Seafood Brasil #42

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CINCO PERGUNTAS

SUPLEMENTO

A volta da Associação Brasileira da Gastronomia Japonesa

Fornecedores aceleram ritmo de inovações na aquicultura

brasil www.seafoodbrasil.com.br

Luz verde intermitente

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Enquanto armadores de SC veem demandas paralisadas, indústrias variam matérias-primas e batem recordes

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seafood

#42 - Dez/Jan 2022 ISSN 2319-0450


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Editorial

O espírito do momento

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screvo sob o impacto da dor das famílias dos falecidos de Petrópolis, cidade serrana do RJ em estado de calamidade pelas chuvas torrenciais que arrastaram casas, veículos e vidas em fevereiro. Ainda que o setor não tenha sido diretamente afetado pelas tempestades, a tragédia anunciada deixa uma série de lições amargas para um ano que se pretendia de reconstrução pós-pandemia, mas também uma dose de esperança.

Vemos uma nova onda de comprometimento coletivo e solidariedade, inclusive de empresas do ramo. O voluntariado é uma grande demonstração da capacidade de se colocar no lugar do outro, mas há quem consiga exercer isso sempre. Nesta edição trazemos o exemplo da Adriana Drica (Personagem, pág. 82), que colocou sua empatia a serviço da pesca artesanal e se tornou a vereadora mais votada de Balneário Piçarras (SC).

Na seção Cinco Perguntas (pág. 6), entrevistamos o novo presidente da entidade que defende o interesse dos restaurantes japoneses. Apesar de operar um restaurante defensor do washoku, Marcelo Shiraishi se coloca no lugar dos empresários de todas as vertentes desta culinária afetada em cheio pelas consequências da pandemia. Ainda no âmbito gastronômico, na seção Na Cozinha, exploramos as relações entre o pescado e o movimento Slow Food (pág. 72). Já na Capa (pág. 26), avaliamos quanto avançaram os pleitos do setor pesqueiro industrial de SC ao governo federal desde nossa última visita, em 2017. Em meio a críticas do segmento, o secretário Jorge Seif Jr. nos concedeu entrevista exclusiva sobre o tema em que garante ter se colocado no lugar do setor pesqueiro. Boa leitura!

Ricardo Torres - Editor-chefe

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Índice

06 5 Perguntas

08 Na Água

10 MKT & Investimentos 24 Na Planta

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42 Na Gôndola

44 Suplemento

62 Estatísticas

82 Personagem

72 Na Planta

Capa

Expediente Redação redacao@seafoodbrasil.com.br Publishers: Julio Torre e Ricardo Torres Editor-chefe: Ricardo Torres Editor-executivo: Léo Martins Repórter: Fabi Fonseca Diagramação: Emerson Freire Adm/Fin/Distribuição: Helio Torres

Comercial

comercial@seafoodbrasil.com.br Tiago Oliveira Bueno

Impressão

Máxi Gráfica A Seafood Brasil é uma publicação da

Seafood Brasil Editora Ltda. ME CNPJ 18.554.556/0001-95

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5 Perguntas a Marcelo Shiraishi, novo presidente da Associação Brasileira de Gastronomia Japonesa (ABGJ)

Entrevista

Pela união da culinária nikkei Novo presidente da ABGJ, Marcelo Shiraishi quer estreitar relacionamento com cadeia de suprimentos, aprimorar troca de informações e fortalecer todos os segmentos da gastronomia japonesa Texto: Ricardo Torres

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Entre os quatro principais objetivos da entidade sob a gestão de Shiraishi está a aproximação com a cadeia de suprimentos, na qual o pescado tem papel preponderante. Frequentemente, os peixes e frutos do mar representam mais da metade do custo de mercadoria vendida por esses estabelecimentos, o que torna a relação com os fornecedores tão indispensável quanto sensível. Em tom ao mesmo tempo conciliador e exigente, Shiraishi sinaliza disposição para construir uma nova fase nessa relação, com uma conversa franca sobre preços, padronização, origens e qualidade. “Em reunião que fizemos na Fiesp percebi que do lado do pescado dá para fazer um trabalho muito bonito”, conta.

Acervo pessoal

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Associação Brasileira de Gastronomia Japonesa (ABGJ) tem um novo presidente. Marcelo Shiraishi é gestor administrativo do Ayzomê, uma pérola washoku - a culinária japonesa tradicional - em São Paulo. Apesar da proposta do restaurante ser um resgate aos princípios que norteiam os pratos japoneses, o marido da chef e embaixadora da culinária japonesa Telma Shiraishi quer imprimir à entidade uma visão plural. “Cada restaurante terá um papel fundamental na gastronomia japonesa e cada um fará seu serviço”, pontua.


“Oferecimento de matéria prima de qualidade a preços competitivos é o que melhor o setor pode oferecer a nós.”

Quais são os principais objetivos desta nova gestão? O primeiro deles é reunir todos os restaurantes para trocar informações e fortalecer a categoria. O segundo objetivo é estar perto da cadeia de suprimentos, tanto na parte de pescado quanto de outros insumos estamos próximos, mas não estamos organizados. O terceiro objetivo é estar próximo das entidades de classe: somos parceiros oficiais da Abrasel, mas também estamos estabelecendo parcerias com a ANR e o SindResBar, para colocar pleitos e defender interesses da categoria. O quarto é estreitar o relacionamento Japão-Brasil, de modo que possamos trazer referências do Japão e valorizar a culinária nikkei. Um dos grandes exemplos é o Peru, que está muito bem rankeado, com os melhores restaurantes do mundo. Como pode o Brasil estar fora de uma premiação como a 50 Best, que premia os melhores restaurantes do mundo?

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Outro ponto muito sério é que a associação não irá avaliar as diferentes culinárias japonesas que existem aqui para dizer que uma é melhor que

Neste momento de retomada das atividades, qual é o maior entrave dos restaurantes japoneses? O que mais temos sofrido agora é com a questão do RH [recursos humanos]. Parte da mão de obra tem ficado doente e, nesta retomada, muitos profissionais da área estão repensando a carreira. Estamos com uma crise de falta de mão de obra em todos os departamentos do restaurante. Por outro lado, também nos prejudica muito o aumento de custo de matéria-prima e a falta de apoio de linhas de crédito, ao mesmo tempo que pagamos impostos incrivelmente altos.

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O quanto das inovações introduzidas durante a pandemia deve permanecer nesta retomada? O teletrabalho veio para ficar. Não teremos 100% das pessoas em casa, mas certamente não teremos 100% presencialmente no trabalho. De 20% a 25% da força de trabalho deve permanecer em casa, o que impacta o modelo de negócio. Os restaurantes precisam fazer o atendimento local e por delivery.

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Muitos restaurantes fecharam e muitos empreendedores estão buscando novos modelos, mais flexíveis, como dark kitchens, ou restaurantes com modelo mais enxuto, menos equipe de salão etc. O mercado

não perdoa, ele continua se atualizando a uma velocidade incrível. Como os fornecedores de pescado podem trabalhar em conjunto com os restaurantes japoneses? Oferecimento de matéria-prima de qualidade a preços competitivos é o que melhor o setor pode oferecer a nós. Os peixes e frutos do mar representam 50% do meu CMV [Custo de Mercadoria Vendida] e são uma questão muito sensível. Não vejo um trabalho de classificação de peixes ou o estabelecimento de regras de precificação.

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Em reunião que fizemos na Fiesp, percebi que do lado do pescado dá para fazer um trabalho muito bonito. Com o tamanho da nossa costa, como não conseguimos produzir algo a um custo acessível? Por exemplo: o panga, importado do Vietnã, é ainda muito discriminado. Mas, de repente, a versão brasileira pode desenvolver alguma variedade de cativeiro que possa ser interessante e baratear custos. A tilápia já é vista mais para a parte quente, não tenho visto muito para sushis e sashimis. O robalo é um peixe muito nobre, mas o preço é na mesma faixa de salmão e atum. O bijupirá, que já tem cultivo, vai muito bem na nossa gastronomia. Este estreitamento de relacionamento e parceria com o lado de produtor de pescado é super importante. Sabemos, porém, que tudo o que se faz tem de ter viabilidade econômica, com utilidade de mercado. Se encontrarmos uma forma de trabalharmos juntos, a chance de ter sucesso é muito grande.

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Neste sentido, depois de um certo tempo, pensamos junto com a minha esposa o que poderíamos fazer. Um dos caminhos seria retomar esta associação de forma que o primeiro objetivo fosse reunir a todos para trocar informações - apenas em São Paulo, temos 1.000 restaurantes japoneses.

a outra. Cada restaurante terá um papel fundamental na gastronomia japonesa e cada um fará seu serviço. Não julgaremos ou orientaremos o que cada um deve fazer na gastronomia japonesa, não iremos interferir nisso.

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Por que retomar o trabalho da associação? Estamos há quase dois anos em pandemia. Neste período, vimos muitos colegas do nosso setor, empresários muito sérios, fechando as portas. Um dos elementos que percebemos como de fundamental importância e que talvez tenha faltado era a questão da informação. Boa informação sobre tudo o que estava acontecendo.

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Larvas “veganas”?

Na

Água Tecnologia para pesca e criação Crédito das fotos: Divulgação/Empresas

Duro de matar

H2 com muito O O aerador de pás é a alternativa da Weemac para a oxigenação de viveiros escavados. Através da movimentação das camadas superiores, a solução cria uma leve correnteza com a rotação das pás, para deixar a água mais homogênea e melhorar a uniformidade do crescimento. A profundidade mínima do equipamento é de 1 m, com uma abrangência de 2.500 m² a 5.000 m².

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Indicada para sistemas submetidos a altos desafios ambientais, a Pond, linha de pós-larvas de camarão marinho Litopenaeus vannamei da Aquatec, é proveniente de reprodutores selecionados em viveiros comerciais. Chamado de “o maratonista” por conta de sua resistência, segundo a empresa, o produto tem uma melhor performance em sistemas de baixa densidade e que tenham como características adversidades de meio ambiente, chegando a gramaturas de 7 g a 10 g.

A iAqua traz para o mercado as novas dietas Frippak Fresh, produto de nutrição animal formulado com um objetivo: reduzir ao máximo a dependência de alimento vivo em larviculturas. De acordo com a empresa, a solução contém grandes níveis de ingredientes naturais e frescos como proteínas, lipídeos e vitaminas, o que ajuda no objetivo do produto em diminuir a necessidade de algum alimento vivo para as larvas.

ou sistema de recirculação. O equipamento possui sistemas de alimentação centralizados que podem ser personalizados para qualquer espécie de peixe, otimizando assim o consumo da ração. Dentre outros benefícios da solução, a empresa destaca a redução da taxa de conversão alimentar e o aumento dos índices de sobrevivência das espécies.

Saco vazio não nada bem O alimentador pré-engorda é a aposta da Marine Equipment para auxiliar pisciculturas que possuam viveiros escavados e/

Livrai-nos do mal Indicado para espécies de tilápias e seus híbridos, o Aquaflor 50% Premix distribuído pela Ammco é um antibiótico para o tratamento de septicemia hemorrágica bacteriana, doença causada por bactéria gram negativa do gênero aeromonas sp, e na estreptococose, doença originada por bactérias gram positiva da espécie Streptococccus agalactiae. Ainda segundo a empresa, o produto também é indicado para o tratamento da chamada “doença da boca vermelha”, que acomete espécies de Truta Arco-Íris. A solução é disponibilizada em embalagens de 2 kg.


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Marketing & Investimentos

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Cardume tecnológico e institucional Enquanto expositores do 3ª Internacional Fish Congress & Fish Expo (IFC) apostaram em novidades para a aquicultura, palestrantes discutiram inserção global do Brasil

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Texto: Ricardo Torres

á ouviu falar do termo spoiler? Essa revelação antecipada de informações sobre algo ainda inédito é o que fizemos na Seafood Brasil #41 com a 3ª edição do International Fish Congress & Fish Expo (IFC) . O evento, realizado

em formato híbrido (presencial e com transmissão online), aconteceu entre os dias 24 e 26 de novembro de 2021 e contou com 1.561 inscrições de 10 países diferentes. Já com data nova para a 4ª edição - 31 de agosto a 02 de setembro de 2022 – o IFC 2021 deixou

um legado de lançamentos que exploramos nesta reportagem. Uma das principais vertentes abordadas na feira foi a sanidade, que se provou na mira de grandes empresas farmacêuticas. A multinacional


Hipra trouxe para a IFC a vacina por imersão, que imuniza peixes através das mucosas das brânquias, boca e pele

A mesma tecnologia já é utilizada em outras espécies de peixes como o robalo, pargo europeu, truta e salmão. No Brasil, ela já está em testes em propriedades no interior de São Paulo com a tilápia, grande aposta da empresa no Brasil. Benito acredita que um diferencial é a

A Zoetis, especializada em vacinas, medicamentos e testes veterinários, promoveu um evento paralelo durante o Congresso para realizar o lançamento da Fishteq NFT20, uma máquina que vacina, conta, mede e classifica os peixes. O Brasil é o primeiro país a receber esse equipamento para vacinação de tilápias – outros países já utilizam a tecnologia, mas para a vacinação de outras espécies como salmão e truta. Segundo a empresa, o equipamento proporciona muita biosseguridade, além de outras vantagens como segurança, redução da manipulação dos animais, contagem

e vacinação eficientes, registro e formação de banco de dados. Além da apresentação no evento paralelo, o público presente pôde conferir o equipamento em primeira mão no estande da empresa. “Com a chegada dessa tecnologia, o piscicultor terá maior performance na vacinação, além de elevada padronização dos lotes, já que a classificação dos peixes se dá através do processamento de imagens individuais digitalizadas”, explica a engenheira de pesca e gerente técnica e comercial de Aquacultura da Zoetis, Danielle Damasceno. “A máquina ainda ajusta a posição da agulha de acordo com o respectivo tamanho de cada animal, garantindo que a vacina seja aplicada no local correto”, completa.

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facilidade do procedimento – similar à anestesia por imersão – e os benefícios financeiros, como o aumento da rentabilidade das produções.

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espanhola Hipra apresentou a vacina por imersão, que imuniza os peixes por meio das mucosas das brânquias, boca e pele, de modo a proteger os alevinos a partir de 0,5 g. “Com essa tecnologia, conseguimos proteger os animais mais sensíveis da criação, que são os alevinos. Assim, contribuímos para um melhor crescimento e reduções no uso de antibióticos e taxa de mortalidade’’, afirma Raúl Benito, brand manager da Aqua Hipra (leia mais sobre a Hipra no Suplemento, a partir da pág. 44).

Jéssica Martinez Feller

Jéssica Martinez Feller

Máquina para vacinação Fishteq NFT20 foi o grande destaque da Zoetis para a 3ª IFC


Divulgação/ IFC

Marketing & Investimentos

A Peixe BR lançou no IFC seu Manual de Biosseguridade da Piscicultura Brasileira, material que contém temáticas abrangentes aos desafios sanitários, estratégias de controle e boas práticas de manejo

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O evento trouxe também um painel específico sobre o tema. Em “Sanidade e Biossegurança na Aquicultura Brasileira - avanços e desafios para garantir a sustentabilidade da cadeia e o acesso ao mercado nacional e internacional”, o presidente executivo da Peixe BR, Francisco Medeiros falou sobre o processo de elaboração e importância do Manual de Biosseguridade da Piscicultura Brasileira, que desde seu lançamento no IFC, está disponível para download gratuitamente em www.peixebr.com.br. O guia é resultado de aproximadamente nove meses de trabalho, durante os quais os membros do Comitê de Sanidade (formado por 18 técnicos de empresas associadas à Peixe BR) se dividiram em seis grupos de estudo, com temáticas abrangentes aos desafios sanitários, estratégias de controle e boas práticas de manejo.

Mesmo sendo uma iniciativa do setor produtivo, Medeiros destacou e agradeceu a colaboração de Valéria Stacchini Ferreira Homem, médica veterinária e coordenadora de Animais Aquáticos do Departamento de Saúde Animal do Mapa. A médica veterinária ressaltou que o Mapa é o órgão responsável pela certificação, fiscalização e demais questões ligadas ao licenciamento de produção aquícola no País. Assim, mesmo que iniciativas como esta sejam bem-vindas e até mesmo necessárias para popularizar questões ligadas à biosseguridade, elas não substituem as legislações vigentes para dentro e fora do Brasil.

Da produção ao consumo A expansão do Brasil como um ator global na tilápia foi tema do painel “Para onde vai o mercado da tilápia?”, do pesquisador e professor da Universidade do Arizona (EUA),

Kevin M. Fitzsimmons. Ele apresentou dados globais sobre o consumo e a produção de tilápias nos últimos três anos, focando no crescimento da produção brasileira e na estagnação da chinesa, atualmente a maior produtora do mundo. “Na minha opinião, o Brasil é o único País que pode alcançar e até mesmo ultrapassar a produção chinesa de tilápias.” David Basset, secretário executivo da European Aquaculture Technology and Innovation Platform (EATip), apresentou brevemente uma plataforma tecnológica que está em adaptação para a realidade brasileira. Com o intuito de identificar desafios e prioridades da aquicultura, a plataforma faz parte do acordo internacional chamada “Declaração de Belém” que envolve União Europeia, Brasil e a África do Sul, e conta ainda com o envolvimento da Empresa


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Marketing & Investimentos

Palestra com Meg Felippe, o Carrefour: para ela e o representantes da Nielsen Brasil, o mercado interno pode crescer com estabilidade de preços e apelo à saudabilidade

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Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Basset adiantou ainda que um workshop inicial sobre ela está sendo alinhado para acontecer em abril de 2022, em Florianópolis (SC). Já os representantes das empresas Copacol e GeneSeas Aquacultura, o superintendente comercial e de marketing, Valdemir Paulino dos Santos, e o CEO, Vicente Criscio, respectivamente, afirmaram que este futuro está ligado incondicionalmente às exportações. Para ambos, o embargo da União Europeia ao

pescado brasileiro não representa um grande problema diante do mercado que ainda há para ser conquistado, em especial o dos Estados Unidos. Em sua fala, Santos citou ainda as negociações em andamento com a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil) através da Associação Brasileira da Piscicultura (Peixe BR) para a criação de uma identidade internacional que represente o peixe de cultivo brasileiro, tal qual outras proteínas possuem.

Para discutir o contexto do consumo interno, o IFC chamou Roberto Butragueño Revenga, diretor de varejo vertical da Nielsen Brasil e Meg Felippe, médica veterinária sanitarista e diretora comercial do Carrefour. Para Revenga, a palavra da vez é saudabilidade, fator que deve ser o grande trunfo do setor, caso seja bem trabalhado através de campanhas de marketing nacionais. Ele lembra ainda que, embora o mercado internacional seja de fato grande, o interno não está nem perto de ter atingido seu potencial, comparando-o com a Espanha, onde o


Nesta linha, os itens financiáveis são: implementação de sistemas de geração de energia renovável; automação, adequação e construção de instalações; e aquisição de máquinas e equipamentos.

Crédito ao setor

Já a segunda opção é o Moderagro, que possui taxa de 7,50% ao ano, o mesmo prazo e carência da Inovagro, mas com limite de crédito de até R$ 880 mil por beneficiário. Nesta modalidade, os itens financiáveis são: produção, beneficiamento, industrialização, acondicionamento e armazenamento de produtos; construção e ampliação das instalações destinadas a guarda de máquinas e estocagem de insumos; e a implantação de frigorífico e de unidade

Em uma das apresentações mais esperadas pelos produtores presentes no evento, a vice-presidente de Negócios de Varejo da Caixa Econômica Federal, Thays Cintra, destacou as novas linhas de crédito disponíveis para a aquicultura e a pesca. A primeira é o Inovagro, que possui taxa de 7,00% ao ano, prazo de até 10 anos, 3 anos de carência e limite de crédito de até R$ 1,3 milhão.

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Outra questão salientada por ambos foi a queda do poder aquisitivo do consumidor brasileiro, que, ao mesmo tempo, tem mais acesso a canais de busca e comparação de preços. Neste sentido, Meg Felippe ressaltou que o consumo aumentou de forma inesperada no auge da pandemia da Covid-19, quando o preço do pescado se manteve competitivo. No entanto, esse já não é mais o cenário, o que faz com que o pescado volte a perder espaço para produtos de origem bovina e suína. Para ela, esse é um indicativo de que a cadeia produtiva não deve competir entre si - devido

à proveniência dos seus produtos (aquicultura, pesca extrativa etc.) –, mas sim unir esforços para posicionar o pescado diante das outras proteínas, que são suas verdadeiras concorrentes nas gôndolas.

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consumo de pescado é 10 vezes maior do que aqui.


Marketing & Investimentos Da esquerda para a direita: Katia Mastroto, Vera Lucia Pereira, Ofélia Campigotto e Fernanda Queiróz e Silva

a linha de crédito para Investimento poderá ser utilizada na aquisição e reforma de máquinas, equipamentos e utensílios, além da construção ou ampliação de benfeitorias. Pedro Guimarães, presidente da Caixa, ressaltou que as novas linhas vão possibilitar a compra de equipamentos importantes para aprimorar a prática da atividade pesqueira. “São dois dias, três dias, em mar aberto. Como alguns não têm geladeira, eles têm que voltar antes. Se o pescador puder ter uma geladeira no barco para fazer gelo, ele passa uma semana. A gente está falando de crédito de R$ 3 mil e R$ 4 mil para quem já tem renda.”

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Arquivo Pessoal

Incentivo à participação feminina

de beneficiamento de produtos da aquicultura, aquisição de máquinas e demais materiais utilizados na aquicultura.

da necessidade de licenciamento ambiental – ainda considerado por muitos produtores como entrave principal à obtenção de financiamento.

Cintra também falou sobre a recente abertura de linhas de crédito destinadas a produtores aquícolas que exploram áreas da União, com taxa para custeio de 4,5% ao ano, prazo de 185 dias após o fim do período de defeso e limite de crédito de até R$ 250 mil. Já para investimentos com taxa de 4,5% ao ano, o prazo é de até 5 anos para semifixo e 12 anos para fixo, além do limite de crédito de até R$ 200 mil.

Francisco Medeiros, da Peixe BR, comenta que a vantagem é que se trata de mais um banco oficial com agências em todos os locais oferecendo o crédito ao setor de aquicultura. “É um avanço na área de financiamento. Agora o setor vai continuar a trabalhar para derrubar a exigência do licenciamento ambiental da piscicultura como prérequisito do financiamento, pois esse é o maior gargalo de acesso ao crédito no Brasil.”

Após o IFC, algumas alterações nas regras para linhas de crédito de aquicultura foram anunciadas pelo governo federal junto à Caixa em janeiro deste ano. Entre as novidades para o crédito de aquicultura contempladas no Plano Safra, o governo informou que o produtor pode oferecer outro imóvel para garantia do empréstimo, não necessariamente o próprio empreendimento. O restante segue as regras do mercado financeiro e, principalmente, a manutenção

A Caixa também destacou duas novas linhas de crédito direcionadas aos pescadores artesanais beneficiários do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e detentores de Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP): a de Custeio e de Investimento. Na linha para Custeio, o crédito poderá ser utilizado no financiamento das despesas inerentes à captura do pescado e à conservação das embarcações e equipamentos. Já

A fim de incentivar a participação feminina, a organização do IFC disponibilizou um cupom de 50% de desconto na inscrição para mulheres aquicultoras. A ilustração de uma sereia, encomendada ao grafiteiro e artista plástico Rodrigo Cardoso dos Santos, mais conhecido como “Digo”, representou essas mulheres que, embora muitas vezes esquecidas, são parte fundamental da cadeia produtiva de pescado. Entre as aquicultoras presentes no evento estava Ofélia Campigotto, presidente da Associação Catarinense de Aquicultura (ACAq), que questionou o Dr. Audun Lem, vice-diretor da divisão de pesca e aquicultura da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), sobre o papel das mulheres no setor. “Sabemos que [globalmente] as mulheres representam 50% dos trabalhadores ligados ao setor da pesca e aquicultura. No entanto, na maioria das vezes, elas não são reconhecidas”, começou. “Isso é muito mais uma questão de visibilidade e de reconhecer o papel fundamental que as mulheres têm no setor”, completou o representante da FAO, demonstrando que a questão não é exclusiva ao território brasileiro.


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Marketing & Investimentos Vitrine tecnológica: algumas novidades e lançamentos no IFC Entre os pontos altos da 3ª edição do IFC, estão os lançamentos e apresentações de equipamentos e tecnologias desenvolvidas ou adaptadas para a realidade da cadeia produtiva aquícola brasileira. Confira alguns dos destaques apresentados durante o evento:

MQ PACK

Jéssica Martinez Feller

A empresa expôs uma nova máquina que conta com um inovador sistema de pesagem e empacotamento automático de peixe. O equipamento, que segundo o CEO Marcos Queiroz gera ganhos em precisão de peso de 1.000 kg por mês de pescados, é 100% nacional e pode ser financiado pelo BNDES.

Máquina com sistema de pesagem e empacotamento automático de peixe

Especializada em sistemas aquáticos, a empresa apresentou o filtro de tambor rotativo 800/2. Considerado pela empresa como o primeiro filtro autolimpante, é capaz de remover partículas sólidas de forma automática, com compatibilidade tanto para água doce quanto salgada.

Filtro de tambor rotativo 800/2

CRÉDITOS: Divulgação / Altamar

ALTAMAR

CRÉDITOS: Jéssica Martinez Feller

MAREL A FilleXia da Marel é uma filetadora automatizada que processa até 40 peixes por minuto. Com layout compacto, a máquina procura reduzir riscos de contaminação, aumentar a produtividade e qualidade do produto, além de maximizar o uso da matéria-prima.

FilleXia processa até 40 peixes por minuto

A empresa esteve presente na feira com duas de suas cinco marcas: a Raguife produtora de rações para aquicultura e carcinicultura; e a Brazilian Fish, que levou uma gama de produtos congelados como bolinhos e trouxinhas de tilápia, além de uma tilápia recheada, apresentada como opção para as festas de final de ano.

AQUAGENETICS DO BRASIL

CRÉDITOS: Divulgação / IFC

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Tilápia recheada, pronta para o consumo, foi grande aposta da Brazilian Fish

CRÉDITOS: Jéssica Martinez Feller

GRUPO AMBAR AMARAL

Reconhecida como a maior produtora brasileira de alevinos e juvenis de tilápia, a empresa anunciou durante o evento que está investindo no 1º núcleo compartimentalizado do mundo, com foco no melhoramento genético das espécies. Instalado no Tocantins, o núcleo terá capacidade de receber, trabalhar no material genético e distribuí-lo para todo o planeta com segurança sanitária.

AquaGenetics aproveitou o evento para expor planos para o núcleo do Tocantins


A empresa apresentou seus dois tipos de aeradores: o modelo chafariz e o de pás. Ambos os equipamentos são mecânicos, movidos a energia elétrica e têm como objetivo incorporar o oxigênio atmosférico na água dos sistemas de cultivo de organismos aquáticos.

Aeradores modelo chafariz e pás foram destaques da Bonkoski

DUPEIXE A plataforma lançada em 2021 é um hub comercial desenvolvido para aproximar, conectar e gerar negócios entre todos os segmentos e portes de empresas da cadeia comercial de pescado.

CRÉDITOS: Jéssica Martinez Feller

CRÉDITOS: Jéssica Martinez Feller

BONKOSKI

Sócios da plataforma, Kaká Ambrósio e Lutty Chagas

TREVISAN

CRÉDITOS: Divulgação/IFC

Entre os equipamentos expostos, destaque para o aerador de pás alternadas cujo rendimento e eficiência, segundo a empresa, são maiores em comparação aos outros tipos de aeradores existentes no mercado.

Trevisan apresenta o aerador de pás alternadas

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Bombas de sucção e aeradores (foto) para peixes foram a aposta da Agricotec/Cardinal no evento

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A Cardinal, que pertencente ao grupo Agricotec, apresentou suas bombas de peixes, desenvolvidas para transferência e despesca de alevinos, peixes médios e grandes. Já a marca “mãe” expôs seu aerador de água de tanques com quatro pás.

CRÉDITOS: Jéssica Martinez Feller

AGRICOTEC/CARDINAL


Marketing & Investimentos

Curtas

As notícias mais importantes do último bimestre

Bares e restaurantes não retomaram vendas pré-pandemia

Cerca de 63% das empresas do setor de bares, restaurantes, cafés e lanchonetes de todo o País ainda não recuperaram as vendas em relação à pré-pandemia, na comparação de outubro de 2021 com outubro de 2019. Os dados são da pesquisa Série Covid-19, realizada pela Associação Nacional de Restaurantes (ANR), a consultoria Galunion e o Instituto Foodservice Brasil (IFB).

Potiporã conquista certificação Great Place to Work A unidade de beneficiamento da Potiporã, a maior indústria de camarão do Brasil, recebeu a certificação Great Place to Work (GPTW). Parte do grupo Samaria, a empresa emprega cerca de 500 colaboradores no processamento, que beneficiam 1 mil toneladas de camarão por mês.

A Prime Seafood pretende construir uma fábrica estimada em 45 mil metros de área para processamento de atum e lagosta em Areia Branca, no Rio Grande do Norte, à beira do rio Apodi. À Seafood Brasil, a empresa ainda falou sobre a parceria com a Sea Delight e o International Pole and Line Foundation (IPNLF) para o lançamento do Fisheries Improvement Project para a albacora-lage no Brasil.

Internet

A estiagem que desde o fim do ano passado afeta o Brasil, especialmente a Região Sul, também causou impactos nas lavouras de soja e milho. A consequência é clara: alta de 50% a 60% no custo da ração, cujo repasse o setor não tem conseguido absorver. Apesar disso, a produção de rações para aquicultura brasileira deve crescer mais de 5% em 2022, segundo o Sindicato Nacional da Indústria de Alimentação Animal (Sindirações).

Nova fábrica da Prime Seafood

BTJ AQUA entra no food service

A BTJ AQUA, player de tilápias do interior de SP, iniciou a comercialização de tilápia para o mercado de food service. A empresa firmou uma parceria com a Galunion Consultoria para estruturar o negócio, com mapeamento de oportunidades de outros produtos relacionados à proteína do peixe - hoje, o principal produto é o filé de tilápia, com produção anual de 10 mil toneladas.

Divulgação

Estiagem no Sul gera impactos nas rações

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ProBrasil é apresentado ao setor

Idealizado por oito associações do agronegócio brasileiro, o Fórum ProBrasil - Proteínas do Brasil foi apresentado ao setor em dezembro. Composto pela Abipesca, ABPA, Abiec, Abinpet, ABRA, Abrafrigo, Sindirações e a Ubrabio, o ProBrasil forma um parque que emprega diretamente 1,4 milhão de trabalhadores em 754 indústrias associadas, com uma receita estimada em R$ 1 trilhão. Em novembro, a PeixeBR se filiou à ABPA para maior representatividade política e institucional.


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Na

Planta Tecnologia em processamento de pescado Crédito das fotos: Divulgação/Empresas

Tchau tchau, bactérias No ramo de EPi’s, a Prevemax apresenta a capa branca de polietileno antimicrobiana. Podendo ser usada na agricultura, indústria alimentícia, frigoríficos e outros setores, o produto protege tronco e membros superiores de quem o usa. De acordo com a empresa, a capa não apresenta nenhum componente metálico em sua confecção ou qualquer outra substância que possa causar algum dano ao usuário.

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Por uma boa classificação e formação Para quem procura uma solução para a classificação e formação de porções, a Marel apresenta ao mercado duas opções: a classificadora Compact Grader 600 e a formadora de lotes Target BatcherTBL 3000. Segundo a

empresa, as classificadoras são ideais na distribuição de matéria-prima em diferentes partes do processo e de acordo com faixas de peso pré-estabelecidas. Já as formadoras podem formar produtos congelados ou resfriados, atendendo a diversas aplicações.

Debaixo de zero A Mebrafe disponibiliza máquinas de gelo em quatro modelos: fabricadores de gelo em escamas, que possui capacidade de 1.300 a 20.000 kg/24h; geradores de gelo em escamas, com capacidade de 2.000 a 30.000 kg/24h; os geradores de gelo em escamas para amônia; e os geradores de gelo em cilindro para amônia, que tem capacidade de 3.000 a 15.000 kg/24h. A empresa informa que todos os equipamentos são ideais para a indústria do pescado.

Sardinhas na geração Z A evisceradora de sardinha é a opção da Brusinox para quem procura automatizar sua produção. O equipamento realiza cortes automáticos na medida da barriga da sardinha para que ela possa ser encaixada na lata, permitindo assim o

melhor aproveitamento do produto. Ainda segundo a empresa, o equipamento permite o corte de cabeças e caudas de forma ágil, proporcionando assim produtividade à operação.

No fio da navalha A Bettcher oferece ao mercado o afiador de lâminas universal modelo 210, que permite o usuário afiar lâminas, em especial as Bettcher Whizard. De acordo com a empresa, o equipamento é de precisão e garante um fio de lâmina fino e preciso em segundos, além de durar por mais tempo. Por fim, o afiador de lâminas traz uma chaira alinhada para retirar os resíduos de afiação de todas a lâminas.

Tilápias no modo automático A Automatic Posting Machine 0130 é a opção oferecida pela Branco Máquinas para corte em posta dos pescados. Equipamento desenvolvido para o processamento de diversos tipos de pescados como a tilápia, a solução é composta por esteiras e um conjunto de berçários que faz o transporte dos pescados até o processamento do conjunto de discos de corte. Pensado para 01 (um) operador, a produção do equipamento é de 1.600 kg/h.


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Cinco anos depois Desde nossa última visita, em 2017, armadores não enxergam evolução, mas indústrias prosperaram Estatísticas do Sindipi

Texto: Ricardo Torres

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complexo pesqueiro de Itajaí e Navegantes (SC) segue vibrante. As descargas são constantes e o movimento de caminhões é quase tão intenso quanto os contêineres. As indústrias da região, em nova fase, apostam na matériaprima importada e até na tilápia para diminuir a dependência da pesca extrativa. Do ponto de vista da mão de obra, uma nova força de trabalho formada por refugiados haitianos se adaptou rapidamente ao trabalho pesado das linhas de processamento e se soma aos milhares de trabalhadores brasileiros que atuam tanto nas maiores indústrias de conservas do Brasil, a Camil e a Gomes da Costa, além das indústrias multiitens de pescado, como Costa Sul, Cais do Atlântico e Natubras, que operam localmente. Até as que trabalham com matéria-prima importada, como a Komdelli, souberam

reagir às consequências da pandemia e buscaram alternativas que as fizeram crescer. Já os armadores não reverberam o mesmo entusiasmo. Ao contrário: alguns demonstram frustração com a gestão do secretário da aquicultura e pesca do Mapa, Jorge Seif Jr., oriundo da região e do setor. “Nossa expectativa era grande, mas as coisas não fluíram como esperávamos”, diz André Mattos, armador e coordenador da câmara de camarão rosa do Sindicato de Armadores e Indústrias da Pesca de Itajaí e Região (Sindipi). Para expor os principais pleitos, o presidente da entidade, Jorge Neves, concedeu uma entrevista exclusiva à Seafood Brasil. Em paralelo, abrimos espaço ao próprio Seif Jr., que cobra apoio de armadores. “Enquanto o setor não reportar dados, teremos problemas para defendê-lo”, alerta.

• Total de armadores associados: 256 • Total de indústrias associadas: 38 • Total de despachantes associados: 3 • Total de embarcações associadas: 464 • Embarcações de Cerco: 60 • Embarcações de Emalhe: 79 (sendo apenas 2 de peixe sapo) • Embarcações de Camarão Rosa: 140 • Embarcações de Camarão Sete Barbas: 33 • Embarcações de Arrasto de Peixe: 71 • Embarcações de Arrasto Oceânico de Peixe: 5 • Embarcações de Arrasto Oceânico de camarão-carabineiro: 1 • Embarcações de Polvo: 2 • Embarcações de Vara e Isca Viva: 28 • Embarcações de Long Line: Espinhel de Fundo: 2 Espinhel de Superfície: 30 • Embarcações de Cardume Associado (Atuns): 11


As demandas dos armadores de SC Uma atualização da edição #18 da Seafood Brasil

• Estatística pesqueira: Em 2017, o Sindipi já dizia que dados da pesca são fundamentais para nortear planos de gestão e manejo dos estoques pesqueiros, em referência à ausência de estatística pesqueira que se arrastava desde 2011. “Pois bem, de lá para cá, continuamos sem estatística e, por conseguinte, sem gestão eficiente da pesca. Absolutamente nada mudou”, diz o Sindipi. Segundo a entidade, este é o único setor que trabalha na produção de alimentos sem um sistema de informações sobre a atividade, ficando sem saber, por exemplo, qual foi a produção no ano anterior. A consequência disso são atos normativos com potencial restritivo que acabam prejudicando o setor.

• Permissionamento: A revisão da IN 10/2011 segue parada. Em 2019 a SAP/MAPA começou o processo de revisão dessa IN, mas o assunto segue sem solução.

• Cotas para pesca da tainha: Muito se avançou no sistema de gestão por cotas de captura da tainha. Se por um lado esse sistema se mostra promissor com resultados significativos na gestão pesqueira, por outro o setor pesqueiro amarga expectativas que foram frustradas. No relato para a Seafood Brasil em 2017, havia temor de que apenas 32 embarcações de cerco/traineira pescassem tainha naquela época. Chegamos a 2021 com oito embarcações permissionadas. “Mesmo a frota de cerco/traineira respondendo por menos de 25% de toda produção de tainhas, as restrições quase em sua totalidade são direcionadas a ela”, frisa a entidade.

• PREPS: O setor se considera amarrado a um sistema obsoleto, que apresenta falhas constante de rastreamento e prejudica os armadores de pescas com suspensões de licenças e até multas. Diante da inércia do poder público, o Sindipi se prontificou a buscar uma alternativa mais eficiente ao Preps, que foi “ignorado” pelas autoridades.

• Portaria nº445/2014: O segmento estima um prejuízo na ordem de R$ 60 milhões anualmente.

• Gestão Compartilhada: Esse parece ser o único assunto que se resolveu. Através da revogação da Lei nº 13.502/2017, e mais tarde da implementação da Lei nº 13.844, de 18 de junho de 2019, a gestão conjunta do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) dos temas relacionados ao uso sustentável dos recursos pesqueiros chegou ao fim, com muitas críticas de ambientalistas. O Sindipi considerou a mudança “um grande avanço para o setor”, ao criar “um ambiente mais previsível e com segurança jurídica para os empresários”.

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Desde 2014, quase meio bilhão de reais foi jogado ao mar de volta. A proposta do setor pesqueiro sempre foi no sentido de gerar informações e dados sobre as espécies tidas como ameaçadas, uma vez que a eficácia da Portaria nº 445/2014 nunca foi avaliada, acusa o Sindipi. A alternativa, de acordo com a entidade, seria uma autorização especial de pesca que permitisse o desembarque dessas espécies para comercialização, por um período pré-estabelecido, para geração de dados que estimem a abundância atual de cada uma das espécies listadas.


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“Reconquistamos a confiança” Jorge Neves defende “gestão transparente com foco nos associados”, mas diz que pleitos não foram atendidos por Seif Jr. longo dos anos. Estou no comando da entidade há duas gestões e o que posso destacar como positivo é a confiança que reconquistamos, fruto de gestões transparentes e que têm como foco os associados e, consequentemente, todo o povo das águas. Pela primeira vez na história da pesca, temos um secretário da pesca oriundo da região e de família dedicada à atividade. Como o sr. avalia a gestão de Jorge Seif Jr. à frente da secretaria? Sabemos que estar à frente de uma entidade, de um cargo público relevante, não é uma tarefa fácil, ainda mais no setor pesqueiro, que enfrenta dificuldades históricas e desafios novos e ameaçadores para a categoria - como a questão do subsídio, das antenas DMR e da Portaria 310. Mas lhe respondo tomando como base a sua própria pergunta: é justamente por ser alguém oriundo da pesca que, teoricamente, conhece bem as dificuldades dos armadores, das indústrias e dos pescadores, é que ainda insistimos em manter a expectativa de que a gestão do secretário atual consiga atender as demandas do setor. Gostaria de lhe responder a esse questionamento apenas com elogios, mas a realidade atual da pesca no Brasil não me permite isso.

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presidente do Sindicato dos Armadores e das Indústrias da Pesca de Itajaí e Região (Sindipi), Jorge Neves, completa em 2022, sete anos à frente da entidade. A maior conquista da gestão, segundo o próprio, foi reconquistar a confiança, “fruto de gestões transparentes e que têm como foco os associados”, diz na entrevista abaixo. Apesar do tom polido das respostas, ele não disfarça a decepção com a gestão de Jorge Seif Jr. à frente da SAP. “Gostaria de lhe responder a esse questionamento apenas com elogios, mas a realidade atual da pesca no Brasil não me permite isso”, crava.

Em 2017, quando fizemos a última visita a Itajaí/Navegantes, a SAP havia migrado do Mapa para o MDIC. Em paralelo, o Sindipi enfrentava uma crise de reputação após a Operação Enredados. Qual é o balanço que o sr. faz da sua gestão à frente do Sindipi? Ninguém faz nada sozinho. Hoje, o Sindipi tem a força que tem para agregar o setor porque foi algo construído por toda a diretoria ao

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A exigência de troca das antenas DMR, sem a correspondente oferta de produto pelo fornecedor, gerou insegurança jurídica ao setor. Qual foi a atuação do Sindipi em relação à questão e como a questão foi/será solucionada? Identificamos o problema e o confirmamos através de um contato com o representante comercial da Trucks Control. A partir disso, o Sindipi alertou a SAP por e-mail e por telefone sobre a questão e, em dezembro, oficializamos esse alerta através de ofício. Somente em 11 de janeiro de 2022, a SAP respondeu ao nosso ofício informando

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que haviam realizado uma reunião com a empresa Onixsat no mês de dezembro para tratar sobre o assunto. A Secretaria informou que iria realizar uma reunião com o Ibama para alertar sobre a situação, porém precisava de algumas informações que solicitou ao Sindipi como: nome da embarcação, número do TIE, data do agendamento para troca e o comprovante do agendamento. Encaminhamos um novo ofício para a SAP esclarecendo que tais informações devem ser solicitadas à empresa responsável pelo acontecido e não ao Sindipi. A SAP precisa tomar as providências adequadas, os nossos armadores não podem ser penalizados pela falta de responsabilidade, atitude e logística de uma empresa, seja ela qual for. Até o momento, a SAP não se posicionou sobre o assunto. E nós seguimos cobrando. A prorrogação da vigência da Portaria Nº 310 em dois anos é suficiente para a adequação de todas as embarcações dos associados do Sindipi? Não existe a prorrogação. O que aconteceu foi alteração de um artigo que fala em relação ao prazo, o que não impede a SAP de exigir que a Portaria seja aplicada em situações pontuais no futuro, por exemplo. A alteração do prazo não exclui a obrigatoriedade de adequação de embarcações pesqueiras aos requisitos higiênico-sanitários estabelecidos na Portaria 310/2020.

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Levando em conta que desde 2014 os armadores não recebem subsídios do governo e vêm sofrendo constantes perdas, a questão financeira é um dos principais entraves. Aliado a isso, temos também a ocupação dos estaleiros. Temos um número alto de embarcações e, levando em conta a sazonalidade da atividade pesqueira, talvez o número de estaleiros não seja suficiente para atender a frota durante este prazo.


Como o Sindipi participa da revisão da portaria 445? A eficácia da Portaria no 445/2014 nunca foi avaliada. A proposta do setor pesqueiro sempre foi no sentido de gerar informações e dados sobre as espécies que estão listadas na Portaria, principalmente desembarcando parte do que é pescado. Uma vez

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O mais próximo que há hoje de uma revisão/avaliação da 445 é o trabalho do Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) para avaliar e recomendar ações de conservação e uso sustentável para espécies pertencentes à lista de peixes e invertebrados aquáticos ameaçados de extinção. O Sindipi não participa desse grupo, que tem como representação da pesca industrial o Conepe e a Abipesca na suplência. Cumpre ressaltar que são poucas reuniões previstas para esse grupo (12 meses para conclusão dos trabalhos) e que não há garantias de que eles consigam se debruçar sobre a elaboração de novos Planos de

Recuperação de espécies de interesse comercial. Como não podemos assistir a este problema à margem do que está acontecendo, o Sindipi tem alinhado parceria com a academia (Univali) para realizar estudos contundentes a respeito das espécies. Teremos novidades em breve. À margem das questões políticonormativas, qual é a sua visão sobre a produção pesqueira dos últimos anos? As capturas de forma geral têm apresentado queda. Contudo, algumas questões devem ser consideradas para esse cenário. O principal deles é a proibição de desembarque das espécies da 445 em 2014 e a proibição da pesca de arrasto a menos de 12 milhas no Rio Grande do Sul. Ainda o Brasil teve nos últimos anos aumento de 16 vezes em áreas protegidas marinhas, o que invariavelmente implica em restrições de pesca.

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Aqui no Sindipi, temos feito a nossa parte. Fomentamos o atendimento à portaria, inclusive com formação semanal de pescadores na área de boas práticas de manipulação de pescado.

que as espécies foram proibidas e há obrigatoriedade de descartá-las ao mar, é como se elas não existissem mais. No entanto, a verdade é que nenhuma informação é gerada porque o que se pesca volta para o mar na mesma hora.

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Segundo a própria SAP, o Brasil tem hoje aproximadamente 26 mil embarcações que precisam ser adequadas. O número é alto e nosso questionamento é também com relação a eficiência e agilidade de fiscalização. Será que há um número suficiente de pessoas para certificar todas essas embarcações em tempo hábil?


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“Sou da pesca. Não existe base para que eu sabote o setor”

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Seif Jr. rechaça críticas e conclama setor privado a assumir papel para aprimorar segmento pesqueiro

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orge Seif Jr., o secretário da Aquicultura e Pesca do Ministério da Agricultura na gestão Bolsonaro, despertou uma grande expectativa entre os armadores e a indústria pesqueira de Santa Catarina pela ligação histórica de sua família com o segmento. No quarto ano de gestão da pasta, porém, ele enfrenta críticas sobre a falta de atendimento de novas e históricas demandas do segmento. Embora admita parte delas na entrevista exclusiva abaixo (editada em temas por questão de espaço), ele compartilha com os críticos a responsabilidade pela resolução.

Críticas sobre trabalhar mais pela aquicultura que pela pesca Sou oriundo da pesca, estou aqui justamente pelo meu histórico na pesca.

Não existe base para que eu sabote [o setor], ou deixe de ver ou faça uma letargia. Hoje, em cada ato normativo, quando se trata de pesca, somos bombardeados por Justiça, MP, órgãos ambientais, Federais e Estaduais. A construção de alterações de normativas para a pesca é muito mais difícil e tem de ser muito mais bem estruturada [em comparação à aquicultura].

à PF de embarcações capturando espécie A, B ou C, e que isso não entra nas estatísticas, é o setor prejudicando o próprio setor. Os Estados Unidos, anualmente, nos perguntam o que capturamos de cada espécie e comparam com os dados de importação e, muitas vezes, o que retorna à secretaria é inferior só ao que foi exportado.

Cobrança por estatística pesqueira e sua evolução nos últimos 3 anos Nos falta tempo e questão orçamentária, após muitos anos de total abandono da pasta. Fui ao IBGE como uma forma de conseguir estatística pesqueira, mas eles disseram que não têm gente para isso tudo. Temos buscado parcerias com institutos de pesca pelo Brasil e universidades para ter os dados e equilibrar essa balança. Em todo o mundo, o setor privado faz pesquisa e doa isso em forma de parceria aos órgãos ambientais de seu governo e aos órgãos que legislam e ordenam a pesca. Não adianta só cobrar: enquanto não houver esforços conjuntos do setor produtivo, governo e academia, continuaremos nesta retórica.

O setor precisa se organizar e entender que mapas de bordo precisam ser preenchidos. A falta de informação, a subnotificação ou a não entrega destas informações, viram munição para os órgãos ambientais no mundo todo.

Você crê que os pescadores, armadores e indústrias têm reportado fidedignamente os dados para que isso reflita uma realidade e nos ajude, com base nos cálculos matemáticos das universidades, para verificarmos se a biomassa de tainha tem crescido e se recuperado? Nós trabalhamos com as melhores informações disponíveis e acreditamos que elas são fidedignas. Se eventualmente recebemos denúncias do Ibama encaminhadas

Sobre o ritmo de adesão das empresas à 310 e retomada das exportações à Comunidade Europeia Hoje, são 61 embarcações certificadas pela 310, 151 por analisar e 297 devolvidas para os técnicos que os armadores contrataram para documentações adicionais. Sabemos que entre 10% e 20% da nossa pesca é industrial, 80% é de pesca artesanal. Apesar de existirem 30 mil embarcações, só 20% tem a necessidade de fazer este comércio totalmente formalizado e rastreado. A 310 foi uma continuação simplificada do Embarque Nessa, que exigia uma série de mudanças desde 2014. Com a 310, pegamos este documento, tiramos os excessos e mostramos e orientamos nossos pescadores que com condições básicas de higiene, já podemos certificar o pescado para a indústria e exportação. Melhoramos alguns ritos


Trabalhos do Grupo de Trabalho Interministerial e a perspectiva sobre uma revisão da portaria Este GTI foi capitaneado pessoalmente por mim no meu primeiro mês de governo federal com o ministro Ricardo Salles e a ministra Tereza Cristina. Quem define as espécies é o Conselho Nacional de Biodiversidade (Conabio). Quando eles propõem novas espécies para a 445, é baseado nas melhores informações disponíveis. Enquanto o setor não reportar dados, teremos problemas para defendê-lo.

Sobre as antenas do Preps, as empresas [fornecedoras] já tinham enviado vários comunicados aos usuários sobre esta necessidade. O pessoal acabou deixando para a última hora, com pandemia, alta demanda, alta do dólar e poucos técnicos para fazer as mudanças. Se todos pedem ao mesmo tempo, o fornecedor não tem capacidade de atendimento operacional.

Balanço sobre a privatização dos TPPs e o recadastramento de pescadores Sobre os terminais, concedemos o de Cabedelo, fizemos acordo com a Companhia de Docas do Ceará para o terminal de Fortaleza, agora virá

Santos, Cananeia, Sergipe, Manaus, Belém, Natal etc. O Estado brasileiro não tem condições de administrar terminal pesqueiro, isso tem que ficar para a iniciativa privada. Já o recadastro nacional dos pescadores é a maior ação social dentro da pesca deste governo. A CGU diz que 67% dos recebedores do benefício são alheios à atividade de pesca. Isso vai até outubro e acreditamos que dará tempo para concluir a atividade. O pescador não trabalha só. Como enquadramos as mulheres? Existe uma discussão dentro do Ministério da Cidadania, mas precisamos mudar a lei. Sabemos que há a necessidade de enquadramento da pessoa que vive com o pescador e temos de ter cuidado para não punir este trabalho e abrir o cofre do governo para que seja um seguro-defeso 2.0 que gaste dinheiro público. Também temos previsto um recadastramento de embarcações, em parceria com a CNA e o Sebrae, além da Marinha. Estamos conversando sobre o Fundo da Marinha Mercante para que possa ser mais uma fonte de financiamento para a renovação da frota, além da Caixa Econômica.

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Criação do “Rede Pesca Brasil”, a extinção dos CPGs e o debate sobre o ordenamento de recursos pesqueiros Quando era o CPG funcionava bem. O presidente, devido aos exageros dos GTs em gestões anteriores, que era farra com dinheiro público, decidiu extinguir todos os comitês. Realmente demorou para ser recriado porque existiam diversas questões na fila - o texto que enviamos tinha ponderações e voltava da AGU. Creio que a Rede Pesca é a solução pois é a retomada dos CPGs.

A atuação do SAP na proibição do arrasto no Rio Grande do Sul e trocas de antenas do Preps Estamos em tratativas sobre este assunto, para cumprir o que o Supremo Tribunal Federal (STF), baseado no Rebyc, determinou e estamos caminhando para concluir esta etapa. É um tema extremamente politizado sobre uma espécie de camarão que compartilhamos com outros países. Não tem sentido nenhum o Brasil tomar medidas extremas contra o pescador e deixar o Uruguai e a Argentina fazerem supersafras de camarão para depois, o comprarmos de outros países. Isso é inconcebível.

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de processamento, mas o setor também não acreditou que implementaríamos esta norma. Sobre a UE, a parte brasileira foi feita. Enviamos o plano de ação e aguardamos sinalização da Europa para visitarem embarcações, empresas e aquicultura para reabrir.


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Vocação para pescado Brusinox chega aos 26 anos com metade dos negócios voltados à indústria de pescado, segmento que mais impulsionou crescimento da empresa

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uando a Irmãos Fischer, tradicional empresa de Brusque (SC), decidiu descontinuar a sua linha de fabricação de aço inoxidável na virada do milênio, os funcionários Ambrózio Leonel Bacca e Celso Fernandes fizeram uma proposta aos sócios: assumir a operação, os funcionários e a carteira de clientes. O acordo foi fechado e deu origem à Brusinox, que já surgiu como a única fabricante nacional de máquinas, acessórios e equipamentos para a indústria de alimentos especializada em inox.

de estruturas arcaicas nos frigoríficos brasileiros, como plataformas de madeira, por estruturas de aço inox. A demanda acelerou o volume de encomendas da Brusinox, que passou a suportar tecnologicamente o desenvolvimento das indústrias de pescado do pólo de Itajaí e Navegantes (SC). “Fomos evoluindo de uma forma que hoje não tem nenhuma indústria daqui que não seja nossa cliente”, aponta Bacca. Aos poucos, as mesas de manipulação e evisceração todas passaram a ter o padrão desenvolvido pela Brusinox.

No mesmo período, o Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal do Ministério da Agricultura reforçou a demanda por substituição

A experiência adquirida pelos fundadores desde a década de 70 nos frigoríficos da região os credenciou a dar novos saltos tecnológicos para automatizar processos, como a alimentação, evisceração e classificação, com vistas à redução de perdas. “A indústria da pesca era a indústria do desperdício. Hoje não. Um cliente nosso quer máquinas para CMS para fazer outros produtos”, exemplifica Bacca. O filho dele, Ambrózio Bacca Filho, é o gerente de vendas da empresa e ilustra o raciocínio especificamente com o desenvolvimento de uma máquina para fazer postas. “Normalmente se congela várias espécies e

Família Bacca no comando da Brusinox: da esq. para a dir., Ambrózio, Daniel e Ambrózio Filho

tamanhos, depois se usa uma serra fita manualmente para cada peixe. Se a posta é de 20 mm e temos uma máquina que não gera perda, ele economiza uma posta a cada grupo de peixes. Em uma safra, por exemplo, essa máquina se paga em menos de um mês.” A falta de padronização entre as muitas espécies de pescado utilizadas pela indústria logo representou um desafio, que até hoje a empresa procura transpor com apoio de muito investimento próprio em Pesquisa & Desenvolvimento (P&D). Atualmente, são oito projetos em desenvolvimento pela empresa, mas não é raro um desenvolvimento não se provar viável. “Uma vez, há muitos anos, nós começamos a projetar um descascador de camarão com o qual gastamos R$ 1,5 milhão. No final, não deu certo e ele não atingiu o resultado esperado.” Nenhum desenvolvimento é desperdiçado, no entanto. De duas máquinas de evisceração e descabeçamento originalmente desenvolvidas para tilápia, a empresa construiu um equipamento único para fazer o mesmo com a sardinha lage. A espécie, que possui uma barriga mais pronunciada, não apresentava o mesmo desempenho na mecanização dos processos. “Fizemos um ajuste de lâminas e ficou um espetáculo. Faz 15 mil sardinhas por hora”, gaba-se Bacca, indicando que o desenvolvimento atende às necessidades das conserveiras. Diante da diminuição de matériaprima disponível no pólo de Itajaí e Navegantes, a família Bacca afirma ter testemunhado a busca dos frigoríficos


Hoje, o negócio do pescado em todas as vertentes rende 50% do faturamento anual da empresa e só cresce, inclusive no exterior. Há 15 anos, clientes estrangeiros vinham à Brusinox para encontrar soluções de processamento no segmento. Hoje, a própria companhia faz uma prospecção ativa e os resultados se multiplicam. “Já vendemos muitas máquinas para a Venezuela, Índia, Moçambique, Madagascar, especificamente

para camarão de cativeiro. Para Honduras, vendemos o separador de gelo, um tombador, o separador e o classificador”, contabiliza Bacca Filho. Em grande medida é por conta dos novos desenvolvimentos ao segmento que a Brusinox precisa de cada vez mais espaço. O novo galpão de 2.800 m²²onde a empresa se instalou recentemente já não é suficiente para acomodar o departamento de P&D, como conta Bacca. “Só para o desenvolvimento de máquinas, a gente precisaria de metade desse galpão.” Os planos incluem a construção de uma sede própria no futuro, projetada desde o início para abrigar todos os sonhos fabris da empresa.

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A Brusinox acompanha ativamente a evolução do setor aquícola, em especial da tilapicultura. “Nós estamos na tilápia desde que saiu o primeiro abatedouro no Brasil. Fomos nós que o montamos. Também fomos os primeiros a desenvolver uma evisceradora e uma filetadora automática”, diz Bacca, que vê na tilápia uma grande possibilidade

de inovações. A empresa elaborou uma linha específica para o peixe, que inclui sangrador, tanque para sangria, classificador, descamador, sistema de vácuo para linha de abate, resfriador de filés, entre outros.

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por outras origens. “As indústrias daqui precisam justificar a estrutura e estão trazendo tilápia e camarão de cultivo do Nordeste para o processamento”, diz Bacca Filho. A derrocada de outros pólos pesqueiros, como Santos (SP) e Rio Grande (RS), gerou apreensão inicial, mas a movimentação do próprio segmento arrefeceu o impacto.


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Resultados 4.0 Prestes a celebrar 33 anos, Costa Sul se moderniza e deve completar ciclo de 3 anos com 77% de crescimento nas vendas

“A

pandemia foi uma surpresa total”, admite o diretor da Costa Sul, Luzaldo Pscheidt. Nem ele e nem ninguém imaginava como se daria o avanço no consumo da proteína aquática no primeiro ano pandêmico. “Até 2019, estávamos crescendo em torno de 10% ao ano e, em 2020, crescemos 27% por conta de tudo o que aconteceu na pandemia”. Se investigarmos mais a fundo os resultados da empresa, notamos um indicativo claro de que o consumidor procurou se alimentar melhor a custos mais baixos - o que empresas como a Costa Sul conseguiram entregar.

O investimento também se deu na consolidação e abertura de novos canais de vendas, a partir de uma postura comercial mais agressiva e uma reestruturação no departamento. “Criamos um setor destinado exclusivamente a varejo. Antes não tínhamos esta separação interna na nossa gerência comercial, que atendia grandes redes de atacados e também o varejo.” Como consequência, a

empresa espera crescer 30% em 2022 - em cima do crescimento de 20% registrado em 2021. O olhar para a reorganização interna também rendeu a adequação da indústria à quarta revolução industrial. A empresa investiu em um novo sistema integrado de gestão empresarial (ERP) e em novos processos de aferição e controle de parâmetros produtivos. A novidade permitirá o monitoramento da performance produtiva e comercial em tempo real, com total rastreabilidade. “A partir de abril, faremos a virada do sistema e estaremos acompanhando a indústria online, da descarga do barco ao produto no caminhão. Isso vai otimizar bastante os custos e teremos uma produção bem mais ágil. Assim, chegaremos ao nível de empresas mundiais do setor”, projeta.

Comitiva do Sindipi, Seafood Brasil e Seafood Show na Costa Sul: testemunhas da conversão à quarta revolução industrial

Dominar o acesso à matéria-prima nacional foi um dos maiores trunfos do período, em um cenário dominado por empresas concentradas na importação de matéria-prima. Outro foi olhar para a demanda externa. Dois anos atrás, a Costa Sul também se tornou uma empresa com forte viés exportador. “Começamos a buscar o mercado externo e hoje, já estamos com 25% a 30% do nosso faturamento exportado aos mercados africano, americano e canadense”, diz Pscheidt. Essa versatilidade se expressa no portfólio. Hoje, a Costa Sul trabalha com mais de 100 SKUs (um código único de identificação de produtos) e quer chegar a 120. Segundo Pscheidt, os produtos cujas vendas

Acervo/Sindipi

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Tudo graças a um processo de reorganização das compras de matéria-prima, muito em função da desvalorização do real. “Nós chegamos a trabalhar com 50% de produtos nacionais em 2019. Quando o dólar subiu a patamares de 5, nós tivemos de mudar. Como a nossa empresa tem barcos próprios, voltamos a trabalhar com mais produtos nacionais e 30% de produto importado”.

mais cresceram no período foram os empanados, em razão do baixo custo e do fato de ser uma proteína de melhor nível nutricional. O sucesso da categoria motivou o investimento de aproximadamente R$ 5 milhões da Costa Sul na implantação de equipamentos para uma linha específica de empanados que hoje, inclui quadritos e steaks de CMS, além dos filés naturais empanados.


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Planta da Camil em Navegantes (SC): com dificuldades nas originação de sardinha, empresa vê como promissora a expansão do atum

Pescado “vale a pena” Camil Alimentos reduz volumes nos últimos dois anos com falta de matériaprima, mas segue enxergando a categoria como estratégica

E

m evento da Genial Investimentos em 19 de janeiro deste ano, o diretor financeiro e de relações com investidores da Camil Alimentos, Flavio Vargas, disse que o negócio de pescado “vale a pena” para o grupo. O comentário ganha ainda mais relevância se analisarmos os resultados divulgados publicamente pela empresa para o ano de 2020 e até o terceiro trimestre de 2021 - o ano fiscal da Camil se encerra em março. O anúncio de resultados de 2020 revelou preços maiores, apesar da queda de volumes. As 36,6 mil toneladas de itens de pescado comercializados naquele ano representaram 2% do volume total comercializado pela empresa, queda de 5,4% sobre o ano de 2019. Em

contrapartida, o preço líquido de venda foi de R$ 18,33/kg, alta de 17,5% sobre o ano anterior. Os resultados do período mais recente disponível - 3º trimestre de 2021 - revelam uma diminuição de 14,1% sobre o mesmo período de 2020 no volume da categoria, para 7,2 mil toneladas, com preço líquido 9,8% maior, de R$ 21,35/kg na média. O contraste entre preços e volumes se deu pela junção dos efeitos da pandemia com um velho problema que afeta as indústrias conserveiras: as intermitentes safras de sardinha na costa brasileira. André Ziglia, diretor de suprimentos e comex da Camil Alimentos, explica que a busca da matéria-prima importada continua a ser um paliativo. “Quanto maior a captura no mercado nacional, menor

PESCADOS NA CAMIL - EVOLUÇÃO VOLUME E PREÇOS (TRI/TRI E ANO/ANO) Pescados 18.000

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14.000

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16.000

12.000

20,09

20,40

21,43

Preço líquido (R$/KG)

19,45

11.166

2.000

9.242 7.966

8.000

21,35

21,35

15,36

15,95

10.130

9.976

22,0 20,0 18,0 16,0 14,0

8.335 7.157

7.157

12,0

6.000

10,0

4.000

8,0

2.000

6,0

0

4T20

Fonte: Camil

1T21

2T21

3T21

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3T20

3T21

4,0

será a necessidade de importação, já que importamos somente o necessário para a atender à demanda.” A empresa não revela números, mas os dados do ComexStat revelam que apenas Itajaí (SC) nacionalizou em todo o ano de 2021, 57 mil toneladas de sardinhas de Omã e Marrocos para reprocessamento, quase 10 mil toneladas a mais que no ano anterior. O volume é nacionalizado principalmente pela Camil, sediada em Navegantes (SC), e pela Gomes da Costa. “A originação de sardinha tem sido desafiadora mesmo antes da pandemia. No entanto, em 2020, a dificuldade de importação da matériaprima com custo impactado pela desvalorização cambial nos mercados exportadores, somada à menor pesca local, foram alguns dos efeitos da pandemia que impactaram toda a cadeia da categoria”, diz Ziglia. Outro impacto foi o fechamento das fronteiras entre países com a pandemia, o que comprometeu a importação da matéria-prima nos mercados exportadores. “O fornecimento de embalagens também foi comprometido, mas o risco de desabastecimento foi mitigado com estocagem estratégica dos principais produtos”, pontua Ziglia. Como alternativa, a Camil afirma ter investido energia no negócio de atum, “que tem apresentado boa pesca local”. O consultor Wilson Santos,


GDC: 2 milhões de latas

Há anos consolidando empresas de diversos segmentos alimentícios - o mais recente deles foi café - a empresa reconhece monitorar oportunidades no pescado. “A Camil permanece atenta ao mercado para identificar as oportunidades de aquisições estratégicas para a companhia. Expandir as categorias em que já atuamos é uma das nossas frentes de atuação”, sublinha Ziglia.

A Gomes da Costa, maior indústria conserveira nacional, tem sua planta fabril do outro lado do rio Itajaí-Açu, de onde saem 2 milhões de latas de atum, sardinha e outros produtos por dia. Este é um dos poucos números que a empresa revela oficialmente. Para esta reportagem da Seafood Brasil, foi possível apurar que o impacto da pandemia, aparentemente, foi positivo nas vendas da empresa. “Os brasileiros desenvolveram novos hábitos durante a pandemia, quando houve a necessidade de ficar dentro de casa e, um deles, foi cozinhar. Mesmo com as dificuldades do período, nossa marca continuou presente nos lares brasileiros, sendo uma aliada na hora do preparo das refeições”, disse Andrea Napolitano, CEO da GDC, via assessoria de imprensa. O atum, assim como no caso da Camil, também ganhou espaço: “Também vemos uma tendência de crescimento no consumo de atum. Mais pessoas estão conhecendo os benefícios nutricionais deste peixe e optando por incluí-lo em suas refeições, garantindo praticidade, saudabilidade e variadas opções de receitas para todos os momentos do dia.”

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Inspirada por esta oferta e demanda crescentes, a Camil espera bons resultados em 2022 para suas marcas Coqueiro e Pescador, além de uma safra mais generosa. “No setor de peixes, especificamente, acreditamos na captura

mais forte em nosso mercado interno, principalmente em sardinha”, diz Ziglia. Outra oportunidade mapeada há anos é a diversificação de matériaprima, o que se torna ainda muito complexo pelos volumes exigidos pela indústria conserveira. “Estamos sempre avaliando alternativas para inovações e tendência do mercado de pescados para termos no nosso portfólio. Mas, por enquanto, não há a confirmação de nenhum novo tipo de pescado em nossos produtos.”

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especialista na indústria conserveira, faz coro. “Entre todos os recursos capturados pela pesca marítima extrativista na costa brasileira, o atum é aquele que poderá entregar a melhor resposta positiva a curto prazo, tanto em termos econômicos como social e ambiental.” E ele vai além. “Fica claro que estamos passando de exportador de matéria-prima para indústria conserveira externa para exportador de produto acabado, com forte agregação de mão de obra.” Santos calcula que as exportações de conservas acabadas em 2021 aumentaram 55%, atingindo mais de 24 milhões de latas. “Este volume absorve cerca de 5.100 toneladas de matéria-prima e representa aproximadamente 13% do mercado total brasileiro”, completa.


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Gestão de canais Cais do Atlântico aposta na exportação para contornar altos e baixos no mercado interno para o peixe fresco

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A dinâmica acima se repete quase diariamente na operação da empresa, uma das maiores fornecedoras de peixe fresco para mercados do Sul e Sudeste do Brasil, com giro de aproximadamente 2.000 toneladas mensais. Castoldi entende que a pandemia trouxe aumento de consumo, mas houve muita quebra nas lojas - o que achata os volumes. “Do lado da indústria, porém, a saída foi diminuir a dependência destes canais. Com peixe fresco, a venda ocorre até às 11 horas da manhã, não posso ficar esperando o pedido chegar às 3 horas da tarde”, confessa. “Então eu vou te vender na hora que der certo o negócio, se eu tiver o peixe aqui e te servir eu vou te atender, senão eu passo para frente”, completa. Ao longo dos últimos anos, a Cais do Atlântico tem construído cada vez mais formas de “passar para frente” o produto. A maior parte do pescado segue para distribuidores do food service de todo o Brasil, além de outras indústrias que irão reprocessá-lo, centrais de abastecimento e as próprias redes supermercadistas para os itens frescos. A pandemia representou uma montanha-russa nestes canais. “Na

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ressionado por metas agressivas, o comprador de peixe fresco de um grande varejo nacional pede preço, mas diminui o volume. Para atender ao parceiro de longa data, Dagoberto Castoldi, gerente comercial da Cais do Atlântico, decide fechar a carreta com carga compartilhada entre o Ceasa e a rede varejista. Quando chega ao destino, porém, o preço não bate, o varejista reclama e Castoldi lamenta, mas não consegue ajustar.

Dagoberto Castoldi, gerente comercial: “Peixe fresco não pode esperar”

venda do período da Quaresma em 2020, tivemos aumento de 56%, mas em contrapartida, logo na sequência, foi 70% de queda de venda no mercado interno”, aponta Castoldi. A direção se assustou com a reação dos clientes de devolução ou cancelamentos, mas reagiu procurando canais externos.

14.000”, calcula Castoldi. Ele diz que mercados como o norte-americano absorvem este aumento em produtos de ticket médio mais alto, mas outros mercados, como de alguns países africanos, já rejeitam itens mais baratos quando o produto dobra ou até triplica de preço.

As exportações estão em franca ascensão e já respondem por 40% do faturamento da empresa, mesmo com o aumento dos custos das operações. “Nos três primeiros meses da pandemia, nós tivemos que fazer um turno noturno para atender a demanda da exportação, que aumentou 100%.” O maior problema com os embarques foi e continua sendo a falta de contêineres. “Se antes o custo por contêiner era de US$ 2.000, hoje é US$ 6.000 com um negociador intermediário. Se você for negociar para a mesma rota via particular, o valor chega a US$

Diversificar os canais ajuda a driblar o impacto dos custos. A empresa desenvolveu uma grande rede de parceiros, desde armadores e outras indústrias, que aciona para garantir ou escoar estoques. O posicionamento estratégico da matriz, em Laguna (SC), e das filiais em Itajaí (SC) e em Rio Grande (RS), também colabora com a eficiência logística, mas a chave do negócio está na gestão da imprevisível matéria-prima oriunda da pesca extrativa. Nisso, colaboram muito os mais de 50 anos de experiência dos fundadores.


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Salmão nos quatro cantos O esforço da Komdelli para evitar efeito rebote da expansão em 2020, manter fatia no autosserviço e abastecer distribuidores de todo o Brasil

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uando o plano estratégico para 2020 estava começando a entrar em vigor, as notícias pandêmicas forçaram a Komdelli a adotar uma postura cautelosa. O plano foi engavetado, parte da equipe dispensada e todos ali adotaram uma expectativa de poucas vendas. O contrário aconteceu e um terceiro plano teve de ser colocado em prática. “Deu um boom: invertemos o plano, corremos para comprar embalagem, matéria-prima e recontratamos pessoas”, conta Vitor Pierri, gerente de grandes contas (key account) da empresa. A empresa não revela números, mas admite ter obtido uma “expressiva”

expansão nos resultados em 2020. “A pandemia, de modo geral, foi muito positiva para a empresa em termos de rentabilidade, de crescimento e de volume”, comemora Tiago Dreher, head comercial. A corrida ao autosserviço para as compras de abastecimento só não pegou a empresa mais desprevenida porque a presença no canal já estava estabelecida. “O consumo despontou no autosserviço e a Komdelli, por estar preparada e sempre ter atuado neste canal, se deu bem.” Ainda assim, havia ajustes a fazer. A Komdelli sempre atendeu grandes contas das maiores redes do País, mas ainda não havia encontrado uma fórmula para chegar a todas

Da esq. à dir., Tiago Dreher, head comercial, e Vitor Pierri, key account: pandemia forçou Komdelli a duplicar equipe comercial e criar sistema de pulverização de entregas

as Regiões. Isso também mudou recentemente. “Temos feito um trabalho de pulverização de distribuição muito forte com parceiros logísticos locais, com os quais fazemos entregas de 100 kg, o que antes era impensável aqui”, ressalta Pierri. A mudança ajudou a diversificar o perfil de clientes e a não perder vendas. O desafio agora é sustentar o crescimento nos novos tempos. As vendas do autosserviço seguem em bom ritmo, mas arrefeceram em 2021. Ao mesmo tempo, os distribuidores retomaram os negócios em função da recuperação do food service. “O distribuidor voltou a ocupar um espaço que havia deixado em 2020”, frisa Pierri. Para dar conta de todos os perfis e evitar um efeito rebote, a empresa reestruturou o departamento comercial em agosto passado.

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Dreher passou de gerente de suprimentos a head comercial e Pierri de gerente comercial para key account. Sob a orientação deles, a equipe comercial dobrou para 50 representantes comerciais. “Mas vamos aumentar esse número com gestores regionais em São Paulo, no Sudeste, Centro-Oeste, Norte e Nordeste.” A Região Sul continua a ser o “quintal”, mas não há limites para esta expansão. Matéria-prima não vai faltar, garante Pierri. “Temos mais de duas dezenas de fornecedores no Chile, então dificilmente ficaremos sem salmão, até porque não podemos nos dar este luxo. Afinal, 95% do nosso faturamento é salmão chileno”, aponta. “Somos a maior indústria de processamento de salmão no Brasil e estamos crentes que o nosso volume tende a crescer para que tenhamos hegemonia nesses números.”, finaliza.


Reinvenção dos distribuidores Natubras assiste ao impacto da pandemia na modificação de canais atendidos pelos distribuidores, seu principal grupo de clientes A Natubras não mudou o perfil de atuação no mercado. A empresa tem grande foco nos camarões selvagens, mas também fornece filés de pescada, de linguado, tentáculos de polvo, sardinha espalmada, entre outros. Tudo com ultracongelamento por nitrogênio, o que estende o tempo de prateleira para até dois anos, mas a empresa opta por operar com 18 meses de validade. A Natubras é uma das poucas no Brasil a adotar o sistema, que também dá mais margem na formação e escoamento de estoques.

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Já os clientes, majoritariamente distribuidores do food service, sofreram de forma mais profunda. “Muitos realmente fecharam e saíram do negócio”, conta o responsável pelo departamento comercial, Juliano Tulio. “O cliente do distribuidor se reinventou, então os distribuidores também foram se reinventando. Se os restaurantes estavam fechados, eles procuraram varejos, canais online e outros recursos. E aqui na indústria, procuramos nos ajustar para melhor atender ao cliente.”

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B

alneário Piçarras (SC) é uma terra de pessoas resilientes. Quando a pandemia trouxe consigo a insegurança das vendas, os cerca de 150 funcionários da principal empresa pesqueira da região, a Natubras, talvez esperassem pelo pior. A realidade foi outra: a empresa nunca parou, contratou mais 15 pessoas no período e, em qualquer chance eventual de ociosidade, alguns funcionários costuravam máscaras para escolas, creches e pescadores locais.


Na

Gôndola A oferta de peixes, crustáceos e moluscos Crédito das fotos: Divulgação/Empresas

Salmão defumado A Opergel traz para o mercado um salmão de origem chilena ideal para o preparo de defumados. A gordura ajuda a fixar as características da fumaça, segundo a empresa, o que torna o salmão ideal para a defumação, justamente por incorporar mais sabores e aromas. O produto é apresentado em caixas com 10 kg, cada uma com 10 salmões.

anéis, mariscos e tentáculos de polvo, além de vir com um sachê de tempero de 12 g. O produto segue ao varejo e distribuidores em caixas com 14 unidades cada, com bandejas pesando 500 g.

Camanor no varejo O camarão sem cabeça é a opção que a Camanor selecionou para fortalecer a presença no varejo e trazer mais praticidade aos consumidores. Segundo a empresa, após o descabeçamento, os camarões passam por um processo rigoroso de seleção e reclassificação para uniformizar o produto. Embalado em sacos de 1 kg e masterizados em caixas de 10 kg, não utiliza nenhum tipo de conservante artificial e tem validade de 18 meses.

no verso de cada produto, a empresa ainda traz receitas para que as costelinhas possam ser saboreadas de uma forma mais criativa. A Copacol ainda disponibiliza o produto em caixas fechadas com 24 unidades cada.

Camarão em 1 kg A Bomar Pescados traz ao mercado o camarão cinza (Litopenaeus vannamei) inteiro congelado. Com esse produto, a empresa espera oferecer uma opção para ser degustada em forma de petiscos ou em uma receita. Pensado ainda para que o consumidor possa servir o camarão cinza em grandes quantidades a parentes e amigos, o produto vem em embalagens de 1 kg.

O soufflé do Popeye

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De bandeja

O famoso kit paella agora vem em bandejas. A Bom Peixe traz o grupo de frutos do mar congelados com todos os ingredientes necessários para a preparação da iguaria de origem espanhola. A bandeja conta com camarão, lula em

Dois (ou mais) palitos Pensada para ser servida em petiscos ou em pratos completos, as costelinhas de tambaqui palito da Copacol são congeladas uma a uma e disponibilizadas no mercado em embalagens de 400 g. Com a ideia de proporcionar uma experiência maior ao consumidor,

Praticidade sem perder o sabor. Esse é o principal objetivo do soufflé de merluza com espinafre e queijo da Congelados Artico. Disponibilizado em embalagens de 500 g, o produto possui ingredientes selecionados para garantir o seu sabor. Após 15 min em micro-ondas ou 30 min em


A Gomes da Costa traz o atum em pedaços com óleo comestível e caldo vegetal. O produto, que faz parte da linha Food Service da empresa, foi pensado para ser utilizado especificamente em restaurantes, catering, hospitais,

acordo com a empresa, o kani kama tem sabor de caranguejo e contém peixe e derivados de trigo, ovos, soja, leite de vaca e crustáceos. Disponibilizado a vácuo em embalagens de 200 g com 14 unidades cada, o produto é indicado como aperitivo ou acompanhamento.

Vai de aperitivo ou petisco? A DellMare promete agradar os consumidores com o seu kani kama. Por já vir cozido, o produto é prático para o dia a dia e pode ser consumido normalmente depois de descongelado. Ainda de

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Um atum no pedaço

hotéis, cozinhas industriais ou outros estabelecimentos que elaboram grandes números de refeições e exigem maiores quantidades de produto. Sem glúten ou conservantes, o produto é oferecido pela empresa em embalagens de 1 kg.

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fornos normais, o soufflé de merluza com espinafre e queijo estará pronto para ser consumido.


A era da Aquicultura 4.0

O

toda a produção, o que termina por profissionalizar ainda mais a atividade. Como alerta o professor Valenti, esse já é um sintoma de que a atividade aos poucos se conecta com a Quarta Revolução Industrial iniciada no século XXI. “Esta nova era é caracterizada por um sistema de controle industrial rígido e centralizado e pelo uso de tecnologias modernas, como a Internet das Coisas (IoT), Inteligência Artificial (IA), nanotecnologia, blockchain, aprendizado de máquina e sensores otimizados. Os conhecimentos físicos, biológicos e digitais são usados em conjunto para gerar produtos, processos e serviços inovadores”.

Aos poucos, a busca pela eficiência e a pressão pela diminuição do impacto ambiental provocam uma corrida pela parametrização de

Dessa forma, diz o professor, a aquicultura 4.0 significa o uso de tecnologias atualizadas e inovações para melhorar a eficiência dos

processos, a qualidade do produto e a eficiência e competitividade do mercado. “O movimento pela aquicultura 4.0, geralmente, inclui o uso de soluções de tecnologia de informação. No entanto, não é obrigatório”, reforça Valenti. Veja neste caderno especial como as empresas e os pesquisadores se esforçam para materializar estes conceitos no setor.

A 6ª edição deste suplemento é patrocinada pelas seguintes empresas: Alliplus, Altamar, Anci Global/Panaferd, Andritz, Hipra, Indukern, Pathovet, Potiporã, Samaria Rações e Raguife, que investiram em anúncios e forneceram material para esta participação editorial.

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Suplemento de Tecnologia Aquícola da Seafood Brasil vai para a sua sexta edição com um foco especial nos conceitos da Aquicultura 4.0. Para nos ajudar nesta tarefa, convocamos alguns dos maiores especialistas do País, como o professor Wagner Valenti, professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e diretor da Agência Unesp de Inovação, além dos pesquisadores da Embrapa Pesca e Aquicultura e do Instituto de Pesca (IP) da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo.

Aditivos

Nutrição

Sanidade

Equipamentos

Formas jovens


Inspirado pelas estruturas de tratamento de efluentes que fazem a filtragem mecânica de sólidos, Shei e sua equipe desenvolveram um tambor rotativo específico para aquicultura. “Notamos que essa filtragem não era muito usada no Brasil na aquicultura. Conhecemos estruturas com fluxo de tratamento de água para 800 m³/ hora que tinha uma estrutura capaz

de tratar 80 m³/hora.” O equipamento se popularizou fortemente em 2021. “Fomos de 2 tambores em 2020 para 12 no último semestre, um salto muito grande”, aponta Shei. Em paralelo, a Altamar estruturou uma equipe de projeto para facilitar a instalação dos equipamentos. “Como os clientes são muito distantes e muitas vezes necessitam de adaptações à estrutura da propriedade, começamos a fazer projetos internos de montagem”, conta. Segundo Shei, ambas as novidades colocam a Altamar no mesmo patamar das empresas da Europa e América do Norte. Tudo isso exigiu investimento, não só em recursos humanos, mas em marcas de corte computadorizado e software de desenho técnico.

Alimentadores automáticos

A utilização de alimentadores automatizados pode reduzir despesas com mão de obra e aumentar a frequência de arraçoamento, como lembra o pesquisador Fabrício Pereira Rezende, da Embrapa Pesca

Um modelo possível de alimentador alinhado à Quarta Revolução Industrial, na visão de Rezende, seria composto por um reservatório de ração e um dosador, que por sua vez, seria acionado a partir de uma central de processamento ligada a um sensor de temperatura para fazer a correção do volume de ração em função da temperatura da água. Outro exemplo citado por ele seria o uso de equipamentos de monitoramento automático da qualidade de água com registro em banco de dados. O elemento humano, no entanto, continua imprescindível. “A tomada de decisão estaria condicionada ao olhar experiente do técnico responsável para ajustes de intercorrências.”

EMPRESA CITADA

Marcelo Shei (12) 3957-3154 shei@altamar.com.br

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A

utilização de processos e equipamentos inovadores para promover a circularidade nas propriedades, por meio da reciclagem e reaproveitamento de resíduos, pode reduzir custos, aumentar a lucratividade e ampliar as oportunidades de mercado, sugere o professor Wagner Valenti. Há empresas que apostam também em soluções mecânicas para uma gestão aprimorada de resíduos, como é o caso da Altamar. “A aquicultura está começando a planejar melhor as estruturas de qualidade de água”, avalia o diretor fundador, Marcelo Shei. “No nosso caso, estamos pensando em fornecer as melhores estruturas para o gerenciamento adequado da água.”

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Equipamentos: gestão de resíduos

e Aquicultura. Apesar de existir uma diversidade de alimentadores automáticos que cumprem tal função, poucos modelos atuais realmente trazem tecnologias embarcadas que podem ser consideradas de aquicultura 4.0.


Divulgação/Indukern

Matriz da Indukern em Jundiaí (SP) e Daniela Nomura Varandas, nova coordenadora comercial para a aquicultura

Aditivos: a serviço da rentabilidade

A

rápida expansão da aquicultura mundial estimulou um forte ritmo de inovações em todos os âmbitos da atividade nos últimos anos. O reflexo no Brasil também foi claro, como ilustra o professor Wagner Valenti. “A aquicultura brasileira passou por diversas mudanças tecnológicas em diferentes elementos da cadeia produtiva, aprimorando as estratégias de genética, nutrição, biossegurança, gestão financeira e produtiva, e de marketing.” Segundo ele, algumas dessas melhorias vieram da integração e colaboração de empresas brasileiras com estrangeiras. “Essa troca e atualização tecnológica depende de uma tecnologia incremental que certamente é importante para conduzir à aquicultura 4.0. Porém, precisamos de 46

tecnologias disruptivas para aproveitar o nosso potencial de produção de organismos aquáticos e gerar uma verdadeira revolução azul”, acrescenta. Na esteira de outras multinacionais que pareciam apenas esperar o despertar deste gigante aquícola que aos poucos o Brasil se torna, a Indukern também desembarcou no setor. De origem espanhola, a empresa integra um dos maiores grupos distribuidores de especialidades químicas do mundo. No Brasil, a empresa iniciou sua operação em 1996 e hoje foca em nutrição e saúde animal, além dos ramos alimentício, matérias-primas farmacêuticas, químicos, aromas e fragrâncias, petfood e premix. É da sede em Jundiaí (SP) e de outros seis centros de distribuição no Brasil

(RS, SC, PR, SP, PE e CE) que a empresa distribui aminoácidos industriais como lisina, metionina, treonina, triptofano e valina. A linha inclui ainda produtos voltados para maximizar a produtividade, como: complexos enzimáticos, aditivos fitogênicos, óleos funcionais, ingredientes proteicos, nutrientes funcionais, pigmentantes, além de uma ampla gama de vitaminas e minerais. A nova divisão Aqua, lançada oficialmente em 2022, tem o objetivo de consolidar a empresa como fonte de soluções para desafios sanitários, maior sobrevivência e melhores resultados zootécnicos. Para tanto, contratou a executiva Daniela Nomura Varandas como coordenadora comercial para a área. Mestre em patologia de organismos aquáticos,


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Desempenho aprimorado Os aditivos são uma ferramenta tão ampla quanto complexa para melhorar o desempenho dos animais durante as diferentes fases da criação. Veja a seguir uma síntese das principais possibilidades e suas funções: Maximizar o aproveitamento de nutrientes: prebióticos, enzimas digestíveis, minerais orgânicos; Aditivos nutracêuticos: fitobióticos, óleos essenciais, extratos de leveduras, e ácidos orgânicos; Aditivos microbiológicos: bactérias probióticas e leveduras; Aditivos tecnológicos: sílicas, emulsificantes, aglutinantes etc.; Aditivos conservantes: para a indústria de rações. Fonte: assessoria técnica da diretoria de departamento do Instituto de Pesca (IP-APTA-SAA)

ela acompanha há anos os desafios sanitários do segmento. “Talvez a aquicultura brasileira, por ter sofrido com o surgimento de doenças muito impactantes que causaram muitos prejuízos econômicos, como foi a Francisella, Streptococcus, mancha branca, entre outras é que atualmente, o uso de aditivos imunoestimulantes, antioxidantes e vacinas que previnem as diversas enfermidades são amplamente utilizados.” Na visão dela, os itens que deverão ter a maior penetração no segmento são produtos tecnológicos como o Butirex (ácido butírico) e o AquaPeper (um blend de óleos funcionais), com funções associadas à saúde intestinal e ganhos zootécnicos. “Já amplamente utilizados para aves e suínos, trazemos esses aditivos especiais para a aquicultura”, diz. Na linha de premix, ela destaca o Premix Aqua, com formulações personalizadas para cada cliente e fabricação na unidade de Jundiaí. “Possuímos 4 linhas de misturadores 48

modernos e automatizados, que conferem grande confiança nas pesagens de micronutrientes e agilidade na entrega, produzidos com os melhores ingredientes do mercado”, sublinha. Outro diferencial apontado por ela é o fato de a Indukern ter laboratórios próprios para análises físico-químicas. Nomura Varandas acredita que a aquicultura vai trilhar o mesmo caminho das demais proteínas animais, nas quais o Brasil está entre os maiores produtores globais. “Possui grande capacidade técnica, mão de obra especializada, clima e ambiente favorável, grande diversidade de espécies nativas com potencial zootécnico, fartura de matérias-primas para alimentação animal, consumo interno aumentando e exportações em rápido crescimento.” Apesar da evolução recente, Paulo Rocha, diretor da AlliPlus, ainda enxerga uma distância cultural e comportamental entre a aquicultura brasileira e os líderes globais do setor que prejudica o amadurecimento da atividade. “No Equador, onde estive recentemente e pude comercializar nossos produtos, falar da forma mais transparente possível com o produtor é o que está em voga”, destaca.

óleos essenciais e ácido lático criado para agir contra microrganismos patogênicos nas fases iniciais da criação de peixes, suínos e aves. A atuação especializada da AlliPlus com estes aditivos está sintonizada com a demanda tecnológica do setor, como sugere a assessoria técnica da diretoria de departamento do Instituto de Pesca (IP-APTA-SAA). “Essas ferramentas nutricionais estão em evidência e serão importantes para o desenvolvimento da área. Até poucos anos atrás, eram vistas apenas na avicultura e suinocultura.”

Busca pelo natural Outro ponto de interlocução entre os pesquisadores e os fornecedores de aditivos como a AlliPlus é a busca por soluções naturais de baixo impacto ao meio ambiente. “Há uma tendência geral dos consumidores em preferir alimentos naturais que reconhecidamente não afetem negativamente o meio ambiente, que são produzidos localmente e respeitam a população rural e as questões de bem-estar animal. Assim, inovações que aumentem a eficiência do processo produtivo, mas tenham uma visão de responsabilidade socioambiental, são altamente demandadas.”

Ele lamenta a estratégia de alguns fornecedores locais de usar um discurso de difícil compreensão aos produtores nacionais, de forma que eles comprem produtos sem saber exatamente com que finalidade. “Continuamos nos esforçando mais e mais para estar ao lado do produtor, transmitindo informação clara, simples e transparente, para que ele saiba os benefícios dos produtos que está comprando e para que seja um negócio viável para ambas as partes”, adverte.

É nesta linha em que se insere o Panaferd-AX, um bioaditivo para pigmentação natural de salmões e trutas fabricado pela multinacional japonesa ANCI. O salmão, como todos os animais, não pode criar sua própria cor, mas sim absorvê-la por meio de seus alimentos. A cor laranja do produto de cativeiro, tão apreciada em todo o mundo, normalmente se deve à utilização de astaxantina sintética, produzida em um reator químico com componentes petroquímicos, segundo Carolina Mobilia, responsável pelas vendas do produto na América Latina.

A empresa comercializa o AlliPlus, uma linha de óleos essenciais e ácidos orgânicos, e o Lac, um mix de

A astaxantina é um dos principais carotenóides depositados e pigmentados no músculo do


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Divulgação/Panaferd

Diagrama de produção do pigmento de origem natural Panaferd

salmão. A versão sintética é a solução de pigmentação utilizada pela maior parte da indústria chilena de salmão, mas a ANCI aposta no ingrediente natural. O Panaferd-AX é baseado no microrganismo natural Paracoccus carotinifaciens, uma das principais fontes de pigmentação do salmão selvagem obtidas pela cadeia alimentar. O produto é livre de Organismos Geneticamente Modificados (OGMs), não contém preservantes químicos e não envolve exploração de recursos dos ambientes aquáticos naturais. Mobilia explica que o PanaferdAX não só fornece o carotenóide astaxantina, mas também um perfil amplo de carotenoides pigmentantes e antioxidantes, como os encontrados na carne de salmão selvagem. “A astaxantina, a adonirrubina e a adonixantina fornecem um alto nível de proteínas e nutrientes naturais, com benefícios para a saúde humana, como atraso do envelhecimento, melhora da pele e da função celular, aprimoramento da visão, aumento do sistema imune, redução de inflamações, melhora da função cerebral, perda de peso, entre outros.” A junção entre os benefícios ao consumidor e ao sistema de 50

criação responde às demandas por sustentabilidade. “Um salmão livre de produtos químicos, sustentável, maior transparência e informação são as principais demandas dos consumidores. A origem da cor é uma das variáveis que não fica de fora, tanto que há anos os varejistas mais exigentes agregam exigências aos seus fornecedores, além das certificações mais tradicionais, buscando entregar um produto 100% natural e confiável aos clientes”, diz Mobilia. Ela cita como exemplo o caso da rede Whole Foods, nos Estados Unidos, que não comercializa salmão ou truta que contenham pigmentação de origem sintética. Os maiores clientes do PanaferdAX não estão no Chile, no entanto. “Estamos fortemente presentes no salmão que é produzido na Escócia, Islândia, Canadá, Estados Unidos (land-based) e com forte crescimento no resto da Europa”, informa Mobilia. “Os produtores do Chile, principal produtor na América Latina, têm disponibilidade do nosso produto e a possibilidade de incorporá-lo quando seus clientes o solicitarem.” A expectativa da executiva é de que o Brasil veja uma oportunidade de melhoria na incorporação de mais benefícios e valor agregado como

o oferecido pela Panaferd-AX. “Os mercados de produtos orgânicos, superpremium e 100% naturais são mercados que no Brasil têm uma demanda importante e eles estão em constante crescimento; alternativas na compra de salmão também devem estar presentes”, conclui.

EMPRESAS CITADAS

Daniela Nomura Varandas (11) 99553-3541; (16) 99609-0002 daniela.nomura@indukern.com.br

Paulo Rocha (85) 9 9680-5639 paulo@alliplus.com

Carolina Mobilia +56 9 9882-7378 carolina.mobilia@anciglobal.com


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Rações: equilíbrio entre performance e preço

P

ara um mercado sempre em busca de margens mais favoráveis, a tecnologia na nutrição animal pode representar uma grande aliada. De acordo com a assessoria técnica da diretoria de departamento do Instituto de Pesca (IP-APTA-SAA), o processamento de rações com equipamentos de ponta permite qualidade em relação à mistura, moagem, extrusão e peletização, aplicação de líquidos (aditivos) em sistemas a vácuo e menor aquecimento nos processos de secagem, proporcionando desta forma um produto de qualidade nutricional e mais fácil opção de escolha para cada fase do ciclo produtivo ou desafio do momento.

Um exemplo desse perfil é a Andritz, multinacional austríaca com forte atuação no Brasil em máquinas para as diferentes etapas de fabricação de ração. “O futuro dos alimentos está associado a qualidade nutricional, alto desempenho e performance produtiva, aliados à sustentabilidade e respeito ao meio ambiente. Com as novas formulações de nutrientes, aprimoramento genético, e novas tecnologias nos processos e equipamentos de produção de alimentos completos ‘premium’ para aquafeed , buscamos melhores taxas de conversão com linhas de processo de alta capacidade que eliminam o desperdício e produzem alimentos 52

Divulgação/IP

“Os fatores citados acima já são reais e muito utilizados em rações de alta performance, em que o resultado técnico e a eficiência produtiva e econômica são objetivos do produtor, e não apenas o custo da alimentação”, adverte o corpo técnico do IP. Essa qualidade depende, no entanto, de fornecedores comprometidos com os resultados das fábricas de ração e, por consequência, dos produtores.

Crise nos preços força busca por ingredientes alternativos, como farelo de algodão, de girassol ou de amendoim, resíduo seco de destilaria/milho, feijão e sorgo; na foto, resultado de formulações desenvolvidas pelo Instituto de Pesca (IP-APTA-SAA)

para todas as fases de crescimento e engorda”, diz André Mello, Gerente de Negócios Aquafeed e Petfood. A empresa, que tem mais de 180 anos de experiência, conta com estrutura fabril em Pomerode (SC), fornece soluções completas e conjuntos de equipamentos para alimentos Aquafeed para moagem, mistura, acondicionamento, extrusão ou peletização, secagem, resfriamento, aplicação de líquidos e processo de automação. “Do

amplo portfólio, podemos destacar moinhos de moagem fina, conjuntos de extrusão para alimentos micro e de engorda, secadores CZD de zona combinada, sistema de aplicação e recobrimento a vácuo.” A maior novidade da Andritz é a introdução de dois novos modelos de extrusoras de rosca dupla para as indústrias de aquafeed e pet food: a ExTS-616 opera em uma faixa de volume de 6-10 toneladas por hora (tph) e o ExTS-718 produz entre 10-


18 tph cada. As extrusoras de dupla rosca são consideradas pela própria empresa como a solução ideal para a extrusão de alimentos para rações de peixe com baixo teor de amido, alto teor proteico e possibilidade de injeção de carne fresca (slurry), uma vez que foram projetadas para se adequar ao processamento de produtos viscosos, oleosos, pegajosos ou muito úmidos. Além disso, possibilita a produção de uma gama ampla de alimentos, desde os micro extrusados (0,6 mm Ø) até os produtos de terminação e engorda, no mesmo conjunto de equipamentos. A expectativa da Andritz é positiva. “O setor de aquicultura vem se profissionalizando e apresentando um crescimento sólido ano a ano. A Andritz reforça o compromisso de oferecer soluções completas de equipamentos e tecnologias para as fábricas de alimentos aquafeed que possibilitam a produção de alimentos completos com a mais avançada tecnologia, menores custos por tonelada produzida e possibilitando a

produção de uma gama completa de alimentos”, diz Mello.

Matérias-primas e tecnologia em alta Como apontam os especialistas do IP, o principal desafio do ano de 2021 foi conviver com o aumento do preço e a perda de qualidade da ração. “Uma questão que na verdade atingiu a todos os produtores do Brasil, já que o aumento dos preços das matérias-primas foi geral. As fábricas precisaram fazer ajustes nas fórmulas e a perda da qualidade da ração foi observada no campo.” Considerando o aumento no custo de produção, os especialistas do órgão sugerem que a eficiência produtiva diminuiu por conta da perda de qualidade das rações e preços do peixe estáveis, com o que muitos pequenos produtores pararam de produzir. A Raguife foi uma das empresas que procurou reagir sem diminuir a qualidade das rações comercializadas. “A formulação das rações acaba sendo ajustada com a inclusão de

ingredientes alternativos, que auxilia nesse período e permite aos animais não serem prejudicados com a perda da performance zootécnica”, disse Felipe Georges Ambar do Amaral, sócio-diretor da empresa, ao site da Seafood Brasil. “O milho e a soja subiram em torno de 10% e a ração já teve uma alta nos preços este ano de 48%, o que vem dificultando a todos na comercialização do produto final. Ao se tornar um produto mais caro, o produtor não está conseguindo repassar e tendo prejuízo em seu negócio”, contou. Dentro da Raguife, as alternativas passam por investimentos em estrutura de estocagem, mas também em ferramentas tecnológicas. Na virada para 2021, a empresa trocou toda sua plataforma de automação de máquinas para se ajustar aos conceitos da indústria 4.0. “Estamos visando maior produtividade, melhores controles de processo, redução de desperdícios e procurando repassar todo esse pacote em forma de qualidade no produto e, principalmente, mostrando resultado

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Divulgação/Raguife

Com investimentos em estruturas logísticas e ferramentas tecnológicas, Raguife sustenta projeção de crescer 30% em 2022

zootécnico com melhores custos de produção aos seus clientes”, diz o gerente de operações da empresa, Vinicius Alves de Lima. Em 2021, a empresa considera ter aumentado a eficiência produtiva por meio de uma série de ajustes: “Automação de processos, digitalizando e simplificando processos (tornandoos mais precisos e confiáveis), otimização de todas as linhas de produção e rotinas de manutenções preventivas, identificação automática de oportunidades de melhorias por meio de análise de dados e seus componentes inteligentes”, enumera Lima. O executivo acredita que até o fim do primeiro trimestre de 2022 o novo conceito será implantado em toda a estrutura, de forma que os gestores, coordenadores e operadores de diversos setores terão dados em tempo real, permitindo uma tomada de decisão rápida e não baseada em suposições. “Tudo isso vem com o auxílio de diversas empresas com know-how no ramo de indústria 4.0 associado a fortes investimentos da empresa em melhorias e infraestrutura física para que todo o planejamento 54

de crescimento da empresa seja orgânico e de forma eficiente.” Em 2021, a empresa fortaleceu as vendas da linha Pro Start e espera ter o mesmo resultado com a linha TS Camarões, lançada no fim do ano com o objetivo de fornecer a carcinicultores de todo o Brasil. “A projeção da empresa é continuar com o forte crescimento na faixa de 30% e se fortalecendo cada vez mais nos pólos de produção que já atende e também aumentar a participação em mercado nos quais iniciou o atendimento em 2021”, completa Lima. O movimento deixa a competição mais acirrada no ramo de nutrição para carcinicultura, onde a Samaria Rações tem grande protagonismo. Depois de consolidar a marca no segmento, a empresa procura aumentar ainda mais o volume produtivo. “Começamos o ano de 2022 dobrando a capacidade produtiva de rações para camarões. Em fevereiro, implantamos uma nova linha completa de peletizadora, moinhos e demais equipamentos importados da Dinamarca”, declara o empresário e diretor do Grupo Samaria, Cristiano Maia.

A planta já fez o start up do novo maquinário e está em plena produção. A capacidade produtiva aumentou para 6.000 toneladas/mês. Até maio de 2022, também entrará em produção uma nova linha de extrusão completa, triplicando a capacidade de produção para rações de peixes e alevinos. “Todo investimento iniciado no ano passado, de cerca de R$ 40 milhões, está sendo concluído no decorrer desse ano. Até meados de 2022, teremos também uma linha de pets e até o final do ano, uma nova fábrica para rações de equinos”, projeta Marcelo Simão, gerente geral da Samaria Rações. Simão é responsável pelo planejamento estratégico, que foi aprovado e financiado por Maia. O gerente ressalta que o perfil do empresário foi fundamental para os investimentos necessários para esta nova fase da empresa. “O Dr. Cristiano Maia é um visionário, e também um defensor da aquacultura e do produtor rural. Por isso, também estará investindo em outras linhas produtivas em sua expansão fabril.” EMPRESAS CITADAS

André Mello (16) 99760-0778; andre.mello@andritz.com

Felipe Amaral (17) 3631-4347; felipe@grupoambaramaral.com.br

Marcelo Simão (85) 3111-6400; msimao@samariaracoes.com.br


55


Sanidade: dores do crescimento

N

os últimos anos, o setor notou a expansão de doenças emergentes, principalmente em razão dos efeitos da expansão da tilapicultura por todo o País, conforme indica a Assessoria Técnica da Diretoria de Departamento do Instituto de Pesca (IP-APTA-SAA). “O aumento da produção de tilápia, a maior proximidade entre as propriedades rurais e a utilização de espaços próximos nos reservatórios de hidrelétricas contribuem para o aumento de enfermidades.” As grandes empresas do segmento já fizeram a implantação de rígidos programas de sanidade aquícola, o que deveria ser universalizado.

proporcionar uma plataforma de serviços tecnológicos para a indústria”, aponta o diretor de serviços técnicos da Pathovet do Brasil, o veterinário e mestre em Desenvolvimento Agrário Hugo Roa.

A aposta dos chilenos parece ter dado certo. Ao longo do primeiro ano de existência, a Pathovet analisou perto de 6.000 amostras, das quais 85% foram análises de PCR em tempo

O aumento de desafios sanitários contribui para a chegada de empresas estrangeiras já bem posicionadas em outras cadeias aquícolas. É o caso da Pathovet, empresa chilena de biotecnologia que passou a operar no Brasil em maio de 2021 e traz toda a bagagem de lidar com as doenças do salmão com o uso da biotecnologia na detecção de patógenos e definição de indicadores biológicos observados nos peixes durante a interação com o interno.

Renata Galeti, da Pathovet do Brasil: empresa quer implantar proteômica e avaliação de parâmetros preditivos

56

Divulgação/Hipra

“Com o background adquirido na indústria do salmão, entendemos como estão surgindo novas necessidades tecnológicas. É importante não só diagnosticar rápido e de maneira tecnicamente confiável, mas também


real, o principal produto da empresa. “Destacamos que 95% dos resultados destas análises foram entregues em menos de 48 horas, marco que tem sido valorizado positivamente pelos nossos clientes”, sublinha Roa. O objetivo da empresa é se tornar o laboratório líder do mercado, com clientes de toda a cadeia produtiva. “Foi assim que os principais núcleos genéticos do País confiaram os seus programas de vigilância ativa e passiva à Pathovet do Brasil. As principais produtoras de formas jovens também são nossas clientes, bem como algumas empresas de engorda”, acrescenta o diretor técnico no Brasil, Miguel Fernandez Alarcon. Além do serviço de diagnóstico, o trabalho também contempla assistência técnica a campo, com informações consolidadas sobre a prevalência de doenças. “Isso constitui em um elemento crucial na tomada de decisões estratégicas.” Esse modelo de trabalho também é empregado

em clientes produtores de tilápia da América Central e México. Para 2022, há várias linhas de trabalho potenciais, entre as quais a Pathovet destaca a área de proteômica - análise ampla e em larga escala do conjunto de proteínas de uma amostra biológica. “Esta é uma linha de serviço com demanda bem consolidada no laboratório Pathovet do Chile, e que estamos implementando em nossas instalações no Brasil. De imediato, estão validados ensaios para a determinação de títulos de anticorpos (IgM antiStreptococcus agalactiae), bem como ensaios de ELISA para a quantificação dos níveis plasmáticos e em tecido muscular dos antibióticos florfenicol e oxitetraciclina”, informa Roa. Tais análises tornam possível verificar a estimulação imune induzida por vacinas (determinação de título de anticorpos), e também compreender a farmacocinética dos antibióticos no peixe de modo a evitar/corrigir falhas terapêuticas.

Outra linha é com a FAI do Brasil para o projeto “Programa Sanitário e de Bem Estar Animal”, que procura compreender os fatores responsáveis pelo desencadeamento de algumas doenças que causam grandes prejuízos, bem como o seu respectivo impacto, e como minimizar as perdas decorrentes. “A iniciativa, única, só foi possível a partir da análise estatística da informação consolidada de várias empresas parceiras do projeto, que através da iniciativa poderão se beneficiar com algumas respostas”, adverte Alarcon. O foco na pesquisa aplicada e o contato estreito com o mercado permitiu ainda o desenvolvimento de uma plataforma de serviços baseada na avaliação de parâmetros preditivos. “Estamos em fase final de validação de ensaios de expressão gênica capazes de nos indicar se determinada vacina induz a resposta imune pós-vacinal (celular e humoral), ou o percentual de

57


Processos de vacinação da Hipra: imersão aos alevinos e injeção em juvenis

sucesso de um tratamento de reversão sexual, e até como determinada dieta influencia o metabolismo animal”, comenta. “Estes serviços antes pareciam uma utopia, mas hoje estão muito próximos de se tornarem realidade, o que sem dúvida se deve à consciência do setor quanto aos benefícios da tecnologia para o desenvolvimento sustentável”, completa o executivo. Essa aliança entre fornecedores e prestadores de serviços para a aquicultura também se dá no campo do desenvolvimento de aditivos nutricionais e produtos veterinários, como explica Roa. “Oferecemos as nossas soluções também para empresas de produtos veterinários e aditivos nutricionais, como laboratórios produtores de vacinas comerciais e 58

autógenas, do Brasil e empresas multinacionais. Para este segmento, prestamos serviço de assistência a campo, diagnóstico confirmativo e avaliação de produtos em modelos de desafio pelos principais patógenos da aquicultura brasileira.“

Vacina por imersão O controle dos desafios sanitários também exige superar desafios relativos à própria aplicação de produtos veterinários. A vacinação peixe a peixe durante as fases iniciais é um deles e a Hipra, outra multinacional recémchegada ao Brasil, dedica-se a implantar por aqui uma alternativa eficaz para a imunização completa de toda a criação, da alevinagem ao peixe gordo.


A partir da contratação de especialistas brasileiros, como o biólogo João Felipe Moutinho Sant`Anna, a empresa espanhola desenvolveu um programa anual de vacinação completo para responder aos principais patógenos da tilapicultura. Para peixes a partir de 0,5 gramas na fase de alevinagem, a Hipra desenvolveu uma vacina por imersão para evitar a manipulação manual ou mecânica dos animais. Já para juvenis a partir de 30 gramas, a empresa opera também com a vacina injetável. A novidade caiu bem no mercado e os resultados foram positivos, segundo indica Moutinho. “Hoje já comercializamos mais de trinta milhões de doses de vacina injetável, em operações já negociadas com mais de 100 milhões de alevinos a serem vacinados para 2022 até esse momento.” A expectativa é fechar o ano com até 200 milhões de alevinos vacinados por imersão e outros 30 a 50 milhões de

juvenis com vacinas injetáveis. “O objetivo da empresa é consolidar essa plataforma e atingir contas chaves em grupos verticalizados, que já estão aderindo ao programa Hipra de vacinação para peixes”, acrescenta o executivo. O escopo de serviços, porém, vai além das soluções de portfólio. A empresa também opera com vacinas autógenas personalizadas para patógenos específicos, quando as opções comerciais não se encontram disponíveis ou não proporcionam a proteção esperada. ”Uma vacina autógena é constituída de bactérias isoladas durante um surto de doença específico de uma fazenda, seu regime e método de administração são adaptados ao plano de produção específico de tal local.” O Brasil abriga uma das duas fábricas da empresa (a outra é na Espanha) capazes de fabricar as

vacinas autógenas. Outro serviço presente localmente é um centro próprio de diagnóstico, que contempla uma biblioteca de cepas para armazenamento de longo prazo de isolados bacterianos. Incluindo o Brasil, a Hipra possui 38 subsidiárias, 2 fábricas, 3 centros de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e 10 centros de diagnóstico em todo o mundo. EMPRESAS CITADAS

João Felipe Moutinho Sant`Anna (51) 3325-4500 joao.moutinho@hipra.com

Miguel Fernandez Alarcon (16) 9 9177-4938 miguel.fernandez@pathovet.cl

59


Pós-larvas: genética e metagenômica

A

cadeia produtiva do camarão é uma atividade relativamente recente e passa constantemente por novos desafios, sobretudo advindos do surgimento de novas enfermidades, o que impõe constante revisão e aprimoramento do processo produtivo. É o que aponta a gerente geral da Unidade Produtora de Larvas (UPL) da Potiporã, Roseli Pimentel, onde ações sistemáticas de modernização têm sido realizadas. Um dos investimentos foi na área de metagenômica, que possibilitou analisar com maior precisão as comunidades microbianas existentes nos diferentes ambientes a que os animais são submetidos. A executiva explica: “A metagenômica é uma técnica que independe do cultivo prévio dos microrganismos, permitindo acessar também a biodiversidade microbiana que é perdida quando métodos de cultivo são usados”, informa. Para ela, a decisão de incluir este tipo de análise no processo produtivo possibilitou estabilizar as

unidades de produção de pós-larvas para garantir a oferta de PLs para seus clientes de forma regular e segura no âmbito microbiológico. No âmbito sanitário, a empresa segue com o laboratório de diagnóstico por PCR, que possibilita o monitoramento individual de todos os animais do plantel e também de todos os lotes de pós-larvas produzidos. “Com uma capacidade para processamento de 7.000 amostras mensais e um tempo entre coleta de amostra e liberação do resultado de 48 horas, é possível manter matrizes ‘limpas’ e, consequentemente, produzir pós-larvas sanitariamente aptas para as fazendas de engorda.” Já em relação ao melhoramento genético, a Potiporã mantém parceria com a empresa Genaptus, responsável pelo programa com foco na seleção das melhores famílias através da utilização de marcadores microssatélites. Além de dispor de áreas específicas para o desenvolvimento do programa e levantamento de famílias (maturação,

Laboratório de diagnóstico por PCR da Potiporã: 7 mil amostras mensais e liberação de resultado em 48 horas

larvicultura e fazenda), a Potiporã conta com um sequenciador capilar e equipe treinada para processamento de 4.000 genotipagens por mês, como conta Pimentel. “Essa arrojada estrutura permite que os cruzamentos sejam determinados e seus resultados mensurados em campo. Com base nessa confirmação de performance, os cruzamentos que produzirão as larvas comerciais são definidos.” Assim, os lotes de pós-larvas produzidos na Potiporã são geneticamente monitorados, de forma a buscar garantir a manutenção no desempenho e eliminar o risco de consanguinidade nas larvas produzidas. Já no campo da pesquisa, o foco é caracterizar o ambiente de cultivo. “As condições em que as pós-larvas são entregues aos clientes devem estar alinhadas às condições de cultivo em cada fazenda.” Segundo ela, a Potiporã pretende caminhar mais próxima dos clientes, com vistas a minimizar os impactos do ambiente, de forma que o animal encontre condições favoráveis para expressar seu potencial genético. Com uma capacidade de produção de 500 milhões de PL/mês, as unidades produtoras de pós-larvas situadas no RN (3 unidades) e no CE (1 unidade) já atendem aos clientes em diferentes salinidades.

Arquivo/Seafood Brasil

EMPRESA CITADA

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Roseli Pimentel (84) 3522-2078 roselisilva@potipora.com.br


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Estatísticas

Comex pautado pela pandemia

O

SEAFOOD BRASIL • DEZ/JAN 2022 •

62

s efeitos da pandemia - uma combinação de fatores em múltiplas direções continuaram a pautar o desempenho da balança comercial brasileira ao longo de 2021. Do ponto de vista da oferta, o aumento dos combustíveis, desafios logísticos associados à carência de contêineres, desafios produtivos por falta de mão de obra ou insumos, rupturas causadas pelos lockdowns mundo afora, além da alta demanda com a reabertura pós-vacinação nos EUA e Europa, pressionaram globalmente os preços dos itens de pescado.

No ano passado, a recuperação gradual dos canais de food service no Brasil e no mundo conteve a expansão vertiginosa das vendas de pescado no varejo que marcou 2020, o primeiro ano da pandemia. Com isso, a distribuição dos canais regressou aos poucos à proporção tradicional, embora as vendas de pescado via varejo físico e online tenham se transformado de maneira irreversível. A pressão inflacionária advinda desta situação penalizou os importadores, mas auxiliou o crescente número de exportadores brasileiros - que ainda se beneficiaram da valorização da moeda norte-americana frente ao real. A balança comercial

Exportações

Importações

Saldo

50.794

316.393

-265.599

$360.386.939

$1.180.469.932

-$820.082.993

Preço médio (US$/ton.)

$7.094

$3.731

$3.363

Variação kg/2020

8,65%

6,56%

Variação US$/2020

41,60%

31,70%

Variação de preço médio/2020 (US$/ton.)

30,30%

23,60%

Volume (ton.) Receitas/Dispêndio (US$)

10 ANOS DE EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS DE PESCADO | 2011-2021 Expo - t

Impo - t

400k

Toneladas

Texto/Gráficos: Abraão Oliveira e Ricardo Torres - Painel do Pescado

BALANÇA COMERCIAL BRASILEIRA DO PESCADO EM 2021

300k 200k 100k 2000

2005

2010

2015

2020

MÉDIA DOS PREÇOS ANUAIS DE PESCADO | 1997-2021 PM - Expo

PM - Impo

7.000 Preço médio (US$/Ton.)

Importação de salmão cresce apesar de preço 59% mais alto e exportações de tilápias registram recorde histórico em 2021

6.000 5.000 4.000 3.000 2.000 2000

2005

2010

2015

2020


SEAFOOD BRASIL • DEZ/JAN 2022 •

63


Estatísticas

HISTÓRICO MENSAL DAS EXPORTAÇÕES | 2018-2021 2018

6.000

2019 2020

5.000

2021

4.000 3.000 2.000 1.000 0

Jan

Fev

Mar

Abr

Mai

Jun

Jul

Ago

Set

Out

Nov

Dez

EVOLUÇÃO MENSAL DA EXPORTAÇÃO DE TILÁPIA (TODOS OS FORMATOS) | 2021 1.000 2018 2019

800

2020 2021

600

400

200

Jan

Fev

Mar

Abr

Mai

Jun

Jul

Ago

Set

Out

Nov

Dez

SEAFOOD BRASIL • DEZ/JAN 2022 •

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0

brasileira de itens de pescado em 2021 seguiu deficitária, com diferença de US$ 820 milhões entre as importações e as exportações. No entanto, o desempenho das vendas externas segue encurtando esta distância.

de pescado. No recorte histórico trazido pelo Painel do Pescado, percebemos que as empresas brasileiras apuraram crescimento de 58% no volume exportado entre 2014 e 2021, um crescimento médio de 7% ao ano.

para US$ 360 milhões no faturamento com as vendas externas, uma alta de 68%. Já os volumes despachados ao exterior pelas empresas brasileiras ainda estão na metade do patamar alcançado no pico histórico ocorrido em 2003.

O País parece ter se recolocado novamente no trilho dos exportadores

Em 10 anos, os exportadores brasileiros subiram de US$ 214 milhões

A pauta exportadora foi bastante diluída em 2021, enquanto


SEAFOOD BRASIL • DEZ/JAN 2022 •

65


Estatísticas

VOLUME (KG) - PAÍSES Peru

Coreia do Sul

China

Estados Unidos

Chile

Canadá

Venezuela

Equador

Taiwan (Formosa)

Libéria

Hong Kong

Paraguai Uruguai

Argentina

Colômbia

República do Congo

Congo

República Dominicana Suriname

Gabão

Japão

RECEITA (US$) - PAÍSES

China

Hong Kong

Estados Unidos Japão

Peru

Venezuela

Austrália

Colômbia

Canadá

Chile

Rep. do Uruguai Congo

Equador

66 SEAFOOD BRASIL • DEZ/JAN 2022 •

Coreias do Sul

Singapura

Gabão

Uruguai Congo

Argentina

Paraguai

Taiwan (Formosa)


Itens como a polaca da China reduziram muito sua participação, enquanto o panga retomou um papel

O salmão se manteve soberano na pauta importadora a despeito da alta nas cotações, o que colaborou para que os preços médios praticados pelos fornecedores internacionais atingissem altas históricas em 2021, em geral motivados pelos distúrbios de oferta e demanda provocados pela pandemia.

Exportações em alta O Brasil alcançou em 2021 o maior volume de exportações do setor desde 2007 - havia 9 anos que o País não superava a barreira de 50 mil toneladas. O recente movimento se intensificou a partir de 2015, com um salto em 2019 - contido pela pandemia em 2020, mas retomado no ano passado. As vendas de tilápia brasileira ao exterior registraram um recorde histórico nos 12 meses encerrados em dezembro de 2021. Foram embarcadas a clientes estrangeiros 4.285 toneladas,

67

No âmbito da importação, os 12 meses encerrados em dezembro de 2021 sugerem uma leve recuperação após a queda acentuada registrada entre 2017 e o primeiro ano de pandemia (2020). No decorrer da década, nota-se uma redução dos volumes importados.

de destaque com 28 mil toneladas. O volume é similar ao da merluza argentina, que vem se reduzindo ano após ano com capturas menores e problemas com restrições sanitárias das autoridades brasileiras.

SEAFOOD BRASIL • DEZ/JAN 2022 •

as importações ficaram mais concentradas. O Brasil exportou os volumes acima a 123 países, enquanto importou de outros 40.


Estatísticas

EXPORTAÇÕES DE PESCADO | CATEGORIAS - 2021 (US$)

Filés de Peixes 4,0% Conservas

Peixes congelados 35,5%

5,3%

O Chile e os 10 principais países fornecedores em volume representam 95% das importações, somando 299,6 toneladas. De cada 3 kg de pescado importado, 1 kg foi de salmão chileno - este produto apurou um aumento nada simbólico de 59% no valor pago no período, fechando 2021 a US$ 6.599/tonelada.

Peixes secos e/ou salgados 6,3% Peixes frescos 14,2% Crustáceos 34,1%

A Argentina, que já despachou 92 mil toneladas ao Brasil no início da série histórica, apurou em 2021 desempenho três vezes menor com uma pauta concentrada na merluza. O produto integra a categoria de filés brancos congelados, muito popular no varejo brasileiro, mas que vem perdendo espaço para a tilápia nacional.

EXPORTAÇÕES DE PESCADO | CATEGORIAS - 2021 (KG)

Filés de Peixes 4,3% Conservas 9,8% Peixes secos e/ou salgados 1,5%

Peixes congelados 61,5%

Peixes frescos 15,4% Crustáceos 6,9%

equivalentes a US$ 14 milhões. Em 2020 haviam sido exportadas 1.537 toneladas, um aumento de 179%.

equivalentes a 1.275 toneladas. O desempenho proporcionou um crescimento de 44% em volume.

Pela primeira vez desde o início da série avaliada pela plataforma (1997), os exportadores de tilápia embarcaram 954 toneladas apenas em dezembro, um desempenho inédito. Os filés de tilápia já se tornaram o principal item de exportação na categoria filé, com receitas de US$ 7,623 milhões,

Importações concentradas no Chile

68 SEAFOOD BRASIL • DEZ/JAN 2022 •

adquiriu 418 mil toneladas. Com o aumento do preço médio em 23,62%, para US$ 3.731 a tonelada, as importações geraram um dispêndio de US$ 1.180.469.932, um aumento nos gastos de 31,73% ante o mesmo período de 2020.

No ano passado, os fornecedores estrangeiros enviaram 316 mil toneladas ao Brasil, o que denota uma lenta redução em curso. O ápice histórico das compras externas aconteceu em 2013, quando o Brasil

Já entre os asiáticos, o Vietnã embarcou 28,5 mil toneladas de filé de pangasius para o Brasil em 2021, contra 22,4 mil toneladas em 2020 – representando assim uma ascensão de 27%. Depois de atingir um pico de 93,4 mil toneladas só em 2013, os embarques da China iniciaram uma trajetória descendente a um ritmo de -10,3% ao ano e chegaram no ano passado a 16,3 mil toneladas. Os peixes frescos (basicamente o salmão chileno) representaram 52% de todo o dispêndio de pescado do Brasil em 2021. A categoria observou aumento de 66,85% no gasto (total de US$ 610.774.079), no período entre janeiro e dezembro do ano passado ante 2020. O preço médio da tonelada dessa categoria de pescado terminou 2021 em US$ 6.609, um crescimento de 59,73% se


PAÍSES - DISPÊNDIO COM IMPORTAÇÕES (US$)

Noruega

Argentina

Portugal

Chile Vietnã

Omã

Peru

Uruguai

Taiwan (Formosa)

Marrocos

China

Outros

Equador

PAÍSES - VOLUME DE IMPORTAÇÕES (KG)

Vietnã

Noruega

Argentina Chile

Tailândia

69

Outros

SEAFOOD BRASIL • DEZ/JAN 2022 •

Portugal

Países Baixos

Vietnã

Taiwan (Formosa)

Peru Espanha

Omã

Equador

Uruguai

China


Estatísticas comparado ao igual período de 2020. A análise da importação mensal mostra que o produto tem demanda constante ao longo do ano e é menos dependente de sazonalidades.

IMPORTAÇÕES DE PESCADO | CATEGORIAS - 2021 (US$)

Conservas 2,9%

Peixes secos e/ou salgados 10,9% Peixes frescos 6,9%

Peixes congelados 14,9%

Filés de Peixes 17,4%

IMPORTAÇÕES DE PESCADO | CATEGORIAS - 2021 (KG)

Moluscos 1,8%

Peixes frescos 29,2%

Conservas 4,4% Peixes secos e/ou salgados 7,7% Peixes congelados 35,4%

Filés de peixes 21,3%

PARTICIPAÇÃO DE CADA PRODUTO NO VOLUME IMPORTADO - 2021

As sardinhas e sardinelas foram mais um grupo de produtos que atingiu outro patamar de importância na pauta importadora brasileira. As preparações para a indústria conserveira atingiam até 2013 picos de 50 mil toneladas, quando a derrocada da captura das sardinhas em território nacional forçou o incremento destes itens para níveis entre 70 e 90 mil toneladas. Só no ano passado, esses produtos alcançaram 70,3 mil toneladas, 22% do volume nacionalizado. 82% deste montante entrou via Santa Catarina, que pagou o preço médio mais baixo de todo o País pelo produto: US$ 0,85/kg. As sardinhas e sardinelas são o produto importado mais barato, seguido pelas cavalinhas (US$ 1,11/kg), tubarões e raias (US$ 1,34/kg), corvinas (US$ 1,40/ kg) e curimatãs (US$ 1,44/kg). Também entre os preços médios mais baixos está o panga do Vietnã, aqui integrando o grupo de outros peixes, com valor médio de US$ 2,20/kg. Opção mais barata entre os filés brancos sem espinha, o produto se valorizou 4,4% em 2021 - essas características estimularam um aumento de volume de 27,8%, com um dispêndio 33,4% maior, para US$ 63.176.714.

Cavalinhas 1,6% Sépias e lulas 1,7%

Salmões e trutas 31,6%

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Atuns e afins 2,9% Tubarões e raias 5,6% Sardinhas e sardinelas 22,2% Merluzas 8,8%

Bacalhaus 8,1% Outros 14,6%

*Este relatório é o produto de uma análise extensa dos dados trazidos pelo Painel do Pescado em janeiro de 2022. Os dados constam do ebook “TUDO sobre a balança comercial de pescado em 2021”, produzido pelo Painel do Pescado - um dashboard estatístico com dados do Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex). Mais informações em: http:// bit.ly/ebook_comex_pescado_2021


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A pressa é inimiga da refeição Alimento bom, limpo e justo é a tríade que norteia o Slow Food, movimento baseado na capacidade de renovação do meio ambiente e até na harmonia para boa convivência entre as pessoas

Texto: Fabi Fonseca

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alimentação é provavelmente um dos amálgamas sociais mais antigos da humanidade. Estar junto e comer junto são alguns dos principais elementos definidores do Homo sapiens ao longo dos nossos 300 mil anos de existência. Há três décadas, no entanto, uma certa volta às origens explicitou a preocupação em comer devagar, fazer escolhas saudáveis, evitar o desperdício, estar atento à origem do alimento e uma série de outras características em torno da alimentação Food. saudável. Esse caldo deu origem ao Slow Food.


realmente assustadora, cenário esse que ainda é agravado pela crise climática. “O movimento surge como mais um que traz a bandeira das questões ambientais atrelada à produção de alimentos como urgente.

E isso é algo que a gente realmente precisa olhar”, reforça. Atualmente, o Slow Food está presente em mais de 160 países. No Brasil, como destaca Meneguello,

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Para ela, o esgotamento dos recursos está em uma velocidade

Sururu é usado na alimentação diária e muito apreciado na gastronomia regional baiana: uso de ingredientes regionais é chave para o movimento

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O Slow Food é um movimento global fundado pelo sociólogo e jornalista italiano Carlo Petrini, em 1986, que tinha como um de seus objetivos principais se opor ao fast food e à alta da alimentação industrializada. No entanto, o movimento também traz pontos em relação à manutenção e salvaguarda de práticas, de saberes, de cultura e também sobre a biodiversidade. “A gente anda num processo de depredação muito intenso em que se não fizermos mais nada, não olharmos para isso e deixarmos o fluxo seguir como vem sendo, vamos provocar a nossa extinção como espécie”, opina Ligia Meneguello, da Coordenadoria de Programas e Conteúdos da Associação Slow Food do Brasil.

Flickr/Governo da Bahia

O alimento bom, limpo e justo é o que norteia o movimento, baseado em princípios de que a produção global precisa considerar a capacidade do ambiente de se renovar, bem como a necessidade de que as pessoas vivam juntas em harmonia. Essas características são aplicáveis a todos os alimentos, inclusive ao pescado. E isso deu origem a um derivado desta filosofia: a rede global Slow Fish.


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Inauguração da maior cadeia de fast food do mundo, na Piazza di Spagna, no centro histórico de Roma, na Itália, inspirou, como contraponto, o surgimento do Slow Food

o movimento começou no Rio de Janeiro, em 2000, para em seguida, ir para São Paulo e por fim, se espalhar por várias outras regiões do País. Com atuação orgânica, associam-se ainda ao movimento pessoas que se identificam com a filosofia: os adeptos se aproximam dos grupos locais e se voluntariam como podem - ou como querem - de acordo com o seu perfil. “A rede Slow Food Brasil é muito ampla e diversa, formada por ativistas, por pesquisadores, por jornalistas, por pessoas que gostam da comida e que a enxergam como um ponto central para debate e para suas vidas”, informa. Porém, Meneguello revela que também

fazem parte da rede agricultores, pescadores, extrativistas e pessoas que atuam na cadeia produtiva que se identifiquem com o que o movimento traz como proposta: um olhar mais aprofundado sobre a cadeia produtiva, que valorize o alimento que seja “bom, limpo e justo”. “A valorização da cultura alimentar local, das biodiversidades, dos territórios e que enxerga a incidência política como uma ferramenta de atuação também fazem parte de nossa filosofia”, explica. Ela ainda completa. “Temos uma situação bastante ampla para valorizarmos o alimento que tenha identidade, que não impacte

a natureza ou nos seus modos de produção, além de remunerar de forma justa quem o produz.” O movimento se organizou em comunidades locais e se formalizou com uma associação em 2013, a Associação Slow Food do Brasil, mais um nó da Rede Slow Food Brasil. Embora esse grupo tenha autonomia e represente o movimento no País, ele não direciona completamente as atuações locais, como informa Meneguello. “Essa ação local é variável. Por isso, muitas vezes nós trazemos as diretrizes do Movimento Internacional para apoiar as comunidades locais nas suas ações, orientar quando nos é solicitado ou


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vimo o o su tod e con m r ent teia nor líbrio e i u equ is q ipa sca o c n ao u ri por s p que b o o t e s on ofia de s sp pal a o a filo i j c e v m prin da, le u tivo e ápi az de j r b a f oo a. form que om lizad de c 6 De to e o ito. a ção lento 198 dustri u e n d e p m r o s r e m do ção in a p m olha e re a ê o d v a n m t u nto õe É global fu alimen ime prop E v o a U a l s: , o m o, e O Qvimento à alta d tais or iss fatore e n o e d i P M foo . três mb t nte fas es a urge do em A õ t T s a a e POS por qu um temva base O R i o t o P tivad com odu A r • OFI seja: de. Mo entos eia p S . O uz. e d a d L asil u m a I i o d q l i c r t F a o p n a o Br t e o n A e e d r e v i . D im i a e em sob clus RESizar o alalidade naturezrreta qu s, in A e s L í co PI qu lor ea 0 pa OS pre va tenha impact e forma e 16 d s e i Sem m: qu e não ere d ma o em un qu e : t m •B o n se mp e re L L está pre • Li to: qu A ASI s U R u d J T B o • A o O CE Slow F o EN N D om A o E , R mc a ALCalmente A g r nxe PÕE Atu ae M e O u eq MC ida m QUEtivistas dores o c am da vidas tific • A squisa s n m e a s d a st e se i • P nalista ue go as su ue d r q q l o s J a e • tr oa tiva cen ess odu • P onto res r p p eia um riculto es éria cad ropõe g r mat a o A n a d p • e a s t o m n a nt sta esc dura • P trativi ue atu ovime dos a t q x s m i v • E ssoas ue o ntre q e te: e n • P om o o F c

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UM INTENSIVÃO SOBRE O SLOW FOOD


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O movimento Slow Fish reúne diversas pessoas distintas, como pescadores artesanais, cozinheiros e pesquisadores em prol do pescado bom, limpo e justo

O Slow Food em si é composto por diversas vertentes e projetos coletivos, como é o caso do Slow Fish. E como não poderia deixar de ser, nesse pedaço, o pescado é o protagonista.

cozinheiros, biólogos marinhos, antropólogos, jornalistas, professores, pesquisadores, estudantes, consultores e ambientalistas, além de outras pessoas interessadas. “Esta variedade de perspectivas enriquece o nível do diálogo que o Slow Fish promove. Ele é dedicado a um futuro melhor para a pesca costeira e de águas continentais, além de ser uma valiosa fonte de informação para qualquer pessoa que queira ampliar seus conhecimentos e compreensão sobre pesca e consumo sustentável”, opina.

A bióloga, doutora em oceanografia e professora da Universidade do Estado de Santa Catarina, Patricia Sfair Sunye, explica que o Slow Fish conta com pescadores artesanais, proprietários de peixarias e de restaurantes,

Sunye também é membro do Slow Fish Brasil - a campanha foi criada em 2001, durante um evento realizado pelo Slow Food Internacional. E, apesar de inicialmente direcionado às pescarias no Mediterrâneo, o novo movimento se

até mesmo representar formalmente alguma comunidade em função de uma necessidade”. Logo, sua atuação é vista através de projetos. Já enquanto associação, ela se mantém através de parcerias e eventos de formas variadas.

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Pescado bom, limpo e justo: Slow Fish

expandiu rapidamente entre os demais elos da rede Slow Food. Tratando da perspectiva voltada aos recursos pesqueiros e à produção consciente, Ligia Meneguello conta que o Slow Fish traz a proposta de consumo de animais nativos e locais. Na pesca, por exemplo, a campanha ressalta a necessidade de respeitar as técnicas de capturas artesanais, que vão lidar com a sazonalidade, além de questões sociais relacionadas aos pescadores, marisqueiras e outros ofícios da atividade Sunye ressalta que é fundamental para o Slow Fish a ideia de que o oceano e seus recursos são um bem comum para toda a humanidade e que por isso, devem ser protegidos


e restaurados como tal. Igualmente importante é o conceito de que comunidades pesqueiras diversas e saudáveis ​​são a chave para o sucesso de uma pesca sustentável que pode alimentar a população mundial. “Isso significa recuperar e promover as tradições de culturas costeiras para garantir o acesso deste bem comum para as gerações futuras, ao invés de priorizar os lucros de alguns interesses privados em curto prazo”, revela. “O Slow Fish luta ativamente por equidade intergeracional, agora e no futuro”, completa.

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Na pesca, a campanha do Slow Fish traz a proposta de consumo de animais nativos e locais, além do respeito às técnicas de capturas artesanais e sazonalidade


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Uma arca gastronômica: a cozinha Slow Food Não tem jeito: quando uma rede com princípios tão característicos como o Slow Food quer mostrar sua filosofia na prática, a melhor maneira melhor de se fazer é através do paladar. Ou seja, a gastronomia em si é um elemento fundamental para que as pessoas compreendam de uma forma mais simples o que é e o que se propõe esse movimento. E uma das principais portas de entrada para o Slow Food é a chamada “Arca do Gosto”. Podendo

ser considerada um segmento do movimento, basicamente, ela é um catálogo internacional - resultado da pesquisa e aprofundamento dos membros - que identifica, localiza, descreve e divulga alimentos especiais e considerados ameaçados de extinção. Além disso, ela engloba sabores locais considerados quase esquecidos, além de receitas tradicionais. “Não é que esses ingredientes não existam mais. Na verdade, é que há dificuldade de encontrá-los porque as pessoas não cuidam deles do jeito certo”, explica Cláudia Mattos, cozinheira e terapeuta holística.

Mattos, que é proprietária de um restaurante Slow Food na Lapa, bairro situado na Zona Oeste da cidade de São Paulo, conta que a “Arca do Gosto” também contempla receitas, formas de cuidar e como proteger cada alimento. “Ela é usada no dia a dia pelos cozinheiros na tentativa de encantar as pessoas pelo paladar e histórias dos ingredientes”, ressalta. Segundo conta Mattos, os chefs de cozinha do movimento gostam de ser chamados de cozinheiros, por considerarem que dessa forma, isso não elitiza a profissão. “A gente ainda se denomina coprodutor. Isso significa que nos comprometemos a apoiar o produtor, indo até o local [de produção] para auxiliá-lo de algum jeito ou até mesmo dando informações interessantes a ele como, por exemplo, contando a história dos ingredientes que usamos nos pratos”.

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No entanto, de acordo com Mattos, um problema que todo cozinheiro do movimento enfrenta é o fato de eles terem muito conhecimento, mas muitos poucos locais para colocá-lo em prática. “Para driblar esse problema, não só o contato com o produtor é importante”, começa. “Eu gosto também de fazer parcerias com outros cozinheiros, bem como dar aulas na

Exemplos de itens de pescado presentes na “Arca do Gosto”: Vieras (Nodipecten nodosus) Ostra-de-mangue (Crassostrea rhizophorae) Sururu (Mytella guyanensis) Tainha (Mugil platanus) Dashicô (sardinha seca e defumada. Também é conhecida por niboshi ou iriko)

No DOQ, são promovidos pratos de pescado que trazem peixes frescos da estação, além de bivalves diversos, que são provenientes de extrativismo sustentável, ostras nativas e de cultivo


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BOM, LIMPO E JUSTO: O PERFIL DO PEIXE

SLOW FISH

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Pirarucu, o grande porta-voz

Muito consumido na região Norte, o pirarucu é um exemplo de peixe na cozinha Slow Fish - por muitos anos, a espécie esteve ameaçada de extinção pela pesca predatória. Agora, o manejo sustentável do peixe finalmente vem ganhando destaque no País. Nos últimos 12 anos, por exemplo, a população de pirarucu cresceu 631% nas três terras indígenas dos Paumari do rio Tapauá, no sul do Amazonas. Mais sobre esse assunto, você confere na edição #41 da Seafood Brasil.

Iniciativas para propagação rápida O Slow Fish teve uma série de iniciativas na promoção do pescado “bom, limpo e justo” ao longo de sua atuação. A criação e compartilhamento de materiais de divulgação para o consumo consciente e responsável, valorização de espécies “negligenciadas” e informações sobre as condições e gestão dos recursos marinhos, estuarinos e continentais no Brasil foram as primeiras ações.

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Durante a Semana Santa de 2014, foi lançado o Desafio Slow Fish, que consistia em juntar pessoas e organizar uma refeição tendo como prato principal uma espécie de pescado oriunda da pesca artesanal, mas que fosse “boa, limpa e justa”. Dessa forma, os restaurantes participantes pesquisaram sobre as espécies e escolheram uma receita tradicional ou inovadora, com a experiência dentro de cada grupo sendo compartilhada através de fotos e de um texto sobre o aprendizado coletivo durante este processo. “Esta é a única campanha do Slow Fish que envolve toda a rede. Iniciativas regionais e locais, de promoção de espécies locais e pouco valorizadas, são executadas por membros do Slow Fish Brasil e da rede em todo o Brasil, em especial os membros da ‘Aliança dos Cozinheiros’”, contou a doutora em oceanografia e professora da Universidade do Estado de Santa Catarina, Patricia Sfair Sunye.

Regras garantem que, mesmo com a pesca, o pirarucu consiga recuperar e aumentar a sua população por meio da reprodução natural

região para quem quer aprender a cozinhar. Assim, posso ouvir suas histórias deles e eles, as minhas. Trocamos experiências sobre como fazemos, como gostamos de cozinhar, de plantar e muito mais”, revela. “Por isso, não se trata só da cozinha, mas sim de todo o processo”, falou. Porém, a cozinheira ressalta que mesmo com essa falta de locais para propagar o conhecimento do movimento, ainda assim, a adesão do público a seu restaurante é muito boa. De acordo com ela, isso acontece porque as pessoas veem a filosofia do movimento além do prato, mas também por conta de um aliado importante: as redes sociais. “Hoje, a gente tem a internet que possibilita muito isso, ou seja, de cada um divulgar e saber dessas histórias através das redes sociais”, exemplifica.

Um cardume de cozinheiros Todos os cozinheiros do Slow Food fazem parte da chamada “Aliança dos Cozinheiros”, que reúne profissionais de todo o mundo inspirados pela filosofia do movimento. E nesse contexto, é claro que os cozinheiros Slow Fish, que trabalham diretamente com os produtos da pesca e de aquicultura sustentáveis, estão inclusos. De forma orgânica, o Slow Fish também tem seus adeptos em restaurantes espalhados pelo Brasil, como é o caso do restaurante DOQ BBQ, em Salvador, na Bahia, que funciona desde 2007 e costuma atrair um público bastante eclético.

Cozinheiro há 21 anos, Caco Marinho está à frente da casa especializada em diversos pratos, incluindo frutos do mar feitos na brasa. Membro da “Aliança dos Cozinheiros” e praticante da chamada ecogastronomia, ele destaca a forma de cozinhar e comer com prazer e responsabilidade. “Sou participante ativo do grupo de trabalho do Slow Fish também. Ou seja, a máxima do alimento bom, limpo e justo é o que guia o meu trabalho e o meu restaurante.” Contando um pouco do seu dia a dia, Marinho revela que seguindo o que defende o movimento, ele mantém um relacionamento direto com os pequenos produtores e pescadores de seu entorno. “Dou preferência a eles na hora de comprar e faço questão de pagar o preço justo. Funciono como parceiro, um embaixador para eles, indicando, divulgando e facilitando todos os processos”, destaca. No DOQ, os pratos de pescado trazem peixes frescos da estação, além de bivalves diversos que são provenientes de extrativismo sustentável como ostras nativas e de cultivo. “O legal é que os clientes apreciam muito o fato de o peixe não ser só um peixe. E isso acontece justamente porque respeitamos os defesos, o frescor do alimento e que ele tenha uma história não só com o lugar em si, mas também com as pessoas que fazem parte dele”, informa Marinho. No entanto, ele ressalta ainda a importância que o

Divulgação

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preparado respeitoso do peixe tem para os clientes e para reforçar o movimento. “Isso é percebido e dá à casa uma grande confiança, além da preferência na hora de escolherem onde eles querem ir”, pontua o cozinheiro. Por fim, Cláudia Mattos explica que não é preciso ficar ditando regras para que alguém entenda, seja ativista ou defenda os movimentos Slow Food ou o Slow Fish. “Existem formas muito mais leves e gostosas para se fazer isso. E nesse contexto, a gastronomia na prática tem que ser nossa aliada”, explica. “Por exemplo, ao invés de usarmos teoria atrás de teoria sobre São Paulo e a importância de consumir as coisas locais, é muito mais fácil apresentar um suco de cambuci, que é

Seguindo o conceito “bom, limpo e justo”, o Slow Fish, logo, também incentiva o consumo de espécies pouco conhecidas, que estejam na safra e que já atingiram o tamanho de primeira maturação. “Um pescado bom é aquele que é deliciosamente fresco, cuja origem possa ser identificada e que seja um produto da

pesca artesanal. Já o pescado limpo é capturado de forma sustentável, em locais, períodos e com petrechos que não prejudiquem a espécie, o ambiente e outras espécies, e processado localmente”, resume Sunye. Por fim, ela lembra que o pescado justo é aquele que tem um valor transparente ao longo da cadeia produtiva, cujo preço valoriza a forma de captura e o saber fazer do pescador artesanal. “Se proceder da aquicultura, a produção deve ser orgânica com espécies locais”, finaliza Sunye. E é dessa forma que o movimento Slow Fish, de forma justa, limpa e boa, nada sem pressa rumo a seus objetivos. Afinal, devagar e sempre, a gente sempre chega lá.

Pescados com qualidade

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do Exija cedor e n for seu alidade a qu dutos pro dos ás ubr Nat

a fruta símbolo do Estado”, diz. Para ela, ao contar essas histórias, as pessoas vão querer degustar a fruta quase que de forma automática. “E isso é muito legal. Afinal, o cozinheiro vai trazer de uma forma elegante ingredientes que a maioria das pessoas desconhecem, fazendo com que eles se apaixonem por aquilo que é feito por aqui de forma boa, limpa e justa”, finaliza.

O sabor que faz a diferença


Personagem

Ela não aceita um “não” Adriana Drica rompeu com velhos paradigmas da pesca artesanal para presidir colônia Z-26 e se tornar a vereadora mais votada de Balneário Piçarras em 2020

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Adriana Drica dá visibilidade às mulheres e aos pleitos da pesca artesanal

Texto: Ricardo Torres

pesca artesanal não existe sem a participação da mulher. Com marido pescador, Adriana Ana Fortunato Linhares, sabe exatamente o que esta frase significa. “O esposo sai às 4h. Então, todos os dias ela o acorda e prepara o café. Quando ele chega, 12 horas depois, ela já está esperando no trapiche com gelo e óleo e leva o peixe ou camarão para casa para preparálo. Só que a mulher se vira com todo o resto: leva o filho à escola, faz almoço, vai ao banco, compra a peça do barco que quebrou…”, enumera Drica, como é conhecida em Balneário Piçarras (SC).

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Agentes ativas da atividade pesqueira, as mulheres são invisíveis aos olhos do Estado e até dentro do próprio setor. Drica foi uma das que não se deixou invisibilizar. Quando teve o primeiro filho, decidiu buscar a licençamaternidade. Na colônia, ouviu: “Esquece, tu não consegue”. Inconformada, foi à Itajaí (SC) cobrar o direito no INSS e o conseguiu, apesar da falta de respaldo da própria colônia que a deveria auxiliar. Se a estrutura criada para defender seus interesses tinha deixado de servir para isso, estava na hora de transformála. Drica “perturbou” o marido, Alex, para que disputasse a presidência da colônia. “Nós somos pescadores. Se nós não nos importarmos em fazer a diferença, ninguém vai se importar”, disse. Ela tinha observado uma tradição de uso político da estrutura ou para benefícios particulares. “As pessoas diziam que estavam fazendo um favor para nós.” A muito custo, Alex conseguiu fazer uma chapa com 12 pessoas. Quando foi colar na parede um cartaz para promover a candidatura, deu-se conta de que seria impossível ele ir ao mar e cuidar da colônia. Foi aí que Drica deu a ideia dela se candidatar no lugar do marido para que assim, ele pudesse se dedicar ao trabalho e ela, à função de presidente da colônia, caso fosse eleita.

No entanto, Drica manifestou seu receio do preconceito à candidatura, que se confirmou em parte: alguns abandonaram a chapa pelo fato de a candidata ser mulher, mas a maioria se manteve a seu lado. A eleição veio e a chapa da renovação venceu. “No outro dia, caiu a ficha”, relembra Drica. A falta de estrutura era flagrante: o local da Z-26 era um dormitório de andarilhos, com mato para todo lado e apenas uma mesa precária com centenas de documentos de pescadores empilhados. Drica, Alex e a tesoureira Luzia fizeram mutirões para organizar tudo, mas faltava braço. Enquanto o marido batia na porta de empresas pedindo apoio, a presidente foi direto ao então prefeito de Piçarras, Leonel Martins, e ouviu a promessa de ter uma funcionária. Como ela não veio logo, Drica se plantou diante do gabinete dele uma tarde toda até que ele cumprisse o que prometeu. Drica se tornou popular pela sua determinação em defender a colônia e os pescadores, o que chamou a atenção de Leonel. O prefeito a convenceu se candidatar a vereadora com o mote “Quem não gosta de política será governada por quem pode”. Sem dinheiro para a campanha, Drica, mãe de duas crianças, passou 45 dias na rua para pedir voto e apresentar uma plataforma em defesa do povo mais vulnerável. A novata na política enfrentou o boicote de tubarões do partido e o ceticismo local para conquistar 536 votos e se eleger com a maior votação de 2020. Dois anos depois, ela sonha em construir um Mercado do Peixe na região para legalizar a venda dos pescadores artesanais. Se alguém lhe disser que não consegue, Drica já está preparada para provar o contrário.


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