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Frases de artistas ConCeptistas

1. O meu trabalho aperfeiçoa o mundo com anseios e anseia o mundo com imperfei ções. (Elsa Torino)

2. O que é proposto é um turismo de protocolos, a evasão na exactidão. (Júlio Grade)

3. O meu corpo só se torna corpo através de rituais. Ofereço-lhe ao longo do dia vários gestos e recito-lhe textos. É na dádiva performativa que me torno real. (Erica Harper)

4. Tento fazer com que a minha biografia seja o mais possível fotográfica. (Fran cesco Manfano)

5. O meu trabalho repugna-me. É tão detestável quanto o estado do mundo e da cultura, que é cada vez mais serial killer. Cada imagem desenrola-se num palco que se vai destruindo. (Mario Gonzalez)

6. O consumo é a propensão para mais reprodução. (Oka Trika)

7. Tendo a fazer arte anónima, a desenhar nas casas de banho, a amontoar coisas na rua a quem ninguém liga e a que chamo esculturas. Tenho documentado este sábio modo de passar por anónima. Exponho depois essas grandes fotografias nos museus. (Manuela Gomes)

8. O material da minha obra são resíduos que permitem estabelecer uma história da imaterialidade da arte. (Yosuph Singer)

9. O centro do meu trabalho é o fim. O fim das histórias, dos poemas, a punch line, o fim dos filmes, o último traço de um artista, o momento em que abandona o trabalho. O resto é palha. (Mike Manolo)

10. As formas só se tornam significativas depois de vomitadas. (Luigi Bomarzo)

11. Interessa-me a estrutura da pura expectativa, na relação com o tempo, fora do esperado e do inesperado. (Bonito Olivetti)

12. Quero realizar obras em performance no jogo, se possível em casinos. A excitação do jogo, o ganhar ou perder dinheiro, etc., sobretudo nas implicações de perder dinheiro. É no lado dos perdedores que me situo. (Joaquin del Jerez)

13. Crio textos que dão a sensação de emular pinturas importantes. As minhas peças recentes são assim notas e narrativas que respondem a algumas obras-primas, sem serem necessariamente descrições. (Benita Crash)

14. O que quero incutir no espectador é a ideia de que tenho um segredo que lhe é negado. É da sensação de frustração que nasce o fascínio. (Marx E. Nest)

15. Trabalho sobre as emoções específicas de cada momento, a finitude, a proximida de, o súbito, a ocasião, coisa própria de míope. Aprendi-o ao ler Alberto Caeiro. Não precisamos nem de limites nem do infinito para nada. (Pedro Bento)

16. Fiz-me artista tornando-me terapeuta de artistas. Gosto desse jogo com os outros. Interessa-me ajudá-los a resolver problemas e aumentar a sua criatividade. Crio indirectamente, e é frequente encontrar soluções para os seus trabalhos que eles nunca pensaram. (Lucas Lucas)

17. Tenho a sensação de ter perdido quer a vida interior quer a vida exterior antes da Perestroika. Não sei onde e como vivo. Exploro obsessivamente a condição de estar perdido. (Mikhail Vochenko)

18. Interessa-me muito o dogma e a ideia descabelada de ilustrar todo o tipo de dog mas da forma mais dogmática possível. (Júlio Rato)

19. Tornei-me fotógrafa para documentar a ausência de tempo e o embaraço com a má memória. (Maria Tzara)

20. Documento as refeições do mundo da arte, especialmente as dos galeristas durante as feira e as dos artistas em férias. (Pepe Rabin)

21. Pinto coisas como quem desvia os olhos. O meu olhar apaixonado teme ver o outro que tanto deseja. Pinto esse estranho momento que é o da cobardia na sedução. (Belinda Boris)

22. Sou como um jogador de ténis que abandonou o jogo mas que continua a ver a bola ser jogada por uma presença invisível. (Zico Zack)

23. Na fotografia trata-se de destruir quer a representação quer os objectos, um de cada vez, para serem desfrutados. (Gioconda Nery)

24. Interessam-me as banalidades e frivolidades que cada um pensa de si. Emocio nam-me os equívocos da auto-estima nos quais todos se reconhecem um pouco. É esse retorcido e medíocre lugar-comum que dá luz às minhas imagens. (Dilip Rushdie)

25. Faço arte reciclando o tipo de material subtil que os conceptuais usaram, sobre tudo o que se tornou fora de moda. Gosto dessa obsolescência retro à qual não é alheia uma certa aura obscurecida. (Miki Kono)

26. Procuro recuperar a noção de graça, de beleza, de bondade, de humildade, de sa bedoria, como em Rafael. Sou insaciável quanto a isso. (Lanfranco Te)

27. Tenho procedido ao luto do velho apocalipse. Já lhe escavei buracos e enterrei-o várias vezes. Continuo a escrever epitáfios sobre ele. Sou o autor post-apocalíptico que persiste em recordar o fim do esplendor do fim do mundo. (Jay Charles)

28. Tento objectualizar o meu esquecimento e o esquecimento dos outros. Faço antirememorações e não há anamnese que me console. (Livia Brown)

29. Sou o artista das desconversas, dos adiamentos, do tédio e do dia seguinte. (Au gusto Barata)

30. Mostro a vertigem da dissimulação, as coisas no seu halo enganoso e retórico, na melancolia do engodo, no prazer de nos deixarmos enganar. (Rony Horny)

31. Insiro-me na tradição de grande passividade que recolhe com lentidão e distração relíquias e destroços. (Julio Sevilla)

32. Não faço obras para museus ou para ficarem em armazéns à espera que os preços subam ou desçam ocupando grandes espaços. Faço antes peças intimistas para pôr no quarto em que se dorme, pinturas que ajudam a adormecer ou que dão alegria ao acordar. É assim que, julgo, mudarei o mundo. É esta a minha revolução. (Levina Castro)

33. Produzo esculturas dentro das quais as pessoas possam dormir e reparar o seu sono a qualquer hora do dia. (Magda Pathos)

34. Tenho criado momentos de consciência poética que eliminam quaisquer esforços analíticos ou questionamentos parasitas. (Abel Bardot)

35. Fotografo a paixão, o momento de desvairado enamoramento. Nisso sou herdeira dos surrealistas e de Hollywood, o que é quase a mesma coisa. (Heloise Vernet)

36. Recupero nos meus vídeos a atmosfera de quem é defraudado, a dor funda que nos faz cúmplices das tragédias. O meu modelo narrativo é a condução trágica para um equívoco, como na morte de Desdémona. (Chris Walter)

37. Tenho trabalhado em mostrar a arte de culpabilizar sob qualquer pretexto. In teressa-me mais a retórica do ressentimento e da culpabilização do que a própria culpa ou os factos comezinhos. Sabemos que é daqui que nascem os nacionalismos e os fascismos. (Glenn Green)

38. Investigo questões que muitas vezes questionam em arte e que são erros inques tionáveis. Faço a arqueologia da beleza inquisitiva, como historiador de velhas ciências. (Ivan Van Zeller)

39. Nestas pinturas a questão essencial ainda está em formação. É pelo facto de só es tar ainda em formação que permite manifestar a sua força. Uma questão quando acaba de ser definitivamente formulada perde metade do gás. (Pietro Salato)

40. Em arte o político não passa pelos materiais, passa pela lógica económica. Faço assim instalações onde a lógica e a economia se manifestam plenamente enun ciando-se. (Francesco Gadda)

41. Uns gostam disto como queijo, outros como armadilha, outros como ratos. (Ro berto Ponti)

42. Pinto quadros como esconderijos onde guardo tudo o que não quero que os outros vejam ou saibam. (Ulisse Giostra)

43. Cremos que há objectos malignos que podem passar por comodidades. Trabalho nesse domínio antropológico que determina se um objecto é maligno ou benigno. Pura magia, pura fraude. (Giorgio Leccese)

44. Sou atraída pela dramaturgia que se insinua nos espaços públicos. (Maria Mo retto)

45. Do que eu sempr gostei é de existir uma matemática do dissídio, seja qual for o sistema. É da produção de dissídio puro, como fertilizante, que me ocupo. (Fia metta Ludovice)

46. Fico feliz quando as verdades me esmurram. É só isso que quero transmitir, o esmurrar didático da verdade num ringue de boxe como em Hemingway, Mickey Spilane e Scorsese. (Alberto Pavesa)

47. Objectos capazes de fazer desaparecer os locais onde são apresentados. (Luigi Manzoni)

48. Prefiro olhar paa pinturas austeras, inocentes, puras, como um jovem monge pre parado para assaltar casto o absoluto. (Alfredo Schwarz)

49. Sacudir as referências das imagens, como se fossem roupa que estendo ao sol, para que fiquem aí, a enxugar, a ganhar o cheiro a luz e o momento unitário. (Marina Lucca)

50. Obras para tempos ficcionais e para espectadores que são personagens. Obras que não se voltam para o futuro, nem são a comédia do passado, nem o aqui e ago ra. Obras flutuantes, como uma névoa chinesa abraçando a paisagem. (Claudia Fiume)

51. Com o iminente desaparecimento da crítica de arte, tenho-me dedicado a obras que são quer crítica, quer autocrítica, sérias recensões dos outros e irónicas obser vações sobre si mesmo. (Paola Stecchini)

52. Faço instalações asfixiantes e ruidosas que impeçam as pessoas de ver, ouvir e pensar. (Edoardo Martorelli)

53. Uma arte do género de não ser aquilo que se espera de artistas do tipo que fazem coisas que não se parecem com arte. (Piero Vila)

54. Temos que ascender à condição de génios, não de apenas uma, mas de todas as artes, por mais falhanços que arrastemos pelo caminho. (Gino Ermini)

55. E aqui torno evidente a clivagem que torna incompatíveis os vários tipos de ficção em que nos movemos, seja no mundo da arte seja nas relações amorosas. Tem que se continuar a suportar as versões delirantes do mundo, como se não houvesse difamação, paranóicos e gente intragável. (Domenica Rubini)

56. Arte é incomunicação é o intransmissível que é pornográfico, a transgressão do inexistente com a excitação que a acompanha. É no seio do não-ser que vai nascer a revolução espetacular. (Giuseppe Flaiano)

57. Revelo as relações brutais entre o poder e a vida em sociedade. As últimas décadas acabaram com as subtilezas e com a piedade, e a publicidade e a cultura já nada disfarçam. Vamos nascer para morrer de raiva e esmifrados. (Marcelo Fino)

58. Quis fazer uma arte divertida que traduzisse a nonchalante profundidade e a

multiplicidade de referências e acabei em artista fria e conceptual com sucesso invejável. Ainda não percebi como é que me aconteceu. (Antonella Pini)

59. Tenho-me dedicado a dar e a transcrever entrevistas. Creio que muitos artistas são geniais a dar entrevistas e a sua restante obra é uma sombra dessa glória. É na tradição de grandes entrevistadas que me quero acima de tudo integrar. (Patrizia Bianca)

60. Gosto de me situar num mundo que exige demais de mim, que me faz irrequieto, angustiado, hiperprodutivo e um pouco selvagem. Penso no Bergman dos anos loucos a multiplicar-se em filmes, encenação de peças de teatro e amantes simul tâneas. Este lado frenético ao lado de um santo budista parece-me uma condição excepcional. (Giancarlo Bianco)

61. O que me interessa na arte actual é a grandiloquência e escala no inútil e no oferecer soluções avulsas para o mundo, como se isso fosse uma tarefa exigida à priori ao artista. Quero que me vejam como um demiurgo ecologista a trabalhar em materiais nobres que encham museus e palácios com instalações monumentais. (Mimo Sabato)

62. A autoria situa-se menos nos objectos e mais na sua mediatização. É no controlo dos significados e da difusão que actuo títulos, explicações, entrevistas, artigos, filmes, auto-curadoria, redes sociais e presença entre meus pares. Crio, além disso, polémicas comigo mesma e sou uma acérrima contestatária quanto ao que de erróneo sobre mim sai. (Alda Conti)

63. As minhas abstracções dão a sentir os orgasmos dos deuses. (Nicolao Santini)

64. Há que encher o mundo de túneis de evasão, como os dos narcotraficantes. A fuga, a alienação, o atopismo etc. Eu sou aquela que não se encontra a si onde se espe ra. Estou no lugar em que já não iria estar. Ou quiçá num não-lugar. (Maria Schmidt)

65. O meu trabalho é pura contestação social, sem subtilezas, referências, comedimen tos e explicações. Nestas coisas temos que ser directos e falar para toda a gente. Só assim se chega lá. (Paolo di Lucca)

66. Tive sempre fascínio pelo cheiro das coisas que não nos chegam na televisão e no cinema. O bafo a aguardente no saloon. O cheiro a muco e a esperma nos filmes

pornográficos. O mau hálito de alguns actores. O perfume de certas paisagens. É isso que mostro em videos acompanhados de cheiros. (Giancarlo Coccia)

67. É como se traduzisse o excesso dionísiaco em calão clássico, no formalismo mais frio. Dirão que a tradução não é lá muito fiel, mas é um facto que Dionísos está lá. (Guido Fiorentino)

68. O meu trabalho é o espancamento do pensamento. Sinto um grande prazer em avacalhar insinuações esotéricas e teorias consistentes. (Egberto Amelio)

69. A realidade é o que se infiltra em cada subjectividade. Temos a memória para mobilar e sinais que nos levam a extenuantes caminhos. (Franco Artese)

70. Desinteressei-me. Tudo isto é sobre o desinteresse (la noia), sobre o absoluto de sinteresse do desinteresse. (Lucio Galli)

71. Segui o conselho de deus e passei a representá-lo sempre de costas, de costas para nós, para o mundo, como se estivesse eternamente amuado. (Ivan Cattapani)

72. O que faço não é um modelo para olhar as coisas, é um meta-modelo que permite descansar o olhar. (Antonio Cenni)

73. Reciclo ideias de outros artista como se fossem lixo. Este lado de reciclagem talvez faça com que o art world seja mais arejado, saudável e biodegradável. (Americo Moncada)

74. Produzo cartoons sobre tudo e mais alguma coisa e espero chegar um dia a inven tar a melhor piada messiânica. (Sonia Karpov)

75. Não pinto nem para mim nem para o mundo. Pinto para os meus filhos e os meus pais, que são tipos refinados e grandes coleccionadores. O meu irmão, por outro lado, detesta arte e adora ir à caça. (Walter Cohen)

76. Gosto que apliquem categorias ambíguas às minhas fotos, assim como adjectivos que exprimam o meio termo, o se calhar, o nem sim, nem não, a hesitação geral do mundo entre o absoluto e a nulidade. (Renata Inverno)

77. Quero a tradução atabalhoada, a dobragem em línguas que não sei falar, a cópia da cópia da cópia, se possível rasurada. Quero sentir os efeitos da entropia, o envelhecimento desastrado. O meu tema é a novidade da degradação e do en velhecimento, sobre a inevitabilidade da novidade, do caos e do desconhecido. (Tomaso Zevi)

78. Sou como aqueles artistas de vanguarda que coleccionam arte antiga. Actual mente exponho o que colecciono e restauro. Tornei-me num antiquário que se faz passar por artista. Numa época assim a arte mais avançada são os velhos mestres depois de restaurados e vendidos mais caros. (Giovanna Polini)

79. Agradam-me cada vez mais os panfletos e os tratados intelectuais. Dos mais an tigos, dos mais obscuros e incompreensíveis. Dão-me um prazer incomparável num mundo viciado nessa banalidade que é quebrar tabus e barreiras. Abremme o apetite pelo que não quebra. Pela leitura difícil. Pela resistência. Pela sabe doria refinada. (Ferruccio Isaac)

80. Quando me falam em campo social ligo a ignição do meu tractor. (Gioachino Grittini)

81. O que mais nos prende na arte é o sorriso e o seio materno, os seios da Vénus de Milo e o sorriso da Mona Lisa. Os dois são inseparáveis. (Giulia Colussi)

82. As minhas fotografias são prolongamentos da escultura arcaica grega. Cuidam da geometria, do hieratismo e da glória que conecta com o mundo dos mortos. (Nunzio Leone)

83. Não quero ter as preocupações típicas das elites americanas e do centro da Europa. De resto identifico-me com as mais naifs formas de encarar a arte objectos mágicos, eventualmente perigosos, que podem destruir quem os compra. (Osvaldo Pancella)

84. Lento, demorado, minucioso, perdido em pormenores, escatológico, irónico, literá rio, ineficaz tudo adjectivos que me classificam e enobrecem cinco décadas de dedicada produção. (Enrico Lombardo)

85. Tenho-me entretido a inventar artistas que detesto, como no livro A Literatura Nazi na América, do Bolaño, e não continuo fascinado com as possibilidades e qualidades do que me é relutante, e em que no fundo me torno… por momentos. (Tito Stregha)

86. Por favor faz-me tudo ao mesmo tempo, devagarinho. (Sergio Schiavo)

87. Quero produzir o efeito de que o pior já passou e de que podemos suspirar, rir como loucos ou desatar a chorar. A experiência do belo, mais do que a esperança, está ligada ao alívio ao alívio da dor e da infelicidade. (Olga Tambelli)

88. Não quero que os outros saibam muito de mim. Sou sofisticado a dar pistas falsas e eliminar resíduos da intimidade. (Jimmy Berti)

89. Tudo é co-dependente. É uma grande ingenuidade declarar que é possível ter uma visão do mundo entre tanto vago e o delirante patch-work que aí vai. (Carmelo Battaglia)

90. O retorno à disfuncionalidade a partir da tempestade. Voilá! (Grazia Cali)

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