Galeria

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RESTAURAÇÃO

ALERIA

A produção artesanal de instrumentos se mantém em Porto Alegre, mas é um serviço para poucos

PÁGINA 2G Juliana de Gonzalez/JM

ODEON Boemia e cultura no centro

Bar que substituiu o clima do Bom Fim dos anos setenta sobrevive com um público renovado e fiel, prestigiado por músicos como Plauto Cruz

Gabriela Bordasch/JM

PÁGINA 6G

Cuba ensina cinema ao mundo A Escuela Internacional de Cine y Televisión nasceu do grupo de Gabriel García Márquez

PÁGINAS 4G E 5G


2G

Cultura

Jornal da Manhã / Galeria Fotos: Mariana González/JM

Biblioteca Pública aguarda restauração

Diretora quer abrir parte do prédio para atividades culturais ainda este ano

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■ mariana GONZÁLEZ

o completar um século do início de sua construção, o prédio na esquina das ruas Riachuelo e General Câmara, no Centro de Porto Alegre, encontra-se repleto de móveis antigos empilhados, caixas e poeira. A Biblioteca Pública do Estado do Rio Grande do Sul, após concluir a primeira etapa de sua reforma e restauração, aguarda a liberação dos recursos que permitirão a conclusão do trabalho. A primeira parte, iniciada em 2009, lidou com a estrutura: recuperação da fachada, da calçada e dos pisos e entrepisos, tubulação que receberá a parte elétrica e problemas de infiltração, além da estabilização da pintura do Salão Egípcio. “Como nosso projeto era muito antigo, e havia sido encaminhado ao Ministério quando ainda não havia um sistema informatizado de acompanhamento, nos sugeriram que concluíssemos essa etapa, fizéssemos a prestação de contas e entrássemos com uma nova proposta, com valores atualizados”, esclarece a diretora da Biblioteca, Morgana Marcon. Essa proposta já foi aprovada e, atualmente, passa por uma análise técnica no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). “Depois, o projeto vai para uma análise de custo e, após recebermos o ‘sim’, podemos captar os recursos. A princípio, está tudo certo para a aprovação”, diz a bibliotecária. A segunda etapa tratará da recuperação dos ornamentos e das pinturas murais, além

Acervo histórico pode ser acessado por pesquisadores; acima, o Salão Egípcio quase pronto

de implantar acessibilidade, fiação, sistema ser totalmente concluída em cinco anos, e a de climatização e de segurança para o acer- abertura da Biblioteca deve acontecer daqui vo e para o prédio – um investimento total a, no máximo, dois anos. Mas a bibliotecária de R$ 14 milhões. “As pinturas, os adornos, planeja abrir alguns espaços ainda em 2012 a recuperação dos lustres, são muito caros”, para a realização de eventos culturais: “Preexplica Morgana. Ela destaca a importância tendemos reabrir o Salão Mourisco, no sedo cuidado com as obras originais, mostrado gundo andar, mesmo com as obras em andadesde o início do trabalho: “Buscamos resga- mento. Este é o ano do centenário (do início tar as formas originais do prédio, utilizando da construção) do prédio; queria abrir alguinclusive os mesmos materiais da construção ma coisa este ano, para comemorar. Estamos original.” A madeira necessária para restau- batalhando por isso.” Enquanto não abre, o rar uma pequena parte do piso danificada por serviço funciona, de forma reduzida, na Casa cupins, por exemplo, foi encontrada no Mato de Cultura Mario Quintana. Grosso; já o vidro trabaO edifício, tombalhado das janelas foi addo como patrimônio A equipe procurou histórico em 1982, não quirido de uma empresa paulista e, por não ser resgatar as formas permite que a Bibliotemais fabricado no tom Pública cresça; por originais do prédio ca de verde necessário, foi isso, além da reforma e tingido em Canoas. “Se da restauração do précompararmos um ao lado do outro, nota-se a dio antigo, as obras acrescentarão um prédio diferença, mas não no todo. Aproximamos o anexo, onde passará a funcionar o setor de máximo possível da cor original.” empréstimos. Ambos os prédios serão acessíO prédio neoclássico, mas combinando di- veis a pessoas em cadeiras de rodas, terão sisversos estilos e com grande influência do po- tema de segurança para o edifício e o acervo, sitivismo, começou a ser construído em 1912 e climatização. “O anexo ficará com a parte e, até hoje, não havia passado por uma re- moderna da Biblioteca: o acervo geral, o seforma tão grande. A primeira etapa da cons- tor de empréstimos, o setor braile, o acesso trução do prédio, desenhado especialmente à internet gratuita. O antigo vai virar uma “bipara a Biblioteca, foi concluída em 1918, mas o blioteca-museu”, e abrigará o setor de obras então diretor Victor Silva não achou que o lo- raras, o acervo antigo (adquirido para a inaucal atendesse às necessidades da instituição. guração da Biblioteca) e o setor sobre o Rio A inauguração finalmente aconteceu em 7 de Grande do Sul”, conta Morgana. A Biblioteca setembro de 1922, durante as comemorações possui mais de mil volumes catalogados em do centenário da Independência do Brasil. seu acervo de obras raras, como os manusSegundo Morgana, a restauração deve critos de peças de João Simões Lopes Neto

e primeiras edições de diversos autores gaúchos. O exemplar mais antigo no acervo é o latino Farsália, de 1518. A ideia inicial era que as obras estivessem concluídas em 2011, apenas dois anos após seu início. Mas, por ser um prédio antigo, ele é, como define Morgana, “uma grande caixa de surpresas”: os danos eram muito maiores do que os previstos. Foi necessário, também, contornar algumas faltas de cuidado, como a pintura de branco sofrida por alguns bustos de mármore que contornam a fachada e uma placa encravada sobre uma pintura mural. Estas são algumas das dificuldades em trabalhar com um edifício tombado. “Não pudemos colocar tinta anti-pichação na fachada, pois ela não deixa as paredes respirarem. Não pudemos instalar nada no teto, nem câmeras de segurança, por causa das pinturas”, explica. Outro obstáculo a ser enfrentado é o pouco recurso disponível para o setor de cultura. Para complementar o recurso da Secretaria de Cultura do Estado, a Biblioteca conta com sua Associação de Amigos e com o envio de projetos para editais. Mas um problema ainda presente é a falta de profissionais: são apenas três bibliotecários e, para manter o novo espaço em funcionamento, serão necessários, pelo menos, mais quinze. “Não vamos ter condições de manter dois prédios com uma equipe reduzida. Precisamos de uma equipe qualificada”, ressalta. A diretora espera que saia um concurso para bibliotecários, para gerentes administrativos e para outros cargos necessários, como jornalistas, para que a Biblioteca volte a ser referência para o Estado.


Arte de rua

Jornal da Manhã / Galeria

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No meio do caminho tinha um indiozinho Protesto silencioso e anônimo na cidade integra a população com a cultura indígena através do personagem Xadalu

Leandro Abreu/divulgação

■ bÁRBARA SOUZA

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mensagem através de arte que é o que melhor eu sei fazer. Foi o jeito que eu encontrei de fazer alguma diferença”, enfatiza. Os milhares de indozinhos produzidos mensalmente são feitos em todos os momentos livres que o idealizador tem. Em uma gráfica improvisada nos fundos da sua casa, quando o serígrafo não está reproduzindo a imagem em larga escala, ele pensa em novas customizações para dar sempre uma cara diferente ao personagem. Existem Xadalus grandes, pequenos, coloridos, em preto e branco, de touca, com máscara de oxigênio e de óculos. Há um ano o indiozinho ganhou uma “namorada” estampada em alguns adesivos do protesto. Com paciência, o criador assegura que não se importa com o fato da população em geral não saber que aqueles adesivos bacanas significam tanto. Quando perguntado sobre o possível reconhecimento do Xadalu pelos indígenas da capital, o publicitário não se engana e sabe que a maioria não o reconhece, mas para ele, essa ainda é a graça. “No momento certo vão saber e aí veremos a força do Xadalu”, ele aposta que o tempo vai trazer a intensidade de sua iniciativa Como o indiozinho já conquistou o carinho de vários jovens da Zona Sul de Porto Alegre, não é só o publicitário e idealizador do projeto que espalha a iniciativa. Amigos e admiradores do protesto contribuem pra disseminação da ideia. A demanda foi tanta que hoje já é possível comprar um kit Xadalu com adesivos e outros acessórios. O pacote está sendo vendido na Arte Loja, do Centro de Cultura Mario Quintana, na Capital. Em uma página no Facebook que se chama Xadalu Preserve a Natureza, e em um perfil chamado Xadalu, você pode encontrar informações.

uita gente já viu, outros, nunca perceberam. Mas eles estão pelas ruas de Porto Alegre, principalmente entre a área central da cidade e a Zona Sul. O Xadalu é um adesivo em forma de índio. O personagem, curiosamente, vai bastante além da arte de rua e é um consolidado protesto silencioso. Os decalques estão afixados pelos principais bairros da Zona Sul em grande quantidade. Também nesta região da cidade mora um rapaz de 28 anos, serígrafo, designer gráfico e publicitário. Ele é um “não-índio” de classe média alta e criador do protesto. Não contar quem ele é, é uma das exigências para se saber mais sobre o protesto. Para o publicitário, que não divulga seu nome nem mostra publicamente o rosto, o maior segredo é exatamente esse mistério. “Quando o movimento for descoberto pela população, vai se tornar algo muito mais vivo e presente na vida das pessoas do que se elas soubessem de tudo desde o começo”, conta ele, que define o “tudo” como a ideologia gigantesca por trás de cada adesivo. Duvida que caiba tanto em uma imagem? Ele não. O índio Xadalu foi criado na infância do designer que, anos depois, amadurecido o projeto, transformou-o em algo real. A proposta é despertar a curiosidade através da presença visual do personagem, para depois, sim, conscientizá-los sobre um acontecimento lento que ele chama de “destruição da cultura indígena”. Sem nenhuma ligação com entidades ou com os indígenas portoalegrenses, o Xadalu (que é não só o nome do personagem, como também a forma como o idealizador do protesto se denomina) é alguém que, preocupado com a forma como os índios são vistos pela sociedade “branca”, fez aquilo que estava ao seu alcance. “Como eu já trabalhava com a pregnância visual e comunicação em massa resolvi passar essa

Os estêncils são afixados pelo seu idealizador

Encontro com a poesia fora dos livros

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s intervenções artísticas criam uma nova maneira de ter acesso à literatura. Um estilo alternativo de ler um poema na cidade de Porto Alegre. Com pouco mais de seis meses, o projeto chama a atenção na capital. O Rastro Urbano de Amor (RUA) surgiu com a intenção de seguir os passos de algumas atividades urbanas que aconteceram em São Paulo. Heloisa Medeiros, idealizadora do grupo gaúcho, afirma que viu no Youtube as manifestações paulistas e decidiu trazer essa iniciativa para o Sul. O coletivo artístico tem princípios apolíticos: “não tem idealismo político, é uma ação entre amigos para chamar a atenção de maneira poética e simbólica. Aqueles monumentos que estão depredados, que são alvos de pichação precisam de um olhar com amor. Amor naquilo que é frio, naquilo que é cinza”, fala Heloisa. O RUA apresentou suas ideias em três oportunidades na cidade. No Aqui Bate um Coração, corações foram espalhados em pontos conhecidos para mostrar que cada local histórico merece ser cuidado. A Praça da Alfândega foi um exemplo. Na Serenata Iluminada, uma reunião foi realizada no Parque Farroupilha à noite para um sarau. E a Po esia Ex-pressa buscou levar frases de poemas

Katherine D’Ávila/JM

■ AIRAN ALBINO

famosos, ou coisas simples que fizessem as pessoas que geralmente estão apressadas pararem para observar os escritos feitos com giz de cal. Esse material se dissolveu na primeira chuva. Atualmente, o grupo de amigos ganhou um espaço para centralizar seus projetos, na Casa de Cultura Mario Quintana. O ambiente é no 5º andar do prédio, a Casa da Cultural Digital. Conforme Vinícius Russo, que participa das intervenções, o novo centro é um laboratório de vivências, onde nenhuma ideia se perde.

A vez do governo Em 1991, o então vice-prefeito de Porto Alegre, Tarso Genro, voltava de viagem de Londres. Lá pôde notar algo que se destacava na cidade: poemas nos metrôs. Logo trouxe a ideia para o Brasil. Então, no ano seguinte, a Secretaria Municipal da Cultura implantou o Poemas nos Ônibus. Um concurso literário que premia os melhores poemas, publicando -os nos coletivos da cidade. O início foi tímido devido à falta de apelo popular, mas com o os anos passou a ser referência nacional, conforme o ex-coordenador Fernando Rozano. Já na segunda vez houve um salto de participação. Lucia Jahn, atual coordenadora do projeto, diz que a cada

O poema passa por um rigoroso processo de seleção antes de chegar à janela do coletivo ano o concurso cresce mais. “Muitos contam que nunca tinham escrito, mas acharam que poderiam ousar”, afirma Lucia. No primeiro semestre do ano acontece o período de inscrições e na metade do segundo a premiação dos poemas selecionados. Nesse ano foram feitas 95 inscrições pessoalmente ou pelo correio e 980 pela internet. Cinco jurados de diferentes segmentos avaliam os poemas. 57 já foram escolhidos. O comitê de avaliação de

2012 é formado pela produtora cultural Márcia do Canto, o compositor Zé Caradípia, a produtora-executiva da Câmara do Livro Jussara Rodrigues, e pelos escritores Caio Riter e Sergio Napp. Todos os anos a SMC lança um livro com os poemas selecionados, na Feira do Livro de Porto Alegre. A previsão do órgão é de que no começo de 2013 os transportes coletivos recebam os novos poemas.


4G

Especial

Jornal da Manhã / Galeria Gabriella Bordasch/JM

Cinema em

Cuba

atrai jovens de todo o mundo Parceria de instituição cubana e Ministério da Cultura ajuda a despertar interesse de brasileiros O primeiro ano da graduação é polivalente, abrange todas as especialidades

■ GABRIELLA BORDASCH

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Enviada Especial/Cuba

tras escolas do mundo”, destaca. O que também agrada, não só aos brasileiros, mas aos estudantes em geral, é o fato de a escola estar na zona rural de San Antonio de Los Baños. A organização está localizada em uma área de 40 hectares, em meio a palmeiras, e muita área verde. “Os alunos estão imersos aqui, vivendo e respirando o cinema. Não há forma de perder o foco”, acredita o diretor Rafael Rosal. Tudo o que eles precisam, tem na escola. O maior atratativo, sem dúvida, é a midiateca André Bazin (o nome é uma homenagem ao cinestas francês), uma das mais completas da américa latina. Os estudantes tem à disposição milhares de títulos de curtas e longas metragem de ficção e documentário, produzidos em todas as partes do mundo. A escola conta também com duas salas de cinema. A principal, cujo nome homenageia o cineasta bahiano Glauber Rocha, que foi um entusiasta da EICTV no Brasil, é onde acontecem shows, reuniões, exposições e, claro, exibições dos clássicos do cinema. “A escola tem áreas que diversificam e estimulam o processo criativo de estudantes e profissionais”, assegura Rosal.

Gabriella Bordasch/JM

Cineastas deixam registro nas paredes Gabriella Bordasch/JM

prestigiada Escuela Internacional de Cine y Televisión (EICTV), que tem sua sede em San Antonio de Los Baños, a cerca de 30 quilômetros da capital Havana, em Cuba, cada vez mais chama a atenção dos brasileiros. De acordo com o diretor, o guatemalteco Rafael Rosal, esta é a nacionalidade que, por ano, recebe mais diplomas da instituição. “É muito bom tê-los aqui. Eles têm diferenciais. São alegres, criativos, e se integram muito facilmente”, conta ele. Só neste ano, aproximadamente 300 jovens participaram do processo seletivo do governo federal para tentar uma vaga na escola cubana. Destes, oito conseguiram bolsa. O Ministério da Cultura do Brasil mantém uma parceria com a EICTV desde 1990. Não há outra forma de ingresso no curso regular, que tem a duração de três anos. O custo para estudar cinema em Cuba é de cinco mil euros por ano, incluindo hospedagem, alimentação e assistência médica básica. O valor é subsidiado pela Secretaria do Audiovisual. A cada ano, a escola recebe 40 novos alunos para suas sete especialidades: realização de filmes de ficção, documentário, roteiro, produção de fotografia, som, montagem e, iniciado em 2012, o mais novo curso, TV e novas mídias. Mas por que estudar cinema na ilha dos irmãos Castro? Para o gaúcho Eduardo Resing, de 24 anos, estudante do curso regular, em primeiro lugar, o prestígio da escola está no núcleo em que ela foi fundada. Há 25 anos, o escritor colombiano Gabriel García Márquez, o cineasta argentino Fernando Birri e o teórico cubano Julio Garcia Espinosa uniram forças junto ao comitê de cineastas da América Latina, que também contou com o apoio do governo cubano. O renomado grupo tinha como objetivo montar uma escola onde estudantes de diversos países latinos, da África e Ásia pudessem se reunir e, através do cinema, dar voz a esses povos do terceiro mundo. A proposta buscava aprimorar o patrimônio do “novo cinema latino americano”, que teve início nos anos 60. A chamada escola de todos os mundos atualmente recebe alunos de qualquer continente, surgiu em dezembro de 1986 como uma organização não governamental e até hoje recebe doações de todas as partes. “É emocionante. Cada pedaço deste lugar me remete aos personagens ilustres que já pas-

saram por aqui”, afirma Eduardo. Ele se refere a nomes famosos do cinema como Francis Ford Coppola e Steven Spielberg, que já foram apresentar trabalhos inéditos no auditório da EICTV. A maioria dos estudantes já tem uma formação. Eles buscam uma atividade para aprimorar o currículo. Além de Eduardo, graduado em cinema pela Universidade Federal de Pelotas, os outros sete brasileiros, que fazem parte do time de alunos da escola que vai pegar o canudo em 2015, partilham da mesma opinião: a troca de conhecimento com pessoas de diversos lugares é o grande ponto positivo. “Fazemos amizades e contatos para a vida inteira. Quem sabe um dia não possamos fazer coproduções com profissionais de outros países?”, imagina a paulistana Sálua de Oliveira, de 25 anos. Formada em jornalismo, ela hoje sonha em ser sonidista de grandes produções. Inclusive esta é a especialidade da casa: o curso de maior reconhecimento internacional é o de técnico de áudio. “Falta sonidista no mercado cinematográfico. Quero poder ir pra outros países também quando sair de Cuba. A EICTV tem parcerias com ou-

Jovens de diferentes estados brasileiros dizem estar empolgados para viver os próximos três anos na escola cubana


Especial

Jornal da Manhã / Galeria

5G

Fotos: Gabriella Bordasch/JM

No salão amplo da Escuela Internacional de Cine y Televisión, é onde os alunos socializam e trocam experiências. Dezenas de nacionalidades circulam pelos corredores

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ão cinco e meia da tarde, começam os primeiros sons inconfundíveis de latinhas se abrindo para o brinde. Os mais ousados optam por “shots” de rum ouro da famosa garrafa de Havana Club. Depois de um dia pesado de aulas, gravações e calor intenso em San Antonio de Los Baños, nada mau relaxar no saguão “geladinho” da Escuela Internacional de Cine y Televisión (EICTV). No espaço amplo, envidraçado, com vista para toda área verde da fazenda onde fica a escola, os alunos se reúnem para esperar a hora do acesso à internet – das 18h às 8h funciona a rede wi-fi somente no saguão do prédio principal. O estudantes são um fenômeno à parte. Mesmo sem ter vivido estas épocas, a comunidade instalada na escola é uma mescla entre hippies e beatniks. Do estilo às ideias, em uma primeira olhada, os jovens que por ali circulam parecem aderir a movimentos antimaterialistas e levantar bandeiras da contracultura. O que não provoca aversão por produtos da Apple. Com seus macbooks e iphones da última geração, os intelectualóides sentam-se nas poltronas confortáveis de ferro e pano junto às mesas espalhadas pelo prédio, próximo ao bar 24 horas, onde ocorrem os happy hours diários.

Depois das aulas, rum ouro As peculiaridades da Escuela propiciam momentos lúdicos e únicos aos alunos

Goles e Google Entre um gole e outro de Bucanero ou Cristal, as duas únicas cervejas do país, ambas estatais, pesquisas no Google e gargalhadas nos chats das redes sociais. As ganas de falar com o mundo externo se dá principalmente pela dificuldade de comunicação. A globalização, que parece tornar os países cada vez mais próximos, às vezes dá sinais de não ter chegado naquela ilha do Caribe. A internet não pode ser pior. É comparável à discada a partir de um modem. Aquela que as gerações Y e Z talvez nunca tenham ouvido falar, que se usava há mais de 15 anos. A espera para mandar qualquer arquivo, como uma foto que expresse toda a felicidade de estar naquele lugar, parece eterna. Dificuldades tecnológicas à parte, os jovens parecem não se importar muito, já que fazer parte daquele grupo de pouco mais de 300 alunos é literalmente um sonho. O lugar é completamente inusitado. Quem imagina estudar cinema na zona rural de um país socialista, em uma escola que mais parece um sítio dos anos 60? Porém, a estrutura, na medida do possível, vai além da necessidade dos cursos. Tem até uma piscina olímpica e quadras de esporte, onde três vezes por semana um professor dá aulas de Tai Chi. Tudo para deixar o público “de todos os mundos” mais

Alunos têm ônibus disponíveis uma vez ao dia para buscar inspirações na capital Havana

Frases revolucionárias e alusivas ao socialismo estão espalhadas pelos prédios da Escuela à vontade possível. E é impossível não amar San Antonio de Los Baños. Às sextas-feiras, aquele mesmo bar que abastece happy hours vira o point das festas. Até que, com muita responsabilidade, os hi-

ppies e beatniks do século 21 procuram não anarquizar o ambiente, já que entorpecentes não são permitidos e, se forem pegos usando, seriam imediatamente expulsos. De qualquer forma, tudo aquilo é tão surreal, que até

a droga mais pesada não traria o efeito do que é a realidade da Escuela. Também no dia em que a balada paz e amor – com muito amor, diga-se de passagem – se alastra pelos corredores do prédio mais hipster de Cuba, os estudantes costumam encomendar comida dos pequenos restaurantes familiares de San Antonio. Conhecidos como “Paladares”, estes estabelecimentos privados, acomodados na sala das residências cubanas, existem desde antes da revolução, só que de forma clandestina. Após a queda da União Soviética e consequentemente a crise no país dos Castro, o governo se viu obrigado a fazer algumas reformas econômicas, entre elas legalizar este tipo de atividade. Desses lugares os jovens pedem lagostas ou camarões, abacate, arroz “moros e cristianos” (feijão e arroz misturados, bem sequinho, uma delícia!) e banana frita. Tudo a preço de... banana frita. Os pratos custam em média 5 dólares. A tele-entrega mais 4 dólares. Mas esqueça a imagem do motoqueiro de capacete entregando pedidos como prevê o protocolo. Eu nem conseguiria imaginar algo do gênero, até porque tudo ao redor dos cerca de 111 km2 na ilha é peculiar aos nossos olhos. Quem leva lagostas à EICTV é uma mulher que faz do próprio carro um táxi – hoje também permitido – e ganha a vida buscando e levando os alunos a Havana. Na realidade, eles inventaram este serviço na pequena cidade: ligam para a taxista que entrega as viandas e faz o delivery. Este é um dos poucos luxos que os estrangeiros se proporcionam, já que o refeitório, única opção grátis para alunos e funcionários, é reclamação quase unânime. Dependendo da boa vontade de cada um, três dias seria o suficiente para só o cheiro do grande salão provocar náuseas. Mas o médico da escola garante que a comida é feita sob maior rigor de higiene e que os produtos são de boa qualidade. Como qualquer fazenda que se preze, lá também tem uma horta de onde saem as verduras e legumes que vão parar nas mesas do refeitório. Nas proximidades da organização tem ainda um grande pomar de laranjas que costuma atiçar fetiches dos estudantes. A fazenda com brisa caribenha também tem ares afrodisíacos, segundo quem a habita. A bem da verdade, é que ficar três anos enclausurado naquela atmosfera cinematográfica faz com que, em algum momento, os jovens sintam-se no direito de serem protagonistas da própria história de amor. E na maior parte das vezes, para o desgosto de Fidel Castro, essas histórias parecem clichês de Hollywood. Uma ou outra, como as que começam nos laranjais, é que estão mais para Cinema Cubano. (G.B.)


6G

Retrato

Jornal da Manhã / Galeria Fotos: Juliana de Gonzalez/JM

■ juliana de GONZaLEZ

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assar pela Andrade Neves à noite é uma tentação para os amantes de boa música. Na pequena rua, no centro de Porto Alegre, há um reduto de jazz, MPB, choro e tango: o famoso Bar Odeon. Inaugurado em 25 de outubro de 1985 por iniciativa de três amigos, o Odeon segue o estilo semelhante ao de estabelecimentos presentes em Buenos Aires, Montevidéu e Rio de Janeiro. “E mantém esse estilo até hoje”, assegura o proprietário Celestino Santana. Advogado aposentado, o “Tino” para os mais íntimos, é o único dos fundadores que “toca” o bar até hoje. Ainda assim, ele conta com a ajuda do gerente Adalberto e dos garçons Tom e Ramírez, que servem o chope e as cervejas artesanais, além do famoso bolinho de bacalhau. A decoração do Odeon permanece inalterada desde sua fundação. Em 2005, foi introduzida a música com uma pequena reforma no palco e colocação do piano. A proposta é baseada no jazz tradicional e outros estilos musicais como MPB, tango e choro. “O choro é que a gente não tem executado mais aqui porque o nosso grande músico do choro, o Plauto Cruz não toca mais, embora a gente mantenha laços com ele”, destaca Celestino. “Aqui tocam só os grandes músicos de Porto Alegre, só os mestres”, enfatiza. Dentre eles, pode-se destacar Luis Mauro Filho, Dionara Schneider, Ivone Pacheco, entre outros. O repertório musical progressivamente rendeu fama ao Odeon. “No início era só para nós (donos), mas o empreendimento ganhou dimensões de negócio, com intenção mais profissional e cultural. A gente tem obrigação de manter o bar, pois ele é tradicional, está inserido no circuito e por desenvolver a cultura na cidade”. A música permitiu ao Odeon ganhar este ano, pela terceira vez consecutiva, o concurso Veja de melhor bar musical. “Bastante interessante para nós”, vangloria-se Celestino. O local também já foi recomendado no exterior. “Um músico de Buenos Aires veio aqui esses dias e disse que indicaram o bar para ele”. Além das ilustres presenças musicais, o bar também possui músico de casa, o próprio dono. Celestino canta e toca clarinete. Com timidez ele ressalva que é amador, mas a beleza de sua voz é inegável. Tanto que, vez por outra, é convidado pelos clientes para cantar ou tocar em seu próprio bar. Também é convidado para embalar festas de amigos. Toda essa atmosfera atrai intelectuais, músicos e boêmios de todas as idades. “Metade do público são pessoas mais velhas e metade jovens bem distribuídos. Os públicos se comunicam bem. Tem um tipo de jovem que estabelece relação com gente mais velha até por causa da música. A gente verificou que os jovens gostam de jazz, MPB e tango”, comenta Celestino. “A marca do bar é o clima. Existe uma relação entre as pessoas, bons papos, boas conversas. A gente tem uma relação amistosa com os clientes”.

ODEON

O aniversário do Odeon em outubro deste ano atraiu frequentadores, grandes músicos, presenças ilustres e a volta de boas recordações

27 anos de música e boemia

um carro de vidros escuros sobe em cima da calçada e para em frente ao Odeon. A porta do passageiro se abre e é possível distinguir a imagem de um senhor. Várias pessoas vão em direção à entrada do bar recebê-lo. Para surpresa de todos, Plauto Cruz aparece para confraternizar o aniversário do Odeon. Na companhia do flautista estava Ivone Pacheco, a dama do Club de Jazz Take Five. Outro belo dueto se formou. Ivone no piano e Plauto Cruz na flauta e voz. Celestino viu o retorno do grande músico do choro ao seu bar.

Plauto Cruz na música brasileira

Festa marca mais um ano de Odeon Os 27 anos dessa amizade foi comemorado em grande estilo. O bar recebeu muitos clientes no dia 25 de outubro. Ainda no final da tarde, a maior parte das mesas já estavam cheias e, em torno das 19h30, já não havia mais lugar para sentar. Às 21h15 chegou o trompetista Luiz Fernando Rocha, do grupo Jazz 6, do qual faz parte o escritor Luiz Fernando Verissimo, como saxofonista. A cada instante mais gente chegava. A iluminação branca cedeu lugar à amarelada, dando o clima ideal para os duetos que estavam por vir. Para prestigiar o evento apareceu Dionara Schneider, que tocou piano junto a Luiz Fernando Rocha. A música estava boa, os garçons corriam para atender os frequentadores que não paravam de chegar e pedir mais chope, cerveja e bolinhos de bacalhau. A noite prometia se estender. Todos julgariam que não poderia ficar melhor. De repente,

O Odeon atrai públicos de diferentes idades

Plauto Cruz e Dionara Schneider no Odeon

Tino Santana, proprietário do Bar Odeon mostra o seu talento ao lado do pianista Paulão

Natural de São Jerônimo, a 67 quilômetros de Porto Alegre, Plauto Cruz é um dos maiores flautistas brasileiros. Realizou diversas turnês pelo Brasil e exterior, especialmente em shows de chorinho e samba. Na capital gaúcha, participou de vários programas de rádio na Rádio Gaúcha, Difusora, Itaí e, por último, na Farroupilha. Ganhou 60 troféus e já gravou mais de 40 LP’s com grandes músicos brasileiros, como Lupicínio Rodrigues, Nelson Gonçalves e outros.

Os pais também podem se divertir ■ SABRINA SIMÕES Os pais querem relaxar. As crianças querem se divertir. Quem tem filhos sabe que esta combinação nem sempre dá certo. Até pouco tempo atrás, lugares de crianças e de adultos eram bem definidos – e muito diferentes. Frequentar restaurantes, cinemas e até bares era tarefa impossível para aqueles que tinham filhos pequenos e queriam fazer um passeio em família. Nos últimos anos, alguns pais, incomodados por terem que deixar de fazer seus programas favoritos por não poderem levar seus filhos, começaram a mudar esta cultura. Foi o caso de Irene Nagashina, cinéfila que após o nascimento do primeiro filho se viu obrigada a abandonar seu hobby favorito. “Nos primeiros meses de maternidade vivemos entre fraldas e mamadas, a nossa vida é a vida do bebê. Por mais encantador que seja, nos isolamos do mundo e esquecemos dos interesses que tínhamos antes. É importante trazer a mãe de volta ao convívio cultural”, conta Irene. Surgiu então a

idéia do Cinematerna, sessões de cinema especiais para pais com bebês de até 18 meses, que contam com uma estrutura diferente para o conforto dos pequenos – ar condicionado fraco, luz suave, volume mais baixo, além de trocadores para as inevitáveis emergências. Tatiana Araújo buscou alternativas de diversão desde que sua filha tinha dois meses de vida. “Antes de engravidar eu tinha uma visão mais pessimista em relação à minha vida social depois do nascimento da Júlia. Imaginava que as mães tivessem que esquecer completamente seus programas até o filho ter idade suficiente para poder participar”, lembra Tatiana. Mas conversando com outras mães e pesquisando na internet, ela descobriu que não são poucas as opções. “Vou pelo menos uma vez a cada duas semanas ao cinema, continuo frequentando restaurantes e até em happy hour já fomos”, diz a mãe, que se refere ao projeto Bebe Social, que em maio deste ano promoveu um encontro para pais com bebês em um bar de Porto Alegre.

Em outubro chegou outra novidade na cidade: a Dance Kids, “balada” para crianças de 1 a 10 anos, inspirada em festas como a americana Baby Loves Disco, festivais como o espanhol Sónar, que já tem sua versão Sónar Kids, e na Disco Baby, de São Paulo. Outra facilidade é a conscientização dos proprietários de restaurantes, que perceberam a necessidade de um espaço dedicado aos pequenos. Com um centro de entretenimento infantil que é referência, o Dado Garden Grill possui uma estrutura de 175 m² e conta com atrações como minimercado, área para desenhos e leituras em meio a colméias de fibras e banquinhos em formato de flores, hortinha artificial e espaço gourmet kids, entre outras atividades que prendem a atenção da criançada. “Fizemos uma pesquisa e descobrimos que poucos locais no Brasil possuem um espaço tão qualificado para receber o público infantil. Investimos para montar esta estrutura e cada pai que pode saborear sua refeição com tranquilidade, faz tudo valer a pena”, ressalta o gerente do restaurante, Adrian Lacerda.


Comportamento

Jornal da Manhã / Galeria

Elson Sempé/JM

7G

Jovens aliam cirurgias plásticas a exercícios ■ camila foragi

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Depressão:

A solidão e o estresse no trabalho são dois sintomas que fazem o deprimido desistir de realizar suas tarefas cotidianas

doença da década

Devido ao acúmulo de compromissos e dificuldades do dia a dia , a doença vem crescendo gradativamente ■ PATRÍCIA JARDIM

C

hamada de mal da década, a depressão é considerada um dos grandes males que afeta a humanidade, juntamente com o alcoolismo e obesidade. O portador raramente tem a consciência que está doente e reluta em procurar ajuda. Pessoas de diferentes faixas etárias são atingidas, desde crianças a idosos. A doença pode ser contraída por diversos fatores: traumas do passado, estresse no trabalho, brigas constantes, frustrações e insatisfação que podem comprometer as atividades do cotidiano e a saúde do paciente. O psiquiatra Nei Nadvorny explica que dentre os principais sintomas estão o choro sem motivo, isolamento social, irritabilidade, falta de atenção, alteração no sono (para mais ou para menos) e mudança de apetite. Porém, para uma pessoa ser diagnosticada com depressão é necessário apresentar um conjunto de sintomas, “é como uma gripe, não é um espirro que constata a doença é preciso apresentar outros fatores como coriza, febre, dores no corpo, com a depressão é a mesma coisa”, compara o médico. Os sintomas devem ser pressentidos todos os dias no período de um mês ou mais, pois as mudanças de humor durante o dia, ou durante uma semana, já são consideradas comuns, devido aos compromissos e preocupações do cotidiano. Um quadro de depressão inicia silenciosamente, às vezes com um mal-estar ou uma tristeza sem motivo. Em geral o indivíduo pensa ser apenas uma fase, que basta tomar algum calmante, sair com os amigos, praticar uma atividade que logo tudo irá passar. É comum que a pessoa procure Patrícia Jardim/JM

Muita ou pouca fome também são sintomas da doença

florais ou outros remédios, com a falsa ideia de que podem melhorar. No entanto, a Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Conselho Federal de Medicina (CFM) contra indicam o uso destes medicamentos, pois não existem estudos profundos que comprovem o efeito deles. Os sintomas persistem e evoluem com o passar do tempo, comprometendo a saúde e atividades do depressivo .“A pessoa começa a querer ficar em algum local isolada sem ser incomodada, deixa de realizar seus afazeres, inclusive a higiene pessoal, é como se estivesse esperando pela morte”, afirma Nadvorny. É essencial a busca de apoio profissional assim que os primeiros sintomas forem detectados. As pessoas costumam deixar para procurar ajuda quando a doença está em um estágio bem avançado, tendo passado da metade de sua evolução, tornando o tratamento mais longo. É importante também que a família e os amigos estejam atentos ao comportamento do depressivo e o incentivem a buscar o acompanhamento o mais rápido possível. De acordo o médico, em quase 100% dos casos, os depressivos que buscam ajuda e realizam o tratamento encontram a cura, mas, iniciando tarde, a consequência é a demora para obter resultados. O tratamento usual da depressão parte de dois princípios fundamentais: a medicação e a psicoterapia. O aconselhável seria iniciar com medicamentos junto com a psicoterapia e, ao longo do tempo, ir diminuindo a dose dos remédios. Segundo Nadvorny, isso infelizmente não é regra. “As pessoas não querem realizar a psicoterapia, apenas querem tomar remédios, pois acreditam que a cura seja mais rápida por este meio, mas é através da terapia que podemos chegar aos motivos pelo qual a pessoa se encontra neste estado, pode ser um método demorado, porém duradouro”, garante o psiquiatra. Há cerca de 30 anos foi lançado o Prozac, medicamento que tinha como objetivo agir em um neurotransmissor. Com a evolução dos estudos sobre os antidepressivos, foram lançados remédios mais modernos capazes de agir em dois neurotransmissores responsáveis pela depressão. É importante lembrar que o remédio é receitado pelo médico, pois existem antidepressivos contraindicados para pessoas portadores de glaucoma, mulheres grávidas ou com alergias. Além dos medicamentos e da psicoterapia, o paciente pode incrementar seu tratamento utilizando-se de terapias alternativas como acupuntura, pilates, dança, academia, entre outros. Essas terapias servem de apoio ao tratamento proposto pelo profissional, que não deve ser abandonado. Para bons resultados, é importante a consciência de que se está doente, dizem os especialistas. É preciso também ter paciência, pois o processo de cura geralmente demora, e cabe ao depressivo dedicar-se ao tratamento para obter bons resultados.

os 26 anos de idade, após várias tentativas de emagrecimento, Débora de Freitas Monguilhott decidiu que finalmente iria realizar um sonho antigo: fazer uma lipoaspiração na barriga. “Como havia engordado muito, fiquei flácida, e não gostava do meu abdômen, via muitos defeitos no meu corpo. Sempre quis fazer a lipo, mas não tinha o dinheiro. Então esse ano decidi fazer a avaliação para que em junho pudesse me submeter à cirurgia. O que mais me motivou a tomar esta decisão foi o fato de ter feito academia todos os dias da semana e não ter obtido os resultados esperados. O transport, a esteira e a musculação infelizmente não foram suficientes”, afirma. Após ter realizado o procedimento cirúrgico em junho, Débora é mais uma que entra para as estatísticas. Afinal, o Brasil é o segundo país no ranking mundial de cirurgias plásticas. Atualmente são realizados mais de 1,7 mil procedimentos por dia. A cada hora, 71 pessoas se submetem a operações estéticas em busca do corpo e do rosto perfeitos. O país só perde para os Estados Unidos. De acordo com uma pesquisa realizada pelo Ibope, 69% das cirurgias plásticas são estéticas, e a maioria realizada por mulheres. O procedimento mais procurado por elas é a lipoaspiração, que ocupa o 1º lugar da lista com 90 mil lipos realizadas no país anualmente. Os números foram apontados pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP). Segundo pesquisa realizada pelo Data Folha e divulgada no site da SBCP, o Rio Grande do Sul é o quarto estado brasileiro que mais faz cirurgias plásticas, com 73% dos procedimentos para fins estéticos e apenas 27% para reparação. O professor de educação física Luís Fernando Ferreira, de 24 anos, explica por que os números de cirurgias estéticas são tão elevados. “Não existe como perder a gordura localizada, a gordura se perde do corpo todo. A mulher, por uma questão genética, acumula mais gordura na barriga e no glúteo, engordando quase sempre primeiro nestas regiões. Normalmente quando a pessoa vem a uma academia perder a gordura localizada, ela se frustra, porque não perde a gordura localizada em si. Vai perder coxa, braço, e vai achar sempre que a barriga e bumbum estão maiores, e realmente estarão. É preciso uma perda de gordura muito grande para que haja a perda de gordura localizada.” Ferreira ensina que para ocorrer essa grande perda de gordura é preciso fazer alguma atividade aeróbica de alta intensidade. Aquelas onde a frequência cardíaca entra no chamado zonal. Ou seja, em torno de 60 a 80% da tua frequência cardíaca máxima. Corrida, aulas de ginástica, jump, circuito e as lutas são as atividades mais indicadas para quem deseja perder grande quantidade de gordura no corpo todo. “Vale lembrar que a musculação é péssimo emagrecedor, emagrece zero, ela é um modificador metabólico. Fazer mil repetições de abdominal ou dez não fará diferença, irá definir o músculo e não eliminar a gordura”, afirma. Leonardo Velozo, 29 anos, também não resistiu à tentação e se rendeu a lipoaspiração. Quando estava com 25 anos de idade realizou sua primeira cirurgia plástica. O objetivo foi livrar-se das gorduras localizadas na barriga e costas. “Malhava muito e via quase todas as partes do meu corpo reduzindo de tamanho, mas a barriga e costas pareciam cada vez maiores, o que me incomodava muito. Na época fiquei magro e estava satisfeito com meu corpo, mas como não cuidei minha alimentação e fui obrigado a parar de ir à academia devido a uma lesão no joelho, recuperei meu peso antigo”, revela. Hoje, prestes a completar 30 anos de idade, Leonardo está se programando para realizar um novo procedimento cirúrgico em 2013. Camila Foragi/JM

Jump é um exercício eficaz para a perda de gordura


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Quadrinhos

Jornal da Manhã / Galeria Acervo de Rafael Sica/Divulgação

Silenciosos, fantásticos e nada ordinários ■ Liege ferreira

R

afael Sica é considerado um dos mais influentes quadrinistas brasileiros da nova geração. Ganhou dois prêmios HQ Mix (Desenhista Revelação e Web Quadrinhos) e ano passado concorreu na categoria melhor livro de tiras com a obra Ordinário, editada em 2011 pela Cia. das Letras, que reúne as tiras publicadas no seu blog, que existe há nove anos. O artista teve seus trabalhos publicados nas revistas Piauí, Superinteressante, +Soma, Mundo Estranho, Galileu, no jornal Folha de S. Paulo, entre outros. Sica também participou da sessão semanal de quadrinhos no portal IG no último ano com a série Borgo. Em 2008 fez sua primeira exposição individual no Museu do Trabalho em Porto Alegre, intitulada Cinza-Choque. Agora, o artista participa da

mostra coletiva Correndo o Risco III, também no Museu do Trabalho. Os quadrinhos do Sica não têm diálogos, a atenção se volta apenas para os desenhos extremamente detalhistas, que retratam em preto e branco o ser humano e suas psicopatias, a vida na metrópole, marcada por sentimentos intensos como solidão, tristeza, desilusão, medo e horror, sempre com um humor ácido e um toque de surrealismo. Seu trabalho mostra o cotidiano de cidade grande – não por coincidência ele morou alguns anos em São Paulo – um vazio individualista, onde as pessoas estão juntas, mas no fundo encontram-se todas sozinhas. Sem falar na própria sujeira típica e poluição visual das capitais, que está sempre presente na sua arte. O artista explica que seu processo criativo é “aleatório”. Depende muito do propósito do trabalho. “Mas geralmente parto do rabisco e do erro”, detalha. Liege Ferreira / JM

Estúdio do quadrinista e ilustrador Rafael Sica, autor da publicação em HQ Ordinário

Por sua narrativa nada convencional, o artista muita vezes se aproxima da obra Macaudo, do argentino Liniers. De uma maneira mais sombria, seus personagens fantásticos muitas vezes lembram ilustrações como as de Maurice Sendak no clássico infantil Onde Vivem os Monstros. Sobre suas influências, Sica revela que são muitas e acha difícil identificar exatamente, mas cita em especial a literatura: “Acho que Dostoievski tá no topo dessa lista, junto com Kafka e Cortázar. Quando descobri esses autores, me senti mais confortável. Percebi que alguém mais sabia do que eu sabia, era como se estivesse lendo algo que estava em mim. No desenho, acho que Edward Gorey é uma grande influência. Mas poderia citar também Fabio Zimbres, Jaca e Mutarelli”, enumera o quadrinista. O olhar aguçado de Sica sobre o cotidiano é irônico e melancólico, como se ele não acreditasse nas pessoas nem na sociedade em que vive, e satiriza tudo isso. Seu traço mudou com o tempo. Antigamente se aproximava mais do cartum, era colorido e “mais fáceis”. Mesmo hoje, seu traço oscila: ora mais rabiscado e confuso, ora mais limpo, mas sempre extremamente trabalhado, o que faz toda a diferença na composição dos quadros: “Antes eu experimentava menos. Não que fosse mais acessível. Com o silêncio, o trabalho ficou mais aberto e sugestivo, mas não foi uma transformação pensada. Simplesmente essa transição segue acontecendo, como um amadurecimento”, completa Sica. Nenhuma tirinha possui um significado certo, é algo mutante, que se molda à bagagem do próprio leitor – mesmo que não exista diálogos, é possível “ler” os desenhos. A relação de Sica com os leitores é um capítulo à parte. No seu blog, as pessoas xingam, rasgam elogios e tentam entender o que se passa na cabeça do artista e o que aquilo tudo quer dizer. Segundo ele, não existe uma mensagem no seu trabalho, existe, sim, é uma necessidade de entendimento maior do que uma busca por sensações, por isso essas res-

HQ da série Borgo, do desenhista Rafael Sica, publicada no portal IG. As tiras surrealistas retratam ironicamente o cotidiano.

Variedade de pincéis para criações de Sica postas imediatas. “A reflexão é mais honesta que a resposta, sempre”, assegura. Ele não responde, mas lê todos e, inclusive, utilizou alguns para uma série de desenhos. Sica nasceu em Pelotas, a 260 quilômetros de Porto Alegre e, apesar de ser jornalista por formação, sempre optou pelo desenho. “Fui uma criança calada, tímida, reprimida, o desenho acabou sendo um caminho natural pra lidar com essas barreiras. Minha fala, minha língua, sempre foi o desenho. Me ajudou a encurtar alguns caminhos. foi natural escolher o desenho como profissão”. Suas ilustrações também seguem o mesmo estilo das tiras, porém são coloridas e ele as divulga em uma página no Flickr. Para o futuro, ele planeja fazer um livro infantil e em breve sairá uma adaptação das letras do Marcelo Yuka, da banda O Rappa, em HQ pela editora Barba Negra. O projeto é coletivo, mas só do Sica serão trinta páginas de quadrinhos. Para conferir o trabalho do artista acesse rafaelsica.zip.net.


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