TCC O Desafio da Reciclagem do Lixo Eletrônico

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06 < Legislação

DIÁRIO CATARINENSE > TERÇA-FEIRA | 25 | NOVEMBRO | 2008

DC Documento

Apenas Paraná possui legislação exclusiva para lixo tecnológico

Ausência de menção específica ao e-lixo dificulta aplicação de normas

A

única regulamen- Salvato, ainda não existe necessitação brasileira que dade de planejamento para isso, já trata do lixo eletrô- que a empresa atua no mercado de nico é uma resolução varejo há apenas quatro anos. Para do Conselho Nacio- ele, a abertura de um programa de nal do Meio Ambien- recolhimento dos computadores te (Conama), que estabelece limites vai acontecer mais tarde, quando para o uso de substâncias tóxicas houver um volume maior de venem pilhas e baterias e responsabi- das e os computadores vendidos liza os fabricantes pela coleta e re- começarem a ficar obsoletos. ciclagem desses materiais. Tramita Em Santa Catarina, o descarte do desde 1998, no Congresso Nacional lixo eletrônico está sujeito à Política um projeto de lei que regulamenta Estadual de Resíduos Sólidos (Lei a coleta, o tratamento e a destina- nº 13.557), em vigor desde 2005, ção final do lixo tecnológico. Outro que estabelece, entre outras mediprojeto semelhante foi proposto em das, a criação de um Sistema de In2007 e anexado ao primeiro. A re- formações sobre resíduos sólidos. A gulamentação existente nos estados Secretaria de Desenvolvimento Ecodo Sul do país se refere apenas ao nômico Sustentável, órgão respondescarte de pilhas e baterias e para sável pela implantação do sistema, resíduos sólidos em geral. no entanto, não possui previsão paUma legislação mais específica ra o lançamento desse mecanismo. para o lixo tecnológico foi apro- A aplicação efetiva da lei estadual vada no Paraná em é prejudicada por dois junho deste ano. A motivos: além de delei nº 15.851 obripender da aprovação Políticas de ga as empresas de da Política Nacional de resíduos sólidos produtos de inforResíduos Sólidos, que não fazem referência ao e-lixo mática instaladas tramita no Congresso em seus artigos no estado a criarem Nacional há mais de programas de recoum ano, ela foi anexada lhimento, reciclagem ao Código Ambiental ou destruição de equipamentos. A do estado, projeto do executivo que Positivo Informática, sediada no tramita na Assembléia desde julho Paraná, é a maior fabricante de desse ano. Por isso, a PERS não está computadores do Brasil - registrou completamente regulamentada, jusuma produção de 225 mil compu- tifica Cláudio Cameschi, gerente de tadores por mês - e é responsável resíduos sólidos da secretaria. por 25% dos computadores vendiOutra questão que prejudica a dos nos mercado oficial em 2007. eficácia da PERS é a classificação A empresa não possui uma estru- dos tipos de resíduos presentes tura exclusiva para o recolhimen- nessa lei. Eles são classificados em to e reciclagem de computadores urbanos, industriais, de serviço de porque, de acordo com o assessor saúde, de atividades rurais, de serde comunicação da empresa Duda viços de transporte, radioativos e

PROJETO DE LEI PREVÊ LOGÍSTICA REVERSA

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PL nº 1991/07) descreve a logística reversa como “procedimentos destinados a facilitar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos aos seus geradores, para que sejam tratados ou reaproveitados em novos produtos, na forma de novos insumos, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, visando a não geração de rejeitos”. De acordo com o PL, o responsável pelos serviços públicos de limpeza urbana deve priorizar a contratação de organizações de catadores de materiais recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda. O professor de Engenharia Ambiental da PUC/PR, Carlos Garcias, critica o modelo de reciclagem adotado no país, sempre associado à marginalidade e à precariedade de condições de trabalho: “Nós adoramos reciclagem, mas quem tem que fazer é o pobre coitado do cavalo de dois pés. Nós estamos condenando uma parte da sociedade a uma degradação a tal nível que eles são a nossa sustentação!”.

especiais. A ausência de uma menção explícita ao lixo tecnológico pode dificultar o cumprimento da norma pelos responsáveis. Uma alteração feita na PERS em janeiro desse ano estabeleceu “a responsabilização do fabricante e de empresas que comercializem produtos ofertados ao consumidor final”. A lei, nesse caso, dá margem a muitas interpretações, porque não deixa claro nem a que tipo de produto se refere nem de que maneira se dará essa responsabilização. Para o presidente da ONG CDI, Antônio Póvoas, na prática a lei não é cumprida por falta de regulamentação: “Ainda não se sabe se o consumidor deve levar o produto obsoleto ao ponto de venda ou se as empresas precisam criar depósitos específicos para receber esse material”. Por isso ele acredita que a lei é

apenas o primeiro passo: “É preciso ainda estimular os fornecedores a participarem de projetos locais onde as pessoas poderiam descartar esse material. O comerciante, o fabricante e o vendedor que se tornarem responsáveis pelo destino do lixo tecnológico vão ter que criar uma estrutura para dar destino a isso”. Na opinião de José Rubens Morato, coordenador do Grupo de Pesquisa em Direito Ambiental da UFSC, é preciso uma lei específica de responsabilidade pós-consumo que classifique esse resíduo especial e que determine um procedimento de fiscalização que garanta a efetividade da norma. “Para isso, o órgão público precisa criar uma infra-estrutura geral: estabelecer o local onde vai ser feito o depósito, determinar qual a responsabilidade da empresa, quando ela vai ser acionada, como ela vai

gerenciar o custo da poluição e, principalmente criar instrumentos pra fiscalizar o cumprimento da lei”. Há, no entanto, dificuldades em definir o responsável, porque a cadeia de produção de produtos eletrônicos envolve fabricantes, distribuidores, varejistas, e muitas vezes, importadores. O professor defende a existência de uma responsabilidade compartilhada entre os envolvidos na cadeia. “Todos têm que responder pela sua parte no processo produtivo”. A legislação no Rio Grande do Sul demonstra o mesmo ponto fraco da de SC: a falta de clareza na classificação dos resíduos. Os tipos de resíduos previstos na PERS do estado são os provenientes de: atividades industriais, urbanas (doméstica e de limpeza urbana), comerciais, de serviços de saúde, rurais, de prestação de serviços e de extração de minerais.

Responsabilidade gera dilema Sete anos se passaram desde a criação da primeira Comissão Especial da Política Nacional dos Resíduos na Câmara dos Deputados. Em 2007, finalmente um projeto de lei (PL 1991/07), proposto pelo poder executivo (Ministério do Meio Ambiente) institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). O projeto tramita em regime de urgência no Congresso há um ano e dois meses. A questão central que impede a aprovação de uma Política Nacional de Resíduos Sólidos é a falta de consenso entre o governo e o setor empresarial quanto ao modelo de responsabilização pós-consumo a ser adotado no país. O PL que cria a Política estabelece que os resíduos sólidos reversos coletados pelos serviços de limpeza urbana deverão ser dispostos em instalações ambientalmente adequadas, “para que seus geradores providenciem o retorno para seu ciclo ou outro ciclo produtivo”, o que, em outras palavras significa a adoção da Responsabilidade Ampliada do Produtor (RAP), modelo em vigência na União Européia. A atribuição do gerenciamento dos resíduos aos fabricantes força-os a repensar a concepção dos novos produtos, a ampliação do tempo de vida útil e a facilidade de reciclagem dos equipamentos. Para o professor de Engenharia Ambiental da PUC/PR Carlos Mello Garcias a responsabilidade compartilhada é fundamental. “Não adianta responsabilizar só uma parte da sociedade”, acredita.

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A Gestão Compartilhada norteia o modelo de responsabilidade pós-consumo dos Estados Unidos. Esse padrão divide a responsabilidade pelos resíduos entre produtores, revendedores, consumidores e governos. A adoção da gestão compartilhada atende aos interesses econômicos dos produtores, já que, ao responsabilizar todos os envolvidos, acaba causando a ausência de definição quanto às competências de cada uma das partes nessa co-responsabilidade. Além disso, a cadeia de pós-consumo de um eletrônico é complexa, pois envolve desde fabricantes, redes varejistas, empresas de manutenção, de coleta de resíduos, catadores, comerciantes de sucatas, recicladores, até o próprio consumidor final. Eventualmente, a maior parte da responsabilidade acaba recaindo sobre o poder público municipal, que já é responsável pela gestão de resíduos municipais urbanos. Para Ângela Cássia Rodrigues, autora de uma dissertação de mestrado sobre os resíduos eletrônicos, “A ausência de regulamentação quanto à responsabilidade por esse tipo de resíduo faz com que o fluxo desses produtos ocorra de forma caótica, difusa e sem controle”. Na opinião de José Rubens Morato, coordenador do Grupo de Pesquisa em Direito Ambiental da UFSC, a falta de regulamentação gera incertezas, “tanto por parte do fabricante, quanto por parte do próprio órgão público, que deveria agir e não age. Então, fica um jogando a

responsabilidade para outro e acaba ninguém fazendo”. Na União Européia, duas diretivas sobre o uso e descarte desse lixo estão em vigor desde 2003. A WEEE (Waste Electrical and Electronic Equipment) disciplina a gestão de resíduos eletroeletrônicos, responsabiliza financeira e fisicamente os fabricantes e importadores por essas atividades e estabelece metas de coleta e prazos para a instalação de sistemas de tratamento e recuperação dos equipamentos descartados. A outra diretiva é a RoHS (Restriction of Certain Hazardous Substances), que restringe o uso de determinadas substâncias tóxicas e perigosas na fabricação dos produtos. Ambas integram a Política Integrada de Produtos, que se baseia em nos princípios da precaução, da ação preventiva, do poluidor-pagador e da RAP. De acordo com a política, os produtos devem conter informações sobre os materiais que os compõem e a localização interna das substâncias perigosas. No Brasil, produtores e distribuidores envolvidos na questão dos resíduos eletrônicos não concordam com a adoção de modelos do exterior. Para eles as particularidades do país devem ser consideradas. A Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica) defende a implantação da gestão compartilhada, onde as empresas poderiam assumir a responsabilidade exclusivamente sobre o produto que elas próprias fabricam.


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