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PORTUGAL

NOTÍCIAS 15

Julho 2012 Publicação Trimestral • Série VI • P.V.P €2

DOSSIÊ

Tratado de Comércio de Armas

É URGENTE UM DOCUMENTO QUE NOS PROTEJA retrato

Alberto Estevez revela o que se passa nos bastidores das Nações Unidas

ENTREVISTA

A investigadora Rita Santos fala de violência armada e da realidade portuguesa


ÍNDICE 03. EDITORIAL 04. ENTREVISTA

11. DOSSIÊ Tudo sobre o Tratado de Comércio de Armas: a necessidade, os objetivos, as expetativas e as negociações

28. BOAS NOTÍCIAS 29. APELOS MUNDIAIS

Rita Santos, investigadora, fala de violência armada no mundo e em Portugal

22. EM AÇÃO INTERNACIONAL

07. RETRATO

Quando passam 10 anos da criação do Tribunal Penal Internacional ainda há muito a melhorar

32. PRESTAÇÃO DE CONTAS

23. EM AÇÃO NACIONAL

33. AGENDA/CARTOON

Alberto Estevez, lobista da Amnistia Internacional nas Nações Unidas, explica os bastidores do Tratado de Comércio de Armas

09. EM FOCO União Europeia, Sudão e Rússia: descubra porque estiveram recentemente em destaque

Os novos órgãos sociais da Amnistia Internacional e o Prémio de Direitos Humanos no IndieLisboa

27. EM AÇÃO JOVEM

Conheça quem no mundo precisa de si

34. CRÓNICA “Para além da conferência de julho” sobre o Tratado de Comércio de Armas

O ativismo juvenil recomenda-se

FICHA TÉCNICA • Propriedade: Amnistia Internacional Portugal • Diretor: Presidente da Direção, Victor Nogueira • Equipa Editorial e Redação: Cátia Silva e Irene Rodrigues • Colaboram neste número: Andreia Nunes, Che, Departamento de Angariação

de Fundos e Financeiro, Grupo de Juristas da Amnistia Internacional Portugal, Inês Braizinha, José Bernardino, Mariana Guimarães, Victor Nogueira • Revisão: Cátia Silva e Irene Rodrigues • Conceção Gráfica e Paginação: OODesign • Impressão: Relgráfica-Artes Gráficas Fotografia de capa: © Straight 8 Photography/Shutterstock.com

Avenida Infante Santo, 42 – 2.º 1350-179 Lisboa Tel.: 213 861 652 Fax: 213 861 782 Email: boletim@amnistia-internacional.pt Os artigos assinados são da exclusiva responsabilidade dos seus signatários. Excluída de Registo pela ERC


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EDITORIAL Amigos, A Amnistia Internacional (AI) defende o estabelecimento de um tratado internacional sobre o comércio internacional de armas há mais de vinte anos. Fizemos grandes campanhas mundiais pelo Controlo das Armas, em conjunto com outras organizações não governamentais, porque o uso indevido das armas está diretamente associado à repressão e violações de direitos humanos, a conflitos armados que atingem de forma injusta e desproporcionada populações civis, à deslocação forçada de milhões de pessoas, ao enquadramento de milhares de crianças em forças regulares e de oposição armada, à tortura, morte e pobreza. O comércio internacional das armas é um negócio altamente lucrativo, envolvendo forças poderosas, estatais e privadas. Apesar de se ocupar de artigos muito perigosos – estima-se que as armas estejam presentes em cerca de 60% das violações documentadas de direitos humanos – é um comércio pouco transparente e legalmente menos regulado que a venda de arte, medicamentos, ou … bananas. As grandes potências, em particular os membros permanentes do Conselho de Segurança nunca estiveram muito interessados no estabelecimento de regras transparentes que assegurem princípios de aplicação, limitações e controlo na sua aplicação, responsabilização dos agentes envolvidos. Mas é indispensável assegurar mecanismos internacionais no comércio de armas que possam, no mínimo, prevenir o seu uso para atrocidades, ou violações de direitos humanos e do direito humanitário. Os média têm revelado imagens terríveis da repressão na Síria, em que a Rússia, vetou medidas contra o regime de al-Assad, fornecendo 78% do material de guerra utilizado contra a oposição e populações civis. Mas este negócio inclui muitos outros atores. Um exemplo: no Sudão do Sul, um país com apenas um ano de existência, tanto o exército como a oposição têm recebido grande quanti-

© Privado

dade de armamento novo e sofisticado que tem alimentado confrontos internos, incluindo ataques indiscriminados a populações civis, que têm provocado mortos e feridos, destruição de casas e bens e milhares de deslocados. Em combates em áreas urbanas, o exército chegou a utilizar Tanques T 72 contra forças oposicionistas, operando com veículos blindados, com total desrespeito pela sorte dos habitantes apanhados em fogo cruzado. Estas armas circularam pelo Quénia e Uganda, através de companhias de transporte lituanas e alemãs, através de pagamentos realizados por paraísos fiscais, como a Ilha de Man. O Tratado de Comércio de Armas cuja discussão agora se inicia deveria tornar impossível situações como esta. Apesar de limitado no seu alcance, pode vir a ser um instrumento importante, se for possível um tratado forte e efetivo. Devemos empenhar-nos nesta ação, contribuindo para fazer avançar os padrões internacionais, como já aconteceu em relação à Tortura. Mas mesmo que agora não se consigam cumprir todos os objetivos pretendidos, esta é uma matéria que não sairá da nossa agenda, tal como o combate à impunidade que lhe está associada. Há que recordar que a AI iniciou, em 1994, uma grande campanha mundial pelo estabelecimento de um tribunal internacional permanente que pudesse julgar os res-

ponsáveis por crimes de genocídio, crimes de guerra e crimes contra a humanidade. Essa campanha envolveu milhares de Organizações Não Governamentais e resultou no Estatuto de Roma que viria a criar o Tribunal Penal Internacional, em 2002, com 60 Estados signatários (hoje já são 121). Nós continuaremos a defender a criação de melhores condições para que o TPI possa cumprir e alargar a sua missão. A Amnistia Internacional tem passado por grandes transformações internas, que se vão aprofundar, na procura de um maior crescimento, afirmação e impacte global pelos direitos humanos. O Programa de Transição Global, em execução, inclui uma diferente repartição de funções pelo movimento, novas formas de presença e uma maior integração das estruturas e processos existentes. Acompanhar e participar ativamente nestes processos e contribuir para um reforço da AI na sociedade portuguesa, é um desafio para os recém-eleitos membros dos corpos sociais da AI Portugal – que poderão conhecer melhor nesta revista. Contamos convosco! Um abraço, Victor Nogueira (Presidente da Direção)

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ENTREVISTA Rita Santos, Investigadora sobre Violência Armada “Os fluxos ilegais de armas derivam da produção e do comércio legal” Em 2010 saiu o primeiro estudo sobre violência armada em Portugal, realizado por uma equipa do Núcleo de Humanidades, Migrações e Estudos para a Paz, do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, da qual faz parte a investigadora Rita Santos. Especializada em relações internacionais, violência armada, desmilitarização, género e armas ligeiras, integra ainda o OGiVA-Observatório sobre Género e Violência Armada. Temáticas sobre as quais falou em entrevista ao Notícias da Amnistia Internacional Portugal. Por Cátia Silva

Amnistia Internacional (AI): Quando se pensa em violência armada o mais fácil é associarmos a conflitos e guerras. Esclareça-se: as armas são também usadas em tempo de paz e, comparativamente, serão até mais usadas nessas alturas? Rita Santos (RS): É verdade. Começando pelo início, estima-se que existam atualmente cerca de 650 milhões de armas de pequeno porte e ligeiras no mundo e dois terços delas estão nas mãos de civis. A população civil, além de ser a principal utilizadora destas armas, é também a principal vítima da violência que com elas é exercida. Globalmente registam-se todos os anos, em média, 500 mil homicídios e cerca de 40% deles são cometidos com armas de pequeno porte e ligeiras. E muito mais pessoas são feridas e afetadas psicologicamente por este tipo de violência. Neste momento as regiões do mundo mais atingidas são as Américas Latina, do Sul e Central, as Caraíbas e a África Subsariana.

© Hélio Gomes Rita Santos durante a ante-estreia do documentário Luto como Mãe, em Coimbra.

AI: Países onde a violência armada está associada ao narcotráfico, correto?

2009, nesse mesmo período 48.000 pessoas morreram de forma violenta, com armas de fogo, no Brasil, um país que não está em guerra há muitos anos. É um contexto de paz formal que tem índices elevadíssimos de violência armada, que é perpetrada quer por civis, quer por agentes estatais, como acontece também em El Salvador, na Guatemala, Honduras, Venezuela, México e na Jamaica, sobretudo.

RS: Está muito ligada a organizações de narcotráfico, mas também a outro tipo de crimes, ligados ao uso interpessoal das armas de fogo. Se globalmente há todos os anos cerca de 55.000 mortes que acontecem em cenários de conflito armado e de guerra, pelo menos entre 2004 e

AI: Uma lista de países que faz lembrar o estudo do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime que associa a maior criminalidade ao menor índice de desenvolvimento humano e económico. Concorda?

RS: Não necessariamente. Neste momento o Brasil é um país que está a crescer bastante e se analisarmos os seus municípios e estados, tem-se registado um maior crescimento da violência armada nas cidades do interior que mais têm crescido e que se têm urbanizado de forma mais acelerada. Em tudo o que tenho estudado percebo que não há relações unilaterais e lineares. A violência armada, seja na aceção criminal, seja na interpessoal, não se justifica por um fator apenas. Há uma correlação entre pobreza e violência, mas vai no sentido inverso ao que o senso comum enfatiza. A violência armada produz empobrecimento e violência, mas não acontece necessariamente o contrário. A título de exemplo, entre 2008 e 2010 uma parte


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do nosso Núcleo esteve a trabalhar sobre violência urbana na Guiné-Bissau, dos países mais pobres do continente africano, e em Cabo Verde, um país modelo em termos de crescimento económico. O que as minhas colegas perceberam é que nos dois casos há ocorrências limitadas de violência armada, mas ainda assim Cabo Verde tem índices mais elevados que a Guiné-Bissau. Até porque há vários níveis que explicam a adoção de um comportamento violento, desde fatores económicos, estruturais, passando pelos sociais e culturais. Ligar isto a um só fator é impossível. “As histórias que recolhemos nas prisões de Coimbra e de Lisboa, de pessoas presas por homicídio, deram-se quase todas em contexto de violência familiar ou entre vizinhos” AI: Nesse caso parece que a violência é algo que já está em algumas sociedades, pelos mais variados fatores, e depois só se transforma em armada se houver facilidade no acesso a armas? RS: Sim, mas mais uma vez a existência de muitas armas não significa que sejam utilizadas em maior número. O caso de Portugal demonstra isso, assim como um outro caso extremo, o da Suíça, que é dos países que tem maior número de armas em posse civil na Europa e que tem um uso muito limitado. AI: Isso significa que, para si, Portugal tem muitas armas? Em termos de posse de armas, o Small Arms Survey coloca Portugal em 55ª posição entre 178 países analisados... RS: Em termos de distribuição das armas estamos em pé de igualdade com países como a Alemanha, Inglaterra, Itália... E atrás de países como a Eslováquia, a Finlândia, França... Estamos num nível muito intermédio. A violência armada em Portugal não atinge proporções epidémicas, no entender da Organização Mundial de Saúde, que fixa valores epidémicos da violência nos 10 mortos por 100 mil habitantes – em Portugal estamos entre 2,1 óbitos (se pensarmos em homicídios, suicídios, entre outros) e 1,2 óbitos (só homicídios) por 100 mil habitantes. Mas eu estaria aqui horas a falar sobre os problemas de encontrar indicadores e sobre a análise dos dados, pois há uma

confusão total. Além disso, é muito importante perceber que isto não significa que a violência armada não exista em Portugal e que não deva ser motivo de preocupação, porque a violência compreende um espetro amplo de comportamentos, que vai muito para além das mortes. Não devemos, por exemplo, esquecer as histórias de pessoas que foram feridas com armas de fogo, as que testemunharam o seu uso e as que foram vítimas de ameaças. AI: Onde se sente mais a violência armada em Portugal? RS: Ela não está de todo circunscrita às zonas suburbanas, como nos parecem sugerir muitas vezes os relatos mais mediáticos sobre violência armada. As histórias que recolhemos nas prisões de Coimbra e de Lisboa, de pessoas presas por homicídio, deram-se quase todas em contexto de violência familiar ou entre vizinhos e, portanto, davam conta de uma utilização quase impulsiva das armas. AI: Nesse caso não deveriam ser as armas de caça as mais usadas em Portugal? Porque no estudo que o Núcleo realizou – “Violência e Armas Ligeiras: um retrato português” – estas são as mais frequentemente licenciadas, enquanto o revólver ou a pistola parecem ser as mais utilizadas. RS: Nos casos do uso ostentativo ou intimidatório das armas de fogo – em contexto de assaltos, tentativas de assalto, sequestro, extorsão – grande parte das armas que são utilizadas são curtas, sejam revólveres ou armas de caça modificadas para serem curtas. No contexto da violência familiar – em situações de violência doméstica ou de conflito entre vizinhos – normalmente são usadas armas de caça. AI: O estudo refere mesmo que é em contexto familiar ou entre vizinhos que as armas são mais utilizadas. E se assim é, a atual crise económica pouco ou nada terá alterado os níveis de violência armada? RS: A violência armada no sentido dos óbitos não tem aumentado, de facto. Tem até diminuído ligeiramente desde 2007. Na verdade, o problema é que os dados que estamos a analisar são de uma série

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temporal de dez anos e precisaríamos de bastante mais para tirar algum tipo de conclusões. Porém, em termos mundiais também não se têm registado, desde 2004, grandes variações no número de mortos com armas de fogo. AI: Já no que diz respeito aos feridos, os dados apurados referem o dobro do número de mortos e baseiam-se apenas nos registos oficiais, o que pode significar que as armas são muitas vezes usadas sem serem disparadas, correto? RS: Exato. Esse é um ponto muito importante. Tanto no contexto mais organizado, como na violência familiar, a arma de fogo não precisa de ser disparada para ser violenta. Muitas vezes as pessoas que denunciam a violência doméstica dizem: nunca vi a arma, não sei se existe, mas ele diz que um dia levo um tiro. E 88% das mulheres diziam que se sentiam em perigo por isso. Um outro elemento que vai ao encontro do que estávamos a falar, é o que indica que 70% das vítimas referiu que os agressores tinham uma arma de caça. Algumas garantiam ainda que estas estavam legais. AI: Segundo o estudo de que é coautora só 54% das armas existentes em Portugal estão legais. É possível saber se é com elas, ou com as ilegais, que é mais fortemente perpetrada a violência armada? RS: Conseguimos apurar que as armas de fogo que foram utilizadas não resultando em morte estavam, na sua maioria, legais, mas em relação a homicídios não conseguimos apurar. Porque mais uma vez os dados que existiam – até àquele célebre apagão – não permitiam fazer esse tipo de extrapolação. “A arma de fogo não precisa de ser disparada para ser violenta” AI: Apagão? RS: Sim. Foi uma semana antes da apresentação do nosso estudo, em maio de 2010. Os dados dos crimes com armas de fogo desapareceram do site do Ministério da Justiça, que veio dizer que tinha havido um erro informático que tinha contabilizado em dobro o número de crimes cometidos com arma de fogo num

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ano específico. O que acontece é que esses dados nunca mais voltaram a estar disponíveis. AI: Há pouca transparência em Portugal no que diz respeito às armas? RS: Neste momento é difícil dizer que existe um controlo efetivo das armas legais em Portugal, porque não há divulgação de dados sobre armas legalizadas. O número com o qual trabalhamos é uma estimativa do Departamento de Armas e Explosivos da Polícia de Segurança Pública (PSP). AI: Mas se o licenciamento é feito não fica automaticamente registado? RS: Só desde 2008/2009 é que há um registo informático. Antes só havia registo em papel e supostamente estes registos estão a ser informatizados, desde 2008. AI: Mas o processo de licenciamento é exclusivamente feito pela PSP? RS: Sim.

© Hélio Gomes A equipa responsável pelo estudo sobre a violência armada em Portugal: Tatiana Moura, José Manuel Pureza e Rita Santos.

AI: E nesse processo há alguma análise da pessoa a quem se vai atribuir a licença de porte de arma? RS: O que a Lei de 2006 determina é que há etapas cumulativas que têm de ir sendo preenchidas. Para os candidatos às licenças de armas B1, revólveres, é preciso submeter um requerimento – se bem que as justificações para o requerimento são muito vagas: “por razões profissionais ou circunstâncias de defesa pessoal”. Depois é decidido caso a caso. Há muita margem de manobra e uma interpretação subjetiva que se tem de fazer da lei. Depois é necessária a frequência e aprovação de um curso de formação (para os candidatos a armas de caça já não é preciso, desde 2011, porque foram equiparados aos utilizadores de armas em contexto desportivo, bastando por

isso terem licença de caça). Falta depois comprovar o historial de idoneidade do candidato – e aqui a lei de 2009 foi muito importante porque introduziu a hipótese de não atribuição da licença (ou de apreensão) a quem tem historial de violência doméstica, condenados ou com alguma medida provisória. Por último, é preciso apresentar um certificado médico (normalmente do médico de família), que é uma das angústias dos profissionais de saúde, porque muitas vezes não lhes é dito por palavras que há uma situação de violência doméstica, mas percebem que existe. E ao negarem o certificado colocam a vítima num risco maior, porque estão a sugerir que lhes foi comunicada a violência doméstica. AI: Até porque mesmo que nesses casos apreendam a arma do agressor, este pode sempre comprar outra de forma ilegal e vingar-se... RS: Depois há essa questão. De facto há formas de ter acesso a armas de fogo de forma ilegal. E já nem me refiro a casos como os relatados numa reportagem da RTP, sobre um chamado “supermercado de armas”. As armas podem ser desviadas, ou roubadas. Podem ser vendidas sem intermediários, por donos de armas que já não precisam delas e vendem-nas inocentemente a outra pessoa. Há ainda a situação das armas transformadas, que se tornam ilegais por isso, das contrabandeadas de outros países e das que são herdadas e a situação de propriedade não é regularizada. AI: Em algumas das situações que refere percebe-se que as armas nem sempre são encaradas como um problema. Há alguns anos atrás era talvez frequente ter uma arma em casa? RS: Em zonas mais rurais sim, ter armas é muito comum porque estão associadas à caça e por razões culturais. E estas pessoas não percebem o risco. Acham que nunca poderiam utilizar mesmo que se exaltassem e que se houver um roubo a arma não vai ser roubada. Até porque há armas que são recordações, como as trazidas pelos antigos combatentes. No entanto, ao mesmo tempo que verificámos isto, quando tentámos fazer entrevistas a pessoas com as armas legais, com situação regularizada, foi sempre muito difícil falar sobre as armas. É um assunto tabu.

“Seria importante ter dados conclusivos sobre a posse de armas de fogo em Portugal” AI: No fundo isso parece indicar que têm noção dos riscos... RS: Há um relação muito ambivalente com as armas de fogo. Se por um lado acham que ao terem uma arma legal não vão ter qualquer tipo de problema – porque há essa associação: as armas ilegais matam e as legais não causam problemas –, ao mesmo tempo há uma dificuldade em falar sobre a utilização dessas armas, em mostrar onde as guardam, etc. AI: O mesmo acontece com os Estados, porque os dados relacionados com armas são quase tabu, mas ao não existirem não se consegue perceber tendências, nem onde é preciso atuar para prevenir a violência armada... RS: Seria muito importante ter dados conclusivos sobre a posse de armas de fogo em Portugal, até para as próprias forças de segurança. Conhecer o universo real deveria ser uma preocupação dessas unidades, senão não temos como orientar as políticas públicas de controlo de armas de fogo, não temos como identificar os canais e os mecanismos de desvio entre o mercado legal e o ilegal, por exemplo. AI: Um Tratado de Comércio de Armas como o que está a ser negociado, se for forte, poderia ajudar a este nível? RS: O que está em causa no Tratado é criar um regime internacional de regulação das transferências. É um passo importante porque vai estabelecer obrigações comuns que guiem os Estados no processo de decisão de importar, exportar ou autorizar o trânsito de armas. Até porque, ao contrário de outros produtos, no caso das armas estas são quase sempre produzidas legalmente. A produção ilegal e artesanal das armas é quase residual, portanto os fluxos ilegais de armas derivam da produção e do comércio legal. Se conseguirmos controlar um pouco melhor a parte legal, vamos conseguir controlar um pouco melhor o circuito ilegal das armas.


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RETRATO ALBERTO ESTEVEZ, COORDENADOR DE LÓBI SOBRE O TRATADO DE COMÉRCIO DE ARMAS De voluntário em Vigo a lobista nas Nações Unidas Antes de partir para Nova Iorque, onde está a acompanhar as negociações em torno do Tratado de Comércio de Armas, o lobista Alberto Estevez recordou com o Notícias da Amnistia Internacional Portugal o percurso que começou como voluntário. Além disso, levantou o véu sobre os bastidores da reunião de líderes mundiais nas Nações Unidas. Na altura de fecho desta edição o espanhol Alberto Estevez preparava-se para uma verdadeira “maratona de lóbi”. Em nome da Amnistia Internacional está agora na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, a acompanhar de perto as negociações em torno do Tratado de Comércio de Armas e a tentar influenciar os líderes de todo o mundo para que adotem um documento que nos proteja. É o culminar de mais de duas décadas de trabalho pela regulação das transferências internacionais de armas, que Alberto fez, quase sempre, de forma voluntária, nos tempos que “roubava” à sua profissão de tradutor de inglês, francês, galego, catalão e, ocasionalmente, alemão. Um poliglota que é também um ativista de corpo e alma, “nascido e criado” – pode dizer-se – na Amnistia Internacional. Embora seja fácil perceber que o seu dinamismo, a sua capacidade negocial e a preocupação com o mundo serão inatos, foi na Amnistia que despertou para o problema das armas e aprendeu a fazer lóbi. Uma aprendizagem que começou no liceu, aos 17 anos, na sua cidade de Vigo. “Na altura pensava que a Amnistia Internacional era uma organização que não fazia muitas coisas, porque se centrava na libertação de prisioneiros de consciência, na luta contra a tortura, contra a pena de morte, nos desaparecimentos forçados”, diz, recordando como era ingénuo achar que tudo isto era pouco. Mesmo pensando assim, leu um artigo

© Privado Alberto Estevez em frente à escultura pela não violência que existe à porta das Nações Unidas, em Nova Iorque.

O LÓBI E AS ARMAS no El País sobre este trabalho e quis saber mais. Acabou por se tornar membro1 e voluntário2, integrando o Grupo Local3 de Vigo da secção espanhola, do qual só saiu no passado mês de março, quando o trabalho de tradutor e de lobista lhe tiraram todo o tempo livre. Até porque se enquanto jovem achava que o trabalho da Amnistia era coisa pouca, aos 42 anos sabe bem quantas décadas são precisas para se conseguir, por exemplo, um Tratado de Comércio de Armas. Agora que este está em negociação, Alberto vai lutar, em nosso nome e como Coordenador de Lóbi da Amnistia Internacional para o Tratado, por um documento eficaz.

A ligação de Alberto Estevez ao tema das armas é, como o próprio diz, “uma série de felizes coincidências”. Tudo começou em 1990, quando estava na Faculdade, em Salamanca, a estudar Filologia Germânica, ao mesmo tempo que pertencia à Direção da Amnistia Internacional Espanha4. “Escrevia cartas a governos e trabalhava em campanhas sobre tortura, desaparecimentos, execuções extrajudiciais,... violações de direitos humanos onde havia sempre pelo meio armas. Pensei: se cortássemos o fluxo – ou se o regulássemos – era como cortar a gasolina dos carros. Sem armas reduziremos o número de violações de direitos

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A ESPERANÇA NO TRATADO

O mais recente cartaz da secção portuguesa sobre o controle de comércio de armas.

humanos com que temos de trabalhar”. Era também este o pensamento que corria pela sede da Amnistia Internacional, em Londres, e por todas as secções nacionais: prevenir ao invés de procurar somente soluções para as violações de direitos humanos. Alberto Estevez assumiu, de forma voluntária, a investigação sobre esta temática. Ainda falando em coincidências, acrescenta, “em 1994 um investigador sobre desarmamento propôs à Amnistia Internacional, aos Médicos Sem Fronteiras e à Greenpeace trabalharmos em conjunto para acabar com o secretismo em torno do comércio de armas em Espanha”. Uma campanha nacional que dura até hoje. Internacionalmente, foi em 1991 que a sede da Amnistia começou a seguir as pisadas das transferências de armas, através de Brian Wood, atual Diretor da campanha e que Alberto diz ser “o cérebro de todo o trabalho em torno das armas”. Na altura Brian era o único a fazer o chamado trabalho MSP, dedicado a assuntos Militares, de Segurança e Policiais, nos quais se incluem as armas5. Contudo, a campanha “Controlar as Armas” só foi formalmente lançada em 2003, quando existia já uma equipa de seis pessoas, entre profissionais da comunicação, campaigners 6 e administrativos. Para além destes, a equipa MSP tem uma verdadeira “tropa de elite”: os consultores de investigação, como Alberto Estevez, contratados ocasionalmente para trabalhos como relatórios, manuais ou lóbi nas Nações Unidas, como agora acontece.

Durante quatro semanas – até 27 de julho – os Estados de todo o mundo vão estar nas Nações Unidas a negociar um Tratado de Comércio de Armas – ou melhor, estarão nas negociações os que puderem suportar a estadia numa das cidades mais caras do mundo, alerta o lobista. Alberto Estevez vai acompanhá-los. Embora na altura em que esta entrevista foi feita ainda não se soubesse como se processariam as reuniões, o mais provável, refere, é a maioria das sessões decorrerem à porta fechada, sem o acesso a organizações como a Amnistia Internacional. “Algumas pessoas da sociedade civil vão na comitiva dos governos, mas nós não queremos pôr em causa a independência”, reforça. Por isso, “falamos na hora das refeições, nos corredores,...”, diz, explicando que é por isso que a delegação da Amnistia Internacional tem entre 15 a 20 lobistas, que estarão alternadamente em Nova Iorque: “é fundamental termos uma delegação diversificada, com pessoas do Senegal, da Coreia do Sul, do Reino Unido, de Espanha, do México, do Chile, entre outros, que conhecem há vários anos alguns diplomatas e têm uma boa relação com eles”. Pessoas que são essenciais porque, na verdade, “as negociações fazem-se dentro e fora das salas de reunião: lá dentro entre governos, cá fora com organizações como a nossa”. O papel que assumimos nesta fase é o de assessores técnicos, permanentemente disponíveis para ajudar os Estados que defendem o mesmo que nós. “Temos alguns aliados. Eles contam-nos como vão as negociações e nós fazemos propostas que podem apresentar. Por vezes trocamos mensagens de telemóvel ou emails com a redação que propomos para o Tratado”. Depois, “nunca seguem a 100% as nossas propostas, mas podem dizer que um ou outro parágrafo lhes interessa e proporem nas sessões”. Um lóbi que Alberto já viu dar bons frutos: “parecem pequenas coisas que não levam a lado nenhum, mas quando foi feito o esboço do Tratado (que serve de base às negociações), estão lá muitas das propostas que a Amnistia tem feito aos diplomatas ao longo de muitos anos”. Uma conquista que vem reforçar que há 25 anos atrás, quando Alberto Estevez quis ser voluntário, fez

a escolha certa: “interessava-me mudar as coisas, melhorar um pouco o mundo em que vivíamos” recorda, acrescentando: “a Amnistia Internacional pareceu-me o instrumento acertado para o fazer”. E como até hoje não o desiludiu, o lobista celebra agora as Bodas de Prata desta relação. 1. A Amnistia Internacional é reconhecida pela sua isenção e imparcialidade, que só são possíveis porque não dependemos de governos, mas defendemos e promovemos os direitos humanos graças ao contributo regular financeiro dos nossos membros e apoiantes. Mais em www.amnistia-internacional.pt (‘Torne-se Membro’ ou ‘Faça um Donativo’). 2. A Amnistia Internacional é uma organização que tem na sua essência o trabalho voluntário. Foi com voluntários que começou, em 1961, e é com voluntários que se mantém, uma vez que os órgãos dirigentes– na sede e nas mais de 50 secções pelo mundo –são constituídos por membros voluntários. Há ainda voluntários que ajudam no trabalho do dia-a-dia. Mais em www.amnistia-internacional.pt (O que pode fazer). 3. Nas secções nacionais são os voluntários que ajudam o movimento a chegar a todo o país, através dos chamados Grupos Locais. O objetivo é, em cada localidade, cada estrutura promover, defender e educar para os direitos humanos. Em Portugal há Grupos Locais, Grupos Temáticos e Grupos de Estudantes. Consultar Tabelas nas partes ‘Em Ação Nacional’ e ‘Em Ação Jovem’ desta revista. 4. A Direção é um dos Órgãos Sociais das secções da Amnistia Internacional, constituída por voluntários. 5. A Equipa MSP tem quatro grandes projetos: o Tratado de Comércio de Armas, que é agora prioritário; a regulação do comércio de objetos usados para tortura, que tem tido bons desenvolvimentos nos últimos anos; o trabalho com as forças policiais, para que atuem respeitando os direitos humanos; e a formação para os direitos humanos junto de diversos profissionais, como médicos, polícias, etc. 6. O campaigner é quem define as formas de atuação para conseguir alterar uma determinada situação, como, neste caso, alcançar um Tratado de Comércio de Armas eficaz, que tem exigido um trabalho que dura há mais de duas décadas, com petições, manifestações, lóbi, entre outras ações.

Acompanhe as negociações! Alberto Estevez é um dos lobistas da Amnistia Internacional que está nas Nações Unidas a acompanhar a conferência sobre o Tratado de Comércio de Armas. Acompanhe tudo o que se está a passar em Nova Iorque no blog http://livewire. amnesty.org


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EM FOCO Nos últimos meses, alguns países estiveram em destaque, pelas piores razões. Portugal, porque terá participado nos voos de rendição norte-americanos e porque poderia ajudar a salvar centenas de sudaneses. E a Rússia, que esteve sob a luz dos holofotes da Assembleia da República portuguesa.

União Europeia Voos de rendição têm de ser investigados Quando no final de Junho se assinalou o Dia Internacional de Apoio às Vítimas de Tortura, a Amnistia Internacional lançou a campanha Unlock the Truth in Europe, que visa apelar aos governos da União Europeia que investiguem, em conformidade com os direitos humanos, o seu envolvimento no programa de detenções secretas e de rendições da CIA (Agência Central de Informações norte-americana). Recorde-se que após o 11 de setembro de 2001 várias pessoas foram arbitrariamente presas em países como o Afeganistão e o Paquistão e levadas para o centro de detenção de Guantánamo, em Cuba. Pelo caminho terão passado por países europeus (entre eles Portugal), como provam alguns novos dados, que informam ainda que foram criadas prisões secretas na Lituânia, Polónia e Roménia. Factos que pode conhecer no site agora lançado pela Amnistia Internacional: unlockthetruth.org/. Participe ainda na petição que vamos enviar ao Parlamento Europeu em http://tinyurl.com/cblfgh2.

Sudão Pelo fim dos bombardeamentos indiscriminados Com o referendo de 9 de janeiro de 2011, o Sudão do Sul tornou-se um Estado independente da República do Sudão (parte norte do país), depois dos resultados revelarem que uns impressionantes 98,8% dos cidadãos eram a favor da independência. Um outro referendo deveria ter tido lugar na mesma data para decidir se Abyei, cidade petrolífera do Cordofão do Sul (um estado federado da República do Sudão) ficaria com o país do norte ou passaria a pertencer ao Sudão do Sul. Tal não aconteceu devido à falta de consenso sobre a elegibilidade dos eleitores de dois grupos étnicos: os misseryia e os ngok. Também no Cordofão do Sul e no estado do Nilo Azul estão programados referendos, cujo desfecho pode resultar num maior nível de autonomia para estes Estados da República do Sudão.

SUDÃO

DARFUR

CORDOFÃO DO SUL NILO AZUL SUDÃO DO SUL

Devido à tensão que se faz sentir nestas regiões, em junho de 2011 rebentou um conflito que se veio juntar às contendas sentidas no Darfur. As Forças Armadas Sudanesas estão, desde essa altura, a realizar bombardeamentos aéreos indiscriminados no Cordofão do Sul e no Nilo Azul, o que tem provocado inúmeros mortos e feridos, a destruição de habitações e, consequentemente, maior po-

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breza, uma vez que os agricultores não podem cultivar a sua terra. Por tudo isto, as populações têm abandonado as suas casas, os seus empregos e, muitas vezes, até as suas famílias para salvarem a sua própria vida. Mais de 500.000 pessoas foram já deslocadas das suas casas e cerca de 150.000 estão refugiadas na Etiópia e no Sudão do Sul. Nesta fuga para os países vizinhos vários civis têm sido presos e, por vezes, mortos pelas autoridades sudanesas, por serem confundidos com apoiantes do partido armado da oposição sudanês, o Movimento de Libertação do Povo do Sudão. Tudo isto tem vindo a criar uma verdadeira catástrofe humanitária, que atinge maiores proporções porque o governo da República do Sudão continua a recusar a entrada a organizações humanitárias de distribuição de alimentos e outros mantimentos. O Conselho de Segurança das Nações Unidas emitiu em maio deste ano a Resolução 2046, para pacificar os conflitos entre a República do Sudão e o

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Sudão do Sul, mas esta não contempla a condenação dos bombardeamentos indiscriminados, nem a falta de acesso à ajuda humanitária. No sentido de colmatar estas falhas, é urgente pedir ao governo português – sendo Portugal membro não permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas até dezembro do presente ano de 2012 – que tome medidas para garantir, o mais rapidamente possível, que a comunidade internacional proteja os civis sudaneses. Ajude estas populações no seu pedido de socorro. Tudo o que tem de fazer é enviar o postal que encontra no interior da revista.

© REUTERS/Goran Tomasevic As crianças ajudam a família a empacotar as suas vidas e a fugir para os campos de refugiados nos países vizinhos.

Rússia Violações de Direitos Humanos reveladas no Parlamento português Lia-se no convite para o colóquio sobre o caso do russo Sergei Magnitsky, que a 15 de maio decorreu na Biblioteca da Assembleia da República portuguesa, que a “trágica história não é uma acusação a um governo ou a um país”. Os deputados que promoveram o evento – João Soares, Miguel Santos e Mónica Ferro – fizeram “questão de sublinhar que nada nos move contra a Rússia e o seu Governo”. Contudo, o que Bill Browder, empresário norte-americano, veio contar aos deputados portugueses sobre Sergei Magnitsky é mais uma prova das acusações antes feitas pela Amnistia Internacional: as forças de segurança russas usam a tortura e outros maus-tratos em locais de detenção. Bill Browder falou ainda de corrupção e das falhas no sistema judicial russo. Explique-se a “trágica história” de Sergei Magnitsky, morto num centro de detenção, aos 37 anos de idade. Até 2007 este auditor, a trabalhar na firma de advogados Firestone Duncan, na Rússia, levou uma vida perfeitamente normal. A 4 de junho desse ano tudo mudou quando a Hermitage Capital, de Bill Browder, sua cliente, foi inspecionada pela polícia, por alegados crimes financeiros, tendo sido apreendidos documentos originais de empresas pertencentes ao grupo. “Não percebi porque queriam aquilo, mas três meses depois descobrimos que já não éramos os donos [de três das empresas]. Usaram os documentos para registá-las no nome de um criminoso, que foi libertado um ano depois”, conta Bill Browder,

em entrevista ao Notícias da Amnistia Internacional Portugal. A razão por detrás de tudo isto foi o que Sergei teve de investigar. A resposta deixou-o “chocado”: em dezembro de 2007 as empresas receberam o reembolso dos impostos pagos no ano anterior, ou seja, 220 milhões de dólares americanos que vieram do Estado russo (leia-se, dos contribuintes). Descobertas que levaram a Hermitage a apresentar, em fevereiro de 2008, uma queixa formal, com Sergei como testemunha. Alguns meses depois, a 24 de novembro, o auditor era preventivamente preso por fraude fiscal, pelos “mesmos polícias acusados pela Hermitage” e pelos mesmos factos. Daqui até ao dia da sua morte passou quase um ano, no qual Sergei foi agredido, ameaçado, torturado e colocado em solitária, não tendo tido acesso à família, ou a cuidados médicos. Tudo isto ficou documentado num diário que escreveu com detalhe, nas cartas que enviou a várias entidades e nas queixas formais que foi apresentando contra os policias que o maltratavam. Alguns destes documentos podem ser consultados no site do caso: http://russian-untouchables.com/eng. Em agosto de 2009 as dores sentidas por Sergei começaram a tornar-se insuportáveis, revelam as cartas que enviou aos seus advogados. Foi observado uma única vez, tendo-lhe sido diagnosticado um problema no pâncreas que exigia operação. Tal nunca aconteceu e a 16 de novembro de 2009 os rela-

tórios policiais referem que Sergei estava descontrolado, provavelmente devido às dores. Foi colocado em solitária e agredido. Quando os paramédicos chegaram à cela Sergei já estava morto. Um desfecho que Bill Browder nunca esperou: “sabíamos que a Rússia era um mau sítio, mas nunca imaginei que matariam o meu advogado. Matavam jornalistas, oligarcas, políticos, defensores de direitos humanos, mas não advogados de negócios”. Acrescenta que havia “um contrato social óbvio no país: os homens de negócios só fazem negócios” e acreditou que isso lhe dava imunidade face às violações de direitos humanos que acontecessem na Rússia. Hoje sabe que ninguém está totalmente a salvo e por isso quer que “a morte de Sergei seja um ponto de viragem. Que sirva para salvar vidas”. Para isso precisa de todos nós. Só juntos podemos fazer ouvir a nossa voz. Leia o postal que encontra no interior da revista, assine e envie ao Diretor do Serviço Federal sobre execução de punições, exigindo cuidados médicos para todos os prisioneiros. Indigne-se! Atue!

© russian-untouchables.com Durante o funeral de Sergei Magnitsky.


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DOSSIÊ Tratado de Comércio de Armas

É urgente um documento que nos proteja Os Estados de todo o mundo estão reunidos nas Nações Unidas para decidir sobre as nossas vidas. Quando se negoceia o Tratado de Comércio de Armas é fundamental perceber o que está em cima da mesa e exigir um documento ‘à prova de bala’. Para que todos nós, comuns cidadãos, que não usamos diariamente colete protetor, possamos estar a salvo. Quando decorre na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, a negociação do Tratado de Comércio de Armas – que a Amnistia Internacional pede desde os anos 90 – este Dossiê do Notícias da Amnistia Internacional Portugal vai procurar explicar a importância do documento e tudo o que precisa saber para acompanhar este processo, que pode representar uma mudança na História mundial. O que irá ler aqui talvez permita entender porque é que, internacionalmente, há mais regulações sobre o comércio de bananas e de ossos de dinossauros do que existem obrigações em termos de transferências de armas [ver conceito na caixa “Quais as armas incluídas no Tratado?”]. Um desinteresse por parte dos Estados em regular um dos negócios mais lucrativos do mundo (juntamente com a droga e o tráfico de seres humanos), que para nós, que não usamos diariamente coletes à prova de bala, pode ser fatal. Refira-se que no minuto que terá demorado a ler este parágrafo, uma pessoa, num qualquer país do mundo, morreu devido a conflito ou a violência armada. Esse país pode ser Portugal. Essa pessoa pode ser alguém que conheça. É por isso fundamental saber as características deste negócio, que cresceu com os ataques a Nova Iorque de 11 de setembro de 2001. “Desde 2002 que o crescimento nas vendas de armas pelas 100 maiores empresas de defesa do mundo foi de 60%”, revela o SIPRI-

© REUTERS/Buddhika Weerasinghe O Comércio de armas é um negócio muito lucrativo e fortemente concentrado.

-Stockholm International Peace Research Institute 1. Continuando nos números, só no ano passado os Estados gastaram em armas 1.738 mil milhões de dólares americanos, ou seja, 249 dólares por cada habitante do planeta. Mas muito embora todos paguemos por este armamento, os lucros do negócio vão, na verdade, para as mãos de muito poucos. “Esta continua a ser uma indústria fortemente concentrada”, com as 10 maiores empresas de defesa ou armamento do mundo a serem as mesmas há anos, explica o SIPRI 2. Geograficamente, 60% dos 100 maiores produtores de armas são norte-americanos e 30% pertencem à Europa Ocidental. Além disso, apenas cinco países – Alemanha, Estados Uni-

dos da América, França, Reino Unido e Rússia [ver caixa “Os Estados-chave neste Tratado”] – são responsáveis pela exportação de 72% das armas existentes no mundo. Refira-se que os últimos quatro (com a China) têm assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, o que lhes dá poder para vetarem resoluções como as que preveem intervenções militares num qualquer país, sob o Capítulo VII da Carta das Nações Unidas. Ainda para perceber a concentração da indústria, importa dizer que “as decisões de que armas comprar e a quem comprar estão na mão de um número reduzido de pessoas”, refere em entrevista ao Notícias da Amnistia Internacional Portugal

1 “Business as usual for top arms producers despite slowdown in arms sales”, SIPRI- Stockholm International Peace Research Institute, Comunicado de Imprensa de 27 de fevereiro 2012. 2 As 10 maiores empresas de defesa do mundo são: Lockheed Martin (Estados Unidos da América-EUA), BAE Systems (Reino Unido), Boeing (EUA), Northrop Grumman (EUA), General Dynamics (EUA), Raytheon (EUA), EADS (Europeia, com sede na Holanda), Finmeccanica (Itália), L-3 Communications (EUA), United Technologies (EUA). SIPRI Yearbook 2012: Armaments, Disarmament and International Security, Summary, Stockholm International Peace Research Institute.

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o sul-africano Andrew Feinstein, especialista e ativista do controlo do comércio de armas e cofundador da organização britânica Corruption Watch. Isto porque a aquisição de armas se prende com questões de segurança nacional, o que pressupõe um sigilo e secretismo que fazem deste um negócio com poucos atores, abrindo lugar a subornos e corrupção. Até porque é uma das atividades mais lucrativas do mundo. Refere o SIPRI que em 2010 a norte-americana OshKosh Corporation teve um crescimento de 156% nas suas vendas ao ganhar um concurso para veículos todo-o-terreno. Como não há muitos negócios destes por ano, compensa às empresas pagar quantias avultadas de dinheiro ‘às pessoas certas’, para garantirem o negócio. É aqui que surgem os chamados “intermediários”, de que é exemplo o famoso russo Viktor Bout3, considerado dos maiores traficantes de armas do mundo, a comercializar legal e ilegalmente. O problema de tudo isto é que estes atores se movem, essencialmente, por dinheiro. E é por isso que, por exemplo, todos os anos são produzidas 12 mil milhões de munições, o que seria suficiente para matar todas as pessoas do mundo, duas vezes. Estima-se ainda que existam 875 milhões de armas no mundo, mas ninguém sabe ao certo o seu número, em que país estão e a que mãos foram parar, pois, enquanto secreto, este é um negócio muito pouco transparente. Desde 1992 que as Nações Unidas – através do UNROCA-United Nations Register of Conventional Arms – pedem aos Estados-membros (193 países e territórios) que revelem voluntariamente as suas importações e exportações de armas convencionais, mas até ao ano passado 22 países nunca tinham apresentado re-

Precisamos de si! Para que o mundo tenha o mais rapidamente possível um Tratado de Comércio de Armas que salve vidas, é fundamental pressionar os governos a tomarem decisões. Para isso, durante ou após a conferência, vamos precisar de si. Só com uma atuação em massa podemos fazer ouvir a nossa voz. Junte-se à nossa mailing list relacionada com o Tratado de Comércio de Armas – escrevendo para boletim@ amnistia-internacional.pt – e pediremos a sua ajuda em breve. Precisamos de si para que a História tenha um final feliz!

latórios4 e somente 37 reportaram todos os anos5. A tendência é até para cada vez menos países apresentarem os seus negócios de armas, por questões de segurança nacional, alegam os governos. A Amnistia Internacional, por sua vez, diz que a falta de transparência tem ajudado a que 60% das violações de direitos humanos, documentadas entre 1991 e 2002, tenham envolvido armas. E tudo isto acontece com total impunidade, uma vez que a única forma de travar estes negócios são os embargos de armas decretados pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, que normalmente surgem quando já se perderam demasiadas vidas. Por tudo isto, e pelo que ainda lhe vamos revelar nas próximas páginas, desde o início dos anos 90 que a Amnistia Internacional pede uma regulação global para o comércio de armas. Desde então – e de forma mais sistemática desde 2003, quando a Amnistia se juntou à Oxfam e à IANSA-International Action Network on Small Arms para lançarem a campanha “Controlar as Armas” – tem sido feito lóbi junto dos governos para chegar a padrões comuns, limites e formas de punição para a importação, exportação e transferência de armas. Em 2006 as Nações Unidas deram um passo gigantesco ao assumirem o compromisso de iniciar este processo,

que culmina agora, na Conferência que decorre em Nova Iorque durante todo o mês de julho [ver caixa “Cronologia do Tratado de Comércio de Armas”]. É uma oportunidade única de chegarmos a um documento que pode salvar muitas vidas, mas Alberto Estevez, lobista da Amnistia Internacional junto das Nações Unidas, sabe melhor que ninguém que não será um processo fácil, explicou ao Notícias da Amnistia Internacional Portugal. Ficou claro, logo em 2006 e mais fortemente nas quatro reuniões do Comité Preparatório sobre o Tratado de Comércio de Armas – que decorreram de 2010 a fevereiro de 2012 – que vários Estados vão tentar que o documento seja fraco nas suas obrigações, tanto em termos de “Âmbito de aplicação”, como de “Parâmetros/Critérios” ou de “Implementação/ Aplicação”. Três assuntos que vão estar em debate ao longo das quatro semanas de negociações, que começaram a 2 de julho [ver caixas “Principais Questões em Negociação no Tratado de Comércio de Armas” e “Os Estados-chave neste Tratado”. Mais sobre este processo no Retrato e na Crónica desta revista]. No final da Conferência, ou seja, a 27 de julho, teremos um de três cenários: um Tratado de Comércio de Armas “robusto”, como a Amnistia Internacional deseja [ver caixa “O que quer a Amnistia Inter-

3 Viktor Bout era um militar da Força Aérea russa que, após a queda da URSS-União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, começou a trabalhar nos transportes aéreos. Diz-se que se iniciou no negócios das armas usando aviões militares que tinham sido abandonados com o colapso soviético. Terá então começado a passar armas para territórios em guerra no continente africano. Tornou-se traficante de armas e diamantes tanto para governos, como para organizações terroristas e grupos armados. Era comum fornecer os dois lados dos conflitos. No passado mês de abril, aos 45 anos, foi condenado a 25 anos de prisão por “conspiração para a venda de armamento” às guerrilhas da Colômbia, depois de ter sido preso na Tailândia em 2008 e, dois anos depois, extraditado para os Estados Unidos da América. 4 Enuncie-se: 14 africanos (Angola, Argélia, Cabo Verde, Eritreia, Guiné, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Libéria, Marrocos, República do Congo, Somália, Sudão, Uganda, Zimbabué); 2 asiáticos (Coreia do Norte e Mianmar) e 6 do Médio Oriente (Arábia Saudita, Bahrein, Emirados Árabes Unidos, Iémen, Iraque, Síria). “Reporting to the United Nations Register of Conventional Arms”, Paul Holtom, Lucie Béraud-Sudreau e Henning Weber, SIPRI-Stockholm International Peace Research Institute, maio de 2011, e Transparency in Armaments: Reporting to the United Nations Register of Conventional Arms. Fact Sheet, Office for Disarmament Affairs, Nações Unidas, 2011. 5 Enuncie-se: 5 americanos (Brasil, Canada, Chile, Estados Unidos da América, México); 6 da Ásia e Oceania (Austrália, Coreia do Sul, Índia, Japão, Nova Zelândia, Singapura), 25 europeus (Alemanha, Áustria, Bélgica, Bielorrússia, Bulgária, Dinamarca, Eslováquia, Eslovénia, Espanha, Finlândia, Holanda, Hungria, Irlanda, Itália, Liechtenstein, Malta, Mónaco, Noruega, Polónia, Portugal, Reino Unido, Roménia, Rússia, Suíça, Ucrânia) e 1 no Médio Oriente (Israel). “Reporting to the United Nations Register of Conventional Arms”, Paul Holtom, Lucie Béraud-Sudreau e Henning Weber, SIPRI-Stockholm International Peace Research Institute, maio de 2011, e Transparency in Armaments: Reporting to the United Nations Register of Conventional Arms. Fact Sheet, Office for Disarmament Affairs, Nações Unidas, 2011. 6 Alberto Estevez estima que o documento só entre em vigor com um número elevado de ratificações. Nos debates a que tem assistido o lobista diz que os Estados falaram sempre em 70/80 ratificações obrigatórias. 7 “Rise in international arms transfers is driven by Asian demand, says SIPRI”, SIPRI-Stockholm International Peace Research Institute, Comunicado de Imprensa de 19 de março de 2012. 8 O voto contra foi dos Estados Unidos da América e as abstenções de: Arábia Saudita, Bahrein, Bielorrússia, China, Egito, Emirados Árabes Unidos, Iémen, Ilhas Marshall, Índia, Irão, Iraque, Israel, Kuwait, Laos, Líbia, Nepal, Omã, Paquistão, Qatar, Rússia, Síria, Sudão, Venezuela e Zimbabué. 9 O voto contra foi do Zimbabué e as abstenções: Arábia Saudita, Bahrein, Bielorrússia, Bolívia, China, Cuba, Egito, Emirados Árabes Unidos, Iémen, Índia, Irão, Kuwait, Líbia, Nicarágua, Paquistão, Qatar, Rússia, Síria, Sudão e Venezuela.


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nacional para este Tratado”]; um Tratado fraco, com pouca utilidade; ou não haverá Tratado, tendo as negociações de prosseguir em futuras Assembleias Gerais das Nações Unidas, como a do último trimestre do ano. Caso se consiga um Tratado de Comércio de Armas, o passo seguinte será a sua ratificação por um número de Estados por definir6, para que

possa entrar em vigor. Nessa altura será essencial que os principais exportadores e fabricantes de armas ratifiquem o documento. Em qualquer um destes cenários, vamos precisar da sua ajuda, pois só juntos podemos fazer ouvir a nossa voz e pressionar os governos de todo o mundo [ver caixa “Precisamos de Si”]. Ajude-nos a mudar o rumo da História!

1925

A Liga das Nações produz um esboço de Convenção sobre o Comércio de Armas, que não chegou a ser adoptado.

1995

Oscar Arias, ex-Presidente da Costa Rica e Prémio Nobel da Paz, convida laureados do Nobel da Paz a juntarem-se para criar um Código de Conduta Internacional sobre Transferências de Armas, que é lançado dois anos depois.

2001

O mesmo Grupo faz circular um Esboço de Projeto de Convenção sobre as Transferências Internacionais de Armas, que pede um acordo universal e vinculativo sobre este negócio.

2006

É aprovada, na 61ª sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, a Resolução 61/89, de 6 de dezembro, para dar início às negociações em direção a um Tratado de Comércio de Armas – com análise do ponto de vista dos Estados-membros sobre as questões a introduzir no Tratado – e a criação de um Grupo de Trabalho para orientar os trabalhos, que estava constituído em 2008. A resolução foi aprovada com 153 votos a favor, 1 contra e 24 abstenções8 .

2009

É aprovada, na 64ª sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, a Resolução 64/48, de 2 de dezembro, que agenda para 2012 a Conferência para a criação do Tratado de Comércio de Armas. Foi aprovada com 151 votos a favor, 1 contra e 20 abstenções9 .

2010

O Grupo de Trabalho para o Tratado de Comércio de Armas realiza a Primeira Sessão do Comité Preparatório (PrepCom na sigla inglesa) sobre o Tratado de Comércio de Armas entre 12 e 23 de julho.

2011

O Grupo de Trabalho realiza a Segunda Sessão do Comité Preparatório entre 28 de fevereiro e 4 de março e a Terceira Sessão de 11 a 15 de julho.

2012

Realiza-se a Quarta e última Sessão do Comité Preparatório, de 13 a 17 de fevereiro.

2a27 julho 2012

Conferência das Nações Unidas sobre o Tratado de Comércio de Armas.

© REUTERS/Noor Khamis

Enquanto não há um Tratado de Comércio de Armas “robusto”… … as armas continuam a alimentar conflitos armados que entre 2007 e 2011 os russos forneceram 78% das armas que entraram na Síria e que este país representa 10% das suas exportações, revela o SIPRI 7. Porém, se apontamos o dedo à Rússia, é preciso fazê-lo também, pelo menos, à Alemanha, aos Estados Unidos da América, a França e ao Reino Unido, os cinco maiores exportadores de armas do mundo, que fornecem, em conjunto, 75% das armas existentes globalmente [ver caixa “Os Estados-chave neste Tratado”]. Como o mercado é desregulado, muitas delas acabaram, nas últimas décadas, por serem usadas em conflitos armados, para matar civis. Explica Andrew Feinstein: “não acredito que o fácil acesso a armas seja a causa dos conflitos, mas faz com que sejam muito mais

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Cronologia do Tratado de Comércio de Armas

Todos os anos são produzidas 12 mil milhões de munições, o suficiente para matar todas as pessoas do mundo, duas vezes.

No fecho desta edição, os telejornais discutiam se a situação na Síria seria de ‘guerra civil’. Para o sírio Khaled al-Hamedh, de 21 anos, a denominação – importante para possibilitar uma intervenção militar internacional – nada importou. O jovem saiu de casa a 31 de julho de 2011 para comprar medicamentos para o irmão de quatro anos, quando foi alvejado e atropelado por um tanque de combate das forças governamentais. A denominação não foi também importante para milhares de outros civis que já perderam a vida na Síria. No entanto, tem sido fundamental para a Rússia, que se opõe a uma intervenção por parte do Conselho de Segurança das Nações Unidas (e pode bloqueá-la enquanto membro permanente). Interessante é perceber

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O que quer a Amnistia Internacional para este Tratado? A Amnistia Internacional espera que no final de julho o mundo possa contar com um Tratado de Comércio de Armas “robusto”, ou seja, que existam normas rigorosas a controlar as transferências internacionais de armas, a torná-las transparentes e a responsabilizar os seus fornecedores e comerciantes. Pretende-se que o documento tenha no seu âmago os direitos humanos, impedindo transferências sempre que estejam em risco. De forma mais detalhada, a Amnistia Internacional estabeleceu cinco Princípios para o futuro Tratado de Comércio de Armas: Princípio 1: Responsabilização dos Estados: Todas as transferências internacionais de armas devem ser autorizadas por um Estado e respeitar as leis nacionais e as obrigações do Direito Internacional. Princípio 2: Limitações Expressas: Não devem ser autorizadas transferências que violem obrigações segundo o Direito Internacional, por exemplo: embargos de armas (ao abrigo da Carta das Nações Unidas), armas que possam provocar sofrimentos supérfluos ou desnecessários e que não distingam combatentes de civis (ao abrigo do Direito Internacional Humanitário); armas que possam vir a ser transportadas para um terceiro país, não respeitando este último destinatário as Limitações expressas no Tratado. Princípio 3: Outras Limitações: Não autorizar transferências de armas quando estas forem, ou quando se acreditar que possam ser, usadas para violações ou abusos de direitos humanos (a análise da probabilidade é importante). Princípio 4: Na autorização das transferências, os Estados devem ter em conta fatores como: cumprimento de compromissos internacionais por parte do país destinatário, nível de criminalidade nesse Estado, entre outros. Princípio 5: Transparência: Obrigatoriedade dos Estados signatários enviarem relatórios anuais e detalhados sobre transferências internacionais de armas, para registo e publicação de relatório anual.

© Amnistia Internacional

Princípio 6: Mecanismos de controlo rigorosos: Encontrar formas de controlar com rigor as exportações e importações de armas, a mediação na venda de armas, as transferências de armas licenciadas, o trânsito e o embarque de armas.

É fundamental impedir que as armas caiam nas mãos erradas.

sangrentos, causem muito mais mortos e durem mais tempo”. Para além disso, as armas que acabam por ficar disponíveis no pós-conflito facilitam o seu reacender. Realidades que seriam ultrapassadas

com um Tratado de Comércio de Armas “robusto”, que impedisse a entrada de armamento em países onde se preveja virem a ocorrer conflitos, ou onde estes já decorrem. Poupar-se-iam, todos os anos,

cerca de 57.000 vidas (número de pessoas que se estima morrerem anualmente em guerras, a que se somam centenas de vítimas indiretas, como as mortes por cólera ou malária, por exemplo).

… as armas continuam a contribuir para a repressão interna Diz o provérbio popular que “em tempo de guerra não se limpam armas”, mas a verdade é que alguns Estados nunca as chegam a ‘limpar’, usando-as para reprimir os seus próprios cidadãos. O Chade é um bom exemplo: a 2 e 3 de fevereiro de 2012 centenas de pessoas foram assassinadas, outras desapareceram e

algumas foram arbitrariamente detidas e torturadas no seguimento da rebelião (falhada) da coligação de partidos da oposição. A supremacia das forças governamentais deveu-se unicamente ao poder das suas armas, tal como aconteceu em vários países da ‘Primavera Árabe’. O mesmo está a ocorrer na Grécia,

onde a polícia tem usado a força e o gás lacrimogéneo para reprimir os manifestantes. Outros Estados vão ainda mais longe, utilizando as armas como forma ‘legal’ de assassinar: em 2011 foram oito10 os países que utilizaram o fuzilamento como forma de aplicação da pena de morte.


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Com um Tratado de Comércio de Armas ‘robusto’, que proíba transferências que ajudem a violar direitos humanos, “as forças de segurança teriam de cumprir a nível nacional as normas internacionais do uso da força, senão não teriam acesso a mais gás lacrimogéneo, nem a outras

armas”, refere Alberto Estevez. Seria assim cortado o fluxo que alimenta muitos governos e grupos armados, salvando cerca de 55.000 pessoas todos os anos (número estimado de vítimas anuais da violência armada perpetuada pelas for-

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ças governamentais e grupos armados organizados, excluindo a violência armada por parte de civis e grupos armados informais, que referimos em seguida).

… as armas continuam a contribuir para a violência armada Os números falam por si: quase 200.000 pessoas foram, em 2010, mortas com armas de fogo disparadas por indivíduos ou gangues/grupos armados informais, revela a Amnistia Internacional. A iniciativa diplomática Declaração de Genebra sobre Violência Armada e Desenvolvimento prefere falar em 740.000 assassinatos anuais consequência da violência armada, indicando que “nove em cada 10 mortes violentas ocorre em locais onde não há conflitos”11. Seja qual for o verdadeiro número, importante é perceber que há uma só protagonista: a arma de fogo, responsável por 42% dos homicídios ocorridos em todo o mundo, releva o Escritório das Nações Unidas so-

bre Drogas e Crime 12. Uma delas terá morto Mateo López, da Guatemala, assassinado em 2010 por dois homens que seguiam de mota. Nas Américas encontram-se, efetivamente, os países com mais mortes violentas registadas, muitas vezes associadas ao crime organizado13, mas pensar que o Oceano Atlântico é suficientemente grande para poupar Portugal a esta realidade, é pura utopia. Um estudo realizado pelo Núcleo de Estudos para a Paz, do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, afirma que “por semana morrem em Portugal pelo menos duas pessoas vítimas de arma

de fogo”14. A analista norte-americana do Center for Defense Information, Rachel Stohl, acrescenta que a existência de armas leva a que tensões diárias que seriam resolvidas de forma não violenta se transformem em violência15. Tudo isto pode mudar com um Tratado de Comércio de Armas “robusto”, explica Alberto Estevez: “uma das propostas que temos para o documento é que os Estados tenham em conta o número de homicídios nos países, ou melhor, que países que tenham uma violência endémica não recebam armas”. Só assim se pode ‘apagar’ os números com que começámos este texto.

… as armas continuam a ser usadas para recrutar crianças-soldado Há menos de 100 anos era impensável as crianças serem usadas como soldados. Não por maior respeito pelos seus direitos, mas porque o armamento era tão pesado que um menor não o conseguiria usar ou manejar. Os avanços tecnológicos vieram mudar tudo isto, com as armas a ficarem cada vez mais pequenas, ligeiras e simples de utilizar. Radhika Coomaraswamy, perita das Nações Unidas para questões de crianças e conflitos armados, afirma que em 40 minutos um menor consegue aprender a disparar uma Kalashnikov (AK-47), a arma mais comum no mundo16. Tudo isto levou ao incremento do uso de crianças – normalmente com idades

entre os 14 e os 18 anos, mas podendo ter apenas nove – como soldados, cozinheiros, mensageiros, espiões, escravos sexuais, suicidas, escudos humanos, entre outras utilizações, seja pelas forças governamentais ou pelos grupos armados, seja em tempos de paz ou de conflito. Uma realidade que começou a mudar em 2002, quando entrou em vigor o Protoloco Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança relativo ao envolvimento de crianças em conflitos armados, do qual fazem parte 147 Estados. Revela a Coalition to Stop the Use of Child Soldiers que desde então menos governos têm colocado menores em cenários de guerra17, porém, “no que diz

respeito a grupos armados não estatais (…) apesar de alguns exemplos de progresso, a situação mantém-se, no essencial, inalterada: o recrutamento e uso de rapazes e raparigas por grupos armados continua generalizada”18. Um Tratado de Comércio de Armas “robusto” iria controlar as transferências de armas – procurando impedir que vão parar às mãos erradas – e bloquear o acesso a armamento a governos que violem a lei internacional ao recrutarem menores de 18 anos para cenários de guerra. Só assim mais crianças podem, simplesmente, ser crianças.

10 Foram eles: Autoridade Palestiniana, Bielorrússia, China, Coreia do Norte, Emirados Árabes Unidos, Iémen, Somália e Vietname. 11 Folheto informativo da Declaração de Genebra sobre Violência Armada e Desenvolvimento. 12 Global Study on Homicide 2011: Trends, Contexts, Data, Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime. 13 Global Burden of Armed Violence 2011, Declaração de Genebra sobre Violência Armada e Desenvolvimento. 14 “Violência e armas ligeiras: um retrato português”, estudo realizado entre 2007 e 2010 pelo Núcleo de Estudos para a Paz, do Centro de Estudos Sociais da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, publicado no P@X Boletim de 15 de dezembro de 2010. 15 “Targeting Children: Small Arms and Children in Conflict”, Rachel Stohl, The Brown Journal of World Affairs, 2002. 16 Radhika Coomaraswamy, perita das Nações Unidas para questões relacionadas com crianças e conflitos armados, ao UN News Service (www.un.org). 17 Entre 2004 e 2007 fizeram-no o Chade, Iémen, Israel, Mianmar, Reino Unido (na situação específica do Iraque, em 2005, para onde foram destacados jovens com 16 anos), República Democrática do Congo, Somália, Sudão e Uganda. Relatório de 2008, Coalition to Stop the Use of Child Soldier. 18 Indica o Relatório de 2008 da Coalition to Stop the Use of Child Soldier que os países onde as crianças foram recrutadas e usadas por paramilitares, milícias, forças de defesa civis e grupos armados, entre 2004 e 2007, foram: Afeganistão, Burundi, Butão, Chade, Colômbia, Costa do Marfim, Filipinas, Haiti, Índia, Indonésia, Iraque, Israel/Autoridade Palestiniana, Líbano, Libéria, Mianmar, Nepal, Nigéria, Paquistão, Quénia, República Centro Africana, República Democrática do Congo, Ruanda, Somália, Sri Lanka, Sudão, Tailândia e Uganda.

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… as armas continuam a ‘empurrar’ os migrantes No final de 2010 o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados referia, no seu Statistical Yearbook, que havia, em todo o mundo, 43,3 milhões de deslocados internos e refugiados devido a conflitos armados e perseguição. A maioria provém do Afeganistão, seguido do Iraque, ou seja, de países em guerra. No entanto, acrescenta Rachel Stohl,

mesmo quando os conflitos terminam “os refugiados têm muitas vezes medo de regressarem às suas casas pela grande quantidade de armas que continuam nas mãos de ex-combatentes, que não foram desmobilizados, ou porque continua a haver armas escondidas”19. Até porque todos os refugiados e deslocados sentiram já na pele o poder ilimitado de

alguém que possui uma arma. Um Tratado de Comércio de Armas “robusto” iria permitir controlar as transferências de armas e saber quantas continuam em circulação após os conflitos, bem como em que mãos elas estão. Um documento assim protegeria mais os refugiados e deslocados do que as tendas dos campos onde permanecem anos a fio.

… as armas continuam a ser usadas para a violência de género Sábado, 18 de dezembro de 2010: “Levaram-me, com outras cinco mulheres, para uma casa. Era manhã. Estavam lá três homens. Disseram-nos que nos despíssemos. Recusei-me. Um deles bateu-me. Disse-lhe que isso não era humano. E ele disse: ‘já vamos ver isso’. Puxou de uma arma e eu tive de ceder. Os três homens violaram-nos”, contou à Amnistia Internacional uma mulher da Costa do Marfim, que preferiu o anonimato. Uma história que, infelizmente, se banalizou em muitos conflitos armados, uma vez que a violência sexual é, efetivamente, uma tática de guerra, que serve para humilhar, dominar, espalhar o medo, dispersar e/ou deslocar civis, refere a resolução 1820, de 19 de junho de 2008, do Conselho de Segurança das Nações Unidas. São disso exemplo a Libéria (1989 a 2003), a Bósnia (1991 a

1995), o Ruanda (1994), a Serra Leoa (1991 a 2002), a República Democrática do Congo, desde os anos 90 e o Darfur, no Sudão. Em todas estas situações as armas são usadas para obrigar as vítimas a ceder e manter os maridos e familiares impotentes. Não se pense, no entanto, que as armas só contribuem para a violência de género em tempo de guerra. Embora os números da UMAR-União de Mulheres Alternativa e Resposta refiram que ‘apenas’ 30% dos homicídios de mulheres ocorre com arma de fogo (a maioria tem recurso a arma branca)20, “quando existe uma arma em casa, as mulheres ficam três vezes mais expostas a mortes violentas. Os perpetradores são muitas vezes os esposos ou companheiros (...). Além disso, por cada mulher assassinada ou ferida com arma de fogo, muitas outras são ameaçadas”,

revela o OGiVA-Observatório sobre Género e Violência Armada, do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra 21 . A mesma fonte indica que as armas usadas estão, na sua maioria, legais e que “a probabilidade de uma arma de fogo em casa ser usada para intimidar ou ferir membros da família é superior à sua utilização contra possíveis intrusos”. Um Tratado de Comércio de Armas “robusto” iria impedir os Estados de colocarem mais armas em países como a República Democrática do Congo, onde são usadas para violar os direitos humanos das mulheres. Em termos de violência doméstica, a obrigatoriedade de apresentar alguns números publicamente, como o de homicídios, iria envergonhar alguns Estados e levá-los a controlar mais fortemente o licenciamento de armas.

… as armas ajudam a perpetuar a pobreza Numa altura de crise económica a situação na Grécia está na 'boca do mundo', seja pela repressão policial, pela crise, pelas medidas impostas, pelo dinheiro que deve, ou, evidencie-se, pela polémica compra de quatro submarinos à alemã ThyssenKrupp, em 2000, e posterior contrato de melhoria de três submarinos, em 2002. Daniel Cohn Bendit, deputado no Parlamento Europeu, acrescentou em 2010 que a Grécia tinha comprado uns meses antes seis fragatas e helicópteros a França. Andrew Feinstein explica a polémica: “alguns relatórios revelam

que na negociação da dívida na Grécia, a França e a Alemanha, de forma direta, e os Estados Unidos da América, indiretamente, estão a dizer ao governo grego que tem de cortar na educação, na saúde e nos benefícios sociais, na ordem dos 30/40%, mas não pode cortar na defesa mais de 10%. Isto porque os três países são os principais fornecedores de armas da Grécia, que é o maior comprador de armas da União Europeia (por causa da relação com a Turquia)”. Refira-se que até 2010 a Grécia tinha

gastos militares na ordem dos 4% do seu Produto Interno Bruto (PIB) (e em anos anteriores 7%), sendo então o quinto maior importador de armas do mundo, revela o SIPRI 22. A média de despesas com defesa na União Europeia é de 2% do PIB, o que para alguns analistas é muito em tempo de crise, enquanto para os governos é uma questão de segurança interna. Andrew Feinstein é um dos críticos: “na África do Sul gastámos cerca de 10 mil milhões de dólares em armas de que não precisávamos e que mal usámos. (...) Mesmo que haja ameaças, o equipa-

19 “Targeting Children: Small Arms and Children in Conflict”, Rachel Stohl, The Brown Journal of World Affairs, 2002. 20 “OMA – Observatório de Mulheres Assassinadas da UMAR: Dados preliminaries 2011”, União de Mulheres Alternativa e Resposta. 21 “Desarmar a violência doméstica na Semana de Ação Global Contra a Violência Armada”, artigo de opinião do OGiVA-Observatório sobre Género e Violência Armada, Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, junho de 2009. 22 Atualmente a Grécia não está sequer nos 10 principais investidores em meios militares (um dado que inclui despesas com pessoal, formação, armas, entre outros) do mundo, que são, por ordem: Estados Unidos da América, China, Rússia, Reino Unido, França, Japão, Índia, Arábia Saudita, Alemanha e Brasil, revela o SIPRI Yearbook 2012: Armaments, Disarmaments and Internatinal Security: Summary, SIPRI-Stockholm International Peace Research Institute, 2012. 23 O relatório “Military expenditure by country, in local currency, 1988-2011”, do SIPRI- Stockholm International Peace Research Institute, revela que nas datas analisadas três países do mundo apenas não tinham gasto dinheiro com os meios militares: Costa Rica (único que tem esta posição desde 1988), Haiti (desde 1996) e Panamá (desde 2000). 24 Conventional Arms Transfers to Developing Nations, 2003-2010, Richard F. Grimmett, Congressional Research Service, 22 de setembro de 2011. 25 Global Study on Homicide 2011: Trends, Contexts, Data, Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime.


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© AP/PA Photo/Rodrigo Abd Prédio de habitação atingido pelos bombardeamentos indiscriminados do governo sírio. Algo que seria suficiente para impedir que mais armas entrassem no país se houvesse um Tratado de Comércio de Armas “robusto”.

mento é inútil pois não temos capacidade económica para a gasolina, para treinar pilotos, etc. A verdadeira razão para o negócio foram os cerca de 300 milhões de dólares pagos como suborno”, afirma, acrescentando que o mesmo acontece em quase todos os países do mundo23, incluindo Portugal [ver caixa “Portugal e o negócio de armas”]. Negócios que por vezes não chegam ao conhecimento da opinião pública e quando tal acontece, continua Feinstein, os governos “criam um ambiente de medo dizendo que há ameaças sobre o país”. O ativista não hesita em afirmar que muitas dessas notícias são fabricadas. Curioso é o facto de “durante os anos 2003-2010 o valor dos acordos de transferências de armas com as nações em desenvolvimento ter correspondido a

72,9% do valor total global”, segundo o Congressional Research Service do Congresso norte-americano24. O documento refere a Índia, Taiwan e a Arábia Saudita como os Estados que, pela respetiva ordem, mais fizeram acordos de compra de armas. Em termos de entregas de armamento, em 2010 os países em desenvolvimento corresponderam a 62,6% do total do negócio. Por outro lado, é interessante notar que os países com um desenvolvimento humano e económico mais fraco e com rendimentos desiguais registam os mais elevados números de homicídios, diz o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime 25, acrescentando que “a comunidade internacional acredita cada vez mais que a violência armada é um obstáculo ao desenvolvimento humano, social e económico”.

Um Tratado de Comércio de Armas “robusto” faria com que os Estados não pudessem transferir armas para países onde o negócio pudesse prejudicar ou dificultar os esforços de redução da pobreza ou afetar o desenvolvimento socioeconómico. Uma medida que iria salvar um número incalculável de vidas. O COMÉRCIO DE ARMAS Se o seu telemóvel permite ler QRCodes, assista ao vídeo que explica como as armas se foram espalhando pelo mundo, quem beneficia com elas e quem mais sofre as consequências deste comércio (até hoje) desregulado. Pode também assistir em: http://tinyurl.com/bursh49

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Principais Questões em Negociação no Tratado de Comércio de Armas Questões em Negociação no Tratado

Um Tratado “Robusto”…

O que dizem os Estados

Âmbito de Aplicação Que tipo de armas devem estar incluídas?

(ver página seguinte)

Q ue transações e atividades devem estar incluídas? Os intermediários e dealers devem estar incluídos?

… Regularia importação, exportação, transferência, transbordo, corretagem, fabrico e fabrico sob licença estrangeira, transferência de tecnologia, ofertas, empréstimos, promoção, investigação e assistência técnica. ...Incluiria o controlo dos intermediários.

Há unanimidade em querer definições claras sobre as armas e transações, mas alguns preferem-nas amplas e gerais – para que possam incluir alterações futuras –, outros defendem maior detalhe. Fica fora do Tratado o movimento de armas dentro de um Estado.

Parâmetros / Critérios Devem os Estados signatários não autorizar a exportação, importação ou transferência de armas quando… . .. possam servir para violar o Capítulo VII da Carta das Nações Unidas (que regula a ação em caso de ameaça à paz, rutura da paz e ato de agressão) ?

… Incluiria esta cláusula.

. .. possam servir para violar quaisquer obrigações ou compromissos assumidos sob regulação internacional, regional ou sub-regional?

… Incluiria esta cláusula.

. .. possam servir para enfraquecer a paz e a segurança ou provocar, prolongar ou agravar a instabilidade interna, regional, sub-regional ou internacional?

… Incluiria esta cláusula.

possam servir para cometer ou facilitar violações … graves à lei internacional humanitária?

… Incluiria esta cláusula.

possam servir para cometer ou facilitar violações … graves à legislação internacional de direitos humanos?

… Incluiria esta cláusula.

possam servir para cometer ou facilitar violações … graves à lei penal internacional (ou seja, servirem para cometer genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de guerra)?

… Incluiria esta cláusula.

possam servir para prejudicar ou dificultar … a redução da pobreza e o desenvolvimento socioeconómico do Estado destinatário?

… Incluiria esta cláusula.

possam ser desviadas por forma a serem usadas … em finalidades inconsistentes com os princípios e objetivos do Tratado?

… Incluiria esta cláusula.

possam ser usadas para o crime transnacional … organizado?

… Incluiria esta cláusula.

possam ser usadas para apoiar, encorajar ou … perpetuar atos terroristas?

… Incluiria esta cláusula.

É unânime a necessidade de definir Critérios objetivos. Uns querem esclarecer o que cabe em cada parâmetro, outros sugerem apenas a inclusão das razões para recusar um negócio. Vários revelam preocupação em colocar estes entraves à sua soberania nacional. Referem que os atores não estatais – como os grupos armados – continuariam com acesso a armas, o que pode pôr em causa a segurança nacional. Outra questão prende-se com a forma de analisar o risco das armas servirem para ‘más finalidades’ ao serem transferidas. Discute-se ainda se haverá capacidade para os Estados controlarem o movimento de todas as armas: da produção à sua utilização ou destruição.

Implementação / Aplicação D evem ser criados mecanismos de controlo e monitorização de todos os movimentos que incluam armas convencionais?

Atribuiria às autoridades nacionais competência … para controlarem e licenciarem armas de modo transparente e eficaz.

D evem ser criados mecanismos de registo das autorizações ou recusas de posse de arma, bem como das importações, exportações e transferências?

Implicaria relatórios detalhados, indicando o mode… lo/tipo de arma, transferências autorizadas e recusadas, importador e/ou exportador e finalidade do negócio. Estes dados deveriam ser fornecidos num prazo a definir e ficar guardados por (pelo menos) 10 anos.

A lguns querem que a forma de Implementação do Tratado seja um assunto nacional (por possível falta de recursos). Outros referem a importância de um organismo internacional que assista na implementação, aplicação, verificação e monitorização. A maioria quer que a análise e decisão sobre a produção e transferência de armas seja assunto de soberania nacional (tendo como base os Parâmetros/Critérios).


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Implementação / Aplicação (cont.) D evem ser criados mecanismos para aplicação efetiva do Tratado?

Implicaria a criação de mecanismos legais e … judiciais para punir quem viole o Tratado. …Permitiria prevenir e condenar a corrupção.

R eceio demonstrado em reportar os negócios de armas realizados, por motivos de segurança nacional. Discute-se o grau de detalhe deste tipo de relatórios. Discute-se a aplicação de sanções e punições para quem não cumpra o Tratado.

D eve ser encorajada e facilitada a assistência e cooperação internacionais para apoio na aplicação do Tratado?

Incluiria assistência técnica, legal, material e … financeira em questões relacionadas com o comércio de armas, bem como a troca de informações e a responsabilização. Podia ser feita pelo sistema das Nações Unidas.

O s países em desenvolvimento temem não ter capacidade para criar mecanismos de controlo do comércio de armas. Mas receiam ainda que o apoio de outros países ponha em causa a sua soberania nacional. De forma geral receiam os mecanismos de troca de informações.

Deverá incluir-se no Tratado a assistência às vítimas?

Incluiria assistência técnica e material para … cuidados, reabilitação e reintegração social e económica das vítimas de conflito armado.

uitas divergências quanto ao nível de assistência M que deve ser prestado.

D eve ser criada uma Unidade de Apoio à Implementação?

Criaria uma entidade para guardar os relatórios … anuais e providenciaria assistência técnica e administrativa na implementação do Tratado.

A discussão é entre a criação de um organismo dentro das Nações Unidas ou a utilização de um órgão internacional independente. E que funções específicas devem assumir.

Disposições Finais C omo irá decorrer o processo de assinatura, ratificação e adesão ao Tratado e a sua entrada em vigor?

Não exigiria unanimidade na negociação do texto … do Tratado. ... Não daria direito de veto. ... Não exigiria um número exagerado de ratificações para entrar em vigor.

Irá permitir reservas?

N ão permitiria reservas que ponham em causa as disposições do Tratado.

D iscute-se o que significará ‘decidir por consenso’, que ficou definido na resolução de 2006. Caso não seja possível obter 'consenso', poderá ser adotada a regra da Assembleia Geral de decidir com base na maioria de dois terços.

Tabela construída com base nos seguintes textos: “Chairman’s Draft Paper”, de 14 de julho de 2011; “Facilitator’s Summary for Scope”, de 22 de julho de 2010; “Facilitator’s Summary on Parameters”, de 22 de julho de 2010 e “Facilitator’s Summary in Implementation and Application”, todos disponíveis no blog do Tratado de Comércio de Armas (http://armstradetreaty.blogspot. pt). Ainda “Arms Trade Treaty”, National Model United Nations (www.nmun.org).

Quais as armas incluídas no Tratado? O Tratado de Comércio de Armas vai regular as chamadas Armas Convencionais, o que exclui armas de destruição maciça, sejam nucleares, biológicas ou químicas – já banidas e controladas por outros Tratados. Segundo o “Chairman’s Draft Paper”, de 14 de julho de 2011, documento que serve de base às negociações da Conferência, as armas a serem incluídas no Tratado são as mencionadas nas sete categorias do UN Register on Conventional Arms: 1) tanques/carros de combate; 2) veículos militares blindados; 3) sistemas de artilharia pesada (canhões, morteiros, entre outros); 4) aeronaves de combate; 5) helicópteros militares; 6) navios de guerra (de superfície e submarinos); 7) mísseis e sistemas de lançamento de mísseis. Refere o “Facilitator’s Summary for Scope” que alguns Estados defendem a inclusão de mais armas dentro de cada uma destas categorias. O Tratado de Comércio de Armas deverá vir a incluir as Armas Ligeiras – metralhadoras pesadas; lançadores de granada; armas antiaéreas portáteis; antitanques portáteis; canhões sem recuo; lançadores portáteis de sistemas de mísseis antitanque e sistemas de foguete; morteiros de calibre menor que 100 milímetros – e Armas de Pequeno Calibre – revólveres e pistolas automáticas; caçadeiras e carabinas; sub-metralhadoras; espingardas de assalto; metralhadoras. Está também em negociação a inclusão das Munições necessárias para as armas definidas, os Explosivos, as Peças ou Componentes desenhados para as armas referidas, bem como de toda a Tecnologia e Equipamento criados para desenvolver, produzir ou manter as categorias de armas especificadas.

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Os Estados-chave neste Tratado

Posição em relação ao Tratado

5 maiores Importadores/Receptores (em 2010)

% das importações de armas do mundo

C eticismo. Não acredita que um conjunto de normas internacionais que regulem este comércio seja o necessário para impedir que as armas cheguem às mãos erradas.

Índia

10%

C oncorda com um “Âmbito de Aplicação” abrangente, tirando apenas a Tecnologia. Defende o princípio do consenso, mas não com direito de veto. Os relatórios das transferências de armas nacionais devem ser voluntários. Também a implementação do Tratado deveria ser assunto nacional (embora aceite a ideia de um organismo dentro das Nações Unidas a coordenar a implementação). No fundo, quer pouca interferência na soberania nacional.

Prevê-se que seja dos principais bloqueadores de um Tratado “robusto”. Defende que o direito de cada Estado à segurança nacional deve ser um princípio básico do Tratado.

Coreia do Sul

6%

Paquistão

5% T em tido uma abordagem cautelosa. Não quer que o Tratado se aplique a armas ligeiras e de pequeno calibre (a área em que a China se tem especializado enquanto exportador). Quer excluir do Tratado transferências diretas de governos para governos. Nas últimas décadas exportou armas para países com registos graves em termos de direitos humanos, como Angola, Líbia, Paquistão, República Democrática do Congo, Sudão, Zimbabué. Só se ficar com uma opinião demasiado isolada do resto dos países poderá ceder em alguns assuntos. Faz questão de afirmar os direitos dos Estados à sua defesa nacional e a implementarem o Tratado da forma que melhor entenderem.

Posição em relação ao Tratado

5 maiores Exportadores/Fornecedores (em 2010)

% das exportações de armas do mundo

P aís que mais comercializa armas do mundo, com quase 50% do volume de transferências no mercado de armas convencionais. Desde 2009, altura em que tomou posse Barack Obama, que os Estados Unidos demonstram apoio ao Tratado. A Administração Bush opôs-se sempre à criação do documento. Declarações das autoridades têm sido fracas quanto à inclusão de “Parâmetros/Critérios”. Também parece haver pouco interesse por mecanismos de implementação fortes. Tem-se oposto à inclusão das munições no Tratado. Prevê-se que seja dos principais bloqueadores de um Tratado “robusto”. Diplomatas afirmaram não quererem limitações que se prendam com direitos humanos, lei humanitária e/ou desenvolvimento socioeconómico, por considerarem que exigiria interpretações ideológicas. Confortável com o Tratado cobrir todo o tipo de armas convencionais e com mecanismos de controlo fortes. T em seguido a maioria dos Estados da União Europeia, apoiando os “Parâmetros/Critérios”. Opôs-se à ideia de ‘consenso’ e ao poder de veto na tomada de decisões. Pode ceder à pressão norte-americana e aceitar enfraquecer o critério dos direitos humanos, até porque entre os seus clientes estão países do Médio Oriente (Argélia e Arábia Saudita), Grécia, Turquia, entre outros.

Estados Unidos da América1

30%

1

Rússia

24%

1

Alemanha

9%

China1 2

5%

Singapura

4%

T em demonstrado forte apoio aos “Parâmetros/Critérios”, embora tenha entre os seus ‘clientes’ habituais: Emirados Árabes Unidos, Grécia e Singapura. Tem pedido mecanismos de implementação do Tratado “robustos”.

Começou por querer que o Tratado não tivesse um “Âmbito de Aplicação” alargado, mas foi mudando de opinião, aceitando cada vez mais tipos de armas. Foi o primeiro “Estado-chave” a mostrar apoio pelos “Parâmetros/Critérios”. Pode ceder à pressão norte-americana para criar um Tratado menos “robusto”, até porque os Estados Unidos da América são um dos seus principais ‘clientes’’, como a Arábia Saudita, os países do Médio Oriente e Norte de África, entre outros.

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França

8%

Reino 1 4 Unido

4%

Tabelas construídas com base nos seguintes textos: SIPRI Yearbook 2011: Armaments, Disarmament and International Security, Summary, Stockholm International Peace Research Institute; “19 March 2012: Rise in international arms transfers is driven by Asian demand, says SIPRI”, Stockholm International Peace Research Institute, Comunicado de Imprensa de 19 de março de 2012; Statements on an arms trade treaty, disponível em http://www.un.org/disarmament/ATT/statements/, A Global Arms Trade Treaty: What States Want, Amnistia Internacional, outubro de 2007; entrevista a Alberto Estevez, lobista da Amnistia Internacional para o Tratado do Comércio de Armas e investigação da Amnistia Internacional. 1 Os seis países assinalados são considerados Estados-chave para a Amnistia Internacional, por serem os mais influentes no negócio das armas. Cinco são membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas – China, Estados Unidos da América, França, Reino Unido e Rússia. O sexto é a Alemanha. 2 Em 2011 a China tornou-se o 6.º maior Exportador de Armas do mundo, ao mesmo tempo que era o 3.º maior Importador (ex aqueo com o Paquistão). Interessante é que entre 2002 e 2006 a China foi o maior Importador de armas do mundo, tendo começado a perder esta posição à medida que se foi tornando um exportador mais forte. Entre 2002-2006 e 2007-2011 o volume de exportações da China aumentou em 95% (dois terços da exportação da China vão para o Paquistão). 3 A posição de França é a anterior ao novo Governo, que subiu ao poder em maio de 2012, quando tinham terminado as negociações preliminares. 4 Tem uma das maiores empresas de armamento do mundo, a BAE Systems.


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Quem terá maior Peso? Costa do Marfim Costa Rica • França • Libéria Mali • Suíça • Reino Unido República Democrática do Congo Serra Leoa • Uruguai Cerca de 120 países dos 193 países das Nações Unidas, incluindo muitos africanos, bastantes Europeus e alguns latino-americanos

Arábia Saudita Bolívia • China Coreia do Norte • Cuba Egito • Equador • Irão Nicarágua • Paquistão • Rússia • Síria Venezuela • E a maioria dos países Árabes

Os mais favoráveis a um Tratado “robusto”?

Os menos favoráveis a um Tratado “robusto”?

Países da Comunidade das Caraíbas (CARICOM)

Portugal e o Negócio de Armas Pelo menos duas pessoas morrem por semana em Portugal vítimas de arma de fogo, revela o Núcleo de Estudos para a Paz do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, que entre 2007 e 2010 realizou o estudo “Violência e armas ligeiras: um retrato português”. Em média, são 104 mortos, todos os anos, devido a armas (86% deles homens). Acrescenta o Relatório Anual de Segurança Interna 2010, do Sistema de Segurança Interna, que mesmo assim o número de homicídios com recurso a arma de fogo tem vindo a diminuir, tendo em 2010 sido usada em 34% dos assassinatos. Bem mais elevados são os números relativos aos feridos com arma de fogo: 2.047 entre 2003 e 2009, em média, quase 300 pessoas por ano. Acrescenta o Núcleo de Estudos para a Paz que 40% tinham sofrido tentativas de homicídio. O mesmo estudo refere ainda que as armas de fogo existentes em Portugal foram usadas em 87% dos roubos registados em 2006 e 2007. Embora exista um mercado ilegal de armas no nosso país, é possível estimar-se que a quantidade de armas de fogo em posse civil ronde as 2,6 milhões. Apenas 54% estão legalizadas (processo da exclusiva competência da PSP-Polícia de Segurança Pública). Em termos de licenciamento, refere a polícia no relatório “Atividade do Departamento de Armas e

Explosivos da PSP 2011” que no ano passado foram emitidas 20.845 licenças. O Núcleo de Estudos para a Paz acrescenta que 84,5% dos licenciamentos são referentes a armas de caça, mas a arma que é mais frequentemente usada – e que por isso é mais perigosa – é o revólver/ pistola. Preocupante é perceber que, segundo o estudo feito em Portugal, quatro armas são extraviadas/roubadas todos os dias. A maioria são espingardas. Dados que seriam mais do que suficientes para todos nós, portugueses ou residentes em Portugal, ficarmos preocupados com o texto que está em negociação para o Tratado de Comércio de Armas. Mas se mais argumentos forem necessários, é importante referir que estão neste momento abertos dois processos relativos à compra, em 2004, de dois submarinos à empresa alemã Ferrostal pelo estado português (na altura Paulo Portas era Ministro da Defesa e Durão Barroso líder do governo). Um negócio que a eurodeputada Ana Gomes cifra em 1.210 milhões de euros. O primeiro processo (de 2006), em fase de inquérito, refere-se à compra dos submarinos, estando em causa crimes de corrupção e participação económica em negócio e branqueamento. O segundo (de 2009) diz respeito às contrapartidas dadas, estando acusados 10 gestores alemães e portugueses dos crimes de falsificação

de documentos e burla qualificada. O julgamento está marcado para setembro. A isto soma-se a polémica compra de seis blindados (entre outros equipamentos) para a Cimeira da NATO que decorreu em Lisboa a 19 de novembro de 2010. Um negócio de cinco milhões de euros que não teve concurso público, pela urgência da reunião de líderes mundiais. Porém apenas dois carros deram entrada no país, já após o evento. Importa referir que Portugal gasta com Defesa a média do que investem os países da zona Euro, ou seja: 2,1% do PIB, o que segundo o SIPRI equivaleu em 2010 a 3.640 milhões de euros1. Também no que diz respeito ao Tratado de Comércio de Armas, Portugal tem sido consentâneo com a posição da maioria dos Estados da União Europeia. Lê-se no documento entregue às Nações Unidas a 29 de março de 2007 com a posição portuguesa: “Portugal apoiou desde a primeira hora a adoção de um tratado que regule o comércio de armas convencionais”2. Acrescenta que deve ser o mais abrangente possível e incluir todos os “Parâmetros/Critérios” de um Tratado “robusto”. Diz ser “pertinente” criar um registo internacional dos relatórios nacionais sobre transferências de armas. No entanto, deixa também claro que “o novo tratado deverá reafirmar o direito inalienável dos Estados à legítima defesa, individual e coletiva”.

1 Dados disponíveis na The SIPRI Military Expenditure Database, http://milexdata.sipri.org/ 2 “Towards an arms trade ttreaty: establishing common international standards for the import, export and transfer of conventional arms. Reporto f the Secretary-General, General Assembly, A/62/278 (Part II), 17 de agosto de 2007.

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Tribunal Penal Internacional: 10 anos depois* Ao completar a sua primeira década de existência, o Tribunal Penal Internacional apresenta ainda sinais de imaturidade e inconsistências estruturais que ainda não permitiram a eficácia pretendida. Por Grupo de Juristas da Amnistia Internacional Portugal

Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) ou por iniciativa própria, quando existam indícios de crimes de genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e crimes de agressão, em Estados que estejam sob jurisdição do Tribunal.

© Amnistia Internacional O edifício que acolhe o Tribunal Penal Internacional.

Foi a 1 de julho de 2002 que entrou em vigor na ordem jurídica internacional o Estatuto de Roma, que criou o Tribunal Penal Internacional (TPI), sediado em Haia, Holanda, cujo texto fora aprovado a 17 de julho de 1998. A criação deste Tribunal foi vista, à data, como uma marcante conquista na garantia de responsabilização internacional e pelo respeito global pelos Direitos Humanos. Atualmente, 121 países já ratificaram o Estatuto. De acordo com o Estatuto de Roma, o Procurador do TPI pode iniciar uma investigação a pedido de um Estado que tenha ratificado o Tratado, a pedido do

de Lubanga, como por exemplo o abuso e escravidão sexual, negando que seja feita justiça e o direito de reparação a muitas outras vítimas.

Atualmente, o TPI atua em 15 casos, provenientes de sete situações distintas. Três Estados signatários do Estatuto levaram casos de crimes que ocorreram em seus territórios: Uganda, República Democrática do Congo e República Centro-Africana. Além destes, o Conselho de Segurança da ONU indicou situações de existência de crimes no Sudão e na Líbia – Estados que não ratificaram o Tratado. E, por pedido do Procurador, foi concedida autorização para realização de investigações no Quénia e na Costa do Marfim.

Por vezes, o Tribunal fica impedido de julgar alegações de crimes, ante a incapacidade dos Estados capturarem os suspeitos e os enviarem para Haia. É o caso, por exemplo, de Bosco Ntaganda, acusado de alistar e recrutar crianças enquanto era, alegadamente, Chefe Adjunto das FPLC, bem como de Joseph Kony e outros líderes do Exército de Resistência do Senhor, no Uganda, acusados de praticarem crimes contra a humanidade e crimes de guerra, e Omar Al-Bashir, presidente do Sudão, acusado de ter cometido genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de guerra na região de Darfur.

A 14 de março de 2012, dez anos após a sua criação, foi proferida a primeira sentença do TPI. Foi condenado o ex-chefe de milícia congolesa, Thomas Lubanga Dyilo, por crimes de guerra. Lubanga foi considerado culpado por alistar e recrutar crianças menores de 15 anos nas Forças Patrióticas pela Liberação do Congo (FPLC), utilizando-as num conflito armado internacional entre setembro de 2002 e agosto de 2003.

A própria linha de atuação do TPI é demasiado dependente do Conselho de Segurança da ONU, que pode suspender ou interferir nas suas ações, colocando-o à mercê de uma eventual instrumentalização política. Os países que integram permanentemente o Conselho de Segurança, entre os quais os Estados Unidos da América, China e Rússia, não são partes do Estatuto de Roma e dispõem ainda de um Direito de Veto.

Porém, há críticas a apontar. Lubanga está preso em Haia desde 2006, o processo teve início somente em 2009 e a sentença em 2012. É necessária uma justiça mais ágil. Além disto, é desapontante o facto do Procurador não ter investigado as alegações de outros crimes cometidos pelas FPLC sob o comando

A Amnistia Internacional considera que o TPI terá ainda um longo caminho a percorrer como instrumento de garantia de respeito dos Direitos Humanos no mundo, e esperamos mais julgamentos e um reforço na cooperação internacional igualmente para a reparação de vítimas.

* Artigo mais completo sobre o Tribunal Penal Internacional disponível em www.amnistia-internacional.pt (Notícias/Notícias).


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Entre as atividades da Amnistia Internacional Portugal dos últimos meses, há a destacar a eleição dos novos Órgãos Sociais, a entrada da Diretora Interina e mais um Prémio de direitos humanos no Festival Internacional de Cinema IndieLisboa. Conheça o júri e os vencedores. Novos Órgãos Sociais da Amnistia Internacional Portugal Decorreu a 30 de março a Assembleia Geral Ordinária da Amnistia Internacional Portugal, onde foram escolhidos os Órgãos Sociais que vão dirigir a secção portuguesa nos anos 2012 a 2015 (exceto os elementos que transitaram dos Órgãos Sociais anteriores, cujo mandato é de dois anos). Todos eles são voluntários, escolhidos em Assembleia pelos próprios membros da secção. A sua energia e entusiasmo permitem que a Amnistia Internacional continue a ser uma organização não governamental ‘movida a espírito voluntário e ativismo’. Os Órgãos Sociais da Amnistia Internacional Portugal dividem-se em: Assembleia-Geral, que vota a política geral da secção portuguesa; Direção, que estabelece a ponte entre a secção e a sede da organização, em Londres, assegurando ainda a comunicação interna e externa da Amnistia Internacional Portugal; e Conselho Fiscal, de Responsabilização e Controlo, que analisa o orçamento, o relatório anual da secção, o balanço e as contas anuais. Apresentamos-lhe em seguida os rostos que vão guiar a Amnistia Internacional Portugal nos próximos anos…

Assembleia Geral © Privado

© Privado

© Privado

Presidente

Vice-Presidente

Secretária

Manuel Beirão Martins Guerreiro

Tânia Alves

Ana Margarida Ferreira

direção © Privado

© Privado

Vogal

Vogal

Presidente

Luís Sottomaior Braga

José Bernardino

Victor Nogueira

Conselho Fiscal, de Responsabilização e Controlo

Vice-Presidente

Joana G. Cardoso

Tesoureiro

Vogal

Ricardo M. Ferreira

Mariana Hancock

© Amnistia Internacional Presidente

Raquel Maló Almeida

Secretário

António Belo

© Amnistia Internacional

© Amnistia Internacional

Vice-Presidente

Secretária

António Eloy

Maria Teresa Nogueira

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À Conversa com o Júri do Prémio Amnistia Internacional no IndieLisboa 2012…*

© Amnistia Internacional

Mais um Prémio Amnistia Internacional no IndieLisboa A violência de género em cenários de guerra, mais particularmente na República Democrática do Congo, é o tema da curta-metragem From This Day to Where. A forma como os realizadores noruegueses Matias Rygh e Mathias Eriksen pegaram nas vivências dramáticas de muitas mulheres convenceu o júri deste ano do Prémio Amnistia Internacional Portugal no Festival Independente de Cinema IndieLisboa – a jornalista Maria Flor Pedroso, a atriz Anabela Moreira e o escritor João Tordo –, que foi unânime na entrega do Prémio no valor de 1.250 Euros (patrocinado pela Fundação Serra Henriques). Dos 15 filmes a concurso para o galardão, o júri sentiu ainda necessidade de distinguir, com Menções Honrosas, o documentário Meet The Fokkens, de Gabriëlle Provaas e Rob Schröder, e o filme de animação Bon Voyage, de Fabio Friedli. O Notícias da Amnistia Internacional Portugal conversou com o júri, logo após a escolha dos premiados, e com os realizadores destacados por este Prémio, que pela oitava vez consecutiva – sendo que o IndieLisboa vai na sua 9ª edição (decorreu de 26 de abril a 6 de maio) – levou as temáticas dos direitos humanos e da dignidade humana ao Festival de Cinema Independente.

O júri do Prémio: a jornalista Maria Flor Pedroso, o escritor João Tordo e a atriz Anabela Moreira.

Amnistia Internacional (AI): Como foi escolher o filme vencedor? Houve unanimidade? Maria Flor Pedroso (MFP): Encaminhámo-nos logo para os filmes que acabámos por escolher. Quer as Menções Honrosas, quer o Prémio, foram absolutamente consensuais. AI: Foi também consensual qual dos filmes seria o Vencedor? MFP: Para ganhar o Prémio havia a possibilidade do From This Day to Where e do Meet the Fokkens. AI: Porque venceu então o From This Day to Where? Pela temática? Anabela Moreira (AM): Eu acho que nenhum de nós foi ver os filmes a partir do tema. Não foi um dos nossos critérios principais. Obviamente que depois a discutir entre um e outro filme, o tema pode sido contabilizado para termos atribuído o Prémio ao filme do Congo. Mas é um filme muito forte. Que conta uma história brutal, de uma maneira muito bonita. Sem vitimizar. Sem chocar. Está feito com bom gosto. Para mim é um filme perfeito. Já o Meet the Fokkens é igualmente poderoso, mas a mim não me tocou tão profundamente, derivado ao tema. AI: E a escolha das Menções Honrosas? João Tordo (JT): Havia vários filmes que todos tínhamos gostado e seria justo também distingui-los. O Meet the Fokkens é um filme mais divertido. Tem situações do dia-a-dia que são, por um lado, mais fáceis de encarar e, por outro, que te mantêm preso ao ecrã. MFP: É um filme mais acessível, mas que também coloca muitas questões e é surpreendente. AI: O filme vencedor é uma curta-metragem. Não perdeu por isso? JT: Não. Ganha sobretudo por ser uma curta, porque vai direto ao assunto e não se perde nada. A Anabela disse uma coisa engraçada

Vencedor

From This Day to Where, de Matias Rygh e Mathias Eriksen* Em apenas 18 minutos, os noruegueses Matias Rygh e Mathias Eriksen conseguiram transmitir o quotidiano de muitas mulheres congolesas, que têm de lidar com o facto de terem sido violadas naquele que foi considerado o mais sangrento conflito desde a II Guerra Mundial.

© From this Day to Where Uma das cenas do filme.

Amnistia Internacional (AI): Porquê um filme sobre a República Democrática do Congo? Matias Rygh/Mathias Eriksen (MR/ME): Tínhamos a ideia de fazer um filme sobre este país há alguns anos, depois de termos tomado conhecimento das imensas atrocidades que ocorrem na parte oriental [a guerra começou em 1998 e formalmente terminou em 2003, mas os conflitos têm continuado e agravaram-se desde 2008]. Falámos sobre várias formas de abordar o assunto, até que surgiu uma oportunidade através de um amigo que trabalhou lá. AI: E porquê abordar a temática da violência sobre as mulheres? São dois homens a falar de um sofrimento feminino… MR/ME: Em relação ao Congo, diz-se que é mais perigoso ser-se mulher do que ser soldado. Escolhemos retratar as mulheres, porque não são apenas as vítimas que mais sofrem neste conflito, mas paradoxalmente são as lutadoras mais rijas. Numa sociedade que está literalmente construída sobre os ombros destas mulheres, a arma mais * Entrevistas completas em www.amnistia-internacional.pt (clicar no banner do Prémio Amnistia Internacional no IndieLisboa). Refira-se que parte da entrevista de Gabriëlle Provaas e Rob Schröder foi-nos enviada pelos próprios mas retirada da conversa que os realizadores tiveram com Lauren Wissot, do Global Comment.


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eficaz de destruição maciça é atingi-las através da violência sexual. Para além dos traumas pessoais, as consequências sociológicas desta “arma” são massivas. Porém, no meio do caos, descobrimos um grupo de mulheres que se atreveram a apoiarem-se umas às outras e a denunciar a brutalidade. AI: As situações que acontecem no filme estavam a ocorrer ou foi ficcionado? MR/ME: Embora o filme tenha sido escrito e representado por atores locais, cada cena baseou-se em histórias que nos foram contadas ou situações que testemunhámos. (…) Inicialmente queriamos que fossem as vítimas a representar (…) mas provou-se que era demasiado perigoso (...). Uma semana antes de chegarmos cortaram os lábios a uma rapariga que deu uma entrevista a um jornal. AI: Como souberam que tinham vencido o Prémio Amnistia Internacional no IndieLisboa e o que sentiram? MR/ME: Recebemos um telefonema da Embaixada da Noruega em Lisboa, que recebeu o prémio por nós. Ficámos muito honrados e contentes que o filme tenha conseguido comunicar o trabalho único e inspirador destas mulheres congolesas. A melhor parte é saber que estão a colocar os holofotes nas condições das mulheres do filme.

1ª Menção Honrosa

Meet the Fokkens, de Gabriëlle Provaas e Rob Schröder* Quase a chegarem aos 70 anos de idade, as gémeas Louise e Martine Fokkens preparam-se para dizer adeus a mais de quatro décadas a trabalharem naquela que é vista como uma das profissões mais antigas do mundo, a prostituição, num dos locais mais míticos do Planeta, o bairro Red Light District, em Amesterdão, Holanda. Amnistia Internacional (AI): Como conheceram as gémeas Louise e Martine, de 69 anos? Rob Schröder (RS): Ao lado da porta de minha casa está o quarto onde a Martine trabalha. Ela é de longe a mais velha da rua. Estava fascinado por ela. É velha e gorda. (…) Gostava de falar com ela. Ela toma conta dos jardins da rua. (…) Um dia perguntou-me porque viajava tanto e disse-lhe que fazia filmes. Ela interessou-se. Acrescentei que queria fazer um filme sobre aquela pequena rua. Ela disse: “há muitas histórias para contar”. “E podes ser a protagonista”, disse-lhe. “Talvez, mas a minha irmã também pode entrar?”, foi a resposta. AI: E porquê contar a sua história? Gabriëlle Provaas (GP): Quando o Rob se mudou para aquela pequena rua [no Red Light District], há cinco anos atrás, ficou claro que tinha de ser feito um filme. As mulheres que se alinham ali são mais velhas e mais sábias. Não são forçadas por proxenetas. (…) Queríamos um filme sobre mulheres que escolhem esta que é a mais velha das profissões voluntariamente.

© Meet the Fokkens As gémeas protagonistas.

AI: O que sentiram quando souberam que tinha recebido esta Menção Honrosa? Reparámos, no dia da entrega de Prémios, que ficaram espantados… RS/GP: Ficámos realmente espantados e extremamente honrados. Como dissemos no discurso na entrega de prémios, pensámos sempre que a Amnistia era para “as pessoas que estão nas prisões”, mas de certa forma as prostitutas são prisioneiras, quer das pessoas que as obrigam a prostituir-se, quer da sociedade que as estigmatiza. (…) Sentimos a necessidade de contar uma história de mulheres fortes, que continuaram a atuar juntas enfrentando a exclusão social.

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sobre o filme, que era “acabadinho”, que é uma definição perfeita. MFP: E o Bon Voyage a mesma coisa. AI: Sendo jornalista, Maria Flor Pedroso, como foi participar no Prémio Amnistia Internacional? MFP: Só tenho a agradecer o convite. Ter de ver estes filmes, por causa do Prémio, que nada têm a ver com o meu trabalho no dia-a-dia – porque não trabalho estas questões, pelo menos não desta forma –, permitiu-me pensar um pouco sobre os filmes e isso é que foi interessante. Vi realidades que conheço menos e até tirei algumas notas para depois ver melhor. AI: E para si João Tordo, como foi participar neste Prémio, enquanto escritor? JT: Eu costumo ser júri, mas de livros e o cinema tem um tempo que eu, muitas vezes, não gosto. Criou-se aquele conceito que um filme tem de ter duas horas. A literatura tem outro tempo. Neste caso, como foi tão intenso, e vi tantos filmes de seguida, tive a sensação de estar a ler romances. Eu gostei, embora ache sempre que não estou qualificado. Não sou assim tão entendido em cinema. E mesmo em relação à Amnistia Internacional, sinto-me um bocadinho ignorante. AI: Se tem esse problema com o tempo do cinema, como conseguiu escolher uma curta para vencer o Prémio? JT: É um bocadinho a diferença entre ler um bom romance ou um excelente conto. Este filme é um excelente conto e vale mais do que um bom romance. AI: A Anabela Moreira, enquanto atriz, era o elemento técnico do júri. Como foi ser júri deste Prémio? AM: É um trabalho muito difícil. E eu trabalhar no cinema não significa absolutamente nada, porque são escolhas sempre subjetivas e nós sentimos o peso da responsabilidade. Não é que os Prémios sejam assim tão importantes, embora possam alterar o rumo de um filme. É sempre a escolha subjetiva de um júri e as coisas devem ser relativizadas. Não tenho um olho técnico. Tenho os meus critérios, que são só os meus. E daqui a 20 anos se calhar serão outros. AI: Mas os Prémios são um estímulo? AM: É um estímulo muito importante. Não deve é deixar de ser um estímulo para aqueles que não o ganharam, porque podem ser tão bons quanto o que ganhou. MFP: E há aqui uma coisa importante. O facto de sermos o júri escolhido pela Amnistia Internacional também nos obrigou a olhar para os filmes com outra responsabilidade. Se calhar podia ter havido outro desfecho se fosse outro Prémio.

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2ª Menção Honrosa

Bon Voyage, de Fabio Friedli* O suíço Fabio Friedli precisou de apenas seis minutos para mostrar ao mundo aquilo por que passam os migrantes, desde que sobem para um camião sobrelotado, à viagem pelo deserto e pelo mar à qual nem todos sobrevivem, até chegarem à “fortaleza Europa”, onde não são bem-vindos. Tudo isto com a “leveza” que só a animação permite.

© Bon Voyage Uma das cenas do filme de animação.

Amnistia Internacional (AI): O Bon Voyage é um filme sobre a imigração para a Europa. Porquê esta temática? Fabio Friedli (FF): Em 2009 houve uma votação na Suíça chamada iniciativa-minaretes. Os suíços decidiram proibir a construção de novos minaretes nas mesquitas existentes no país (tínhamos quatro). Foi um gesto simbólico para os muçulmanos e para os migrantes, afirmando: Não são bem-vindos. (…) Senti a necessidade de usar a possibilidade de fazer animação para falar sobre este assunto dos migrantes da forma como eu a vejo e tentar alterar a perspetiva, tentar olhar da perspetiva dos refugiados. AI: Este é um tema que tem sido muito retratado em documentários. O que é que a animação lhe permitiu fazer que um documentário, se calhar, não permitiria? FF: A técnica da animação permitiu-me abordar o assunto da migração de forma muito diferente. Era muito importante para mim fazer um filme sobre um tema sério sem ser aborrecido ou fazer algo que já foi visto. Usei a abstração, que é automaticamente dada pela animação, para tornar divertidas todas as coisas horríveis que acontecem aos migrantes que tentam chegar à Europa. Isto, claro, quebra um tabu e no início não estava certo se me seria “permitido” fazer isto. Hoje sei que pessoas que estiveram naquelas situações gostam do filme e riem-se muito quando chegam as cenas mais brutais. AI: Como soube que tinha recebido uma Menção Honrosa no Prémio Amnistia Internacional no IndieLisboa e o que sentiu? FF: Fiquei muito lisonjeado por receber esta Menção especial. Não é apenas fabuloso enquanto cineasta, como é muito bom ver que muitas pessoas, em todo o mundo, preocupam-se realmente com este assunto.

Secção Portuguesa com Diretora Interina Na sequência da licença de maternidade da Diretora Executiva da secção portuguesa da Amnistia Internacional, Teresa Pina, foram analisadas várias possibilidades de substituição, tendo a Direção optado pela holandesa Frida Kruijt para ocupar o cargo de Diretora Interina. A trabalhar no Secretariado Internacional, sede da Amnistia, em Londres, desde 2004, Frida tem um profundo conhecimento da organização e uma vasta experiência em gestão de projetos de direitos humanos e no apoio ao desenvolvimento de pequenas e médias organizações. Para além do inglês e francês, domina o castelhano e compreende português. Estará a dirigir a secção portuguesa da Amnistia Internacional até ao início de novembro. * Entrevistas completas em www.amnistia-internacional.pt (clicar no banner do Prémio Amnistia Internacional no IndieLisboa).

GRUPOS E NÚCLEOS DA AMNISTIA INTERNACIONAL (grupo, localidade, coordenador, email, blogue) GRUPO 1/Lisboa Coordenador a designar: grupo1.aiportugal@gmail.com; http://grupo1aiportugal.blogspot.pt/ GRUPO 3/Oeiras Lucília-José Justino: zjustino@gmail.com GRUPO 6/Porto Virgínia Silva: aiporto6@gmail.com; http://aiporto.blogspot.com GRUPO 14/Lourosa Valdemar Mota: aigrupo14@gmail.com GRUPO 16/Ribatejo Norte Yvonne Wolf: yvonne_wolff@adsl.xl.pt GRUPO 19/Sintra Susana Gaspar: ai.grupo19@gmail.com; http://blog-19.blogspot.com ; grupo19amnistia.blogspot.pt GRUPO 24/Viana do Castelo Luís Braga: luismbraga@sapo.pt GRUPO 32/Leiria Maria Fernanda Ruivo: fernanda.ruivo@sapo.pt GRUPO 33/Aveiro Alexandra Monteiro: amnistiaveiro@gmail.com; http://amnistiaveiro.blogspot.pt/ NÚCLEO DE COIMBRA Bárbara Barata: nucleoaicoimbra@gmail.com; nucleoaicoimbra.blogspot.pt NÚCLEO DE CRIANÇAS (Vila Nova de Famalicão) Vitória Triães: aip.ibeji@gmail.com NÚCLEO DE ESTREMOZ Maria Céu Pires: amnistiaetz@gmail.com; amnistiaestremoz.blogspot.pt NÚCLEO DE GUIMARÃES Cristina Lima: amnistia.guimaraes@gmail.com NÚCLEO DO OESTE / CALDAS DA RAINHA Teresa Mendes: ai.nucleooeste@gmail.com; http://aioeste.blogspot.pt NÚCLEO DO PORTO André Rubim Rangel: nucleo.ai.porto@gmail.com NÚCLEO DE TORRES VEDRAS Ana Lopes: aitorresvedras@gmail.com; COGRUPO DA CHINA Maria Teresa Nogueira: nogueiramariateresa@gmail.com COGRUPO SOBRE OS DIREITOS DAS CRIANÇAS Manuel Almeida dos Santos: cogrupodireitosdascriancas@gmail.com; cogrupodireitosdascriancas.blogspot.pt COGRUPO CONTRA A PENA DE MORTE Luís Braga: ai.contrapenademorte@gmail.com; http://contrapenademorte.wordpress.com GRUPO DE JURISTAS José Bernardino: ai.grupojuristas@gmail.com NÚCLEO LGBT Manuel Magalhães: lgbt.amnistia@gmail.com; http://lgbtamnistia.blogspot.pt Se ainda não existe um grupo da Amnistia Internacional Portugal perto de sua casa, pode sempre ser pioneiro e começar o activismo na sua localidade. Fale connosco pelo boletim@amnistia-internacional.pt ou ligando 213 861 652.


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Amnistia Internacional

JOVEM O ativismo juvenil na Amnistia Internacional Portugal continua bom e recomenda-se. Saiba o que tem ocupado os nossos jovens, a quem alguém ousou chamar “geração rasca”. Portugueses de partida para Itália

“Dois jovens têm-se destacado pela sua inequívoca capacidade de liderança”, refere Daniel Oliveira, Coordenador de Ativismo da Amnistia Internacional Portugal. Sílvio Vieira, que coordena o Grupo de Estudantes da Amnistia Internacional no Colégio de São Miguel, em Fátima, e Luís Nobre, Coordenador do Grupo de Estudantes da Escola Superior de Saúde de Santarém, são por isso os dois jovens escolhidos pela secção portuguesa para participarem no próximo European Youth Meeting, um encontro europeu de jovens que vai decorrer em Palermo, na ilha Sicília, Itália, de 24 a 29 de julho. “O objetivo do encontro é desenvolver as capacidades de ativismo e o compromisso de longo prazo com as causas/ campanhas, potenciar a capacidade de liderança e trabalhar um entendimento comum das questões de direitos humanos”, referem os organizadores do European Youth Meeting deste ano. Outro propósito é estreitar laços entre os co© AI Portugal ordenadores de grupos de estudantes de vários países, para que cada vez mais trabalhem em rede. É isso que vão fazer o Sílvio e o Luís. Boa viagem!

Free2Choose: Até onde vai a tua liberdade?

Até que ponto permitiríamos que investigassem a nossa vida? E até que ponto permitiríamos que investigassem a vida de outras pessoas se receássemos que fossem terroristas? O conflito entre estes dois direitos humanos – privacidade e segurança – é um bom exemplo do desafio que foi lançado aos jovens de todo o país em junho de 2011, a que se deu o nome de concurso Free2Choose. A iniciativa partiu da Amnistia Internacional Portugal e da Associação Internacional Intercultural Projects and Research, com o apoio da holandesa Anne Frank House. O que foi pedido aos jovens – divididos por ensino básico, secundário e superior – foi que criassem vídeos de curta duração (clips), nos quais era encenado um conflito entre dois direitos humanos, com relevância no contexto português. O prazo para participação no concurso terminou a 30 de abril e foram entregues 28 vídeos, com temáticas que passam pela violência de género, a privacidade, os direitos culturais, entre outros. O objetivo do projeto Free2Choose é levar os jovens a perceberem os conflitos que podem surgir entre um ou mais direitos humanos, levando-os a refletir sobre eles. Importante é também serem os próprios jovens, através dos vídeos, a explicarem esses dilemas à sociedade. Os clips estão agora em fase de análise e serão publicamente apresentados ainda este ano. Em breve damos notícias.

GRUPOS DE ESTUDANTES DA AMNISTIA INTERNACIONAL PORTUGAL (Coordenadores e emails/blogues)

• GE do Agrupamento de Escolas da Batalha Eduardo Almeida: edu_prioralmeida@ hotmail.com • GE DO COLÉGIO DE SÃO MIGUEL (Fátima) Sílvio Vieira: amnistia.csm@hotmail.com; aiateondepodemoschegar.blogspot.pt • GE DO COLÉGIO DIOCESANO DE NOSSA SENHORA DA APRESENTAÇÃO (Calvão) Jorge Carvalhais: amnistia@colegiocalvao.org • GE DA ESCOLA SECUNDÁRIA DE ALBUFEIRA Rosaria Rego: grupoestudantes_esa_ amnistiainternacional@hotmail.com; grupodaesaai.blogspot.pt • GE DA ESCOLA SECUNDÁRIA ANTERO DE QUENTAL (S.Miguel, Açores) Fernanda Vicente: fpacvicente@sapo.pt • GE DA ESCOLA SECUNDÁRIA DE ERMESINDE Maria Arminda Sousa: sousarminda@ gmail.com; www.ai-ese.pt.vu • GE DA ESCOLA SECUNDÁRIA FILIPA DE VILHENA (Porto) Carla Ferreira: carlafariaferreira@ hotmail.com • GE da Escola Secundária Francisco Rodrigues Lobo (Leiria) Ana Vieira: amnistiaesfrl-leiria@ hotmail.com • GE da Escola Secundária de peniche Miguel Santos: amnistiainternacional@ espeniche.pt • GE da Escola Superior de Saúde de Santarém Luís Nobre: amnistia.esss@gmail.com • GE DA FACULDADE DE DIREITO DE LISBOA Sofia Mouro: nucleoai.fdul@gmail.com • ReAJ-REDE DE ACÇÃO JOVEM A designar: redejovem.amnistia@gmail. com; reajportugal.blogspot.pt Se ainda não existe um Grupo da Amnistia Internacional na tua escola ou universidade, podes ser tu a criá-lo. Nós dizemos como... Escreve-nos para boletim@amnistia-internacional.pt ou telefona para o 213 861 652.

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BOAS NOTÍCIAS Nos últimos meses recebemos várias notícias que continuam a provar que juntos podemos fazer a diferença. E foi o que fizemos em todos estes casos… O mundo ficou, assim, um pouco melhor. NIGÉRIA Menor libertado ao fim de 17 anos Após quase duas décadas de prisão, Patrick Okoroafor foi finalmente libertado no passado mês de maio. O nigeriano tinha apenas 14 anos quando foi detido e acusado de assalto à mão armada e roubo de 5.500 nairas nigerianas (cerca de 27 euros). Dois anos depois, em 1997 e ainda menor, foi condenado à morte, mas a sentença, ilegal, foi rapidamente alterada para prisão perpétua. Em 2009 as autoridades reduziram a pena para 10 anos de encarceramento, a cumprir a partir dessa data.

IRÃO Mais Repórteres pelos Direitos Humanos foram libertados

© Comité de Repórteres pelos Direitos Humanos

© Privado

Patrick clamou sempre ser inocente, mas só aos 31 anos voltou a ser um homem livre, depois de uma forte campanha mundial levada a cabo pela Amnistia Internacional e pelos seus ativistas. Ao sair da prisão, fez questão de agradecer e de referir a importância das mais de 10.000 cartas que recebeu: “depois do início da campanha da Amnistia pela minha libertação e após ler algumas das milhares de cartas, cartões e mensagens que me foram enviadas, comecei a ter esperança de que brevemente seria libertado e não num futuro muito distante”.

RUANDA Ex-Ministro saiu em liberdade Após ter ajudado a fundar, no Ruanda, em 2001, o Partido para a Democracia e Renovação, Charles Ntakirutinka – que foi ministro de diversas pastas do governo de Pasteur Bizimungu (1994-2000) – foi preso, em abril de 2002, juntamente com outros sete homens (entre eles o referido ex-Presidente). Acusados de ‘incitamento à desobediência civil’, ‘associação com elementos criminosos’ e ‘conspirar para assassinar membros do governo’, foram alvo de um julgamento injusto, que não cumpriu as normas internacionais, e sentenciados pelos crimes de que estavam acusados. A 1 de março deste ano, após uma intensa campanha da Amnistia Internacional e do perdão concedido a Bizimungu, chegou a vez de Ntakirutinka ser libertado, depois de

10 anos de prisão cumpridos unicamente pelas suas opções políticas. É, por isso, considerado um prisioneiro de consciência pela Amnistia Internacional. Terminou assim mais uma injustiça!

© Privado

A 12 de abril foi libertado o ativista iraniano Kouhyar Goudarzi, depois de o mesmo ter acontecido à sua mãe, Parvin Mokhtare, em liberdade desde 18 de março de 2012. Refira-se que os dois tinham sido presos a 31 de julho e a 1 de agosto de 2011, respetivamente, com acusações que passavam por “espalhar propaganda contra o sistema” e “reunião e conspiração contra a segurança nacional”. Kouhyar foi ainda acusado de pertencer ao grupo PMOI-People’s Mojahedin Organization of Iran e de se ter manifestado, frente às Nações Unidas, pela retirada do nome da organização da lista de grupos terroristas. Foi então condenado a cinco anos de prisão e a sua mãe a 23 meses, depois de julgamentos onde não houve direito a defesa. Os dois negaram sempre todas as acusações que lhes foram feitas e acredita-se que terão sido presos, na verdade, apenas por pertencerem ao Comité de Repórteres pelos Direitos Humanos, uma organização nacional que (apesar de proibida) faz campanha contra as violações de direitos humanos que continuam a ser comuns no Irão. Outros membros da organização têm sido presos e injustamente julgados. A Amnistia Internacional considera-os prisioneiros de consciência e, por isso, tem lançado apelos por todos eles. Até agora temos recebido boas notícias, como esta de Kouhyar e da sua mãe. Juntos vamos ajudando estes corajosos!


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APELOS MUNDIAIS “Abra o seu jornal em qualquer dia da semana e encontrará a história de alguém, algures no mundo, que foi detido, torturado e executado porque as suas opiniões e crenças não são aceites pelo seu governo. (…) O leitor tem uma sensação nauseante de impotência, mas este sentimento que está presente um pouco por todo o mundo, pode ser unido numa acção comum. Algo pode ser feito.“ Foram estas as palavras que o advogado britânico Peter Benenson escreveu, em 1961, no jornal The Observer, no artigo que deu origem à Amnistia Internacional: “The Forgotten Prisoners”.Assim o ativista lançava um desafio à Humanidade, que continua vigente 50 anos depois: apelar pelos “prisioneiros de consciência”. Hoje pedimos-lhe que dê continuidade a este movimento. As pessoas que lhe apresentamos nas próximas páginas precisam de si. E juntos podemos fazer a diferença. Eles contam connosco!

ENVIE OS POSTAIS QUE ENCONTRA NO INTERIOR DESTA REVISTA PELAS PESSOAS QUE APRESENTAMOS NAS PRÓXIMAS PÁGINAS. A SI CUSTA TÃO POUCO. A ELES FAZ TODA A DIFERENÇA!

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Autoridade Palestiniana Destino de seis palestinianos é desconhecido Desconhece-se o paradeiro de seis homens palestinianos desde 12 de março de 2002, altura em que estavam presos num Centro de Detenção da Autoridade Palestiniana em Salfit, na Cisjordânia. Foram vítimas de desaparecimento forçado. © Privado

‘Ali al-Khdair (então com 27 anos), Taiseer Ramadhan (com 37), Nazem Abu ‘Ali (com 30), Shaker Saleh (então com 40 anos), Ismail Ayash (com 29) e Mohammad Alqrum (com 47 anos) não receberam nenhuma acusação formal, mas eram suspeitos de terem passado informações aos serviços secretos israelitas. Enquanto estiveram presos receberam a visita © Privado dos familiares, que contaram que exibiam marcas de tortura, como queimaduras de cigarros na cara e no corpo.

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As forças de segurança da Autoridade Palestiniana disseram às famílias que os homens tinham escapado da prisão e fugido para Israel. No entanto, nunca mais se soube deles e já passaram 10 anos. Suspeita-se que tenham morrido em detenção, mas alguns agentes aconselharam as famílias a esquecerem o caso. Por favor escreva, apelando a uma investigação à alegada prática de tortura e ao subsequente desaparecimento forçado dos seis homens palestinianos e que os responsáveis sejam levados perante a justiça. [Postal-apelo em anexo no interior desta revista. Tudo o que tem de fazer é assinar, colocar a cidade e o país de onde envia o apelo e a data.]

Gâmbia

Prisão perpétua por ter t-shirts na sua posse Dr Amadou Scattred Janneh, um antigo Ministro da Informação e Comunicação da Gâmbia, está a cumprir uma pena de prisão perpétua por terem sido encontradas na sua posse t-shirts com a frase “Fim à Ditadura”. Foi detido a 7 de junho de 2011 e acusado de “intenção de provocar ou incitar ao ódio, ao desprezo ou de promover o descontentamento face ao Presidente ou ao Governo da Gâmbia”. Dr Amadou Janneh, natural da Gâmbia e com cidadania norte-americana, foi condenado a prisão perpétua e a trabalhos forçados no dia 16 de janeiro de 2012. As t-shirts foram feitas pela organização não-governamental “Coalition for Change – The Gambia”. Outras três pessoas, detidas no mesmo dia e acusadas de estampar as t-shirts, foram condenadas a três anos de prisão e a trabalhos forçados por “insubordinação”, acabando por não recorrer da sentença. Já Janneh espera o resultado do recurso que interpôs.

© Coalition for Change - The Gambia’ (CCG)

Por favor escreva, apelando à libertação imediata e incondicional de Dr Amadou Scattred Janneh, que a Amnistia Internacional considera ser um prisioneiro de consciência. A sua detenção e prisão violam os direitos à liberdade de expressão, de reunião e de associação. [Postal-apelo em anexo no interior desta revista. Tudo o que tem de fazer é assinar, colocar a cidade e o país de onde envia o apelo e a data. Pode ainda escrever mensagens de solidariedade para a morada: Dr Amadou S. Janneh / C/O Lawyer Lamin Camara / No. 174 Picton Street. Banjul / P.O. Box 1335 / The Gambia.]


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Amnistia Internacional

Egito

Morte a tiro deve ser investigada Mohamed Sayed Ibrahim Abdel Latif foi morto a tiro enquanto tentava levar um homem ferido para o hospital durante um protesto anti governo no Egito. O jovem de 23 anos saiu de casa a 29 de janeiro de 2011 para se dirigir até à padaria onde trabalhava. Encontrou-se com alguns amigos perto da esquadra da polícia de Imbaba, nos arredores de Cairo. Naquele dia, várias pessoas tentavam chegar ao protesto na Praça Tahrir e eram impedidas pela polícia, que tinha © Privado homens à paisana a disparar a partir de telhados perto da esquadra. Mohamed foi atingido no pescoço e no braço enquanto tentava ajudar um homem ferido. Morreu pouco tempo depois. No dia seguinte, foi pedido ao seu irmão Ashraf que assinasse uma declaração a dizer que não queria que Mohamed fosse autopsiado ou que o Ministério Público fosse notificado. No entanto, Ashraf conseguiu a autópsia. A família de Mohamed afirmou ainda ter sido pressionada pela polícia para retirar a queixa contra os agentes de Imbaba. Não o fez e tudo o que continua a exigir, um ano depois, é justiça pela sua morte. Por favor escreva, apelando a uma investigação total, independente e imparcial à morte de Mohamed e que os responsáveis tenham um julgamento justo, sem recurso à pena de morte. [Postal-apelo em anexo no interior desta revista. Tudo o que tem de fazer é assinar, colocar a cidade e o país de onde envia o apelo e a data.]

Roménia

Famílias “sem lugar onde ficar” No dia 17 de dezembro de 2010 cerca de 350 pessoas, de 76 famílias, a grande maioria da comunidade cigana, foram desalojadas das suas habitações pelas autoridades da cidade de Cluj-Napoca, na Roménia. Foram avisadas dois dias antes que se teriam de mudar. O realojamento só visou 40 famílias, colocadas nos arredores da cidade, perto de um aterro sanitário e de um antigo depósito de resíduos químicos. A habitação concedida não é adequada. Os habitantes não têm acesso a água quente, nem a gás. A paragem de autocarro mais próxima está a 2,5 km de distância, o que condiciona o acesso à educação, ao emprego, a cuidados de saúde e a outros serviços básicos. “É um pesadelo. Ao meu lado há uma família com 13 pessoas (11 delas crianças) a viver numa divisão”, afirmou um residente. Às restantes 36 famílias não foi atribuída qualquer habitação, tendo ficado sem abrigo. Entretanto, sete delas conseguiram ir viver com familiares, em casas sobrelotas, e as outras 29 foram autorizadas a construir habitações improvisadas sem acesso a água, saneamento ou eletricidade. Por favor apele ao Presidente da Câmara de Cluj-Napoca que desenvolva planos de habitação a longo prazo e providencie compensação adequada às vítimas pelo desalojamento forçado. [Postal-apelo em anexo no interior desta revista. Tudo o que tem de fazer é assinar, colocar a cidade e o país de onde envia o apelo e a data.]

© Joshua Gross, Joshua Tree Photography

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Notícias

Amnistia Internacional

Por Departamento de Angariação de Fundos e Financeiro

O trabalho da Amnistia Internacional não seria possível sem o seu apoio. Obrigado por acreditar connosco nos Direitos Humanos.

RECEITAS E DESPESAS 2012

“Todos os dias alguém é vítima de exploração, seja laboral ou outra. Todos os dias alguém comete um crime. Todos os dias alguém é vítima de suborno. Nunca tinha feito nada para ajudar. Hoje fiz, juntei-me à Amnistia Internacional!”

André Santos, 23 anos, apoiante recrutado pelo “Face to Face” em Lisboa

Evolução do Número de Apoiantes e Membros da AI Portugal Apesar da descida no valor das receitas sentida em 2012, verificamos que o número de apoiantes e membros inscritos nos primeiros cinco meses deste ano foi de 1.370, valor superior a 2011 (1.222 pessoas) e 2010 (956 pessoas), facto que nos deixa muito satisfeitos. Graças a si e à sua vontade de mudar o mundo connosco, nós chegamos mais longe na luta pelos Direitos Humanos. O Projeto “Face to Face” continua a ser a

0

1º Quadrimestre 2010 Legenda:

Despesas

1º Quadrimestre 2011

232.395,42€

100.000

203.833,88€

200.000

258.726,17€

300.000 230.158,25€

Como forma de aumentar as receitas, temos como prioridade a realização de novos métodos de inscrição de apoiantes (tal como noutras secções, via telemarketing) e outras ações de angariação de fundos paralelas ao projeto “Face to Face”.

Receitas e Despesas nos primeiros quatro meses de 2010, 2011 e 2012

263.752,72€

No gráfico podemos observar as receitas e despesas do primeiro quadrimestre de 2012, comparativamente com os últimos dois anos. Neste período de 2012, a Amnistia Internacional (AI) Portugal obteve um saldo positivo no valor total de 28.561,54 euros, abaixo do de 2010 e semelhante ao de 2011.

207.756,72€

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1º Quadrimestre 2012

Receitas

fonte de inscrição responsável por 84% do total de apoiantes e membros da AI Portugal. Depois de Lisboa e Porto acolherem as nossas equipas, em junho é a vez de Coimbra receber mais uma vez este projeto. Partilhamos aqui alguns testemunhos de apoiantes inscritos em Lisboa, neste ano, a quem agradecemos as generosas palavras!

Consignação dos 0,5% do IRS: Obrigado! Em maio de 2012, a AI recebeu o valor correspondente aos 0,5% de consignação do IRS de todos os contribuintes que optaram por apoiar a AI (declarações relativas ao ano de 2010, entregues em 2011). O valor recebido foi de 68.205,17 euros. A AI beneficia desta consignação desde 2008, tenho recebido já um total de 263.233,03 euros. Agradecemos a todos os contribuintes que optaram por colocar o NIF da Amnistia. Com um simples gesto e sem custos, fizeram uma grande diferença. Este valor será essencial para todo

o trabalho de investigação, de educação para os direitos humanos e de campanhas globais e nacionais da Amnistia Internacional.

Valor recebido pela Consignação de IRS Valor recebido em 2009

47.742,99 €

Valor recebido em 2010

82.152,16 €

Valor recebido em 2011

65.132,71 €

Valor recebido em 2012 (maio) 68.205,17 €

“A Amnistia dá-me confiança para o futuro, quando ele não parece risonho. Não me deixa esquecer as injustiças, mas também me lembra de todas as conquistas. Ser apoiante da Amnistia é testemunhar as mudanças do mundo e fazer parte delas”

Mariana Violante, 25 anos, recrutadora do “Face to Face” e apoiante


Notícias

Amnistia Internacional

AGENDA AMNISTIA INTERNACIONAL EM SINES Nestes meses de verão o país fervilha com os Festivais de música. E como os direitos humanos não tiram férias, a Amnistia Internacional Portugal vai rumar a sul para estar no Festival Músicas do Mundo, em Sines, a educar para estes direitos que são de todos nós, seres humanos, e a promover o ativismo. Se estiver no festival, de 19 a 28 de julho, procure-nos. Queremos saber de si!

LEITURAS Pão & Rosas: Exercícios de Cidadania Maria do Céu Pires PVP: 10 euros A Coordenadora do Grupo de Estremoz da Amnistia Internacional Portugal, Maria do Céu Pires (a terceira na fotografia), professora de Filosofia no ensino secundário, reuniu em livro as crónicas que escreveu de 2006 a 2011 sobre acontecimentos da atualidade. A obra foi lança-

© Privado

da em Estremoz, a 19 de maio, contando com a presença de Fernando Mão de Ferro, das Edições Colibri, da ex-Presidente da secção portuguesa, Lucília-José Justino, e de Fernanda Henriques, Professora de Filosofia da Universidade de Évora (pela ordem da fotografia). No final de junho o livro foi também lançado em Lisboa. A Violência sobre Crianças Coord. Luís Larcher PVP: 19,95 Euros Mais de meio século depois de ter sido criada a Declaração Universal dos Direitos da Criança, há ainda um fosso grande entre o que deveriam ser estes direitos e o que eles, na verdade, são. Este livro, lançado no Dia Mundial da

O COMÉRCIO DE ARMAS E OS DIREITOS HUMANOS Por Ché, cartoonista espanhol

Criança (1 de junho), reúne intervenções de magistrados, psicólogos, psiquiatras e professores que têm produzido ensaios e estudos sobre esta temática. Alicerces: Revista de Investigação, Ciência, Tecnologia e Artes Instituto Politécnico de Lisboa A edição número 5 da revista Alicerces reúne textos sobre o tema: “Conversando sobre Direitos Humanos e da Criança”, organizados por Catarina Tomás e António Belo, este último da Direção da Amnistia Internacional Portugal. A revista é gratuita e existem poucos exemplares, que podem ser pedidos no Instituto, pelo 217 101 200.

TOME NOTA • 17 de julho Dia Mundial da Justiça Internacional • 9 de agosto Dia Internacional dos Povos Indígenas • 12 de agosto Dia Internacional da Juventude • 23 de agosto Dia Internacional de Recordação do Tráfico Negreiro e da sua Abolição • 30 de agosto Dia Internacional dos Desaparecidos • 21 de setembro Dia Internacional da Paz

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Notícias

Amnistia Internacional

CRÓNICA Para além da Conferência de julho Por José Bernardino, Vogal da Direção da Amnistia Internacional Portugal

© Privado

Realiza-se finalmente a Conferência das Nações Unidas relativa à Resolução nº 64/48, o mandato sob o qual será negociado multilateralmente o Tratado de Comércio de Armas (TCA). Mas ainda que esse pioneiro documento seja aprovado, as dificuldades não terminarão aí. Mesmo tendo em conta os conteúdos discutidos nos quatro Comités Preparatórios (PrepComs) que precederam a Conferência de julho, será difícil que nesta área sensível se chegue a um consenso que permita uma total eficácia do documento. As Regras de Procedimento adotadas na última PrepCom, realizada no passado mês de fevereiro, dispõem que todas as decisões substantivas do Tratado (como o seu âmbito) tenham que ser aprovadas por consenso, enquanto que as questões procedimentais (como a sua implementação) possam ser aprovadas por uma maioria de dois terços dos votos. A qualificação das questões pode também trazer algumas dificuldades às negociações e está sujeita a arbitragem. O consenso não será fácil, mas pior do que não conseguirem aprovar um TCA seria os negociantes aprovarem um documento desigual e lacunar.

O papel negocial dos países que são membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, tendo em conta o seu peso no mercado globalizado de armas, é determinante e não pode ser subestimado. Não será exagero afirmar que sem o seu apoio, o TCA não será eficaz. No passado mês de maio, 51 organizações não-governamentais, entre as quais a Amnistia Internacional, a Oxfam e a Human Rights Watch, enviaram uma carta conjunta ao Presidente Barack Obama apontando várias questões ainda não pacíficas e que consideram essenciais: 1) que existam no TCA critérios de proibição de negociação de armas diretamente relacionados com a legislação internacional de Direitos Humanos em vigor; 2) que seja um Tratato abrangente que inclua desde as armas de aplicação militar até às armas ligeiras, tanto para exportadores como importadores e intermediários; e 3) que as munições também sejam incluídas, tendo em conta os elevados níveis já existentes de proliferação de armas e a contribuição da transação de munições para prolongar conflitos. Após a assinatura do texto final, será necessária a ratificação do Tratado pelos Estados para que este possa entrar em vigor. Isto levantará outro tipo de problemas. No caso dos EUA, embora o Presidente tenha competências para negociar e assinar o Tratado, será necessário que este seja aprovado por uma maioria de dois terços no Senado, uma das duas câmaras do Congresso (o órgão legislativo federal) e só depois disto se poderá concluir o processo de ratificação. A composição atual do Senado é muito dividida partidariamente, o que fará com que a sua aprovação seja difícil. E caso a implementação do Tratado implique a libertação de fundos, ela poderá ainda ser

bloqueada pela Câmara dos Representantes, a segunda câmara do Congresso. Não obstante estas dificuldades, a partir do momento em que o Estado, na figura do seu representante, assina um tratado, mesmo que não o ratifique, fica vinculado a não praticar atos que o privem do seu objeto ou do seu fim, de acordo com o art. 18º da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (1969). Isto significa que, embora seja difícil para já uma ratificação nos EUA, a assinatura de um texto forte será uma vitória diplomática decisiva. É pouco provável que seja votada a criação de um organismo supraestadual que supervisione a aplicação das disposições do Tratado de forma coerciva. Assim, a monitorização será feita através da apresentação e discussão de relatórios anuais relativos ao comércio de armas e em encontros inter-estaduais, o que exigirá uma maior transparência por parte dos Estados. Por outro lado, a opinião pública desempenhará um papel importante de vigilância dos Estados que entrem em contradição com os seus compromissos internacionais. E se o Tratado for abertamente violado, resta uma possível apreciação da situação pelo Tribunal Internacional de Justiça. Desta forma, a implementação do TCA talvez venha a ser morosa, o que é compreensível quando tratamos de direito internacional público. Apesar destas cautelas e dificuldades, estamos efetivamente perante uma data histórica. Se em julho conseguirmos um TCA sólido e eficaz, serão os Direitos Humanos que ganharão novas armas de defesa.


AJUDE-NOS A DEFENDER OS DIREITOS HUMANOS NO MUNDO!

MEMBRO AMNISTIA

TORNE-SE

DA

INTERNACIONAL

© AP/PA Photo/Halabisaz

© UNHCR/H Caux

© AP/PA Photo/Khalid Mohammed

Todos os dias, a toda a hora e a cada segundo, são violados Direitos Humanos fundamentais A Amnistia Internacional trabalha para acabar com esses abusos Ajude-nos a defender os Direitos Humanos no mundo! PODE AJUDAR-NOS: • Tornando-se membro (e passando a participar nas assembleias da Amnistia Internacional Portugal) • Tornando-se um apoiante regular • Enviando um donativo esporádico • E participando ativamente nas atividades que lhe propomos durante todo o ano TODOS OS MEMBROS E APOIANTES DA AMNISTIA INTERNACIONAL RECEBEM: • Informação periódica sobre as Ações e Campanhas da Amnistia Internacional, nas quais pode participar • A revista trimestral da Amnistia Internacional com notícias e reportagens relacionadas sobre as mais variadas temáticas ligadas aos Direitos Humanos CONCORDANDO COM A AÇÃO DA AMNISTIA INTERNACIONAL 1. Assinale uma das seguintes quatro opções:

* 1. Autorizo a minha entidade bancária a debitar da minha conta ao lado indicada, por sistema de débitos diretos (SDD), a pedido da Amnistia Internacional - Portugal, as importâncias indicadas e com a regularidade indicada 2. Estou informado de que os débitos poderão ser efetuados em datas distintas 3. A Amnistia Internacional apenas poderá alterar os montantes após uma informação prévia 4. Irei informar a minha entidade bancária, por escrito, caso pretenda cancelar as instruções aqui indicadas 5. Tenho conhecimento de que, caso algum débito (efetuado por SDD) não cumpra as instruções aqui indicadas, terei 30 dias úteis para reclamar junto da minha entidade bancária, que me devolverá o montante em causa.

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