Revista Rpesm 20

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FICHA TÉCNICA

TÍTULO | TITLE

Revista Portuguesa de Enfermagem em Saúde Mental | Portuguese Journal of Mental Health Nursing

PUBLICAÇÃO E PROPRIEDADE | PUBLISHING AND PROPERTY

A Sociedade Portuguesa de Enfermagem em Saúde Mental | The Portuguese Society of Mental Health Nursing

DIRETOR | MANAGING DIRECTOR

Carlos Sequeira, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal

COORDENADOR | COORDINATOR

Luís Sá, PhD - Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Católica Portuguesa, Porto, Portugal

COORDENADOR DA COMISSÃO EDITORIAL | EDITORIAL BOARD COORDINATOR

Francisco Sampaio, MSc – Hospital de Braga, Portugal

COMISSÃO EDITORIAL | EDITORIAL BOARD

Analisa Candeias, MSc - Escola Superior de Enfermagem da Universidade do Minho Bruno Santos, MSc - Irmãs Hospitaleiras, Braga Carlos Vilela, MSc - Escola Superior de Enfermagem do Porto Joana Coelho, MSc - Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia / Espinho Lia Sousa, MSc - Centro Hospital de São João, Porto Lucília Vale de Nogueira, MSc – Centro Hospitalar do Porto Luís Silva, MSc - Hospital de Magalhães Lemos, Porto Regina Pires, MSc – Escola Superior de Enfermagem do Porto Rita Costa, MSc - Unidade Local de Saúde de Matosinhos, Porto Rosa Silva, MSc - Instituto de Ciências da Saúde – Universidade Católica Portuguesa, Porto Sónia Teixeira, MSc - Centro Hospitalar Conde de Ferreira

COMISSÃO CIENTÍFICA | SCIENTIFIC REVIEWERS

Agustín Simónelli Muñoz, PhD - Universidad Católica San Antonio, Múrcia, Espanha Aida Mendes, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Coimbra, Portugal Alexandre Marques Rodrigues, PhD - Escola Superior de Saúde de Aveiro, Aveiro, Portugal Amadeu Gonçalves, PhD - Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Viseu Ana Querido, PhD - Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria Beatriz Araújo, PhD - Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Católica Portuguesa, Porto, Portugal Carlos Sequeira, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Carme Ferré Grau, PhD - Universitat Rovira i Virgili. Tarragona, Espanha Catarina Tomás, PhD - Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria Elaine Antunes Cortez, PhD - Escola de Enfermagem AAC - Universidade Federal Fluminense Elizabete Borges, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Francisca Manso, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Lisboa, Portugal Geilsa Cavalcanti Valente, PhD - Escola de Enfermagem AAC - Universidade Federal Fluminense Guilherme Correa Barbosa, PhD – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Brasil Graça Pimenta, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Isilda Ribeiro, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal José Carlos Carvalho, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal José Carlos Gomes, PhD - Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria, Portugal José Carlos Santos, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal Juan Roldan Merino, PhD - Escuela de Enfermería Sant Joan de Déu (adstrita a la UB), Espanha Júlia Martinho, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Luís Sá, PhD – Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Católica Portuguesa, Porto, Portugal Margarida Sotto Mayor, PhD - Hospital de Magalhães Lemos, Porto, Portugal Maria José Nogueira, PhD - Escola Superior de Saúde Atlântica Mar Lleixà-Fortuno, PhD - Universitat Rovira i Virgili. Tarragona, Espanha Marluce Miguel de Siqueira, PhD - Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil Michell Araújo, PhD - Faculdade Católica Rainha do Sertão - Fortaleza e Hospital de M., Brasil Odete Araújo, PhD - Escola de Enfermagem da Universidade do Minho, Portugal Odete Pereira, PhD - Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Brasil Olga Sousa Valentim, PhD - Escola Superior de Saúde Atlântica Paulo Seabra, PhD - Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Católica Portuguesa, Lisboa Raul Cordeiro, PhD – Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Portalegre, Portugal Teresa Barroso, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal Teresa Lluch-Canut, PhD – Escola Universitària d’Infermeria - Universitat de Barcelona, Espanha Zeyne Scherer, PhD – Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo, Brasil

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 2


Público-alvo:

Enfermeiros, médicos, psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais e outras pessoas com interesse na área da saúde mental.

Objectivo:

Divulgação de evidências científicas sobre a promoção da saúde, prevenção de doenças, tratamento, reabilitação e reintegração das pessoas com doença mental ao longo da vida.

Âmbito:

Políticas e design dos cuidados de saúde; Avaliação, diagnóstico, intervenções e resultados de enfermagem; Sistemas de informação e indicadores em saúde mental; Direitos e deveres dos doentes mentais; Formação e investigação em enfermagem em saúde mental.

SUBSCRIÇÃO | SUBSCRIPTIONS

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ISSN:

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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 3


Índice

EDITORIAL CONVIDADO

1

OS NOVOS DESAFIOS PARA A SAÚDE MENTAL NA EUROPA ................................................ 6

ARTIGOS DE INVESTIGAÇÃO

2

CONFLITOS EM CONTEXTO DE SAÚDE: UM INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO DE ESTILOS

DE GESTÃO DE CONFLITO ...................................................................................................... 9

3

DELIMITANDO LA COERCIÓN Y LOS CUIDADOS ENFERMEROS EN SALUD MENTAL:

UNA APROXIMACIÓN CUALITATIVA ........................................................................................ 19

4

PERCEPÇÃO DE PESSOAS QUE USAM DROGAS ACERCA DO TRATAMENTO EM UM

CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL ................................................................................. 27

5

VIVÊNCIAS DOS ENFERMEIROS SOBRE MORTE E MORRER EM CUIDADOS INTENSIVOS:

UMA REFLEXÃO FENOMENOLÓGICA

6

PREVALÊNCIA DE SINTOMAS DEPRESSIVOS E/OU ANSIOSOS EM PESSOAS COM

HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA E/OU DIABETES MELLITUS

7

RELIGIOSIDADE, ESTRATÉGIAS DE COPING E SATISFAÇÃO COM A VIDA: VERIFICAÇÃO

DE UM MODELO DE INFLUÊNCIA EM ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS

8

QUALIDADE DE VIDA, ENGAGEMENT, ANSIEDADE E DEPRESSÃO ENTRE GESTORES DE

UNIDADES DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE .......................................................................... 58

9

MAPEAMENTO DOS RECURSOS HUMANOS E SERVIÇOS OFERTADOS POR DOIS

CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL INFANTO-JUVENIL ................................................... 65

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................................................................................... 34

.................................. 43

........................... 51


ARTIGOS DE REVISÃO

10

SERVIÇOS DE ATENDIMENTO MÓVEL DE URGÊNCIA FRENTE ÀS EMERGÊNCIAS

PSIQUIÁTRICAS: UMA REVISÃO NARRATIVA

11

PERCEÇÕES, ATITUDES E EMOÇÕES DOS DOENTES SUBMETIDOS A INTERNAMENTO

PSIQUIÁTRICO COMPULSIVO: REVISÃO INTEGRATIVA

...................................................................... 72

..................................................... 81

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 5


Editorial Convidado

1

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0220

OS NOVOS DESAFIOS PARA A SAÚDE MENTAL NA EUROPA | Raul Cordeiro1 |

“Setting the scene: the panorama of mental health in Europe” No dia em que escrevo este Editorial comemoram-se 70 anos desde que a Assembleia Geral da organização das Nações Unidas proclamou a Declaração Universal dos Direitos do Homem, em 1948. Neste documento são enunciados os direitos considerados fundamentais para a vida do ser humano. São referidos os direitos individuais e coletivos, sem discriminação de raça, género, nacionalidade, etnia, idioma, religião ou qualquer outra condição. Sobre a saúde, a Declaração enuncia no seu Artigo 25.º: “toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade”. A luta pelos direitos humanos é, assim, por natureza, uma luta infindável na satisfação dos direitos de todos os homens. Todos os direitos estabelecidos nos tratados internacionais de direitos humanos se aplicam a pessoas com problemas de saúde mental. Os instrumentos internacionais de direitos humanos protegem os direitos das pessoas com transtorno mental e portador de deficiência seja física ou intelectual. Este princípio de universalidade é reforçado pelos princípios de igualdade e não-discriminação, que estão incluídos nos instrumentos de direitos humanos. Num relatório elaborado para a ONU sobre direitos humanos e deficiência, Bruce et al. (2002) observam que o processo de assegurar que as pessoas com deficiência desfrutam dos seus direitos é “lento e desigual” e por isso exige das sociedades um esforço acrescido e uma atenção mais dedicada.

Às pessoas portadoras de doença mental aplica-se um pressuposto de igual complexidade. Se pensarmos na saúde mental, nos vários contextos da vida pessoal e social compreendemos bem o longo caminho a percorrer no sentido da universalidade dos direitos humanos e qual deverá ser o futuro dos cuidados de saúde mental, em especial na Europa. Os transtornos da saúde mental são um dos maiores desafios de saúde pública na Europa. Um problema silencioso com grande carga de incapacidade associada. Problemas como a depressão, a ansiedade e a esquizofrenia reúnem uma parte significativa das causas de reforma antecipada por incapacidade na Europa com elevado peso económico e social. O European Mental Health Action Plan 2013-2020 (2015) sintetiza de forma muito prática os objetivos, os valores e a visão que incorporam os grandes desafios para a saúde mental na Europa. Desde logo manter as expetativas de bem-estar em tempos de novas realidades económicas, manter o comprometimento dos sistemas de saúde garantindo o acesso e a qualidade de cuidados de saúde ao mesmo tempo que se pensam reformas são desafios difíceis. Dois fatores emergem imediatamente desta realidade. o desemprego/estabilidade do emprego e o envelhecimento da população. Ao nível da saúde mental, a Europa tem procurado proteger os seus cidadãos norteando os seus sistemas de saúde por valores fundamentais como a justiça, o empoderamento de doentes e famílias para lidar com a doença em contexto familiar e comunitário. Esse compromisso com a desinstitucionalização e o desenvolvimento de serviços de saúde mental baseados na comunidade mantem-se vivo, embora o progresso seja desigual em toda a Europa, com diferenças entre Norte e Sul e Este e Oeste. O consenso é que cuidados e tratamento devem ser fornecidos em contextos locais, uma vez que grandes unidades hospitalares psiquiátricas conduzem, muitas vezes levam à negligência e à institucionalização sem retorno.

1 Doutor em Ciências e Tecnologias da Saúde; Enfermeiro especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica; Investigador no CINTESIS - Center for Health Technology and Services Research; Investigador no VALORIZA – Research Center for Endogenous Resource Valorization; Professor Adjunto no Polytechnic Institute of Portalegre, Nursing Research Unit for South and Islands, Praça do Município, 11, 7300-110 Portalegre, Portugal, raulcordeiro@ipportalegre.pt Citação: Cordeiro, R. (2018). Os novos desafios para a saúde mental na Europa. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (20), 06-08. doi: 10.19131/rpesm.0220 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 6


A realidade também demonstra que o estigma social associado à doença mental é um monstro de difícil combate e que a descriminação consequente diminui a procura de cuidados de saúde mental. Um sistema de saúde integrando as respostas sem clivagens é essencial para o acesso das pessoas com doença mental. Um sistema mais comprometido com os resultados sociais da integração do que com os custos económicos do cuidado. De uma forma sintética o European Mental Health Action Plan 2013-2020 (2015, p. 3) enumera quatro objetivos fundamentais para um plano de ação: - Todas as pessoas têm iguais oportunidades para concretizar o seu bem-estar mental ao longo de sua vida, particularmente aqueles que estão mais vulneráveis ou em risco; - As pessoas com problemas de saúde mental são cidadãos cujos direitos humanos são plenamente valorizados, protegidos e promovidos; - Os serviços de saúde mental são acessíveis quer física quer financeiramente e estão disponíveis na comunidade de acordo com as necessidades; - As pessoas têm direito a ser tratadas com respeito, segurança e eficácia. No entanto realidade da Europa, nos últimos anos tem despertado desafios novos aos profissionais e à organização dos cuidados de saúde mental. A Europa é hoje uma sociedade multicultural, multissocial, multirreligiosa e até multieconómica. Dela emergem novas realidades, novas interpretações e novos desafios para a intervenção em saúde mental. Ao invés de uma população normatizada, existe hoje na Europa uma sociedade de modelos multiétnicos (Rosas, 2007) que exigem dos serviços de saúde abordagens diferenciadas. Vejamos alguns ambientes com particular especificidade. Desde logo o local de trabalho. Estão bem descritos no estudo de revisão conduzido por Lindberg et al. (2017) a lista de indicadores que caraterizam locais de trabalho saudáveis, promotores de saúde mental. Outro local específico é a escola. A infância e adolescência são etapas importantes para o desenvolvimento social e emocional.

Ao mesmo tempo, ter boa saúde mental e física apoia os jovens na gestão dos desafios que enfrentam durante o seu desenvolvimento. A saúde mental deve ser uma característica de todas as iniciativas de promoção da saúde na escola. Não só a fundação da saúde mental ao longo da vida é estabelecida nos primeiros anos, mas uma abordagem escolar completa também levará a uma maior ligação ao ambiente escolar como ambiente terapêutico. As escolas podem desempenhar um papel importante na saúde mental e no bem-estar de seus estudantes e funcionários. Outro desafio de âmbito cultural são as migrações. Estudos já demonstram que as migrações estão muitas vezes associadas à falta de preparação social e cultural e consequente inadaptação ambiental causadores de sofrimento (Virupaksha, Kumar & Nirmala, 2014). Deixo-vos com alguns dos desafios que recentemente apresentei em Bruxelas na AIM Conference – The future of mental health (Cordeiro, 2018): - Mental health at school; - Mental health at workplace; - Mental health and transculturality / cultural competencies; - Mental health and migrations and minorities; - Mental health on continuity care; - Mental health and new medications; - Stigma and discrimination; - “The black dog – Depression and suicide”. Daqui irão certamente novas reflexões e novos estudos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Bruce, A., Quinn, G., Degener, T., Burke, C., Quinlivan, S., Castellino, J., ... & Quinlivan S. (2002). Human rights and disability: The current use and future potential of United Nations human rights instruments in the context of disability. Geneva: United Nations Press. Cordeiro, R. (2018). Setting the scene: The panorama of mental health in Europe. Conference presented at AIM Conference – The future of mental health in Europe, 16 nov 2018, Brussels, Belgium.

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 7


Lindberg, P., Karlsson, T., & Vingård, E. (2016). Determinants for positive mental health and wellbeing at work – a literature review. Presented at the 4th Wellbeing at Work 2016, May 29th to June 1st, 2016, Amsterdam, Netherlands. Disponível em: http://urn. kb.se/resolve?urn=urn:nbn:se:hig:diva-23052 Rosas, J. (2007). Sociedade multicultural conceitos e modelos. Relações Internacionais, 14, 47-56. UN General Assembly, Universal Declaration of Human Rights, 10 December 1948, 217 A (III), Disponível em: https://www.refworld.org/docid/3ae6b3712c. html

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 8

Virupaksha, H. G., Kumar, A., & Nirmala, B. P. (2014). Migration and mental health: An interface. Journal of Natural Science, Biology, and Medicine, 5(2), 233-239. World Health Organization – Europe. (2015). The European Mental Health Action Plan 2013–2020. WHO Regional Office for Europe. Disponível em http:// www.who.int/iris/handle/10665/175672


Artigo de Investigação

2

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0221

CONFLITOS EM CONTEXTO DE SAÚDE: UM INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO DE ESTILOS DE GESTÃO DE CONFLITO | Pedro Cunha1; Ana Paula Monteiro2; Abílio Afonso Lourenço3; Ricardo Bessa Moreira4 |

RESUMO INTRODUÇÃO: O conflito encontra-se subjacente a qualquer organização humana, não sendo as instituições de saúde exceção. OBJETIVO: Adaptar e validar um instrumento de avaliação de estilos de gestão do conflito, o Dutch Test for Conflict Handling (DUTCH; De Dreu et al., 2001), para o contexto da saúde. MÉTODOS: Depois da tradução para português, a escala foi aplicada a 364 sujeitos de ambos os sexos, estudantes e profissionais da saúde. Recolheu-se informação sobre dados sociodemográficos. Na administração dos questionários explicou-se aos participantes o objetivo do estudo e foi dada a garantia de anonimato. RESULTADOS: A analise fatorial exploratória indicou, como na estrutura original, a existência de 5 fatores que apresentaram boa consistência interna (0,74 < α < 0,85). O DUTCH apresenta uma consistência interna robusta para a escala total (α = 0,82). Recorrendo a modelos de equações estruturais, o modelo apresentou coeficientes de ajustamento adequados [χ(160) = 298,9; p < 0,001; χ/gl = 1,87; GFI = 0,927; AGFI = 0,904; CFI = 0,942; TLI = 0,931; RMSEA = 0,049) e vai ao encontro dos pressupostos de base do inventario. CONCLUSÕES: A versão portuguesa de DUTCH revela características psicométricas que o caracterizam como fiável para avaliar estilos de gestão de conflito. Pode ser um bom apoio à investigação, relacionando os resultados nele obtidos com outras variáveis da gestão de conflitos. O instrumento é composto por um pequeno número de itens e é de fácil aplicação na área da saúde. PALAVRAS-CHAVE: Conflito; Estilos de gestão de conflito; Saúde

RESUMEN

ABSTRACT

“Conflictos en contexto de salud: Un instrumento de evaluación de estilos de gestión de conflicto”

“Conflicts in health context: An instrument to evaluate conflict management styles”

INTRODUCCIÓN: El conflicto se encuentra subyacente a cualquier organización humana, no siendo las instituciones de salud excepción. OBJETIVO: La presente investigación tuve como objetivo adaptar y validar un instrumento de evaluación de estilos de gestión de conflicto, el Dutch Test for Conflict Handling (DUTCH; De Dreu et al., 2001), para lo contexto de la salud. METODOLOGÍA: Después de la traducción para portugués, la escala ha sido aplicada a 364 sujetos de ambos sexos, estudiantes y profesionales de la salud. Se ha también recogido información sobre datos sociodemográficos. En la administración de los cuestionarios se ha explicado a los participantes el objetivo de lo estudio y les fue dada garantiera de anonimato. RESULTADOS: La análisis factorial exploratoria ha indicado, cómo en la estructura original, la existencia de 5 factores que presentaran buena consistencia interna (0,74 < α < 0,85). El DUTCH presenta una consistencia interna robusta para la escala total (α = 0,82). Recurriendo a modelos de ecuaciones estructurales, el modelo ha presentado coeficientes de ajuste adecuados [χ(160) = 298,9; p < 0,001; χ/gl = 1,87; GFI = 0,927; AGFI = 0,904; CFI = 0,942; TLI = 0,931; RMSEA = 0,049) e va al encuentro de los presupuestos de bases del inventario. CONCLUSIONES: La versión portuguesa del DUTCH revela características psicométricas que lo caracterizan como fiable para evaluar estilos de gestión de conflicto. Puede ser un buen apoyo a la investigación, relacionando los resultados obtenidos en él con otras variables de la gestión de conflictos. El instrumento es compuesto por un pequeño número de ítems y es de fácil aplicación en el área de la salud.

INTRODUCTION: The conflict is underlain by any human organization, and health institutions are not an exception. AIM: Adapt and validate an instrument of evaluation of conflict management styles, the Dutch Test for Conflict Handling (DUTCH; De Dreu et al., 2001), for the health context. METHODS: After the translation to Portuguese, the scale was applied to 364 male and female individuals, students and health professionals. It was collected information about socio demographical data. In the administration of the questionnaires it was explained to the participants the objective of the study and it was given guarantee of anonymity. RESULTS: The exploratory factor analysis has indicated, such as in the original structure, the existence of 5 factors that presented a good internal consistency (0,74 < α < 0,85). DUTCH presents a robust internal consistency to the total scale (α = 0,82). Using structural equation models, the model presented adequate adjustment coefficients [χ(160) = 298,9; p < 0,001; χ/gl = 1,87; GFI = 0,927; AGFI = 0,904; CFI = 0,942; TLI = 0,931; RMSEA = 0,049) and meets the basic assumptions of the inventory. CONCLUSIONS: The Portuguese version of DUTCH reveals psychometric characteristics that characterize it as reliable to evaluate conflict management styles. It can be a good support to investigation, relating the results obtained in it with other variables of conflict management. The instrument is composed by a small number of items and is of easy application in health area.

DESCRIPTORES: Conflicto; Estilos de gestión de conflicto; Salud

KEYWORDS: Conflict; Conflict management styles; Health Submetido em 31-03-2018 Aceite em 25-07-2018

1 Doutor; Professor Associado com Agregação na Universidade Fernando Pessoa, Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, 4249-004 Porto, Portugal, pcunha@ufp.edu.pt 2 Doutora; Professora Auxiliar na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Escola de Ciências Sociais e Humanas, 5001-801 Vila Real, Portugal, apmonteiro@utad.pt 3 Doutor em Psicologia da Educação; Professor do quadro do Agrupamento de Escolas Alexandre Herculano, 4300-096 Porto, Portugal, privadoxy@gmail.com 4 Doutor em Ciências Sociais; Professor Convidado Equiparado a Auxiliar na Universidade do Minho, Escola de Economia e Gestão; Professor Auxiliar na Universidade Lusófona do Porto, 4000-098 Porto, Portugal, ricardo.m.b.moreira@gmail.com Citação: Cunha, P., Monteiro, A. P., Lourenço, A. A., & Moreira, R. B. (2018). Conflitos em contexto de saúde: Um instrumento de avaliação de estilos de gestão de conflito. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (20), 09-18. doi: 10.19131/rpesm.0221 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 9


INTRODUÇÃO O conflito encontra-se subjacente a qualquer organização humana. As organizações de saúde são sistemas complexos, nos quais a existência de diferentes interações entre profissionais de saúde, pacientes e familiares vai originar um elevado potencial para a ocorrência do conflito (Nayeri & Negarandeh, 2009; Scott & Gerardi, 2011). A não existência de conflito no âmbito da saúde é uma ilusão (McKibben, 2017) e a sua existência num certo nível pode ser até benéfica, constituindo momentos de melhoria e evolução das organizações e dos indivíduos. Os cuidados de saúde requerem trabalho em equipa e uma elevada interdependência entre os diversos profissionais, o que poderá ocasionar conflitos, mas essa atuação interdependente permite assegurar a qualidade dos serviços e a satisfação dos pacientes (Cunha & Miguelote, 2015; Nierkens, Krumeich, De Ridder & Van Dongen, 2002). Assim, a área da saúde traduz-se num campo em que são executados julgamentos éticos e morais, como esclarecimento, avaliação e tomada de decisões que envolvem situações onde as normas de conduta, valores e crenças podem entrar em conflito. Os profissionais de saúde procuram encontrar o equilíbrio entre os interesses do paciente e os interesses do hospital onde exercem, tendo sempre como base uma eficiência ética e prática (Claro & Cunha, 2017). Ao refletir sobre qualidade na saúde é, portanto, fundamental considerar a gestão construtiva de conflitos numa área que, pela sua intrínseca natureza, é portadora de grandes tensões e ansiedades entre os diferentes atores que nela desenvolvem a sua atividade profissional (Nierkens et al., 2002). Se o conflito não for gerido eficazmente terá implicações na qualidade do atendimento e na prestação de cuidados aos pacientes (Scott & Gerardi, 2011), tal desmotivará os profissionais e prejudicará o serviço de saúde como um todo (McKibben, 2017). A gestão de conflitos é um elemento fundamental para oferecer cuidados de saúde seguros e de elevada qualidade (Scott & Gerardi, 2011) Uma gestão construtiva do conflito pressupõe estimar os riscos e potencialidades que a mesma comporta. A gestão de conflitos foi definida como “o comportamento orientado para a intensificação, redução, e a resolução da tensão “(De Dreu, Harinck & Van Vianen, 1999, p. 371). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 10

Os estilos de gestão de conflitos podem ser compreendidos como as intenções mais genéricas e habituais adotadas pelas partes no conflito. Os estilos de gestão de conflito são ainda relacionados com a qualidade do acordo alcançado durante a negociação (Pruitt & Carnevale, 1993) e são considerados uma das variáveis fundamentais a analisar na gestão construtiva e eficaz do conflito. Entre as diversas tipologias de estilos de gestão de conflito presentes na literatura, ao longo deste trabalho destacaremos o modelo bidimensional de cinco estilos proposto por Rahim e Bonoma (1979), dado este constituir o modelo teórico de base para o instrumento de medida que utilizámos na presente investigação. Este modelo descreve cinco estilos de gestão de conflitos que resultam da combinação de duas preocupações: a preocupação em atingir os interesses/objetivos próprios e a preocupação em satisfazer os interesses/objetivos da outra parte (Figura 1). Figura 1 - Estilos de gestão do conflito (adaptado de Rahim, 2002)

O estilo de gestão do conflito evitação caracteriza-se por um baixo interesse próprio e baixo interesse pelos outros. Igualmente designado de evasão estabelece-se na negação da situação. Apesar de não existir resolução do conflito, esta pode ser a estratégia mais adequada quando é necessária uma análise mais aprofundada da situação ou quando os indivíduos não são ainda detentores de toda a informação. Quanto ao estilo anuência, centra-se na tentativa de satisfazer o interesse do outro em detrimento do interesse próprio. No emprego deste estilo são privilegiadas as relações sobre as pessoas e por isso existe cedência, mesmo que o resultado seja desfavorável para a parte que o utiliza. Este estilo é útil nas situações em que se acredita que o objetivo da outra parte é mais importante, mas por vezes é utilizado para se obter algo em troca.


O estilo dominação é descrito por um elevado interesse por si mesmo e um baixo interesse pelo outro, procurando-se alcançar os objetivos próprios sem ponderar os interesses da outra parte. Este estilo representa uma estratégia “ganhar-perder” (win-lose) em que a consecução dos objetivos de uma das partes é concebida com prioridade face aos interesses da outra parte. Este estilo pode ser eficaz quando são necessárias decisões rápidas, mas também quando ações impopulares precisam de ser efetuadas (Rahim, Garret & Buntzman, 1992). O estilo solução de problemas corresponde a uma grande preocupação com interesses próprios e dos outros (Rahim, 2001), implica abertura, troca de informação e exame das diferenças, a fim de alcançar uma solução efetiva e aceite por ambos os lados. Este estilo é adequado quando os temas em discussão são complexos e importantes para ambas as partes, pressupondo na sua aplicação disponibilidade temporal e a implicação das partes no acordo final (Rahim, 2001; 2002). O estilo compromisso posiciona-se no meio dos quatro mencionados, caracteriza-se por um interesse intermédio por si mesmo e pela outra parte, implicando um intercâmbio de concessões, na medida em que cada parte cede algo na sua posição, de forma a tomarem uma decisão intermédia e aceitável para ambos (Rahim, 2002). Este estilo é útil quando ambas as partes têm igual poder e pretendem minimizar as diferenças ou quando não é possível chegar a um consenso e é necessário encontrar uma solução temporária sem pressão de tempo (Rahim, 2002). É de ressaltar que não existe um estilo considerado melhor ou pior, cada um tem as suas vantagens e desvantagens e está sujeito às características próprias de cada contexto. No caso da saúde, a conflitualidade está sempre presente devido também a fatores como, entre outros, elevada tensão intra e interpessoal, excessiva competitividade profissional, horários de trabalho por turnos, natureza intrínseca do trabalho, complexidade das personalidades envolvidas nas tarefas e vulnerabilidade constante entre paciente e profissional de saúde (Cunha & Miguelote, 2015). A este propósito, De Dreu e Beersma (2005) mencionam que a preocupação em atingir os interesses próprios e em satisfazer os interesses da outra parte é importante e dependem tanto da pessoa como da situação, e, por conseguinte, a utilização dos estilos provêm, também, destes dois fatores.

Devemos ainda atender que para se gerir positivamente uma situação de conflito é necessário compreender a sua natureza, a sua dinâmica e as suas variáveis, bem como conseguir que as partes envolvidas tenham consciência dos objetivos e motivações de todos (Rahim et al.,1992). Para além disto, é fundamental que a comunicação seja precisa e adequada para que ocorra um entendimento, que se transmita uma atitude de confiança e que as partes partilhem a ideia de que o conflito é um problema recíproco (Rahim et al., 1992). Os modelos bidimensionais têm recebido forte apoio empírico na investigação, em contexto das organizações, e a abordagem de cinco estilos proporciona uma consistente fundamentação teórica para o desenvolvimento de instrumentos de avaliação do grau de utilização dos estilos de gestão de conflito na realidade organizacional (De Dreu, Evers, Beersma, Kluwer, & Nauta, 2001). Entre os instrumentos mais utilizados encontramos o Management Of Differences (MODE) de Thomas e Kilmann (1974) e o Rahim Organizational Conflict Inventory – II (ROCI-II) de Rahim (1983). O Dutch Test for Conflict Handling – DUTCH (De Dreu et al., 2001) foi desenhado segundo os autores para minimizar a escassa descriminação de outros questionários, por um lado, entre a evitação e a anuência e, por outro, entre a integração e o compromisso. Foi também construído com o propósito de ser utilizado quer por investigadores interessados pelos estilos de gestão do conflito e variáveis a estes associados, quer por gestores preocupados em conhecer quais os estilos mais utilizados na sua organização (De Dreu et al., 2001). Da revisão da literatura relativa a esta problemática, coloca-se, cada vez mais, a premência e a necessidade dos seus profissionais possuírem instrumentos eficazes para lidar com contendas, de forma a responderem à cada vez maior pluralidade de personalidades e de situações de divergência interpessoal e à necessidade imperiosa de construção da paz nos diferentes contextos que constituem a saúde. MÉTODOS O objetivo principal do presente trabalho consistiu em adaptar um instrumento de avaliação de estilos de gestão de conflito e validar as qualidades psicométricas do mesmo, de forma a fundamentar empiricamente a sua utilização a nível prático e teórico na realidade nacional, assim como da sua aplicação no contexto da saúde. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 11


Amostra A amostra foi constituída por 364 sujeitos (28.6% do sexo masculino e 71.4% do sexo feminino), com média de idades de 26.4 anos e o intervalo das mesmas variou entre os 17 a 62 anos. Relativamente ao estado civil, 81.3% dos sujeitos são solteiros, 13.5% casados e 5.2% divorciados. As habilitações literárias dos participantes são: 45.6% possuem o Ensino Secundário; 2.2% têm um Bacharelato; 43.4% são detentores de uma Licenciatura; 6.9% possuem Pós-graduação e 1.9% têm um Mestrado. Quanto à profissão 57.7% dos sujeitos são estudantes, 9.6% são profissionais de saúde e 32.7% dos sujeitos ocupam diversas profissões. Dos inquiridos, 27.2% dos indivíduos referem possuir experiência negocial e 72.8% mencionam não a possuir. Relativamente à importância do cálculo do tamanho da amostra, que permita conferir validade interna aos estudos, os cânones das ciências da saúde destacam-se por se nortearem por teorias, métodos e técnicas de investigação, onde as ciências exatas ocupam posição de destaque, com particular ênfase na estatística aplicada. Desta forma, existe a preocupação de se utilizar um tamanho de amostra adequado que, por um lado, evite obter resultados a partir de amostras subdimensionadas, que confluam para conclusões equivocadas a erros de medida. Por outro lado, impeça uma seleção de respondentes que exceda o quantitativo lógico, evitando desperdício desnecessário de recursos e conduta ética inadequada (Nayak, 2010). Nesta investigação foi utilizado o Critical N (CN) (Hoelter, 1983), também chamado índice de Hoelter .05 e .01 (níveis de significância), que refere a adequação do tamanho da amostra ao modelo postulado com 95% de confiança e 99%, respetivamente. Este critério verifica a adequação do tamanho da amostra, e não o ajustamento do modelo. A proposta deste índice é uma estimativa do tamanho da amostra que seja suficientemente adequado ao ajuste o modelo para o teste χ2. Um valor que exceda 200 é indicativo que o modelo representa adequadamente os dados amostrais. No presente estudo, os dados de significância são respetivamente 221 (.05) e 237 (.01), confirmando, assim, o adequado tamanho da amostra. Instrumento e Procedimentos O DUTCH (De Dreu et al., 2001) constitui um instrumento de medida dos estilos de gestão de conflito acima apresentados e é formado por 20 itens, distribuídos por cinco dimensões, nomeadamente: anuência (e.g., “Adapto-me aos objetivos e interesses das outras partes“); Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 12

compromisso (e.g., “Enfatizo que temos de encontrar uma solução de compromisso“); dominação (e.g., “Forço o meu ponto de vista “); solução de problemas (e.g., “Examino os assuntos até encontrar uma solução que realmente me satisfaça e também à outra parte“); e evitação (e.g., “Evito um confronto sobre as nossas diferenças “). Utiliza uma escala do tipo Likert com alternativas de resposta que variam de 1 (Nunca) a 5 (Habitualmente). Cada estilo de gestão é mensurado através de 4 itens. Para a adaptação do DUTCH, o mesmo foi traduzido e submetido a uma retroversão por um especialista da língua inglesa e, posteriormente sujeito a uma triagem por um psicólogo. Neste seguimento, foram realizados pré-testes em amostras mais reduzidas equivalentes à atual, cujos resultados serviram para aprimorar os inventários, tendo por base a compreensão semântica dos itens. Após a autorização prévia das respetivas instituições, os instrumentos foram aplicados em pequenos grupos, entre seis e dez indivíduos, de acordo com uma programação com os respondentes. Participaram apenas as pessoas que anteriormente assinaram o consentimento informado, descrito na declaração de Helsínquia para estudos com humanos. Com o propósito de recolher informação que possibilitasse a caracterização da amostra, foram apresentadas algumas questões sobre dados individuais, designadamente sexo, idade, estado civil, habilitações literárias, profissão e experiência negocial. Na administração dos questionários explicou-se aos participantes o objetivo do estudo no sentido de os motivar para o seu preenchimento. Para tal, as instruções proporcionadas aos inquiridos foram as descritas no cabeçalho de cada questionário. Durante este processo foram garantidos, ainda os procedimentos éticos e deontológicos convencionais, designadamente a confidencialidade das respostas e a voluntariedade na participação, assim como referida a importância da sinceridade das respostas. A recolha de dados foi individual e os questionários foram preenchidos na presença de um dos investigadores para esclarecimento de eventuais dúvidas. A amostra foi obtida de uma forma aleatória no decurso de 2017. A opção por este tipo de amostra prende-se, por um lado, com o facto de um subconjunto de inquiridos, a amostra, ao ser selecionado totalmente ao acaso a partir de um conjunto maior, a população, possa garantir que todos os indivíduos da população têm a mesma probabilidade de serem escolhidos para constituir a amostra. Por outro lado, garantir que cada subconjunto possível de indivíduos (amostra) tem a mesma probabilidade de ser selecionado que qualquer outro subconjunto de indivíduos.


RESULTADOS Para a validação da análise preditiva da relação das variáveis em estudo, foi utilizada a técnica de modelação equações estruturais (MEE), tendo como suporte o programa informático SPSS/AMOS24. Se o ajustamento global do modelo testado for apropriado, aprovamse as relações ou efeitos apresentados pelas variáveis latentes (fatores) sobre as observadas (itens). Foi verificado, ainda, se havia valores em falta e a presença de outliers, de linearidades e de normalidade, pois esta metodologia requer que as variáveis em estudo devem seguir uma distribuição normal. Devido à máxima verossimilhança (ML) poder produzir uma distorção quando a suposição de normalidade é violada, de forma preliminar foi examinada a distribuição das variáveis (assimetrias e curtoses). Os coeficientes de assimetria e curtose são utilizados para verificar se um conjunto de dados pode ter sido gerado a partir de uma distribuição normal. Considerando o critério de Finney e DiStefano (2013), em que 2 e 7 são identificados como valores máximos admissíveis para assimetria e curtose, respetivamente. Uma vez delineado o modelo, é testada a veracidade de todas as relações definidas entre as variáveis, de forma total, naquilo que se denomina “ajustamento global do modelo”, ou seja, é verificada a adequação do modelo à matriz dos dados. Este ajustamento global é inferido com base num conjunto de índices, designados de índices de ajustamento global do modelo, nomeadamente: O ajuste do modelo foi estimado tendo como suporte os índices estatísticos mais frequentemente utilizados: Qui-quadrado (χ2); χ2/graus de liberdade; goodnessof-fit index (GFI), adjusted goodness-of-fit index (AGFI), comparative fit index (CFI), Tucker-Lewis index (TLI) e root mean square error of aproximation (RMSEA). Num sentido mais restrito, o modelo hipotetizado não é significativamente diferente no contido na matriz dos dados empíricos quando o valor do χ2 tem uma probabilidade associada menor que .05. Assim, os investigadores desta área desenvolveram índices de ajuste complementares com os quais avaliam a verosimilhança de um dado modelo, entre os quais o GFI, AGFI, CFI, TLI e RMSEA. Os dois primeiros indicam a quantidade de variância/covariância explicada no modelo, estimando-se que valores iguais ou superiores a .90 são usualmente avaliados como indicadores de ajustamento do modelo e anunciam um ajuste aceitável, enquanto que os superiores a .95 referem um bom ajuste.

O CFI é um índice que nos informa do ajuste do nosso modelo comparando-o com um modelo independente, considerando-se que valores iguais ou superiores a .95 indiciam um bom ajuste do modelo hipotetizado (Byrne (2001)). O TLI permite comparar o modelo estimado com um modelo teórico nulo, ou seja, tem como objectivo determinar se todos os indicadores são associados a um único factor latente. Valores iguais ou superiores a .95 revelam um ajuste robusto. Por sua vez, o índice RMSEA é um valor indicativo que aponta o erro de aproximação à população. Esta diferença é indicada em graus de liberdade, o que torna este índice sensível ao número de parâmetros estimados, dando, desta forma, complexidade ao modelo. Segundo Byrne (2001) os valores que variam entre .08 e .05 denunciam um ajuste razoável e quando se apresentam inferiores a .05 indicam um bom ajuste. DISCUSSÃO Análise Exploratória Após a necessária tradução do DUTCH original e cumpridos todos os procedimentos relativos a este processo, foi realizada a análise estatística ao agora denominado DUTCH-PV (Dutch Test for Conflict Handling - Portuguese Version). Foi utilizada uma amostra de 364 respondentes, a qual revelou valores de adequação para o índice de KMO de .82, apresentando o teste de esfericidade de Bartlett valores muito adequados (χ2(190)=2533.330; p=.000), o que indica que a análise de componentes principais pode ser feita e que as variáveis são correlacionáveis. Os scores obtidos em cada uma das dimensões que constituem a escala estão todos acima da média, mais especificamente: na dimensão anuência variam entre 3,19 e 3,58; no compromisso entre 3,98 e 4,21; na dominação entre 3,60 e 3,81; na solução de problemas entre 4,21 e 4,30; e na dimensão evitação os valores variam entre 3,41 e 3,90. Assim, para testar a validade interna do DUTCH-PV, procedemos à análise fatorial das subescalas e ao estudo da consistência interna. A análise fatorial possibilita fazer a avaliação da validade das variáveis que constituem os fatores, revelando de que forma dizem respeito aos mesmos conceitos a partir da correlação que existe entre elas. Na análise da estrutura fatorial dos resultados, optou-se pela análise do DUTCH-PV em componentes principais com rotação varimax. Foram considerados todos os fatores isolados que apresentassem um valor-próprio (eigen-value) igual ou superior à unidade. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 13


Os resultados apontam para a existência de cinco fatores, referentes à Anuência, Compromisso, Dominação, Solução de Problemas e Evitação, conforme os valores indicados na Tabela 1. Tabela 1 - Estrutura Fatorial do DUTCH-PV Itens

Anuência

Compromisso

Dominação

Solução de Problemas

Evitação

Fatores da amostra 1

1

.79

6

.71

11

.65

16

.78

2

2

.74

7

.73

12

.77

17

.57

3

3

.75

8

.80

13

.86

18

.85

4

4

.80

9

.79

14

.67

19

.67

5

5

.82

10

.68

15

.75

20

.82

% valor-próprio

2.4

2.3

2.8

2.5

2.5

% de variância

11.7

11.3

14.2 12.6 12.4

Pela leitura da Tabela 1, podemos verificar que os 20 itens da escala são explicados em 62.2% pelos cinco fatores do DUTCH-PV. O primeiro fator que explica 11.7% da variância é saturado pelos itens 1, 6, 11 e 16 referente à Anuência (anu), o segundo fator que explica 11.3% da variância é saturado pelos itens 2, 7, 12 e 17, relativo ao Compromisso (comp), o terceiro fator que explica 14.2% da variância é definido pelos itens 3, 8, 13 e 18 alusivos à Dominação (dom), o quarto fator, que explica 12.6% da variância, é saturado pelos itens 4, 9, 14 e 19 relativos à Solução de Problemas (sp) e o quinto fator, saturado pelos itens 5, 10, 15 e 20, refere-se à Evitação (evit) sendo explicado em 12.4%. Na Anuência, Compromisso, Dominação, Solução de Problemas e Evitação os itens referentes saturam com pesos fatoriais entre: .65 e .79; .57 e .77; .75 e .86; .67 e .80; e .68 e .82, respetivamente.

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 14

Para o cálculo da consistência interna que procura analisar em que medida os itens que compõem o teste se apresentam como um todo homogéneo, devido ao formato Likert dos itens, foi realizado a partir da determinação do índice Alpha de Cronbach, cujos valores podem ser observados na Tabela 2. Tabela 2 - Consistência Interna do DUTCH-PV Fator/itens

DUTCH – PV

Anuência

α=.74

1

.65

6

.71

11

.71

16

.64

Compromisso

α=.76

2

.74

7

.66

12

.66

17

.72

Dominação

α=.85

3

.84

8

.84

13

.80

18

.79

Solução de Problemas

α=.78

4

.70

9

.70

14

.75

19

.74

Evitação

α=.78

5

.70

10

.77

15

.74

20

.70

Da análise da tabela 2, podemos verificar que aos fatores Anuência, Compromisso, Dominação, Solução de Problemas e Evitação correspondem os Alphas de .74, .76, 85, .78, e .78, respetivamente, o que indica que têm uma boa consistência interna. Em suma, considerando a totalidade dos itens da escala, o DUTCH-PV apresenta um coeficiente de Alpha robusto (α=.82). Análise Confirmatória Para dar consecução aos objetivos delineados, foi realizada uma análise recorrendo modelos de equações estruturais (MEE).


Esta técnica pode ser entendida como uma extensão da regressão múltipla, se for considerado que na aplicação da regressão o investigador está interessado em prever uma única variável dependente, enquanto nos MEE há mais do que uma variável dependente, assim como permite testar uma teoria de ordem causal entre um conjunto de variáveis. A partir da base de dados debruçamo-nos novamente sobre a questão da dimensionalidade e estrutura do DUTCH-PV testando um modelo que será apresentado de seguida. Assim, analisaremos as características metrológicas dos itens em função das médias (M), desvio-padrão (DP), distribuição dos resultados (valores mínimos e máximos), indicadores de assimetria e curtose, conforme se pode observar na Tabela 3.

Este modelo multifatorial descreve adequadamente a matriz de covariância dos dados, apresentando os seguintes índices de ajustamento: χ2(160)=298,901; p=.000; χ2/gl=1,868; GFI=.927; AGFI=.904; CFI=.942; TLI=.931; RMSEA=.049 (.040-.057). Estes valores estão em conformidade com os índices indicados por Byrne (2001). Na Tabela 4 são apresentados os valores não estandardizados e estandardizados, erros de estimativa e significância para o modelo multifatorial. Figura 2 - Especificação pictórica do modelo multifactorial DUTCH-PV

Tabela 3 - Estatística Descritiva (Mínimo, Máximo, Média, Desvio-Padrão, Assimetria e Curtose) do DUTCH-PV para a Amostra em Estudo Itens

Min.

Máx.

Média

DP

Assimetria Curtose

1

1

5

3.19

.898

-.135

.562

6

1

5

3.34

.850

-.261

.918

11

1

5

3.58

.898

-.654

.594

16

1

5

3.50

.934

-.499

.279

2

1

5

4.10

.779

-1.439

4,055

7

1

5

4.05

.775

-.233

-.730

12

1

5

3.98

.928

-.855

.841

17

1

5

4.21

.719

.-508

-.059

3

1

5

3.72

.906

-.417

-.151

8

1

5

3.60

1.057

-.290

-.758

13

1

5

3.81

.999

-.614

-.362

18

1

5

3.67

1040

-.327

-.646

4

2

5

4.21

.755

-.526

-.573

9

2

5

4.29

.694

-.555

-.408

14

1

5

4.26

.773

-1.070

1,705

19

1

5

4.30

.725

-.792

.466

5

1

5

3.60

1.072

-.650

-.016

10

1

5

3.41

1.031

-.505

-.161

15

1

5

3.90

1.033

-1.002

.669

20

1

5

3.76

1.145

-.635

-.424

Podemos constatar, da leitura conjugada das Tabelas 3 e 4, que os parâmetros estimados para o modelo multifatorial (Fig. 2) apresentam valores adequados e estatisticamente significativos, conforme já referido anteriormente, assim como podemos também verificar a ausência de desvios-padrão demasiado elevados ou pequenos, indicadores de que os parâmetros respetivos não podem ser estimados com precisão.

Da observação da especificação pictórica da Figura 2, hipotetizamos que: (i) As respostas dadas pelos inquiridos da amostra podem ser explicadas por cinco fatores de primeira ordem (Anuência, Compromisso, Dominação, Solução de Problemas e Evitação); (ii) A carga fatorial mostrada por cada um dos itens está relacionada, somente, com o respetivo fator que é suposto medir; (iii) Não existe correlação entre os erros de estimativa relacionados com cada um dos itens. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 15


Tabela 4 - Resumo dos Valores Não Estandardizados e Estandardizados, Erros de Estimativa e Significância para o Modelo Multifatorial Itens

Valores Valores Erro de não estan- estandardestimativa dardizados izados

p

Tabela 5 - Correlações de Pearson entre as Dimensões do DUTCH- PV 1

2

3

4

1. Anuência

-

2. Compromisso

.310**

-

3. Dominação

.199**

.317**

-

4. Solução de Problemas

.202**

.526**

.303**

-

5. Evitação

.072

.160*

.071

.128*

5

1_anu Anuência

→ → → → →

1.000

---

---

---

6_anu Anuência

.765

.560

.089

***

11_anu Anuência

.834

.578

.094

***

16_anu Anuência

1.123

.748

.111

***

Compro- 1.000

---

---

---

(**) p<0.01; (*) p<0.05

Compro- 1.382

.758

.149

***

CONCLUSÕES O objetivo deste estudo foi a adaptação portuguesa de um instrumento de avaliação de estilos de gestão de conflito. As análises fatoriais exploratórias e confirmatórias permitiram confirmar a presença de cinco fatores: Anuência, Compromisso, Dominação, Solução de Problemas e Evitação. Os coeficientes estatísticos ao nível das análises exploratórias, confirmatórias e consistência interna obtidos validam a utilização da escala servindo um primeiro nível de avaliação dos estilos de gestão de conflito. O presente estudo apresenta algumas limitações. A primeira é que os estilos de gestão foram mensurados através de medidas de autoavaliação, podendo não representar uma observância de atuação idêntica ao que os indivíduos responderam, pois, os sujeitos são questionados quanto aos comportamentos adotados num conflito, contudo não se observam in loco os comportamentos no momento particular da situação conflitual. Acresce que o emprego dos estilos de gestão de conflitos não depende apenas da atitude pessoal, ou seja, não é simples assegurar que um sujeito adota um determinado estilo, pois num conflito é fundamental ter em consideração a atitude de ambas a partes. Em segundo lugar, embora o tamanho da amostra seja adequado, em futuros estudos, é essencial a replicação do DUTCH-PV noutras amostras independentes, mais numerosas e diversificadas, que nos permitam, simultaneamente, fazer testes de calibração e validação dos resultados obtidos. Não obstante as limitações apresentadas, este estudo anuncia que o DUTCH-PV revela características psicométricas que o caracterizam como um instrumento fiável para avaliar os estilos de gestão de conflito.

2_comp misso 7_comp misso

12_comp promisso

Com-

1.572

.720

.173

***

Com-

1.066

.630

.126

***

Domina-

---

---

---

Domina-

.705

.096

***

13_dom nação

1.291

.822

.093

***

18_dom nação

Domi-

1.407

.860

.098

***

4_sp Solução de Problemas

1.000

---

---

---

9_sp Solução de Problemas

.953

.752

.079

***

.900

.639

.085

***

19_sp Solução de Problemas

.836

.632

.080

***

5_evit

1.000

---

---

---

17_comp promisso

3_dom ção

1.000

8_dom ção

1.173

Domi-

14_sp Solução de Problemas

Evitação

→ → → →

10_evit

Evitação

.661

.541

.071

***

15_evit

Evitação

.764

.625

.071

***

20_evit

Evitação

1.067

.707

.086

***

Observando a tabela 5, relativa às correlações de Pearson (r) entre as dimensões do DUTCH-PV, os valores das associações poderão ser considerados baixos. De realçar a associação moderada entre o compromisso e a solução de problemas (r=.526; p<.01). Todos estes valores são estatisticamente significativos, com exceção das associações entre a dominação e a evitação (r=.071; p=n.s.) e anuência com a evitação (r=.072; p=n.s.).

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 16

-


Esta importância é tanto mais significativa se atendermos ao facto de que não existe, no contexto português, um instrumento desenhado para avaliar o constructo em estudo, bem como a constatação de que os processos que nos levam à avaliação de estilos de gestão de conflitos são profundos e complexos e compreendem um vasto conjunto de componentes que se desenvolvem em contextos diversificados. Deste modo, um aspeto positivo deste instrumento pode residir no facto de dar um significativo apoio à investigação, podendo relacionarse os resultados que os sujeitos obtêm no DUTCH-PV com outras variáveis relevantes no domínio da gestão de conflitos. Saliente-se que este instrumento é composto por um relativo pequeno número de itens, o que o torna de fácil aplicação em grandes grupos, nomeadamente em contextos de saúde. Outra vantagem relevante é considerarmos que a sucessiva aplicação do DUTCH-PV proporcionará uma vasta e diversificada recolha de dados facilitadora da compreensão do funcionamento deste instrumento, assim como dos processos que concorrem para uma gestão construtiva de conflitos na área da saúde. IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA Verificam-se várias implicações práticas da aplicação do instrumento em diferentes contextos dentro do vasto sector da saúde, como por exemplo gestão de conflitos no bloco operatório, entre distintos grupos de profissionais no âmbito de uma mesma organização hospitalar, entre profissionais de um mesmo grupo no interior de uma unidade de saúde, avaliação de competências de resolução de conflitos aquando de entrevistas de recrutamento e seleção de profissionais para determinadas equipas de trabalho, avaliação psicológica da utilização dos diferentes estilos de gestão de conflitos para planeamento de intervenção subsequente, entre outros aspetos a contemplar em ações de formação para profissionais de saúde. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Byrne, B. M. (2001). Structural Equation Modeling With AMOS – Basic Concepts, Applications, and Programming. New Jersey: Lawrence Erlbaum. Claro, R. & Cunha, P. (2017). Estratégias de Gestão Construtiva de Conflitos: Uma Perspetiva dos Profissionais de Saúde. Psicologia, Saúde & Doenças, 18 (1), 55-68. Doi: http://dx.doi.org/10.15309/17psd180105

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Artigo de Investigação

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Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0222

DELIMITANDO LA COERCIÓN Y LOS CUIDADOS ENFERMEROS EN SALUD MENTAL: UNA APROXIMACIÓN CUALITATIVA | Carlos Serrano1; Rubén Cabanillas2; Borja Morales3; Amal Delgado4; Sonia Castillo5; María del Pino6; Magdalena Guillén7 |

RESUMEN CONTEXTO: La cultura cada vez más coercitiva en la atención a la salud mental se pone de manifiesto en multitud de intervenciones. Es preciso tomar en consideración las aportaciones de los profesionales de salud mental como procedimiento de evaluación y determinación de factores estratégicos en la facilitación hacia un cambio de paradigma. OBJETIVO: Analizar el discurso grupal en base a las opiniones, experiencias y percepciones de las enfermeras sobre la coerción y sus límites con los valores profesionales en el ámbito de los cuidados en salud mental. MÉTODO: Estudio descriptivo de enfoque cualitativo, donde participaron once enfermeras involucradas en el proceso formativo/docente de la especialidad de enfermería de salud mental. La recolección de datos se produjo a través de la técnica de grupo focal y el contenido textual ha sido sometido al análisis temático. RESULTADOS: Las categorías temáticas identificadas son: “Coerción: contexto de descubrimiento y contexto de justificación”, “Cuidado humano, vulnerabilidad y coerción en salud mental” y “Fortalezas y debilidades del cuidado profesional”. CONCLUSIÓN: Los valores y actitudes emergentes de las enfermeras especialistas en salud mental se articulan en la relación de ayuda, siendo la propia identidad enfermera el resultado de esa práctica y teniendo como principal característica la gestión integral del cuidado. Los cuidados enfermeros contribuyen a la consecución práctica de los derechos humanos. El cuidado contractual supone la negación de hacerse partícipe de prácticas obligatorias o coercitivas, tratándose de incorporar en una lógica de derecho la complejidad del cuidado. DESCRIPTORES: Coerción; Salud mental; Atención de enfermería; Análisis cualitativo

RESUMO

ABSTRACT

“Delimitando a coerção e os cuidados de enfermagem em saúde mental: Uma abordagem qualitativa”

“Defining coercion and mental health care provided by nurses: A qualitative approach”

CONTEXTO: A cultura cada vez mais coercitiva da atenção em saúde mental é evidente em diversas intervenções. É preciso ter em consideração as contribuições dos profissionais da saúde mental como procedimento de avaliação e determinação de fatores estratégicos na facilitação da mudança de paradigma. OBJETIVO: Analisar o discurso grupal com base nas opiniões, experiências e percepções das enfermeiras sobre a coerção e os seus limites com os valores profissionais no âmbito dos cuidados em saúde mental. MÉTODOS: Estudo descritivo com uma abordagem qualitativa, onde participaram onze enfermeiras envolvidas no processo de formação e a docência da especialidade de enfermagem de saúde mental. A colheita de dados foi realizada através da técnica de grupo focal e o conteúdo textual foi submetido à análise temática. RESULTADOS: As categorias temáticas identificadas são: “Coerção: contexto de descoberta e contexto de justificação”, “Do cuidado humano, vulnerabilidade e coerção em saúde mental” e “Fortalezas e debilidades do cuidado profissional”. CONCLUSÃO: Os valores e atitudes emergentes das enfermeiras especialistas em saúde mental dependem da relação de ajuda, sendo a própria identidade da enfermeira o resultado dessa prática e tendo como principal característica a gestão integral do cuidado. Os cuidados de enfermagem contribuem à consecução prática dos direitos humanos. O cuidado contratual supõe a negação de fazer-se participante de práticas obrigatórias ou coercitivas, tratando-se de incorporar em uma lógica de direito a complexidade do cuidado.

BACKGROUND: Increasingly coercive culture in mental health care clearly comes out in a multitude of interventions. It is necessary to take into consideration the contributions of mental health professionals to evaluate and determine strategic factors to facilitate a paradigm shift. AIM: Analysis of group discourse based on the opinions, experiences and perceptions of nurses about coercion and its limits, with professional values in the field of mental health care. METHODS: Descriptive study from a qualitative approach with the participation of eleven nurses involved in the teaching- learning process about specialises in mental health. Data collection was done through the focus group technique and textual content has been subjected to thematic analysis. RESULTS: The thematic categories identified are: “Coercion: context of discovery and context of justification”, “Human care, vulnerability and coercion in mental health” and “Strengths and weaknesses of professional care”. CONCLUSION: Values and emerging attitudes of nurses specialized in mental health are based on aid relationships. The own nurse identity is the result of this practice and the integral management of care is the main feature. Nursing care contributes to the practical achievement of human rights. Contractual care implies the refusal to participate in compulsory or coercive practices, trying to understand the complexity of care under a logic of law.

PALAVRAS-CHAVE: Coerção; Saúde mental; Cuidados de enfermagem; Análise qualitativa

KEYWORDS: Coercion; Mental health; Nursing care; Qualitative analysis Submetido em 31-03-2018 Aceite em 24-06-2018

1 Enfermero Especialista en Salud Mental en la Área de Gestión Sanitaria Sur de Granada, Unidad de Salud Mental Comunitaria de Motril, España, c_aguiler2@hotmail.com 2 Enfermero Residente en Salud Mental en el Hospital Universitario Virgen de las Nieves, Unidad Docente Multiprofesional de Salud Mental, España, ruben.chacon@hotmail.es 3 Enfermero Residente en Salud Mental en el Hospital Universitario Virgen de las Nieves, Unidad Docente Multiprofesional de Salud Mental, borjagonzalezmorales@gmail.com 4 Enfermera Residente en Salud Mental en el Hospital Universitario Virgen de las Nieves, Unidad Docente Multiprofesional de Salud Mental, esperanza80es@hotmail.com 5 Enfermera Residente en Salud Mental en la Unidad Docente Multiprofesional de Salud Mental San Cecilio, Campus de la Salud, Granada, España, arbsodica@gmail.com 6 Enfermera Especialista en Salud Mental en el Hospital Universitario San Cecilio, Unidad de Hospitalización de Salud Mental, Granada, España, lolapla66@gmail.com 7 Enfermera Especialista en Salud Mental en la Área de Gestión Sanitaria Sur de Granada, Hospital de Día de Salud Mental, Granada, España, magdafergui@gmail.com Citação: Aguilera Serrano, C., Chacón Cabanillas, R., González Morales, B., Ali Delgado, A., Díaz Castillo, S., Plaza del Pino, M. D., & Fernández Guillén, M. (2018). Delimitando la coerción y los cuidados enfermeros en salud mental: Una aproximación cualitativa. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (20), 19-26. doi: 10.19131/rpesm.0222 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 19


INTRODUCCIÓN La coerción es una respuesta subjetiva a una intervención particular y se ha considerado una parte desafortunada pero, a la vez, necesaria, de la atención de personas con enfermedades psiquiátricas al utilizarse como un método para mejorar la adherencia al tratamiento en distintos países (Hotzy & Jaeger, 2016). Aun considerando los sesgos y/u omisión de datos oficiales por falta de registros sobre medidas coercitivas (Bowers et al.., 2012), se evidencia cómo cada vez más personas están siendo sometidas a intervenciones psiquiátricas coercitivas. Sirva como ejemplo el aumento en la tasa de hospitalización psiquiátrica involuntaria en Inglaterra, la cual, sufrió un incremento de más de un tercio en seis años (Care Quality Commission, 2016), posicionándose así en la tasa más alta registrada desde la implementación de la Ley de Salud Mental de 1983 (reformada en el año 2007). La cultura cada vez más coercitiva en la atención a la salud mental también es evidente a partir de una tendencia renovada hacia la institucionalización de personas con diagnóstico de trastorno mental grave, la marcada expansión de viviendas “protegidas” (vivienda seguras, pero con libertades restringidas) para personas con enfermedad mental en la comunidad o con el aumento en el número de camas psiquiátricas forenses en muchos países europeos (Priebe et al.., 2008). Pero también, con la aparición de nuevos tipos de instalaciones seguras de salud mental que reproducen algunas de las funciones de los antiguos manicomios, como ocurrió en Italia con la nueva legislación de 2012, requiriendo el desarrollo de instalaciones residenciales seguras para personas con trastornos mentales considerados “socialmente peligrosos” (Barbui & Saraceno, 2015). Gran parte de las pesquisas que se han llevado a cabo hasta la fecha han abordado la alta prevalencia de la coerción, los límites entre las intervenciones obligatorias y la coacción así como los resultados de los usuarios a la luz de la coerción percibida y/o experimentada (Tingleff, Bradley, Gildberg, Munksgaard & Hounsgaard, 2017). Sin embargo, la legislación europea de Derechos Humanos actualmente sigue sin considerar estos aspectos para reducir su impacto. Por otro lado, se acrecientan cada vez más las investigaciones que analizan las vivencias, percepciones y opiniones emitidas por los profesionales sanitarios (Aguilera Serrano, Heredia Pareja, Guzmán Parra, García Sánchez & Mayoral Cleries, 2017; GarcíaCabeza, Valenti & Calcedo, 2017; Valenti et al., 2015), resultando indispensables como procedimiento de evaluación y determinación de factores estratégicos en la facilitación hacia un cambio de paradigma. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 20

Una alternancia del tradicional y desfasado modelo biomédico en favor de un modelo de atención sociosanitaria basada en la cooperación entre profesionales y personas afectadas, donde se reduzca o elimine el uso de estas prácticas y se introduzcan medidas alternativas. El estatus de los profesionales en formación en salud mental, tanto dentro del organigrama general del Sistema de Salud pero también como miembros integrantes y participativos de los equipos interdisciplinares, sitúa a los mismos como elementos clave en una oportunidad para avanzar en el cambio de paradigma, encontrándonos con estudios previos en nuestro entorno que así lo evidencian (Carballeira, Lopez, Cocho & Nocete, 2017). Con el propósito y afán de seguir profundizando en la comprensión del fenómeno, surge la iniciativa por replicar el estudio de Carballeira et al. (2017), pero en esta ocasión, sobre una muestra discrecional concreta compuesta por enfermeras en periodo de formación como especialistas en salud mental. La naturaleza del papel de las enfermeras en entornos de salud mental viene cambiando en las últimas décadas, y se ha convertido quizás en una de las áreas más complejas para el desempeño profesional al existir una discordia entre los valores éticos y las intervenciones coercitivas utilizadas, pudiendo causar importantes problemas como el conflicto entre el cuidado y el control/seguridad de los usuarios (Camuccio, Chambers, Välimäki, Farro & Zanotti, 2012). Por tanto, el interés principal del estudio se centra en explorar y exponer las percepciones, vivencias y expectativas de las enfermeras en relación a la coerción y los límites con los valores profesionales en el ámbito de los cuidados en salud mental. Todo lo anterior proporciona una base de evidencia para el desarrollo de intervenciones que pueden mejorar el cuidado profesional (independiente/dependiente/colaborativo) junto con las personas usuarias de los servicios de salud mental y sus familiares. MÉTODOS Estudio cualitativo para analizar el contenido grupal en base a las opiniones, experiencias y percepciones de las enfermeras sobre la coerción y sus límites con los valores profesionales en el ámbito de los cuidados profesionalizados en salud mental. Se desarrolló un estudio exploratorio, descriptivo, con once enfermeras involucradas en el proceso formativo y docente como enfermeras especialistas en salud mental.


Todas pertenecientes, respectivamente, a las distintas Unidades Docentes Multiprofesionales de Salud Mental acreditadas en la provincia de Granada: Hospital Universitario Virgen de las Nieves (4), Hospital Universitario San Cecilio (5) y Área de Gestión Sanitaria Sur de Granada (2). En la Tabla 1 se muestran los datos sociodemográficos de la muestra. Tabla 1 - Características de la Muestra Participantes Edad Género Nacionalidad

Experiencia Laboral

Estado Civil

Total N= 11 (%) Media

31.090

DT

9.903

Hombre

2 (18.1)

Mujer

9 (81.8)

Español/a

11 (100)

Otros <1 año

3 (27.3)

1-5 años

5 (45.5)

5-10 años 10-15 años

1 (9.0)

>15 años

2 (18.1)

Soltero/a

9 (81.8)

Casado/a

2 (18.1)

Separado/a Viudo/a

La recolección de datos se realizó a través de la técnica del grupo focal. Esta técnica socio-cualitativa, colectiva y dinámica, promueve una acción simultánea entre los componentes del grupo estudiado, valorando el conocimiento de los actores sociales y reconociéndolos como expertos de su propia realidad. Al mismo tiempo, el uso de esta técnica garantiza a los sujetos estudiados un espacio para el reflejo de sus propias concepciones y para la autoevaluación, lo que permite un posible cambio en el comportamiento o en su comprensión. Los participantes se conocían entre sí, fenómeno que invalidaría la conceptualización de un grupo focal sensu stricto, pero pensamos que en el contexto que nos ocupa, esta circunstancia no refrenda en absoluto la interacción de los integrantes del grupo. El moderador, que realiza la propuesta del tema y suscita el deseo de los componentes a participar activamente, en todo momento tiene un rol de “pantalla” (no juzga, escucha), evitando ser crítico o represivo (corregir errores) o cómplice (valorar afirmativamente). La entrevista grupal tuvo lugar en una de las aulas de formación del Hospital Campus de la Salud de Granada, con una duración de una hora y media en el mes de diciembre de 2017.

Se grabó en cassettes para que, posteriormente, pudieran transcribirse con la mayor autenticidad. No fue necesario incluir el permiso del Comité de Ética de Investigación ya que el trabajo no ha implicado recabar datos de población vulnerable (pacientes, familiares, niños, ancianos, etc.). Los participantes dieron y aprobaron de forma individual, libre, consciente y voluntaria el Consentimiento Informado, que aseguró su anonimato, la confidencialidad de los datos personales y el uso estricto de la información para fines científicos. Para mantener su anonimato, los sujetos fueron codificados con la letra S seguida de un valor numérico para diferenciar entre sí: por ejemplo, S1 (Sujeto 1), S2 (Sujeto 2) y así sucesivamente. Para facilitar el diálogo, se partió de la siguiente batería de preguntas a modo de guía: ¿Qué es la coerción en salud mental? ¿Qué implica la coerción en la persona con sufrimiento psíquico? ¿Qué pensáis sobre el cuidado coercitivo? ¿Dónde están los límites entre cuidado y coerción? ¿Qué aportan los cuidados enfermeros para hacer frente a la coerción? ¿Cuáles son las habilidades de la enfermera en el cuidado en salud mental? ¿Qué elementos hay que superar de la coerción? ¿Qué intervenciones, modelos o mecanismos conocéis para reducir las medidas coercitivas? ¿Se os ocurren otras formas y/o cuidados desde la comunidad frente a la coerción? Finalmente, la entrevista grupal grabada en audio fue transcrita efectuándose a posteriori el análisis de contenido según las etapas descritas por Taylor Bogdan (Bodgan, 1998) desarrollando categorías, codificando datos, separando éstos y finalmente, refinando el análisis. A partir de este análisis surgieron tres categorías: (1) - Coerción: contexto de descubrimiento y contexto de justificación. (2) - Cuidado humano, vulnerabilidad y coerción en salud mental. (3) - Fortalezas y debilidades del cuidado profesional. RESULTADOS Coerción: Contexto de Descubrimiento y Contexto de Justificación En investigación científica es importante discernir entre la manera en cómo se realizan los descubrimientos y la manera en cómo se justifican y aceptan. Reichenbach (Bárcenas, 2002) trazó la distinción entre el contexto de descubrimiento y contexto de justificación. Aplicado a nuestra área concreta de estudio, el contexto de descubrimiento recoge las inferencias que realizan las enfermeras acerca de lo que genera o determina la puesta en marcha de la coerción. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 21


“Yo creo que en un principio todo esto se gesta con la idea de que la persona no se haga daño…, es verdad que luego se puede llegar a extralimitar su uso de manera injustificada…, pero en principio, lo que quizás se pretende es bajar el umbral de agresividad que puedan presentar los usuarios, esos miedos o inquietud, que dificultan el interactuar adecuadamente.” S10 “El objetivo principal es el intentar que una persona con un estado de agitación, al no poder controlarse por sí misma, no pudiendo bajar ese umbral de agresividad, intentar garantizar la seguridad de la persona y del entorno.” S2 “En teoría sólo se utilizan en los casos de extrema necesidad, cuando ya no se puede hacer nada más.” S7 “Facilitan el poner y establecer unos límites..., y eso en situaciones extremas, puede ayudar a la autopercepción y autocontrol de la persona.” S11 En relación al contexto de justificación, las enfermeras fundamentan los criterios que la coerción debe satisfacer en base a: “La coerción es una medida, como una presión, que se aplica a la fuerza en contra de la voluntad o conducta de la persona.” S1 “La envergadura de la coerción es tal que incluye la fuerza, el uso y abuso de poder, el castigo o la amenaza…” S3 “Además, las medidas coercitivas pueden dividirse en dos categorías…, por un lado, están las formales, que es cuando se ejercen bajo una especie de marco normativo…, y que incluyen la contención mecánica, el aislamiento, la contención química…, y por otro lado, estarían las informales, aquellas que se ejercen y a veces las convertimos en invisibles, pues la amenaza, la opresión o el castigo…” S8 “Las cámaras de video-vigilancia que están instaladas con frecuencia en algunas unidades de hospitalización de salud mental también pueden ser consideradas como un mecanismo coercitivo, al poder transgredir la intimidad personal.” S4 “Hay muchas intervenciones, que tenemos interiorizadas como normales y adecuadas, y no vemos que con las mismas podemos estar coaccionando”. Y también todo lo de los tratamientos involuntarios, los propios ingresos…, la cantidad de pacientes que ingresan involuntarios desde la comunidad es ya un dato a repensar.” S2

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“No sólo existe coerción en las unidades de hospitalización, pero quizás es donde más se pone de manifiesto. En los equipos o servicios de atención comunitaria también hay coerción, un ejemplo podría ser el tema del “depotcentrismo”, es decir, cuando las consultas de enfermería se centran muchas veces únicamente en la administración del tratamiento parenteral depot, dejando de lado quizás el cuidado y visión integral con la persona…, usándose como excusa para conseguir la adherencia al tratamiento y el supuesto buen seguimiento…” S5 Indistintamente de los argumentos utilizados en el proceso de contextualización, la coerción en salud mental se presenta y es erigida por las enfermeras como una cuestión epistemológica de gran transcendencia en el proceso por reducir o eliminar el uso de estas prácticas e introducir medidas alternativas (Guzman-Parra et al., 2016). “A través de la coerción se consigue desautorizar…, anular el funcionamiento y autonomía personal.” S6 “Un punto en común de lo que estamos hablando al fin y al cabo es de la restricción de la libertad.” S3 “Además, se vulneran derechos y la propia dignidad de la persona.” S5 Cuidado Humano, Vulnerabilidad y Coerción en Salud Mental En los cuidados, la relación es una condición indispensable para el ofrecimiento de un trato digno y respetuoso. Cuidar está en los fundamentos de la conciencia de ciudadanía y de la percepción del otro y de nosotros mismos como sujetos vulnerables. Los cuidados nos contemplan y protegen, pero también nos ayudan a salvaguardar la identidad propia y colectiva así como a mantenerla en buenas condiciones sociopolíticas como se puede ver en las siguientes declaraciones: “Los cuidados deben ir en beneficio de la vida de las personas, por lo tanto la coerción no es un cuidado porque pone en riesgo la dignidad de la persona y los derechos humanos. Quizás el límite entre lo coercitivo y el cuidado se encuentren en la propia relación terapéutica, en el momento en que se rompe o directamente, no se ha establecido esa bidireccionalidad obligatoria.” S7 “No hay cosa que sea más enfermera que el trabajar la autonomía personal…, y las enfermeras estamos dejando de lado muchos aspectos relacionados con esto, siendo captados e integrados por otros profesionales.” S12


“Trabajamos la mayor parte del tiempo centrados en el déficit, centrados en el síntoma…, ¿Por qué no trabajar más también sobre la parte sana de la persona?. Si algo caracteriza a la enfermera es el trabajo integral y holístico con la persona, que engloba tanto la parte sana como la parte enferma…, es fundamental trabajar con el todo de la persona, pero sobre todo, apoyándonos en sus virtudes, en las capacidades o habilidades, porque va a ser lo que facilite verdaderamente la recuperación partiendo de su propia autogestión.” S10 “El principal fallo de las enfermeras es que no se creen lo que son, y eso, a lo único que nos lleva es a que otras disciplinas, otros profesionales, a día de hoy, estén trabajando aspectos de nuestros cuidados, cuidados que hemos descuidado, porque no hemos querido darle la importancia que tenían o porque no hemos sabido…” S3 Una estrategia para afrontar la coerción, extraída en el discurso de las informantes, lo conforma la propia formación especializada como enfermeras en salud mental: “Cuando en una unidad en un turno específico hay más enfermeros especialistas que generalistas eso se nota, se nota en todo… la relación terapéutica, en el trato con el paciente, en el ambiente y el nivel de estrés de la unidad…, en cómo evoluciona el turno…, todo cambia, es distinto…, nada más entrar por la planta, a veces, ya sabes cómo se puede dar el turno…, y eso es algo que se debería estudiar y tener en cuenta por los líderes y gestores.” S5 “Existe aún hoy día mucho desconocimiento de la envergadura de nuestro rol profesional…” S2 “Las enfermeras especialistas en salud mental pueden aportar mucho sobre temas de control y manejo emocional, resolución de problemas, gestión del conflicto, desescalada, etc., pero también trabajar aspectos de educación terapéutica, de sensibilización y lucha contra el estigma hacia la salud mental, no sólo con los usuarios sino incluso el estigma de los propios profesionales.” S2 “… y también en todo lo que se refiere a la prevención y promoción…, insistiendo, apoyando y colaborando con el resto del equipo interdisciplinar.” S8

Fortalezas y Debilidades del Cuidado Profesional Las relaciones interpersonales, que determinan el cuidado enfermero, están sujetas a una serie de factores condicionantes (la naturaleza de la interacción entre enfermera y paciente, las fases de la interacción, el rol de las enfermeras en la relación con el paciente y las propias condiciones del paciente para la interacción) que deben ser tomados en consideración y analizados con el fin de impedir que en determinados momentos distorsionen el contacto humano en el que se basa la práctica enfermera. Entre éstos, y en base al discurso grupal del estudio, los factores personales de la enfermera (orientación teórica, uso del lenguaje y las variables sociológicas e individuales) reseñados como indispensables para ayudar al usuario en su proceso de salud destacan: “Hay que empezar por cambiar las palabras…, es muy importante…, por ejemplo…, cuando me decían, <<voy a sacar a tal…, oye no, tú vas a acompañar al paciente a una salida, que tú no vas a sacar un perro…>> Tenemos que empezar a cambiar por la propia forma de hablar.” S8 “Debemos informar eficientemente, de forma clara, concisa y completa…, porque no hay mayor interesado en la enfermedad que aquel que la padece, nosotros no queramos ser sus justicieros ni tomar decisiones por ellos.” S3 “Muchas veces nos excusamos demasiado en falta de tiempo, en falta de personal…, y realmente, lo que hay detrás, es una falta de interés y de implicación importante…, y se nos olvida que tenemos una responsabilidad con las personas, que nuestros cuidados tienen un valor y que si nosotros mismos no se lo damos, difícilmente el resto lo verán.” S2 “Todos sabemos la importancia de individualizar los cuidados, y sin embargo, las meras normas de las unidades, íntimamente relacionadas con los cuidados, son rígidas e inflexibles. La norma de cuidados no puede entenderse como tal si no añadimos el obligatorio individualismo, de lo contrario, caemos en lo coercitivo.” S2 “El propio estigma de los profesionales contribuye a marcar barreras…” S11 “Somos nosotras [las enfermeras] las que tenemos que mitigar la desinformación, trabajar los mitos y estereotipos…, erradicar los miedos y fomentar el pensar de manera inclusiva, favoreciendo el contacto más cercano y continuo con el paciente.” S10

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“El factor humano es importante y los propios coordinadores, supuestos líderes, deberían de trabajar y considerar más estos aspectos de los profesionales.” S6 Las enfermeras son identificadas por su trabajo diario y continuo junto a las personas como las principales influyentes en la relación terapéutica, fuente principal de cuidados (Aguilera Serrano, Heredia Pareja, Guzmán Parra, García Sánchez & Mayoral Cleries, 2017), destacando así los informantes el valor distintivo de la propia intervención enfermera Presencia: “La presencia enfermera es ver las necesidades del paciente desde que entra hasta que se marcha, valorando sus necesidades en todo momento.” S1 “… lo de presencia, ya no es sólo presencia de estar un tiempo determinado del día con el usuario ahí hablando…, sino que supone estar presente para cuando él te necesite, favoreciendo la humanización, es decir, el cuidado, eliminando de este modo todas aquellas barreras que se puedan establecer o vengan establecidas.” S9 “A muchos profesionales, por ejemplo, les incomoda el trabajo con los familiares por el miedo a no saber qué decirles, con excusas inconsistentes de que éstos pueden estimular o generar angustia a su familiar o resto de usuarios, ponerlos más nerviosos y alterar el clima de la unidad… Cuando estos son los contextos donde debemos estar más presentes que nunca. Informar es cuidar, es educar en salud y debemos prestar mayor atención a este área…, quizás nos sea más difícil informar de aspectos clínicos, etiológicos o del pronóstico, pero no podemos dejar de informar sobre el cuidado del paciente.” S5 “Es vital e irrefutable el trabajo colaborativo de las enfermas tanto con las asociaciones de pacientes como de familiares, permitiendo y favoreciendo la parte más humana, el dar esperanza por su condición de persona.” S12 DISCUSIÓN La coerción y su vínculo con la asistencia sanitaria, promovida desde el propio sistema de atención a la salud mental, se viene gestando desde los inicios de la misma (Asociación Española de Neuropsiquiatría, 2017). Las principales razones que se han venido empleando en su justificación contemplan la necesidad del uso de medidas coercitivas en base a la falta de autonomía en los autocuidados y toma de decisiones por parte de los pacientes así como la necesidad de estrategias para el control de riesgos. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 24

De manera general, se ha avanzado hacia la desinstitucionalización, pero aún “decenas de miles de personas con problemas de salud mental continúan viviendo actualmente en instituciones psiquiátricas en Europa” además de persistir el uso, como en el contexto de este estudio, de prácticas como los tratamiento involuntarios y/o el uso de la contención mecánica, entre otras medidas coercitivas (Turnpenny, Petri, Finn, BeadleBrown & Nyman, 2017). Se conoce que el progreso de la asistencia psiquiátrica represiva, muchas veces enmascarada con el sistema penitenciario, a un modelo de asistencia más humanista, se ha debido, en parte, al emblema conceptual del “cuidado”. Sin embargo, el paradigma enfermero ha estado fuertemente influenciado por el modelo biomédico, lo que le ha repercutido negativamente en la visión, desarrollo y avance profesional, llegando incluso al extremo de la despersonalización. La existencia y evolución de los cuidados en salud mental está vinculada a la presencia de una profesión que hace del concepto de “cuidado” su principal objeto de reflexión teórica con finalidad eminentemente práctica. Así lo dejaban entrever nuestras informantes exponiendo como la presencia enfermera es la propia humanización del cuidado. Además, la evidencia respalda el rol terapéutico de las enfermeras de salud mental con sus cuidados, siendo incuestionable el interés por la necesidad de idear estrategias para promover el mismo, y todo ello, a través del pilar básico de la profesión enfermera, la relación terapéutica (Moreno-Poyato et al., 2017). El enfoque colaborativo y participativo con el equipo interdisciplinar, y fundamentalmente, con las personas con experiencias en primera persona, son indispensable en la obtención de resultados de salud positivos a través de los cuidados enfermeros, pudiendo así contrarrestar aquellos déficits identificados en relación al compromiso terapéutico, como pueden ser la obstaculización en la provisión de atención individual como consecuencia de las tareas rutinarias o administrativas, la disminución del tiempo que los profesionales sanitarios pasan con los pacientes (Sharac et al., 2010), o con la escasa participación activa de los mismos en sus procesos de salud-enfermedad conocidas a través de las propias autopercepciones.


CONCLUSIONES Los valores y actitudes emergentes de las enfermeras especialistas en salud mental se articulan en la relación de ayuda, siendo la propia identidad enfermera el resultado de esa práctica y teniendo como principal característica la Gestión Integral del Cuidado. Valores como la igualdad, la justicia, la verdad, la libertad o la dignidad, adquieren un mayor nivel de adhesión en cuanto mayor es la práctica profesional centrada en la persona y en los cuidados propios. Los cuidados enfermeros contribuyen así a la consecución práctica de los derechos humanos. El cuidado contractual, conceptualizado por Szasz (BuchananBarker & Barker, 2009), supone la negación de hacerse partícipe de prácticas obligatorias o coercitivas, tratándose de incorporar en una lógica de derecho la complejidad del cuidado, no sólo en relación con el status de profesional con un sujeto beneficiario de una política de cuidados, sino en base a los cuatro principios universales de la bioética (Beauchamp & Childress, 2015). El enfoque contractual considera que la relación enfermera-paciente surge de un acuerdo mutuo, conservando ambos roles participativos y trabajando en estrecha colaboración. La connivencia y búsqueda de nuevas formas de encuentro, ayudará a establecer espacios de diálogo y discusión, favoreciendo la diseminación de una filosofía humanizadora del cuidar. La implicación y compromiso de las enfermeras con la calidad del cuidado permitirán garantizar una atención ética, profesional y humana. IMPLICACIONES PARA LA PRÁCTICA CLÍNICA La metodología cualitativa no pretende nunca generalizar sus hallazgos, pero sí que nos permite una aproximación conceptual e interpretativa a través de los datos obtenidos. Los discursos de los informantes tienen fuertes influencias sobre la concepción de cuidado y la asistencia dispensada a las personas con problemas de sufrimiento psíquico y/o emocional. El presente trabajo puede ser considerado relevante para la práctica clínica en la medida en que la presentación de los resultados positivos relativos a la promoción de estrategias para el reconocimiento de la necesidad del cuidado enfermero especializado en salud mental, frente al uso de intervenciones coercitivas, pueda ser considerado como base para la promulgación del paradigma de atención y cuidados centrados en la persona.

Además, favorece la diseminación de una filosofía humanizadora del cuidado así como defensa y consecución práctica de los derechos humanos de las personas con enfermedad mental, familiares y/o personas representativas designadas. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS Aguilera Serrano, C., Heredia Pareja, C., Guzmán Parra, J., García Sánchez, J. A., & Mayoral Cleries, F. (2017). Medidas coercitivas en salud mental. Grupo focal con profesionales del ámbito comunitario. Revista Española de Enfermería de Salud Mental, 1, 4–11. Disponível em: http://www3.uah.es/revenfermeriasaludmental/ index.php/REESM-AEESME/article/view/1/8 Asociación Española de Neuropsiquiatría. (2017). Coerción y salud mental. Revisando las prácticas de coerción en la atención a las personas que utilizan los servicios de salud mental. (Asociación Española de Neuropsiquiatría, Ed.) (Cuadernos). Madrid. Disponível em: http://www.tienda-aen.es/wp-content/uploads/2018/04/Cuaderno-Te?cnico-20-Coercio?n.pdf Barbui, C., & Saraceno, B. (2015). Closing forensic psychiatric hospitals in Italy: A new revolution begins? British Journal of Psychiatry, 206 (6), 445–446. Doi:10.1192/bjp.bp.114.153817 Bárcenas, R. (2002). Contexto de descubrimiento y contexto de justificación: Un problema filosófico en la investigación Científica. Acta Universitaria, 12 (2), 48– 57. Disponível em: http://www.actauniversitaria.ugto. mx/index.php/acta/article/viewFile/282/260 Beauchamp, T. L. & Childress, J. F. (2015). Principles of Biomedical Ethics. Occupational Medicine, 65 (1), 88–89. Doi:10.1093/occmed/kqu158 Bodgan, T. (1998). Introducción a los métodos cualitativos de investigación. Barcelona: Paidos. Bowers, L., Ross, J., Nijman, H., Muir-Cochrane, E., Noorthoorn, E., & Stewart, D. (2012). The scope for replacing seclusion with time out in acute inpatient psychiatry in England. Journal of Advanced Nursing, 68 (4), 826–835. Doi:10.1111/j.1365-2648.2011.05784.x

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Moreno-Poyato, A. R., Delgado-Hito, P., Suárez-Pérez, R., Leyva-Moral, J. M., Aceña-Domínguez, R., Carreras-Salvador, R., … Montesó-Curto, P. (2017). Implementation of evidence on the nurse-patient relationship in psychiatric wards through a mixed method design: Study protocol. BMC Nursing, 16 (1). Doi:10.1186/ s12912-016-0197-8 Priebe, S., Frottier, P., Gaddini, A., Kilian, R., Lauber, C., Martinez-Leal, R., … Wright, D. (2008). Mental health care institutions in nine European countries, 2002 to 2006. Psychiatric Services, 59 (5), 570–573. Doi:10.1176/appi.ps.59.5.570 [doi] Sharac, J., McCrone, P., Sabes-Figuera, R., Csipke, E., Wood, A., & Wykes, T. (2010). Nurse and patient activities and interaction on psychiatric inpatients wards: A literature review. International Journal of Nursing Studies, 47 (7), 909–917. Doi:10.1016/j.ijnurstu.2010.03.012 Tingleff, E. B., Bradley, S. K., Gildberg, F. A., Munksgaard, G., & Hounsgaard, L. (2017). “Treat me with respect”. A systematic review and thematic analysis of psychiatric patients’ reported perceptions of the situations associated with the process of coercion. Journal of Psychiatric and Mental Health Nursing, 24 (9-10), 681–698. Doi:10.1111/ijlh.12426 Turnpenny, Á., Petri, G., Finn, A., Beadle-Brown, J., & Nyman, M. (2017). Mapping and Understanding Exclusion in Europe: Institutional, coercive and community-based services and practices across Europe. Mental Health Europe. Brussels. doi:https://doi.org/10.22024/ UniKent/01.02/64970 Valenti, E., Banks, C., Calced o-Barba, A., Bensimon, C. M., Hoffmann, K. M., Pelto-Piri, V., … Priebe, S. (2015). Informal coercion in psychiatry: a focus group study of attitudes and experiences of mental health professionals in ten countries. Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology, 50 (8), 1297–1308. Doi:10.1007/ s00127-015-1032-3


Artigo de Investigação

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Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0223

PERCEPÇÃO DE PESSOAS QUE USAM DROGAS ACERCA DO TRATAMENTO EM UM CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL | Vanessa Manente1; Daiana de Siqueira2; Keity Soccol3; Silvana Andres4; Janaina Canabarro5; Claudete Moreschi6 |

RESUMO CONTEXTO: No Brasil, o Centro de Atenção Psicossocial representa um dos locais que é ofertado o tratamento às pessoas que usam drogas. OBJETIVO: Compreender como as pessoas que usam de drogas percebem o tratamento ofertado em um Centro de Atenção Psicossocial. MÉTODO: Trata-se de uma pesquisa qualitativa, exploratória e descritiva, realizada com 21 usuários de álcool e drogas em tratamento no Centro de Atenção Psicossocial. A coleta de dados ocorreu no período de setembro e outubro de 2017, por meio de entrevista aberta. RESULTADOS: Identificaram-se três categorias temáticas: tratamento pautado na abstinência; tratamento baseado na redução de danos e, estratégias para adesão ao tratamento. O tratamento mais referido pelos participantes foi a abstinência; a maioria dos participantes não acredita na efetividade da redução de danos; e, o medo da perda do vínculo com os familiares foi evidenciado como fator principal para adesão ao tratamento. CONCLUSÃO: Notou-se a necessidade de maior participação dos usuários na escolha do seu tratamento, além da desmistificação acerca da abstinência e da redução de danos como opções de abordagens que contribuem com o tratamento das pessoas que são atendidas em um Centro de Atenção Psicossocial. PALAVRAS-CHAVE: Drogas; Redução do dano; Enfermagem; Transtornos relacionados ao uso de substâncias; Abstinência

RESUMEN

ABSTRACT

“Percepción de personas que usan drogas acerca del tratamiento en un Centro de Atención Psicosocial“

“Perception of people who use drugs about treatment in a Psychosocial Care Center”

CONTEXTO: en Brasil, el Centro de Atención Psicosocial representa uno de los locales que se ofrece el tratamiento a las personas que usan drogas. OBJETIVO: comprender cómo las personas que usan drogas perciben el tratamiento ofrecido en un Centro de Atención Psicosocial. METODOLOGÍA: se trata de una investigación cualitativa, exploratoria y descriptiva, realizada con 21 usuarios de alcohol y drogas en tratamiento en el Centro de Atención Psicosocial. La recolección de datos ocurrió en el período de septiembre y octubre de 2017, por medio de una entrevista abierta. RESULTADOS: Se identificaron tres categorías: tratamiento pautado en la abstinencia; tratamiento basado en la reducción de daños y estrategias para la adhesión al tratamiento. El tratamiento más mencionado por los participantes fue la abstinencia; la mayoría de los participantes no cree en la efectividad de la reducción de daños; y el miedo a la pérdida del vínculo con los familiares fue evidenciado como factor principal para la adhesión al tratamiento. CONCLUSIÓN: Se notó la necesidad de mayor participación de los usuarios en la elección de su tratamiento, además de la desmitificación acerca de la abstinencia y la reducción de daños como opciones de abordajes que contribuyen con el tratamiento de las personas que son atendidas en un Centro de Atención Psicosocial.

BACKGROUND: in Brazil, the Psychosocial Care Center represents one of the places that treatment is offered to people who use drugs. AIM: to understand how people who use drugs perceive the treatment offered in a Psychosocial Care Center. METHOD: this is a qualitative, exploratory and descriptive research carried out with 21 alcohol and drug users under treatment in the Psychosocial Care Center. The data collection took place in the period of September and October of 2017, through an open interview. RESULTS: three categories were identified: treatment based on abstinence; treatment based on harm reduction, and strategies for adherence to treatment. The most mentioned treatment was abstinence; most participants do not believe in the effectiveness of harm reduction; and, fear of losing the bond with relatives was evidenced as the main factor for adherence to treatment. CONCLUSION: It was noted the need for greater participation of the users in the choice of their treatment, besides the demystification about abstinence and harm reduction as options of approaches that contribute to the treatment of the people who are cared for in a Psychosocial Care Center.

DESCRIPTORES: Drogas; Reducción del daño; Enfermería; Trastornos relacionados con sustancias; La abstinencia

KEYWORDS: Drugs; Harm reduction; Nursing; Centro de Atenção Psicossocial; Substance-related disorders; Abstinence Submetido em 31-03-2018 Aceite em 13-07-2018

1 Enfermeira, Avenida Batista Bonoto Sobrinho, 97700-000 Santiago/RS, Brasil, vanessabatistam@hotmail.com. 2 Enfermeira; Doutora em Enfermagem; Docente na Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, Erechim - RS, Brasil, daianasiqueira@yahoo.com.br 3 Enfermeira; Doutora em Enfermagem; Docente no Centro Universitário Franciscano, 97010-030, Santa Maria - RS, Brasil, keitylais@hotmail.com 4 Enfermeira; Mestre em Enfermagem; Docente na Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, Erechim - RS, Brasil, silvana.andres@yahoo.com.br 5 Enfermeira no Hospital Geral do Estado de Santa Maria-RS, 97010-290 Passo D’areia, Santa Maria - RS, Brasil, jana.l.c2010@hotmail.com 6 Enfermeira; Doutora em Ambiente e Desenvolvimento; Docente na Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, Brasil, clua_moreschi@yahoo.com.br Citação: Manente, V. B., Siqueira, D. F., Soccol, K. L. S., Andres, S. C., Canabarro, J. L., & Moreschi, C. (2018). Percepção de pessoas que usam drogas acerca do tratamento em um Centro de Atenção Psicossocial. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (20), 27-33. doi: 10.19131/rpesm.0223 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 27


INTRODUÇÃO No Brasil, dentre os serviços que prestam assistência à saúde das pessoas que usam drogas situam-se os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), que são regulamentados pela Portaria GM/MS nº 336/2002. Esses serviços prestam assistência às pessoas com transtornos decorrentes do uso e dependência de drogas (Gabatz, Johann, Terra e Padoin, 2013). Essa Portaria, por meio da inserção de novos serviços de saúde mental, garantiu uma mudança no cenário do atendimento a essas pessoas, que antes eram atendidos principalmente em hospitais psiquiátricos (Gabatz et al., 2013). Cada CAPS, estabelece o plano terapêutico de acordo com a individualidade de cada usuário levando em consideração a sua autonomia, podendo estar voltado para a prevenção à recaída ou para a redução de danos. As estratégias de redução de danos, desde sua inserção no Brasil, provocaram polêmicas e resistências, sob a alegação de facilitar o uso/consumo de drogas e de levar a gastos indevidos do dinheiro público. A redução de danos pode ser definida como um modo diferente de abordar o tratamento do usuário de álcool e drogas, descentralizando o foco do problema da erradicação e da abstinência e privilegiando o direito à saúde de todos e o respeito à liberdade individual daquele que não deseja ou não consegue interromper o uso da substância (Machado e Boarini, 2013). Já a abstinência, ou abstenção do uso de drogas, ocorre quando o usuário por razões pessoais cessa o uso da substância que vinha consumindo. A pessoa que pratica a abstinência de álcool é chamada de abstêmio. Considera-se em abstinência aquela pessoa que não ingeriu bebidas alcoólicas nos últimos doze meses. O termo abstinência não deve ser confundido com síndrome de abstinência. É possível que qualquer usuário problemático de drogas permaneça em abstinência, porém isso vai depender do seu estado psíquico e das circunstâncias em que está inserido (Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, 2010). As ações de redução de danos levam em consideração o respeito aos direitos humanos e tem suas ações voltadas em prol da população de usuários de drogas e seus familiares (Elias e Bastos, 2011). A redução de danos caracteriza-se como uma medida que não estabelece como meta inicial para o tratamento a abstinência do uso drogas, mas pressupõe que a atenção à saúde chegue até o usuário, onde quer que ele se encontre, e não o contrário (Brasil, 2014). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 28

Enquanto a abstinência apresenta uma proposta de remissão do sintoma e a cura do doente, a redução de danos está direcionada para a produção de saúde, incentivando a autonomia do cuidado de si (Passos e Souza, 2011). O Brasil, ainda hoje, prevê essas duas modalidades no tratamento dos usuários de álcool e outras drogas, que envolvem a abstinência e a redução de danos. Diante do exposto, observou-se que a escolha entre a redução de danos e a abstinência, é algo pactuado com a própria pessoa e que essa opção é pessoal e individual, respeitando a sua autonomia e direito de escolha. Assim, o presente estudo apresenta como objetivo compreender como as pessoas que usam de drogas percebem o tratamento ofertado em um Centro de Atenção Psicossocial. Considerando o contexto acima, questionou-se: como as pessoas que usam drogas percebem o tratamento ofertado em um Centro de Atenção Psicossocial? MÉTODOS Trata-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa, exploratória e descritiva. A pesquisa qualitativa está preocupada com a realidade, com os significados, com os motivos, crenças, valores e atitudes que as pessoas atribuem a um determinado fenômeno. Esse tipo de pesquisa pode ser aplicada tanto para compreender as relações, as percepções, opiniões e interpretações que os sujeitos fazem a respeito de como vivem, constroem relações e a si mesmos, como sentem e pensam sob a ótica do próprio sujeito (Minayo, 2014). A presente pesquisa foi realizada em um Centro de Atenção Psicossocial localizado em um município do Estado do Rio Grande do Sul - Brasil. A escolha desse cenário ocorreu em virtude de que esse CAPS além de atender pessoas com transtornos mentais, atende também pessoas com transtornos relacionados ao uso de álcool e outras drogas. O CAPS possui uma equipe composta por uma enfermeira, dois técnicos de enfermagem, quatro psicólogas, uma médica psiquiatra, além dos oficineiros. Desenvolvem atividades de educação em saúde com as pessoas que usam drogas licitas e ilícitas e com as pessoas que apresentam transtornos mentais. Os participantes da pesquisa foram 21 usuários que estavam na modalidade de tratamento não intensivo que faziam uso de drogas lícitas e/ou ilícitas, em diferentes estágios e tempo da evolução do tratamento, no referido serviço durante o período da coleta dos dados.


Como critérios de inclusão, elencou-se aqueles maiores de 18 anos que estavam inseridos em alguma modalidade de tratamento no referido serviço. E, os critérios de exclusão foram os indivíduos que possuíam dificuldades de comunicação que viesse a prejudicar a condução da entrevista. Para a produção dos dados foi utilizado a entrevista aberta, por meio da qual os participantes tiveram a possibilidade de discorrer sobre o tema proposto. Para que as entrevistas deste estudo alcançassem os objetivos propostos, foi utilizado um instrumento para enunciação dos dados de identificação dos participantes da pesquisa, e as seguintes questões iniciais abertas: Como você percebe o tratamento voltado para a abstinência? O que você entende por redução de danos? E o que você pensa sobre a redução de danos? Quais as estratégias que você percebe na adesão do seu tratamento? Salienta-se que todos os participantes realizavam tratamento recorrente no serviço, ou seja, nenhum participante estava realizando o seu primeiro tratamento. As entrevistas aconteceram no período entre os meses de setembro a outubro de 2017, sendo realizadas individualmente, em uma sala previamente reservada no CAPS, com antecedente agendamento da entrevista em horário definido em acordo com sua disponibilidade. As informações emergidas durante as entrevistas foram registradas em um gravador digital, conforme autorização prévia do participante Para a análise dos dados, foi utilizada a Análise Temática seguindo a Proposta Operativa de Minayo que se caracteriza por dois níveis de interpretação. O primeiro momento interpretativo é constituído pelo mapeamento do campo das determinações fundamentais na fase exploratória, que se refere ao contexto histórico do grupo social em questão. O segundo momento interpretativo consiste no ponto de partida e de chegada da pesquisa, representa a convergência com os fatos empíricos, é o momento em que se encontra nos relatos dos informantes o sentido, a lógica interna, as projeções e as interpretações, havendo um significado cultural do grupo e um elo muito mais abrangente. Para operacionalizar esse segundo momento é sugerido os seguintes passos: pré-análise, exploração de material e tratamento dos resultados obtidos e interpretações (Minayo, 2014). Para a execução e desenvolvimento desta pesquisa foram respeitados os preceitos éticos da Resolução Nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde (Brasil, 2012). Recebeu aprovação do comitê de ética sob número do parecer 2.222.950 e CAEE 72771417.6.0000.5353.

Para preservar a identidade dos sujeitos foi utilizada a letra ‘U’, que é a letra inicial da palavra participante seguida de um numeral (U1, U2, U3, e assim sucessivamente). RESULTADOS Participaram do estudo 21 usuários, sendo que 02 eram do sexo feminino e 19 do sexo masculino. Destes, 14 participantes com idades entre 40 e 60 anos, 05 com idades entre 20 e 40 anos e 02 com idade acima de 60 anos. Em relação a escolaridade, 16 participantes com ensino fundamental incompleto, 01 com ensino fundamental completo, 03 com ensino médio completo e 01 analfabetos. Todos os entrevistados realizavam tratamento no serviço em regime não intensivo e participavam do “Grupo Álcool e drogas”, que acontecia nas quintas-feiras, no turno da manhã. A análise das falas das pessoas que usam drogas possibilitou a compreensão das seguintes categorias temáticas: Tratamento pautado na abstinência; Tratamento baseado na redução de danos; e, Estratégias para adesão ao tratamento. Tratamento Pautado na Abstinência O tratamento mais referido pelos participantes foi a abstinência. Alguns participantes relataram que percebem necessidade em cessar com o uso da substância, pois assim se sentem melhor e com mais autocontrole. Estou indo até o último e não bebo. Não quero beber mais. O tratamento eu vou fazendo e não tem bebida para mim. (E1) Parar é um tempo, e eu decidi deixar. Estou me sentindo muito bem. Melhora tudo na vida da gente. Em casa, com os familiares. Com as pessoas, todo mundo respeita. (E3) Deve fazer uns cinco ou seis meses que não bebo. Não bebi mais. Nem cerveja. Só que eu não sabia beber uma ou duas e parar, não me controlava. (E17) Ainda, relataram que embora pratiquem a abstinência, ainda em determinados períodos, sentem vontade de ingerir algum tipo de substância. Depois que eu parei de tomar, nunca mais tentei colocar na boca. Às vezes, até dá uma vontade, mas olho e penso que se eu tomar, volta o vício. Aí não, deixo quieto. (E13) Eu cheguei num bar comprar cigarro, aí me deu vontade de comprar um samba, mas aí um amigo me disse que não era para beber. Aí peguei o cigarro e fui embora. Não comprei. (E14) Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 29


Tratamento Baseado na Redução de Danos A redução de danos foi vista como uma forma de tratamento com bons resultados por alguns participantes. Alguns relataram estarem praticando ou já terem praticado redução de danos, mesmo que de forma desconhecida. Eu acho que dá certo. Não é o meu caso, porque não tenho vontade nenhuma. Mas se eu ainda bebesse, acho que seria bom. (E15) Estive dois anos e meio sem colocar nada na boca, aí tive uma pequena recaída, e às vezes, eu coloco uma cerveja na boca. Mas cerveja. Em algum final de semana só. (E5) Usei e uso ainda. Estou usando. Estou usando maconha. Porque eu não consigo ficar sem. (E9) Uso ali, um ou dois dias e paro dois ou três meses. Um ano já fiquei sem. Uso maconha, cocaína e crack. Nessas duas semanas que comecei a vir aqui, não usei. (E18) Porém, a maioria dos participantes não acredita na efetividade da redução de danos, usando como uma das formas de justificativa o descontrole no consumo. Não tinha como dizer assim: vou tomar hoje e amanhã não vou tomar. No outro dia, amanhecia com vontade de tomar mais ainda. Não tinha como diminuir. (E2) Não dá para só diminuir. Tu diminui e quando vê está do mesmo jeito. Eu acho que não. (E6) Tem que parar de beber completamente. Para mim não funciona. Dizer que diminui é bobagem. (E7) Não existe isso, para mim não existe. É para pouquíssimos que existe. Dizer que hoje vai tomar só um traguinho. Porque quem é viciado, eu tiro por mim, não pode tomar um gole. Se tomar o primeiro, não para mais. (E10) Para mim não dá certo. Se eu fizer isso, inventar de seguir tomando, mesmo que seja pouquinho, eu não aguento. Aí vou virar na mesma pessoa que eu era. (E16) Redução eu acho que não. Tem gente que não se controla. Eu mesmo sou um. Se eu começar a tomar, tenho que tomar muito. (E1) Estratégias para Adesão ao Tratamento A família foi vista pelos usuários como um ponto positivo, representando uma estratégia para adesão ao tratamento. O medo da perda do vínculo e o distanciamento dos familiares também foi evidenciado como fator motivador para adesão ao tratamento.

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No meu ponto de vista, a pessoa tem que colocar um capricho, ela mesma tem que pensar nela. Eu penso em mim, penso na minha filha. Eu penso na minha vida e na minha filha. Por isso eu deixei de beber. (E1) Olha, agora eu penso no serviço. Em me firmar no serviço. E na minha família. A minha família é muito importante também. (E10) Decidi parar porque tinha que cuidar da minha mãe, ela morava sozinha. Daí decidi não beber mais. (E16) Eu tenho esposa, filhos. O medo de perder a família, o ambiente familiar. Ter que ficar longe, afastado. Porque a minha esposa não me aceita drogado em casa. Se ela vê que eu estou drogado, já manda eu sair. (E18) Outros participantes identificaram como estratégias para a adesão ao tratamento o uso de medicamentos para ansiedade e as internações em unidades psiquiátricas e fazendas terapêuticas. Eu fui para a fazenda. Eu tive que ir. Foi muito bom para mim. (E4) Tomo medicamento para me acalmar, para ficar bem. Por exemplo, com esse medicamento e os tratamentos que eu fiz, que eu estou fazendo, não tenho vontade. (E4) Eu disse que não tinha mais para onde ir, que trabalhar eu não podia. Tive um câncer na boca. Fiquei pensando o que iria fazer da vida. Chamei a minha cunhada e pedi para ela me internar de novo. (E6) Através da medicação, para a gente não achar falta. E agora, a psicóloga arrumou para eu ir para a fazenda terapêutica, ficar um ano, para largar de vez. (E8) Salienta-se que os participantes relataram outras estratégias para adesão, como o consumo de algumas bebidas e de cigarro como forma de suprir a necessidade do uso das substâncias psicoativas. Com relação ao consumo de outras bebidas, as mais consumidas segundo os relatos foram o chimarrão e o refrigerante. Levanto cedo e tomo bastante mate. Estando em casa, fico quase todo o tempo com a cuia na mão. (E2) Quando eu sinto vontade de beber, tomo refrigerante, água. Faço outras coisas para passar o tempo. (E11) Foi aos poucos para deixar. Foi bem complicado. Nem mesmo aquelas sem álcool eu tomo. Eu tomo coca cola, guaraná, tomo suco também. Mas bebida não. (E12) Chego nos bares e compro uma coca pequena, só para matar o tempo. Não preciso mais ficar bebendo. Outra coisa que eu faço é fumar. (E19)


DISCUSSÃO Constatou-se que a forma de tratamento que os participantes mais buscam no Centro de Atenção Psicossocial é a abstinência. O tratamento pautado na abstinência, ou seja, na proibição total do consumo de substâncias psicoativas constitui apenas uma entre as muitas formas de lidar com o uso dessas substâncias e não tem se mostrado a mais eficiente (Trad, Trad e Romaní, 2013). Considerar a abstinência como o principal objetivo do cuidar ao usuário de substâncias psicoativas pode limitar as opções de trabalho dos profissionais de saúde, visto que em muitos casos os usuários não se reconhecem como tal, o que dificulta o sucesso do tratamento (Dourado et al., 2014). Evidenciou-se que os usuários sentem necessidade em parar com o uso da substância, pois assim se sentem melhor e com mais autocontrole. A decisão de consumir ou não é mediada pelas expectativas que a pessoa tem quanto aos efeitos iniciais do consumo da substância. Se inicialmente a ênfase é dada à manutenção da abstinência, posteriormente devem ser abordados aspectos disfuncionais da personalidade, visando uma maior adesão ao tratamento e uma melhor capacitação para a resolução de problemas (Silva, 2015). Ainda, nesse sentido, na abstinência, os usuários em determinados períodos, sentem vontade de ingerir algum tipo de substância. A possibilidade de surgir uma recaída pode ocorrer quando as estratégias usadas pela pessoa para manter o estado de abstinência falham e, consequentemente, venham a apresentar sentimentos de fracasso, desesperança e culpa. É possível que possa afetar negativamente a sua autoeficácia (Silva, 2015). Para a adesão ao tratamento, a importância da família e o medo do distanciamento dos familiares foi evidenciado. A dependência química de um ou mais membros da família causa um impacto importante nas relações afetivas interpessoais e sociais. Assim, dificulta a aproximação e manutenção de laços de intimidade, de confiança, com reflexos na interação do familiar com a sua rede social e com o usuário (Maciel, Zerbetto, Filizola, Dupas e Ferreira, 2013). O isolamento familiar pode levar ao comprometimento do tratamento, além de dificultar a ação do profissional envolvido no processo de prevenção e promoção da saúde mental. Dessa maneira, a interação da família no tratamento do usuário é um fator que merece investimento, seja em relação ao atendimento individualizado, ou por meio de intervenções no âmbito comunitário para a integração social da família.

O envolvimento de famílias que compartilham do mesmo problema torna-se de grande relevância para a terapêutica, por criar um espaço de trocas de vivências, angústias e informações para a compreensão da dependência química (Maciel et al., 2013). Com relação aos modelos de tratamento, após a criação da Política de Atenção Integral ao Usuário de Álcool e Outras Drogas, em 2003 e, na Política Nacional sobre Drogas, em 2005, houve o surgimento da redução de danos (Brasil, 2003). O tratamento com base na redução de danos tem como pilar a liberdade de escolha do indivíduo, visando à sua responsabilidade e colaboração no gerenciamento do próprio consumo de forma menos prejudicial à saúde (Trad et al., 2013). No decorrer das abordagens realizadas, os participantes mostraram desconhecer o tratamento voltado à redução de danos. Alguns participantes não acreditam na efetividade da redução de danos, usando como uma das formas de justificativa o descontrole no consumo. Esta percepção pode resultar do pavor que o tema provoca no imaginário popular. Assim, coloca em risco as importantes experiências inovadoras apresentadas como possibilidades de tratamento no Brasil, em um campo em que ainda existe vasto caminho a percorrer (Dourado et al., 2014). Sabe-se que não é submetendo o ser humano à imposição de que seja “abstêmio por natureza” que se solucionará o problema. A abordagem de redução de danos está mais próxima da visão atual que a ciência tem acerca do uso de substâncias psicoativas do que a abordagem proibicionista. Considera-se que práticas sociais, dependem mais das estruturas e das configurações existentes na sociedade em que são empregadas do que apenas da ação farmacológica de uma substância (Trad et al., 2013). Em contrapartida, a redução de danos foi visualizada por alguns participantes como uma forma de tratamento efetiva. Assim, a redução de danos se estabelece como ferramenta de tratamento capaz de mitigar as consequências maléficas para o organismo do usuário. Além disso, atua como estratégia, na medida em que a própria difusão da informação já é elemento responsável por minimizar os danos e consequências sociais para os usuários (Dourado et al., 2014). É fundamental informar/orientar os usuários acerca das consequências negativas decorrentes do uso de substâncias psicoativas, bem como sobre a prevenção do abuso das mesmas, visto que essas podem provocar sequelas ao organismo. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 31


Ainda, é imprescindível informá-los a respeito das formas e estratégias de tratamento, assim como informar aos não usuários acerca das reais consequências das drogas, preparando-os para melhor lidar com a situação. Evita-se, assim, a continuação de um discurso perpetrado pelo medo, pelo proibicionismo, pelo abstencionismo e pela ignorância (Silva, 2015). Nesse cenário, a abordagem de redução de danos propõem estratégias que se adequem aos seus interesses, protegendo a sua vida e abrandando seu sofrimento. Além disso, não é necessário considerar este método como único caminho a ser adotado, na medida em que, em sua essência, ele não estabelece qualquer contradição ao tratamento associado a outras estratégias. É possível traçar planos terapêuticos que compatibilizem a redução de danos com outros tratamentos, como, por exemplo, os grupos de ajuda mútua, não havendo qualquer prejuízo ou empecilho a essa (ou outra) associação (Silva, 2015). Além disso, é importante fortalecer a articulação da rede de atenção em saúde com o intuito de facilitar o acesso e tratamento nos serviços (Wandekoken e Siqueira, 2013). Salienta-se que a redução de danos deve ser compreendida como uma estratégia política de saúde pública que se apresenta diante da impossibilidade de uma sociedade sem substâncias. Deste modo, apresenta-se como uma forma pragmática para lidar com aquelas pessoas que estão em situação de risco ou sofrimento em decorrência do seu uso (Dourado et al., 2014). CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao compreender como os usuários de drogas percebem o tratamento ofertado em um Centro de Atenção Psicossocial, evidenciou que a abstinência é o modelo de tratamento mais utilizado pelos participantes. Alguns participantes acreditam na efetividade da redução de danos e praticam essa modalidade de tratamento mesmo que de forma desconhecida. Outros, porém, não acreditam que a redução de danos possa ser efetiva. A família foi citada pelos participantes como a principal estratégia para adesão ao tratamento. Notou-se a necessidade de maior participação das pessoas que usam drogas na escolha do seu tratamento, de modo que possam realizar suas escolhas, decidir sobre o modelo de tratamento que vão seguir, baseado em orientações realizadas pelos profissionais de saúde.

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IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA Espera-se que esse estudo venha contribuir com a desmistificação acerca dos dois tipos de abordagem que direcionam o tratamento dos usuários de drogas, bem como, possibilitar aos usuários e aos serviços de saúde desenvolver uma melhor reflexão acerca da temática. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Brasil. (2003). A Política do Ministério da Saúde para atenção integral a usuários de álcool e outras drogas / Ministério da Saúde, Secretaria Executiva, Coordenação Nacional de DST e Aids. Brasília: Ministério da Saúde. Brasil. (2014). O uso de substâncias psicoativas no Brasil: módulo1. (5ª ed). Brasília: Secretaria Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas. Brasil. (2012). Resolução 466/12- Trata de pesquisas em seres humanos e atualiza a resolução 196. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/ Reso466.pdf Dourado, G.O.L., Costa, M.C.M., Soares, A.D.A.S., Queiroz, A.A.F.L.N., Sousa, A.F.L.S., e Carvalho, L.K.C.A. (2014). Redução de danos no âmbito da Estratégia Saúde da Família: análise reflexiva. Revista Interdisciplinar. 7 (2):173-183. Elias, L.A., e Bastos, F.I. (2011). Saúde Pública, Redução de Danos e a Prevenção das Infecções de Transmissão Sexual e Sanguínea: revisão dos principais conceitos e sua implementação no Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, 16 (12):4721-4730. Doi: 10.1590/S141381232011001300021 Gabatz, R.I.B., Johann, M., Terra, M.C., e Padoin, S.M.M. (2013). Percepção do usuário sobre a droga em sua vida. Escola Anna Nery, 17 (3), 520-525. Doi: 10.1590/S1414-81452013000300016 Machado, L.V., e Boarini, M.L. (2013). Políticas Sobre Drogas no Brasil: a Estratégia de Redução de Danos. Psicologia: Ciência e Profissão, 33 (3), 580-595. Doi: 10.1590/S1414-98932013000300006


Maciel, L.D., Zerbetto, S.R., Filizola, C.L.A., Dupas, G., e Ferreira, N.M.L.A. (2013) Consequências e dificuldades da dependência química no âmbito familiar: uma revisão de literatura. Revista De Atenção Primária À Saúde, 16 (2): 187-196. Disponível em: http://ojs2. ufjf.emnuvens.com.br/aps/article/viewFile/6856/3329 Minayo, M.C.S. (2014). O desafio do Conhecimento. Pesquisa qualitativa em saúde. (14ª ed). São Paulo: Hucitec. Passos, E.H., e Souza, T.P. (2011). Redução de Danos e Saúde Pública: Construções Alternativas à Política Global de “guerra as drogas”. Psicologia & Sociedade; 23 (1):154-162. Doi: 10.1590/S0102-71822011000100017 Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas. (2010). Glossário de álcool e drogas / Tradução e notas: J. M. Bertolote. Brasília: Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas.

Silva, L.A.L.R.S. (2015). A inserção da família no tratamento ao usuário de drogas: uma revisão integrativa. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Escola de Enfermagem. Trad, S.N.S., Trad, L.A.B. e Romani, J.O. (2013). Contribuições das Ciências Sociais ao estudo sobre drogas e o diálogo com a produção nacional contemporânea. In: Maria Salete Bessa Jorge; Leny Alves Bomfim Trad; Paulo Henrique Dias Quinderé; Leilson Lira de Lima (Org.), Olhares Plurais Sobre o Fenômeno do Crack. (pp. 27-66). Fortaleza: EdUECE. Wandekoken, K.D. e Siqueira, M.M. (2013). Uso de Crack: É Possível o (Re)Encantamento?. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental; (9): 54-59. Disponível em: http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_ abstract&pid=S1647-21602013000100009&lng=pt&nr m=iso

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Artigo de Investigação

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Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0224

VIVÊNCIAS DOS ENFERMEIROS SOBRE MORTE E MORRER EM CUIDADOS INTENSIVOS: UMA REFLEXÃO FENOMENOLÓGICA | Ricardo Silva1; Isabel Lage2; Ermelinda Macedo3 |

RESUMO CONTEXTO: Na atualidade a morte tem vindo a ser remetida para o hospital em detrimento do espaço íntimo do lar. As unidades de cuidados intensivos são altamente tecnológicas, abertas e destituídas de privacidade, onde a morte é um fenómeno frequente, algumas vezes inesperado, mas quase sempre traumático. Neste contexto, o enfermeiro é confrontado com diversos dilemas e emoções que podem comprometer a sua saúde mental e condicionar os cuidados que presta a alguém em final de vida. OBJETIVOS: Explorar e descrever a experiência da morte e do morrer vivida pelos enfermeiros numa unidade de cuidados intensivos e de compreender o significado que lhe atribuem. MÉTODOS: Optámos pela realização de um estudo qualitativo, exploratório e descritivo, de base fenomenológica. Os participantes (N=25) foram selecionados por conveniência tendo a amostra sido atingida por saturação teórica. Os dados foram recolhidos com recurso à entrevista não estruturada e analisados segundo a reflexão fenomenológica das narrativas, segundo a perspetiva de van Manen (2016). RESULTADOS: Da análise das narrativas emergiram cinco temas: condicionantes da perceção dos enfermeiros sobre a morte e o morrer; práticas e contextos de cuidados ao doente em morte iminente; práticas e contextos de cuidados à família; mecanismos de adaptação; e conflitos internos na gestão dos cuidados. CONCLUSÕES: Estes resultados permitem uma compreensão mais abrangente do objeto em estudo e orientam as intervenções dos enfermeiros para um cuidado centrado na pessoa, digno e confortador para a família e doentes que se confrontam com a morte neste e noutros contextos. PALAVRAS-CHAVE: Morte; Enfermagem; Cuidados críticos

RESUMEN

ABSTRACT

“Vivencias de los enfermeros sobre muerte y morir en cuidados críticos: Una reflexión fenomenológica”

“Nurses’ experiences about death and dying in intensive care: A phenomenological reflection”

CONTEXTO: En la actualidad la muerte ha sido remitidas al hospital en detrimento del espacio íntimo del hogar. Las unidades de cuidados críticos son altamente tecnológicas, abiertas y carentes de privacidad, donde la muerte es un fenómeno frecuente, inesperado e traumático. En este contexto, el enfermero se enfrenta a diversos dilemas y emociones, que pueden comprometer su salud mental y, consecuentemente, condicionar los cuidados que presta a alguien en final de la vida. OBJETIVOS: Explorar y describir la experiencia de la muerte y del morir vivida por los enfermeros en cuidados críticos, y comprender el significado que le atribuyen. METODOLOGÍA: Optamos por la realización de un estudio cualitativo, exploratorio y descriptivo, de base fenomenológica. Los participantes (N=25) fueron seleccionados por conveniencia teniendo la muestra se ha alcanzada por saturación teórica. Los datos fueron recogidos con recurso a la entrevista no estructurada y analizados según la reflexión fenomenológica de las narrativas, según la perspectiva de van Manen (2016). RESULTADOS: Del análisis de las narrativas surgieron cinco temas: condicionantes de la percepción de los enfermeros sobre la muerte y el morir; prácticas y contextos de atención al enfermo en muerte inminente; prácticas y contextos de cuidado de la familia; mecanismos de adaptación; y conflictos internos en la gestión del cuidado. CONCLUSIONES: Estos resultados permiten una comprensión más amplia del objeto en estudio y pueden orientar las intervenciones de los enfermeros, para un cuidado más centrado en la persona, y más digno para la familia y enfermos, que enfrentan la muerte.

BACKGROUND: Death is now being sent to the hospital at the expense of the intimate space of the home. Intensive care units are a highly technological space, open and deprived of privacy, where death is a frequent phenomenon, sometimes unexpected, but almost always traumatic. In this context, the nurse is confronted with diverse dilemmas and emotions that can compromise her mental health and consequently, condition the health care that gives to someone who experiences the end-of-life. AIM: To explore and describe the experience of death and dying experienced by nurses in an intensive care unit, and understands the meaning attributed to it. METHODS: We opted for a qualitative study, exploratory and descriptive, of phenomenological basis. The participants (N=25) were selected by convenience, and the sample being reached by theoretical saturation. The results were collected with the unstructured interview and analysed according to phenomenological reflection of the narratives in light of the prospect of van Manen (2016). RESULTS: From the analysis of the narratives emerged five (5) themes: conditioners of nurses’ perception of death and dying; practices and contexts of patient care in imminent death; practices and contexts of care to the family; mechanisms of adaptation; and internal conflicts in the management of care. CONCLUSIONS: These results allow a broader understanding of the object under study and can guide the nurses´ interventions towards more person-centered, more dignified and more comforting care for the family and patients facing death in this and other contexts.

DESCRIPTORES: Muerte; Enfermería; Cuidados críticos

KEYWORDS: Death; Nursing; Critical care Submetido em 31-03-2018 Aceite em 30-06-2018

1 Mestre em Enfermagem da Pessoa em Situação Crítica; Enfermeiro especialista em Médico-Cirúrgica no Hospital de Braga, Braga, Portugal, ricardosilvarici@hotmail.com 2 Doutora em Enfermagem; Enfermeira Especialista em Médico-Cirúrgica; Professora Coordenadora na Universidade do Minho, Escola de Enfermagem, ilage@ese.uminho.pt 3 Doutora em Psicologia; Enfermeira Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica; Professora Adjunto na Universidade do Minho, Escola de Enfermagem, Braga, Portugal, emacedo@ese.uminho.pt Citação: Silva, R., Lage, I., & Macedo, E. (2018). Vivências dos enfermeiros sobre morte e morrer em cuidados intensivos: Uma reflexão fenomenológica. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (20), 34-42. doi: 10.19131/rpesm.0224 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 34


INTRODUÇÃO Ao longo dos tempos a morte tem vindo a ser remetida para o hospital em detrimento do espaço íntimo do lar. As unidades de cuidados intensivos (UCI) diferenciamse pela tecnologia de ponta, meios avançados de monitorização e de terapêutica farmacológica, e têm como objetivo recuperar e tratar falências multiorgânicas que colocam a vida da pessoa em risco, atribuindo-lhe um significado curativo. Apesar do significado curativo destas unidades, a incidência de mortes ocorre com alguma frequência (Direção-Geral da Saúde, 2003; Urden, Stacy, & Lough, 2008; Silva e Lage, 2010). Desde sempre, os enfermeiros vivenciam uma realidade enraizada, norteada pela cura e pelo sucesso terapêutico. Contudo, muitas vezes são confrontados com a finitude humana, a qual põe em causa a tecnologia e o conhecimento científico. As situações de morte e do morrer em cuidados intensivos (CI) colocam aos enfermeiros desafios pessoais e profissionais que exigem uma alteração de paradigma de prestação de cuidados. Resultados de estudos sugerem que os enfermeiros neste contexto vivenciam a morte e o morrer envolvidos em sentimentos de respeito pela pessoa e sua família, disponibilidade e de defesa (advocacy) do doente (Kongsuwan & Locsin, 2010; Valiee, Negarandeh, & Nayeri, 2012; Robichaux & Clark, 2006; Fridh, Forsberg & Bergbom, 2009). Porém, é também evidente a carga emocional relacionada com a morte inesperada (King & Thomas, 2013), que se traduz em sentimentos de ansiedade, depressão e falta de esperança, sendo que, a sua intensidade é diretamente proporcional à idade do doente, nível de consciência, morte cerebral ou doação de órgãos (Vallie et al., 2012). Questões relacionadas com a suspensão de medidas (Espinosa, Young, Symes, Haile, & Walsh, 2010) e a não participação na tomada de decisão (Fridh et al., 2009; Espinosa et al., 2010) assumem, neste contexto de cuidados, sensações variáveis, que podem influenciar a experiência dos enfermeiros perante a morte e o morrer dos doentes que cuidam, adotando mecanismos de adaptação que visam preservar a sua saúde mental (Shorter & Stayt, 2009). A evidência assinala, também, a importância de uma gestão adequada da comunicação com a família durante o processo em que a morte será inevitável (King & Thomas, 2013) considerando, ainda, que esta comunicação não deve cessar após a prestação dos cuidados post-mortem (King & Thomas, 2013; Fridh et al., 2009).

Outros dados apontam para necessidade de formação adequada para prestar cuidados a pessoas em processo de morte, nomeadamente em ações paliativas (Espinosa et al., 2010). Acresce, ainda, que, de acordo com Fridh et al. (2009), o processo de cuidar em fim de vida é desgastante para os enfermeiros em contexto de CI, sendo, por isso, necessário tempo para a recuperação, de forma a poderem cuidar de outros doentes que, aparentemente, tenham necessidade de cuidados semelhantes. Considerando a evidência científica, a experiência profissional e a preocupação sobre a reflexão acerca da experiência da morte e do morrer dos doentes em UCIs, optou-se por se realizar um estudo qualitativo orientado pela questão de investigação: Que significado atribuem os enfermeiros à sua experiência de lidar com a morte e o morrer na unidade de cuidados intensivos? Foram definidos como objetivos: i) explorar o significado que os enfermeiros atribuem à morte e ao morrer numa unidade de cuidados intensivos; ii) descrever o significado que os enfermeiros atribuem à morte e ao morrer numa unidade de cuidados intensivos e; iii) compreender o significado que os enfermeiros atribuem à morte e ao morrer numa unidade de cuidados intensivos. MÉTODOS Optou-se por um estudo qualitativo e exploratório, de base fenomenológica, tendo por referência a perspetiva de van Manen (2016). Para van Manen (2016, p. 25) a “fenomenologia é, por um lado, a descrição da vivência da qualidade dos momentos vividos e, por outro lado, a descrição do significado das expressões de vida experienciadas”. Foram estudados todos os enfermeiros de uma Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente (UCIP), de um hospital da região norte de Portugal, que obedeciam aos seguintes critérios de elegibilidade: i) trabalharem na UCIP há pelo menos cinco anos; ii) terem vivido a experiência de morte no contexto da UCIP há pelo menos mais de uma semana, atendendo a que van Manen (2016) defende que a realidade da experiência vivida obtém-se quando surge a consciência refletida do fenómeno o que pressupõe um distanciamento temporal entre a experiência vivida e da experiência no momento. Embora o autor não dê indicação precisa do tempo necessário, a morte ocorre frequentemente na UCIP, razão pela qual se optou por este espaço temporal, ii) aceitarem de uma forma livre e esclarecida a participação no estudo e a gravação áudio da entrevista.

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Excluíram-se os participantes que estivessem a vivenciar um processo de luto pessoal, na medida em que as experiências recentes de morte de familiares e amigos poderiam influenciar as suas perspetivas e comprometer a profunda compreensão da consciência refletida, no que diz respeito à essência do significado do fenómeno da morte e do morrer do ponto de vista profissional. Recorreu-se a uma amostragem de conveniência, tendo a amostra teórica final sido atingida por saturação dos dados (Bogdan & Biklen, 2013) após a realização de entrevistas a vinte e cinco participantes (N=25). Considerando que a entrevista atende ao propósito específico de obter e explorar as narrativas constituindo, em si, um recurso à compreensão profunda da essência do significado do fenómeno em estudo (van Manen, 2016; Bogdan & Biklen, 2013; Streubert & Carpenter, 2013), recorreu-se à entrevista não estruturada. Do guião da entrevista constavam 2 partes. A primeira com quatro (4) questões de natureza biográfica e social (idade, sexo, habilitações literárias e tempo de exercício profissional) e uma (1) questão relativa à data da última experiência profissional de morte na UCIP. A segunda parte dizia respeito à questão aberta, a qual tinha como objetivo recolher informação o mais completa possível que permitisse compreender o significado que os enfermeiros atribuem à morte e ao morrer em CI, sendo assim formulada: Sendo a morte e o morrer um acontecimento com o qual lida frequentemente na unidade de cuidados intensivos polivalente, que significado atribui a esta experiência? O estudo foi aprovado pela Subcomissão de Ética para as Ciências da Vida e da Saúde (SECVS) da Universidade do Minho e pela Comissão de Ética para a Saúde do Hospital onde se realizou a investigação. Previamente procurou-se dar a conhecer ao entrevistado o propósito da entrevista bem como os objetivos do estudo, assegurando o anonimato e a confidencialidade dos dados recolhidos. Foi assinado o consentimento informado, livre e esclarecido, sendo ainda assegurado que as gravações digitais seriam destruídas após a transcrição das narrativas e análise dos dados. A colheita dos dados decorreu ao longo de três (3) meses na UCIP em ambiente propício para o efeito e de acordo com a disponibilidade dos participantes. As entrevistas tiveram duração média de onze (11) minutos, com um mínimo de cinco (5) e um máximo de vinte e dois (22) minutos.

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Na impossibilidade de se realizar a validação das entrevistas pelos participantes após o final da entrevista, acordou-se o envio por correio eletrónico da transcrição da entrevista a cada participante tendo, assim, a possibilidade de eliminar e/ou retificar o seu conteúdo. Os dados foram sujeitos aos procedimentos da análise segundo o método da reflexão fenomenológica das narrativas (van Manen, 2016) com a intenção clara de descrever e interpretar as estruturas essenciais da experiência vivida. Para van Manen (2016, p. 92) “normalmente podemos ter 3 aproximações sobre aspetos temáticos encobertos ou isolados de um fenómeno em algum texto”. Nesta perspetiva foram seguidos os procedimentos preconizados pelo autor de referência, tendo realizado: i) a aproximação holística; ii) a aproximação seletiva e iii) a aproximação detalhada ou linha por linha. Mais especificamente, através da aproximação holística pretendeu-se a aproximação ao texto como um todo, perguntando qual a frase que poderia captar o significado principal do mesmo, de modo a expressar esse significado através da formulação de uma frase. Em relação à aproximação seletiva, leu-se e releu-se diversas vezes o corpus de análise, questionando quais as frases ou declarações reveladoras do fenómeno em estudo. Já na aproximação detalhada, ou linha a linha, leu-se todas as frases ou frase a frase e perguntou-se o que é que a frase revelava sobre o fenómeno ou experiência descrita, de forma a emergirem os temas e subtemas (van Manen, 2016). Da análise resultante das diferentes e sucessivas operações de redução dos dados emergiram cinco (5) temas principais (e respetivos subtemas): condicionantes da perceção dos enfermeiros sobre a morte e o morrer; práticas e contextos de cuidados ao doente em morte iminente; práticas e contextos de cuidados à família; mecanismos de adaptação; conflitos internos na gestão dos cuidados. RESULTADOS A média de idades dos participantes rondou os trinta e seis (36) anos. Sete (7) participantes são do sexo masculino e dezoito (18) participantes do sexo feminino, com idades compreendidas entre os vinte e sete (27) e os cinquenta e cinco (55) anos. A maioria dos enfermeiros eram detentores do grau de licenciado. Dos restantes, dois (2) possuíam pós-graduação, cinco (5) o título de especialista e, um (1) grau de mestre. Relativamente ao tempo do exercício profissional na UCIP, a média situou-se nos oito (8) anos.


O tema Condicionantes da perceção dos enfermeiros sobre a morte e o morrer traduz um conjunto de elementos que geram diferentes entendimentos sobre este fenómeno. Das narrativas que deram origem a este tema pode inferir-se que a morte cerebral, a doação de órgãos, o “controlo” da morte, as crenças religiosas do enfermeiro, a proximidade com o doente e o estado emocional do enfermeiro são decisivos na perceção destes profissionais sobre a morte e o morrer. “Em relação à morte cerebral, que é outra questão, que nos afeta, o grande problema muitas vezes é a ausência ou a falta de conhecimento da família e a dificuldade em aceitar e perceber no fundo a questão de morte cerebral, se associado à doação de órgãos” (E6). “A morte nos CI é um fenómeno controlado na maior parte das vezes, portanto não há, salvo raras exceções, mortes surpresas (…) na UCI” (E2). “(…) Existem situações que me custam mais, a morte de doentes do que outra, porque me relaciono com família, me relaciono com o doente, vejo a evolução do doente e às vezes custa-nos mais” (E10). “Mas isto difere e, depois também acho que o nosso estado pessoal e psíquico também influencia um bocado. Às vezes estamos mais bem preparados, custa-nos menos, quando às vezes estamos mais em baixo, acho que é mais difícil encarar este processo de morte” (E10). Ainda, no que diz respeito às condicionantes da perceção dos enfermeiros sobre a morte e o morrer, observa-se que algumas variáveis associadas ao próprio doente e família, designadamente a idade e a história de vida familiar, suscitam alguma reflexão e sentimentos. “Às vezes ponho-me a pensar, ou na vida que a pessoa teve, ou nos filhos (…). Por trás daquela pessoa que está ali morta há uma história, há uma vida, há pessoas envolvidas, há família, amigos e, realmente tenho essa perspetiva… naquela altura de imaginar um bocadinho a vida” (E14). “Quando são pessoas jovens sentimos sempre, mais do que fosse uma idade já avançada” (E24). Relativamente ao tema Práticas e contextos de cuidados ao doente em morte iminente, e no que reporta ao trabalho em equipa, as opiniões dos enfermeiros oscilam entre a manifestação de que existe tomada de decisão unilateral (médica) e o trabalho em equipa. Emerge a futilidade terapêutica como uma prática presente, havendo, necessariamente, o recurso ao uso frequente dos fármacos e da tecnologia para manter a vida do doente. No entanto, as narrativas também evidenciam a prática do cuidado digno que é prestado à família e ao doente em morte iminente, bem como, o devido reconhecimento do papel do enfermeiro.

“Eu acho que apesar de nós sermos importantes na equipa, não temos qualquer poder de decisão em suspender ou não medidas a um doente, apesar de se falar que esta decisão é uma decisão multidisciplinar, não é, quem decide é o médico” (E17). “Aqui eutanásia não. Mas distanásia tem-se a noção que se faz, investem, investem, investem…” (E3). “E depois temos os casos em que eles investem…investem e sabem que não vão ter resultados. Eles sabem que não vão recuperar, só que muitas vezes eles não querem tomar a decisão) (E24). “Aqui, há uma preocupação pelo conforto do doente. Mesmo em situações de parar de escalar medidas, há sempre tanto da nossa parte como dos médicos, analgesia e conforto” (E8). “E depois, são pessoas que além de enfrentar aquele processo de dor e de perda, também têm uma palavra de apreço para connosco e, isso acaba por ser sempre gratificante, porque ainda nos agradecem” (E11). No que se refere aos contextos de cuidados, os participantes refletem sobre as diferenças relacionadas com os cuidados associados à morte e ao morrer nas UCI e em outras unidades onde já tinham prestado cuidados a doentes em fim de vida. “Eu comecei a trabalhar no Instituo Português de Oncologia, e lá temos uma perceção da morte… um bocadinho diferente. Aqui é mais tecnológico e, às vezes temos a tendência de ver a família como uma máquina” (E3). “Aqui a morte é mais humanizada… no serviço de urgência às vezes os doentes faleciam e nós nem dávamos conta, não dávamos por isso (…) Aqui não, salvo exceções muito raras em que o doente agudiza muito rapidamente e acaba por falecer. Habitualmente é sempre uma morte mais acompanhada” (E4). Quanto ao tema Práticas e contextos de cuidados à família existe um conjunto de variáveis que influencia as perceções dos enfermeiros sobre o fenómeno em estudo, fundamentalmente associadas ao conforto e privacidade, tendo em conta a importância de promover a presença da família na morte e no morrer, e o respeito pela vontade do doente e família. As narrativas sugerem também a necessidade de o enfermeiro prestar apoio psicológico, ser advogado e defensor da família. Nesse sentido, o propósito da implementação da consulta de follow-up, às famílias que veem partir o seu familiar e a necessidade de um apoio no âmbito da psicologia, ilustram alguns significados.

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“Têm livre acesso à unidade, portanto, não há restrições no número de visitas como é habitual. Disponibilizamos a entrada dos familiares, seja a que hora for” (E4). “Estes cuidados em fim de vida podem estar expressos à família, e muitas vezes nós não temos esse conhecimento, porque também não o procuramos. Agora com a nova lei do testamento vital, provavelmente poderá cada vez mais existir esse conhecimento (…)” (E6). “Claro que temos de ser humanos, criar empatia com as famílias, ter respeito por esses momentos, e facilitar tudo o que seja possível no apoio à família” (E21). “Um dia não são dias e vai-se fazendo à medida que se pode, alguns dias melhor, outros dias pior, mas acho que devia haver um follow-up, mesmo das famílias que perdem alguns familiares aqui” (E12). “E ter o apoio do psicólogo, acho que é muito importante. Mesmo durante a visita, acho que devíamos ter aqui uma pessoa alguns dias por semana, fixa para o apoio aos familiares” (E14). Ainda no âmbito deste tema, surgem alguns elementos associados à gestão de más notícias e ao processo de luto das famílias como condicionantes da experiência dos enfermeiros. “Mas existem situações que nos custam sempre mais… são aquelas situações em que a família não está preparada para receber a notícia de que o seu familiar vai morrer” (E3). “Não foi um doente que faleceu passado umas horas, como era perspetivado, e à família custou-lhe imenso […]. O doente estava sedado e com analgesia, esse aspeto nós tínhamos salvaguardado, o doente estava confortável. Mas, o mesmo não se passava com a família e acho que aí é mais complicado o processo de luto, porque acaba por ser um luto, um luto que apesar de a pessoa estar viva é complicado” (E7). O tema Mecanismos de adaptação sustenta a importância da adaptação psicológica, relacionada com as experiências de morte e do morrer vividas pelos enfermeiros na UCI. Os relatos traduzem a necessidade de os enfermeiros adotarem mecanismos de adaptação, designadamente, a fuga, o apoio entre os pares e familiares e o recurso às emoções. “Não podemos apegar-nos muito aos doentes, não podemos ligar-nos emocionalmente, porque também dificulta a realização do nosso trabalho (…). Se não nos defendermos e nos distanciarmos um bocadinho, depois não conseguimos lidar com a próxima situação” (E21).

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“Quando eu saio daqui vou a conduzir com o rádio ligado até casa e, em alguns dias, chego a casa e tenho efetivamente de falar daquilo que se passou, porque acaba por ser maior…” (E3). “E já chorei em frente à família, a chorar efetivamente, custou-me imenso, mas não consegui, não conseguia, é muito complicado, muito, muito complicado” (E3). Finalmente, o tema Conflitos internos na gestão de cuidados, parece dar conta da existência de duas realidades, que não sendo opostas surgem, aparentemente, como incompatíveis, perante a evidência das circunstâncias. Este facto gera em alguns enfermeiros um sentimento de conflito interno, na medida em que são arredados das decisões que deveriam ser tomadas no seio da equipa multidisciplinar. Falamos da discordância nos critérios de admissão na UCI e na discordância na transferência do doente face à sua situação clínica. “E depois há casos de doentes que entram na unidade que no meu ver não têm critérios para entrar; alguns acabam por morrer logo na entrada no serviço, ainda na semana passada aconteceu um caso” (E24) “Outro aspeto, que também vou falar e este é mais recente… é transferir o doente para outro hospital sem viabilidade, ou seja, o doente vai em peça em T, mas vai com indicação para não investir, porque não tem viabilidade. Para mim é assustador (…)” (E6). “Aqui também acontece uma coisa que para mim é bastante penosa, normalmente os doentes não morrem aqui, ou seja, a partir do momento em que se decide suspender medidas, o doente é colocado, ou em peça em T, ou outra e, é transferido para outro serviço. A mim custa-me um bocado …”(E12). DISCUSSÃO A perspetiva dos enfermeiros sobre a morte e o morrer é condicionada por elementos de natureza vária podendo trazer-lhes sofrimento, quando envolvidos com a morte do doente, particularmente quando se trata de doentes jovens, de mortes inesperadas e, de histórias de vida carregadas por um grande simbolismo afetivo e emocional, tal como descrevem King & Thomas (2013) e Espinosa et al. (2010). O sofrimento emocional relacionado com a morte cerebral e a doação de órgãos encontra paralelo nos estudos de Ronayne (2009) e de Shorter & Stayt (2009), onde também realçam a grande prevalência de jovens com diagnóstico de morte cerebral e a doação de órgãos, algo que em muitas ocasiões se torna sofrível para os enfermeiros, nomeadamente


quando criam uma recriação do “eu” pela proximidade de idades, ou mesmo, quando se identificam com o acontecimento, porque encaram aquela realidade como se fosse a dos “seus”. A ideia de morte “controlada” nas UCI, manifestada por alguns participantes deste estudo, dá eco ao sustentado por Shorter & Stayt (2009), quando afirmam, que os doentes estão monitorizados e com suporte de medidas, que visam o controlo de todo o processo. A proximidade quase afetiva que, por vezes, o enfermeiro estabelece com o doente e família é, frequentemente, sinónimo de um maior grau de sofrimento, nos momentos que antecede e no momento em que acontece a morte. Nesse sentido, a experiência de luto é tanto ou mais perturbadora quanto maior for o vínculo ao doente e à família. As relações de proximidade, bem como a experiência de luto, também se veem refletidas nos estudos de Thompson, Austin, & McGrath (2010) e de Shorter & Stayt (2009). Por outro lado, o estado emocional dos enfermeiros condiciona a sua perceção sobre a morte e o morrer, tal como defende Espinosa et al. (2010). Os mesmos referem que deve ser assegurada a condição psicológica afetiva e emocional do enfermeiro, no momento em que se atribui um doente em morte iminente, protegendo, desse modo, o profissional enquanto pessoa, mas também o doente e a família. Como forma de assegurar o mentalmente “são”, alguns participantes abordaram a questão da crença, como forma de um melhor entendimento sobre a morte e o morrer, tendo por base a sua própria crença e o suporte que encontram na sua religião, apoiando os resultados de Valiee et al. (2012) e de Souza, Ribeiro, Rosa, Gonçalves, Silva, e Barbosa (2013). A pertinência da formação foi abordada apenas por um participante do estudo, embora seja um assunto de análise por alguns investigadores que destacam a importância da reflexão e da discussão sobre a morte e o morrer nas salas de aula (Thompson et al., 2010). No tema Práticas e contextos de cuidados ao doente em morte iminente, as narrativas deixam claro que a aplicação de medidas fúteis é, por vezes, uma realidade quando se assiste ao investimento desmesurado assente na farmacologia e na tecnologia avançada, em detrimento de ações que tenham somente em conta a humanização da morte. Por outro lado, o uso de fármacos e de meios tecnológicos permite o “controlo da situação” e o amenizar de um qualquer sentimento de culpa.

As implicações relacionadas com a futilidade terapêutica e com o uso insipiente de critérios e princípios éticos são também aspetos apontados por alguns estudos (Robichaux & Clark, 2006; Fridh et al., 2009; Espinosa et al., 2010, Shorter & Stayt, 2010). As narrativas permitem inferir, ainda, que os enfermeiros procuram minorar o desconforto, o sofrimento e a dor, com a intenção clara de promoverem a dignidade humana na morte do doente, princípio também corroborado por Shorter & Stayt (2010). Algumas práticas e condutas descritas nas narrativas parecem deixar transparecer uma filosofia curativa, em detrimento duma perspetiva paliativa. Todavia, os participantes do estudo revelaram comportamentos que traduzem respeito absoluto pela dignidade da pessoa que está a morrer, proporcionando o conforto e o controlo da dor, dados que são corroborados por King & Thomas (2013). As palavras de reconhecimento por parte das famílias e, por vezes, do doente em fim de vida são descritas com orgulho e sentido de dever cumprido. É notório que os vários contextos de cuidados influenciam determinantemente o entendimento e a forma como experienciam a morte dos seus doentes na UCI, na medida em que, as UCI permitem arredar a consciência da morte e do doente, pelo uso devido de fármacos e da tecnologia, algo inacessível às enfermarias onde, por vezes, a morte ocorre de uma forma descontrolada e descuidada, tal como referem Shorter & Stayt (2009). A partir das narrativas pode constatar-se a existência do trabalho em equipa, no entanto, a decisão de suspender medidas é uma decisão unilateral e exclusivamente médica. Também, dados vinculados aos estudos de Fridh et al. (2009) e de Amaral, Soares, e Souza (2010) traduzem dificuldades no relacionamento e na colaboração entre equipas. Quanto à falta de intervenção dos enfermeiros na tomada de decisão, os estudos de Robichaux & Clark (2006), de Fridh et al. (2009) e de Espinosa et al. (2010), vêm apoiar estes resultados, no sentido da tomada de decisão ser unilateral, não havendo qualquer tipo de decisão conjunta que tenha em conta a perspetiva médica e de enfermagem. Relativamente ao tema Práticas e contextos de cuidados à família, a privacidade no momento da morte no contexto da UCI é relatada com alguma preocupação, por nem sempre ser possível proporcionar as melhores condições nesta unidade de cuidados, num momento imbuído de enorme simbolismo e desgaste emocional. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 39


No entanto, são evidentes algumas ações que visam contornar as vicissitudes da UCI, com o objetivo de proporcionar a melhor privacidade e conforto à família. Kongsuwan & Locsin (2010) revelam que os participantes do seu estudo relatam dificuldade em conseguir o ideal de privacidade e de conforto no momento da morte, devido ao ruído, à logística e espaço físico, informação também sustentada por Fridh et al. (2009). Os dados relacionados com a possibilidade da presença da família no momento da morte do seu familiar vão de encontro aos resultados do estudo de Fridh et al. (2009). Depreende-se, ainda, que os participantes, ao incentivarem a presença da família, também pretendem promover a relação psicológica e física entre o doente em fase final de vida e os familiares. Os participantes do estudo revelam também que o apoio psicológico prestado pelo enfermeiro tem como único destinatário a família. Esse apoio traduz grande sobrecarga emocional, para além da relacionada com os cuidados que estão associados à morte e ao morrer. Alguns estudos abordam o apoio psicológico, tendo em conta as necessidades do enfermeiro e não propriamente da família (Shorter & Stayt, 2009; Thompson et al., 2010). No entanto, estudos que abordam a morte cerebral e a doação de órgãos enfatizam a atenção que os enfermeiros dispensam à família do ponto de vista psicológico no esclarecimento do conceito de morte cerebral e na gestão da doação de órgãos (Pearson, Robertson, Walsh, & Fitzgerald, 2001; Ronayne, 2009). Em todas as circunstâncias, mas particularmente em situações de confronto com a morte, a gestão de más notícias exige competências de comunicação, fundamentalmente quando a família não está à espera nem preparada para as receber, ou a finitude não é previsível. Algumas das narrativas traduzem as dificuldades sentidas pelos enfermeiros, quando estes são os interlocutores e gestores das más notícias. King & Thomas (2013) apontam para que o domínio da comunicação da morte e do morrer resulte num valor acrescentado e numa poderosa arma terapêutica. Por sua vez, Espinosa et al. (2010) vão de encontro às dificuldades narradas pelos participantes, sugerindo ações de formação e protocolos dirigidos à gestão das más notícias. Os dados relativos à gestão do processo de luto das famílias ancoram-se nos resultados do estudo de Forsberg, Flodén, Lennerling, Karlsson, Nilsson, & Fridh (2014), onde é manifesto o respeito e cordialidade pelo doente e pela família em todo o processo de luto, através de uma adequada gestão do tempo, da comunicação, do silêncio e do espaço vital. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 40

Por outro lado, o enfoque dessa abordagem é mais abrangente e profundo nos fenómenos da morte cerebral e doação de órgãos (Pearson et al., 2001; Ronayne, 2009). O follow-up, percebido como o regresso da família à UCI no pós-morte do seu familiar, foi lembrado nas narrativas como intenção futura. Fridh et al. (2009) e Forsberg et al. (2014), ao abordarem o follow-up, ressalvam a importância do regresso à UCI, porque, assim, assegura-se o esclarecimento das dúvidas suscitadas pela família, a possibilidade de ouvir as suas opiniões, quanto aos cuidados prestados e, por fim, o apoio no processo de luto. As narrativas agregadas ao tema Mecanismos de adaptação são consistentes com a adoção de comportamentos de fuga por parte dos enfermeiros, como forma de se defenderem do processo de morte do doente e do sofrimento vivido pela família. Estas formas de estar perante a morte também são apoiadas por Shorter & Stayt (2009) e por Espinosa et al. (2010). Nestes estudos depreende-se que a autoproteção emocional leva o enfermeiro a evitar uma relação de proximidade com o doente e com a família, como forma de evitar sofrimento nos momentos da morte e do morrer. Espinosa et al. (2010) definem-nos como “o enfermeiro duro” (p. 279). As narrativas também abordam a necessidade de os enfermeiros chorarem na presença da família e do doente no momento da morte, bem como, na procura dos colegas ou da família nos momentos de maior sobrecarga emocional. O choro, entendido como um mecanismo de adaptação, também foi referido no estudo de Thompson et al. (2010) e de Espinosa et al. (2010). Thompson et al. (2010), Shorter & Stayt (2009) e Espinosa et al. (2010) realçam a procura ou o apoio dos colegas de trabalho como uma mais-valia, permitindo aos enfermeiros a autoproteção emocional, bem como, a reflexão sobre as experiências vivenciadas da morte e do morrer na UCI. O tema Conflitos internos na gestão dos cuidados revela o desacordo na admissão de doentes com pouca probabilidade de recuperação e de sobrevivência funcional, o que vai de encontro ao pensamento de Rios (2001). As narrativas, revelam, também, divergências quanto às transferências de doentes para outras UCIP ou serviços, quando os mesmos estão em morte iminente. King & Thomas (2013) acrescentam que algumas dessas transferências ocorrem pela necessidade de vagas, tendo acontecido nos serviços do mesmo hospital.


CONCLUSÃO

IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA

As narrativas que dão voz aos participantes permitiram uma melhor compreensão do significado que os enfermeiros da UCIP atribuíram à morte e ao morrer. Os dados deste estudo indicam que os enfermeiros, perante a morte e o morrer de um doente, vivem experiências diversas que condicionam diferentes perceções sobre este fenómeno. A perceção da morte e do morrer é condicionada por diversos fatores. É evidente a dificuldade de alguns participantes em aceitarem a morte dos doentes mais jovens, bem como histórias de vida com eventos dramáticos, embora assumam a morte como um fenómeno natural, mas por vezes banalizado. As práticas e contextos de cuidados ao doente e família são determinantes na perspetiva dos enfermeiros, observando-se o sofrimento das famílias que exige dos enfermeiros competências de comunicação adequadas, relativamente à gestão do luto e à comunicação de más notícias. Acresce ainda, que os enfermeiros se preocupam com a defesa dos direitos dos doentes e da família, na promoção da presença da família no momento da morte, tendo em atenção o direito à privacidade. A morte e o morrer geram uma grande carga emocional nos enfermeiros, levando-os a adotar mecanismos de adaptação permitindo autoproteção emocional, bem como, a reflexão sobre as experiências vivenciadas da morte e do morrer na UCI. Emergem ainda alguns conflitos internos na gestão dos cuidados, designadamente, quando se trata de decisões unilaterais que envolvem o potencial de recuperação e as transferências de doentes em morte iminente para outras unidades de cuidados. Os dados deste estudo apontam para que diferentes variáveis influenciem a perceção da morte e do morrer dos enfermeiros. Os participantes identificam alguns aspetos que podem contribuir para melhoria dos cuidados, nomeadamente aspetos relacionados com o equilíbrio psicológico dos profissionais, a necessidade de um atendimento à família personalizado e humanizado, a importância de promover um eficaz trabalho de equipa, a necessidade de formação acrescida sobre a morte e o morrer, de comunicação de más notícias e de gestão do luto.

Este estudo pode dar um contributo significativo para que a morte seja um acontecimento cada vez mais humanizado e mais digno, tanto para quem o vive, como para os profissionais que assistem os doentes e famílias permitindo, também, uma análise das práticas de cuidados em UCI, unidades onde a morte ocorre com muita frequência. A análise dos seus resultados sugere que a formação em fim de vida, que inclua o sofrimento, a comunicação de más notícias e a gestão do luto e estratégias de coping dirigida a enfermeiros que trabalham em UCI, possa constituir um caminho para a melhoria contínua dos cuidados e a melhor preparação dos enfermeiros para o enfrentamento destes processos. Ainda, as consultas de follow-up podem funcionar como um recurso para a recolha de informação relevante sobre os cuidados na morte e no morrer, com o objetivo de melhorar o acompanhamento das famílias e do doente ao longo de todos os momentos associados à morte e ao morrer, incluindo o processo de luto. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Amaral, M., Soares, E., & Souza, R. (2010). Relacionamento interdisciplinar de profissionais de saúde que atuam em unidades de alta complexidade. Revista de Pesquisa: cuidado é fundamental online, 2 (1), 646-654. Disponível em: http://www.seer.unirio.br/index.php/ cuidadofundamental/article/download/585/pdf_11 Bogdan, R., & Biklen, S. (2013). Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria e aos métodos. (12ª ed.). Porto: Porto Editora. Direção-Geral da Saúde. (2003). Cuidados intensivos: recomendações para o seu desenvolvimento. Disponível em: http://www.dgs.pt/upload/membro.id/ficheiros/ i006185.pdf Espinosa, L., Young, A., Symes L., Haile, B., & Walsh, T. (2010). ICU nurses experiences in providing terminal care. Critical Care Nursing Quarterly, 33 (3), 273-281. Doi: 10.1097/CNQ.0b013e3181d91424 Forsberg, A., Flodén, A., Lennerling, A., Karlsson, V., Nilsson, M., & Fridh, I. (2014). The core of after death care in relation to organ donation – a grounded theory study. Intensive and Critical Care Nursing, 30, 275-282. Doi: 10.1016/j.iccn.2014.06.002. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 41


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Artigo de Investigação

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Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0225

PREVALÊNCIA DE SINTOMAS DEPRESSIVOS E/OU ANSIOSOS EM PESSOAS COM HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA E / OU DIABETES MELLITUS | Gabriela Neves Paula de Souza1; Rauni Jandé Roama Alves2; Luís Paulo Souza e Souza3; Alcindo José Rosa4 |

RESUMO CONTEXTO: A Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) e o Diabetes Mellitus (DM) têm sido apontados como condições que favorecem o desenvolvimento de transtornos emocionais. OBJETIVO: Investigar a prevalência de sintomas depressivos e/ou ansiosos (SDA) em pessoas com HAS e/ou DM cadastradas em uma Estratégia Saúde da Família do centro-oeste brasileiro. MÉTODOS: Trata-se de um estudo transversal e quantitativo. Foram investigados 106 adultos com HAS/DM, aos quais foram aplicados dois instrumentos: (1)Mini International Neuropsychiatric Interview, para avaliação dos SDA; (2) questionário sobre dados socioeconômicos, antropométricos, clínicos e adesão medicamentosa, para caracterização da amostra. RESULTADOS: Os principais achados indicaram a prevalência de SDA de 27,4% (IC95% 19,1-36,8; n = 29) na amostra total. Além disso, tais sintomas foram mais prevalentes nos seguintes estratos dessa população: mulheres (35,4%; IC95% 23,7 - 48,6; n = 22); pessoas com idade mais avançada (28,5%; IC95% 14,6 - 46,3; n = 10); pessoas sem companheiros (36,3%; IC95% 20,4 - 54,8; n = 12); pessoas que estudaram de zero a oito anos (27,8%; IC95% 18,3 - 39,0; n = 22). CONCLUSÃO: Os resultados foram compatíveis com outras pesquisas que indicaram alta prevalência de SDA em pessoas com HAS e/ou DM. Tais dados reforçam que cuidados com saúde mental devem ser implementados já na atenção primária dessa população. PALAVRAS-CHAVE: Prevalência; Saúde mental; Hipertensão; Diabetes mellitus

RESUMEN

ABSTRACT

“Prevalencia de síntomas depresivos y/o ansiosos en personas con hipertensión arterial sistémica y/o diabetes mellitus”

“Prevalence of depressive and/or anxious symptoms in people with systemic arterial hypertension and / or diabetes mellitus”

CONTEXTO: La Hipertensión Arterial Sistémica (HAS) y la Diabetes Mellitus (DM) se han señalado como condiciones que favorecen el desarrollo de trastornos emocionales. OBJETIVO: Investigar la prevalencia de síntomas depresivos y/o ansiosos (SDA) en personas con HAS y/o DM registradas en una Estrategia Salud de la Familia del centro-oeste brasileño. METODOLOGÍA: Se trata de un estudio transversal y cuantitativo. Se investigaron 106 adultos com HAS/DM, a los que se aplicaron dos instrumentos: (1) Mini International Neuropsychiatric Interview para la evaluación de SDA; (2) cuestionario sobre datos socioeconómicos, antropométricos, clínicos y adhesión medicamentosa, para caracterización de la muestra. RESULTADOS: Los principales hallazgos indicaron la prevalencia de 27,4% (IC95% 19,1-36,8, n = 29) de SDA en la muestra total. Además, estos síntomas fueron más prevalentes en los siguientes estratos de esa población: mujeres (35,4%; IC 95% 23,7 - 48,6; n = 22); las personas con edad avanzada (28,5%; IC 95% 14,6 - 46,3, n = 10); las personas sin compañeros (36,3%; IC95% 20,4 - 54,8, n = 12); las personas que estudiaron de cero a ocho años (27,8%; IC95% 18,3 - 39,0, n = 22). CONCLUSIÓN: Los resultados fueron compatibles con otras investigaciones que indicaron alta prevalencia de SDA en personas con HAS y/o DM. Tales datos refuerzan que la atención sanitaria mental debe implementarse ya en la atención primaria de esa población.

BACKGROUND: Systemic Arterial Hypertension (SAH) and Diabetes Mellitus (DM) have been identified as conditions that favor the development of emotional disorders. AIM: To investigate the prevalence of depressive and/or anxious symptoms (SDA) in people with SAH and/or DM enrolled in a Family Health Strategy in the center-west of Brazil. METHODS: This is a cross-sectional and quantitative study. It was studied 106 adults with SAH / DM to whom two instruments were applied: (1) Mini International Neuropsychiatric Interview, for evaluation of SDA; (2) questionnaire on socioeconomic, anthropometric, clinical data and drug compliance, for characterization of the sample. RESULTS: The main findings indicated a prevalence of 27.4% (95%CI 19.1-36.8, n = 29) of SDA in the total sample. In addition, such symptoms were more prevalent in the following strata of this population: women (35.4%; 95%CI 23.7-48.6, n = 22); people with more advanced age (28.5%; 95%CI 14.6 - 46.3; n = 10); people without partners (36.3%; 95%CI 20.4 54.8, n = 12); people who studied from zero to eight years (27.8%; 95%CI 18.3 - 39.0, n = 22). CONCLUSION: The results were compatible with other studies that indicated a high prevalence of SDA in people with SAH and/or DM. These data reinforce that mental health care should be implemented already in the primary care of this population.

DESCRIPTORES: Prevalencia; Salud mental; Hipertensión; Diabetes mellitus

KEYWORDS: Prevalence; Mental health; Hypertension; Diabetes Mellitus Submetido em 31-03-2018 Aceite em 03-07-2018

1 Psicóloga; Especialista em Arteterapia; Especializanda na Universidade Federal de Mato Grosso, Programa de Residência Multiprofissional em Saúde da Família, Rodovia Rondonópolis-Guiratinga, KM 06 (MT-270), Bairro Sagrada Família, 78735-910, Rondonópolis – Mato Grosso, Brasil, gabrielapsicoarte@gmail.com 2 Psicólogo; Doutor em Psicologia (área de concentração Avaliação Psicológica); Docente na Universidade Federal de Mato Grosso, curso de graduação em Psicologia e programa stricto sensu em Psicologia, 78735-910, Rondonópolis – Mato Grosso, Brasil, rauniroama@gmail.com 3 Enfermeiro; Doutorando em Saúde Pública (área de concentração Epidemiologia) na Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Medicina; Professor na Universidade Federal de São João del-Rei, Departamento de Medicina, 36301-182 São João Del Rei – Minas Gerais, Brasil, luis.pauloss@hotmail.com 4 Psicólogo; Doutor em Saúde Pública; Docente na Universidade Federal de Mato Grosso, curso de graduação em Psicologia, Mato Grosso, Brasil, alcindojrosa@gmail.com Citação: Souza, G. N. P., Alves, R. J. R., Souza, L. P. S., & Rosa, A. J. (2018). Prevalência de sintomas depressivos e/ou ansiosos em pessoas com hipertensão arterial sistêmica e/ou diabetes mellitus. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (20), 43-50. doi: 10.19131/rpesm.0225 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 43


INTRODUÇÃO As doenças e agravos crônicos não transmissíveis (DCNT) compõem um cenário complexo e preocupante na área da saúde, pois constituem a principal causa de morbimortalidade no mundo. Dentre as mais frequentes, estão a Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) e o Diabetes Mellitus (DM), que atingem uma em cada três e uma em cada dez pessoas adultas, respectivamente. De acordo com Machado e Campos (2015), suas incidências e prevalências estão associadas à transição demográfica e epidemiológica e, consequentemente, ao envelhecimento populacional. Esses autores afirmam, ainda, que tais condições geram altos custos públicos. Por exemplo, no Brasil, o gasto médio anual com medicamentos no Sistema Único de Saúde (SUS) é R$ 764.880,00 (aproximadamente € 191.220,00). Além disso, há também custos emocionais para as pessoas com esses quadros, pois estudos apontam que elas apresentam uma maior probabilidade de desenvolverem sintomas depressivos e/ou ansiosos (SDA). Em pesquisa realizada por Helena, Lasagno e Vieira (2010), avaliou-se a prevalência de transtornos mentais não psicóticos (TMNP), dentre eles SDA, em pessoas com HAS e/ou DM oriundas de Unidades de Saúde da Família de Blumenau, Santa Catarina, Brasil. Os selecionados (N = 710) foram submetidos a um questionário domiciliar com questões relativas às características socioeconômicas, pessoais e de medicamentos, e ao SelfReport Questionnaire-20 (SRQ-20). As variáveis estudadas foram submetidas à análise uni e multivariada. A prevalência desses transtornos foi de 39,4% e os fatores de maior associação a eles foram: ser do sexo feminino (RP= 1,50; IC95% 1,12-2,01; p<0,01), fazer uso de psicotrópicos (RP=1,74; IC95% 1,34-2,26; p<0,01), ter ficado hospitalizado e/ou alta frequência de comparecimento ao pronto-socorro no último ano (RP=1,30; IC95% 1,02-1,66; p = 0,03) e ser da classe econômica de consumo “E” (RP = 2,62; IC95% 1,09 - 6,27; p = 0,03), de acordo com a classificação da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP). Por sua vez, Oliveira e Sales (2005) buscaram verificar a ocorrência de SDA em indivíduos (N = 68) com HAS e/ ou DM atendidos por uma Equipe de Saúde da Família, bem como a adesão ao tratamento e apoio familiar. As autoras aplicaram algumas entrevistas sobre aspectos pessoais, uma escala que visava aferir SDA e realizaram a medição de glicemia e da pressão arterial em todos os participantes. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 44

Os resultados apontaram que 72% apresentaram SDA, e que, além disso, 54,4% não praticam atividades físicas, 55,9% apresentaram glicemia e alterações nos níveis pressóricos. As autoras inferiram possível influência da SDA na adesão ao tratamento e qualidade de vida dessa população. Além disso, apontou a importância dos grupos de educação em saúde como forma de suporte. Amaral et al. (2007) realizaram uma investigação mais específica, na qual buscaram identificar a prevalência de transtorno depressivo maior em 285 pessoas somente com HAS. Aplicaram o Inventário de Depressão de Beck (BDI) e a “Entrevista Estruturada para o Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais - Transtornos do Eixo I” para o rastreamento desses sintomas, tendo encontrado prevalência de 20%. Por outro lado, Braz et al. (2012) investigaram um grupo de pessoas somente com DM (N = 145), buscando averiguar a associação entre sintomas depressivos, variáveis sociodemográficas e clínicas e adesão ao tratamento medicamentoso. Aplicaram-se o BDI e a Medida de Adesão aos Tratamentos (MAT). O BDI indicou a prevalência de sintomas depressivos igual a 33,1%. Interessantemente, a prática de atividade física se associou com uma melhor avaliação no BDI (p = 0,05), mas não foi observada correlação clinicamente importante entre o BDI e o MAT. Lustman e Clouse (2005) também buscaram investigar evidências da comorbidade entre diabetes e o risco de depressão. Realizaram um estudo de revisão da literatura nas bases de dados PubMed, PsycINFO e MEDLINE, com os seguintes descritores: diabetes, depressão, controle metabólico, hiperglicemia, hipoglicemia; com delimitação de tempo de 1980 e 2002. De modo geral, os estudos encontrados evidenciaram que a depressão, quando presente em pessoas com diabetes, favorece diminuição no controle metabólico, baixa adesão à medicação e aos regimes dietéticos, redução da qualidade de vida e aumento dos gastos com cuidados de saúde. Vericaram, também, que um controle metabólico fraco pode exacerbar a depressão e diminuir a resposta aos antidepressivos. A psicoterapia e a farmacoterapia foram apontados como tratamentos que devem se fazer presentes nessa população. Para os autores, os esforços aprimorados para um bom controle glicêmico podem contribuir para melhorias no humor e nas percepções de bem-estar.


No entanto, apesar desses dados indicarem a presença dessas sintomatologias emocionais de modo contundente nos casos de HAS e DM, no contexto da Atenção Primária à Saúde (APS) do Brasil ainda são incipientes as propostas de avaliação e de intervenção que consideram os processos psicológicos como parte da multifatorialidade envolvida em seus cuidados, bem como em de outras condições. A atual política de saúde mental brasileira alimentouse de experiências exitosas de países europeus na substituição de um modelo de saúde mental baseado em hospitalização psiquiátrica por um modelo de serviços comunitários com forte inserção territorial. O Ministério da Saúde do Brasil (2013) divulgou, no caderno 34, diretrizes e ferramentas para esse modelo de cuidado em saúde mental na APS, compreendendo esse nível de atenção como um serviço estratégico que pode ser realizado por todos que compõem a equipe multiprofissional. Abrange desde estratégias de acolhida e momentos de reflexão, tendo como legítima a habilidade de empatia como uma intervenção em saúde mental que deve ser comum a todos os atuantes na área. Porém, um dos passos iniciais é reconhecer sintomatologias diversas, bem como compreender que algumas podem se fazer mais prevalentes, prática essa ainda incomum no cotidiano dos atendimentos realizados. O Apoio Matricial oferecido pelas equipes de Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) embasam a integralidade do cuidado e a responsabilização compartilhada dos casos entre equipes de Estratégia Saúde da Família (ESF), nesse nível da atenção. O que unifica o objetivo dessas equipes deve ser o entendimento do território e a relação de vínculo dos profissionais de saúde com os usuários. Essas políticas são aplicadas em todo território brasileiro, porém, há certa carência quando pensado ainda o centro-oeste do país. Essa carência envolve desde a realização de pesquisas de prevalência, como as supracitadas no início do presente texto, bem como o funcionamento prático dos atendimentos dos aspectos de saúde mental também já citados. Deste modo, a fim de reforçar o cuidado dos aspectos já na Atenção Primária à Saúde, principalmente relativos ao centro-oeste brasileiro, o presente estudo se propôs a investigar a prevalência de SDA em pessoas com HAS e/ou DM cadastradas em uma ESF presente nessa localização.

MÉTODOS Trata-se de um estudo transversal e quantitativo, realizado com 106 participantes com HAS e/ou DM provindos de uma ESF do distrito sul do município de Rondonópolis, Mato Grosso, Brasil. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Mato Grosso (CAAE 45225315.0.0000.5541), tendo sido realizado entre dezembro de 2016 e julho de 2017. O levantamento dos usuários com HAS e/ou DM foi realizado por meio da análise prévia dos prontuários, e, posteriormente, visita domiciliária. Foram considerados os seguintes critérios de inclusão: ser maior de 20 anos; residir na área de abrangência da ESF investigada; e, para as mulheres, também se adotou a condição de não ser gestante. Os de exclusão foram: algum comprometimento que não permitisse condições de resposta aos instrumentos (como deficiências e/ou transtornos psiquiátricos) e aqueles participantes que não fossem encontrados em seus domicílios em até três tentativas de contato. Inicialmente, foram incluídos no estudo 174 participantes, contudo, após exclusões, a amostra final foi composta por 106. Durante a visita domiciliária, foram aplicados dois instrumentos de autorrelato, que somente eram respondidos após os participantes lerem e assinarem o Termo de Consentimento Livre Esclarecido. Um dos instrumentos foi a Versão Brasileira 5.0.0 da entrevista diagnóstica padronizada breve Mini International Neuropsychiatric Interview (MINI) (Lecrubier et al., 2000), utilizada para caracterização dos sintomas de ansiedade e depressão. É organizada por 19 módulos que exploram 17 transtornos do Eixo I do DSM-IV, o risco de suicídio e o transtorno da personalidade anti-social. Identifica sinais diagnósticos positivos para os principais transtornos psicóticos e do humor. Para a presente pesquisa, foram utilizadas somente as seções A, B e O do instrumento, que possibilitam a identificação de sintomas característicos aos quadros de: episódio depressivo maior atual; episódio depressivo maior recorrente; transtorno distímico atual; e transtorno de ansiedade generalizada atual. Os participantes foram classificados com “SDA” quando apresentaram resultado positivo para pelo menos um desses quadros. Utilizou-se, ainda, um questionário para levantar os dados socioeconômicos, antropométricos, clínicos e de adesão medicamentosa. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 45


As prevalências de DAS aferidas pelo MINI e seus respectivos intervalos de confiança foram analisados de acordo com variáveis extraídas do questionário aplicado. Algumas dessas variáveis foram organizadas em estratos populacionais a fim de se extrair conclusões mais abrangentes e generalizáveis para a amostra estudada, que não foi tão ampla. Primeiramente, organizou-se a idade, dividindo-a em dois grandes grupos para análise dessas sintomatologias: adultos (de 20 a 59 anos) e idosos (60 anos ou mais). Por meio dessas classificações, buscou-se identificar os impactos de senilidade sobre os sintomas. A escolaridade foi categorizada em duas faixas: (a) zero a oito anos de estudo; (b) nove ou mais anos de estudo. Aferiu-se, desse modo, que as pessoas pertencentes à primeira faixa teriam tido acesso ao denominado Ensino Fundamental no Brasil, podendo ter um nível de escolaridade de analfabeto até de domínio satisfatório da leitura, escrita e do cálculo. Já na segunda, aferiu-se que as pessoas poderiam ter tido acesso desde ao denominado “Ensino Médio” até a pós-graduação, o que indicaria, provavelmente, capacidades mais elaboradas de leitura, escrita e raciocínio lógico e de diversos outros conhecimentos sociais, bem como um acesso a profissões mais estáveis e mais bem remuneradas. Buscouse identificar os impactos da escolarização, de acordo com classificações adotadas no Brasil. As rendas foram classificadas por meio dos salários mínimos: até meio, de meio a dois, de dois a cinco e de cinco a dez. As classes econômicas foram compatíveis a tais salários, sendo a classe “A-B” compatível a uma renda de mais de cinco salários mínimos (acima de R$ 4.780, aproximadamente, acima de € 1.195) e “C-D” de menos de cinco salários mínimos (Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa, 2016). Essas classificações favoreceriam verificar a análise das sintomatologias considerando o impacto econômico, também considerando classificações brasileiras. Foram consideradas variáveis menos possíveis de organização em estratos, tais como: raça ou cor da pele autodeclarada (branca; amarela; parda; indígena; preta) (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 2013), sexo (masculino; feminino), estado civil (com companheiro(a); sem companheiro(a)), trabalho (sim; não), moradia (própria; alugada), doença (HAS; DM; HAS e DM) e hábitos de vida (sedentarismo; tabagismo; uso diário de álcool; excesso de peso; adesão medicamentosa (baixa/mediana; elevada) (Morisky, Green & Levine, 1986). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 46

O banco de dados foi digitado no Microsoft Office Excel® 2007. A verificação e a tabulação do número de participantes, porcentagens e intervalos de confiança 95% (IC95%) foram realizadas utilizando o programa Epi Info®, versão 3.5.4. RESULTADOS A prevalência de SDA na amostra geral (N = 106) foi de 27,4% (IC95% = 19,1 - 36,8; n = 29). Maior prevalência foi encontrada em mulheres, nas pessoas com idade mais avançada, nos que não possuíam companheiros e nos que estudaram de zero a oito anos. Os participantes que se autodeclararam pertencer a raça/cor branca apresentaram menor prevalência desses sintomas, seguidamente pelas pessoas de cor parda, preta e indígena (Tabela 1). Tabela 1 - Prevalência de Sintomas Depressivos e/ou Ansiosos de Acordo com as Características Sociodemográficas dos Participantes (N = 106). Rondonópolis, Mato Grosso, Brasil, 2017. Variável

n (%; IC95%)*

Prevalência de sintomas depressivos e/ou ansiosos n (%; IC95%)**

Sexo Masculino

44 (41,5; 32,0 - 51,4) 7 (15,9; 6,6 - 30,0)

Feminino

62 (58,4; 48,5 - 67,9) 22 (35,4; 23,7 - 48,6)

Idade (anos) 20 – 59

71 (66,9; 57,1 - 75,8) 19 (26,7; 16,9 - 38,5)

≥ 60

35 (33,0; 24,1 - 42,8) 10 (28,5; 14,6 - 46,3)

Estado civil Com companheiro (a)

73 (68,8; 59,1 - 77,5) 17 (23,2; 14,1 - 34,6)

Sem companheiro (a)

33 (31,1; 22,4 - 40,8) 12 (36,3; 20,4 - 54,8)

Escolaridade 0 a 8 anos

79 (74,5; 65,1 - 82,4) 22 (27,8; 18,3 - 39,0)

+ de 9 anos

27 (25,4; 17,5 - 34,8) 7 (25,9; 11,1 - 46,2)

Raça/Cor Amarela

1 (0,9; 0,02 - 5,1)

0

Branca

16 (15,0; 8,8 - 23,3)

2 (12,5; 1,55 - 38,3)

Indígena

2 (1,8; 0,2 - 6,6)

1 (50; 1,26 - 98,7)

Parda

61 (57,5; 47,5 - 67,0) 16 (26,2; 15,8 - 39,0)

Preta

26 (24,5; 16,6 - 33,8) 10 (38,4; 20,2 - 59,4)

Legenda: * Número de participantes, porcentagem e intervalo de confiança na população investigada (N = 106); ** Número de participantes, porcentagem e intervalo de confiança de sintomas depressivos e ansiosos presentes em cada estrato populacional investigado.


Na Tabela 2, é possível observar que características de SDA tiveram maior prevalência nos casos comórbidos de HAS e DM, seguidos por aqueles que somente tinham HAS e, por fim, DM. Em relação aos hábitos de vida, maior prevalência foi encontrada em usuários que faziam uso de álcool diariamente, seguido por aqueles com excesso de peso, sedentários e tabagistas. Foi verificada, também, que a sintomatologia esteve mais presente naqueles cuja adesão medicamentosa estava em nível baixo/mediano (Tabela 2). Tabela 2 - Prevalência de Sintomas Depressivos e/ou Ansiosos de Acordo com as Características de Saúde dos Participantes (N = 106). Rondonópolis, Mato Grosso, Brasil, 2017. Variável

n (%; IC95%)*

Prevalência de sintomas depressivos e/ou ansiosos n (%; IC95%)**

Doença Hipertensão

76 (71,7; 62,1 - 80,0) 21 (27,6; 17,9 - 39,0)

Diabetes Mellitus

9 (8,4; 3,9 - 15,5)

Hipertensão e Diabetes

21 (19,8; 12,7 - 28,6) 6 (28,5; 11,2 - 52,1)

2 (22,2; 2,8 - 60,0)

Hábitos de vida Sedentarismos

58 (54,7; 44,7 - 64,4) 17 (29,3; 18,0 - 42,7)

Tabagismo

22 (20,7; 13,4 - 29,7) 4 (18,1; 5,1 - 40,2)

Uso de álcool diário

2 (1,8; 0,2 - 6,6)

Excesso de peso

52 (49,0; 39,2 - 58,9) 17 (32,6; 20,3 - 47,1)

2 (100; 15,8 - 100)

Adesão medicamentosa Baixa/Mediana

37 (34,9; 25,9 - 44,7) 11 (29,7; 15,8 - 46,9)

Elevada

69 (65,0; 55,2 - 74,1) 18 (26,0; 16,2 - 38,0)

Legenda: * Número de participantes, porcentagem e intervalo de confiança na população investigada (n = 106); ** Número de participantes, porcentagem e intervalo de confiança de sintomas depressivos e ansiosos presentes em cada estrato populacional investigado.

Na Tabela 3, pode-se observar que os DAS foram mais prevalentes naqueles cuja renda foi de até meio salário mínimo, seguidos por aqueles com dois a cinco salários e, por fim, daqueles com meio a dois salários. Foram mais prevalentes naqueles que pertenciam às classes econômicas C e D, quando comparados àqueles das classes A e B. Maior prevalência foi vista nos que disseram não trabalhar, bem como naqueles com moradia alugada (Tabela3).

Tabela 3 - Prevalência de Sintomas Depressivos e/ou Ansiosos de Acordo com as Características Econômicas dos Participantes (N = 106). Rondonópolis, Mato Grosso, Brasil, 2017. Variável

n (%; IC95%)*

Prevalência de sintomas depressivos e/ou ansiosos n (%; IC95%)**

Até ½ salário mínimo (R$ 468,50)

76 (71,7; 62,1 - 80,0)

21 (27,6; 17,9 39,0)

De ½ a 2 salários mínimos (R$ 468,50 – 1.874,00)

68 (64,1; 54,2 - 73,2)

15 (22,0; 12,9 33,7)

De 2 a 5 salários mínimos (R$ 1.874,00 – 4.685,00)

27 (25,4; 17,5 - 34,8)

8 (29,6; 13,7 - 50,1)

De 5 a 10 salários mínimos (R$ 4,685,00 – 9.370,00)

1 (0,9; 0,02 - 5,1)

0

A e B (+5 salários mínimos) 1 (0,9; 0,94; 0,02 - 5,1)

0

C e D (-5 salários mínimos)

105 (99,0; 94,8 - 99,9)

29 (27,6; 19,3 37,2)

Sim

45 (42,4; 32,9 - 52,4)

7 (15,5; 6,4 - 29,4)

Não

61 (57,5; 47,5 - 67,0)

22 (36,0; 24,1 49,3)

Própria

99 (93,4; 86,8 - 97,3)

27 (27,2; 18,8 37,1)

Alugada

7 (6,6; 2,7 13,1)

2 (28,5; 3,6 - 70,9)

Renda

Classe econômica

Trabalho

Moradia

Legenda: * Número de participantes, porcentagem e intervalo de confiança na população investigada (n = 106); ** Número de participantes, porcentagem e intervalo de confiança de sintomas depressivos e ansiosos presentes em cada estrato populacional investigado.

DISCUSSÃO Nesse estudo, a prevalência encontrada de SDA em pessoas com HAS e DM foi de 27,4%, e, apesar de baixa quando comparada a investigações anteriores com a mesma população (Helena, Lasagno e Vieira, 2010; Oliveira e Sales, 2005), é considerada alta quando comparada aos dados nacionais referente à população geral, que apontam o percentual de 7,6% para depressão e 6,4% para transtornos de ansiedade (IBGE, 2014). Tal dado reforça a necessidade de avaliações periódicas no que diz respeito às sintomatologias em pacientes com HAS e DM na APS, uma vez que um diagnóstico precoce possibilita uma terapêutica mais eficaz e menos custosa.

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Verificou-se maior prevalência do desfecho na população feminina, resultado parecido com aqueles encontrados por outras pesquisas (Helena, Lasagno e Vieira, 2010; Oliveira e Sales, 2005). Alguns estudos apontam que a maior prevalência de depressão na população geral de mulheres, quando comparada à dos homens, pode estar associada às questões ligadas ao gênero. A sobrecarga das mulheres, relacionada à dupla jornada de trabalho e até mesmo ao estado civil, como de ser solteira/viúva ou divorciada, podem contribuir para tal predisposição (Almeida et al., 2004). Quando analisado o estado civil, a amostra deste estudo foi composta, em sua maioria, por mulheres (58,4%), obtendo maior prevalência da DAS naquelas que referiram estar “Sem companheiro(a)”. Possivelmente, o desvalor cultural e a falta de um apoio cotidiano mais próximo justifiquem este resultado. Maior prevalência de SDA (28,5%) foi encontrada nos participantes com faixa etária entre 60 anos ou mais, corroborando com os dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) a qual aponta que, na população geral brasileira, a faixa etária com maior proporção de depressão é a de 60 a 64 anos de idade (11%) (IBGE, 2014). Em outra pesquisa brasileira, foi verificado que as prevalências de transtornos psiquiátricos menores, como as investigadas neste estudo, apresentaram-se mais frequentes a partir dos 40 anos de idade, com tendência a aumentar ano após ano, também na população geral (Costa, et al., 2002). Em estudo específico de pessoas com HAS e DM, houve maior tendência de desenvolver depressão entre os idosos (Oliveira e Sales, 2005). Do ponto de vista vivencial, o processo de envelhecimento se dá com experiências de perdas continuadas, seja com a falta de status ocupacional, o valor econômico, agravamento de condições clínicas e até mesmo declínio progressivo de humor causado pelas mudanças do sistema endócrino, neurológico e fisiológico, próprias da idade. Por sua vez, a vivência desse processo biopsicossocial pode gerar, muitas vezes, quadros de sofrimento psíquico (Guimarães e Podkameni, 2012). Aventou-se que esses processos façam parte, até mesmo em maior grau, na população aqui investigada. Por sua vez, nos resultados observados quanto à variável raça/cor, obteve-se que a prevalência de SDA foi maior na população autodeclarada indígena (50%), seguida da preta (38,4%), parda (26,2%) e branca (12,5%). Alguns estudos apontam que desigualdades étnico-raciais são agravantes para o sofrimento em saúde mental. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 48

O racismo e a negação de direitos que dele decorre são recorrentes no processo de construção de mal-estar ou adoecimento psíquico (Guimarães e Podkameni, 2012). Em relação à população indígena na zuna urbana, alguns fatores que tendem a fomentar transtornos psicológicos seria a inferiorização social, imposição de adaptação a outra cultura, a barreira linguística e o julgamento social do índio na cidade (Rodrigues, 2014). Na população aqui investigada, supõe-se que tal impacto também se fez presente. Pôde-se verificar maiores sintomatologias de SDA nos estratos de classe econômica baixa (C e D), menor escolaridade (0 a 8 anos) e de não trabalho. Ludemir e Melo (2002) apontam que a baixa escolaridade, baixa renda e exclusão do mercado formal de trabalho estão relacionadas e são situações estressoras contribuintes para a origem de transtornos mentais. Além disso, especificamente o grau de escolaridade reflete condições socioeconômicas e influencia comportamentos e escolhas futuras, com sofrimento psíquico mais comum a pessoas com posições mais desfavoráveis de acesso escolar. Nos participantes desta pesquisa, é possível que tais posições tenham tido esse efeito. Verificou-se, também, que nos participantes com HAS, isoladamente, foi encontrada maior sintomatologia de SDA do que nos com DM. Não foram encontrados estudos na literatura que compararam as duas condições quanto a sintomatologia. Porém, Saboya (2009) evidenciou que as chances de um indivíduo com HAS apresentar DAS são de aproximadamente três a quatro vezes maiores que as de um indivíduo normotenso. Prevalência semelhante seria esperada em pessoas com DM, de acordo com Moussavi et al. (2007), que analisaram dados de indivíduos adultos de 60 países. Pode ser que o fato de a amostra ser composta por um número bem maior de participantes com HAS (n = 76) quando comparados ao somente com DM (n = 9) tenha influenciado tal prevalência no estudo de Moussavi et al. (2007). Verificou-se maior prevalência de SDA nos quadros comórbidos de HAS e DM. Na literatura nacional, não foram encontrados estudos que comparassem grupos comórbidos com não-comórbidos dessas condições. Mas, seguindo um princípio lógico, tal dado poderia ser explicado pelo fato das duas condições estarem presentes concomitantemente, e, dessa forma, favorecerem ainda mais a prevalência dos SDA. A prevalência de DAS foi maior naqueles que apresentaram baixa/média adesão medicamentosa.


Infelizmente, pode-se verificar que a adesão à farmacoterapia pode ser prejudicada pela presença destes sintomas, o que é compatível com achados anteriores realizados tanto com a população geral como com pessoas com DM (Braz et al., 2012). Por sua vez, a prevalência de SDA esteve mais presente em usuários que referiram consumir álcool diariamente. Esses dados vão ao encontro de estudos que apontam que na população geral esse consumo está atrelado frequentemente a transtornos mentais não psicóticos, como os aqui estudados (Costa et al.,2002; Moreira et al.,1996). O álcool possui efeito ansiolítico/relaxante sobre o comportamento humano, o que favorece em muito o alto consumo em populações de risco (Moreira et al.,1996), como a aqui estudada. É importante reforçar que uma das limitações do presente estudo é a distribuição dos dados amostrais e estratificados. Por exemplo, foram investigados somente dois indígenas e dois usuários que faziam uso de álcool diariamente. Tais dados, por serem muito pequenos, podem ter levado a prevalências não tão generalizáveis para a população estudada, apesar de terem sido compatíveis com a literatura. Sugere-se que em estudos futuros, possam-se aumentar todos os estratos com baixo número de participantes. Tal controle favoreceria uma análise mais detalhada, como, por exemplo, de faixas etárias e tempos de escolaridade menos amplos e mais diversificados. Além disso, a amostra total foi obtida por conveniência, não sendo estabelecido um cálculo amostral prévio para que se pudesse atingir uma amostra ideal (ou próxima ao ideal) para ser pesquisada no município de Rondonópolis, local foco da investigação. Sugere-se que, futuramente, esse controle e ampliação da pesquisa sejam realizados. Uma outra e última limitação observada foi em relação às próprias sintomatologias investigadas. Ressalta-se que aqui não foi investigado se elas já se caracterizariam como transtornos depressivos e ansiosos, somente foram identificados sinais de suas presenças pelo instrumento MINI. Sugere-se que, em pesquisas futuras, seja identificada a presença desses transtornos propriamente ditos. Dessa forma, aconselha-se cuidado para a generalização dos dados aqui encontrados em âmbito psiquiátrico.

A hipótese de que a prevalência dessa sintomatologia seria alta nessa localização foi confirmada, justificando ainda mais este tipo de serviço na região e em outras localidades do país. Permitiu reforçar a relevância do trabalho dos profissionais da saúde em identificar aspectos emocionais que possam influenciar o tratamento das DCNT. Os SDA foram mais prevalentes na população estudada com HAS e DM do que na população geral, de acordo com a literatura. Ressalta-se que cuidados sobre a saúde mental dessa população devem ser melhor trabalhados e/ou estabelecidos no contexto da ESF.

CONCLUSÃO

Amaral, G. F., Jardim P. C. B. V., Brasil, M. A. A., Souza, A. L. L., Freitas, H. F., Melo, A. F. B., e Ribeiro, C. N. (2007). Prevalência de transtorno depressivo maior em centro de referência no tratamento de hipertensão arterial. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul, 29 (2), 161-168. Doi: 10.1590/S0101-8108200700020000

O presente estudo cumpriu seu objetivo de investigar a prevalência de SDA em pessoas com HAS e/ou DM cadastradas em uma ESF do centro-oeste brasileiro.

IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA Esse estudo permitiu verificar que o uso de instrumentos que auxiliem no rastreamento de SDA é de grande significância na atenção primária a saúde. A entrevista diagnóstica padronizada breve MINI se mostrou como uma ferramenta de grande potencial nesse nível de assistência, pois permitiu a identificação de SDA de modo prático, simples e de fácil acesso e compreensão por todos os membros da equipe. Os dados apontaram, também, para necessidade de serem consideradas as multifatorialidades das DCNT no âmbito da atenção primária à saúde. A investigação por estratos permitiu identificar que para uma assistência mais efetiva e singular, é necessário que os profissionais abranjam em suas práticas os aspectos biopsicossociais dos usuários, e que projetem intervenções que abranjam todas essas esferas numa dinâmica de trabalho interdisciplinar. Estratégias como promoção e prevenção de saúde, ações intersetoriais, capacitação em saúde mental, inclusão de equipes de NASF nas ESF’s, discussão de casos, interconsultas e construção conjunta de projetos terapêuticos são modos de se trabalhar a saúde integral desta população. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Almeida, F. N., Lessa I., Magalhães, G., Araújo, M.J., Aquino, E., James, A. S., & Kawachi E. U. (2004). Social inequality and depressive disorders in Bahia, Brazil: interactions of gender, ethnicity and social class. Social Science & Medicine, 59 (7), 1339-1353. Doi: 10.1016/j. socscimed.2003.11.037

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Artigo de Investigação

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Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0226

RELIGIOSIDADE, ESTRATÉGIAS DE COPING E SATISFAÇÃO COM A VIDA: VERIFICAÇÃO DE UM MODELO DE INFLUÊNCIA EM ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS | Luis Fleury1; Antonio Gomes2; Julio da Rocha3; Nilton Formiga4; Marilei e Souza5; Sérgio Marques6; Margarida Bernardes7 |

RESUMO CONTEXTO: O ambiente universitário pode muitas vezes favorecer o desenvolvimento de problemas de saúde mental, uma vez que os universitários são submetidos a intenso nível de estresse e carga cognitiva. OBJETIVO: Verificar a influência da religiosidade na satisfação com a vida e na adoção de estratégias para lidar com os problemas. MÉTODOS: Estudo quantitativo com coleta de dados utilizando instrumentos psicométricos validados com 588 estudantes universitários de 18 a 63 anos. Foi utilizada a técnica de modelagem de equações estruturais para verificar um modelo de influência. RESULTADOS: Os resultados indicam que a Religiosidade influencia positivamente e de forma significativa a Satisfação com a Vida, bem como a adoção de Estratégias para Enfrentamento de Problemas. Os resultados não são generalizáveis, entretanto constituem evidência empírica da importância da religiosidade em termos de saúde mental. CONCLUSÃO: De forma geral, esta pesquisa pretendeu verificar um modelo teórico sistêmico, o qual hipotetizava uma interdependência entre as variáveis Religiosidade, Coping e Satisfação com a vida que se comprovou. Com isso, acredita-se que os resultados observados, teoricamente, sustentam as propostas sugeridas pela psicologia positiva. PALAVRAS-CHAVE: Religião; Satisfação do paciente; Saúde mental

RESUMEN

ABSTRACT

“Religiosidad, estrategias de coping y satisfacción con la vida: Verificación de un modelo de influencia en estudiantes universitarios”

“Religiosity, coping strategies and satisfaction with life: Verification of a model of influence in university students”

CONTEXTO: El ambiente universitario puede a menudo favorecer el desarrollo de problemas de salud mental, ya que los universitarios son sometidos a intenso nivel de estrés y carga cognitiva. OBJETIVO: Verificar la influencia de la religiosidad en la satisfacción con la vida y en la adopción de estrategias para lidiar con los problemas. MÉTODOS: Estudio cuantitativo con recolección de datos utilizando instrumentos psicométricos validados con 588 estudiantes universitarios de 18 a 63 años. Se utilizó la técnica de modelado de ecuaciones estructurales para verificar un modelo de influencia. RESULTADOS: Los resultados indican que la Religiosidad influye positivamente y de forma significativa en la Satisfacción con la Vida, así como la adopción de Estrategias para Enfrentamiento de Problemas. Los resultados no son generalizables, sin embargo constituyen evidencia empírica de la importancia de la religiosidad en términos de salud mental. CONCLUSIÓN: En general, esta investigación pretendió verificar un modelo teórico sistémico, el cual hipotetizaba una interdependencia entre las variables Religiosidad, Coping y Satisfacción con la vida; con ello, no sólo se comprobó el modelo pretendido, pero, se cree que los resultados observados, teóricamente, sostienen las propuestas sugeridas por la psicología positiva.

DESCRIPTORES: Religión; Satisfacción del paciente; Salud mental

BACKGROUND: The university environment can often favor the development of mental health problems, since university students are subjected to intense levels of stress and cognitive load. AIM: To verify the influence of religiosity on satisfaction with life and on the adoption of strategies to deal with problems. METHODS: Quantitative study with data collection using validated psychometric instruments with 588 university students aged 18 to 63 years. The structural equation modeling technique was used to verify an influence model. RESULTS: The results indicate that Religiosity influences positively and significantly the Satisfaction with Life, as well as the adoption of Strategies to Confront Problems. The results are not generalizable, however they constitute empirical evidence of the importance of religiosity in terms of mental health. CONCLUSION: In general, this research aimed to verify a systemic theoretical model, which hypothesized an interdependence between the variables Religiosity, Coping and Satisfaction with life; Thus, not only has the desired model been proved, but it is believed that the results observed theoretically support the proposals suggested by positive psychology.

KEYWORDS: Religion; Patient satisfaction; Mental health Submetido em 31-03-2018 Aceite em 31-10-2018

1 Psicólogo; Mestre em Psicologia; Docente na Universidade Federal do Rio de Janeiro, Av. Pedro Calmon, 550, 23092-620 Rio de Janeiro, Brasil, luis_fleury@yahoo.com.br 2 Enfermeiro; Doutor em Enfermagem; Docente na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Brasil, mtosoli@gmail.com 3 Psicólogo; Doutor em Psicologia; Docente na Universidade Católica de Petrópolis, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Rio de Janeiro, Brasil, juliorocha@gmail.com 4 Psicólogo; Doutor em Psicologia Social; Docente na Universidade Potiguar, 23092-620 Natal, Rio Grande do Norte, Brasil, nsformiga@yahoo.com 5 Enfermeira; Doutora em Enfermagem; Docente na Universidade Severino Sombra, 23092620 Rio de Janeiro, Brasil, marileimts@hotmail.com 6 Enfermeiro; Doutor em Enfermagem; Docente na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, sergiocmarques@uol.com.br 7 Enfermeira; Doutora em Enfermagem; Docente na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 23092-620 Rio de Janeiro, Brasil, margarbe@globo.com Citação: Fleury, L. F. O., Gomes, A. M. T., Rocha, J. C. C., Formiga, N. S., Souza, M. M. T., Marques, S. C., & Bernardes, M. M. R. (2018). Religiosidade, estratégias de coping e satisfação com a vida: Verificação de um modelo de influência em estudantes universitários. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (20), 51-57. doi: 10.19131/ rpesm.0226 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 51


INTRODUÇÃO A questão do enfrentamento de problemas é estudada na literatura como Estratégias de Coping. Trata-se de constructo multidimensional relativo às formas como as pessoas lidam com situações estressantes (Noda, Takahashi, & Murai, 2018). De acordo com Garrido (2018), o coping pode ser definido como o somatório dos esforços cognitivos e comportamentais que um indivíduo utiliza para lidar com uma situação de estresse que é avaliada como forte o suficiente para sobrecarregar ou exceder seus recursos pessoais. Em tais situações, o indivíduo desenvolve estratégias para lidar com as exigências que surgem. Para Garrido (2018) o coping pode ser analisado a partir de duas óticas: foco no problema e foco na emoção. Logo, o coping com o foco no problema refere-se ao uso de estratégias que visam a atingir diretamente a fonte geradora de estresse, e causa modificações, atenuandoa ou mesmo eliminando-a, quando possível. Seriam exemplos: a negociação com pessoas envolvidas na situação, a modificação de local ou de conduta objetivando atenuar o fator estressante e a tentativa de impor limites para fazer o problema diminuir ou mesmo não se repetir. Enquanto o foco na emoção se refere ao uso de estratégias por parte do indivíduo para lidar com a carga emocional que foi desencadeada pelo agente estressor. Seriam exemplos: a aceitação de um problema como algo natural, o esforço em manter o pensamento positivo mesmo em situação adversa, estratégias para evitar lidar com o problema e o uso de substâncias, como álcool ou mesmo drogas, como uma forma de aliviar a tensão enfrentada (Noda et al., 2018). A questão da eficiência ou não de uma estratégia de coping deve ser avaliada com cautela. Logicamente, algumas estratégias serão mais prováveis de serem adotadas por alguns indivíduos. Outros terão preferências por estratégias diferentes, ainda que em situação semelhante. Assim, pareceria lógico pensar que enfrentar diretamente a fonte estressora deve ser a estratégia mais eficiente, mas nem sempre isso pode ser o mais adequado, tanto pela dúvida que o indivíduo pode ter em relação à resolução ou não do problema, como em função dos custos emocionais que tal ação pode resultar. Dito de outra forma, pode ser melhor para o indivíduo se esquivar do problema do que lidar com os custos emocionais de enfrentá-lo (Delahaij & Van Dam, 2017).

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Atualmente a literatura aponta o conceito de coping como conjunto de medidas intencionais, cognitivas e comportamentais adotado pelas pessoas para adaptarem-se a diferentes circunstâncias estressantes com o propósito de minimizar sua susceptibilidade e retornar ao seu estado anterior (Melo, Carlotto, Rodriguez, & Diehl, 2016). Ao discutir a questão do método de enfrentamento de um problema e os custos emocionais envolvidos nesse processo, traz-se à luz a satisfação do sujeito com a sua vida. Para Siqueira e Padovam (2008) a Satisfação com a Vida pode ser definida como a avaliação global feita pelo indivíduo sobre a sua vida. Sendo uma variável individual, que o indivíduo percebe como apropriada, comparando as circunstâncias da sua vida com as dispostas neste conceito. A satisfação com a vida é um julgamento cognitivo de algum ponto específico na vida da pessoa, um processo de juízo e avaliação geral da própria vida; uma avaliação sobre a vida de acordo com um critério. O julgamento da satisfação depende de uma comparação entre as circunstâncias de vida do indivíduo e um padrão por ele escolhido (Jovanovic & Brdar, 2018). No estudo da satisfação com a vida podem ser identificados dois tipos de teorias. Aquelas que enfatizam circunstâncias objetivas e contextuais como os principais fatores na explicação da satisfação com a vida e são comumente rotuladas de teorias de baixo para cima (bottom-up theories). Por outro lado, as teorias que se baseiam em critérios individuais estáveis são comumente rotuladas de teorias de cima para baixo (top-down theories) (Samaha & Hawi, 2016). As teorias do tipo de cima para baixo baseiam-se na lógica de que traços da personalidade global do indivíduo explicam seu nível de satisfação com a vida. Alguns traços de personalidade em particular, como extroversão e neuroticismo, por exemplo, determinariam o grau de experiência de felicidade e satisfação com a vida dos indivíduos. A evidência da estabilidade da satisfação com a vida oferece suporte empírico a este tipo de teoria, indicando uma forte associação da satisfação com a vida com traços de personalidade e uma fraca influência do humor da pessoa, de fatores situacionais ou de eventos da vida sobre a satisfação (Samaha & Hawi, 2016; Whisman & Judd, 2016). Ressalta-se que essa investigação ancora-se nos pressupostos teóricos da Psicologia Positiva ao entender que a satisfação com a vida constitui importante indicador de saúde e qualidade de vida apontado pela literatura especializada (Seligman & Csikszentmihalyi, 2000; Antoine, Dauvier, Andreotti, & Congard, 2018).


Por fim considerou-se nesta pesquisa as variáveis de religiosidade e espiritualidade. O estudo baseou-se nos conceitos de religiosidade e espiritualidade dos principais autores mundiais que trabalham no contexto da saúde, especialmente Koenig, Pargament e Nielsen (1998) e Moreira-Almeida (2007). Para estes autores, religião e religiosidade envolvem a adoção de um conjunto de crenças, práticas e rituais, na maioria das vezes relacionadas a um ser superior e transcendente. Tratase de uma dimensão sociológica, de vivência e convivência comunitária. A espiritualidade, por sua vez, pode ser definida como uma conexão com o sagrado e o transcendente, bem como pela busca de sentido, não necessariamente mediada pela religião, mas passando por ela para uma grande maioria de pessoas. Atualmente, as relações entre religiosidade e saúde – física e/ou mental – vêm sendo crescentemente investigadas. A maior parte dos estudos indica que a religiosidade é habitualmente um fator de proteção que deve ser observado na prática clínica contra o desenvolvimento de transtornos mentais (por exemplo, depressão, ansiedade, abuso de substâncias, etc.), além de estar associada a melhor qualidade de vida (Taunay et al., 2012; Bravo, Pearson, & Stevens, 2016). MÉTODOS Participaram do estudo 588 universitários, de 18 a 63 anos (M =25,01 ano, α = 12,03 anos), com a prevalência de mulheres (81%), a maioria (58%) tem uma renda econômica entre 1 e 3 salários mínimos. Esta amostra é não probabilística e de conveniência, pois foi considerada a pessoa que, consultada, dispusera-se a colaborar respondendo ao questionário que era apresentado. Para estabelecer a significância da amostra, esta foi calculada no pacote estatístico G Power 3.1 que é um software destinado a calcular o poder estatístico - o teste de hipótese, tendo como base, não apenas o ‘n’ necessário para a pesquisa, mas, também, o tipo de cálculo a ser realizado (Faul, Erdfelder, Lang, & Buchner, 2007). Para a coleta de dados deste estudo, considerando uma probabilidade de 95% (p < 0,05), magnitude do efeito amostral (r ≥ 0,50) e um padrão de poder hipotético (π ≥ 0,80); a amostra especificada revelou-se suficiente e significativa (tendo como indicadores: t ≥ 1,98; π ≥1,00; p < 0,05). Os participantes responderam aos seguintes instrumentos:

- Caracterização Sócio-demográfica. Foram elaboradas perguntas que contribuíram para identificar os participantes deste estudo (por exemplo, sexo, idade, estado civil, renda econômica, escolaridade, bem como, realizar um controle estatístico de algum atributo que possa interferir diretamente nos seus resultados. - Inventário Multifatorial de Coping (IMCA), de autoria de Antoniazzi (2000). Tal instrumento é constituído por 43 itens, divididos em quatro diferentes estratégias de enfrentamento de situações estressantes: ação direta, ação social, negação e autocontrole. O fator “ação direta” é constituído por 14 itens, definida como estratégias que apresentam ações e comportamentos que buscam modificar as circunstâncias e os eventos estressantes, sendo, portanto, considerada uma estratégia eficaz e benéfica ao indivíduo. A “ação social” é o segundo fator do instrumento, a qual implica criar estratégias ligadas à busca por auxílio externo para a resolução dos conflitos, buscar familiares e amigos próximos para obter ajuda, como conselhos e conforto. O fator é formado por 8 itens. O terceiro fator do IMCA é denominado “negação”. Ele é constituído por 11 itens que juntos se referem à tentativa de o indivíduo de não enxergar o problema, e é considerado como uma estratégia ineficiente e nociva tanto ao indivíduo quanto ao combate ao problema em si; afinal, inicialmente, faz com que o indivíduo mude o olhar, o foco da situação estressante, sem, contudo, deixar de percebê-la. O quarto e último fator da escala é denominado “autocontrole”, o qual é aferido por 10 itens relacionados a estratégias de enfrentamento de problemas estressantes, quando o indivíduo busca manter a calma e se controlar, de modo a se estressar menos. O índice de confiabilidade (Alfa de Cronbach) do instrumento foi igual a 0,845. - A satisfação com a vida (SV) foi mensurada com a utilização da Escala de Satisfação com a Vida validada para amostras brasileiras por Gouveia, Barbosa, Andrade e Carneiro (2005). A escala é composta por 5 itens que dizem respeito a percepção geral do quanto o sujeito está satisfeito com a sua vida. Neste estudo, observou-se uma alfa de 0,780. - Escala de Religiosidade da Duke – DUREL (ERD), composta por 5 itens, validada por Taunay et al. (2012). A escala é composta por 5 itens que dizem respeito a frequência que o sujeito vai ao templo religioso, frequência que o sujeito dedica a atividades religiosas individuais e sobre as suas experiências religiosas. No presente estudo, a escala em questão, apresentou um alfa de 0,84 e um ICC (Coeficiente de Correlação Intraclasse) de 0,86 (95% IC variando de 0,85-0,88; F = 7,37, p < 0,005), condição essa, que não interfere na consistência da medida da ERD em questão. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 53


Procedimentos Éticos Todos os procedimentos adotados nesta pesquisa seguiram as orientações éticas previstas na Resolução 196/96 do CNS e da Resolução 016/2012 do Conselho Federal de e Psicologia. E estão de acordo com a Resolução 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde para pesquisas realizadas com amostras de seres humanos. Os responsáveis pela coleta dos dados visitaram diferentes universidades. Foi dito aos participantes que não havia resposta certa ou errada e que mesmo necessitando uma resposta individual, estes não deveriam se ver obrigados em respondê-los podendo desistir a qual momento seja quanto tivesse o instrumento em suas mãos ou ao iniciar sua leitura, ou outra eventual condição. Todos assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Em qualquer um desses eventos, não haveria problema de sua desistência. A todos era assegurado o anonimato das respostas e que estas seriam tratadas em seu conjunto estatisticamente. Análise de Dados Utilizou-se a versão 21.0 do pacote estatístico SPSS para Windows, e computadas estatísticas descritivas. E o software AMOS GRAFICS, versão 21.0, para o Modelo de Equações Estruturais (MEE), sendo considerados os seguintes índices para ajuste do modelo de acordo com a literatura especializada (Hair, Tatham, Anderson & Black, 2009): • O χ² (qui-quadrado) testa a probabilidade de o modelo teórico se ajustar aos dados; quanto maior este valor pior o ajustamento. É comum considerar sua razão em relação aos graus de liberdade (χ²/g.l.). Neste caso, valores até 5 indicam um ajustamento adequado; • Root Mean Square Residual (RMR), que indica o ajustamento do modelo teórico aos dados, na medida em que a diferença entre os dois se aproxima de zero. Para o modelo ser considerado bem ajustado, o valor deve ser menor que 0,05; • O Goodness-of-Fit Index (GFI) e o Adjusted Goodness-of-Fit Index (AGFI) são análogos ao R² em regressão múltipla. Portanto, indicam a proporção de variância–covariância nos dados explicada pelo modelo. Estes variam de 0 a 1, com valores na casa dos 0,80 e 0,90, ou superior, indicando um ajustamento satisfatório. • A Root-Mean-Square Error of Approximation (RMSEA), com seu intervalo de confiança de 90% (IC90%), é considerado um indicador de desajuste, isto é, valores altos indicam um modelo não ajustado. Assumese como ideal que o RMSEA se situe entre 0,05 e 0,08, aceitando-se valores de até 0,10; Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 54

• O Comparative Fit Index (CFI), compara de forma geral o modelo estimado e o modelo nulo, considerando valores mais próximos de um como indicadores de ajustamento satisfatório; • O Normed Fit Index (NFI), varia de zero a um e pode ser considerado aceitável para valores superiores a 0,90. Caracteriza-se por ser uma medida de comparação entre o modelo proposto e o modelo nulo, representando um ajuste incremental. RESULTADOS Para atender ao objetivo principal do presente estudo que é investigar a influência da Religiosidade sobre a Satisfação com a Vida e Coping, considerou-se um modelo recursivo de equações estruturais. Observou-se após a realização das devidas modificações de ajustes, que o modelo proposto se mostrou adequado, uma vez que os constructos avaliados apresentaram uma associação interdependente (Tabela 1). Neste modelo é possível destacar os seguintes índices estatísticos: (x²/gl = 1,97; RMR = 0,05; GFI = 0,98; AGFI = 0,95; CFI = 0,98; NFI = 0,95 e RMSEA (90%IC) = 0,04 (0,03-0,05). Tabela 1 - Associações Lambdas (γ) entre os Constructos do Modelo Teórico Religiosidade Satisfação Coping com a vida Religiosidade

---

Satisfação com a vida 0,31 Coping

0,38

--0,36

---

Considerando esses resultados, o modelo apresentou indicadores aceitáveis de acordo com o que exigido na literatura vigente (Hair et al., 2009). No que se refere ao modelo gerado, vale destacar que todas as saturações (Lambdas, γ) estão dentro do intervalo esperado |0 - 1|, e denotam não haver problemas da estimação proposta, pois todas foram estatisticamente diferentes de zero (t > 1.96, p < 0.05). Ao analisar os resultados supracitados, com base nas estimativas de predição entre as associações das variáveis e a partir da análise de regressão referente ao modelo teórico elaborado, observou-se, que todas as variáveis foram significativas a um p < 0,001 (Tabela 2).


DISCUSSÃO

Tabela 2 - Indicadores das Estimativas Preditivas do Modelo Teórico Hipotetizado Constructo

Variáveis Estimativa

d.p.

Razão P Critério

VIF

cop

<---

rel

0,56

0,02 2,76

0,001

1,00

stv

<---

rel

0,71

0,03 6,13

0,001

1,07

stv

<---

cop

0,66

0,09 5,80

0,001

1,01

sats1

<---

stv

1,00

---

---

1,98

sats2

<---

stv

0,86

0,06 15,16

0,001

1,54

sats3

<---

stv

0,94

0,05 17,45

0,001

1,81

sats4

<---

stv

0,69

0,05 13,38

0,001

1,37

sats5

<---

stv

0,77

0,06 11,06

0,001

1,25

reli5

<---

rel

1,00

---

---

2,03

reli4

<---

rel

0,82

0,04 19,37

0,001

1,87

reli3

<---

rel

0,71

0,04 17,02

0,001

1,86

reli2

<---

rel

0,99

0,06 15,26

0,001

2,10

reli1

<---

rel

0,99

0,06 16,32

0,001

2,53

AçãoDireta

<---

cop

1,000

---

---

1,37

AçãoSocial

<---

cop

0,88

0,05 17,66

0,001

1,08

AutoControle

<---

cop

0,74

0,12 15,55

0,001

1,35

Negação

<---

cop

0,67

0,04 12,65

0,001

1,06

---

---

---

Notas: rel = Religiosidade; stv = Satisfação com vida; cop = Coping; sats1 ...sats 5 = itens da escala de satisfação com vida; reli1 ...reli5 = itens da escala de religiosidade.

É preciso destacar que, nestes resultados, não encontrou-se multicolineariedade, condição essa, observada no cálculo de Inflação da Variância do Fator (IVF) que baseia-se no fator de tolerância entre as variáveis (este índice, deve apresentar escores que não excedam um valor acima de 5), pois implica na baixa qualidade do modelo empírico estimado (Hair et al., 2009), este indicador variou na presente análise de 1,00 a 2,53 (p < 0,01). É possível afirmar que o modelo teórico que hipotetiza a influência da religiosidade na satisfação com a vida e na adoção de estratégias de coping foi comprovado, uma vez que, além de apresentar indicadores psicométricos adequados quanto à modelagem estrutural aceita na literatura estatística, revelou uma associação positiva entre os constructos (Hair et al., 2009). Com isso, de forma geral tais resultados permitem afirmar a influência da variável religiosidade sobre coping e satisfação com a vida.

De forma geral, esta pesquisa pretendeu verificar um modelo teórico sistêmico, o qual hipotetizava-se uma interdependência entre as variáveis Religiosidade, Coping e Satisfação com a Vida. Dessa maneira, não apenas se comprovou o modelo pretendido, mas, acredita-se que os resultados observados estão dentro do pressuposto teórico da Psicologia Positiva (Antoine et. al., 2018). Assim, pode-se refletir em relação ao funcionamento sistêmico do sujeito onde habilidades, potenciais humanos, motivações e recursos adaptativos devem ser fomentados no tratamento clínico para que esse indivíduo tenha melhores condições de saúde mental e consequentemente sentir-se mais capaz de lidar com as demandas do ensino universitário (Antoine et. al., 2018). Pôde-se verificar através das análises realizadas que a religiosidade é uma importante variável a ser desenvolvida e que pode influenciar o desenvolvimento da satisfação com a vida. Nestes termos, o estudo corrobora o que a literatura relata sobre o funcionamento da religiosidade na saúde do sujeito (Moreira-Almeida, 2007; Taunay et al., 2012). Bem como, corrobora com a importância da avaliação do coping para investigação de fenômenos relativos a saúde mental, sobretudo no contexto universitário que é um ambiente propício ao desenvolvimento de estresse pela elevada carga cognitiva a que os estudantes são submetidos (Garrido, 2018; Delahaij & Van Dam, 2017). Por fim, ressalta-se que a Psicologia Positiva objetiva o desenvolvimento, nas práticas clínicas de cuidado com a saúde mental, de potencialidades do sujeito em contraposição aos desafios que o indivíduo precisa lidar na sua rotina. Sendo assim, o desenvolvimento de um ambiente que proporcione satisfação com a vida e o incentivo a vivência das práticas religiosas individuais devem ser fomentadas pelo contexto universitário e também pelos profissionais de saúde em suas práticas clínicas a fim de lidar com a estressante rotina universitária que pode levar aos alunos ao adoecimento e evasão (Jovanovic & Brdar, 2018; Samaha & Hawi, 2016; Whisman & Judd, 2016; Garrido, 2018; Machado, Gurgel & Reppold, 2017).

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CONCLUSÕES A principal conclusão deste estudo é que a religiosidade é uma importante aliada no desenvolvimento da satisfação com a vida e que esse fenômeno exerce influência na adoção da estratégia a ser utilizada para o enfrentamento de um problema. Uma limitação deste estudo é que não se pode generalizar os resultados, mas embora os resultados estejam relacionados a esse contexto amostral, indicam importantes evidências empíricas do funcionamento da religiosidade para formação e desenvolvimento saudável do sujeito. Sugere-se para estudos futuros, que se realize uma comparação entre universitários que relatem práticas religiosas com aqueles que não relatam a mesma vivência religiosa. Assim, será possível estudar o desempenho em variáveis relacionadas a saúde de sujeitos religiosos e não religiosos. IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA O presente estudo deixa claro que o profissional de saúde deve utilizar em sua prática clínica a religiosidade e espiritualidade presente no sujeito como aliadas no tratamento de enfermidades mentais o que está em conformidade com a literatura consultada (Bravo et al., 2016). Logo, não se pode negligenciar o papel estratégico que a religiosidade e a espiritualidade pode ter em uma intervenção de saúde no contexto do adoecimento relacionado a vida universitária. Desse modo, os gestores responsáveis pela saúde no âmbito universitário podem fomentar a criação de espaços que acolham grupos para o desenvolvimento de práticas religiosas na universidade. Tais grupos podem atuar como aliados no tratamento e na adesão ao tratamento proposto pelo centro de saúde, bem como podem acompanhar o desenvolvimento das práticas terapêuticas propostas pelos profissionais de saúde. Essa proposta se sustenta com base nas evidências apontadas neste artigo de que uma vivência da religiosidade e da espiritualidade estão associadas a maior satisfação com a vida e a estratégias de enfrentamento de problemas mais saudáveis.

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Artigo de Investigação

8

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0227

QUALIDADE DE VIDA, ENGAGEMENT, ANSIEDADE E DEPRESSÃO ENTRE GESTORES DE UNIDADES DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE | Luciano Garcia Lourenção1 |

RESUMO CONTEXTO: Os profissionais que gerenciam serviços de saúde precisam ter conhecimento e equilíbrio emocional. No entanto, a falta de investimentos em infraestrutura e políticas públicas pode tornar as condições de trabalho precárias e favorecer o adoecimento do trabalhador, comprometendo o funcionamento e a efetividade dos serviços de saúde brasileiros. OBJETIVO: Avaliar qualidade de vida, engagement, ansiedade e depressão entre gestores das Unidades de Saúde da Família. MÉTODOS: Estudo transversal com 15 gestores de Unidades de Saúde da Família. Dados coletados com Whoqol-bref (Fleck et al., 2000); Escalas de Ansiedade (BAI) (Gomes-Oliveira et al., 2012) e Depressão de Beck (BDI-II) (Beck et al., 1988); Utrech Work Engagement Scale (UWES) (Vazquez et al., 2015). RESULTADOS: Idade variou entre 24 e 55 anos. Houve prevalência do sexo feminino (80,0%), sobrepeso ou algum grau de obesidade (20,0%) e casados (53,3%). Tempo médio de atuação na Estratégia Saúde da Família de 2,9 anos. Os escores de qualidade de vida foram superiores a 58,0. O maior escore foi para o domínio Físico (60,8) e o menor escore para o domínio Meio Ambiente (58,4). Observado algum grau de ansiedade em 33,3% e depressão leve em 26,7%. Os profissionais apresentaram nível médio de engagement em todas as dimensões da UWES. CONCLUSÃO: Os gestores apresentam bom nível de qualidade de vida, com diminuição no domínio Meio Ambiente; os escores de engagement estão no nível médio. Os índices de ansiedade e depressão presentes podem ser decorrentes do desgaste profissional gerado pelo processo de trabalho gerencial. PALAVRAS-CHAVE: Qualidade de vida; Saúde mental; Trabalhadores; Atenção primária à saúde

RESUMEN

ABSTRACT

“Calidad de vida, engagement, ansiedad y depresión entre gerentes de Unidades de Atención Primaria”

“Quality of life, engagement, anxiety and depression among health unit managers of Primary Care Units”

INTRODUCCIÓN: Profesionales que administran servicios de salud necesitan tener conocimiento y equilibrio emocional. Sin embargo, la falta de inversiones en estructura y la creación de políticas públicas pueden hacer las condiciones de trabajo precarias y favorecer la enfermedad del trabajador, comprometiendo el funcionamiento y la efectividad de los servicios de salud brasileños. OBJETIVO: Evaluar calidad de vida, engagement, ansiedad y depresión entre gerentes de Unidades de Salud de la Familia. METODOLOGÍA: Estudio transversal con 15 gerentes de Unidades de Salud de la Familia. Los datos fueron recolectados con Whoqol-bref (Fleck et al., 2000); Escala de Ansiedad (BAI) (Gomes-Oliveira et al., 2012) y Depresión de Beck (BDI-II) (Beck et al., 1988); Utrech Work Engagement Scale (UWES) (Vazquez et al., 2015). RESULTADOS: La edad varía entre 24 y 55 años. La prevalencia del sexo femenino (80,0%), sobrepeso o algún grado de obesidad (20,0%) y casados (53,3%). Tiempo medio de actuación en la Salud de la Familia de 2,9 años. Los escores de calidad de vida fueron superiores a 58,0. El mayor puntaje fue para el dominio Físico (60,8) y el menor puntaje para el dominio Medio Ambiente (58,4). Se observó algún grado de ansiedad en el 33,3% y la depresión leve en el 26,7%. Los profesionales presentaron nivel medio de engagement en todas las dimensiones de la UWES. CONCLUSIÓN: Los gerentes presentan buen nivel de calidad de vida, con disminución en el dominio Medio Ambiente; los puntajes de engagement están en el nivel medio. Los índices de ansiedad y depresión presentes pueden ser consecuencia del desgaste profesional generado por el proceso de trabajo gerencial.

INTRODUCTION: Professionals that manage health services need to have knowledge and emotional balance. However, lack of investments in infrastructure and public policies can make working conditions precarious and favors sickness of workers, jeopardizing the functioning and effectiveness of Brazilian health services. AIM: To evaluate quality of life, engagement, anxiety and depression among managers of the Family Health Units. METHODS: Cross-sectional study with 15 managers of Family Health Units. Data collected with Whoqol-bref (Fleck et al., 2000); Beck Anxiety (BAI) (BAI) (Gomes-Oliveira et al., 2012) and Beck Depression Scales (BDI-II) (Beck et al., 1988); Utrech Work Engagement Scale (UWES) (Vazquez et al., 2015). RESULTS: Age varied between 24 and 55 years. There was a prevalence of female (80.0%), overweight or some degree of obesity (20.0%) and married (53.3%). Average time in the Family Health Strategy of 2.9 years. The quality of life scores was higher than 58.0. The highest score was for Physical domain (60.8) and the lowest score for Environment domain (58.4). Some degree of anxiety was observed in 33.3% and mild depression in 26.7%. The professionals presented average level of engagement in all dimensions of UWES. CONCLUSION: Managers have good quality of life, with decline in the Environment domain; the engagement scores are in the mid-level. The rates of anxiety and depression present may be due to the professional burnout generated by the managerial work process.

DESCRIPTORES: Calidad de vida; Salud mental; Trabajadores; Atención primaria de salud

KEYWORDS: Quality of life; Mental health; Workers; Primary health care Submetido em 31-03-2018 Aceite em 23-07-2018

1 Enfermeiro; Doutor em Ciências da Saúde; Professor Titular-Livre na Universidade Federal do Rio Grande, Escola de Enfermagem, Av. Itália - Carreiros, 96203-900 Rio Grande – RS, Brasil, luciano.famerp@gmail.com Citação: Lourenção, L. G. (2018). Qualidade de vida, engagement, ansiedade e depressão entre gestores de Unidades da Atenção Primária à Saúde. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (20), 58-64. doi: 10.19131/rpesm.0227 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 58


INTRODUÇÃO Com a consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS), no Brasil e a expansão da Estratégia Saúde da Família (ESF), como porta de entrada das pessoas no sistema de saúde, a atuação do gestor da unidade ou serviço de saúde se tornou primordial para a organização dos serviços e das ações de atenção à saúde, assim como para a efetivação das políticas públicas de saúde (Fernandes & Cordeiro, 2018). Para gerenciar o serviço, o profissional precisa ter conhecimento e equilíbrio emocional. No entanto, a falta de investimentos no sistema de saúde brasileiro torna as condições de trabalho cada vez mais precárias e favorece o adoecimento do trabalhador, comprometendo o funcionamento e a efetividade dos serviços de saúde (Santos, Pestana, Guerrero, Meirelles, & Erdmann, 2013). O cenário complexo de responsabilidades, sobrecarga de trabalho, novas exigências, fragilidades na infraestrutura e no perfil socioeconômico e sanitário das áreas atendidas repercute na motivação dos gestores (Fernandes & Cordeiro, 2018), e pode causar insatisfação ocupacional, sofrimento emocional e redução na qualidade dos serviços prestados (Morelli, Sapede & Silva, 2015). O que deveria trazer prazer e satisfação ao profissional origina desprazer, sentimento de insignificância, impotência e outros estressores para a saúde e o bem-estar, levando ao adoecimento dos profissionais (Bezerra, 2015). O trabalho do gestor na Atenção Primária à Saúde (APS) sofre impactos da falta de profissionais qualificados, baixa remuneração, desvalorização profissional e formação desarticulada da APS. Com isso, sinais de cansaço e estresse físico e emocional são comuns entre estes profissionais. O desgaste causa sentimento de incompetência e pode fazer com que o profissional deixe o cargo. Este estresse reflete, ainda, na vida pessoal do profissional, compromete atividades de lazer com a família e amigos, e pode aumentar a agressividade, irritabilidade, fadiga e tristeza, comprometendo a qualidade de vida (Porciuncula, 2015). Nesse contexto, compreender as condições de saúde mental, qualidade de vida e engagement dos profissionais que gerenciam os serviços de Atenção Primária à Saúde, pode direcionar a reorganização do sistema e auxiliar na prevenção dos problemas de saúde destes profissionais, além de favorecer a criação de estratégias para reestruturação do processo de trabalho, que poderão repercutir positivamente no aumento da produtividade e na qualidade da assistência prestada aos utentes.

Assim, este estudo objetivou avaliar a qualidade de vida e os níveis de engagement, ansiedade e depressão entre gestores das Unidades de Saúde da Família de um município do interior do Estado de São Paulo, Brasil. MÉTODOS Estudo quantitativo, descritivo, correlacional e transversal, realizado com amostra não probabilística, de conveniência, que incluiu todos os gestores das 15 Unidades de Saúde da Família de um município do interior do Estado de São Paulo, Brasil, que consentiram em participar da pesquisa. Optou-se por esta amostra por tratar-se de profissionais de um município de referência que possui, em seu quadro funcional, o cargo de gestores das unidades de saúde. Embora o tamanho amostral seja limitado, estes profissionais desempenham exclusivamente atividades gerenciais, foco deste estudo. Para a coleta de dados foram utilizados cinco instrumentos autoaplicáveis: um instrumento elaborado pelo autor, contendo variáveis sociodemográficas e profissionais; a versão abreviada do Instrumento de Avaliação de Qualidade de Vida da Organização Mundial de Saúde - Whoqol-bref, escolhida por seu caráter transcultural e por ser um instrumento curto, de rápida aplicação, que pode ser utilizado tanto em populações com algum tipo de doença como em populações saudáveis (Fleck et al., 2000); a Escala de Depressão de Beck ou Inventário de Depressão de Beck (BDI-II), por sua capacidade de medir a intensidade da depressão na população geral (Paranhos, Argimon & Werlang, 2010); a Escala de Ansiedade de Beck ou Inventário de Ansiedade de Beck (BAI), por ser capaz de medir a intensidade dos sintomas de ansiedade (Karino & Laros, 2014); e a versão brasileira da Utrech Work Engagement Scale (UWES), capaz de medir a relação positiva do trabalhador com o ambiente laboral (Agnst, Benevides-Pereira & PortoMartins, 2009). O Whoqol-bref é formado por 26 questões, com respostas de múltipla escolha em escala Likert. Foi validado para a população brasileira por Fleck et al. (2000), é multidimensional e avalia a qualidade de vida em quatro domínios (24 questões): Físico, Psicológico, Relações Sociais e Ambiente (Fleck et al., 2000). As características psicométricas da versão em português do Whoqol-bref são semelhantes às da amostra do estudo multicêntrico que deu origem ao instrumento.

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Os dados do teste de campo da versão abreviada em português do Whoqol-bref mostraram que o instrumento apresenta características satisfatórias de consistência interna, validade discriminante, validade de critério, validade concorrente e fidedignidade teste-reteste (Fleck et al., 2000). A Escala de Depressão de Beck ou Inventário de Depressão de Beck (BDI-II), composta por 21 questões que abordam diversos itens relacionados aos sintomas depressivos como desesperança, irritabilidade e cognições como culpa ou sentimentos de estar sendo punido, assim como sintomas físicos como fadiga, perda de peso e diminuição da libido. A BDI-II foi validada no Brasil por Gomes-Oliveira, Gorenstein, Lotufo Neto, Andrade e Wang (2012) e mostrou-se fidedigna e válida para mensurar sintomatologia depressiva na população brasileira não clínica. Apresentou consistência interna de 0,93; validade concorrente (correlação de 0,63-0,93 com escalas aplicadas simultaneamente) e capacidade preditiva de gravidade (mais de 65% de classificação correta de indivíduos deprimidos) aceitáveis (GomesOliveira et al., 2012). A aplicação do BDI-II seguiu as recomendações do Manual de Escalas Beck (Cunha, 2001). Após leitura das instruções aos participantes do estudo, foi entregue o protocolo do teste para respostas. A correção foi realizada por uma psicóloga e a classificação dos níveis de depressão dos profissionais seguiu a seguinte classificação: 0 a 11 pontos = Nível Mínimo de Depressão; 12 a 19 pontos = Nível Leve de Depressão; 20 a 35 pontos = Nível Moderado de Depressão; 36 a 63 pontos = Nível Grave de Depressão. A Escala de Ansiedade de Beck ou Inventário de Ansiedade de Beck (BAI), utilizada para medir a severidade da ansiedade de um indivíduo, a partir de 21 questões sobre como o indivíduo tem se sentido na última semana, expressas em sintomas comuns de ansiedade com quatro possíveis respostas (não; levemente; moderadamente; severamente). A BAI mostrou alta consistência interna (alfa de Cronbach = 0,92) e confiabilidade teste-reteste durante 1 semana, r (81) = 0,75. A aplicação do BAI seguiu as recomendações do Manual de Escalas Beck (Cunha, 2001). Após leitura das instruções aos participantes do estudo, foi entregue o protocolo do teste para respostas. A correção foi realizada por uma psicóloga e a classificação dos níveis de ansiedade dos profissionais seguiu a seguinte classificação: 0 a 10 pontos = Nível Mínimo de Ansiedade; 11 a 19 pontos = Nível Leve de Ansiedade; 20 a 30 pontos = Nível Moderado de Ansiedade; 31 a 63 pontos = Nível Grave de Ansiedade. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 60

A Utrech Work Engagement Scale (UWES), validada no Brasil por Vazquez, Magnan, Pacico, Hutz e Schaufeli (2015), que permite identificar o nível de relação com o trabalho (Escore geral), através de 17 questões distribuídas nas dimensões Vigor (altos níveis de energia e resistência, vontade de investir esforço, não sendo facilmente fatigado, e persistência em face de dificuldades), Dedicação (sentimento de entusiasmo e orgulho sobre o emprego; sentir-se motivado e desafiado pelo trabalho) e Absorção (estar totalmente imerso no trabalho e ter dificuldades de se desligar, de modo que o tempo passa depressa e se esquece de tudo o que está ao redor) (Agnst et al., 2009). A UWES apresentou alta consistência interna na população brasileira (alfa de Cronbach = 0,95; correlações entre os fatores = 0,81 a 0,82; Índice de Ajuste Comparativo - CFI = 096; Índice TLI de TuckerLewis = 0,95) e mostrou boas evidências de validade de conteúdo e de construto para uso em nosso contexto cultural (Vazquez et al., 2015). A análise foi realizada com o programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 17.0. Os dados sociodemográficos foram utilizados para caracterizar a população do estudo. A distribuição da idade foi analisada com o teste de Kolmogorov-Srminov, que indicou distribuição normal dos dados. Para a análise da qualidade de vida foram calculados os escores do whoqol-bref, conforme modelo estatístico disponibilizado pelo Grupo Whoqol e apresentados os escores médios e desvios-padrão, mediana, valores mínimo e máximo, intervalo de confiança de 99% para cada domínio. Os níveis de ansiedade de depressão foram analisados por uma psicóloga, segundo orientações dos respectivos instrumentos e categorizados em ausência de depressão/ ansiedade, depressão/ansiedade leve, depressão/ansiedade moderada e depressão/ansiedade grave (Cunha, 2001). Para análise do engagement, os cálculos dos escores foram realizados conforme modelo estatístico proposto no Manual Preliminar UWES – Utrecht Work Engagement Scale (Agnst et al., 2009), apresentando-se valores mínimo, máximo, mediana, média (± desvio padrão) e intervalo de confiança de 95% para cada dimensão da UWES. Após o cálculo dos escores foi realizado a classificação dos valores obtidos, conforme decodificação do Manual Preliminar UWES: 0 a 0,99 = Muito Baixo; 1 a 1,99 = Baixo; 2 a 3,99 = Médio; 4 a 4,99 = Alto; 5 a 6 = Muito Alto.


A consistência dos dados foi testada por meio do Coeficiente Alfa de Cronbach, cujos valores maiores ou iguais a 0,7 foram considerados satisfatórios. Respeitando os preceitos Éticos de Pesquisas envolvendo seres humanos, este projeto foi submetido à apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, sob Protocolo CAAE 23948113.2.0000.5415 e aprovado em 12 de novembro de 2013, com o Parecer n. 460.331. RESULTADOS Participaram do estudo 15 gestores das Unidades de Saúde da Família do município, sendo 12 (80,0%) do sexo feminino. A faixa etária variou de 24 a 55 anos, com idade média de 36,5 anos (dp: ±9,7 anos) (K-S = 0,799; p=0,546). Em relação ao IMC, apenas oito (53,2%) profissionais estavam na faixa de normalidade, enquanto três (20,1%) apresentavam sobrepeso ou algum grau de obesidade. Oito (53,3%) profissionais eram casados e sete (46,7%), solteiros; onze (73,3%) profissionais tinham renda familiar de seis a 10 salários mínimos. O tempo de atuação na ESF variou de 10 meses a cinco anos, com média de 2,9 anos (dp: ±1,2 anos). A Tabela 1 apresenta a distribuição das caraterísticas sociodemográficas dos gestores das unidades de Saúde da Família. Tabela 1 - Distribuição das Características Sociodemográficas dos Gestores das Unidades de Saúde da Família

Sexo

IMC

n

%

Masculino

3

20,0

Feminino

12

80,0

Baixo peso

1

6,7

Normal

8

53,2

Sobrepeso

1

6,7

Obesidade I

1

6,7

Obesidade II

1

6,7

Desconhecido 3

20,0

Casado

8

53,3

Solteiro

7

46,7

2a5

4

26,7

6 a 10

7

46,6

Mais de 10

4

26,7

Satisfeito com a profissão/ função

Sim

12

80,0

Não

3

20,0

Pensou em desistir da profissão/função

Sim

5

33,3

Não

10

66,7

Estado civil Renda Familiar (salários mínimos*)

*Valor do Salário Mínimo: R$788,00.

A Tabela 2 apresenta a distribuição dos escores médios e desvios-padrão, coeficiente de variação, valores mínimo e máximo, e amplitude para os domínios do Whoqolbref, segundo a avaliação dos gestores das Unidades de Saúde da Família. Os valores dos escores de qualidade de vida observados foram superiores a 58,0, indicando bom nível de qualidade de vida dos profissionais em todos os domínios do whoqol-bref. O maior escore foi para o domínio físico (60,8) e o menor escore para o domínio meio ambiente (58,4). Tabela 2 - Distribuição dos Escores Médios e Desvios-Padrão, Coeficiente de Variação, Valores Mínimo e Máximo, e Amplitude para os Domínios do Whoqol-bref, Segundo a Avaliação dos Gestores das Unidades de Saúde da Família Domínio Média

Desvio Coeficipadrão ente de variação

Valor Valor Amplimíni- máxi- tude mo mo

Físico

60,8

7,6

50,8

48,0

77,6

29,6

Psicológico

60,0

10,0

66

37,2

72,0

34,8

Relações Sociais

63,2

11,2

70

32,0

80,0

48,0

Meio Ambiente

58,4

7,2

48

42,0

68,0

26,0

TOTAL

60,0

7,2

49,6

43,6

72,0

28,4

A Tabela 3 apresenta os resultados da avaliação do engagement, a partir da distribuição dos escores médios e desvios-padrão, valores mínimo, máximo e intervalo de confiança de 95%, segundo as dimensões da UWES. Os profissionais obtiveram escore médio 3,6 em todas as dimensões e, portanto, apresentaram nível médio de engagement. Tabela 3 - Distribuição dos Escores Médios e Desvios-Padrão, Valores Mínimo, Máximo e Intervalo de Confiança de 95%, para as Dimensões da Utrecht Work Engagement Scale (UWES), Segundo a Avaliação dos Gestores das Unidades de Saúde da Família Domínio

n

Media±DP Mín

Máx

IC (95%)

Classificação

Dedicação

15

3,6±1,1

1,6

4,8

(2,9;4,2) Médio

Absorção

15

3,6±0,7

2,5

4,7

(3,2;4,0) Médio

Vigor

15

3,6±0,8

2,1

4,8

(3,2;4,0) Médio

Escore geral

15

3,6±0,7

2,3

4,5

(3,2;4,0) Médio

Legenda: DP: desvio padrão, Min: mínimo, Max: máximo. IC 95%: intervalo de confiança de 95%.

A Tabela 4 apresenta a distribuição dos níveis de ansiedade e depressão dos gestores das Unidades de Saúde da Família. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 61


Conforme observado, 33,3% dos profissionais estudados apresentaram algum grau de ansiedade e 26,7% apresentaram depressão leve. Tabela 4 - Distribuição dos Níveis de Ansiedade e Depressão dos Gestores das Unidades de Saúde da Família Ansiedade

Depressão

n

%

n

%

Ausência

9

60,0

11

73,3

Leve

2

13,3

4

26,7

Moderada

3

20,0

-

-

Grave

-

-

-

-

Desconhecido

1

6,7

-

-

DISCUSSÃO O processo de descentralização do sistema de saúde desencadeado pelo SUS levou à responsabilização dos municípios pelo gerenciamento de todas as ações e serviços de saúde. Com o objetivo de dar autonomia e responsabilidades a um profissional das unidades/serviços de saúde, muitos municípios criaram o cargo de gestores das unidades. No entanto, em alguns municípios não houve clareza do papel dos gestores das unidades, causando conflitos de relacionamentos (Ramires, Lourenção & Santos, 2004). Apesar das dificuldades inerentes ao processo ou ao ambiente de trabalho dos gestores das Unidades de Saúde da Família, os resultados deste estudo mostraram grande satisfação dos profissionais com a função que exercem. Estes resultados são importantes, pois o trabalho dos gestores dos serviços de saúde é fundamental para a efetivação das políticas públicas, afinal, estes profissionais respondem pela forma como a produção dos serviços está organizada e pelo modelo tecno-assistencial vigente (Santos et al., 2013). Um estudo com gestores de unidades de saúde brasileiras aponta como atividades mais importantes da atuação gerencial aquelas relacionadas à gestão de pessoas, gestão de processos e as centradas no utente. Para os profissionais, o relacionamento com a equipe, utentes e comunidade, a identificação com o trabalho e o comprometimento da equipe favorecem o trabalho gerencial. Por outro lado, a falta de profissionais nas equipes, falta de capacitação profissional e de recursos materiais, financeiros e equipamentos dificultam a atuação dos profissionais (Fernandes et al., 2010). Os resultados desse estudo apontaram bons índices de qualidade de vida dos profissionais, em todos os aspectos avaliados e evidenciam que o ambiente de trabalho é o aspecto que mais interfere na qualidade de vida dos profissionais. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 62

Estes resultados discordam da literatura, que aponta o ambiente laboral dos serviços de saúde desgastante, capaz de comprometer a qualidade de vida dos profissionais (Fernandes & Cordeiro, 2018; Bezerra, 2015; Morelli et al., 2015). Tanto o ambiente quanto o processo de trabalho dos gestores dos serviços de saúde estão cercados de fatores que comprometem a saúde e a qualidade de vida dos profissionais. A exigência de habilidades como autonomia, liderança, relacionamento interpessoal e comunicação interferem psicologicamente no profissional e na sua produtividade (Risso, 2017). Porém, a capacidade analítica do profissional e sua conexão com a atividade exercida pode levar a resultados pessoais e laborais positivos, mesmo frente a estados psicológicos críticos. Acredita-se que esta discordância e os resultados positivos evidenciados neste estudo estejam relacionados às condições de trabalhos dos profissionais no município estudado. E, embora se trate de uma especificidade, contribuem para mostrar a relevância de os gestores municipais investirem na carreira dos profissionais que exercem a função de gestores das unidades de saúde, pois estes profissionais são os responsáveis pela organização do processo de trabalho, liderança da equipe e o elo de comunicação com os demais níveis hierárquicos no sistema de saúde. Embora os gestores dos serviços estudados tenham apresentado níveis médios de engagement em todas as dimensões da UWES, os resultados são inferiores aos obtidos em estudos com profissionais de saúde brasileiros (Gonsalez et al., 2017) e colombianos (Ortiz, & Jaramillo, 2013). O percentual de profissionais que apresentaram algum nível de ansiedade e depressão (33,33% e 26,67%, respectivamente) é inferior ao observado em um estudo com gestores de Unidades de Saúde da Família da região nordeste do Brasil. Entretanto, são percentuais que merecem atenção e implementação de ações de promoção de saúde destes trabalhadores, pois a presença destes sintomas pode prejudicar a capacidade de liderança, gestão e relacionamento com a equipe e com os utentes (Martins, Silva, & Nunes, 2015). Medidas de promoção da saúde laboral dos gestores são importantes para evitar os aspectos negativos e promover os aspectos positivos do contexto ocupacional. As organizações precisam entender a saúde como um valor estratégico e incrementar os recursos laborais para prevenir riscos psicossociais e amplificar a qualidade do trabalho (Ortiz, & Jaramillo, 2013), porque há um contínuo desafio para os trabalhadores se adaptarem às novas contingências de trabalho e se manterem saudáveis (Agnst et al., 2009).


Destaca-se, no entanto, que os trabalhadores são corresponsáveis no reconhecimento dos riscos profissionais e na adoção de medidas que garantam qualidade de vida no trabalho (Baptista et al., 2018). Portanto, os gestores precisam ser capacitados para atuarem na organização e estruturação de um ambiente de trabalho saudável, que promova a saúde e a qualidade de vida de todos os profissionais da equipe. Além disso, ações de empoderamento dos gestores, como clareza das atribuições, autonomia administrativa, criação e implementação de planos de carreiras e valorização profissional são fundamentais para que estes profissionais estejam aptos para contribuir na implementação de programas e projetos que promovam um ambiente laboral saudável (Gomes & Queirós, 2018). A realização de estudos mais aprofundados sobre as possíveis causas desses resultados, poderão ajudar na proposição de medidas de intervenção que contribuam para a melhoria do processo de trabalho dos gestores das unidades da atenção primária, e garantir que gestores cumpram a função de gestores dos serviços de saúde com qualidade, contribuindo para a gestão do SUS. A amostra do estudo, limitada a um único município, representa uma limitação, por não permitir generalizar os resultados a toda a população de gestores dos serviços de saúde. Outra limitação do estudo é o delineamento transversal, que não possibilita o estabelecimento de relações causais. Aponta-se, assim, a necessidade de novos estudos, com amostra ampliada, incluindo profissionais de diferentes municípios, nas várias regiões do Brasil e delineamento capaz de verificar a relação de causa e efeito entre os transtornos avaliados, as características comportamentais, ambientais e as condições de trabalho dos gestores das unidades da atenção primária à saúde. CONCLUSÕES O estudo mostrou que os gestores das Unidades de Saúde da Família apresentaram bom nível de qualidade de vida, com um leve declínio no domínio Meio Ambiente. Há um percentual importante de profissionais com algum nível de ansiedade e depressão. Estes índices podem ser resultantes do desgaste profissional gerado pela complexidade do processo de trabalho e das responsabilidades inerentes ao processo de gestão do serviço de saúde. Os níveis de engagement estão acima da média em todas as dimensões da UWES.

O estudo demonstra que, mesmo com bons níveis de engagement e qualidade de vida, os gestores das unidades de saúde podem apresentar ansiedade e depressão. Estes resultados apontam a necessidade de ações de promoção de saúde e bem-estar dos trabalhadores. A implementação de medidas que identifiquem precocemente sintomas de ansiedade e estresse e promovam controle das causas de ansiedade e estresse, prevenindo incapacidades individuais decorrentes destes transtornos. Assim, sugere-se a realização de novos que investiguem as causas e fatores de risco de ansiedade e depressão em gestores de unidades de saúde, bem como os aspectos que fortaleçam o engagement destes profissionais. Além disso, estudos com amostras maiores de profissionais, em diferentes regiões do Brasil, permitirão identificar aspectos culturais e organizacionais que interfiram na relação destes profissionais com o ambiente laboral, aprofundando o conhecimento sobre este problema e contribuindo para o direcionamento de ações de promoção da saúde e qualidade de vida destes trabalhadores. IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA O estudo contribui para a discussão e implementação de políticas de atenção à saúde dos profissionais gestores, em sua maioria, enfermeiros; colabora para a reflexão dos gestores sobre a importância da criação de ações e políticas de incentivo à carreira dos gestores, com melhorias das condições de trabalho e fortalecimento do processo de gestão das equipes, favorecendo a oferta de assistência mais eficaz e resolutiva. Embora não permita verificar a existência de relações causais, ao descrever o problema, o estudo contribui para o entendimento dos níveis de qualidade de vida, engagement, ansiedade e depressão entre os gestores das unidades de saúde, permitindo o direcionamento de ações de promoção de saúde destes trabalhadores. Além disso, evidencia a necessidade de processos de ensinoaprendizagem que garantam formação adequada e qualificação permanente destes profissionais, assegurando o avanço das ações de saúde no sistema público de saúde.

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Artigo de Investigação

9

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0228

MAPEAMENTO DOS RECURSOS HUMANOS E SERVIÇOS OFERTADOS POR DOIS CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL INFANTO-JUVENIL | Claudia Moreira de Lima1; Sue Ellen Ferreira Modesto Rey de Figueiredo2; Akeisa Diele Ribeiro Dalla Vechia3 |

RESUMO OBJETIVO: Este estudo teve como objetivo caracterizar e identificar os serviços disponíveis à crianças e adolescentes com variados tipos de transtornos mentais atendidas em dois Centros de Atenção Psicossociais Infanto-Juvenis (CAPSi) do estado de Mato Grosso, Brasil. MÉTODOS: Foi aplicado um questionário semiestruturado auto respondido pelos coordenadores dos CAPSi participantes da pesquisa entre os meses de janeiro e fevereiro de 2018 e foram utilizadas fichas para o registro das observações feitas pelos pesquisadores nas unidades. Os principais serviços disponíveis às crianças/adolescentes que frequentam os respectivos CAPSi foram: acolhimento, atendimento por equipe multidisciplinar (médicos, enfermeiros, psicólogos, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos e assistentes sociais), oficina/grupo terapêutico, reuniões da equipe técnica, visita domiciliar, atendimento individual aos usuários e seus familiares, participação em assembleias e comemoração de datas festivas/mês. RESULTADOS: Os resultados apontam que a equipe atuante nos serviços busca desenvolver ações de forma interdisciplinares idealizando um cuidado de forma integral, apesar da falta de recursos humanos adequados. CONCLUSÕES: Conhecer a situação da assistência ao público infanto-juvenil com algum transtorno de saúde mental pode ser um primeiro passo para a sensibilização de líderes das áreas da saúde e da educação para novas propostas de assistência a estes indivíduos bem como seus familiares. PALAVRAS-CHAVE: Saúde mental; Crianças; Adolescentes; Transtornos mentais

RESUMEN

ABSTRACT

“Asignación de recursos humanos y servicios ofrecidos por dos centros de atención psicosocial para niños y adolescentes”

“Human resources mapping and offered services by two childjuvenile psychosocial attention centers”

OBJETIVO: Este estudio pretende caracterizar e identificar los servicios disponibles para los niños y adolescentes con diversos tipos de trastornos mentales conocidos en dos centros de atención psicosociales para los niños (Centro (CAPSi)) en el Estado de Mato Grosso, Brasil. METODOLOGIA: Un cuestionario semiestructurado fue contestado por los coordinadores de la encuesta del Centro (CAPSi) entre los meses de enero y febrero de 2018 e hicieron fichas para las observaciones formuladas por los investigadores en las unidades. Los principales servicios disponibles para niños y adolescentes que asisten a su centro (CAPSi) eran: acogerlos, cuidado por un equipo multidisciplinario (médicos, enfermeras, psicólogos, terapeutas ocupacionales, audiólogos y trabajadores sociales), taller/grupo terapéutico, reuniones de personal técnico, visita a domicilio, asistencia individual a los usuarios y sus familias, participación en reuniones y conmemoración de fechas festivas/mes. RESULTADOS: Los resultados señalan que el equipo que actúa en los servicios busca desarrollar acciones de manera interdisciplinaria, idealizando un cuidado de forma integral, a pesar de la falta de recursos humanos adecuados. CONCLUSIONES: Para conocer la situación de la asistencia a los niños y adolescentes con un trastorno de salud mental pueden ser un primer paso hacia la sensibilización de líderes en las áreas de salud y la educación a nuevas propuestas de ayuda a estas personas, así como su familia.

AIM: This study’s objective is to characterize and identify the avaliable services to children and teenagers with various types of mental disorders attended at two Child-Juvenile Psychosocial Attention Centers(CJPAC) from the state of Mato Grosso, Brazil. METHODS: It was applied a semi-structured questionnaire which was self answered by the coordinators from the reaserch participating CJPACs between the months of January 2018 and Febuary 2018 forms were used to record the observations made by the researchers at the units. The main avaliable services to the children/teenagers that attend the respective CJPAC were: hosting, multidisciplinary team treatment (doctors, nurses, psychologist, occupational therapists, speech therapists, social assitants), therapeutic group/workshop, technical team meetings, home vist, individual user attendance and their relatives, assembly participation and celebration of festive dates/months. RESULTS: The results point towards that the active team on these services seek to develop actions in an interdisciplinary way idealizing them with integral caution, although the lack of adequate human resources. CONCLUSIONS: To know the situation of public child-juvenile assitance services to it’s public with any mental heath disorder can be the step to the sensibilization of leaders of health and education areas to new assistance proposals of such individuals and their relatives as well.

DESCRIPTORES: Salud mental; Niños; Adolescentes; Trastornos mentales

KEYWORDS: Mental health; Children; Teenagers; Mental disorders Submetido em 31-03-2018 Aceite em 19-07-2018

1 Enfermeira Especialista em Urgência e Emergência; Mestranda na Universidade de Cuiabá, Programa Ambiente e Saúde, Brasil, cml_claudiamoreira@hotmail.com 2 Psicóloga; Doutora em Oncologia; Docente Permanente na Universidade de Cuiabá, Programa de Pós-Graduação Scrito Sensu em Ambiente e Saúde, Cuiabá/MT, Brasil, suemodesto@hotmail.com 3 Enfermeira; Mestranda na Universidade Federal do Estado de Mato Grosso, 78300-000 Tangará da Serra/MT, Brasil, akeisa_drdv@hotmail.com Citação: Lima, C. M., Figueiredo, S. E. F. M. R., & Dalla Vechia, A. D. R. (2018). Mapeamento dos recursos humanos e serviços ofertados por dois centros de atenção psicossocial infanto-juvenil. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (20), 65-71. doi: 10.19131/rpesm.0228 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 65


INTRODUÇÃO

MÉTODOS

Nos últimos anos os transtornos mentais na população infanto-juvenil representam um sério problema de Saúde Pública, sendo responsáveis por agravantes na qualidade de vida, podendo causar incapacidades, morbidades e até morte prematura (Paula, Miranda e Bordin, 2010). Estudos apontam para uma prevalência de 10% a 20% de crianças e adolescentes do mundo sofram de algum transtorno mental de leve a grave (Organização Mundial da Saúde, 2003). A nível nacional essa taxa varia de acordo com a abordagem do estudo, ficando em 12% a 24,6% em estudos realizados utilizando instrumentos de rastreamento ou de 7% a 12,7% em estudos desenvolvidos por entrevistas (Paula et al., 2014). Entretanto apesar da premente temática a nível mundial a atenção à saúde mental de crianças e adolescentes passou a fazer parte da agenda das políticas públicas tardiamente (Delfine e Reis, 2012). No Brasil a Lei Federal 10.216 em 2001, trata da Reforma Psiquiátrica e através da publicação da portaria 336/02 que se consolidou o modelo assistencial dos Centros de Atenção Psicossociais Infanto-Juvenis (CAPSi) como um importante dispositivo de atendimento à saúde mental do público infanto-juvenil, tendo como objetivo o cuidar com foco na compreensão da subjetividade de maneira mais humanizado e menos hospitalocêntrico (Carvalho, Gondim, Holanda e Alencar, 2014). Nesse contexto os CAPSi são responsáveis por atender crianças e adolescentes com idade compreendida entre zero a 18 anos que apresentem algum transtorno psíquico (Carvalho et al., 2014). De acordo com os dados de agosto de 2017 havia no Brasil 2.465 CAPS implantados, sendo 1.191 CAPS I, 505 CAPS II, 100 CAPS III, 324 CAPSad, 106 CAPSad III e 229 CAPSi (Ministério da Saúde, 2017). Com relação aos CAPSi a região centro Oeste conta com 10 unidades, destes quatro estão no Estado de Mato Grosso, localizadas nos municípios de Cuiabá atual capital do Estado e os municípios de Várzea Grande, Rondonópolis e Cáceres cada município com 1 unidade (Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso, 2017). Há uma escassez de trabalhos que tratam da assistência em saúde mental direcionada ao público infanto-juvenil, dessa forma, almejamos com este estudo fornecer conhecimento acerca da assistência no campo da saúde mental da criança e adolescente, agregando dados aos estudos existentes, para isso nosso estudo buscou conhecer e descrever os serviços prestados por dois Centros de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenil (CAPSi) do Estado de Mato Grosso.

Trata-se de um estudo do tipo transversal, descritivo realizado em dois Centros de Atenção Psicossocial Infanto-juvenil (CAPSi) localizados nos municípios de Cuiabá e Várzea Grande, estado de Mato Grosso – Brasil. A escolha das unidades foi por conveniência. A coleta das informações ocorreu entre os meses de janeiro e fevereiro de 2018. Para as entrevistas com os coordenadores de cada CAPSi participante do estudo, utilizou-se roteiro semiestruturado autorrespondido, que versou sobre os atendimentos ofertados durante o ano de 2017, abordando itens relacionados a funcionalidade das unidades bem como informações acerca da equipe profissional atuante no respectivo ano. Utilizaram-se fichas para o registro das observações feitas pelos pesquisadores nas unidades. Posteriormente, os dados coletados pelo questionário foram codificados e armazenados em planilha eletrônica do programa Microsoft Excel® para posterior análise que ocorreu em três etapas: tabulação dos dados; análise estatística simples; triangulação com dados qualitativos e interpretação crítica dos dados em confronto com a literatura pesquisada. Em um primeiro momento foi descrito o serviço agrupando os dados dos dois questionários nas categorias serviços prestados e recursos humanos. A posteriori foram comparadas as categorias operacionais com informações disponíveis na literatura nacional e internacional acerca da temática e normas regulamentadas. O diário de campo teve como objetivo detalhar fatos do cotidiano dos CAPSis servindo como complemento às análises anteriores, proporcionando acesso a realidade dos fatos, contribuindo na caracterização e discussão dos dados das entrevistas. Esta pesquisa foi desenvolvida após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Cuiabá-UNIC, sob o Parecer n. 2.421.481, CAAE: 80172417.8.0000.5165. A pesquisa foi desenvolvida sem financiamento. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), por meio do qual foram informados sobre as medidas para assegurar o anonimato e a confidencialidade sobre a origem dos dados obtidos. O presente estudo obedeceu às normas de pesquisa com seres humanos, segundo a Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.

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RESULTADOS As unidades participantes deste estudo somam um quantitativo de 2.548 usuários cadastrados e em atendimento regular durante o ano de 2017, com idade compreendida entre 0 a 18 anos, sem um período estabelecido para acompanhamento/tratamento, este é realizado até a percepção da equipe da possibilidade de alta assistencial e/ou quando esta não acontece e o usuário completa a maior idade é feito encaminhamento ao Centro de Atenção Psicossocial (CAPS). As unidades prestam atendimento em dois períodos (matutino e vespertino) de segunda e sexta-feira, com cuidados a crianças e adolescentes com transtornos mentais severos e/ou persistente dentre eles: autismo, neurose grave, psicose, depressão, ideação e tentativa de suicídio, bipolaridade, transtorno opositor desafiador, quadros de déficit intelectual associado a outra transtorno mental e hiperativo associado a outro transtorno mental, sendo de maior recorrência atendimentos a casos de Autismo psicótico neurótico grave e tentativa e ideação ao suicídio. Os serviços nas unidades são desenvolvidos por uma equipe multiprofissional atuando sob uma lógica interdisciplinar, onde os profissionais atuam de forma distinta, com competências próprias de sua formação ao mesmo tempo que realizam atividades em coletivo com os demais colegas desenvolvendo um trabalho interdisciplinar. As equipes das unidades somam um quantitativo de vinte e quatro profissionais, estes divididos entre unidade I e unidade II, estando estes profissionais em caráter efetivo (28,57% e 60%) e provisório (71,43% e 40%) respectivamente. A composição das ‘categorias profissionais’ atuantes nas unidades engloba médicos, enfermeiros, psicólogos, terapeutas ocupacional, fonoaudiólogos, assistentes social e técnicos de enfermagem. A distribuição profissional em cada unidade de estudo pode ser melhor visualizada no quadro 1. Quadro 1 - Descrição do Número de Participantes da Pesquisa, Segundo a Quantidade por Unidade. Cuiabá, 2018. Categoria Profissional

CAPSi Unidade I

CAPSi Unidade II

%

%

Médico

01

7,14

01

10,0

Enfermeiro

02

14,29

02

20,0

Psicólogo

02

14,29

02

20,0

Terapeuta Ocupacional

02

14,29

00

0,0

Fonoaudiólogo

03

21,41

01

10,0

Assistente Social

02

14,29

02

20,0

Técnico de Enfermagem 02

14,29

02

20,0

Total

100

10

100

14

Fonte: CAPSi Cuiabá/MT, CAPSi Várzea Grande/MT. Coordenação de Saúde Mental-MT. 2018

As atividades realizadas pelos profissionais são especificas da abordagem da formação de cada profissional este atuando de forma interdisciplinar, além da realização de um trabalho organizado em forma de escala mensal, com a participação nas atividades por todos os profissionais. Estas ações estão detalhadas no Quadro 2. Quadro 2 - Atividades Desenvolvidas pelo Profissional em Formato de Escala

Acolhimento inicial Oficina/grupo terapêutico Participação em reunião da equipe técnica Visita domiciliar Atendimento individual aos usuários e aos familiares Participação na assembleia com os usuários Elaboração de datas festivas/mês Dentre a atividades supracitadas, faz-se necessário destacar que o profissional médico, não compartilha das mesmas atividades, ficando destinado especificadamente aos atendimentos clínicos, visitas domiciliares e participação nas reuniões técnicas. Foram investigados também os serviços ofertados à clientela e seus familiares, ressaltamos que nesta etapa da pesquisa por conta do instrumento de pesquisa utilizado para a coleta dos dados não foi possível identificar elementos mais qualitativos relacionados às formas de participação de usuários, familiares e profissionais. O atendimento de crianças e adolescentes com algum problema de saúde mental bem como atenção a seus familiares, vem sendo desenvolvido nos CAPSi investigados, com ações que envolvem oficinais terapêuticas, atendimentos em grupos, atendimentos individuais, atividades comunitárias, visitas e atendimentos domiciliares. A assistência é ofertada com atendimentos diferenciados para cada grupo, com atividades e horários por faixa etária e transtorno, o que contribuiu para uma evolução quanto ao tratamento. No que tange a articulação dos CAPSi com outros setores e movimentos sociais, são realidade das instituições, que mantem contato próximo com escolas, Unidades Básicas de Saúde, Conselho tutelar e promotoria/ justiça. Quanto à assistência prestada ao usuário nos CAPS, a Portaria n.º 336/2002 (p.4, 2002) prevê que: “[...] os pacientes assistidos em um turno (04 horas) receberão uma refeição diária; os assistidos em dois turnos (08 horas) receberão duas refeições diárias [...]”. A respeito desse aspecto, as unidades exploradas nesta pesquisa disponibilizam refeição aos usuários assistidos conforme as normas do MS supracitada. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 67


Outro dado significativo do estudo refere-se à ‘Reunião de Equipe’. Todos os CAPSi participantes da pesquisa realizam reunião de equipe semanalmente viabilizando a discussão de casos, avaliação das atividades desenvolvidas, levantamento de problemas e propostas visando melhorar a prestação dos serviços. DISCUSSÃO Os Centros de Atenção Psicossocial Infanto-juvenil (CAPSi), foram uma importante conquista no que se refere ao cuidado desprendido à saúde de crianças e adolescentes com transtornos mentais, com estimativas que apontam para uma estatística de que uma entre quatro a cinco crianças e adolescentes no mundo apresentam algum tipo de transtorno mental (Patel, Flisher, Hetricks & McCorry, 2007). Os dados encontrados neste estudo com relação ao perfil nosológico das unidades traz o suicídio (tentativa ou ideação) e o autismo (Autista psicótico neurótico grave) entre as causas de maior utilização dos serviços. Cediço, nos últimos anos, vem sendo divulgados dados alarmantes da ocorrência de autismo, está síndrome merece atenção especial, tendo em vista que estudos em todo o mundo apontam para uma prevalência de 1% da população infanto-juvenil, sendo 1 caso a cada 68 crianças (Untoiglich, 2013; Brasil, 2015). No que tange o suicídio, este é considerado um problema de saúde pública. Um estudo epidemiológico realizado em 101 países entre 2000 a 2009 sobre suicídio entre todas as faixas etárias, foi constatado que 14,7% dos suicídios abordados na pesquisa ocorreram em crianças e adolescentes (Kõlves & De Leo, 2015). No que se refere aos profissionais atuantes nas unidades, estes são na sua maioria contratados, o que torna o cuidado frágil uma vez que com o interromper dos contratos alguns não atuam novamente na unidade, havendo assim a substituição por outro profissional. Não é nossa intenção desmerecer o profissional que assume a atividade, entretanto, destarte, essa rotatividade de pessoal acarreta dificuldade no estabelecimento de vínculo usuário-profissional-família, uma vez que esta interação quando possível ser estabelecida é um ponto positivo na construção da rede de atenção em saúde mental, tendo esse vínculo como um percursor de melhor prognóstico (Paes, Schimith, Barbosa e Righi, 2013; Ribeiro, 2015). Por outro lado, a diversidade de profissionais atuantes nas unidades para a realização dos cuidados demonstra a existência de uma prática multiprofissional, essa interação entre diferentes profissionais, possibilita uma articulação nas intervenções propostas. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 68

Sendo essa diversidade profissional essencial nos centros de atenção psicossocial independente de sua classificação, visando atender o perfil dos usuários do serviço, tentando adequar-se à realidade sociocultural da região. Para tanto, os cuidados desprendidos são desenvolvidos a partir do Projeto Terapêutico Singular (PTS), que tem a construção da atividade envolvendo equipe, usuário e família (Boccardo, Zane, Rodrigues e Mãngia, 2011). Diante ao exposto as equipes quando formadas por profissionais de categorias diversas devem levar em consideração os usuários que serão atendidos, de modo a possibilitar um acompanhamento contínuo além de uma melhor absorção da terapêutica por cada usuário (Anjos Filho e Souza, 2017), porem se faz necessário mencionar a observação de dificuldade na articulação entre profissionais em alguns momentos, o que é esperado tendo que a sua formação o leva a priorizar distintos aspectos no trabalho terapêutico. Desta feita a equipe de um CAPS (esteja ele em qualquer categoria de classificação) deve ser contemplada com uma diversidade profissional, onde cada tipo de CAPS tem características próprias quanto aos tipos e quantidade de trabalhadores. No que tange a equipe profissional mínima para estruturação de um CAPSi temos: “01 (um) médico psiquiatra, ou neurologista ou pediatra com formação em saúde mental; b - 01 (um) enfermeiro. c - 04 (quatro) profissionais de nível superior entre as seguintes categorias profissionais: psicólogo, assistente social, enfermeiro, terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo, pedagogo ou outro profissional necessário ao projeto terapêutico” (Portaria 336, 2002, p. 4-5). Com relação aos ‘profissionais que compõem as equipes’ é importante ressaltar que as duas unidades apresentam defasagem em recursos humanos em nível profissional conforme o preconizado pela Portaria n.º 336/2002, apresentando deficiências como falta de médico psiquiatra ou com formação em saúde mental. Em pesquisa realizada na cidade da Paraíba, também foi constatado a carência quanto a distribuição dos recursos humanos no serviço, em especial também na área médica (Clementino et al., 2016). Ainda, de modo a reforçar os dados apurados, destaca-se que quando o profissional não tem uma proximidade com a área de saúde mental o cuidado fica prejudicado, o que é confirmado no estudo realizado por Ronchi e Avellar (2013), onde os depoentes desconheciam a dinâmica de funcionamento do CAPSi, assim como a regulamentação dos serviços, o que levava a um atendimento precário.


Há de se considerar além disso que a falta de uma equipe mínima atuante neste setor de saúde caracteriza-se como um fator desestabilizador para o serviço, tendo como ponto crítico problemas para a prática da integralidade, uma vez que a multiprofissionalidade conforme mencionado contribui para a introdução de novas formas de abordagem/tratamento (Paes et al.,2013). No que tange as atividades a serem desenvolvidas nestas unidades, o MS preconiza a realização de atividades de caráter individual e em grupos. Diante ao aludido, as duas unidades oferecem diferentes atividades as crianças e adolescentes, com atendimento tanto individual quanto coletivo, desenvolvem atividades por meio de oficinas/ grupos terapêuticos, realizam visitas domiciliares, além de atividades voltadas ao atendimento a família conforme necessidade identificada. Faz-se enfatizar que as unidades dispõem de horários diferenciados para cada faixa etária e transtorno tratado. Em relação a este achado, a literatura cientifica evidencia que a assistência adequada de acordo com o transtorno psíquico, faixa etária e um ambiente acolhedor facilitam o cuidado e a relação entre usuário e profissional, estes fundamentais para uma assistência humanizada (Ribeiro, 2015). A realização de atividades tanto no individual quanto no coletivo, assim como a entrega de materiais (lápis, borracha, giz de cera, papel sulfite, brinquedos entre outros), fornecidos durante o atendimento possibilita ao usuário identificar ações necessárias no seu dia a dia. Ações estas preconizadas pelo Ministério da Saúde (2010), onde trata da atenção dispensada ao usuário através da disponibilização de materiais que favorecem o vínculo e a criação de um ambiente adequado às suas necessidades. Outra atividade importante realizada com às crianças e os adolescentes são as oficinas de artes e de histórias, além da realização de grupos com adolescentes. As atividades não têm um padrão estabelecido, elas são desenvolvidas de acordo com o grupo formado ou usuário atendido, levando em consideração a individualidade de cada um. As visitas domiciliares são realizadas com o objetivo de promover momentos direcionados para o usuário e família. Esta abordagem permite acompanhar o usuário no seu individual, favorece a realização de atendimento assistencial e educativo além de possibilitar a inserção da família no tratamento o que gera um suporte para a continuidade deste. Por meio deste recurso é direcionado um suporte a família do usuário, que muitas vezes estão em situação de falta de suporte social, atividade ocupacional e a própria ausência de suporte familiar (Pereira, Cézar, Reisdorfer e Cardoso, 2014).

Ainda em relação aos serviços ofertados, uma das unidades informou oferecer visitas institucionais e matriciamento, além de realizar assembleia geral. No que diz respeito ao matriciamento este é uma abordagem satisfatória neste setor de saúde, tendo em vista que a atenção em saúde é feita de forma compartilhada com vistas à integralidade e à resolubilidade do cuidado, por meio do trabalho interdisciplinar. O matriciamento tem sido bem avaliado quando as equipes conseguem adequada interlocução, possibilitando estabelecer corresponsabilidade no tratamento dos usuários (Delfine e Reis, 2012). Os autores ainda enfatizam que as ações desenvolvidas extramuros são essenciais neste setor de saúde visando atender a diversidade de problemas que envolvem a saúde mental neste foco do público infantojuvenil, garantindo assim maior resolutividade em casos de sofrimento psíquico, porém, o que poderia ser usado a favor do tratamento – diferentes setores atuando juntos – mostra-se um desafio a ser superado, tendo que as intervenções em saúde mental a este público são desafiadoras, justificadas pela falta de parâmetro essencial durante o atendimento e pela complexidade da situação e também do ambiente. No que diz respeito a rotina dos CAPSis, a oferta de lanche é tida como a finalização do trabalho em ambas as unidades estudadas. Mister identificar que esse processo não deve ser visto como um simples momento de refeição, mais sim um momento que deve levar em consideração as especificidades do usuário, onde o ambiente destinado à ‘hora do lanche’ é um ambiente que pode e deve ser tomado como um local de possibilidade de intervenção, mais uma vez evidenciado pelo Ministério da Saúde (Ministério da Saúde, 2010), onde traz que a atenção dispensada aos usuários, deve estar atenta aos espaços utilizados pelos pacientes de modo geral, assim todo e qualquer espaço pode ser agregado no atendimento vistas a uma terapêutica. Na questão referente a ‘reunião da equipe’ sua realização permite uma maior integração e interação entre os profissionais, possibilitando melhor discussão dos casos atendidos. É um importante dispositivo neste setor de saúde que auxilia no (re)delinear do trabalho através das falas interdisciplinares dos casos apresentados pelos profissionais, essa interdisciplinaridade contribui para o surgimento de conteúdo de inovação em saúde e traz um olhar diferente para os procedimentos que estão sendo abordados, identificando a necessidade de mudança de terapêutica, adequação ou complementação (Anjos Filho e Souza, 2017). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 69


CONCLUSÕES Os principais serviços disponíveis às crianças/adolescentes que frequentam os respectivos CAPSi deste estudo foram: acolhimento, atendimento por equipe multidisciplinar (médicos, enfermeiros, psicólogos, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos e assistentes sociais), oficina/grupo terapêutico, reuniões da equipe técnica, visita domiciliar, atendimento individual aos usuários e seus familiares, participação em assembleias e comemoração de datas festivas/mês. Na pesquisa empreendida, pôde-se verificar potencialidades dos serviços de saúde mental, onde os dados apurados permitem constatar que a equipe atuante nos serviços busca desenvolver ações de forma interdisciplinares idealizando um cuidado de forma integral, apesar da falta de recursos humanos adequados diante do preconizado. Nesse enredo ressalta-se que que a não inclusão das outras instituições existentes no Estado evidencia uma limitação, destarte, nosso interesse é despertar e ampliar a discussão acerca da temática, onde os resultados desse estudo ajudam a conhecer um pouco mais a situação da assistência ao público infanto-juvenil com algum transtorno de saúde mental, o que pode ser um primeiro passo para a sensibilização de líderes das áreas da saúde e da educação para novas propostas de assistência a estes indivíduos bem como seus familiares. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Anjos Filho, N. C., Souza, A. M. P. (2017). A percepção sobre o trabalho em equipe multiprofissional dos trabalhadores de um Centro de Atenção Psicossocial em Salvador, Bahia, Brasil. Interface - Comunicação, Saúde, Educação, 21 (60), 63-76. Doi: 10.1590/180757622015.0428 Boccardo, A. C. S., Zane, F. C., Rodrigues, S., Mângia, E.F. (2011). O projeto terapêutico singular como estratégia de organização do cuidado nos serviços de saúde mental. Revista de Terapia Ocupacional. 22 (1), 85-92. Doi: 10.11606/issn.2238-6149.v22i1p85-92 Brasil (2010). Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. (4ª ed.) Brasília: Ministério da Saúde. Disponível em: http://bibliotecadigital.puc-campinas. edu.br/services/e-books/humanizasus_documento_ gestores_trabalhadores_sus.pdf Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 70

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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 71


Artigo de Revisão

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0229

10 SERVIÇOS DE ATENDIMENTO MÓVEL DE URGÊNCIA FRENTE ÀS

EMERGÊNCIAS PSIQUIÁTRICAS: UMA REVISÃO NARRATIVA | Alana dos Santos de Souza1; Helena Moraes Cortes2; Paula Hayasi Pinho3 |

RESUMO CONTEXTO: O atendimento na crise pode ser realizado pelos: Centros de Atenção Psicossocial, emergências dos hospitais gerais, urgência/ emergência dos pronto-socorros, atenção primária à saúde e os Serviços de Atendimento Móvel de Urgência. OBJETIVO: Realizou-se uma revisão narrativa sobre os serviços de atendimento móvel de urgência frente às emergências psiquiátricas. MÉTODO: Foram realizadas buscas de artigos nas bases de dados: SCIELO, BVS, CAPES e LILACS publicados entre 2013 a 2018. Para a busca dos artigos utilizou-se as seguintes palavras-chaves: emergências psiquiátricas, crise psíquica, serviço de atendimento móvel de urgência no atendimento à crise, sendo identificados 23 estudos. RESULTADOS: Observou-se uma escassez de estudos sobre os serviços de atendimento móvel de urgência frente às emergências psiquiátricas. Os serviços de urgência e emergência, quando prestam assistência à pessoa em crise psíquica, tem priorizado a sedação e o encaminhamento para o internamento hospitalar, reproduzindo o saber da psiquiatria tradicional. A dificuldade dos profissionais de saúde em atender a pessoa em situações de urgência e ou emergência psiquiátrica, por vezes está relacionada com a deficiente formação, e com a falta de educação permanente que abarque a saúde mental. CONCLUSÃO: O cuidado prestado pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência à pessoa em sofrimento psíquico é fundamental para o fortalecimento da reestruturação da assistência à saúde mental no país. É necessário o treinamento das equipes que atuam nesses serviços para garantir a função substitutiva dos serviços da Rede de Atenção Psicossocial e, o cuidado das pessoas que vivem e convivem com transtornos mentais fora das internações hospitalares. PALAVRAS-CHAVE: Saúde mental; Intervenção na crise; Serviços de saúde mental

RESUMEN

ABSTRACT

“Servicios de atención móvil de urgencia frente las emergencias psiquiátricas: Una revisión narrativa”

“Moving services of urgency in front of psychiatric emergencies: A narrative review”

CONTEXTO: La atención a la crisis puede ser realizada por: Centros de Atención Psicosocial, emergencias de los hospitales generales, puertas hospitalarias de atención a la urgencia / socorro, atención primaria a la salud y los Servicios de Atención Móvil de Urgencia. OBJETIVO: Se realizó una revisión narrativa sobre los servicios de atención móvil de urgencia frente a las emergencias psiquiátricas. MÉTODO: Se realizaron búsquedas de artículos en las bases de datos: SCIELO, BVS, CAPES y LILACS publicados entre 2013 a 2018.En la búsqueda de los artículos se utilizaron las siguientes palabras clave: emergencias psiquiátricas, crisis psíquica, servicio de atención móvil de los servicios de atención telefónica la urgencia en la atención a la crisis, siendo identificados 23 estudios. RESULTADOS: Se observa la escasez de estudios sobre los servicios de atención móvil de urgencia frente a las emergencias psiquiátricas. Los servicios de urgencia y emergencia, cuando prestan asistencia al usuario en crisis psíquica, han priorizado la sedación y el encaminamiento para la internación hospitalaria, reproduciendo el saber de la psiquiatría tradicional. La dificultad de los profesionales de la salud en atender a la persona en situaciones de urgencia y o emergencia psiquiátrica, a veces está relacionada con la deficiente formación, y con la falta de educación permanente que abarque la salud mental. CONCLUSIÓN: La asistencia prestada por el Servicio de Atención Móvil de Urgencia a la persona en sufrimiento psíquico es fundamental para el fortalecimiento de la reestructuración de la asistencia a la salud mental en el país, es necesario el entrenamiento de los equipos que actúan en esos servicios para garantizar la función sustitutiva de los servicios de la salud Red de Atención Psicosocial y el cuidado de las personas que viven y conviven con trastornos mentales fuera de las internaciones hospitalarias.

BACKGROUND: Crisis care can be carried out by: Psychosocial Care Centers, general hospital emergencies, hospital emergency care / emergency room doors, primary health care and Mobile Emergency Care Services. AIM: To carry out a narrative review on emergency mobile services in the face of psychiatric emergencies. METHODS: Articles were searched in databases: SCIELO, VHL, CAPES and LILACS published between 2013 to 2018. The following keywords were used to search for the articles: psychiatric emergencies, psychic crisis, mobile urgency in dealing with the crisis, with 23 studies being identified. RESULTS: There is a shortage of studies on emergency mobile services in the face of psychiatric emergencies. The emergency and emergency services, when assisting the user in psychic crisis, have prioritized sedation and referral for hospital admission, reproducing the knowledge of traditional psychiatry. The difficulty of health professionals in caring for the person in situations of emergency and or psychiatric emergency is sometimes related to poor training and lack of permanent education that includes mental health. CONCLUSION: The assistance provided by the Mobile Emergency Service to the person suffering from mental illness is fundamental to strengthen the restructuring of mental health care in the country, it is necessary to train the teams that work in these services to guarantee the substitutive function of the services of the Psychosocial Attention Network and the care of people who live and coexist with mental disorders outside hospital admissions.

DESCRIPTORES: Salud mental; Intervención em la crisis; Servicios e salud mental

Submetido em 31-03-2018 Aceite em 09-07-2018

KEYWORDS: Mental health; Crisis intervention; Mental health services

1 Estudante do 9º semestre de Enfermagem na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Centro de Ciências da Saúde, Bahia, Brasil, alanasanttos94@gmail.com 2 Doutora e Mestra em Ciências: Enfermagem Psiquiátrica e Saúde Mental; Enfermeira especialista em Atenção Psicossocial no âmbito do Sistema Único de Saúde; Professora Assistente na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, 44570-000 Cajueiro - Santo Antônio de Jesus - Bahia, Brasil, helena@ufrb.edu.br 3 Doutora em Ciências pela Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem; Psicóloga, especialista em Atenção Psicossocial; Professora Assistente na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, 44570-000 Cajueiro - Santo Antônio de Jesus - Bahia, Brasil, paulahpinho@gmail.com Citação: Souza, A. S., Cortes, H. M., & Pinho, P. H. (2018). Serviços de atendimento móvel de urgência frente às emergências psiquiátricas: Uma revisão narrativa. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (20), 72-80. doi: 10.19131/rpesm.0229 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 72


INTRODUÇÃO O perfil epidemiológico das emergências psiquiátricas, tem passado por mudanças no decorrer das últimas décadas, pela razão da Reforma Psiquiátrica brasileira. As emergências psiquiátricas são caracterizadas por situações de crise psíquica que os usuários apresentam, embora, nem toda a situação de crise determine uma emergência, entretanto, estas estão intimamente relacionadas (Bonfada, 2010; Quevedo e Carvalho, 2014). Para a psiquiatria tradicional a crise é entendida como uma situação de grave desequilíbrio resultante da doença mental. Entende-se como uma agudização e exacerbação do adoecer mental, e tem como consequências ações que objetivam a contenção e a redução dos sintomas, por considerar que o funcionamento geral do indivíduo está prejudicado e, este pode se tornar incapaz de assumir responsabilidades pessoais (Amarante, 2007; Willrich, 2016). Em contrapartida, no campo da atenção psicossocial a crise também é compreendida como uma situação de sofrimento psíquico intenso, que produz uma desorganização mental, e pode ser originada de aspectos ligados ao convívio familiar e social do indivíduo, proporcionando o desligamento da sua realidade, principalmente no meio social, afastando-se, restritamente, do sentido limitado da agudização sintomatológica (Amarante, 2007; Willrich, 2016). A Reforma Psiquiátrica brasileira, procurou substituir o modelo de assistência psiquiátrica de tipo manicomial, por uma rede de serviços substitutivos de apoio à saúde mental e psiquiatria. O cuidado à saúde na perspectiva da atenção psicossocial, vem se consolidando e mostrando-se resolutivo. Apesar disso, a atenção à saúde precisa ser ampla e considerar o sujeito na sua integralidade, e não apenas o transtorno psíquico por ele apresentado (Demarco, Jardim e Kantorski, 2016). O movimento de desinstitucionalização no Brasil, fundamentado na Reforma Psiquiátrica, visou a reestruturação da assistência à saúde mental no país, procurando a integração das pessoas com transtornos mentais, no seu meio social, por meio da valorização de serviços estratégicos, comunitários e de territorialização, bem como novas formas de cuidados e, a garantia do direito à cidadania, desconstruindo o estigma da loucura (Maftum, Silva, Borba, Brusamarello e Czarnobay, 2017). Os serviços de assistência substitutivos do modelo manicomial no atendimento à crise são prestados pelos componentes integrados da Rede de atenção Psicossocial (RAPS).

O atendimento na crise pode ser realizado pelos: Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) nas suas diferentes modalidades, emergências dos hospitais gerais, atenção à urgência/emergência nos prontos socorros, atenção primária à saúde por meio das Unidades Básicas de Saúde (UBS) e, os Serviços de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) (Brasil, 2011). Para o Ministério da Saúde do Brasil, não há local específico e, exclusivamente responsável, para atender às situações de crise, nem sendo tampouco de exclusividade dos profissionais de saúde. O atendimento à crise deve acontecer no lugar onde se encontra o indivíduo, ou seja, no seu circuito de vida ou de cuidado: residência, via pública, serviços de saúde como UBS, CAPS, pronto-socorro, entre outros lugares de convívio em que o indivíduo se encontre (Ministério da Saúde, 2013). Diante disso, os serviços de urgência e emergência assumem um lugar importante no atendimento às pessoas com transtornos psíquicos. O SAMU deve prestar atendimento inicial à pessoa em crise psíquica em domicílio, em via pública, ou quando precise ser transferida de uma UBS, para o atendimento especializado em saúde mental, podendo ser este preferencialmente o CAPS, ou os hospitais gerais (Campos, 2015). Desse modo, entendemos que para o atendimento à pessoa em situação de crise psíquica é necessário que hajam profissionais capacitados, desde o atendimento de emergência até ao encaminhamento para o serviço especializado, visando minimizar os riscos de complicações para o indivíduo e para outros, sendo necessário que os profissionais saibam lidar com essa situação, para conseguir trabalhar na estabilização do quadro e recuperação do sujeito. Mesmo que a equipe de urgência/emergência esteja preparada para atuar em situações de crise, é comum se deparar algumas vezes, com a carência de conhecimentos específicos, visto que no currículo acadêmico das universidades em geral, o atendimento à emergência em saúde mental é abordado de forma breve, principalmente nos cursos técnicos, tornando-se um problema de saúde de difícil abordagem para as equipes, em diversas categorias (Brito, Ramos, Arruda, Dias e Silva, 2013). O imaginário social de que o doente mental oferece periculosidade, o estigma, o preconceito e o desconhecimento revelam-se como dificuldades de acesso para pessoas em situações agudas aos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) de maneira geral. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 73


Em virtude disso, verifica-se a necessidade de qualificação das práticas de cuidado por meio do desenvolvimento das competências e, da literacia em saúde mental e psiquiatria dos cuidadores, nas situações de crise psíquica em serviços de emergências (Ministério da Saúde, 2016). A partir das problemáticas apresentadas, fica evidente a necessidade de conhecer a atuação dos profissionais de saúde diante de uma situação de crise psíquica. Nesse contexto, emerge a seguinte questão de pesquisa: qual o entendimento dos profissionais que atuam no Serviço de Atendimento móvel de Urgência sobre o atendimento à crise psíquica? MÉTODOS Trata-se de um estudo qualitativo de revisão narrativa da literatura. Para a elaboração deste trabalho utilizouse uma pesquisa bibliográfica em estudos primários, descritivos, exploratórios e de abordagem qualitativa e quantitativa, por meio da análise de artigos científicos e teses, disponíveis em base de dados eletrônicos de acesso livre (SCIELO, BVS, CAPES e LILACS) publicados nos últimos cinco anos, entre 2013 a 2018. Para a busca dos artigos nas bases de dados utilizou-se as seguintes palavras-chaves: emergências psiquiátricas, crise psíquica, serviço de atendimento móvel de urgência no atendimento à crise. Os critérios de inclusão foram: artigos que abordassem a crise no paradigma da atenção psicossocial e, a atuação do serviço de atendimento móvel de urgência, editados em língua portuguesa e publicados nos últimos cinco anos. Ao final da pesquisa, foram selecionados 23 artigos nas bases de dados consultadas. Os resultados surgiram após serem lidos os resumos e, selecionados os que mais se aproximavam do objeto de estudo. Os resultados foram analisados pelo método comparativo com a literatura científica. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados foram agrupados em três categorias empíricas, a saber: a crise frente ao paradigma da atenção psicossocial; desafios dos profissionais de saúde no atendimento à crise na perspectiva da atenção psicossocial; o serviço de atendimento móvel de urgência na assistência à crise psíquica. A Crise Frente ao Paradigma da Atenção Psicossocial A loucura sempre existiu na nossa sociedade, sendo vista de diferentes maneiras no decorrer das épocas. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 74

O modo como a loucura era (é) considerada pela sociedade, estabelecia o tratamento e a forma de cuidado a ser prestado. Atualmente, as pessoas que possuem transtornos psíquicos são cuidadas a partir de uma nova compreensão do adoecer mental, que não é de cura, mas sim de suporte, pois o foco não é mais a doença (Demarco, Jardim e Kantorski, 2016). Para compreendermos o conceito do processo de saúde e do adoecer mental é necessário refletir e, considerar que as pessoas estão sujeitas a diversas condições que, podem levar a desenvolver transtornos mentais em algum momento da vida - como os fatores físicos, ambientais, sociais, culturais, econômicos, entre outros (Paes e Maftum, 2013). As emergências psiquiátricas ou crises podem ser conceituadas como alterações agudas do pensamento, do comportamento e do humor, causadas por transtornos psiquiátricos ou crise psicológica, a qual implica uma intervenção terapêutica imediata, em consequência de ser capaz de haver evolução rápida para um resultado danoso, tanto individual quanto social (Martins, H. Neto, R. Neto e Velasco, 2015; B. Sadock, V. Sadock e Ruiz, 2016). Para a psiquiatria clássica, a crise é entendida como uma situação na qual há disfunção grave, que ocorre exclusivamente no decurso da doença. Devido a esse entendimento, a resolução para a crise baseia-se em conter a agressividade, conservando ações que eram realizadas no quotidiano dos manicómios e que acabou por marginalizar e excluir as pessoas em sofrimento psíquico da sociedade (Willrich, Kantorski, Chiavagatti, Cortes e Antonacci, 2013). Na lógica da atenção psicossocial, a crise é compreendida como expressão existencial, em resposta as situações produzidas nas relações do contexto de vida social e familiar do sujeito. Por isso, esta é considerada como condição social mais do que biológica, e requer dos serviços de atenção psicossocial a responsabilização, por meio de acolhimento e a construção de vínculos afetivos dos profissionais em relação às pessoas que estão sendo cuidadas (Willrich et al, 2013). De acordo com Almeida, Nascimento, Rodrigues e Schweitzer (2014), as pessoas em grave sofrimento psíquico passam por condições críticas, desencadeando os momentos de crise, e passam a reproduzir ações confusas e incompreendidas pela própria pessoa e, por aqueles que estão próximos. Essas ações podem levar à necessidade de avaliação e intervenção dos serviços de emergência. Para Brito, Bonfada e Guimarães (2015), nem toda situação de crise psíquica determina absolutamente uma urgência ou emergência em saúde mental.


Se tratarmos toda a crise como urgência ou emergência, seguimos reproduzindo intolerância e preconceito com as pessoas com transtornos psíquicos, e acabamos por demonstrar a incapacidade de compreender e aceitar estas pessoas no nosso dia-a-dia, reproduzindo o saber da psiquiatria tradicional, limitando a pessoa à doença. Os momentos de manifestações da crise psíquica por uma pessoa são vistos por muitos como uma situação urgente, quando começa a afetar o quotidiano interpessoal. Na maioria dos casos, as pessoas sentem-se incomodadas ou ameaçadas pelo comportamento do indivíduo em sofrimento psíquico, e isto acaba por determinar, quando há necessidade de chamar os profissionais de assistência à urgência e emergência (Brito, Bonfada e Guimarães, 2015). Alguns dos sentimentos mais comuns numa pessoa em situação de crise evidencia-se pela incerteza, ameaça e insegurança, tanto para o indivíduo em crise quanto para os que convivem com ele, produzindo uma configuração social, marcada por severas dificuldades de comunicação entre os envolvidos, o que termina por ampliar o problema e gerar uma percepção de urgência. Portanto, esses momentos devem ser compreendidos por profissionais qualificados que precisam acolher o indivíduo nas suas especificidades (Ministério da Saúde, 2013). Corroborando com Almeida et al. (2014) e Oliveira, Ferreira, Vasconcelos e Dutra (2017), na lógica da atenção psicossocial, valoriza-se a subjetividade, o saber e o sentir do sujeito numa situação de crise, com o propósito de compreender o que está acontecendo com ele. Procuram-se novas formas de cuidados, como por exemplo, a escuta qualificada, e o atendimento aos familiares e/ou acompanhantes, a estabilização do quadro, o estabelecimento de hipótese diagnóstica, a exclusão de causa orgânica, e encaminhamento para a continuidade do cuidado nos serviços da Rede de Atenção Psicossocial. A assistência em saúde mental, no serviço de Atenção Psicossocial, requer uma relação de parceria no cuidado entre o profissional, o utente e a família; para que o cuidado prestado seja mais eficiente, com o propósito de que a família compreenda e aceite a pessoa com transtorno mental, participando ativamente, e contribua para a melhoria do quadro. Além disso, é fundamental conhecer melhor a pessoa em sofrimento psíquico e, ajudar a equipe a redimensionar-se de acordo com as necessidades que são exigidas.

Dessa forma, a relação utente e profissional, é uma experiência em que ambos podem desenvolver capacidades interpessoais e, ajudar na compreensão do problema psíquico do sujeito (Fernandes, Pereira, Leal, Sales e Silva, 2016). Desafios dos Profissionais de Saúde no Atendimento à Crise na Perspectiva da Atenção Psicossocial Segundo Santos (2013, p.15), “a assistência à saúde mental no Brasil, encontra dificuldades em relação a implantação da reabilitação psicossocial/inserção social frente ao estigma social, à doença mental e à pessoa com transtorno mental”. É bastante comum, a inexperiência de aproximação da população em geral e dos profissionais de saúde a uma pessoa em situação de crise, em consequência dos séculos de isolamento e exclusão, aos quais vem sendo submetidas as pessoas que vivem e convivem com transtornos mentais (Ministério da Saúde, 2013). Ao longo da história, a sociedade tem lidado com a loucura excluindo as pessoas com transtornos mentais do seu quotidiano. Os hospitais psiquiátricos têm mantido o papel de isolar as pessoas em sofrimento psíquico, alegando oferecer tratamento para melhorar a saúde dessas pessoas. Entretanto, sabe-se das situações de violência e de degradação, que as pessoas internadas nos hospitais psiquiátricos sofreram e tem sofrido. Diante desse contexto, as pessoas em sofrimento psíquico são estigmatizadas também pelos profissionais de saúde, e muitas condutas ainda são baseadas no modelo biomédico (Holanda, Eduardo, Silva, Nascimento e Flavio, 2016; Salles e Barros, 2013). Mesmo com a reestruturação da assistência à saúde mental no país, muitos ainda vêem as pessoas com transtornos psíquicos, principalmente nos seus momentos de crises, como alguém perigoso. Para Bastos, Dutra, C. Silva, Pacheco e T. Silva (2016), mesmo depois de quarenta anos do início dos movimentos pela Reforma Psiquiátrica e suas conquistas, percebe-se que alguns profissionais ainda preservam práticas do pensamento manicomial. O estigma, a doença mental, as concepções erróneas e a falta de formação e de treino das equipes de saúde, tornam-se fontes de insegurança para muitos profissionais quando se deparam com usuários agitados e/ou agressivos (Quevedo e Carvalho, 2014).

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O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência na Assistência à Crise Psíquica A partir do século XVIII, o cuidado às pessoas com transtornos psíquicos era prestado pelos manicómios, sendo restrito ao internamento. Esse modelo de atenção à saúde das pessoas com transtornos mentais, aos longos dos anos, era a única opção existente e, referência de tratamento em saúde mental. Os manicómios eram instituições de exclusão e estabeleciam que a loucura precisava de ser isolada (Coneglian, Cavalcante e Leandro, 2015). A RAPS, no Brasil, tem por objetivo ampliar o acesso dos serviços à população em geral e responsabilizar-se pela atenção à saúde das pessoas com transtornos mentais e com necessidades de uso de crack, álcool e outras drogas, e as suas famílias. Está no bojo da RAPS, a articulação do cuidado entre os pontos da rede de base territorial, permitindo o desenvolvimento do vínculo dos utentes e qualidade do cuidado por meio de acolhimento, do acompanhamento, da atenção nas urgências, tendo o internamento como último recurso terapêutico (Cortes, 2016). O SAMU, conforme a Portaria nº 3.088/2011 é um dos serviços de atenção às urgências/emergências em saúde mental, compondo a RAPS, em substituição ao atendimento de urgência/emergência nos hospitais psiquiátricos; logo, tem papel fundamental no cuidado das pessoas em sofrimento psíquico intenso e, com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas (Brasil, 2011). As urgências e emergências ocupam um lugar estratégico nos cuidados, consideradas portas de entradas para os usuários com transtorno mental, em situação de crise, nos serviços do SUS. Entretanto, tem se apresentado como um dos pontos problemáticos da RAPS, em razão de que na maioria das vezes, os serviços de urgência e emergência, quando prestam assistência ao utente em crise psíquica, tem priorizado a sedação e o encaminhamento para o internamento hospitalar, como se estes métodos fossem a principal e única possibilidade para conter a crise (Oliveira e Silva, 2017; Brito, Bonfada e Guimarães, 2015). A assistência prestada pelo SAMU à pessoa em sofrimento psíquico é fundamental para o fortalecimento da reestruturação da assistência à saúde mental no país. Mas, segundo Almeida et al. (2014), o seu modelo de atenção é baseado no paradigma biomédico, associando, muitas vezes, a visão de que as emergências em saúde mental estão relacionadas com a agressividade, e a hiperatividade, conduzindo o entendimento de crise para a descompensação psicopatológica. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 76

Desta forma, buscando de imediato a estabilização do quadro clínico, por meios de contenção mecânica ou química, por diagnósticos e, doses medicamentosas definidas em protocolos. As ações de contenção mecânica ou química têm a finalidade de evitar que os utentes atuem de forma violenta durante os momentos de agitação, e somente deverão ser utilizadas, quando práticas não coercitivas, como o diálogo e a escuta, não forem suficientes para lidar com expressões de agressividade (Willrich, Kantorski, Antonacci, Cortes e Chiavagatti, 2014). Os serviços de emergências têm o histórico de desconhecer ou não atuar de forma que a atenção à crise psíquica necessita, ou seja, por meios da empatia, do diálogo, da humanização, da corresponsabilização pelo cuidado e da criatividade durante o atendimento ao indivíduo em situação de crise (Oliveira e Silva, 2017). Zeller & Citrome (2016), apontaram os benefícios das práticas não coercitivas no atendimento a crise pelos serviços de emergências. Estas incluem a redução de lesões físicas e psicológicas para os utentes, bem como a redução do uso de recursos, custos e além de melhorar a relação entre profissionais de saúde e utente. Os autores ressaltam que para muitos utentes pode ser a sua primeira experiência no serviço de saúde mental, de forma negativa; o que pode influenciar em não cooperação dos utentes com os profissionais de saúde e, comprometer assim, os atendimentos futuros. De acordo com Bastos et al (2016), em seu estudo sobre saúde mental no atendimento pré-hospitalar móvel, observaram que ainda existe a percepção dos profissionais do SAMU de que os fluxos dos utentes atendidos, por esse serviço, possuem direcionamento prioritário para a rede hospitalar, não articulando intervenções acompanhadas de outros serviços de base territorial à saúde mental. Isso pode contribuir para fragilizar os serviços da Rede de Atenção Psicossocial. Santos et al (2014), evidenciaram noutro estudo, que dos 18.820 atendimentos realizados pelo SAMU, no período em estudo, 5,2% foram prestados a indivíduos com quadros de urgências psiquiátricas, e que a maioria dos atendimentos foram prestados no domicílio das pessoas assistidas, 46,6% foram contidas e transportadas para o hospital psiquiátrico de referência, 81,2% são feitos com auxílio da polícia militar, 87,5% dos profissionais têm dificuldades no atendimento psiquiátrico e, 58,4% requerem formação e treino em saúde mental e psiquiatria.


Ainda conforme estes autores, observou-se que 58,3% dos profissionais, desconheciam os princípios da Reforma Psiquiátrica e a legislação referente à Política Nacional de Saúde Mental (PNSM), 81,5% desconheciam as estratégias utilizadas pelo serviço, para atuar conforme as diretrizes da PNSM. Nesse contexto, os sujeitos conceituaram as urgências e emergências psiquiátricas como as situações onde o utente predispõe ameaça à vida a si e a outros, confirmando o status de periculosidade, atribuído ao sujeito em crise (Santos et al, 2014). Daggenvoorde, Gijsman & Goossens (2017), buscaram explorar experiências de utentes e suas famílias, no primeiro contato de emergências por uma equipe móvel de atendimento à crise. Os relatos dos utentes demonstraram que eles se sentiram estigmatizados, como criminosos, quando houve envolvimento da polícia para garantir a segurança no atendimento. Tal abordagem também foi apontada como difícil de ser aceita pelos seus familiares. Conforme o estudo, para os profissionais que realizaram o primeiro contato com os sujeitos em crise, ainda há pouca orientação sobre como interagir nestas situações. Bonfada, Guimarães, Miranda e Brito (2013), perceberam noutro estudo que, os profissionais de saúde demonstraram compreensões que contradizem a Reforma Psiquiátrica brasileira. Os autores evidenciaram que os profissionais que atuam no SAMU não dão credibilidade ao modo da atenção psicossocial; os discursos dos profissionais revelaram que, eles entendem que os utentes de saúde mental necessitam de internamento psiquiátrico. Nesse contexto, observa-se que o modelo baseado na psiquiatria tradicional ainda permanece, no ideário dos profissionais de saúde como referência para a assistência psiquiátrica. Para Buedo & Fiadaron (2016), o internamento é considerado um recurso terapêutico de natureza restritiva e, só pode ser realizada quando proporcionar maiores benefícios, do que as intervenções que podem ser realizadas no meio familiar, comunitário e social. Segundo Daggenvoorde, Gijsman & Goossens (2017), a avaliação no domicílio e, o tratamento nos serviços comunitários precisa ser a primeira escolha a ser considerada, quando possível, antes de recomendar a admissão numa unidade de internamento para um sujeito em crise. Segundo Almeida et al. (2015), as diretrizes do SAMU não informam os conteúdos das formações e treinos das equipes.

Isso abre oportunidade para que os profissionais atuem com base nas práticas da psiquiatria tradicional, e tendo a transferência do utente para o internamento como única opção de assistência à crise psíquica, divergindo do preconizado pela atenção psicossocial. Brito et al (2013), apresentaram no seu estudo que apesar de vários avanços na assistência à saúde mental, ainda há uma grande dificuldade dos profissionais que atuam no serviço do SAMU, em prestar assistência de qualidade. E isso, pode estar relacionado com as características e, comportamentos que os utentes apresentam em situações de emergências psiquiátricas, e essas dificuldades podem estar relacionadas com o estigma, o desconhecimento sobre o assunto ou desinteresse dos profissionais. O medo foi citado por 90% da equipe, como um fator que dificulta prestar a assistência. Entretanto, a empatia coloca o profissional como facilitador do atendimento, visto que este tem um olhar para o utente, observando a sua integralidade e, podendo assim prestar uma assistência de maior qualidade. Conforme Bonfada et al (2013), diante da deficiência dos serviços estratégicos para atenção à saúde mental e psiquiatria, as famílias dos utentes usam o SAMU como uma possibilidade para o internamento perante os momentos de crise. Os argumentos dos profissionais entrevistados revelaram que muitas vezes, o internamento acontece devido à incapacidade do familiar em conviver com o doente mental, diante da singularidade que, o indivíduo em sofrimento psíquico apresenta. Entretanto, os autores ressaltam que não se deve atribuir toda a responsabilidade à família pois, esta deve ser considerada como parceira no acompanhamento terapêutico, e não como cuidadora exclusiva dos utentes com transtornos psíquicos grave. O internamento pode desvalorizar o usuário e estabelecer a ideia de que as pessoas com transtornos mentais são incapazes de construir o seu quotidiano fora das instituições. Para o Ministério da Saúde, o internamento precisa de ser considerado como último recurso e não como solução imediata à crise psíquica. Devendo também, quando necessário, ser realizada prioritariamente nos CAPS III (funcionamento por 24 horas), com a lógica do acolhimento integral, e nos hospitais gerais de forma articulada com a rede (Salles e Barros, 2013; Ministério da Saúde, 2013). Os profissionais de saúde, quando decidirem pelo internamento como um recurso terapêutico nas situações de crise, devem assistir o utente na sua integralidade. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 77


É preciso levar em consideração, a necessidade de manter os laços sociais e familiares, bem como, a continuidade do tratamento para serviços de apoio territorial. Além do que, a família deve participar e acompanhar todo o processo de hospitalização do sujeito (Buedo & Fiadaron, 2016). De acordo Silva e Dimenstein (2014), a atenção à crise revela-se como um centro estratégico do cuidado da RAPS, visto que, o seu cuidado fora dos internamentos dos manicómios, garante a permanência dos utentes no seu meio familiar e comunitário. O que pode possibilitar a territorialização e a globalização do cuidado, interrompendo o trajeto do internamento como forma de segregação. A atenção à crise, sendo desse modo realizada, garante a função substitutiva dos serviços e as ações da RAPS. As autoras ressaltam que, a qualificação das práticas e dos serviços são elementos imprescindíveis à sustentabilidade da Reforma Psiquiátrica. Segundo Oliveira e Silva (2017), no que se refere ao SAMU, os treinos das equipes, é instituído e definido pela Portaria 2.048/GM, assim, realiza-se uma capacitação dos profissionais, no momento em que o serviço é implantado através dos municípios. E durante essa capacitação, somente são dedicadas duas horas de formação às intervenções de saúde mental. Sendo este momento exclusivamente teórico, sem nenhuma abordagem prática. A concepção do SAMU, como um serviço de atendimento que precisa intervir rápido e com pontualidade, impossibilita uma ação ampliada das equipes à subjetividade que os utentes apresentam. As ações estão direcionadas para as estratégias preestabelecidas, sistematizadas, protocoladas, que dificultam ações subjetivas. Em virtude disso, este serviço ratifica a crise no modo da psiquiatria tradicional, como simples exacerbação sintomatológica e, principalmente caracterizada pelo risco que os utentes podem oferecer, entendendo que, as situações de crise precisam ser controladas e solucionadas imediatamente (Almeida et al., 2015). Almeida et al. (2015), enfatizam que para que ocorra uma mudança nas práticas assistenciais da saúde mental e psiquiatria, torna-se necessário superar o modelo tradicional da psiquiatria, rediscutir o conceito da loucura na sociedade e, repensar o modo das práticas assistenciais, a partir do paradigma da atenção psicossocial e dos princípios do SUS. Nesta perspectiva, concordamos com Amarante (2007), quando diz que é preciso mudar mentalidades, mudar as atitudes, e mudar as relações sociais.

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CONCLUSÕES Os resultados apresentados nesta revisão permitiram identificar que a assistência prestada pelo serviço de atendimento móvel de urgência, no Brasil, às pessoas em situação de crise psíquica, tem como principal desfecho o encaminhamento para as unidades hospitalares. É essencial, que os profissionais que atuam no SAMU durante o atendimento a uma pessoa em crise psíquica, tenham a compreensão de que vários aspectos podem ocasionar um desequilíbrio mental, desde uma descompensação psicopatológica até os fatores de stress ou estressores da vida quotidiana. Dessa forma, é fundamental procurar ter uma definição clara do problema, através da formulação dos diagnósticos de enfermagem, da implementação de intervenções, que impliquem o utente e a família como parceira, o diálogo e a escuta qualificada. Esta compreensão pode contribuir, para que estes profissionais saibam lidar com o comportamento e, a situação psicossocial do utente em crise e da sua família. É necessário que, as equipes tenham a definição clara dos papeis de cada profissional durante o atendimento na crise. Caso haja a necessidade de uma contenção e internamento temporário, o utente deverá ser encaminhado prioritariamente para o CAPS, conforme prevê a portaria da RAPS. É imprescindível que, a rede de serviço de saúde do SUS, seja acompanhada de profissionais que saibam atender a todas as situações envolvendo os utentes na sua integralidade e, que possam dar os encaminhamentos adequados para os determinados problemas de saúde. A educação permanente das equipes multiprofissionais que atuam no SAMU é fundamental para garantir a função substitutiva dos serviços da RAPS e, o cuidado das pessoas que vivem e convivem com transtornos mentais, fora dos internamentos hospitalares. Torna-se necessário a educação permanente, afim de instrumentalizá-las quanto aos atendimentos e, encaminhamentos adequados para os demais serviços integrantes da RAPS. Assim, considera-se fundamental que as equipes que atuam nesses pontos da rede, estejam receptivas e motivadas para as atividades de educação permanente, baseadas nos cuidados preconizados pelo modo de atenção psicossocial.


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Artigo de Revisão

Disponível em http://dx.doi.org/10.19131/rpesm.0230

11 PERCEÇÕES, ATITUDES E EMOÇÕES DOS DOENTES SUBMETIDOS A

INTERNAMENTO PSIQUIÁTRICO COMPULSIVO: REVISÃO INTEGRATIVA | Tânia Sofia Pereira Correia1 |

RESUMO CONTEXTO: O internamento compulsivo em Psiquiatria é um dos temas mais desafiantes desta área da saúde devido às questões éticas envolvidas. A experiência de estar sob cuidados involuntários, nomeadamente em internamento compulsivo, caracteriza-se por sentimentos negativos face à perda de liberdade e autonomia. OBJETIVOS: Conhecer perceções, atitudes e emoções dos doentes submetidos a internamento compulsivo. MÉTODOS: Revisão integrativa da literatura através de pesquisa nas bases de dados EBSCO e Trip Database nas duas primeiras semanas de janeiro de 2018, cujos critérios de inclusão foram: estarem disponíveis em full text, de abordagem quantitativa, qualitativa e/ou revisões de literatura, nos idiomas Português, Inglês e Espanhol e terem como tema de pesquisa as perceções, atitudes e emoções de doentes internados compulsivamente em psiquiatria. RESULTADOS: Foram encontrados 8 artigos que dão resposta ao objetivo do estudo, incluem uma revisão de literatura, quatro estudos observacionais, um ensaio controlado, um estudo qualitativo e um estudo de validação de escala. CONCLUSÕES: Face à experiência de internamento compulsivo, foram identificadas perceções, atitudes e emoções maioritariamente negativas, mas também positivas e ambivalentes. Conclui-se que estas vivências podem ter consequências para além do internamento e que há práticas que devem ser aperfeiçoadas no sentido de melhorar a experiência do doente sujeito a internamento compulsivo. PALAVRAS-CHAVE: Internação compulsória de doente mental; Coerção; Satisfação do paciente; Emoções

RESUMEN

ABSTRACT

“Percepciones, actitudes y emociones de los enfermos sometidos a ingreso compulsivo: Revisión integrativa”

“Perceptions, attitudes and emotions of the patients subjected to involuntary psychiatric hospitalization: Integrative review”

CONTEXTO: El ingreso compulsivo en Psiquiatría es uno de los temas más desafiantes de esta área de salud debido a las cuestiones éticas envueltas. La experiencia de estar bajo cuidados involuntarios, en un régimen de ingreso compulsivo, se caracteriza por sentimientos negativos en relación a la pérdida de libertad y autonomía. OBJETIVOS: Conocer las percepciones, actitudes y emociones de los enfermos sometidos al ingreso compulsivo. MÉTODOS: Revisión integrativa de la literatura a través de la búsqueda en las bases de datos EBSCO eTrip Database, en las dos primeras semanas de enero de 2018, cuyos criterios de inclusión fueron: estar disponibles en texto completo, cuantitativa, cualitativa y / o revisiones de la literatura, en portugués, inglés y español y tienen como tema de investigación de las percepciones, actitudes y emociones de pacientes internados compulsivamente en psiquiatría. RESULTADOS: Se encontraron ocho artículos que dan respuesta al objetivo del estudio, incluyen una revisión de literatura, cuatro estudios observacionales, un ensayo controlado, un estudio cualitativo y un estudio de validación de escala. CONCLUSIONES: Frente a la experiencia de internamiento compulsivo, se identificaron percepciones, actitudes y emociones mayoritariamente negativas, pero también, positivas y ambivalentes. Se concluye que estas vivencias pueden tener consecuencias más allá del internamiento y que hay prácticas que deben ser perfeccionadas en el sentido de mejorar la experiencia del paciente sujeto a internamiento compulsivo.

BACKGROUND: Involuntary hospitalization in Psychiatry is one of the most challenging themes in this specialty due to the ethical issues involved. The experience of being under involuntary care, namely in compulsory hospitalization, is characterized by negative feelings in the face of loss of freedom and autonomy. AIM: To investigate the perceptions, attitudes and emotions of the patients that are admitted into involuntary hospitalization. METHODS: Integrative literature review through data search on the EBSCO database and on the Trip Database, in the first two weeks of January 2018, whose inclusion criteria were: to be available in full text, quantitative, qualitative and / or literature reviews, in the Portuguese, English and Spanish languages, attitudes and emotions of patients hospitalized compulsively in psychiatry. RESULTS: We found eight articles that met the study’s objective, including a literature review, four observational studies, a controlled trial, a qualitative study and a scale validation study. CONCLUSIONS: Perceptions, attitudes and emotions that were mostly negative, but also positive and ambivalent, were identified in view of the experience of compulsive hospitalization. It is concluded that these experiences can have consequences beyond hospitalization and that there are practices that must be improved in order to improve the experience of the patient subject to compulsory hospitalization.

DESCRIPTORES: Internación compulsoria del enfermo mental; Coerción; Satisfacción del paciente; Emociones

KEYWORDS: Commitment of mentally ill; Coercion; Patient satisfaction; Emotions Submetido em 31-03-2018 Aceite em 16-07-2018

1 Mestre em Direção e Chefia dos Serviços de Enfermagem; Estudante na Escola Superior de Saúde Norte da Cruz Vermelha Portuguesa, curso de Pós-Licenciatura de Especialização em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica; Enfermeira no Centro Hospitalar do Baixo Vouga, EPE, Pedopsiquiatria, Aveiro, Portugal, tsp.correia@gmail.com Citação: Correia, T. S. P. (2018). Perceções, atitudes e emoções dos doentes submetidos a internamento psiquiátrico compulsivo: Revisão integrativa. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (20), 81-90. doi: 10.19131/rpesm.0230 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 81


INTRODUÇÃO O internamento compulsivo de doentes com transtorno mental, devido ao compromisso da liberdade e autonomia individual, é um dos temas mais controversos e tem vindo a gerar debates jurídicos e éticos há mais de 100 anos. Durante os séculos XIX e XX, surgiram, em todo o mundo, diferentes abordagens e regulamentações de medidas compulsivas influenciadas por tradições culturais ou legais (European Commission, 2002). A implementação de medidas compulsivas nos cuidados de saúde mental deve respeitar e equilibrar três interesses/argumentos diferentes: os direitos humanos básicos das pessoas envolvidas, a segurança pública e a necessidade de tratamento adequado da pessoa em questão (European Commission, 2002). Os fatores associados ao internamento compulsivo, a sua prevalência e a insatisfação dos doentes têm vindo a ser estudados e investigados internacionalmente, especialmente a nível Europeu (Gabriel, 2017). São conhecidos muitos dos fatores de risco para internamento compulsivo. No entanto, os resultados dos estudos neste âmbito são difíceis de comparar por falta de representatividade ou por outras deficiências metodológicas (European Commission, 2002). A evidência sugere que são fatores importantes para o risco de internamento involuntário os diagnósticos (esquizofrenia e outros transtornos psicóticos), a intensidade das doenças psiquiátricas, os antecedentes de internamento compulsivo e níveis mais baixos de funcionamento social (Zinkler & Priebe, 2002; European Commission, 2002; Myklebust, Sørgaard, Røtvold, & Wynn, 2012). A prevalência do internamento compulsivo varia significativamente em toda a Europa. Uns dados são apresentados sob a forma de taxas (número anual de admissões compulsivas por 100.000 habitantes) e outros em percentagens (European Commission, 2002). Isto deve-se ao facto de os dados de fontes oficiais serem frequentemente fornecidos por relatórios nacionais de saúde, departamentos de saúde, ou gabinetes estatísticos que utilizam diferentes definições ou métodos utilizados para o cálculo. Desta forma, verifica-se uma falta de dados internacionalmente comparáveis e a falta de estudos metodologicamente sólidos (European Commission, 2002). Zinkler e Priebe (2002) realizaram uma revisão sobre internamento compulsivo de pessoas com transtorno mental em que os resultados revelam grandes variações em diferentes países europeus.

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Na década de 90 verificou-se um aumento dos internamentos compulsivos em países como a Inglaterra e a Áustria, a nível regional e nacional, no entanto os países com maiores taxas são a Finlândia e a Alemanha. Também se apurou que as taxas são superiores em zonas urbanas (Zinkler & Priebe, 2002). Nesta revisão, concluíram que altas taxas de internamento compulsivo podem dever-se à valorização da segurança pública e condições de vida vulneráveis. Por outro lado, baixas taxas podem estar relacionadas com desenvolvimento de trabalho comunitário significativo, como é o caso de Itália (Zinkler & Priebe, 2002). No relatório Compulsory Admission and Involuntary Treatment in the EU da Comissão Europeia (2002) também verificaram diferenças notáveis entre os estados membros, variando da mais baixa, com apenas 6 por 100.000 habitantes em Portugal, para a mais alta, com 218, na Finlândia; ou em percentagens de internamentos compulsivos sobre todos os episódios de internamento psiquiátrico anual, que varia entre 3,2% em Portugal a 30% na Suécia (valores do ano de 1999 e/ou 2000). Este relatório divulga que, durante a última década, as taxas de internamento compulsivo mantiveram um padrão ligeiramente homogéneo. Estes dados contrariam conclusões que indicam uma tendência internacional de crescimento relatado em outros trabalhos científicos. O mesmo relatório considera que o aumento do número total de internamentos compulsivos deve ser contextualizado com as alterações dos padrões de cuidados prestados e com redução do tempo médio do internamento em detrimento de readmissões mais frequentes (European Commission, 2002). Isto é, face aos cuidados prestados atualmente, internamentos tendencialmente mais curtos e readmissões mais frequentes não significam mais dias de internamento compulsivo. Os critérios legais para o internamento compulsivo dos doentes mentais são globalmente similares nos países europeus quando se trata de pacientes em risco para si próprios ou para os outros (Zinkler & Priebe, 2002). Os mesmos autores acreditam que esta prática parece ser mais influenciada pelas crenças e valores dos profissionais de saúde mental do que pelos requisitos legais (Zinkler & Priebe, 2002). No entanto, verificou-se que as taxas de internamento compulsivo na Europa é menor nos países que estipulam a inclusão obrigatória de um advogado independente no procedimento. Por consequência, os países em que não há apoio jurídico independente obrigatório apresentam taxas significativamente maiores (European Commission, 2002).


A primeira Lei de Saúde Mental em Portugal surgiu em 1963. Os programas de saúde mental em 1985 e 1989 incluíam medidas importantes para integrar cuidados de saúde mental em hospitais gerais e desenvolver a saúde mental da comunidade. Em 1992 a legislação determina a integração de todos os centros de saúde mental em hospitais gerais (Almeida & Molodynski, 2016). Todavia, o investimento em serviços de natureza comunitária em saúde mental, iniciado na década de 80, foi interrompido por razões políticas no início da década de 90 (Almeida & Molodynski, 2016).Tornou-se premente a necessidade de rever a lei da saúde mental em Portugal de forma a dar resposta a recomendações externas, nomeadamente das Nações Unidas e Organização Mundial de Saúde (OMS), sobre a prestação de cuidados de saúde ao nível da comunidade, reabilitação psicossocial em estruturas residenciais, centros de dia e unidades de reabilitação profissional integradas na comunidade e adaptadas ao grau de autonomia de cada um (Almeida & Molodynski, 2016). Como resultado desta influência, é criada em 24 de julho de 1998 a Lei 36/98 e em 5 de fevereiro de 1999 é criado o Decreto-lei n.º 35/99 que regula a lei, inclui a base da política de saúde mental e descreve detalhadamente a organização dos serviços de saúde mental. A lei da saúde mental tem cobertura nacional e aplica-se para todos os cidadãos portugueses. Define a política, os princípios gerais da prestação de serviços de saúde mental e os princípios reguladores para o internamento compulsivo de pessoas com doença mental, bem como os seus direitos. Determina que os cuidados de saúde mental devem ocorrer em contexto essencialmente comunitário e num ambiente o menos restritivo possível (Almeida & Molodynski, 2016). Em resposta, foram tomadas medidas importantes neste sentido. No entanto, a hospitalização continua a consumir a maior fatia dos recursos (83%) (Caldas de Almeida, 2009). De acordo com o artigo 5º da Lei 36/98, todos os utilizadores dos serviços de saúde mental têm como direitos: receber informações adequadas sobre seus direitos, o plano de tratamento proposto e os efeitos esperados; tratamento e proteção com base no respeito pela individualidade e dignidade; autonomia para aceitar ou recusar intervenções, exceto em casos de detenção obrigatória ou em situações de emergência em que a não intervenção representaria riscos verificáveis para a pessoa ou para outros; aceitar ou recusar participar em investigações, ensaios clínicos; condições dignas e adequadas em serviços hospitalares e residenciais:

habitabilidade, higiene, alimentação, segurança, respeito e privacidade; receber apoio no exercício dos direitos de protesto e reclamação (Almeida & Molodynski, 2016; Lei n.º 36/98 - Lei de Saúde Mental, 1998). De acordo com o artigo 12º da Lei de Saúde Mental, os critérios para internamento compulsivo compreendem: pessoa que, em virtude de um transtorno mental grave, represente um perigo para si próprio ou para outros (bens jurídicos de relevante valor, próprios ou alheios, de natureza pessoal ou patrimonial); recusa de tratamento médico necessário; incapacidade para avaliar o significado e as implicações do consentimento e da ausência de tratamento que pode resultar em uma deterioração significativa da sua condição (Almeida & Molodynski, 2016; Lei n.º 36/98 - Lei de Saúde Mental, 1998). O artigo 13º refere que a detenção pode ser solicitada pelo representante legal de uma pessoa que sofre de transtorno mental, qualquer pessoa elegível para solicitar sua interdição, autoridades de saúde pública, Ministério Público, médicos ou o diretor clínico de uma instituição, nos casos em que o conhecimento de transtorno mental acontece durante admissão voluntária naquela instituição (Caldas de Almeida, 2009; Lei n.º 36/98 - Lei de Saúde Mental, 1998). A decisão sobre este tipo de medida é tomada por um juiz, com base no relatório de avaliação psiquiátrica. Os doentes, além do direito a terem um advogado de defesa nomeado, devem ser informados dos seus direitos, estar presentes nos atos processuais e serem ouvidos por um juiz. Os doentes também têm direito de votar, enviar e receber correio eletrónico e comunicar com a Comissão de Acompanhamento. Contudo, são obrigados a cumprir o tratamento prescrito (Almeida & Molodynski, 2016; Lei n.º 36/98 - Lei de Saúde Mental, 1998). O internamento compulsivo de urgência ocorre se houver um perigo iminente devido a uma deterioração aguda do estado da pessoa que sofre de transtorno mental. A polícia ou as autoridades de saúde pública podem determinar que a pessoa que sofre de transtorno mental seja acompanhada à instituição mais próxima com um serviço de urgência psiquiátrico para avaliação psiquiátrica formal. Em situações em que o atraso na avaliação do doente possa ser perigoso, qualquer policial pode proceder à escolta imediata do doente ao serviço de urgência. Nestas situações o Ministério Público local deve ser informado imediatamente. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 83


Quando a avaliação psiquiátrica estabelece a necessidade de internamento e o doente recusa, a instituição deve notificar a admissão do doente ao tribunal competente (mandado e relatório médico) (Almeida & Molodynski, 2016; Lei n.º 36/98 - Lei de Saúde Mental, 1998). Num prazo até 48h após admissão do doente, o juiz deve emitir uma decisão sobre a admissão, iniciar o processo de internamento compulsivo e, consequentemente, solicitar nova avaliação psiquiátrica a realizar em 5 dias por dois psiquiatras independentes e com a possível assistência de outros profissionais da saúde mental. Com a receção desta avaliação, é definida uma data para a sessão conjunta. Nas situações em que a avaliação psiquiátrica não determina a necessidade de detenção, a pessoa deve ser imediatamente liberada. (Almeida & Molodynski, 2016; Lei n.º 36/98 - Lei de Saúde Mental, 1998). O tratamento em ambulatório compulsivo é uma alternativa ao internamento compulsivo. Se deixar de ser seguro ou o doente não cumprir os requisitos estabelecidos pelo médico psiquiatra, o médico deve informar o tribunal e solicitar o internamento compulsivo (Almeida & Molodynski, 2016). O cuidar é a essência da prestação de cuidados em saúde mental. O internamento compulsivo é uma das práticas mais desafiadoras do ponto de vista ético pois toca direitos e liberdades do doente. Contudo, ainda pouco se conhece sobre a perspetiva do doente, nomeadamente através de instrumentos com evidência de validade (Gabriel, 2017; Golay, et al., 2017). Neste sentido, este trabalho tem como objetivo conhecer as perceções, atitudes e emoções dos doentes submetidos a internamento compulsivo.

Quanto ao período de busca, este compreendeu as duas primeiras semanas de janeiro de 2018. Na pesquisa utilizaram-se caracteres boleanos para conjugar os diferentes descritores, sendo que a expressão de pesquisa utilizada foi “compulsory admission” OR “involuntary hospitalization”. Estabeleceram-se como critérios de inclusão estudos que dessem resposta ao objetivo, publicados entre 2007 e janeiro de 2018, disponíveis em full text, de abordagem quantitativa, qualitativa e/ou revisões de literatura, nos idiomas Português, Inglês e Espanhol. Teriam de referir-se a pesquisa sobre a experiência de doentes internados compulsivamente em psiquiatria. Deste processo (Figura 1) resultaram oito artigos que incluem uma revisão de literatura, quatro estudos observacionais, um ensaio controlado, um estudo qualitativo e um estudo de validação de escala. Figura 1 - Processo de seleção de estudos incluídos

MÉTODOS Reconhecida a problemática do internamento compulsivo e dilemas inerentes, fez-se uma pesquisa do estado da arte através uma revisão integrativa da literatura, uma vez que “a revisão integrativa oferece aos profissionais de diversas áreas de atuação na saúde o acesso rápido aos resultados relevantes de pesquisas que fundamentam as condutas ou a tomada de decisão, proporcionando um saber crítico” (Mendes, Silveira, & Galvão, 2008, p. 763). Assim, realizou-se uma pesquisa utilizando as palavraschave: compulsory admission, involuntary hospitalization. Através da associação destes descritores, concretizou-se a pesquisa nas bases de dados EBSCO e Trip Database. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 84

RESULTADOS Os estudos selecionados são maioritariamente estudos qualitativos, o que pode traduzir a necessidade de conhecer melhor este fenómeno de forma exploratória. Os resultados e conclusões dos artigos são apresentados de seguida (Quadro 1). Estão organizados em aspetos negativos e positivos das perceções, atitudes e emoções dos utentes submetidos a internamento compulsivo.


Quadro 1 - Resultados da Pesquisa Nº Autores (Ano) País

Objetivos

Amostra Metodologia

Resultados/Conclusões

1

Katsakou & Explorar a 5 artigos Preibe (2007) experiência de Reino Unido internamento e tratamento compulsivo de doentes psiquiátricos.

Revisão de Aspetos negativos estudos quali- Restrição da autonomia e não participação nas decisões do tratamentativos to: perda de liberdade, de direitos e de impotência; Perceção de baixa qualidade do tratamento (serviços e profissionais): ambientes não promotores do bem-estar, falta de privacidade, sentimento de rejeição e falta de disponibilidade dos profissionais; Impacto emocional: desesperança, frustração, baixa autoestima insegurança e sentimento de perda de controle. Sentimento de punição por terem um problema de saúde e discriminação face a outros doentes não compulsivos. Após a alta alguns continuam a sentir-se desvalorizados e estigmatizadas. Aspetos positivos face ao internamento compulsivo Respeito pela autonomia: alguns doentes sentiram-se integrados e envolvidos no seu processo de tratamento. Apesar da obrigatoriedade do mesmo, percecionaram alguma liberdade e flexibilidade. Tratamento e benefícios: relação positiva com profissionais que lhes reduziu medos e inseguranças, relações positivas com outros doentes, identificam o ambiente hospitalar como seguro e o internamento compulsivo como necessário.

2

Priebe, et al. (2010) Reino Unido

Explorar os n=2326 pontos de vista dos doentes após internamento involuntário em diferentes países europeus.

Estudo observacional prospetivo

Aspetos negativos Aqueles que sofrem de esquizofrenia tiveram opiniões mais negativas. Aspetos positivos Um mês após o internamento compulsivo 55% concordam retrospetivamente com a adequação da admissão compulsiva e após três meses, 63%. Há variações significativas entre os países. Género, situação de vida e diagnóstico foram identificados como fatores que influenciam a opinião dos doentes.

3

Sibitz, et al. (2011) Reino Unido

Estabelecer uma tipologia de perspetivas de coerção.

n=15

Estudo qualitativo

Aspetos negativos As pessoas descreveram sentimentos de humilhação, desrespeito e desamparo. Identificaram a experiência como algo exagerado e desnecessário. O impacto negativo da experiência: diminuição da autoestima, sentimento de impotência e falta de controlo, reserva e defesa nas relações sociais, perceção de que as medidas coercivas promoveram o prolongamento do internamento, efeitos negativos no desempenho de papéis sociais e recuperação pobre. A maioria dos participantes questionou a forma como foram aplicadas as medidas coercivas. Aspetos positivos Outros identificaram como algo necessário quando confrontados com o perigo para si ou para os outros. Impacto positivo: ajudou a encarar a doença mais seriamente, promoveu a valorização de uma situação estável e a ser mais calmo quando confrontado com a adversidade.

4

Rusch, et al. (2014) Suiça

Conhecer reações emocionais e cognitivas relacionadas ao estigma com internamento involuntário e seu impacto em pessoas com doença mental.

n=186

Ensaio controlado

Aspetos negativos Reações ao internamento involuntário: vergonha, autodesprezo, baixa autoestima, que podem levar ao auto estigma, ao empowerment reduzido e à baixa qualidade de vida. Aspetos positivos As intervenções para reduzir os efeitos negativos das admissões obrigatórias devem abordar reações emocionais, empowerment e capacitação.

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5

Gabriel (2017) Canadá

Construir N=80 e avaliar as propriedades psicométricas de um instrumento para avaliar a atitude dos pacientes em relação ao internamento involuntário

Revisão abrangente da literatura Validação de escala

Aspetos negativos Identificaram sentimento de violação de direitos legais e autonomia: ameaça à independência, humilhação e estigmatização por parte de outros. Aspetos positivos Atitudes positivas: sentimento de respeito, reconhecimento da necessidade do internamento. Apesar da coerção ser mais frequentemente relatada pelos doentes com admissão involuntária, esta também foi identificada pelos doentes admitidos voluntariamente. Atitudes negativas face ao internamento compulsivo mudam com o tempo. Ambivalência apesar do reconhecimento da necessidade do internamento, sentiram que a admissão poderia ter sido voluntária e sem pressão;

6

Jaeger, et al. (2013) Alemanha

Examinar a influência a longo prazo do internamento compulsivo sobre a adesão à medicação, o envolvimento no tratamento e na coerção percebida.

Estudo multicultural de observação naturalista

Aspetos negativos A hospitalização involuntária não parece prejudicar o envolvimento futuro com o tratamento de doentes com esquizofrenia, mas pacientes anteriormente hospitalizados involuntariamente mostram-se mais sensíveis à coerção subjetiva ou real e mais vulneráveis à não adesão à medicação. Por isso, o risco de hospitalização involuntária futura pode ser aumentado.

7

O’Donogue, et al. (2011) Reino Unido

Investigar a n=81 perceção das pessoas sobre a necessidade de sua admissão involuntária no ano seguinte ao da alta e taxas de readmissão para o hospital e a influência do insight e do estilo de recuperação.

Estudo observacional retrospetivo

Aspetos negativos Dos que mudaram seus pontos de vista, a maioria refletiu negativamente sobre sua admissão involuntária. Aspetos positivos Na primeira entrevista 72% relataram que sua admissão involuntária tinha sido necessária, um ano após a alta apenas 60%.

8

Smith, et al. (2014) Irlanda

Avaliar a satisfação com os serviços após a admissão psiquiátrica e explorar sua relação com uma série de fatores clínicos e de serviços.

Estudo de observação multicêntrico

Aspetos negativos Menor satisfação relaciona-se com coerção física, administração de medicação sem consentimento, menores níveis de justiça processual, medidas de isolamento e uso de substâncias. Aspetos positivos O nível geral de satisfação com os serviços de internamento de psiquiatria foi bom. Uma melhor relação terapêutica, maior insight e maior funcionalidade foram associadas a maiores níveis de satisfação do tratamento.

290 internados voluntariamente e 84 pacientes hospitalizados involuntariamente

n=161

DISCUSSÃO De acordo com os artigos encontrados, pode-se constatar que a pesquisa atual surge maioritariamente sob a forma qualitativa e de origem europeia. Os resultados dos estudos revelam que o internamento compulsivo é um processo complexo e pode ter impacto nas vidas dos doentes (Katsakou & Preibe, 2007). Por vezes envolve práticas de coerção física ou psicológica e, neste contexto, os doentes são confrontados com as regras externas impostas por profissionais (Katsakou & Preibe, 2007). Estas vivências são percecionadas e sentidas de forma negativa, positiva e ambivalente, identificando práticas que necessitam de ser melhoradas (Quadro 1).

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Perceções, Atitudes e Emoções Negativas As perceções, atitudes e emoções negativas identificadas pelos doentes face ao internamento compulsivo são: a perceção de restrição de autonomia, ameaça à independência, a não participação nas decisões do tratamento, a perda de liberdade, de direitos, do poder de decidir por eles mesmos e o sentimento de impotência (Katsakou & Preibe, 2007; Gabriel, 2017). Descreveram ainda: uma perceção de baixa qualidade do tratamento (serviços e profissionais), nomeadamente, ambientes não promotores do bem-estar, falta de privacidade, sentimento de rejeição pela sensação de falta de abertura/ disponibilidade dos profissionais e medo dos outros doentes (Katsakou & Preibe, 2007). Quando as pessoas sentem que não têm voz no tratamento que recebem e são tratadas desrespeitosamente pelos profissionais, a sua autoconfiança é automaticamente afetada e eles sentem que são seres humanos inferiores, com menos valor do que outras pessoas. Estes aspetos têm um impacto emocional negativo, nomeadamente sentimentos de desesperança, frustração, baixa autoestima, vergonha, insegurança e sentimento de perda de controle sobre suas vidas (Katsakou & Preibe, 2007; Rusch, et al., 2014; Gabriel, 2017). Os doentes descreveram situações em que se sentiram humilhados, desrespeitados, desemparados, sozinhos e alguns acreditam que as medidas coercivas levaram a um prolongamento do internamento (Sibitz, et al., 2011). Sentem-se punidos por terem um problema de saúde e discriminados face a outros doentes não compulsivos. Após a alta, alguns continuaram a sentir-se desvalorizados e estigmatizados (Katsakou & Preibe, 2007), apresentaram auto estigma, empowerment reduzido, baixa qualidade de vida (Rusch, et al., 2014), maior reserva nas relações sociais, efeitos negativos no desempenho de papéis sociais e uma perceção negativa que influenciou uma recuperação pobre (Sibitz, et al., 2011). De acordo com um estudo realizado por Jaeger et al. (2013), a hospitalização involuntária não parece prejudicar o envolvimento futuro no tratamento dos doentes com esquizofrenia, no entanto, doentes anteriormente hospitalizados involuntariamente mostram-se mais sensíveis à coerção subjetiva ou real e posteriormente aderem menos à medicação. Por isso, o risco de hospitalização involuntária futura pode ser aumentado (Jaeger, et al., 2013). Neste sentido, a satisfação dos doentes é um indicador a ter em consideração. De uma forma geral os doentes internados em psiquiatria têm uma boa satisfação com os serviços.

No entanto, verifica-se que os doentes admitidos involuntariamente, que sofreram coerção física, que foram colocados em isolamento, aos quais foi administrada medicação contra a sua vontade, que sentiram menores níveis de justiça processual, mostraram-se menos satisfeitos. Há, ainda, fatores externos ao internamento que também podem influenciar o nível de satisfação e o uso de substâncias foi identificado como tal (Smith, et al., 2014). As atitudes negativas face ao internamento compulsivo tendem a mudar com o tempo. Num estudo realizado em onze países europeus foram entrevistados 1809 doentes psiquiátricos internados compulsivamente um mês após admissão e 1613 foram entrevistados três meses depois. Os resultados revelaram que um mês após o internamento compulsivo 55% concorda retrospetivamente com a adequação da admissão compulsiva e após três meses, 63% (Priebe, et al., 2010). No entanto, um outro estudo realizado em um hospital psiquiátrico em Dublin (Hospital St John of God) com 81 doentes internados compulsivamente, dos quais 68 foram reentrevistados um ano depois do internamento, revelou que a maioria refletiu negativamente sobre sua admissão involuntária: desses, 33% acreditavam anteriormente na necessidade do internamento compulsivo, mudando de opinião um ano depois (O’Donogue, et al., 2011). Para além de haver variações significativas entre países diferentes, fatores como gênero, situação de vida e diagnóstico, influenciam as vivências do internamento compulsivo (Priebe, et al., 2010). Perceções, Atitudes e Emoções Positivas Nos estudos encontrados, para além de perceções, atitudes e emoções negativas, os doentes internados compulsivamente também identificaram perceções, atitudes e emoções positivas na sua experiência (quadro 1). Alguns doentes sentiram-se bem integrados e envolvidos no seu processo terapêutico, valorizaram o facto de lhes ser dada informação sobre os seus direitos e tratamento e, apesar da obrigatoriedade do internamento compulsivo, percecionaram alguma liberdade e flexibilidade (Katsakou & Preibe, 2007). Referiram, ainda, que uma relação positiva com os profissionais lhes reduziu medos e inseguranças, identificaram relações positivas com outros doentes, sentiram o ambiente hospitalar como seguro, e reconheceram o internamento compulsivo como necessário e com resultados benéficos (Katsakou & Preibe, 2007). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 87


Descreveram que o internamento compulsivo os ajudou a encarar a doença mais seriamente, promoveu a valorização de uma situação estável, contribuiu para valorizar a necessidade de aproveitar a vida cotidiana e ser mais calmo quando confrontado com a adversidade (Sibitz, et al., 2011). Melhores níveis de satisfação com o tratamento em internamento compulsivo estão relacionados com uma melhor relação terapêutica. Também foram identificados fatores associados a maiores níveis de satisfação do tratamento que não estão propriamente relacionados com o internamento, mas podem ser trabalhados nesse âmbito, que são o maior insight e maior funcionalidade (Smith, et al., 2014). Perceções, Atitudes e Emoções Ambivalentes Alguns doentes mostraram-se ambivalentes, apesar do reconhecimento de que houve necessidade de tratamento e de que a admissão evitou maiores danos, sentiram que a admissão poderia ter sido realizada de forma voluntária e sem pressão (Gabriel, 2017). Muitos dos doentes, participantes nos estudos encontrados, questionaram a forma como foram aplicadas as medidas coercivas identificando-as como práticas que precisam ser substancialmente melhoradas para contrariar possíveis efeitos adversos a longo prazo (Sibitz, et al., 2011). IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA Os achados destes estudos poderão ter implicações significativas para os cuidados em contexto de internamento compulsivo. Quando os doentes sentem que são respeitados, que os profissionais estão genuinamente interessados e envolvidos no seu tratamento, quando lhes é oferecido algum grau de participação e autonomia no seu tratamento, estas medidas são vistas com um impacto menos negativo na sua autoestima e é-lhes mais fácil aceitar o internamento compulsivo (Katsakou & Preibe, 2007). Assim sendo, é necessário melhorar a participação das pessoas no seu processo de internamento, bem como, a perceção que têm dessa participação, mesmo que admitidas involuntariamente; fornecer informação sobre o tratamento e envolver o doente na discussão de possíveis alternativas; melhorar a interação entre doentes e profissionais e otimizar a relação com os outros doentes; e promover um ambiente seguro (Katsakou & Preibe, 2007).

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É também muito importante que os serviços/cuidados de saúde salvaguardem, apesar da necessidade de tratar compulsivamente alguns doentes, o objetivo a longo prazo de promoção de autonomia e independência que pode estar em causa nos doentes que têm alta com sentimentos de inferioridade e baixo empowerment (Katsakou & Preibe, 2007). As intervenções para reduzir os efeitos negativos das admissões obrigatórias devem abordar reações emocionais, empowerment e capacitação (Rusch, et al., 2014). CONCLUSÃO Em geral, as pessoas que padecem de transtorno mental são particularmente sensíveis a qualquer intrusão na sua independência e privacidade, e as medidas compulsivas e coercivas são vistas como um ataque à sua autonomia e liberdade. É importante compreender como a exposição a internamentos compulsivos, que muitas vezes envolvem medidas coercivas, pode fazer com que os doentes se sintam expostos e vulneráveis. As restrições da autonomia são provavelmente inevitáveis quando as pessoas são tratadas contra a sua vontade (Katsakou & Preibe, 2007). Nesta revisão de literatura foram identificadas perceções, atitudes e emoções positivas e negativas face a experiências vivenciadas por doentes sujeitos a internamento compulsivo e ainda ambivalência, o que nos remete para a necessidade de melhoria de práticas nos cuidados prestados. Foi também possível perceber que estas vivências quando percecionadas como negativas podem ter consequências a longo prazo, nomeadamente baixa autoestima, vergonha, insegurança e sentimento de perda de controlo sobre suas vidas, empowerment reduzido e baixa qualidade de vida, maior reserva nas relações sociais, efeitos negativos no desempenho de papéis sociais e uma recuperação pobre. Foram também referenciadas perceções, atitudes e emoções positivas face ao internamento compulsivo, nomeadamente o sentimento de que esta experiência os ajudou a encarar a doença mais seriamente, promoveu a valorização de uma situação estável, maior valorização da necessidade de aproveitar a vida cotidiana e ser mais calmo quando confrontado com a adversidade.


As perceções, atitudes e emoções negativas, positivas e a ambivalência, associadas à identificação da necessidade de melhoria dos cuidados prestados, ajudaram a identificar práticas que melhoram a experiência do doente sujeito a internamento compulsivo, nomeadamente intervenções que abordem reações emocionais, empoderamento e capacitação, melhoria da relação doente-profissional, envolvimento do doente no seu tratamento, informação sobre direitos e tratamento com o objetivo a longo prazo de promoção de autonomia e independência. A experiência de internamento compulsivo é algo complexo que sofre influencia de diversos fatores e alguns deles não necessariamente relacionados com o internamento em si. Sugere-se a realização de estudos que identifiquem melhor a influência destes fatores nas vivências do internamento compulsivo. Face à prevalência de estudos qualitativos na área, sugere-se, ainda o desenvolvimento de mais estudos quantitativos sobre o tema. Como não foi encontrada evidência sobre a temática em Portugal, aponta-se a necessidade de conhecer as vivências dos doentes sujeitos a internamentos compulsivos no nosso país. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Almeida, T. & Molodynski, A. (2016). Compulsory admission and involuntary treatment in Portugal: Mental Health Law Profile. British Journal of Psychiatry, 13 (1), 17-19. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/ pmc/articles/PMC5618893/ Caldas de Almeida, J. M. (2009). Portuguese National Mental Health Plan (2007–2016) executive summary. Mental Health in Family Medicine, 6 (4), 233–244. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2873880/ European Commission. (2002). Compulsory Admission and Involuntary Treatment of Mentally Ill Patients – Legislation and Practice in EU-Member States. Projeto de pesquisa, Health & Consumer Protection Directorate-General, Alemanha. Gabriel, A. (2017). Development of an instrument to measure patients’ attitudes towards involuntary hospitalization. World Journal of Psychiatry, 7 (2), 89-97. Doi: 10.5498/wjp.v7.i2.89

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Rusch, N., Muller, M., Lay, B., Corrigan, P., Zahn, R., Schonenberger, T., Bleiker, M., Lengler, S., Blank, C., Rossler, W. (2014). Emotional reactions to involuntary psychiatric hospitalization and stigma-related stress among people with mental illness. European Archives of Psychiatry and Clinical Neuroscience, 264 (1), 35– 43. Doi: 10.1007/s00406-013-0412-5 Sibitz, I., Scheutz, A., Lakeman, R., Schrank, B., Schaffer, M., & Amering, M. (2011). Impact of coercive measures on life stories: qualitative study. The British Journal of Psychiatry, 199 (3), 239–244. Doi: 10.1192/bjp. bp.110.087841 Smith, D., Roche, E., O’Loughlin, K., Brennan, D., Madigan, K., Lyne, J., Feeney, L., O’Donoghue, B. (2014). Satisfaction with services following voluntary and involuntary admission. Journal of Ment Health, 23 (1), 38-45. Doi: 10.3109/09638237.2013.841864

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12 NORMAS

DE PUBLICAÇÃO DA ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL

REVISTA

PORTUGUESA

DE

A Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental é publicada duas vezes por ano, em junho e dezembro, tratando-se de uma revista indexada em bases de dados nacionais e internacionais. A Revista apresenta, atualmente, as seguintes secções: Artigos de Investigação; Artigos de Revisão (Narrativa, Sistemática e Integrativa) da Literatura; Artigos de Boas Práticas/Reflexão. 1 – Procedimentos de Submissão do Artigo: 1.1 – Submissão eletrónica: os artigos devem ser sempre submetidos eletronicamente no sítio da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental: http://www.aspesm.org/. 1.2 – Para a submissão dos artigos, deverão sempre ser enviados os seguintes documentos: a) Artigo integral, obedecendo às normas da revista; b) Checklist de autoverificação, preenchida na totalidade c) Declaração de Cedência de Direitos de Autor e de Observação dos Princípios Éticos da Investigação, provando que os autores concordam que o artigo, uma vez aceite, fique da propriedade d’ ASPESM, não podendo, por isso, ser publicado noutra fonte, e que foram cumpridos todos os princípios éticos inerentes a um trabalho de investigação. Nota: a Direção da Revista reserva-se o direito de retirar um artigo do processo de revisão ou das bases de dados (no caso dos artigos publicados), sempre que se verifique que os autores publicaram uma versão idêntica noutra Revista. 2 – Processo de Revisão: Os artigos propostos são apreciados num processo Double Blinded (duplamente cego). Neste processo, o artigo é enviado por dois Peer Reviewers (Pares Revisores), os quais o examinam e arbitram sobre a sua qualidade, dando as recomendações que julgarem convenientes. Sempre que não se verifique acordo entre os dois revisores, o Diretor da Revista reserva-se o direito de indicar um terceiro revisor. A Direção da Revista enviará ao autor informação sobre a eventual aceitação definitiva, aceitação com alterações, ou não aceitação. No caso da aceitação com alterações, os autores receberão os pareceres e recomendações sugeridas pelos Peer Reviewers. O autor deve efetuar as alterações e reenviar o documento, via eletrónica, no tempo regulamentado. Nota: caso não se verifique o cumprimento rigoroso do tempo estipulado para correção do artigo, este pode ser excluído do processo de revisão. Cada artigo será, posteriormente, verificado pelo Diretor e Coordenador da Revista, que analisam a primeira versão do artigo e a versão corrigida, em função das recomendações dos Peer Reviewers. O processo de revisão será efetuado online. As fases do processo de revisão e recomendações encontram-se descritos no quadro abaixo: Fase Receção do Artigo Revisão Reformulação do Autor Verificação Redatorial Publicação

Procedimento Após o envio do artigo, este será submetido a um processo de revisão técnica (revisão dos aspetos formais e de normalização, de acordo com as normas de publicação da Revista). O artigo é enviado para 2 Peer Reviewers, que o examinam e arbitram sobre a sua qualidade, dando as recomendações convenientes. A Direção da Revista enviará ao autor informação sobre a aceitação definitiva, aceitação com alterações, ou não aceitação, bem como os pareceres e recomendações dos Peer Reviewers. As alterações a efetuar pelo autor deverão ir, rigorosamente, de acordo com as recomendações dos Peer Reviewers. Cada artigo deverá ser verificado pelo Diretor e pelo Coordenador da Revista, que analisam a primeira versão do artigo e a versão corrigida, em função das recomendações dos Peer Reviewers. A oportunidade de publicação é da inteira responsabilidade da Direção da Revista.

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3 – A decisão final acerca da oportunidade de publicação dos artigos é da responsabilidade do Diretor da Revista. 4 – O artigo: 4.1 – Tipo de artigo: devem ser artigos científicos originais e versarem temas de saúde mental, Enfermagem de saúde mental ou educação em saúde mental. O conteúdo dos artigos é da exclusiva responsabilidade dos seus autores, aos quais compete respeitar os princípios éticos da investigação e cumprir as normas da edição da Revista. A Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental poderá incluir artigos em língua portuguesa, espanhola, inglesa ou francesa, consoante a origem dos artigos. 4.2 – Estrutura do artigo 4.2.1 - Título: o artigo deverá incluir um título informativo (que vá de encontro ao âmbito do trabalho) e sucinto (em português, espanhol e inglês); máximo de 16 palavras, sem abreviaturas e sem a indicação da localização geográfica da investigação. 4.2.2 - Autores: os autores devem estar devidamente identificados, com o nome, habilitações académicas, categoria profissional, instituição onde exercem funções, contactos (morada, e-mail e telefone institucionais) e informação no caso de o artigo ser extraído de Dissertação ou Tese (indicando o título, ano e instituição onde foi apresentada). O nome e afiliação dos autores deve surgir imediatamente após o título em português. As afiliações devem estar por extenso (ex.: Local de Trabalho – Escola Superior de Enfermagem do Porto). Os endereços de correio eletrónico dos autores dos artigos devem estar com hiperligação (com link disponível). 4.2.3 - Resumo: o resumo do trabalho deve ser apresentado em português, espanhol e inglês, e não deve exceder as 250 palavras, devendo incluir a descrição do contexto, objetivo(s), metodologia, resultados e conclusões. 4.2.4 - Palavras-Chave: o artigo deve apresentar, no máximo, 4 palavras-chave, transcritas de acordo com os descritores MeSH (em português, ver DeCS), em português, espanhol e inglês. 4.2.5 - Corpo do artigo: O artigo (tratando-se de um trabalho de investigação) deve ser estruturado em secções, devendo incluir os seguintes capítulos: Introdução, Metodologia, Resultados, Discussão, Conclusão, e Implicações para a Prática Clínica). Os artigos de revisão e de boas práticas/reflexão não têm que obedecer, necessariamente, a esta divisão. 4.3 - Formato: • O texto deve ser apresentado em formato Word, letra Arial, tamanho 11, espaçamento 1,5, páginas em formato A4, em coluna única, evitando negritos e sublinhados, variação do tipo de letra, fundos de cor, etc.; • Todas as margens devem ter 2,5 cm.; • Não devem ser incluídas notas de rodapé. • O artigo não deve ultrapassar as 15 páginas incluindo resumo (em português, espanhol e inglês), referências, tabelas, quadro e figuras. • O artigo não deverá ser paginado. • Os parágrafos não devem ser indentados. • O artigo deve ser redigido de acordo com o Novo Acordo Ortográfico (caso não o seja, a Comissão Editorial reserva-se o direito de realizar a conversão). Nota: caso o(s) autor(es) se recuse(m) a redigir o artigo segundo o Novo Acordo Ortográfico devem, aquando do seu envio, manifestar essa posição de forma clara e inequívoca. • Na primeira utilização de uma sigla esta deve estar, primeiramente, por extenso, por exemplo: Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC). • Quando se realizarem citações de três a cinco autores, todos os nomes devem ser mencionados na primeira vez que a citação é feita (ex.: Bradley, Ramirez, & Soo, 1999). Nas vezes seguintes, deve utilizar-se apenas o nome do primeiro autor seguido de “et al.” (ex.: Bradley et al., 1999). Caso a citação seja de seis ou mais autores, logo na primeira vez em que a citação é feita deve utilizar-se apenas o nome do primeiro autor seguido de “et al.”. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 92


• No corpo do artigo, ao citar autores coletivos, na primeira vez que a citação é feita, deve ser mencionado o nome por extenso (ex.: National Institute of Mental Health [NIMH], 2003). Nas vezes seguintes, pode ser utilizada a abreviatura (ex.: NIMH, 2003). • Os títulos dos capítulos devem seguir a seguinte estrutura: Nível do Título Formato 1 Centrado, Negrito, com Maiúsculas e Minúsculas 2 Alinhado à Esquerda, Negrito, com Maiúsculas e Minúsculas 3 Indentado, negrito, em minúsculas terminando com ponto final. 4 Indentado, negrito, itálico, em minúsculas terminando com ponto final. 5 Indentado, itálico, em minúsculas terminando com ponto final. 4.3.1 - Tabelas, quadros, gráficos e figuras: devem ser incluídos apenas os que sejam absolutamente essenciais para a compreensão do artigo e numerados por ordem de inclusão no texto, em função de cada tipo. As tabelas e quadros devem apresentar o título em cabeçalho e os gráficos e figuras devem apresentar o título por baixo. Para tabelas e quadros o tamanho da letra pode ser reduzido até um mínimo de 9 e sem espaçamentos. As tabelas, quadros, gráficos e figuras devem surgir imediatamente após o parágrafo em que é feita referência às mesmas. 4.3.2 - Citações: todos os autores citados no artigo devem constar da lista de referências bibliográficas. Exemplo: Sequeira (2006), (Sequeira, 2006), ou “Em 2006, Sequeira (...)”. Deve indicar-se o número de página, no caso de citação textual, tal como nos exemplos: Sequeira (2006, p. 32) ou (Sequeira, 2006, p. 32). Quando citar dois ou mais autores numa mesma paráfrase, deve ordená-los por ordem alfabética, tal como no exemplo: (Miller, 1999; Shafranske & Mahoney, 1998). Nota: utilizar o símbolo “&” apenas nas paráfrases em que os autores citados sejam de países em que o português não é uma língua oficial (ex.: EUA, Reino Unido, etc.). 4.3.3 - Referências Bibliográficas: • As referências selecionadas devem permitir evidenciar as publicações mais representativas do “estado da arte” da problemática em estudo (últimos 5 anos, extensíveis a 10 anos para problemáticas que tenham sido pouco estudadas), resultando da pesquisa de bases de dados de revistas indexadas nacionais e internacionais. • As referências bibliográficas devem estar elaboradas de acordo com as normas da 6ª Edição da American Psychological Association (APA). Todas elas deverão estar citadas no artigo. • Nas referências bibliográficas, independentemente do número de autores, estes devem ser todos referidos, não sendo permitido o uso de “et al.”. • O título das revistas nunca deve ser abreviado nas referências bibliográficas. Por exemplo, não se deve escrever “RPESM”, mas sim “Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental”. • Sempre que se inclua um site nas referências bibliográficas, a sua hiperligação deve estar presente e funcionante. Nota: as fontes devem ser alvo de seleção criteriosa, em função da sua pertinência, e não devem ultrapassar um total de 20 referências, organizadas por apelido do autor e ordenadas por ordem alfabética. APA 6ª Edição (Exemplos – consultar http://www.apastyle.org/) 4.3.3.1 Modelo de referências (indicar o nome de todos os autores – não usar “et al.”): Livros Shotton, M. A. (1989). Computer addiction? A study of computer dependency. London, England: Taylor & Francis. Trabalho académico (Dissertação/Tese) Healey, D. (2005). Attention deficit/hyperactivity disorder and creativity: An investigation into their relationship. Tese de Doutoramento, University of Canterbury, Christchurch, New Zealand. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 93


Trabalho académico (Dissertação/Tese) Healey, D. (2005). Attention deficit/hyperactivity disorder and creativity: An investigation into their relationship. Tese de Doutoramento, University of Canterbury, Christchurch, New Zealand. Editor literário Barkley, R. A. (Ed.) (2008). Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade: Manual para diagnóstico e tratamento (3ª ed.). Porto Alegre: Artmed. Capítulos de livros Haybron, D. M. (2008). Philosofy and the science of subjective well-being. In M. Eid & R. J. Larsen (Eds.), The Science of subjective well-being (pp. 17-43). New York, NY: Guilford Press. Autor coletivo American Psychological Association. (2010). Publication manual of the American Psychological Association (6ª ed.). Washington, DC: Author. Artigos de publicações periódicas Com DOI Herbst-Damm, K. L. & Kulik, J. A. (2005). Volunteer support, marital status, and the survival times of terminally ill patients. Health Psychology, 24, 225-229. doi: 10.1037/0278-6133.24.2.225 Sem DOI Light, M. A. & Light, I. H. (2008). The geographic expansion of Mexican immigration in the United States and its implications for local law enforcement. Law Enforcement Executive Forum Journal, 8(1), 73-82. Documentos eletrónicos Livros Schiraldi, G. R. (2001). The post-traumatic stress disorder sourcebook: A guide to healing, recovery, and growth [Adobe Digital Editions version]. doi: 10.1036/10071393722 Artigos de publicações periódicas Wheeler, D. P. & Bragin, M. (2007). Bringing it all back home: Social work and the challenge of returning veterans. Health and Social Work, 32(1), 297-300. Acedido em http://www.naswpressonline.org Outros (póster, comunicação livre, etc.) Leclerc, C. M. & Hess, T. M. (2005, agosto). Age diferences in processing of affectively primed information. Póster apresentado na 113ª Annual Convention of the American Psychological Association, Washington, DC. Nota: no caso de os autores serem de países de língua oficial portuguesa, nas referências bibliográficas o “&” deve ser substituído por “e”. 5 – Formato Padrão do Artigo a submeter: Primeira Página • Título (em português, espanhol e inglês) • Nome dos autores (separados por ponto e vírgula); • Afiliações dos autores (uma afiliação por linha); • Indicação caso o artigo seja extraído de Dissertação/Tese. Nota: esta página, posteriormente, é retirada pelo Coordenador da Comissão Editorial, sendo atribuído um número codificado que identifica o artigo junto dos revisores Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, Nº 20 (DEZ.,2018) | 94


Segunda Página • Titulo (em português); • Resumo (em português); • Palavras-Chave (em português); • Título (em espanhol); • Resumen; • Descriptores; • Titulo (em inglês); • Abstract; • Keywords. Páginas Seguintes: • Introdução; • Metodologia; • Resultados; • Discussão; • Conclusões; • Referências bibliográficas; • Apêndices (se existentes), agradecimentos (se existentes), conflitos de interesses (se existentes), fontes de financiamento (se existentes), e contribuições dos autores (se aplicável).

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