da Força Aérea Brasileira, onde anualmente ocorrem os grandes shows anuais de aviação comemorativos do Dia do Aviador. Enquanto construía sua estrutura de campo, a sede Cultura Aeronáutica

O Aeroclube de São Paulo é uma das mais antigas e conceituadas escolas de aviação civil do hemisfério sul. Criado em 8 de junho de 1931, está localizado no Campo de Marte, zona norte da capital paulista. Suas instalações são modernas; a frota de aviões, diversificada e atual; sua atividade, dedicada à formação de pilotos privados, comerciais, de helicóptero, de linha aérea e instrutores de voo. Entre os sócios fundadores do organismo, constam nomes de expressão da história política nacional, como o do médico, aviador e antigo governador de São Paulo, Ademar de Barros (1901-1969) e o do magnata das comunicações Francisco de Assis Chateaubriand (18921968), lançador da TV no Brasil e dono dos Diários Associados. Naquele tempo, o Campo de Marte era uma área pantanosa pertencente à sesmaria de Sant’Anna. A região, explora-

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Engolidos pelas chamas O crescimento da aviação levou o aeroclube a hangarar suas aeronaves de instrução. Os aviões eram pilonados, isto é, suspensos pela cauda, como forma de otimizar o espaço útil nos hangares. A medida, porém, implicava sérios riscos. O tanque de combustível do Paulistinha, que ficava no plano superior do teto do cockpit, deveria estar vazio quando o avião fosse erguido pela cauda. Mas sempre sobravam resquícios de gasolina no tanque. Com isso, invariavelmente o hangar tornou-se uma autêntica bomba, prestes


Acervo DL

a explodir a qualquer instante, devido à mistura do ar com o vapor de gasolina dominando o ambiente. Um dia, a temida ignição fez o hangar explodir. Na tarde de 14 de outubro de 1967, um dos alunos cumpriu seu voo de instrução e foi ao hangar procurar seu molho de chaves, que, como imaginara, poderia estar no avião já pilonado. A temperatura no hangar era alta. No ar, pairava um forte cheiro de gasolina. A escuridão no interior dificultava a procura das chaves. Foi quando o aluno resolveu acender um isqueiro para iluminar o local. A explosão foi instantânea. O fogo se alastrou e o aluno, com o corpo chamuscado, nem pensou em apanhar um extintor antes de correr. Havia outras pessoas nas imediações, que também correram para escapar ao sinistro. O hangar queimou por vários minutos até a chegada dos bombeiros, que demoraram várias horas para controlar o intenso fogaréu. Quando tudo terminou, a realidade era desalentadora: as 27 aeronaves que estavam penduradas no hangar foram totalmente destruídas. O aeroclube perdera praticamente toda a frota, restando apenas três aeronaves que se encontravam estacionadas fora. Mas ninguém morreu. Hospitalizado, o aluno queimado recuperou-se, restando-lhe no corpo as marcas da sua imprudência. Por sorte, o incêndio não se alastrou pelas demais dependências.

O comandante Morelli, a bordo de uma aeronave

O traslado

Após o incêndio de 1967, a instrução no Aeroclube de São Paulo passou a ser ministrada por membros da diretoria e sócios. O veterano piloto comercial José Augusto Morelli participou desse grupo de voluntários e recorda aquele período: “Dávamos instrução sem nada cobrar do Aeroclube. Era o prazer de voar. O patrimônio do Aeroclube era tratado como se fosse nosso. Membros da diretoria e associados até lavavam os aviões”. Morelli era diretor técnico da organização. Ele foi um dos pilotos a defender a ideia de trazer os aviões em voo. “Tínhamos alto grau de instrução”, lembra. “Portanto, não fazia sentido gastar de 5% a 10% do preço da aeronave para pagar a terceiros pelo traslado. Minha estratégia era a que o desafio fosse entregue aos sócios com maior experiência de vôo.” A jornada era mesmo um desafio. Até então, e guardadas as proporções, havia ocorrido uma única aventura semelhante com aeronautas brasileiros. Foi durante a Segunda Guerra Mundial, quando pilotos da FAB trouxeram dos EUA, em voo, centenas de aviões leves de instrução militar. Os paulistas passaram por quatro meses de treinamentos. Em paralelo, fizeram estudos sobre os custos da viagem (estada, combustível, óleo, taxas, seguro etc.), a rota e seus pontos de reabastecimento, pernoites, documentação técnica, regras de tráfego internacional e tudo o mais. Seguiram para os EUA 22 pilotos em voo comercial da Pan American Airlines, dois deles como reservas. Chegados ao aeroporto de Vero Beach, na Flórida, sede da Piper Aircraft, os pilotos conheceram a ficha técnica das aeronaves e fizeram treinamento de voo em grupo. Concluídos os preparativos, o dia do traslado foi marcado. Mas o voo não aconteceu: o ciclone Gilda, tempestade tropical que se havia formado no Atlântico, estendeu-se sobre a rota do Caribe, forçando os pilotos a permanecer no chão por uma semana. O experiente piloto, líder do grupo, narra a jornada aérea: “Parece que foi ontem. A fonia era feita por mim. Solicitei à torre que a nossa decolagem fosse efetuada em sequência contínua. Pedido concedido, a torre de Fort Lauderdale alertou um comandante de Boeing que estava na aproximação. Guardo na memória a voz do comandante: ‘Ok, I have them in sight. The sky is over cast of them’. Parecíamos um bando de pombos abandonando o aeródromo e voando mar adentro. Um voo espetacular, como planejado. Pequenos imprevistos foram resolvidos sem dificuldade. A viagem foi repleta de detalhes interessantes e emocionantes, suficientes para preencher um livro. O voo durou 23 dias. No dia 4 de novembro de 1973, os Arrow fizeram passagens aéreas sobre o Campo de Marte e pousamos. Um belo trabalho de equipe. Alguns dos pilotos não estão mais entre nós; estão voando em níveis mais altos”. Anualmente, os remanescentes do grupo de pilotos se reúnem em jantar comemorativo na capital paulista. O encontro de 2012 aconteceu no dia 11 de novembro

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Foto: Cultura Aeronáutica

Renascido das cinzas Com a perda da frota, a instrução de voo no aeroclube foi paralisada. A sobrevivência da instituição ficou ameaçada. Não havia recursos financeiros para recuperar os estragos e adquirir

Foto: Irineu Moura

Um dos aviões Cherokee trazidos em voo, quando desativado, foi espetado sobre pedestal como monumento à aventura e ao renascimento do clube

novas aeronaves. Entretanto, a diretoria do Aeroclube decidiu recompor a frota. Inicialmente, procurou o Departamento de Aviação Civil (DAC), ligado ao então Ministério da Aeronáutica, que, no entanto, não tinha condições de ceder aeronaves, sobretudo porque o Paulistinha havia saído de linha. Os meses se passaram até que uma solução emergente foi colocada em prática: de forma voluntária, os sócios do aeroclube resolveriam a questão, com base num programa de título de sócio remido. A solidariedade aumentou. Os sócios mais aquinhoados, como industriais e comerciantes, mobilizaram-se para reconstruir o hangar e cobrir os gastos de reposição da frota.

Os Paulistinhas ficavam quase na vertical, de modo a aproveitar o espaço no hangar, como nesta imagem feita no Aeroclube de Bragança Paulista 50

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O aeroclube encomendou um lote de aeronaves ao fabricante norte-americano Piper: uma dúzia de aviões Cherokee 140, de instrução básica, e seis Arrows, de instrução avançada. Para fazer economia, um grupo de pilotos selecionados entre diretores e sócios buscaria as aeronaves, devendo preparar-se para o traslado. Quando as aeronaves encomendadas ficaram prontas, seis anos depois do grande incêndio, os pilotos seguiram para os EUA. Os 18 aviões foram trazidos em voo, fazendo escalas em 14 cidades ao longo da rota – o percurso foi de 7.200 quilômetros, sendo 3.200 deles sobre o Mar do Caribe. Para resolver problemas de autonomia e vencer a longa distância, tanques externos de 100 litros foram

adaptados aos Cherokee 140, que consumiam 30 litros de gasolina/ hora e tinham apenas 4 horas e meia de autonomia. Os Arrow, mais bem equipados em instrumentação, funcionaram como líderes durante o voo. A operação foi bem-sucedida e marcou o renascimento do Aeroclube de São Paulo. Com os novos aviões, a qualidade da instrução deu um salto de qualidade. Hoje, a escola de aviação paulista opera uma frota mais avançada, composta por aeronaves Daemon 20, Tupi, Corisco, Sêneca, Decathlon, Christian Eagle e Bücker, entre outros. Um Cherokee antigo, matrícula PT-DHC, encontra-se espetado como monumento em frente ao Aeroclube de São Paulo.

OS PILOTOS do traslado AGUIRRE ALCIR ALEXANDRE COSTA ARMANDO SBAMPATO ARNALDO F. CARVALHO DONALD STUART MUIR FLORIANO GONÇALVES FREDERICK LEVIAN DECLERC HERCULES BRESEGHELO JORGE HERSTEIN JOSÉ AUGUSTO MORELLI JOSÉ BALSANI MIGUEL A SALERNO OSWALDO BERBEL PIERO MANGINELO RICARDO KOEPIC MORAES RICARDO LEVI JORGE ROBERTO WASIK RONALD VIVIANI VIRGÍLIO PAMARICO WERNER VAN EYKEN WILSON LUIZ ATHAIDE

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Andre Rieu / Divulgação

cultura.música

Ritmos da guerra aos palcos Com seus dobrados, marchas e hinos, as bandas militares despertam emoções e passeiam também pela música sinfônica Cosme Degenar Drumond

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O Brasil tem um grupo de música militar conhecido além-fronteiras: a Banda Sinfônica do Corpo de Fuzileiros Navais. Com 90 instrumentistas e um coro de 45 vozes, entre oficiais regentes, suboficiais e sargentos fuzileiros navais, de ambos os sexos, suas apresentações são eventos que passeiam pelas mais brilhantes páginas da boa música. No Rio de Janeiro, a Companhia de Bandas do Batalhão Naval, na histórica Fortaleza de São José da Ilha das Cobras, de 1736, comporta ainda a Banda Marcial, que tem 120 componentes e se distingue por suas belas evoluções e pela presença de gaitas escocesas. Estas despertam tamanho entusiasmo que sua fama chegou ao maestro e violinista holandês André Rieu. Assim, os seis tocadores de gaita escocesa do grupo foram convidados para participar em São Paulo da segunda temporada de concertos do maestro, reforçando o som de seu violino e o da Orquestra Johann Strauss, responsável pelas valsas


encantadoras que levam as audiências ao delírio. São esses conjuntos que, atuando em todo o país, exercem importante papel de relações públicas com a comunidade civil, sempre disposta a se deixar arrebatar ao ouvi-las interpretar o Cisne Branco, hino oficial da Marinha, ou passear por seus vastos repertórios de dobrados, marchas e música popular para ouvidos exigentes. Afinal, foi por sua excelência que a Banda Sinfônica se tornou a melhor do mundo no 5º Festival Internacional de Bandas Militares realizado em Módena, Itália, em 1996, e os outros conjuntos são efusivamente aplaudidos a cada apresentação no Brasil e no exterior. Da guerra às festas Presentes nos exércitos de todos os tempos desde a história mais remota, os grupos de músicos, nos quais não podiam faltar poderosos instrumentos de sopro e tambores barulhentos, tocavam para organizar as

forças, comandar ataques ou retiradas e assustar os inimigos. Modernamente, as bandas militares são formadas por sargentos, cabos e soldados músicos e regidas por maestro militar, e tocam para dar um charme especial a cerimônias oficiais, animar bailes e festas e simplesmente fazer concertos como contribuição cultural à sociedade. Muitas se tornaram orquestras famosas e revelaram músicos extraordinários. O compositor Carlos Gomes foi um que se iniciou em banda militar e chegou à glória no La Scala de Milão com óperas como O Guarani e Fosca. Outro exemplo é o do regente Eleazar

de Carvalho, cujo centenário de nascimento se comemorou em 28 de junho. Menino levado, ele foi mandado servir na Marinha pelo pai, que pertencia às falanges do Exército Brasileiro. Na Escola Naval, em Fortaleza, aprendeu a tocar tuba – “porque o rancho dos músicos era melhor”, conforme contou com sua verbe proverbial. Depois, no Rio de Janeiro, fez parte da Banda do Corpo dos Fuzileiros Navais, da qual saiu em 1929 para abraçar a carreira erudita nos Estados Unidos – não sem antes dirigir a música do Cassino da Urca e formar, com Donga, Pixinguinha e Almirante, o conjunto American Jazz. George Goodstadt

Foto: BABR

À esquerda, músicos da Marinha tocando gaitas de fole na segunda temporada de André Rieu em São Paulo, em setembro passado. Ao lado, Banda Sinfônica da Base Aérea de Brasília em concerto na Sala Villa-Lobos, no Teatro Nacional Cláudio Santoro

Na caricatura Big Band, de Al Hirschfeld, a partir da esquerda, Duke Ellington, Glenn Miller, Artie Shaw, Benny Goodman e Count Basie

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Álbum com gravações de Glenn Miller diante de sua big band e da banda militar

O contrário desse tipo de trajetória aconteceu uma vez: foi o caso do trombonista norte-americano Glenn Miller, que, no auge do sucesso com sua big band ao vivo, no disco e no cinema, decidiu levar a música para a área militar. Em 1941, com a canção Chattanooga Choo Choo, ele vendeu mais de 1 milhão de discos – marca que não era atingida por ninguém desde 1926. Mas foi recusado pela Marinha. Dirigiu-se ao Exército, que o aceitou para colaborar com o esforço de guerra – pois os EUA se envolveram no conflito mundial em dezembro de 1941, após o ataque japonês a Pearl Harbor. Lotado no Corpo Aéreo do Exército, já que Força Aérea ainda não existia como instituição independente, e apoiado pelo general Walter R. Weaver, do Comando de Treinamento do Exército na Carolina do Norte, Miller criou uma big band para 54

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a Força Expedicionária Aliada e passou a fazer apresentações no front, para manter alto o moral da tropa e proporcionar entretenimento aos combatentes aliados. Com um ano de formação, a Glenn Miller Band fez mais de 800 exibições e 500 radiotransmissões para as tropas aliadas na Europa e na África. Muita gente conservadora não gostou da modernização que ele introduziu na música militar, mas nada impediu que seus arranjos, originais e incansavelmente ensaiados, se transformassem na sensação musical daqueles idos, com clássicos como Moonlight Serenade, até hoje indispensável nas seleções de música romântica. Inspiração atual Em 1944, o músico salvou seu grupo de ser bombardeado no Sloane Court Hotel, em Londres, mas não pôde evitar a tragédia que se abateria sobre ele. Em 15

de dezembro do mesmo ano, ao meio-dia, Miller embarcou num monomotor no sul da Inglaterra para tratar em Paris do concerto de Natal na recém-libertada capital francesa. Misteriosamente, o avião desapareceu no Canal da Mancha e, apesar das buscas intensas, nunca foi encontrado. Especulações sobre a tragédia diziam que Miller fora capturado pelos nazistas e torturado até a morte. Em outra versão, ele teria morrido num bordel de Paris. Ao ver o filme Música e lágrimas, a cinebiografia do músico lançada em 1953, o aviador inglês Fred Shaw, depois de pesquisar para sustentar sua hipótese, revelou que o avião de Miller, que partira sob chuva do campo de Twinwood, fora abatido por fogo amigo. Participante de uma missão de ataque a Berlim, na Alemanha, ele se lembrava: a operação fora abortada e, na volta, os pilotos receberam ordem de alijar as bombas como medida de segurança para o pouso. Nesse momento, Shaw diz ter visto abaixo dos bombardeiros um avião pequeno, que foi atingido em cheio. A hipótese foi confirmada em 1984 pelo Departamento de História Aeronáutica do Reino Unido. Outro pesquisador, Chris Way, autor do livro Glenn Miller in Britain: Then and Now, lançado em 1996, afirma que o Nordwin Norseman congelou sobrevoando o Canal da Mancha e simplesmente caiu no mar. Seja como for, a música de Glenn Miller não morreu. Até mesmo sua orquestra continua viva e atuante. Reconstituída primeiro sob a direção do cantor e saxofonista


Big bands brasileiras A banda de Glenn Miller serviu de inspiração para músicos e instituições civis e militares de vários países, dando origem a muitas orquestras de dança. Também no Brasil foram formadas orquestras do tipo big band. Uma delas é o Conjunto Fuzibossa, estruturado em 1926 por músicos da grande banda da Marinha, que até hoje se apresenta com teclado, baixo, guitarra, bateria, trompete, trombone, sax e cantores. Uma das mais recentes nasceu nos anos 2000, em Brasília, por iniciativa do major-brigadeiro Antônio Carlos Moretti Bermudez, quando comandante da Base Aérea local. Toda sextafeira, após o expediente, o então coronel aviador Bermudez reunia-se com seus oficiais para descontraído bate-papo. Numa dessas happy hours, sentou-se ao lado do capitão músico Alderley, regente da Banda da Base Aérea, e lançou um desafio: – Que tal montarmos uma big band? A inspiração vinha de sua formatura na Academia da Força Aérea. O baile dos cadetes fora animado por uma banda militar transfigurada em orquestra de dança. Agora, dese-

java proporcionar aos seus comandados o mesmo prazer de ouvir boa música. O maestro topou. Ao verificar que faltava quase tudo para formar a banda, ele convocou seus músicos e conseguiu a colaboração necessária para obter contrabaixo, guitarra, piano, bateria, cantores, mesa de som, microfones e amplificadores. Muitos aprenderam a tocar os instrumentos necessários, que adquiriram ou tomaram emprestados. Chegaram até a reformar uma velha guitarra que havia no depósito da unidade. O maestro tinha um teclado. Outros itens foram adquiridos pelo comandante e pelo subcomandante da base com dinheiro do próprio bolso e doados à orquestra nascente. Na parte do repertório, o capitão Alderley providenciou as partituras, que passaram a ser es-

critas por seus músicos, enquanto outras lhe foram ofertadas por um shopping center da cidade. Com poucas semanas de ensaio, o grupo estava tinindo e passou a animar festas e bailes na comunidade militar. A orquestra tocou também no shopping, em retribuição pelas partituras recebidas. Agradou tanto que, a cada mês, durante uma hora, sempre à noite, virou atração do centro de compras. Foram dois anos de apresentações ao público, interrompidos em razão das transferências do efetivo de músicos, uma peculiaridade da carreira militar. A banda se desfez, mas a comunidade brasiliense não deixou de ter boa música produzida pela Aeronáutica: a Banda Sinfônica da Base Aérea de Brasília é uma atração que vai bem além das comemorações anuais da Semana da Asa.

Foto: Sgto Rezende / Agência Força Aérea

Tex Beneke (1914-2000), da banda original, foi depois refundada, em 1956, por Ray McKinley (1910-1995), baterista da banda do Serviço Aéreo do Exército dos EUA, e ainda hoje, dirigida pelo trombonista Larry O’Brien, faz em média 300 apresentações por ano ao redor do mundo.

7/10/2012: a Banda de Música da Base Aérea de Brasília (BABR) entrando na Praça dos Três Poderes para a cerimônia da troca da Bandeira Nacional DEFESA LATINA

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cultura.livros

Todos os blindados do Brasil Pesquisador faz circular cerca de mil páginas de informações e imagens sobre emprego e desenvolvimento de veículos militares blindados no país

Mirian Paglia Costa

O biênio 2011-2012 foi especial para o professor e pesquisador de assuntos militares Expedito Carlos Stephani Bastos, da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG). Um dos principais estudiosos brasileiros na área, suas atenções circulam em torno de temas tecnológicos, sendo os blindados uma de suas especialidades. Neste dezembro, ele completa um esforço de três décadas de trabalho ao lançar o segundo volume de Blindados no Brasil – Um longo e árduo aprendizado, cujo primeiro tomo saiu em março do ano passado. Os dois volumes cobrem em detalhe e com farta iconografia toda a trajetória dos carros de combate e veículos blindados no país desde 1921 até os dias atuais. Trata-se de uma

contribuição inestimável, pois as mais de 600 páginas e cerca de 1.200 imagens do trabalho não só oferecem uma visão global do assunto, com indicação dos acertos e desacertos da indústria bélica brasileira na área, mas também um roteiro facilitador para aprofundamento em pesquisas futuras. Esse caminho, aliás, já foi tomado pelo próprio pesquisador mineiro, que lançou em setembro o primeiro volume da Coleção Blindados, cobrindo a presença do primeiro blindado no país no título Renault FT-17 O primeiro carro de combate do Exército Brasileiro. Em 56 páginas, o livro resgata documentos de época e imagens, além de detalhar aspectos técnicos, de construção e eventos que justificaram o emprego do carro na história militar brasileira desde 1921 até sua desativação em 1942. Bastos também mapeou todos os exemplares atualmente preservados no país. A ideia da coleção, argumenta ele, é ofere-

cer uma série de estudos sobre as nove décadas de emprego e desenvolvimento de veículos militares no país. Assim, em seus volumes, ele entregará ao público interessado na história da tecnologia militar nacional análises detalhadas dos modelos de blindados que marcaram época no Exército Brasileiro. Em outra frente, esta a da reportagem in loco, Bastos lançou, em fevereiro de 2011, Blindados no Haiti – Minustah, uma expe­ riência real. Este último título nasceu de uma visita do pesquisador ao Haiti. O autor lá esteve em 2008, a convite do Ministério da Defesa, e participou, com o Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha do Brasil, de diversas patrulhas pelas ruas de Porto Príncipe, além de visitar unidades militares ou de polícia de outros países que compõem o efetivo da Minustah. Para ele, a experiência no emprego de blindados em área urbana no Haiti representou um verdadeiro laboratório para a Marinha e o Exército Brasileiro. Caprichos de colecionador A paixão do pesquisador por seu tema é tal que, não contente em cavoucar a história em todos os tipos de acervos – de bibliotecas a arquivos privados de militares, de massas falidas de indústrias do setor a jornais

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e revistas, entre várias fontes possíveis –, ele faz reproduções em escala dos veículos. Assim, materiais que a desmemória nacional deixou desaparecerem são devolvidos, com milimétrico rigor, ao olho do interessado. Isso o leitor irá encontrar em muitas fotografias que ilustram Blindados no Brasil, sobretudo no primeiro volume. Ali se veem, por exemplo, dois blindados construídos por São Paulo para a Revolução de 1924, os quais foram tomados pelas forças da União, já equipadas com os Renault F-17 – foi por ocasião deste levante, conhecido também como “Revolução do Isidoro” (do nome do general Isidoro Dias Lopes, chefe das forças paulistas), que a capital paulista foi atingida com o “bombardeio terrificante” ordenado pelo presidente Artur Bernardes e se aprofundou o Movimento Tenentista. Os dois veículos são verdadeiras curiosidades: um é

coberto com ripas de madeira, o outro, com chapas de metal sobre chassis de um caminhão inglês. Este ficou tão pesado que não podia se locomover. Como se não bastassem esses quatro livros para coroar o trabalho de Expedito Bastos, ele está pronto para comemorar, em 2013, a primeira década do portal UFJF/Defesa (www.ecsbdefesa.com.br), nascido a partir de seu vasto acervo pessoal e de experiências e informações por ele adquiridas no contato com integrantes de corporações militares, empresários, técnicos e engenheiros da indústria de material de defesa. Em dez anos, sob sua coordenação, o site divulgou mais de 1.700 artigos, registra média mensal de 60 mil usuários e já foi acessada por visitantes de 134 países. Na Universidade Federal de Juiz de Fora, o autor foi também um dos fundadores do Centro de Pesquisas Estratégicas “Pau-

lino Soares de Sousa”. Criado há seis anos e coordenado pelo professor Ricardo Vélez Rodriguez, o organismo tem 15 pesquisadores agrupados em cinco linhas de pesquisas: estratégias urbanas e cidadania, história do pensamento estratégico, problemas estratégicos contemporâneos, gestão do conhecimento e tecnologia militar.

Um Renault F-17 e soldados da União em 1924, ocupando São Paulo que construiu sua defesa sobre caminhões ingleses com blindagem de madeira e de chapas de aço; aqui, em reconstituições do autor (escala 1:35) DEFESA LATINA

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DePaul University College of Law

Armas biológicas

Barry Kellman, o autor, é doutor em direito por Yale

A guerra entre humanos

e micro-organismos Criador e principal consultor do Programa de Prevenção de Biocrimes da Interpol, o jurista Barry Kellman, professor da DePaul University de Chicago (EUA), é o autor de Bioviolência: Prevenção de crimes e terrorismos biológicos, que chegou às livrarias em português pela Ideias & Letras. Com 544 páginas substanciosas, o livro é considerado o coroamento dos esforços de Kellman em torno da prevenção da bioviolência, dos quais resultaram também um manual para implementação da Convenção sobre Armas Químicas e o guia Managing Terrorism’s Consequence (“Gerenciando consequências do terrorismo”), ambos destinados a orientar as autoridades norte-americanas em torno do tema. A atenção dedicada ao tema ainda é injustificadamente limitada, pois, como bem enfatiza Gro Harlem Brundtland, a médica que foi primeira-ministra da Noruega e diretora-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), “hoje, bactérias e vírus viajam tão depressa quanto os e-mails e os capitais especulativos”, o que sinaliza o impacto da globalização na disseminação de doenças. E o despreparo da comunidade das nações para enfrentar esse desafio é o que preocupa Kellman, pois as armas biológicas põem em risco a humanidade, e não apenas um país ou um povo em particular. Diz ele: “Exceção feita a duas dúzias de Estados desenvolvidos, ataques de bioviolência poderiam ser preparados com pouquíssima chance de ser detectados e com potencial destrutivo inimaginável para a população desprotegida”.

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Por que isso? Segundo o autor, “porque, até o momento, o direito internacional foi incapaz de desenhar, implementar e fazer cumprir políticas preventivas”, pois estas exigiriam mudanças significativas nos conceitos legais existentes. A principal delas seria a centralização dos comandos de prevenção e reação – teoricamente, na Organização das Nações Unidas –, o que demandaria dos países considerável renúncia a seu poder nacional e grande aceitação de políticas de cooperação. Infelizmente, o mundo ainda não parece aberto a atitudes desse tipo. Seja como for, o tema é do maior interesse, pois vale a pena perguntar até quando os governos confiarão na sorte para escapar a pandemias potencialmente arrasadoras (naturais ou provocadas).


O exército dos bichos O terrorismo do século 21 despertou as nações para os perigos da bioviolência, com armas químicas ou bacterio­ lógicas, mas a presença dos animais nos conflitos não data de hoje. E não apenas dos cavalos como transporte de soldados ou participantes do primeiro tanque de guerra da história, no início do século 15. Tampouco dos pombos-correio ou de seus predadores, os falcões, treinados para interceptar correspondências. Num pequeno livro muito informativo e de agradável leitura, Priscila Gorzoni, uma ativista em defesa dos animais, passeia pela história abordando a presença e a atuação maligna ou benigna de mamíferos, vermes, insetos, aves, ofídios etc. nos confrontos entre humanos. Animais nas guerras é o título da obra, publicada pela Matrix Editora.

Britânicos lançam pombo-correio na Segunda Guerra Mundial

Controle do espaço aéreo A obra foi lançada em 2010, com apoio da Fundação Atech, mas mantém seu interesse. Trata-se do livro Destino: soberania – O domínio brasileiro da tecnologia no tráfego aéreo, dos jornalistas Valéria Rossi e Aldrich Kanashiro. Lançado pela Segmento MC Editores, ele detalha em 223 páginas a conquista de todo o ciclo de conhecimento e tecnologia para gerenciar o espaço aéreo nacional, apresentando também imagens que contextualizam essa trajetória, além da evolução da Atech no setor. O livro contém ainda relatos de personagens importantes da área, como o brigadeiro Sócrates da Costa Monteiro, ex-ministro da Aeronáutica. Abordando passado, presente e cenário futuro, o trabalho relata o desenvolvimento do X-4000, primeiro software 100% nacional de gerenciamento aéreo, e o Sagitário (sistema avançado de gerenciamento de informações de tráfego aéreo e relatórios de interesse operacional), que entrou em operação em Curitiba (PR) no Cindacta II.

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cultura.cinema

Trilogia militar

completada Fotos: Divulgação

Em concorrida pré-estreia na Escola Naval do Rio de Janeiro, o Centro de Comunicação Social da Marinha (CCSM) e a Escola de Guerra Naval (EGN) apresentaram, no dia 14 de setembro, o documentário O Brasil na Batalha do Atlântico. O diretor, Erik de Castro, presente no evento, falou à TV Marinha na web e à Rádio Marinha. “Com este

Erik de Castro no set de filmagem, acima, cena do filme.

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filme, termino, após dez anos, uma trilogia que mostra a participação brasileira na Segunda Guerra Mundial. Agora, que finalizamos, a ideia é colocálos no mercado para que todo brasileiro tenha acesso, com o simples propósito de resgatar a memória”, declarou. Os outros documentários são Senta a pua (2001), do mesmo diretor, sobre a participação do 1º Grupo de Aviação de Caça naquele conflito, e A cobra fumou (2003), com direção de Vinícius Reis e produção de Castro, que focaliza a participação dos pracinhas da Força Expedicionária Brasileira (FEB) na Europa. O diretor agradeceu o apoio prestado pela Marinha do Brasil, que lhe facilitou a coleta de mais de 100 horas de material

gravado, incluindo mais de vinte entrevistas com veteranos da Marinha de Guerra e da Marinha Mercante. A exibição foi prestigiada pelas presenças do comandante da Marinha, almirante de esquadra Julio Soares de Moura Neto, autoridades, ex-combatentes e familiares, que saíram impressionados com a pujança das imagens e a emoção captada nos depoimentos, muitos deles comoventes. Considerando que o lançamento constitui “uma bela homenagem aos heróis brasileiros que participaram da guerra”, o almirante Moura Neto lembrou uma importante lição que ficou do conflito. “Na Segunda Guerra, a Marinha não estava pronta, mas rapidamente reagiu, recebeu meios e se fez ao mar para defender a nossa soberania, os nossos interesses e os navios mercantes em trânsito pelo litoral brasileiro ou que aqui aportavam”. Em resumo, ao ver o documentário, disse o coman-


dante, “estamos nos preparando para não ser surpreendidos”. A Batalha do Atlântico (3/09/1939-7/05/1945) foi a mais longa campanha da Segunda Guerra Mundial, tendo registrado o naufrágio de 3.500 navios cargueiros aliados, 175 navios de guerra aliados, 119 porta-aviões de escolta aliados e 783 submarinos alemães. Caminho para o público Para o Brasil, o conflito foi deflagrado pelos ataques de um submarino alemão, o U207, que, durante três dias, vitimou cinco navios mercantes e um iate, provocando 607 mortes em meados de agosto de 1942. No último dia desse mês, depois de muita hesitação e negociação com os Estados Unidos, o ditador Getúlio Vargas cedeu às pressões da população revoltada com a agressão do U-boat e declarou estado de guerra. Ao longo da Batalha do Atlântico, o Brasil escoltou 3.164 navios mercantes em 575 comboios. No lado das perdas, foram afundados 3 navios de guerra e 30 mercantes, nos quais faleceram 1.927 pessoas, sendo 469 militares da Marinha, 956 tripulantes dos navios mercantes e 502 passageiros. Um problema sério que a trilogia sobre o Brasil na Segunda Guerra vem enfrentando é o da distribuição. Apesar da existência de plateia para tais filmes, soma-se às dificuldades normais encontradas pela cinematografia nacional nas redes de exibição – que só abrem exceção para os filmes de bilhete-

Foto de pilotos brasileiros tirada pelo major da USAF John William Buyers, utilizada no filme Senta a pua

ria garantida pela presença de artistas famosos da televisão – o fato de a trilogia pertencer ao gênero documentário, pelo qual distribuidores e exibidores parecem ter alergia. E isso é verdade inclusive para documentários internacionais. A trilha desses filmes para se encontrar com as plateias brasileiras deve ser, além da

exibição nos canais de TV estatais e a cabo, a transformação em DVD para distribuição como vídeo. Nesse formato, os filmes poderão fazer carreira também na rede pública de ensino, como materiais paradidáticos, ajudando a juventude a conhecer um pouco mais sobre as Forças Armadas do Brasil. DEFESA LATINA

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efemérides

Foi para abrigar o Aeroclube do Brasil, a primeira organização aeronáutica fundada no país em outubro de 1911, que a antiga Fazenda dos Afonsos assumiu sua vocação, ganhando uma pista para pousos e decolagens e o nome de Campo dos Afonsos em 1912. Agora, no dia 12 de dezembro, comemoram-se os cem anos da Base Aérea dos Afonsos. Sob a batuta do brigadeiro Juniti Saito, comandante da Aeronáutica, os festejos terão homenagens a pioneiros da Força Aérea Brasileira e show da Esquadrilha da Fumaça. A cerimônia terá ainda a presença dos comandantes da Marinha, almirante Julio Soares de Moura Neto, e do Exército, general Enzo Martins Peri, cujas forças serão especialmente saudadas como cofundadoras da Força Aérea Brasileira, posto que, em 1941, cederam os vetores da aviação naval e da aviação militar para a formação da força irmã. “Berço da aviação do Brasil”, o Campo dos Afonsos foi e continua a ser pioneiro em várias atividades e iniciativas. Sediou

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Fotos: Musal

Cem anos do Campo dos Afonsos

a primeira escola de aviação do país e é hoje o campus da Universidade da Força Aérea (Unifa), para formação de quadros de elite com mestrados e doutorados em ciências aeronáuticas, assim como o centro nervoso das escolas de Aperfeiçoamen-

to, de Comando e Estado-Maior e de Instrução Especializada. De suas pistas decolaram os pioneiros da integração nacional – pilotos do Correio Aéreo Militar (CAM), depois Nacional (CAN), sob o comando do futuro patrono da arma, brigadeiro Eduardo Gomes. Ali, onde a indústria aeronáutica deu seus primeiros passos, está a sede do Museu Aeroespacial (Musal), que abriga um acervo extraordinário de aeronaves, objetos e documentos históricos. Um selo e um carimbo dedicados ao centenário foram lançados como parte das comemorações da unidade, que viu nascer a FAB e presenciou momentos memoráveis de sua trajetória. Também ficaram prontos dois produtos fundamentais para a divulgação da história do Campo dos Afonsos: um livro e um documentário, preparados por especialistas e historiadores reunidos pelo Centro de Memória do Ensino Militar da Unifa.


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