TREVL 16 — amostra da Edição "Verão 2018"

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Trans-Sulawesi

Velho Chico

Aida e o medo

«Lisboa-Dili-Lisboa»

«TRX — Triumph Experience»

4,50€ (Continente) IVA Inc.

TREVL#16 | Verão 2018 — Quadrimestral

Life Unloaded

Brasil • Geórgia • Indonésia • Marrocos • México

1



Editorial Director e Revisão José Bragança Pinheiro jbpinheiro@trevl.pt

Viajantes e colaboradores Aida Valenti Anabela e Jorge Valente* Hugo Ramos Marcos Leal Rui Correia* Ton Pederneiras * TREVLers

Editor Geral Hugo Ramos Arte Rita Pereira José Bragança Pinheiro Publicidade António Albuquerque

antonio.albuquerque@fast-lane.pt

Telefone: (+351) 939 551 559 Assinaturas: assinaturas@trevl.pt

Para todos os gostos — Por que não existem no mercado europeu motos novas adequadas para viajar no mercado no segmento de menor cilindrada? Até há bem pouco tempo, um dos temas mais comuns nas discussões de viajantes​de moto gravitava em volta desta questão. Agora, essas animadas tertúlias virtuais estão algo diferentes, pois os fabricantes estiveram atentos e foram desenhando e colocando no mercado motos mais pequenas, mais ágeis e, até, mais simples. Visto a uma certa distância, poder-se-ia pensar que este caminho já havia começado a ser trilhado por construtores de menor dimensões (CCM, CSC Cyclone, AJP, Mash para citar apenas alguns), com ofertas entre os 250, 400 e 700 cc de capacidade de motor, pensadas na versatilidade, leveza e opções de carga e suspensão que a viagem recomendaria, entre outros aspectos. ​ s grandes marcas mantiveram o segmento mais alto das grandes cilindradas A bem vivo e a concorrência nunca esteve mais feroz que hoje, porventura. Vemos vários construtores a ombrear a liderança das maxi-trails e das desportivas de turismo. Não é pois uma surpresa que, ao folhear esta edição, descubramos nela histórias e viagens feitas por modelos grandes e pequenos. Dois extremos saltam à vista — KTM 1290 Adventure R e a Honda CRF 250 Rally. Separadas por 90 kg e quase um litro de capacidade de motor, são propostas bem distintas para viajar, capazes de satisfazer um leque amplo de preferências individuais.

Proprietário e editor Administração, Redacção e Publicidade:

Pensar-se-ia que a discussão se poderia então virar para as dimensões médias — por que não há mais motos para viajar nos segmentos intermédios? Voltando a estas páginas, vemos a BMW G650GS do Rui Correia na Indonésia, reencontramos uma Triumph Tiger 800 XC no Sertão brasileiro, ou a Tracer 900 GT como a mais recente proposta desportiva de turismo da Yamaha.

Depósito Legal: 357231/13 ISSN: 2182-8911

Parecem-nos tempos animadores estes, quando as opções pululam e o mercado tem agilidade e empenho suficiente demonstrado em ouvir e adaptar a sua oferta.

Fast Lane II, Lda

Av. Infante D. Henrique, Ed. Beira Rio, Fracção T 1950-408 Lisboa Telefone: (+351) 218 650 244

Produção Gráfica: Finepaper

Impressão e acabamento: Grafisol

Distribuição:

VASP – Distribuidora de Publicações, Lda. Quinta do Grajal – Venda Seca 2739-511 Agualva-Cacém

Começámos a primeira TREVL encorajando que se deve viajar com a melhor moto do mundo — a que temos na garagem, cara ou barata, velha ou nova, pequena ou grande. Hoje, escrevemos estas mesmas palavras com a determinação de quem está certo. José Bragança Pinheiro Director — jbpinheiro@trevl.pt

Periodicidade Quadrimestral (3x por ano) Todos os direitos reservados de reprodução fotográfica ou escrita para todos os países. Estatuto Editorial TREVL é uma revista lúdica e informativa sobre a temática do motociclismo nas suas vertentes de lazer, mobilidade e transporte, desportiva, cultural e, especialmente, turística. TREVL dará especial relevo ao rigor da escrita e à componente artística do desenho gráfico e da fotografia. TREVL empenhar-se-á num jornalismo apaixonado e comprometido com a temática que é seu objecto. TREVL é independente do poder político, económico e de quaisquer grupos de pressão. TREVL defende e respeita o pluralismo de opinião sem prejuízo de assumir as suas próprias posições. TREVL assumirá uma postura formativa. TREVL respeita os direitos e deveres constitucionais da liberdade de expressão e de informação e cumpre a Lei de Imprensa.

Capa A Triumph 800 XC testemunha um amanhecer deslumbrante sobre a represa de Sobradinho, no Brasil. Foto Ton Pederneiras

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página

Os TREVLers Anabela e Jorge valente revelam um dos melhores destinos «escondido-à-vista-de-todos». Geórgia («DiariesOf»)

52

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O viajante Ton Pederneiras foi explorar os caminhos que acompanham o rio São Francisco e descobriu mais do que um simples curso de água. Brasil («Destino Incerto»)

14

66

O Hugo Ramos embarcou em mais uma aventura por Marrocos aos comandos da mais recente geração da Honda «Africa Twin». Marrocos

A Aida Valenti na sua volta ao mundo de moto, regressa às nossas páginas, falando sobre medo, como sofremos por antecipação receios injustificados. EUA e México («LifeUnloaded RTW»)

O TREVLer Rui Correia empreende no regresso para fechar a sua volta ao mundo, partindo agora de Timor-Leste. Indonésia e Filipinas

82

do acotarescrita

Revis uguês. t em por ÃO foi , o Log N acordo do o adopta ráfico. or tog

Honda F800 GS

por Jorge Valente 61

73

BMW G650 GS

82

Honda Africa Twin «Sports Adventure»

30

KTM 1290 Adventure R

48

KTM 990 Adventure

14

Triumph «Tiger» 800 XC

21

Suzuki DR 650

38

por Hugo Ramos

«Velho Chico», Brasil

por Ton Pederneiras

@EUA e México, por Aida Valenti («LifeUnloaded RTW») 4

6

@Indonésia, por Rui Correia

por Hugo Ramos

Honda CRF250L Rally por Marcos Leal

Yamaha «Tracer» 900 GT por Marcos Leal


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Vancouver

«Épico»

@Marrocos, por Hugo Ramos

«As vistas foram absolutamente deslumbrantes durante todo o dia, com aquela sensação mágica que Marrocos nos transmite de grandiosidade, de vermos dezenas de pistas a desenharem-se até onde a nossa vista alcança e a certeza de podermos passar ali cem vezes e nunca pisar o mesmo solo. Mesmo que o GPS nos diga para onde ir, o nosso espírito livre de viajantes faz-nos imaginar outras tantas viagens e outras tantas aventuras naquela paisagem. Viajar também é evadirmo-nos e a evasão também é espiritual, transcendental, sentida, emocional. Marrocos é mágico por isso também, pela capacidade de nos regenerar o espírito da mesquinhez do dia-a-dia, da pequenez de vistas do nosso quotidiano. »

São Francisco

38 Cidade do México

«Medo»

@México, por Aida Valenti («LifeUnloaded RTW»)

«Vais ser sequestrada pelos cartéis e mantido refém pelo resgate». «Vais morrer assim que atravessares a fronteira». E estes foram apenas alguns dos comentários que ouvi.

«On My Mind»

@Geórgia, por Anabela e 52 Jorge Valente («DiariesOf») «"A estrada existe" — disse-nos finalmente um jovem, — "mas está em tão má condição que é mais fácil voltar por Mestia." E continuou, explicando. "A última vez que passei por lá, parte da estrada tinha sido completamente destruída pelo rio, com as chuvas."»

Batumi

Tiblissi

Baku

14

«Velho Chico»

@Brasil, por Ton Pederneiras

«O nosso último guia, após ensinar todo o caminho, gaguejou e pediu que não seguíssemos. Aquela estrada escondia um reduto de bandidos impiedosos que não permitiam que ali passassem com vida e — para agravar — mortes recentes haviam ocorrido e os ânimos estavam acirrados. »

Foz do São Francisco

FILIPINAS São Paulo

«Trans-Sulawesi»

@Indonésia, Timor-Leste, 66 por Rui Correia

Manado

«Embarcamos a Kuda para Macáçar nas ilhas Celebes (Sulawesi). O tufão Kay-Tak dominava o clima na Insulíndia com chuvadas torrenciais. Decidimo-nos arriscar atravessar toda a ilha de Sulawesi, dois mil quilómetros de curvas e chuva diluviana, na esperança de encontrar uma solução em Manado ou Bitung.»

Índice de Destinos

98

Dili

5 página


14


Em viagem

Velho

Chico

Destino Incerto Canal de mototurismo de viagens no Brasil, mas também no mundo, com conteúdos para quem queira aventura-se em duas rodas.

Seguindo o curso do rio São Francisco, Ton percorre desde regiões inóspitas e secas até cascatas. Ton Pederneiras («Destino Incerto»)

L

á estava, em frente de uma das cachoeiras mais belas que havia visto. A água despencava em duas quedas de quase 300 m de altura no poço cercado de pedras gigantes. Do impacto nascia uma nuvem húmida nada menos que fantástica. Sozinho e com a mente totalmente vazia — o que é raro em mim. Aos poucos começaram a desfilar os dias recentes, meses e anos que culminaram ali, naquele local. Como em muitas outras coisas na minha vida, procuro mil pretextos para seguir o caminho que algo em mim me aponta. Dessa vez não fora diferente. Decidira criar um novo roteiro para a TRX. Teria de ser original, nunca feito antes — montar um projecto social no Nordeste, resgatar uma amizade importante para mim, e aventurar-me de moto sem caminho definido, cedendo por fim à mágica atracção que o rio São Francisco me causa. Tudo isto me trouxe até aquele momento e lugar. Foram tantos os começos que me levaram até ali, que não conseguiria arriscar onde e quando a viagem começou.

Salteadores de Lagoa Perdida «Se Minas não tem mar, O mar não tem Minas Gerais»,

César Menotti e Fabiano

Amanhecia quando deixámos São Paulo para trás. Eu na minha Tiger 800 XC — mais tarde baptizada

— e o Có ainda em lua-de-mel com a sua KTM 990 Adventure. O caminho escolhido para Minas Gerais foi a Rodovia Fernão Dias, na qual o trânsito é sempre uma incógnita. Naquele dia brindava-nos sem engarrafamentos, banhada pelo sol e um céu azul a realçar o verde da vegetação envolvente às suas curvas abertas, convidativas a acelerar. Antes do meio-dia cumpríramos a nossa missão no asfalto e, da mesa do restaurante do Turvo onde nos serviram um peixe delicioso, olhávamos as águas da Represa de Furnas, o terreno reservado para essa tarde. Entramos no barco que exploraria o mar Mineiro, com a primeira paragem na Lagoa Azul. O belo poço ficava escondido no paredão de pedra talhada, típica da região. Furtiva, a fenomenal cachoeira criava um local cénico e exclusivo, quando revelada, por contraste com o silêncio penetrante do Vale dos Tucanos, seguindo pelos desfiladeiros estreitos passando pela deslumbrante cascata Ecopark e o Vale dos Cânions, dignos de um filme do Indiana Jones. Os altos paredões levantam-se no lago com recortes incríveis e, lá do alto, a água solta-se até encontrar o lago. Nadando sob a queda a sensação é que a viagem podia terminar ali momento que já teria valido a pena. O dia termina escurecendo, com um jantar simples e o primeiro — e último — acampamento da viagem. Brasil

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Lake Louise

Canadá Vancouver Whistler Victoria

Tofino

Spokane, WA

White Salmon, OR

Cape Meares, OR

Black Hills

Crater Lake Cape Perpetua, OR

Salt Lake City Montanhas Rochosas Reno, NV

Denver, CO Goblin Valley

P. N. Yosemite

São Francisco

Los Angeles

Cincinatti, OH

Moab, UT EUA

Tecate, CA

Ensenada

«Coco’s Corner»

San Ignacio Oceano Pacífico

Baja California

México La Paz

El Soldado Mazatlán

Cabo Pulmo Tequila

La Gloria Tolantongo

Guadalajara Cidade do México

Seguir a viagem

Há muitas formas de apoiar a viagem da Aida e Paul à volta do mundo. Esta que sugerimos é apenas uma delas. Seguir a página de «Facebook» e manter o contacto, encorajando-os é outro. Encontra a tua.

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San Cristobál de las Casas

Cuauhtémoc Guatemala

Belize Honduras

El Salvador Nicarágua

Costa Rica


Em viagem

Medo Título original: «What the fuck are you so afraid of?»

Long Island, NY

Como lidamos com ele durante uma viagem por terras desconhecidas? Qual o real impacto que, em cada um de nós, têm as histórias que se ouvem no caminho sobre o que nos espera à frente? Aida Valenti («LifeUnloadedRTW»)

D

Oceano Atlântico

Cuba

República Dominicana Jamaica

Haiti

e que raio tens tu tanto medo?» O medo pode ser um factor determinante a manter-nos vivos nas tarefas e vida do dia-a-dia. Mas pode também ser um grande inibidor, impedindo-nos de atingir todo o potencial que nos estava reservado, limitar as experiências de vida para que estamos guardados. Em criança, somos bombardeados para termos cuidado em todas as curvas. Somos ensinados a não falar com estranhos, não andar depressa... a lista é interminável. É-nos dito que a vida é frágil e, na realidade, é. Mas ao mesmo tempo, também não nos incentivaram a testar os nossos limites, a arriscarmos. Somos como que formatados para temer o desconhecido. Como adulta, assumo a minha culpa de passar esta maneira de estar aos meus filhos, passando o que me fizeram a mim, porque assim fui educada. Todos nós, enquanto humanos, desejamos acima de tudo que a nossa família e amigos estejam seguros.

Uma aventura temida

Panamá Colômbia

Os leitores mais atentos da TREVL e quem nos acompanha nas redes sociais saberão já que estou a viajar pelo mundo na minha fiel Suzuki DR 650, fazendo equipa com o meu companheiro e amigo Paul Arcadia. A esta aventura chamámos «LifeUnloadedRTW». Antes desta viagem sequer começar, tive de enfrentar os meus próprios medos, que eram — e ainda são — muitos. O de estar longe da minha família. De me magoar, ou que aconteça algo ainda pior. O medo de avariar no meio de lado nenhum. México («LifeUnloadedRTW»)

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60


Raio-X BMW F800 GS (2016) «Poderosa» — edição «diaries of»

Saída de moto do Luxemburgo a 3 de Agosto, com chegada à Geórgia no dia 16, 14 dias depois. Interrompemos a viagem, regressando de avião a 23 de Outubro, volvidos quase dois meses na Geórgia. Aí deixámos a nossa moto com um amigo ganho. Contamos retomar a viagem em direcção ao Japão em Março de 2018.

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5

6 2 3

4

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1 8

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pág. Anterior Topo esquerdo O encontro com um motociclista no deserto perto do Azerbeijão revelou-se providencial. (@Cachétia) Topo direito Chegada a Kutaisi ao cair da noite. (@Kutaisi) Centro Mais que orientações, Eko ofereceu amizade e uma disponibilidade para ajudar. (@Cachétia) Base esquerda Trilho à saida de Ushguli, o caminho foi de terra e sempre a subir até chegarmos à portela de Zagar. (@Zagar) Base direita Uma boa tenda faz muita diferença, quando o campismo é a forma principal de dormida. (@Desfiladeiro de Okatse)

1 Malas laterais Touratech Levámos apenas duas malas laterais de alumínio — para nós, preferível ao plástico —, com 31 e 38 litros cada. Aprendemos em viagens anteriores que as malas com suportes de plástico não são uma boa opção, quebrando e sendo de difícil reparação.

5 deflector Para altura do piloto (1,73 m) o deflector torna a condução prolongada mais confortável.

2 Saco impermeável Na traseira levámos um saco impermeável da Touratech com 49 litros de capacidade. A mala traseira é o nosso quarto e cozinha, onde transportamos a tenda — ficar a seco em noites de chuva e vendaval justifica o investimento numa boa tenda—, colchões, sacos de cama, fogão e tacho.

7 Equipamento Apesar do calor sentido, resistimos à tentação de nos livrarmos dos casacos e protecções.

3 Saco dianteiro No dorso da moto (evitando dizer «saco de depósito», porque neste modelo o combustível fica lá atrás) levamos o material fotográfico num saco impermeável original BMW. 4 Luzes auxiliares Da Wunderlich.

6 Navegação Confiamos ao mapa de estradas a nossa navegação, sem GPS.

8 Pneus Equipámos a moto com Anakee 3, um bom compromisso para o tipo variado de pisos que nos propomos a fazer, mesmo sem que haja uma ideia planeada do que nos será exigido. Para nós o melhor compromisso pois fazemos alcatrão, cascalho e terra. Não evitamos um ou outro — é o que nos aparece. 9 Drone O preço acessível e o tamanho reduzido foram os grandes factores decisivos na escolha do «DJI Spark» para nosso primeiro drone (500 €). Com apenas 300 g é

surpreendentemente robusto. A mala de transporte mede apenas 20x20x6 cm, cabendo em qualquer canto das nossas malas. Na escolha privilegiámos poder ser telecomandado por telemóvel, evitando transportar um telecomando. A desvantagem é que o telemóvel perde o contacto com o drone aos 50 m. Acabámos a comprar o telecomando DJI para assim o podermos voar até aos 120 metros. Como ainda somos principiantes com drones, achamos muito interessantes as várias funções pré-definidas e o voo em modo de segurança, que o faz regressar à base em caso de perda de contacto ou limite de bateria. Características ideais para quem está a começar a pilotar, limitando os riscos. A bateria tem um limite de voo de apenas 15 minutos, valendo a pena investir numa bateria adicional. Na Geórgia fomos interpelados uma única vez pela polícia em espaços públicos — é certo, estavamos num recinto religioso central. Pediram-nos a identificação e fotografaram o nosso passaporte. Queriam apenas saber quem éramos e onde estavamos instalados. Pudemos continuar a filmar.

Geórgia («DiariesOf»)

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66


Em viagem

Trans

Sulawesi Circum-navegar o mundo de moto tem as suas dificuldades, em especial em arquipélagos, sendo a água um território onde uma moto se sente «fora-de-pé». Rui Sá Pinto Correia e Maria José Barrosa

A

viagem de regresso DiliLisboa completou a sua primeira etapa, cumpridos três mil quilómetros durante um mês, atravessando as ilhas de Timor, Flores, Sulawesi, arquipélago Sangihe e os mares de Savu, Flores, Celebes e Filipinas. Dominantes, as chuvas de monção castigaram severamente a jornada, obrigando a cuidados e penosos esforços de condução e estoicismo físico ao longo do percurso sinuoso das montanhas, longas cordilheiras e arribas de costa que caracterizam a geografia fantasiosa de Sulawesi. Alturas há em que as distâncias têm outra lonjura e medida que não os quilómetros que separam dois pontos em extremos. De facto, pudemos compreender, pela experiência de cruzar a interminável trans-Sulawesi e os mares da insulíndia — adoçados e submetidos aos horários incertos e desconhecidos de ferries cuja existência real ninguém assegura —, a dificuldade de realizar esta travessia. A presença portuguesa permanece viva na língua, nas manifestações culturais e religiosas das Flores (Larantuka e Sikka) e nas fortificações de Sulawesi em Macáçar e Gorontalo.

Nas montanhas centrais de Sulawesi, somos envolvidos na peculiar cultura de Tana Toraja, onde a morte e os ritos funerários são valorizados como roteiro turístico. Integrados nos grupos de turistas indiferentes, somos conduzidos a cavernas onde hoje residem os ancestrais que, com os flash dos telemóveis, despertam para a vida nas páginas do facebook. Navegamos as noites do equador, em mares de piratas e radicais islâmicos, sob o céu ondulante de estrelas. Por entre ilhas perdidas e contestadas e vulcões que se listam entre os mais explosivos no Anel de Fogo do Pacífico, sofremos, no convés de um ferry, de um sono impossível e de um inexpectável vento frio do equatorial. Barramos na fronteira invisível e inamovível da burocracia. Não nos deixam cruzar os últimos 60 km que separam a Indonésia da ilha de Mindanao nas Filipinas. Forçados a regressar a Sulawesi, afrontamos esses temerosos inimigos do viajante — a Alfândega e Imigração. Depois de muito sujeitar a argumentos o nosso propósito, questionando a real existência do pacto ASEAN de que são membros a Indonésia e as Filipinas, bem como o efectivo domínio e soberania do estado sobre os seus territórios, quando estes não conseguem criar as condições de segurança ao viajante, foi finalmente Indonésia («Timor—Lisboa»)

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Em viagem

Épico Marrocos surpreende sempre. Por mais vezes que entremos em África pelas suas fronteiras, há sempre algo de novo a descobrir e um povo de braços abertos à nossa espera. Hugo Ramos

Honda

D

esta vez não foi a sentir a humidade do vento do estreito de Gibraltar que entrei em África. Tão pouco sentindo os cheiros que dominam o ar de Tânger, aquele misto imaginário da salinidade atlântica, aquecido com a tepidez mediterrânica, polvilhado com a secura do deserto, a rarefacção do Atlas e as múltiplas fragâncias das especiarias locais. Desta vez um pássaro de ferro levou-me pelos ares até à mítica cidade marroquina de Fez — «número dois» do reino e várias vezes sua capital —, onde encontramos uma das mais espectaculares almedinas marroquinas. É também casa da Universidade de Quaraouiyine, a mais antiga do mundo, criada no ano de 859. Como cidade imperial de Marrocos, foi sem dúvida a escolha certa para uma viagem que redundantemente tem «Epic» no nome, a qual seria épica a todos os níveis.

Segunda edição

«Honda Africa Twin Morocco Epic Tour» — assim se chamou ao evento «turístico» organizado pela Honda ibérica, que tem como parceiro a Sports-Adventure, uma empresa espanhola com muita experiência em África, um garante de uma organização quase isenta de falhas e com uma resposta fantástica a qualquer incidente ou necessidade no exigente terreno marroquino fora-de-estrada. As inscrições — disponíveis apenas para Portugal e Espanha — rondaram este ano as 150 no total,

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Marrocos

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Destinos

África

3 9 15 África do Sul 4 9 Angola 1 Argélia 3 15 Botsuana 9 10 Congo (R. D.) 9 Egipto 9 Etiópia 9 Gâmbia 4 15 Malaui 6 10 14 10 13 16 Marrocos 1 2 14 9 Mauritânia 4 9 15 Moçambique 3 4 15 Namíbia 4 9 Quénia 9 10 Ruanda 1 14 9 Sahara Ocidental 5 São Tomé e Príncipe 2 9 Senegal (Dakar) 2 9 Sudão 10 Sri Lanka 9 15 Tanzânia 3 4 15 Zâmbia

Ásia

Arménia Azerbeijão Burma (Myanmar) Camboja China Geórgia 3 Índia Indonésia Irão Iraque Japão Laos Malásia Mongólia Nepal Paquistão Quirguistão Tailândia Tajiquistão Timor-Leste Turquemenistão Usbequistão Vietname

Oceânia Austrália

América

Conheça aqui quais os destinos de viagem de moto sobre os quais já publicámos, tanto na TREVL, como na REV.

Nesta edição

Os destinos incluídos nesta edição estão destacados com um fundo amarelo.

Edições passadas

Cada entrada nas tabelas seguintes tem a indicação de qual o número onde foi publicada (a amarelo na TREVL, a azul na REV).

Interactivo

Para uma experiência mais interactiva com visualização sobre o mapa-mundo, sugerimos visitar o nosso site na secção «TREVL no Mundo».

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«Alasca» (EUA) Argentina 4 6 Belize Bolívia Brasil Canadá Chile Colômbia Costa Rica El Salvador Equador 6 EUA Guatemala México Nicarágua Panamá Paraguai 6 Peru Uruguai Venezuela

7 8 15 6 7 9 11 9 12 15 7 8 9 11

5 7 8 4 7 8 9 8 9 14 15 9 9 9 7

8 8 9 13 7 16 14 16 14 9 9 13 9 11 11 9 11 9 9 16 11 11 13

7

5 11 13 7 10 11 12 5 4 11 7 11 12 4 6 7 8 16 5 4 10 11 12 4 5 7 8 5 8 5 8 4 7 5 7 12 15 16 2 5 8 12 16 5 8 5 8 6 11 5 4 7 11 12 6 4 7 10 11 4 8

Europa

7 Albânia Alpes Balcãs Bielorússia Bósnia e Herzegovina Bulgária Córsega Croácia Dinamarca 1 Espanha 1 Escócia Eslovénia Gales Grécia Inglaterra Irlanda Islândia Itália Letónia Kosovo Montenegro 1 Noruega Pirenéus Polónia Roménia 3 7 Rússia Sérvia Suécia 2 7 8 Turquia

Portugal

10 11 15 1 2 3 7 15 9 7 15 7 1 7 8 14 4 5 7 5 6 12 7 2 7 11 2 6 2 1 3 5 7 9 2 7 15 7 15 8 13 14 1 5 7 9 14 16 8 11 14 2 7 15 14 11 12 14

Açores Alto Alentejo Alta Estremadura Alto Douro Beira Baixa Serra Algarvia Serra da Arrábida S. de Aires e Candeeiros Tejo dos Castelinhos

Espanha

Deserto de Bardenas Galiza Picos de Europa Ruta de la Plata Sierra Norte

12 7 13 3 2 10 13 1 1 7 10 1

5 12 1 5 4 7 7


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