Ju 628

Page 1

Jornal daUnicamp www.unicamp.br/ju

Campinas, 15 a 21 de junho de 2015 - ANO XXIX - Nº 628 - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

MALA DIRETA POSTAL BÁSICA 9912297446/12-DR/SPI UNICAMP-DGA

CORREIOS

FECHAMENTO AUTORIZADO PODE SER ABERTO PELA ECT

Fotos: Antoninho Perri / Antonio Scarpinetti/ Divulgação

3

O mapeamento da febre maculosa

8

Chico de Oliveira, do Cebrap ao ornitorrinco

4

A fronteira agrícola e as novas ‘capitais’

5

9

Excesso de nutrientes é ameaça à mata urbana

12

Técnica aprimora liga para implante

Os acordes pioneiros do Trio Surdina

Uma dor clandestina 6 e7

Tese desenvolvida pela psicóloga Carolina Machado de Godoy mostra que a maioria das grávidas vítimas de estupro opta pelo aborto clandestino. Para fundamentar seu estudo, que foi desenvolvido na Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp sob a orientação da professora Arlete Fernandes, a psicóloga fez o caminho inverso: entrevistou mulheres que solicitaram a interrupção legal da gestação.

Estudo liga artistas a distúrbios mentais Grupo vê vestígio de sangue de dinossauro Empreendedorismo é destaque na ‘Science’

Ilustração: Fábio Reis

TELESCÓPIO

2


2

Campinas, 15 a 21 de junho de 2015

TELESCÓPIO

CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br

Sem hiato no aquecimento global O chamado “hiato” do aquecimento global, uma queda na taxa de elevação das temperaturas do planeta registrada a partir de 1998, pode não ser um fenômeno real, mas resultado de um erro de medição, diz artigo publicado na revista Science. O “hiato” foi registrado no relatório do Comitê Intergovernamental para Mudança Climática (IPCC) publicado em 2013, que afirma que a temperatura global na superfície “mostrou uma elevação muito menor nos últimos 15 anos [1998-2012] do que nos 30 a 60 anos anteriores”. O trabalho agora publicado na Science, baseado em novos dados da Administração Nacional de Oceano e Atmosfera (NOAA) dos Estados Unidos, atribui a percepção do hiato a vieses observacionais e erros de medição, incluindo uma cobertura inadequada nas mudanças no Ártico. A NOAA também aplicou, recentemente, uma correção a suas informações sobre a temperatura dos oceanos. Levando-se todos os erros e dados incompletos em consideração, dizem os autores, a temperatura global subiu a uma taxa de 0,116º C por década no período de 2000 a 2014, em comparação com a taxa de 0,113º C apurada entre 1950 e 1990. Com isso, a suposta desaceleração do aquecimento global revela-se uma ilusão.

Rede eletrônica injetável Pesquisadores da China e dos Estados Unidos anunciam, no periódico Nature Nanotechnology, a criação de uma malha de eletrodos que pode ser injetada, em tecido vivo, com uma agulha de 0,1 mm de diâmetro. Testes realizados pelos autores em materiais de laboratório e no cérebro de camundongos mostram que, uma vez injetada, a malha, que tem área de alguns centímetros quadrados e espessura de menos de um milímetro, é capaz de se desenrolar, assumir uma configuração tridimensional e operar como componente eletrônico funcional. A aplicação no cérebro dos animais não gerou resposta imunológica, e a rede foi capaz de formar conexões com os neurônios dos animais, diz o artigo. A rede ainda pôde ser usada para monitorar a atividade de uma região do cérebro dos camundongos sem prejudicar os tecidos adjacentes.

Criatividade e psicose Artigo publicado no periódico Nature Neuroscience sugere uma raiz genética comum para a criatividade artística e distúrbios como esquizofrenia e transtorno bipolar. Análises epidemiológicas anteriores já haviam revelado que pacientes esquizofrênicos e bipolares tendem a ter mais parentes envolvidos em “profissões criativas” do que a população em geral, mas o novo trabalho avaliou também marcadores genéticos específicos. O estudo, de autoria de pesquisadores europeus e americanos, considerou como membros de “profissões criativas” indivíduos filiados a associações artísticas nacionais ou artistas profissionais. Levou em conta, ainda, estudos prévios que haviam levantado dados genéticos de mais de 150 mil pessoas. Os autores descobriram que as variações genéticas associadas a um risco elevado de distúrbios mentais, nesses trabalhos anteriores, também permitiam prever o mesmo risco numa população de controle, na Islândia. E essas mesmas variações também permitiam prever se islandeses mentalmente saudáveis seriam ou não membros de associações nacionais de músicos, dançarinos, atores, escritores ou artistas visuais. No artigo, os autores escrevem que seu levantamento “sustenta que há influências genéticas diretas na criatividade, em oposição à ideia de que conviver num ambiente com indivíduos psicóticos estimula a aptidão criativa”. “A principal descoberta apresentada aqui é que a criatividade, conferida, ao menos em parte, por variantes genéticas comuns vem com um risco aumentado de distúrbios psiquiátricos, conferido pelas mesmas variações genéticas”.

A maioria das supernovas – nome dado a estrelas que explodem de modo violento, espalhando elementos químicos como carbono e oxigênio pelo Universo – se localiza no interior de galáxias, mas imagens do Telescópio Espacial Hubble permitiram determinar que as três supernovas eram estrelas solitárias, diz nota distribuída pela universidade. De acordo com os autores da descoberta, a interação gravitacional de galáxias localizadas no interior de superaglomerados tende a arrancar cerca de 15% das estrelas de suas galáxias de origem. Essas estrelas permanecem ligadas aos superaglomerados, mas passam a residir fora das galáxias propriamente ditas.

Sangue de dinossauro Paleontólogos descobriram, no interior de oito ossos fossilizados de dinossauros do período Cretáceo – datados de 75 milhões de anos atrás – vestígios do que podem ser células do sangue e de fibras de colágeno. Os autores, ligados ao University College London (UCL), descrevem a descoberta com cautela, referindo-se ao material encontrado como “estruturas supostamente biológicas”, mas especulam que a preservação desse tipo de estrutura, mesmo ao longo de escalas de tempo geológicas, “pode ser mais comum do que se imaginava”. Nota da Nature Coomunications, periódico que publica o trabalho, lembra que anúncios anteriores de descobertas do tipo envolveram fósseis muito mais bem preservados que os trabalhados pela equipe do UCL, e mostraram-se “controversos”.

Robô sul-coreano ganha prêmio do Pentágono

Destruição de estrelas exiladas Três supernovas descobertas entre 2008 e 2010 explodiram no espaço intergaláctico, depois de terem sido expulsas de suas galáxias de origem, diz estudo realizado por pesquisadores da Universidade da Califórnia em Berkeley, que será publicado no Astrophysical Journal. Foto: Lieber Research Group, Harvard University/Divulgação

Um prêmio de US$ 2 milhões, oferecido pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos para a criação de um robô capaz de atuar em ambientes perigosos, foi conquistado pela equipe de robótica de uma universidade pública sul-coreana, informa o jornal The New York Times. O robô do Instituto Avançado de Ciência e Tecnologia da Coreia (KAIST), chamado Hubo, tem forma humanoide e é capaz tanto de caminhar quanto de rodar: quando se ajoelha, um par de rodas entra em contato com o solo. O teste do Pentágono exigia que o robô realizasse oito tarefas – incluindo operar uma furadeira, abrir uma porta, subir escadas e guiar um veículo – em menos de uma hora.

Resultados genéticos inesperados Rede de eletrodos é injetada, em meio aquoso, por agulha de vidro com diâmetro de menos de 100 micrômetros

inesperado dessa tecnologia: a descoberta de problemas de saúde não dos fetos, mas das mães. “Pais, obstetras e médicos têm sido pegos de surpresa”, escreve a autora, Diana Bianchi, da Universidade Tufts, nos EUA. “Os formulários de consentimento (...) raramente mencionam a possibilidade de descobertas sobre a saúde da mãe”. O artigo cita o caso de uma mulher que, após o exame sobre a genética do feto (que se mostrou saudável), foi encaminhada para uma triagem de câncer. “Há uma confusão considerável sobre como lidar com resultados incidentais”, diz Bianchi. “Administradas adequadamente, as descobertas incidentais que emergem de testes pré-natais podem acelerar tratamentos e salvar vidas, em vez de apenas aumentar a ansiedade de milhares de gestantes”.

Disco voador O “disco voador” da Nasa – na verdade, uma peça inflável, projetada para desacelerar naves espaciais enviadas a planetas de atmosfera tênue, como Marte – foi testado com sucesso, informa a agência espacial, embora o paraquedas especial supersônico, que deveria ter suavizado a descida, não tenha funcionado corretamente. O “disco”, chamado oficialmente de Low-Density Supersonic Decelerator (Desacelerador Supersônico de Baixa Densidade, ou LDSD) com massa de 3 toneladas e diâmetro de 4,7 metros, desceu no Oceano Pacífico, ao largo do Havaí.

‘Science’ publica especial sobre empreendedorismo A revista Science da última semana traz um caderno especial de artigos sobre ciência, empreendedorismo e inovação tecnológica. “Empreendedores são jardineiros que plantam inovação na economia”, diz editorial assinado por Iqbal Quadir, fundador do Centro Legatum de Desenvolvimento e Empreendedorismo do MIT. “O crescimento e o florescimento dessas inovações atraem abelhas – cientistas e engenheiros – e aumenta suas habilidades, impulsionando-os no caminho de novas técnicas, descobertas e carreiras”, o que pode levar a um “círculo virtuoso”. “Cientistas e engenheiros resolvem importantes problemas”, prossegue o editorial. “Mas são os empreendedores que identificam o que é importante, em termos de relevância para o público e de sustentabilidade econômica. Em países onde os recursos econômicos são limitados, são os jardineiros – focados no que deita raízes – que podem estimular, alimentar e direcionar as abelhas”. Além da peça opinativa de Qadir, o caderno traz artigos sobre crowdfunding, sobre o perfil psicológico de fundadores de start-ups e sobre o mercado de bens “intangíveis”, como patentes, entre outros temas.

Desde o início da década, existem exames de DNA que podem ser realizados com o sangue da gestante para detectar anomalias genéticas no feto. Um artigo de opinião publicado recentemente na revista Nature apontou para um resultado

UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas Reitor José Tadeu Jorge Coordenador-Geral Alvaro Penteado Crósta Pró-reitora de Desenvolvimento Universitário Teresa Dib Zambon Atvars Pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários João Frederico da Costa Azevedo Meyer Pró-reitora de Pesquisa Gláucia Maria Pastore Pró-reitora de Pós-Graduação Rachel Meneguello Pró-reitor de Graduação Luís Alberto Magna Chefe de Gabinete Paulo Cesar Montagner

Elaborado pela Assessoria de Imprensa da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Periodicidade semanal. Correspondência e sugestões Cidade Universitária “Zeferino Vaz”, CEP 13081-970, Campinas-SP. Telefones (019) 3521-5108, 3521-5109, 3521-5111. Site http://www.unicamp.br/ju e-mail leitorju@reitoria.unicamp.br. Twitter http://twitter.com/jornaldaunicamp Assessor Chefe Clayton Levy Editor Álvaro Kassab Chefia de reportagem Raquel do Carmo Santos Reportagem Carlos Orsi, Carmo Gallo Netto, Isabel Gardenal, Luiz Sugimoto, Manuel Alves Filho, Patrícia Lauretti e Silvio Anunciação Fotos Antoninho Perri e Antonio Scarpinetti Editor de Arte Luis Paulo Silva Editoração André da Silva Vieira Vida Acadêmica Hélio Costa Júnior Atendimento à imprensa Ronei Thezolin, Gabriela Villen, Valerio Freire Paiva e Eliane Fonseca Serviços técnicos Dulcinéa Bordignon e Fábio Reis Impressão Triunfal Gráfica e Editora: (018) 3322-5775 Publicidade JCPR Publicidade e Propaganda: (019) 3383-2918. Assine o jornal on line: www.unicamp.br/assineju


3

Campinas, 15 a 21 de junho de 2015

Mapeamento pode antecipar diagnóstico da febre maculosa Veterinário analisou as principais variáveis ambientais e demográficas na bacia do rio Piracicaba LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br

febre maculosa brasileira (FMB) é uma doença infecciosa de caráter agudo e de grande importância em saúde pública devido à sua alta letalidade. Apesar de a doença ter tratamento e cura, o coeficiente de letalidade no Estado de São Paulo alcança mais da metade dos casos notificados. Não deveria ser assim, se dependesse do tratamento, que é eficaz. A questão é que esse tratamento deve ser ministrado precocemente, o que não ocorre porque no exame clínico a febre maculosa pode ser confundida com outras doenças, como a leptospirose e a dengue na região Sudeste. Não havendo um fator patognomônico (sinal ou sintoma específico), a FMB só é confirmada através de exame laboratorial, ao tempo em que o caso pode tornar-se grave a partir do quarto ou quinto dia de infecção e evoluir rapidamente para óbito. O médico veterinário Celso Eduardo de Souza, que estuda a FMB há 25 anos e atua na Superintendência de Controle de Endemias (Sucen) do Estado de São Paulo, espera contribuir para facilitar a suspeita precoce de casos da doença, em tese de doutorado apresentada na Faculdade de Ciências Médicas (FCM). Souza estudou os fatores ambientais associados à transmissão e distribuição espacial da febre maculosa na bacia do rio Piracicaba, região paulista onde se registra a maior incidência de FMB no país. A pesquisa foi orientada pela professora Maria Rita Donalísio Cordeiro e desenvolvida no Laboratório de Análise Espacial de Dados Epidemiológicos (EpiGeo). O autor da tese explica que o tratamento da FMB é específico, à base de doxiclina, e precisa ser instituído até o segundo dia dos sintomas, caso contrário, a chance de óbito se torna elevada. “Os antibióticos de

O médico veterinário Celso Eduardo de Souza: “A garantia dos medicamentos não vai diminuir o número de óbitos, por causa da dificuldade no diagnóstico e da confusão com outras doenças”

Publicação Tese: “Fatores associados à transmissão e à distribuição espacial da febre maculosa brasileira na bacia do rio Piracicaba, Estado de São Paulo, SP, Brasil” Autor: Celso Eduardo de Souza Orientador: Maria Rita Donalísio Cordeiro Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM)

primeira geração utilizados atualmente não atingem a bactéria Rickettsia rickettsii. Outra dificuldade é que somente agora o Ministério da Saúde está importando a doxiclina injetável para tratamento de casos graves em humanos; no Brasil, ela existe apenas para uso animal, ou seja, também estamos sem ferramentas adequadas. De qualquer forma, creio que a garantia dos medicamentos não vai diminuir o número de óbitos, por causa da dificuldade no diagnóstico e da confusão com outras doenças.” Na opinião de Celso de Souza, é preciso aumentar a suspeição por parte do médico, para que ele inicie imediatamente o tratamento. “Recentemente, quando estive no HC [Hospital das Clínicas Unicamp], os médicos residentes discutiam o ‘caso de Holambra’ – cidade onde morava um casal que saiu para pescar às margens do Rio Jaguari, em Jaguariúna, área de transmissão da FMB. Ambos ficaram doentes e receberam tratamento com diagnóstico de dengue, com protocolo perfeito, mas na verdade tinham contraído febre maculosa; foram removidos para o HC já em estado grave e morreram”. O médico veterinário da Sucen também guarda na memória a advertência do já falecido sanitarista Luiz Jacintho da Silva, professor da Unicamp e estudioso da febre maculosa, de que está se trabalhando apenas com a ponta do iceberg. “Isto é verdadeiro, pois só chegam os casos graves que necessitam de hospitalização; os casos brandos passam despercebidos, o que talvez explique a baixa incidência registrada da doença. Não existe um exame para diagnóstico imediato e, se coletado o soro, o resultado sairá somente 15 dias depois, quando já for tarde. Dificilmente o médico vai suspeitar (e tratar) de doença transmitida por carrapato se o paciente não mencionar que frequentou áreas de risco ou teve contato com o vetor.” Tais informações, conforme salienta o autor da tese, só podem ser obtidas com uma boa anamnese – entrevista feita por profissional da saúde que busca relembrar todos os fatos relacionados à doença e ao doente. “O diagnóstico é realmente o grande desafio para os estudiosos, ou ‘a pedra angular’ da febre maculosa, na definição dos norte-americanos. Isso por que se trata de uma bactéria sensível a antibióticos: toma-se o remédio e pronto, controla-se a infecção. Nos Estados Unidos, a letalidade varia de 2% a 20%, graças à atuação diferenciada da vigilância epidemiológica”. Souza também é autor de um trabalho importante que identificou a capivara como um hospedeiro amplificador da bactéria Rickettsia rickettsii, transmitida através da picada de carrapatos (no caso, pelo Amblyomma sculptum). Este trabalho vem sendo utilizado para o controle da FMB e influenciou, por exemplo, na decisão de abater 100% da população de capivaras no Lago do Café, em Campinas. “Verdade que a capivara não é a única vilã, mas é considerada um dos melhores hospedeiros amplificadores da R. rickettsii entre os animais estudados, capaz de infectar mais de 30% dos carrapatos que sugam seu sangue durante o período de ricketsemia. Não existe ainda nenhum tratamento com carrapaticidas que seja eficaz nestes animais: a simples pulverização é inútil, pois se trata de animal semiaquático”, justifica o pesquisador.

O MAPEAMENTO Em relação à tese, o veterinário informa que no período abrangido de 2003 a 2013, houve perto de 1.200 casos notificados no Brasil, sendo 570 no estado de São Paulo e, destes, 360 na bacia dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (PCJ). Esta bacia banha 65 municípios – incluindo Campinas, Piracicaba, Pedreira e Jaguariúna, que registraram o maior número de ocorrências (54%) na última década. “A letalidade na região ficou entre 40% e 60% dos casos. Constatamos que a doença sempre ocorre em áreas de

Fotos: Antonio Scarpinetti

Capivara no Parque Ecológico de Campinas: animal é hospedeiro amplificador da bactéria ‘Rickettsia rickettsii’

baixa altitude e próximas a coleções hídricas. O risco de contrair febre maculosa no centro da bacia do Piracicaba é oito vezes maior que no restante da região.” O pesquisador chegou a tais constatações analisando as principais variáveis ambientais e demográficas, bem como a presença das espécies de vetores e de animais hospedeiros nos locais prováveis de infecção (LPI), associados à confirmação de casos de febre maculosa. São informações retiradas das fichas de investigação de focos de carrapatos realizadas pelas equipes de campo da Sucen e das fichas de investigação epidemiológica de FMB do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do Serviço de Vigilância Epidemiológica do Ministério da Saúde. O projeto aprovado pelo CNPq incluiu uma pesquisa de campo, cujos dados ainda estão sendo trabalhados. Segundo o autor do estudo, a partir dos dados coletados, foram desenvolvidos modelos matemáticos buscando entender os fatores associados ao risco de contrair a doença em determinadas áreas. “A ideia é repassar os mapas e outras informações para que os serviços de saúde fiquem atentos: se uma pessoa febril vier de uma região reconhecidamente de risco para FMB, deve ser imediatamente investigada e tratada precocemente. O resultado da tese é o mapeamento das áreas de risco e o estudo dos fatores associados à FMB – fatores que, embora conhecidos, não estavam publicados em lugar algum. Agora temos tudo por escrito.”

NA ÁREA URBANA Mais uma conclusão na tese de doutorado é que o ambiente periurbano (vizinhança imediata de uma cidade) apresentou maior número de locais prováveis de infecção (LPI) em comparação ao ambiente rural. Ao pon-

to em que obrigou Campinas a exterminar a população de capivaras na Lagoa do Taquaral e no Lago do Café, embora elas ainda sejam vistas no Parque Ecológico Monsenhor Emílio José Salim – de onde sua retirada não foi solicitada à Secretaria de Meio Ambiente. “A febre maculosa, no passado considerada uma endemia rural, atualmente vem ocorrendo também na área urbana e periurbana. Consequentemente, houve mudança também do perfil ocupacional dos doentes, antes mais de trabalhadores rurais e hoje de pessoas que frequentam os ambientes de risco em atividades de lazer (pesca, passeio, ecoturismo) e voltam infestadas de carrapatos infectados”. O autor incluiu no estudo uma revisão histórica, segundo a qual, a primeira descrição de FMB no país foi feita no estado de São Paulo em 1929, a partir de casos na capital paulista. Houve progressivo declínio da incidência na década de 30 e um longo silêncio a partir de 1943, até a sua volta no início dos anos 1980, com a criação da lei de crimes ambientais e a ocorrência de novos casos suspeitos na Região Metropolitana de São Paulo. Em 1985, a FMB passou a ocorrer de maneira endêmica, sobretudo nas bacias hidrográficas dos rios Atibaia, Jaguari e Camanducaia, que formam a bacia do rio Piracicaba, com os primeiros casos ocorrendo em Pedreira e Jaguariúna. Celso de Souza ressalta, finalmente, algumas hipóteses aventadas para a reemergência da FMB na região de estudo, dentre elas a maior disponibilidade de testes laboratoriais específicos para a doença; invasão de focos naturais pelo homem com os empreendimentos imobiliários de novos condomínios; e o aumento da população de capivaras devido à falta de predador natural, proibição da caça e destruição das matas ciliares pela expansão da produção de milho e cana-de-açúcar.


4

Campinas, 15 a 21 de junho de 2015

Expansão de fronteira agrícola altera perfil de cidades médias Pesquisa constata que município do interior de Tocantins passa a ter status de capital

Fotos: Divulgação

CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br

expansão da fronteira agrícola em direção à Amazônia, na última década, tem um componente urbano que muitas vezes passa despercebido, com o desenvolvimento de cidades de porte médio que passam a cumprir funções que antes eram exclusivas das capitais estaduais e grandes centros, diz a dissertação de mestrado “Fronteira e reestruturação produtiva na Amazônia Brasileira (2003-2013): um estudo sobre a mudança na hierarquia urbana do município de Araguaína (TO) na Amazônia Oriental”, defendida por Evaldo Gomes Júnior no Instituto de Economia (IE) da Unicamp. “Chamo isso de fronteira agrícola de conteúdo urbano. Ela avança, do ponto de vista produtivo, a partir da agricultura, mas tem um conteúdo muito urbano, inclusive repercutindo alguns problemas gerados pela nossa própria condição de subdesenvolvimento”, disse Gomes. “Por exemplo, houve expulsão do campo durante o avanço da fronteira agrícola: muitas pessoas que moravam no campo tiveram de ir para as cidades, muitas pessoas que migraram para a Amazônia já se deslocaram diretamente para as cidades, não foram para algum tipo de colonização rural”. O pesquisador explica que, embora essas cidades tenham assistido a um crescimento populacional expressivo por conta do avanço da fronteira agrícola, elas não se limitam ao papel de meros entrepostos de apoio à população rural. “Elas exercem uma influência muito mais relacionada ao setor de comércio e de serviços”, disse ele. “Centralizam serviços hospitalares, serviços educacionais, comércio. Elas cresceram graças ao avanço da fronteira agrícola, mas essa centralidade que exercem também está muito relacionada ao setor terciário, não só ao setor primário, e ao setor secundário. Essas cidades têm indústrias, frigoríficos, fábricas de celulose, relacionadas à fronteira agrícola”. A pesquisa tratou especialmente de Araguaína, cidade do Estado do Tocantins que emergiu no fim da década de 50, pouco antes do início das obras da estrada Belém-Brasília, e que se constituiu, como diz a dissertação, no “principal centro econômico e de interligação entre vários municípios da então região norte do Estado de Goiás com outras regiões”. Conhecida como “capital do boi gordo”, é uma grande exportadora de carne bovina. O trabalho de Gomes destaca que o aumento da centralidade de Araguaína na região permitiu o fortalecimento de vários outros setores econômicos, para além dos serviços de apoio direto à pecuária. “O mu-

Área cultivada (no alto, à esquerda), vista parcial de Araguaína (ao lado) e de seu centro comercial (acima): centralidade do município impulsionou o fortalecimento de outros segmentos

nicípio situa-se na borda oriental da Amazônia, na região Norte do Estado do Tocantins”, descreve a dissertação. “Detém o segundo maior PIB do Estado, e também a segunda maior população, atrás apenas da capital (...) Se levarmos em conta esses dois parâmetros, é o maior município do Estado, dentre aqueles que surgiram como consequência da construção da rodovia Belém-Brasília, ou a partir do avanço da fronteira do capital”. Com a chegada da rodovia, “Araguaína tornou-se o principal centro ao longo do eixo rodoviário nesta região do Estado, e é o centro que representa mais claramente o resultado de uma reorientação espacial, onde o Rio Tocantins deixa de ser o principal escoadouro e meio de locomoção das populações daquela região”.

RECENTE

Esse fenômeno do avanço da fronteira agrícola associado a um crescimento e a um ganho de importância das cidades de médio porte é recente, disse o autor. “Vem principalmente a partir dos anos 2000, que foi quando alguns fatores influenciaram no avanço da agricultura no Brasil”. Ele cita o efeito China – país cuja demanda sustentou uma elevação do preço das commodities por vários anos – além de mudanças na política para o setor. “O crédito agrícola cresceu muito nos últimos anos, e retornou a patamares que só foram verificados na década de 70”, afirmou Gomes. “Mas essa mudança, que chamo de Foto: Antoninho Perri

Evaldo Gomes Júnior, autor da dissertação: “As cidades cresceram graças ao avanço da fronteira agrícola, mas essa centralidade que exercem também está muito relacionada ao setor terciário”

mudança hierárquica, é recente. Então você tinha, por exemplo, uma cidade como Imperatriz (MA) ou Marabá (PA), que existem desde o século 19, mas não tinham a centralidade que adquiriram atualmente, a partir desses processos de avanço da fronteira agrícola”. Ele lembra que as expansões agrícolas anteriores à que se vê na Amazônia, por exemplo as que ocorreram rumo ao Paraná e ao Centro-Oeste, saindo de São Paulo, se davam por meio do avanço de posseiros, que não migravam para cidades, mantinham-se como população rural: “O avanço da fronteira agrícola, até os anos 50, 60, se dava por meio de posseiros. Os posseiros eram expulsos e iam buscar terras mais para o interior, e permaneciam na zona rural”, contou. “Mas, a partir da década de 70, com a ditadura, muda completamente a política agrícola no Brasil. O posseiro deixa de ter importância, e o avanço passa a ser determinado muito mais por ganhos especulativos”, vinculados à valorização da terra com a construção de rodovias e projetos de infraestrutura. “Os grandes capitais, já não mais posseiros, passam a grilar terras ao longo das rodovias que vão sendo abertas. A figura do posseiro deixa de existir como explicação para esse avanço da fronteira. E essa grilagem leva tanto o posseiro quanto a população cuja terra está sendo grilada para as cidades”.

SUBDESENVOLVIMENTO

Mesmo sendo uma novidade e estando integradas a redes globais de produção e exportação, essas cidades também servem à reprodução de características do subdesenvolvimento brasileiro, afirma Gomes. “A gente tem que entender que o subdesenvolvimento não é somente uma herança”, aponta. “É lógico que a partir do momento em que a gente se tornou colônia, exercemos um certo papel do ponto de vista da economia mundial. Mas o subdesenvolvimento também é uma construção. Ele tem que ser renovado. Então, se o Brasil deixou de ser colônia, ele permanece subdesenvolvido por meio de outros mecanismos. A modernização agrícola não implica na sua superação. Pelo contrário, esta modernização é operada por meio da manutenção do subdesenvolvimento”. O pesquisador usa como exemplo a estrutura fundiária brasileira, que pode ser considerada parte do “velho”, da “herança”, mas que se mantém graças a novas formas. “A grilagem de terras no Tocantins, que é o Estado que mais estudo, não é mais a mesma. Quando construíram a rodovia Belém-Brasí-

lia a grilagem era feita de várias formas (fraude de inventários, envelhecimento de papéis etc.), mas era uma especialidade dos cartórios. Atualmente, há instituições do próprio Estado, não só cartórios, promovendo a grilagem. Isso é um aspecto novo. Há coisas que permanecem, mas há novidades”. O pesquisador vê coisas “muito boas” nesse cenário de cidades intermediárias – “assiste-se a uma diversificação maior, nessa região, em relação ao que a cidade oferece, a uma descentralização das funções da cidade: não é mais a metrópole do Centro-Oeste, como Goiânia ou Brasília, que vai influenciar diretamente a região” – mas aponta “processos contraditórios”. “Há uma repetição dos problemas gerados numa metrópole nessas cidades intermediárias”, disse. “Elas já assistem a um forte surto de violência, há um baixo investimento em infraestrutura, em educação, em saneamento básico. Então, são cidades ricas, com importância para a produção agrícola e a produção industrial ligada à agricultura, são importantes para as cidades menores do seu entorno, mas que vão repetir problemas urbanos que também são típicos do subdesenvolvimento. Então você vai encontrar bairros pobres, bairros sem infraestrutura urbana, bairros sem saneamento básico, como em qualquer metrópole do país”. E esses problemas emergem de forma rápida. “Há cidades que estão recebendo uma migração muito elevada”, conta o pesquisador. “Esse é outro aspecto importante. As cidades menores desses Estados, Tocantins, Maranhão e Pará, estão perdendo população. Então, em geral, essa migração rumo a Imperatriz, Marabá e Araguaína vem de perto, de cidades menores que não têm o que ofertar para a população. Isso causa uma concentração populacional nas cidades intermediárias, enquanto as outras encolhem”.

Publicação Dissertação: “Fronteira e reestruturação produtiva na Amazônia Brasileira (2003-2013): um estudo sobre a mudança na hierarquia urbana do município de Araguaína (TO) na Amazônia Oriental” Autor: Evaldo Gomes Orientador: Humberto Miranda do Nascimento Unidade: Instituto de Economia (IE)


5

Campinas, 15 a 21 de junho de 2015

Pesquisa aprimora liga de titânio para implante Material foi submetido a tratamentos térmicos e acabamentos de superfície após modelagem Foto: Antoninho Perri

SILVIO ANUNCIAÇÃO silviojp@reitoria.unicamp.br

m estudo concluído em fevereiro último pelo pesquisador Guilherme Arthur Longhitano demonstrou que é possível melhorar as propriedades mecânicas e superficiais de uma liga de titânio utilizada em implantes ortopédicos. A liga de titânio foi submetida a tratamentos térmicos e modificações de superfície após a modelagem e produção por meio de uma técnica de impressão 3D, também conhecida como prototipagem rápida. A pesquisa foi conduzida junto à Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM) da Unicamp. Como resultado dos seus experimentos, o pesquisador da Unicamp obteve materiais com qualidade superior àqueles não submetidos aos tratamentos, sobretudo no que se refere à durabilidade e adaptação ao corpo. O estudioso e engenheiro mecânico graduado pela FEM aponta as principais vantagens do trabalho. “Conseguimos ótimos resultados após as modificações no material obtido pela técnica de impressão 3D. Entre os benefícios podemos citar a qualidade final do implante, tanto física quanto estética. Isso permite, por exemplo, a redução no tempo de cirurgia, evitando riscos e diminuindo gastos, além de chances menores de rejeição e maior durabilidade.” Guilherme Longhitano utilizou tratamentos térmicos, acabamentos de jateamento, ataque químico e polimento eletroquímico na liga de titânio Ti-6Al-4V, uma das mais empregadas em implantes ortopédicos permanentes ou temporários devido à sua biocompatibilidade. “Os tratamentos térmicos modificam as propriedades mecânicas do implante e os acabamentos de superfície alteram sua superfície, a qual está diretamente relacionada com a interação do implante com o corpo. Por meio do estudo dessas técnicas é possível a produção de implantes com qualidade superior. Isso permite, por exemplo, uma melhoria na qualidade de vida do paciente e sua reinserção no mercado de trabalho”, afirma. Os estudos de Guilherme Longhitano integraram dissertação de mestrado apresentada junto ao Programa de Pós-Graduação da FEM. A pesquisa foi orientada pela professora aposentada Maria Clara Filippini Ierardi, do Departamento de Engenharia de Materiais da Unidade. Os materiais utilizados no experimento foram obtidos junto ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Biofabricação (INCT-Biofabris), instalado na Unicamp. Houve financiamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). “O Biofabris trabalha com impressoras 3D na fabricação de implantes, alguns, inclusive já empregados em pacientes do Hospital de Clínicas (HC) aqui da Unicamp. O objetivo da nossa pesquisa, portanto, é melhorar ainda mais esses implantes, que já apresentam um nível de customização muito bom. Fazemos isso seguindo as normas da Sociedade Americana para Testes e Materiais [ASTM, na sigla em inglês], de modo que, futuramente, eles possam ser empregados comercialmente”, esclarece o engenheiro mecânico. Os seus trabalhos têm sequência, no momento, com o início da sua tese de doutoramento. “Trata-se de uma continuação do estudo com implantes produzidos por impressoras 3D, sendo que desta vez o foco é produzir implantes porosos que se adequem melhor às propriedades do osso humano. Além disso, será associada à técnica de funcionalização nessas estruturas porosas, com o objetivo de melhorar a resposta biológica do implante no corpo, através da incorporação de propriedades antibacterianas e favorecimento da osseointegração, por exemplo.”

DUCTILIDADE E RUGOSIDADE

Conforme o pesquisador da FEM, um resultado importante dos seus estudos foi o aumento de uma propriedade mecânica da liga de titânio, denominada tecnicamente como

Etapa do processo de fabricação das ligas de titânio: experimentos resultaram em materiais com qualidade superior

ductilidade. Trata-se de uma propriedade que representa o grau de deformação que um material suporta até o momento da sua fratura. “Um material com grau de ductilidade baixo vai deformar pouco e se romper precocemente. Já uma liga mais dúctil vai deformar bastante antes de se romper. Quanto mais dúctil o material, melhor. Pense, por exemplo, que o corpo humano está sujeito a práticas esportivas e atividades de locomoção. Um implante, quando está em nosso corpo, fica sujeito a esforços cíclicos e mecânicos. E quanto mais ductilidade tiver o material, maior será sua confiabilidade”, explica. Ele informa que após o tratamento térmico, a ductilidade da liga de titânio praticamente dobrou, passando de 6% para 11%. Guilherme Longhitano acrescenta que, além da melhora da ductilidade, houve um ganho importante no controle da rugosidade, que é outra propriedade relevante da superfície do material a ser empregado em um implante. O engenheiro mecânico relata que os acabamentos de superfície na liga de titânio permitiram um controle maior nos valores de rugosidade. Este controle possibilita, por exemplo, a obtenção de um valor específico nesta medida, de modo a produzir implantes ainda mais customizados às necessidades do paciente. Nos acabamentos de superfície, o menor valor de rugosidade foi obtido após as etapas de jateamento e ataque químico combinadas. “A combinação de jateamento com ataque químico gerou os menores valores de rugosidade. Enquanto o jateamento é responsável por reduzir a rugosidade e deixá-la mais uniforme, o ataque químico efetua uma limpeza na superfície e reduz ainda mais a rugosidade. O polimento eletroquímico apresentou um acabamento espelhado, que por outro lado mostrou altos valores de rugosidade.” Em relação ao tratamento térmico, que consistiu em modificar a estrutura da liga de titânio por meio de aquecimento e resfriamento, foi constatado que a condição ideal para as propriedades mecânicas foi a 950 ºC. As amostras foram submetidas aos tratamentos térmicos nas temperaturas de 850 ºC, 950 ºC e 1050 ºC, durante uma hora, com resfriamento em forno.

varredura, difração de raios-X, medidas de rugosidade e massa, microdureza Vickers, e ensaios de tração e compressão. Houve a colaboração do Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano), vinculado ao Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM); do Instituto de Física ‘Gleb Wataghin’ (IFGW); e da Faculdade de Engenharia Química (FEQ), este dois últimos, da Unicamp. A técnica de impressão 3D utilizada para obter a liga de titânio empregada na pesquisa é denominada como Sinterização Direta de Metais por Laser (DMLS). Guilherme Longhitano explica as principais diferenças deste método em relação aos processos convencionais para obtenção de peças de implantes. “Na técnica convencional são utilizados implantes em tamanhos padronizados, que não se adequam perfeitamente às necessidades de um paciente. Quando utilizada a produção de implantes por impressoras 3D, é utilizado toda uma metodologia para obtenção de implantes customizados: o paciente é submetido à tomografia computadorizada; em seguida os dados e imagens são transformados em um modelo de desenho em 3D; em seguida são produzidos biomodelos destes implantes. Estes modelos são feitos em materiais de baixo custo e servem para o médico planejar a cirurgia. Somente depois o implante é produzido em metal (no caso, a liga Ti-6Al-4V), esterilizado e então implantado.”

LONGHITANO, G. A. ; LAROSA, M. A. ; JARDINI, A. L. ; ZAVAGLIA, C. A. C. ; IERARDI, M. C. F. . ACABAMENTOS DE SUPERFÍCIE DA LIGA TI-6AL-4V PRODUZIDA POR SINTERIZAÇÃO DIRETA DE METAIS POR LASER. In: XXXV Congresso Brasileiro de Aplicações de Vácuo na Indústria e na Ciência/ 1º Congresso Ibero-Americano de Superfície, Materiais e Aplicações de Vácuo, 2014, Natal - RN. XXXV Congresso Brasileiro de Aplicações de Vácuo na Indústria e na Ciência/ 1º Congresso Ibero-Americano de Superfície, Materiais e Aplicações de Vácuo, 2014. Dissertação: “Estudo de tratamentos térmicos e acabamentos de superfície na liga Ti-6Al-4V produzida via DMLS para aplicação em implantes” Autor: Guilherme Arthur Longhitano Orientadora: Maria Clara Filippini Ierardi Unidade: Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM) Financiamento: Capes Foto: Antonio Scarpinetti

TÉCNICAS UTILIZADAS

As modificações resultantes após os tratamentos térmicos e acabamentos de superfície foram analisadas por meio da microscopia óptica, microscopia eletrônica de

Publicações

O engenheiro mecânico Guilherme Arthur Longhitano: “Objetivo é melhorar a resposta biológica do implante no corpo”


6

Campinas, 15 a 21

Vítimas de violência sexual e

Pesquisa da FCM desenvolvida por psic

Ilustração: Fábio Reis

ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br

studo de doutorado desenvolvido na Faculdade de Ciências Médicas (FCM) aponta que a vítima de violência sexual, ao engravidar, mesmo podendo recorrer ao aborto legal, acaba optando pelo aborto inseguro. Não assume que a criança foi fruto dessa violência. “Passa a viver solitariamente essa situação e a sua complicação, que é a gravidez. Em geral, a vítima não sai incólume. Sente medo e angústia do que poderá sobrevir, e o pior é que terá que conviver com a dor moral da violência pelo resto de sua vida, mesmo achando forças para retirar a criança”, conclui Carolina Machado de Godoy, autora da pesquisa. Segundo a psicóloga, as estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) para o aborto na América Latina são contundentes: 19 milhões de abortamentos inseguros por ano (39 abortos inseguros por mil mulheres). Em média, está previsto que 15% das gestações terminarão em aborto espontâneo. Metade das gestações que evoluem são indesejadas e uma parte delas acaba em aborto clandestino. Para fundamentar o seu trabalho, a autora foi justamente buscar o caminho inverso: ela abordou no seu trabalho as vivências das mulheres que sofreram violência sexual, engravidaram e, a seguir, solicitaram interrupção legal da gestação no Ambulatório de Atendimento Especial às Mulheres Vítimas de Violência no Hospital da Mulher “Prof. Dr. José A. Pinotti” - Caism. Carolina elucida a problemática do sofrimento dessas mulheres, sinalizando quão inaceitável é essa atitude e como ela fere os seus direitos. Mais um agravante: seu trabalho sugeriu que, quando a violência acontece, essas mulheres deixam de procurar os serviços de atenção à sua saúde. Na verdade, elas querem muito esquecer tudo. Elas deveriam procurar logo um serviço médico, adverte a psicóloga. Como isso não ocorre, vão se dar conta depois de que ficaram grávidas. Desde 1940, o Código Penal brasileiro prevê o aborto em casos de estupro. “O aborto não é penalizado quando representa risco à mãe e, desde 2012, nem quando o feto é anencefálico”, afirma a professora da área de Ginecologia da FCM Arlete Fernandes, orientadora da tese. Arlete conta que Carolina voltou seu olhar para essas vítimas da violência. Foi deste modo que se propôs a estudar, em longo prazo, as suas vivências, experiências e emoções por causa da interrupção da gestação. Ela entrevistou dez mulheres que procuraram o Caism entre 2006 e 2011. Seu público-alvo eram mulheres entre 18 e 38 anos, de diferentes classes socioeconômicas, a maioria com filhos. Três tinham curso superior completo e as demais tinham mais de oito anos de escolaridade. Uma delas era empresária. A maior parte estava estudando na época da violência. Essas mulheres, na maior parte, tinham sido vitimizadas por violência urbana, por desconhecidos, na rua. Metade da amostra era solteira e a outra metade divorciada ou vivia em união estável.

VIVÊNCIAS

Um achado do estudo foi que essas mulheres não procuraram um serviço de emergência nas primeiras horas, e não pela violência, mas pela descoberta da gravidez. Se tivessem vindo antes, a gravidez teria sido evitada com o uso da pílula de emergência, constata a doutoranda. Uma questão que se interpõe no conhecimento sobre o assunto é que ainda não se sabe o que de fato elas vivenciam durante e após a interrupção, e o que isso traz de repercussão à sua qualidade de vida. Ter optado por um estudo qualitativo permitiu conhecer a vivência das mulheres, desde receber a notícia da gravidez, a trajetória até o Caism e a interrupção da gestação. “Avaliamos mulheres pelo menos um ano após esse procedimento ou até cinco anos após”, ressalta. “A amostra foi reduzida para conhecer as experiências em profundidade.” As vítimas, via de regra, chegam ao Caism em sigilo absoluto, explana a pesquisadora. “Por isso meu estudo reforça a decisão da mulher de ‘ter’ que esquecer o que houve com ela.”

Carolin autora foi red experi

A experiência da interrupção pode lhes trazer certo alívio. Mas, à medida que é elaborada, as mulheres sentem culpa, sobretudo pela proibição do aborto no contexto moral e religioso. Sentem que não deram uma chance para aquela criança. Arlete salienta ainda que elas não se arrependem do aborto, todavia trazem essas questões no seu íntimo. No Caism, elas são atendidas por psicólogas e psiquiatras durante o período de internação, e o serviço é disponibilizado por seis meses após o procedimento. No estudo, disseram que foram ajudadas, que a sua carga diminuiu e demonstraram satisfação com o serviço. De outra via, não retornaram porque queriam esquecer aquele constrangimento. Retornar implicaria relembrar a angústia. “Por isso é necessário criar serviços para reencaminhar essas mulheres, fazer acompanhamento de saúde mental e trabalhar com a mídia veiculando que essa é uma problemática dolorida”, sublinha a ginecologista. A seu ver, é importante divulgar mais constantemente os serviços de atenção à saúde da mulher, pois são primordiais para essas pessoas. As vítimas não procuram o serviço por vergonha ou por desconhecerem a lei do aborto. Na verdade, elas precisam de apoio para se readaptarem à realidade. “É preciso reforçar o valor do perdão, que está no âmago da religião, e se livrar do preconceito. O estupro é uma marca na vida de quem foi violentada e cuja decisão foi a melhor na época, visto que não conseguiriam lidar com a gravidez de um pai desconhecido. Como iriam justificar isso para um filho, para um marido e para a sociedade?”, questiona Arlete. Fora a justificação da paternidade, há outros dois motivos para a solicitação do aborto: o medo de ter o filho e de não conseguir amá-lo; e dele ser a lembrança viva daquela violência. A docente reforça que a mulher não pediu para ser agredida sexualmente “e, incrivelmente, se sente culpada, dizendo que não deveria estar na frente do portão da casa, no ônibus, com uma blusa decotada, em um lugar ermo. Não é nada disso. Chega. Ela é uma vítima”.

PIONEIRISMO

Em 1994, mesmo sendo um direito previsto por lei, as mulheres não tinham um serviço do SUS para serem acolhidas e cuidadas. A princípio, elas procuravam o Caism espontaneamente a fim de buscarem cuidados, visto que ele era o Centro de Atenção


7

1 de junho de 2015

evitam recorrer a aborto legal

cóloga aborda vivências de mulheres que solicitaram interrupção da gestação Fotos: Antonio Scarpinetti

na Machado de Godoy, a da tese: “A amostra duzida para conhecer as iências em profundidade”

Trechos de depoimentos

A professora Arlete Fernandes, orientadora do estudo: “É necessário criar serviços para reencaminhar essas mulheres”

Excertos extraídos da tese. Foram mantidas a forma e a grafia originais.

AGRESSÃO SEXUAL

“Eu cheguei em casa. Tomei um banho. Eu não sei quanto tempo eu fiquei debaixo do chuveiro, e deitei. Fui dormir. Não sei quanto tempo eu dormi. Só sei que fui acordar depois de quase um dia. Minha mãe estava viajando e eu não podia deixar ela perceber que aconteceu isso. Então eu falei: - eu tenho que melhorar. Me arrumei e fui esperar minha mãe chegar de noite. No domingo, então ela chegou. Eu sorrindo... e fui levando meses fingindo que nada aconteceu. Até o dia que eu descobri a gravidez...” “Eu não tinha informação e eu estava com muita vergonha. Eu fiquei muito ruim. Eu queria só chegar em casa, tomar banho, e achava que ia dormir, mas não dorme...não faz nada, nada do que você pensa você faz. Mas a única coisa que eu queria era não contar para ninguém, não falar para ninguém. Eu achava que ia acabar ali...”

DIFICULDADE

EM PEDIR AJUDA

Integral à Saúde da Mulher. “Raciocinando assim, elas tentavam resolver uma situação de direito, mas que ninguém tinha se disposto a acolhê-las”, observa a ginecologista. Ela relata que as mulheres grávidas, após a violência sexual, eram encaminhadas ao serviço, na época sob a coordenação do obstetra Aníbal Faúndes, que tinha ideias de vanguarda – de oferecer atendimento integral e especializado à mulher em suas necessidades reprodutivas. Acontece que, para essas mulheres, era tão improvável ingressar em um serviço de referência que chegavam ao Caism muito além das 20 semanas de gestação, quando o aborto já não era mais permitido e havia riscos. Faúndes e sua equipe – enfermeiras, psicólogas e assistentes sociais –, sensibilizados com a problemática, idealizaram um serviço de emergência para atender as mulheres logo após a violência sexual e administrar a pílula de emergência, que impede a gravidez. Das vítimas que procuraram o Caism até aqui, houve só uma gravidez entre as mulheres que usaram a anticoncepção de emergência e mais de 1.500 já foram atendidas pelo Serviço de Emergência. De 1994 até hoje, foram 200 solicitações de interrupção legal da gestação. Arlete, porém, explica que nem todas as solicitações são atendidas. Por volta de 60% são realizadas; outras 40% são negadas porque estão em idade gestacional superior à estipulada, não preenchem os critérios da lei ou, ainda, porque desistiram ou porque perderam seguimento. Hoje, se as mulheres chegam ao Caism até 72 horas após a violência sexual, recebem anticoncepção de emergência – uma pílula de 1,5 mg de levonorgestrel (progesterona), a antiga ‘pílula do dia seguinte’. Arlete comenta que essa pílula, quanto mais cedo for ingerida, maior será sua efetividade. “Não se trata de uma pílula abortiva. Ela inibe o óvulo de sair do ovário, por isso deve ser tomada logo após a violência.”

IMPLICAÇÕES

Arlete expõe que este estudo é sobremodo relevante nesse momento em que saiu um decreto da Presidência da República, de agosto de 2014, que exige que todos os serviços do SUS, que funcionam 24 horas, têm o dever de atender violência sexual – tanto na emergência quanto na interrupção da gestação. “Como são serviços difíceis de serem implantados, é preciso ter estudos de maior abrangência para aumentar o conhecimento sobre a problemática da violência sexual e de seus agravos.”

Essa é somente uma complicação, enfatiza Carolina. Existem outras. Cerca de 20% das mulheres continuam, após seis meses da violência sexual, com necessidade de tratamento para quatro complicações: depressão, ansiedade, transtorno de estresse pós-traumático e ideação suicida, diagnosticadas através de escalas de saúde mental. A psicóloga assinala ainda que as mulheres, após a violência sexual, tendem a se prostituir mais, a terem condutas não cuidadosas consigo mesmas, a fumarem, a beberem e a usarem drogas. Perdem o emprego e não se ajustam mais à sociedade. “A violência sexual é uma agressão que afeta o ego das mulheres”, revela. “Não interfere só no físico. É um estigma na vida, e a gravidez é o agravo.” Se não houvesse a gravidez, as vítimas acreditam que ninguém saberia do estupro. “Mas, com a gravidez, a violência é revivida pela segunda vez. Se fosse possível apagar algo nesse sofrimento, apagaria a violência”, opina a orientadora. Para Carolina, a maior violência é ver essas mulheres sendo desrespeitadas, como se isso fosse legalizado. O resultado é que, quando ocorre uma violência sexual, as mulheres não dizem, subnotificam, não procuram ajuda. A psicóloga realça a necessidade de olhar para essas mulheres como pessoas que estão em grande sofrimento, pois de fato estão. “Assim, se existe uma prerrogativa social de que a mulher que faz um aborto é uma mulher sem emoção, que não está pensando na criança, pelos achados que tivemos, isso não faz sentido algum.” O Caism é o único serviço da região de Campinas que fornece esse tipo de assistência. O Ministério da Saúde está tentando implantar esse serviço em outros locais e trazer pessoal de recursos humanos para treinamento. Para implantar novos serviços, avalia Arlete, mesmo os profissionais precisam ser treinados, posto que o preconceito está na sociedade e no profissional da saúde. Se o serviço não for acolhedor, achando que a mulher é culpada pela violência, como ela vai fazer o aborto? Vai procurar o aborto inseguro. Isso é um pecado que as pessoas fazem com as vítimas, opina. “O aborto é uma marca indelével da sociedade e, na verdade, vivenciá-lo é extremamente difícil. Seria bom que nunca acontecesse, nem o espontâneo. Todavia, em algumas situações, ele é uma terapia”, desmistifica Arlete, que é a atual responsável pela coordenação do serviço de atenção especial às mulheres vítimas de violência sexual no Caism.

“E o mais difícil mesmo foi porque eu não queria contar para ninguém. A gente fica com muita vergonha. É estranho o sentimento. A gente fica com muita vergonha. A gente não quer contar. A gente quer resolver, e, se não tivesse acontecido a gravidez, ninguém tinha sabido”

DESCOBERTA DA GRAVIDEZ

“Senti um... não tem nem como explicar. É terrível. Na hora, passa mil e uma coisas na cabeça. E assim, eu agradeço a Deus por ter conseguido ajuda porque, se eu não tivesse conseguido, eu não sei do que seria capaz. Porque na hora mesmo eu fiquei sem chão, fiquei sem rumo, fiquei completamente desestabilizada...” “O resultado de que estava grávida, quando o meu médico falou: ‘você está grávida’, eu não fui para ouvir isso. Eu não estava preparada para ouvir isso. Eu não imaginava... isso me marcou muito...”

PENSAMENTO A RESPEITO

DO ABORTO CLANDESTINO

“... É engraçado que a gente pensa um monte de besteira. Se fala que não pode, eu não sei o que eu faria. Eu não sei o que eu ia fazer, mas eu ia fazer alguma coisa, sabe? Comprar remédio pela internet, de ir para São Paulo fazer aborto ilegal, essas coisas todas. Tudo isso passava. Tudo isso passava pela minha cabeça...” “... eu queria ir embora para poder procurar uma coisa clandestina. Então, na hora que eu soube, eu falei: eu tenho que parar com isso (referindo-se à gestação)...”

INFORMAÇÕES SOBRE O

DIREITO AO ABORTO LEGAL “Não, ninguém sabia. Ninguém sabia o que eu poderia fazer. Muito pelo contrário: eles iam entrar com um processo pedindo para a juíza a liberação, contando o caso, justificando. Demorava dois ou três meses para sair o retorno do juiz. Dois ou três meses para sair

retorno de juiz. Já aconteceu tudo, né? Ninguém indicou vocês aqui. Ninguém indicou ...”

DECISÃO PELA SOLICITAÇÃO DE INTERRUPÇÃO LEGAL DA GESTAÇÃO

“Porque eu não podia levar para o resto da vida uma coisa que eu não queria que tivesse acontecido. Toda vez que eu fosse olhar na criança, eu ia lembrar de tudo...” “Porque é um... no momento que tudo acontece você se sente um lixo... e foi assim que eu me senti. E depois eu pensava que eu não ia conseguir gostar, se no caso fosse acontecer de levar adiante, de não gostar, de maltratar até. E sei lá... porque acho que filho a gente tem que amar, cuidar... e muitas coisas não acontecem assim como a gente gostaria. E para mim a opção da interrupção foi, naquele momento, a solução...” “Apesar de ter muita coisa que me dói muito, a hora que eu coloco o porquê eu fiz e o porquê eu não faria, sempre... É o que meu pai falava, né: ‘coloca numa balança e vê o que que pesa mais’, porque de você fazer e por que de você não fazer. E sempre pesa mais o porquê eu fiz isso...”

SOFRIMENTO E IMPACTO

DA RELIGIOSIDADE EM LONGO PRAZO

“Ah, eu me sinto, é, é difícil porque até hoje eu não consigo achar uma justificativa, por mais que eu tenha feito. Eu tinha muitos motivos. Eu não consigo achar uma justificativa na religião pelo que eu fiz, sabe? Então eu acho que eu vou ser muito castigada ainda por causa disso...” “Eu sou católica e isso foi o que mais pesou. Pesou muito. Porque foi onde que gerou mais conflito na minha cabeça...” “Ah... no começo fica assim, meio um vazio, uma coisa ruim, dolorida, porque afinal de contas é uma vida, né? Mas... é triste. Eu fiquei um pouco bagunçada...” “Acho que eu fiquei mais descrente. Eu já cheguei até a ter alguns pensamentos ruins já, de que Deus não existe...” “Eu acho que não cura nunca. Porque assim, comigo, já vai fazer dois anos mais ou menos... e para mim continua muito recente. Para mim, eu acho que não vai sarar nunca. Por isso assim, que às vezes eu preciso desse tempo. Eu preciso de um tempo para ver se isso apaga um pouco. Mas eu acho que é uma ferida que nunca sara completamente. Não esquece nunca...”

DECISÃO E NÃO ARREPENDIMENTO “O bom foi a opção que eu tive de continuar vivendo, de continuar batalhando pelo que eu queria. E de ruim o sentimento que eu sei que era uma vida que eu tive que interromper. Então fica sempre aquele pensamento triste na cabeça da gente...” “Eu faria tudo de novo. Minha vida mudou para melhor, apesar desta tristeza que parece que nunca vai embora...”

Publicação Tese: “Vivências de mulheres que sofreram violência sexual e solicitaram interrupção legal da gestação” Autora: Carolina Machado de Godoy Orientadora: Arlete Fernandes Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM) Financiamento: Fapesp


8

Campinas, 15 a 21 de junho de 2015

Tese aborda as diferentes fases da trajetória do sociólogo pernambucano

Chico de Oliveira e o ovo do ornitorrinco Fotos: Antoninho Perri

LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br

ornitorrinco é um ensaio do sociólogo Francisco de Oliveira, que recorreu ao estranho animal dotado de bico de pato – considerado ao mesmo tempo réptil, pássaro e mamífero – como metáfora do Brasil enquanto nação presa a um impasse evolutivo. Figura importante e polêmica das ciências sociais, Chico de Oliveira tem a sua trajetória resgatada em tese de doutorado abordando desde o início eufórico com a utopia desenvolvimentista de Celso Furtado, passando pela maturação no Cebrap e na criação do Partido dos Trabalhadores, até a decepção com a derrota de suas apostas políticas e a percepção de um país sem rumo – daí o pessimismo nos ensaios dos últimos anos e a pecha de rancoroso, por críticas àquelas instituições e antigos correligionários. “O ovo do ornitorrinco: a trajetória de Francisco de Oliveira” é o título da tese de Flávio da Silva Mendes, orientada pelo professor Marcelo Siqueira Ridenti e defendida no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH).“A trajetória dele como intelectual e militante é impressionante. Conheci sua obra no início da graduação e desde então cresceu meu interesse e admiração pelo que escreve, mas também tenho minhas críticas. Ele passou por centros importantes de produção e de crítica e, a partir desta trajetória, obtive uma visão geral de toda a sua geração”, afirma o autor da tese, que também fez, juntamente com seu orientador, uma entrevista com o personagem. Nascido no Recife em 7 de novembro de 1933, Chico de Oliveira trabalhou ao lado de Celso Furtado na Sudene (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste) nos anos anteriores ao golpe de 1964; preso uma primeira vez, ao ser solto, fugiu do país. Retornou em 1969 para atuar no Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento) com Fernando Henrique Cardoso e Octávio Ianni. Peça importante na oposição ao regime militar, foi novamente preso e torturado em 1974. Nos anos 80 engajou-se na luta pela redemocratização e na criação do PT. Um dos maiores críticos dos governos de FHC nos 90, rompeu também com o PT após a eleição de Lula em 2002. Flávio Mendes afirma que O ornitorrinco é um ensaio curto, publicado juntamente com a reedição do clássico Crítica à razão dualista (2003), servindo como metáfora da sociedade brasileira que guarda profundas aberrações, entre o arcaico e o mais moderno, entre a extrema miséria e o luxo ostensivo. “O ‘ovo’ no título da tese é a melhor metáfora que encontrei sobre a origem e para onde aponta o pensamento de Chico de Oliveira, que se traduz na decepção com os rumos do desenvolvimento do país e na postura política e intelectualmente pessimista. Sua crítica continua presa aos valores desenvolvimentistas do período de Celso Furtado.” Segundo o autor da pesquisa, a metáfora condensa a ideia de um Brasil que avançou em vários aspectos, tornando-se uma das maiores economias do mundo, mas com uma indústria que, ainda que avançada, não atinge a nova era molecular e digital. “Chico de Oliveira aponta avanços e atrasos, como na imagem do ornitorrinco, animal que não é nem uma coisa nem outra e está preso a um impasse evolutivo. Na visão dele, não é mais possível pensar o Brasil em termos do desenvolvimentismo do passado, nem propor outra forma de desenvolvimento para superar o estado que chama de ‘desenvolvimento truncado’”.

Francisco de Oliveira em palestra na Unicamp: decepção com o processo desenvolvimentista, com FHC e com o PT

Mendes acrescenta que é um pouco em função deste projeto no Cebrap, e de críticas à postura de Fernando Henrique sobre o que significou o golpe de 64, que o sociólogo vai elaborar Crítica à razão dualista. “Nesse texto, Chico faz uma conversão do desenvolvimentismo para o marxismo acadêmico, trazendo aspectos novos, como a questão regional, para um núcleo que pensava o desenvolvimento capitalista a partir de São Paulo. Ele inova mostrando que aonde mais se sentia as características do desenvolvimento do país não era no polo avançado, e sim na periferia, que é o Nordeste.” De acordo com o pesquisador, o clássico de Chico de Oliveira traz como argumento central a crítica ao dualismo defendido pela Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe), que via no Brasil um setor avançado e um setor atrasado. “Vem daí a proposta da Sudene de industrializar o Nordeste, eliminando-se o setor agrário exportador, que mantinha resquícios arcaicos (os latifúndios); industrializando a região, o país se nivelaria e superaria o atraso.” Mendes diz que Chico de Oliveira contraria esta lógica, ao sustentar no ensaio que aquele atraso é integrado ao setor avançado, dando o exemplo do trabalho informal, em que o vendedor de latinhas torna-se fundamental para a comercialização da Coca-Cola. “Ele mostra que vão se criando outros trabalhadores precarizados, porém funcionais para o capitalismo brasileiro. É um capitalismo atrasado, que por não conseguir competir no mercado internacional, promove o rebaixamento da mão de obra para que possa se re-

CRÍTICA AO DUALISMO

Flávio Mendes elege Crítica à razão dualista, publicado primeiramente como ensaio em 1972, como marco inicial da trajetória intelectual de Chico de Oliveira. “Cabe destacar que ele não é formado na Faculdade de Filosofia da USP, centro de debate marxista onde estavam Fernando Henrique, Octávio Ianni e Roberto Scharz, que vão formar o Cebrap no final dos 60, quando expulsos da universidade pelo AI-5. O Cebrap, portanto, é muito marxista e muito paulista, ao passo que Chico é de fora deste contexto, do núcleo do desenvolvimentismo, tendo chegado a convite de Ianni para participar de um projeto específico sobre desenvolvimento nacional.”

Flávio da Silva Mendes, autor da tese: “A perspectiva de Chico de Oliveira é de que existe uma estrutura maior impedindo que suas apostas se efetivem”

produzir. Esta é a grande tese de Chico de Oliveira, exposta no livro que se mantém como referência até hoje.” Outro texto que Mendes considera importante é “Elegia para uma re(li)gião” (1977), uma análise crítica da atuação da Sudene. “A Sudene levou industrialização para o Nordeste, mas os donos daquela indústria são de São Paulo ou do capital estrangeiro; industrializou-se a região, mas manteve-se a dominação. Esses dois textos da década de 70, que julgo os principais, fazem crítica também ao modelo de desenvolvimento da ditadura (o ‘milagre econômico’): de que o país crescia economicamente, mas em nada evoluía no campo social.”

CRIAÇÃO DO PT

O pesquisador lembra que, na década de 80, o sociólogo vai se envolver principalmente com a criação do PT, ao mesmo tempo em que a unidade dentro do Cebrap começa a se desfazer. “Fernando Henrique era favorável à continuidade da oposição à ditadura no âmbito do MDB [Movimento Democrático Brasileiro], enquanto Chico, Ianni e outros intelectuais defendiam a criação de um partido com perfil mais à esquerda. E Chico aposta no PT como um partido que, de alguma forma, retomaria um modelo de desenvolvimentismo social, apesar da nova conjuntura internacional.” Entre 1982 e 84, Chico de Oliveira faz um estágio de pesquisa na França, no início do primeiro governo do socialista François Mitterrand. “Na volta ao Brasil, ele passa a

defender o modo de produção socialdemocrata, pregando que a grande tarefa da esquerda brasileira era construir uma socialdemocracia, ainda que fosse uma caricatura do modelo europeu. Tal postura resultou em certo distanciamento do PT, que nascera com um discurso classista – este distanciamento ficou claro quando o partido se posicionou contra a participação no Colégio Eleitoral que elegeu Tancredo Neves em 85, e Chico adotou uma posição mais moderada, a favor da Frente Ampla.” Na avaliação de Flávio Mendes, os textos do sociólogo na década de 80 se equilibram entre o clima otimista proporcionado pela conjuntura nacional e as preocupações com as transformações do capitalismo mundial. “A decepção vem durante os anos 90. A derrota de suas apostas políticas e o avanço de uma democracia de corte liberal aprofundaram o tom pessimista de seus trabalhos e alimentaram o diagnóstico do Brasil como uma nação presa a um impasse evolutivo, como sugere a metáfora apresentada em ‘O ornitorrinco’. Ele se torna um crítico bastante duro do governo de Fernando Henrique, de quem tinha sido muito próximo no Cebrap.” Mendes observa uma reaproximação entre o sociólogo e o PT quando o partido passa a rever seu discurso com a derrota de Lula na eleição presidencial de 89. Chico, no entanto, acabou saindo do PT em 2003, dentre outros motivos, por brigas internas que acarretaram inclusive em processos movidos por José Dirceu e outros militantes. “Se ele já era um dos maiores críticos do governo FHC, passou a ser crítico também do governo do PT. Hoje, o argumento central de sua crítica é que o país retornou ao desenvolvimento truncado e que a política está anulada neste processo, com o debate nacional dominado pela economia (controle da inflação, crescimento econômico), sem que se toque em questões políticas fundamentais.”

RODA VIVA

Chico de Oliveira vai fazer 82 anos e Flavio Mendes, juntamente com o professor Marcelo Ridenti, teve a oportunidade de entrevistá-lo em 2012 – entrevista publicada no caderno CRH (Centro de Recursos Humanos, da UFBA) e disponível na internet. “A conversa foi muito oportuna porque se deu logo depois de sua participação no programa ‘Roda Viva’, da TV Cultura, em que os jornalistas procuraram tirar dele o que queriam ouvir: alguns queriam que falasse mal do Lula e do PT, e conseguiram, pois ele fala o que pensa.” O pesquisador se refere às declarações do sociólogo que tiveram forte repercussão, como “Lula não tem caráter” e “Lula é um oportunista”. “Nesse entrevero há muitas questões envolvidas, pessoais e políticas, mas é fato que Chico gosta de polemizar. A sua postura é um pouco de espetáculo, não que busque o holofote, mas por não ter receio de falar o que pensa – e isso tem um custo alto, tanto do ponto de vista intelectual como político. Entrevistando pessoas mais próximas, ouvi críticas com as quais não concordo, como a de guardar rancor. Pessoalmente, vejo coerência no seu pensamento, coerência esta que busquei na tese.” Mendes conta que em sua entrevista, visando traçar a trajetória de Chico de Oliveira, ficou claro como evoluiu seu pensamento até a decepção com os rumos do desenvolvimento nacional. “Por trás de sua postura há toda esta decepção com um projeto desenvolvimentista que não deu certo, com o processo de democratização dos anos 80 e com o PT. A perspectiva de Chico é de que existe uma estrutura maior impedindo que suas apostas se efetivem, levando-o a uma postura de anulação, de estar em beco sem saída. Não vejo sentido em creditar esta postura a rancor ou decepção pessoal. É diminuir um raciocínio rico, que conta a história do Brasil de forma rica. Concorde-se ou não com ele, Chico nos faz pensar.”

Publicação Tese: “O ovo do ornitorrinco: a trajetória de Francisco de Oliveira” Autor: Flávio da Silva Mendes Orientador: Marcelo Siqueira Ridenti Unidade: Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH)


9

Campinas, 15 a 21 de junho de 2015

Fósforo e nitrogênio causam

desequilíbrio em mata urbana Foto: Prefeitura de Campinas/Divulgação

Altas concentrações na Santa Genebra, em Campinas, se assemelham a índices de regiões industriais da China SILVIO ANUNCIAÇÃO silviojp@reitoria.unicamp.br

ma pesquisa da Unicamp conduzida pela bióloga Ângela Cruz Guirao constatou altas concentrações de fósforo (P) e nitrogênio (N) na Mata de Santa Genebra, situada na região oeste de Campinas, no distrito de Barão Geraldo. Conforme o estudo, as taxas encontradas na unidade de conservação de uso sustentável do município se assemelham a índices de regiões industriais da China, país que apresenta os mais altos valores do mundo, devido à poluição atmosférica provocada pela industrialização. Elevadas taxas destes nutrientes geram diversos impactos no ecossistema da Mata, considerada como o maior fragmento florestal de Campinas, com 251 hectares de área, relaciona Ângela Guirao. A pesquisadora da Unicamp alerta para o risco de um desequilíbrio ambiental, com o aumento de espécies vegetais exóticas invasoras e até mesmo o desaparecimento da floresta original. “O aparecimento de espécies exóticas na Mata de Santa Genebra é sintomático deste desequilíbrio. Espécies como leucena, mamona, bambu e gramíneas já estão presentes ali, ocupando o espaço de espécies nativas. Pode ocorrer uma substituição acentuada da fisionomia vegetal existente na Mata, e isso é muito preocupante”, adverte Ângela Guirao. A bióloga aponta para a forte ação do homem no entorno da Mata, o que pode, de acordo com ela, explicar as elevadas taxas dos nutrientes N e P. Além de estar rodeada por uma ocupação urbana, a Mata de Santa Genebra apresenta, nos seus arredores, o cultivo industrial de cana-de-açúcar pela Usina Açucareira Ester; a poluição dos veículos das rodovias Dom Pedro I e Professor Zeferino Vaz; e da Refinaria de Paulínia (Replan). “Se pretendemos ter uma floresta conservada e com a vegetação natural preservada é fundamental considerar não somente o manejo interno, mas o do seu entorno. É algo que precisa ser levado em conta no plano de manejo da mata, na zona de amortecimento, nas restrições e uso daquele entorno. Isso deve ser pensado, inclusive, para a conservação de outros fragmentos do município”, recomenda a bióloga, que é graduada pela PUC-Campinas, com mestrado em geografia pela Unicamp. Ângela Guirao atua como bióloga da Secretaria do Verde, Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Prefeitura de Campinas.

Vista área da Mata Santa Genebra, cuja área é de 251 hectares: ação do homem é ameaça ao ecossistema

A pesquisa de campo na Mata foi realizada no período de 2013 a 2014. Além da presença do P e N, foram avaliadas as quantidades de outros nutrientes na floresta, como cálcio, magnésio e enxofre. “Estes nutrientes são substâncias importantes para vários ciclos da natureza, sejam os ciclos ligados a animais, sejam ligados a vegetais. A circulação de tais nutrientes, que chegam pela água ou atmosfera, é influenciada pelo ambiente geográfico. São substâncias químicas que se relacionam com o biológico e geográfico”, explica Ângela Guirao. A sua pesquisa integrou tese de doutorado defendida recentemente junto ao Instituto de Geociências (IG) na área de concentração de análise ambiental e dinâmica territorial. A tese foi orientada pelo professor José Teixeira Filho, que atua tanto no Programa de Pós-Graduação do IG, quanto na Faculdade de Engenheira Agrícola (Feagri) como docente e diretor da Unidade.

Fotos: Antonio Scarpinetti/Divulgação

GEOPROCESSAMENTO

Ângela Guirao informa que o estudo analisou, por meio de uma nova metodologia, o ciclo da água (processo hidrológico) e o ciclo biogeoquímico (biológico, geográfico e químico) no fragmento florestal. Para analisar estes ciclos na unidade de conservação ela dividiu a Mata de Santa Genebra em duas bacias hidrográficas: uma pertencente ao Rio das Pedras, que contribui para o Ribeirão Anhumas, afluente do Rio Atibaia; e outra, ao Ribeirão Quilombo, que deságua no Rio Piracicaba. Conforme o orientador da pesquisa, a relevância do método consistiu no uso de ferramentas de geoprocessamento para compreender os ciclos hidrológicos e biogeoquímicos. Tais ferramentas, explica José Teixeira Filho, permitem a mudança da escala dos pontos de monitoramento hidrológico e biogeoquímico para as bacias hidrográficas. Com os dados coletados e simulações baseadas no Índice de Área Foliar foi possível, por exemplo, a partir de uma imagem de satélite, expandir as informações daquele determinado campo para toda a bacia.

“A Ângela usou uma imagem de satélite e, para cada pixel daquela imagem, conseguiu identificar o valor da área foliar. O experimento montado teve o objetivo de caracterizar alguns detalhes particulares da vegetação da mata e depois possibilitar, a partir de ferramentas de geoprocessamento, que se mude a escala espacial. No final, ela desenvolveu cartas que tem a condição de apontar como isso ocorre ao longo da mata, mesmo a floresta tendo uma heterogeneidade importante”, relata. Para o docente, a modelagem hidrológica, em função do Índice de Área Foliar, mostrou-se uma ferramenta adequada para a mudança de escala dos dados obtidos para as bacias hidrográficas. Tal técnica permitiu uma análise e entendimento dos processos biogeoquímico e hidrológico na escala temporal e espacial, podendo, inclusive, ser aplicada em outras bacias para a compreensão do funcionamento das florestas. “Em muitas metodologias são apontados apenas valores gerais, médios. A pesquisa em questão se destaca porque o seu método não mede apenas valores médios. Temos condição de saber, em cada posição da bacia, como está o balanço hídrico e biogeoquímico. A Ângela produziu uma cartografia do balanço hídrico e cartografia do balanço geoquímico. Este método poderia, inclusive, ser empregado em outros trabalhos, tanto na parte do manejo florestal, como na parte agrícola, principalmente, na chamada área da agricultura de precisão”, acrescenta o orientador. A metodologia, de natureza quantitativa e qualitativa, também consistiu na caracterização da vegetação da mata por meio de levantamento bibliográfico, avaliação do acúmulo e da taxa de decomposição da serrapilheira – camada formada pela deposição e acúmulo de matéria orgânica no solo. Além disso, houve o monitoramento hidrológico, como a chuva incidente, a chuva interna da cobertura vegetal, a interceptação de chuva da cobertura vegetal, a chuva da serrapilheira e a interceptação de chuva da serrapilheira, bem como o escoamento superficial. Por fim, o monitoramento biogeoquímico, verificando a transferência de nutrientes via serrapilheira ao solo e fluxo de N e P via chuva incidente, chuva interna da cobertura vegetal e da serrapilheira, e escoamento superficial.

CONCENTRAÇÕES

A bióloga Ângela Cruz Guirao, autora da tese, no laboratório, em trabalho de campo e amostras recolhidas por ela durante a pesquisa: levantamento minucioso

As concentrações de fósforo e nitrogênio foram medidas em quilo por hectare ao ano (kg.ha-¹ano-¹) na floresta. A maior transferência de nitrogênio na mata ocorreu, durante o experimento, via nutrientes da serrapilheira (entre 192 e 194 kg.ha-1ano-1); seguida pela deposição atmosférica seca da cobertura das árvores (entre 44 e 47) e, por fim, pela transferência via chuva que atravessa a serrapilheira (26,3 e 26,6). O fósforo teve a maior transferência na floresta pela chuva que atravessa a serrapilheira (entre 12,7 e 14,1); seguido pela deposição atmosférica seca da cobertura vegetal (10,8 e 10,9) e pela transferência via nutrientes da serrapilheira (8,7 e 8,8). Foto: Antonio Scarpinetti

Publicações GUIRAO, A. C. ; TEIXEIRA FILHO, J. . Preservação de um fragmento de florestal urbano - Estudo de Caso: A ARIE Mata de Santa Genebra, Campinas-SP. GEOUSP: espaço e tempo, v. 29, p. 147-158, 2011. GUIRAO, A. C. ; TEIXEIRA FILHO, J. . A utilização do SIG na caracterização fisiográfica de duas bacias hidrográficas de floresta urbana, Campinas-SP/ Brasil. In: XIII Conferencia Iberoamericana en Sistemas de Información Geográfica, 2011, Toluca. GUIRAO, A. C. ; TEIXEIRA FILHO, J. . Alternativas de uso e manejo das terras no entorno de duas bacias hídricas de floresta urbana. In: XIV Simpósio Brasileiro de Geografia Física Aplicada, 2011, Dourados. XIV Simpósio Brasileiro de Geografia Física Aplicada, 2011. GUIRAO, A. C. ; TEIXEIRA FILHO, J. . Concentração de fósforo total em duas bacias hidrográficas de floresta urbana,

Campinas SP. In: XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos, 2011, Maceió. Anais do XIX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos,, 2011. GUIRAO, A. C. ; TEIXEIRA FILHO, J. . Interceptação das chuvas em uma floresta urbana: A ARIE Mata de Santa Genebra, Campinas (SP). In: XX Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos, 2013, Bento Gonçalves- RS. XX SIMPÓSIO BRASILEIRO DE RECURSOS HÍDRICOS 2013/ ISSN, 2013.

Tese: “Processos hidrológicos e biogeoquímicos em bacias hidrográficas de floresta estacional semidecidual” Autora: Ângela Cruz Guirao Orientador: José Teixeira Filho Unidade: Instituto de Geociências (IG)

O professor José Teixeira Filho, orientador do estudo: “A pesquisa se destaca porque o seu método não mede apenas valores médios”


10

Campinas, 15 a 21 de junho de 2015

Painel da semana  Fármacos anticâncer - A Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da Unicamp e a Rede Iberoamericana de Investigação em Câncer (Ribecâncer) promovem, de 15 a 18 de junho, no Anfiteatro do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL), o III Workshop Internacional “Descoberta e desenvolvimento de fármacos anticâncer - Do produto natural até a clínica”, sob a direção e a coordenação dos professores Arturo San Feliciano (USAL, Salamanca, Espanha), João Ernesto de Carvalho (FCF-CPQBA/Unicamp) e Valdir Cequinel Filho (Univali-SC). Inscrições para participação no evento devem ser feitas no link http://www.funcamp.unicamp.br/eventos/DescobertaDesenvolvimentoFarmacosAntiCancer/index.asp. A configuração do workshop inclui uma oficina de prática de informática, com três sessões de trabalho individual e coletivo em rede e uma sessão de avaliação do evento. As palestras serão em português ou espanhol, acompanhadas de apresentações em espanhol, português e inglês. Mais detalhes pelo telefone 19-3521-7067.  Economia solidária - A Coordenadoria de Assuntos Comunitários (CAC), órgão da Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários (PREAC), organiza no dia 16 de junho, das 9 às 17 horas, mais uma edição da Feira de Economia Solidária. A Feira será realizada na rua dos Flamboyants, localizada entre o Restaurante Administrativo (RA) e o prédio da Engenharia Básica. No local, além da comercialização de comidas típicas, bebidas e produtos orgânicos/ artesanais, ocorrem atividades musicais e roda de capoeira. A Feira pertence à Rede de Economia Solidária de Campinas, associação que está sob a responsabilidade da Secretaria de Trabalho e Renda da Prefeitura do município. Seu objetivo é promover a inclusão de pessoas que produzam algum tipo de produto artesanal com vistas à sua comercialização a preço justo. A Feira é aberta ao público em geral. Outros detalhes podem ser obtidos pelo telefone 19-35212936 ou e-mail cac@reitoria.unicamp.br.  Concertos da Sinfônica - O músico Rafael Piccolotto, indicado ao Grammy Latino em 2013 e um dos mais festejados artistas da nova geração, conduz os próximos concertos da Orquestra Sinfônica da Unicamp (OSU), que irá proporcionar um encontro sofisticado e inventivo do erudito com o popular. As apresentações acontecem em Campinas, nos dias 17 (quarta-feira), às 20h, no Teatro Castro Mendes, e 18 (quinta), às 19h, no Espaço Cultural Casa do

Lago. Além dos naipes da Sinfônica, Piccolotto estará acompanhado de uma banda formada por Marcelo Coelho (sax), Eloá Gonçalvez (piano), Daniel Ribeiro (baixo), Leandro Barsalini (bateria). No repertório, composições do regente e arranjos especialmente criados por Piccolotto para a formação orquestral de peças de Chick Corea, Joaquim Rodrigo, Milton Nascimento e Tom Jobim.  Extensão comunitária - A Coordenadoria de Assuntos Comunitários (CAC) realiza no dia 17 de junho, às 9 horas, o 1º Seminário de Projetos de Extensão Comunitária (PEC), no auditório da Biblioteca Central Cesar Lattes (BCCL). O Seminário divulgará as ações de extensão realizadas pela Unicamp com o apoio prestado pela Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários (PREAC), por intermédio do Edital PEC realizado anualmente. Mais detalhes pelo telefone 19-3521-2936 ou e-mail dalete@unicamp.br  Teatro no CIS-Guanabara - De 18 a 21 e também no dia 26 de junho, o Centro Cultural de Inclusão e Integração Social (CISGuanabara) recebe a Boa Companhia de Campinas para apresentação do espetáculo teatral Portela, patrão; Mário, motorista. O projeto foi contemplado pelo Edital do Fundo de Investimentos Culturais de Campinas (FICC) 2014. A criação, direção e atuação é de Daves Otani e Eduardo Osorio. Co-direção: Verônica Fabrini. Apresentações: quinta a sábado, às 20 horas; no domingo, às 19 horas, e no dia 26, às 19h30. Indicação: 14 anos. Tempo de espetáculo: 70 minutos. O CIS-Guanabara fica à rua Mário Siqueira 829, no bairro do Botafogo, em Campinas-SP. Mais informações pelo e-mail guanabara@reitoria.unicamp.br  Internacionalização da Graduação - A Agência para a Formação Profissional da Unicamp (AFPU) e a Vice-Reitoria Executiva de Relações Internacionais (VRERI) organizam nos dias 20, 24 e 26 de junho, das 13h45 às 16h45, na Sala PDG da AFPU, o 1º Encontro de Internacionalização da Graduação. O evento tem como público-alvo Secretários e Assistentes Técnicos (ATs) de Graduação ou profissionais indicados pelo Coordenador de Graduação de cada unidade. O evento objetiva facilitar a internacionalização das unidades de ensino e pesquisa da Unicamp por meio da revisão dos procedimentos de apoio às suas relações internacionais. Os encontros combinarão apresentações individuais com trabalhos em grupo. Neles, cada participante será convidado a compartilhar seus saberes sobre a internacionalização de sua unidade e a construir consensos em torno de desafios e propostas de melhoria dos procedimentos atualmente adotados. Mais detalhes podem ser obtidos pelo e-mail afpu@reitoria.unicamp.br

Eventos futuros  Demografia histórica - O Núcleo de Estudos de População “Elza Berquó” (Nepo) e a Rede Demografia Histórica e História da População da Associação Latinoamericana de População (APAP) realizam, de 22 a 23 de junho, o I Seminário de Demografia Histórica e História da População na América Latina. A abertura do evento ocorre às 9h30, no auditório do Nepo. Alunos de graduação e de pós-graduação podem enviar trabalhos, em forma de pôsteres, até 12 de junho para o e-mail maisa@nepo.unicamp.br  Palestras com Peter Barlow - O Instituto de Biologia (IB) da Unicamp recebe, para palestras, o professor Peter Barlow, da Universidade de Bristol. O primeiro encontro ocorre no dia 23 de junho, às 14 horas, na sala IB11, no prédio da Pós-graduação. Na ocasião, Barlow abordará o tema “The origins of the quiescent centre concept”. O docente, que estudou botânica na Universidade St Andrews, volta a proferir palestra no dia 25 de junho, às 14 horas, no auditório PA-3 da Faculdade de Tecnologia (FT) da Unicamp, em Limeira-SP. Junto ao professor Cristiano Gallep, ele falará sobre as oportunidades de colaboração e intercâmbio de docentes e discentes, com possibilidades de suporte britânico e nacional com a Universidade de Bristol.

Destaque

 Biossegurança e cultura de segurança - A próxima edição do Fórum Permanente de Vida e Saúde acontece no dia 24 de junho, às 9 horas, no Centro de Convenções da Unicamp. O evento, que está sob a responsabilidade dos professores Antonio Gonçalves Filho e Marcelo Lancellotti, será transmitido ao vivo pela TV Unicamp. Biossegurança e cultura de segurança: o binômio fundamental na promoção do aprendizado institucional é o tema central do evento. Programação e outras informações no link http://www. foruns.unicamp.br/foruns/projetocotuca/forum/htmls_descricoes_ eventos/saude79.html, telefone 19-3521-4759 ou e-mail sonia.mazzariol@reitoria.unicamp.br  Gestão da água - Pesquisadores discutirão o tema em mesaredonda programada para o dia 24 de junho, às 16 horas, no Anfiteatro UL01 da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) da Unicamp. O encontro faz parte do Quartas Interdisciplinares (QIs), evento que está sob a coordenação dos professores Eduardo Marandola Jr. e Álvaro D’Antona. A promoção é do Centro de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas (CHS). O Quartas Interdisciplinares reúne docentes e pesquisadores (da própria FCA e convidados) para debater temas que permitem o exercício da interdisciplinaridade. Mais informações pelo e-mail chs@fca.unicamp.br ou telefone (19) 3701-6674.  Artigos para a Studium - A revista eletrônica Studium, publicação virtual do Instituto de Artes (IA), já está recebendo artigos e imagens para a sua edição de número 37. O próximo exemplar da revista abordará coleções de fotografias brasileiras com foco em fotografias modernas e contemporâneas. Os trabalhos devem ser enviados até 30 de junho para o e-mail studium37@gmail.com.  Metalogenia - O Instituto de Geociências (IG) sediará, entre 1 e 9 de julho, o Curso Latino-americano de Metalogenia com o tema “Hydrothermal systems: a voyage from the source to the ore”. O curso é aberto para estudantes, acadêmicos e profissionais envolvidos com metalogenia, exploração mineral e mineração. Realizado anualmente desde 1982 em países da América Latina, seu objetivo é difundir os principais avanços científicos na área de Geologia Econômica. Na Unicamp, o curso está sob a responsabilidade do professor Roberto Xavier (IG). Inscrições e outras informações no site http://cms.unige.ch/sciences/terre/research/Groups/mineral_resources/latinometal/campinas15/campinas15.html  Ciência & Arte no Inverno - A Pró-Reitoria de Pesquisa (PRP) da Unicamp, em parceria com a Secretaria de Educação da Prefeitura Municipal de Campinas, lançará no mês de julho, o Programa-piloto Ciência & Arte no Inverno. O evento, marcado para acontecer de 7 a 21, deve trazer ao campus universitário, 90 estudantes do Ensino Fundamental da Rede Municipal. A abertura do Ciência & Arte no Inverno acontece às 9 horas, no auditório da Legolândia, na Faculdade de Ciências Médicas (FCM). Na Universidade, os alunos desenvolverão oficinas de pesquisa, em diversas unidades, sob a orientação de docentes. O objetivo do Ciência & Arte no Inverno é possibilitar o contato dos alunos com a vida acadêmica e com os profissionais que compõem o ambiente universitário, bem como estimular a vocação para a pesquisa científica e artística, envolvendo-os com os atuais desafios da Ciência e da Arte. O Programa é apoiado pelo Fundo de Apoio ao Ensino, à Pesquisa e Extensão (Faepex). Mais detalhes podem ser obtidos pelo e-mail ciencianoinverno@reitoria.unicamp.br ou telefone 19-3521-4614.

Teses da semana  Artes - “Alma : O estilo pianístico de Egberto Gismonti” (mestrado). Candidato: Vinicius Bastos Gomes. Orientador: professor Paulo José de Siqueira Tiné. Dia 19 de junho de 2015, às 14 horas, na sala 24 do Departamento de Música do IA.  Economia - “A baixa classe média no Brasil sob a ótica social e ocupacional” (doutorado). Candidato: Daniel de Mattos Höfling. Orientador: professor Waldir José de Quadros. Dia 19 de junho de 2015, às 14 horas, na sala 23 do pavilhão da Pós-graduação do IE.

 Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo - “Aplicação do custeio-meta no processo de projeto em habitação de interesse social” (mestrado). Candidata: Alessandra Akemi Yokota. Orientador: professor Ariovaldo Denis Granja. Dia 19 de junho de 2015, às 14 horas, na sala CA22 da FEC.  Engenharia Elétrica e de Computação - “Projeto e fabricação de um sistema sensor de espectroscopia de impedância eletroquímica” (mestrado). Candidato: Erasmo Jose Dias Chiappetta Filho. Orientador: professor Fabiano Fruett. Dia 18 de junho de 2015, às 9 horas, na FEEC.  Engenharia Química - “Avaliação de nova resina contendo nanopartículas para aplicação na isolação elétrica de barras estatóricas” (mestrado). Candidato: Rafael Novaes da Conceição. Orientador: professor João sinézio de Carvalho Campos. Dia 17 de junho de 2015, às 9 horas, na sala de defesa de teses do bloco D da FEQ. “Fibras naturais como matéria-prima para a produção de carvão ativado” (doutorado). Candidata: Carla Fabiana Scatolim Rombaldo. Orientador: professor Antonio Carlos Luz Lisbôa. Dia 17 de junho de 2015, às 14 horas, na sala de defesa de teses do bloco D da FEQ.  Geociências - “A rosa do deserto: hidropoéticas do lugar no habitar contemporâneo” (mestrado). Candidata: Diana Alexandra Bernal Arias. Orientador: professor Eduardo José Marandola Junior. Dia 16 de junho de 2015, às 14 horas, no auditório do IG.  Linguagem - “O uso da ferramenta Scratch na escola pública: multiletramentos, autoria e remizagem” (mestrado). Candidata: Lidiany Teotonio Ricarte. Orientador: professor Petrilson Alan Pinheiro da Silva. Dia 15 de junho de 2015, às 9h30, na sala de defesa de teses do IEL. “O sobrevivente insalvável: tempo e imagem na poesia de Weydson Barros Leal” (mestrado). Candidata: Danielle Marinho. Orientador: professor Eduardo Sterzi de Carvalho Júnior. Dia 15 de junho de 2015, às 14 horas, na sala de videoconferência do Centro Cultural do IEL. “Os heróis gregos e anglo-saxões ou as transformações de um paradigma” (mestrado). Candidato: Fábio Waki. Orientador: professor Flávio Ribeiro de Oliveira. Dia 16 de junho de 2015, às 14 horas, na sala de defesa de teses do IEL. “Reflexões sobre o desamparo: a questão do pai na religião e na psicanálise” (mestrado). Candidata: Esther Melo Shiga. Orientadora: professora Maria Rita Salzano Moraes. Dia 18 de junho de 2015, às 10 horas, na sala de defesa de teses do IEL. “Usos da lousa digital interativa no ensino de língua inglesa como língua adicional: um estudo de caso” (mestrado). Candidata: Gabriela Claudino Grande. Orientadora: professora Inês Signorini. Dia 19 de junho de 2015, às 14 horas, na sala de defesa de teses do IEL.  Matemática, Estatística e Computação Científica - “Números complexos: aplicações” (mestrado profissional). Candidato: Raul Cintra de Negreiros Ribeiro. Orientador: professor Edmundo Capelas de Oliveira. Dia 16 de junho de 2015, às 10 horas, na sala 253 do Imecc. “Brahmagupta e quadriláteros cíclicos no Ensino Médio” (mestrado profissional). Candidata: Gabriela Vicentini de Oliveira. Orientador: professor Edmundo Capelas de Oliveira. Dia 16 de junho de 2015, às 14 horas, na sala 253 do Imecc. “Aproximação de funções por interpolação: método de Lagrange” (mestrado profissional). Candidato: Antonio Marcos Gabetta Junior. Orientadora: professora Claudina Izepe Rodrigues. Dia 19 de junho de 2015, às 15 horas, na sala 253 do Imecc.  Odontologia - “A influência da soldagem (laser ou tig) em estruturas de titânio sobre o desajuste marginal (bi e tridimensional), força de destorque em parafusos protéticos, fadiga mecânica, corrosão e tensão induzida aos pilares protéticos de próteses implantossuportadas” (doutorado). Candidata: Sabrina Alessandra Rodrigues. Orientador: professor Marcelo Ferraz Mesquita. Dia 19 de junho de 2015, às 13h30 na sala da congregação da FOP.  Química - “Estudos físico-químicos de compostos orgânicos: interações de longa distância e análise conformacional de compostos organofluorados” (doutorado). Candidato: Rodrigo Antonio Cormanich. Orientador: professor Roberto Rittner Neto. Dia 19 de junho de 2015, às 9 horas, na sala IQ14 do IQ.

do Portal

Claudia Bauzer recebe título de Honoris Causa da Université Paris Dauphine Université Paris Dauphine, da França, concedeu o título de Doutor Honoris Causa a Claudia Bauzer Medeiros, professora do Instituto de Computação da Unicamp e coordenadora adjunta de Programas Especiais da Fapesp. A cerimônia ocorreu no dia 4 de junho, no campus da instituição, em Paris. Na ocasião, a universidade francesa também concedeu o mesmo título a David Cooper, professor da Escola de Negócios da University of Alberta, do Canadá, e da University of Strathclyde, da Escócia; Peter Bradbury Miller, professor da London School of Economics & Political Sciences, da Inglaterra; e Christos Papadimitriou, professor do Departamento de Ciência da Computação da University of California em Berkeley, dos Estados Unidos. Medeiros foi a segunda mulher a receber o título da universidade francesa. Membro da coordenação de área de Ciência e Engenharia da Computação da Fapesp, Medeiros colabora desde 1992, como pesquisadora convidada, com o Laboratório de Análise e Modelagem de Sistemas para Apoio a Tomadas de Decisão (Lamsade, na sigla em francês), mantido pela universidade francesa e pelo Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS) – a maior agência de fomento à pesquisa da França. O laboratório é conhecido mundialmente por ter criado uma abordagem original em análise de multicritérios para apoiar tomadas de decisões. As pesquisas conduzidas no Lamsade aplicam-se a diversas áreas e problemas, como os relacionados a transporte urbano, energia nuclear, redes de telecomunicações e sistemas de informação geográfica. Além disso, no laboratório também é realizado um importante trabalho em computação teórica, explicou Medeiros. “Tive a oportunidade de trabalhar com pesquisadores do Lamsade em vários projetos, incluindo um sobre monitoramento de tráfego em Lyon, em que um dos principais desafios era como coordenar o fluxo de automóveis nessa cidade por meio dos sensores de tráfego”, disse Medeiros, à Agência Fapesp.

Foto: Antoninho Perri

A professora Claudia Bauzer Medeiros, do Instituto de Computação da Unicamp

“Tem sido uma cooperação efetiva e recíproca em que não só enviamos professores e estudantes de pós-graduação ao Lamsade, como também têm vindo pesquisadores do laboratório ao Brasil para participar dos nossos projetos”, afirmou. Medeiros graduou-se em engenharia elétrica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), tendo concluído mestrado na mesma instituição e doutorado em ciência da computação na Universidade de Waterloo, no Canadá. Realizou estágio de pós-doutoramento no Instituto Nacional de Pesquisa em Informática e Automação (Inria), na França. Foi três vezes ganhadora do Prêmio Zeferino Vaz de Excelência Acadêmica da Unicamp e recebeu o Prêmio Newton Faller da Sociedade Brasileira de Computação, além do Change Agent Award do Anita Borg Institute for Women and Technology/ACM e o Prêmio de Reconhecimento Docente da Unicamp. É Doutor Honoris Causa pela Universidade Antenor Orrego, de Trujillo, no Peru, e recebeu a comenda da Ordem Nacional do Mérito Científico. Em 2012, tornou-se Distinguished Speaker da Associação Americana de Computação (ACM). Sua pesquisa está centrada no gerenciamento e análise de dados científicos, tratando dos desafios da gestão de dados heterogêneos e distribuídos em várias escalas no espaço e no tempo, incluindo desde imagens de satélites até redes de sensores. Foi presidente da Sociedade Brasileira de Computação (SBC) de 2004 a 2007. Há 20 anos coordena grandes projetos multidisciplinares e multi-institucionais, nas áreas de biodiversidade, gestão agrícola e meio ambiente em parceria com universidades brasileiras, francesas e alemãs. Em 1994, Medeiros criou o Laboratório de Sistemas de Informação da Unicamp – um dos primeiros laboratórios de pesquisa no Brasil dedicado à resolução de problemas científicos multidisciplinares. (Elton Alisson/Agência Fapesp)


11

Campinas, 15 a 21 de junho de 2015

Óleos essenciais em ração de suínos CAROLINA OCTAVIANO Especial para o JU

esquisadores do Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas (CPQBA) da Unicamp desenvolveram uma micropartícula que compreende uma composição de capim-limão e palmarosa, que pode ser empregada para o controle de doenças causadas por entobactérias, servindo como um aditivo à ração de suínos, em substituição aos antimicrobianos sintéticos utilizados como promotores do crescimento animal. De acordo com Marta Cristina Teixeira Duarte, coordenadora da pesquisa e desenvolvimento da micropartícula de óleos essenciais, o grande diferencial da nova tecnologia é a obtenção natural do produto, a partir de plantas que contêm uma composição capaz de agir em diferentes alvos na célula microbiana e não apenas em um específico, como é a ação dos antibióticos empregados atualmente. Outra vantagem dessa solução tecnológica desenvolvida na Unicamp é o fato de o produto ser biodegradável. Para obtê-los, não é necessário o uso de solventes orgânicos, e os princípios ativos são de plantas facilmente cultiváveis – sem haver a necessidade de extrativismo. Estes fatores fazem com que a professora considere a tecnologia verde e sustentável. “A nova tecnologia é um antimicrobiano para aplicação via ração que promove o controle de doenças entéricas e melhora a saúde intestinal dos animais, fazendo com que eles absorvam melhor os nutrientes da ração”, afirma Milenni Garcia Michels, coordenadora de Propriedade Intelectual da Ourofino Saúde Animal, empresa co-titular e licenciada que participou, por meio de parceria, do desenvolvimento da micropartícula. Os testes contaram ainda com o auxílio dos pesquisadores Glyn Mara Figueira, Mary Ann Foglio, Ana Lúcia Tasca Gois Ruiz, Rodney Alexandre Rodrigues, João

Foto: Thomaz Marostegan/Divulgação

CPQBA desenvolve micropartícula que tem palmarosa e capim-limão em sua composição Ernesto de Carvalho e Benício Pereira, todos do CPQBA. A pesquisa foi apoiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), no âmbito do programa PITE/Fapesp. A tecnologia já foi testada na alimentação de suínos e demonstrou resultados positivos e satisfatórios. “Ensaios in vivo mostraram que quando óleos essenciais microencapsulados foram adicionados em baixas concentrações à dieta de leitões recém-desmamados, estes apresentaram desempenho superior ao dos animais tratados com antibióticos controles”, explica a professora Marta. Milenni conta que a micropartícula foi aprovada em testes prévios e que há interesse da indústria em registrar o produto no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, e comercializá-lo. “Entretanto não há previsão de chegada ao mercado, pois ainda são necessários outros testes e a etapa de registro no MAPA”, revela a coordenadora da PI da Ourofino. Na opinião de Milenni, a nova tecnologia é um importante salto tecnológico no segmento de suínos, podendo ser aplicada também à criação de aves. “Os ativos de fonte natural estão de acordo com a tendência mundial, de novos aditivos alimentares”, avalia. Por se tratar de uma tecnologia desenvolvida em conjunto, a Ourofino é co-titular da patente depositada em 2012 no Brasil e em 2013 no exterior. Assim, possui

Marta Cristina Teixeira Duarte, coordenadora da pesquisa: “Espero que esta tecnologia seja um incentivo para que pesquisadores e alunos continuem na busca pela substituição de outros produtos sintéticos por produtos naturais”

exclusividade na exploração comercial da micropartícula de cuja composição compreende óleos essenciais e agentes. “Os benefícios da parceria foram vários, dentre eles a interação com um importante grupo de pesquisa e a possibilidade de ter um produto inovador no nosso portfólio”, comenta Milenni. A professora aponta também para a importância do relacionamento entre universidade e empresas, buscando o desenvolvimento de tecnologias inovadoras. “Trata-se do desenvolvimento de uma tecnologia nacional, o que demonstra que a interação universidade-empresa é imprescindível para gerar, em curto prazo, novos produtos e tecnologias. Espero que esta tecnologia seja um incentivo para que pesquisadores e alunos continuem na busca pela substituição de outros produtos sintéticos por produtos naturais”, aponta Marta.

A coordenadora de PI da Ourofino reitera que a Agência de Inovação Inova Unicamp teve um papel decisivo na tramitação da parceria e do licenciamento, desde os primeiros passos até o alinhamento de entendimentos sobre a relação entre universidade e empresa para aprovação do contrato de licenciamento. “A Agência tem modelos bem estruturados e consegue mediar as necessidades que envolvem essa relação”. Já a coordenadora das pesquisas defende que o apoio da Inova foi essencial tanto na etapa de negociação do licenciamento com a empresa, como na fase de realização da busca de anterioridade, análise de patenteabilidade, redação de patente e proteção da tecnologia. “Isso só foi possível em curto prazo por podermos contar com profissionais especializados e atualizados em relação às leis de propriedade intelectual”, conclui a professora do CPQBA.

Treino combinado atenua obesidade

Doze semanas de treinamento, sem intervenção nutricional, ajudaram a reduzir a gordura corporal ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br

combinação de treinamento com pesos e treinamento aeróbio, conhecido como treinamento combinado ou treinamento concorrente (TC), pode ser uma boa alternativa para adolescentes com excesso de peso. Foi o que apontou estudo de doutorado de Wendell Arthur Lopes defendido na Faculdade de Educação Física (FEF). Doze semanas de treinamento, sem intervenção nutricional, ajudaram a reduzir a gordura corporal, aumentar a massa livre de gordura e melhorar a resistência à insulina e o estado inflamatório crônico de baixo grau. O trabalho, orientado pela docente da FEF Cláudia Regina Cavaglieri, foi feito com um público feminino: 48 adolescentes que estudavam no Colégio da Polícia Militar (CPM), uma escola pública de Curitiba, Paraná. A iniciativa envolveu parceria entre a FEF da Unicamp e o Departamento de Educação Física da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Segundo o pesquisador, a inclusão do treinamento de força no treinamento aeróbio tradicional é uma estratégia interessante para adolescentes obesas, pois nota-se que elas têm aumentado as adesões a esse tipo de programa.

Publicação Tese: “Treinamento combinado em adolescentes com excesso de peso: sobre a composição corporal, resistência à insulina e inflamação sistêmica” Autor: Wendell Arthur Lopes Orientadora: Cláudia Regina Cavaglieri Unidade: Faculdade de Educação Física (FEF)

Wendell enfatiza que na pesquisa os ganhos pareceram superiores ao treinamento isolado. “Observamos que acabou motivando mais a população obesa, visto que reduz a monotonia do treinamento aeróbio separadamente, e permite a valorização da força muscular, componente da aptidão física que se mostra preservado nessa população.” As adolescentes avaliadas foram divididas em três grupos de acordo com o estado nutricional e com participação na intervenção. O TC consistiu em treinamento de força (com três séries de seis a dez repetições máximas) seguido de treinamento aeróbio (30 minutos de caminhada e corrida), totalizando 60 minutos por dia, três vezes por semana. A ingestão alimentar foi avaliada por meio de recordatório nutricional de 24 horas, e todas essas adolescentes foram orientadas a manter a dieta habitual. As avaliações efetuadas foram clínica e exame físico; coleta de sangue, avaliação antropométrica e ultrassonografia abdominal; avaliação ergoespirométrica; avaliação da composição corporal; e avaliação da força muscular e nutricional.

DOENÇAS Wendell Lopes relata que, na infância e na adolescência, a obesidade já é considerada fator de risco para várias doenças e já pode predizer um quadro mais grave em idades mais avançadas”, lamenta o autor. Ele comenta que particularmente o excesso de gordura pode levar a um estado inflamatório caracterizado pelo aumento dos níveis séricos de substâncias pró-inflamatórias. São os casos da interleucina-6, fator de necrose tumoral-alfa, proteína C reativa e redução de substâncias anti-inflamatórias, como adiponectina, que estão associadas ao desenvolvimento de diabetes do tipo II, doenças cardiovasculares e aterosclerose.

Foto: Divulgação

Wendell Arthur Lopes, autor da tese: adolescentes foram divididas em três grupos de acordo com o estado nutricional e com participação na intervenção

Logo, os exercícios aeróbios, explica ele, são valiosos. E devem ser prescritos para diferentes populações e objetivos – também a inclusão do treinamento com pesos para indivíduos com excesso de peso (ou com vistas ao emagrecimento). Ele contribui para o ganho de outros componentes que favorecem a saúde, como a massa livre de gordura; potencializa a redução de gordura corporal; e melhora outros parâmetros, como a resistência à insulina. Já o uso de dietas restritivas e a cirurgia bariátrica, em geral indicadas para os adultos, são pouco recomendadas para o tratamento da obesidade infanto-juvenil. Desta maneira, revela, o exercício físico certamente vem se impondo como um importante aliado no tratamento da obesidade e da inflamação crônica associada.

EXERCÍCIOS Os indivíduos obesos, por serem mais pesados que seus pares não obesos, demonstram menor capacidade de realizar exercícios físicos que requeiram sustentação do peso corporal, como a caminhada e a corrida. Estas atividades têm a sua intensidade aumentada por causa da sobrecarga corporal, em consequência da diminuição do tempo total de exercício. Tem mais: os obesos apresentam menor aptidão física aeróbia, quando comparados aos não obesos, com menores valores de consumo máximo de oxigênio (VO2 máximo – quando os processos de absorção, transporte e utilização de oxigênio estão no seu limite fisiológico de trabalho), em termos de massa corporal. Normalmente, os exercícios físicos que não exigem a sustentação do peso corporal – como o ciclismo e a natação – são bem-tolerados pelos obesos que conseguem manter uma intensidade menor por um maior período de tempo e aumentar o gasto energético total. De outra via, o treinamento com pesos também tem sido incentivado para indivíduos obesos na infância e na adolescência. Ele não obriga carregar ou movimentar o peso corporal. Além disso, como os adolescentes obesos são mais fortes que seus pares não obesos (em termos absolutos), têm uma maior tolerância a esses exercícios físicos. Apesar do treinamento com pesos não ser caracterizado por um elevado dispêndio calórico, tem resultado efetivo como componente de programas de intervenção para jovens obesos. Foi por isso também que Wendell Lopes abordou em seu doutorado o valor da inclusão do treinamento com pesos associado ao treinamento aeróbio. “Pesquisas que investigam a efetividade de diferentes intervenções para a redução de peso ou da gordura corporal são valiosas para essa população e para que avance o conhecimento sobre o assunto”, acentua o pesquisador.


12

Campinas, 15 a 21 de junho de 2015

PIONEIRISMO E MODERNIDADE EM SURDINA Fotos: Divulgação

PATRÍCIA LAURETTI patricia.lauretti@reitoria.unicamp.br

Bossa Nova foi um movimento de ruptura na música popular brasileira. Mas a genialidade de João Gilberto, Tom Jobim e Vinícius de Moraes é também devedora de uma noção de modernidade que vinha se configurando anos antes. Um exemplo é a música do Trio Surdina, formado por famosos instrumentistas que atuavam na Rádio Nacional do Rio de Janeiro: o violonista Aníbal Augusto Sardinha (Garoto), Romeu Seibel (Chiquinho do Acordeon) e o violinista Rafael Lemos Junior (Fafá Lemos). No início da década de 1950 suas versões de boleros, baiões e “sambas de fossa” já traziam uma sonoridade diferenciada, destacada na tese de doutorado de Rodrigo Aparecido Vicente, aluno do programa de pós-graduação em Música do Instituto de Artes (IA) da Unicamp. O trio foi formado no programa Música em Surdina, que estreou em 1951, apresentado pelo radialista, cantor e compositor Paulo Tapajós. A proposta era completamente diversa dos habituais e estridentes programas de auditório da Rádio Nacional. Repertório intimista, suave, que tentava agradar ao público dos nightclubs da zona sul carioca, gente de classe média que buscava nessas pequenas boates a música da noite, feita, em boa parte, por artistas que migraram dos cassinos que haviam sido fechados em 1946. Embora fosse o mesmo repertório “popular” das canções do período, o trio soube explorar o potencial da música instrumental para criar e recriar inúmeras obras. “É curioso porque eles tocavam de tudo. Desde boleros, baião, samba-canção, foxtrote e obras autorais, sobretudo, choro e samba. O repertório do trio é marcado por músicas muito conhecidas. Há gravações de Noel Rosa, Ary Barroso, artistas consagrados à época. A diferença será o modo como reinterpretam as canções. Eles aproveitam o potencial da música instrumental, não cantada, para constituir o estilo identificado com a música mais moderna”. Assim, de acordo com Rodrigo, o Trio Surdina concebe, de certa forma, outro tipo de música, cuja estética a Bossa Nova adotaria posteriormente. Partitura a partitura, o pesquisador comparou gravações originais com outras versões e a interpretação do trio. “Percebe-se como eles modificam o original, lançando mão de recursos pouco explorados na música de ampla circulação e ainda assim sem descaracterizar a composição”. O samba-canção “Risque”, de Ary Barroso, por exemplo, é considerado de harmonia simples, baseada em apenas três notas (triádica). O trio reelabora a harmonia inserindo novos acordes e uma série de extensões, enriquecendo o acompanhamento da melodia. Mesmo a melodia é transformada. “Como é música instrumental, eles se sentem livres para interpretar a melodia, explorando o potencial crítico da linguagem da música instrumental no sentido de transformar, elaborar formas, padrões, procedimentos novos. Eles vão dar um passo além em relação à base que lhes serviu de referência. Isso no contexto da música de ampla circulação, no campo do entretenimento”. Outra característica fundamental do trio é a interação entre os músicos. Eram grandes instrumentistas e improvisadores que conseguiam aliar espontaneidade e organização, procedimentos da tradição da música popular e da música erudita, sinaliza Rodrigo. As relações com a Bossa Nova se aprofundam, quando um paralelo é feito entre o choro “O relógio da vovó”, de 1953, e o clássico “Desafinado”, de Tom Jobim e Newton Mendonça, de 1958. Há intelectuais e músicos que veem na composição do trio a origem de “Desafinado”. “Coincidência ou não, a melodia inicial desse clássico da Bossa Nova possui praticamente a mesma relação intervalar do motivo presente na segunda parte de “O relógio da vovó”, ou seja, ambas incorporam a dissonância como elemento constituinte da música, apresentando-a não apenas como mero ‘desvio’ ou ‘recurso de tensão’”, explica o pesquisador. Não se trata de um caso de plágio, evidencia Rodrigo. “A semelhança entre as composições indica uma busca comum pela renovação dos modos e técnicas de compor no âmbito da música popular brasileira”, complementa.

O trio lança seus LPs pela gravadora Musidisc, uma das primeiDa esq. para a dir., Chiquinho, Garoto e Fafá Lemos, formação original do Surdina: explorando ras na época a trabalhar exclusio potencial da música instrumental vamente com a recém-lançada e revolucionária tecnologia hi-fi, da qual faziam parte os discos de vinil. A formação se dá num programa que já buscava, de forma quase pioneira, um segmento do mercado, o da chamada “música de boate”, num momento em que começa a se desenvolver a sociedade de consumo. Nesse conjunto de mudanças, o design gráfico e as ilustrações das capas dos LPs também faziam toda diferença. Algumas capas de LPs do Trio Surdina lembram, de acordo com Rodrigo, capas do selo Elenco, que concentrou a maior parte da produção da Bossa Nova no início da década de 1960, e que privilegiavam uma concepção de modernidade alcançada via despojamento, ou seja, com poucas cores e traços econômicos. “Nesse sentido, pode-se dizer que há um esforço, já nos anos 1950, de tentar compatibilizar os elementos visuais e textuais dos LPs com o DESPOJAMENTO conteúdo musical, explorando o novo formato de discos em todas as suas potencialidades. O pesquisador teve bastante dificuldade Dizendo de outro modo, o LP não era apenas para encontrar os discos do trio. Decidiu lium produto, mas também um objeto prenhe mitar a tese à análise dos quatro primeiros de sentidos, que trazia consigo um projeto LPs que pertencem à primeira formação, com estético-ideológico específico”, reflete. Garoto, Chiquinho e Fafá Lemos. As faixas dos vinis foram disponibilizadas em um bloRodrigo lembra ainda que o Brasil vivia gue de um pesquisador e também biógrafo um “impulso modernizador”, com o desendo violonista Garoto, chamado Jorge Mello. volvimento da indústria e da economia. A Para ouvir o trio em uma execução ao vivo na gravadora Sinter, subsidiária da norte-ameriRádio Nacional, Rodrigo foi até o Museu da cana Capitol, comercializava discos de jazz, Imagem e Som do Rio de Janeiro. Encontrou que começavam a chegar ao país e influenciauma gravação de “Noite de Estrelas”, progravam a geração de músicos. Garoto, Chiquima de Paulo Gracindo, apresentado em 1952. nho e Fafá Lemos faziam parte de um círculo “Eles tocam um baião que também foi grade artistas que giravam em torno do maestro vado em disco, e o que eles tocam ao vivo é Radamés Gnattali, consagrado como um dos completamente diferente. Você nota que eles renovadores da linguagem orquestral da múestavam improvisando em diversos aspectos, sica popular brasileira. O violonista Garoto, embora pareça uma performance previamenprincipalmente, é uma referência para gerate organizada e ensaiada”. ções de músicos, inclusive para Rodrigo, que é também violonista. Quando o Trio Surdina surgiu, o rádio alcançava grande audiência. As cantoras EmiliO pesquisador ainda se lembra de quando nha Borba, Marlene, Nora Ney e Elizete Carouviu falar, pela primeira vez, do Trio Surdoso despontavam como estrelas. Versões de dina. Foi em uma aula do professor de piamúsica estrangeira tocavam sem parar. Ainda no, harmonia e história da MPB do curso de assim, afirma o pesquisador, a música da épomúsica da Unicamp, Hilton Jorge Valente, ca ficou esquecida, talvez por puro precono Gogô. “Numa das aulas ele falou do priceito, calcula Rodrigo. “Há diversos estudos meiro LP do trio, em especial de uma canção sobre os programas de auditório, as radionodo Garoto que se chama ‘Duas contas’. Essa velas. Mas em relação à música propriamente composição concentra elementos e procedidita há uma lacuna que agora começa a ser mentos que soavam muito modernos para preenchida por pesquisas”. É que muitos os músicos da época, como a sua harmonia. intelectuais e artistas enxergariam apenas, Muitos ficavam tentando ‘tirar de ouvido’ na Bossa Nova, o início da modernidade na suas progressões de acordes e, no caso de música brasileira, preterindo, ou mesmo desGogô, reproduzi-la ao piano”. qualificando, boa parte da produção situada Anos depois, o estudo de Rodrigo atesta na passagem dos anos 1940 para 1950. que, de fato, a tal modernidade já estava lá Mas não, o trio não estava exatamente à no início da década de 1950. “O estudo dos frente de seu tempo. Apenas se insere em um fonogramas do Trio Surdina revelou que, nas contexto no qual os ventos da modernidade condições materiais e sociais de produção já começavam a soprar. A tese de doutorado existentes no Brasil dos anos 1950, certas também revela que não apenas a roupagem obras foram capazes de concentrar um potendas músicas tinha essa levada mais moderna, cial lúdico e criativo, indicando a possibilidacomo vários outros fatores estabelecem uma de de elaboração de novas experiências estéponte com a geração seguinte. ticas no interior da indústria fonográfica”.

Discos de diferentes momentos do Trio Surdina: além da sonoridade, design gráfico também era inovador

Para o autor da tese, as composições e reinterpretações do trio transcendem em muitos aspectos os limites preconizados pelos padrões e convenções de certos estilos. “Músicos como Garoto, Chiquinho do Acordeon e Fafá Lemos foram alguns dos protagonistas desse processo amplo de transformação das linguagens e estilos ocorrido na história da música popular brasileira”. Foto: Antonio Scarpinetti

Publicação Tese: “Música em surdina: sonoridade e escutas nos anos 1950” Autor: Rodrigo Aparecido Vicente Orientador: José Roberto Zan Unidade: Instituto de Artes (IA)

O músico Rodrigo Aparecido Vicente, autor da pesquisa: “A semelhança entre as composições indica uma busca comum pela renovação dos modos e técnicas de compor”


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.