Jornal da Unicamp - Ed. 514

Page 1

Trabalhadora noturna ganha peso por causa de hormônios Página 3

Cochilos diurnos podem causar queda de idosos Página 8

Jornal daUnicamp www. unicamp. br / ju

Campinas, 21 a 27 de novembro de 2011 - ANO XXV - Nº 514 - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

IMPRESSO ESPECIAL 1.74.18.2252-9-DR/SPI Unicamp

CORREIOS FECHAMENTO AUTORIZADO PODE SER ABERTO PELA ECT

Foto: Antoninho Perri

O livro dos livros A história de duzentos anos do livro no país, da chegada da Família Real aos dias atuais, é resgatada em Impresso no Brasil: dois séculos de livros brasileiros. A obra, organizada pela professora Márcia Abreu, do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da Unicamp, e pelo professor Aníbal Bragança, da Universidade Federal Fluminense (UFF), reúne ensaios de 40 autores. Páginas 6 e 7

Exemplar da Coleção Sérgio Buarque de Holanda, que integra o Acervo de Obras Raras da Biblioteca Central Cesar Lattes: obra foi produzida em 1815 pela Impressão Régia

Gene regula crescimento de planta

Desigualdade e expectativa de vida

Biotecnologia e aromas de frutas

Estudo faz releitura do ‘sambão-joia’

Página 5

Página 9

Página 11

Página 12


2

Campinas, 21 a 27 de novembro de 2011

ARTIGO

por: Edison Lins Foto: Antonio Scarpinetti

Funcionários das estaduais paulistas ingressam no auditório do Memorial da América Latina, em São Paulo, durante a primeira edição do Conpuesp: evento teve 518 apresentações

I

O Conpuesp e a excelência profissional dos funcionários das universidades estaduais paulistas

mpossível não se contagiar e motivar-se ainda mais, ao observar, por dois dias, no amanhecer do campus, como cenário a Praça da Paz, o efervescente movimento da saída da quase dezena de ônibus, partindo da Unicamp, rumo ao Memorial da América Latina, em São Paulo, para participar da primeira edição de um encontro histórico, o Conpuesp (Congresso dos Profissionais das Universidades Estaduais de São Paulo), ocorrido em fins de outubro. Há tempos não se via, na Unicamp, e provavelmente também na USP e na Unesp, tanto entusiasmo, envolvimento e integração para, que se destaque isso, participar de um evento de profissionais. Congresso ao qual aderiram, principalmente, para mostrarem orgulhosos, em pôsteres, as realizações do seu cotidiano profissional. Na participação e no envolvimento ímpar uma atitude afirmativa, de que fazem parte efetivamente do ambiente acadêmico de maior dimensão no cenário brasileiro. Profissionalismo relevante para que as universidades paulistas tenham a reconhecida liderança no cenário acadêmico brasileiro. E o clima participativo foi expressão da vivacidade e do dinamismo de um conjunto específico, parte do quadro de profissionais do serviço público paulista, que tem evidenciado incessante busca de qualificação na prestação de seus serviços em diversos momentos. E o Conpuesp se soma de forma diferenciada ao permanente esforço empreendido no campo da gestão pública paulista. Tendo como palco o Memorial da América Latina, espaço emblemático, localizado em São Paulo, e contando com a participação de centenas de funcionários da Unicamp, USP e Unesp, o evento foi um marco relevante, inédito e histórico e deixa um saldo de dimensões abrangentes e altamente positivas. Constitui-se em um fato da reafirmação profissional que se

pauta e se orienta pelo compromisso e pela qualidade que se concretiza na expressão do conjunto de profissionais das três respeitáveis instituições sustentadas pela sociedade paulista e brasileira. E também o evento é, de certa forma, uma prestação de contas diante do aporte da sociedade e a ela é retribuído com a seriedade e o comprometimento dos funcionários, em sua diversificada composição, habilidades e competências, presentes em todas as áreas das referidas universidades e interagindo com docentes, alunos e com a população que é atendida pelos muitos serviços, que decorrem da aplicabilidade das pesquisas pioneiras e inovadoras que as universidades estaduais desenvolvem, sempre com reconhecida excelência. O evento, grandioso em diversos aspectos qualitativos e quantitativos, foi mostra dessa pujança profissional que dá sustentação e suporte à significativa produção acadêmica, científica e de serviços do mais alto interesse social. Realizações que qualificam nossas instituições e fazem delas motivos de orgulho. A acentuada pujança dos profissionais se materializou em centenas de pôsteres nos quais orgulhosos profissionais dimensionavam a importância do seu próprio trabalho, aquele que realiza no cotidiano das unidades e órgãos que compõem universidades públicas de referência nacional e internacional. O congresso tem como referência direta a inovadora e pioneira experiência do Simtec – Simpósio dos Profissionais da Unicamp. Evento que, desde sua origem e historicamente, tem contado com o apoio da administração maior da Unicamp. Evento ainda inédito enquanto formato e propósito de reunir diversas categorias profissionais, que atuam em um mesmo ambiente, de todos os níveis de escolaridade e diversidade de formação e de histórico profissional, num encontro único, integrador e de

múltiplas representações técnicas e acadêmicas. A primeira edição aconteceu em 1997, gestão do professor José Martins Filho, idealizado pelo então Pró-Reitor de Desenvolvimento Universitário, professor José Tadeu Jorge que, convidado pela organização do encontro, se fez presente no Conpuesp. Ressalte-se que foi na sua gestão como reitor que o evento foi finalmente retomado. Isso nos remete a uma parte específica da programação do Conpuesp, aquela que abriu espaço para compartilhamento de casos de resultados e contribuição com o desenvolvimento profissional e melhoria dos processos. E o caso de referência e sucesso da Unicamp, foi o resgate da construção e das edições do próprio Simtec, cujo resgate histórico e afirmativo dos seus objetivos, foi valorizado na brilhante apresentação de um profissional da Unicamp, o Orlando Furlan, ATU do Instituto de Economia. A USP e a Unesp também apresentaram seus cases, extremamente válidos e representativos da qualidade profissional que se busca, de forma perene, nas universidades estaduais de São Paulo. Replicar de forma conjunta e ampliada com as universidades coirmãs, a experiência que já ocorre na Unicamp, consolidado pelas edições de 2008 e 2010, era um objetivo pautado há tempos e afirmado de forma definitiva no encerramento da terceira edição. Foi decisivo o importante gesto de apoio e incentivo do reitor da Unicamp, professor Fernando Costa, em cuja gestão também ocorreu a terceira edição do Simtec. E ele quando no exercício da presidência do Cruesp – Conselho dos Reitores das Universidades Paulistas – designou uma Comissão organizadora e instalou os trabalhos de planejamento e demais providências que viabilizaram o evento, respeitando as indicações de cada uma das universidades estaduais e formalizando o apoio imprescindível da Unicamp,

através do GGBS – Grupo Gestor de Benefícios Sociais – e da AFPU – Agência de Formação Profissional –, órgãos da administração da Unicamp. Reconhecimento também que aqui se registra ao professor Edgar Salvadori De Decca, coordenador-geral da Unicamp, e como tal presente no evento, além de representar, no ato, o professor Fernando Costa, e pela ação que resultou na concessão de uso do Memorial da América Latina, palco adequado para a realização de um evento de integração profissional desse porte. Papel muito importante teve o professor José Ranali, como chefe de gabinete da Unicamp e secretário-executivo do Cruesp, pelo trabalho estratégico de formatar providências administrativas e articular, com seus pares da USP e da Unesp, recursos financeiros iniciais que garantiram o evento. O grupo de profissionais que organizou o Conpuesp enfrentou, com determinação, os desafios inerentes à organização de um evento inédito. Desafios adicionais, sempre superados de forma corajosa e eficiente, tiveram os representantes da USP e da Unesp, ao lidarem com a organização do evento em pauta, para eles uma primeira experiência de evento geral e multiprofissional. Por isso uma ação conjunta e histórica organizada por representantes das três universidades estaduais paulistas. O Conpuesp, formatado em parâmetros acadêmicos, portanto em sintonia com o ambiente em que os profissionais participantes atuam. Três instituições que respondem por expressiva e qualificada parcela da produção científica brasileira. As avaliações das dimensões positivas do Conpuesp se sustentam em números objetivos: 1.392 inscritos, sendo 184 da Unesp, 627 da Unicamp e 581 da USP. Com relação aos trabalhos submetidos e aceitos, apresentados na forma de pôsteres durante os dois dias do evento, totalizaram 518 apresentações, sendo 76 da Unesp, 184 da USP e 258 da Unicamp. Os traba-

lhos foram assim distribuídos, dentro dos quatro grandes eixos temáticos, sendo este um dos itens de validação do sentido acadêmico do evento: Eixo 1 - Administração e Gestão: 211; Eixo 2 – Ensino, Pesquisa e Extensão: 94; Eixo 3 – Saúde e Qualidade de Vida: 177; e Eixo 4 – Gestão Ambiental e Sustentabilidade: 36. A liderança da Unicamp, com maior número de participantes e de trabalhos comparativamente aos parceiros, resulta certamente da realização das três edições do Simtec, evento interno com ampla adesão por parte dos funcionários e da Universidade. As duas mais recentes edições contaram ainda com crescente participação de profissionais da Unesp e da USP, o que foi determinante para o Conpuesp. A adesão dos pares uspianos e unespianos, entretanto, foi expressiva e significativa. A qualidade dos trabalhos que se expressou nas centenas de pôsteres ficou patente para os participantes e convidados, incluindo docentes e alunos. Se valida, assim, a realização da primeira edição do evento e aponta para a continuidade, indicativo que vem recebendo ampla aprovação através de sondagem avaliativa. Assim, uma nova edição do Conpuesp deverá ocorrer em 2013. Antes, em 2012, ocorrerá a quarta edição do Simtec, na Unicamp. Desta forma, e em sintonia com o ambiente acadêmico, os funcionários reafirmam, de forma superlativa, que estão integrados, com seu trabalho, desenvolvimento técnico, acadêmico e, sobretudo, com seu compromisso institucional, ao esforço das universidades estaduais paulistas na busca e na consolidação da vanguarda com excelência, que a primeira edição do Conpuesp exemplifica. Edison Cardoso Lins, funcionário da Unicamp, integra o grupo organizador do Simtec e foi um dos representantes da Unicamp na Comissão Organizadora do Conpuesp, primeira edição.

UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas Reitor Fernando Ferreira Costa Coordenador-Geral Edgar Salvadori De Decca Pró-reitor de Desenvolvimento Universitário Paulo Eduardo Moreira Rodrigues da Silva Pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários Mohamed Ezz El Din Mostafa Habib Pró-reitor de Pesquisa Ronaldo Aloise Pilli Pró-reitor de Pós-Graduação Euclides de Mesquita Neto Pró-reitor de Graduação Marcelo Knobel Chefe de Gabinete José Ranali

Elaborado pela Assessoria de Imprensa da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Periodicidade semanal. Correspondência e sugestões Cidade Universitária “Zeferino Vaz”, CEP 13081-970, Campinas-SP. Telefones (019) 3521-5108, 3521-5109, 3521-5111. Site http://www.unicamp.br/ju. E-mail leitorju@reitoria.unicamp.br. Twitter http://twitter.com/jornaldaunicamp Coordenador de imprensa Eustáquio Gomes Assessor Chefe Clayton Levy Editor Álvaro Kassab (kassab@reitoria.unicamp.br) Chefia de reportagem Raquel do Carmo Santos (kel@unicamp.br) Reportagem Carmo Gallo Neto Isabel Gardenal, Maria Alice da Cruz e Manuel Alves Filho Editor de fotografia Antoninho Perri Fotos Antoninho Perri e Antonio Scarpinetti Coordenador de Arte Luis Paulo Silva Editor de Arte Joaquim Daldin Miguel Vida Acadêmica Hélio Costa Júnior Atendimento à imprensa Ronei Thezolin, Felipe Barreto e Patrícia Lauretti Serviços técnicos Dulcinéa Bordignon Everaldo Silva Impressão Pigma Gráfica e Editora Ltda: (011) 4223-5911 Publicidade JCPR Publicidade e Propaganda: (019) 3327-0894. Assine o jornal on line: www.unicamp.br/assineju


3

Campinas, 21 a 27 de novembro de 2011 Foto: Antoninho Perri

O endocrinologista Bruno Geloneze durante exame no Gastrocentro: “Raramente se imagina o descompasso de um hormônio que está determinando fome e saciação”

Hormônios fazem mulher que trabalha à noite ganhar peso Estudo revela que a grelina e a xenina atuam de maneira desregulada no hipotálamo ISABEL GARDENAL

U

bel@unicamp.br

m estudo da linha de pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) que avalia hormônios que regulam o apetite, coordenada pelo endocrinologista Bruno Geloneze, apontou responsabilidade da grelina e da xenina, hormônios recém-descobertos, para o ganho de peso das trabalhadoras do turno da noite, indo contra o senso comum de que engordam porque trabalham muito ou por conta do estresse. Esses hormônios atuam de forma desregulada no hipotálamo (parte do cérebro que modula a fome e a saciedade) alterando o padrão de apetite dessas pessoas, que passam a consumir alimentos mais vezes e menos saudáveis. As consequências, além do ganho de peso, é que essas mulheres poderão ficar inclusive mais predispostas a desenvolver a indesejada síndrome metabólica, que promove em seus portadores problemas como hipertensão arterial, dislipidemia, diabetes e obesidade. A fisioterapeuta Daniela Schiavo, autora da pesquisa, comparou mecanismos de fome e saciedade de 12 mulheres que trabalham no turno normal do setor de limpeza do Hospital de Clínicas da Unicamp e 12 mulheres que atuam no turno da noite. Segundo ela, vários trabalhos na literatura indicam que as trabalhadoras do turno da noite têm maior ganho de peso que mulheres que têm a mesma função e trabalham de dia. Isso já está estabelecido mundialmente em grandes casuísticas, diz. O que pouco se sabe são os motivos que levam a esse ganho de peso e os mecanismos determinantes para o comportamento relacionado à fome e à saciedade. O senso comum diz “trabalhar à noite aumenta o estresse e faz as pessoas comerem de maneira errada”. Diz mais: “depois que a obesidade se instala, é difícil as pessoas retomarem o peso original”. “Então também estudamos pessoas que não tinham obesi-

dade ainda. Apesar de a gente ter feito um pareamento para idade, sexo, peso e atividade física, essas mulheres que trabalhavam à noite já apresentavam mais adiposidade abdominal, talvez sim ligado ao estresse da atividade”, expõe Geloneze. No estudo, foi dosado o cortisol, o hormônio do estresse. A despeito da casuística ter sido pequena, segundo ele, foram tomados cuidados essenciais a uma pesquisa científica: só foram escolhidas mulheres, funcionárias do setor de limpeza de um mesmo lugar e que exerciam o mesmo tipo de função e na faixa etária entre 25 e 45 anos (em idade reprodutiva portanto, sem o viés da menopausa). Tinham ainda o mesmo padrão de atividade física. Não eram sedentárias, a se ver pelo seu trabalho (que não é leve), contudo não têm atividades programadas como frequentar uma academia, por impedimentos socioeconômicos e culturais. Além disso, elas tinham o mesmo Índice de Massa Corporal (IMC), em torno de 26,5 (o índice fica entre 25 e 30), com um leve sobrepeso, mas que não é obesidade e nem tampouco um peso normal. Corresponde a um IMC médio da população brasileira, afirma Geloneze. Pessoas trabalhadoras noturnas há mais de um ano, que ainda não tinham um ganho de peso relevante, foram entrevistadas para se conhecer o seu comportamento alimentar: como era a sua sensação de fome e de saciedade. O estudo apurou que elas sentiam dificuldade em reconhecer a fome ou a saciedade. Como é possível saber isso?

Hormônios Quando chega o horário em que a mulher habitualmente come, ela se lembra disso e recebe um insight: ‘você está com fome’. Nesse momento, ela

em geral aponta para o estômago ou sente que ele está ‘sinalizando’ que é hora de comer. É o pico da grelina, produzida ciclicamente pelo estômago com um pico meia hora antes da refeição e uma redução acentuada 30 minutos a uma hora depois. “O pico de grelina desencadeia a hora de comer e, na hora que está com a sensação de saciação, ele fica com um nível mais baixo.” Além da grelina, há a xenina, outro hormônio estomacal. No mesmo momento em que a grelina bate lá em cima (o pico pré-prandial, antes da refeição), a xenina bate lá embaixo. Quando a grelina cai após a refeição, a xenina sobe. Fazem oposição e, assim, mantêm um certo equilíbrio. Junto ao pico pré-prandial da grelina, ocorre um ponto mais baixo ainda, tecnicamente chamado nadir, quando se produzem hormônios opositores à grelina – o GLP1, o PYY3-36 e a oxintomodulina. Eles são formados no intestino e caem um pouco antes da refeição, subindo depois dela. Na verdade, esses hormônios fazem a saciação, aquela sensação de que a fome passou, de plenitude gástrica, que acontece após a refeição. Outro mecanismo, o da saciedade, é aquela sensação que a pessoa tem de não estar com fome entre as refeições, por volta das 10 horas, após o café da manhã, e das 15 horas, após o almoço. Neste momento não há mais a sensação de plenitude, mas ainda a fome não apareceu. É a fisiologia normal desempenhada pelo hormônio leptina que estava igual nos dois grupos de mulheres estudadas”, define o médico.

Testes As mulheres estudadas foram ao Laboratório de Investigação, Metabo-

lismo e Diabetes (Limed), localizado no Gastrocentro, para se submeter a um teste de refeição padrão mundialmente aceito. Este teste consistiu em ingerir uma barra de cereal e um copo de suco. Fizeram uma refeição balanceada com carboidrato, gordura e proteína, totalizando 515 calorias. As mulheres que trabalham no turno normal ficaram uma hora em repouso no Limed esperando a hora de comer, às 8 horas, que coincidiu com o momento em que tomam o café da manhã. O que Daniela Schiavo observou é que elas tiveram um pico de grelina pré-prandial na hora de comer e uma queda da grelina após a refeição. A xenina caiu antes da refeição e subiu após dela. O GLP1, o PYY3-36 e a oxintomodulina não apresentaram queda acentuada, mas subiram após a refeição. O comportamento com as trabalhadoras noturnas foi outro. Em sua rotina, elas tomam o café da manhã mesmo quando não estão trabalhando. “Nós as pegamos num dia de folga, para não terem o efeito do estresse de não ter dormido”, comenta Geloneze. No dia em que trabalham, ao cumprirem o turno, elas também tomam o café da manhã às 8 horas. Logo, elas chegaram ao Limed e comeram como sempre. Agora vem a parte ‘charmosa’, anuncia o especialista. A grelina dessas mulheres antes da refeição sobe um pouco e conseguem desencadear o mecanismo de ‘comer’. Ocorre que, no pós-refeição, a grelina não cai e elas não têm a queda fisiológica da saciação. Os hormônios intestinais GLP1, PYY3-36 e oxintomodulina se comportaram igualmente nas pessoas que trabalham de dia, já a xenina caiu antes da refeição e subiu muito menos após a refeição. Resumindo: a

Estudos envolvem milhares de pessoas No Limed, há três linhas de trabalho em andamento hoje, cujos acrônimos são Brams (Brazilian Metabolic Syndrome Study), Brains (Brazilian Incretin Study) e Baros (que deu origem ao termo bariátrica). O Brams, dividido em dois braços principais, é um grande estudo que está sendo feito com sete mil pacientes para avaliar a relação entre obesidade, distribuição de gordura corporal, citocinas inflamatórias, resistência à insulina e produção de insulina. É uma investigação multicêntrica financiada pelo CNPq e coordenada por Geloneze. Atualmente é conduzida em Campinas, Itu, Fortaleza e Natal. O trabalho, já na metade, conta

com quatro mil pacientes. Outro braço é o Brams Pediátrico, que reunirá 1.000 crianças e adolescentes que serão estudados quanto aos mesmos aspectos que compõem a síndrome metabólica (dislipidemia, hipertensão, diabetes e adiposidade central, produção de citocinas inflamatórias pelo tecido adiposo e resistência à insulina por testes dinâmicos). Os dois formam o primeiro estudo. O segundo chama-se Brains (Brazilian Incretin Study) e estuda os hormônios gastrointestinais que modulam a produção de insulina. É um guarda-chuva da linha de pesquisa que analisa hormônios gastrointestinais. “Estamos estudando

vários modelos. Um deles é esse das trabalhadoras noturnas”, comenta Geloneze. O terceiro estudo, o Baros, analisa os mecanismos fisiológicos e fisiopatológicos da cirurgia bariátrica, e várias técnicas e situações (com diabéticos, não diabéticos, insuficiência renal ou não). A perspectiva é que, com o desenvolvimento de fármacos focados em mecanismos, o tratamento interferirá na grelina suprimindo a produção pós-prandial e, ao mesmo tempo, utilizará algum medicamento para aumentar a xenina pós-refeição. Com isso, recuperaria-se o padrão fisiológico, com repercussões na perda do peso.

regulação de xenina e grelina antes da refeição está parcialmente mantida, mas o efeito de elevar xenina pósrefeição e cair grelina, muito importantes à saciação, estava sobremodo desregulado. Essa pode ser a causa do fenômeno de perda do ritmo biológico e da sensação de fome, saciedade e provavelmente por uma alimentação que passa a ser irregular, contribuindo para um aumento de calorias com o tempo. A pessoa que não tem saciação, come pouco. Daqui a pouco come mais uma vez e come de novo. Dificilmente faz uma refeição com verduras, legumes, arroz, feijão e carne, alimentos de qualidade e de baixa caloria. O pior, conta o endocrinologista, é que as trabalhadoras noturnas são tratadas como as que ganharam peso por outros motivos. Talvez as mulheres não ingiram uma quantidade maior de alimento, todavia qualitativamente têm mais facilidade para fazer alimentação rápida, informa Geloneze. O que vem a se somar a isso é a mudança do ritmo biológico, determinada pelo horário da refeição, que leva a uma mudança dos hormônios do estômago, o qual produz a grelina. Esta foi descoberta em 2001. Acreditava-se que os mecanismos de saciação eram determinados apenas pelos hormônios intestinais GLP1, PYY3-36 e oxintomodulina. Não se conhecia a xenina. À Unicamp coube o mérito do primeiro trabalho científico da literatura comprovando que a grelina após a cirurgia bariátrica em diabéticos não sobe após o emagrecimento. Em pessoas que emagrecem, ela sobe. Isso ajuda a explicar o porquê depois que as pessoas passam por uma cirurgia bariátrica não têm tanta fome, mesmo tendo emagrecido. Qualquer pessoa que faça regime tem mais fome. Este foi um dos trabalhos pioneiros da Unicamp, de 2003. O segundo grupo, da Universidade de Washington, Seatlle, apresentou a cirurgia de forma inédita a pacientes não diabéticos. Posteriormente, um aluno de mestrado que desenvolvia pesquisa no Limed ficou um tempo naquela Universidade. Dessa interação, surgiram trabalhos cooperativos e, no mesmo ano, a Unicamp publicou um trabalho da cirurgia para diabéticos. “No caso das trabalhadoras noturnas, descobrimos a desregulação dos hormônios gastrointestinais, mas especificamente gástricos – do tubo digestivo ao órgão endócrino. Mas estamos dizendo aqui que a parte do tubo digestivo, o estômago endócrino, está desregulado. Raramente se imagina o descompasso de um hormônio que está determinando fome e saciação. Foi o que descrevemos”, declara o médico.


4

Campinas, 21 a 27 de novembro de 2011

Longe da clínica, do motorzinho e da anestesia

Fotos: Antoninho Perri/Divulgação

Tese avalia atendimento odontológico para pessoas desprovidas de serviços básicos de atenção CARMO GALLO NETTO

N

A dentista Cristina Gibilini (abaixo e ao lado, durante tratamento em escola pública), autora da tese: ART alcança resultados mais promissores quando associado a trabalhos educativos e preventivos

carmo@reitoria.unicamp.br

as décadas de 1960 e 1970, todo longa-metragem exibido nos cinemas brasileiros era precedido de um cinejornal. O mais famoso deles, o Canal 100, tinha como grande atração, ao final de cada edição, a apresentação de uma importante partida de futebol recente. Em tomadas antológicas, mostrava as reações de tristeza e alegria dos torcedores que, nas manifestações de júbilo, invariavelmente, exibiam sorrisos desdentados, provocando gargalhadas na plateia. Era o retrato de uma nação que se revelava um país de desdentados. Embora a redução da prevalência e severidade da cárie tenha sido progressiva e significativa, graças à fluoretação da água e ampliação dos procedimentos coletivos pelo SUS, sua maior ocorrência se manifesta ainda em camadas sociais e regiões menos favorecidas economicamente. Para minorar determinados problemas dentários desse público que dificilmente teria acesso ao tratamento dentário convencional, tem sido empregado, em algumas lesões da cárie, o ART (Tratamento Restaurador Atraumático) – Atraumatic Restorative Treatment, em inglês. O atendimento – que se dá em locais onde não é possível o atendimento odontológico padrão por razões como falta de energia elétrica ou de difícil acesso – não utiliza instrumentos rotatórios, nem anestesia. Em uma escola, por exemplo, as crianças podem ser assistidas deitadas sobre uma mesa com a cabeça apoiada em uma almofada para maior conforto. Junto a ela são dispostos os instrumentos, materiais e produtos utilizados nas restaurações, transportados pelo dentista em uma maleta multibox. Como pano de fundo, invariavelmente, uma lousa denuncia o consultório improvisado em sala de aula. Em pesquisa desenvolvida na Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP), orientada pela professora Maria da Luz Rosario de Sousa, a dentista Cristina Gibilini avaliou o potencial deste tipo de tratamento com vistas à sua ampliação no atendimento à população infantil de escolas públicas. Os resultados do estudo mostram que o ART melhora a condição oral e atenua o risco de cárie dessas populações. Em relação ao emprego do ART, constituíram objetivos principais da pesquisa avaliar: a proporção de lesões de cáries, passíveis a este tipo de tratamento, em escolares de 5 a 10 anos de idade; sua efetividade como medida de controle da cárie e sua importância na promoção de saúde pública, bem como a influência de variáveis clínicas independentes e de aspectos sócio-demográficos na longevidade das restaurações. A avaliação prévia a que foram submetidas crianças com idades entre 5 a 10 anos, provenientes de 10 escolas públicas do município de Piracicaba (SP), mostrou que cerca de 37% delas apresentavam lesões de cárie não tratadas e que aproximadamente 40% destas crianças possuíam pelo menos

OMS recomenda serviço O ART foi desenvolvido na década de 1980 diante da necessidade de encontrar um mecanismo que possibilitasse preservar os dentes cariados em indivíduos de todas as idades em países em desenvolvimento e comunidades carentes, centrando-se enfaticamente na redução da contaminação bucal. Desde 1994 vem sendo recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como parte de programas de saúde bucal desenvolvidos nesses países. Em 1998, a técnica recebeu a aprovação da Federação Dentária Internacional (FDI) com ênfase em países em desenvolvimento. Mais recentemente, a OMS passou a promover o ART em programas comunitários com bases educativas e preventivas em vários países.

um dente com indicação para o ART. Compuseram a amostra 173 escolares de ambos o sexos. As restaurações executadas foram avaliadas após 6, 12 e 18 meses, segundo protocolos da literatura. Em relação à possibilidade de incidência de cáries, aproximadamente 50% dos escolares tratados passaram da classificação de alto risco para risco moderado, em decorrência apenas da utilização da técnica. Na avaliação realizada após seis meses da restauração, a pesquisadora constatou sucesso em 82% dos procedimentos, assim consideradas as restaurações que se mantiveram e não apresentaram problemas. O ART revelou-se efetivo em restaurações envolvendo uma ou mais faces do dente após 18 meses e os fatores sócio-demográficos não se mostraram estatisticamente associados às suas manutenções Diante disso, Cristina considera que “a técnica pode ser vista como alternativa para controle de cárie, em larga escala, em diversos ambientes além do escolar”.

Indicações O tratamento de restauração é considerado atraumático porque não causa dor e não exige anestesia. É indicado para lesões de cárie que não apresentam dor, nem abscesso e não chegam à polpa do dente (nervo). Seu emprego restringe-se às cáries circunscritas às duas primeiras camadas do dente, o esmalte e a dentina, mantendo-se preservada a terceira camada, a polpa. O ART consiste basicamente na remoção do tecido cariado amolecido, depositário de grande número de bactérias, com instrumentos manuais (curetas). As camadas mais profundas do tecido dentário, que se situam abaixo da parte amolecida – que seriam removidas na forma de raspas no tratamento convencional – são mantidas e cobertas com o material restaurador, o cimento de ionômero de vidro. Estudos consagrados mostram que

essa porção do dente, que daria origem às raspas, tem capacidade de remineralização quando coberta com materiais e manutenção adequados. Além de mínima intervenção operatória, o processo preserva a estrutura dentária sadia, reduzindo a probabilidade da necessidade de tratamento endodôntico (canais) e de futuras exodontias (extrações), além de não exigir emprego de anestesia local devido à ausência de sintomatologia dolorosa. A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda o ART para situações em que a ausência de consultórios odontológicos impede a utilização dos meios tradicionais. A técnica pode ser indicada para habitantes de áreas rurais ou suburbanas, grupos minoritários e comunidades carentes, além de pacientes em asilos, creches e orfanatos. Em suma, para pessoas que não possuem serviços básicos de atenção dentária e que não tenham acesso ao tratamento convencional. Entre as vantagens da técnica a pesquisadora alinha execução rápida, custo baixo, emprego de instrumentos manuais baratos, de manejos simples e facilmente transportáveis, além da não demanda de eletricidade e de equipamentos muito especializados. Além disso, a remoção apenas do tecido cariado amolecido origina cavidades menores e preserva o tecido dentário sadio. E mais: o fluoreto contido no cimento ionômero de vidro, liberado progressiva e continuamente, pode prevenir o aparecimento de lesões reincidentes, atuando na remineralização do tecido dentário deixado na base da cavidade, que seria removido no tratamento convencional. Esse flúor de reserva pode ser reposto pela aplicação tópica, através da água ou da pasta de dente com fluoreto. Ao limitar o aparecimento da dor, a técnica minimiza o uso de anestesia e a não utilização do motor e do sugador, o que a torna bem aceita por adultos e principalmente crianças. Por tudo isso, afirma

a pesquisadora, “o ART constitui-se em excelente aliado em programas de promoção e educação para a saúde, reduzindo a possibilidade de extrações e contribuindo para a saúde bucal”. São mencionadas como desvantagens do processo: a resistência de profissionais odontológicos que, em geral, consideram a restauração com cimento de ionômero de vidro de caráter provisório, utilizada para a adequação do meio bucal; cansaço manual do dentista no ART; exigência de atenção constante em cada fase da execução; as limitações do material que restringem seu uso a cavidades de tamanho pequeno e médio. A pesquisadora rebate dizendo que os materiais empregados têm sido aperfeiçoados e que a exigência de atenção constante deve acompanhar toda e qualquer técnica odontológica empregada. Diz ainda que, embora o ART tenha sido originalmente indicado para cavidades de uma face, devido às características mecânicas do material, existem estudos que indicam sua utilização para cáries que atingem duas faces do dente. “Conscientes da cobertura que a técnica proporciona e das necessidades principalmente das populações mais carentes, resolvemos, com base em estudos existentes, incluir no tratamento cáries que atingiram mais de uma face do dente”, acrescenta ela.

Constatações Ao se propor ao estudo, a pesquisadora pretendeu prioritariamente observar o potencial de atendimento que o ART pode proporcionar, a melhoria da condição oral das crianças atendidas e a longevidade das restaurações. A avaliação realizada depois de seis meses mostrou sucesso muito grande (82%), o que leva a autora a considerar que o acompanhamento poderia ser realizado a partir dos 12 meses. O estudo mostrou ainda que nenhum dos fatores externos como escolaridade dos pais, tipo de

moradia, renda familiar, entre outros, interfere na longevidade da restauração. O ART alcança resultados mais promissores quando associado a trabalhos educativos e preventivos. Para Cristina, a proposta não é apenas restaurar: “É necessário que existam programas de educação em saúde para que as crianças tenham acesso à informação, e até mesmo à escova e à pasta dental, para que possam melhorar a higienização. O ART constitui um importante suporte no controle da cárie. O acompanhamento deve ser permanente, a exemplo de qualquer pessoa que se submete aos tratamentos convencionais, quando recebe a recomendação de periodicamente voltar ao dentista”. Segundo a pesquisadora, existem poucos estudos que abordam a prevalência de crianças com indicação para o ART, principalmente no atendimento público. O trabalho a levou à conclusão de que esse número é bastante grande e a técnica promissora. Considera essa uma das suas maiores conclusões, por ser tratar de um processo barato, rápido – o tempo médio de cada restauração é de seis minutos –, e de excelente retorno. “A criança é atendida em ambiente que lhe é familiar, em que se sente bem e protegida, o que diminui a ansiedade. O clima coletivo contribui para uma atmosfera colaborativa de envolvimento entre crianças e dentista e de aceitação, fundamental para a propagação e manutenção de ambientes salutares. Além de tudo, a eliminação da locomoção das crianças simplifica sobremaneira a logística!”, conclui.

.............................................................. ■ Publicação

Tese: “Avaliação longitudinal do tratamento restaurador atraumático em estudantes de escolas públicas de Piracicaba” Autora: Cristina Gibilini Orientadora: Maria da Luz Rosario de Sousa Unidade: Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP)

..............................................................


Campinas, 21 a 27 de novembro de 2011

Estudo revela ação de gene para crescimento de planta Trabalho, que rendeu artigo na Plant Phisiology, está relacionado ao melhoramento da cana-de-açúcar

5

Fotos: Antoninho Perri

ISABEL GARDENAL

P

bel@unicamp.br

esquisa recente desenvolvida no Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética (CBMEG) com a planta modelo Arabidopsis thaliana revelou que o AtbZIP63, “um gene que regula outros genes”, tem uma participação relevante no ajuste do crescimento e do desenvolvimento dessa planta, integrando a disponibilidade de energia obtida através da fotossíntese com a de água no solo (estresse hídrico). O trabalho gerou um artigo que acaba de ser publicado na revista norte-americana Plant Phisiology. Resultado do Bioen, projeto temático da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) relacionado com Bioenergia, a investigação está focada no melhoramento da cana-de-açúcar e na compreensão como as plantas conseguem otimizar a conversão de energia através da fotossíntese para ser transformada em biomassa, seja celulose ou açúcar. O que se percebeu foi que esse gene é capaz de combinar duas informações importantes quando se trata de crescimento e desenvolvimento. A primeira das informações é como estão suas reservas de energia na forma de glicose – carboidrato essencial a praticamente todas as formas de vida – e onde está contida a energia química e o carbono para a construção das moléculas da vida. Já a segunda informação é como está a disponibilidade de água no solo, informação codificada na quantidade de um dos hormônios mais importantes para as plantas, o ácido abscissíco (ABA), que sinaliza para todo o organismo se há água suficiente no solo para que ela possa crescer normalmente ou se precisa fazer alguns ajustes. O biólogo Cleverson Carlos Matiolli – autor do trabalho, escrito em colaboração – reporta que o entendimento de como esse processo de ajuste ocorre pode ser fundamental à compreensão de como a planta lida com as variações que ocorrem no ambiente, principalmente em tempos em que as perspectivas de mudanças climáticas podem ocorrer nas próximas décadas devido ao aquecimento global. “Entender como as plantas conseguem lidar com o estresse hídrico e com o uso de energia (obtido na fotossíntese e acumulada na forma de açúcares para crescer e se desenvolver) pode fornecer pistas que poderão ser empregadas futuramente para a manipulação de outras plantas que, diferentemente dessa planta modelo, têm interesse econômico, como por exemplo a cana-de-açúcar ou o eucalipto. Estas plantas, assim como a planta modelo Arabidopsis thaliana, também precisam usar estas informações sobre as reservas de energia e disponibilidade de água para que possam crescer e acumular sacarose e celulose”, contextualiza. No estudo, Matiolli procurou entender como as plantas são capazes de se desenvolver e, junto do seu desenvolvimento normal, adaptar-se às condições variáveis do meio, inclusive com o estresse. A Arabidopsis

Cleverson Carlos Matiolli, um dos autores do trabalho: investigando como as plantas conseguem otimizar a conversão de energia por meio da fotossíntese para ser transformada em biomassa

Estufas com Arabidopsis thaliana: planta é a primeira cujo genoma foi completamente sequenciado

thaliana, recorda ele, é a primeira planta cujo genoma foi completamente sequenciado e que vem sendo usada como organismo modelo para estudo da biologia molecular vegetal nas últimas duas décadas. É uma planta modelo como o camundongo é modelo de estudo de mamíferos e a Escherichia coli é modelo de estudo de microbiologia. Ela foi escolhida há anos devido a algumas características especiais que possui, como um ciclo de vida curto, facilidade de gerar e selecionar mutantes, e o fato de ser um genoma bastante compacto dentre as plantas, o que traria uma maior facilidade de ser sequenciado.

Otimização O biólogo buscou compreender como as plantas conseguem otimizar o uso da energia obtida através da fotossíntese, como ela estabelece um protocolo de uso balanceado dessa energia para o seu desenvolvimento e crescimento num ambiente que varia constantemente. Durante o dia, explica ele, a planta é agraciada pela luz do sol e produz compostos de carbono através da fotossíntese. Boa parte desta energia é canalizada para o seu crescimento. O seu excedente é reservado sob a forma de compostos de carbono, mais especificamente de amido, para que, durante a noite, esse amido tenha uma quantidade suficiente de energia para que a planta possa continuar crescendo

e se desenvolvendo. “A planta cresce ao longo das 24 horas do dia”, pontua. Mas essa energia armazenada durante o dia necessita ser empregada de modo otimizado. A ação do gene AtbZIP63 varia de acordo com o dia e a noite, obedecendo a um ciclo circadiano, que nada mais é que um relógio biológico que os organismos seguem. Sua atividade aumenta durante a noite e diminui durante o dia, e esta sua variação é uma pista valiosa de que ele está envolvido nestes ajustes que são necessários nas transições dianoite. “O relógio biológico ajuda as plantas a preverem as mudanças que acontecerão quando a noite chegar e quando o dia amanhecer, preparando a sua adaptação e o uso das reservas”, afirma o pesquisador. É claro que há ainda a possibilidade de existirem estresses provocados por patógenos (como bactérias, vírus e fungos) e pouca disponibilidade de água no solo (estresse hídrico), reduzindo a eficiência de crescimento. A planta precisa se adequar a estas situações, adverte Matiolli, e tentar usar da melhor forma possível o que tem. Por outro lado, como ela consegue fazer uso dessas reservas de maneira eficiente? O autor do artigo explica que nesse contexto entra em ação o gene estudado – conhecido como fatores reguladores de transcrição (FTs). Eles atuam regulando o processo de ativação e de inativação, em geral muito significativo, de múltiplos genes que

são centrais na adaptação da planta a uma nova condição, entre elas a presença ou não de luz do sol. No caso das plantas, isso é preponderante já que, durante o dia, elas têm um aporte de energia do sol através da fotossíntese (com a conversão dessa energia do sol) e à noite, não tendo mais essa energia, elas precisam utilizar as suas reservas. A previsão da planta serve para prevenir carências de energia e de compostos de carbono, para continuar crescendo e se desenvolvendo. No ciclo dia-noite, ela tem uma mudança de fisiologia, mostrando um metabolismo de dia e outro de noite. Fazem parte dessa mudança também os genes que são ativados ou desativados, desde que relacionados com o uso da energia. Durante a noite, a planta não precisa produzir proteínas ou ativar genes ligados à fotossíntese. Precisa, antes, ativar genes responsáveis pela mobilização das reservas.

Adversidades A expressão do gene AtbZIP63, da família bZIP (Basic Leucine Ziper), também modifica: durante o dia, ela cai e durante a noite aumenta, acompanhando o ciclo circadiano. Sendo esse um gene que regula outros genes, os “regulados” vão em geral obedecer o mesmo padrão de oscilação. “Recentemente, vimos que o regulador de transcrição rege processos relacionados ao uso de amido e de energia contida nele, pela reserva durante o dia. Ativa e inati-

va genes que vão atuar no controle do uso do amido durante a noite.” Esse pode ser um dos aspectos como esse gene trabalha. O que se observou na pesquisa de Matiolli, orientada pelo docente do CBMEG Michel Vincentz, foi que o mutante (uma planta que não tem esse gene ativo) apresenta problemas de desenvolvimento e de crescimento. Essa dificuldade tem uma íntima relação com o seu possível papel no controle do uso do amido e com o desenvolvimento da parede celular. Já no que tange ao fator de transcrição, esse gene ainda regula um conjunto de outros genes do estresse energético, situação em que se verifica escassez aguda de energia. Cleverson pondera que a planta necessita lidar com esse tipo de adversidade. É o caso de uma situação em que por uma semana inteira o dia fica nublado e com pouca luz do sol. A planta não consegue acumular muita energia através da fotossíntese. Então ela começa a entrar numa carência de energia sem a luz do sol para se alimentar. Como a planta consegue responder a essa escassez aguda de energia? Esse gene encara um papel decisivo. A tendência natural, se essa condição de estresse energético prosseguir por muito tempo, conta Matiolli, é que ela diminua a sua eficiência reprodutiva, produzindo menos sementes, ou morra. Uma atitude natural da planta é buscar a otimização do seu desenvolvimento até a reprodução, para que ela consiga – mesmo com condições estressantes de energia – lidar com isso. “Ela vai tentar até o último instante se reproduzir e gerar descendentes”, assinala. Agora, se a planta não trabalhar muito bem com esse estresse, poderá ter um crescimento e um acúmulo pouco eficientes. Não conseguirá se desenvolver adequadamente e acumular biomassa da forma como deveria, lamenta. Este estudo foi desenvolvido no Laboratório de Genética de Plantas, na linha de pesquisa de Genética Vegetal.

............................................................. ■ Publicação

Matiolli, C. C.; Tomaz, J.P., Duarte, G.T.; Prado, F.M.; Del Bem, L.E.V.; Silveira, A.B.; Gauer, L.; Corrêa, L.G.; Drumond, R.D.; Viana, A.J.C; Di Mascio, P.; Meyer, C.; Vincentz , M.G.A. The Arabidopsis bZIP gene AtbZIP63 is a sensitive integrator of transient ABA and glucose signals. Plant Physiology, 13, 2011.

.............................................................


6

200 anos Campinas, 21 a 27 de novembro de 2011

de história do livro no país

Por meio de coletânea de ensaios, obra ganhadora do Jabuti traça a trajetória do impresso no Brasil, desde a chegada da Família Real

A

MANUEL ALVES FILHO manuel@reitoria.unicamp.br

té a chegada da Família Real ao Brasil, em 1808, a impressão de livros era proibida no país. As obras escritas por autores nacionais até podiam circular por estas plagas, mas tinham que ser confeccionadas no exterior, mais frequentemente em Portugal. Esses e outros aspectos relacionados à história da imprensa no Brasil estão relatados no livro Impresso no Brasil: dois séculos de livros brasileiros, vencedor do prêmio Jabuti 2011 na categoria Comunicação. A obra, que conta com 40 autores, foi coorganizada pela professora

Jornal da Unicamp – Como a senhora recebeu a notícia da conquistado Jabuti? Márcia Abreu – Recebi a notícia da premiação com alegria. Na verdade, duas alegrias. A primeira foi o livro ter sido selecionado entre os dez finalistas. Isso já foi um importante reconhecimento ao trabalho, visto que são centenas de obras publicadas anualmente na mesma categoria. A segunda foi obviamente a premiação, pois estávamos concorrendo com livros muito bons. JU – Como surgiu a ideia do livro? Márcia Abreu – A ideia do livro era comemorar os 200 anos da imprensa no Brasil, completados em 2008. A gente começou a preparar o livro dois anos antes pensando nisso. Entretanto, enfrentamos alguns percalços, o que fez com que ele fosse lançado em 2010. A ideia do livro é apresentar a trajetória da imprensa no Brasil, que começa em 1808 com a chegada da Família Real e com a criação da Imprensa Régia no Rio de Janeiro. Antes, era proibido imprimir no Brasil. A autorização para funcionamento da primeira tipografia no país ocorreu somente depois da vinda de D. João VI. JU – Mas, anteriormente, havia produção de impressos no país, não? Márcia Abreu – Tem um capítulo no livro que trata de uma tipografia anterior à chegada da Família Real – a de Antonio Isidoro da Fonseca –, mas ela funcionava clandestinamente. Ela publicou dois ou três volumes, mas foi logo fechada pelas autoridades de então. Antes de 1808, quem quisesse publicar um livro tinha que encomendar a produção para tipografias em Portugal. Era preciso enviar o manuscrito para lá, a impressão era providenciada e os exemplares impressos remetidos para o Brasil. JU – Havia censura, então? Márcia Abreu – Existia censura. Mas ela não era tão severa como se imagina. Algumas coisas eram proibidas, mas a maior parte dos pedidos era autorizada. Então, criou-se o seguinte cenário: o livro não podia ser impresso no Brasil, mas podia circular no país, desde que tivesse sido produzido fora. A Coroa Espanhola, por exemplo, não teve esse mesmo comportamento. Ela permitiu a instalação de tipografias em suas colônias desde logo. Curiosamente, Portugal autorizou a instalação de uma tipografia em Goa, outra colônia sua. O problema da Cora Portuguesa era com o Brasil. Algumas pessoas

dizem que era economicamente mais viável publicar fora do que aqui. Do contrário, seria preciso importar papel e ter mão de obra especializada. Na época, a venda de livros se dava, sobretudo, através do litoral brasileiro. Então, era prático receber os livros de Lisboa e distribuí-los pelos portos brasileiros. JU – Quando os primeiros livros começaram a ser efetivamente impressos no Brasil? Márcia Abreu – Os primeiros livros começaram a ser produzidos em 1808 mesmo. Quando D. João VI chegou, ele logo percebeu que não conseguiria administrar todo o reino de não tivesse uma tipografia perto de si. Então, ele mandou instalar rapidamente os equipamentos tipográficos, que vieram com ele nas naus. Vieram também trabalhadores qualificados para operá-los. Assim, em maio de 1808 as máquinas já estavam funcionando. A ideia de D. João era imprimir documentos oficiais: editais, avisos, ordens régias etc. No tempo livre, a tipografia poderia produzir para terceiros. Logo, algumas pessoas começaram a encomendar publicações. Em 1808, começaram a ser impressas obras poéticas e, em 1810, começaram a ser produzidas os primeiros romances. JU – Que tipos de livros eram publicados nesses primórdios? Márcia Abreu – Isso é um caso interessante porque, quando pensamos em literatura, logo nos ocorrem as altas obras da literatura erudita. Isso também foi publicado no início. Mas um livreiro chamado Paulo Martim logo percebeu que ele poderia ganhar dinheiro com a atividade e passou a publicar pequenos romances em folhetos muito finos. Então, essa primeira tipografia produziu ao mesmo tempo documentos oficiais e literatura popular, republicando títulos que circulavam em Portugal e possivelmente fariam sucesso aqui. Esses volumes normalmente eram impresso em papel barato e não contavam com capa. Até 1821, apenas a Impressão Régia podia publicar no país. Depois, a autorização foi aberta para outros lugares. A primeira tipografia particular foi instalada na Bahia, por Manoel Antonio da Silva Serva, fato que é abordado em um capítulo do nosso livro. JU – Ou seja, pelo que a senhora está dizendo, o brasileiro demonstrou interesse pelo livro desde logo. É isso? Márcia Abreu – Essa pergunta é

Márcia Abreu, do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da Unicamp. O outro organizador foi o professor Aníbal Bragança, da Universidade Federal Fluminense (UFF). Na entrevista que segue, Márcia Abreu fala de como o livro foi pensado e produzido e dos temas nele abordados. Também faz uma revelação curiosa. Segundo ela, a primeira tipografia brasileira, denominada Impressão Régia, produzia documentos oficiais, mas também volumes populares, o que indica o interesse dos brasileiros pela leitura desde o período colonial. Foto: Antoninho Perri

Exemplar da Coleção Sérgio Buarque de Holanda, que integra acervo da Coleção de Obras Raras da Biblioteca Central Cesar Lattes: obra foi produzida e distribuída pela Impressão Régia em 1815

interessante. Muitas pessoas dizem que não há interesse pelo livro no Brasil. Quando a gente mostra que naquele período já havia interesse, aí elas dizem que isso se concentrava no Rio de Janeiro. O nosso livro, porém, mostra que isso não é verdade. Rapidamente as tipografias se espalharam pelo país. Há textos na obra falando de tipografias em Pernambuco, Paraíba, Manaus, Rio Grande do Sul, já no século XIX. Ou seja, assim que se tornou possível, as pessoas começaram a se movimentar para instalar tipografias em seus municípios e imprimir coisas de interesse da sociedade local. Esses polos de leitura e produção de impressos estavam em todas as importantes cidades brasileiras. JU – Esse dado não parece ter conexão com a avaliação atual de que o brasileiro lê pouco. Márcia Abreu – Quando falamos de baixo índice de leitura no Brasil de hoje, isso não é totalmente correto. A gente fala isso como um chavão, que vai sendo repetido. Essa questão também é abordada no nosso livro.

Foto: Reprodução

Retrato de D. João VI, que trouxe os primeiros equipamentos tipográficos ao Brasil


Campinas, 21 a 27 de novembro de 20111 Foto: Marc Ferrez/Coleção Gilberto Ferrez/Acervo Instituto Moreira Salles

Real Gabinete Português de Leitura, no Rio de Janeiro, em 1895: disseminação do impresso pelo país contribuiu para a constituição de bibliotecas públicas e particulares Foto: Antoninho Perri

A professora Márcia Abreu, uma das organizadoras do livro: “A primeira tipografia instalada no país produziu ao mesmo tempo documentos oficiais e literatura popular” Foto: Reprodução

Capa da Gazeta do Rio de Janeiro, primeiro jornal impresso no país

Nele, há uma análise da série Harry Potter e também das obras de Paulo Coelho, que são fenômenos de vendagem com milhões de exemplares vendidos. Tem também análises dos livros que realmente movimentam a indústria editorial brasileira, que são os livros didáticos. O governo federal tem uma enorme participação nisso, pois compra essas obras para depois distribuí-las gratuitamente nas escolas públicas. Então, a gente tem que analisar os dados com muito cuidado. Dizer que no Brasil ninguém quer ler não explica o sucesso no país desses best sellers. No Brasil, o livro de fato ainda é caro para boa parcela da população, mas as pessoas encontram formas de ter acesso aos livros. JU – Quem eram os leitores brasi-

leiros no início do século XIX? Márcia Abreu – Agora você fez possivelmente a pergunta mais difícil de ser respondida. O que a gente consegue saber é quem eram os tipógrafos, os escritores, os livreiros e o que eles publicavam. Encontramos catálogos e outras fontes que nos dão essas informações. Agora, quem lia tudo isso – e porque lia - continua sendo um grande mistério. Quando descobrirmos, isso talvez isso valha um Nobel! Mas dá para ter algumas pistas. O nosso livro traz algumas análises a respeito. Por exemplo: temos dados de inventários de pessoas que morriam e deixam seus bens para parentes e amigos, entre eles livros e até bibliotecas inteiras. Tem pesquisadores que examinam esses inventários e tentam imaginar

como eram os donos originais e as razões que os levaram a comprar tais volumes. É uma pista, mas tem limites. Afinal, nem todos os livros que temos em casa nós já lemos, não é? Alguns títulos ficam eternamente na estante. Em contrapartida, nem todos os livros que lemos estão dentro de nossas casas. Tem coisas que lemos emprestadas etc. Esse tipo de inventário ajuda, mas não resolve a questão de quem eram os leitores. Identificar quem lê e saber como se lê continua sendo um grande mistério. JU – A constituição de bibliotecas públicas e particulares foi uma consequência imediata da possibilidade de impressão no país? Márcia Abreu – Uma coisa importante é deixar claro que houve a disseminação do impresso pelo país como um todo. Isso contribuiu para a constituição de bibliotecas públicas e particulares. Foi criado também o chamado Gabinete de Leitura. Eles eram mantidos por grupos de pessoas – por associações de imigrantes, por exemplo –, que resolviam montar bibliotecas de acesso público, mas de constituição privada. Era quase como uma videolocadora de hoje. A pessoa fazia uma ficha, pagava uma taxa e tinha o direito de retirar determinado número de livros por mês. Isso fez um enorme sucesso no Brasil. E os livros mais retirados eram os romances, que constituíam o grande sucesso do século XIX. JU – Quando foi impresso o primeiro jornal no país? Márcia Abreu – O primeiro periódico foi publicado no Brasil em 1808, intitulado Gazeta do Rio de Janeiro, produzido pela Impressão Régia. A partir de 1821, acaba a censura prévia e ocorre uma proliferação enorme de jornais, em todos os pontos do país. A maior parte das publicações, porém, era efêmera. Tinha de tudo. Alguns eram favoráveis e outros contrários aos portugueses, por exemplo. JU – Os jornais passaram a ser um espaço privilegiado para que alguns literatos, como Machado de Assis, publicassem seus textos, não? Márcia Abreu – No século XIX, o jornal era o grande veículo. Muitas pessoas já fizeram estudos sobre os folhetins, que eram aquelas narrativas publicadas em pedaços. Machado de Assis fez muito isso. Isso era uma boa estratégia para vender jornal. As pessoas ficavam presas naquela narrativa durante meses ou anos para saber como a história terminaria. É mais ou menos o que acontece hoje em relação às telenovelas. A partir disso fica difícil imaginar que as pessoas não tinham interesse pela leitura na época. Tem também as crônicas que alguns literatos escreviam e que depois eram compiladas em livros. Naquela época, publicavam-se também poesias nos jornais, o que não vemos frequentemente hoje. JU – Quando surgiu a questão do direito autoral? Márcia Abreu – Esse tema também é abordado em nosso livro. Até muito tardiamente não havia direito de autor. Se uma pessoa publicava um livro, ela não tinha qualquer garantia de que receberia parte do dinheiro obtido com as vendas. O dinheiro podia ficar inteiramente com o livreiro. Às vezes, o livreiro até cobrava para fazer a publicação. Um dos primeiros meios de vida dos letrados foi trabalhar em jornais, alguns deles em várias publicações ao mesmo tempo. Alguns poucos conseguiram viver de literatura. O lugar social do letrado ainda não estava bem estabelecido na época, tampouco a remuneração por seu trabalho. Um dos empreendimentos que eles fizeram para mudar isso foi a fundação da Academia Brasileira de Letras, tema também abordado em nosso livro. O objetivo da iniciativa era defender o papel social dos letrados. E o argumento usado era de que eles defendiam a língua e a literatura nacional, o que contribuía para fortalecer o sentimento de identidade nacional dos leitores. JU – Antes, então, não havia qualquer garantia para o autor? Márcia Abreu – No século XVIII, os autores tinham que pleitear algo que se chamava Privilégio Real. Eles escreviam para o rei e argumentavam que a produção do livro deu muito trabalho e que consumiu quase todos os seus recursos. E pediam autoriza-

7

ção para ter direito sobre a venda da obra por dez anos, por exemplo. O rei dizia sim ou não. De posse dessa autorização, o interessado procurava o tipógrafo, que, algumas vezes, também cumpria o papel de livreiro, para imprimir o livro. Se a empreitada era bem-sucedida e a obra vendia bem, o autor podia pleitear uma renovação do privilégio por mais algum tempo, que também podia ou não ser atendida. Isso colocava dificuldades tanto para os escritores quanto para os impressores, que lutaram pelo estabelecimento dos direitos autorais. O início do direito autoral foi na Inglaterra e na França, no século XVIII. Isso demorou a chegar ao Brasil. Teve muita discussão ao longo do XIX. Havia uma corrente que achava que o autor não deveria receber, dado que o principal propósito era difundir a ideia. Assim, depois da ideia difundida, ela não pertencia mais ao autor, que não deveria receber por isso. Outra corrente, porém, defendia que mesmo a ideia tendo sido difundida, a sua originalidade e o estilo empregado para a sua propagação pertenciam somente ao escritor, que merecia, portanto, ser remunerado. Essa segunda ideia acabou vingando e foi instituído então o direito autoral. No Brasil, isso ocorreu no final do século XIX. JU – Com o advento da internet, a questão do direito autoral não precisa ser rediscutida? Márcia Abreu – Essa é uma questão interessante. Se você coloca um texto seu na internet, provavelmente seu nome vai desaparecer como autor depois de um tempo, depois de algumas replicações. Isso não é bom. É importante preservar a responsabilidade por aquela ideia. Por outro lado, a divulgação dos textos e ideias pela internet é muito bacana, pois amplia muito o número de leitores das nossas produções. Eu recebo e-mails de pessoas de vários estados, que acabaram tomando contato com um texto meu pela rede. Se não fosse por esse meio, talvez isso não acontecesse. Hoje em dia, existe o Creative Commons, que dá licença para que a pessoa difunda o seu texto na internet sem o pagamento do direito autoral, preservando seu nome. É algo muito novo. Pelo Creative Commons, você também pode autorizar a pessoa a mexer no seu texto - suprimir ou incluir algo. Isso é interessante. Estamos entrando em novo mundo. Por isso foi bom lançar o livro agora. É um momento de se comemorar os 200 anos do livro no Brasil, num instante em que o livro passa por profundas mudanças. JU – Quem são os autores e como o livro está organizado? Márcia Abreu – O livro é uma obra coletiva. Ele tem dois organizadores: eu e o professor Aníbal Bragança, da Universidade Federal Fluminense. Além de nós dois, são 40 autores brasileiros, de diversas instituições, de todo o Brasil, que prepararam textos inéditos, especialmente para esta publicação. Neles, são abordados, como já disse, temas da história dos livros desde os primórdios da imprensa no Brasil até os dias atuais. A primeira parte trata de questões do mercado editorial. Já a segunda fala mais sobre pessoas, ou seja, autores e leitores.

................................................................ ■ Serviço

Título: Impresso no Brasil: dois séculos de livros brasileiros Organizadores: Aníbal Bragança e Márcia Abreu Autores: Diversos Editora: Unesp Páginas: 663 Preço sugerido: R$ 59,00

................................................................


8

Campinas, 21 a 27 de novembro de 2011

Dissertação associa queda de idoso a cochilos diurnos

Nas n bas ca

Foto: Antoninho Perri

Fisioterapeuta vê relação entre ocorrências e sintomas de insônia noturna na terceira idade

Foto: Antonio Scarpinetti

RAQUEL DO CARMO SANTOS

A

kel@unicamp.br

quele cochilo que muitos idosos dão durante o dia merece um olhar mais cuidadoso por parte dos profissionais de saúde, principalmente quanto à frequência e duração do hábito. O alerta é do fisioterapeuta Alexandre Alves Pereira, que encontrou uma relação significativa entre sintomas de insônia, cochilo diurno e ocorrência de quedas em idosos, em pesquisa realizada na Faculdade de Ciências Médicas (FCM). O estudo cruzou informações do banco de dados do Estudo Fibra (Fragilidade em Idosos Brasileiros), por meio do qual foram entrevistados 689 idosos em Campinas. A ocorrência de quedas nesta população atingiu 26,2%, sendo que 11,87% sofreram duas ou mais quedas. Segundo Pereira, levando em consideração as consequências físicas e psicológicas que o episódio ocasiona em pessoas de mais idade, a porcentagem deve ser observada com atenção. “As quedas representam um grave problema de saúde pública na população idosa, configurando uma

A orientadora, professora Maria Filomena Ceolim, e Alexandre Alves Pereira, autor da tese: cruzando dados de entrevistas feitas com 689 idosos

síndrome clínica com impacto significativo sobre a qualidade de vida”, destaca Pereira, lembrando que entre as complicações está o risco de fraturas, além do medo de cair novamente, bem como o risco de internação e morte. Alexandre Pereira explica ainda que são vários os fatores que levam o idoso a cair. Por isso, são relevantes as pesquisas cujo foco são aspectos que podem estar relacionados a esta ocorrência e, assim, ampliar as estratégias de prevenção. Neste sentido, o estudo indica a necessidade de avaliação mais criteriosa da qualidade do sono e suas consequências para o idoso, pois

podem revelar piora na condição de saúde e declínio funcional. “É comum ouvirmos a afirmação de que o cochilo diurno na velhice é corriqueiro, pois a prevalência é alta. Mas, a idade avançada não é condição única para o surgimento do cochilo. Ele pode ser motivado por algum quadro de enfermidade, por exemplo. Neste sentido, a pesquisa sugere que este tipo de ocorrência deve ser investigado, principalmente, porque mesmo as quedas também podem indicar outro problema”, reafirma. A pesquisa realizada pelo fisioterapeuta buscou o número de idosos

que respondia positivamente a uma das questões que evidenciam a presença de sintomas de insônia. São elas: dificuldade ao iniciar o sono, dificuldade em manter o sono, despertar precocemente ou dormir mal durante a noite. O estudo buscou ainda identificar os idosos que respondiam afirmativamente sobre o costume de cochilar durante o dia e aqueles que apresentaram quedas nos últimos 12 meses. Na sequência, o fisioterapeuta fez o cruzamento de todos os dados e indicou as associações, que segundo ele, são pouco exploradas na literatura

O papel das fibras elásticas

Participação das moléculas na reobstrução das artérias após cirurgia de angioplastia é investigada MANUEL ALVES FILHO manuel@reitoria.unicamp.br

Linha de pesquisa conduzida no Instituto de Biologia (IB) da Unicamp investiga as propriedades das fibras elásticas, presentes em tecidos que sofrem estresse mecânico. Elas são as responsáveis, por exemplo, pela capacidade do pulmão de se inflar e retornar à posição original durante o processo de respiração. Um dos estudos concluídos recentemente pelo grupo foi desenvolvido para a dissertação de mestrado da biomédica Tallita Vassequi da Silva, sob orientação do professor Claudio Chrysostomo Werneck. Ensaios realizados por ela com animais submetidos à angioplastia sugerem que a proteína denominada MAGP1, um dos componentes das fibras elásticas, desempenha papel relevante na formação da reestenose (novo estreitamento) das artérias. A pesquisadora apurou, ainda, que o uso do losartan, uma droga comercial indicada para o tratamento da hipertensão, é eficaz na redução da neoíntima, como esse tipo de obstrução também é chamada. De acordo com o professor Werneck, durante algum tempo a ciência

acreditou que as fibras elásticas tinham uma função puramente estrutural. Atualmente, porém, o enfoque mudou. Cada vez mais, sabe-se que elas desempenham outros papéis, como a regulação de determinados hormônios e fatores de crescimento. “Nossa ideia principal é poder estudar essas moléculas focando principalmente a questão da formação da neoíntima e de trombos. Estamos tentando entender como esses processos ocorrem, a partir de ensaios com animais geneticamente modificados”, explica. O docente lembra que a parede das artérias é formada por camadas alternadas de células e fibras elásticas. Quanto maior for a pressão a que o sistema está submetido, maior é o conteúdo dessas camadas, que se assemelham a lâminas. “Isso acontece porque o vaso tem que ter a capacidade de se estender e depois se acomodar, de acordo com a pressão exercida pelo batimento cardíaco. O que nós fazemos é analisar como as fibras elásticas são formadas e como possíveis defeitos nessas moléculas podem levar ao desencadeamento de algum tipo de doença”, acrescenta. Conforme Tallita, o principal procedimento é tentar mimetizar o que acontece na angioplastia. A cirurgia consiste em desobstruir a artéria, introduzindo em seu interior um cateter com um minúsculo balão inflável na ponta. Nos seres humanos, é comum ocorrer a reestenose alguns meses depois do procedimento. “A cirurgia é importante, mas também é bastante traumática. Quando ocorre uma lesão na parede do vaso, as células que estavam presas entre as lâminas, e que tinham o seu crescimento inibido, tendem a migrar para o interior do vaso e começam a se multiplicar. Decorrido algum tempo, esse vaso volta a ser fechado”, detalha o professor Werneck.

Foto: Antoninho Perri

O professor Claudio Werneck e sua orientanda, Tallita Vassequi da Silva: objetivo da pesquisa é propor futuramente um tratamento que possa ao menos minimizar os efeitos deletérios da angioplastia

Para tentar entender melhor como o problema se dá, Tallita usou camundongos modificados geneticamente, que apresentam deficiência da proteína MAGP1. Para ter um padrão de comparação, ela também utilizou animais selvagens sem a referida deficiência. Tanto os roedores modificados geneticamente quanto os selvagens, conforme a autora da dissertação, foram submetidos à cirurgia modelo de angioplastia. “Apuramos que esses camundongos, depois de submetidos à angioplastia, desenvolveram mais neoíntima que o grupo constituído por indivíduos selvagens. Ou seja, os resultados sugerem que a proteína de fato exerce um papel importante na formação da reestenose”, afirma. Como complemento do seu estudo, a biomédica também submeteu os camundongos deficientes em MAGP1 e os selvagens a um tratamento de quatro semanas com o losartan. O professor Werneck assinalada que a droga já

é vendida comercialmente, indicada para o controle da hipertensão. Entretanto, também vem sendo testada por um pesquisador norte-americano no tratamento de uma doença denominada Síndrome de Marfan, cujo desenvolvimento está relacionado com uma menor quantidade de fibrilinas, que também compõem as fibras elásticas. As pessoas acometidas por essa doença apresentam membros excessivamente longos, além de problemas em outras estruturas do corpo, como pulmões, olhos, coração e vasos sanguíneos. “Como sabíamos que o uso do losartan está apresentando resultados positivos no tratamento experimental da Síndrome de Marfan, resolvemos utilizá-lo no nosso estudo, para verificar se ele também poderia ser efetivo neste tipo de abordagem. Assim, constituímos quatro grupos, da seguinte forma: deficientes em MAGP1 tratados com losartan e com placebo e selvagens também trados com a

científica. “Acredito que a pesquisa abre um caminho para se avaliar o impacto das intervenções nas queixas e hábitos relativos ao sono na velhice visando à prevenção de eventos adversos”, afirma.

.............................................................. ■ Publicação

Dissertação: “Relação entre atividade física, capacidade funcional, velocidade da marcha, sintomas de insônia, cochilo diurno, sintomas depressivos e ocorrência de quedas em idosos residentes na comunidade” Autor: Alexandre Alves Pereira Orientador: Maria Filomena Ceolim Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM) Financiamento: CNPq e CAPES

..............................................................

droga e placebo. Os grupos tiveram a pressão arterial aferida e, em seguida, foram submetidos à angioplastia. Observamos que todos os animais eram normotensos [apresentavam pressão arterial normal]. Também verificamos que o tratamento com o losartan resultou na diminuição da formação da neoíntima em comparação com os camundongos que receberam somente placebo. Por fim, identificamos que os roedores deficientes em MAGP1 apresentaram maior formação de neoíntima se comparados com os selvagens”, relaciona Tallita. De acordo com o professor Werneck, um dos próximos passos, agora, é tentar compreender melhor como o losartan está atuando. “O fato de bloquearmos eventualmente um receptor não nos dá necessariamente a informação do que está acontecendo com a molécula ligante. Não sabemos, por exemplo, se ela está tendo um aumento de síntese ou não. Precisamos continuar investigando isso em modelo animal, para tentar ampliar o conhecimento acerca do tema. O objetivo final, obviamente, é propor um tratamento que possa ao menos minimizar os efeitos deletérios da angioplastia”, diz. O estudo desenvolvido por Tallita contou com bolsa concedida pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). A linha de pesquisa coordenada pelo docente do IB conta com financiamento da própria Fapesp e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

.............................................................. ■ Publicação

Dissertação: “Avaliação da função da MAGP1 na formação de neoíntima” Autora: Tallita Vassequi da Silva Orientador: Claudio Chrysostomo Werneck Unidade: Instituto de Biologia (IB) Financiamento: Fapesp e CNPq

..............................................................


Vivendo mais. Com menos Tese revela que expectativa de vida vem aumentando em bairros mais pobres de Campinas EDIMILSON MONTALTI

A

divulga@fcm.unicamp.br

expectativa de vida apresenta tendência de aumento no mundo todo. No Brasil, são poucos os estudos que avaliam o impacto da desigualdade social nesse indicador. A socióloga e demógrafa Ana Paula Belon, do Centro Colaborador em Análise de Situação de Saúde (CCAS), do Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, debruçou-se sobre dados da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Campinas e avaliou as desigualdades na expectativa de vida ao nascer no município no período de 2000 e 2005. A pesquisa virou parte da tese de doutorado “Mortalidade e expectativa de vida: tendências e desigualdades sociais”, a qual foi defendida este ano na área de epidemiologia do programa de pós-graduação em Saúde Coletiva da FCM. A orientação foi da professora Marilisa Berti de Azevedo Barros. O trabalho resultou no artigo “Redução das desigualdades sociais na expectativa de vida em município do Sudeste brasileiro”, publicado recentemente na revista inglesa International Journal for Equity in Health. “Este artigo e a tese de doutorado de Ana Paula inserem-se na linha de pesquisa sobre desigualdade social em saúde e vinculam-se ao projeto de monitoramento da mortalidade da população do município de Campinas, que é desenvolvido em parceria entre o CCAS e a Secretaria Municipal de Saúde de Campinas. Os dados sobre o perfil da mortalidade no município são divulgados em boletins periódicos”, explica Marilisa. Para a pesquisa, Ana Paula utilizou informações das populações que residem nas áreas cobertas pelos 49 Centros de Saúde que dividem o município de Campinas. Foi realizada uma estratificação socioeconômica destas 49 áreas, baseada nas variáveis do Censo Demográfico de 2000: percentual de responsáveis pelo domicílio com rendimento igual ou superior a dez salários mínimos; percentual com rendimento inferior a dois salários mínimos; percentual de responsáveis de domicílio com mais de dez anos de estudo; e percentual com menos de um ano de escolaridade. Foi produzido um escore global para cada área de abrangência dos Centros de Saúde, considerando a média de sua posição em relação a cada um dos quatro indicadores. A partir deste escore global, as áreas foram ordenadas e agrupadas em três estratos socioeconômicos: alto, médio e baixo. O estrato socioeconômico baixo foi composto pelas áreas do Jardim São Marcos, DIC I e DIC III, por exemplo. Os bairros São Quirino, Anchieta e o Distrito de Sousas, entre outros, formaram o estrato médio. Já nas áreas consideradas como de estrato alto, agruparam-se os bairros Taquaral, Jardim Aurélia e Distrito de Barão Geraldo, entre outros. O estrato de pior nível socioeconômico – comparado ao de melhor condição de vida – apresentou maior participação de pessoas com menos de 15 anos de idade e menor proporção de idosos. Entre os responsáveis pelos

domicílios residentes nestas áreas, somente 4,4% tinham renda mensal igual ou superior a dez salários mínimos e apenas 13,7% tinham mais de dez anos de estudo. No estrato alto, estes valores foram respectivamente de 44,5% e 60,4%. “A pesquisa detectou profundas desigualdades sociais na população do município de Campinas, porém, a expectativa de vida vem aumentando e a diferença no tempo médio de vida entre áreas de menor e de maior status socioeconômico vem diminuindo”, revelou Ana Paula. A expectativa de vida ao nascer da população do estrato alto foi a mais elevada nos dois anos estudados, sendo de 75,2 anos em 2000 e 76,5 em 2005. Os menores valores foram observados no estrato baixo, com 68,7 anos em 2000 e 72,3 anos em 2005. O aumento de anos de vida no estrato alto foi de apenas 1,3 ano entre 2000 e 2005, enquanto no estrato baixo foi de 3,6 anos. Devido ao ganho de anos de vida ter sido três vezes maior no estrato baixo, as desigualdades sociais na expectativa de vida diminuíram. Em 2000, uma criança nascida nas áreas correspondentes ao estrato baixo viveria, em média, 6,5 anos a menos que um recém-nascido das áreas do estrato alto. Em 2005, esta disparidade caiu para 4,2 anos. A pesquisa revelou também que em 2000 a expectativa de vida dos homens no estrato baixo era sete anos inferior à estimada para as áreas mais ricas. Na população feminina, esta diferença entre os estratos alto e baixo foi de 5,5 anos. Por outro lado, ao comparar a variação do tempo médio de vida entre 2000 e 2005, observou-se que, embora a expectativa de vida feminina seja maior que a calculada para os homens, foi na população masculina que os ganhos de anos de vida foram maiores. E quem mais se beneficiou deste aumento foram os homens que moravam nas áreas de piores condições de vida. Em apenas cinco anos, a expectativa de vida dos homens residentes nas áreas mais pobres aumentou 4,7 anos. Os homens das áreas mais ricas tiveram um ganho de apenas 2,1 anos. Consequentemente, as desigualdades na expectativa de vida masculina entre o estrato alto e o baixo, que era de 7 anos em 2000, diminuiu para 4,3 anos em 2005. Segundo outra pesquisa publicada por Ana Paula juntamente com Marilisa Barros, 69,7% do total de anos adicionados na expectativa de vida masculina no período de 2000 a 2005 é explicado pela redução dos riscos de morte por causas externas, – acidentes e violência – e, em especial, pelos homicídios. “Como os riscos de mortalidade por homicídios e outras causas externas são maiores nas áreas de piores condições socioeconômicas, a queda da morta-

Campinas, 21 a 27 de novembro de 2011

9 Foto: Antoninho Perri

Retrato do contraste em Campinas: de acordo a autora da pesquisa, a expectativa de vida vem aumentando e a diferença no tempo médio de vida entre áreas de menor e de maior status socioeconômico está diminuindo

lidade por essas causas observada nos primeiros anos de 2000 impactou fortemente na mortalidade masculina destas áreas, possibilitando maiores ganhos de anos de vida e levando à redução das desigualdades na expectativa de vida entre áreas ricas e pobres”, diz Ana Paula. Devido a este aumento no tempo médio de vida masculino, as diferenças na expectativa de vida entre homens e mulheres diminuíram. No estrato baixo, por exemplo, a expectativa de vida ao nascer do sexo masculino era 9,6 anos inferior ao estimado para o sexo feminino, em 2000. Em 2005, esta distância caiu para 7,1 anos. No estrato alto, a diferença entre os sexos declinou de 8,2 para 6,4 anos entre 2000 e 2005. Segundo Ana Paula, os dados deste estudo, ao apontar queda das desigualdades na expectativa de vida em Campinas, divergem dos achados obtidos em países desenvolvidos.

“Estados Unidos, Dinamarca e Nova Zelândia, por exemplo, registraram ampliação das desigualdades sociais na esperança de vida ao longo do tempo, uma vez que os maiores ganhos de anos de vida ocorreram nos grupos com melhores condições de vida. Em Campinas, ocorreu o oposto. A redução das desigualdades sociais na esperança de vida é decorrente do maior incremento de anos de vida nas áreas de baixo nível socioeconômico”, destaca Ana Paula. O que explica a redução das desigualdades sociais na expectativa de vida do campineiro? Além da forte queda da mortalidade por causas violentas, segundo a pesquisadora, as políticas sociais de transferência de renda contribuíram para isso. Estudos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) Foto: Divulgação

mostram que as desigualdades sociais no país vêm diminuindo ao longo desta década graças à ampliação de políticas que garantem à população de menor poder aquisitivo melhores condições de vida. “A melhoria nas condições de vida promove maior acesso aos serviços de saúde e bem-estar nutricional, o que impacta positivamente nos indicadores de saúde. Ainda, o aumento na cobertura dos serviços de saúde, como o Programa de Saúde da Família, e a expansão da oferta de programas específicos de promoção à saúde e de prevenção de doenças e fatores de risco podem também ter contribuído para reduzir a mortalidade na população de menor status socioeconômico, a qual é mais dependente do Sistema Único de Saúde (SUS)”, diz Ana Paula. Para a professora Marilisa, a redução da desigualdade social na expectativa de vida, constatada na pesquisa, aponta a possibilidade de minimizar o impacto das desigualdades econômicas sobre a saúde da população por meio de intervenções adequadas do setor saúde e de atuações intersetoriais. Segundo Ana Paula, apesar da redução, as disparidades sociais na esperança de vida permanecem altas. “As desigualdades sociais na saúde são injustas e inaceitáveis e gestores de políticas públicas de saúde devem combatê-las, garantindo maior assistência à saúde de qualidade, sobretudo à população mais carente. Estes esforços do sistema de saúde devem ser somados aos programas econômicos que estão voltados à redução da pobreza e promoção da equidade das condições de vida”, conclui Ana Paula.

............................................................. ■ Publicação

A professora Marilisa Berti de Azevedo Barros (à dir.), orientadora, e a socióloga e demógrafa Ana Paula Belon, autora da tese: estratificação socioeconômica de 49 áreas

Tese: “Mortalidade e expectativa de vida: tendências e desigualdades sociais” Autora: Ana Paula Belon Orientadora: Marilisa Berti de Azevedo Barros Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM)

.............................................................


10 Vida Teses da semana Painel da semana Teses da semana Livro da semana Destaques do Portal da Unicamp

aa c dêi ma c

Campinas, 21 a 27 de novembro de 2011

Painel da semana Processamento de alto desempenho - A Unicamp, através do Centro Nacional de Processamento de Alto Desempenho (Cenapad), organiza, de 21 de novembro a 2 de dezembro, no Cenapad, um workshop sobre processamento de alto desempenho e suas aplicações em simulação computacional. O workshop, que ocorrerá em dois auditórios e em uma sala de treinamento do Centro de Computação (CCUEC), está dividido em 4 módulos. O primeiro abordará o tema “Introdução ao método de elementos finitos de alta ordem”. O segundo será sobre uma “Visão geral, Estudos de Caso e Tendências - Computação de Alta Performance (HPC)”. No terceiro ocorrerão aulas práticas em computação de alto desempenho. O quarto módulo será sobre “Aplicações de computação de alto desempenho para elementos finitos”. Como pré-requisito é desejável que o participante tenha alguma base em análise de elementos finitos e MPI. As inscrições para os módulos e a programação detalhada estão no link https:// www-950.ibm.com/events/wwe/grp/grp029.nsf/ v16_agenda?openform&seminar=E9DKCXE S&locale=pt_BR. O workshop é apoiado pela IBM Brasil. Mais informações: 19-3521-2196.  TEDxUnicamp - No dia 21 de novembro, das 9 à 12 horas, no Centro de Convenções, acontece o evento TEDxUnicamp com o tema “As Fronteiras entre as Ciências e as Artes”. Todas as palestras serão proferidas por professores da Unicamp, de diversas áreas do conhecimento. Cada palestra ocorre nos moldes do TED (www. ted.com) com apresentações de 15 minutos, cobrindo tópicos multidisciplinares de pesquisas e áreas de conhecimento. No período da tarde, no mesmo local, das 14 às 16 horas, será realizado o TEDxYouth@Unicamp, evento direcionado ao público jovem. Outras informações sobre os eventos ligue: 19-3521-7923.  Palestra com Mohamed Habib - O professor Mohamed Habib, pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários, profere palestra sobre alimentos orgânicos no dia 22 de novembro, às 14h30, no auditório da Biblioteca Central Cesar Lattes (BC-CL). Informações: 19-3521-6427.  Seminário e inauguração - O Laboratório de Estudos Urbanos (Labeurb) organiza no dia 22 de novembro, o seminário “A cidade fala”, ocasião em que também inaugurará, às 15 horas, o seu novo prédio. O seminário ocorre a partir das 9 horas com uma conferência da professora Eni Puccinelli Orlandi sobre cidade e estado. Às 12h30 também será lançado o livro “Análise de Discurso no Brasil: Pensando o Impensado Sempre”. Mais informações: evenlabe@unicamp.br  Novas instalações do SAE - O Serviço de Apoio ao Estudante (SAE) inaugura as suas novas instalações em data comemorativa aos seus 35 anos. A cerimônia ocorre no dia 22 de novembro, às 10 horas, na Rua Sérgio Buarque de Holanda 251, no campus da Unicamp.  Utopia e ficção científica - No dia 22 de novembro, a partir das 9 horas, na Sala do Telão do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL), acontece a Jornada de Estudos “Utopia e ficção científica”. No evento, o Centro de Pesquisa sobre Utopia (U-Topos) pretende discutir o substrato temático comum à utopia e à ficção científica: ambas as manifestações tratam, com o recurso dos mundos imagi-

nários, das mais urgentes questões da época que as produziu. Na primeira mesa-redonda, a professora Ana Cláudia Ribeiro (Unincor) fala sobre “Arqueologia da ficção científica brasileira: notas sobre as páginas da história do Brasil escrita no ano 2000, de Joaquim Felício dos Santos”. Programação completa: http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ sala_imprensa/utopia.pdf  Palestra e workshop - O Programa de Pós-graduação em Artes Visuais do Instituto de Artes (IA) organiza no dia 23 de novembro, das 9 às 12 horas, uma palestra com Jorge Manilla, artista de grande reconhecimento no cenário da arte-joalheria. A palestra será realizada das 9 às 12 horas, no auditório da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC). O workshop ocorre no Instituto de Artes (IA). Mais informações podem ser obtidas pelo e-mail ws.manilla@gmail.com.  Unicamp Ventures - Organizado pelo Grupo Unicamp Ventures com o apoio da Agência de Inovação Inova Unicamp, o VI Encontro Unicamp Ventures acontece no dia 23 de novembro, das 14h às 18h30, e tem por finalidade consolidar e ampliar a rede de empreendedores oriundos da Universidade. O evento conta com palestras e troca de experiências entre convidados e participantes. O Encontro Unicamp Ventures é destinado ao público empreendedor oriundo da Unicamp (grupo Unicamp Ventures), além de envolver estudantes de graduação e pós-graduação da Universidade, pesquisadores e pessoas interessadas em empreendedorismo tecnológico. Site do evento: http://www.inova. unicamp.br/unicampempreende/  Enfoco - O Grupo de Estudos e Pesquisas Formar Ciências da Faculdade de Educação (FE) da Unicamp organiza no dia 25 novembro, a partir das 8h30, no Centro de Convenções da Unicamp, o VII Encontro de Formação Continuada de Professores de Ciências (Enfoco) com o tema “Políticas e práticas de reformas curriculares oficiais de ciências na escola fundamental”. O evento, que prossegue até o dia 26, tem como público-alvo professores da educação básica de Campinas-SP e municípios da região, graduandos de cursos de licenciatura e pós-graduandos em educação e áreas afins. Para participar do Enfoco, as inscrições devem ser feitas até o dia 20 de novembro, no endereço eletrônico http://www.fe.unicamp.br/enfoco/ inscricoes.html. O Enfoco ocorre a cada dois anos e conta com o apoio do Fundo de Apoio ao Ensino, à Pesquisa e Extensão (Faepex), da Faculdade de Educação (FE), da Prefeitura Municipal de Campinas e da Secretaria da Educação de Itatiba-SP. O professor Edilson Duarte dos Santos, doutorando pela FE, é um dos integrantes da comissão organizadora. Acesse a programação completa no hotsite http://www.fe.unicamp.br/enfoco/. Outras informações podem ser obtidas pelo e-mail edilson. santos@uol.com.br.  IB comemora 500ª defesa de tese em Ecologia - O Programa de Pós-graduação em Ecologia do Instituto de Biologia (IB) comemora no dia 25 de novembro, às 18 horas, na Casa do Professor Visitante (CPV), a sua 500ª defesa de tese em Ecologia. Um coquetel será realizado com a presença do professor Euclides Mesquita Neto, pró-reitor de Pós-graduação, e de alunos e docentes do IB. A comemoração está sob a responsabilidade do professor André Victor Lucci Freitas. A tese de número 500 “História natural de Rhinella jimi (Anura; Bufonidae): uma espécie invasora em Fernando de Noronha” é de autoria de Julia Tolledo Santos. Ela foi orientada pelo professor Luis Felipe de Toledo Ramos Pereira. A defesa ocorre às 9 horas, na sala de defesa de teses do IB. Outras informações pelo telefone 19-35216381 ou e-mail ecologia@unicamp.br  Senabraille - Evento será realizado de 27 a 30 de novembro, no Centro de Convenções da Unicamp. Terá como tema central “Bibliotecas: espaços acessíveis a múltiplos usuários”. A organização é da Unicamp e da Febab. Outras informações na página eletrônica http:// www.sbu.unicamp.br/senabraille/ ou telefone 19-3521-6504.  Vestibulinho do Cotil - O Colégio Técnico de Limeira, o Cotil, já está recebendo as inscrições para o seu Exame de Seleção de 2012. As provas serão aplicadas no dia 27 de novembro, a partir das 14 horas, nas cidades de Campinas, Americana, Limeira, Araras, Cosmópolis, Piracicaba e Rio Claro. Já a lista com os cursos oferecidos pelo Cotil pode ser

consultada no link http://www.cotil.unicamp.br/ cursosoferecidos.php  Inovações Curriculares - O III Seminário de Inovações Curriculares acontece de 12 a 14 de dezembro, no Centro de Convenções da Unicamp. A abertura oficial será realizada às 8h30. As inscrições são abertas à comunidade em geral e podem ser feitas até 11 de dezembro, no site http://www.prg.unicamp.br/ inovacoes/2011/. A organização é da Pró-reitoria de Graduação e da Faculdade de Educação (FE) da Unicamp.  Memória e Fotografia - O Grupo de Pesquisa Memória e Fotografia (GPMeF) promove até 30 de novembro, no saguão do Ciclo Básico Básico I da Unicamp, a exposição fotográfica ‘Fé, Festa e Memória’. A mostra apresenta 23 fotografias coloridas (30x45 cm) que revelam diferentes olhares de pesquisadores sobre aspectos da tradição e da memória da religiosidade popular. O trabalho integra o calendário oficial do V Festival Hercule Florence de Fotografia realizado em Campinas durante o mês de outubro de 2011. As fotografias foram produzidas pelos pesquisadores Nelson Chinalia, Olga Rodrigues de Moraes von Simson, Batistina Sousa Corgozinho, Maria Cecília Monteiro, Amarildo Carnicel e Suzana Barretto.

Eventos Futuros  Fórum de Empreendedorismo e Inovação - No dia 28 de novembro, das 9 às 17 horas, acontece mais uma edição do Fórum Permanente de Empreendedorismo e Inovação. A Mentoria Empresarial para Inovação é o tema central do evento. Programação e outras informações no link: http://foruns.bc.unicamp. br/empreen/foruns_empreen.php  Mídia e ciência - No dia 29 de novembro, das 8 às 17 horas, acontece o 4o encontro Mídia e Ciência com o tema “O jornalismo científico e a popularização da ciência no Brasil “. O evento será realizado no auditório José Irineu Cabral (Edifício Sede da Embrapa – Parque Estação Biológica, final Av. W3 Norte, Asa Norte), em Brasília-DF. A promoção é da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Mais detalhes no hotlink http://www.cenargen.embrapa.br/ev entos/2011/1111_4encontroMidiaCiencia.html

Tese da semana  Computação - “Um simulador compilado dinâmico para o ArchC” (mestrado). Candidato: Maxiwell Salvador Garcia. Orientador: professor Sandro Rigo. Dia 25 de novembro, às 10 horas, no auditório do IC (sala 85 - IC 2). - “Recuperação de vídeos por conteúdo: da teoria à prática” (doutorado). Candidato: Jurandy Gomes de Almeida Junior. Orientador: professor Ricardo da Silva Torres. Dia 28 de novembro, às 14 horas, no auditório do IC - Sala 85 - IC 2.  Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo - “Análises microestrutural e das propriedades mecânicas e de durabilidade de argamassas e concretos com isoladores elétricos de porcelana” (doutorado). Candidato: Marco Antonio Campos. Orientador: professor Vladimir Antonio Paulon. Dia 22 de novembro, às 10 horas, na FEC. - “Levantamento em campo da rugosidade equivalente de tubos metálicos” (mestrado). Candidato: Francisco Carlos Schroder. Orientador: professor Paulo Vatavuk. Dia 24 novembro, às 14 horas, na sala defesa de teses da FEC. - “Metodologia para o planejamento de reabilitação de redes de distribuição de água” (mestrado). Candidato: Alex Orellana. Orientador: professor José Gilberto Dalfré Filho. Dia 24 de novembro, às 14 horas, na FEC.  Engenharia Elétrica e de Computação “Avaliação de desempenho de esquemas de modulação e codificação na presença de interferência de co-canal” (mestrado). Candidato: Carlos Daniel Altamirano Carrillo. Orientador: professor Celso de Almeida. Dia 21 de novembro, às 14 horas, na sala da congregação da FEEC. - “Avaliação da eficiência espectral média do enlace reverso de redes celulares na presença de interferência de co-canal” (mestrado). Candidato: Edgar Eduardo Benítez Olivo. Orientador: professor Celso de Almeida. Dia 22 de novembro, às 9 horas, na FEEC.

- “Simulador para a avaliação da eficiência espectral média de redes celulares na presença de interferência de co-canal” (mestrado). Candidata: Diana Pamela Moya Osorio. Orientador: professor Celso de Almeida. Dia 22 de novembro, às 14 horas, na sala da congregação da FEEC. - “Análise dos emparelhamentos de arestas de Polígonos Hiperbólicos para a construção de constelações de sinais geometricamente uniformes” (doutorado). Candidato: Alessandro Ferreira Alves. Orientador: professor Reginaldo Palazzo Júnior. Dia 23 de novembro, às 14 horas, na sala PE11 da FEEC. - “Estudo, projeto e implantação de filtros harmônicos sintonizados para a expansão industrial” (mestrado). Candidato: Paulo Henrique Tavares. Orientador: professor José Antenor Pomílio. Dia 25 de novembro, às 8h30, na FEEC. - “Contribuições em codificação de imagens e vídeo” (doutorado). Candidata: Vanessa Testoni. Orientador: professor Max Henrique Machado Costa. Dia 25 de novembro, às 14 horas, na CPG/FEEC.  Engenharia Mecânica - “Estudo do fenômeno “stick-slip” aplicado às vibrações de freios automotivos” (mestrado). Candidato: André Garcia Lima Suetti. Orientador: professor Robson Pederiva. Dia 23 de novembro, às 14h30, no bloco K da FEM.  Engenharia Química - “Analise da Influência de impelidores laterais no tempo de mistura em tanques de estocagem de diesel com o uso da fluidodinâmica computacional (CFD)” (mestrado). Candidato: Fredy Antônio Cabrales Navarro. Orientador: professor José Roberto Nunhez. Dia 23 de novembro, às 14 horas, na sala de defesa de teses (bloco D) da FEQ.  Geociências - “Uma discussão sobre a filogênese Kant-Goethe-Schopenhauer na constituição do conceito forma-paisagem e o seu impacto na geografia humboldtiana” (mestrado). Candidato: Josevan Dutra dos Santos. Orientador: professor Antonio Carlos Vitte. Dia 25 de novembro, às 14 horas, no auditório do IG.  Humanas - “Cenas de parto e políticas do corpo: uma etnografia de experiências femininas de parto humanizado” (doutorado). Candidata: Rosamaria Giatti Carneiro. Orientadora: professora Luzia Margareth Rago. Dia 22 de novembro, às 14 horas, na sala de defesa de teses do IFCH. - “Produção do conhecimento científico brasileiro: o caso de uma instituição de pesquisas em Campinas “ (doutorado). Candidata: Tania Cristina Lima. Orientador: professor Guilhermo Raul Ruben. Dia 23 de novembro, às 14 horas, na sala de defesa de teses do IFCH.  Linguagem - “Diálogos miméticos entre Sêneca e Shakespeare: As Troianas e Ricardo III” (mestrado). Candidato: Régis Augustus Bars Closel. Orientadora: professora Suzi Frankl Sperber. Dia 21 de novembro, às 14 horas, na sala de defesa de teses do IEL. - “Discursos sobre a milícia: nomes, vozes e imagens em movimento na produção de sentidos” (doutorado). Candidata: Greciely Cristina da Costa. Orientadora: professora Eni de Lourdes Puccinelli Orlandi. Dia 25 de novembro, às 14 horas, na sala de defesa de teses do IEL.  Matemática, Estatística e Computação Científica - “Soluções limites para problemas elípticos envolvendo medidas” (doutorado). Candidato: Adilson Eduardo Presoto. Orientador: professor Francisco Odair Vieira de Paiva. Dia 21 de novembro, às 10 horas, na sala 253 do Imecc.  Medicina - “Alterações metabólicas e mitocondriais na analbuminemia congênita: estudos em ratos nagase analbuminêmicosdislipidêmicos” (doutorado). Candidato: Tiago Rezende Figueiredo. Orientador: professor Helder Tedeschi. Dia 22 de novembro, às 9 horas, no anfiteatro do Departamento de Farmacologia. - “Relações entre condições socioeconômicas, de saúde psicossociais e satisfação com a vida em idosos cuidadores comparativos com não cuidadores” (doutorado). Candidata: Mônica Regina Scandiuzzi Valente Tomomitsu. Orientadora: professora Mônica Rodrigues Perracini. Dia 22 de novembro, às 9 horas, no anfiteatro da CPG/FCM. - “Relação entre exercícios físicos, força muscular e atividades de vida diária em mulheres idosas recrutadas na comunidade” (mestrado). Candidata: Luciana Helena Martins Ribeiro.

Livro

da semana

Cartas a Cincinato Estudos críticos por Semprônio

Autor: Franklin Távora Organização: Eduardo Vieira Martins ISBN: 978-85-268-0940-6 Ficha técnica: 1a edição, 2011; 280 páginas; formato: 14 x 21 cm; Áreas de interesse: Teoria literária Preço: R$ 40,00 Sinopse: As Cartas a Cincinato, de Franklin Távora, foram publicadas no jornal Questões do Dia entre 14 de setembro de 1871 e 22 de fevereiro de 1872 e reunidas em livro no mesmo ano. Apesar de frequentemente citadas pela historiografia literária, as cartas não foram reeditadas no século XX, tornando- se uma raridade bibliográfica. Com apresentação e notas explicativas, a presente edição visa recolocar o livro de Franklin Távora em circulação, facilitando seu acesso a estudantes de letras e a pesquisadores interessados na literatura brasileira do século XIX. Autor: João Franklin da Silveira Távora nasceu no Ceará em 13 de janeiro de 1842 e ainda criança mudou-se com a família para Pernambuco, onde iria estudar e obter o título de bacharel em direito (1863). Quando estudante, iniciou sua atividade literária, publicando contos e escrevendo para o teatro. Como jornalista, trabalhou para publicações liberais e tomou parte ativa na chamada Questão Religiosa. Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1874, ingressou na Secretaria do Império e exerceu intensa atividade intelectual, como diretor da segunda fase da Revista Brasileira (1879-1881) e como membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), no qual foi admitido em 1880. Deputado da Assembleia Provincial, historiador, jornalista, crítico, dramaturgo e contista, é lembrado pela historiografia literária principalmente por defender a tese da existência de uma literatura do Norte, que, na sua visão, seria mais genuinamente brasileira do que a do Sul. No intuito de construir essa literatura, escreveu romances como O Cabeleira (1876), O matuto (1878) e Lourenço (1881), aos quais acrescentou Um casamento no arrabalde (originariamente publicado em 1869 e reeditado em 1881). Távora morreu no Rio de Janeiro, em 18 de agosto de 1888.

Orientadora: professora Anita Liberalesso Neri. Dia 25 de novembro, às 15 horas, no anfiteatro da CPG/FCM. - “Vulnerabilidade social individual, programática e saúde percebida em idosos de campinas” (Mestrado). Candidata: Natália Oliveira Rodrigues. Orientadora: professora Anita Liberalesso Neri. Dia 25 de novembro, às 9h30, no anfiteatro da CPG/FCM.  Química - “Avaliação do efeito pró-oxidante no PP, em blendas com PHB, visando a biodegradação” (doutorado). Candidato: Paulo Aparecido dos Santos. Orientador: professor Marco-Aurelio De Paoli. Dia 22 de novembro, às 13h30, no Miniauditório do IQ.

DESTAQUES do Portal da Unicamp Foto: Antonio Scarpineti

Fórum partilha experiências sobre doenças transmissíveis na região 11/11/2011– No intuito de fazer com que academia e serviço público compartilhassem suas experiências, o Núcleo de Vigilância Epidemiológica do Hospital de Clínicas (HC) da Unicamp organizou o fórum extra “Doenças transmissíveis de interesse em saúde pública na região de Campinas”, no último dia 11, no auditório da Faculdade de Ciências Médicas (FCM). “O fórum faz parte de uma série de atividades promovidas pelo Núcleo para tornar mais intensa e consistente a relação do nosso serviço de referência com os serviços de vigilância dos municípios da região. Somos referência para cerca de 50 cidades”, explicou o médico infectologista Rodrigo Nogueira Angerami, um dos coordenadores do evento. Segundo Angerami, a escolha das doen-

ças transmissíveis como mote central se deve ao fato de que várias dessas doenças representam um problema não apenas para Campinas, mas também para os municípios do entorno. “Todos os tópicos escolhidos fizeram, fazem ou podem vir a fazer parte do contexto epidemiológico da região. Dividimos entre as doenças emergentes e as crônicas. A leishmaniose visceral é um risco emergente, assim como da reintrodução do sarampo, além dos surtos de meningite meningocócica que vêm se somando a cada ano. Entre as doenças já instaladas, temos a tuberculose e a febre maculosa.” Rodrigo Angerami acrescenta que, dentro da proposta de promover maior integração, foram convidados para as palestras tanto técnicos especialistas da Unicamp, como

das Secretarias Estadual e Municipal da Saúde. “Também trouxemos palestrantes de universidades coirmãs do interior, como os professores Benedito Lopes da Fonseca e Luiz Tadeu Figueiredo, ambos da USP de Ribeirão Preto, que falarão respectivamente sobre dengue e febre amarela.” Esta sessão extra dos Fóruns Permanentes idealizados pela Coordenadoria Geral da Universidade (CGU) foi formatada com miniconferências seguidas de mesas-redondas, oferecendo panoramas em Campinas, região e no Estado sobre doenças transmissíveis como dengue, febre amarela, leishmaniose, tuberculose, micoses endêmicas, febre maculosa, meningite meningocócica, coqueluche e sarampo. (Luiz Sugimoto)

O infectologista Rodrigo Angerani, da coordenação do fórum: integração entre o serviço de referência e os serviços de vigilância dos municípios


Biotecnologia produz aromas de frutas a partir de resíduos Compostos podem ser usados pela indústria de alimentos e colocados em rações ISABEL GARDENAL

T

bel@unicamp.br

rabalho de doutorado desenvolvido na Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) por Daniele Souza de Carvalho resultou na produção de aromas naturais de frutas por via biotecnológica, obtidos a partir de resíduos agroindustriais. Além disso, comprovou-se a sua viabilidade de uso por reduzir o tempo de processamento, o que deve diminuir também os custos. Esses aromas mostraram-se promissores para aplicação sobretudo na indústria de alimentos, podendo serem adicionados ao leite fermentado, iogurtes e rações animais, entre outras possibilidades. Do processamento da indústria cervejeira, foi aproveitado o bagaço de malte, que sobressaiu no experimento com um aroma puxado para o abacaxi, e do processamento da mandioca, a manipueira, um aroma puxado para o morango. Daniele, que é química de alimentos, expõe que o tempo de processamento foi encurtado para um dia, em oposição às 72 a 96 horas que em geral demandariam pelos processos convencionais para obtenção deste composto. Isso porque, se o microrganismo fosse colocado direto no meio, teria que passar por uma fase de adaptação, que envolve a curva de crescimento normal. Ela explica que ativou o microrganismo em meio convencional e, após 24 horas, foi adicionado no resíduo, desenvolvendo a produção máxima desse composto em 24 horas de fermentação. Os achados já apontam que é possível beneficiar diferentes setores da indústria, salienta a autora, principalmente com a diminuição dos custos, já que os processos biotecnológicos exigem, em geral, um longo tempo de fermentação e têm um substrato caro. Por reunir essas características, Daniele pensou em utilizar resíduos como substrato para o processo fermentativo. “Sem fazer a etapa de pré-inóculo (quando adiciona-se o microrganismo ao meio), o microrganismo teria que passar pela fase de adaptação, entretanto, com o auxílio da etapa do pré-inóculo, ele já estaria

com todo o aporte enzimático ativo e começaria a produzir os compostos de aroma.” Na tese, orientada pela docente da FEA Gláucia Maria Pastore, quando comparado o extrato de malte, que seria o meio sintético comum de se usar, com o resíduo de bagaço de malte, ambos apresentaram a mesma performance. “Tivemos a visita de um aromista, que ficou encantado com o produto oriundo do extrato fermentado. O aromista já trabalha com a possibilidade de saltar a etapa da purificação”, aborda Daniele, outra desvantagem do processo biotecnológico. “Assim chegaremos mais perto da escala industrial.” O éster, objeto de estudo, foi o hexanoato de etila, o qual possui um intenso aroma frutal. A linhagem, que é o microrganismo (no caso o Neurospora sp.), foi isolado de uma massa de mandioca proveniente do Estado do Maranhão, por ser muito recorrente naquela biota, ao passo que os resíduos agroindustriais partiram de indústrias do interior do Estado de São Paulo. Da manipueira (uma espécie de líquido tóxico originado no processamento da mandioca, que surge na prensagem da massa da raiz da mandioca), sobressaiu um aroma de morango e, do bagaço de malte, um aroma de abacaxi. Isso em grande parte ocorre devido às diferentes concentrações obtidas e a outros compostos formados. Na literatura, o hexanoato de etila tanto pode ser descrito como aroma de abacaxi quanto de banana, maçã, morango e pêssego. Ora pode assumir a característica de uma fruta, ora de outra. “No nosso caso, conseguimos que o buquê geral dos extratos fosse diferenciado”, informa a pesquisadora.

Aplicações Normalmente, o bagaço de malte serve como ração animal, seu principal destino. Aqui ele serviu para alimentar o microrganismo responsável por produzir o aroma. Na verdade, esclarece a doutoranda, vão se esgotando os seus compostos – as macromoléculas, os carboidratos, os lipídios e as proteínas – e, por mecanismos secundários, produz-se o aroma. Em países como a China e o Japão, por exemplo, o hexanoato de etila é adicionado em bebidas como os saquês e licores. Nos dois países, são consumidas, no total, mais de duas mil toneladas do produto por ano, que ainda pode estar presente nas balas, geleias, perfumes e numa série de compostos nos quais se almeja o aroma frutal. Na tese, o bagaço de malte foi escolhido pelo fato de ser o extrato de malte, o melhor meio sintético onde se produz maior quantidade de hexanoato de etila, já a manipueira porque já é muito estudada no Laboratório de Bioaromas e Compostos Bioativos da FEA para a produção de biossurfactantes, compostos de origem mi-

Campinas, 21 a 27 de novembro de 2011

11 Fotos: Antoninho Perri

Daniele Souza de Carvalho, autora da tese: “Com a nossa pesquisa, abrimos um leque para futuras investigações” Frasco com compostos: pesquisadores já entraram com pedido de patente

A professora Gláucia Pastore, orientadora: “A produção de aromas naturais mostrou-se altamente estimulante”

crobiana. Como estava praticamente disponível, conta a autora, tentou-se empregá-la não só para a produção de biomassa, o que já é realizado em alguns estudos no laboratório, mas também para a produção de hexanoato. Daniele e Gláucia Pastore já festejam os bons resultados e acabam de entrar com um pedido de patente – junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) – para proteger o processo de obtenção de aroma. Não havia pesquisa semelhante empregando-se o hexanoato de etila. Falta agora, de acordo com a química de alimentos, se debruçar mais sobre a área de purificação e de ampliação de escala, quiçá usando o microrganismo liofilizado, que aceleraria o processo, já que eliminaria a etapa de pré-inóculo. Esse estudo tem a seu favor o fato de ser conduzido num país de base agrícola, com uma grande carga de resíduo agroindustrial capaz de poluir muito o meio ambiente. “Com a nossa pesquisa, abrimos um leque para futuras investigações com vistas a ampliar os seus usos e diminuir o impacto ambiental, no momento em que estamos reduzindo a carga orgânica dos compostos que estão sendo utilizados pelos microrganismos, além de agregar valor aos resíduos”, realça Daniele. Na opinião de Gláucia Pastore, a sua orientada deu uma clara demonstração de que é factível aplicar conhecimento científico e desenvol-

vimento tecnológico na produção de compostos de importante valor agregado. Além de serem valiosos para a saúde e bem-estar da população, através da agroindústria de alimentos, geram subprodutos que seriam mal aproveitados – como substâncias ou produtos de baixo valor –, descartados inadequadamente em termos de segurança ambiental. “A aplicação da C&T como foi feita nesse trabalho, com a produção de aromas naturais a partir de substratos, mostrou-se altamente estimulante.”

Dia a dia Há algumas décadas, o Laboratório de Bioaromas e Compostos Bioativos da FEA vem se dedicando aos subprodutos da agroindústria brasileira: de cana-de-açúcar, de café, de soja e de cerveja, entre outros. A resposta disso é simples. Existe mundialmente uma preocupação com a biomassa, o quanto dela poderá ser transformado ou biotransformado. “O Brasil, nesse quesito, tem uma série de substratos muito destacados dentro das diversas cadeias alimentares, contudo sem aplicação nobre. Utilizam-se subprodutos como ração ou para geração de energia”, ensina Gláucia Pastore. Ocorre que este material tem potencial de trazer um valor agregado muito alto. São subprodutos para a indústria farmacêutica, aditivos para a indústria de alimentos ou substratos para serem transformados via biotecnologia. “Então o mundo se depara

hoje com isso, e o nosso país começa a pensar nesta direção. A ideia foi localizar esses subprodutos para ver o que gerariam como valor agregado elevado e quais poderiam ser transformados em aromas”, relata a docente. Conforme ela, têm sido testados vários subprodutos. Da cadeia do trigo, pesquisaram-se o farelo de trigo e o farelo de arroz. Prosseguiuse testando, trabalho que envolveu a inoculação de microrganismos, potenciais produtores de aroma de fruta. O próximo passo foi observar o que ia acontecendo. Chegou-se a um substrato muito mal aproveitado e que sequer se desconfiava disso. “Como já estava disponível e tinha uma alta carga de açúcar e proteína, notava-se que era totalmente desperdiçado. Era um resíduo da indústria da cerveja, aquela cevada transformada que seria praticamente jogada ou empregada na alimentação do gado”, descreve. Daniele investigou os resíduos, avaliando a sua viabilidade. Aproveitou para verificar o que continham e foram inoculados alguns microrganismos produtores de aroma. O resultado foi muito bom: conseguiu-se a produção de aromas via biotecnológica – os aromas naturais de morango e de abacaxi, sem ter morango e sem ter abacaxi. O trabalho foi efetuado dentro da linha de pesquisa “Obtenção de ingredientes em compostos bioativos de produtos oriundos de subprodutos da agroindústria brasileira”, dirigida por Gláucia Pastore. Surgiram inclusive as primeiras conversas com as indústrias de aromas e de leite, que pretendem conceber produtos aromatizados naturalmente. Especula-se o seu emprego em iogurtes e leites fermentados. “Pretendemos também auxiliar a indústria de ração, já que o cheiro de seus produtos é um item a ser reconsiderado, por não ser nada agradável”, comenta a orientadora. Como a produção de aroma frutal por microrganismos é considerada natural pela legislação, este apelo vem bem ao encontro da crescente demanda por produtos mais saudáveis.

............................................................. ■ Publicação

Tese: “Produção de aroma frutal por linhagens de Neurospora sp. em meios sintéticos e resíduos agroindustriais” Autora: Daniele Souza de Carvalho Orientadora: Gláucia Maria Pastore Unidade: Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) Financiamento: Capes

.............................................................


12 Jornal daUnicamp Campinas, 21 a 27 de novembro de 2011

O ‘sambão-joia’ pede passagem

P

MARIA ALICE DA CRUZ halice@unicamp.br

aralelo ao cenário marcado pelo samba sofisticado e engajado da MPB, surgiram na década de 1970 outras produções desprezadas pela crítica, entre as quais um samba mais romantizado. Contemporâneo ao requinte de Antônio Carlos Jobim, Chico Buarque, bossa nova, tropicália, entre outros, esse tipo de samba esteve sujeito a indagações por parte de historiadores de música brasileira, mas encontrou espaço importante na indústria fonográfica e na sociedade, desenvolvendo uma produção relevante para compreender os conflitos musicais da década de 1970, na opinião do musicista Adelcio Camilo Machado, autor da dissertação “Quem te viu, quem te vê: o samba pede passagem para a década de 1970”, orientada pelo professor José Roberto Zan . De acordo com Machado, esses cancionistas foram nomeados como sendo de um segmento desprestigiado do samba, rotulado por críticos musicais do período como “sambãojoia”. Dentre eles, encontrava-se o sociólogo Gilberto Vasconcellos, que considerava Benito di Paula, Martinho da Vila e a dupla Antônio Carlos e Jocafi, dentre outros, participantes desse segmento. Esses foram os quatro sambistas escolhidos pelo musicista para serem estudados em sua pesquisa. Para Machado, Vasconcelos olhava para a produção despolitizada dos compositores fazendo uma série de críticas, que, porém, não foram suficientes a ponto de impedir que Benito di Paula e Martinho da Vila superassem Roberto Carlos em vendagem por muitos meses, de acordo com acervo do Ibope visitado por Machado. E muito menos que permanecessem entre os dez mais vendidos durante um ano inteiro. Vendiam, como observou Machado nos documentos, desde compactos simples e duplo a LPs. E ainda puderam aproveitar a catalogação de fitas cassete na época. De acordo com a pesquisa, sua produção é contemporânea de um grande crescimento da indústria cultural e do auge da repressão do regime militar, fatores que modificaram o cenário musical brasileiro, dificultando a entrada de músicas politizadas no mercado, a não ser no caso de artistas já consagrados. Se de um lado a análise musical realizada por Machado revela composições simples, com progressões harmônicas, frases melódicas e até mesmo textuais repetidas, a sociologia revela material importante para entender a produção musical da época, de acordo com as conclusões do pesquisador. E foi com a orientação do sociólogo Zan que Machado percebeu a necessidade de atentar para um objeto que costuma ser colocado à margem da linha evolutiva da música brasileira: o samba romantizado. “O foco da pesquisa é justamente entender que esta produção se liga com discurso cultural, político, simbólico, com todos os conflitos que aconteciam”, explica Machado.

Luta de classes A partir dos anos 1960, era comum identificar uma produção de MPB focada no cenário político, mas uma das constatações de Machado é de que, mesmo num registro de música popular que não tem a ver com a MPB culta (dos universitários), a produção desses artistas também era fruto do cenário político e cultural da época. Um exemplo da simplicidade composicional, observado na análise feita a partir de transcrições dos discos ouvidos por Machado, está na música Você Abusou, de Antônio Carlos e Jocafi, que, além de repetir a frase melódica, repete a frase “tirou partido de mim abusou” por 12 vezes durante os três minutos de duração. Segundo Machado, este grau de repetição supera os cancionistas cultos, que certamente diriam: “Fazemos com variação. Não vamos repetir”. A letra, porém, possui um significado mais profundo ao se analisar a produção musical do período e se constatar os conflitos na área. Quando se inserem na música brasileira, pela porta dos festivais, os compositores já dão um aviso aos autores de samba engajado com o trecho Mas não sei fazer poema ou canção/ que fale de outra coisa que não seja o amor/ se o quadradismo de meus versos/ vai de encontro aos intelectos/ que não usam o coração como expressão. “Por aí, percebemos a luta de classes no interior do campo da cultura.

Eles lançam um samba de sucesso afirmando que estão fazendo samba romântico mesmo, não-intelectualizado.” Mas o fato é que as possibilidades não eram as mesmas para os novos sambistas e os artistas já consagrados. Repetir “tirou o partido de mim” talvez não fosse tão permitido quanto repetir “eu vou só, eu vou só, eu vou só”, de Dorival Caymmi. Ouvir um samba bolerado de Benito de Paula também era diferente de ouvir Dois pra lá, dois pra cá, com João Bosco e Elis Regina, para a classe mais engajada. Já Martinho da Vila foi beneficiado pela divisão de opiniões entre os críticos na década de 1970. “Não encontrei crítica clara ao Martinho da Vila como as que li sobre Benito e a dupla”, revela Machado. Apesar dos percalços de início de carreira, o compositor obteve maior grau de consagração artística. “Para muita gente, Martinho da Vila não é do sambão joia de jeito nenhum, como citara Gilberto Vasconcelos, em seu livro. Muitos acreditam que ele seja um sambista tradicional, que resgata as raízes”, pondera Machado. Mas a própria estreia de Martinho na música também registra passagem importante para mostrar o conflito na MPB no período. Já na primeira faixa do primeiro LP, Martinho emenda três sambas por meio de falas que atuam mais como respostas. A primeira delas diz respeito aos jurados de seu samba Carnaval das Ilusões por não terem entendido as transformações que teria feito no samba enredo da Vila Isabel: “Botar música nessa poesia do Gemeu não foi mole, não! E os críticos meteram o pau no novo estilo de samba enredo, e a Vila perdeu o carnaval. O meu amigo Chico Buarque de Hollanda dormiu. O resto da comissão não entendeu nada. No dia do resultado, eu fiz o meu primeiro samba de protesto”, diz Martinho. Chico Buarque, um dos jurados, também aparece no texto cantado: Caramba, caramba/Nem o Chico entendeu/O enredo do meu samba. “Ele provoca esse pessoal que tinha direito de decidir o que era um bom ou mau samba”, acrescenta Machado. Em entrevista com o instrumentista, arranjador e produtor musical Rildo Hora, produtor de alguns dos primeiros discos do compositor, Machado observou a construção de um “personagem”. Ao contrário de seu primeiro disco, feito de forma artesanal, e do segundo, com uma orquestração mais carregada, ambos exclusivamente autorais e produzidos por Romeo Nunes, seu terceiro disco, já nas mãos de Hora, é composto de 12 faixas, sendo que seis são criações de compositores antigos e já consagrados, como Paulinho da Viola. No quarto álbum, Martinho resgata o partido alto, samba focado nas manifestações afrobrasileiras, atingindo posição de maior vendagem no Ibope. “Martinho vai à Vila Isabel, que foi bairro de Noel Rosa, e constrói toda uma ligação identitária com a comunidade, transformando-se num sambista considerado como autêntico”, explica Machado. Já Benito di Paula, apesar de adotar um procedimento típico da MPB refinada, principalmente em composições como Tributo a um rei esquecido, em homenagem a Geraldo Vandré, exilado na época em que a música foi composta, permaneceu com a fama de um compositor menor. A letra em homenagem a Vandré, na opinião de Machado, é uma mostra que no repertório de Benito também tinham letras que, poeticamente, não deixavam a desejar à linguagem da fresta. “Sabendo que era proibido falar publicamente de Vandré em tempos de ditadura, ele brincou com a letra. E ela de fato não deixa a desejar”, reforça o musicista. Outra canção gravada por Benito que driblou a censura foi O bom é o Juca, composta num período em que o discurso oficial exaltava a figura do presidente Garrastazu Médici. “Esse samba narrava os benefícios que a comunidade teria quando esse Juca fosse presidente. Contudo, para não ser vetada, ao final, sua letra diz que o Juca deve ser presidente, mas da escola: Muita coisa pode acontecer / o bom é o Juca e tem que ser / presidente da escola”. Mesmo assim, Benito recebeu críticas explícitas, principalmente quando comandou o programa televisivo Brasil Som75 na Tupi. A revista Veja, na época, chegou a sugerir que o formato era ruim e tinha a “presença insossa” do compositor Benito di Paula. Apesar de não demonstrar descontentamento com as opiniões contrárias e de os índices do Ibope estarem sempre a seu favor, Benito parece responder em uma de suas letras: Deixa essa gente falar/é inveja que eles

sentem/ canto mais um samba/que é pra todo mundo ver/a minha bandeira do samba/Deus ajuda a defender. Alguns críticos, como Sérgio Cabral, chegam a valorizar os sambistas da época. Na abertura de uma entrevista com a dupla Antônio Carlos e Jocafi, publicada no Jornal O Pasquim, o crítico arrisca: “Muita gente fala que Antônio Carlos e Jocafi têm uma fórmula para compor as músicas. Ouvi e não achei fórmula nenhuma. Agora eles estão com a palavra”, opina. Diante da oportunidade, então, a dupla não hesitou em responder às críticas: “Fórmula? Então venham ver quando estamos compondo para ver se tem fórmula. Fórmula coisa nenhuma. Duvido que algum escritor gosta de ver seu livro parado na prateleira. A gente é profissional”, posicionam-se.

Diversidade Quando chega a censura e, logo em seguida, a indústria cultural, dois tipos de reação são manifestados, de acordo com os documentos analisados por Machado. Por um lado, o da MPB, que tenta injetar uma crítica política, e, por outro, o da despolitização da canção. A partir de então, o referencial de legitimidade não fica somente na questão política. “Nesse momento, Martinho não faz um samba nacional como fez Ary Barroso, mas um samba da Vila Isabel, que tem a identidade daquele grupo”, revela Machado. Assim como Antônio Carlos e Jocafi, cancionistas da Bahia, também não estão pensando em fazer música nacional-popular, que leve à revolução nacional, mas estão fazendo a música do ijexá ou do candomblé. A produção dos sambistas ajuda a perceber algo como uma crise da nação na década de 1970, que joga por terra a ideia de unidade e leva a uma fragmentação em identidades específicas locais, segundo o musicista. “Nesse momento, o que compõe o Brasil passa a ser a diversidade”, acrescenta. Até mesmo a Aquarela Brasileira, de Silas de Oliveira, interpretada por Martinho, trata de uma nação regionalizada, enaltecendo as belezas diversas de seus estados. Em Ary Barroso, a letra enaltece um Brasil unificado. Mesmo defendendo a proposta de um samba romântico, logo na chegada, a dupla Antonio Carlos e Jocafi, assim como Benito di Paula, tentava se aproximar da MPB, segundo Machado, principalmente por meio da figura da cantora Maria Creuza, na época esposa de Antônio Carlos, uma das intérpretes de composições de Vinícius e Toquinho, na década de 1970. Conforme constatado pelo musicista na análise, mesmo fazendo sambão-joia, Antônio Carlos e Jocafi não davam tratamento melodramático, mas usavam intimismo e delicadeza. Outra característica de suas composições, observadas por Machado, é a relação entre elementos nacionais e internacionais, pois, além das tradições baianas, a dupla também incorporou elementos de rock e soul em suas peças, apesar de os grandes sucessos terem sido alcançados por canções que apresentam “brasilidade”. Em Benito di Paula também é possível perceber a intenção de se aproximar da MPB, principalmente quando escreve letras como a de Banda do Povo, quando, ao se referir a Chico Buarque, afirma: “Esse amigo, camarada, sabe do meu paradeiro / eu confesso, de verdade, sempre fui seu companheiro”. Em algumas de suas composições também é possível identificar relações entre nacional e internacional, segundo Machado. Ele acrescenta que mesmo tendo sido apontada a escolha de Benito pelo gênero ligado à brasilidade, a partir do terceiro LP, Benito trazia a experiência como crooner em boates paulistas, recheando seus sambas de elementos de um romantismo de massa com características de pop romântico internacional, representado por baladas italianas, boleros e chá-chá-chás. “A produção de Benito está mais ligada ao entretenimento que ao processo de intelectualização do repertório que culminou na MPB da década de 1960. Por isso sua música foi rotulada como sendo de ‘mau gosto’ por alguns críticos”, explica Machado. Para o musicista, não se pode comparar o piano de Benito di Paula com o de Antônio Carlos Jobim, que teve a oportunidade de uma formação em escola de música, mas não se pode negar a participação de todos os artistas na linha evolutiva da música popular brasileira, principalmente num período tão conflituoso como a passagem da década de 1960 para a de 1970.

Antonio Carlos e Jocafi, Benito di Paula e Martinho da Vila: na linha evolutiva da música popular brasileira? Fotos: Antoninho Perri/Reprodução

O musicista Adelcio Camilo Machado: desmitificando conceitos consolidados

........................................................... ■ Publicação

Dissertação: “Quem te viu, quem te vê: o samba pede passagem para a década de 1970” Autor: Adelcio Camilo Machado Orientação: José Roberto Zan Unidade: Instituto de Artes (IA)

...........................................................


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.