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Fotos: Reprodução

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As touradas e a literatura na Paris do entre-guerras

‘Orpheu’, matriz da vanguarda portuguesa

Ernest Hemingway

Mário de Sá-Carneiro

Jornal daUnicamp www.unicamp.br/ju

Campinas, 3 a 9 de agosto de 2015 - ANO XXIX - Nº 631 - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

MALA DIRETA POSTAL BÁSICA 9912297446/12-DR/SPI UNICAMP-DGA

CORREIOS

FECHAMENTO AUTORIZADO PODE SER ABERTO PELA ECT Foto: Gabriel Monteiro/ Divulgação

A baía resiste, apesar do homem 3

O projeto Biota/Fapesp Araçá mapeia e ajuda a preservar a biodiversidade da baía homônima localizada em São Sebastião, Litoral Norte paulista. Coordenado pela professora Cecília Amaral, do Instituto de Biologia da Unicamp, o projeto já descreveu 56 novas espécies, além de uma família e cinco gêneros.

Pesquisadores em trabalho de campo: projeto envolve cerca de 170 participantes

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Uma manteiga com mais cremosidade Pesquisa liga drogas a ocorrências violentas

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Energia eólica no NE impulsiona economia

Modelo matemático e a origem da vida

Os efeitos da colheita mecanizada no solo

O que se leva de um curso superior?

Ritos agrícolas e campo magnético

TELESCÓPIO

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Campinas, 3 a 9 de agosto de 2015

TELESCÓPIO

CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br Foto: Chuck Carter e Gregg Hallinan/Caltech

tividade elétrica e térmica, fazem do grafeno um importante alvo de pesquisas. O prêmio Nobel de Física de 2010 foi concedido a autores de estudos sobre esse material. A equipe de Cornell usou técnicas inspiradas em kirigami para cortar e dobrar folhas de grafeno, criando eletrodos, molas e dobradiças, e demonstrando que esses dispositivos podem operados remotamente, por meio de campos magnéticos. O trabalho é descrito na revista Nature.

Prevendo surtos de gripe

Ilustração de aurora na atmosfera da anã marrom LSR J1835+3259

Aurora gigante Uma equipe internacional de pesquisadores descreve, na revista Nature, a detecção de sinais de uma aurora eletromagnética, como as auroras boreal e austral da Terra, em um corpo celeste localizado a 18 anos-luz, chamado LSR J1835, provavelmente uma anã marrom. Anãs marrons são uma classe de astros intermediária entre planetas gigantes gasosos, como Júpiter e Saturno, e estrelas propriamente ditas. Embora auroras sejam comuns em todos os astros dotados de campo magnético, as captadas na anã marrom são bem mais intensas do que as dos planetas do nosso Sistema Solar, liberando uma energia pelo menos 10 mil vezes maior que a das auroras de Júpiter. Os autores afirmam que as auroras da anã marrom injetam energia nas camadas inferiores de sua atmosfera, e que correntes criadas no campo magnético do astro podem ser importantes na produção de fenômenos meteorológicos.

Origem da vida As hipóteses mais aceitas sobre a origem da vida na Terra pressupõem o surgimento de polímeros – moléculas formadas pelo encadeamento de unidades menores, os chamados monômeros – que desenvolveram a capacidade de fazer cópias de si mesmos, como o DNA e o RNA que existem nos seres vivos atuais. As condições sob as quais esse processo se deu ainda são desconhecidas, mas um modelo matemático, apresentado no periódico Journal of Chemical Physics, sugere um mecanismo para explicar o salto entre monômeros livres e polímeros replicantes. Os autores, ligados ao Laboratório Nacional de Brookhaven (EUA), propõem que moléculas longas podem ter servido como “gabaritos” químicos para facilitar a ligação entre moléculas menores, acelerando a formação de estruturas replicantes.

“A ligação assistida por gabarito (...) é um meio mais fiel de preservar a informação, já que as cadeias de polímero de uma geração são usadas para construir a seguinte”, diz nota divulgada pelo Instituto de Física dos Estados Unidos a respeito do estudo.

Um modelo de computador, alimentado com 16 anos de dados ambulatoriais e de laboratórios de exames clínicos, foi capaz de “pós-prever” os momentos de pico e a intensidade máxima de 44 epidemias de gripe que atingiram Hong Kong no período, obtendo uma taxa de sucesso de 93% a três semanas de antecedência de cada evento. O artigo que descreve o modelo e sua criação aparece no periódico PLOS Computational Biology, e é de autoria de pesquisadores da Universidade de Columbia e da Universidade de Hong Kong. “Essas previsões fornecem informação que pode ser valiosa para o público e para as autoridades”, disse, por meio de nota, o principal investigador, Jeffrey Shaman, de Columbia. “Indivíduos podem optar por tomar a vacina contra a gripe, e as autoridades podem antecipar as necessidades de doses de vacina e outros recursos”.

Campo magnético no Sul Sete vezes cometa A edição mais recente da revista Science traz um conjunto de sete artigos sobre o cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko, descrevendo descobertas feitas pela sonda Philae, o primeiro objeto artificial a pousar nesse tipo de corpo celeste. Ao descer no cometa, em novembro de 2014, Philae surpreendeu os cientistas ao quicar na superfície, lançando-se de volta ao espaço antes de pousar de vez em outro ponto do astro. Esse salto inesperado é tema de um dos artigos, que analisa os diferentes graus de rigidez dos dois pontos de descida. Outros trabalhos descrevem os resultados obtidos pela transmissão de ondas eletromagnéticas através do núcleo do cometa, a detecção de 16 tipos de moléculas orgânicas no astro, sendo quatro dos quais até então desconhecidos em cometas, a presença de polímeros criados por radiação na superfície do cometa; também analisam em detalhe as fotos feitas por sete câmeras e as leituras das variações de temperatura do astro.

Kirigami de grafeno Pesquisadores da Universidade Cornell, dos Estados Unidos, adaptaram a arte japonesa do kirigami – que cria obras a partir da manipulação de folhas de papel por meio de dobraduras e recortes – para o grafeno, um material formado por camadas de carbono com apenas um átomo de espessura. Suas propriedades físicas, incluindo força, condu-

Um ritual de limpeza praticado por agricultores da África do Sul, entre 1000 e 400 anos atrás, está ajudando cientistas a entender as variações do campo magnético terrestre no hemisfério sul, aponta artigo publicado no periódico Nature Communications. O rito, que consistia em queimar cabanas e armazéns de grãos, aquecia as rochas do piso, que então se alinhavam com o campo magnético dominante na época. Os autores do estudo, baseados nos Estados Unidos e na África do Sul, afirmam que esse registro das rochas mostra uma mudança relativamente rápida na direção do campo por volta do ano 1300, e os autores acreditam que essa descoberta pode ter implicações para a compreensão de mudanças recentes registradas no campo magnético do planeta. “O decaimento dramático da intensidade do campo geomagnético dipolo nos últimos 160 anos coincide com mudanças na morfologia do campo no hemisfério sul, e tem motivado especulações sobre uma reversão iminente”, escrevem os autores. “A compreensão dessas mudanças, no entanto, tem sido limitada pela falta de observações de longo prazo no hemisfério sul”, uma lacuna que o registro sul-africano pode ajudar a preencher.

Esforço coletivo em bioquímica Muito da pesquisa básica em biomedicina é feita com o uso de “sondas” químicas, moléculas projetadas para interagir com proteínas específicas e, assim, permitir que os cientistas deduzam qual a função dessas proteínas no corpo humano, e se seria útil encontrar uma droga capaz de afetá-las.

De acordo com um grupo internacional de pesquisadores, no entanto, a literatura da área vem sendo “contaminada” por inúmeras sondas defeituosas, que ou não são específicas o suficiente para os alvos em vista, ou que apresentam outras interações indesejáveis. Para contornar isso, esses pesquisadores decidiram estabelecer um consórcio, financiado pelo Wellcome Trust, a fim de documentar e orientar o uso de sondas. A iniciativa, chamada Chemical Probes Portal (http://www.chemicalprobes.org/), consiste num website colaborativo onde cientistas podem publicar notas sobre o uso de sondas e seus efeitos, além de receber orientações sobre tipos de sonda, seus usos e os controles adequados.

Curso superior, aprendizado contínuo? Ter cursado graduação numa universidade não estimula as pessoas a manter uma vida intelectual mais ativa do que a da população em geral, sugere pesquisa realizada pelo Instituto Gallup nos Estados Unidos. O levantamento, que apresentou a 170 mil americanos adultos a questão “Você aprendeu algo novo ou interessante hoje?” não encontrou diferença significativa entre as taxas de resposta positiva dadas por graduados do ensino superior e pessoas com menor nível educacional: foram 66% dos portadores de diploma de bacharelado que responderam “sim” à pergunta, ante 65% dos formados em cursos técnicos ou com curso superior incompleto e 63% dos formados apenas no ensino médio regular. O impacto da educação formal no nível de curiosidade e atividade intelectual, de acordo com o Gallup, só aparece a partir da pós-graduação. Foram 74% dos pós-graduados que disseram ter aprendido coisas novas e interessantes no dia em que responderam à pesquisa, dez pontos porcentuais acima da população em geral. Outra sondagem do Gallup mostrou que o consumo de bebidas alcoólicas entre os americanos adultos com nível universitário é maior (apenas 20% se declaram abstêmios) do que entre os adultos em geral (36%). Ambos os levantamentos foram divulgados no início da semana passada.

Aventura viking Os vikings realizavam saques e ataques na costa britânica, durante a Idade Média, não apenas em busca de riqueza, mas também de aventura, exotismo e status social, argumenta o arqueólogo Steve Ashby, da Universidade de York, em artigo publicado no periódico Archaeological Dialogues. Para os vikings, “o ato de conquistar o tesouro era tão importante quanto o tesouro em si”, afirma. “Nas hierarquias flexíveis da Era Viking, quem se aproveitava das oportunidades para ampliar seu capital social tinha ganhos significativos”, escreve o pesquisador. “O apelo dos saques era, portanto, maior que o butim; era conquistar e preservar poder, por meio do encanto da viagem, e da realização de feitos grandiosos”.

UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas Reitor José Tadeu Jorge Coordenador-Geral Alvaro Penteado Crósta Pró-reitora de Desenvolvimento Universitário Teresa Dib Zambon Atvars Pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários João Frederico da Costa Azevedo Meyer Pró-reitora de Pesquisa Gláucia Maria Pastore Pró-reitora de Pós-Graduação Rachel Meneguello Pró-reitor de Graduação Luís Alberto Magna Chefe de Gabinete Paulo Cesar Montagner

Elaborado pela Assessoria de Imprensa da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Periodicidade semanal. Correspondência e sugestões Cidade Universitária “Zeferino Vaz”, CEP 13081-970, Campinas-SP. Telefones (019) 3521-5108, 3521-5109, 3521-5111. Site http://www.unicamp.br/ju e-mail leitorju@reitoria.unicamp.br. Twitter http://twitter.com/jornaldaunicamp Assessor Chefe Clayton Levy Editor Álvaro Kassab Chefia de reportagem Raquel do Carmo Santos Reportagem Carlos Orsi, Carmo Gallo Netto, Isabel Gardenal, Luiz Sugimoto, Manuel Alves Filho, Patrícia Lauretti e Silvio Anunciação Fotos Antoninho Perri e Antonio Scarpinetti Editor de Arte Luis Paulo Silva Editoração André da Silva Vieira Vida Acadêmica Hélio Costa Júnior Atendimento à imprensa Ronei Thezolin, Gabriela Villen, Valerio Freire Paiva e Eliane Fonseca Serviços técnicos Dulcinéa Bordignon e Fábio Reis Impressão Triunfal Gráfica e Editora: (018) 3322-5775 Publicidade JCPR Publicidade e Propaganda: (019) 3383-2918. Assine o jornal on line: www.unicamp.br/assineju


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Campinas, 3 a 9 de agosto de 2015

Projeto mapeia e registra

novas espécies em baía de SP Biota/Fapesp Araçá descreve também cinco novos gêneros e uma família, no Litoral Norte Foto: Cecilia Amaral/Divulgação

CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br

biodiversidade da Baía do Araçá, no Litoral Norte paulista, não só resiste à presença do vizinho Porto de São Sebastião como ainda ajuda a sustentar a população caiçara do entorno e preserva a capacidade de surpreender e encantar cientistas, revelando novas espécies, afirma a pesquisadora da Unicamp Cecília Amaral, coordenadora do Projeto Biota/Fapesp Araçá, que envolve cerca de 170 participantes, entre pesquisadores, técnicos e estudantes, do Brasil e do exterior. Iniciado em 2012 e com término previsto para 2016, o projeto já conta com 60% dos dados analisados e revela um ambiente vibrante. “Em 50 anos de pesquisas, até 2010, tinham sido descritas pouco mais de 700 espécies na baía, sendo 34 espécies novas e nove ameaçadas de extinção”, disse a pesquisadora. “Agora, ainda com apenas 60% dos dados analisados, temos mais de mil espécies, sendo outras 56 novas para a ciência, além de cinco novos gêneros e uma nova família”. Gênero e família são níveis de classificação superiores à espécie – um gênero pode abrigar várias espécies e uma família, vários gêneros. Descobertas de gêneros até então não descritos pela ciência são um evento mais raro que o de espécies, e a descoberta de uma nova família é algo ainda mais difícil. As descobertas sobre a biodiversidade no Araçá estão descritas no livro “Vida na Baía do Araçá: Diversidade e Importância”, lançado, no início de agosto, em São Paulo e também em São Sebastião. “A publicação apresenta, em linguagem acessível, mas com rigor científico, os nossos resultados”, disse Cecília. O livro em papel será distribuído gratuitamente, e também estará disponível online, quando o site do projeto Biota/Fapesp Araçá entrar no ar, o que, a pesquisadora acredita, deve ocorrer em breve. “O livro atesta que a baía está viva”, disse ela. Além de investigar a biodiversidade da baía – que chegou a ser declarada “morta” pelo prefeito do município de São Sebastião, em 2011, em meio aos debates sobre a ampliação do porto, que já engoliu, com aterros, duas áreas do Araçá – o projeto Biota/ Fapesp também busca uma compreensão integrada do ambiente físico e químico e das interações humanas. “A baía reúne vários ambientes, como praias, planície de maré, costões rochosos, onde vive uma grande diversidade de organismos. Temos também o manguezal, que já foi muito maior, mas ainda existem alguns remanescentes de grande importância ecológica. A região foi bastante modificada pelo homem, sofreu aterros e também tem a proximidade da cidade de São Sebastião, uma zona muito urbanizada”, disse a pesquisadora. “Então, resolvemos fazer algo que é inédito no Brasil, e raro mesmo em nível mundial, um projeto que não trabalha somente com a fauna e a vegetação, mas também com as pessoas que vivem no entorno, onde temos

Vista parcial da Baía do Araçá: descobertas sobre a biodiversidade foram descritas em livro

“E tem outro fator ali, também”, acrescenta ela. “Como é uma baía mais abrigada, muitos peixes são criados em seu interior. Outro dia, os pesquisadores do projeto capturaram meia tonelada de sardinha jovem na baía, porque a sardinha provavelmente está sendo criada em seu interior. Essas áreas são conhecidas mundialmente como regiões de criadouro”. Parte do ineditismo do projeto vem da forma como foram obtidas as amostras de espécimes da vida aquática. “No caso de peixes, não foram usados rede de arrasto e um barco de pesquisa, como normalmente se faz. Foram convidados pescadores que pescam na baía e entorno, com as suas diferentes armadilhas, seus petrechos, como são chamados, e coletaram nas áreas mais exclusivas onde costumam pescar. Então, é o resultado de fato, pescado pelo pescador”.

INTERAÇÕES

bairros, moradores. E como esses moradores veem a baía? Ela fornece subsídios para sobrevivência deles? Eles coletam peixe na baia? Eles coletam invertebrados marinhos para alimentação? Tem venda? Tem importância comercial? Tem sim, e como!”, afirmou.

RESILIÊNCIA

a água vai circular por baixo da plataforma, entre os pilotis, não haveria alterações no ambiente como um todo, incluindo a fauna e flora. Mas a plataforma atrapalhará, sim, e muito. Porque tudo abaixo dela, num ambiente sem luz e com milhares de pilotis, terá sua dinâmica modificada e um severo empobrecimento da vida ocorrerá, além do ambiente tornar-se insalubre”. A causa da resistência excepcional do ambiente do Araçá aos ataques humanos ainda está sendo investigada, mas Cecília aposta no papel da circulação da água entre a baía e o canal de São Sebastião. “No final do projeto, vamos ter essa resposta mais sólida, mas creio que a hidrodinâmica é o principal parâmetro que coordena esse trabalho. Quando a corrente marítima entra na baía, ela vem de norte a sul, num processo que está sempre lavando a baía, e ao mesmo tempo trazendo novos organismos”, disse. “Por exemplo, registramos um acúmulo maior de metais no canal, só que dentro da baía estes são encontrados em quantidades bem menores, menos da metade”, exemplifica. “Creio que o estudo da hidrodinâmica, tipos de corrente, altura de onda, altura de maré, integrado a outros fatores irão esclarecer melhor tal fato”.

Uma das constatações do projeto, até agora, foi a notável capacidade da vida na baía de resistir e se recuperar das agressões feitas pelo ser humano. “Ela tem uma resiliência muito própria, uma recuperação natural muito grande”, disse Cecília. “Muitos de nós estudamos a Baía do Araçá há muitas décadas, trabalho com meus estudantes desde 1987. Então, vejo como mexem na baía, olho e penso, desta vez ela não se recupera. Aí vamos lá estudar, e a baía se recuperou”. A baía sofreu com a ampliação do Porto de São Sebastião, devido aos aterros, e também com a instalação de um emissário para despejo de esgoto, precedida por uma dragagem, na década de 1990. O Projeto Biota/Fapesp já mostrou que mesmo as nove espécies em perigo de extinção, detectadas nas pesquisas anteriores, continuam lá. “Todas aquelas espécies ameaçadas continuam lá, e agora registramos mais sete. Assim, são 16 espécies ameaçadas que vivem no Araçá. Por quê? O ambiente, embora sofrendo alterações frequentes, vai se recuperando, então as espécies ali permanecem. Este resultado já é suficiente para mostrar que a baía vive. Porém, ainda temos mais 40% de material para ser analisado, o que pode trazer muitas novidades para o resultado final. O projeto tem a expectativa de terminar em 2016”. Mas essa resistência toda não é, adverte a pesquisadora, inesgotável. Ela cita a nova proposta de ampliação do porto com a construção de uma plataforma para contêineres por sobre parte da baía. “Para evitar um novo aterro, porque quando se aterra tudo é destruído, foi proposta uma plataforma sobre pilotis”, explicou ela. “A alegação é que, como

O projeto também vem estudando e constatando a importância da preservação da baía para a população que vive em seu entorno. “Os caiçaras querem que permaneça como está”, disse Cecília. “Tem um grande número de caiçaras que vive do Araçá”. Os pesquisadores envolvidos no levantamento de dados para a gestão integrada da baía vêm entrevistando as famílias e montando um relatório com as respostas. “Eles estão vendo que ganho os caiçaras têm com o que coletam ali. Alguns dizem: ‘coleto e como’. Outros: ‘sustento a minha família e também tenho comércio, vendo 20 kg de berbigão ao dia’, por exemplo”.

Foto: Antonio Scarpinetti

Fotos: Gabriel Monteiro/Divulgação

CAIÇARAS

Draga para coleta de organismos do fundo do mar (acima) e agrupamento de minhoca-do-mar em seus tubos (abaixo)

A professora Cecília Amaral, coordenadora do Projeto Biota/Fapesp Araçá: “Temos mais 40% de material para ser analisado, o que pode trazer muitas novidades para o resultado final”

O projeto se divide em três frentes – Processos Biológicos, Processos Físicos e Gestão – sendo que cada uma tem questões específicas a responder. Os Processos Biológicos, por exemplo, investigam a biodiversidade local, as populações das diferentes espécies e a relação entre elas. Os pesquisadores da área de Processos Físicos buscam compreender as características da água e do sedimento. E Gestão avalia o aspecto socioeconômico, quais os impactos da atividade humana sobre a baía, como e por quem a área é utilizada. “Todas essas perguntas estão dentro de cada um desses grandes grupos, e aí temos a integração entre os grupos”, disse Cecília. “Qual a integração entre a biologia, o físico e o químico? A estrutura das comunidades de animais e vegetais? Como eles se distribuem no tempo e no espaço? Quais são os eventuais impactos que eles podem sofrer, tanto naturais quanto antrópicos?” “A gestão pode interagir também com esses aspectos”, lembrou. “Vai interagir com o físico e químico: houve erosão? Qual o prejuízo para a baía e os moradores por causa da erosão? A questão da pesca. Tem pesca? Como vai ser conduzido o manejo dessa pesca? Quais serviços ambientais são prestados?”

MODELOS

No fim, os pesquisadores esperam que as intercessões entre as diferentes áreas produzam um modelo ecológico. “Como não temos todos os dados ainda, o modelo será elaborado após a finalização dos resultados, possivelmente nos seis últimos meses, quando estiver tudo pronto”, disse Cecília. “O modelo reúne todos os resultados e gera uma figura: como a baía funciona, quem se alimenta de quem, quais as bases da teia trófica com seus próprios organismos e mais aqueles como o peixe que entra para desovar, e depois da desova as larvas são criadas ali dentro”, exemplificou. “E com o objetivo de incluir as interações humanas, também”. O produto final do projeto deverá ser um sistema para o gerenciamento dos dados gerados. “As informações estarão disponíveis em bancos de dados, para que sejam utilizados como subsídios na avaliação e elaboração de planos de conservação e manejo. Além disso, outros pesquisadores poderão cruzar as informações”. Se bem-sucedido, o projeto poderá servir de modelo para outras áreas, no Brasil e no exterior. “Se a gente consegue trabalhar com tudo isso, com todos esses tipos de análises, dar uma fotografia de como aquele sistema funciona, incluindo a gestão, será um fato inédito – porque sempre estudamos a biodiversidade, o ambiente físico, químico e não relacionamos com a importância socioeconômica da área de estudo”, disse a pesquisadora. “A inclusão da gestão, nessa globalização do projeto, creio que seja a primeira vez que se faz no Brasil. No exterior, existem três ou quatro projetos com esse objetivo. Então, a ideia é que essa pesquisa seja levada a outros locais, outros Estados, como um modelo bem-sucedido”.


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Campinas, 3 a 9 de agosto de 2015

Adição de fração da gordura do leite confere maior maciez ao produto

Pesquisadora desenvolve

manteiga mais cremosa Fotos: Antoninho Perri

SILVIO ANUNCIAÇÃO silviojp@reitoria.unicamp.br

ma manteiga mais macia, mesmo em baixas temperaturas, promete tornar o ato de espalhá-la sobre o pão ou o biscoito mais fácil aos consumidores. O produto, muito apreciado pela população devido às características marcantes de sabor e aroma, foi formulado pela pesquisadora Mayara de Souza Queirós, da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp, como parte de sua dissertação de mestrado defendida recentemente. Ela garante que não há diferença de sabor para a manteiga comercializada. Ao contrário das margarinas, a manteiga consumida atualmente possui a desvantagem de ser mais sólida e, consequentemente, menos cremosa, sobretudo em temperaturas de refrigeração, que variam entre 5ºC e 10ºC. A obtenção de uma manteiga mais fácil de espalhar, semelhante às margarinas, foi possível graças à adição da oleína, uma fração da gordura do leite. A autora da pesquisa esclarece que a manteiga formulada, desenvolvida em escala experimental, não está disponível para comercialização. Mayara Queirós explica que a oleína é uma fração mais líquida da gordura do leite, o que conferiu à manteiga formulada na FEA uma maior maciez em relação às manteigas convencionais. Além disso, de acordo com ela, a adição de oleína possibilitou que a manteiga ficasse mais amarela, dispensando o uso de corantes. Durante o fracionamento da gordura do leite houve uma concentração de betacaroteno em oleína. Tal pigmento natural conferiu a coloração tão apreciada pelos consumidores. “O nosso objetivo foi formular uma manteiga para que o consumidor, ao retirá-la da geladeira, já pudesse consumir imediatamente, sem esperar determinado tempo em temperatura ambiente. Partimos, na formulação desta manteiga, de uma gordura pura do leite. Fizemos um duplo fracionamento nessa gordura e obtivemos a oleína. O nosso resultado principal foi que, com a adição de oleína, a manteiga ficou mais macia e amarelada. Esses resultados foram conseguidos com a adição de 50% de oleína ao creme de leite utilizado para fabricação de manteiga”, relata a pesquisadora da Unicamp, que é tecnóloga em alimentos.

Manteiga é testada em equipamento da Faculdade de Engenharia de Alimentos: oleína dispensa o uso de corantes

O mestrado de Mayara Queirós, defendido junto ao Programa de Pós-Graduação em Tecnologia de Alimentos da FEA, foi orientado pela docente Mirna Lúcia Gigante, que atua no campo de pesquisas relacionadas à ciência e tecnologia de alimentos, com ênfase em tecnologia de produtos lácteos. Houve coorientação do químico e pesquisador Renato Grimaldi, que atua no Laboratório de Óleos e Gorduras da FEA. A pesquisa foi financiada, na forma de bolsa à autora, pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). “Trabalhos futuros devem prever o teste sensorial desta manteiga e um tempo de armazenamento mais longo, para garantir a chamada vida de prateleira do produto. A avaliação sensorial seria muito mais para comprovar a espalhabilidade do que o sabor, ou seja, testar se o consumidor acha mesmo que ela possui esta propriedade”, considera a orientadora Mirna Gigante. Ainda conforme a docente, outros resultados importantes da pesquisa demonstraram que, quando expostas à temperatura ambiente, a firmeza de ambas as manteigas diminuiu ao longo do tempo, porém a manteiga adicionada de oleína foi significativamente menos firme que a manteiga controle. Isso ocorreu nos dois tempos de armazenamento avaliados, 1 e 7 dias. Também foi observado que o armazenamento por sete dias afetou positivamente a firmeza da manteiga adicionada de oleína.

METODOLOGIA

Ela acrescenta que a adição de oleína reduziu o teor de gordura sólida da manteiga, resultando em um produto de composição similar à manteiga controle, mas com menor ponto de fusão (maior capacidade de derretimento) e maior tempo para formação de cristais. “A adição de oleína conferiu maciez à manteiga porque alterou, possivelmente, a rede dos cristais de gordura que compõe a manteiga, diminuindo a quantidade de gordura cristalizada.” Mayra Queirós distingue que, enquanto a manteiga é de base láctea, produzida a partir do creme do leite, a margarinas são produzidas por meio da hidrogenação de óleos vegetais. Estes óleos, com propriedades mais líquidas do que a gordura do leite, tornam as margarinas mais macias

Fotos: Divulgação

e espalháveis do que as manteigas, principalmente quando resfriadas. “Nós poderíamos ter adicionado, na formulação, um óleo vegetal, mas aí não seria uma manteiga”, justifica. Ainda de acordo com a estudiosa da FEA, a manteiga é produzida a partir da inversão de fase do creme de leite por meio da aplicação de energia mecânica aliada ao resfriamento. Tecnicamente a manteiga pode ser definida como uma emulsão (mistura) de água em óleo. A sua maciez e espalhabilidade são definidas pelo equilíbrio entre as fases líquidas e cristalizadas da gordura, sendo que o aumento da quantidade de gordura líquida na emulsão resulta em um produto mais macio e espalhável. A autora da pesquisa informa que a legislação brasileira exige que a manteiga tenha, no mínimo, 82% de matéria gorda; no máximo, 16% de umidade; e 2% de extrato seco desengordurado. O produto deve apresentar também consistência sólida, pastosa à temperatura de 20 ºC, textura lisa e com distribuição uniforme de água. Normalmente, o processamento da manteiga inclui as etapas de obtenção e pasteurização do creme do leite, batimento para que ocorra a inversão de fase, remoção do leitelho (leite da manteiga), lavagem, adição de sal e malaxagem (processo para deixar a manteiga uniforme e cremosa).

Etapas dos experimentos: controle de agitação e temperatura

Mayara de Souza Queirós (à esq.), autora da pesquisa, e a professora Mirna Lúcia Gigante, orientadora: sabor preservado

A fração de oleína adicionada ao creme de leite antes da fabricação da manteiga foi obtida através do fracionamento a seco duplo da gordura anidra do leite. O procedimento foi realizado em reator encamisado com controle de agitação e temperatura. Mayara Queiros relata que as frações obtidas foram caracterizadas quanto à composição em ácidos graxos, conteúdo de gordura sólida, isoterma de cristalização e comportamento térmico. As manteigas foram caracterizadas quanto à composição físico-química e de ácidos graxos, cor instrumental, conteúdo de gordura sólida, ponto de fusão, isoterma de cristalização e comportamento térmico. Os parâmetros analíticos foram medidos através de força e penetração, por meio de um teste de penetração com cone acrílico de 45°, em um analisador de textura TA-XT2i da Stable Micro Systems, controlado por computador.

Publicação Dissertação: “Efeito da adição de oleína da gordura do leite nas características da manteiga” Autora: Mayara de Souza Queirós Orientadora: Mirna Lúcia Gigante Coorientador: Renato Grimaldi Unidade: Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) Financiamento: CNPq


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Estudo constata relação entre drogas e ocorrências violentas EDIMILSON MONTALTI Especial para o JU

ese de doutorado desenvolvida pela psiquiatra Karina Diniz Oliveira, da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, analisou o perfil sociodemográfico e o padrão de uso de substâncias psicoativas (SPA) – álcool, cocaína, maconha e crack – em pacientes vítimas de traumas de violência – espancamento, ferimentos por arma branca ou de fogo – e acidentes de trânsito em Campinas. A pesquisa associou ainda as substâncias psicoativas usadas pelos pacientes com a gravidade e o mecanismo de trauma. A pesquisa foi realizada entre novembro de 2012 e setembro de 2013, com 453 pacientes maiores de 18 anos, atendidos na Unidade de Emergência Referenciada (UER) do Hospital de Clínicas (HC) da Unicamp. O estudo contou com a participação de alunos de medicina e enfermagem por meio do programa PET-Saúde. Os estudantes foram devidamente treinados e orientados para o atendimento e coleta de dados. Participaram também investigadores do Centro de Controle de Intoxicações (CCI). A tese, recém-defendida no programa de pós-graduação em saúde mental da FCM, foi orientada pela psiquiatra e professora Renata Cruz Soares de Azevedo. De acordo com Karina, a pesquisa tem duas frentes: a primeira é ensinar o aluno a lidar com dependentes químicos, sem fantasias, e a segunda é entender as correlações entre trauma e o uso de álcool, cocaína, maconha e crack. “A dependência química aparece em pacientes de diversas especialidades. É importante que o médico esteja preparado para perguntar sobre uso de drogas sem medo de achar que vai ofender o paciente”, disse a psiquiatra. Os pacientes foram orientados sobre os objetivos da pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Informado ao Paciente (TCLIP) para participar do estudo. Após aceitação e assinatura do termo, foi aplicada uma entrevista na qual foram coletados os dados sociodemográficos, antecedentes e mecanismo do trauma e uso de substâncias psicoativas (SPA). Aos que preencheram critérios para abuso e dependência de SPA, os avaliadores aplicaram uma breve intervenção, com entrevista motivacional. Em seguida, quando possível, foi tentada a coleta de amostras de urina para avaliação da presença de cocaína, crack, cocaetileno (substância derivada da associação entre álcool e cocaína) e canabinóides (derivado da maconha). A dosagem de álcool foi feita em amostras de urina colhidas e analisadas no Laboratório de Patologia do HC da Unicamp, dentro da rotina do serviço de atendimento da UER. Já as amostras de sangue coletadas foram analisadas pela equipe do Centro de Controle de Intoxicações (CCI) da Unicamp. Os pacientes que chegaram inconscientes a UER e não tiveram condições de manifestar seu consentimento ou evoluíram para óbito tiveram os exames colhidos na rotina de atendimento, uma vez que isso já é padronizado no atendimento ao paciente traumatizado. As amostras só foram analisadas após algum familiar ou responsável terem autorizado a participação da pesquisa.

Pesquisa traça perfil de vítimas de traumas atendidas no Hospital de Clínicas da Unicamp Caso o paciente viesse a ter, posteriormente, condições de consentimento, ele era abordado. Se houvesse recusa em participar da pesquisa, as amostras eram descartadas. Se evoluísse a óbito, eram contatados seus familiares responsáveis e, mediante consentimento desses, com assinatura do TCLE, era realizada a análise das amostras. De acordo com os dados da pesquisa, a idade dos pacientes avaliados variou de 18 a 90 anos, sendo 36,3 anos a média de idade. Do total de 453 pacientes, 105 não responderam ao questionário por recusa, inconsciência ou sequelas incapacitantes. Os pacientes que se recusaram a responder o questionário, mas consentiram com a coleta das amostras, foram incluídos na pesquisa. O quesito estado civil foi respondido por 347 pessoas. Dessas, 44,7% mantinham relacionamento estável e 63,2% declararam ter filhos. No quesito escolaridade, 12,5% estudaram até quatro anos, 34,3% entre quatro e oito anos e 53,3% declararam mais de oito anos de escolaridade. Com relação ao trabalho, 82,3% relataram que exerciam algum tipo de atividade profissional. A pesquisa mostrou que o início do uso de substâncias psicoativas ocorre antes dos 18 anos de idade. O uso de SPA foi declarado por 115 pessoas e o de cocaína, crack ou canabinóides por 88 indivíduos antes dos 18 anos. O uso combinado (poliuso) de SPA foi declarado por 147 sujeitos. A dependência de mais de uma SPA foi respondida dos 10,6% dos entrevistados. “O que chamou a atenção foram as altas taxas de positividade nas últimas 72 horas de uso das drogas antes do trauma

ou violência. O uso de cocaína apareceu em quase 20% dos exames. Essa taxa é três vezes maior que a média nacional”, revelou Karina. De acordo com a pesquisa, o uso declarado de SPA apresentou diferenças em relação ao gênero dos entrevistados. Houve proporção significativamente maior de homens entre os que declararam uso de cocaína, canabinóide e poliuso de SPA. Já o uso de benzodiazepinicos, por sua vez, foi declarado em maior proporção por mulheres. Na análise comparativa da média de idade dos entrevistados, os usuários de canabinóides, cocaína e de mais de uma SPA eram mais jovens, enquanto aqueles que faziam uso de benzodiazepínicos, mais velhos.

TRAUMA E DROGAS A associação entre o consumo de drogas (lícitas e ilícitas) e traumatismos é muito frequente nas unidades de emergência. O trauma é um ferimento ou lesão caracterizado por uma alteração estrutural ou desequilíbrio fisiológico, resultante da exposição aguda à energia mecânica, térmica, elétrica ou química, ou da ausência de algo essencial, como calor ou oxigênio. A pesquisa constatou que todos os traumas decorrentes de espancamento e queda de altura, sofridos por mulheres, foram causados por companheiros, namorados ou cônjuges. Os indivíduos que sofreram queda da própria altura eram mais velhos que os demais. Dentre os 249 pacientes atendidos na UER do HC da Unicamp que sofreram traumas de trânsito, 121 eram jovens e foram socorridos devido a acidente com motocicleta. “O uso de substância psicoativa está associado à gravidade maior ou menor do trauma. Quem tinha cocaína e álcool no sangue estava mais associado a trauma mais graves. A maioria era composta de homens jovens, com filho e emprego formal. Em decorrência do trauma, eles ficaram afastados do trabalho por pelo menos seis meses”, revelou. De 179 pacientes participantes da pesquisa, 71 referiram já ter usado mais de uma

Foto: Antonio Scarpinetti

Publicação Tese: “Detecção de substâncias psicoativas em pacientes admitidos por trauma em unidade de emergência: estudo de correlações” Autora: Karina Diniz Oliveira Orientadora: Renata C. Soares de Azevedo Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM)

SPA na vida e 17 preencheram critérios para a polidependência. Nos polidependentes, o atropelamento foi o mecanismo de trauma de trânsito mais comum. A análise laboratorial realizada em 238 pacientes mostrou predomínio de álcool (21,1%), seguido de cocaína (19,8) e crack (12%). Segundo Karina, no contexto social, o dependente faz uso de álcool, maconha e depois cocaína e o principal motivo para o uso de mais de uma droga é a associação entre elas para potencializar ou diminuir os efeitos. “O uso combinado de cocaína e álcool forma uma substância chamada cocaetileno. Apesar de ser lesivo, ele potencializa o efeito e a intensidade da cocaína. Outra associação comum é cocaína com maconha ou crack com maconha, num cigarro chamado mesclado. A maconha tira o efeito desagradável do crack, que chamam de ‘nóia’”, explicou. A psiquiatra da Unicamp diz que a importância da pesquisa resulta da possibilidade, a partir dos resultados apresentados, de avaliar com maior precisão os detalhes do binômio trauma/SPA e estabelecer estratégias de prevenção para ambas as questões, minimizando custos sociais e preservando o bem-estar e a qualidade de vida da população. Ainda de acordo com a tese, a doença trauma é um problema de saúde pública, uma vez que afeta grande parcela da população em idade produtiva. Além da mobilização de grandes quantias para o tratamento médico das vítimas, as consequências do trauma e suas sequelas causam prejuízos sociais e laborativos que oneram o Estado, devido a diversos encargos sociais demandados pelas vítimas e suas famílias. As consequências de um trauma grave são, muitas vezes, devastadoras, tanto para a vítima quanto para sua família, que arca com prejuízos emocionais e financeiros algumas vezes insuperáveis. “O dependente ou usuário de drogas fica mais impulsivo e perde a capacidade de medir riscos. Às vezes, se envolve em situações de violência ou em acidentes na busca pela droga. É o que a gente vê na prática”, reforça a psiquiatra.

A psiquiatra Karina Diniz Oliveira, autora da tese: “É importante que o médico esteja preparado para perguntar sobre uso de drogas, sem medo de achar que vai ofender o paciente”


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Campinas, 3 a 9 d

A tourada como metáfora Fotos: Reprodução

Artigo sobre livro de Hemingway faz pesquisador do IFCH revisitar a Paris do entre-guerras CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br

ma série de escritores baseados em Paris, nos anos 20 e 30 do século passado, usou da tourada espanhola para refletir sobre as realidades da guerra moderna, a partir da I Guerra Mundial, passando pela Guerra Civil Espanhola e chegando às portas da II Grande Guerra, diz a tese de doutorado “Fronteiras da Europa: A Corrida de Touros Vista da Paris Literária Entre-Guerras”, defendida por Luís Felipe Sobral e orientada por Heloisa Pontes no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp. “Sem considerar as especificidades de cada um dos autores, o que acontece é que a guerra estabelece um tipo de violência que é caótica e sem sentido, considerando-se o modelo de conflito que se instaura a partir da I Guerra Mundial”, disse o pesquisador. “As pessoas que lutaram, a maioria dos soldados, não foram inteiramente forçadas: elas viam, no início, um sentido naquilo. Mas conforme conheciam o campo de batalha da Grande Guerra, que é uma guerra moderna e que, no limite, procura aniquilar o inimigo, não simplesmente vencer, mas destruir totalmente, esse sentido se esvaiu. É isso que choca essa geração”. Os autores então vão encontrar, na tourada, uma maneira de viver e de encarar a violência de um modo ordeiro e regrado. “Extremamente regrado, na verdade, porque o ideal da tourada espanhola é que você se coloque à prova diante do animal. Então, não adianta só fazer os passes, o toureiro tem que fazer os passes numa determinada posição, para se colocar em risco”. Estruturada sob a forma de ensaio, a tese parte de uma resenha de Morte ao Cair da Tarde, de Ernest Hemingway, escrita pelo poeta surrealista e antropólogo francês Michel Leiris e publicada em junho de 1939, às portas da II Guerra Mundial, que começaria em setembro do mesmo ano, com a invasão da Polônia por forças alemãs e soviéticas.

A morte do toureiro valenciano Manuel Granero, em maio de 1922, em arena madrilhenha: tragédia inspirou o escritor Georges Bataille

significado que é dado nas coisas não está tanto nas coisas em si quanto no olhar que você dirige a elas. Foi a resenha que deu todo o andamento, o ponto de partida, de irradiação, do meu argumento”. Sobral diz que esse ponto de partida levanta uma questão metodológica que se tornou um “desafio interessante”: “A questão da tese é proposta a partir dessa resenha e a partir de junho de 39, quando ela é publicada. Mas eu não poderia considerar algo que é dito num momento específico e generalizá-lo para um período histórico inteiro”, explica. “Porque eu estaria impondo um determinado sentido que pode não existir. Então, uso esse momento como uma espécie de posto de observação. É como se, ao olhar o período do entre-guerras, eu estivesse em junho de 1939 e olhasse para trás e para a frente, para apreender esse escoamento do tempo”.

Por conta disso, a tese segue um percurso cronológico: “No início de Morte ao Cair da Tarde, Hemingway explica porque ele vai à tourada na Espanha. Mas isso em 1932, quando o livro foi publicado. Só que ele foi à tourada pela primeira vez em 1923. Na verdade, quando estou analisando o começo dos anos 20, o próprio Hemingway não diz porque vai à Espanha. Ele só irá dizê-lo em 32, e não posso impor essa ideia, que só veio mais tarde, aos anos 20. Foi difícil fazer isso na tese: respeitar a passagem do tempo. Tratar cada período dentro de seu próprio contexto, mesmo eu sabendo onde ele iria desembocar”.

POLÍTICA Além de Hemingway e de Leiris, a tese de Sobral debruça-se sobre trabalhos de Henry de Montherlant e Georges Bataille. Foto: Antoninho Perri

APOCALÍPTICO Em sua resenha, depois de comentar o livro de Hemingway – que é uma espécie de “guia turístico” para as touradas espanholas, publicado originalmente em 1932 – Leiris lança uma nota pessoal, nostálgica. O trecho, citado na tese, diz: “Não é sem tristeza e mal-estar que se revive com Hemingway essa bela época do turismo espanhol, quando se podia perambular de festa em festa e apreciar livremente um gênero de existência que logo não será mais que uma lembrança para os arqueólogos”. “Ali, de repente, o que aparentemente era uma análise que estava presa ao livro do Hemingway, é invadida pela conjuntura histórica de uma maneira que você já não consegue relê-la sem pensar nisso”, disse Sobral. “Esse final apocalíptico contrasta com o resto. Aí ele olha para a tourada, mas pensa na Guerra Civil Espanhola. Uma vez que Leiris era de esquerda, é compreensível que ele se mostrasse assim em relação à situação espanhola. E em junho de 39, todo mundo sabia que ia ter guerra. Então, nisso, ele lança uma pista sobre uma relação profunda entre a tourada e a guerra. A questão que proponho é: será que isso também está presente nos demais olhares literários em Paris?” Ainda sobre a resenha, o pesquisador acrescenta que “o valor está menos nela em si do que na maneira como olho para ela. Este é um dos pontos da tese, também: o

Luís Felipe Sobral, autor da pesquisa: “Essa relação entre a guerra e a tourada acaba se tornando política”

“Trabalho sobretudo com Hemingway, depois com o Leiris. E com o Montherlant, que foi um escritor bastante popular na França e até hoje mantém um certo renome. Mas, durante a ocupação nazista, ele demonstrou uma postura ambígua diante dos alemães e isso custou sua reputação no meio literário”, disse o autor. “Depois de Montherlant, trato de Georges Bataille, que tem uma novela que inclusive foi traduzida para o português, História do Olho, e então volto ao Leiris. Teria ainda o Joseph Peyré, que é pouco conhecido fora da França. Mas acabei escolhendo não tratar dele, porque sem ele já tinha material suficiente para fazer a análise, que não é uma análise de crítica literária: eu preciso da recepção das obras, preciso de uma série de fontes do contexto, já que esta não é uma tese literária, é uma tese de antropologia”, explica. “Do ponto de vista antropológico, procurei me debruçar sobre o problema segundo as categorias de entendimento dos próprios escritores, que se esforçaram, por sua vez, em apreender a tourada de acordo com a perspectiva do espetáculo. Ainda assim, há um limite para esse esforço e posso dizer que persiste um resquício de exotismo nos olhares literários, que tendem a reforçar um limite demarcado pelos Pireneus, daí o título da tese, Fronteiras da Europa”. No caso de Hemingway e de Leiris, Sobral identifica, de início, um modo mais existencial, psicológico, de tratar tanto da tourada quanto da guerra, mas que, à medida que a década de 30 avança, vai se tornando cada vez mais político. “É como se a conjuntura política fosse inchando e se tornasse inescapável”, disse ele. “Basicamente, na transição do começo do entre-guerras, do início dos anos 20, às vésperas da II Guerra, essa relação entre a guerra e a tourada acaba se tornando política. Normalmente, quando a gente fala de guerra, pressupõe-se falar de política. Mas, do ponto de vista literário, isso não necessariamente acontece”, explicou o pesquisador. “Na novela O Sol Também Se Levanta (1926), do Hemingway, há um questionamento sobre a guerra, mas não é político, é um questionamento existencial”. “Mas depois, sobretudo depois da Guerra Civil e quando se chega às vésperas da II Guerra Mundial, aí não tem jeito de falar de tourada sem falar de guerra no sentido político. Então essa é a transição geral que a relação sofre. Agora, em cada autor existem especificidades”.


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a das GUERRAS MODERNAS o touro o acerta, derruba-o e perfura-lhe a cabeça. Bataille usou esse episódio na novela, mas do ponto de vista da sexualidade, pois, enquanto ocorre o acidente na arena, desenrolase uma cena pornográfica na arquibancada”. Sobral explica que, por uma série de outras fontes, incluindo escritos autobiográficos de Bataille, é possível ligar o episódio da tourada em História do Olho à guerra. “É uma situação desgraçada que o pai do Bataille sofreu durante a guerra: ele tinha sífilis e morreu abandonado, de maneira horrorosa. Então, através das fontes, é possível chegar dessa cena do livro, que liga a sexualidade dos personagens à morte real do matador Manuel Granero, até a morte do pai”.

TOURADAS

Ernest Hemingway: escritor norte-americano mencionou medidas adotadas para atenuar a violência da tourada

“No caso do Leiris, os primeiros textos dele sobre a tourada não têm relação com a guerra, mas porque ele não vivenciou a I Guerra”, diz o autor. “Ele mesmo diz que vivenciou a guerra como se fosse um grande feriado, porque não lutou, passou intocado por aquele evento. Mas depois, conforme vai passando o tempo e vêm a Guerra Civil e a II Guerra, então a guerra passa a ser fundamental para ele pensar sobre a tourada”.

MITRAÍSMO

E SEXUALIDADE

Montherlant, por sua vez, se vale de uma mistura entre cristianismo e mitraísmo para tratar da tourada. O mitraísmo foi uma religião popular no mundo romano, nos primeiros séculos da era comum, onde o sacrifício de um touro pelo deus Mitra tinha grande importância como gesto criador de vida. “Montherlant procura, na simbologia da tourada, fazer uma fusão entre os símbolos cristãos e do mitraísmo”, explica Sobral. “Só que isso do ponto de vista moderno, porque o livro, que se chama Les Bestiaries, trata de um rapaz francês que vai para a Espanha tourear. O livro contém traços autobiográficos porque ele mesmo toureou, como amador”. “Já no caso do Bataille, o ponto de vista é o da sexualidade, porque a História do Olho é uma novela pornográfica, e, em uma das cenas do livro os protagonistas assistem a uma tourada. Trata-se de uma tourada real, a que o próprio Bataille assistiu na Espanha, em que um matador, Manuel Granero, morre de uma maneira horrenda,

O surrealista francês Michel Leiris: resenha do poeta e antropólogo foi ponto de partida para a pesquisa

Trechos da tese “Ao contrário de Hemingway, os críticos de Death in the Afternoon não consideraram suplementares os assuntos que ultrapassam o âmbito da corrida. Em outubro de 1932, o escritor americano Robert Coates abriu sua resenha, publicada na New Yorker, dizendo que o “tão aguardado novo livro” do autor seria “apreciado por apenas dois tipos muito distintos de pessoas”: aquelas interessadas no aspecto técnico da corrida e aquelas atraídas pela figura de Hemingway como escritor. Da mesma maneira, o escritor americano Granville Hicks, fundador em 1926 da revista comunista New Masses, afirmou em sua resenha de novembro de 1932 que não haveria muito a ser dito sobre o livro caso seu autor fosse outro; “mas porque Hemingway encontra-se tão bem posicionado entre os romancistas contemporâneos”, explica ele, “e porque mais pessoas lerão o livro porque estão mais interessadas em Hemingway do que na tourada, é justificável continuar falando sobre o autor”. As opiniões desses críticos assinalam um efeito curioso do estabelecimento de Hemingway como escritor: sua persona literária sobrepunha-se ao conteúdo de seu livro; a maior parte de seus leitores estava interessada mais nele próprio do que na corrida e, nesse sentido, os trechos suplementares, que se afastavam da discussão técnica sobre a tourada para tratar dos mais diversos assuntos — por exemplo, os motivos literários que o conduziram à Espanha —, adquiriam uma importância decisiva.”

A tourada é, há séculos, um ponto polêmico dentro da cultura espanhola. Já no século 16 havia éditos religiosos condenando a prática. Por sua vez, em Morte ao Cair da Tarde, Hemingway se refere a medidas adotadas para suavizar a violência da tourada – como a adoção de proteções para os cavalos, cujos ferimentos, provocados pelo chifre dos touros, chocavam os turistas – como sinal de “decadência”. Nas pesquisas para a elaboração da tese, Sobral assistiu a touradas na Espanha. “Minha tese não tem uma descrição etnográfica da tourada, do que vi, porque o trabalho que fiz é histórico, sobre o período entre-guerras”, disse. “Sim, não deixa de ser, a princípio, algo um pouco chocante, porque não é algo que estejamos acostumados a ver. Mas eu estava ali com uma bagagem cheia de leituras sobre a questão, e assisti a três dias seguidos. Meu esforço foi tentar compreendê-la em seus próprios termos, de uma perspectiva antropológica. Enfim, tendo a ser simpático e considero-a um fenômeno social e cultural bastante interessante. Mas eu acho que, no fundo, quem tem de saber se devem continuar ou não com as touradas são os próprios espanhóis”.

*** “A princípio, é estranho pensar a guerra de outra maneira senão política; mas no âmbito da representação literária, essa implicação não é sempre necessária. Em The Sun Also Rises, por exemplo, a experiência devastadora da guerra não incita uma reflexão política, mas existencial; vagando pela Europa, os personagens atormentados dedicam-se exclusivamente a procurar uma maneira de viver com as feridas da guerra; eles não questionam em nenhum momento as causas imperialistas do conflito, muito menos pensam em cobrar dos governos dos países envolvidos explicações sobre ele. O foco da tese não é assim a tourada e a guerra em si mesmas, mas como o olhar literário lançado à corrida da Paris entre-guerras articula essa relação.”

O escritor francês Henry de Montherlant: fundindo cristianismo e mitraísmo para falar sobre a tourada

Publicação Tese: “Fronteiras da Europa: A Corrida de Touros Vista da Paris Literária Entre-Guerras” Autor: Luís Felipe Sobral Orientadora: Heloisa Pontes Unidade: Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH)

O escritor Georges Bataille: cena pornográfica na arquibancada enquanto o toureiro morria na arena


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Campinas, 3 a 9 de agosto de 2015

Os historiadores e seu passado ROBSON DELLA TORRE robson_torre@yahoo.com.br

Construção da narrativa histórica: Séculos XIX e XX, coletânea de artigos organizada pelas professoras Néri de Barros Almeida, Ana Lúcia Nemi e Rossana Alves Baptista Pinheiro, reúne 13 contribuições redigidas por pesquisadores e professores de várias universidades brasileiras de destaque que se debruçam sobre a dependência dos historiadores para com a tradição historiográfica dos últimos dois séculos. Conceitos, metodologias, recortes temáticos: tudo passa por rigoroso escrutínio na busca por entender o quanto a escrita da História nos dias de hoje ainda está atrelada a seus mestres dos séculos XIX e XX, o quanto se afastou deles e quais as possibilidades que se abrem a ela a partir dessa revisitação crítica de seu passado. A coletânea é bastante ampla em sua abordagem. Da dívida dos historiadores para com o método empregado pelos “pais” de sua disciplina na Grécia clássica, Heródoto (c. 484-425 a.C.) e Tucídides (c. 460-c. 395 a.C.), às interpretações contemporâneas sobre a América Latina de Richard Morse (1922-2001), José Enrique Rodó (1871-1917) e Manuel Bomfim (18681932); da análise de um conto de Alexandre Herculano (1810-1877) em Portugal no século

Método desenvolvido por pesquisadores do IB e do IQ tem baixa toxicidade

XIX à discussão sobre o projeto arquitetônico da fachada oriental do museu do Louvre na França seiscentista, o livro busca ser o mais abrangente possível em termos temáticos, cronológicos e metodológicos. A despeito da pluralidade de objetos e de abordagens, as contribuições se detêm em preocupações comuns: o aporte do nacionalismo para a formação da História acadêmica no século XIX, o compromisso dos historiadores oitocentistas para com o fortalecimento de seus respectivos Estados Nacionais, a importância de novas filosofias da História para a compreensão e a atribuição de significado ao passado estudado, o peso das preocupações ideológicas dos historiadores enquanto manipulam técnicas de erudição e de crítica documental para o estabelecimento de “verdades”. Assim, mostra-se, por exemplo, que a edição do texto dos processos de condenação e de absolvição de Joana d’Arc por Jules Quicherat (1814-1882), apesar de sua indiscutível qualidade técnica, está imbuída de um forte viés nacionalista e ainda fomenta novos usos e apropriações sobre a Donzela de Orléans na atualidade; que os conceitos de “helenização” e de “romanização”, correntes nos livros didáticos até hoje, foram cunhados a partir de uma concepção colonialista das grandes potências europeias que hoje está completamente criticada; que as discussões sobre a consolidação das monarquias nacio-

nais na Baixa Idade Média refletem inquietações dos historiadores contemporâneos a respeito de sua concepção de Estado e da relação que este deve manter com a sociedade civil; enfim, que até mesmo a Igreja foi entendida à luz de conceitos forjados no século XIX, tal como “Reforma gregoriana”, que expressavam o olhar dos pesquisadores para eventos contemporâneos seus, dentre os quais o processo de unificação italiana de meados do século XIX e o crescimento do secularismo nas primeiras décadas do XX. No geral, a linguagem dos artigos é acessível a um público não especializado, que, dessa forma, pode tomar contato com debates importantes que têm prevalecido em diferentes áreas da disciplina histórica nas últimas três décadas. Ao mesmo tempo, o rigor metodológico e a qualidade das pesquisas apresentadas não desapontarão o leitor interessado em comentários detalhados e teses de vigor sobre a matéria trabalhada. As organizadoras da coletânea conseguiram produzir um volume ao mesmo tempo diversificado e qualificado, que certamente trará grandes benefícios ao debate entre historiadores e pesquisadores das demais áreas das ciências humanas. Robson Della Torre é doutorando em História pela Unicamp e foi recentemente aprovado em concurso para professor de história antiga e medieval da Unimontes (MG).

SERVIÇO Título: A construção da narrativa histórica – Séculos XIX e XX Organização: Ana Nemi, Néri de Barros Almeida e Rossana Alves Baptista Pinheiro Edição: Editora da Unicamp e Fap-Unifesp Área de interesse: História Páginas: 288 | Preço: R$ 40,00

Sistema híbrido pode ser alternativa contra câncer Foto: Antoninho Perri

CAROLINA OCTAVIANO Especial para o JU

uscando garantir a baixa toxicidade e uma melhora na qualidade de vida de pacientes com câncer de próstata, pesquisadores do Instituto de Biologia (IB) e do Instituto de Química (IQ) da Unicamp desenvolveram um sistema híbrido à base de hidrogel para tratamento da doença. O processo agrega hidrogéis de polímeros biocompatíveis e nanopartículas mesoporas de sílicas incorporadas com fármacos – liberados de forma controlada – para tratamento tumoral. A própria nanoestrutura já exerce efeitos no tumor, mas é potencializada pela utilização dos medicamentos. “Quem dita o efeito antitumoral é a nanoestrutura, que interage com proteínas que estão no sangue e no abdômen, local escolhido para a aplicação. Essas proteínas chegam até a célula tumoral e isso, somado ao efeito do fármaco, faz com que obtenhamos um efeito muito significativo”, explica Wagner José Fávaro, professor do IB e um dos responsáveis pelo desenvolvimento da tecnologia. Em sua avaliação, o processo representa uma grande evolução como método de drug delivery para o sistema biológico. A tecnologia, que está disponível para licenciamento, tem como principal diferencial tanto o efeito antitumoral como a baixa toxicidade, atenuando os efeitos colaterais. O processo obteve resultados satisfatórios em testes in vivo, em ratos de laboratórios. Durante um mês, os animais receberam sistematicamente injeções que continham o sistema híbrido à base de hidrogel e apresentaram uma diminuição no tamanho dos tumores e também baixa toxicidade, principalmente no coração. “Não chegamos à cura do câncer, mas o tamanho dos tumores nestes animais foi reduzido, em todos os estágios. Em estágio inicial, conseguimos que o tumor fosse quase eliminado. Se este tratamento for prolongado ou associado a outros tipos de fármacos, podemos obter uma nova abordagem”, aponta Fávaro.

O professor do IB Wagner José Fávaro, integrante do grupo que desenvolveu a tecnologia: “Podemos obter uma nova abordagem”

QUALIDADE DE VIDA Uma das preocupações dos professores e pesquisadores envolvidos nos estudos foi a de garantir a qualidade de vida durante o processo de tratamento do câncer. “Curar o câncer é um grande desafio, mas é importantíssimo que a gente consiga melhorar ou prolongar o processo e garantir que esse paciente tenha qualidade de vida, fato que está diretamente associado à toxicidade dos fármacos”, explica Fávaro. Segundo o professor, o tratamento é inovador por utilizar a nanotecnologia aliada aos fármacos no combate ao câncer de próstata. “Em oncologia, a nanotecnologia ainda é pouco aplicada e tem utilização muito recente. Em nenhum trabalho vimos a utilização da sílica em gel associada ao fármaco no tratamento do câncer de próstata. Em todos os tumores, há muito pou-

cos trabalhos que utilizam essa versão da sílica em forma de gel, associada aos fármacos. Por isso, esse hidrogel criado por nós é único”, afirma.

PARCERIA A parceria entre os dois Institutos da Unicamp para o desenvolvimento da tecnologia teve início após a realização de pesquisas sobre o comportamento de tumores por pesquisadores do IB. Na ocasião, eles analisavam, com base no mapeamento molecular, qual o melhor momento para se dar início ao tratamento com fármacos, buscando uma maior eficiência. Após esses estudos, o Instituto procurou o Laboratório de Química Biológica, do IQ, que é coordenado pelo professor Nelson Eduardo Duran Caballero, também responsável pela patente.

“Pensamos no câncer de próstata e criamos um modelo deste câncer, na qual se induziu o desenvolvimento da doença. Depois, começamos a fazer alguns estudos sobre a adequação dos materiais que eles tinham, em nanotecnologia, dentro dos tumores e demos início a vários projetos, associando a nanotecnologia aos fármacos já existentes, buscando melhorá-los”, comenta Fávaro, que revela que os estudos estão evoluindo de modo a contemplar outros tipos de cânceres, como o da bexiga, por exemplo. “Precisamos ampliar os estudos e também analisar os resultados a longo prazo”, conclui. Interessados no licenciamento da tecnologia devem entrar em contato com o Setor de Parcerias da Agência de Inovação Inova Unicamp, pelo endereço parcerias@inova. unicamp.br ou pelos telefones (19) 35212552 ou 3521-2607.


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Campinas, 3 a 9 de agosto de 2015

Na fronteira dos bons ventos Fotos: Reprodução/Divulgação

Complexos eólicos Alegria, Mangue Seco e Morro dos Ventos, todos localizados no Rio Grande do Norte: reflexos no desenvolvimento regional

LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br

Brasil, que em 2013 ocupava a 11ª posição em capacidade instalada para produção de energia eólica, no ano passado já se colocou entre os dez países com maior estrutura produtiva, indicando a representatividade do setor em nível mundial, especialmente num período de esgotamento progressivo dos recursos hídricos. A economista Luziene Dantas de Macedo, professora do Departamento de Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), embora focada no Nordeste e com especial atenção ao seu Estado potiguar, acaba oferecendo uma visão geral sobre os benefícios e os desafios de se obter eletricidade dos ventos, em tese de doutorado orientada pelo professor José Bonifácio de Souza Amaral Filho e defendida no Instituto de Economia (IE) da Unicamp. Luziene Macedo justifica o foco no Nordeste pelo fato de a região ser considerada a melhor fronteira para a geração de eletricidade por fonte eólica, devido às boas condições de vento tanto no litoral como no semiárido, respondendo por mais de 50% da potencialidade existente no país. “Há quatro anos, quando pensei no tema para o doutorado, as perspectivas eram extremamente positivas e amplamente veiculadas pela mídia, o que despertou meu interesse em investigar os impactos desta atividade na região em termos de geração de emprego e renda. Se do ponto de vista nacional, esta produção é importante por possibilitar a diversificação da matriz energética, quis saber o que ela representa para o desenvolvimento regional.” A autora relembra na tese que a energia eólica passou a fazer parte da política governamental para setor de energia elétrica em meados dos anos 2000, quando os Planos Decenais de Expansão de Energia Elétrica (PDEEs), elaborados pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e pelo Ministério de Minas e Energia (MME), começaram a destacar com maior veemência a sua essencialidade na matriz elétrica do país. E que os dados do PDEE 2022, levando em consideração a taxa de crescimento média anual, revelaram que a energia eólica apresenta o maior percentual para o período de 2012 a 2022, de 25,5% - o que representa um salto de participação na matriz de 1,5% para 9,5% nestes dez anos. Segundo a economista, os parques eólicos vêm ganhando importância para o Nordeste ao possibilitar um encadeamento produtivo com a atração de empresas fabricantes de equipamentos, como de aerogeradores, pás, nacelas e torres. “Entretanto, especificamente no Rio Grande do Norte, a atividade tem se concentrado em poucos elos da cadeia, limitando o seu potencial transformador da estrutura produtiva e de distribuição da renda gerada. Isto apesar de o Estado ter se destacado em 2014 como o primeiro em número de projetos eólicos,

Economista analisa impactos de parques de energia eólica na economia potiguar outorgados e em construção, respondendo por 86,5% de todos os empreendimentos no país; e de aparecer na segunda posição em operação comercial de energia eólica, perdendo somente para o Ceará.” Luziene encontra várias explicações para isso. A principal delas é que os fabricantes de equipamentos se concentram nos Estados vizinhos, que oferecem uma boa escala de produção por conta da infraestrutura já montada, como os portos de Suape (PE) e de Pecém (CE), e uma sincronia com várias indústrias de outros segmentos. “Além do mais, os outros governos vêm oferecendo incentivos financeiros, e não apenas fiscais, para que as empresas lá se instalem, ajudando ainda com licenças ambientais e preparação de suas malhas viárias. No Rio Grande do Norte, isso não acontece. Apesar da importância estratégica para o Estado, a atividade não gera encadeamento produtivo, não se comunica com os demais setores da economia, a não ser o de serviços.” A pesquisadora explica que nos Estados de Pernambuco, Bahia e Ceará encontra-se instalada toda a cadeia produtiva de equipamentos eólicos, composta por aerogeradores, pás e torres, consolidando assim espaços adensados de produção; diferencia-se nesse aspecto o Rio Grande do Norte, com apenas duas fábricas de torres instaladas (em Parazinho e Areia Branca). Ainda segundo ela, uma turbina eólica típica contém até 8 mil componentes: os mais onerosos são as torres, cuja altura varia de 40 a 120 metros (responsáveis por 26% dos custos) e as pás do rotor, que normalmente medem até 60 metros, podendo chegar a 100 metros (22% dos custos).

BENEFÍCIOS Contudo, Luziene Macedo também aponta os benefícios locais que a produção de energia eólica traz à população potiguar, assinalando em primeiro lugar o arrenda-

Publicação Tese: “Produção de energia elétrica por fonte eólica no Brasil e aspectos de seu impacto na Região Nordeste e Rio Grande do Norte” Autora: Luziene Dantas de Macedo Orientador: José Bonifácio de Souza Amaral Filho Unidade: Instituto de Economia (IE)

mento de terras, que assegura uma renda relevante às famílias que disponibilizam parte de suas propriedades para a implantação de parques eólicos. “O pagamento pode ser de mil reais mensais por torre instalada, feito diretamente aos proprietários por um período mínimo de 20 anos. Como os empreendimentos eólicos ocupam em média apenas 20% da área arrendada, os proprietários ainda podem manter as atividades complementares que desejarem.” Um benefício direto do arrendamento, ressaltado pela autora da tese, é a exigência da regularização fundiária, com a possibilidade de a empresa, visando à segurança do empreendimento, quitar a dívida que pesa sobre o proprietário rural – o que ele não conseguiria por meio da agricultura familiar – para depois abatê-la em parcelas do pagamento pelo arrendamento. “Não devemos ignorar que a atividade mudou a realidade de municípios como Parazinho, que tem uma fábrica de torres e parques eólicos instalados. Além da abertura de novos comércios (lojas, restaurantes, pousadas), houve melhoria na infraestrutura rodoviária para o transporte de pás e torres. Isso possibilitou ao Estado maior arrecadação de ICMS, PIS e Cofins, e às prefeituras de ISS (decorrente da cessão do espaço para instalação dos empreendimentos). Mais um aspecto benéfico, conforme a pesquisadora, tem relação com a formação técnica e superior, levando muitas pessoas a buscarem qualificação – há uma estimativa de criação de 170 mil postos de trabalho até 2020. “O aerogerador (as pás e a nacela que abriga o gerador) é um componente de maior conteúdo tecnológico. Nos municípios onde o setor eólico é pujante, o pagamento de salários mais altos para profissionais habilitados tem atraído inclusive os estrangeiros. Destaque-se também que o BNDES está implantando projetos sociais em algumas dessas localidades, juntamente com empresas empreendedoras de 24 parques eólicos no Estado. Acho que o RN poderia se concentrar nas atividades de operação e manutenção, onde há uma rotatividade interessante.”

DESAFIOS Luziene baseia-se em estudos e pesquisas já realizados para destacar a má qualidade das estradas, em sua maioria estreitas e esburacadas, entre os maiores desafios para o desenvolvimento da indústria eólica, que demanda uma estrutura logística capaz de suportar o tamanho e peso dos seus equipamentos. “As informações coletadas são de caminhões que chegam a medir mais de cem metros de comprimento e que as condições das estradas já propiciaram acidentes e uma redução drástica da velocidade, mudando a dinâmica dos moradores de comunidades próximas. Além disso, existem restrições a certas cargas do setor eólico (como de transporte no período noturno) e, dependendo da distância, a mobilização de equipamentos pode durar um mês, encarecendo a operação.”

Gargalos maiores que da infraestrutura rodoviária, alerta a pesquisadora, são a rigidez e demora na emissão de licenças ambientais, o que vem atrasando as obras dos novos empreendimentos, e a infraestrutura de transmissão. “Desde 2012 vários parques eólicos, aptos a iniciar a operação comercial, tiveram seus calendários alterados simplesmente porque as obras de transmissão, subestações e estações coletoras não haviam sido concluídas. Mesmo que esse problema tenha sido parcialmente resolvido em 2014, ainda existe uma série de empreendimentos de linhas de transmissão e subestações a ser realizada para que o Rio Grande do Norte volte a assumir a posição de destaque nos leilões de energia”. No que se refere aos impactos ambientais, a autora da tese observa que o ruído nas usinas hoje já é tolerável, mas existe a orientação para que parques eólicos não sejam instalados nas dunas, que são móveis, exigindo por isso a reserva de área demasiadamente grande. “Outra preocupação é com a destinação dos resíduos sólidos das usinas, não havendo uma política que defina o que fazer com equipamentos inativados, visto que os parques têm vida útil de 20 anos.” Luziene Macedo aborda ainda a criação em 2002 do Proinfa (Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica), visando incentivar empreendimentos por produtores independentes autônomos, bem como de leilões para contratação de energia eólica, realizados a partir de 2009. “É preciso agilizar o processo, pois o capital não espera. O Rio Grande do Norte já perdeu espaço nos últimos leilões, inclusive para o Piauí. Já no 18º LEN [Leilões de Energia Nova], realizado em dezembro de 2013, e no 19º, em 2014, obteve-se representatividade relativamente importante, recolocando novamente o Estado na disputa pela comercialização de energia no ambiente regulado, mesmo perdendo concorrência para Bahia e Pernambuco.”

CAPACIDADE De acordo com os dados apresentados por Luziene Macedo em sua tese de doutorado, a região Nordeste participou dos 11 leilões para contratação de energia eólica no ambiente regulado entre 2009 e junho de 2014, o que equivale a um total de 406 empreendimentos perfazendo uma potência de 10.491 MW – ou 85,3% de toda a capacidade eólica contratada no país. O Rio Grande do Norte possuía, em junho do ano passado, 40 projetos eólicos em operação, perfazendo 906.359 kW de capacidade instalada, representando 40,4% do total do Nordeste; perdeu para o Ceará, que apresentou menos projetos (39), mas maior capacidade instalada (42,5%) desta fonte para efeito de geração de eletricidade. A tendência é de que o RN volte a ser competitivo graças aos investimentos em linhas de transmissão que entraram em operação em 2014.


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Campinas, 3 a 9 de agosto de 2015

Destaque

do Portal

Pesquisa sobre superplástico ganha destaque na ‘Science’ Grupo do IFGW participa de estudos coordenados por físico da Universidade do Texas Foto: Antonio Scarpinetti

LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br

revista Science acaba de publicar artigo (www.sciencemag.org/ content/349/6246/400) sobre um superplástico que pode ser esticado em até 30 vezes o seu comprimento original e aumentar em 200 vezes a sua condutividade, oferecendo um grande leque de aplicações na área de circuitos eletrônicos flexíveis, sendo a mais imediata em marca-passos. O trabalho coordenado pelo físico Ray Baughman, do Instituto Nanotech da Universidade do Texas, em Dallas, tem a colaboração, faz cerca de 20 anos, do professor Douglas Soares Galvão e de seu grupo do Laboratório de Sólidos Orgânicos e Novos Materiais, do Departamento de Física Aplicada do Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW) da Unicamp. “É um estudo em colaboração com vários pesquisadores do mundo – americanos, brasileiros, coreanos, chineses – que partiu de uma ideia muito simples: envolver borracha elástica com florestas de nanotubos de carbono”, explica Douglas Galvão. “Trata-se de um material com propriedades completamente novas em relação ao que existe no mercado, mas possível de ser produzido dentro da nossa sala: o nanotubo de carbono é uma tecnologia razoavelmente desenvolvida e a borracha é conhecida há tempos. E por se tratar de pouca quantidade, o custo é baixo.”

O professor Douglas Soares Galvão, do IFGW: “Trabalhamos na modelagem para explicar porque o superplástico apresenta este comportamento”

Medicina Nuclear, Proteção Radiológica, etc, são alguns tópicos que serão abordados durante a realização do evento. Programação e inscrições no link http://viconfime.blogspot.com.br/

trado). Candidato: Marcelo Matias Elme. Orientador: professor Angelo José Fernandes. Dia 8 de julho de 2015, às 14 horas, na sala 3 da Pós-graduação do IA.

 Vestibular 2016 - As inscrições para o Vestibular Unicamp 2016 da Unicamp terão início dia 3 de agosto e deverão ser feitas até 3 de setembro. O valor da taxa de inscrição ainda não foi definido. A primeira fase será realizada dia 22 de novembro. A segunda, nos dias 17, 18 e 19 de janeiro de 2016. Antes da primeira fase haverão provas de Habilidades Específicas para candidatos aos cursos de Música (no período de 24 a 28 de setembro). Para os demais cursos (Arquitetura e Urbanismo, Artes Cênicas, Artes Visuais e Dança), as provas de Habilidades Específicas ocorrem de 25 a 28 de janeiro de 2016. A primeira chamada será divulgada pela Comvest dia 12 de fevereiro. Mais informações no link http://www. comvest.unicamp.br/vest2016/vest2016.html

“(DE) Composição e produção de sentido: dramaturgias na dança contemporânea” (doutorado). Candidata: Gisela Dória Sirimarco. Orientadora: professora Cássia Navas Alves de Castro. Dia 8 de agosto de 2015, às 9 horas, no IA.

 Fórum de Vida e Saúde - Evento com o tema “Doenças negligenciadas: do diagnóstico ao tratamento” acontece no dia 5 de agosto, às 9 horas, no Centro de Convenções da Unicamp. O evento está sob a responsabilidade do professor Rodrigo Ramos Catharino. Inscrições, programação e outras informações no link http://www.foruns.unicamp.br/foruns/projetocotuca/forum/htmls_ descricoes_eventos/saude81.html  Nova coordenação - No dia 5 de agosto, a pesquisadora Marta Maria do Amaral Azevedo assumirá a coordenação do Núcleo de Estudos de População (Nepo) “Elza Berquó”. A pesquisadora cumprirá o biênio 2015-2017, em substituição à professora Estela Maria Garcia Pinto da Cunha. A sessão de posse será realizada às 10 horas, na Avenida Albert Einstein 1.300, no campus da Unicamp.

Painel da semana  Semana de Engenharia Química - De 3 a 8 de agosto será realizada a 18ª Semana de Engenharia Química da Unicamp com o tema “Liderando Transformações”. Entre as propostas, ocorrerão palestras, visitas técnicas e confraternizações. O objetivo é promover a interação entre alunos e empresas. Para inscrições e outras informações consulte o site http://www.seq.com.br/ .  Semana de Engenharia Elétrica - Evento ocorre de 3 a 7 de agosto. A cada ano atrai alunos e empresas de diversas regiões do Brasil para palestras, debates, minicursos e visitas às empresas e centros de pesquisa da região de São Paulo, garantindo o intercâmbio de ideias e a interação entre congressistas e parceiros. Além disso, a Semana de Engenharia Elétrica da Unicamp contará com uma feira de recrutamento, em parceria com as Semanas da Engenharia Mecânica e da Computação, na qual diversas empresas oferecem seus programas de estágio e trainee. A abertura oficial do evento será no dia 3, no auditório I do Centro de Convenções. Inscrições para participação podem ser feitas no site www.seeunicamp.com.br onde também estão divulgadas as informações sobre a programação do evento. Mais detalhes pelo e-mail unicampsee@gmail.com  ConFiMe - A sexta edição do Congresso de Física Médica da Unicamp (ConFiMe) será realizada de 3 a 5 de agosto, nas dependências do Instituto de Física “Gleb Wataghin” (IFGW) da Unicamp. O evento é organizado por alunos de graduação em Física e Física Médica com o auxílio e a orientação de docentes do IFGW e do Centro de Engenharia Biomédica (CEB) da Unicamp. O Congresso tem como público-alvo alunos dos cursos de graduação em Física e Física Médica de várias localidades brasileiras, assim como professores e pesquisadores da área. Um dos objetivos é fornecer aos participantes uma visão geral sobre a área de Física Médica no Brasil para possibilitar contatos entre alunos, pesquisadores e profissionais ligados às aplicações de física à medicina. Introdução à Física Médica, Radiobiologia, Radioterapia, Radiologia,

 Fórum de Ciência, Tecnologia e Inovação - Com o tema “Educação, Tecnologia, Arte e Comunicação: em busca de um novo olhar multidisciplinar de ensino-aprendizado”, no dia 6 de agosto, às 9 horas, no Centro de Convenções da Unicamp, acontece a próxima edição do Fórum Permanente de Ciência, Tecnologia e Inovação. O evento será transmitido (ao vivo) pela TV Unicamp e está sob a responsabilidade do professor João Vilhete D’Abreu. Programação, inscrições e outras informações no link http://www. foruns.unicamp.br/foruns/projetocotuca/forum/htmls_descricoes_ eventos/tecno76.html. Mais detalhes pelo telefone 19-3521-4759.  Palestra com Simone Duarte - A Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP) promove no dia 6 de agosto, a palestra “O uso da luz no tratamento e na prevenção de biofilmes”. Ela será ministrada pela pesquisadora Simone Duarte, professora assistente de Ciência Básica e Biologia Craniofacial da New York University (EUA). O evento acontece às 14 horas e objetiva introduzir o uso da luz como uma terapia antimicrobiana eficaz no tratamento e na prevenção do desenvolvimento de biofilmes. Mais informações pelo telefone 19 2106-5384, ou e-mail cesar@fop.unicamp.br.  Palestra com Carlos Henrique de Brito Cruz - No dia 7 de agosto, às 10 horas, no Auditório da Agência para a Formação Profissional da Unicamp (AFPU), o professor Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fapesp, ministra a palestra “Desafios para C&T&I em São Paulo”. O evento faz parte da série de seminários do Departamento de Política Científica e Tecnológica (DPCT) e do Programa de Pós-graduação em Política Científica e Tecnológica (PPG-PCT) do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp. Mais informações pelo telefone 19-3258-4597 ou e-mail bia@ige.unicamp.br.

Teses da semana  Artes - “As técnicas vocais no canto popular brasileiro: processos de aprendizagem informal e formalização do ensino” (mes-

Segundo o professor do IFGW, a ideia surgida agora, mas que poderia ter sido colocada em prática há muitos anos, foi esticar as fibras de borracha e recobri-las com os nanotubos de maneira especial. “Quando se estica e se solta, essas estruturas apresentam duas ordens de escala, uma maior e outra menor, movimento que é repetido várias vezes sem que o material se quebre – poder esticá-lo ou dobrá-lo sem que perca suas propriedades elétricas é um avanço para a eletrônica flexível. É um material ideal para produzir uma série de circuitos eletrônicos como marca-passos, braços robóticos e outros sensores.” Douglas Galvão acrescenta que a participação da Unicamp se deu através de seu aluno de doutorado Francisco Alírio Moura, que estava em Dallas com bolsa sanduíche. “Trabalhamos na modelagem para explicar porque o superplástico apresenta este comportamento. E ficamos satisfeitos porque, diante da complexidade do problema, conseguimos um modelo simples que explica o caminho da corrente elétrica pelo material. Para isso, combinamos técnicas de dinâmica molecular para modelos mais simples e depois recorremos ao ‘elemento finito’, técnica usada em engenharia. Este é o terceiro artigo na Science dentro deste projeto, sendo que o ano tem sido frutífero para o nosso grupo, que teve dois trabalhos publicados na Nature Communications e outros dois na Scientific Reports.”

Orientador: professor Helio Waldman. Dia 5 de agosto de 2015, às 9h30, na sala PE12 do prédio da CPG da FEEC. “Um modelo de simulação da dinâmica de dispersão do Huanglongbing (HLB) em um pomar de citros” (mestrado). Candidata: Ana Paula Diniz Marques. Orientador: professor Takaaki Ohishi. Dia 7 de agosto de 2015, às 14 horas, na FEEC.

 Ciências Médicas - “Concordância entre estadiamento clínico e estadiamento patológico em função dos diferentes subtipos moleculares de câncer de mama” (mestrado). Candidata:Juliana Pinho Espinola. Orientador: professor Luis Otavio Zanatta Sarian. Dia 3 de agosto de 2015, às 9 horas, no anfiteatro do CAISM.

 Engenharia Mecânica - “Valoração probabilística de empreendimentos de geração de energia elétrica a partir de bagaço de cana-de-acúcar em leilão de energia de reserva” (mestrado). Candidata: Viviana Andrea Contreras Medellín. Orientadora: professora Ieda Geriberto Hidalgo. Dia 8 de julho de 2015, às 14 horas, na sala de seminário do ID2 da FEM.

“Prevalência de hipertensão pulmonar e características clínicas de crianças e adolescentes com fibrose cística” (mestrado). Candidata: Maria Fernanda Murijo Righi. Orientadora: professora Adyléia A. Dalbo Contrera Toro. Dia 5 de agosto de 2015, às 14 horas, na sala 3 do CIPED.

 Filosofia e Ciências Humanas - “A vida negativa do logos - Hegel e o legado platônico da dialética” (doutorado). Candidato: André de Goes Cressoni. Orientador: professor Alcides Héctor Benoit. Dia 4 de agosto de 2015, às 14 horas, na sala multiuso do IFCH.

“Avaliação da atividade anti-inflamatória do alcalóide isatina em ratos submetidos ao modelo de colite ulcerativa induzida por ácido trinitrobenzenossulfônico” (doutorado). Candidato: Eduardo Augusto Rabelo Socca. Orientadora: professora Alba Regina Monteiro Souza Brito. Dia 7 de agosto de 2015, às 9 horas, no anfiteatro do Departamento de Farmacologia da FCM.

 Física - “Sistemas de muitos corpos: gases nobres pesados adsorvidos em substratos de grafeno e gases de Fermi ultrafrios” (mestrado). Candidato: Lucas Madeira. Orientador: professor Silvio Antonio Sachetto Vitiello. Dia 3 de agosto de 2015, às 14 horas, no auditório da Pós-graduação do IFGW.

“Desenvolvimento e validação de um método para quantificação de cocaína e metabólicos em unhas por LC-MS/MS” (mestrado). Candidata: Carla Giane Loss. Orientadora: professora Nelci Fenalti Hoehr. Dia 7 de agosto de 2015, às 9 horas, no anfiteatro da CPG da FCM. “Valor da expressão de marcadores de apoptose, angiogênese e proliferação celular no diagnóstico diferencial de lesões benignas e malignas da tireóide: correlação clínica, citológica e ultrassonográfica” (doutorado). Candidato: Frederico Fernandes Ribeiro Maia. Orientadora: professora Denise Engelbrecht Zantut Wittmann. Dia 7 de agosto de 2015, às 9 horas, no anfiteatro do Departamento de Clinica Médica da FCM.  Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo - “Avaliação de cenários para elaboração de plano diretor de macrodrenagem urbana estudo de caso: bacia do Ribeirão Anhumas em Campinas - SP” (doutorado). Candidato: Marco Antonio Jacomazzi. Orientador: professor Antonio Carlos Zuffo. Dia 6 de agosto de 2015, às 9 horas, na sala de defesa de teses 1 do prédio de aulas da FEC.  Engenharia de Alimentos - “Subprodutos de araticum e pequi: estudo da atividade antioxidante dos compostos bioativos na proteção ao estresse oxidativo” (doutorado). Candidata: Maysa Do Vale De Oliveira. Orientadora: professora Glaucia Maria Pastore. Dia 3 de agosto de 2015, às 9h30, no auditório do DTA da FEA. “Processos integrados de extração, clarificação e concentração de açúcares prebióticos a partir de resíduos de alcachofra” (doutorado). Candidata: Mariana Teixeira da Costa Machado. Orientadora: professora Miriam Dupas Hubinger. Dia 4 de agosto de 2015, às 9 horas, no salão nobre da FEA.  Engenharia Elétrica e de Computação - “Análise de desempenho de serviço de voz em um sistema LTE de 450 MHz” (mestrado). Candidato: Ricardo Takaki. Orientador: professor Paulo Cardieri. Dia 3 de agosto de 2015, às 14 horas, na FEEC. “Sistemas de verificação de locutor baseados em i-vectors” (mestrado). Candidato: Cristian Jesus Silva de Souza. Orientador: professor Lee Luan Ling. Dia 3 de agosto de 2015, às 14 horas, na FEEC. “Redes ópticas reconfiguráveis com restrições dinâmicas de camada física” (mestrado). Candidato: José Carneiro Maranhão Neto.

“Síntese e caracterização de nanopartículas magnéticas complexas” (mestrado). Candidata: Maria Eugênia Fortes Brollo. Orientador: professor Kleber Roberto Pirota. Dia 5 de agosto de 2015, às 14 horas, no auditório da Pós-graduação do IFGW. “Medidas fracas do deslocamento Goos-Hänchen próximo ao ângulo crítico para reflexão interna total” (mestrado). Candidato: Octávio José Santos de Santana. Orientador: professor Luís Eduardo Evangelista de Araújo. Dia 7 de agosto de 2015, às 14 horas, no auditório da Pós-graduação do IFGW.  Matemática, Estatística e Computação Científica - “Encolhimento bayesiano de coeficientes de ondaletas sob distribuição à priori beta” (doutorado). Candidato: Alex Rodrigo dos Santos Sousa. Orientadora: professora Nancy Lopes Garcia. Dia 4 de agosto de 2015, às 9 horas, na sala 221 do Imecc. “Cohomologias em espaços projetivos com pesos” (mestrado). Candidato: Bruno Suzuki. Orientadora: professora Elizabeth Terezinha Gasparim. Dia 4 de agosto de 2015, às 10 horas, na sala 253 do Imecc. “Álgebra geométrica conforme e geometria de distâncias” (doutorado). Candidato: Valter Soares de Camargo. Orientador: professor Carlile Campos Lavor. Dia 5 de agosto de 2015, às 14 horas, na sala 253 do Imecc. “Um estudo sobre aritmética entre números fuzzy interativos e aplicações em biomatemática” (mestrado). Candidato: Gustavo Barros Dias Ignácio. Orientador: professor Laecio Carvalho de Barros. Dia 7 de agosto de 2015, às 14 horas, na sala 121 do Imecc. “Ciclos limite em sistemas dinâmicos suaves e não suaves” (mestrado). Candidato: Otávio Marçal Leandro Gomide. Orientador: professor Ricardo Miranda Martins. Dia 7 de agosto de 2015, às 14 horas, na sala 253 do Imecc.  Odontologia - “Influência da ferramenta de redução de artefato metálico na qualidade das imagens de tcfc” (mestrado). Candidata: Polyane Mazucatto Queiroz. Orientadora: professora Deborah Queiroz de Freitas França. Dia 6 de agosto de 2015, às 9 horas, na sala da congregação da FOP.  Química - “Estudos visando a síntese de aminoácidos polihidroxilados e nova abordagem para a síntese de piranonas a partir de adutos de Morita-Baylis-Hillman” (mestrado). Candidato: Bruno Boni Guidotti. Orientador: professor Fernando Antonio Santos Coelho. Dia 3 de agosto de 2015, às 9 horas, no miniauditório do IQ.


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Campinas, 3 a 9 de agosto de 2015

Estudo avalia compactação do solo na colheita de cana CARMO GALLO NETTO carmo@reitoria.unicamp.br

rabalho desenvolvido pelo engenheiro agrônomo Oswaldo Julio Vischi Filho junto à Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri) da Unicamp, orientado pelo professor Zigomar Menezes de Souza e coorientado pelo professor Reginaldo Barboza da Silva, avaliou a pressão de contato exercida por máquinas agrícolas de colheita mecanizada da cana-de-açúcar com o objetivo de verificar se ela causa compactação adicional no solo do canavial, comprometendo a sustentabilidade e a produtividade. Embora a colheita mecanizada reduza o custo da operação, e resolva a dificuldade decorrente da falta de mão de obra, gera, por sua vez, outro problema: a compactação dos solos, evidente nos canaviais paulistas e brasileiros. O problema vem tomando rumos preocupantes, inclusive com redução de produtividade das lavouras e prejuízos financeiros ao setor sucroenergético. Evitar ou minimizar os efeitos da compactação do solo é muito mais barato do que arcar com os custos das operações mecânicas necessárias para a quebra da camada compactada, que exigem tratores de alta potência e envolvem grandes gastos de combustível. Uma das soluções do problema é conhecer a capacidade de suporte de carga dos solos e as pressões sobre eles exercidas pelos maquinários pesados empregados, dimensionando-os de forma a não causarem danos à estrutura física dos terrenos. Com base nesse escopo, o trabalho desenvolvido pelo pesquisador avaliou a capacidade de suporte de carga que pode ser considerada como o limite dos solos avaliados para que não sofram danos irreversíveis em sua estrutura. Essa capacidade de suporte de carga foi então relacionada com as áreas e as pressões decorrentes de rodados dos equipamentos sobre o solo. Essas informações, avaliadas conjuntamente, permitem preservar a estrutura do solo por meio do dimensionamento correto das máquinas e equipamentos a serem utilizados no campo, com vistas à sustentabilidade do cultivo e aumento da produtividade. O pesquisador acredita que o trabalho, bem como o artigo gerado a partir dele – “Capacidade de suporte de carga de Latossolo Vermelho cultivado com cana-de-açúcar e efeitos da mecanização do solo”, publicado na revista Pesquisa Agropecuária Brasileira, possam contribuir para o aperfeiçoamento de políticas públicas, para o aumento da produtividade se utilizados pelos agricultores e ainda servir de referência para o desenvolvimento de futuros trabalhos, pois são raros os estudos acadêmicos com esse foco para a cultura de cana-de-açúcar no Brasil. Oswaldo trabalha na Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, atuando, desde 1994, na Coordenadoria de Defesa Agropecuária, onde foi responsável pelo Programa de Fiscalização do Uso e Conservação do Solo no estado. Ele acumula experiência na área de agronomia, com ênfase em manejo e conservação do solo e da água e das leis que regulam seus usos. Ingressou no curso de doutorado da Feagri com o objetivo de encontrar respostas e parâmetros para os graves problemas de compactação que acometem os canaviais brasileiros, diante da constatação de que a intensa mecanização de produção de cana-de-açúcar contribui para a compactação do solo e reduz a produtividade da cultura, como comprovam os relatórios oriundos do setor sucroenergético sobre as últimas safras de cana-de-açúcar no Brasil.

ALCANCE E IMPORTÂNCIA

Originária da ilha de Nova Guiné, Sudeste Asiático, e introduzida na então nova colônia

Publicação Tese: “Indicadores físicos e mecânicos do solo sob cultivo de cana-deaçúcar em áreas comerciais” Autor: Oswaldo Julio Vischi Filho Orientador: Zigomar Menezes de Souza Coorientador: Reginaldo Barboza da Silva Unidade: Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri)

Tese analisa pressão de contato exercida por máquinas agrícolas Fotos: Divulgação

Trator com bitola estendida e esquematização da área, sendo “LP”, linha de plantio e “R”, eixo do rodado do trator

estabilidade de agregados, teor de carbono e curva de retenção de água. O intervalo hídrico ótimo integra o potencial matricial, a porosidade de aeração e resistência do solo à penetração das raízes em um único atributo, possibilitando estabelecer as condições de umidade do solo limitantes ao crescimento das plantas. Por sua vez a pressão de pré-consolidação indica a máxima carga a que o solo foi submetido no passado e relaciona sua densidade com a pressão aplicada. Finalmente, o conhecimento das máquinas utilizadas na cultura da cana-de-açúcar e as interações entre os rodados das mesmas nos solos dos canaviais é importante para que se possa fazer a preservação das suas estruturas físicas. Frise-se que as colhedeiras pesam mais de 18 toneladas e o trator puxa até três reboques, os transbordos, que têm, cada um, 14 toneladas e transportam outras 14 de carga.

CONCLUSÕES

Na sequência, máquinas usadas em canaviais: trator Case Magnum 235, trator/transbordo, transbordo com três eixos e colhedora Case Modelo A8800

portuguesa, em 1532, por Martim Afonso de Souza com a finalidade de produzir matéria-prima para os engenhos de açúcar, a cana-de-açúcar (Saccharum spp.) levaria o Brasil à condição de maior produtor mundial. Em decorrência, o país é hoje hegemônico na produção de açúcar, contribuindo com 25% dela e 50% das exportações globais e ocupa ainda, depois dos EUA, a segunda posição como grande produtor de etanol no mundo, em que responde com 20% da produção e 20% das exportações. Trata-se, portanto, de uma cultura importante para o país, que destina a ela 10,5 milhões de hectares, dos quais 5,5 milhões concentram-se no Estado de São Paulo, onde se estende por cerca de um terço da área agrícola. Segundo dados de 2014, a cadeia produtiva do setor sucroenergético (açúcar, álcool e energia obtida pela queima do bagaço e da palha) proporciona ao Brasil 1,2 milhões de empregos diretos e U$ 15 bilhões oriundos de exportações. Esse quadro mostra o alcance e a importância dessa cultura para o Estado de São Paulo, que tem procurado garantir a sua sustentabilidade. Com efeito, lei estadual, de 2002, que proíbe a queima para a despalha da cana-de-açúcar, prevê a extinção desse processo até 2021 para áreas com declividade inferior a 12% e até 2031 para declividades superiores. Em decorrência ocorreu aceleração da utilização dos processos mecânicos em seu cultivo, particularmente na colheita. Com o propósito de reduzir ainda mais esses prazos, em 2008, foi assinado pelas secretarias do Meio Ambiente e da Agricultura e Abastecimento do Estado, pela União da Indústria Sucroalcooleira (Unica) e pela Organização de Plantadores de Cana da Região Centro-Sul do Brasil (Orplana) Protocolo Agroambiental que, dentro do projeto etanol verde, tem o objetivo de desenvolver ações de estimúlo à sustentabilidade do setor. Esse instrumento estabeleceu o prazo final para eliminação da queimada de cana-de-açúcar para 2014 em áreas com declives de até 12% e 2017 para as demais.

O QUE FOI FEITO

A qualidade física do solo está relacionada à sua capacidade de garantir aos sistemas radiculares das plantas condições favoráveis ao seu desenvolvimento. Estas condições estão relacionadas com a estrutura do solo e são determinadas pela disponibilidade de água, aeração, temperatura e resistência do solo à penetração das raízes. A estrutura ideal para o solo é aquela que permite uma grande área de contato entre ele e as raízes, espaço poroso suficiente para a movimentação de água e difusão de gases e resistência que não impeça o crescimento das raízes. Para o estudo de todas estas características o pesquisador se valeu de dois indicadores clássicos de qualidade: o intervalo hídrico ótimo e a pressão de pré-consolidação, que permitem avaliar o processo de compactação. O trabalho concentrou-se sobre o Latossolo Vermelho, com duas classes texturais, a argilosa e a média, em dois locais distintos de coleta, o canteiro e a linha de plantio, em áreas com seis e dezoito anos de colheita mecanizada. Depois, foram determinadas as interações entre o solo e os rodados dos equipamentos – colhedora de cana sobre esteiras, trator que puxa os transbordos utilizados para o transporte de carga, estudo que se revela inédito em relação a trabalhos similares. A colheita das amostras e os experimentos com os equipamentos agrícolas foram realizados na usina São Martinho, município de Pradópolis, SP, em que estão presentes os dois solos estudados e predominantes na região de Ribeirão Preto, a que mais produz cana-de-açúcar no Estado. O autor se propôs a verificar a hipótese de que o processo de compactação e os indicadores derivados da curva de compressão e do intervalo hídrico do solo são influenciados diferencialmente pelo sistema de manejo aplicado à cana crua durante distintos intervalos de implantação em solos de diferentes classes texturais. Os atributos do solo avaliados foram a densidade, porosidade, a sua resistência à penetração, conteúdo de água,

Para Oswaldo, os resultados do trabalho confirmam a hipótese inicial de que o processo de compactação e os indicadores derivados da curva de compressão e do intervalo hídrico do solo são influenciados pelos ciclos de manejo com colheita mecanizada aplicada à cana-de-açúcar em solos de diferentes classes texturais, com diferentes tempos de implantação. Os sistemas de colheita mecanizada alteram os atributos físicos do solo, aumentando a densidade e diminuindo a porosidade total e a macroporosidade, com maior evidência na região do canteiro e nos sistemas com seis anos de colheita mecanizada, embora não provoquem alterações na microporosidade, responsável pela retenção da água. A colhedora de cana, com mais de 18 toneladas, é a máquina que apresenta maior área de contato com o solo e em decorrência menor pressão de contato e, em consequência, causa menor compactação do solo. O trator apoiado sobre pneus, que pesa quase 15 toneladas, possui área de contato menor e pressão de contato maior. O transbordo com pneus, que carregado pesa mais de 28 toneladas, é o equipamento que apresenta a menor área de contato e em decorrência a maior pressão de contato, o que pode fazê-lo responsável por uma compactação adicional nos canaviais. Constatou-se, também, que o recobrimento dos solos com palhada aumenta a área de contato rodado/solo, diminuindo a pressão de contato exercida pelos eixos das máquinas. Entretanto, a capacidade de suporte de carga dos solos estudados, para os sistemas com seis e dezoito anos de colheita mecanizada, está abaixo das pressões de contato aplicadas aos solos pelos rodados dos maquinários agrícolas considerados no trabalho, em que eles definem as condições que devem ser respeitadas para que não haja compactação adicional na área de produção de cana de açúcar. O autor enfatiza que “os estudos sobre capacidade de suporte de carga e suas relações com as áreas de contato e as pressões de contato das máquinas com o solo precisam ser incentivados com vistas à solução de problemas de compactação que afetam os canaviais”. Ele defende ainda o desenvolvimento de um equipamento que permita avaliar in loco a capacidade de suporte de carga do solo em razão das dificuldades de coleta e preparo das amostras e da morosidade e do custo das análises em laboratório. Foto: Antonio Scarpinetti

O engenheiro agrônomo Oswaldo Julio Vischi Filho, autor da pesquisa


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Campinas, 3 a 9 de agosto de 2015

Os incompreendidos Foto: Divulgação

MARTA AVANCINI Especial para o JU

á um século, em março de 1915, era lançado em Lisboa o primeiro número da revista Orpheu. Resultado de um projeto luso-brasileiro de literatura, a publicação reunia artistas e intelectuais portugueses de ponta, tais como Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro, Almada-Negreiros, Alfredo Pedro Guisado e o brasileiro Ronald de Carvalho. Inspirada nas vanguardas europeias, a publicação tinha o propósito de revolucionar o pensamento e as artes, congregando artistas alinhados com as estéticas modernas. Por isso, entrou para a história como o marco fundador do Modernismo em Portugal. “Nossa pretensão é formar, em grupo ou ideia, um número escolhido de revelações em pensamento ou arte, que sobre esse princípio aristocrático tenham em Orpheu o seu ideal esotérico e bem nosso de nos sentirmos e conhecermo-nos”, escreveu o diretor da revista em Portugal, Luís de Montalvor, na introdução do primeiro número. Desse modo, ele definiu a publicação como “um exílio de temperamentos de arte que a querem como um segredo ou um tormento”. Além de Montalvor, o poeta Ronald de Carvalho estava à frente do projeto, como diretor no Brasil. Passados cem anos, o que permanece da revolução estética desencadeada por Orpheu? Quais são seus legados? Responder a essas perguntas é o mote do livro Orpheu 1915-2015, organizado pelo pesquisador e crítico literário Carlos Felipe Moisés, formado pela Universidade de São Paulo (USP). O volume, lançado pela Editora da Unicamp, reúne uma coletânea de textos originais da revista e artigos sobre o movimento, publicados ao longo do século XX. O objetivo é motivar e subsidiar o debate sobre os sentidos e as repercussões da revista. “Procurei recolher textos representativos da variedade de reações desencadeadas pela revista”, explica Moisés. O intuito é evidenciar que Orpheu não foi um episódio datado, circunscrito ao momento da sua aparição. “A revista constitui uma densa e duradoura matriz de estímulos estético-literários, cujos efeitos podem ser acompanhados, em sucessivas metamorfoses, década após década, geração após geração”. Nesse sentido, reitera o crítico literário, a publicação permanece viva, já que nunca foi esquecida. Apesar disso, ele acredita que retomar Orpheu na contemporaneidade se coloca como uma necessidade: “Só a lembrança viva de histórias como a de Orpheu permite que a inércia e o comodismo continuem a ser combatidos”, afirma Moisés.

O pesquisador e crítico literário Carlos Felipe Moisés, autor do livro: “Procurei recolher textos representativos da variedade de reações desencadeadas pela revista”

Foto: Reprodução/Divulgação

REAÇÃO Logo no primeiro número, Orpheu gerou intensa repercussão negativa no meio cultural e artístico português, ainda fortemente marcado pelo classicismo e alijado das revoluções estéticas que assolavam outras partes da Europa. A revista foi caracterizada como “literatura de manicômio”, e os jovens autores ridicularizados - especialmente Sá-Carneiro e Álvaro de Campos, um dos heterônimos de Fernando Pessoa. O primeiro publicou um conjunto de poemas que comporiam, mais tarde, Indícios de Oiro, entre eles “16” e “Nossa Senhora de Paris”, que tematizam a inadaptação à vida e o sentimento de incompletude. De Álvaro de Campos, foram publicados “Opiário” e “Ode Triunfal”, um elogio ao ambiente frenético e mecanizado da modernidade. Em vez de intimidar, a reação escandalizada serviu de munição para o grupo que ficou conhecido como Geração de Orpheu. Em agosto de 1915, o segundo número da publicação foi lançado, com contornos ainda mais radicais. Sá-Carneiro e Pessoa assumem a direção de Orpheu, abandonando o projeto de uma revista binacional. A edição trazia a público reproduções de pinturas cubistas do artista plástico Guilherme de Santa-Rita, além de poemas de Ângelo de Lima, doente mental que vivia num manicômio. Também participaram Eduardo Guimarães [escritor brasileiro], Raul Leal, Violante de Cysneiros (pseudônimo de Armando Cortes-Rodrigues), Almada Negreiros, Raul Leal e Luís de Montalvor, além de Sá-Carneiro e Pessoa. A crítica e o rechaço gerados pelo segundo número de Orpheu foram tão intensos quando os do primeiro. Mesmo assim, o grupo liderado por Pessoa e Sá-Carneiro partiu para o terceiro número. A intenção, porém, esbarrou em empecilhos que inviabilizaram o projeto: a edição chegou a ser montada e enviada à gráfica, mas não foi impressa. As dificuldades financeiras e a morte precoce de Sá-Carneiro em 1916 foram decisivas para que o projeto fosse abortado. Uma carta de Sá-Carneiro a Pessoa, reproduzida no livro Orpheu 1915-2015, ajuda a compreender os problemas enfrentados pela publicação. “Em duas palavras: temos desgraçadamente de desistir do nosso Orfeu. Todas as razões lhe serão dadas melhor pela carta de meu Pai que junto incluo e peço que não deixe de ler. Claro que é devida a um momento de exaltação. No entretanto cheia de razões pela conta exorbitante que eu obrigo o meu Pai a pagar (...) o simples aparecimento do n.º 3 do Orfeu – feito ainda sob minha responsabilidade (...) seria na verdade mostrar em demasia a meu Pai minha insubordinação. Pena ter criado ilusões, feito com que você falasse a colaboradores etc.” Ou seja, em virtude das dificuldades de Sá-Carneiro, que vinha arcando com os custos da revista, utilizando para isso a mesada que recebia do pai, obviamente sem o consentimento deste, o projeto teve de ser interrompido.

são e a conservação. “Só assim ganha pleno sentido o veredito definitivo de Fernando Pessoa: ‘Orpheu acabou. Orpheu continua’”, analisa o pesquisador. Orpheu “continua” exatamente porque não se ateve apenas a uma dessas vertentes, seja a conservadora, defendida por Luís de Montalvor, seja a mais rebelde, representada por Sá-Carneiro, Almada Negreiros ou Álvaro de Campos. O autor reforça seu argumento com um exemplo: a cada número Orpheu abriga produções de tendências e posturas contraditórias, tais como o decadentismo de Ronald de Carvalho (vanguarda moderada) e o futurismo de Sá-Carneiro (vanguarda radical). Ou seja, a atitude conservadora dividia terreno com a revolução. Esse passo à frente, alvo de crítica virulenta justamente por ter abalado estruturas do modo como se fazia literatura e arte em Portugal, é que teria possibilitado a consolidação dos movimentos modernistas no país, graças ao esforço capitaneado pela Presença, a partir do pioneirismo da revista Orpheu e suas sucessoras imediatas: Exílio (1916), Centauro (1916), Portugal Futurista (1917) e Athena (1924-1925).

O LUGAR DE PESSOA

Expediente do segundo número da revista “Orpheu”: marcado pelo classicismo, meio intelectual português rejeitou publicação do grupo liderado por Fernando Pessoa e Sá-Carneiro

UM ESPÍRITO VIVO

O fim de Orpheu não significou o fim do Modernismo em Portugal. Como enfatiza o autor do livro, a revista foi efêmera, mas a ideia teve sequência imediata com a publicação de outras revistas, igualmente efêmeras, enquanto durou o ímpeto revolucionário, e prosseguiu anos afora. “A esse propósito, cabe lembrar que a revista Presença, surgida no final dos anos 1920, como assumida herdeira de Orpheu, já não foi tão efêmera assim, dando firme continuidade ao que os pioneiros haviam iniciado. E assim tem sido, até hoje”. Conclusão: o projeto não deixou de ir adiante, defende Moisés. “A suposta falta de ‘espaço’ para a rebeldia, num meio reconhecidamente conservador, tem sido não um impedimento, mas, ao contrário, uma boa razão para que a revolução prosseguisse”. Lançada em 1927, a Presença circulou até 1940 e entrou para a história como uma das mais influentes revistas literárias portuguesas do século XX, responsável pela difusão do Segundo Modernismo. A publicação possui, segundo o crítico literário Moisés, uma firme relação com Orpheu, expressa na declaração de seu diretor, Adolfo Casais Monteiro: “Nós, escritores, temos uma dívida para com esta geração. Eis de fato a estranha verdade: a geração do Orpheu só através da Presença realizou parte da sua ação”. Em vez de ter sido uma herança direta, estanque, o legado de Orpheu remete a diversas questões crítico-teóricas, levantadas pela estética da sua sucessora, a Presença. A própria concepção de modernidade é uma delas. Na visão de Moisés, a modernidade revolucionária de Orpheu resultava da convergência e, muitas vezes, da fusão dos contrários – o individual e o coletivo, o futuro e o passado, o velho e o novo, a ousadia e o comedimento, a transgres-

Entre os autores que participaram de Orpheu, Fernando Pessoa teve importância decisiva para que o ideário da publicação permanecesse vivo. “Não fosse por Fernando Pessoa, a revista Orpheu teria caído no esquecimento, logo em seguida à publicação dos seus dois números”, afirma Moisés. “É por isso que, desde então, quando pensamos em Orpheu, pensamos imediatamente em Fernando Pessoa”. No entanto, o destaque que o poeta ocupa teve como consequência relegar outros autores importantes a um plano secundário, tais como Sá-Carneiro, Almada Negreiros, José Régio, Casais Monteiro, Jorge de Sena, entre outros. “O vulto extraordinário de Pessoa tem condenado ao limbo não só a revista, como outras figuras exponenciais”, afirma. Além disso, ofusca a percepção da publicação como resultado de uma ação coletiva. “Assim sendo, corremos o risco de minimizar ou até de esquecer o que foi e, sobretudo, o que continuou a ser Orpheu, enquanto ação coletiva”. Segundo Moisés, Orpheu representou, para Fernando Pessoa, um momento privilegiado em que ele acreditou na necessidade de uma ação coletiva, para além ou aquém da realização da sua obra individual. Um “momento” que não se limitou a 1915-1916, mas estendeu-se a outras revistas nas quais ele empenhou o mesmo propósito nos anos seguintes, e teve desdobramentos que repercutem até hoje. Assim, se de um lado justifica-se a primazia concedida ao poeta dos heterônimos, de outro caberia repensar essa história hoje centenária.

SERVIÇO Título: Orpheu: 1915-2015 – Textos doutrinários e fortuna crítica (antologia) Organização, prefácio e notas: Carlos Felipe Moisés Páginas: 304 Área de interesse: Crítica e teoria literária Preço: R$ 54,00


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