Por um mercado acionário maduro

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Norte Rebelo Advogados Associados S/S Registro OAB-RS nº 1.578

POR UM MERCADO ACIONÁRIO MADURO por Nikolai Sosa Rebelo, especialista em Direito Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS

A recuperação da economia brasileira nas últimas duas décadas fortaleceu as sociedades empresárias brasileiras. Fato que comprova tal afirmação é o ressurgimento da Bolsa de Valores de São Paulo que passou por graves crises durante a década de 1990, quase sendo levada à extinção naqueles anos de fraco desempenho. Hoje, a Bolsa de Valores de São Paulo – BOVESPA atrai diversos investidores nacionais e internacionais. Assim, vive-se o momento das grandes corporações. Lentamente, alguns paradigmas estão sendo mudados pela nova realidade do mercado nacional. Os profissionais brasileiros estão se deparando com complexos contratos financeiros e as modernas estruturas societárias que já são conhecidas em países Europeus e nos Estados Unidos. As chamadas companhias abertas são as sociedades empresárias que se habilitaram a negociar seus títulos no mercado aberto de ações, representado no Brasil, principalmente, pela BOVESPA. A estrutura societária das companhias brasileiras ainda é bastante concentrada. Analisar a estrutura societária é analisar a estrutura do poder das sociedades anônimas. O poder é representado pelo poder de controle sobre a sociedade. O controle é um poder-dever, pois não pode ser exercido ao livre arbítrio, aplicando-se muitas regras de proteção aos interesses dos demais acionistas. O estudo doutrinário sobre o poder de controle distingue-o em poder de controle interno e poder de controle externo. O poder de controle interno é o que decorre da propriedade acionária ou do exercício de cargos da administração. O poder externo é exercido por pessoas estranhas à sociedade, normalmente com relação de crédito perante a companhia. O controle externo também pode ocorrer pela atividade regulatória da administração pública, por meio de mecanismo de intervenção na atividade privada, como por exemplo, no caso de atividades do setor financeiro ou em concessionárias de serviços públicos. O poder de controle interno é dividido em totalitário, majoritário, minoritário e gerencial. Totalitário ocorre em caso de subsidiária integral, ou seja, a companhia dominada por um único acionista. Também se tem classificado desta forma o controle sempre unânime em algumas companhias com poucos acionistas membros de uma mesma família. Basta, porém, que um acionista detentor de uma ação não esteja alinhado com o restante, para que o controle deixe de ter esta classificação passando a ser majoritário. Esta alteração de enquadramento é de extrema relevância, pois em razão da possibilidade de divergência, nascem diversos deveres do acionista controlador perante os acionistas minoritários (por exemplo, direitos de retirada em algumas situações, necessidade de prestação de contas etc.). Assim, o controle majoritário é o controle daquele acionista que tem mais da metade das ações votantes. As duas outras modalidades de controle somente ocorrem de fato em razão do fenômeno da dispersão acionária combinado com o fenômeno do absenteísmo da massa de acionistas. Ou seja, são sociedades com tantos acionistas com pequenas parcelas do capital que não participam das deliberações das assembleias gerais, Rua Riachuelo, 1038 / Cj.1102 – Porto Alegre – RS – 90010-272 Fone/Fax: (51) 3211.5344 e-mail: darci@norterebelo.com.br

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permitindo que alguns sócios com participação minoritária controlem a sociedade. No caso do controle gerencial, fenômeno ainda sem ocorrência no Brasil, decorre da máxima separação entre controle e propriedade, pois os administradores por meio de mecanismos de procurações conseguem controlar uma companhia aberta diante da enorme dispersão acionária e absenteísmo dos sócios. A moderna sociedade anônima é a sociedade com capital disperso. O acionista passa a ser simples investidor, em busca de rendimentos. A gestão passa a ser profissionalizada, saindo de cena as paixões do controle familiar. O próprio acionista minoritário individual também não é o único partícipe desta nova sociedade anônima, que, por vezes, cede lugar a outra estrutura profissionalizada. Vale dizer, ao invés do acionista individual ser o investidor, ele se une aos chamados fundos de investimentos, também administrados profissionalmente por sociedades empresárias com profissionais altamente especializados. O mesmo papel tem as sociedades seguradoras e resseguradoras que não limitam seus rendimentos aos pagamentos efetuados pelos seus segurados, assumindo a condição também de investidor institucional no mercado acionário. O controle minoritário já não é mais desconhecido em terras brasileiras. O Brasil caminha, ainda lentamente, para a nova realidade do mercado acionário. Um mercado com maior maturidade. O mercado aberto bem desenvolvido pode ser um excelente meio de redistribuição de renda, onde as grandes empresas captam recursos dos pequenos investidores, mas devolvem em dividendos. Nos Estados Unidos, esse mecanismo funciona como complemento da aposentadoria de muitos cidadãos americanos, podendo esse sistema ser copiado em terras pátrias. Mas a complexidade do mercado maduro merece total atenção de entes regulatórios. Tanto as macro-sociedades abertas, com grande dispersão acionária, como os investidores institucionais (fundos de investimentos e outros) devem ser controlados para não sofrerem do vício que muitos gestores caíram nos últimos anos, ou seja, apostas extremamente arriscadas, tendo como consequência as graves crises econômicas (por exemplo, a crise de 2008 nos Estados Unidos). Nesse sentido, o Brasil que sempre teve uma postura regulatória mais conservadora, não tem caído nessas tentações. A regulação ainda é muito intervencionista, podendo conceder um pouco mais de liberdade aos agentes privados, mas não pode-se deixar de elogiar o fato de o controle exercido ter sido eficiente na gestão da crise econômica desencadeada nos últimos anos. Merecem ser citados ainda os grandes debates sobre as guerras pelo controle (as famosas take-over bids e as proxies wars) e as cláusulas poison pills, como regras societárias de proteção da dispersão acionária, ainda mal utilizadas pelas companhias brasileiras. Também a melhoria do sistema de governança corporativa deve ser citada como grande fator para essa mudança do mercado ainda em fase inicial. Essas novas companhias vão competir com as grandes companhias familiares, que hoje exercem forte influência nos governantes, e talvez essa concorrência sirva para elas também cogitarem alterar sua estrutura. Sabe-se que ainda é difícil de isso ocorrer, devido ao grande acesso a financiamento dessas sociedades familiares, porém, muitas entrantes do mercado acionário aberto superaram a barreia desses financiadores pela pulverização do capital e pela utilização do alto padrão de governança corporativa.

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