Aracaju Magazine 140

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dos pratos. A conversa pouco fluía. O almoço foi realizado e ganhou certamente comentários no Twitter e fotos no Facebook de cada um deles. O cardápio foi divulgado via internet e a reunião virou mais publicidade e satisfação para os que não estavam, do que prazer para os que estavam juntos. Deve ter ficado ali também um compromisso do quarteto para uma próxima rodada, talvez! Já fui vítima disso. Almocei com uma amiga e em pouco mais de uma hora, perdi 30 minutos do tempo dela para o celular. Protestei e disse que estava sendo abandonada numa verdadeira solidão a dois! E a cena se repete em vários lugares, basta observar. Num show, há pessoas que passam mais de uma hora e meia gravando as cenas, para fazer sabe-se lá o que com as imagens. Puxa vida, a pessoa gosta muito do cantor e acaba perdendo tempo registrando cenas para certamente colocar no YouTube para mais uma vez mostrar para quem não foi, que ela estava lá! Não basta mais dizer: tem que ter fotos e vídeos e publicação nas redes sociais. A discussão é ampla e cada um pensa de um jeito diferente. A interatividade é divertida, afinal quem não quer pensar que ‘decidiu’ a cor da gravata de William Bonner ou escolheu o figurino primoroso de Patrícia Poeta? Eu mesma já acompanhei pelo Twitter uma festa inteira nos mínimos detalhes, com direito a ver docinhos e figurino. Amei! Quero deixar claro: adoro internet, sou tuiteira de plantão e divido ideias e ‘potocas’ com amigos e desconhecidos. Tenho mais de 800 seguidores. Sei que não são todos amigos, mas não me custa dividir com eles conhecimentos que julgo importantes. Converso com o marido, dou ordens aos filhos, re-

solvo questões domésticas, acadêmicas e muito mais! Vi uma grande ideia ganhar vida na internet: O SOS Criança, Movimento dos Pais pela Reabertura das Pediatrias no Setor Privado de Aracaju, foi articulado e teve toda a sua mobilização feita pela rede. E foi esse movimento que ajudou o Ministério Público Estadual (MPE) e a Advocacia Geral da União

“A modernidade

trouxe coisas maravilhosas e avanços que melhoraram a vida do mundo inteiro. Mas o que se percebe é o uso exagerado e muitas vezes desnecessário de tanta ‘interatividade’ ”

(AGU) a garantir que os planos de saúde dessem atendimento hospitalar às crianças. E tudo nasceu numa conversa no Twitter. A rede serve para múltiplas funções: encontrar animais, doadores de sangue, informações, emprego e grandes amores, não duvido disso. Concordo quando ouço que a mesma tecnologia que aproxima os que estão longe acaba afastando os que estão perto. O risco é a dependência de uma realidade apenas virtual e é comprovação científica: a internet vira doença quando o indivíduo não consegue mais se relacionar com o mundo real. É na rede que a maioria dos jovens se sente protegida, afinal

todas as inseguranças típicas da idade ganham uma barreira sólida , garantindo a muitos deles o anonimato necessário a sua vida criada no mundo da fantasia. A internet é um maravilhoso espaço para encontros e descobertas. Pessoas que não se encontram há anos vivem uma nova experiência, a exemplo de um argentino que localizou o filho graças ao Facebook, após 10 anos de buscas. O que discuto não é isso: o que discuto aqui é a substituição do encontro pelas redes. Observe festas em escolas: situação típica para pais que não perdem um só instante dos filhos. Fotografar é bom para guardar como lembrança. Gravar também, já fiz muito isso! Mas gente, passar o tempo inteiro da apresentação garantindo as imagens para dividir com quem muitas vezes nem tem interesse em ver as peripécias do seu filhote, é exagero demais! Quem tem filho sabe que eles ficam nos procurando e dizendo: “olha eu aqui”! Não perca a chance de estar de verdade com eles só para garantir um excelente enquadramento. Canso de ver gente pelo Twitter marcando encontros que a gente sabe, nunca vão acontecer. Afagos e mimos que não se concretizam na vida de verdade e interesses que não sobrevivem fora da rede. Já fiz, sim, amigos pela internet e o próprio Twitter serviu para estreitar relacionamentos, mas tudo começa ou acaba na relação com a presença física: ou você já conhecia a pessoa ou passa a conhecer. Com os amigos, agora adotei uma regra: no espaço virtual fotos, mimos, vídeos e tudo mais, mas na hora do encontro real quero privacidade, atenção. E mais: celulares e Twitter desligados por favor! Afinal minha saudade é de carne e osso e alma!

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