Edição 1037

Page 1

Diário da Cuesta

NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE E DA CIDADANIA EM BOTUCATU

Acompanhe as edições anteriores em: www.diariodacuesta.com.br

Heitor Villa-Lobos, aniversariante de 5 de marco, foi um compositor, maestro, violoncelista, pianista e violonista brasileiro, descrito como “a figura criativa mais significativa do Século XX na música clássica brasileira”, e se torna o compositor sul-americano mais conhecido de todos os tempos. O maestro foi, indiscutivelmente, a principal figura da música na Semana de Arte Moderna de 1922. “Uma das manifestações mais importantes de Villa-Lobos foi a sua escrita orquestral. Eu diria que ele se tornou um compositor voltado para as suas raízes e utilizado do nosso folclore como seu alter ego. A partir de então, suas composições ficaram marcadas para sempre pelos laços profundos com a terra brasileira”. (Isaac Karabtchevsky) Página 2

ANO IV Nº 1037 TERÇA-FEIRA , 05 DE MARÇO DE 2024

Maestro Villa-Lobos

Transformações profundas mudavam o perfil da sociedade brasileira nos primeiros anos da década de 20, nos campos da literatura, da arte e da música: desde a revolucionária SEMANA DE ARTE MODERNA DE 1922 até a nova música que surgia carregada de folclore e brasilidade na maestria criativa de Heitor Villa-Lobos (1887-1959), responsável pela descoberta de uma linguagem peculiarmente brasileira em música, compondo obras que enaltecem o espírito nacionalista, ao qual incorpora elementos das canções folclóricas, populares e indígenas.

Os anos de 1930/40 seriam marcados por uma grande atuação na educação E a participação do maestro Villa-Lobos nos grandes eventos orfeônicos comemorativos das datas cívicas, sempre caracterizou a vinculação dele com o governo totalitário e a associação que se fez entre música, disciplina e civismo

Em 1931, em São Paulo, o maestro organizou uma concentração orfeônica chamada “Exortação Cívica”, com 12 mil vozes. Após dois anos assumiu a direção da Superintendência de Educação Musical e Artística. A partir de então, a maioria de suas composições se voltou para a educação musical Em 1932, Getúlio Vargas tornou obrigatório o ensino de canto nas escolas e criou o Curso de Pedagogia de Música e Canto. Em 1933, foi organizada a Orquestra Villa-Lobos

A experiência do Canto Orfeônico no Brasil

Em 1930, realiza turnê por sessenta e seis cidades. Grande sucesso! Realiza também nesse ano a “Cruzada do Canto Orfeônico” no Rio de Janeiro.Eram tão grandes os sucessos de Villa-Lobos e a aceitação da população que a visita em cada cidade era um fenômeno

Em 1931, a CARAVANA VILLA-LOBOS esteve em Botucatu/SP, quando foi festivamente recepcionada. A foto, defronte ao Teatro Espéria, mostra, ao centro, o maestro Villa-Lobos, com a presença dos professores da Escola Normal (prof. Franklin de Mattos, prof. Sylvio Galvão, profa. Jair Conti), do prefeito

municipal, Leônidas Cardoso, autoridades e populares.

Explica o autor que “o ideal do canto orfeônico tem suas raízes na França. No início do século XIX, o canto coletivo era uma atividade obrigatória nas escolas municipais de Paris e o seu desenvolvimento propiciou o aparecimento de grandes concentrações orfeônicas que provocavam o entusiasmo geral Na época, o sucesso desse empreendimento foi tal que surgiu até mesmo uma imprensa orfeônica

O canto orfeônico tem características próprias que o distinguem do canto coral dos conjuntos eruditos. Trata-se de uma prática da coletividade em que se organizam conjuntos heterogêneos de vozes e tamanho muito variável. Nesses grupos não se exige conhecimento musical ou treinamento vocal dos seus participantes

O método obteve sucesso em outros países, sendo que o autor destaca os seguintes aspectos da realidade brasileira da época: “as conotações de caráter políticos; a falta de capacitação pedagógica adequada, a falta de uma metodologia de ensino suficientemente estruturada”.

A opinião crítica do professor de História Contemporânea da USP, Arnaldo Contier, que enfoca a questão de forma particularmente rigorosa: “Villa-Lobos esteve na Alemanha nazista, quando voltou de Praga em 36. E, naquele momento, fez uma relação muito clara entre musica, civismo, propaganda e trabalho. Uma atitude nada ingênua e, ao contrário, muito consciente Villa-Lobos compactuou com o regime getulista de um modo deliberado e o fez porque quis e nunca somente por necessidade.”

Mesmo assim, é indiscutível a importância, o esforço e o mérito de Villa-Lobos. À parte o aspecto político, o trabalho que ele fez na divulgação de nosso folclore e das riquezas nacionais é valioso, revolucionário! (AMD)

2
Diário da Cuesta

A R T I G O “A tonga da mironga do kabuletê”

Maria De Lourdes Camilo Souza

Quem pensa que Vinicius era só poesia se enganou.

Não mais que de repente dou com essa música no YouTube.

Caí na risada pensando olha isso, há quanto tempo não ouvia... Gente, acabei cantando junto e saí dançando e a Mindy me olhando divertida abanando o rabão e rindo da minha gaiatice.

Chérie que já me conhece de outros carnavais nos seguia.

Estava mais interessada em capturar um filhotinho de pardal que entrou casa adentro e se debatia na vidraça.

E fui cantando como se ainda fosse carnaval.

“ Eu caio de bossa, Eu sou quem eu sou,

Eu saio da fossa xingando em nagô.

A tonga da mironga do kabulete”

Quem se lembra?

Essa música saiu depois que a Gesse, uma baiana, mulher do Vinicius, chegou do Mercado Modelo, muito admirada ao ter ouvido essa dos afrodescendentes enquanto por lá passava.

Chegou em casa falando a expressão e dando aula do que se tratava.

E quem é da tribo Nagô sabe que é uma alusão não muito lisongeira á mãe do sujeito.

Deu numa letra de um sambinha gostoso e o povo aderiu divertidamente. Ah bons tempos que se podia cantar xingamento em nagô sem virar mi-mi-mi.

Se um gaúcho escutasse já exclamava: - Bah Tchê: É disso que o véio gosta!

E o Sérgio Reis já seguiria cantando: “Panela véia é que faz comida boa.”

E se você escutar bem as músicas antigas vai entender que são compostas por muito mais que três acordes desses “baticunduns” contemporâneos.

E sem querer ofender ninguém continuei cantando: “A tonga da mironga do kabuletê “ Afinal hoje pode, é quarta feira de cinzas mas essa música não era hit carnavalesco.

E segue o baile...

Diário da Cuesta 3

LEITURA DINÂMICA

1– O ator global Marcos Palmeira interpretou Villa-Lobos em sua fase jovem no filme “VILLA-LOBOS: Uma Vida de Paixão”. O pai de Marcos Palmeira é o Diretor do filme, Zelito Viana, irmão do famoso Chico Anysio A interpretação de Marcos Palmeira, na 1ª fase, e de Antonio Fagundes na 2ª fase, foram muito elogiadas pela crítica.

2– Companheira de Villa-Lobos por mais de duas décadas, sua primeira esposa foi Lucília Guimarães Villa-Lobos que soube que seu casamento estava encerrado por carta. Figura fundamental na formação artística do maestro, a pianista teve sua relevância ignorada por todos que escreveram sobre Villa-Lobos. Lucília orientou e colaborou enquanto intérprete de muitas de suas obras. A pesquisadora Mary Lombardi afirmou que muitas composições de piano creditadas somente a Villa-Lobos foram, na verdade, criações conjuntas com Lucília. Villa-Lobos não teve filhos

3 – Foi turbulento o episódio da vida pessoal do maestro que ocorreu em 1936, em uma viagem a Berlim, quando ele mandou uma carta desmanchando o casamento de 23 anos com a pianista Lucília Guimarães. Ele viajou em companhia de Arminda

Neves d’Almeida, professora de música e sua secretária, então com 24 anos (quando ele tinha 46). A união com Arminda durou até sua morte.

4

– Históricamente, os charutos estiveram ligados ao poder e ao universo masculino. Personalidades como Fidel Castro, Che Guevara, Winston Churchill, Orson Welles, Tom Jobim, Fernando Pessoa, Groucho Marx, Getúlio Vargas e Villa-Lobos tiveram sua imagens associadas aos charutos. A produção do fumo baiano envolve 12 mil trabalhadores. Atualmente, as oito fábricas locais produzem 10 milhões de unidades por ano. Apesar disso, mais de 90% da produção nacional é exportada.

5

– “O Trenzinho Caipira” é parte integrante da peça Bachianas Brasileiras nº 2. A obra se caracteriza por imitar o movimento de uma locomotiva com os instrumentos da orquestra. Em 1931, ao excursionar por 54 cidades do interior paulista, inspirou-se para compor “O Trenzinho Caipira”. Anos depois, a melodia recebeu letra composta pelo poeta Ferreira Gullar, em Poema Sujo

“O TRENZINHO DO CAIPIRA” - Heitor Villa-Lobos

É uma composição de Heitor Villa-Lobos e parte integrante da peça Bachianas Brasileiras nº 2. A obra se caracteriza por imitar o movimento de uma locomotiva com os instrumentos da orquestra... Bachianas Brasileiras é uma série de nove composições de Heitor Villa-Lobos escrita em 1922:

Lá vai o trem com o menino

Lá vai a vida a rodar

Lá vai ciranda e destino

Cidade e noite a girar

Lá vai o trem sem destino

Pro dia novo encontrar

Correndo vai pela terra

Vai pela serra

Vai pelo ar

Correndo entre as estrelas a voar No ar no ar no ar no ar no ar

Lá vai o trem com o menino

Lá vai a vida a rodar

Lá vai ciranda e destino

Cidade e noite a girar

Lá vai o trem sem destino

Pro dia novo encontrar

Correndo vai pela terra

Vai pela serra

Vai pelo ar

Cantando pelas serras do luar

Correndo entre as estrelas a voar

No ar, no ar, no ar

Diário da Cuesta 4

ASAS SOLTAS

Naquela quadra do ano o outono estava muito lindo e o sol brilhante! Vez por outra era um aguaceiro só, e por todas as partes o vento sul muito frio! Durante a noite rápida manga d’água tamborilava no telhado da sua casa. Véspera de um domingo tudo indicava mais um dia para ficar desfrutando daquela tranquilidade campestre. Pela manhã abriu a janela de seu quarto e verificou que o céu estava nublado - branco e muitas nuvens como flocos de algodão.

Seus pais, oriundos de famílias com tradições religiosas, mesmo sob chuva se deslocavam do sítio até uma pequena cidade próxima, onde participavam do culto dominical. Nesse domingo ele não acompanhou os pais, mesmo sem saber das razões da sua momentânea indiferença. De sua janela olhava para o gramado encharcado pela chuvarada do dia anterior e das pancadas noturnas.

Apanhou no armário da cozinha um pacotinho de alpiste e como de costume, jogava pequenos grãos atraindo bandos de tico-ticos e pardais. No amontoado que se fazia, eventualmente aparecia um canário da terra. Na distraída e descompromissada manhã esse era o seu passatempo, seu próprio lazer.

Tico-ticos e Pardais! linda natureza...!

Sob as difusas nuvens, às vezes caia uma levíssima neblina. Passarinhos brincavam como crianças tagarelas: como bicam uns aos outros! Este aqui pousa num galho, voa, e deixa-o balançando. Aquele outro salta

no telheiro do alpendre cheio de flores multicoloridas emprestando-lhe o maior realce.

Abençoadas asas soltas! Distante dos calendários ou datas nada lhes dizem os sinos, senão a música dos sinos domingueiros. Estas avezinhas são as donas da liberdade, do que é natural, do que é verdadeiro, nada as detém ou limita, exceto quando uma maldade predatória delas se aproxima.

Alegres e sem compromissos obrigatórios, sem outra moral senão a sua, nem outro Deus senão o espaço celeste, cinzento ou azul, não importa.

Voam sem dinheiro e sem bagagem; mudam de casa ou galho quando querem; imaginam um córrego, pressentem um jardim, e não precisam mais do que abrir as asas para alcançar a felicidade; nada sabem de horas nem de dias; banham-se em qualquer tina d’água e a qualquer momento, amam o amor sem nome.

No domingo quando todos vão à missa trancando as portas, os passarinhos em um alegre e generoso exemplo de amor sem rituais, voam com o seu jovial alarido, para os jardins e gramados da casa fechada, esperando encontrar ali um velho amigo que de sua janela, os recebe com o alpiste da conciliação entre o homem e a natureza.

Roque Roberto Pires de Carvalho
Momentos Felizes
Diário da Cuesta 5
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.