Pará+ 87

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fevereiro 2009

Belém - Pará - Brasil

www.paramais.com.br

ISSN 16776968

Edição 87

3,00

ECOS DO FÓRUM SOCIAL CARNAVAL




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O rei momo

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Carnaval em Bragança

10 Pretinhos do Mangue 12 Em Óbidos o Carnapauxis 14 O Carnaboi odivelense 16

Editora Círios SS Ltda CNPJ: 03.890.275/0001-36 Inscrição (Estadual): 15.220.848-8 Rua Timbiras, 1572A - Batista Campos Fone: (91) 3083-0973 Fax: (91) 3223-0799 ISSN: 1677-6968 CEP: 66033-800 Belém-Pará-Brasil

O Carnarimbó em Marapanim

DIRETOR e PRODUTOR: Rodrigo Hühn; EDITOR: Ronaldo Gilberto Hühn; COMERCIAL: Alberto Rocha, Augusto Ribeiro, Rodrigo Silva, Rodrigo Hühn; DISTRIBUIÇÃO: Dirigida, Bancas de Revista; REDAÇÃO: Ronaldo G. Hühn; REVISÃO: Paulo Coimbra da Silva; COLABORADORES: Acyr Castro, Camillo Martins Vianna, Garibaldi Nicola Parente, Sérgio Martins Pandolfo; FOTOGRAFIAS: Alfredo Coimbra, Augusto Sozinho, Advaldo Nobre/Seduc, Claudio Santos, Daniel Alves, Eliseu Dias, Eunice Pinto, Lucivaldo Sena e Tamara Sodré/AgPa, Celso Roberto, Fábio Rodrigues Pozzebom/ABr, Jesiel Rodrigues, Marcelo Martins, Xisto Souza; DESKTOP: Mequias Pinheiro; EDITORAÇÃO GRÁFICA: Editora Círios OS ARTIGOS ASSINADOS SÃO DE INTEIRA RESPONSABILIDADE DE SEUS AUTORES

ANATEC ASSOCIAÇÃO DE PUBLICAÇÕES

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O Novo Português

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Selo em comemoração ao Fórum Social Mundial

Da África para

26 a Amazônia 47

O Balanço do FSM

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4141 5706 Av. Conselheiro Furtado 988. (Próximo a praça Batista Campos)

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o m o m i re

por GARIBALDI NICOLA PARENTE

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rei da alegria, da folgança, da animação, nasceu com muito apetite em meio à fartura e com muito vigor. O rechonchudo de “carne e osso” recebe do prefeito da cidade as chaves do poder para governar com humor, desabafo, irreverência, delírio e simpatia. Monarca de coroa e gonfalão reina com virtude e magia. A coroa remete significantemente ao poder que não é poder, ao único poder que emana realmente do povo por basear-se na sublime inversão dos ordenamentos e preceitos societários. Nesta ambivalência as águas vão rolar através da desmistificação do poder estatal. As vias irônicas garantem mais vitalidade ao modo de revelação dos enigmas da sociedade. Armada a ciranda carnavalesca só resta sassaricar na fantasia para libertar-se de corpo e alma à comunhão nesse mundo as avessas. O contato bem próximo dos brincantes incita a volúpia na sonoridade sensual do tamborim e do retumbão para a purgação carnal do sentimento daquele amor que só quer ser amor.O gonfalão representa a altivez espiritual, é sinal identitário de dignidade e de honra dos foliões na integração elevada à condição de pertencimento mútuo de todos em torno do grande rei em sua imponência de comandar a folia. Momo já usou máscara, hoje não usa mais. A máscara

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não é necessária para exteriorizar sua magia. Seu carisma reside na brincadeira que comanda, na harmonia que cataliza e a afinação que demanda através da purificação ao esconjurar os maus espíritos. Sua postura, seus gestos, seus movimentos anunciam alvíssaras de liberdade e o núncio solene de faustosa emoção. “Deixa minh'alma sagrar Não sou de ficar no ninho. Sou rei de bendita sorte Nas áleas do meu vinho.” Quem é momo? Para buscar a verdade devo dizer que nos tempos do Olimpo, lugar onde habitavam as divindades, grego- latinas, tempo heróico, paradisíaco e fantástico nasceu o deus Baco, filho de Zeus, o deus dos deuses.Baco foi educado primeiro pelas ninfas, depois recebeu os cuidados juvenis das musas. Cresceu sempre risonho e festivo, em pouco tempo foi possuído pelos princípios divinos e escalou as alturas para torna-se rei.Conquistou as Índias em marcha triunfal, um cortejo muito numeroso formado por ninfas bacantes, pastoras, pastores, sátiras, inclusive o deus Pã e outros. Todos os participantes portavam bastões enfeitados com galhos de trepadeiras ornamentais e ramos novos de videira. Em vez de armas soavam os tambores, os pratos, as flautas. Sob os efeitos do vinho a animação ruidosa comportava cantos, danças, gesticulações mímicas, saltitos ágeis e Baco Caravágio


cambalhotas... Baco ficou conhecido como o deus do vinho, das extasiantes celebrações orgíacas. Ele é o mais livre de todos os deuses, sua fantasia liberta os espíritos de qualquer cuidado. Adorado, sua sacerdotisas surgem de todos os lados aos gritos de Evoé Baco ! Deus imortal, ostenta o privilégio de renascer todas as vezes em que haja alguma celebração orgíaca, uma pândega, uma farra, uma folia. Na voz silenciosa de Manuel Bandeira, compartilhamos: Se perguntarem: que mais queres, Além de versos e mulheres?... Vinho!... O vinho que é o meu fraco!... Evoé Baco! O rei momo tem muitas semelhanças com o deus Baco. Momo é filho de um grande amor entre o deus Hipnos e a deusa Nix. Amantes da vida povoaram o mundo com muitos filhos, todos chamados “sonhos”. Morfeu é o filho mais conhecido por ser muito hábil em transmudar-se em diferentes formas humanas e por dormir muitas horas incontáveis. Hipnos também é um dorminhoco inveterado, dorme silenciosamente num belíssimo jardim cercado por canteiros de papoula de cuja flor se extrai o ópio, alcalóide de ação narcótica amortecedora dos sentidos e provocadora da euforia. A deusa Nix traz em si os segredos e os mistérios das trevas sturnas. Então sabe muito bem como desfrutar a beleza da noite, o desejo, a volúpia, o delírio. Ela parece ser mãe de todas as coisas, é mãe do inflexível destino, paradoxalmente mãe do dia. Ao momo, monarca da fuzarca, cabe o poder de ressuscitar ano após o carnaval do samba, do vinho e do amor. O Zé Pereira

samba energiza o corpo para conceber os passos e os movimentos da dança ao som da orquestra de caracaxás, tambores taróis, pandeiros, cuícas, tamborins, saxofones, trombones, clarinetes, recorecos, ganzás, pratos, frigideiras, triângulos, zabumba... Esse samba desperta também Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth, Donga, Sinhô, Pixinguinha, Noel Rosa, Ismael Silva, João de Barro, Haroldo Lobo, Ari barroso, Herivelto Martins, Lamartine Babo, todos poetas do samba. Acorda o “Zé Pereira” folguedo carnavalesco da região do Minho em Portugal, trazido pelo sapateiro lusitano José Paredes para as ruas do Rio de Janeiro em 1846 ao som dos batuques e cantorias: “Viva o Zé Pereira Viva o carnaval Viva o Zé Pereira Que a ninguém faz mal.” Momo reanima os mitos através dos quais nos reconhecemos neles, nós vemos nós mesmos: Cupido, Eros, Vênus... A bebida é o tempero da sensualidade, do amor e dos imortais, Fernando Pessoa tange a sua lira: “Da-me vinho porque a vida é nada”. Rosas de ouro a todos nós. Ó abre alas! Vênus vai passar. Ave Vênus! Ao vinho dos vinhedos de Vêneto. Estamos entre a terra e o céu, consagramos nossos corpos ao prazer e nossas almas ao sonho, legitimo delírio, chama charmosa de brincar de carnaval e de amor.

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a banda Cantídio Gouveia, conhecida como a "Furiosa", a mais tradicional banda de música da cidade, com mais de 70 anos de fundada, instalada em um coreto, na praça Antônio Pereira, que dá início à folia, abrindo o carnaval de Bragança, no nordeste paraense. O cenário do reinado momesco não poderia ser melhor: a orla do rio Caeté, que banha a sede do município. O secretário de Cultura e Desportos de Bragança, Antonio (Toni) Soares, e a secretária de Turismo, Josilane Casseb, coordenaram o evento. Após o show da banda, o grupo Samba de Mesa ganhou espaço para fazer a festa das pessoas que se concentravam na praça. O carnaval bragantino atrai um grande número de foliões, locais e de outros estados brasileiros.

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Na praça Matriz

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A "Furiosa", banda de música Cantídio Gouveia, abriu o carnaval em Bragança

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A abertura oficial do carnaval bragantino

O rei momo Cleiton Fonseca, ao lado da secretária de Turismo de Bragança, Josilane Casseb Drag queens participaram

Carnaval em

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Fotos: DAVID ALVES/AG. PARÁ

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” E U G N A M m Curuçá", com cerca de 40 mil habitantes e 250 anos de fundação, localizada no nordeste paraense, na região do Salgado, distante 130 quilômetros de Belém, os "Pretinhos do Mangue", são o destaque da quadra momesca, onde a originalidade é a principal característica da época carnavalesca. Ressaltando a importância da preservação do mangue, dos ecossistemas que servem à cidade e do combate à devastação, que ameaça o meio ambiente, eles são conscientes da necessidade de conservação do mangue e dos caranguejos, uma das principais fontes de geração de renda para famílias locais. Segundo eles, a ameaça de extinção vem dos catadores do crustáceo de cidades vizinhas, que estariam matando até a fêmea, chamada "condessa". O catador de

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Sujo de lama do mangue


A lama tingida de vermelho é pra homenagear os Guarás

Governamental (ONG) de defesa do meio ambiente: Associação Sócio-ambiental e Cultural de Curuçá Pretinhos do Mangue. O bloco já doou à cidade 11 depósitos para coleta de lixo.

Os foliões se sujam de lama do mangue para passar uma mensagem de preservação do mangue e da natureza

Curuçá garante que não captura a fêmea. Cada uma gera até 30 mil filhotes, de acordo com o coordenador do bloco, Edmilson Campos, conhecido por "Cafa". Para participarem do bloco, basta disposição para cobrir o corpo com a lama do mangue (a lama não fazer mal à pele). É o verdadeiro “abadá natural”. Os Pretinhos do Mangue festejaram o registro oficial como Organização Não

Passam a lama do mangue para passar uma mensagem de preservação do mangue e da natureza Pretinhos do Mangue defende a preservação do mangue

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Foto: LUCIVALDO SENA / AG. PARÁ

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s i x u a p a n r a C E Em Óbidos o

m Óbidos, município do oeste paraense, à margem esquerda do rio Amazonas, a 950 quilômetros de Belém, a intensa participação popular e ausência de escolas de samba assemelham o carnaval com o de Olinda, em Pernambuco. Pelas ruas da cidade, no sob e desce das ladeiras, desfilam apenas blocos, que este ano reuniram mais de 100 mil pessoas, em quatro dias de folia. Doinícioaofimdodesfile,aempolgaçãodosblocosagradouaos turistas, que chegaram de municípios vizinhos, como Santarém, Terra Santa, Alenquer, Monte Alegre e Oriximiná, e também de Manaus (Amazonas), Caracas (Venezuela) e países da Europa. A cada ano, a população local, de 45 mil habitantes, ganhanocarnavalumacréscimoestimadoem40%. No carnaval obidense, mais conhecido como Carnapauxis, o destaque é o folião que não tem idade nem raça, todos indistintamente crianças, jovens, adultos e os que fazem parte da terceira idade são contagiados pela alegria e caracterizam-se de Mascarado Fobó. O ponto alto da brincadeira é a “batalha de pó”, travada entre os brincantes. Nos desfiles oficiais todos os blocos fazem reverencia ao Fobó.

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Mascarado Fobó


Óbidos em festa

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E lá vai pó

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Fotos: DAVID ALVES/AG PA

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O ODIVELENSE São Caetano de Odivelas, cidade do nordeste paraense com 19 mil habitantes, distante 93 quilômetros de Belém, uniu a tradição do Boi de Máscara – único no mundo – à folia de momo. Dessa fusão nasceu o Carnaboi Odivelense. Durante o Carnaval, as ruas do município ficam coloridas com o arrastão dos Bois de Máscara e seus personagens multicoloridos, hilários e originais. Além do arrastão e apresentação do Boi de Máscara, o carnaval da cidade é marcado pela presença dos blocos, puxados por bandinhas de sopro e percussão. Em São Caetano existem 10 grupo s de Boi de Máscara, três deles na zona urbana e sete na zona rural. Os mais ativos e conhecidos são Boi Faceiro, Boi Tinga e Boi Mascote. As vestes, adereços e o boi são confeccionados pela comunidade.

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Os cabeçudos

Mascarados e cabeçudos, como é o caso do Boi Faceiro fazem a festa do Carnaboi


O boi está no sangue do odivelense, no caso o Boi Faceiro

Uma das figuras mais hilárias do Boi de Máscara é o Cabeçudo, personagem volumosa. O cabeçudo é uma figura jocosa da cultura e no Barrigudo, existe uma conotação de crítica que pode representar qualquer figurão da política ou uma personalidade pública. Dos mais vistosos do Boi de Máscara é o Pirro (diz-se Pirru), referência livre a Pierrô. A secretária de Cultura, Esporte, Lazer e Turismo, Maria Nazides Ferreira Soares, aposta tudo na fusão carnaval-boi, em decorrência do boi “estar no sangue do odivelense e ter semelhança com a farra momesca”. Outra peculiaridade do município, segundo a secretária, é a tendência musical da população, que guarda relação com igual tradição das escolas.

Os blocos carnavalescos são acompanhados por bandinhas de músicos locais, como é o caso do “Lacraias”

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A Folia é Aqui!, foi o tema do Carnarimbó, cuja programação inclui desfile de blocos de enredo, escolas de samba, trios elétricos e shows diários de carimbó, um ecletismo que valoriza manifestações folclóricas características do Pará

O Carnarimbó em Foto: LUCIVALDO SENA / AG. PARÁ

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m Marapanim, na Terra do Carimbó, o Carnarimbó, comanda a folia com a sensualidade e a alegria dos foliões em um dos ritmos mais característicos da rica cultura paraense, contagia moradores e visitantes. As agremiações se revezam em frente a duas quadras, o grupo Raízes da Terra com suas dançarinas e dançarinos, acompanhado pelos carimbozeiros, em seguida o conjunto Japiim e o “Novos Canarinhos”.

Mestre Bento Alves no Carnarimbó Integrante do bloco “Japiim”

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Fone: (91) 3248-5651 EDIÇÃO 87 [FEVEREIRO 09] p a r a m a i s . c o m . b r

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Camillo VIANNA

Amazônia. Recuperação de Cursos D'água nas Regiões Bragantina, Gurupi, Salgado e das Ilhas do Baixo Tocantins

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entro do projeto de ocupação da Amazônia, parece não haver duvida que a prioridade esta sendo a eliminação, a mais rápida possível, da mata ciliar dos pequenos cursos d'água, igarapés, furos e paranás, resultante dos projetos de agropecuária e retirada de madeira. Os novos colonizadores com maior representatividade são os centrosulistas, altamente treinados nesse tipo de atividade, pois, praticamente, já deram sumiço a Mata Atlântica, só restando, como se diz por aqui, uma besteirinha de nada, ou seja, os tais 7% residuais. Depois de longo isolamento, a Amazônia está sendo invadida pelos novos bucaneiros e flibusteiros, migrantes do Sul e Sudeste, que atuam com extrema ferocidade, derrubando e queimando tudo o que encontram pela frente. Na década de 70, levantamento dos cursos d'água em áreas de atuação da Sociedade de Preservação aos Recursos Naturais e Culturais da Amazônia (SOPREN) sob presidência do autor, em parceria com o professor Ronaldo Araujo, da diretoria do Centro Rural Universitário de Treinamento e Ação Comunitária (CRUTAC) da Universidade Federal do Para, foram contabilizados 250 igarapés, alguns já secos e outros que secavam completamente durante o verão, quando as chuvas suspendem na Amazônia. Outro aspecto interessante a que os veios d'água com menos de um palmo de profundidade e que servem apenas para as mulheres lavarem roupa e para amolecada brincar, apresentam vistosas placas metálicas, ali colocadas pelo Governo Federal para identificar o tal filete d'água como rio, atravessado por ponte, igualmente metálica, como é o caso de um deles apelidado pelos construtores de Velho Barreiro, O Gaúcho, entre outros, na P.A 150, que liga Marabá ao município de Itupiranga, a margem do rio Tocantins, bem próximo ao lago de Tucuruí que abastece a hidrelétrica do mesmo nome. Na região das ilhas do Baixo Tocantins paraense, há abundante ocorrência de uma das mais belas e importantes palmeiras da mata ciliar, que é a Euterpe olerácea — o açaizeiro. Da década de 70, em diante, essa palmeira vem sendo devastada em verdadeira carga de cavalaria, na busca desenfreada de palmito, por catarinenses,

Ponte metálica atravessando filete d’água

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gaúchos e paulistas, que instalaram pequenas fabriquetas espalhadas pela região. Os rótulos dos recipientes para exportação indicavam que o material, ou seja, o palmito era originário da terra dos espertíssimos predadores. Tal denúncia foi feita por ex-governador do antigo Território Federal do Amapá em suntuosa reunião realizada na SUDAM, em Belém, ponto de maior dinamicidade em corrupção e coisas afins que acabou sendo fechada talvez por excesso de seriedade do pessoal alienígena e de uns quantos crias da casa. A SOPREN e entidades vinculadas deram origem a chamada Operação Princesinha, denominação dada a palmeira considerada pelo mestre Oswaldo Cruz, a mais bela do Brasil, que visa a preservação e disseminação do açaizeiro. Logo no inicio das atividades foi fácil identificar outras espécies

Euterpe olerácea, palmeira considerada pelo mestre Oswaldo Cruz, a mais bela do Brasil

existentes na várzea como, andiroba, anuerá, seringueira, murumuru, miriti, pau mulato e outras cujas sementes vêm de bubuia, flutuando, o chamado pelos ribeirinhos, lixo da maré. Em Taciateua, na região bragantina, foi instalada pela SOPREN, no início da década de 60, na margem do rio do mesmo nome uma das mais importantes bases de produção de mudas e distribuição de sementes. A comunidade local foi sensibilizada para defender a natureza, e, em consequência fará realizar, em dezembro próximo, a IX Eco-Taciateuara, com a participação de alguns municípios próximos. Na região do Salgado — parte da atlântica, agora chamada Amazônia Azul — no município de Vigia de Nazaré, vários rios e igarapés e várzeas representam a maior e mais antiga atuação da


Da esquerda pra direita:

entidade preservacionista amazônica de conservação de curso d'água, com lançamento ciliar e plantio de mudas de espécies diversas coma mogno, macacauba, cedro, muruci, açaí e pau d'arco, este tradicionalmente usado na construção de embarcações típicas da região. Enormes cargueiros O rio Apehu, em Castanhal foi abastecido com sementes, as mais diversas, levadas de Belém, pelo médico Helio Rodrigues Titan, doadas pela SOPREN. O engenheiro agrônomo Silvério vem plantando ao longo dos anos, mudas de variadas espécies na várzea do rio Caraparu em terreno de sua propriedade, produzidas com sementes dadas pela entidade conservacionista. O capitão-médico Pedro de Araujo Barbosa além do lançamento ciliar distribui sementes e mudas igualmente doadas pela SOPREN para pescadores, lavradores, preparadas em sua propriedade situada no município de Curuçá. Faz parte do projeto da SOPREN o bombardeio ecológico, agora em parceria com o Congresso Internacional Israelita de Sociosfera na Amazônia (CISA), que consiste no lançamento de sementes por aviões pertencentes ao Aeroclube e a Forca Aérea Brasileira, em

áreas que incluem os cursos d'água muda de andiroba, murumuru com margens devastadas. palmeira do miriti e pau mulato Enquanto se fala em todo o mundo que a Amazônia a um imenso manancial de água doce sempre fica a ressalva de que ele não é permanente, não só pela agressão, como pelo desaparecimento de pequenos cursos d'água. Pouca referência se faz a fenômeno bem antigo e que agora vem sofrendo alguma observação, que e a hidropirataria. Enormes cargueiros no torna viagem com porões vazios, enchem os tanques de água dos rios Amazonas, Pará e outros. A SOPREN lamenta comunicar que um dos seus mais eficientes colaboradores Rui Guilherme Chaves, médico, faleceu em acidente de aviação. Na companhia do presidente da SOPREN sobrevoou em seu avião partes devastadas da região fazendo "Bombardeio Ecológico" com sementes de tachi preto (Taxigalia s. p.), sendo um dos pioneiros dessa atividade na Amazônia. *SOPREN/SOBRAMES

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Acyr CASTRO

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A Eterna Neucília

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uando chega fevereiro, não há como lembrar o dia 25, data em que veio ao mundo a maior e melhor de todas as mães do mundo sem desmerecer de nenhuma outra, que todas o são a partir das Mães das mães, minha madrinha de batismo graças à imposição da vovó Santa, Nossa Senhora Auxiliadora dos Cristãos. Neuza Paiva de Castro, filha de Emanuel Luiz de Paiva e de Cecília Araújo Monteiro de Paiva, é a flor das flores, aquela que deu ao mundo diversos filhos todos postos, desde cedo, a serviço de Deus no fundo e no Neuza Cecília conteúdo a espalhar os ensinamentos da Palavra da Eternidade contra a qual não prevalecerão jamais as forças do mal. A data tem símbolo também para quem ama o Pará e o cinema, já que foi, naquele distante 1912 que nasceu o Cinema Olímpia. Era uma época diferente desta nossa de hoje. Outros tempos, outras idéias, outro tipo de viver e de conviver. No entanto, pensando bem, quão parecidos. Semelhantes, talvez, na sua própria dessemelhança. Então o mundo se preparava para Primeira Guerra Mundial, uma guerra pior que a segunda que seria infinitamente mais tecnológica, nuclear e atômica. Porém a partir da hecatombe de 1914 jamais os seres humanos pararam de se guerrear, liberados os piores instintos animalescos e vis. Neucília, como amorosamente gosto de chamar, faz infinita falta e é de sua ausência e por causa dela que todos sobrevivemos, seus filhos ainda de pé, além de mim a Cecília, a Nina Rosa, a Suely, a Marildinha com quem compartilho teto e pão. Uma falta de seis (6) anos neste março em que está saindo publicada a revista “Pará +” dos amigos diletos Ronaldo e Rodrigo Hühn. E falta que não para de doer, que angustia e faz chorar e para o que inexiste remédio humano. Falta terrível,

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sufocante, às vezes difícil de suportar. Quem experimentou e experimenta com estas palavras de tamanha pobreza em face do que expressam. Mil Duzentos e Doze e Dois. Ano que não dá para deslembrar, de sentido amplo e dir-se-ia que planetário. A dor da perda é dor que rasga, que derruba, que sufoca, impossível de exprimir em simples palavras. Aqueles que passam por isso é o que entendem bem. Ficar sem pai é doloroso mais perder a mãe é indescritível. Não possuo um modo expressivo de explicar escrevendo ou falando. Somente sabe o que digo os que estão na mesma situação. Se a poesia se considera impotente ante tal desespero, imaginem a prosa fria com seus efes e erres. Chorar é o que resta, nada além, é o silêncio e este vazio que sobrenada o invisível. Olhar o distante como se pudesse revivê-lo, em mim e nas coisas, a pairar em meio às lágrimas sentidas, emocionado pela esperança de poder um dia rever a flor-mãe na Eternidade de Jesus o Cristo de Deus nosso Salvador. Um beijo, mãezinha, um beijo e perdão se não tenho correspondido às suas expectativas. O que busco colocar nestas páginas de tamanha pequenez ante a magnitude do que pretendo fique, todavia a marcar uma data inesquecível e uma inigualável criatura que simboliza hoje e sempre. Neuza Cecília, de tradicional família de músicos e poetas, dirá lá em cima, do céu que a todos encobre, “tenha calma, filhote, não chore nem se angustie, estou bem, vi finalmente a face do Senhor e sei agora toda a verdade”. Escrever mais o que? Tudo é nada e nada é tudo para quem compreenda a dor do amor verdadeiro e impar. E até abril, quando Deus e Nossa Senhora, com a compreensão dos amigos diletos que editam esta bela revista. Cião. (*) Jornalista e Escritor


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Sérgio PANDOLFO

O NOVO PORTUGUÊS

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osta a viger oficialmente a partir de 1º de janeiro de língua oficial da ONU (por ora é somente língua de serviço), que 2009 a reforma que unifica a ortografia da língua argumenta: qual a grafia a adotar, a lusa ou a brasileira? E vejaportuguesa, o que se verifica na mídia, em todos os se: nossa viçosa “última flor do Lácio” é uma das primeiras do seus segmentos, é não só uma total desinformação da mundo moderno, eis que é a quinta (5ª) língua mais falada do população em geral como opiniões as mais desencontradas de Mundo (cerca de 300 milhões de almas) e a terceira (3ª) no pessoas “doutas” consultadas, com apreciações muitas vezes Ocidente, sendo uma das consideradas línguas universais de disparatadas, hesitantes, cultura, presente nos seis conflitantes e até de veemente continentes e oficial na União repúdio às novas regras do no Brasil. Europeia. Para o Brasil, que Acordo Ortográfico, que, aspira a ter assento permanente Ela não corre, elaboradas por gente de naquele foro mundial mas ocorre.” supranacional, isso é quase inquestionável renome e competência, diga-se logo (em condição sine qua non. Herbert de Souza, o Betinho que se há de ressaltar o filólogo e O acordo em nada influirá na lexicólogo Antônio Houaiss, principal responsável pelo processo oralidade, somente na grafia, e se limitará a tão-somente 0,5% de unificação), são poucas e extremamente objetivas, simples e simplificantes do nosso rico idioma. Haverá um período de adaptação de quatro anos (até 31/12/2012) em que as duas normativas serão aceitas, mas temos absoluta certeza que dentro de seis a doze meses ninguém mais terá dúvidas ou relutâncias. Como já acontecera aquando de outras reformas até mais profundas e complexas. A redizer Fernando Pessoa: “Primeiro estranha-se, depois entranha-se”. A Língua Portuguesa é a única que contempla duas normas ortográficas oficiais: a do Brasil e a de Po r t u g a l e s u a s e x- c o l ô n i a s independentizadas a partir de 1975. E Hipotética bandeira Brasil-Portugal a representar isso prejudica acordos comerciais e de a concertação dos dois países para a implantação do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa amizade entre nações, a elaboração de documentos diplomáticos e turísticos e tem e 1,6% dos vocábulos usados no Brasil e em Portugal, impedido, até aqui, a adoção do português como reciprocamente. O ser humano, todavia, é dotado de uma propriedade física chamada inércia, que se opõe a toda e Fernando Pessoa. qualquer modificação de seus atos e movimentos, daí a reação Depois de Camões, o maior poeta português de tantos daqui e da fatia lusitana. Desde os primórdios da Era

Há mudança mas anda. Não corre,

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Bandeiras das oito nações de língua oficial portuguesa Legenda de um ex-voto de 1743. Tente ler!

Moderna o português já passou por várias mudanças de seus cânones gráficos, sempre para melhor, é claro, como esta também o é, pois...para frente é que se anda. Os textos produzidos nos séculos XVI ou XVII são praticamente incompreensíveis ou ilegíveis nos dias correntes. Será que alguém tem saudades ou nostalgia da ortografia etimológica, que antecedeu imediatamente à atual, fonética, e pretenderia voltar a escrever asthma, augmentar, phthisica, orthographia, rhythma, philosophia, physiotherapia, pharmacia, Nictheroy, Philadelpho, em vez de asma, aumentar, tísica (tuberculose), ortografia, rima, filosofia, fisioterapia, farmácia, Niterói e Filadelfo? Duvidamos. Heráclito, filósofo grego da remota Antiguidade, já sentenciava: “Tudo muda. Só o que não muda é a mudança”. Um jornalista (?) de uma folha paulista foi execrante: “A reforma irá apenas criar o incômodo de exigir de alguns milhões de usuários que percam algum tempo... (...). Se há algo a ser eliminado, não são acentos e hífens, mas a estultícia de burocratas”. Eis aí a inércia e a intolerância de mãos dadas! Outra figura auscultada, escritor amazônida (não-parauara), mas radicado em S. Paulo, havido como “de vanguarda”, consultado disse “discordar do acordo” por ser incompleto, não corrigir todas as divergências, rematando com esta pérola: “Espero que seja a última (reforma)”. Onde fica a coerência? Se não foi completo... Acabará se tornando um escriptor bilíngüe. Bem mais feliz e lúcida é a afirmação do músico e ex-ministro da Cultura, Gilberto Gil: “O Acordo Ortográfico é benéfico para todos os usuários da Língua Portuguesa e para sua afirmação como língua mundial de cultura. Adotar o Acordo é manter o interesse vivo na língua. É essencial estabelecer uma ortografia comum, já que a língua falada é etérea, fluente e todos nos entendemos”. Ocorre que não cabe ser contra ou a favor. A normativa atual tem força de lei e, portanto, cabe cumpri-la. E mais: como Brasil e Portugal já assinaram seu reconhecimento a Língua Portuguesa passa a ter oficialmente, daqui pra Roseta flamular alegórica do Acordo Ortográfico dos países lusófonos

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frente, um só jeito de escrevera. Que o acordo não foi completo é vero, mas avançamos muito. Não se pôde fazer o melhor? Fezse o melhor que se pôde. Nos próximos avançaremos ainda mais, até à perfeição. Ademais, a língua é algo vivo, mutante, por isso que precisa de periódicos acertos; não fora assim estaríamos a escrever à moda de Camões. Aliás que esse notável poeta quinhentista, Príncipe Perpétuo dos Poetas da língua portuguesa já nos advertia, em versos de um de seus geniais sonetos, que: “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades/ Muda-se o ser, muda-se a confiança/ Todo o mundo é composto de mudança/ Tomando sempre novas qualidades”. Muitos se dizem contra porque eliminou-se o trema. Sai o trema, mas entram mais três símbolos gráficos: as letras k, w e y são reincorporadas ao alfabeto conferindo retidão aos Darwins, Franklins e Yolandas, só para pôr exemplos. Também nutríamos especial simpatia por esse charmoso adereço que coroava o u em determinados vocábulos, mas, que falta fará? Portugal (e seus seguidores) nunca o usou e todos reconhecem a correção do falar luso; ninguém por lá diz “consekência” ou “linghiça”, ó pá! Isso para não falar que alguns “empolados” daqui punham trema onde os não havia e pronunciavam qüestão, qüestionar, adqüirir, em vez de questão, questionar, adquirir; já outros costumam acentuar letras que normalmente não o são, proferindo, alto e bom som, os intoleráveis gratuíto, circuíto, fortuíto, desiguína, adevogado, peneu, rúim, portanto... Acode-nos à lembrança

“Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades/ Muda-se o ser, muda-se a confiança/ Todo o mundo é composto de mudança/ Tomando sempre novas qualidades”


que, quando estudante de medicina, tivemos um professor de bom saber científico e reconhecida cultura geral que só pronunciava “frekência”, “sekência”, “unghento”, “trankilo”; e isso em plena vigência dos dois pontinhos sobrepostos ao u. Ademais, e isto é importante, aprende-se primeiro a falar e somente depois a escrever, consequentemente (assim mesmo, sem trema), a pronúncia correta independe da grafia. Havia acentos demais. Algumas palavras levavam até três ou mesmo quatro acentos. Querem ver? Aí vão exemplos: qüinqüênio, qüinqüefólio, qüinqüenérveo (3), qüinqüelíngüe (4). Eliminaram-se os inúteis. É de se ressaltar o fato de que a grande maioria dos que se declaram contrários às novas regras ao serem inquiridos dizem desconhecerem-nas, ou seja, são do tipo: “Não li e não gostei!”. A alegação que muitos fazem que a reforma teria sido forçada pelas companhias editoras de livros didáticos (incluindo dicionários) e enciclopédias absolutamente não procede, eis que essas publicações são reeditadas regularmente a cada um ou dois anos. Os livros impressos anteriormente à reforma também não perdem seu valor naquilo que têm de essência ou conteúdo doutrinário, continuarão a ser manuseados e ninguém os desprezará, obviamente. E mais: daqui a algumas décadas poderão vir a ser raridades. Padronizou-se a utilização do hífen; as regras são mais abrangentes, há menos exceções. As dúvidas, que certamente surgirão no início, poderão ser dirimidas com a aquisição de manuais já disponíveis nas bancas de revistas, livrarias e

Representação alegórica dos países da comunidade lusófona: Brasil, Portugal, Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné Bissau, São Tomé e Príncipe e o caçula Timor-Leste

Mapa mundi mostrando a distribuição intercontinental dos países de expressão oficial portuguesa

outros locais (a propósito, nosso genuinamente parauara paid'égua perderá o hífen) e, definitivamente, a partir de fevereiro, com a próxima edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa – VOLP, preparado pela Academia Brasileira de Letras em estreita colaboração com a Academia das Ciências de Lisboa, silogeus oficialmente encarregados, nos dois países, para a resolução de questionamentos referentes ao vernáculo e que, por isso, tem força de lei. Ah! E para geral tranquilidade (sem trema e sem pejo, faz favor) os computadores logo, logo, serão adaptados e equipados para corrigir eventuais deslizes. “Inscreve-se, finalmente, a língua portuguesa no rol daquelas que conseguiram beneficiar-se há mais tempo da unificação de seu sistema de grafar, numa demonstração de consciência da política do idioma e de maturidade na defesa, na difusão e na ilustração da língua da lusofonia”, afirma Cícero Sandroni, presidente da Academia Brasileira de Letras. Por fim, a imprensa, em especial os jornais (inclusive as versões na internet), que muitos têm como única leitura e até são usados como elemento de instrução nas escolas, jogam um papel fundamental na assimilação das novas regras e deles se espera a pronta adesão ao Acordo Ortográfico; da mesma forma, as revistas de circulação nacional (e até internacional) como algumas hebdomadárias (semanais) ou mensais já se aprestam para a adoção da nova (ou será novíssima?) forma de grafar os vocábulos de nosso rico e sonoroso idioma em que Camões, poeta-mor da lusa língua, “cantou o peito ilustre lusitano” e “chorou, no exílio amargo, o gênio sem ventura e o amor sem brilho”, para bem de todos e felicidade geral das nações (oito) que compõem a comunidade lusófona. *Médico e escritor – SOBRAMES

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Fotos: David Alves/ Ag. Pará

Selo em comemoração ao Fórum O Ministério das Comunicações, a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos e o Governo do Estado lançaram Selos em homenagem ao Fórum Social Mundial

N

o lançamento dos Selos postais dos rios brasileiros São Benedito e Paranaíba, editados pelos Correios, a governadora Ana Júlia Carepa destacou a importância do Fórum Social Mundial não apenas na promoção de debates de interesse da Amazônia, do Pará e do mundo, mas também pela possibilidade de investimentos duradouros que o evento trouxe para o estado, especialmente para Belém. Os dois selos são alusivos ao Fórum Social Mundial foram lançados no Palácio dos Despachos, em Belém. Com o tema Rios Brasileiros: Parnaíba e São Benedito – Patrimônio do Brasil, os selos destacam a importância dos dois rios no contexto ambiental e no desenvolvimento nacional. A tiragem total será de 300 mil unidades, sendo metade para cada rio. Aldenice Waterloo, uma das organizadoras do FSM, destacou que sem o apoio dos governos federal e

O Selo em comemoração ao Fórum Social Mundial

A MESA OFICIAL... A Governadora Ana Júlia Carepa, o deputado federal Paulo Rocha, a secretária de Estado de Governo, Ana Claudia, Aldalice Otterloo da Coordenação do Comitê local para o Fórum Social Mundial para 2009 e Antonio José Vieira, diretor adjunto dos Correios no Pará, no lançamento dos Blocos de Selos Rio São Benedito no Pará e do Rio Paranaíba que passa pelos Estados de Minas Gerais, Goiás e Matogrosso do Sul em homenagem ao Fórum Social Mundial

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Social Mundial estadual o FSM não seria realizado, já que o evento requer investimentos em logística, de responsabilidade do poder público. Ela observou, no entanto, que a autonomia da promoção do evento foi preservada. Aldenice acrescentou ainda que todos os investimentos realizados vão ficar em Belém e vão Aldalice Otterloo também participou contribuir para a melhoria da qualidade de vida da população da cidade. “O FSM vai propor diretrizes, ações conjuntas e intervenções para que as políticas públicas de governo

sejam aplicadas com qualidade na redução da pobreza em todo o mundo”, acrescentou, rebatendo as críticas de que o FSM não é propositivo. O deputado federal Paulo Rocha (PT), líder da bancada paraense no Congresso Nacional e que pleiteou a liberação de recursos para as obras de apoio ao FSM, enfatizou que Belém vive um momento histórico e que os Correios foi sensível ao estampar em Selos um momento tão importante como este. Para Ana Júlia, os Selos lançados pelos Correios representam as riquezas naturais do Brasil e da Amazônia, no caso do rio São Benedito, localizado no sudoeste do Pará, e representa um apoio da empresa pública ao debate sobre a preservação da natureza, dos rios e das florestas brasileiras. O Bloco de Selos

Estiveram presentes varias autoridades locais

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Fotos Celso Roberto, David Alves, Eunice Pinto, Lucivaldo Sena, Tamara Saré / Ag. Pará, Marcelo Martins e Jesiel Rodrigues

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Marcha pelas ruas e avenidas marcou a abertura do FSM Amazônia


Da África para a Amazônia

U

ma marcha denominada “Da África para a Amazônia”, pelas ruas e avenidas marcou a abertura e o início oficial da nona edição do Fórum Social Mundial (FSM), em Belém do Pará, com a presença de movimentos sociais e organizações da sociedade civil, reunindo várias etnias. Antes da grande caminhada de abertura do Fórum Social Mundial (FSM) 2009, negros e indígenas fizeram uma saudação inicial aos participantes em ato sociopolítico, organizado pelo Centro de Estudos e Defesa do Negro no Pará (Cedenpa), Associação dos Filhos e Amigos do Ilê Uya (Alfaia) e Grupo de Frente ao navio do Greenpeace na Estação das Docas, o início da concentração da marcha

Trabalho do Índio. A manifestação ocorreu em palco armado na praça Pedro Teixeira, centro da capital do Pará, assistida por milhares de pessoas. Eles representaram a vinda do FSM da África para Amazônia, a despedida dos africanos e as boas vindas dos nativos. “É uma cerimônia em homenagem à terra e às águas, em que invocamos as divindades africanas Omolu e Ogum, respectivamente, e Nanã, que representa a mistura harmônica. Como são divindades ancestrais fazem parte da criação do universo, na cosmovisão africana, da busca do eterno equilíbrio da diversidade”, afirmou Edson Catendê, coordenador da Alfaia. Zélia Amador de Deus, do Cedenpa, disse ainda que “negros e negras brasileiros são resultado do A marcha debaixo da chuva tradicional


doloroso sequestro aos nossos povos no continente africano. Não brotamos no meio do oceano Atlântico. Nossos ancestrais são portadores de muita cultura e valores civilizatórios”. No ritual afroreligioso, foram lidos poemas de líderes negros, como Nelson Mandela (África do Sul) e

Amílcar Cabral (Guiné-Bissau). As cantoras Antónia Jimenez (Cuba), Agnez Ruiz (Catalúnia) e Cláudia Peniche (Brasil) saudaram os participantes com a música “Gracias a la vida”. Em seguida, teve o ato de transferência do FSM para os povos indígenas na Amazônia, “presente e futuro da humanidade”, debaixo de forte chuva que caiu em Belém. Os índios Tembé do município de Santa Maria do Pará marcaram presença. “Sem a nossa terra é difícil resgatar nossas raízes”, ressaltou Pina Tembé. Outras etnias do Pará, Amapá eAmazonas também estiveram representadas. Para Alfredo Sfeir-Younis, coordenador do Instituto Zambuling para la Transformacion Humana, o FSM é um espaço público que reúne 100 mil pessoas, aproximadamente, visando a transformação não apenas do Estado. “Este é um momento histórico e cultural para o mundo, mas não só para economia. Ela está à falência. Hoje, não devemos pensar apenas em

A governadora na caminhada

A religiosidade africana, representada pelos orixás, esteve presente no ritual de saudação aos participantes do FSM

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mudar governo, mas uma nova forma de governar sem esquecer das problemáticas sociais. A crise é uma crise coletiva”, avaliou Após a saudação dos Negros e Indígenas a marcha saiu da escadinha do Cais do Porto, na orla da Baía do Guajará (Cidade Velha) e seguiu, até a Praça do Operário, em São Brás, percorrendo cinco quilômetros pelas avenidas Presidente Vargas, Nazaré e Magalhães Barata. Cerca de 50 mil pessoas seguiram a caminhada, grande parte embaixo de chuva, dentre elas, estudantes, índios e quilombolas, representantes de movimentos religiosos, cooperativas, organizações ambientalistas, partidos políticos e entidades internacionais, como a Campanha de Articulação Global para Abolição da Guerra e a Iniciativa das Pessoas do Sul da Ásia (SAPI). Com esse evento, Belém assumia o papel de “centro da cidadania planetária e referência mundial no questionamento à desigualdade, à injustiça, à intolerância, à devastação ambiental”, assim como na luta contra os mais diversos tipos de preconceitos. Na avenida Nazaré, a governadora Ana Júlia Carepa se integrou à caminhada no bloco do Partido dos Trabalhadores (PT), acompanhada de secretários de

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Estado e assessores. “O FSM chama atenção para a importância da Amazônia e que aqui, além de floresta tem gente, gente que quer viver com dignidade”, enfatizou. Para ela, é necessário combater a pobreza com um novo modelo de desenvolvimento para distribuir os benefícios da riqueza a todos. “Estamos chamando a atenção do mundo ao Pará e ao nosso governo, que fomenta um novo modelo de desenvolvimento sustentável, econômica e ambientalmente. Temos o maior programa de reflorestamento, que é o 1 Bilhão de Árvores paraAmazônia”, afirmou. Ana Júlia Carepa acrescentou que o governo do Estado apoia o FSM não apenas na infraestrutura, mas para que as discussões contribuam para o

Na Avenida Nazaré, a governadora Ana Júlia Carepa se integrou à caminhada

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novo modelo de desenvolvimento. ”Nos preocupamos em agregar valor aos nossos recursos naturais sem agressão ao meio ambiente. Esta é a possibilidade de termos um mundo mais justo e solidário”, acredita. Na Praça do Operário, a programação se estendeu com apresentações e rituais de povos indígenas de vários Estados amazônicos. “Companheiros e amigos indígenas e não indígenas, estou feliz pelo encontro em que cada povo vem aqui neste palco dizer a sua

Belém centro da cidadania planetária e referência mundial no combate à desigualdade, à injustiça, à intolerância, à devastação ambiental

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mensagem no dia de abertura do Fórum Social Mundial”, disse o cacique Suruí, do Estado de Rondônia. O Fórum Pan-Amazônico chamava a atenção do mundo, através de sons e movimentos característicos, para a luta destes povos e demais bandeiras levantadas contra a desigualdade social.

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Fotos Lucivaldo Sena / Ag. Pará e Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr

Salve a Amazônia

I

ndígenas do Brasil, Peru, da Bolívia, Colômbia, Venezuela, Guatemala e de outros países das Américas Latina e Central posicionaram-se para chamar atenção para os perigos enfrentados pela floresta amazônica, utilizando os próprios corpos, com uma mensagem no campo de futebol da Universidade Federal Rural da Amazônia UFRA , para escrever a frase “Salve a Amazônia”. A imagem foi filmada e fotografada do alto por equipes em helicópteros que sobrevoavam o local da manifestação, que ocorreu na Universidade Federal Rural da Amazônia. Com essa imagem, os participantes do ato esperavam mobilizar líderes mundiais para priorizar a Amazônia e os direitos dos povos indígenas – Um pedido de socorro para a sobrevivência da floresta e seu povo amazônico. O protesto foi organizado pela Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). Sixto Alverca Cruz, do Peru, membro de uma entidade que luta contra as mineradoras no Peru, veio ao Fórum reclamar da intervenção de empresas chinesas de mineração na região em que ele vive no norte do país. “O governo está desconhecendo os nossos direitos indígenas, coletivos e individuais. Nós viemos aqui propor uma agenda para ser ouvida pelo mundo inteiro. As empresas transnacionais de mineração e o avanço dos transgênicos vão prejudicar muito a soberania alimentar e, além disso, a instalação dessas mineradoras no Peru vai contaminar os rios da Amazônia, tudo está interligado”, defendeu. Iza Tapuia, do Conselho Indígena TapajósArapiuns, disse que o ato fazia parte da campanha que a Coiab estará lançando durante o Fórum Social. Logo cedo, centenas de índios de diversas etnias e representantes de povos indígenas da Bolívia e

Índios de diversas etnias e representantes de povos indígenas

Equador foram em marcha na direção da Tenda Indígena, onde em uma área próxima da Tenda, realizaram vários rituais e manifestações culturais tradicionais. Bekway , da liderança Kaiapó disse que o FSM é uma oportunidade de mostrar para as gerações futuras, as lutas realizadas em favor dos povos indígenas. "Estamos aqui para aproveitar para mostrar a tradição e todo o aprendizado repassados pelos nossos pais, avôs e tios. Mostrar isso aos mais jovens". EDIÇÃO 87 [FEVEREIRO 09] p a r a m a i s . c o m . b r

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Fotos David Alves/Ag Pa

COMPROMISSO COM A COOPERAÇÃO INTERNACIONAL

FA L A

A governadora Ana Júlia Carepa reafirmou o compromisso de ampliar a cooperação internacional entre os países amazônicos, durante o ato de encerramento da I Assembléia do Fórum de Autoridades Locais da Amazônia

T

ambém estou certa de que a integração amazônica é um caminho promissor para a cooperação que queremos estabelecer com nossos irmãos da África e também prezo por uma cooperação Norte/Sul fraterna e respeitosa”, enfatizouAna Júlia Carepa. Na opinião da governadora do Pará, “a cooperação é fundamental para gerar oportunidades aos Estados”, ao mesmo tempo que esse tipo de trabalho “exige parceria com os movimentos sociais”. Ana Júlia Carepa agradeceu a presença dos mais de 300 prefeitos e governadores que vieram a Belém participar do Fala. Ela disse que o governo trabalhou muito para a realização de uma série de eventos que ocorreram em Belém durante a semana, no âmbito do Fórum Social Mundial, e destacou o apoio incondicional do governo Lula. A realização do Fala, por exemplo, teve o apoio de dezenas de parceiros, citados pela governadora. Entre os parceiros no Brasil, Ana Júlia Carepa agradeceu especialmente ao Banco da Amazônia, à Eletronorte e ao Ministério do Turismo. A partir do encontro de Belém, o Pará vai sediar a coordenação do Fala e sua secretaria técnica e executiva. “Agradeço especialmente à Rede FAL que agora tem um filho novo, o Fala, que pode contar com o meu apoio”, disse a governadora.

Reconhecimento No ato de enceramento, a representante da província de Milão (Itália), Irma Dioli, entregou uma comenda à governadora Ana Júlia Carepa pelo empenho dela no apoio e promoção do Fórum de Autoridades Locais (FAL). Em 2008, Irma esteve em Belém, onde assinou um protocolo de cooperação com o governo do Estado. A província de Milão é a maior da Itália, com 189 municípios e quatro milhões de habitantes. Só a capital milanesa tem cerca de um milhão e meio de pessoas. O protocolo firmado com o Pará garante a cooperação na área do meio ambiente e intercâmbios culturais. Ao final da cerimônia de encerramento do Fal-Fala, a prefeita de Andulo (Angola), Maria Lúcia Ganja, entregou presentes à governadora Ana Júlia Carepa,

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FAL

A integração amazônica é um caminho promissor

como gesto de agradecimento pelo trabalho do governo feito em favor da promoção da cooperação internacional.

Declaração da Amazônia Coube a Nazaré Imbiriba, diretora técnica do Fala e chefe da Coordenação Internacional de Desenvolvimento Sustentável - CIDS, do governo do Pará, ler a Declaração da Amazônia, com as conclusões das discussões ocorridas durante o Fala. O documento considera o Fala como um importante espaço de debate e de construção de diretrizes para o enfretamento da crise internacional; reitera o papel do Fala como mecanismo de diálogo político e plataforma de cooperação das autoridades locais; declara o compromisso de atuar em favor da construção de políticas públicas; e condena as políticas neoliberais. 1. Entre os dias 28 e 31 de janeiro de 2009, em Belém do Para, autoridades locais se encontraram no marco do IX FSM celebrado na Amazônia brasileira, com a participação de municipalidades, redes de cidades de todo o mundo, movimentos e organizações do Fórum Social Mundial, representantes de governos regionais e nacionais, e de organismos internacionais. 2. Uma vez mais o FAL afirma a importância da cooperação e da organização em redes entre diferentes níveis de governos territoriais e da aliança com os movimentos sociais para a construção de outro mundo


possível em um contexto de crise estrutural global. Afinal, o próprio FAL e composto por representantes políticos locais que provem e são militantes sociais. 3. Este VIII FAL se reúne no momento em que o mundo assiste a uma crise global de dimensões e duração desconhecidas, com impactos brutais, cujos efeitos se manifestarão em maior medida nas populações e territórios mais desfavorecidos. Esta crise não e só uma crise financeira. O mundo de Wall Street e as propostas do Fórum Econômico de Davos naufragarão e levaram a humanidade a uma crise de civilização. Esta crise global e ao mesmo tempo uma crise econômica, social, ambiental, energética, alimentar, e tem expressões terríveis, como o belicismo e a barbárie a que assistimos recentemente com o massacre do povo palestino na Faixa de Gaza. Porem, esta crise e também uma derrota do unilateralismo neoconservador e da ideologia neoliberal. 4. Frente a este panorama desolador, vai tomando corpo um mundo de alternativas que avança de formas diversas em espaços locais, metropolitanos – importante destacar que hoje mais da metade da população mundial e urbana – nacionais, regionais e globais, criando expectativas e esperanças de novos horizontes para um outro mundo possível. Os processos de integração dos povos e das regiões, o novo multilateralismo, as experiências de democracia participativa, as políticas ativas de inclusão social, o ressurgimento das políticas e do espaço publico, a defesa dos direitos humanos, culturais, lingüísticos, o respeito a diversidade e ao valor da solidariedade, as propostas de cooperação sul-sul, a idéia da aliança de civilizações, a promoção da cultura de paz e da A governadora Ana Júlia elogiou para todos a Amazônia

não-violência, a construção de metrópoles solidarias. Assim como a superação de sistemas econômicos baseados na exploração sistemática e insustentável dos recursos naturais para satisfazer a demanda c o n s u m i s t a s e m Francisco Ruiz da OTCA-Organização controle, as experiências do Tratado de Cooperação Amazônica p o s i t i v a s q u e com Ronaldo Hühn o editor da Amazônia demonstram que e possível uma economia social e ambientalmente justa, os novos modelos territoriais baseadas na sustentabilidade dos recursos e em uma repartição equitativa dos mesmos, são algumas expressões deste novo mundo que queremos construir. 5. Neste contexto de crise e de novas alternativas emergentes, o local, o território, se converte no cenário onde se decidirão esses importantes desafios. Nos últimos anos, os governos locais da rede FAL estabeleceram relações e alianças com os movimentos sociais e a cidadania, construindo redes de autoridades locais (FALP, Plataforma Mundial de OPs, FALA), impulsionando formas inovadoras democráticas e inclusivas de gestão local. Conseguimos também constituir o FAL como uma rede de governos locais, substituindo modelos rígidos, centralizados e burocráticos, por alternativas de organização horizontais, descentralizadas e flexíveis, praticando uma solidariedade local-global, isto e, combatendo as causas e os efeitos locais da globalização excludente. 6. O FAL impulsiona a construção de uma estratégia internacional-local articulada por numerosas cidades, baseada na solidariedade ética e política, no combate as múltiplas formas de exclusão e de discriminação dos diretos humanos e sociais nos territórios. Defendemos o potencial emancipatório das iniciativas de base local quando expressam alianças dos poderes

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Nazaré Imbiriba, coordenadora do Programa de Cooperação Internacional do Estado do Pará, faz a leitura da Declaração da Amazônia

locais com a cidadania, concretizando-se em políticas publicas democráticas participativas e inclusivas, que afirmam políticas emancipatórias de empoderamento das mulheres. A equidade de gênero precisa ser uma prioridade no desenvolvimento das comunidades locais. 7. A Rede FAL defende que esta nascendo um novo internacionalismo de solidariedade local-mundial com todas as lutas pela democracia e a justiça global. Este movimento inclui cada vez mais redes de municípios, cidades e regiões de governos democráticos, desenvolvendo ações que não se limitam aos espaços institucionais ou a esferas estatais. A Rede FAL defende uma ética de solidariedade, uma cultura internacionalista e uma ação política global. Podemos imaginar e lutar por territórios diferentes e melhores, mais humanos e sustentáveis para vivermos. 8. As cidades e territórios são espaços de reinvenção da democracia. Precisamos trabalhar a partir do local, em nível nacional e internacional, pois isso permite articular a luta pela mudança democrática e a A representante da província de Milão – Itália, Irma Dioli, entregou uma comenda à governadora Ana Júlia Carepa pelo empenho ao apoio e promoção do FAL

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transformação social, por um desenvolvimento sustentável, inclusivo e com respeito aos direitos humanos nos territórios, pela integração dos povos e por um novo sistema mundial mais justo e democrático. 9. Para a Rede FAL, a cooperação internacional descentralizada e horizontal, constitui um importante instrumento para melhorar as capacidades dos poderes locais, assim como e um instrumento importante para fazer frente aos impactos da globalização, e possibilita a luta coletiva por uma mundialização alternativa. Reafirmamos a necessidade de pensar e atuar local e globalmente, e que esse outro mundo possível e necessário começa pelas cidades com a aliança estratégica com os movimentos sociais. 10. O VIII FAL, reunido em Belém do Para, no marco do FSM, tem a tarefa urgente de contribuir com o esforço coletivo de construção das alternativas, no contexto da crise mundial do capitalismo, e impulsionar um controle democrático da economia e do Estado. As alternativas a serem promovidas pelos governos locais que integram a Rede FAL, implicam a promoção de valores universais comuns, baseados nos Ana Teresa Vicente – Prefeita de Palmela (Portugal), no encerramento do FAL/FALA

princípios da justiça social, da equidade e da sustentabilidade ambiental. 11. O VIII FAL em Belém aporta reflexões e propostas sobre cinco grandes eixos temáticos para apresentar uma agenda de futuro que reforce o compromisso e o papel do movimento municipalista com esse outro mundo possível. O FAL manifesta o compromisso, mais uma vez, em seguir construindo e fortalecendo a organização mundial CGLU, compartilhando as suas propostas através das comissões onde temos mais responsabilidades e somos mais ativos: Inclusão Social e democracia participativa, Cidades de Periferias para Metrópoles Solidarias, Cooperação Descentralizada, Cultura, Diplomacia das Cidades. Assim como demandamos que essas propostas e reflexões sejam levadas em conta por nossos movermos nacionais e pelos organismos internacionais.


Fotos David Alves/Ag Pa e Marcelo Martins O FMJ teve como tema central "Judiciário, Meio Ambiente e Direitos Humanos"

V Fórum Mundial de Juízes

A

conferência de abertura foi feita pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro do Supremo Tribunal Federal, Carlos Ayres Britto, teve como tema "O STF e os 20 anos de Constituição". Em seu pronunciamento, evocando o histórico da Constituição Federal, Carlos Ayres Britto, disse que juridicamente, o Brasil é um país primeiro mundista. Também admitiu que a Justiça brasileira é conservadora "talvez em demasia". "O Judiciário acaba crucificando no madeiro da segurança jurídica qualquer idéia de progresso. Mas tal rigidez se explica por um choque cultural entre um Judiciário que é por natureza conservador e uma Constituição extremamente progressista como a nossa. Juridicamente, o Brasil é um país primeiro mundista" reafirmou. O ministro defendeu ainda, a busca do equilíbrio entre a segurança jurídica e o sentido de justiça social e a responsabilidade dos magistrados para uma interpretação mais progressista das leis, que não feche os olhos às demandas atuais: “O Judiciário não é traça de processo”. Também defendeu o controle externo às ações dos magistrados e elogiou o papel da imprensa na aproximação com a sociedade. Gabriel Veloso, presidente da Associação dos Magistrados Trabalhistas da 8ª Região (Amatra-8) disse: “Estamos ampliando o caminho para esse diálogo, com a crença de que o Direito não é apenas

uma reunião de fórmulas e ritos e de que é preciso transcender a lei injusta para repor o equilíbrio abalado na efetivação dos direitos fundamentais”. A governadora Ana Júlia Carepa falou sobre os desafios enfrentados pelo governo do Pará para reduzir o desmatamento e ressaltou o papel da Justiça, especialmente com atenção às fraudes de registro de imóveis em cartórios, no processo de regularização fundiária, passo tido como fundamental para combater a grilagem de terras, a violência no campo e a exploração desordenada dos recursos naturais. A d e s e m b a rg a d o r a A l b a n i r a Bemerguy, presidente do Tribunal de Justiça do Estado, foi aplaudida ao reforçar que o ser humano deve ser prioridade nas ações da Justiça, que deve se adequar às mudanças sociais e ao crescimento das demandas. Temas como trabalho escravo, crise econômica, relações jurídicas e a reforma do judiciário foram discutidas por personalidades jurídicas de renome internacional, magistrados de boa parte do mundo, além de profissionais da classe jurídica - magistrados, promotores, advogados, defensores públicos e estudantes de Direito. A senadora Marina Silva, exministra do Meio Ambiente participou do FMJ com a palestra abordando o tema "Ressignificando o desenvolvimento: a contribuição daAmazônia". A organização do evento foi da Associação dos EDIÇÃO 87 [FEVEREIRO 09] p a r a m a i s . c o m . b r

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Magistrados do Estado do Pará (Amepa), Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 8ª Região (Amatra VIII - PA/AP) e da Associação dos Juízes Federais (Ajufe).

CARTA DE BELÉM Os participantes do V FÓRUM MUNDIAL DE JUÍZES, reunidos em Belém (PA) entre os dias 23 e 25 de janeiro de 2009, adotam a seguinte carta:

independência da magistratura. Também por isso os Estados têm obrigação de proteger a vida dos magistrados e de seus familiares. Cada forma de inércia ou de tolerância representaria objetivamente um tácito consentimento a essas violências; 6. Protestam, do mesmo modo, pela necessidade de que as autoridades assegurem o pleno funcionamento do Poder Judiciário, especialmente em Estados como o Pará e Maranhão, evitando-se que se repitam atos de violência já praticados contra a instituição seus operadores e o próprio jurisdicionado; 7. É dever do Estado, por outro lado, assegurar mecanismos eficazes para proteger as liberdades, entre as quais a de exercício dos mandatos associativos e sindicais da magistratura, sem o que estaria comprometido o funcionamento das entidades e também a autonomia que devem preservar perante os Tribunais;

1. Reconhecem que a dignidade da pessoa é o fim de toda a atividade humana e princípio jurídico fundamental; 2. Defendem que o juiz tenha um perfil humanista e saiba conciliar razão e sentimento para construir uma sociedade mais justa; 3. Expressam compromisso com uma sociedade livre, fraterna, igualitária, pluralista, construída em O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro Supremo Tribunal Federal, Carlos Ayres Britto faz a a m b i e n t e s a d i o e do abertura do V Fórum Mundial de Juízes comprometida coma defesa efetiva dos direitos fundamentais, reconhecidos na Constituição e Tratados internacionais; 4. Sustentam a universalidade dos direitos humanos e defendem o cumprimento das decisões das cortes internacionais de defesa dos direitos humanos e repressão aos crimes contra a humanidade; 5. Expressam solidariedade aos magistrados da Colômbia que são vítimas de atentados e ameaças graves. Essas violências representam a violação mais dramática da

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8. Consideram, que é importante que se reconheça, definitiva e isonomicamente, em harmonia com os princípios constitucionais, o direito de afastamento dos juízes presidentes de associações para exercício de mandato associativo; 9. Apóiam a proposição de eleições diretas para os Tribunais e Conselhos da Magistratura, como forma de democratização do Poder Judiciário; 10. Defendem que a nomeação dos juízes dos Tribunais se dê por ato dos próprios Tribunais, sem qualquer intervenção do Poder Executivo; 11. Defendem a extinção do Quinto Constitucional nos Tribunais Brasileiros; 12. Defendem a reforma processual com a finalidade de alterar o atual sistema de recursos, para valorização das decisões de Primeiro Grau; 13. Apóiam a aprovação da PEC n° 438/2001, como medida necessária para a erradicação do trabalho escravo, bem como a criação e adequado aparelhamento de comarcas do trabalho no sul e sudeste do Pará; 14. Entendem que as indenizações decorrentes da ações civis públicas, que têm por objeto o tema do trabalho escravo, devem reverter para as comunidades lesadas; 15. Em face de tantos perigos, devemos prosseguir sustentando a bandeira de um sistema jurídico protetor, destinado a compensar juridicamente uma realidade de desigualdades que, sendo inerentes ao conjunto das relações sociais de trabalho, tendem a multiplicar-se e aprofundar-se na crise. 17. Renovamos nossos compromissos com a defesa dos princípios do Direito do Trabalho, em especial o da progressividade, com o constitucionalismo social, com os Direitos Humanos e com suas garantias. 18. Afirmam a necessidade da interpretação técnicojurídica da lei de anistia para que se apurem efetivamente os crimes contra a humanidade, perpetrados pelos agentes do estado durante o período da Ditadura Militar. 19. Afirmam a necessidade de que o Ministério Público promova a persecução criminal necessária para a responsabilização dos autores de crimes contra

a humanidade praticados durante a Ditadura Militar no Brasil, com a criação de força tarefa para este fim. Por fim, reafirmam os manifestos e deliberações externados nas edições anteriores do Fórum Mundial de Juízes.

A governadora do Estado do Pará Ana Júlia Carepa no V Fórum Mundial de Juízes

A senadora Marina Silva no FMJ

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o final do encontro foi redigida e aprovada a carta de Belém, um documento que sintetiza os princípios discutidos durante os três dias, entre os quais o reconhecimento de que juiz deva ter um perfil humanista e saiba conciliar a razão e o sentimento para construir uma sociedade mais justa. A carta expressa solidariedade aos magistrados da Colômbia que são vítimas de atentados e a aprovação da PEC 438/2001, como medida necessária para a erradicação do trabalho escravo no Brasil. Abaixo, na íntegra, o conteúdo da Carta. EDIÇÃO 87 [FEVEREIRO 09] p a r a m a i s . c o m . b r

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Fotos Advaldo Nobre/Seduc, Cláudio Santos/Ag Pa e Fábio Rodrigues Pozzebom/ABr

VI Fórum Mundial da Educação

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nação. Como ainda pode haver países como os Estados erca de 9.000 pessoas, educadores, Unidos que vêem algumas pessoas como ilegais? Por chefes de Estado e representantes de isso, nós precisamos de outra pedagogia, não essa dos movimentos sociais de 160 países, conteúdos, mas a pedagogia da Terra, que dê conta prestigiaram o VI Fórum Mundial da desse oprimido que é a Terra", ressaltou Gadotti. Educação, que teve como motivação A senadora Marina Silva (PT/AC), destacou a maior a crise mundial e a importância em se debater questões referentes a uma sustentabilidade aliadas às ações de educação, no educação de qualidade no país. “O Hangar - Centro de papel da educação como força Convenções e Feiras da Durante a abertura do VI FME significativa para o processo de Amazônia. construção do conhecimento, do O presidente do Instituto Paulo saber e como agente de Freire, Moacir Gadotti, um dos transformação”. Marina organizadores do Fórum, fez a emocionou os presentes ao c o n f e r ê n c i a d e confidenciar que só aprendeu a ler abertura:"Educação, com 16 anos num curso do Transgressão e Cidadania MOBRAL. Planetária". Para Marina, a adoção de ideais de Gadotti, definiu assim o caráter sustentabilidade econômica, social do FME: “ Aqui não estamos e ambiental dependem de práticas para trazer respostas e pacotes. de ensino preocupadas com o Nós viemos de longe para futuro das próximas gerações. “A compartilhar, para celebrar, educação precisa formar militantes para aprender juntos com pela civilização”. vocês, com a pluralidade do Para o teólogo Leonardo Boff, as povo da Amazônia”. Fez duras crises atuais colocam em cheque a críticas ao processo de civilização ocidental, porém essa globalização por a considerar crise mundial pode se tornar um excludente e injusta, salto de qualidade. "Pode nos principalmente com os pobres. forçar a buscar alternativas de "Somos um só povo, uma única Lotado o Hangar – Centro de Convenções e Feiras da Amazônia, na abertura do VI FME


A senadora Marina Silva e Fernando Azevedo, secretário de Gestão da SEDUC

Participantes no Fórum Mundial da Educação

incluir todos os seres vivos e ordenar as relações. Os educadores podem ajudar a manter o planeta unido, pois todos temos uma origem comum e um destino comum". Falou também dos princípios e virtudes como respeito, responsabilidade universal, convivência e tolerância, como fundamentais. “A humanidade não foi criada para desaparecer, mas para celebrar a vida, e essa irradiação é o propósito do Universo”, finalizou Boff. Todos também apresentaram exemplos e experiências de suas vida.

Moacir Gadotti, diretor do Instituo Paulo Freire e professor da USP, a senadora Marina Silva e o Teólogo Leonardo Boff durante a abertura do VI FME, onde apresentaram exemplos e experiências de vida

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Fotos David Alves, Eunice Pinto/Ag Pa e Marcelo Martins

III Fórum Mundial de Teologia

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cidade de Belém se transformou no centro de discussões teológicas de cerca 900 participantes, entre teólogos, estudantes e professores de teologia, além de pessoas ligadas a movimentos populares, pastorais e educação popular ou que apenas se interessam pelo tema. O teólogo Luiz Carlos Susin, Frei capuchinho, doutor em Teologia pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma, é professor de Teologia da PUC-RS, secretário executivo do evento, disse que a predominância no Fórum foi de brasileiros, por acontecer no Brasil, e de povos de países desenvolvidos, como Europa, Estados Unidos e Canadá, por possuírem mais recursos financeiros. Entretanto, o FMTL também teve a presença de conferencistas da Ásia, África e América Latina, fortalecendo, assim, a questão da diversidade de linhas teológicas, religiões e pensamentos. Na terceira edição, o Fórum teve como principal objetivo formar uma rede mundial de teologias contextuais que herdaram ou que se identificam com a Teologia e Libertação, além de proporcionar um espaço de encontro para uma maior interação da

teologia com a sociedade. Apesar da diversidade de pensamento e de linhas teológicas no encontro, o secretário afirmou que não houve divergências ou desentendimentos. «O que ocorreu foi discussão em termo de aprofundamento e de intercâmbio de conhecimento das linhas", afirma Luiz Carlos. A partir do tema "Água, Terra, Teologia - para outro mundo possível", esta edição do FMTL teve as discussões pautadas na teologia da sustentabilidade da vida no planeta, levando à reflexão e elaboração de um discurso teológico a partir da relação do ser humano com o ambiente em que vive. A intenção inicial do Fórum foi fazer uma reflexão teológica a partir de práticas libertadoras que ajudem a contribuir para o futuro da vida no planeta, abordando, também, A governadora Ana Júlia Carepa na abertura do Fórum Mundial de Teologia e Libertação no auditório da Fundação Cultural

A senadora Marina Silva no III FMTL

A Conferência "Dimensão Eco-teológica da Corporalidade” contou com a participação de pessoas de várias etnias e religiões diferentes e muito alegres

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VÁRIAS ETNIAS E RELIGIÕES participaram do Fórum Mundial de Teologia e Libertação


Ana Júlia e Leonardo Boff no Fórum Mundial de Teologia

questões ecológicas, como a relação do homem com a água e a terra. Segundo Luiz Carlos, o Fórum teve a Ecoteologia como tema central, e não foi destinado exclusivamente para teólogos. Ele afirmou “o FMTL é um espaço aberto para discussões e intercâmbio de conhecimento, ressaltando que é um encontro de teologia ecumênico e voltado para assuntos que superam as questões da Igreja. Assim, as discussões foram em torno de temas sociais e ecológicos, além de reflexões sobre as diversas formas de libertação existentes no mundo”.

O Fórum foi uma oportunidade que os participantes tiveram de trocar conhecimentos e de garantir uma maior interação entre as pessoas de diversos locais e pensamentos. Dessa forma, o evento contribuiu para a mundialização da Luiz Carlos Susin, frei capuchinho, metodologia aplicada: um teólogo, secretário executivo do FMTL, com a nossa Amazônia espaço alternativo, de debates e de divulgação de pesquisas em Teologia, Ciências da Religião e áreas afins.

Felício Pontes, paraense e procurador da República no III FMTL

Água, terra e teologia: rumo a um paradigma ecológico A partir desse tema, Leonardo Boff desenvolveu sua exposição, fazendo a previsão: “Em breve todos seremos socialistas dentro de alguns anos. Ou dividimos o pouco que temos ou não haverá nada para ninguém”. “Essa crise não é cíclica, ou nós mudamos ou a Terra não aguentará, e será uma tragédia”, profetizou, sugerindo o fim do consumismo galopante. Boff revelou dados alarmantes do desperdício: Em 1900, a Terra tinha 1 bilhão de habitantes e utilizava ¼ do planeta. Em 2000, éramos 6,3 bilhões e precisávamos de todo o planeta. Hoje, somos 6,7 bilhões de pessoas e além do planeta todo, precisamos de cerca de 30%, que nem existe. A busca pela Sustentabilidade é imperiosa. Nós temos que mudar. Não podemos tolerar a falta d'água para milhões de pessoas. A racionalidade e a solidariedade é a solução.

Leonardo Boff, teólogo, escritor e professor universitário, presidiu uma das mesas

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Fotos Cláudio Santos/Ag Pa

6º Fórum Parlamentar Mundial – FPM Migrações, fome, degradação do solo e uso da água debate

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6º Fórum Parlamentar Mundial (FPM) foi aberto no Hangar, com representantes dos legislativos da Itália, Alemanha, Grécia, Cuba, Colômbia, Portugal, Dinamarca, Espanha, Uruguai, Venezuela, Palestina e Equador, além da presença de autoridades do governo federal, estadual e municipal do Brasil.

Europeu, disse que o neoliberalismo falhou e o mercado não teve a capacidade de se autorregular, como defendia os seus idealizadores. “O 6º Fórum Parlamentar Mundial tem uma responsabilidade de ampliar os mecanismos de construção de um novo mundo possível. Esta mudança passa necessariamente pelo compromisso do parlamentares em fortalecer o papel do parlamento mundial como uma estrutura política que defenda os mais pobres e não os mais ricos”, enfatizou.

Internacional

Mesa do Fórum Parlamentar Mundial, que visa atuar de forma organizada internacionalmente para apontar soluções aos problemas do planeta

A mesa de abertura foi coordenada pelo deputado federal paraense, Zé Geraldo (PT-PA), e a deputada alemã Gabriele Zimmer, do Parlamento Europeu, abordou os conflitos contemporâneos e o diagnóstico e perspectiva do movimento em favor da paz e exercício da política. O Fórum teve a participação de aproximadamente 200 inscritos. Zé Geraldo destacou na abertura que, mesmo com o avanço da tecnologia e os investimentos em várias partes do globo terrestre, “apenas 20% da população é beneficiada com o que é produzido, enquanto que 80% ficam em situação social extremamente degradante e somente uma ação articulada internacionalmente poderá encaminhar soluções de curto, médio e longo prazo para estes cenários”, destacou. A deputada alemã Gabriele Zimmer, do Parlamento

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O deputado palestino Hanna Saifeh denunciou que o governo de Israel tem por princípio o extermínio do povo palestino. “No entanto, nem Israel vai destruir militarmente o povo palestino e o povo palestino não destruirá Israel. A saída política é a coexistência de dois povos soberanamente”, propõe. O deputado alemão Helmuth Markov, do Parlamento Europeu GUE y Die Linke, explicou que existe a necessidade de uma inversão de prioridades no modelo de produção, consumo e desenvolvimento. “A tecnologia avançou, mas não atendeu às necessidades de grande maioria da população. Hoje um carro faz de seis a oito quilômetros por litro de combustível. É necessário investimento para desenvolver um motor que faça 100


quilômetros com dois ou cinco litros de combustível. Assim, teremos uma nova interferência sobre a natureza e o meio ambiente”, sugeriu. A deputada Blanca Flor, de El Salvador, relatou a decadência do parque industrial do seu país e as conseqüências para a população. “O neoliberalismo fracassou. As políticas do Banco Mundial fracassaram. Sabemos que a fome afeta milhares de pessoas no mundo. Isso ocorre em nosso país. Por isso, é fundamental levantarmos a proposta de uma grande mobilização pelo combate à fome e ao desemprego”, enfatizou. A deputada venezuelana Jhannet Madriz Sotilho propôs, e obteve consenso dos participantes, que seja realizada uma conferência na Organização das Nações Unidas (ONU) para debater a crise financeira internacional, que é uma crise do sistema capitalista neoliberal. “Os neoliberais disseram que o mercado se autorregularia e negavam a intervenção do poder do Estado. Agora que o sistema ruiu, querem os recursos dos cofres públicos para salvar a falência do neoliberalismo e ampliar a miséria social dos povos. Isso é inaceitável e devemos cobrar a realização da conferência na ONU, com o apoio do Fórum Parlamentar Mundial”, acentuou.

Deputado Federal José Geraldo durante a abertura do 6º FPM

Multilateral A senadora Marina Silva destacou a importância de construção de um projeto multilateral. “Temos que construir um projeto com visão acolhedora e que respeite as diferenças multilateralmente. É preciso liderar pelo exemplo e pela transparência. Devemos consolidar lideranças multicêntricas e não mais unipolar.As estruturas têm de ser elásticas, flexíveis". Para a senadora, o sentido unipolar falhou. "Quem apostou no mercado e usou a natureza, mostrou que este modelo não deu certo. As nossas respostas passam pelo campo da arte, da ciência, da tecnologia, da espiritualidade, da ética, da transparência e de um novo modelo de desenvolvimento que seja politicamente correto e sustentável. Pode parecer utópico, mas precisamos ser militantes da civilização", disse.

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Fotos Tamara Saré / Ag. Pará

Mulheres, donas da própria vida

Nilcéa Freire fez um tributo às mulheres que construíram os caminhos para se chegar ao FSM

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enfrentamento da violência contra mulheres do campo e da floresta é o objetivo da campanha, que teve sua segunda etapa lançada tenda Irmã Dorothy Stang. A campanha é uma antiga demanda das mulheres trabalhadoras rurais, quilombolas, seringueiras, quebradeiras de coco em todo o país, apresentada na Marcha das Margaridas de 2007. O lançamento foi feito pela Secretaria Especial de Polícias para Mulheres da Presidência da República, com a presença da ministra Nilcéa Freire. As últimas campanhas de enfrentamento tinham como viés apenas a mulher urbana. Daí a necessidade de tratar de políticas públicas específicas às mulheres da floresta. Após a Marcha das Margaridas foi criado um fórum permanente de debates dessas políticas públicas, que resultou na campanha. A primeira etapa teve spot de rádio veiculado em mais de 800 emissoras do país, nos meses de dezembro e janeiro, e anúncios nas revistas femininas de maior circulação no país. “Agora outras peças serão produzidas, visando à discussão de todas as dimensões da violência, não só a doméstica”, informou a ministra.

Novo mundo Ela fez um tributo às mulheres que construíram os caminhos para se chegar ao FSM, “da possibilidade de construir outro mundo que já estamos fazendo possível”, afirmou. Para Carmem Foro, da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Agricultura (Contag), a autonomia é algo imprescindível no enfrentamento da violência, assim como reforma agrária e crédito. “Quero registrar que esta campanha foi construída por várias mãos e de outros movimentos de mulheres, que não apenas a Contag e Movimento de Mulheres do Campo (MMC). Em todos os nossos processos de deliberações e reflexões, temos dito aos governos que as políticas públicas têm chegado muito pouco à zona rural”, frisou.

Futuro sem violência Ela ressaltou que a campanha não é apenas distribuir material informativo, mas estreitar os compromissos da campanha com a sociedade brasileira, a sociedade internacional e os movimentossociaisrepresentadosnoFSM.

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Pressão Carmem disse ainda que as mulheres organizadas devem ser as protagonistas da campanha. “para que pressionem os governantes neste processo, e que tenhamos um futuro distante da violência do passado”, acrescentou. A representante do MMC, Luciana Nunes, enfatizou que a campanha deve ter a cara das mulheres que estão na roça ou nas margens dos rios. “Tenho certeza que a campanha vai destruir esta situação de violência que ainda existe”, afirmou, lembrando o local escolhido para o lançamento: a tenda com o nome da irmã Dorothy Stang, assassinada em 2005, emAnapu (PA). A irmã Inrriquieta, da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil, comentou que muitas vítimas procuram a igreja para um gripo de socorro na busca do espaço de libertação da violência. Antiga reivindicação das mulheres trabalhadoras rurais, quilombolas, seringueiras, quebradeiras de coco em todo o país


Fotos Eliseu Dias/Ag Pa e Rodrigues Pozzebom/ABr

O balanço do FSM

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ntegrantes do Comitê Internacional do Fórum Social Mundial em coletiva para a imprensa falaram sobre as expectativas dos assuntos abordados durante o evento e para divulgar os números do balanço final. Depois de seis dias de programação, o Fórum Social Mundial (FSM) chegou ao fim com “novas inspirações” para buscar um outro mundo possível. A avaliação é do sociólogo e membro do Conselho Internacional do Fórum Social Mundial Cândido Grzybovski, que ressaltou a importância do evento ter sido realizado na região amazônica Para Grzybovski , a realização do evento em Belém tornou esta edição um marco para o FSM pelas relação “entre a Amazônia e a utopia” e pela crise que “enterrou” o Fórum Econômico Mundial, que ocorreu simultaneamente em Davos, na Suíça. “Ocupamos um enorme vazio na agenda mundial”. Em 2010, o Fórum Social Mundial vai ocorrer de forma descentralizada, sem uma cidade sede. Para 2011, a África e o Oriente Médio são os prováveis candidatos, mas os Estados Unidos também podem estar na lista, segundo Grzybovski. “Conseguimos expor outra face da

Amazônia para o mundo e o nosso sentimento é de um bom cansaço cívico ao final desse FSM”, comemorou Grzybowski O número de participantes superou as previsões da organização, ao todo, mais de 150 mil pessoas participaram da programação do FSM em Belém, entre inscritos, voluntários, governadores e cinco presidentes da América Latina, incluindo Luiz Inácio Lula da Silva. Entre eles também, 1,4 mil quilombolas Ana Cláudia Duarte Cardoso, secretária de Estado de Governo, durante o encerramento do FSM

Participantes do FSM deixando a UFRA EDIÇÃO 87 [FEVEREIRO 09] p a r a m a i s . c o m . b r

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Na coletiva para a imprensa

1,9 mil indígenas, a maior participação desses segmentos em todas as edições do FSM, segundo Grzybovski. Representante das lideranças indígenas, o peruano Mario Palacios disse que o FSM foi importante para dar protagonismo aos povos da floresta e comunidades tradicionais. “Há uma alternativa a essa crise civilizatória, climática, energética. Concluímos que outro mundo é possível e está nos povos indígenas. Somos atores políticos vivos, não somos a parte folclórica da democracia”. Palacios também anunciou a realização do 5º Fórum Social Mundial Pan-Amazônico, aprovada em assembléia. A participação de comunidades indígenas também foi lembrada pela representante do movimento negro, Nilma Bentes. “O Fórum abriu possibilidade para que o movimento negro estreitasse relação com o movimento indígena”. Pela primeira vez, segundo Nilma, as questões raciais foram pautadas em um FSM como reivindicavam os movimentos sociais. O ativista palestino Jamal Juma, coordenador do movimento Stop the Wall, agradeceu a recepção do Fórum à causa palestina e disse que a reunião foi uma oportunidade de apresentar ao mundo o que chamou

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Cândido Grzybovski, sociólogo e membro do Conselho Internacional do FSM, rebateu as críticas de que o megaevento deveria abrir espaço para maior participação dos Cândido Grzybovski governos no debate sobre um outro mundo possível. “Nós não demos as costas para os governos. A cidadania nunca deu, sempre votou, nós que damos mandatos a eles. Mas aqui no nosso evento, no nosso território, eles têm que se submeter às nossas regras, à nossa lógica”. O FSM é organizado por movimentos sociais e organizações não-governamentais e os governos participam eventualmente como convidados. Grzybovski defendeu a Carta de Princípios do FSM, formulada em 2001, segundo a qual governantes e partidos não são partes do evento. No entanto, disse que o FSM está aberto para recebê-los, inclusive para cobrar ações em resposta às demandas apresentadas pela sociedade civil durante os debates. “Aqui é um evento de cidadania. Nós podemos trazê-los para ver se eles são responsáveis nos mandatos que lhes conferimos. Esse foi, inclusive, o sentido do ato que fizemos com os presidentes”, afirmou, em referência ao debate realizado na última quinta-feira (29), no FSM, entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva, Hugo Chávez (Venezuela), Fernando Lugo (Paraguai), Rafael Correa (Equador) e Evo Morales (Bolívia)


de apartheid israelense. “Nesta hora em que testemunhamos o massacre do povo de Gaza, o Fórum é uma plataforma para mostrar a luta do povo palestino. Queremos pedir apoio do Comitê Internacional para forçar Israel a cumprir leis internacionais”. Uma agenda mundial de mobilizações também foi anunciada pela representante do Fórum Social Europeu, a italiana Rafaela Bolini, e inclui protestos durante a reunião do G-8, em maio, na Itália, durante a Conferência da Organização das Nações Unidas sobre

Mudanças Climáticas, em dezembro, na Dinamarca, e até no aniversário de 60 anos da Organização do Tratado doAtlântico Norte (Otan), em abril. No final, a secretária de Governo do Pará, Ana Cláudia Duarte Cardoso, informou os números da atuação do Governo do Estado durante o FSM. “Na área da saúde, tivemos mais de 2.700 atendimentos básicos, mais 68 atendimentos específicos e dez internações; um número baixo que é resultado de um amplo trabalho de prevenção de doenças com os visitantes do FSM”, revelou Cardoso.

Alguns números foram apresentados Todos os números do Fórum Foram registradas 135 mil participantes do Fórum: 15 mil no acampamento da juventude; 3mil crianças em barraquinhas, para 5808 As associações envolvidas 489 da África, 119 da América Central, 155 da América do Norte, 4.193 da América do Sul, 334 da Ásia, 491 da Europa, 27 da Oceania. Promoveram 2310 atividades autgestite. 4.830 eram voluntários, tradutores, técnicos e gestores do promotor para trabalhar por três dias; 5.200 expositores nas lojas, na solidariedade dos espaços de exposições e restaurantes; 200 eventos culturais; 1000 artistas que organizaram vários desempenhos. A cobertura mediática do evento: 800 jornais de 30 países foram credenciados para o Fórum; Cláudio Puti, secretário 4.500 jornalistas, profissionais da comunicação e media livres, de Estado de Governo, 2500, que trabalharam nas salas da Universidade de Belém e fez avaliação mais que positiva do FSM 2 mil alguma distância, e relataram que recebem apoio do pessoal da comunicação EFM. Segurança Ao todo, mais de sete mil militares fizeram a segurança na cidade durante o evento, dos quais 300 são da Força Nacional de Segurança do governo federal, que ficarão na cidade por mais 90 dias, a pedido da governadora Ana Júlia Carepa.

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Fotos Eunice Pinto,Tamara Saré / Ag. Pará e Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr

Transporte fluvial foi opção para participantes do Fórum Da UFPA à UFRA No trapiche

Embarcações de pequeno porte fizeram transporte de passageiros entre os portos da Universidade Federal do Pará e da Universidade Federal Rural da Amazônia com o apoio do Corpo de Bombeiros do Estado

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Chegada de barco na Universidade Federal do Pará-UFPA, vindo da universidade Federal da Amazônia- UFRA


o m o c a i n ô z a ! m u A i A u n ca v n ê v oc áNAS

J ANCAS B



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