TREVL 15 Primavera 2018 — Amostra

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Editorial Director e Revisão José Bragança Pinheiro jbpinheiro@trevl.pt

Viajantes e colaboradores Aida Valenti Anabela e Jorge Valente* António Rosado Armando Almeida Hugo Jorge Hugo Ramos João Sousa Marcos Leal Paulo Sadio* Pedro Ochôa * TREVLers

Editor Geral Hugo Ramos Arte Rita Pereira José Bragança Pinheiro Publicidade António Albuquerque

antonio.albuquerque@fast-lane.pt

Telefone: (+351) 939 551 559 Assinaturas: assinaturas@trevl.pt

Abandono

N

ão é a primeira vez que as páginas de uma TREVL se escrevem no feminino – nem a última – tendo começado com Alicia Sornosa na TREVL 5. Na última capa, Lea lembrou-nos o seu exemplo de força e determinação na volta que deu ao mundo. Nesta, Anabela contempla as montanhas da Geórgia ao lado da sua Poderosita, partilhando as páginas com Aida, uma portuguesa nascida em Montejunto a viver em Long Island, Nova Iorque, desde muito nova. Aida propôs-se a seguir um sonho que a vida lhe fora adiando e, já nos seus quarenta, aproveita uma oportunidade que reconhecer como única e a levou a embarcar numa viagem que não se cansará de a surpreender. Começa a sua volta ao mundo de moto no país que a acolheu, de leste a poente, descendo depois para sul, onde entrará no México pela Baja California. Vai revelando momentos de camaradagem enquanto se surpreende com a bondade dos estranhos e a beleza de um subcontinente duro e belo. No mesmo continente onde a nova expedição «SulAmericaNorte 2018» desembarcará, começando tudo no Barreiro antes de seguir para Londres onde entregam as motos que reencontrarão em Buenos Aires, Argentina. Alguns dos portugueses da expedição «Lisboa – Beijing – Lisboa» de há 3 anos mantém-se no grupo, enquanto se juntam novas caras e perspectivas diferentes, como o realizador João Monteiro e Chaves. Que outros destinos nos esperam aqui, nas páginas de uma TREVL futura?

Proprietário e editor

FAST LANE - Media e Eventos, Lda.

Administração, Redacção e Publicidade: Av. Infante D. Henrique, Ed. Beira Rio, Fracção T 1950-408 Lisboa Telefone: (+351) 218 650 244

Depósito Legal: 357231/13 ISSN: 2182-8911 Impressão e acabamento: LGS Impressores, Lda Rua Alfredo da Silva, 12 2600-016 Alfragide

Distribuição:

VASP – Distribuidora de Publicações, Lda. Quinta do Grajal – Venda Seca 2739-511 Agualva-Cacém

Talvez algures perdidos pelo antigo Crescente Fértil, percorrendo os desertos e montanhas de uma Jordânia adiada, nos colonatos de Jerusalém ou nas ruas desaparecidas de Damasco, escombro de uma Humanidade falhada, lembrando-nos quão efémera é a vida e porque merece ser vivida. De moto e com as pessoas que, lá, nos ajudarão a recordar o que já não existe e poderia ter sido, a construir uma memória. E, como na vida, cada TREVL escreve-se para que se não deixe esquecer, mais do que para partir e ir ver o mundo. Escrevemos cada TREVL para nos recordar que é importante viver e ser feliz, contagiando as pessoas em nossa volta e dando-nos o tempo para as escutar. Queremos sempre que esta seja a TREVL que interrompas a meio. Que, no ímpeto da decisão de partir, a abandones sobre o sofá onde ambos se cobrirão de pó

José Bragança Pinheiro Director — jbpinheiro@trevl.pt

Periodicidade Quadrimestral (3x por ano) Todos os direitos reservados de reprodução fotográfica ou escrita para todos os países. ESTATUTO EDITORIAL TREVL é uma revista lúdica e informativa sobre a temática do motociclismo nas suas vertentes de lazer, mobilidade e transporte, desportiva, cultural e, especialmente, turística. TREVL dará especial relevo ao rigor da escrita e à componente artística do desenho gráfico e da fotografia. TREVL empenhar-se-á num jornalismo apaixonado e comprometido com a temática que é seu objecto. TREVL é independente do poder político, económico e de quaisquer grupos de pressão. TREVL defende e respeita o pluralismo de opinião sem prejuízo de assumir as suas próprias posições. TREVL assumirá uma postura formativa. TREVL respeita os direitos e deveres constitucionais da liberdade de expressão e de informação e cumpre a Lei de Imprensa.

Capa Nas montanhas da Geórgia a contemplação é uma rotina quase obrigatória, a cada quilómetro de mota. Foto Jorge Valente («DiariesOf»)

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página

DO ACOtaRescrita

Revis uguês. t em por ÃO foi N , o g o L rdo o o aco d a t p o d a fico. or tográ

Os TREVLers ANABELA e JORGE VALENTE revelam um dos melhores destinos «escondido-à-vista-de-todos». Geórgia («DiariesOf»)

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Os dois amigos ARMANDO ALMEIDA e o TREVLer PAULO SADIO andaram pelas terras do Sul de África e contam o que foi e está para vir. Sul de África («Africa Twin Adventure»)

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O ANTÓNIO ROSADO ligou Moura, Alentejo, a Baucau em Timor. Neste número conta-nos histórias da Indonésia e Timor-Leste. Indonésia, Timor-Leste («Out off the Box»)

O viajante HUGO JORGE esteve nos Balcãs e conta-nos histórias sobre como este continua a ser um destino entusiasmante. Balcãs («Walkabout»)

O JOÃO SOUSA percorreu nove dos impressionantes países do Sul de África, numa viagem de peripécias e aventura. África («Southern Africa 360º»)

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A AIDA VALENTI arrisca-se a ser a primeira portuguesa a dar a volta ao mundo de moto, aos comandos da sua DR650. EUA («LifeUnloaded RTW»)

BMW F800 GS

@Geórgia, por Jorge Valente 71

BMW F700 GS

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BMW F850 GS

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@Balcãs, por Hugo Jorge

por Hugo Ramos

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BMW F650 GS

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BMW R850 GS

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BMW R1200 GS Adventure

10

Honda Africa Twin «Sports Adventure»

Triumph «Tiger» 800

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Triumph «Tiger» 1200

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por Hugo Ramos

por Marcos Leal

Suzuki V-Strom 250

por Hugo Ramos

Suzuki DR 650

@EUA, por Aida Valenti («LifeUnloaded RTW»)

50

30

@Sul de África, por João Sousa @Indonésia, Timor-Leste, por António Rosado («Out off the Box») «Sul América Norte 2018», Armando Almeida

por Pedro Ochôa


«Aripi»

@Balcãs, por Hugo Jorge 76 («Walkabout») «A capital tem um daqueles nomes que parece mal escrito, lembrando a terra do monstro do Loch Ness. Escópia, assim é o nome da capital da Macedónia, revela-se cosmopolita desenrolando-se em volta da estátua de Alexandre, o Grande, presença dominante da praça principal.»

Belgrado

Bucareste

Sarajevo

Escópia

Canada

Long Island

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«LifeUnloaded RTW»

@EUA, por Aida Valenti («LifeUnloaded RTW»)

«— "Primeiro dia" — ouvia Paul no meu capacete — "Aqui vamos nós dar à volta ao mundo. Milha Um" — terminava, encontrando as palavras certas que me faltaram.»

«On My Mind»

@Geórgia, por Anabela e 62 Jorge Valente («DiariesOf») «"A estrada existe" — disse-nos finalmente um jovem, — "mas está em tão má condição que é mais fácil voltar por Mestia." E continuou, explicando. "A última vez que passei por lá, parte da estrada tinha sido completamente destruída pelo rio, com as chuvas."»

Tiblissi Batumi Baku

Ngorongoro

36 Windhoek

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Maputo

«Africa Twin Adventure»

@Sul de África, por Armando Almeida e Paulo Sadio

«Sul de África 360º»

@Sul de África, por João Sousa

«A 20 metros da tenda, dois pontos brilham na água, iluminados pela luz fraca da minha lanterna. E piscam ao comando do seu dono, um pequeno crocodilo com menos de meio metro.»

Cabo

«Moura-Baucau — Mil&Uma Ilhas» @Indonésia, Timor-Leste, por António Rosado («Out off the Box»)

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«Há sítios que são uma janela para a vida, onde se é dado a ver a Humanidade, se estivermos atentos — cada "ferry" aqui é uma dessas janelas.»

Jacarta

Baucau

Índice de Destinos

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5 página


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Em viagem

Life Unloaded

RTW

E quando a oportunidade que sonháramos nos bate à porta — recusamos? A portuguesa Aida respondeu que não. Aida Valenti («LifeUnloaded RTW»)

A

semente foi plantada depois de, com o meu irmão António, ver o documentário «The Long Way Round» emitido em 2004. Apesar de plantada, acabara de ter o meu segundo filho no final do ano anterior. António tinha um emprego novo, uma nova hipoteca na casa e um casamento recente. Era evidente que não iríamos a lado nenhum. O sonho passou para o banco de trás, deixando os lugares da frente para a vida do dia-a-dia. Filhos, companheiros, trabalho, saúde — tudo tinha prioridade. A «Vida» afogara o «Sonho» até que não era mais que uma vaga memória. As crianças cresceram e novas apareceram, enquanto o sonho era acordado de quando em quando, numa revista ou documentário na televisão. O engraçado sobre os sonhos é que, como as sementes, podem ficar adormecidos até que uma gota de água os desperte para a vida. Aí entrava Paul Arcaria. Solteiro, empregado na Long Island Rail Road, conhecemo-nos num encontro de motociclistas em Janeiro de 2016. Mantivemos contacto por mensagens ocasionais onde contávamos as

mais recentes aventuras de moto, numa espécie de desgarrada ou desafio. Passaram onze meses antes que nos reencontrássemos no NYC International Motorcycle Show, onde Paul cedera a sua moto ao stand da Mosko Moto. Apressou-se a contar-me os seus planos de se fazer à estrada e viajar pelo mundo de moto. Apesar de brincarmos com a ideia de eu me juntar como fotógrafa, a chama acendera-se em mim — tudo quanto era capaz de pensar na viagem de comboio de volta a casa. Falei com Chris, o meu marido, como seria fantástica a aventura que eu não conseguia enxotar da minha ideia. A família concordou em dar uma hipótese, convidando Paul a visitar-nos e partilhar «O Plano». A ideia – simples – seria partir de Long Island até Lisboa. Simples. Na essência, o mesmo que a minha família fizera, mas ao contrário e numa moto. Ah! E com mais alguns continentes à mistura pelo caminho, só pela piada. António era o companheiro do plano inicial, mas esta oportunidade não podia escapar-me. Paul acomodou algumas das minhas sugestões e rapidamente começámos a organizar e preparar a aventura, agora em conjunto. Nunca havíamos conduzido juntos e, apesar disso,

embarcávamos numa viagem de dois anos à volta do mundo (RTW Round The World). O pensamento generalizado era que eu era louca, mas sendo portuguesa, estava habituada a não ter as mesmas ideias que a maioria nos EUA. Para mim é simples — se a minha família me apoia, não há mais nenhuma opinião que importa ouvir e, com 43 anos, sabia que a janela de oportunidade se estava a fechar e rápido.

Que comece a loucura

Decidimos que umas viagens mais pequenas nos permitiriam antecipar se nos iríamos atirar à garganta um do outro ou sobreviver. Fomos aumentando as distâncias, procurando no Novo México a escola de condução fora-de-estrada West 38 Moto para um curso de três dias, seguido de uma viagem fora-de-estrada de quatro até à Overland Expo 2017 no Arizona, em Flagstaff. A experiência trouxera novos aromas à relação e à aventura, partilhando uma tenda sem tomar banho. Foi um período de muita aprendizagem. Paul percebeu que se deixar as meias e botas fora da tenda evita que o chateie a toda a hora. Já com alguns patrocinadores a bordo, permitimo-nos criar uma relação de amizade com um entendimento simples — ia exigir um constante EUA («LifeUnloaded RTW»)

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Em viagem

Twin África Ao irrequieto TREVLer Paulo Sadio junta-se o viajante Armando Almeida. Partilham a vontade, o destino e as motos bicilíndricas. Paulo Sadio

ETIÓPIA

Armando Almeida e Paulo Sadio

SOMÁLIA QUÉNIA

UGANDA

Nairóbi

Monte Kilimanjaro

RUANDA Ngorongoro

BURUNDI

Moshi

4

TANZÂNIA Dar Es Salam R. D. CONGO

A preto, a rota seguida por ambos, Armando e Paulo, diferente da planeada, com um total de 10 mil km feitos durante os 30 dias de viagem.

Mtwara

Livingstonia 3 Parque Nacional South Luangwa

A cinzento marcamos o percurso feito antes pelo Armando, em Setembro.

MALAWI

ANGOLA

MOÇAMBIQUE

ZÂMBIA Kasane

NAMÍBIA

Nata

Maun

Windhoek

Pemba Ilha de Moçambique

Harare

ZIMBABUÉ

Palma 2

Beira

Parque nacional da Gorongoza

Francistown

Swakopmund

BOTSWANA

MADAGÁSCAR

Pretoria

Joanesburgo

Piggs Peak

Luderitz

Maputo

1

SUAZILÂNDIA LESOTO ÁFRICA DO SUL

Cidade do Cabo

36

Cabo das Tormentas

1 «TÁ P’A IR» Embarcamos as motos na TAP Air Portugal para Maputo.


D

ecidi dividir o projecto de viagem pelo sul de África em duas grandes partes, em 2017 e 2018 aproveitando as férias, deixando a minha Honda Africa Twin de 1997 em Moçambique de um ano para o outro. Ambas seriam no Outono, entre Outubro e Novembro, final da época seca e antes do início das primeiras chuvas, as quais nesta zona do continente africano costumam surgir num período mais curto em Novembro e depois com maior intensidade e duração em Fevereiro e Março — isto antes dos «Amaricanos irem à Lua», porque desde então só os Deuses sabem.

4 O plano inicial foi interrompido na entrada do Quénia por falta de um papel.

3 Sem «carnet de passage en douane» não conseguimos entrar com as motos na Tanzânia, contrariamente à informação de outros viajantes.

2 Conflitos violentos armados nesta zona de Moçambique trouxeram também alguma tensão para a nossa viagem.

O Armando aderiu com entusiasmo ao projecto, o que não surpreende dada a sua enorme vontade para viajar. Baptizámos de «Africa Twin Adventure» inspirados pelo número 2 — uma aventura de dois motociclistas em África, viajando em duas motos bicilíndricas (twin), uma Honda Africa Twin XRV 750 de 1997 e uma BMW R1200 GSA. O Armando, não condicionado pelas férias e com mais tempo disponível, optou por fazer o percurso completo em 2017 — Poente e Nascente —, viajando mais cedo com as motos para Maputo. Chegado Agosto, saía de Maputo em direcção à Africa do Sul, onde se juntaria com a sua companheira para subir pela Namíbia, Zimbabué e Botswana, antes de regressar a Maputo (itinerário a cinzento no mapa). Tudo a tempo de nos reencontramos no feriado nacional de 5 de Outubro para a nossa viagem conjunta.

Rumo a norte... ou nem por isso?

Em Maputo acompanhou-nos o grupo de motociclistas moçambicanos e portugueses, #motofriends_Moçambique. O seu conhecimento do país e a boa disposição foi uma boa combinação para conviver e ter alguma ajuda com alguma logística. O nosso trajecto planeado tinha um objectivo central — percorrer a costa do Índico para «coleccionar» os locais de memória arquitectónica portuguesa como a ilha de Moçambique, Quiloa (agora Kilwa Kisawani), Zanzibar na Tanzânia e, por fim, Mombaça e Melinde no Quénia. Depois seguiríamos para o interior, contornando o monte Kilimanjaro por caminhos quenianos, regressando à Tanzânia para visitar a cratera de Ngorongoro. Atraídos pelo mergulho retemperador no lago que dá o nome ao Malaui, nação encaixada entre três países — Zâmbia, Moçambique e Tanzânia — e pela visita à missão de Livingstonia, rumaríamos a sul, antes de virar ali à esquerda como quem vai para o parque nacional de South Lwuanga. A recta final em Moçambique seria aproximando pela região de Tete até à capital moçambicana.

Honda «Africa Twin» XRV 750 ‘1997 Paulo Sadio

BMW R1200 GS Adventure ‘2011 Armando Almeida

Sul de África («Africa Twin Adventure»)

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Em viagem João Around the World Segue as aventuras do João na sua página de internet.

360

o

sul de áfrica Numa volta de nove países onde nem tudo corre pelo melhor — como faz parte na aventura — João mantém o sorriso. João Sousa

C PÁG. SEGUINTE Surfando entre os oceanos Índico e Atlântico no cabo Agulhas. (@África do Sul)

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onhecendo as fronteiras de Moçambique com os países vizinhos, evito as filas infindáveis de Ressano Garcia e dirijo-me pelas montanhas de Namahasha para a fronteira de Goba. Saindo de uma trovoada tropical e calor em Maputo, começa o frio de montanha e neblina cerrada até a Suazilândia. A estrada encontra-se muito degradada, mas vale a pena chegar à fronteira e ser o único cliente. Assim, com 50 rands de taxa alfandegária para a entrada da Mbuti Lilhaza, encontro-me no reino da Suazilândia — um país pequeno que se atravessa num único dia, emergindo na outra ponta, na África do Sul. A temperatura e vegetação muda drasticamente, tornando-se mais frio e predomina uma floresta de coníferas. De Ermelo, província de Mpumalanga, dirijo-me para as portas do parque natural de Drakensberg («Montanha do Dragão»), província de KwaZulu-Natal e acampo em Underberg, povoação no sopé da cordilheira de montanhas que divide a África do Sul e Lesoto. À chegada procurei abastecer a moto nas primeiras bombas de gasolina e perguntar quanto tempo levaria a subir o Sani Pass. — Vinte minutos — respondeu. Achei muito estranho e, não satisfeito com a resposta, pergunto a outro senhor que se encontrava nas bombas. — Cerca de uma hora — ao que achei ser mais entendido no assunto. Não convencido ainda, na vila encontrei um jovem com moto de enduro e insisti na questão. — Uma hora e meia para subir, a correr bem — foi-me explicando, pois a partir das nove da manhã o percurso fica cheio de excursões em 4x4, muito difíceis de ultrapassar. Basicamente, entre paragens para apreciar a paisagem de um cenário do «Senhor dos Anéis», uma manhã seria suficiente para subir e descer Sani Pass. Ideal é fazer o percurso sem carga na moto, mas por preguiça de desatar os pneus extra na moto, acabei por os «guardar» no meio de uns arbustos e assim procurar evitar partir os suportes da traseira da Mbuti Lilhaza.


Sul de África («Southern Africa 360º»)

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Em viagem

“on my Mind

Os TREVLers Anabela e Jorge Valente retomam a viagem em direcção ao Extremo Oriente. Adeptos incondicionais do «Viajar Lento», recusando o GPS e confiando nos estranhos, contam-nos por que a Geórgia não deve ser descurada. Anabela Valente («DiariesOf»)

Q

PÁG. ANTERIOR À saída de Mestia a estrada está pavimentada por apenas alguns quilómetros, mas há trabalhos a decorrer — brevemente haverá asfalto até Ushguli. (@Mestia)

uando o transporte não tem transistor, a música que se ouve no capacete é cantada à capela, com a nossa própria voz. Quando a letra não se conhece, inventa-se e, às vezes, adapta-se à situação. «Do Luxemburgo à Geórgia são dez dias de distância. Quem precisa de um avião para lá chegar mais depressa.» — entrávamos na Geórgia a cantarolar Xutos.

Poderosita. Três dias separam duas cidades que, diz quem lá vive, estão a mudar à velocidade da luz — Odessa e Batumi — duas cidades de dois países da antiga União Soviética. Três dias para nos irmos ambientando a uma nova cultura, uma nova maneira de estar e de ser. Três dias para aprender a ler rostos rígidos e sérios que escondem por trás — bem lá atrás — um coração mole, mas que só se revela ao fim de vários dias de convivência.

Dez

Antes de entrarmos no ferry, usado principalmente por grandes camiões de transporte internacional, tivemos de passar por tantos gabinetes, escuros, fechados e sem ar, e passar por infindáveis trâmites que acabámos por levantar âncora com três horas de atraso. A policia de alfândega revistou toda a gente e todos os veículos, incluindo a única moto na travessia, a nossa. Fizeram-nos abrir todas as malas e tirar tudo cá para fora, no cais. Numa das nossas malas encontraram uma caixa preta suspeita que imediatamente nos obrigaram a abrir. Ficámos receosos com o que poderia acontecer assim que descobrissem o seu conteúdo. É a primeira vez que viajamos com um drone e, apesar de parecerem saber do que se trata, estão interessados no preço. Sem sabermos se nos querem fazer pagar algum imposto, atiramos um valor bastante inferior ao real. Resultou — o interesse ficou por ali. De gabinete em gabinete, o ferry vai ficando maior de mais próximo. Instalamo-nos numa cabina com dois beliches de madeira que ainda cheira a cera fresca — iria ranger a noite toda durante a travessia.

Foram dez dias porque íamos com pressa — em descobrir a Geórgia ainda no Verão —, para aproveitar o bom tempo, evitar a chuva na estrada e, acima de tudo, evitar a neve nas montanhas entre os dois Cáucasos — o Maior e o Menor — e, se não pudéssemos ir às montanhas, ficaríamos com a sensação de não ter visitado a essência do país. Corremos pela Alemanha, quase sem tempo para saborear os biergarten alemães, no Verão cheios de tiroleses, jovens e velhos, sem mãos a medir para a cerveja e würsts. Na Áustria e Hungria apenas parámos para rever velhos amigos. Na Roménia fugimos dos ursos nos Cárpatos. Da Moldávia foi um pulo até à Ucrânia, última paragem antes do nosso destino final.

Três

No porto ucraniano de Odessa, apanhámos o ferry que nos levaria pelo mar Negro até Batumi, a pérola do mar Negro, uma travessia de três dias de descanso, para nós e para a

Geórgia («DiariesOf»)

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Em viagem

PÁG. ANTERIOR Pôr-do-Sol com fogos florestais. (@Vinici, Montenegro)

Walkabout Acompanha as viagens do Hugo na sua página de Facebook.

Aripi Haverão poucos sítios do mundo onde em apenas seis dias se percorrem nove países, sem andar a correr — a região dos Balcãs é um desses sítios. Hugo Jorge («Walkabout»)

U

mas folgas inesperadas em pleno Agosto, não me deixaram muitas dúvidas na escolha de um destino para ir conhecer de mota — Balcãs, o recanto da Europa esquecido ou ignorado. Um mosaico de países que espreitaram para o lado de cá da cortina e decidiram que deste lado era melhor. Ainda se nota a influência comunista, mesmo nos recém-formados países à custa de conflitos recentes. Voei para Bucareste, capital da Roménia, fugindo das assistentes de bordo para que o meu equipamento não fosse parar ao porão. À chegada à Rent4Ride, cancelei a dança da vitória, ao aperceber-me que havia trazido duas luvas direitas, enquanto procurava ajustar o corpo à BMW F700 GS.

Bulgária

Na ânsia de partir e fazer-me à estrada, prometi a Bucareste dedicar-lhe o meu último dia, antes do regresso. O caminho para Varna, na Bulgária, convida ao desvio para a «Floresta de Pedras», a formação

rochosa que tem deixado cientistas a coçar cabeça na falta de consenso quanto à sua formação. Próxima do mar Negro, Varna é uma cidade de veraneantes, mas não é só isso que a define. Tem uma atmosfera amigável, genuína na ausência de esforço para se adaptar ao turista, evidente na recusa óbvia de criar ementas compreensíveis em outra língua que não búlgaro. Já os atributos da praia usam um idioma universal, onde no areal imenso se escreve «Magnífica», temperado pelas águas quentes. Uma breve passagem pelo museu da Marinha e pela catedral Ortodoxa, antes de seguir para a capital, Sófia, juntando 500 aos 250 quilómetros até Varna, feitos durante boa parte com um alemão simpático numa Triumph Thunderbird. Acorda-se em Sófia, tomando o pequeno-almoço a ver o Sol nascer, prenúncio de um dia prazeroso. Saí cedo para o centro bastante desenvolvido, de grande contraste com as zonas mais rurais de ontem, há apenas algumas horas. Aí vemos todas as grandes lojas de marca a que estamos habituados na restante Europa. A catedral Alexandre Nevsky, do início do século xx tem

um brilho próprio dos raios de Sol reflectidos no dourado das suas cúpulas, um traço comum nas igrejas ortodoxas russas.

Macedónia

Volto as costas à cidade para seguir por uma Bulgária rural em direcção à Antiga República Jugoslava da Macedónia (ARJM) — não confundir com a região grega homónima. É evidente que os confortos e vantagens da União Europeia demoram a chegar a todos. Na entrada na Macedónia, uma república que caberia 4 vezes dentro de Portugal, a conversa começou bem com o habitual «Cristiano Ronaldo», mas estragou-se quando mostrei o comprovativo de seguro da mota. — Não serve! — dizia o agente. — É uma cópia — reforça. Relembrei o CR7 mais umas quantas vezes e, talvez por cansaço, foi falar com o chefe. Volvida meia hora de espera, reservara-me um minuto de sermão e a permissão para partir com uma condição — prometer que não teria nenhum acidente na Macedónia. De nada me serviria o seguro, por ser inválido, assegurou-me. Prometi e, antecipo, cumpri. Bem hajas, Cristiano — quantas fronteiras já terás ajudado Balcãs («Walkabout»)

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Em viagem PÁG. ANTERIOR Estas placas — existentes em quase todas as praias de Timor Leste onde há crocodilos de água salgada — relembram sobre a prudência e inteligência em manter a distância destes que são os mais perigosos de todos. (@Timor-Leste)

Mil & Uma ilhas

Com as histórias das Mil-e-Uma-Noites na Turquia e Irão, o António deixou-nos pendurados na edição anterior à porta do aeroporto. — «Passageiros para Jacarta, podem embarcar», anunciavam nos altifalantes. Para chegar à Indonésia e atalhar caminho, António opta por embarcar a moto e voar do Dubai até à capital, Jacarta.

Istanbul

TURQUIA Teerão

IRÃO

Dubai

António Rosado

As Bodas de Jacarta Jacarta, Java Central — Indonésia

H

oje decidi mudar para um hotel num bairro muito pobre de Jacarta, capital indonésia, procurando-o de mala na mão, sentindo-me um alienígena nas ruas estreitas e movimentadas com a grande agitação de gente de um lado para o outro. Apesar de ser Sábado, não parece haver diferença para os demais dias da semana, não fosse a pequenada invadir as ruas e ninguém o saberia. Apercebo-me de outra pista, que me parece perseguir, onde quer que vá — os casamentos. Em todos os cruzamentos há um sinal que avisa da cerimónia, algo que nunca havia visto.

Começo a aproximar-me, atraído pela felicidade evidente na cara das pessoas, vestindo as suas melhores roupas — aqui há festa. Desde o lado de fora da porta, permito-me ver que tudo é lindo — as cores, os cheiros, as pessoas, as famílias... sinto ternura e sei que ali mora o Amor. Eu nestes pensamentos, quando reparam em mim e me convidam. Esforçam-se por me explicar o óbvio — que se trata de um casamento —, enquanto me arrastam festa adentro, cumprimentado por todos. São largas dezenas de pessoas lindas, que se esforçam por me fazer sentir acolhido, em casa. Levam-me ao pai do noivo, anfitrião que está com a esposa num palanque. Quer-me conhecer, apertamos as mãos e deixamo-nos ficar... mão na mão, sinto a bondade que me entrega , sinto-me abençoado. A esposa, contida, cumprimenta-me observando Indonésia e Timor-Leste («Out off the Box»)

87


Destinos

África

3 9 15 África do Sul 4 9 Angola 1 Argélia 3 15 Botsuana 9 10 Congo (R. D.) 9 Egipto 9 Etiópia 9 Gâmbia 4 15 Malaui 6 10 14 10 13 Marrocos 1 2 14 9 Mauritânia 4 9 15 Moçambique 3 4 15 Namíbia 4 9 Quénia 9 10 Ruanda 1 14 9 Sahara Ocidental 5 São Tomé e Príncipe 2 9 Senegal (Dakar) 2 9 Sudão 10 Sri Lanka 9 15 Tanzânia 3 4 15 Zâmbia

Ásia

Arménia Azerbeijão Burma (Myanmar) Camboja China Geórgia 3 Índia Indonésia Irão Iraque Japão Laos Malásia Mongólia Nepal Paquistão Quirguistão Tailândia Tajiquistão Timor-Leste Turquemenistão Usbequistão Vietname

7 8 6 7 9 11 9 12 7 8 9 11

5 7 8 4 7 8 9 8 9 14 9 9 9 7

Oceânia Austrália

7

Conheça aqui quais os destinos de viagem de moto sobre os quais já publicámos, tanto na TREVL, como na REV.

Nesta edição

Os destinos incluídos nesta edição estão destacados com um fundo amarelo.

Edições passadas

Cada entrada nas tabelas seguintes tem a indicação de qual o número onde foi publicada (a amarelo na TREVL, a azul na REV).

Interactivo

Para uma experiência mais interactiva com visualização sobre o mapa-mundo, sugerimos visitar o nosso site na secção «TREVL no Mundo».

98

Europa

7 Albânia Alpes Balcãs Bielorússia Bósnia e Herzegovina Bulgária Córsega Croácia Dinamarca 1 Espanha 1 Escócia Eslovénia Gales Grécia Inglaterra Irlanda Islândia Itália Letónia Kosovo Montenegro 1 Noruega Pirenéus Polónia 3 7 Rússia Sérvia Suécia 2 7 8 Turquia

Portugal

América

«Alasca» (EUA) Argentina 4 6 Belize Bolívia Brasil Canadá Chile Colômbia Costa Rica El Salvador Equador EUA Guatemala México Nicarágua Panamá Paraguai 6 Peru Uruguai Venezuela

8 8 9 13 7 15 14 15 14 9 9 13 9 11 11 9 11 9 9 15 11 11 13

13 7 4 11 4 4 4

6 5

5 4 6 4

5 11 10 11 12 5 7 11 12 6 7 8 5 10 11 12 5 7 8 5 8 5 8 4 7 7 12 15 2 5 8 12 5 8 5 8 6 11 7 11 12 7 10 11 4 8

10 11 15 1 2 3 7 15 9 7 15 7 1 7 8 14 4 5 7 5 6 12 7 2 7 11 2 6 2 1 3 5 7 9 2 7 15 7 15 8 13 14 1 5 7 9 14 8 11 14 2 7 15 14 11 12 14

Açores Alto Alentejo Alta Estremadura Alto Douro Beira Baixa Serra Algarvia Serra da Arrábida S. de Aires e Candeeiros Tejo dos Castelinhos

Espanha

Deserto de Bardenas Galiza Picos de Europa Ruta de la Plata Sierra Norte

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