Revista Presença - Verão 2017

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FRIDA KAHLO

RESISTÊNCIA

Espetáculo para acordar consciências adormecidas

As múltiplas formas de enfrentar o retrocesso que toma o país

PRESENÇA VERÃO 2017

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REVISTA PRESENÇA Verão 2017

Publicação do Sindicato dos Professores de Caxias do Sul Sinpro/Caxias

A diretoria do Sinpro/Caxias renova as esperanças em 2018 e deixa como inspiração este poema do poeta português João Apolinário. Seus versos foram musicados pelo filho João Ricardo, integrante do grupo Secos & Molhados. Seguimos juntos!

Primavera nos dentes

VISITE A SEDE Endereço: Av. Júlio de Castilhos, n° 81 Salas 901/902 - Ed. Village Avenida Bairro Nossa Senhora de Lourdes Horário de atendimento: De segunda à sexta-feira, das 8h30min às 12h e das 13h30min às 18h

Quem tem consciência para ter coragem Quem tem a força de saber que existe E no centro da própria engrenagem Inventa a contra-mola que resiste Quem não vacila mesmo derrotado Quem já perdido nunca desespera E envolto em tempestade decepado Entre os dentes segura a primavera

LIGUE PARA NÓS Fones: (54) 3228.6763 (54) 3222.0734

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INTERAJA Facebook: sinprocaxias YouTube: Canal Presença Twitter: @sinprocaxias LinkedIn: Sinpro Caxias Instagram: sinprocaxias

Coordenação: Secretaria de Comunicação do Sinpro Coordenadora: Olga Neri de Campos Lima Edição: VOXMIDIA - (54) 3028.7479 Jornalista responsável: Rose Brogliato - MTB 11004/RS Colaboração e Revisão: Karine Endres - MTB 12764/RS Colaboração: Gabriela Bento Alves Tiragem: 1.000 exemplares Impressão: Lorigraf


ÍNDICE

ROSE BROGLIATO

4. Resistência aos golpes No segundo semestre do ano, o Sinpro/Caxias atuou pela reflexão e pela organização coletiva

8. Campanha No Dia do Professor, o sindicato alertou para o senso crítico e a defesa dos professores e da educação

1O. Ordem do dia Medida provisória amplia direitos das empresas e os reduz para os trabalhadores

12. Especial Espetáculo sobre Frida Kahlo emociona e provoca a plateia formada por centenas de professores

18. Chamada A diretoria do Sinpro/Caxias buscou novos olhares em eventos que reuniram entidades da categoria

19. Artigo A professora Olga questiona sobre as mudanças necessárias na educação

20. Evento Resistir também é cultivar o humano em nós - sucesso no Jantar Dançante dos Professores

22. Sabatina A historiadora Loraine descortina a relação entre fascismo e educação no cenário atual

- Para participar da seção Artigo: envie textos de até 2700 caracteres. - Para participar da seção Sabatina: envie textos de até 4500 caracteres. - Sugestões, críticas, informações: sinprocaxias@gmail.com

Resistir

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ssa é a palavra mais citada pelos movimentos sociais organizados nos últimos meses. Resistir, conforme o dicionário, “conservar-se firme, não sucumbir, não ceder.”

Atravessamos um dos piores períodos da história do Brasil. As ações do governo Temer visam fragilizar a democracia, acabar com os direitos da classe trabalhadora a partir das reformas Trabalhista e Previdenciária e promover o desmonte do Estado brasileiro com a privatização de empresas estatais. E há ainda a PEC 95, que congelou os gastos sociais por 20 anos. Ataques à educação de qualidade estão contidos na autoritária reforma do ensino médio e no fantasma do projeto de Lei da Mordaça, oportunisticamente chamado “Escola Sem Partido”. Neste momento de profundo retrocesso, é necessário organização, lucidez e solidariedade. Resistir é preciso! Não aceitamos virar “coisa” ou mercadoria. Precisamos resgatar os valores humanos na sociedade e em nós mesmos. Para isso, a educação tem um papel fundamental. Continuamos almejando uma sociedade justa, igualitária e profundamente democrática. E que a educação não seja mercadoria, mas um direito de cidadania! A Diretoria


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RETR O S PEC T IVA

Resistência aos golpes Inúmeras medidas do governo Temer revelam golpes dentro do golpe, exigindo reação

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No segundo semestre, os movimentos foram mais internos, mas se multiplicaram e aprofundaram. Inúmeras organizações pautaram seus debates sobre o futuro do Brasil e a resistência ao golpe, buscando entender o retrocesso que se verifica em todos os setores e combater o entreguismo do patrimônio do nosso país protagonizado pelo governo.

intenso movimento que caracterizou o primeiro semestre desse ano, quando milhões de pessoas fizeram greves e mobilizações quase todas as semanas em contraposição às medidas do governo federal, especialmente contra as reformas Trabalhista e da Previdência, não conseguiu barrar todos os prejuízos, mas obteve resultados significativos.

Em Caxias do Sul, os movimentos sociais preocuparam-se também com as ações nocivas do governo Sartori (entre elas o parcelamento de salários dos professores) e com as polêmicas da prefeitura municipal.

Um deles é o atraso na votação da Reforma da Previdência, que o governo esperava aprovar ainda nos primeiros meses de 2017. Outro, a ampliação do senso crítico em relação ao governo federal. Conforme as últimas pesquisas divulgadas, Michel Temer é o presidente mais impopular do mundo. E não é um instituto brasileiro que aponta, mas uma agência de pesquisa europeia (Eurasia). Temer, que chegou ao poder de forma ilegítima, tem aprovação de apenas 3% da população.

Os sindicatos e entidades representativas dos trabalhadores em âmbito estadual e nacional prepararam-se para resistir à aplicação da Reforma Trabalhista, considerada o maior e mais duro ataque que os trabalhadores brasileiros já sofreram. O Sinpro/Caxias integrou esse contexto, participando de reuniões conjuntas, realizando seus próprios debates e investindo na formação e conscientização dos professores. Se um sindicato já era importante antes, agora será absolutamente necessário para fazer a resistência a esses “golpes dentro do golpe.”

A CUT/RS lançou campanha para mostrar a importância do sindicato para a proteção dos direitos do trabalhador, neste momento de resistência e enfrentamento aos efeitos perversos das reformas. LAMBE LAMBE CONTEE.indd 2

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5 ROSE BROGLIATO

PALESTRA: EVITE PERDER A SUA APOSENTADORIA DATA: 25 de agosto LOCAL: Sindiserv

A mobilização popular pode garantir que a reforma da Previdência seja esquecida nas gavetas do parlamento, mas para barrar de vez a proposta é necessário renovar o Congresso, com políticos comprometidos com um projeto de nação, afirmou o senador na palestra promovida pelos Movimentos Sociais de Caxias do Sul.

ROSE BROGLIATO

SINPRO/CAXIAS ANALISA CENÁRIOS A Diretoria do Sinpro/ Caxias realizou constantes reuniões com o objetivo de buscar a compreensão do cenário que o Brasil atravessa e articular a resistência necessária. Abaixo, com o assessor jurídico Erci Sabedot e com o diretor do Sintep/Serra, Ademar Sgarbossa.

O movimento sindical reuniu lideranças em diversas ocasiões para definir os rumos comuns das lutas. O Sinpro/Caxias esteve presente. ARQUIVO SINPRO/CAXIAS

DIA NACIONAL DE MOBILIZAÇÃO DATA: 10 de novembro LOCAL: Porto Alegre

Representantes do Sinpro/ Caxias participaram da plenária da CUT e dos atos realizados em defesa dos direitos, contra o desmonte da Previdência e pelo fim do trabalho escravo.

ARQUIVO SINPRO/CAXIAS


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SEMINÁRIO SOBRE A REFORMA TRABALHISTA DATA: 1º de setembro LOCAL: Sindiserv As lideranças reunidas no seminário “Reforma Trabalhista – Desafios, Resistência e Ação Sindical” apontaram a Reforma Trabalhista aprovada pelo Governo Temer como o maior e mais duro ataque aos trabalhadores brasileiros. O seminário foi organizado pelos Movimentos Sociais da Serra Gaúcha e teve o apoio do Sinpro/Caxias.

GRITO DOS EXCLUÍDOS DATA: 7 de setembro LOCAL: Centro de Caxias Os movimentos sociais de Caxias do Sul realizaram, no dia 7 de setembro, a mobilização “Grito dos Excluídos”. Os participantes vestiram preto para sinalizar o momento de luto e perda de direitos. O protesto percorreu a rua Sinimbu, após o desfile oficial. Participaram a Pastoral da Criança, Pastoral do Idoso, Cáritas Diocesana, Escola de Formação Fé, Política e Trabalho, Economia Solidária de Caxias do Sul, Movimento Negro, LGBT, Marcha Mundial de Mulheres e estudantes, além de trabalhadores. O foco das manifestações foi a educação.


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ANULAÇÃO DA REFORMA TRABALHISTA A direção do Sinpro/Caxias decidiu pela adesão à campanha nacional em favor do Projeto de Lei de Iniciativa Popular (PLIP) que propõe a revogação da Reforma Trabalhista. No Brasil, já foram revogadas 11 leis por meio desse instrumento de participação popular, que está previsto na Constituição Federal. A expectativa da CUT nacional é de que se recolha mais de 1,5 milhão de assinaturas para serem entregues ao Congresso Nacional, em fevereiro, após o recesso parlamentar.

Assine você também e ajude a buscar assinaturas de seus colegas, familiares, amigos, vizinhos e trabalhadores em geral! Entregue as listas de assinaturas que você conseguir na sede do Sinpro/Caxias - Av. Júlio de Castilhos, 81 - Sala 901 ou para um dos diretores sindicais. Acesse o link abaixo ou busque no site do Sinpro/Caxias.

SITE RESPONSIVO O Sinpro/Caxias investe em comunicação e busca gerar conteúdos que promovem a formação, senso crítico e capacitação. Esse objetivo se realiza a partir da atuação digital (site e redes sociais) e offline, com a Revista Presença e material gráfico, quando necessário. O site do sindicato era o mesmo desde 2011, não correspondendo às atuais necessidades e acarretando problemas devido à desatualização de ferramentas de gerenciamento. Renovado em novembro, o site apresenta como principais características a limpeza visual, o posicionamento como “site de notícias” e o caráter responsivo, ou seja, automaticamente se adapta a qualquer dispositivo que o usuário esteja visualizando, com base no tamanho da tela em que o site é exibido. Porém, continua mantendo todas as características institucionais e de serviços e agrega ainda a qualidade de site seguro. A ferramenta de envio de e-mails foi renovada e a direção solicita que todos façam o recadastramento para receber corretamente os e-mails informativos. Crie o hábito de acessar o site e envie as suas sugestões para sinprocaxias@gmail.com. Fique informado e contribua para o fortalecimento do sindicato.

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C A MPAN HA

Campanha para momento grave Historicamente o Sinpro/Caxias realiza campanhas, mas neste ano a reflexão é muito mais necessária

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proveitando a passagem do Dia do Professor, o Sinpro/ Caxias recomendou a defesa dos docentes e da educação realizando a campanha “Penso, logo resisto!”. A campanha buscou chamar a atenção da sociedade para os ataques que a educação e os professores vêm sofrendo atualmente (nas redes pública e privada) e também destacar a importância do pensamento críti-

co – promovido por uma educação de qualidade – para a resistência em favor da democracia e no combate à violência, à injustiça e à opressão. Historicamente, o Sinpro/ Caxias denuncia o excesso de trabalho extraclasse dos professores e o consequente adoecimento, provocado pela pressão no ambiente escolar e pela transformação da educação em mercadoria, seguindo a ótica neoliberal. Agora a situação é ainda mais grave. Os professores da

Outdoors em pontos estratégicos do município, divulgação nas redes sociais e iniciativas que permitiram a interação e adesão dos professores e da comunidade são as ações que constituíram a campanha.

rede estadual gaúcha atravessaram o Dia do Professor em greve devido ao parcelamento e atraso dos salários. Todos os professores da rede pública sofrem com a ameaça da Reforma da Previdência e com os projetos de fim da estabilidade dos servidores. Enquanto isso, os professores da rede privada de ensino estão sujeitos a um desmonte de direitos a partir da aplicação da Reforma Trabalhista e da Terceirização, além de serem vítimas dos ataques à aposentadoria.

Mais de 300 pessoas mostraram sua adesão personalizando a foto de perfil do Facebook com o tema da campanha.


P RPERSE ES ENNÇÇAA VERÃO 2017 2017 INVERNO

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C AD ER N O MARLEI FERREIRA E ROSE BROGLIATO

PERSPECTIVAS DE FUTURO O filósofo e cientista político da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Emir Sader, esteve em Caxias do Sul, no dia 19 de outubro, para debater as perspectivas do país. Com o tema “O Brasil que queremos: reconstruir um projeto de país para todos/as”, ele chamou a atenção para o momento de definições políticas que estamos vivendo. Para Emir, o futuro do Brasil nos próximos 30 anos será decidido nas eleições de 2018. Sader acredita que, se de fato, as forças conservadoras conseguirem se sobressair nas eleições, veremos retrocessos inimagináveis. “A direita gosta de falar mal do Estado e quer colocar no lugar dele o mercado. O problema é que o mercado não é para todos, é para quem pode pagar, para quem tem poder de consumo. Consumidor é uma coisa, cidadão é outra.”, afirma. A palestra foi uma realização conjunta do Sinpro/ Caxias, da Associação de Microcrédito Popular e Solidário (Acredisol) e do Curso de Licenciatura em Sociologia da UCS.

MARAVILHA Em agosto, no dia 10, foi lançado o programa de televisão “Maravilha” no auditório do Sindicato dos Bancários de Caxias do Sul e Região. O primeiro programa foi ao ar pela TV Caxias-Canal 14 da Net na mesma data. Maravilha é construído por um coletivo de mulheres dos movimentos sociais de Caxias do Sul e tem como força a pluralidade de visões para construir novos conceitos sobre a realidade. “A mulher fez história, contribuiu e foi protagonista, mas praticamente não existe nos livros oficiais. A mulher tem condições, a partir de seu olhar, de sua perspectiva, de propor possibilidades de alternativas, de debate e construção de uma nova realidade”, afirma Olga Neri de Campos Lima, que é apresentadora do Maravilha e coordenadora de comunicação do Sinpro/ Caxias. “O contraditório precisa ser visto e pensado e a mulher tem muito a contribuir com isso”, acrescenta, dando o tom do Maravilha. O programa é veiculado semanalmente pela TV Caxias – Canal 14 da NET, às terças-feiras, 22h30min, com reprise às quartas-feiras, 9h30min e aos sábados, 16h30min. Acesse e curta: Facebook.com/programamaravilha

Reforma trabalhista e da Previdência, assédio, educação, suicídio, estereótipos, protagonismo das mulheres, cultura, literatura... estes são alguns dos temas já tratados pelo programa. Assista no link ao lado.


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ORD EM D O D IA

Reforma Trabalhista Medida provisória amplia direitos das empresas e os reduz para os trabalhadores

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medida provisória (MPV 808) publicada dia 14/11, quatro dias após a entrada em vigor da Reforma Trabalhista, alterou a Lei 13.467 em oito pontos. As mudanças, na maior parte, servem para reafirmar o caráter predatório da lei, que tem como principal objetivo criar um novo modelo de contratação, precária e com direitos reduzidos. Veja alguns exemplos: Contrato Intermitente A medida provisória estabelece uma ‘quarentena’ de 18 meses para o trabalhador demitido ser recontratado como trabalhador intermitente (quando não tem jornada fixa e só recebe pelas horas que trabalha). Ou seja, a MP expõe claramente que as empresas pretendem acabar com os contratos por prazo indeterminado, com jornada e salário fixos, para pagar apenas pelas horas trabalhadas. Trabalhador Autônomo O texto original previa o trabalho com exclusividade para uma única empresa, permitindo assim a contratação sem vínculo empregatício ou o famoso ‘PJ’ (pessoa jurídica). Na medida provisória, a expressão ‘com ou sem exclusividade’ foi suprimida. Em compensação, um novo parágrafo cita expressamente a possibilidade de um trabalhador ‘prestar serviços a apenas um tomador de serviços’, além de criar outras facilidades para os empregadores. Direito adquirido A maior prova de que a medida provisória está mais para atender a interesses das empresas e não dos empregados está no artigo 2º da MP, que assegura que a Lei 13.467 se aplica integralmente aos contratos de trabalho vigentes. Mas, segundo o assessor jurídico do Sinpro/Caxias, Erci Marcos Sabedot, o artigo 468 da CLT veda a alteração contratual lesiva ao trabalhador. A redução de direitos, portanto, não pode atingir os contratos vigentes na data da promulgação da lei. Também a tática de demitir e recontratar com redução de direitos pode ser en-

quadrada como fraude e anulada, de acordo com o artigo 9º da CLT. Insconstitucional Sabedot destaca a posição da Associação Gaúcha dos Advogados Trabalhistas (Agetra), da qual é integrante. “A Agetra tem o entendimento de que o judiciário é que vai definir a real aplicação da Lei 13.467, pois ela fere a Constituição Federal, especialmente em relação aos artigos 6º ao 9º. Direitos constitucionais não podem ser alterados por uma lei ordinária.” Sobre a medida provisória, Erci é taxativo: “A inclusão do novo dispositivo serviu apenas para tentar dar um pouco de segurança jurídica às empresas, porque se sabe que boa parte da nova legislação vai acabar sendo discutida na Justiça, por ser inconstitucional ou ferir princípios do Direito. Ou seja, é um retoque com o mesmo objetivo”, explica. Papel dos sindicatos Para Sabedot, agora é o momento de fortalecer os sindicatos, pois o papel dessas entidades se torna fundamental para a manutenção dos direitos. Um exemplo concreto, destaca ele, é a “quitação anual”, que não deve ser aceita. Outro exemplo são os acordos, convenções coletivas ou dissídios, que podem assegurar direitos que ficaram a descoberto com a nova lei. “Além de fazer campanhas maciças de informação e sindicalização, os sindicatos devem atuar em conjunto para barrar os prejuízos da reforma”, avalia. O advogado alerta que, em caso de qualquer dúvida, os professores devem buscar esclarecimento no sindicato ou telefonar para a assessoria jurídica. O site do Sinpro/Caxias traz os dados da assessoria jurídica e mais informações sobre o tema.


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P ER SPEC TIVA

Quando explorar já não basta... A Reforma Trabalhista pode ser neutralizada com a mobilização da sociedade e do Judiciário

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FOTO FETRAFI/RS

á mais de um século sabemos que o salário representa uma pequena parcela do valor produzido pelo trabalho. Dos escritos de Marx aos nossos dias, a exploração ampliou suas formas, ganhou aliados no seio do operariado, seduziu milhões de empregados com prêmios ou simples elogios, transformou funcionários em feitores de si próprios e promete novos pesadelos. A avaliação acima é do escritor e educador popular Emilio Gennari. Para ele, ainda é cedo para visualizar os desdobramentos da precarização que ganha o amparo da lei a partir da vigência da Reforma Trabalhista, mas as normas aprovadas apontam novos patamares de submissão da classe trabalhadora às necessidades empresariais. Gennari, que atua em todo o país na área de formação, respondeu algumas perguntas para a revista Presença, sobre questões polêmicas da reforma.

A desigualdade vai aumentar no Brasil a partir da Reforma Trabalhista? No dia 25 de setembro, a Oxfam Brasil lançou um relatório sobre a desigualdade no país, intitulado “A distância que nos une”. De acordo com os cálculos desta organização, atualmente, os seis maiores bilionários têm a mesma riqueza dos 100 milhões de brasileiros mais pobres. Considerando que o país tem aproximadamente 207 milhões de habitantes, é como dizer que seis pessoas concentram a mesma renda de metade da população brasileira. A título de reflexão, uma pergunta se faz

dignidade sem esboçar reações consistentes? Que medos se impõem de forma tão poderosa a ponto de apagar a rebeldia, inviabilizar a resistência e tornar as pessoas cegas diante de mudanças que prometem mais sofrimento? Por que a classe não reage?

necessária: graças às mudanças introduzidas pela reforma trabalhista, daqui a 10 anos, quantos milhões de brasileiros irão aumentar o atual exército de pobres cuja renda equivale à dos 6 bilionários mais ricos? Neste momento, é claro que não temos a resposta, mas as reflexões que apresentamos dizem que não serão poucos.

São perguntas ainda sem respostas consistentes. O momento exige uma inserção que permite ouvir e conhecer de perto os trabalhadores, seu cotidiano, suas expectativas e visões de mundo, as ideias que fomentam a sua submissão, os elementos do processo que construiu a realidade com a qual nos deparamos e os sinais de inquietação que emergem do esforço de se moldar às exigências empresariais. Conhecer o terreno em que se movimenta o senso comum da classe é um passo essencial para semear dúvidas na sua visão de mundo, abrir as portas da indignação e dar vida aos primeiros passos de uma reação que mostre a sua inconformidade com a exploração.

Muitos dizem estranhar que as panelas não batam mais, apesar da Reforma Trabalhista. Por que isso acontece? Neste momento, o silêncio, a paralisia, a submissão e até mesmo a adesão entusiasmada de alguns trabalhadores às demandas empresariais são elementos que assustam pela passividade e incapacidade de visualizar o avanço da exploração à qual a reforma trabalhista imprime as marcas da legalidade. Por que os trabalhadores se dispõem a perder completamente a sua

Leia o artigo de Gennari “Reforma Trabalhista, quando explorar já não basta” acessando o link: goo.gl/1JJD5W


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ESP EC IAL

Emoção

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força é de um espetáculo que quer nos fazer sentir e pensar e tocou uma plateia lotada no teatro Murialdo, no dia 23 de setembro. Promovido pelo Sinpro/ Caxias, o espetáculo “Frida Kahlo, à Revolução!” emocionou quem lá esteve, trazendo à tona assuntos polêmicos e que ainda são contemporâneos.

dade elitista e patriarcal são assuntos que a atriz que faz reviver Frida Kahlo, Juçara Gaspar, buscou na obra da pintora e trouxe para a cena teatral. A peça pesquisou referências na obra e nos escritos de Frida, como correspondências e diários. O texto, segundo Juçara, é “baseado em sua escrita apaixonada, revolucioA pintora mexicana Frida nária e imprescindível, que Kahlo (1907-1954) produziu desvela a maquiagem espessa uma obra inovadora, colo- com que os modismos tentacando luzes sobre a temática ram torná-la, a si e a sua obra, da liberdade da mulher. Pro- palatáveis”. Com trilha sonora tagonismo feminino, acessi- executada ao vivo, por Luciabilidade e inclusão, liberdade no Alves, a peça conta ainda artística e denúncia da socie- com a direção de Daniel Colin.


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Ficamos felizes com a apresentação em Caxias, ainda mais por um sindicato, pois fazemos arte e militância junto. Sejam felizes na profissão que escolheram, também sou professora, por isso me emociono. E, apesar do golpe: ‘Que nada nos limite, que nada nos defina, que nada nos sujeite. Que a liberdade seja nossa própria substância, já que viver é ser livre’, como disse Simone Beauvoir. Juçara Gaspar - atriz

o, arte, resistência Por Karine Endres JORNALISTA FOTOS RICARDO BARP

“Eu pinto o que dói, o que me revolta, o que me liberta. É impossível não se revoltar e é desta revolta que jorram meus quadros”, explica a personagem no palco. E é este sentimento profundo da famosa pintora que Juçara Gaspar passa para o público, em atuação sempre permeada pela dor que acompanhou Frida durante a vida inteira. “Pintar completou minha vida. Perdi três filhos, mas a pintura completou minha vida. Há sangue, há morte em minha pintura, mas do que temos medo? Expressar é começar a libertar-se”, fala Frida, através de Juçara.

A relação conturbada com o pintor e muralista Diego Rivera, com quem se casou em 1929, sua viagem à Nova Iorque e posteriormente à França – quando conheceu Picasso e Kandinsky –, a vida amorosa – que incluiu um relacionamento com o russo Leon Trotsky, tiveram espaço em cena. Porém, é a capacidade da atriz em interpretar e encarnar a artista mexicana interagindo com o público que toca e leva a emoção da personagem para cada um dos presentes, transformando o espetáculo em uma vivência única para os professores do Sinpro/Caxias.

“Pés, pra que te quero, se tenho asas para voar? Frida Kahlo


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Mais cultura para todos Os sindicatos podem e devem contribuir para promover a formação e o pensamento crítico

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ontribuir para o debate da sociedade acerca dos mais diversos temas e promover a formação e o pensamento crítico da categoria é função de uma entidade sindical. O Sinpro/Caxias busca cumprir este papel realizando espetáculos, palestras e seminários. Não foi diferente com a peça “Frida Kahlo, à Revolução!”, que toca em pontos polêmicos que a sociedade precisa enfrentar, como a violência contra a mulher e a desigualdade de gênero, assim como discute a realidade latino-americana.

Para a professora da UCS, Graciela Ferré, conhecer a própria cultura é fundamental. “Frida é uma referência e não poderíamos perder um espetáculo como este. Sou latino-americana, sou uruguaia e então, claro, não perderia esta obra”, ressal-

ta. A professora também destaca a importância das ações de formação e cultura do Sindicato: “É fundamental que o Sinpro promova este tipo de espetáculo, pois Caxias oferece poucas oportunidades”.

O produtor cultural Jorge Valmini, que também é ator e diretor de teatro, prestigiou o evento. “Um sindicato promover arte é fundamental”, diz. Para ele, que iniciou sua trajetória ainda no teatro escolar, todas as atividades artísticas devem ser incentivadas. Já a sócia Adriana Barcarolo Tonietto, professora do Murialdo, ressalta a importância de se ter acesso à cultura: “É um investimento muito importante, pois a cultura é fundamental e todos deveríamos estar abertos a ela”, disse. “O Sinpro sempre proporciona grandes eventos e eu não perderia a oportunidade”, completa.

Além disso, também é uma oportunidade de lazer para os sócios. “Vivemos momentos tão tensos durante a semana, precisamos relaxar. Mesmo não conhecendo muito sobre Frida, foi uma oportunidade para buscar informação e ter mais conhecimento, vivenciando um momento de descontração”, afirma a sócia Camila Teixeira, professa das escolas Pastorinhas e Raio de Luz.


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Arte em família

O amor de uma senhora pela arte contagia a família da professora do La Salle Carmo, Cátia Silene Fiorini Toni. Ela conta que, em casa, é a paixão da sogra pela pintura que motivou o desejo de conhecer mais sobre Frida. “Minha sogra gosta muito de

pintura, por isso fomos pesquisar sobre Frida Kahlo. Até minha filha queria vir, mas não deixei. Expliquei que ela teria que esperar um pouco mais”, relata. Para Cátia, o acesso à cultura é de extrema importância, mas não há o hábito de frequentar estes espaços em Caxias. Além disso, ela ressalta que os eventos são uma possibilidade de descontração. “Nossa vida, enquanto professores, é sempre tão corrida, cheia de atividades extraclasse.Então, quando temos a oportunidade de relaxar e descontrair, precisamos aproveitar. O Sinpro/Caxias sempre nos proporciona atividades culturais e momentos de lazer e é isso que precisamos”, afirma.

PARA SABER + Em 2002 foi lançado o filme “Frida” com a atriz Salma Hayeck no papel da personagem principal e Alfred Molina no papel de Diego Rivera. A direção é de Julie Taymor e o filme recebeu dois Oscar por melhor maquiagem e trilha sonora.

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Apoio às lutas e união

O espetáculo “Frida Kahlo, à Revolução!” foi um momento para reafirmar apoio e prestar solidariedade às lutas sociais. Na oportunidade, a Marias Lavrandeiras, empreendimento caxiense de economia solidária pode expor e vender seus produtos. Inspirada em personagens que questionaram a sociedade, como Emiliano Zapata, Pagu, Violeta Parra e, é claro, Frida Kahlo, a empresa tem o objetivo de valorizar a criatividade, o saber humano e o trabalho artesanal e feminino, questionando a divisão sexual do trabalho e empoderando mulheres. Além disso, a Marcha Mundial das Mulheres comercializou alguns produtos, com o objetivo de financiar a viagem à Segunda Jornada Continental pela Democracia e contra o Neoliberalismo, realizada de 16 a 18 de novembro, em Montevidéu.

Tatiane Baggio, psicóloga e integrante da Marcha, ressalta que no atual contexto político de golpe é fundamental fortalecer os espaços de luta e movimento. “É extremamente importante essa iniciativa do Sinpro de abrir espaço para os movimentos sociais e para os parceiros, agregando nesta luta. E quando se trata das pautas das mulheres, a Marcha está sempre junto”, diz.

de conscientização da comunidade e da sociedade”, afirma.

O evento também deu espaço para a venda de livros, com banca da Do Arco da Velha Livraria, que expôs uma seleção de obras relacionadas à vida e legado de Frida Kahlo, além de volumes sobre história, política e questões de gênero.

Tatiane acredita que focar nas pautas polêmicas como a questão de gênero amplia, muitas vezes, nossa visão de mundo, possibilitando o diálogo, a troca e a construção de novos conhecimentos. “É extremamente importante. Acredito que os sindicatos possuem esse papel social,

PARA SABER + “O Diário de Frida Kahlo - Um Autorretrato Íntimo” foi traduzido por Mário Pontes e reúne desenhos coloridos, pensamentos e confissões. Foi lançado no Brasil pela editora José Olympio, em 1994, e conta com uma reprodução fiel de todo o material produzido entre 1944 a 1954, reunido em 280 páginas.


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Quem foi Frida Kahlo? Ícone pop da atualidade e símbolo da luta feminista, Frida é também uma marca do urrealismo. Filha de um imigrante alemão com uma mexicana de origem indígena e espanhola, Frida nasceu em 1907, nas proximidades da Cidade do México. Aos seis anos contraiu poliomielite, que deixou diversas sequelas. Foi a primeira fatalidade, em uma longa lista, que iria influenciar de forma indelével sua arte. Aos 18 anos sofreu um grave acidente de trânsito, quando ficou entre a vida e a morte. Em decorrência deste acidente, Frida enfrentou 35 cirurgias e foi neste período de convalescência

que descobriu a pintura como forma de alívio de sua dor, que se tornaria uma companheira até o fim de sua vida. São algumas das sequelas do acidente que surgem em seus quadros, como os três abortos que sofreu, impedindo-a de concretizar um de seus maiores desejos: tornar-se mãe. O casamento de Frida Kahlo com o muralista Diego Rivera, em 1929, e a relação contubarda que mantinham também marcaram a vida e obra da artista. Na madrugada do dia 13 de

julho de 1954, Magdalena Carmen Frida Kahlo y Calderon foi encontrada morta dentro de casa. Ela tinha 47 anos. As últimas palavras foram encontradas em seu diário: “Espero alegre a minha partida – e espero não retornar nunca mais”. Mal sabia ela que retornaria de inúmeras formas. “O conceito de usar a si mesma como tema de sua obra elevaram Frida a um lugar excepcional”, aponta o escritor mexicano Francisco Haghenbeck, autor do livro “O segredo de Frida Kahlo”.


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C HAMAD A

A diretoria do Sinpro/Caxias participou de eventos que reuniram as entidades representativas dos professores com o objetivo de reflexão e organização.

XIX CONSIND O Conselho Sindical da Contee, com o tema “Desafios e Perspectivas no Pós-Golpe”, reuniu representações de entidades de todo o Brasil, entre elas também professores do Sinpro/Caxias e foi realizado em Brasília, de 29 de setembro a 1º de outubro. Os debates incluíram a situação internacional e do país, das trabalhadoras e trabalhadores brasileiros; a campanha contra a desprofissionalização do(a) professor(a); a Reforma Trabalhista, seus impactos e limites; os retrocessos na educação brasileira e a resistência política e possibilidades jurídicas. Leia a cartilha com as deliberações do encontro: goo.gl/DBYVvW

FÓRUM DAS ICES O professor José Carlos Monteiro, integrante da diretoria do Sinpro/Caxias, representou o sindicato na 9ª Reunião Plenária do Fórum pela Gestão Democrática das ICES - Instituições Comunitárias de Educação Superior do Rio Grande do Sul. O encontro ocorreu no dia 22 de outubro, em Porto Alegre, e reuniu professores e estudantes para debater políticas públicas, mercantilização do ensino, reajuste das mensalidades e reivindicações trabalhistas.

ENCONTRO DE MULHERES A FeteeSul realizou o seu 1º Encontro de Mulheres da Federação. Foram mais de 20 mulheres dirigentes sindicais reunidas na atividade realizada no dia 22 de setembro, na sede do Sinpro/RS, em Porto Alegre. Durante o dia, mesas de debate geraram reflexão sobre o papel das mulheres sindicalistas nesse tempo de resistência e sobre a violência contra a mulher, com participação de lideranças sindicais e políticas, entre elas as representantes do Sinpro/Caxias, professoras Doralice Polly e Cristiane Guazzelli Boschi.


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Só a ousadia não é suficiente! RICARDO BARP

Há consenso sobre a necessidade de mudança de paradigma na educação. Porém, os problemas da área não ocorrem de forma isolada. A ousadia de alguns professores, que se superam apesar de todas as adversidades, não é suficiente para ensejar a transformação. Governo, instituições de ensino, gestores e pais não têm assumido uma atitude que permita sair da situação em que nos encontramos. Durante um bom tempo, o governo federal, através do Ministério da Educação (MEC), discutiu e elaborou o Plano Nacional de Educação (PNE), com o objetivo de traçar uma política educacional para o país visando a década de 2010 a 2020. Participaram dessa construção, além do MEC, pedagogos, gestores, professores e representantes da sociedade. As Conferências Nacionais de Educação (CONAEs) permitiram a definição de eixos a partir de concepções que buscavam a garantia de uma educação pública, gratuita, inclusiva e de qualidade. Esse amplo debate envolvendo educadores e sociedade civil organizada qualificou o PNE como uma conquista histórica. Entre as propostas definidas pelo Plano, destacam-se a garantia do direito à educação básica com qualidade, a redução das desigualdades e respeito à diversidade, a valorização dos profissionais da educação e o acesso ao ensino superior. Entretanto, quando o presidente ilegítimo Temer assume, num verdadeiro golpe à democracia, desconsidera tudo o que fora construído e protagoniza um duro ataque à educação. O Fórum Nacional de Educação, instância responsável pelo monitoramento do PNE, foi precarizado. Com qual objetivo? Impedir educadores, estudantes, pais e sociedade civil de contribuir na formulação de políticas educacionais. Fica evidente a intenção de privatização da educação pública, permitindo acesso à educação de qualidade apenas para os filhos das elites. A década ainda não findou, mas constata-se que do PNE pouco ou nada foi implementado e isso é resultado de uma opção política. Assistimos ao desmonte da educação pública. Recursos são cortados. Políticas de formação de professores estão sendo eliminadas. Instituições agonizam em meio à falta de recursos. Professores recebem salários parcelados ou deixam de receber. Há docentes que não têm

assegurado, como manda a lei, o pagamento do piso nacional do magistério. E esse piso, certamente, não chega a ser um salário justo, considerando a importância do professor. Nem mesmo é compatível com o que o mercado paga a profissionais de outras áreas com o mesmo nível de formação. Nas instituições privadas, ocorre um processo de mercantilização da educação. Estudantes são números a serem negociados na Bolsa de Valores. Instituições de ensino estão atreladas às necessidades dos “clientes”. Pais que terceirizam completamente a tarefa de educar e a transferem aos professores, contratam “serviços educacionais” – e não uma educação cujo princípio seja o conhecimento como processo fundamental de humanização do indivíduo. Num cenário em que a realidade da educação pública é caótica, a escola privada garante matrículas àqueles que ainda conseguem pagar. Mas de que forma realiza o processo de educação? Com salas de aula tradicionais, currículos engessados, materiais didáticos distantes da realidade. Os professores sofrem com uma sobrecarga que vai muito além do trabalho contratado, pressão por resultados e ausência de capacitação para enfrentar os desafios da sociedade digital. Nesse contexto, os professores muitas vezes são responsabilizados pelo insucesso dos alunos, quando há diversas variáveis a serem consideradas e atores educacionais que se eximem de qualquer responsabilidade. Portanto, só a ousadia não é suficiente. Precisamos de políticas públicas adequadas para a educação. Precisamos de pais que considerem o conhecimento como um valor e deixem de enxergar a escola apenas como local seguro para deixar os filhos enquanto estão ocupados. Precisamos que a preparação para o mercado de trabalho seja questionada, pois as profissões de hoje, num curtíssimo espaço de tempo, não existirão mais. Precisamos de gestores educacionais que saiam de seus gabinetes e vejam nos docentes profissionais preparados intelectualmente para pensar, propor e atuar de forma vibrante, comprometida e apaixonada para a formação humana. Profissionais capazes de desenvolver o potencial e a criatividade dos estudantes, com o objetivo de que o conhecimento socialmente acumulado possibilite a construção de um novo pacto civilizatório.

Olga Neri de Campos Lima é professora, dirigente sindical do Sinpro/Caxias e apresentadora do programa Maravilha. Este artigo foi publicado no jornal Pioneiro e no portal da CUT/RS.


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Conviver e celebrar FOTOS RICARDO BARP

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inda que tudo esteja difícil no atual cenário político e econômico, é preciso resistir e alimentar aquilo que há de mais humano em nós: a alegria de conviver e celebrar. O Jantar dos Professores foi um momento importante nesse sentido. Realizado no restaurante Tulipa, junto aos Pavilhões da Festa da Uva, no dia 28 de outubro, reuniu centenas de professores para jantar e dançar com animação do DJ Marcão. A coordenadora da Secretaria de Cultura do Sinpro/Caxias, Nadia Pinto Bento Alves, saudou os participantes representando a diretoria: “Vamos caminhar juntos, temos uma grande jornada pela frente na luta por democracia e direitos. O sindicato somos todos nós”, destacou. Além de curtir a música, os professores se divertiram em fotografias com plaquinhas temáticas.


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SAB ATIN A

Fascismo & Educação “O jornalismo italiano é livre porque serve apenas a uma causa e a um Regime.” Mussolini ARQUIVO PESSOAL

No Brasil, é costume trocar o modelo de ensino cada vez que ocorrem mudanças no regime de governo. Foram elaboradas oito constituições com o objetivo de validar o sistema político vigente. Para apoiá-lo, foram elaborados nove grandes projetos de educação. A mudança no sistema educacional corresponde, assim, às necessidades do modelo econômico-político adotado pelos golpes. O Brasil não é um caso isolado. De uma forma geral, os países adequaram a educação aos seus interesses políticos. O Consenso de Washington não obriga os países a mudarem o conceito de educação nacional, mas suas regras são claras ao centrar na iniciativa privada tanto a saúde como a educação, reduzindo assim a participação do Estado nos dois setores. Esta é sua regra fundamental.

Conhecer os pressupostos teóricos da educação fascista pode orientar o entendimento sobre o que o golpe de 2016 está fazendo com a educação.

Loraine autografando o livro “As Sombras do Littorio”, que revela a história do fascismo em solo gaúcho

Os fundamentos do projeto da educação fascista estavam centrados no empirismo. Como rezam os dicionários: “Empirismo é a doutrina segundo a qual todo conhecimento provém unicamente da experiência, limitando-se ao que pode ser captado do mundo externo, pelos sentidos, ou do mundo subjetivo, pela introspecção, sendo geralmente descartadas as verdades reveladas e transcendentes do misticismo, ou apriorísticas e inatas do racionalismo.” A doutrina fascista de educação pregava que todo conhecimento

provém unicamente da experiência. Os pressupostos empiristas, do fazer pelo fazer, da generalização e do estabelecimento de leis gerais através de eventos particulares, constituem um apelo à indução e à ação. Segundo Gramsci, o empirismo corresponde ao modo americano de pensar, ou seja, o americanismo onde ele se origina. As reformas fascistas em relação ao conhecimento e à escola são baseadas não só na mudança das técnicas de ensino, da metodologia e do conteúdo, mas da própria teoria do conhecimento. As mudanças realizadas permitiram a ingerência do Estado diretamente na educação e a “fascistização” do sistema educacional.

Os fundamentos do projeto da educação fascista eram assim os pressupostos empiristas, do fazer pelo fazer, da generalização e do estabelecimento de leis gerais através de eventos particulares.

Era um apelo à indução e à ação, constituindo assim a máscara sofista da “filosofia”, política do “oportunismo” e “empirismo”. Gramsci resume a reforma como “liberal”, no


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sentido de ser o empirismo a ciência que justifica o domínio da técnica e da organização do capitalismo, consistindo na redução das aulas teóricas, e no aumento das aulas práticas, com o corte em conteúdo “superado” (clássicos) e o acréscimo de uma forma militar fascista: a criação de milícias de crianças e jovens, treinando-os para a luta. Também os conteúdos na área de história e de língua italiana mudaram, encaminhando a juventude para os ideais fascistas. Os diplomas perderam

sua importância na mobilidade social, o papel atribuído à cultura foi reduzido. Os docentes antifascistas foram destituídos de suas funções, e só a adesão da classe ao fascismo passou a ser a garantia de trabalho. Não é de estranhar, pois, que em 1931, os professores fossem obrigados a prestar juramento de fidelidade ao fascismo. A universidade, que parecia ser o reduto mais difícil de ser conquistado pelo fascismo, submeteu-se sem maiores dificuldades ao controle do partido.

O golpe de 2016 segue as regras do Consenso e a educação segue as regras do pragmatismo norte-americano. A educação do Brasil, mais uma vez, é submetida a uma reforma que pretende despolitizar os alunos, treinando-os para o trabalho. Uma escola sem partido e sem o ensino crítico da História e da Sociologia: quando são reduzidas no currículo escolar as disciplinas que despertam o espirito crítico, o objetivo é tornar os alunos alienados treinando-os para o projeto neoliberal, que garante uma mão de obra servil e sem consciência. O Brasil marcha de forma acelerada para a educação proposta pelo fascismo. Como diz Mussolini: “Os homens estão cansados da liberdade, somente um país inferior, ordinário, insignificante, pode ser democrático”. Ao contrário, um povo forte e heroico busca a meritocracia e uma obediência cega à hierarquia, segundo ele. Por outro lado, piora-se as condições de trabalho e se reduz o salário, o que proletariza os professores. Na medida em que se reduz o salário, pioram as condições de vida e, portanto, a própria qualidade do ensino. Ser professor, no Brasil, tem sido uma luta constante contra os mode-

los de ensino impostos e quanto às condições de trabalho.

Como exigir uma educação de primeiro mundo se aqueles que ensinam estão na condição de excluídos sociais?

Este é o problema da educação do Brasil. Uma escola sem política resolve apenas o problema dos empresários e não o dos professores e muito menos o da educação. A liberdade não se consegue com a obediência. Ao contrário do que escreveu Mussolini, não é livre quem só obedece. A liberdade significa reponsabilidade, ela pode trazer medo e insegurança. Como escreveu um dos pais da liberdade, Benjamin Franklin: “Aqueles que abrem mão da liberdade essencial por um pouco de segurança temporária, não merecem nem liberdade nem segurança.” Infelizmente, no Brasil, o professor precisa de mais coragem que todos os outros, para ser livre e educar para a liberdade. Loraine Slomp Giron é doutora em Ciências Sociais, historiadora e pesquisadora.

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