ALL EM REVISTA VOLUME 10, NUMERO 1 - JANEIRO A MARÇO 2023

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NÚMERO 10, VOLUME 1 – JANEIRO-MARÇO 2023

SÃO LUÍS DO MARANHÃO

EDITOR: LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ - Prefixo Editorial 917536 ANO DE GONÇALVES DIAS

EM REVISTA

EDITOR: LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ - Prefixo Editorial 917536

NÚMERO 10, VOLUME 1 – JANEIRO-MARÇO 2023

SÃO LUÍS DO MARANHÃO

COLABORADORES DESTA EDIÇÃO

A presente obra está sendo publicada sob a forma de coletânea de textos fornecidos voluntariamente por seus autores, com as devidas revisões de forma e conteúdo. Estas colaborações são de exclusiva responsabilidade dos autores sem compensação financeira, mas mantendo seus direitos autorais, segundo a legislação em vigor.

EXPEDIENTE

ALL EM REVISTA

Revista eletrônica

EDITOR

Leopoldo Gil Dulcio Vaz

Prefixo Editorial 917536 vazleopoldo@hotmail.com

ACADEMIA LUDOVICENSE DE LETRAS

Praça Gonçalves Dias, Centro – Palácio Cristo Rei

65020-060 – São Luis – Maranhão

ALL EM REVISTA

Revista eletrônica da Academia Ludovicense de Letras

Gestão 2022/2023

COMISSÃO EDITORIAL

CONSELHO FISCAL

COMISSÃO EDITORIAL

DIRETORIA PRESIDENCIA SECRETARIA TESOURARIA

PATRONOS E OCUPANTES DAS CADEIRAS

01 - CLAUDE D’ABBVEVILLE ANTÔNIO JOSÉ NOBERTO DA SILVA - (Fundador) 02 - ANTONIO VIEIRA JOÃO BATISTA ERICEIRA - (Fundador) 03 - MANOEL ODORICO MENDES SANATIEL DE JESUS PEREIRA - (Fundador) 04 - FRANCISCO SOTERO DOS REIS ANTONIO AUGUSTO RIBEIRO BRANDÃOFUNDADOR/ HONORÁRIO ALEXANDRE MAIA LAGO - 1º OCUPANTE 05 - JOÃO FRANCISCO LISBOA RAIMUNDO NONATO SERRA CAMPOS FILHO. (Fundador) 06 - CÂNDIDO MENDES DE ALMEIDA ROQUE PIRES MACATRÃO - (Fundador) 07 - ANTÔNIO GONÇALVES DIAS WILSON PIRES FERRO (Fundador) CLEONES CARVALHO CUNHA 2º Ocupante . 08 - - MARIA FIRMINA DOS REIS DILERCY ARAGÃO ADLER (Fundadora)

09 - ANTÔNIO HENRIQUES LEAL

IRANDI MARQUES LEITE - 1º. Ocupante

10 - JOAQUIM DE SOUSA ANDRADE (SOUSÂNDRADE)

MARIO DA SILVA LUNA DOS SANTOS FILHO 1º. Ocupante

11 - CELSO TERTULIANO DA CUNHA MAGALHÃES

ANDRÉ GONZALEZ CRUZ - (Fundador)

12 - JOSÉ RIBEIRO DO AMARAL

MICHEL HERBERT ALVES FLORÊNCIO (Fundador)

13 - ARTUR NABANTINO GONÇALVES DE AZEVEDO MARIA THEREZA DE AZEVEDO NEVES 1º. Ocupante

14 - ALUÍSIO TANCREDO GONÇALVES DE AZEVEDO

OSMAR GOMES DOS SANTOS - (Fundador)

15 - RAIMUNDO DA MOTA DE AZEVEDO CORREIA DANIEL BLUME PEREIRA DE ALMEIDA 1º. Ocupante

16 - ANTÔNIO BATISTA BARBOSA DE GODOIS AYMORÉ DE CASTRO ALVIM - (Fundador)

17 - CATULO DA PAIXÃO CEARENSE

RAIMUNDO GOMES MEIRELES - (Fundador)

18 - HENRIQUE MAXIMIANO COELHO NETO ARTHUR ALMADA LIMA FILHO - (Fundador)

VINÍCIUS BOGÉA – 1º OCUPANTE

19 - JOÃO DUNSHEE DE ABRANCHES MOURA JOÃO FRANCISCO BATALHA - (Fundador)

23 - DOMINGOS QUADROS BARBOSA ÁLVARES ÁLVARO URUBATAN MELO - (Fundador)

ANTÔNIO AILTON SANTOS SILVA - 1º. Ocupante

20 - JOSÉ PEREIRA DA GRAÇA ARANHA ARQUIMEDES VIEGAS VALE - (Fundador) 21 - MANUEL FRAN PAXCO LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ - (Fundador) 22. - JOSÉ AMÉRICO OLÍMPIO CAVALCANTE DOS ALBUQUERQUE MARANHÃO SOBRINHO 24 - MANUEL VIRIATO CORRÊA DO LAGO FILHO FELIPE COSTA CAMARÃO - 1º. Ocupante 25 - LAURA ROSA MIRIAM LEOCÁDIA PINHEIRO ANGELIM - 1ª. Ocupante 26 - RAIMUNDO CORRÊA DE ARAÚJO JOÃO BATISTA RIBEIRO FILHO - 1º. Ocupante 27 - HUMBERTO DE CAMPOS VERAS JOSÉ DE RIBAMAR FERNANDES - (Fundador) 28 - ASTOLFO DE BARROS SERRA BRUNO TOMÉ FONSECA - 1º. Ocupante 29 - MARIA DE LOURDES ARGOLLO MELLO (DILÚ MELLO) AMÉRICO AZEVEDO NETO - 1º. Ocupante 30 - ODYLO COSTA, FILHO CLORES HOLANDA SILVA - (Fundadora) 31 - MÁRIO MARTINS MEIRELES ANA LUIZA ALMEIDA FERRO - (Fundadora 32 - JOSUÉ DE SOUZA MONTELLO ALDY MELLO DE ARAÚJO - (Fundador 33 - CARLOS ORLANDO RODRIGUES DE LIMA PAULO ROBERTO MELO SOUSA - (Fundador) 34 - LUCY DE JESUS TEIXEIRA CERES COSTA FERNANDES - 1ª. Ocupante 35 - DOMINGOS VIEIRA FILHO JUCEY SANTOS DE SANTANA - 1ª. Ocupante 36 - JOÃO MIGUEL MOHANA RAIMUNDO DA COSTA VIANA - (Fundador) 37- - MARIA DA CONCEIÇÃO NEVES ABOUD JADIR MACHADO LESSA 1ª. Ocupante 38 - DAGMAR DESTÊRRO E SILVA JOSÉ NERES - 1ª. Ocupante

JOSÉ CLÁUDIO PAVÃO SANTANA - (Fundador

SÓCIOS BENEMÉRITOS

FLÁVIO DINO

GOVERNADOR DO MARANHÃO 2015-2022

NATALINO SALGADO FILHO REITOR DA UFMA

SÓCIOS HONORÁRIOS

ANTONIO AUGUSTO RIBEIRO

JOSÉ DE RIBAMAR FERNANDES - (Fundador)

Falecido em março de 2023

39 - JOSÉ TRIBUIZI PINHEIRO GOMES 40 – JOSÉ RIBAMAR SOUSA DOS REIS ROBERTO FRANKLIN - 1ª. Ocupante

Ainda não encontrei o formato ideal para a diagramação da Revista; já fiz várias tentativas, mas parece-me que infrutíferas. Assim, como se trata de registro dos acontecimentos, na medida em que ocorrem, para pontificar as ações da Academia e de seus membros, este ano farei da seguinte forma: crônica1!!!

Sucessão de acontecimentos, datados; na medida em que aparecerem as notícias e/ou fatos, informações, artigos, e demais formas de expressão/comunicação, será registrado...

Osmar foi o primeiro, com artigo semanal, que aparecerão nos próximos dias – sempre coloca à disposição nas quintas-feiras, e aparecerão nos jornais no sábado... Pavão Santana, Baralha, Manoelzinho, Mhario...

Poderia ter colocado o meu material, para inaugurar essa edição, com uma revisão do Atlas da Capoeiragem no Brasil referente aos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro, e São Paulo, que fiz logo após a publicação de meu último livro: “’Cada quá no seu cada Quá’: quando a capoeiragem começou...”, onde resgato a memória da capoeiragem, nos diversos Estados do Brasil. Assim como o artigo sobre a ‘internacionalização da capoeira’ e a ‘capoeira em Portugal’. Mas os polparei dessa leitura, já que não se refere ao Maranhão, e nem à literatura... Até o momento, esse novo livro está disponível no batcanal de sempre, já em quatro volumes...

E o poeta se pergunta: ainda há poesia/poetas no Maranhão?

E a resposta é de que este é o Ano de Gonçalves Dias, em seu 200 anos de nascimento...

E Rosa Machado me lembra, lá de Portugal, que ano que vem, será o sesquicentenário de nascimento de Fran Paxeco... será que a ALL vai considerar o ‘ano de Fran Paxeco”? começo minha campanha agora... 09 de março!!!

SESQUICENTENÁRIO DE FRAN PAXECO

1 Chronica (do latim) é termo que indica narração histórica, ou registro de fatos comuns, feitos por ordem cronológica; como também é conjunto das notícias ou rumores relativos a determinados assuntos.

DICIONÁRIO AURÉLIO, 1986

EDITORIAL
2024

Enfim, ontem (02/02) a primeira AGO da ALL; discussões sobre a Tesouraria, os inadimplentes, o caixa, e nova campanha para pagamento da anuidade – que poderá ser feita em parcelas mensais, vencidas a cada dia 05 do mês: um salário mínimo, que poderá ser pago em parcelas, ao bel prazer do Acadêmico... preferencialmente, de uma vez...- após, as discussões sobre o Ano Acadêmico, com a proposta de algumas ações para o Calendário 2023; inclui na pauta, o Patrono que será homenageando como o ‘ano de...’, e já solicitando que 2024 seja o de Fran Paxeco.

Vinicius Bogéa comunica que o Jornal Pequeno está disponibilizando uma página semanal para as notícias e publicações oriundas da ALL, sendo que ele ficará como o responsável pela mesma, junto com a comissão de publicações; a página do Aílton, no JP Turismo será mantida e, breve, ao suplemento Guesa Errante, do Alberico.

Natalino Salgado, sócio benemérito, reclamou que não está havendo a contrapartida da ALL, para com a UFMA; sugeriu que a ALL passe a se responsabilizar por um programa radiofônico semanal, a ser transmitido pela UNIVERSIDADE FM...

Também a retomada das publicações: o Perfil Acadêmico, e a Antologia da ALL... fiz um relato do estadode-arte do Perfil, e a não-colaboração dos sócios em enviar seu currículo literário... apenas quatro, até o momento... quanto à Antologia, relatei que é estatutário sua publicação, ao menos uma por ano!!! Que na administração da Dilercy foi feita uma tentativa, inclusive com a nomeação de uma comissão, que não funcionou. Após um ano inativo, resolvi reunir o material e acabei elaborando quatro antologias, que não foram aceitas como se de ALL, pois elaborada por um único membro – impossível que uma única pessoa o fizesse.... – Então, as publiquei como de minha autoria, na minha revista...

MARANHAY, Revista Lazeirenta 65 - AGOSTO 2021 - EDIÇÃO ESPECIAL: SEMANA LUDOVICENSE DE LITERATURA by Leopoldo Gil Dulcio Vaz - Issuu

MARANHAY 58 - ANTOLOGIA: OS ATENIENSES, MARÇO 2021 por Leopoldo Gil Dulcio Vaz - Issuu

MARANHAY 57 - MARÇO 2021: EDIÇÃO ESPECIAL - OS ATENIENSES, VOL. III by Leopoldo Gil Dulcio Vaz - Issuu

MARANHAY - (Revista do Léo ) - 56 - março 2021 - EDUÇÃO ESPECIAL: ANTOLOGIA - MULHERES DE ATENAS por Leopoldo Gil Dulcio Vaz - Issuu

MARANHAY : Revista Lazeirenta (Revista do Léo) 55, abril 2021 - Especial: ANTOLOGIA - ALHURES por Leopoldo Gil Dulcio Vaz - Issuu

E outras edições, com o perfil dos homenageados do ano...

Na segunda edição do “MURAL ALL”, publicada no JP, artigo sobre Leonete Oliveira... uma referência a artigos anteriores, meus e de Antonio Aílton; assim, aproveito para complementar a biografia dessa que já foi considerada por Antonio Lopes a primeira escritora maranhense

A Plataforma que utilizo para as publicações – era de graça até 400 páginas – agora cobra para material acima de 50 páginas – R$ 1.580,00 por ano... - ; dificilmente pagarei esse valor, para colocar a /ALL em Revista no ar... mesmo com a minha Revista do Léo, não compensa. Daí fiz algumas alterações, na minha, dedicando-a apenas aos esportes e educação física e retirando a parte de literatura. Esta, fica apenas à ALL EM REVISTA... e será distribuída em PDF aos membros...

E no mês de março, comemora-se o Dia Internacional da Mulher (08) e o dia da Mulher Maranhense (11)...

LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ EDITOR

Expediente

Diretoria

Editorial

Sumário

PREENCHIMENTO DE VAGA – CADEIRA 26 - EDITAL COMISSÃO DE HOMENAGEM AO BICENTENÁRIO DE GONÇALVES DIAS

MARIA FIRMINA DOS REIS PODE SER DECLARADA A PATRONA DA EDUCAÇÃO DE SÃO LUÍS

Por Isaias Rocha

ANO DE GONÇALVES DIAS

SOBRE GONÇALVES DIAS

LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ E DILERCY ARAGÃO ADLER

ACIDENTE OU CRIME?

LUIZ CARLOS AMARAL

FELIZ 2023

Aniversário de José Neres

MORREU ANTÔNIO AUGUSTO RIBEIRO BRANDÃO

EDMILSON SANCHES

JORNAL PEQUENO – Editor: Vinícius Bogéa

CRÔNICA DA SAUDADE

ROBERTO FRANKLIN

LEONETE OLIVEIRA - UMA PIONEIRA JUCEY SANTANA

REPUBLICANDO - QUEM FOI A PRIMEIRA POETA MARANHENSE?

LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

REPUBLICANDO - A PRIMEIRA ESCRITORA MARANHENSE: ALGUMAS DÚVIDAS E ELUCIDAÇÕES

LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

REPUBLICANDO - LEONETE OLIVEIRA ou Ângela Grassi brasileira – A PRIMEIRA POETA MARANHENSE ANTONIO AÍLTON

ACONTECEU...

Márcia Reis: Poesia que traduz sentimentos

OSMAR GOMES DOS SANTOS

MANOEL DOS SANTOS NETO

VIDA ETERNA AO REI

MUNDINHA COMPLETA 80 ANOS E GANHA HOMENAGENS DOS MOVIMENTOS SOCIAIS DO MARANHÃO

JOÃO FRANCISCO BATALHA

OSMAR GOMES DOS SANTOS

JOSÉ CLÁUDIO PAVÃO SANTANA

EDMILSON SANCHES

QUINCAS VILANETO

CARVALHO JUNIOR

FRANCISCO TRIBUZI

JOÃOZINHO RIBEIRO

FERNANDO BRAGA

ANIVERSARIO DA CÂMARA DE ARARI

UM LIVRO CHAMADO DEMOCRACIA

A ESTRUTURA LÓGICA DA NORMA E A DISFUNÇÃO POSITIVA APLICADA

TESE DE HISTORIADORA CARIOCA CITA LIVRO DE EDMILSON SANCHES

DILERCY ADLER NA REVISTA CULTIVE 16 – UMA HOMENAGEM

MÁRIO LUNA FILHO NO DICIONÁRIO DE POETAS CAXIENSES.

4 POEMAS DE QUINCAS VILANETO

CONSIDERAÇÃO DE ANIVERSÁRIO

O CAPITÓLIO TUPINIQUIM

RELATÓRIO SERTANEJO

JOSÉ CLÁUDIO PAVÃO SANTANA

SUMÁRIO

FERNANDO BRAGA

OSMAR GOMES DOS SANTOS

ROBERTO FRANKLIN

ESQUECIMENTO E APRENDIZADO

FERNANDO FERREIRA DE LOANDA, UM POETA ESQUECIDO

A QUEM PERTENCE ESTA TERRA?

UM TOUR PELA NOSSA CIDADE, E AS CHAVES DE UM TEMPO ROGÉRIO ROCHA

CERES COSTA FERNANDES

CERES COSTA FERNANDES

ANTONIO GUIMARÃES DE OLIVEIRA

JOSÉ NERES

OSMAR GOMES DOS SANTOS

FERNANDO BRAGA

JUCEY SANTANA

FERNANDO BRAGA

OSMAR GOMES DOS SANTOS

COEMA HEMETÉRIO DOS SANTOS

NOTAS DO EDITOR SOBRE OS PAIS DE COEMA

CERES COSTA FERNANDES

FERNANDO BRAGA

“SOMOS TODOS DA GERAÇÃO DE 45”

"POESIA E FILOSOFIA: EM BUSCA DO PENSAR QUE POETIZA"

A SÍNDROME DA MOURA-TORTA

A DIVA E A PROFESSORA VÃO À FLIP

DIA MUNICIPAL DA POESIA

BANDEIRA TRIBUZI

O DIA SEGUINTE

SOUSÂNDRADE, O PRÓPRIO GUESA

LEONETE OLIVEIRA - UMA PIONEIRA

SATURNÁLIA

O DESASTRE DA CORRUPÇÃO

SONETO

UM DIA DE CHUVA

ANTONIO NOBERTO FALECIMENTO DA ESCRITORA RAIMUNDA JANSEN, DESCENDENTE DA RAINHA DO MARANHÃO

OSMAR GOMES DOS SANTOS

CERES COSTA FERNANDES

OSMAR GOMES DOS SANTOS

FERNANDO BRAGA

O PODER SEM CONQUISTAS

CHUVA EM 3 MOMENTOS

UM SER INANIMADO

O ROMANISTA ABELARDO SARAIVA DA CUNHA LOBO

DIOGO GALHARDO NEVES HERCULANA FIRMINA VIEIRA DE SOUZA - uma das primeiras historiadoras do Brasil.

Com notas do EDITOR

OSMAR GOMES DOS SANTOS

XENOFOBIA:PALAVRAS AO VENTO? NÃO

OSMAR GOMES DOS SANTOS DEIXE-ME VIVER

OSMAR GOMES DOS SANTOS

FERNANDO BRAGA

DO OUTRO LADO DA TELA

O SENSO ESTÉTICO DE OSWALDINO MARQUES

OS MAIS LIDOS DO FACETUBES

MHARIO LINCOLN

RESENHA: "CAIXA-PRETA (SALVARAM-SE TODOS OS BONS SENTIMENTOS)".

ROGÉRIO ROCHA

"POESIA E FILOSOFIA: EM BUSCA DO PENSAR QUE POETIZA"

EUGES LIMA

LENDA DA CARRUAGEM DE FOGO DE ANA JANSEN

PAULO RODRIGUES

A METAPOESIA DE QUINCAS VILANETO

PRÊMIO SESC DE LITERATURA ABRE INSCRIÇÕES PARA OBRAS DE ROMANCE E CONTOS

MHARIO LINCOLN

MONTELLO, MELHOR QUE AZEVEDO, COM O MESMO VIGOR ÉPICO DE TOLSTOI

LINDA BARROS

CRÔNICAS EM AZULEJOS DE PAPEL JORNAL

MHARIO LINCOLN

JOSÉ NERES: MANEJO E APLICAÇÃO DA INTELIGÊNCIA SÓBRIA, POIS SÁBIO É SABER APLICAR A SABEDORIA. E NÃO ACUMULÁ-LA

JOSÉ RAFAEL DE OLIVEIRA

O LÍRICO, O FÍLMICO E O CRÍTICO NA POÉTICA DE PAULO RODRIGUES

JOSÉ NERES

"O PRONTUÁRIO POÉTICO DO DOUTOR RAFAEL"

LUIZA LOBO

"ÉPICA E MODERNIDADE EM SOUSÂNDRADE"

MHARIO LINCOLN

O PONTO - G - NA POÉTICA METAFÓRICA (Ou carta aberta a Salgado Maranhão)

ANTONIO NOBERTO

SÃO LUÍS - FUNDADA POR FRANCESES E COLONIZADA POR PORTUGUESES: SAIBA SE VOCÊ TEM EMITIDO

OPINIÃO ERRADA OU ACERTADA SOBRE O TEMA

MHARIO LINCOLN

A ANTOLÓGICA ENTREVISTA DE UBIRATAN TEIXEIRA COM BERNARDO COELHO DE ALMEIDA

UMA DAS MAIORES RADIOGRAFIAS EXISTENCIAIS DE SÃO LUÍS, FORA DA CAVERNA DE PLATÃO

BERNARDO COELHO DE ALMEIDA.

MORREU ANTÔNIO AUGUSTO RIBEIRO BRANDÃO

(Caxias, 08/11/1934 São Luís, 03/03/2023)

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OcaxienseAntônio Augusto RibeiroBrandão,88anos, faleceuagoraànoite,em SãoLuís (MA),onderesidia, de causas naturais, conforme comunicado de seu irmão, Frederico Brandão. Laureado economista e distinguido professor universitário, foi membro da Academia Caxiense de Letras.

Em 2021, no dia em que ele completava 87 anos, escrevi o texto acima sobre o ilustre Conterrâneo de que ele tanto gostou que solicitou autorização desnecessária para ele reproduzir.

Que da Eternidade Antônio Augusto Brandão vele pelos Familiares e Amigos que ainda resistem neste lado de cá da Vida.

Condolências aos Familiares.

EDMILSON SANCHES

Abaixo, o texto que escrevi em 2021, no 87º aniversário de Antônio Augusto Brandão.

8 de novembro de 2021

ANTÔNIO AUGUSTO RIBEIRO BRANDÃO, CAXIENSE, 87 ANOS

Economista, ele sabe a diferença: preço, dá-se a coisas; valor, a pessoas. Ele é de valor.

No ano de 1934 o Brasil ganhava uma nova Constituição e Getúlio Vargas ganhava um novo mandato à frente do País.

O ano de 1934 também foi pródigo em dar ao mundo gente de muito nome e renome, futuros reis, presidentes, advogados, políticos, escritores, estilistas, artistas, economistas...

O sol daquele 1934, que se tornou noite eterna para gigantes da Literatura Brasileira que nem o caxiense Coelho Netto e o humbertuense Humberto Campos, iluminou os primeiros momentos de vida de gente como francesa Brigitte Bardot e a gaúcha de raízes maranhenses-caxienses Glória Menezes, o italiano Giorgio Armani, a paraibana Luíza Erundina, o americano Carl Sagan... Naquele ano, há 87 anos, nasciam economistas de grande talento, entre eles o paulista e paulistano Luiz Carlos Bresser-Pereira (que foi ministro da Fazenda, ministro da Administração e Reforma do Estado e ministro da Ciência e tecnologia do Brasil), e o caxiense Antônio Augusto Ribeiro Brandão, que, neste 2021, conta seus 67 anos de formação em Economia com o orgulho sadio e humilde de ter compartilhado seu maior patrimônio o saber -- com gentes das várias regiões do Brasil e, para além do Atlântico, mentes ávidas e atentas do Velho Mundo, a Europa. Que o digam aqueles que ouviram o conterrâneo Antônio Brandão na quase bicentenária Université Lumière Lyon (França) e na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, que neste 2021 completou 731 anos. Instituições centenárias que se renovam a cada instante pelo Conhecimento.

É esse caxiense, autor de vários livros e incontáveis textos, deles vertidos para outros idiomas, é esse conterrâneo de fala pausada e mansa que completa neste 8 de novembro 87 anos. Muitos dos que junto com ele abriram os olhos em 1934 não estão mais neste plano. Para a glória e graça da Família Ribeiro Brandão, Antônio Augusto mantém-se saudável, lúcido e produtivo, e fazendo desafios como um novo livro, biográfico,acercados rastrosdetalentoetrabalho, famíliaefeitos,realizaçõeseincompletudesqueo integram como homem íntegro.

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Professor, autor, palestrante internacional, cidadão viajado pelo mundo, certamente há muito para ele contar e muito para se saber das coisas que viu e fez e das causas que iniciou e defendeu. Mais que um livro, 87 anos são, no mínimo, uma enciclopédia inteira...

A vida de uma pessoa é, antes, durante e depois, a soma de preciosos instantes de vida de muitas pessoas. A história de alguém é resultado da interação com a história de muitos outros alguéns. Para ficar em um só exemplo, Antônio Augusto Ribeiro Brandão lembra do avô materno, que lhe deu um dos sobrenomes e segundo prenome e que completou 81 anos de falecimento em agosto de 2021. O neto Antônio ainda conviveu cerca de seis anos com o comandante Augusto do Espírito Santo Ribeiro, que dirigia o barco Itapecuru, a vapor, e transportava pessoas e bagagens, mercadorias e sonhos na linha que ia de Belém, no Pará, a Recife, em Pernambuco, com escala na capital maranhense, São Luís. Destemido, intrépido, o velho comandante Augusto colecionou histórias e ajudou a fazer uma delas à frente de seu barco: ele abrigou um governador maranhense e sua comitiva, expulsos do Palácio dos Leões, a sede do governo, pelas então forças revolucionárias.

A esse calejado comandante que tinha no nome Espírito Santo se uniu um ser também celestial: Nadir Celeste Ribeiro Brandão. Dª Nadir casou-se com o comandante Augusto e da feliz união nasceu Antônio Brandão, o primogênito, que veria nascerem mais nove irmãos: Frederico José, Rosa Maria, Maria Laura (falecida), José de Ribamar, Ângela Maria, João de Deus, Cenira Maria, Antônio Brandão Filho e Luiz Gonzaga (falecido).

Por sua vez, Antônio Augusto Ribeiro Brandão conheceu Conceição de Maria Soares Brandão, filha de tradicional família caxiense. Tiveram quatro filhos: Marcos Augusto, Márcio de Jesus, Mônica Regina e Antônio Brandão Neto. A família se ampliou com a chegada de cinco netos (Ciro Augusto, Camila Maria, Hugo, Ingrid e Davi), mas viu partir Dª Conceição há oito anos, em 13 de fevereiro de 2013. Sempre pioneiras e intimoratas, as mães preferem ir à frente, pois se, na Terra, romperam o próprio ventre para dar à luz os filhos, querem chegar à Eternidade para prepararem o caminho dos Céus aos que ficaram. Com a verve próprio dos talentosos caxienses, Antônio Brandão maneja as palavras como sabe calcular números bem. As palavras são de um cronista nato e contam sua vida com riqueza de memória. É Antônio Brandão que me repassa o que chamou de “uma historinha ainda viva em minha lembrança”. Ele escreve:

“No início dos anos 40 do século passado, meu pai novamente prefeito de Picos (atual Colinas - MA) embarcou a família em um ‘batelão’ puxado rio acima por uma lancha comandada pelo José Maria Machado. Minha família residia então no Largo da Matriz, em uma casa de calçada alta que ainda existe até hoje, quase ao ladodeondefuncionouaCasadas Modas, umas das lojas dosenhorAldericoSilva,um dos meuspadrinhos de casamento com minha já falecida e querida esposa, Conceição, ele e dona Dinir, no dia 28 de janeiro de 1961, na Matriz de Nossa Senhora da Conceição e São José, em Caxias.

“Chovia muito no final da tarde daquele longínquo dia! Já éramos cinco irmãos (fomos dez e, agora, somos oito). O senhor José Delfino da Silva, grande comerciante e exportador que pontificou na ‘Princesa do Sertão’, ao volante do seu automóvel cor de vinho, em cor vermelha reluzente, foi-nos deixar até à beira do rio [Itapecuru], para o embarque. Seguimos rio acima, de águas então caudalosas e cheio de cachoeiras, naquele enorme ‘batelão’ (papai, usando a sua criatividade, transformara aquele espaço rústico sobre tábuas em verdadeiro apartamento com forro e armadores para redes). A viagem durou praticamente uma semana, com paradas para pernoites.

“Em uma dessas paradas, à noitinha já, chovia muito no local conhecido como Almeida, se bem me lembro, e todas as crianças foram carregadas pelos braços do José Maria Machado até a casinha onde dormimos.” *

O relato acima é parte de memória e de texto já escrito por Antônio Augusto Ribeiro Brandão. O trecho serviu para ilustrar uma das muitas e boas amizades entre famílias caxienses neste caso, a de José Maria Machado e a de Antônio Brandão. Diz o economista e autor caxiense: “Acho que contei sobre essa viagem ao José Maria, filho, e tive a ventura de ainda rever o pai dele já meio com a visão prejudicada, em uma das minhas idas a Caxias e quando ele ainda residia na rua Gustavo Colaço, perto dos Tadeu. Fiquei com vontade de contar essa historinha também a você [Edmilson Sanches], que tem sido atencioso e cordial comigo. Abraços ao José Maria Machado Filho, fiador dessa antiga amizade.” E finaliza: “Espero que possa fazer o melhor uso

*

dessas confidências. Faz parte da minha biografia, que estou tentando terminar de escrever. [...] Falta muita coisa e desejo que possa ser meu próximo livro.”

O caxiense Antônio Augusto Ribeiro Brandão já lançou quatro livros, no Brasil e no exterior, nos anos de 2007, 2012, 2015 e 2019. As obras desse caxiense de boa cepa e grande talento tanto integram o acervo de reconhecidas instituições de ensino superior do Brasil, como a Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas (onde Antônio Brandão fez mestrado), quanto podem ser localizadas em grandes bibliotecas de vários países: em Paris e Lyon, na França; em Salamanca, Espanha; em Portugal, em Póvoa de Varzim e em Coimbra, na Universidade onde estudou outro Antônio, o Gonçalves Dias; e nos Estados Unidos, na portentosa Biblioteca Pública de Nova York, em uma das esquinas da 5ª Avenida, bem no coração de Manhattan.

Meu confrade na Academia Caxiense de Letras, Antônio Augusto Ribeiro Brandão, como excepcional talento na Economia, sabe exatamente qual o patrimônio que formou ao longo de 87 anos. Sabe a diferença entre bens tangíveis e intangíveis. Sabe o que em seu patrimônio tem preço e sabe, sobretudo, o que nele é valor.

Preço dá-se a coisas.

Valor, dá-se a pessoas.

Antônio Augusto Ribeiro Brandão é homem de valor.

Parabéns neste 8 de novembro de 2021 e em cada dia nos muitos anos que ainda hão de vir.

EDMILSON SANCHES

edmilsonsanches@uol.com.br

Fotos: Antônio Augusto Ribeiro Brandão com a namorada e futura esposa, Conceição, no Rio, em 1957. O autor e um de seus livros (o último que escreveu e lançou, foi uma autobiografia que ele me convidou para colaborar, mas terminou levando por si próprio o projeto). Vê-se ainda Augusto Brandão ao microfone, em sessão na Academia Caxiense de Letras, onde, sentado à Mesa (de camisa azul), eu o escutava.

*

POETA, ESCRITOR, IMORTAL E INTELECTUAL JOSÉ

FERNANDES 82 ANOS DE VIDA POR ARARI

Dr Hilton Mendonça entrevista Dr José Fernandes, confira na integra.

HM – Há muito tempo ouço falar de José Fernandes. Quem é esse ilustre cidadão, qual o nível de escolaridade dele e por onde trabalhou?

JOSÉ FERNANDES – Meu nome completo é José de Ribamar Fernandes, nascido em Arari, em 30.01.1938, filho do professor e depois comerciante Nestor Fernandes e de dona de casa Teresa de Jesus Fernandes.

Trabalhei desde os 14 anos como operário tipográfico e, a partir dos 20, tornei-me proprietário de uma microempresa tipográfica onde imprimi os meus dois primeiros livros – Poemas do Início e Caminhos da Alma – , além de livros de outros autores, como J. C. de Macedo Soares, José Chagas, Cunha Santos, Kleber Leite, Abraão Cardoso, Raimundo Corrêa, Genésio Santos, Luís Pires, Ericeira de Sousa e Lopes Bogéa. Nela editei o 1º jornal de Imperatriz e de Bacabal-MA, nos anos 60. Devido à minha atuação como gráfico, torneime, por 30 anos, presidente do Sindicato das Indústrias Gráficas do Estado do Maranhão e Diretor da FIEMA

Federação das Indústrias do Estado do Maranhão, com atuação no SESI, no Conselho de Contribuintes de São Luís-MA, Junta de Recursos da Previdência Social e no Tribunal de Recursos Fiscais do Estado. Formei-me em Direito e trabalhei muitos anos como advogado do BDM, incorporado pelo BEM – Banco do Estado do Maranhão. Fui assessor jurídico do TRT da 19ª Região e Juiz Classista do Trabalho, junto ao TRT da 7ª Região, onde me jubilei após ter recebido, em Brasília, a Comanda do Mérito do Juiz Classista.

HM – Como foi a tua infância e adolescência? Cita alguns fatos marcantes dessa época.

JOSÉ FERNANDES – Minha infância foi marcada por doenças: sofria de labinritite, desmaiava continuamente e sofria de outras patologias, curadas pelos remédios de uma bondosa vizinha, dona Sinuca, do homeopata “seu” Nicolau, do prático em remédios Antonio Garcia e, ainda, com a ajuda de um livro de um mestre do mentalismo, prentice Mulford, de meu pai.

Na adolescência, eu era operário durante o dia e estudante à noite, quando fundei, no Liceu, o jornal “O Estudante de Atenas”, com José Farias, e a primeiro entidade cultural de Arari, a UAE – União Arariense dos Estudantes,ojornal GazetaArariense,oGrupoTeatralRaimundaRamos ea BibliotecaMiltonEriceira;ajudei o hoje general Farias e Silva a criar a UVE – União Vitoriense dos Estudantes e o primeiro jornal de Vitória

O Mearim em Folha.

HM – Em Arari, quando e onde estudaste?

JOSÉ FERNANDES – Dos fins dos anos de 1940 ao início dos anos de 1950, estudei com Luzia Bastos e no Grupo Escolar Arimatea Cisne e, no último ano do antigo primário, no Instituto Nossa Senhora das Graças (hoje Colégio Arariense) e na Escola de Artes Gráficas Belarmino de Matos.

HM – Quem eram alguns dos teus colegas de classe e de quais tens boas lembranças?

JOSÉFERNANDES –NoArimatéaCisne:JoséPrazeres(quehojemoraem Curitiba),MariaEverton,Miriam Silva e Chiquinha Abas; no Instituto Nossa Senhora das Graças: – Antonio Rafael da Silva, Durval Prazeres, Antonio Batalha, Eden Soares e Digé Vale.

HM – Da tua juventude, quem eram os personagens de destaque em Arari?

JOSÉ FERNANDES – Antonio Anísio Garcia, padre Clodomir Brandt e Silva, o médico João Leão da Silva Melo, o oficial da Marinha, chefe da Agência da Capitania dos Portos, Manoel Abas (dono do Cassino Arariense), José Martins (dono de uma boa orquestra e professor de música) e, durante o tempo de sua administração, a prefeita Justina Fernandes Rodrigues (Bembém).

HM – E quanto às moças ararienses, quem eram as mais belas e as mais destacadas?

JOSÉ FERNANDES – É difícil enumerá-las. O Arari tinha a fama de ostentar as moças mais bonitas do Maranhão. Não citarei nomes com o receio de excluir alguma com a qual namorei.

HM

Antes deti edos amigos datuaépoca,quais ararienses iamestudarem SãoLuís e,nas férias, retornavam para Arari, como muitos de nós fizemos, décadas depois?

JOSÉ FERNANDES – Apenas por referências, sei que dois destacados estudantes, no início do século passado, ao passarem férias em Arari, fundaram o primeiro jornal da terra – A Luz – datilografado: José SilvestreFernandeseThiagoFernandes.Oprimeirosetornouum dosmaioreseducadoresdopaís eo segundo, apesar de culto e exímio beletrista, jamais atuou fora de Arari, contentando-se com uma promotoria-adjunta e a ajudar intelectualmente o grupo político comandado, primeiro pelo seu irmão Lucílio, e depois por Antonio Garcia.

Nos meus tempos de juventude, não alcancei as férias dos estudantes José Saraiva, Milton e Sadi Ericeira, Benedito Alves Cutrim, José Fernandes Ribeiro (Zé Padre) nem daquele que veio a ser frei Carlos de Arary. Lembro, porém, das férias de Benedito Garcia, Kleber Moreira, Manoelzinho e Zuza Santos, estes dois filhos do fazendeiro Cipriano Ribeiro dos Santos; de José Salomão; de José Ribeiro (Ribeirinho, que estudava agronomia em Curitiba-PR) e de algumas estudantes, as primeiras que se formaram na Escola Normal do Estado.

HM – Qual a tua ascendência conhecida e qual a tua descendência?

JOSÉ FERNANDES –Meu antepassadomais remoto, conhecido, temcomo troncoPedroLeandroFernandes, português do Arcebispado de Braga, um dos primeiros habitantes do Arari, no início do século XIX, que foi

avô de outro Pedro Leandro Fernandes, este meu bisavô, pai de Ana Maria Fernandes, casada com Raimundo Benedito Fernandes (Tenente Prego), meus avós. Minha avó Ana Maria era irmã de Lucílio e de Thiago Fernandes, personagem da história política e administrativa de Arari, a partir do primeiro quartel do século XX. Do meu casamento com a pedagoga e assistente social Maria José Batista Fernandes vieram as filhas Sílvia e Cláudia, e o filho Nestor Neto, advogados.

HM

Quem eram os líderes ararienses, antes do padre Brandt?

JOSÉ FERNANDES – A história registra o cidadão José Antonio Fernandes, rico pecuarista e industrial, juiz de paz, vereador e primeiro administrador da vila que nascera com o seu maior líder nos tempos remotos; posteriores a ele, pode-se destacar Francisco de Paula Bogéa, Leonardo Pimenta Bastos, Belisário Duarte Fernandes, Manoel Rodrigues Nunes, Antonio Anísio Garcia e Cipriano Ribeiro dos Santos.

HM – Quem eram os ararienses mais letrados da tua juventude?

JOSÉ FERNANDES – A história registra o cidadão José Antonio Fernandes, rico pecuarista e industrial, juiz de paz, vereador e primeiro administrador da vila que nascera com o seu maior líder nos tempos remotos; posteriores a ele, pode-se destacar Francisco de Paula Bogéa, Leonardo Pimenta Bastos, Belisário Duarte Fernandes, Manoel Rodrigues Nunes, Antonio Anísio Garcia e Cipriano Ribeiro dos Santos.

HM – Quem eram os ararienses mais letrados da tua juventude?

JOSÉ FERNANDES

Na minha juventude, as pessoas mais letradas de Arari não eram filhos da terra, a exemplo do padre Brandt, do dr. João Leão da Silva Melo e dos professores Benedito Gonçalves de Morais e José Ribamar Avelar. Ararienses, residentes em Arari, letrados daquele tempo, só o Raimundo de Sousa Fernandes – Caiçara eo enfermeiro eprofessorTonicoSantos. Porém, ébom lembrarqueoutros conterrâneos, residentes em Arari, como o Jorge Oliveira, José Soares, Nestor Fernandes Pedroca e Hoendel (cartorários) e algumas abnegadas professoras e professores possuíam um bom nível cultural, acostumados à leitura. E residentes fora do Arari possuíamos muitas pessoas letradas; apenas como exemplo, o professor José Saraiva, o médico Milton eo irmãoSadi Ericeira,KleberFernandes, JaimePestana,JoséRibeiroFernandes (ZéPadre), frei Carlos de Arary, padre Cutrim, Dr. Ribeirinho. Possivelmente, devo ter omitido alguns.

HM – Quais as grandes diferenças que tu notas entre os jovens a ti contemporâneos e os que fazem a Arari de hoje, final de 2010?

JOSÉ FERNANDES – Por influência da televisão, da internet, da globalização, os interesses dos jovens ararienses de hoje são mais difusos. Nos tempos do GAE, o interesse nosso não era concentrado nos divertimentos, mas, principalmente, nas questões sociais, econômicas e administrativas, objeto da nossa inquietação. Hoje, está faltando aos jovens um pouco mais de ideal, de espírito de cidadania, com bondosas exceções, de vez que muitos, alguns isoladamente, e outros em grupos, reunidos em entidades, estão criando boas iniciativas, inovadoras até, mesmo transpondo dificuldades.

HM

Eu percebo que Arari está ficando sem a grande maioria da descendência oriunda da juventude dos anos 70 a 80. De modo mais claro: os teus filhos (e os dos teus amigos de juventude), e os meus filhos (e os dos meus amigos daqueles tempos), já não moram mais em Arari; todos residem em São Luís, ou em outros lugares. Isso não significa um corte na tradição familiar? Quem é essa nova gente que hoje mora em Arari?

JOSÉ FERNANDES

Nossos filhos, de modo geral, ausentaram-se de Arari, dele se alheiando e, consequentemente, dispersando-se das raízes da família originária. Com raríssimas exceções, podemos dizer que perderam a arariensidade. A própria população local também vem perdendo, aos poucos, a sua antiga identidade, influenciada pelas migrações que miscigenam culturalmente a população da urbe, dificultando a sua integração com a comunidade antes unida por usos e costumes. Tomo por exemplo o carnaval, outrora brincado nas ruas e nas casas (os famosos “assaltos”) e hoje concentrado numa praça repleta de gente pulando, gente que as vezes nem se conhece. Por oportuno, pergunte a qualquer pessoa de Arari o nome e o que fez o personagem no único busto erigido na cidade, próximo à Rodoviária. Dificilmente alguém saberá de quem se trata. No entanto, é válido o esforço daqueles que tentam resistir para preservar as nossas boas tradições. HM – Zé, como era o acesso a São Luís do começo dos anos 1950 até a década seguinte?

Todo o acesso, tanto para São Luís como para qualquer parte, era por meio do transporte fluvial, lanchas e batelões que cortavam o Mearim, o Pindaré e o Grajaú transportando gente e uma grandeproduçãoagrícola.Foi afaseáureadanavegaçãofluviallideradaporArari.Comoadventodasestradas

JOSÉ FERNANDES

de rodagem, o acesso tornou-se mais fácil, mais rápido, mas o Arari passou a não fabricar nem produzir quase nada: acabaram-se as sapatarias, a construção naval, as mercenárias, carpintarias, artesanatos, alfaiatarias, exportação de carne-seca, mel de abelha, aguardente de cana e açúcar mascavo. Tudo passou a ser comprado fora, na capital.

HM – E as ruas de Arari, como eram as principais delas?

JOSÉ FERNANDES – As ruas de Arari, no inverno, eram infernos de lama e, no estio, um mundo de poeira fina e gripante, repletas de cachorros, porcos e gado. Vieram a melhorar depois do primeiro trabalho de piçarramento feito pelo prefeito Caiçara.

HM – Poderias fazer um brevíssimo resumo de todos os livros que já escreveste?

JOSÉ FERNANDES – Poemas do Início, Caminhos da Alma e Portal do Infinito, os três de poesias rimadas, metrificadas ou livres; Crônica Arariense, prosa variada sobre assuntos relacionados com a Arari; A Representação Paritária na Justiça do Trabalho, um ensaio de tema jurídico; O Educador Silvestre Fernandes, uma biografia desse grande polígrafo; O Rio, memorial histórico e geográfico sobre o rio Mearim, afluentes e suas implicações antrópicas-ambientais; Gente e Coisas da Minha Terra, sobre figuras do passado do Arari, origem desse nome, controvérsias sobre quem foi o fundador da cidade. Já impresso, lançarei, em São Luís, neste mês de março, o meu mais recente livro – Ao Sabor da Memória – contendo crônicas de viagens, perfis de personalidades, reminiscências e ilações variadas, extraídas do cotidiano – um livro que, modéstia à parte, merece ser lido, pois, afinal, para isso foi escrito.

HM – Quem eram as pessoas que compunham o antigo Grêmio Arariense dos Estudantes e por onde andam essas pessoas, hoje?

JOSÉ FERNANDES – Citarei vários nomes, os primeiros, desde a fundação, quatro já falecidos: Cleómenes Carneiro, David Maciel Santos, Paulo da Silva Prazeres e José Benedito Pestana. Os demais encontram-se em São Luís-MA e espalhados pelo Brasil, exercendo cargos públicos, profissões liberais, executivos, magistrados, empresários

uns aposentadoseoutros em atividades: EsterSalomão daSilva, MariadeLourdes Gusmão, Belarmino Chaves Everton, João da Silva Maciel, Abdelaziz Aboud Santos, João de Oliveira Prazeres, José de Ribamar Fernandes, Maria de Nazaré Ferreira, João Mário Chaves, João Francisco Batalha, Raimundo Antonio Chaves, Walber Muniz, José Ribamar Muniz Pinto, Renato Reis Martins, Roberval dos Santos Pires, Francisca Sanches Pires, Laura Rosa Victor, João Damasceno Pinto, Luzia de Jesus Fernandes Ericeira, Jaime Muniz Pinto, Rômulo de Jesus Soares, José de Ribamar Salomão Prazeres, Jesus da Graça Rodrigues,LeãoSantos Neto,JoséAbasPrazeres,MarcelinoChavesEverton,MariadoRosárioEvertonVale, José Raimundo Soares Filho, Abdomacir Coêlho Santos – todos com direito ao cargo de Conselheiro da Fundação Cultural de Arari, sucessora do referido Grêmio.

HM – Que avaliação tu fazes da administração de todos os prefeitos que governaram Arari, no teu tempo?

JOSÉ FERNANDES

Seria longa e exaustiva a minha resposta, em face da limitação de espaço disponível para esta pequena entrevista. No entanto, abordarei essa matéria, com minúcias, no meu livro de memórias; não custa aguardar um pouco. Só a título de curiosidade, direi apenas que acompanhei, de perto, as gestões dos prefeitos Justina Fernandes Rodrigues (Bembém), Raimundo de Sousa Fernandes (Caiçara), Benedito de Jesus Abas (Biné) e uma de Leão Santos Neto. Constatei bons trabalhos nessas administrações, a par das carências e deficiências do sistema e dos obstáculos políticos-administrativos peculiares ao cargo.

HM – Padre Brandt ficou imortalizado em Arari, notadamente por ter-se empenhado muito, durante mais de 50 anos, para melhorar a qualidade educacional daquela Ribeira. Como o padre morreu em 1998, podemos dizer que a juventude atual, que conta com idade de 15 anos, aproximadamente, já não sofre mais nenhuma influência daquele educador? Seriam esses jovens aqueles que vão efetivamente começar a enterrar Clodomir Brandt Silva para sempre?

JOSÉ FERNANDES – Do padre Brandt remanescem obras que perduram – o Colégio Arariense, com centenas de alunos, a Biblioteca Justina Fernandes Rodrigues, os diversos Secretariados da Associação da Doutrina Cristã e seus livros, que continuam disponíveis, no seu Memorial, para quem quiser lê-los. Seus feitos são sempre citados em artigos de jornais, discursos e palestras. Enquanto tiver alguém que repasse adiante as lições que ele ministrava nas suas aulas de Civilização, com todo o alunado reunido na igreja, ele continuará presente no sentimento de outras gerações. A propósito, eu, seu ex-aluno, estou reescrevendo a sua vida e a sua obra, num livro que se chamará A Utopia do Padre Brandt.

HM

Thiago Fernandes foi um dos ararienses mais cultos que por ali viveu. O médico João Lima e o exprefeito Caiçara, também. Que outros nomes tu podes citar, como pessoas cultas, que viveram ou que ainda vivem em Arari-MA?

JOSÉ FERNANDES – Dos que viveram, no passado, na nossa terra, além dos já citados, acrescento os nomes do professor e inspetor escolar José Francisco Chaves Fernandes (Zeca Fernandes), o orador Joaca Chaves, o tabelião Pantaleão Costa, o empresário Abdomacir Santos e os não-ararienses Clóvis Ribeiro de Morais, José Moreira e, por último, Lourival Serejo.

É-me difícil as pessoas cultas que hoje vivem em Arari em face da minha ausência da cidade. Sei, porém, que são muitas, aí incluída a classe dos professores. Em tese, os homens e as mulheres com formação escolar superior, residentes ali, são pessoas consideradas cultas ou achegadas à cultura.

HM – Ilustre Zé, pouco se escreve sobre a política arariense. Fico com a impressão de que essa tarefa cabia/cabe, principalmente, aos historiadores de Arari, que não se ocupam do tema, adequadamente; Com isso, o tempo passa,eArarificasem informações importantesacercadas disputaseleitorais havidas,dos atores envolvidos e das gestões realizadas em nossa terra. Como tu és testemunha e foste ator político, gostaria que tu fizessesumaexplanação, amais longaedetalhada possível, sobreas campanhas políticas quetu participaste bem como redigisses uma análise de cada uma das gestões municipais que tu presenciaste, em Arari, ao longo da tua vida.

JOSÉ FERNANDES – Essa resposta, realmente, exige a percuciência de um historiador, e um historiador com profundo conhecimento político e sociológico. E só um alentado estudo talvez elucidasse essa complexa questão levantada

coisa que excede os parcos limites deste entrevistado.

Empiricamente, todavia, é possível que eu dissesse algo a respeito, pois participei da política de Arari como Vereador, aos 20 anos de idade e como postulante à prefeitura, ao 29 anos, e coordenei a campanha eleitoral que elegeu prefeito o meu amigo Dico Caiçara. Tenho, pois, alguma experiência na matéria e prometo que um dia, se tiver engenho e arte, tentarei respondê-la.

Por enquanto, permita-me o ilustrado entrevistador que eu diga apenas que o arariense, o maranhense, o paulista, o brasileiro, nós, com respeitabilíssimas exceções, votamos muito mal: por impulso, descaso, camaradagem, pedido de outrem, favor ou troca de favor, pela feição ou pela palavra malandra do candidato. Nem 5% dos eleitores deste país que elege Maluf, Tiririca, Renan, Jesuíno ou Roriz votam analisando a vida pregressa do candidato, seu passado, sua trajetória; jamais procuram saber se realmente o ou os candidatos têm competência e dignidade para se tornar nosso representante. E mesmo depois de contínuas decepções, nós, eleitores, continuamos a cometer os mesmos equívocos. Uma lástima, por nossa máxima culpa.

Do Blog de Hilton Mendonça Filho

MARIA FIRMINA DOS REIS, MULHER NEGRA QUE QUEBROU BARREIRAS NA LITERATURA

Arte Clube recebe Luciana Diogo, especialista na obra da escritora

Arte Clube

O Arte Clube apresenta uma entrevista especial sobre a escritora Maria Firmina dos Reis (1825-1917), com a pesquisadora Luciana Diogo. Ela é autora do livro "Maria Firmina dos Reis: vida literária" (Ed. Malê) e administra um portal com informações importantíssimas e raras sobre a autora. Firmina nasceu em 1825, em São Luís do Maranhão. Era neta e filha de escravizadas alforriadas. Entre seus muitos pioneirismos, publicou, em 1859, o romance "Úrsula". É o primeiro romance abolicionista escrito por uma mulher em Língua Portuguesa e possivelmente o primeiro romance escrito por uma autora negra na América Latina. Outro feito inédito foi contar histórias sob o ponto de vista do oprimido, com personagens negros e indígenas. Ela também foi professora, e, ao se aposentar, criou uma das primeiras escolas mistas e gratuitas do país. Também atuou em jornais e na música.

Ao longo do tempo, o nome de Maria Firmina dos Reis tem sido apagado da história da literatura. Mas, graças ao trabalho de pesquisadores, sua obra e sua biografia renascem e resistem. Clique no player e confira um papo com a pesquisadora Luciana Diogo, além de ouvir poemas da autora, musicados pela artista Socorro Lira.

TAGS: LITERATURA LITERATURA NEGRA

Memorial de Maria Firmina Dos Reis - Este sítio reúne os materiais disponíveis sobre Maria Firmina dos Reis, dispersos em vários locais, de forma que estudantes, pesquisadores e interessados em geral possam explorar a riqueza da obra dessa escritora negra brasileira.

PATRONOS HOMENAGEADOS

2014 - MARIA FIRMINA DOS REIS 2015 – MÁRIO MARTINS MEIRELES 2016 – coelho neto 2017 – JOSUÉ MONTELLO 2018 – GRAÇA ARANHA 2019 – MARANHÃO SOBRINHO 2020/2021 – CARLOS DE LIMA 2022 - ? 2023 – GONÇALVES DIAS 2024 – FRAN PAXECO

Primeira reunião

DA COMISSÃO DE HOMENAGEM AO BICENTENÁRIO DE

GONÇALVES DIAS, ocorrida no Palácio Cristo, no dia 24 de fevereiro de 2023. Já foi definida a programação do mês de março e ao final do ano, o Concurso de Poesia Estudantil.

Nossa Presidente Jucey Santana, e a escritora e acadêmica da ALL Dilercy Adler, e outros membros da comissão em comemoração ao Bicentenário de Gonçalves Dias, em reunião na Academia Maranhense de Letras (AML).

21/03/2023

MARIA FIRMINA DOS REIS PODE SER DECLARADA A PATRONA DA EDUCAÇÃO DE SÃO LUÍS

Educadora e escritora ludovicense foi a primeira romancista brasileira

Por Isaias Rocha

Texto é de autoria do vereador Dr. Gutemberg, mas tramita apensado à proposição iniciada pelo vereador suplente Marlon Garcia. / Leonardo Mendonça

A CCJ (Comissão de Constituição, Justiça, Legislação, Administração, Assuntos Municipais e Redação Final) da Câmara Municipal de São Luís (CMSL) analisa Projeto de Lei nº 0229/2022 que declara a professora e escritora Maria Firmina dos Reis como patrona da educação ludovicense.

De autoria do vereador Dr. Gutemberg Araújo (PSC), o texto que tramita hoje apensado à proposição nº 0217/2022, iniciada pelo vereador suplente Marlon Garcia aponta, na justificativa, que a professora, nascida na capital maranhense, em 11 de março de 1822, foi a primeira romancista brasileira e por consequente, pioneira no que diz respeito à crítica antiescravista.

“Maria Firmina dos Reis foi a primeira mulher aprovada em concurso público, para o cargo de professora, no Maranhão. O prestígio alavancado por sua carreira na docência foi o que possibilitou a publicação do romance Úrsula, em 1859, assinada sob o pseudônimo ‘Uma maranhense’. Diante do exposto, a Câmara Municipal, através deste Gabinete Legislativo, vem oferecer o devido reconhecimento, a importância de Maria Firmina dos Reis para literatura brasileira, mostrando de forma brilhante a opressão sofrida por negros e mulheres no Brasil no século XIX”, frisou parlamentar em trechos de sua justificativa.

Tramitação

A proposta segue sendo analisada, em caráter conclusivo, pela CCJ. Após o parecer do colegiado, a proposição estará apta para votação em plenário, sendo que não há prazo regimental previsto para a tramitação completa. Caso seja aprovada pela maioria dos vereadores, segue para a sanção do prefeito para virar lei. Se for vetada, a proposição retorna para a Câmara dar a palavra final – se mantém o veto ou promulga a lei.

Biografia

Negra, filha de mãe branca e pai negro, registrada sob o nome de um pai ilegítimo e nascida em São Luís, no Maranhão, Maria Firmina dos Reis (1822 – 1917) fez de seu primeiro romance, Úrsula (1859), algo até então impensável: um instrumento de crítica à escravidão por meio da humanização de personagens escravizados.

Além disso, ela foi a pioneira no que diz respeito à crítica antiescravista. A romancista também foi a autora do conto “A Escrava” (1887), cuja história é de uma mulher de classe alta sem nome que tenta salvar uma mulher escravizada. Ela também foi a primeira mulher aprovada em concurso público, para o cargo de professora, no Maranhão. Anos depois, em 1880, obteve o primeiro lugar em História da Educação Brasileira, rendendo-lhe o título de Mestra Régia.

Maria Firmina também criou a primeira escola mista para meninos e meninas na comunidade de Maçaricó, município maranhense Guimarães, quando passou a lecionar para os filhos de lavradores e fazendeiros do povoado; contudo, a instituição, criada oito anos antes da Lei Áurea, não perdurou muito, pois foi alvo de críticas da época.

ANO DE GONÇALVES DIAS

SOBRE GONÇALVES DIAS by Leopoldo Gil Dulcio Vaz - Issuu

ACIDENTE OU CRIME?

Debruçado sobre a lupa jornalística do plutarco e filho mais ilustre de Cantanhede/MA, primo de Ana Amélia (a musa) e primo de Alexandre Teófilo (o confidente), o escritor e médico, Antonio Henriques Leal, na parte do naufrágio de Guimarães/MA (baía de Cumã), na madrugada do dia 03 de novembro de 1864, várias indagações são lançadas: as contradições dos depoimentos dos tripulantesdonavio VilledeBulongne; o nosso maiorpoetamorreraantesdonaufrágio?Esquecimentonahoradoresgatefeitoembarco"chalupa"?Ademora para a polícia tomar os depoimentos; as contradições dos tripulantes quando entrevistados pelo jornalista e escritor; o naufrágio teria sido realmente acidental ou uma fraude na carga com seguro? 158 anos depois, as inquietações de Antonio Henriques Leal, amigo, compadre e primeiro biógrafo de Gonçalves Dias continuam vivas.

CBCOM

@podcastmaranhao

DOC MA - GUIMARÃES "O NAUFRÁGIO DE CUMÃ"

Luiz Carlos Amaral

Diretor do Podcast Maranhão.

Diretor da Rádio Jeri.

Autor da primeira série internacional da TV maranhense "Maranhão, Começo do Brasil" (TV Mirante/Globo).

Correspondente em Lisboa/PT (Projeto Camões).

Ex-secretário de Cultura e de Governo de Cantanhede/MA. Bacharel em Comunicação Social (UFMA).

CRÔNICA DA SAUDADE

O grande poeta Fernando Pessoa, nos falou em um dos seus mais belos poemas:

“Eu amo tudo o que foi

Tudo o que já não é

A dor que já me não dói

A antiga e errônea fé

O ontem que a dor deixou,

O que deixou alegria

Só porque foi, e voou

E hoje é já outro dia.”

O poema já fala tudo, a saudade seria escutar uma música que nos transporta a aqueles momentos de imensa alegria, é ouvir aquele que partiu afirmar que perdoa a aqueles que um dia lhes fizeram mal. É olhar o espaço ocupado e sentir que o perfume insiste em não te deixar, é olhar para trás e sentir que uma vida foi vivida que uma vida foi construída, É ver que a semente plantada, transformada em árvore que gerou frutos, tem o mesmo sabor daqueles que partiram, que nos deixaram. A expressão seria: “olha você está muito parecido com...” Pois bem tudo aqui falado, lembrado foi o que Henry Filho fez, ele viveu, amou, trabalhou, curtiu, criou seus filhos e seus enteados, perdoou, estendeu a mão, ajudou, riu, chorou. De tudo que foi a vida de Henry o que mais deixou para mós foi exatamente a grande saudade.

Sabemos que a qualquer momento podemos partir, e tudo aquilo que um dia acumulamos aqui na terra vai ficar, mesmo os nossos corpos serão deixados. Tudo se esvai, tudo volta à terra, como está em Gênesis 3:19, do pó viemos e ao pó voltaremos. Talvez nunca devêssemos traçar planos e estratégia de vida. Talvez não devêssemos pensarmuito em bens materiais, lógicoqueviverbem émuito bom, desdequenãovireumarotina e de que vida, como fazia Henry, venha em primeiro lugar.

Temos um verdadeiro prazer em pensar que o mundo é e será sempre um grande problema. Tenhamos a certeza de que todos os nossos problemas estão dentro de nós mesmos, temos que viver a cada hora, minutos e segundos,

Precisamos segui coma lição de plantar a amizade, o amor, acredito que o maior bem que deveríamos deixar aqui na terra seria fazer com que os que aqui ficarem sentisse SAUDADES de todos nós, esse sentimento único que a língua portuguesa nomeia e só poucos a conhecem de verdade, só os que amamos e que nos fazem o bem deixam saudade. Saudade é essa ausência de alguém bom, de um lugar, de belos momentos.

Se deixarmos este sentimento impregnado no coração de alguém ou de muitos, deveríamos ter a certeza que o que vivemos aqui não foi em vão. Se deixarmos aqui a saudade, provocaremos o sentimento falta, deixaríamos em todos aqueles que sentem uma lacuna, a revolta deixada pela nossa ausência se transforma em lembranças prazerosas, provocamos as lembranças dos bons momentos aqui vividos.

São as boas e verdadeiras pessoas que deixam saudade do prazer em conviver, que faz com que os álbuns dos nossos momentos não sejam meras fotografias, mas a presença dos sorrisos, o som da voz, as brincadeiras, as amizades, eternamente revividas.

Assim Henry Filho deixa saudade e vive em cada momento que dele lembramos, sabendo também o quão frágeis somos, que todos teremos a nossa vez de voar, como diz o poema. E que fique então, a exemplo de Henry, não a dor que dói, mas a que se torna saudade.

LEONETE OLIVEIRA - UMA PIONEIRA JUCEY SANTANA

Leonete Oliveira Lima Rocha nasceu em São Luís, Maranhão, em 17 de julho de 1888. Era filha de Gentil Homem deOliveiraeLuiza Fernandes de Oliveira. Foi professora,poeta, congressista,oradorae bibliotecária. Faleceu Rio de Janeiro, em 1969.

Lecionou Português em casa, principalmente para mulheres, tendo sido precursora do ensino de Estenografia, em São Luís. Acreditava ser esta uma das alternativas para o acesso, principalmente da mulher, ao mercado de trabalho. Não chegou a concluir o curso Normal.

Participou com desenvoltura dos meios literários desde a adolescência. Fez parte do projeto “Oficina dos Novos” para a construção do busto do imortal Odorico Mendes, com apenas 14 anos (Pacotilha, 9.4.1902).

Foi eleita para o quadro de membro correspondente do Congresso Maranhense de Letras aos 21 anos (Pacotilha,16.11.1909).

Antes de se tornar conhecida do público, Leonete, usou em diversas ocasiões, o pseudônimo da escritora e atriz espanhola, Ângela Grassi (1823-1883), a quem admirava, como confirma Manoel Lopes, na Coluna “Reflexo” do Diário do Maranhão de 5.6.1909.

Aqui há tempos, os jornais publicaram os primeiros sonetos de uma poetiza que assinava, Angela Grssi. Tivemos suas produções poéticas a ventura de despertar os intelectuais (...) procurarem desvendar o segredo do verdadeiro nome da poetiza invisívelemseugraciosopseudonymo.LeoneteauctoradosversosdeÂngelaGrassi, animada pela sympatia dos que se interessam por seus versos, continuou a publicalos.

Se tornou importante conferencista, viajando para quase todos os estados do país, como convidada para proferir palestras e testemunhos de vida literária e incentivando as mulheres.

Foi a primeira mulher que, no Maranhão, ingressou no serviço público, sendo nomeada auxiliar da Biblioteca Pública do Estado, quando do Governo do Dr. Luiz Domingues, e o diretor da BBL era o historiador, José Ribeiro do Amaral, em seguida assumiu a biblioteca o também imortal Antonio Lobo que foi um grande admirador e incentivador da poeta. Leonete chegou a ser nomeada para o cargo de Auxiliar do Diretor, um pioneirismo (Correio da Tarde, 22.7.1910).

Enquanto esta nomeação, nos meios sociais de São Luís, criou escândalo, em outras capitais repercutiu de maneira surpreendente, fazendo-se em torno do ato do Governo maranhense referências elogiosas, por haver sido, no Brasil, àquela época, um dos primeiros Estados a empregar uma mulher em repartição, em cargo de destaque.

Em 1909, houve concorrida conferência na Biblioteca Pública, ministrada pela poetisa Leonete Oliveira, com o tema “Mulher”. O evento gerou grande polêmica pelo assunto abordado. A conferencista enalteceu o papel na mulher na sociedade, citando importantes vultos femininos, como: Catarina da Rússia, Santa Teresinha, as escritoras Júlia de Lopes Almeida, Laura Rosa, Mariana Luz, entre outras.

Estava lá representado não só freqüentadores que vão a essas reuniões por simples prazer intellectuais, mas igualmente o burguês escandalizado pelo facto extraordinário de ser a conferencista uma moça, e principalmente o tema ser “mulher” (Diário do Maranhão, 29.10.1909 e Pacotilha, 1.11.1909).

Aindasobre a evidenciadamulhernas letras, em matériano jornal Gazetada Notícia,do Cabo Friode Janeiro, com o título “Letras Femininas”, com destaques para Mariana Luz, Adelina Teixeira Marques, Maria Firmina dos Reis, Laura Rosa, Leonete Oliveira e outras, enfatiza “O Maranhão é incontestavelmente das diversas partes do Brasil, aquela que se cultiva com mais abundancia o poesia” (Gazeta de Notícia, 30.3.1919).

Leonete Oliveira, se firmou como excelente poeta, publicando seus poemas em jornais e revistas, O esmero de sua técnica a fez reconhecida como uma grande escritora de seu tempo. Vale ressaltar, que em Novos Atenienses (2016.4.Ed.p.84) de Antonio Lobo, refere-se a Leonete, como: “poetisa adorável pela simplicidade cantante e doce dos seus versos”. Clovis Ramos em, As Aves que aqui gorjeiam: Vozes feminina na poesia maranhense (1993,22) afirma que “Mariana Luz ao lado de Laura Rosa e Leonete Oliveira é uma das mais importantes poetas da vida maranhense e não será esquecida”.

SegundoCrisóstomodeSouza,naobrainédita,PáginasdaSaudade(1945),“Leonetemadrugoupara apoesia, em um tempo em que a maioria das moças cuidava apenas de festas, casamentos e trivialidades, descuidandose da elegância espiritual”.

Com 21 anos de idade Leonete, publicou seu primeiro livro, intitulado, Flocos, em 1910, tendo recebido muitos elogios da crítica nacional:

Com o presente volume, que deu o nome de “Flocos” que é a reunião de todas as produções poéticas destes dois últimos anos, algumas já publicadas em jornal, vem a jovem poetiza alistar-se com galhardia no grupo dos nossos intellectuaes, ondefaltava,devidoaculpávelindiferençadobellosexodanossaAthenas,pelas coisas literárias, um vulto gracioso de mulher. (Pacotilha, 18.1.1910).

Em 1912, Leonete foi morar no Rio de Janeiro, casando-se com o cidadão português, Mauricio Lima Rocha, tendo acrescido em sua assinatura o sobrenome de Lima Rocha do esposo, mudando-se para Lisboa. Em Portugal publicou, em 1917 Cambiantes. O livro foi lançado em Lisboa e em Fortaleza. Depois lançou no Rio de Janeiro e posteriormente em São Luís, para amigos e admiradores. Publicou muitos poemas em jornais de todo o país e de Lisboa.

O livro Flocos (1910), deu-lhe imediatamente um lugar de proeminência na literatura (....). Agora Leonete tendo melhor afinado a sua lyra divina (...) brinda-nos com o segundo livro. Veio de Lisboa para Fortaleza, ondedeencontraatualmenteresidindoadistintapoetizamaranhense.Intitula-seCambiantes,comsuas últimas produções. Inteligente, culta,sabendorimarcom propriedadeemetrificar com elegância.Seus versos deamor, de saudade, de ventura e de tristeza, que faz rir e chorar, sofrer e pensar (Jornal das Moças, RJ, 26.7.1917).

Após residir vários anos em Lisboa, ao retornar ao Brasil, fixou residência em Fortaleza, onde integrou a Ala Feminina da Casa Juvenal Galeno, instituição literária idealizada e fundada em 1919.

De volta ao Rio de Janeiro, fez parte do quadro do pessoal do Ministério do Exército, lotada na Biblioteca. Em 1959 publicou, o seu terceiro livro, Folhas de Outono, sob os auspícios da editora da Biblioteca do Ministério, em que trabalhava.

Participou de várias antologias, entre as quais: Sonetos Brasileiros, organizado pelo imortal da Academia Brasileira de Letras, Laudelino Freire (1913), Sonetos Maranhense, organizado pelos jovens, da Távola do Bom Humor, em comemoração ao centenário da Independência do Brasil (1922), Antologia Maranhense, de José Ribeiro Sá Vale (1937), Novos Atenienses de Antonio Lobo (1916).

A poetisa, tempos depois enviuvou e aposentou-se em 1968, tendo falecido no ano seguinte, 1969, sem mais voltar ao Maranhão.

Leonete Oliveira, virou nome de rua em São Luís (MA), no bairro, Cohab Anil II.

A escrita de Leonete Oliveira, revela a sua preferência por versos medidos e rimados. É possível perceber o cuidado com a sonoridade dos textos, que imprime aos seus versos uma forte carga emotiva, como no poema “Gotas de prantos”, publicado na obra, Os Novos Atenienses. O soneto em tom descritivo, explora a temática da melancolia e da saudade:

Gotas de prantos Gotas de pranto, gotas cristalinas, Que tristemente dos meus olhos descem; Pérolas brancas, trêmulas, divinas, Flores de inverno que jamais fenecem.

Ide nas duas asas pequeninas, Dos meus sonhos azuis que empalidecem, Ide por sobre as ondas diamantinas, Ide! E dizei que as minhas dores crescem.

Voai! Correi nessa galera branca, Que esta saudade do meu peito arranca, Cheia de sonhos e ilusões fugaces.

... Depois de terdes doidejado aflitas, voltai de novo, oh! lágrimas benditas, voltai de novo para as minhas faces.

Depois, evoluindo para a arte, poética, sente-se nos seus versos a encantadora sensualidade dos sons e cores cambiantes, como em “Vênus”, Leonete traz o intertexto com a emblemática pintura “Nascimento de Vênus” de Sandro Boticelli. No texto a autora explora a volúpia e sexualidade da figura mítica, a deusa greco romana do amor e da beleza. Nota-se, como a autora aproxima elementos paradoxais na discrição da divindade, a saber: a frieza e brancura de mármore, com o calor e cores quentes do fogo: Vênus

Ei-la que surge enfim do mar resplandecente de bustos, de corais, de pérolas brilhantes, a coma desnastrada, os seios nus frementes, o olhar em fogo a rir nos olhos fulgurantes.

Treme-lhe o corpo, assim, como se de repente sentisse percorrer lhe as carnes deslumbrantes, uma volúpia, uma volúpia ardente, um surdo palpitar de estonteantes.

... E ela parte a cantar, e na praia deserta fica o suave calor das suas tranças soltas, e o perfume sutil que sua alma desperta

E jamais pôde o mar, nem ao menos de leve, apertar contra o peito, entre as águas revoltas, esse mármore vivo, esse corpo de neve!

Leonete também explora a temática amorosa, como no poema, Beijo, do livro Cambiantes. A autora, de maneira interessante, coloca na fala de uma pessoa, a expressão de sofrimento de um amor perdido. A referência a beijos, mesmo de forma sutil, se refere em uma temática mais sensualizada, o que não era um

território visitado por escritoras naquela época. Observa-se também a dimensão metalinguística que acompanha o desfecho do poema. O último verso traz a ideia da inadequação da linguagem diante das experiencias vividas: Beijo

Para jamais te enganares, não sejas juiz de ninguém. - Como os outros tu julgares, serás julgado também...

Naquele beijo inocente, que os nossos lábios uniram, meu coração, de repente, para o teu peito fugiu.

É dolorosa a verdade, mas eu sempre assim senti, tenho raiva da saudade, que lembra o bem que perdi.

Do que penso e no que sinto, Você quer tudo saber. Mas, pode crer, eu não minto, Sei senti, não sei dizer...

Nessa breve exposição de três poemas, o leitor poderá perceber a beleza da escrita de Leonete, que merece melhor acolhida do público.

Vale observar que Leonete Oliveira, estava completamente esquecida da esfera literária maranhense, graças as pesquisas dosimortaisdaAcademia LudovicensedeLetras, AntonioAilton SantoseLeopoldo Gil Vaz, em 2020, foi publicado um interessante ensaio sobre a autora de Flocos.

LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

Publiquei, recentemente, artigo sobre uma poetisa maranhense que, na opinião de Antonio Lopes, seria a primeira: LEONETE OLIVEIRA Lima Rocha2 nascida em São Luís, Maranhão, em 17 de julho de 1888, filha de Gentil Homem de Oliveira e Luiza Fernandes de Oliveira. Foi Professora e Bibliotecária. Ingressou na Academia Maranhense de Letras. Residia no Rio de Janeiro, aonde veio a falecer. Publicou "Flocos", "Folhas de Outono" e muitos outros. Leonete Oliveira virou nome de rua em São Luís, no bairro Cohab Anil II.

Hoje, sabe-se – e se aceita – como a primeira mulher a escrever poesias, contos, crônicas, e publicar livros, foi Maria Firmina dos Reis, patrona da Academia Ludovicense de Letras.

Antônio Lopes, em artigo publicado no “Diário do Maranhão” edição de 05 de junho de 1909, referia-se sobre a inexistência de poetas mulheres no Maranhão e, então traz-nos alguns nomes, pseudônimos, e identificando quem escreveu algumas belas poesias que apareciam, então. É a seguinte a nota:

2 http://falandodetrova.com.br/leonete

https://www.literaturabrasileira.ufsc.br/autores/?id=2941

https://www.literaturamaranhense.ufsc.br/documentos/?action=midias&id=222031&locale=en

PRIMEIRA
QUEM FOI A
POETA MARANHENSE?

Título: Leonete OliveiraAutor/ Colaborador:Garnier, M.J. Data:[189-?] Descrição:bico de pena Assuntos:Authors, Brazilian - Portraits Oliveira, Leonete dePortraits B869.8 Oliveira, Leonete de, n.1888 - RetratosEscritores brasileiros - RetratosT ipo: Desenho Idioma: Português

Leonete utilizava o pseudônimo de Angela Grassi, que foi uma escritora romântica espanhola, do século XIX3 A Pacotilha, de 11 de junho de 1908 publica um seu poema:

Em A Pacotilha de 14 de agosto de 1908 é publicado um poema dedicado à Angela Grassi, assinado por “H”:

3 Angela Grassi (Cromá, 2 de agosto de 1823 - Madrid, 17 de septiembre de 1883) fue una escritora romántica española del siglo XIXhttps://es.wikipedia.org/wiki/%C3%81ngela_Grassi

E a 25 de agosto, Correa de Araujo lhe dedica outro poema:

Em 1908, no Diário do Maranhão de 09 de outubro sai a seguinte nota:

A Pacotilha de 30 de outubro de 1908 traz a seguinte carta aberta destinada à Vieira da Silva:

Também tece crítica ao livro de Astolfo Marques, recém publicado (A Pacotilha, 03 de dezembro de 1908):

Conforme notas publicadas nos diversos jornais de São Luis, no ano de 1909 Leonete de Oliveira participava de eventos acontecidos, cívicos e religiosos, tanto em São Luis como no interior, como uma festa em Cajapió em honra ao Menino Jesus.

Nova critica literária publicada, em A Pacotilha, desta vez sobre a obra de Maranhão Sobrinho (1º julho de 1909)

A 25 de agosto, em A pacotilha, é publicada um poema

Chegou a dar conferencias na Universidade Popular Maranhense, abordando o tema “A Mulher”: A 1º de novembro de 1909:

Nesse mesmo ano foi aceita como sócia correspondente da Academia Maranhense de Letras:

Como a publicar seus poemas

A Pacotilha de 18 de janeiro de 1910 informa que o livro de Leonete Oliveira entrara na gráfica, e traz mais um poema inédito:

O Correio da Tarde, edição de 22 de julho de 1910 traz sua nomeação para a Biblioteca Pública, como auxiliar do Diretor, Ribeiro do Amaral. 4

A Pacotilha de 6 de abril de 1914 traz a sua exoneração do cargo de auxiliar da diretoria da Biblioteca Pública. Na edição de 10 de julho, pede o comparecimento dos rementes de jornais à repartição postal, para verificarem as remessas, dentre elas, a de Leonete Oliveira, para São Paulo.

A Gazeta de Noticias, do Rio de Janeiro, em sua edição de 14 de novembro de 1914, noticia que estava fixando residência no Rio de Janeiro a poetisa maranhense Leonete Oliveira, procedente de São Paulo:

4 http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=388459&pesq=LEONETE%20OLIVEIRA

M. Nogueira da Silva publica na Gazeta de Noticias, edição de 29 de novembro de 1914 meia página dedicada à poetisa Leonete Oliveira, recém se estabelecida no Rio de janeiro:

O
Jornal, de 2 de julho de 1917, anuncia o aparecimento

Antonio Lopes, em A Pacotilha, edição de 2 de agosto de 1917, ao comentar os livros lançados recentemente, além de comentar o do Barão de Studart sobre O Movimento de 17 no Ceará, dedica um espaço para um segundo, de autoria de nossa poeta:

Lima Barreto, na Revista Contemporânea (31/08/1918)5, sob o título “Um poeta e uma poetisa” – Hermes

Fontes e Leonete Oliveira =- e tece as seguintes considerações:

5 http://memoria.bn.br/DocReader/Hotpage/HotpageBN.aspx?bib=351130&pagfis=415&url=http://memoria.bn.br/docreader#

Nogueira da Silva, no Jornal das Moças (1917) traz-nos a seguinte crítica:6

Leonete Oliveira

O nome, que encima estas linhas, não é desconhecido das gentis leitoras do Jornal das Moças. No numero 107 sahiu, acompanhado de seu retrato, um lindo e bem feito soneto, intitulado Vaidosa, um magmüco inédito aue,-por feliz acaso, nos vem as mãos. No numero seguinte, logo tivemos também oportunidade de dar um outro soneto, como o primeiro marcado de excellente e então arrancado das fulgurantes paginas do seu primeiro livro de versos Flocos.. , .

Leonete Oliveira é a maior e a mais brilhante poetisa maranhense, que ao lado de Gilka Machado, Julia Lopes da Silva, Laura da Fonseca e Silva, Julia Cortines, Rosalia Sandoval, Ibrantina Cardone, Julieta e Revocata de Mello, Leonor Posada, Violeta Odette e outras, forma na vanguarda das letras femininas no Brasil.

O seu livro Flocos deu-lhe immediatamente um logar de proeminencia na literatura, destacando-se, com brilho, dentre a pleiade de poetas e homens de letras do Maranhão.

Agora Leonete Oliveira, tendo melhor afinado a sua lyra divina e melhor acentuado os seus dotes poéticos, brinda-nos com um segundo livro. Veiu de Lisboa para Fortaleza, onde se encontra actualmente residindo a distincta poetisa maranhense. Intitula-se Cambiantes e contem as ultimas produções da festejada escriptora patricia.

O novo livro de Leonete Oliveira vem confirmar inteiramente os conceitos externados do seu valor e de suas virtudes literarias, quando foi do aparecimento do seu primeiro volume de versos. Inteligente, culta, sabendo rimar com propriedade e metrificar com elegância, os versos da formosa poetisa maranhense merecem todos os nossos encomios. O espaço não nos permitte especificar e citar, mas sempre apontamos as seguintes peças: Cambiayites, Creio, Nunca mais, Sol-pôr, Beijos, Os nossos arrufos, Vitima carta, Vaidosa, A uma arvore seca, A um coração, Cantar es e Um ramalhete, alem de outras, que» serão sempre lidas com uma grande, uma sentida, uma funda emoção. Versos de amor, de saudade, de ventura e de tristeza, elles fazem rir e chorar, elles fazem soffrer e pensar.

Nisso, parece-nos, reside todo o elogio que se possa fazer desse interessante e encantador volume que nos enviou a distincta poetisa maranhense.

E quanto a citações, faremos apenas duas. Esta linda e profunda quadra:

Segredos ha no coração,

Que a gente cala e nunca diz...

De um lado o amor, doutro a razão, Quem pôde assim viver feliz ?

que separamos da poesia Cantares e que vale por uma philosophia, vibrando como um jóia delicada, uma minúscula obra-prima do pensamento. E agora este magniüco soneto, “Beijo”; que lembra a musa sensual e impecável de Raymundo Correia, perieito, sentido, encantador :

Beijo de amor que abraza o sangue e acende

Um fogo ardente e liquido nas veias, Beijo que á tua a minha bocca prende, Por que eu anceio e por que tu anceias •

6 http://memoria.bn.br/pdf/111031/per111031_1917_00110.pdf

Essa loucura que ninguém comprehende, De que sentimos as nossas almas cheias, Esse calor divino que se estende

Por sobre nós como doiradas teias:

São desses beijos que nós dois trocamos, E que á força de serem repetidos, Vão comnosco a cantar por onde andamos , . .

Inexgotavel fonte de desejos, Que os nossos lábios vivam sempre unidos, E sempre vivam permutando beijos !

E não precisamos dizer mais do valor e dos méritos excepcionaes da poetisa Leonete Oliveira. Os seus versos dizem mais e mais alto e mais eloqüente, que os nossos pobres conceitos. Organisando o seu novo livro, a grande poetisa maranhense juntou aos novos versos, algumas poesias e sonetos do volume intitulado Flocos, que são estes: Mãe, A louca, Só, Suprema dor, A meu violão, A caza do vaqueiro, Gotas de pranto, Noite, Venus e Volúvel. Isso deu, de algum modo, certo realce as Cambiantes, pois a formosa poetisa escolheu precizamente as melhores peças do seu primeiro livro. Mas, que o não fizesse. Não era precizo. O seu segundo livro é, sob todos os pontos de vista, melhor que o primeiro e vem confirmar brilhantemente o posto que nas letras brasileiras, a applaudida poetisa maranhense conquistou, muito justamente,com a publicação dos seus primeiros versos.

M. Nogueira da Silva

liihliogrupliia A mulher: conferência. Maranhão, Imprensa Oficial, 1909, in-é° de 23 pp.

Flocos: poesias.'Maranhão, Ti/p. Teixeira, 1910, in-8o de 108 pp.

Cambiantes: poesias. Lisboa, Casa Vem tura Abrantes, 1917, in-8° de 126 pp.

Inéditos Miragens: versos. Liyro azul : contos.

Colaboração Na Pacotilha, S. Luiz; Gazeta de Noticias, Rio ; Cruzada, Rio : etc , etc, N.

O soneto publicado no Jornal das Moças:

Logo a seguir, nessa mesma revista, aparece uma nota em que consta como sendo pianista, residindo em Fortaleza, assinando uma composição, que enviara à publicação, como Leonete Oliveira Rocha

O Jornal, edição de 26 de julho de 1918 publica o seguinte poema:

A Pacotilha de 11 de fevereiro de 1919 traz outro poema de Leonete, mas desta vez, acrescentando Rocha ao seu sobrenome: Leonete Oliveira Rocha:

Na edição seguinte, outro poema:

E mais outro:

O Jornal de 14 de abril de 1919 fala sobre concurso promovido pela Revista Maranhense, destacando, entre seus colaboradores, a poetisa Leonete Oliveira.

Outro soneto, publicado em O Jornal, de 26 de abril de 1921

Logo a seguir, 14 de junho, essa nota:

Na edição de 29 de março de 1919 é publicado soneto sobre a seca

Sobre os ultimos versos da poetisa Leonete Oliveira é o titulo de crítica assinada por N. Nogiueira da Silva, transcrito do Boletim Mundial:

A 11 de abril de 1924, A Pacotilha traz a seguyinte denúncia de plágio:

No Diário de Notícias, do Rio de janeiro, edição de 5 de novembro de 1959, sai a seguinte nota:

Em artigo de Diomar das Graças Mota7 - Mulheres professoras maranhenses: memória de um silêncio, publicado em 20088 - consta a seguinte biografia:

Leonete Oliveira (1888–1969), professora normalista, lecionava Português em casa, principalmente para mulheres, e foi a precursora do ensino de Estenografia, em São Luís. Acreditava ser esta uma das alternativas para o acesso, principalmente da mulher, ao mercado de trabalho. Poetisa, publicando em 1910 sua primeira obra, intitulada Flocos, em seguida publicou em Portugal Folhas de outono, posteriormente Cambiantes, em Fortaleza, onde integrou a ala feminina da Casa de Juvenal Galeno, instituição literária idealizada e fundada em 1942.

A 25 de novembro de 1908, nesse mesmo jornal, sai o seguinte:

7 Doutora em Educação pela Universidade Federal Fluminense – UFF, docente do Departamento de Educação II e dos Programas de Pós-Graduação: Mestrado em Educação e Mestrado Materno-Infantil da Universidade Federal do Maranhão – UFMA. E-mail: diomar@elo.com.br.

8 EDUCAÇÃO & L INGUAGEM • ANO 11 • N. 18 • 123-135, JUL.-DEZ. 2008

A PRIMEIRA ESCRITORA MARANHENSE: ALGUMAS DÚVIDAS E ELUCIDAÇÕES

LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

Licenciado em Educação Física;. Mestre em Ciência da Informação Academia Ludovicense de Letras Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão

Quem foi a primeira escritora maranhense? Para Nascimento Morais Filho e Dilercy Aragão Adler, Maria Firmina dos Reis. Antônio Lopes diz ser Leonete Oliveira9, cujo pseudônimo foi Ângela Grassi.

Mas por que essa dúvida? Porque Antonio Lopes publicou artigo, em 1909, identificando a poetisa Angela Grassi como sendo Leonete Oliveira, e a chamou de primeira poetisa maranhense!

Título: Leonete OliveiraAutor/ Colaborador:Garnier, M.J. Data:[189-?] Descrição:bico de pena Assuntos:Authors, Brazilian - Portraits Oliveira, Leonete dePortraits B869.8 Oliveira, Leonete de, n.1888 - RetratosEscritores brasileiros - RetratosT ipo: Desenho Idioma: Português Antonio Aílton, em seu ensaio, repetiu o título que eu dera no material que publicara em minha revista

A Revista do Léo10 – quando trouxe os “recortes & memórias” sobre essa poetisa maranhense.

Dilercy nos traz alguns dados sobre Maria Firmina, para contestar a temporalidade de ambas:

Maria Firmina nasceu em 11 de março de 1822. Em 1859 publicou o Romance Ursula, Em 1861 publicou o romance Gupeva. Em 1871 publicou um livro de poemas “Cantos à beiramar (completará 150 anos de publicação em 2021). Em 1887 publicou o conto A escrava. Em 1861 Participou da Antologia Poética Parnaso

9 LEONETE OLIVEIRA Lima Rocha nascida em São Luís, Maranhão, em 17 de julho de 1888, filha de Gentil Homem de Oliveira e Luiza Fernandes de Oliveira. Foi Professora e Bibliotecária. Ingressou na Academia Maranhense de Letras. Residia no Rio de Janeiro, aonde veio a falecer. Publicou "Flocos", "Folhas de Outono" e muitos outros. Leonete Oliveira virou nome de rua em São Luís, no bairro Cohab Anil II. http://falandodetrova.com.br/leonete; https://www.literaturabrasileira.ufsc.br/autores/?id=2941; https://www.literaturamaranhense.ufsc.br/documentos/?action=midias&id=222031&locale=en

10 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo__25_-_outubro__2019

Maranhense. Tem uma extensa relação de publicações de poemas e inclusive dos próprios contos (por capítulos como as novelas de hoje) em jornais literários. Na orelha do meu Elogio a ela (2014) tem a relação desses jornais também a relação de poemas avulsos. FONTE: O Livro de José Nascimento Morais Filho - Maria Firmina: fragmentos de uma vida

Nesse mesmo livro tem a relação dos trabalhos de MFR publicados em jornais com as datas: jornal literário foi 1860 - o Jornal A Imprensa publica um poema, ainda com as iniciais MFR e a última publicação citada data de 1903 no Jornal Pacotilha.

Então, de acordo com essa data, ela tinha 71 anos de idade. Teriam outras publicações que talvez Nascimento Morais Filho não tinha tido acesso? Aos 71 anos ainda colaborava com jornais e já estava esquecida?

Poderia ainda não ter reconhecimento, à altura de uma primeira romancista, mas continuava publicando em jornais? Por exemplo: eu vi nas citações de José Nascimento Morais Filho colaborações de MFR em jornais em vários anos a partir de 1860. Os últimos anos são: 1889, 1897, 1900, e essa última citação de 1903.

Ou seja, ela publicou em jornais de 1860 a 1903 (segundo as pesquisas de NMF). Acho estranho que fosse desconhecido todo esse trabalho de Maria Firmina por Antônio Lopes. Sem contar que eu acho muito tardio encontrar uma primeira poeta Maranhense já nos anos de 1910.

Acho interessante esse tipo de troca que resulta em soma. No “I Encontro Maranhense de Pesquisadoras e pesquisadores de Maria Firmina dos Reis” lancei oficialmente a ideia de formamos um grupo para concretizarmos a apresentação e análise desses estudos.

Pois bem, após os “protestos” da Dilercy sobre a primazia de MFR, voltei ao artigo que havia escrito – e mandado ao Antônio Aílton para análise – e reescrevi, indo buscar o que ela havia escrito antes, com o seu pseudônimo – Ângela Grassi.

Vamos ao texto de Antônio Lopes – repito-o! - artigo publicado no “Diário do Maranhão” edição de 05 de junho de 1909, onde referia-se sobre a inexistência de poetas mulheres no Maranhão e, então traz-nos alguns nomes, pseudônimos, e identificando quem escreveu algumas belas poesias que apareciam, então.

Vou,agora, colocaro textodeAílton,com basenaquiloquelevantei,sobrea autoraora em estudo,epublicado no sítio de ‘Os integrantes da noite”, disponível no Facebook11:

LEONETE OLIVEIRA ou Ângela Grassi brasileira – A

PRIMEIRA POETA MARANHENSE - ANTONIO AÍLTON

A grande maioria dos que estudaram o Parnasianismo, desde a escola já ouviram falar, pelo menos, em uma mulher entre os austeros parnasianos, de poemas esculpidos e canção marmórea: a poeta paulista de “Musa Impassível”, Francisca Júlia.

Porém, entre os grandes nomes maranhenses que brilham na poesia brasileira na passagem entre o século XIX e o século XX, bem poucos ouviram o nome de Leonete Oliveira (São Luís, 1888Rio de Janeiro, 1969). Esta, segundo um dos importantes registros daquele momento, do escritor e crítico Antônio Lobo (Diário do Maranhão, 05/06/1898) (sic), foi, por sua vez, a primeira poeta maranhense.

Leonete Oliveira ou, conforme assinava em suas primeiras publicações nos jornais maranhenses, Ângela Grassi (escritora romântica espanhola), ganhou o título de “a maior e mais brilhante

11 https://www.facebook.com/groups/582175842330309/

poetisa maranhense” (M. Nogueira da Silva, Jornal das Moças, 1917, p. 12¹). Leonete Oliveira era também professora e bibliotecária.

Há realmente vários registros naqueles jornais finisseculares e de entre-séculos. Mas quem resgata ultimamente esse nome tão importante, um tanto quanto apagado ou silenciado nas atuais matérias sobre a poesia daquele momento, é o incansável pesquisador Leopoldo Vaz, inconformado enquanto não alcança os últimos registros sobre o assunto que busca. Leopoldo publicou esse “apanhado” na sua Revista do Léo², onde pode ser pesquisado.

É somente através das espessuras e cortinas do tempo que podemos ver essa mulher, vivendo num contexto de poetas grandiosos, mas também de uma sociedade que de um modo ou de outro reprimia a voz feminina nos papeis intelectuais e culturais. O próprio Antônio Lobo levanta essa questão e relata que, infelizmente, e apesar de mesmo escassamente algumas vozes femininas ainda se sobressaírem nos grandes centros, na sociedade arcaica do Maranhão isso era muito mais difícil. A mulher, quando muito, dedicava (ou era lançada) aos conventos. Era a educação familiar e religiosa, e haveria muito mais beatas que poetisas – na linguagem da época. Mesmo através dessas cortinas do tempo, o que podemos encontrar nela é uma mulher forte, que penetrou aos poucos nos meios literários e intelectuais, participava de eventos cívicos e religiosos, viajou bastante (São Paulo, Lisboa, Fortaleza, Rio de Janeiro...), fez-se considerar pelos poetas e críticos até sua morte, inclusive poetas conhecidos no séculos XX que lhe submetiam os textos; deu palestras sobre a condição da mulher na Biblioteca Pública do Estado e na Universidade Popular, deu voz à mulher em seus poemas, e era membro correspondente da Academia Maranhense de Letras. Publicou, além de muitos poemas esparsos, pelo menos três livros de poesia: “Flocos” (1910), “Cambiantes” e “Folhas de outono” (1914-1917[?]).

A intenção aqui, obviamente não é fazer um tratado sobre a autora, sua vida e as questões complexas que envolvem seu contexto e obscurecimento. Não é tampouco levantar disputas de se ela foi a primeira, a segunda, ou a terceira poeta maranhense etc, já que há também na pauta o nome de Maria Firmina dos Reis, que tem sido bastante pesquisado. São coisas e questões que exigem uma pesquisa madura e aprofundada. Creio que ela deve ser valorizada pelo que ela é, pelo seu papel, pela sua figura de poeta do momento, inclusive dentro de um sistema da história da literatura brasileira, que relega tantos autores importantes à marginalidade.

Podemos entender a poética de Leonete Oliveira fundamentalmente dentro do espírito do Parnaso, como assim compreendemos, por exemplo, Raimundo Corrêa. Porém, mais acentuadamente que este, a poeta pratica ainda uma experiência romântica patente e se estende até o simbolismo. Seus poemas de tom e teor simbolistas são, a meu ver, os melhores. Ela não deixa também de extravasar em alguns momentos forte erotismo ou de, noutro registro, ironizar a questão masculina. Enfim, uma poeta de alto domínio formal que foi colocando ali, nas chaves parnasianas o seu espírito e sua força.

E a força de um poeta pode ser medida pela desejo que outros têm de imitá-lo(a) ou até plagiálo(la). Isto é, do impacto que sua poesia causa sobre outros. Foi o que aconteceu com um poema do Flocos, de 1910, de Leonete Oliveira, que foi descaradamente plagiada por Carlos Porto Carreiro em 1924 – talvez por um desses acasos que o autor publica e fica na obscuridade, enquanto outros se aproveitam. Mas a verdade apareceu.

Abaixo, escolhi alguns de seus fortes e encantadores sonetos, entretanto há muito mais a ser visto:

Sempre tiveste um coração vazio ermo de sonhos como um deserdado; nunca um raio de amor, mesmo tardio, pôde dar vida ao teu olhar gelado.

Sempre viveste só, mudo e sombrio como quem traz no peito lacerado, em vez de um coração forte e sadio,

um pedaço de mármore guardado.

Mas um dia virá em, que, tristonho, cheio de dor e em lágrimas desfeito, hás de correr em busca de outro sonhos...

Em vão! Que em cada coração, decerto, encontrarás o gelo do teu peito a aridez infinita de um deserto.

(in: Flocos)

SUPLÍCIO DE TÂNTALO

Nasci de asas cortadas, no infinito dos meus sonhos de glória e de ventura, tentei em vão subir, no impulso aflito de quase desespero ou de loucura…

Olhando o espaço, o coração contrito, das belezas da vida ando à procura, e penso, e sinto, e sofro, e choro, e grito , no anseio de vencer esta tortura…

Diante de mim os pomos de ouro avisto e querendo alcançá-los fico inerme, sem saber se estou morta ou ainda existo…

E vendo em tudo um luminoso véu, eu continuo qual se fora um verme, rastejando na terra e olhando o céu!

(in: Folhas de outono)

E este jocoso soneto, a nos lembrar o simbolismo irônico:

CASAR É BOM

- “Casar é bom - diz o burguês pacato, Por entre um riso de expressão brejeira - é muito bom ter-se uma companheira Que nos faça a pastinha e escove o fato”.

- “Casar é bom, não com mulher faceira que vive empoada e trescalando extrato; quem tiver senso, o homem que for sensato que procure uma boa cozinheira...

Essa que tem de todos os sentidos somente o paladar, é o que chamamos o lindo ideal de todos os maridos;

não vê, não ouve, indiferente e fria, não pergunta zangada porque vamos todas as noite à maçonaria...”

¹ http://memoria.bn.br/pdf/111031/per111031_1917_00110.pdf

² https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo__25_-_outubro__2019

Como diz Antonio Aílton:

A intenção aqui, obviamente não é fazer um tratado sobre a autora, sua vida e as questões complexas que envolvem seu contexto e obscurecimento. Não é tampouco levantar disputas de se ela foi a primeira, a segunda, ou a terceira poeta maranhense etc, já que há também na pauta o nome de Maria Firmina dos Reis, que tem sido bastante pesquisado. São coisas e questões que exigem uma pesquisa madura e aprofundada. Creio que ela deve ser valorizada pelo que ela é, pelo seu papel, pela sua figura de poeta do momento, inclusive dentro de um sistema da história da literatura brasileira, que relega tantos autores importantes à marginalidade.

(O Jornal, de 26 de abril de 1921)

BAILE DE MÁSCARAS

Quando menino ainda de calça curta, escutava várias histórias a respeito de nossa cidade e de seus habitantes. Estávamos em pleno carnaval, isso entre os anos 50 e 60, época em que nasciam, praticamente, os bailes nos clubes sociais e os famosos, glamorosos bailes de máscaras.

Esses bailes, promovidos pela nossa sociedade privilegiada, aconteciam nos saudosos clubes sociais, como o Jaguarema, o Grêmio Lítero Recreativo Português, ambos situados no bairro do Anil, e o nosso clube central, situado em plena Beira-Mar, o Cassino Maranhense.

Para quem não era associado a nenhum dos três clubes citados, a diversão no Carnaval se dava nos bailes em outros locais, entre os quais destacamos o famoso Berimbau, Bigurrilho, Saravá, Gruta do Satã, Rei Pelé e o Clube dos Sargentos e Subtenentes localizado no bairro do João Paulo.

Conforme pesquisa realizada através do Blog do Reginaldo Cazumbá, os referidos bailes chegaram ao auge entre 1940 e 1950, sendo que em 1965 o então prefeito de São Luís, o senhor Epitácio Cafeteira, proibiu o uso das máscaras, era apenas permitido o uso do fofão. Devo acrescentar que o traje de carnaval para os frequentadores era o fofão, e uma máscara de meia preta com o nariz avermelhado, abertura somente na boca e nos olhos. E para que ninguém desvendasse o mistério a respeito de quem seria a pessoa por debaixo da máscara, amarravam-na pela parte de trás na nuca, para que ninguém tirasse.

Com a proibição, os bailes rapidamente caíram de frequência e, por conseguinte, os levou a extinção. O que gostaria de relatar, depois de contar uma breve história dos bailes de máscaras aqui em São Luís, aconteceu quando ainda era muito menino. Contavam o que acontecia nos r conseguinte, os levou a extinção. O que gostaria de relatar, depois de contar uma breve história dos bailes de máscaras aqui em São Luís, aconteceu quando ainda era muito menino. Contavam o que acontecia nos referidos bailes, e eu, como bom observador, ficava somente a escutar, embora às vezes não entendesse muito o acontecido. Inúmeros casos ouvi contar, que realmente não sei se tinham alguma verdade ou se era somente folclore de adultos.

Zequinha era um homem trabalhador, pagava seus impostos, um homem simples, cometido e descomplicado, não tinha vícios, apenas o tal do Carnaval era o seu lado fraco. Casado com uma mulata chamada Zuleica, conhecida na família como Zu, era realmente uma mulata da qual, como diziam, fechava o quarteirão, uma mulher linda com os quadris maravilhosos, os seios vastos empinados, ainda não haviam dado de mamar a crianças, uma pele achocolatada, rosto simplesmente majestoso. Veio do interior e logo se engraçou pelo seu Zequinha. Zu, como uma boa interiorana simples e recatada, tinha certa ingenuidade, poderíamos até a afirmar que não sabia tanto acerca de sua beleza. Era cheia de amor e carinho para com o seu esposo. Ele trabalhava o ano inteiro e no Carnaval pedia uma carta de alforria para a sua majestosa esposa, com a justificativa de que ia olhar o Carnaval de rua de São Luís, e que pela formosura de sua mulher não seria conveniente levála, pois alguns despreparados poderiam tomar gosto com ela, e isto seria um caos na folia de nossa cidade.

A famosa Zu, nem discutia, pois além de não estar acostumada com Carnaval, achava uma verdadeira bagunça, e ainda exclamava ao Zé: “Meu bem, não sei por que você gosta tanto desta festa, é só gritaria, bebedeira”. Sempre ingênua e linda, a pobre Zu acabava por concordar, pois era avessa a confusões, acreditava piamente em seu Zequinha. Pois bem, chegando o Carnaval, mais uma vez o tal do Zequinha pegou sua licença e saiu, só que, contrariando o dito, ele sempre se dirigia à casa do amigo Paulo, que em todos os carnavais o ajudava e participava da trama, contra a pobre da esposa. O que ele realmente ia fazer era vestir o seu fofão colocar sua máscara e os dois partiriam para o baile.

Ali chegando, o trabalhador honesto chefe de família e pagador de seus impostos virava o bicho, a única coisa que não fazia era beber, pois dizia que tinha problemas no fígado que o impedia. Do resto o tal raparigueiro era rei, dançava, se divertia fazia tudo o que não fizera durante o ano. Assim aconteceu por muitos anos, sempre enganando a pobre Zu.

Ele tinha sempre uma preocupação, nunca ficava até o fim, pois poderia dar o que falar. Sempre antes do final do baile voltava para a casa do amigo Paulo, banhava-se para tirar o suor, voltava a se vestir com as roupas que deixara e ia para a casa de volta, sempre alegava que banhava para retirar a maisena do mela, mela que ainda existia na cidade na época de carnaval. Não sei o que fazia com a roupa, pois a majestosa Zu nunca reclamou. Servia o jantar, enquanto ele, por sua vez, inventava várias histórias, ela acreditava e ambos iam dormir, pois na época não existia o Carnaval pela televisão, e assim se preparava para que no dia seguinte novamente o teatro pudesse ser armado.

Sabemos sempre que a sorte as vezes falha. Num determinado dia uma amiga da Zu chamada Joana, Jô, cuja língua não cabia na boca, a encontrou, e conversa vai, conversa vem, falou “sem querer”, que durante o Carnaval sempre via seu amado marido entrando na casa do seu amigo Paulo, que era seu vizinho. Zuleica, como toda esposa que ama incondicionalmente

seu marido, não quis acreditar que seu verdadeiro amor pudesse estar aprontando, se recusou a acreditar naquelas afirmações que para ela eram incabíveis.

Zu logo se estranhou com a amiga, porém ficou “com a pulga atrás da orelha”, como popularmente se fala. “Será que meu Zequinha, a quem dediquei a vida toda, em quem nunca notei quaisquer deslizes, pudesse me enganar, será que isso tudo é verdade?”

Podemos afirmar que a noite da pobre Zu foi de insônia total, se mexia para um lado, mexia para o outro, mas seus pensamentos não a deixavam dormir. Pela manhã, com os olhos marcados pela falta de um bom sonho, serviu o café, tomou banho, se vestiu alegando que ia fazer uma visita a uma amiga que aqui chegara e que por muito tempo não a via, mas na verdade ia mesmo era falar com a amiga que a princípio seria a fofoqueira da questão. Saindo de casa se dirigiu à casa da amiga Jô, no trajeto os pensamentos as dúvidas a incomodavam bastante, e se perguntava como poderia saber a verdade, como fazer para saber se o marido estava aprontando. Chegando à casa da Joana, relutou em bater e entrar, mas se assim não fizesse, como saberia a verdade? Tomou coragem, bateu, foi recebida pela amiga com um sorriso amarelado, entrou, sentaram-se em um sofá e de imediato a Jô tratou de se desculpar, afirmando que se metera onde não era chamada, mas que como era amiga, não suportaria deixar a Zu ser enganada por tanto tempo.

Ânimos serenados, desculpas pedidas e aceitas, tomaram a decisão de efetuar um plano para pegar o traidor com a mão ou qualquer coisa que seja na botija, ou em outro lugar. Plano vai, plano vem, Jô deu a ideia de que a única maneira de o pegar seria entrar no baile de máscara. Imediatamente a Zu perguntou: “Como? Estás louca? Entrar num baile de máscaras, ele me mataria se descobrisse”.

Jô, logo respondeu: “Sabe Zu, tenho umas amigas da pá virada e sei que elas frequentam esses bailes vestidas a caráter, podemos ver com elas se dispõe de fofões e máscaras a mais, então pedimos quem elas nos emprestem sem falar o verdadeiro motivo, ou melhor para não dá o que falar. Eu peço para mim e para uma amiga, omitindo teu nome”. É claro que Joana gostaria de frequentar o Carnaval também, mas não tinha coragem e roupas para ir ao baile.

Foi até a amiga, conversaram, e imediatamente recebeu a vestimenta, que a transformaria. Voltando, encontrou Zu pálida, nervosa, com as mãos suadas, cara de será que faço ou não. Convencida pela amiga dela e do capeta, Zu vestiu-se. O fofão, como não fora feito sob medida, ficara um pouco apertado marcando com isso a magnífica silhueta da morena Zu. Era tudo o que um rapaz mal queria, aquele tesão provocando os mascarados do baile.

Na entrada do baile, aquela parada para visualizar o salão, verificar pela discrição da Jô o fofão que o traidor estava usando. Localizaram o dito, botaram o plano em ação, ela ia provocá-lo até que ele a tirasse para dançar. Como as duas estavam sempre juntas, foi combinado que depois ela pediria para ir ao banheiro e a Zu passaria a ser o seu par, o que levaria imediatamente a ser desmascarado o pobre coitado. Só que pela formosura da morena veio imediatamente um outro fofão e a pegou pela cintura e a levou para o salão. Zu, que nunca foi atacada dessa maneira, relutou, mas pela pegada do cabra ela acabou deixando e se entregando.

Olha passaram-se horas, a Zu e o seu par dançando no meio do salão, ele louco pelo corpo da morena, ela se deixava apertar pelo fofão desconhecido. Primeira vez, a Zu sentira ser uma mulher de outro homem, isso a deixava louca, na cabeça dela estava adorando aquela situação, nunca pensara que fosse desejada por mais alguém, nunca pensara que ao ser abraçada daquela maneira, pudesse ter tanto prazer, para ela sua vida se resumira tão somente ao casamento e jamais poderia imaginar se entregar a outro homem.

Meus amigos a Zu, morena de parar o trânsito, gostou, não quis saber de barraco: sua vingança seria sair depois e entrar naquele baile que jamais poderia imaginar que fosse tão prazeroso, e em uma noite ser de vários fofões.

O Zequinha, bem, estava lá. Com certeza jamais imaginaria sua Zu naquele recinto. Somente uma coisa a morena teria que fazer, como sabia a hora do marido chegar em casa, ela sempre se antecipava para chegar primeiro. O certo era que, quando Zequinha chegava com as desculpas, a sua formosa Zu já estava em casa, banhada com sua camisola e seus sonhos eróticos, que a deixavam dormir em bailes sem fim.

FALECIMENTO DA ESCRITORA RAIMUNDA JANSEN, DESCENDENTE DA RAINHA DO

MARANHÃO

ANTONIO NOBERTO

Foi com tristeza que os membros da Academia Ludovicense de Letras (ALL) receberam a informação tardia do falecimento da escritora Raimunda Jansen.

A confirmação do passamento de Raimunda Jansen veio através de um neto, que detalhou a cremação do corpo da escritora e que as cinzas foram lançadas no mar, aqui em São Luís/MA.

A escritora é membro-correspondente da Academia Ludovicense de Letras. Ela nasceu em Coroatá/MA no dia 12 de marco de 1935 e faleceu no dia 25 de dezembro de 2022 em Brasília/DF. É filha de Zózima Jansen Pereira e Geraldo Corrêa Assunção.

Entre as obras publicadas "Vida de Sônia" e "Amanheceu. Descubra a felicidade". Umas das grandes alegrias da escritora foi o recebimento do título de membro-correspondente da ALL.

Raimunda é descendente direto de Ana Jansen, a Rainha do Maranhão, mulher de muitas posses, proprietária de terras e de muitas casas e escravos no estado, uma verdadeira lenda, pois vivia muito além do seu tempo. Ana Jansen influenciou de forma direta e indireta a política maranhense do século XIX, a ponto de receber a boa referência de "Rainha do Maranhão".

*Antonio Nobertoé membro-fundadore ex-presidenteda ALL.Concedeuo títulodeMembro-correspondente a Raimunda Jansen em 2019.

ACONTECEU BREVE LANÇAMENTO

NossosimortaisInaldoLisboaeJuceySantana,acompanhadosdemuitosintelectuaisdoMaranhão, participaram,emSãoLuís,dacelebraçãopelos40anosdaCasadeCulturaJosuéMontello,queéuma grandeparceiradenossaacademia.ParabenizamosàsqueridasJoseaneSouzaeWandaFrançapelo brilhantetrabalhorealizadonaCCJM,quefortaleceaculturadonossoestadoeenalteceonomede umdosmaioresautoresdahistóriadoBrasil.

José Eduardo Agualusa

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

José Eduardo Agualusa Alves da Cunha (Huambo, 13 de Dezembro de 1960) é um jornalista, escritor e editor angolano de ascendência portuguesa e brasileira [1]

Biografia

Nascido em Huambo, na então África Ocidental Portuguesa, é neto materno de Joaquim Fernandes Agualusa, Oficial da Ordem Civil do Mérito Agrícola e Industrial Classe Industrial a 13 de Maio de 1960.[2]

Estudou agronomia e silvicultura no Instituto Superior de Agronomia da Universidade Técnica de Lisboa Colaborou com o jornal português Público desde a sua fundação; na revista de domingo desse diário (Pública) assinava uma crónica quinzenal. Escreveu crónicas para a revista portuguesa LER e o portal Rede Angola. Escreve crônicas para o jornal brasileiro O Globo e para a revista portuguesa Visão. Na RDP África é realizador do programa A Hora das Cigarras, sobre música e poesia africana.

Em 2006 lançou, juntamentecom ConceiçãoLopes eFátimaOtero,aeditorabrasileiraLínguaGeral, dedicada apenas a autores de língua portuguesa. Numa entrevista, o escritor responde a pergunta, "Quem é o Eduardo Agualusa? "Quem eu sou não ocupa muitas palavras: angolano em viagem, quase sem raça. Gosto do mar, de um céu em fogo ao fim da tarde. Nasci nas terras altas. Quero morrer em Benguela, como alternativa pode ser Olinda, no Nordeste do Brasil".

Perguntado se diverte escrevendo, Agualusa explica: "Escrever me diverte, e escrevo também, porque quero saber como termina o poema, o conto ou o romance. E ainda porque a escrita transforma o mundo. Ninguém acredita nisto e no entanto é verdade."[3]

Obras

• A Conjura (romance, 1989) - Prémio Revelação Sonangol (1989

• D. Nicolau Água-Rosada e outras estórias verdadeiras e inverosímeis (contos, 1990)

• O coração dos Bosques (poesia, 1991)

• A feira dos assombrados (novela, 1992)

• Estação das Chuvas (romance, 1996)

• Nação Crioula: correspondência secreta de Fradique Mendes (romance, 1997)

• Fronteiras Perdidas, contos para viajar (contos, 1999)

• Um Estranho em Goa (romance, 2000)

• Estranhões e Bizarrocos (literatura infantil, 2000)

• A Substância do Amor e Outras Crónicas (crónicas, 2000)

• O Homem que Parecia um Domingo (contos, 2002)

• O Ano em que Zumbi Tomou o Rio (romance, 2001)

• Catálogo de Sombras (contos, 2003)

• O Vendedor de Passados (romance, 2004)

• Manual Prático de Levitação (contos, 2005)

• A girafa que comia estrelas (novela, 2005)

• Passageiros em Trânsito (contos, 2006)

• O filho do vento (novela, 2006)

• As Mulheres do Meu Pai (romance, 2007)

• Na rota das especiarias (guia, 2008)

• O meu filho quer ser vampiro (ficção, 2008)

• Barroco Tropical (romance, 2009)

• Milagrário Pessoal (romance, 2010)

• Nweti e o mar: exercícios para sonhar sereias (infantil, 2011)

• Teoria geral do Esquecimento (romance, 2012)

• A educação sentimental dos pássaros (romance, 2012)

• A vida no céu (romance, 2013)

• A Rainha Ginga (romance, 2014)

• O Livro dos Camaleões (contos, 2015)

• A Sociedade dos Sonhadores Involuntários (romance, 2017)

• O Paraíso e Outros Infernos (crónicas, 2018)

Outros: • Geração W (peça de teatro montada em Portugal em 2004) • Chovem amores na Rua do Matador (peça de teatro escrita juntamente com Mia Couto, estreada em Portugal em 2007) • Aquela Mulher (texto para monólogo teatral estrelado por Marília Gabriela e direcção de Antônio Fagundes, montado em São Paulo, Brasil, em 2008 e Rio de Janeiro, Brasil, em 2009) • Lisboa Africana (reportagem, 1993 com o jornalista Fernando Semedo e a fotógrafa Elza Rocha)

Prémios

O seu primeiro romance - A Conjura - recebeu o Prémio de Revelação Sonangol. Com Nação Crioula foi distinguido com o Grande Prémio Literário RTP Fronteiras Perdidas obteve o Grande Prémio de Conto Camilo Castelo Branco da Associação Portuguesa de Escritores, enquanto Estranhões e Bizarrocos obteve o Grande Prémio Gulbenkian de Literatura para Crianças e Jovens, em 2002.[carece de fontes]

Em 2007 recebeu o prestigioso "Prémio Independente de Ficção Estrangeira", promovido pelo diário britânico The Independent em colaboração com o Conselho das Artes do Reino Unido, pelo livro O Vendedor de Passados. Foi o primeiro escritor africano a receber tal distinção.[carece de fontes]

Beneficiou de três bolsas de criação literária: a primeira, concedida pelo Centro Nacional de Cultura em 1997 para escrever Nação Crioula; a segunda em 2000, concedida pela Fundação Oriente, que lhe permitiu visitar Goa, Índia, durante três meses e na sequência da qual escreveu Um Estranho em Goa; a terceira em 2001, concedida pela instituição alemã Deutscher Akademischer Austauschdienst. Graças a esta bolsa viveu um ano em Berlim, e foi lá que escreveu O Ano em que Zumbi Tomou o Rio. Em 2009, foi convidado pela fundação holandesa Fonds voor de Letteren a passar dois meses em Amesterdão, onde escreveu Barroco Tropical [4]

Em 2017, ganhou o Prêmio Literário Internacional IMPAC de Dublin pela obra Teoria Geral do Esquecimento [5]

Recepção crítica

Pires Laranjeira descreve o autor assim: "Agualusa alia à sua capacidade de fundamentação histórica a facilidade de fluência da enunciação, cauterizadas com episódios burlescos, sentimentais e maravilhosos".[6]

Estudos sobre a obra de Agualusa

• Karimi, Kian-Harald: "Sempre em viagem: nações deslizantes como formas do pensamento no romance ‘Nação Crioula’ de José Eduardo Agualusa." Identidades em Movimento. Construções identitárias na África de língua portuguesa e reflexos no Brasil e em Portugal (Hrsg. Doris Wieser, Enrique Rodrigues-Moura). Frankfurt/Main, TFM (Biblioteca luso-brasileira), 2015, pp. 141172. ISBN 978-3-939455-12-7

• Salgado, Maria Teresa. "José Eduardo Agualusa: Uma ponte entre Angola e o mundo." África & Brasil: letras em laços. Ed. Maria do Carmo Sepúlveda. Rio de Janeiro: Atlântica, 2000. pp. 175–196.

Referências

1. ↑ «Angolano, cidadão do mundo». Portal Fórum. 20 de outubro de 2011. Consultado em 13 de junho de 2016

2. ↑ «Cidadãos Nacionais Agraciados com Ordens Portuguesas». Resultado da busca de "Joaquim Fernandes Agualusa". Presidência da República Portuguesa. Consultado em 2 de dezembro de 2014

3. ↑ Rozário, Denise. Palavra de Poeta. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1999. pp. 362-3.

4. ↑ «Writer in Residence Programme 2009 - José Eduardo Agualusa is WIR in Amsterdam» Nederlands Letterenfonds. Consultado em 13 de março de 2019

5. ↑ Battersby, Eileen (21 de junho de 2017). «José Eduardo Agualusa wins €100,000 International Dublin Literary Award» Consultado em 21 de junho de 2017

6. ↑ Laranjeira, Pires. De Letra em Riste. Porto: Edições Afrontamentos, 1992. p. 102

• Sítio oficial de José Eduardo Agualusa (em português e em inglês).

Viana,possedaDiretoriadaAcademiaVianensedeLetras.Presidente,DraFátimaTravassos. Revista"Serões",2.ªSérie,Vol.VIII,n.º46,deAbrilde1909. Ferreira Gullar e Lago Burnett, na década de 1940, na Praça João Lisboa. Época que os dois abraçavam a poesia

parnasiana, antes de migrarem para a poesia moderna. Lago Burnett foi o melhor amigo de Ferreira Gullar na sua iniciação literária, os dois fizeram parte do Centro Cultural Gonçalves Dias e fizeram parte da Revista Saci// Influente. Os dois lançaram praticamente juntos as suas primeiras obras literárias. O Ferreira Gullar lançou o seu livro "Um Pouco Acima do Chão", e Burnett lançou o seu livro "Estrela do Céu Perdido". Uma dica bem interessante pra quem gosta de literatura: A Academia Maranhense de Letras lançou uma coletânea de vídeos sobre escritores maranhenses que é muito bem produzido, só que menos visto. Tem um vídeo sobre Lago Burnett que é bem interessante para saber um pouco sobre o modernismo no Maranhão com a famosa geração de 1945. Acesse o canal da Academia Maranhense de Letras no Youtube e você acha esses vídeos.

Frame do Video sobre Lago Burnett, produzida pela Academia Maranhense de Letras, link: https://youtube.com/watch?v=OlGH8_-qFuA&si=EnSIkaIECMiOmarE

Começandooanoesportivocomopé,ops,amãodireita...CampeãdacategoriaVeteranofemininona 1a.etapadocampeonatomaranhensedetênisdemesa-TMBSãoLuís.

DIOGO DE CAMPOS MORENO - O CONQUISTADOR DO MARANHÃO (1603-1615)

ROSBERG FERNANDES

Desafiando a história oficial, este livro propõe uma nova interpretação sobre as origens do norte do Brasil. É a conquista de toda essa região, chamada à época de Maranhão, que essa obra se propõe analisar. Sua original abordagem revela uma intrigante história de poder e liderança que ficou soterrada embaixo de versões artificiais. Examinando metodicamente as fontes primárias do período, o autor desmonta uma narrativa falsa em que os verdadeiros heróis foram sistematicamente apagados. Ao final, nada mais será como antes, uma história ignorada por 400 anos será pela primeira vez contada e um novo personagem, até hoje completamente esquecido, será incluído no livro de heróis da pátria. A história do Brasil nunca mais será a mesma. Destruindo a versão tradicional baseada em plágios e falsificações, desmistificando a mais importante batalha dos primeirosanosdoBrasil,esclarecendoaorigemdosEstadosdoCearáedoMaranhãoeexplicandoaexistência da única capital brasileira fundada por franceses, a obra vale, não só aos interessados na história regional do país, mas a todos aqueles que acreditam na história como um processo com resultado concreto. Depois de anos procurando provas que o permitissem defender a sua original ideia, este historiador finalmente encontrou um documento decisivo a seu favor. É o resultado desse trabalho que o leitor agora tem a chance de conhecer.

O Historiador e escritor Paulo Tamiazo - SP é personalidade Homenageada na celebração literária cultural da COMENDA MARIA FIRMINA DOS REIS .

O evento é alusivo ao Bicentenário do nascimento da primeira romancista negra brasileira. A Promoção e realização é da Mundo Cultural World (Comendadora Élle Marques); do Instituto Internacional Cultura em Movimento -IICEM (Comendadora Angeli Rose) e da Academia Maranhense de Ciências Letras e Artes Militares-AMCLAM (Comendador Cel. Carlos Furtado).

Paulo César Tamiazo é historiador, pesquisando há 30 anos o passado de sua cidade, Cordeiropolis (SP). Tem seis livros publicados e a coluna “Revivendo a História” no site “Cordero Virtual”. Também publica em jornais e revistasda cidade e dasregiõesde Limeira e RioClaro.Pertence a diversasacademiase recebeuamedalha“Amigo da Cultura” da prefeitura e a “Medalha João Pacífico” da câmara de vereadores de sua cidade. É proprietário da editora Agnus Ação Cultural. Comendador por diversas entidades.

https://www.historiadorpaulotamiazo.com.br

https://www.facebook.com/paulo.tamiazo?mibextid=ZbWKwL

Asirmãs @anaculturalcarvalho e @belcarvalho61,cantoras,compositorasemestrasdeculturapopular, acabamdelançar"MemóriasdeCarvalho",álbumdedicadoabrincadeirasmusicaisdainfância passadaemCururupu,suaterranatal,emlembrançascomotemperodaculturapopulardoMaranhão. Aduplaconversacom @gisa_franco_ eestequevosinstagramanoBalaioCulturaldestesábado(11).O programacomeçaàs13hna @radiotimbira.Nãoperca!

Essamandaladepoetasnãoseencontraemqualquergeraçãoporaí.Emsentidohorário,sendo Antonio Aílton Santos Silva o12dorelógio,depois Bioque Mesito,GeaneLima,HagamenondeJesus,Dyl Pirese Rosemary Rêgo.Estessãomeusamigosqueridos,meuspoetasqueridos.AfotoédeG.Ferreira, fotógrafojornalísticodoJornalPequeno.

ABERTURA DO ANO CULTURAL PROGRAMAÇÃO

18h30 - Composição da mesa de abertura dos trabalhos.

Execução do Hino Nacional.

18h45 - Homenagem à Rosa Mochel (in memoriam)

Palestrante (AGEM): Dra. Luana Gaspar

Tema: Homenagem à idealizadora do Parque da Juçara, Rosa Mochel.

Palestrante (IHGM): Prof. José Augusto Silva Oliveira

Tema: Rosa Mochel: uma pioneira na Agronomia do Maranhão.

Mediadora: Profa. Dra. Elizabeth Abrantes

19h35 - Abertura das Comemorações do Bicentenário de Nascimento de Gonçalves Dias

Palestrante (IHGM): Dra. Elimar Figueredo de Almeida Silva. Ocupante da Cadeira nº 20, patroneada por Gonçalves Dias

Tema: Preito a Gonçalves Dias.

Mediadora: Profa. Dra. Dilercy Adler

20h - Sarau Histórico-Literário: Louvação a Gonçalves Dias

Coordenação: Assír Alves da Silva – 1ª Secretária IHGM

Participantes:

Ana Luiza Almeida Ferro: “I-Juca -Pirama”

Assir Alves da Silva: “Se se morre de amor"

Diogo Guagliardo Neves: “Olhos Verdes”

Jassyara Alves Duailibe: “Canção do Tamoio”

Josimael Caldas: “Canção do Exilio”

Dia: 08/02/2023 (quarta-feira)

Hora:18h30

Local: Cineteatro “Aldo Leite” - Palacete Gentil

Braga - UFMA.

End: Rua Osvaldo Cruz, nº 782, Centro (entrada pela lateral, na Rua do Passeio).

"CÁPSULA DE OXIGÊNIO" À VENDA NA AMEI

O livro "Cápsulas de Oxigênio”, do escritor maranhense Inorbel Marãnhão Viegas, já pode ser adquirido na livraria AMEI, do SLZ Shopping. É uma coletânea de crônicas do cotidiano, escrita durante o tempo mais angustiante da pandemia de Covid-19, que obrigou o Brasil e o mundo a viver em isolamento, respeitar a ciência e repensar o modo de encarar a vida. Escrita de um tempo em que foi preciso sobreviver ao vírus, vencer o medo, não perder a esperança e de acreditar que a poesia salva. Textos despretensiosos. Feitos, em princípio, como forma de manter sua própria sanidade mental. Distribuídos entre um pequeno grupo de amigos, por meio de aplicativo de mensagem, logo ganharam corpo e significância maiores do que se imaginava. Além de ajudar o autor a respirar um ar mais puro, os textos tornaram-se essenciais para um vasto número de leitores. Viraram ferramenta de oxigenação em cápsulas quase diárias.

Editado de forma independente, o livro é fruto de uma ação colaborativa liderada pelos leitores de primeira hora, sem o apoio dos quais não existiria. Não por acaso, coube à Viegas Editora, especializada em revelar autores independentes, nascida em Lisboa e transferida para São Luis do Maranhão, o desafio de revisar os originais, diagramar e publicar o livro.

Nas palavras da jornalista Ana Gabriella Sales, “o caos do tempo pandêmico nos fez buscar um refúgio seguro, da janela pra dentro.”

Maranhão Viegas recorre a um cilindro imaginário de oxigênio para nos abastecer com poesia e esperança nesses tempos de ar rarefeito.

*O lançamento acontece no dia 11/03, sábado, às 11h00, no Infinu.* Brasília/DF

Inorbel Maranhão Viegas

Nasci na Madre D`eus, bairro de pescadores, na ilha de São Luís, MA. Tive o mar como horizonte desde menino. Acreditei nisso a vida inteira e continuo acreditando. O mar é meu caminho.

Maranhão Viegas

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Passos na areia

07:53 - 31/10/2009 - Passos na areia - Contraponto MS - Notícias do Mato Grosso do Sul

Havia 23 anos eu não pisava em solo maranhense.

Muitos me diziam – ingrato, desnaturado.

Não se trata disso. Em verdade carrego o amor explícito pela minha origem no apelido que adotei como nome profissional – Maranhão Viegas.

A história dessa adoção começou lá atrás, nos idos dos anos 80.

Era a primeira aula da faculdade de jornalismo em São Leopoldo, na UNISINOS.

Rodada de apresentação aberta. Chega a minha vez.

Então, meu filho, como é o seu nome e de onde você vem (dia a professora Elvira, por coincidência, também maranhense). Inorbel Viegas. Venho do Maranhão.

Eu sei, disse ela. Mas vamos fazer o seguinte, vai ser difícil guardar esse nome.

Por incomum. Então, deixe de coisa e a partir de agora você será o nosso Maranhão. Maranhão Viegas. Pronto. Batizaram-me.

Anos mais tarde, quando cheguei à profissão, os homens da TV quiseram mudar o meu nome. Outra vez. De novo, lancei mão do meu apelido. Agora, com mais propriedade e convicção. Virei repórter – Maranhão Viegas. E assim me fui, até que a dupla personalidade me incomodou. Hoje, depois de alguns anos de psicanálise, resolvi velhos entraves, compreendi outros tantos e equilibrei a convivência pacífica dos dois em um único sujeito – Inorbel Maranhão Viegas.

Quando fiz 47, em agosto deste, decidi que era hora de me dar uma viagem de retorno de presente. Levei comigo Mara, Mariana e Gabriel. E um feixe de emoções que não sei medir o tamanho.

Dá última vez em que estive lá, em 86, caminhei pela Madre Deus, bairro onde nasci, ainda em companhia do meu avô. Ele, eu e uma câmera nas mãos. Eu estava decidi a registrar o que pudesse em dois rolinhos de filme, cada um com três minutos. Segui-lhe os passos da Rui Barbosa até a Rua de São Pantaleão, perto do hospital Geral. Havia ali um beco onde a velha guarda jogava dominó. Turma dele. Conversavam por olhares. “Seu” Opílio Viegas era um dos que permanecia mais tempo à mesa. Entravam e saiam duplas de desafiantes e ele lá.

Nessa época, a cidade enfrentava um racionamento de energia. A coisa era grave de tal forma, que meu avô controlava em uma tabela feita a lápis, diariamente, o nível de consumo para saber se estava na média ou não. Quem excedia, pagava ao governo uma cara multa. Assim é que a minha avó, no início do mês, estava liberada para assistir todas as novelas e mais o Jornal Nacional.

A medida que o mês ia passando e a cota sendo atingida, diminuía o tempo de TV. Primeiro o meu avô cortava a novela das duas. Depois, a das seis. Por fim, assistia-se apenas o jornal nacional e novela das nove.

Como um Glauber Rocha desavisado, cheguei com uma câmera nas mãos e muitas idéias na cabeça. Uma filmadora super 8 e um “pau de luz” de 1.000 watts. Uma manhã, com ele e minha avó à mesa, na hora do almoço, decidi registrara cena.Osdois empolgados. Aprumeiamáquina,disparei o filmee–Tchum! – acendi o refletor. Mil watts na cara do meu avô e ele não se conteve

“Valha-me Deus! Antonieta, pega as velas que se foi a cota de energia do mês.”

Ele morreu sem ver o filme revelado. Há poucos dias, encontrei os dois rolinhos de três minutos e mandei para São Paulo. Ainda não sei se há algo lá. Torço para que o tempo não tenha apagado estas imagens na fita. Na minha memória elas não se apagarão, jamais.

Agora,desembarco com outracâmeranas mãos. Mais moderna, ecologicamentecorreta emepermitindorever instantaneamente o que gravo. São três dias de reencontro. E de descobertas. Reencontro amigos deixados na infância. Outros, da minha curta passagem de seis meses pela Universidade Federal do Maranhão. Amigos definitivos. Revejo a cidade com os olhos de menino crescido. Pedras de cantaria nas ruas, velhos casarões

azulejados, ladeiras que dão no mar. A dor do encontro dói em meu peito como uma melancolia de seis da tarde, de fim de dia.

Vejo meus filhos descobrindo o meu passado. De onde vim, havia muita areia e mar. Havia um mundo que eu não cheguei a descobrir por inteiro. E que agora estava ao alcance da minha mão por três dias. Jorge, meu primo. Tia Dica, mais velhinha do que imaginava, sentada em um canto da porta da quitanda. Estava tudo lá, como havia anos, deixei. Ali, tive a impressão de que o tempo passou só para as pessoas – agora com cabelos brancos e mansidão. As casas, as ruas, os becos, os cheiros, os sabores, estavam todos lá. Como estiveram uma vida inteira.

Achei tempo de ir aos lençóis. Um deserto de areia e água doce. Até ali só o havia visto em filme – Casa de areia. E imaginado na fala de tantos. É de fato um deserto imenso. Inusitado. Pontuado por lagoas de água doce e um horizonte sem fim.

A viagem curta serviu para aplacar a saudade e dimensionar o tempo. Estive distante sem nunca ter partido. Eu, Inorbel, sou cada vez mais Maranhão. Viegas.

Membros da ALL, no IV Encontro das Academias de Letras do Maranhão, realizado na Academia Maranhense de Letras

Uma tarde de muita Saúde e Luz com o escritor contemporâneo Antonio Aílton
https://www.instagram.com/p/CpiCKrdOFl-/

No lançamento do livro da querida Márcia Reis!

Mural das Minas #018: Márcia Reis: Poesia que traduz sentimentos

Márcia Regina dos Reis Luz nasceu em Caxias, do Maranhão, em 03 de janeiro de 1959. Formada em Letras, na UEMA – em São Luís, defendeu em seu trabalho de conclusão do curso a biografia de Adelino Fontoura, nascido em Axixá-MA, que, apesar de nunca ter publicado um livro, é patrono da Cadeira nº 1, da Academia Brasileira de Letras e da 38, da Academia Maranhense de Letras. É graduada em Direito com Especialização em Direito Civil e Processo Civil, ambos cursados no UNICEUMA, em São Luís. Desde muito cedo começou a juntar coisas no coração: gente, muita gente, letras, muitas letras. Gosta de viver de bem com a vida, honestidade, amigos, paz, fraternidade, compreensão, solidariedade. Na carreira profissional, foi Identificador Datiloscópico, Técnico em Contabilidade, no serviço público federal, e exerceu o magistério por 34 anos. Hoje, além das letras, dedica-se à Advocacia.

Na sua trajetória poética, possui diversas obras premiadas, com participação em diversas Coletâneas, como na do I Festival de Poesias do Sindsep; na I Coletânea Poética da Sociedade de Cultura Latina do Brasil: construindo pontes; na Coletânea Púcaro Literário II; dentre outras. Foi diplomada pela Sociedade de Cultura

Latina do Brasil, pela relevante contribuição em prol da Cultura Latina. É Membro da Academia Maranhense de Trovadores.

SÃO LUÍS, MINHA CIDADE

A cidade é limpa

Um bem incomparável

Nossa casa bem cuidada

é questão tratável

Tenha essa atitude

Seja também responsável

É muito agradável

Faz um bem tão danado

Muito aconchegante um povo educado

qualidade de vida ambiente zelado

Falo da minha São Luis do meu belo Maranhão que tem um bumba meu boi

Cazumbá roda peão casa Nagô e Xangô

Mina, axé, louvação

Bumba-meu-boi vem daqui

Ana e assombrações na carruagem, vaga belos são os casarões azulejos franceses culturas e tentações

A ilha é celeiro

Marrom canta cidade

Onde vive o sabiá

Tem a vitalidade

Gorjeiam Beija-Flores

Toda simplicidade

Minha São Luis do Mara

arquitetura bela

lindas escadarias registro quadro tela patrimônio do povo tem também a viela

Chegando até São Luís

Capital do Maranhão,

Não deixe de visitar

O reggae o espigão

O largo dos amores

A missa a procissão

Barreirinhas um deles

Só terás contentamento

Terra de paraíso

Não existe tormento

Dormirás bem cuidado

Em casa ao relento.

MÃE MULHER

Ser mãe e mulher

uma dádiva divina

nasceu para ser sublime vive para ser amada

uma vez mulher sempre mãe

bendita cuidadora atenciosa guerreira tem também a mãe luz

aquela que está na eternidade mas não esquece dos seus filhos que na terra deixou ser mãe e mulher

beleza maior não há divina e maravilhosa deusa de puro amor mãe mulher és insubstituível.

MEUS QUINZE ANOS

Todo sonho de adolescente

Ao completar 15 anos

É uma festa rodeada de príncipes e princesas

A imaginação vaga e busca

Qual a melhor decoração

Para realizar o seu sonho

Ou mesmo fazer uma viagem

Para lugares longínquos

Mesmo para quem é de Caxias e de uma família

Com 10 irmãos, o sonho não poderia ser diferente

Viu a irmã mais velha ter sua festa e imaginou

Como seria a sua

Mas teve uma surpresa

O presente que ganharia

No seu debut

Seria viajar

Não para terras do outro lado do mundo

Viajaria para conhecer Itapecuru Mirim

E São Luís, do Maranhão

E assim, em dezembro de 1974

Chegou à cidade de Mariana Luz

E em seguida a viagem continuou

Para a Ilha dos Amores

Adorou o presente

E guarda na lembrança a viagem inesquecível.

Lançamento do nosso Delações, em francês, em Genebra. Obrigado! @helvetiaedicoesbr @helvetia_editionsch

Nosso ilustre Acadêmico Daniel Blume, cadeira 15, em um evento internacional representando nossa literatura brasileira, e maranhense.

Nossa Presidente Jucey Santana, e a escritora e acadêmica da ALL Dilercy Adler, e outros membros da comissão em comemoração ao Bicentenário de Gonçalves Dias, em reunião na Academia Maranhense de Letras (AML).

Registro da reunião que a Academia Ludovicense de Letras partticipou hoje pela manhã, na TV UFMA, tendo como representantes a Presidente, Jucey Santana e a Segunda Tesoureira, Clores Holanda. Foi firmada a parceria entre a TV UFMA e a ALL para a participação no Programa Entreletras, o qual ficou definido a participação de membros da ALL, no referido Programa que vai estrear a partir de agosto de 2023. Parabéns à ALL por mais esta significa conquista que tem como objetivo divulgar o nosso sodalício. Ao final da reunião fomos convidadas para conhecer as instalações da TV UFMA, direcionadas pela jornalista Asmynne Barbosa.

SESQUICENTENÁRIO DE FRAN PAXECO

2024

VIDA ETERNA AO REI

Por OSMAR GOMES DOS SANTOS

Faz pouco mais de dois anos que utilizei dos meus rascunhos para, ainda em vida, homenagear Pelé, o rei do futebol. Fiz por entender que não se pode esperar que alguém se vá, para dizer o quão é importante, embora fosse clara essa importância.

Agora, volto a falar do rei. Homenagem póstuma que se soma a tantas outras já conferidas das mais diversas formas.

Reverenciado mundo afora, Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, foi garoto humilde. Negro, um agravante para uma sociedade racista. Enfrentou todas as adversidades que o mundo da bola e o contexto social já foi capaz de submeter a um atleta, o que engrandece e torna única a sua coroa.

Rei! Sim, Rei não por acaso.

A reverência é justa pelos seus feitos como atleta, dentro e fora de campo. Pelé teve tudo para desistir. Menino pobre, viveu os carmas da periferia, a falta de profissionalismo e o racismo em diversas fases de sua vida como jogador.

O preconceito era escancarado, nos clubes, na própria Seleção, por parte dos adversários, da torcida e da arbitragem. Não havia a quem recorrer, se não à habilidade de suas pernas para traçar os caminhos que o levariam a driblar as adversidades. Assim o fez.

Com sua ginga, destreza, força e velocidade, enfileirava os adversários e só parava nos braços dos companheiros de clube, após mais um registro: o gol.

Aos ataques dos canhões em razão do tom de cor, Pelé respondia com tons de genialidade, com a arma chamada futebol-arte.

Viveu um futebol quase medieval, com treinamentos pesados e ausência de regras de fair-play. Jogou com chuteiras e bolas de couro natural, camisas e calções de algodão, uniforme que exigia esforço redobrado quando molhado.

Um rei de hábitos simples, sem “topetes”, sem brincos, sem luzes ou gel nos cabelos, sem filtros.

Pelé era e sempre será o futebol na essência, em estado puro. Virou sinônimo de perfeição... o Pelé da turma, o Pelé do jornalismo, o Pelé do automobilismo, o Pelé da moda, o Pelé, o Pelé, o melhor.

Um verdadeiro artista das quatro linhas, que apesar de tudo que passou respondeu com sorrisos; com arte; com quase mil e trezentos gols oficiais e títulos memoráveis. Cujo nome marcou o século XX, o rosto mais conhecido do planeta.

Feitos memoráveis, que podem até ser alcançados, mas nunca igualados. Muitos jogadores são reconhecidos pelo que fizeram. Mas Pelé é tão singular que sua genialidade entrou para história até mesmo pelo que não concretizou.

O drible de corpo e a finalização quase certeira, a cabeçada e o voo Gordon Banks (defesa mais bonita de todas as copas), a visão e o chute do meio de campo e sua sempre amiga, a bola, insistiu em não entrar. Lances plásticos eternizados.

Confesso estar triste, mas ao mesmo tempo agradecido por poder testemunhar a história do futebol resumida em um homem. Para a matéria, o corpo, o tempo é inexorável, jamais para a lenda, esta vive para a eternidade.

Não uma lenda qualquer, mas aquela criada em torno de um rei. Imortalizado pelo que fez e que não fez, quiçá o único. Se houvesse uma Academia Mundial de Letras Futebolísticas, a cadeira de nº 01 seria eternamente sua.

AquelemeninoqueprometeuumaCopaaopai apósvê-lo chorardepoisdadecepçãodo“Maracanaço”(1950), trouxe três taças mundiais, juntamente com uma equipe desbravadora. Mostrou que sonho e realidade são coisas que andam juntas. Provou que nem todo Império é passível de ruir, ficando o seu reinado eternizado para a posteridade. Rei, Eterno Rei Pelé!

MUNDINHA COMPLETA 80 ANOS E GANHA HOMENAGENS DOS MOVIMENTOS SOCIAIS DO MARANHÃO

MANOEL DOS SANTOS NETO

Mundinha Araújo, uma das maiores ativistas políticas do Maranhão, completa 80 anos neste domingo

Ela vai receber homenagens de diversos movimentos sociais, ao final da missa em ação de graças que será celebrada às 10 horas, na Igreja de São Pantaleão.

Autora de vários livros publicados, além de ser a fundadora do Centro de Cultura Negra do Maranhão, Mundinha dedicou boa parte de sua vida a desenvolver pesquisas sobre a resistência do negro escravo no Maranhão (fugas, quilombos, revoltas e insurreições); comunidades negras rurais e sobre a resistência cultural (festas e danças de pretos) de comunidades maranhenses tradicionais.

Vai aqui um pouco sobre a homenageada: Maria Raymunda Araújo nasceu em São Luís, na Rua da Misericórdia, no dia 8 de janeiro de 1943, sendo a segunda dos 12 filhos de Neuza Ribeiro Araújo e de Eugênio Estanislau de Araújo. No exercício do magistério (1964-1975), Mundinha costumava debater com seus alunos e professores a questão do preconceito racial no Brasil, começando aí a sua militância pela causa.

Nesses tempos acompanhava com interesse a luta dos negros nos Estados Unidos pelos direitos civis, enquanto na África o movimento de libertação das colônias portuguesas culminava com a independência política e a instalação de governos populares na Guiné Bissau, Angola e Moçambique.

No Brasil, em meados dos anos 70, tem início o processo de reorganização de entidades que lutam contra o racismo e a discriminação racial.

Motivada por todos esses episódios, Mundinha Araújo fundou em São Luís, no ano de 1979, o Centro de Cultura Negra do Maranhão (CCN), referência nacional dentre os movimentos sociais do País até os dias atuais. Com a fundação do CCN, inicia as suas pesquisas sobre a resistência do negro escravo. Com este trabalho, construiu um formidável banco de dados, cujas informações vem contribuindo para a construção da história do negro no Maranhão.

“Eu sou da mesma geração de Ângela Davis”, afirma Mundinha, lembrando que viveu intensamente aquela época em que começou a ter forte repercussão em São Luís a luta dos movimentos negros criados nos Estados Unidos em defesa dos direitos civis.

Na década de 80, Mundinha participou ativamente da mobilização dos negros em São Luís, coordenando a Semana do Negro no Maranhão, seminários e outros eventos, cujos temas enfocavam a questão racial no Brasil.

Ao mesmo tempo em que atuava como pesquisadora e militante do Movimento Negro, Mundinha que, além de professora, é técnica em Comunicação Social do quadro de servidores do Estado, exercia na época as suas funções profissionais na Unidade de Editoração do Instituto de Pesquisas Econômico-Sociais e Informática (Ipei – Fipes – Ipes) – (1975-1985).

Em 1985, pretendendo trabalhar na área de pesquisa, solicitou sua transferência para a Secretaria da Cultura, sendo lotada no Arquivo Público do Estado.

Na Cultura, coordenou o ‘Mapeamento cultural dos povoados de Alcântara’ (1985-1987) e na área de Arquivo foi monitora do ‘Guia de Fontes para a História da África, da Escravidão Negra e do Negro na Sociedade Atual’, sob a coordenação do Arquivo Nacional (1987), publicado em 1988.

Em 1991 assumiu a direção do Arquivo Público do Estado do Maranhão (Apem), em cuja administração foi desenvolvido o projeto de modernização dessa instituição (1991 - 2002).

No Carnaval de 2013, Mundinha foi homenageada pelo Bloco Akomabu com o tema ‘Mundinha Araújo, a guerreira que faz história’. Em 2014, foi homenageada na oitava edição da Feira do Livro de São Luís (FeliS). Em novembro de 2014, na data em que se comemora o Dia da Consciência Negra, aconteceu a cerimônia de outorga do título de Doutor Honoris Causa à escritora, pesquisadora e militante do movimento negro Maria Raymunda Araújo, título concedido pela Universidade Estadual do Maranhão (Uema).

Produção literária

Além de ter sido a organizadora do livro ‘Documentos para a história da Balaiada’ (2001), Mundinha já publicou as seguintes obras: ‘Breve memória das comunidades de Alcântara’ (1990), ‘A invasão do Quilombo Limoeiro – 1878’ (1992); ‘Insurreição de escravos em Viana – 1867’ (1994), ‘Em busca de Dom Cosme Bento das Chagas – Negro Cosme: tutor e imperador da liberdade’ (setembro de 2008) e ‘Descendência de Elesbão Lourenço de Araújo e Ana Raimunda de Sá Caldas (Donana)’, este último livro lançado em 2012.

Mundinha está em plena atividade e pretende publicar, ainda neste ano de 2023, quatro trabalhos: ‘Memória dos Quilombos Maranhenses – Século 19’, ‘Catarina Mina, a africana que fez história no Maranhão’, ‘Bumba-meu-boi em tempos de fogo’ e ‘Tambores do Maranhão – Da repressão à consagração’.

Tem um livro inédito: ‘Apontamentos para a história do Movimento Negro’. E agora acalenta o sonho de publicar uma autobiografia: ‘80 anos – Tempos de lembrar’, com histórias de família, sobre sua infância e adolescência, e sobre a São Luís em que estudou, trabalhou e militou como ativista política, Neste domingo, Mundinha completa 80 anos reconhecida em todo o País como uma das maiores lideranças do Movimento Negro no Brasil.

ANIVERSARIO DA CÂMARA DE ARARI

JOÃO FRANCISCO BATALHA

Há 158 anos, nesta data, é instalado o município de Arari. Por coincidência em um segundo domingo de janeiro de 1865.

Da solenidade constou a posse dos seus primeiros vereadores e do presidente da Câmara.

Coube ao Presidente da municipalidade de Vitória do Mearim, Lourenço Rodrigues Chaves, instalar o município e dar posse aos eleitos. Data em que o Arari com a instalação de sua Câmara, posse de seus vereadores e investidura do seu primeiro mandatário, José Antônio Fernandes, passa a ter, efetivamente, emancipação, vida própria e político-administrativa, com normas e princípios institucionais de sua existência como município.

A posse que seria dia sete, conforme o calendário estabelecido, fora, no entanto, adiada pelo presidente da Província do Maranhão, Ambrósio Leitão da Cunha, para a domingueira imediata, ou seja: dia oito de janeiro de 1865, isto porque caberia ao novo presidente da Câmara Municipal da Vila do Mearim, empossado no dia anterior, dar posse à Câmara de Arari. Como presidente, José Antônio Fernandes. Os demais vereadores empossados nessa data foram: Pedro Nunes Cutrim, João Joaquim Pereira, Lino José Tiago de Melo, Joaquim Duarte Fernandes, Raimundo Hermenegildo de Sena e José Nicolau Pereira, eleitos em pleito realizado no dia 7 de setembro de 1864, presidido pelo Juiz de Paz João Joaquim Pereira.

Dia nove de janeiro, o senhor José Antônio Fernandes encaminha comunicado ao presidente da Província dando conta de haver tomado posse e instalado a alcaidaria em uma sala de sua residência devido não haver outro local disponível na vila.

O então presidente, José Antônio Fernandes, já havia passado pela alcaidaria do Mearim, na condição de presidente da Câmara daquela Vila entre os anos de 1857 a 1861.

A emancipação do Arari abalou as estruturas de caixa da Câmara do Mearim o que ensejou reclamações de suas autoridades, principalmente por parte de Manuel Lourenço Bogéa (natural do Arari), que por ser dirigente da Vila do Mearim se opôs à criação do município arariense.

Nessa época, a vila do Arari só tinha um espaço de rua organizado, à beira-rio, que a princípio foi chamada de Rua da Riba. Depois, Rua Grande. Posteriormente Rua Siqueira Campos e atualmente, Rua José da Cunha D´Eça.

Vista Parcial de Arary. Retrato tirado por Moura Quineau, em 24 de dezembro de 1877.

João Francisco Batalha é titular dirigente da Academia Ludovicense de Letras e da Federação das Academias de Letras do Maranhão e integrante fundador do Instituto Histórico e Geográfico de Arari.

OSMAR GOMES DOS SANTOS

DEMOCRACIA, um sistema criado pelo homem, a partir da organização social da qual pretende conclamar a participação de todos e todas para a construção do Estado-nação. Não existe nele perfeição, posto que construído pelo homem.

Certa vez um primeiro-ministro inglês disse que “a democracia é a pior forma de governo, à exceção das demais”. Seu nome era Winston Churchill, considerado um líder estadista e também conservador, o que torna mais interessante tal afirmação.

Trago esta constatação não para reverenciar Churchill, figura que considero controversa em certa medida, apesar da grande influência na política e economia do século XX. Mas apenas para reforçar que dentre todas, mesmo com seus erros e acertos, não há melhor regime do que o democrático.

Retomo ao pensamento inicial para dizer, que o livro da democracia, é construído cotidianamente, com seus traços sendo aprimorados a cada linha escrita. Espaços, vírgulas, parênteses, dois pontos, travessão, além de pontos de interrogação, exclamação e continuando, sempre continuando. Uma demarcação afirmativa é que a democracia denota uma característica peculiar: a marcha democrática é para frente, sem ponto final.

Nessa jornada, natural que percalços ocorram, alguns personagens funcionam como vilões e buscam deturpar o enredo com seus exércitos. Entretanto, como em um final feliz, a democracia há sempre de vencer.

Em sua completude, a obra tem recortes na mais pura “acepção da tragédia”, como visto no “teatro de horrores” que se instalou na Praça dos Três Poderes, coração da democracia, no último domingo (8). Um capítulo que vai na contramão do que propõe um Estado-nação, onde o povo é chamado a participar construtivamente.

Com camisas e bandeiras do Brasil, gritando palavras de “desordem”, algumas centenas de golpistas tentaram tomar o poder de assalto, fora da disputa democrática.

Nada mais que lobos em pele de cordeiro!

Em uma tarde, o respeito do Brasil no cenário internacional foi posto à prova. Estimativas iniciais apontam danos materiais que podem chegar ou mesmo passar dos R$ 20 milhões de reais, no entanto, os prejuízos morais e culturais fogem a qualquer base de cálculo. Portanto, incomensurável!

Obras seculares, muitas das quais remontam a história do Brasil, outras que denotavam a boa relação internacional. Convém destacar alguns princípios insculpidos no Art. 4º da Constituição Federal, que demarca a relação internacional pautada na defesa da paz, na solução pacífica dos conflitos, no repúdio ao terrorismo e na cooperação entre os povos para o progresso da humanidade.

Pelo chão, obras de arte centenárias, únicas - patrimônios da humanidade - depredadas, molhadas, quebradas, rasgadas. Algumas como a que remetiam à atrocidade do holocausto, tal como seu povo durante a Segunda Guerra, foram dizimadas em golpe de insensatez com doses exageradas de totalitarismo.

Não se pode confundir liberdade de opinião e manifestação com libertinagem para suplantar a vontade da maioria. Não há democracia na resistência ao resultado legítimo, no ataque ao próximo, na depredação do patrimônio, nos atos de terrorismo praticados contra as instituições republicanas.

Autoridades deveriam ter agido com rigor e de forma prévia? Possível que sim, diante do conjunto de informações que se noticiou terem chegado a quem poderia agir de forma preventiva. Natural que uma “marcha” de milhares, que se articularam previamente com um propósito comum, não pode passar despercebida. Fica o alerta!

Lembro que há pouco mais de quatro anos usei este espaço para defender a reconciliação após a eleição de Jair Messias Bolsonaro, conclamando que diferenças ficassem para trás. Mais recentemente, agi de forma similar em relação à eleição de Luiz Inácio Lula da Silva.

UM LIVRO CHAMADO DEMOCRACIA

Qual a razão? Apenas para demarcar que é preciso aceitar o resultado do jogo democrático. Simples assim. O conflito, como dizia Georg Simmel, deve ser manifestado apenas no campo das ideias, posições antagônicas que disputam posições, enquanto adversários, jamais inimigos que precisam ser eliminados.

Não cabe mais regressar ao debate sobre escândalos de corrupção, rachadinhas, desvios de condutas de quaisquer que sejam os atores públicos para discutir o processo eleitoral. São esferas distintas. Neste último, cumpre destacar que, no Brasil, o jogo é dentro das quatro linhas, seguindo todos os princípios da administração pública.

A eficiente Justiça Eleitoral tem atuado em obediência e observância das normas e assegurado lisura no processo. Nunca é demais repetir, fazemos uso de modernas tecnologias e temos o mais ágil e transparente processo eleitoral do mundo, que garante a eleição de representantes de todas as vertentes políticas. O que é isso se não a expressão máxima da democracia representativa?

É natural que parte da população esteja insatisfeita, diante do turbilhão de acontecimentos políticos das últimas décadas. Todavia o regime democrático é posto justamente para que possamos debater com equilíbrio e inteligência na consecução dos melhores propósitos republicanos.

Encerro minha contribuição, mas ressalto que o livro da democracia segue aberto, com muitas páginas em branco a serem escritas por cada um de nós. Nessa missão, devemos ter cuidado, mantermos sob controle as paixões da alma, e utilizarmos nossa caneta como um instrumento que promova a paz e a integração social.

*JuizdeDireitodaComarcadaIlhadeSãoLuís. MembrodasAcademiasLudovicensede Letras;Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.

A ESTRUTURA LÓGICA DA NORMA E A DISFUNÇÃO POSITIVA APLICADA

Não se aflija o leitor. O texto, ainda que trate de teoria do direito, com pitadas de lógica aplicada, é compreensível.

Lembro bem das aulas do insigne professor Lourival Vilanova, na Faculdade de Direito do Recife, no mestrado em direito.

Na década de 1990 a tão famosa faculdade ostentava o primeiro lugar no ranking de pós-graduações. Naquela época eram poucos os cursos no Brasil. Mas como neste país tudo que funciona está fadado a ser destruído (basta ver o momento atual) a multiplicação de cursos que pesquisam de tudo e, em muitos casos, sem utilidade alguma, foi fatal. Não precisa grande esforço para nos depararmos com proposições que se fantasiam de científicas em busca do encontro, em expressões milenares, de preconceitos e aversões, e isto é rotulado como pensamento progressista. Não passam de sofismas com financiamento público. Sim, você paga a conta.

Pois bem. O catedrático nos ensinou que a norma possui uma estrutura lógica invariável. E por que isto? Porque (digo eu) ela é o esboço estrutural imodificável para receber um conteúdo. E é no conteúdo que o bicho pega – eu disse que seria um texto digerível.

Lá na faculdade aprendemos que a norma jurídica é uma expressão de dever-ser, portanto, ela contém apenas um pouco do que pode contemplar, enunciada em um comando. Ela não afirma que, se aplicada a regra, a consequência ocorrerá, mas apenas propõe que deva acontecer. Diferente das chamadas normas das ciências naturais em que as consequências independem da vontade do agente. Jogue uma pedra para cima e não saia do lugar. Ela poderá atingir você. Mas com certeza ela cairá. Melhor não fazer, porque nem sempre o empirismo é a melhor companhia. Melhor aprender com o sofrimento de terceiros, uma lição que não sei se é da filosofia chinesa (a bem antiga) ou se é só experiência popular mesmo.

Pois bem. As normas que nos organizam e que pretendem reger nossas vidas são todas iguais nesse contexto lógico de que falo, mas o conteúdo, ao expressar um comando, nem sempre contempla tudo o que contém seu enunciado. As normas, muitas vezes, são mal redigidas ou apenas insuficientemente claras. Querem um exemplo? Vamos lá.

Você se depara com um aviso com o seguinte teor: PROIBIDA A ENTRADA EM TRAJES DE BANHO.

O que transmite esta norma? Claramente que é um enunciado proibitivo aplicado de modo objetivo. Mas imagine ler a mesma norma posta na entrada de um clube de nudismo ou de uma igreja. Perceberam? Claro que, inobstante contenham o mesmo enunciado e propósito, as motivações são diferentes.

Claro que uma norma jurídica contém razões para seu conteúdo que podem possibilitar leituras por motivações diversas. O que, entretanto, não se pode olvidar é que ler a norma em disfunção estrutural (a lógica), atribuindo-lhe significado diverso por voluntária e indisfarçável ilação meramente subjetiva, é a mesma coisa que a ler com olhos no abuso de poder, porquanto, quem interpreta a norma não detém competência para modificar o seu conteúdo dando-lhe a mesma aparência cognitiva. É que está vinculado ao grande “caderno constitucional”, onde todas as notas estão colocadas como regras decifráveis e necessitam ser harmoniosamente compreendidas e aplicadas.

No Brasil de hoje não há lógica nem nas ações das autoridades. Não que elas tenham conseguido modificar a estrutura lógica, imodificável como afirmei: se A é, B deve ser. Mas precisamente porque não se tem mais a compreensão do que pode acontecer quando se está em um palco em que todo o bom senso desapareceu na aplicação das normas jurídicas.

ESTRUTURA LÓGICA DA NORMA E A DISFUNÇÃO POSITIVA APLICADA – A PENA DO PAVÃO (apenadopavao.com)
JOSÉ CLÁUDIO PAVÃO SANTANA A

O pior de tudo é que há quem aplauda a conduta, com a indiferença e ingenuidade de quem supõe que possa ser imune ao autoritarismo. A escalada é progressiva porque tem se defrontado com tipos os mais variados. De omissos a covardes; de complacentes a coniventes, assistem aos atos mais repugnantes já cometidos na história contemporânea do Brasil e vistas no passado das duas grandes guerras mundiais.

A Constituição da República Federativa do Brasil virou uma espécie de norma fundamental hipotética que transpõe o plano cognitivo como proposto por Hans Kelsen. Ela serve apenas como elemento referencial no plano jurídico-positivo, mas mesmo nele é o intérprete que impõe as normas, contraditoriamente, sem a densidade ética em harmonia com a expressão positiva, papel tão reclamado ao positivismo.

Aquele discurso de acusação do “vazio” da norma, destituído de substância ética, de justiça e de moral, para reconhecimento do ordenamento jurídico presente na filosofia jurídica, na busca da construção do que se passou a chamar de pós-positivismo, não passa de uma falácia. O que se assiste com a contemplação cúmplice de juristas é, sobretudo, o poder se impondo em disfunção orgânica, traçando uma espécie de “espiral de retorno”, renovando em pleno século XXI tudo aquilo que se julgou ultrapassado e que levou o homem a registrar em documentos internacionais como cláusulas universais compromissórias protetivas da humanidade.

Quando me abordam, com a retórica que se autoproclama como progressista, falando em democracia, eu costumo argumentar que muitas vezes bastaria o bom senso para definir direitos. Como não canso de afirmar, o homem é naturalmente livre.

É claro que as normas precisam estar escritas como expressão da vontade majoritária. Mas mesmos estas devem ser economizadas pelo legislador, pela simples compreensão de que, quanto mais leis, mais estado, quanto mais estado, mais intromissão na vida do cidadão e, consequentemente, menos liberdade. Jamais pensei, como professor de direito, assistir a autoridades relativizarem conteúdos de normas constitucionais expressas, implícitas e até decorrentes de tratados internacionais. É como se dissessem: a liberdade é constitucional, mas vamos afastá-la dessa vez, só porque é algo oportuno, o que equivale a dizer: corte-se o dedo, no lugar da verruga.

A mim preocupa que tenhamos chegado a cenário trágico como o do presente. Há os que inventam regras, há os que propõem supressão delas e há os que não obedecem a nenhuma delas. Pelo visto a disfunção positiva aplicada reduzirá, definitivamente, a Constituição da República a um símbolo formal que de vivo terá apenas a estrutura lógica.

TESE DE HISTORIADORA CARIOCA CITA LIVRO DE EDMILSON SANCHES

EDMILSON SANCHES.

A historiadora carioca Andréa Camila de Faria Fernandes é uma das mais recentes pesquisadoras a dedicar toda sua formação acadêmica a estudos sobre um escritor maranhense. O nome escolhido foi Antônio Gonçalves Dias, poeta, dramaturgo, etnólogo e jornalista nascido em Caxias. O bacharelado, o mestrado e o doutorado de Andréa Camila tratam de aspectos de Gonçalves Dias. Na tese de doutoramento, outro caxiense foi mencionado: Edmilson Sanches, cujo livro “A Canção do Brasil”, dedicado ao poema “Canção do Exílio”, teve citação no corpo da tese acadêmica e consta das referências bibliográficas. Sanches também consta entre as pessoas a quem a autora carioca agradece colaboração.

PESQUISAS E PUBLICAÇÕES - Segundo Andréa Camila, em mensagem ao jornalista e escritor Edmilson Sanches, ela trabalha com Gonçalves Dias “desde minha graduação” e, na elaboração de seu projeto de doutorado esteve em 2013 em São Luís, como registra na tese, “procurando identificar obras sobre Gonçalves Dias que tivessem sido produzidas localmente” e “participando de um seminário na UEMA [Universidade Estadual do Maranhão], quando tive a oportunidade de conhecer o Sr. Leopoldo Gil, do IHGM [Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão]”, professor e pesquisador de larga produção no Estado. A ele, especialmente mencionado, e a outros estudiosos, Andréa Camila agradeceu em sua tese: “Aos maranhenses Leopoldo Gil Dulcio Vaz, Edmilson Sanches e Rossini Côrrea, que foram sempre solícitos nos pedidos de ajuda e compartilharam comigo entusiasmo pelos estudos sobre Gonçalves Dias, em diferentes momentos, muito obrigada também!”.

Nascida e residente na capital fluminense, Andréa Camila afeiçoou-se aos estudos gonçalvinos e toda sua produçãouniversitária concluintedagraduação e pós-graduação foiorientadapeladoutoraMárciade Almeida Gonçalves, doutora em História Social pela Universidade de São Paulo, professora e pesquisadora da UERJ, onde coordenou vários Programas e Núcleos, entre os quais o Núcleo de Estudos sobre Biografia, História, Ensino e Subjetividades. No seu trabalho de conclusão de curso (bacharelado em História), na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Andréa Camila teve como tema/título da monografia “Gonçalves Dias na Amazônia: o olhar de um romântico”.

Três anos depois, em 2011, ela concluía o mestrado, para o qual escreveu e defendeu na UERJ a dissertação “O santo comércio da amizade: política, literatura e sociabilidade na trajetória de Gonçalves Dias”. Neste trabalho, resume a acadêmica, procura-se “conhecer os caminhos que levaram à construção da imagem do poeta Gonçalves Dias que conhecemos hoje. Procura-se entender de que forma ele veio a construir o nome, no cenário letrado do Império do Brasil, que o fez ser identificado como o poeta nacional por excelência, e, também, identificar em que esferas e projetos ele atuou durante o processo de construção de sua imagem. Nesse caminho, trabalhou-se com a análise de sua correspondência, de modo a perceber qual o peso que suas relações sociais exerceram naformaçãode sua identidadeautoral.Entende-setambém que aimagem/memória de Gonçalves Dias hoje conhecida foi fruto dos esforços de seus biógrafos, se não em criá-la, ao menos em fixá-la, ao longo dos anos, de modo a reservar para Gonçalves Dias, definitivamente, um lugar no panteon nacional”.

Antes de ingressar no doutorado, Andréa Camila escreveu outros trabalhos de relevo sobre Gonçalves Dias, apresentando-os para publicação expondo-os em eventos nacionais. Em 2010, teve publicado seu trabalho “Meditação: visões do Império do Brasil na obra de Gonçalves Dias” no “Caderno de Resumos & Anais do 4º Seminário Nacional de História da Historiografia”, da Universidade Federal de Ouro Preto (MG).

Em 2015, publicou “'Brasileiro de meia cor e meia classe': A vida de Gonçalves Dias por Lúcia Miguel Pereira”, na revista “Ambivalências”, da Universidade Federal de Sergipe.

No29º Simpósio NacionaldeHistória,em julho de2017,em Brasília(DF),apesquisadoracariocaapresentou “A biografia intelectual de Gonçalves Dias: esboço de um projeto”.

Em 2020, no 13º Encontro Estadual de História, realizado em Pernambuco pela seção local da Associação Nacional de História, Andréa Camila publicou “’Sirva de Prólogo’: Construção Identitária nas Apresentações das Obras Poéticas de Gonçalves Dias”.

A TESE E O LIVRO - Só em novembro de 2021, uma década depois do mestrado, Andréa Camila de Faria Fernandes concluiu na UERJ seu doutoramento, com Gonçalves Dias continuando como objeto de seus estudos. A tese foi: “De ‘esperançoso menino do Maranhão’ a ‘poeta nacional’: a consagração da memória de Gonçalves Dias” (238 páginas).

Na tese, citando o livro do jornalista e escritor caxiense, Andréa Camila destaca: “[...] ‘A Canção do Brasil’, de Edmilson Sanches, procura, segundo o autor, registrar e documentar ‘alguns aspectos relacionados ao incomum – dir-se-ia melhor: inédito – alcance do poema ‘Canção do Exílio’’”. A doutora carioca prossegue, revelando e ponto em relevo a contribuição de Sanches: “Já demonstramos aqui que a ‘Canção do exílio’ serviu de inspiração aos mais diversos autores, nos mais diversos momentos, desde a sua publicação em 1846, mas o que Edmilson Sanches faz é ir além, e propor uma ‘biografia do poema’, apresentando sua origem, procurando analisá-lo etimológica e simbolicamente e listando e comentando autores e obras que direta ou indiretamenteseinspiraramna‘CançãodoBrasil’”.Econtinua:“Aanálisedestes,edemuitosoutrostrabalhos existente, é profícua e poderia bem facilmente dar origem a uma nova pesquisa sobre a recepção crítica e a preservação da memória do poeta. Não foi esse nosso objetivo aqui. Citá-los teve apenas a função de demonstrar que a máxima de que Gonçalves Dias é pouco lido não é tão verdadeira como poderíamos pensar num primeiro momento. Talvez ao invés de dizer que ele é pouco lido, seria mais exato pensar que ele é pouco divulgado. Os trabalhos sobre ele existem, estão por aí atravessando os séculos, mas apenas temos acesso a eles quando decidimos pesquisar mais detidamente a vida e a obra do poeta. No dia a dia ficamos no lugar comum. Cantamos a ‘Canção do exílio’ como se fosse nosso Hino e negligenciamos o conhecimento sobre seu autor. Nesse sentido, a pesquisa que aqui empreendemos teve a aspiração, talvez pretensiosa, de tornar Gonçalves Dias mais próximo a nós. De permitir aos que se debruçarem sobre essas páginas conhecê-lo um pouco mais, para, talvez assim, despertar mais interesse sobre o homem e sua obra, pois até consideramos que sua obra vive em nosso imaginário cultural, mas entendemos também que o que dela mais conhecemos é apenas uma pequena parte do conjunto da produção do poeta.”

O livro “A Canção do Brasil”, de Edmilson Sanches, foi lançado em 2020 pela Editora Estampa, de Imperatriz (MA), que, na época, publicou simultaneamente outras três obras do escritor maranhense: “Maranhão Não é Mentira”, “Teixeira Mendes Esse Nome é Uma Bandeira” (2ª edição) e “Do Incontido Orgulho de Ser Caxiense” (2ª edição, ampliada). Contatos: edmilsonsanches@uol.com.br e www.edmilsonsanches.webnode.page .

MARANHÃO E CAXIAS – Informada de que Edmilson Sanches está, a convite, desde junho de 2022 no Rio de Janeiro, onde auxiliou em trabalho de resgate de escritor maranhense em livro, Andréa Camila saúda o caxiense: “Espero que esteja sendo bem recebido aqui nestas terras fluminenses, como já o fui nas suas terras maranhenses. Se tudo der certo, estarei lá [no Maranhão] novamente em julho próximo, para participar do simpósio nacional de história da ANPUH [a Associação Nacional de História]”.

Sobretalentosos caxienses emaranhenses, adoutoradiz,de modo reflexivo, críticoe esperançoso: “Sãotantos os caxienses ilustres e tão pouco o que o Brasil sabe sobre eles e sobre a cidade... Parabéns pelo trabalho de divulgação! Espero um dia poder ir conhecer a terra onde nasceu Gonçalves Dias.” E continua: “O Maranhão é, infelizmente, um mundo quase desconhecido do restante do país. Mesmo Gonçalves Dias, que acho que posso dizer que é o filho mais ilustre dessa fértil terra, é bem pouco conhecido, se pensarmos em tudo que foi. A maioria só sabe que foi poeta e mesmo assim conhece poucos versos; e há ainda muitos que conhecem os versos, mas não fazem ideia de quem é o autor”. A acadêmica carioca conclui: “Admiro seu empenho em resgatar esses nomes e memórias”. ///

da Revue cultive n° 16 por Cultive

Homenageada pelo Institut Cultive Suisse Brésil, a escritora Dilercy Adler recebu o Prêmio Valkyrie dia 28 de novembro 2021 das mãos da presidente do ICSB, Valquiria Guillemin Imperiano.

Dilercy Aragão Adler é uma poeta contemporânea das mais combativa e empática, no que toca a busca do empoderamento do ser humano, através do conhecimento profícuo em Educação, em Psicologia , em Literatura e nas Artes, de um modo geral.

A poeta, escritora e conferencista nasceu em São Vicente Férrer, Maranhão, em 1950. É Psicóloga. Doutora em Ciências Pedagógicas - Cuba (revalidação na UnB-Brasilia); Mestre em Educação pela Universidade Federal do Maranhão-UFMA; Especialização em Metodologia da Pesquisa em Psicologia e Especialização em Sociologia pela Universidade Federal do Maranhão-UFMA. É aposentada pela Universidade Federal do Maranhão-UFMA. É membro do Banco de Avaliadores do Sinaes - BASIS/INEP/MEC.

Ela é uma defensora cultural ativa, presente e batalhadora. Há mais de 12 anos ela se dedica a criar projetos culturais no Maranhão, proporcionando assim o intercâmbio entre a intelectualidade do Maranhão com o resto do Brasil e outros países. Dilercy é esrtudiosa de Firmina do Reis. Através dela Firmina dos Reis ultrapassou as fronteiras do Maranhão e vem sendo estudada e louvada pelos esurtdiosos de literatura.

A seu trabalho sobre Maria Firminina, além de trazer a tona o trabalho da grande escritora brasileira, uma discussão sobre a posição feminina na literatura. Dilercy além de professora é também poeta publicada e reconhecida internacionalmente. Prepare o seu coração pras coisas que eu vou contar eu venho lá do sertão eu venho lá do sertão eu venho lá do sertão e posso não lhe agradar aprendi a dizer não ver a morte sem chorar e a morte o destino tudo e a morte o destino tudo estava for a do lugar eu vivo para consertar...

Música "Disparada" de Geraldo Pedrosa de Araújo Dias (Geraldo Vandré) João Pessoa PB

Como é do conhecimento geral, o Brasil é um país continental e o seu território com 8.516.000 quilômetros quadrados abrange cinco regiões:

TEXTO VOZES DE MULHERES OITOCENTISTAS DO NORDESTE BRASILEIRO: histórias de resistência de Firmina, Laura Rosa e Alba Valdez

Em primeiro lugar, quero parabenizar os organizadores do "Congrès Cultive International Culture de la Femme", na pessoa da Presidente da Cultive, Valquíria Imperiano, por esta iluminada iniciativa e, ao mesmo tempo, agradecer o gentil convite que tenho a honra de atender. Quero ainda dizer da minha alegria em estar nesta mesa com Algemira Mendes, Eugênia de Azevedo Neves, Kalil Guimarães, Matilde Conti e Rita Queiroz, mulheres que usam as suas vozes, principalmente por meio da literatura, para dar força e vigor a outras tantas mulheres.

Como nordestina, escolhi este tema, o qual muito me honra, por ser mulher e por entendê-lo como de extrema pertinência, se almejamos a existência de uma sociedade justa e igualitária, onde todos tenham os mesmos direitos, direitos de toda ordem.

Quanto à minha comunicação, propriamente dita, "Vozes de mulheres oitocentistas do Nordeste brasileiro: histórias de resistência de Firmina, Laura Rosa e Alba Valdez" trata de provas vivas, do enfrentamento do subjugo masculino, de algumas mulheres do Nordeste brasileiro, que fizeram a diferença no século XIX e que fazem eco até os dias atuais.

Firmina dos Reis, maranhense, chegou a usar dois criptônimos antes de usar o próprio nome: "Uma Maranhense" e as iniciais "M.F.R."; Laura Rosa, também maranhense, utilizava o pseudônimo de "Violeta do Campo" e Maria Rodrigues Peixe, cearense, assinava como "Alba Valdez".

Norte, Nordeste, Centro-oeste Sul e Sudeste. A região Nordeste é a que apresenta maior quantidade de Estados, totalizando 09: Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia. O Nordeste é a segunda região mais populosa do país e a segunda em extensão territorial, além de ser a região que possui a maior costa litorânea, com paisagens paradisíacas. Por certo, a produção feminina do fim do século XIX e início do século XX se apresenta menos expressiva que a masculina, mas isso, podemos inferir, se deve principalmente às condições objetivas das sociedades em que viviam essas mulheres e não pela falta de vocação ou de desejo de terem seus trabalhos conhecidos e (re) conhecidos.

Essas sociedades eram profundamente marcadas pela supremacia do homem, pautada em valores do modelo eurocêntrico, masculino, caucasiano e aristocrático.

Foi na região nordestina que ocorreu o início da colonização europeia no Brasil, visto que os portugueses desembarcaram, a primeira vez, na cidade de Porto Seguro, na Bahia. Igualmente na Bahia, na cidade de Salvador, em 29 de março de 1549, foi fundada a primeira capital para abrigar o Governo-Geral. O Nordeste, além disso, se apresentou como centro financeiro do Brasil, até meados do século XVIII.

Devido à variedade geográfica natural e à pluralidade de heranças de povos com matrizes indígena, africana e europeia, em especial a portuguesa, é que os nordestinos expressam ricas manifestações artísticas, que resultam, entre outras questões, em manifestações folclóricas, de artesanato, gastronomia, festividades e vestuário.

No tocante à literatura nordestina, essa região concedeu e concede ainda grandes contribuições para o cenário literário e artístico-cultural brasileiro, colocando em evidência grandes nomes, tanto em quantidade como em qualidade.

No específico à escrita feminina no Brasil, é constatado que, no fim do século XIX e começo do século XX, raramente a mulher apresentava denodo em colocar o próprio nome em suas obras. Maria Convém esclarecer que, apesar dessas condições exacerbadamente proibitivas, elas impediram, menos do que se imagina, a presença da mulher no âmbito literário. Essa assertiva é comprovada hoje, devido ao desenvolvimento de vários projetos de resgate de escritoras brasileiras do passado, os quais, operacionalizados, principalmente a partir da segunda metade do século passado, reúnem valiosas descobertas, tais como diários, cartas, testamentos e jornais do período.

Os jornais e revistas oitocentistas desempenhavam papel de fundamental importância no cenário político e cultural dessa época, exercendo influência sobre a opinião pública e o meio intelectual. Nesse âmbito, a atividade literária encontrou nesses meios de comunicação espaços de difusão e discussão. Raros eram os periódicos oitocentistas que não reservavam um lugar em suas páginas para os assuntos literários. Estes divulgavam textos de ficção, poemas, contos, romances, seriados, crítica literária, ensaios, resenhas. Destarte, se caracterizavam pela simbiose entre jornalismo e literatura, que levou à incorporação de características literárias ao gênero especificamente jornalístico, a exemplo, dos editoriais, artigos de fundo, reportagens, entre outros.

A missão desses jornais e revistas permite aos pesquisadores de hoje, que se dedicam à investigação da trajetória literária no Brasil, terem na imprensa oitocentista um rico acervo de fontes primárias, para o desenvolvimento dessa tarefa.

Convém lembrar que nem todos os romances mais anunciados em 1857 e 1858 são conhecidos do público em geral, na atualidade. Alguns deles, elogiados e recomendados por críticos que gozavam de prestígio na época, sendo por isso de grandes sucessos no século XIX, ficaram totalmente esquecidos posteriormente e,consequentemente, excluídos do cânone literário.

Apesar do cancelamento da expressão feminina, muitas conseguiram burlar, e mesmo tendo sido excluídas do cânone literário, deixaram marcas inapagáveis que nas últimas décadas, como já referido, progressivamente vêm sendo recuperadas. Constância Duarte (2018) cita a experiência de um grupo de pesquisadores, sob a coordenação da professora Zahidé de Lupinacci Muzart, intitulado "Sonho projeto". Esse projeto foi desenvolvido nas décadas de 1980 e 1990 com o objetivo precípuo de resgatar escritoras brasileiras do passado, inclusive por região, coletando os casos das nordestinas.

A professora Mozart afirma que o apagamento de escritoras do século XIX é sobretudo político, pois acentuadamente as mais atuantes, as feministas, não tiveram inserção do seu nome e obra no cânone literário brasileiro. Nessa perspectiva, afirma que o projeto de resgate é antes de tudo um projeto feminista, um projeto político. Desses trabalhos arrolei mais de cem nomes de escritoras em situação de apagamento, entre as quais, aquelas resgatadas com sucesso, outras em processo de ressurgimento mais avançado, outras ainda cujos processos necessitam ser aprofundados como objeto de estudo.

No âmbito da Universidade Federal do Maranhão-UFMA, mais especificamente do Curso de Doutorado em Educação, professoras e professores também vêm se alinhando ao trabalho de desconstrução do silenciamento secular da mulher.

Um trabalho que elegeu a relevância da "Mulher Professora" foi a Tese de Doutorado da Profa. Diomar Motta, "As mulheres Professoras na Política Educacional no Maranhão", defendida no ano 2000 e publicada em 2003, pela EDUFMA, em São Luís. Esse estudo analisa a trajetória educacional das professoras: Laura Rosa (1894-1976), Rosa Castro (1891-1976), Zoé Cerveira (1894-1957) e Zuleide Fernandes Bogéa (18971984), egressas da Escola Normal do Maranhão, criada em 1890 (MOTTA, 2003).

Em decorrência dessa Tese, a Profa. Dra. Diomar Motta criou, em 15 de fevereiro de 2002, o Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação, Mulheres e Relações de Gênero (GEMGe).

O GEMGe é um veículo de intervenção epistemológica, por meio da produção e disseminação de conhecimentos a respeito de questões de gênero, mulheres, visões de feminismos, dentre outros aspectos relacionados à memória da exclusão, e estabelece relação com a Linha de Pesquisa "Instituições Escolares, Saberes e Práticas Educativas do Programa de Pós-Graduação em Educação (Mestrado) da Universidade Federal do Maranhão e, também, articulação com o Núcleo Interdisciplinar de Estudos e Pesquisas sobre Mulher, Cidadania e Relações de Gênero (NIEPEM), afiliado à Rede Feminista Norte e Nordeste de Estudos e Pesquisas sobre Mulher e Relações de Gênero (REDOR).

O Programa de Pós-Graduação em Educação (Mestrado), desde 2003, por meio do GEMGe, com apoio do NIEPEM, afiliado à REDOR, vem promovendo na Universidade Federal do Maranhão o Encontro Maranhense sobre Educação, Mulheres e Relações de Gênero no Cotidiano Escolar (EMEMCE) e o Simpósio Maranhense de Pesquisadoras (es) sobre Mulher, Relações de Gênero e Educação (SIMPERGEN).

A partir de 2008, ano de realização do II EMEMCE e II SIMPERGEN, teve início a outorga da Medalha do Mérito "Professora Laura Rosa", em reconhecimento às mulheres professoras, por suas atuações no magistério e na constituição da história das mulheres, sobretudo na política educacional maranhense. Ou seja, são mulheres homenageando mulheres com uma comenda instituída para homenagear uma ilustre mulher professora poeta.... a Violeta do Campo, Laura Rosa...

Leopoldo Gil Dulcio Vaz, Membro Fundador e Efetivo da Academia Ludovicense de Letras-ALL, desenvolve um projeto "Em busca de escritoras ma-

ranhenses" desde 2017, coletando dados de escritoras do Estado, principalmente em jornais antigos. Nesses quatro anos já conseguiu arrolar cerca de 80 escritoras, dentre as quais, aproximadamente, 10% encontravam-se esquecidas. Já publicou artigos sobre algumas dessas mulheres.

Louvo todas as iniciativas de regaste e salvaguarda dos nomes ilustres da nossa terra, assim como os de todo o Brasil, em especial, os das muitas mulheres silenciadas ao longo da história.

Neste estudo trago como exemplo as imortais Maria Firmina dos Reis, Laura Rosa e Maria Rodrigues Peixe.

NO ÁLBUM DE UMA AMIGA

Maria Firmina dos Reis D'amiga a existência tão triste, e cansada, De dor tão eivada, não queiras provar; Se a custo um sorriso desliza aparente, Que máguas não sente, que busca ocultar!? ... Os crus dissabores que eu sofro são tantos, São tantos os prantos, que vivo a chorar, É tanta a agonia, tão lenta e sentida, Que rouba-me a vida, sem nunca acabar. D'amiga a existência Não queiras provar, Há nelas tais dores, Que podem matar. O pranto é ventura, Que almejo gozar; A dor é tão funda, Que estanca o chorar. Se intento um sorriso, Que duro penar! Que chagas não sinto No peito sangrar!... Não queiras a vida Que eu sofrolevar, Resume tais dores Que podem matar. E eu as sofro todas, e nem sei Como posso existir! Vaga sombra entre os vivos, - mal podendo Meus pesares sentir. Talvez assim Deus queira o meu viver Tão cheio de amargura. P'ra que não ame a vida, e não me aterre A fria sepultura. No caso de Maria Firmina, a primeira romancista brasileira, ao mesmo tempo que Horácio de Almeida, paraibano, em 1962, comprou um lote de livros usados e entre os quais estava o romance "Úrsula" da escritora Maria Firmina, em São Luís, José Nascimento Morais Filho, em 1973, pesquisando textos natalinos de autores maranhenses para sua obra "Esperando a Missa do Galo", na Biblioteca Pública "Benedito Leite", se deparou com vários textos da escritora em jornais literários. Ele cita em seu livro "Maria Firmina: fragmentos de uma vida" (1975), alguns desses jornais: Federalista, Pacotilha, Diário do Maranhão, A Revista Maranhense, O País, O Domingo, Porto Livre, O Jardim dos Maranhenses, Semanário Maranhense, Eco da Juventude, Almanaque de Lembranças Brasileira, A Verdadeira Marmota, Publicador Maranhense e A Imprensa.

Maria Firmina dos Reis nasceu no dia 11 de março de 1822, no bairro de São Pantaleão, nas imediações da igreja do mesmo nome, em São Luís do Maranhão. Segundo a certidão de batismo, filha natural de Leonor Felipa, "molata" forra, que foi escrava do comendador Caetano José Teixeira. Foram seus padrinhos o tenente de milícias João Nogueira de Souza e Nossa Senhora dos Remédios, com base nos documentos da Câmara Eclesiástica Episcopal, disponível atualmente no Arquivo Público do Estado do Maranhão-APEM. Como filha natural não tem registrado o nome do pai, no entanto, no seu atestado de óbito consta que é filha de João Pedro Esteves.

Embora tenha nascido em São Luís, viveu grande parte da sua vida em Guimarães onde produziu toda a sua obra e, ademais, assumiu a Cadeira de Primeiras Letras do Sexo Feminino da Vila de Guimarães, para qual foi nomeada, por ter sido aprovada em concurso público, com esse fim. Também na área da educação, segundo Morais Filho, fundou em 1880 a primeira escola mista em Maçaricó, Vila de Guimarães no Maranhão.

Maria Firmina é indubitavelmente grande intelectual e artista de múltiplos talentos, além de apresentar engajamento político em todas as suas atividades e trabalhos, em prol de uma sociedade mais fraterna e justa. Entre as suas obras: "Úrsula", a mais relevante obra literária (1859); escreveu o romance de temática indianista, "Gupeva" (1861, este ano completa 160 anos de publicação); conto antiescravista, intitulado "A escrava" (1887); "Cantos à beira-mar", poemas (1871, este ano completa 150 anos de publicação). Participou da "Antologia Poética Parnaso Maranhense", coleção de poesias, editada por Flávio Reimar e Antônio Marques Rodrigues (1861). Além do mais, é autora de charadas, incursionou pelo mundo da música compondo letras e melodias entre as quais: "Auto de bumba-meu-boi" (letra e música); "Valsa" (letra e música); "Hino à Mocidade" (letra e música); "Hino à Liberdade dos Escravos" (letra e música); "Rosinha", valsa (letra e música); Pastor Estrela do Oriente (letra e música) e Canto de Recordação "à Praia de Cumã" (letra e música).

Vejo como uma denúncia velada acerca do subjugo da mulher e a escrita feminina que Firmina no Prólogo do Romance Úrsula, quando expressa:

[...] mesquinho e humilde livro é este que vos apresento, leitor. Sei que passará entre o indiferentismo glacial de uns e o riso mofador de outros, e ainda assim o dou a lume.

Não é a vaidade de adquirir nome que me cega, nem o amor próprio de autor. Sei que pouco vale este romance, porque escrito por uma mulher, e mulher brasileira, de educação acanhada e sem o trato e conversação dos homens ilustrados, que aconselham, que discutem e que corrigem, com uma instrução misérrima, apenas conhecendo a língua de seus pais, e pouco lida, o seu cabedal intelectual é quase nulo (REIS,1988, p.10) (grifos meus).

José Nascimento Morais Filho declara que, apesar de ter sido bem recepcionada pela crítica, com palavras de entusiasmo e estímulo, Maria Firmina foi vítima posteriormente de uma amnésia coletiva, ficando totalmente esquecidos o seu nome e a sua obra, mas, como a Fênix ressurgiu também das cinzas.

Costumo dizer que Morais Filho, como um Sankofa, pássaro africano de duas cabeças, uma voltada para o passado e outra para o futuro, que segundo a filosofia africana significa a volta ao passado para ressignificar o presente, dedicou-se incansavelmente para dar novo significado à Maria Firmina como mulher, escritora e professora, dando a ela o lugar que lhe é devido na historiografia literária feminina no Maranhão e no Brasil. a Academia Ludovicense de Letras-ALL, Casa de Maria Firmina dos Reis, o Instituto Histórico e Geográfico de Guimarães-HGG, que a tem também como patrona, procuram consolidar o trabalho de Nascimento Morais Filho e, mais recentemente, a Academia João-lisboense de Letras-AJL, também Casa de Maria Firmina dos Reis.

Convém lembrar que Maria Firmina, dos 95 pródigos anos que viveu neste plano físico, conviveu 66 anos com a escravidão, tendo falecido em 11 de novembro de 1917, na cidade de Guimarães, no Maranhão.

Em continuação, faz-se mister falar um pouco da grandiosidade da Mulher Professora, Poeta, Contista, Laura Rosa, a Violeta do Campo, outra maranhense, também escritora e professora como Maria Firmina.

ESQUELETO DA FOLHA

Laura Rosa, a Violeta do Campo. Vede, senhor, apodreceu na lama Eu a vi há muito tempo entre a folhagem Antes do vento lhe agitar a rama E do regato, sacudi-la à margem. De virente e de verde tinha fama Da folha mais famosa da ramagem Desceu nas águas e resta da viagem O labirinto capilar da tinta.

Ninguém pode fazer igual verdade Nem filigrama mais perfeito e lindo Nem presente melhor pode ser dado. Guardai, Senhor, guardai este esqueleto Todo cuidado! É uma folha ainda Onde escrevo de leve este soneto.

Laura Rosa, segundo Jomar Moraes, "Uma rosa que era violeta", nasceu em 1º de outubro de 1884 em São Luís do Maranhão e faleceu aos 92 anos, em 14 de novembro de 1976 em Caxias-Maranhão. Filha de Cecília da Conceição Rosa e de pai não declarado. Laura foi criada por padrinhos, que lhe proporcionaram uma boa educação.

Formou-se professora normalista em 12 de janeiro de 1910, pela Escola Normal do Estado do Maranhão e no dia 18 do mesmo mês foi nomeada professora de um distrito do município de Caxias.

Por fim, a terceira escritora, tão importante quanto as anteriores, é Maria Rodrigues Peixe, pseudônimo Alba Valdez.

SEM MUCURIPE

(Alba Valdez, História Literária do Ceará, 1951) O Mucuripe é uma visão Marinha, Fala ao senhor nas folhas dos coqueirais; Nas horas que proclama os jangadeiros Olham do mar, a plácida igrejinha.

Se a tarde vem, a multidão se apinha Nessa rude alegria dos peixinhos; O sol golfeja sangue nos outeiros, Beijando a enseada, a vaga borbolenha.

Olhos no Azul, ao som d' Ave Maria Uma velhinha no portal sentada, Reza contrita e o neto acarecia...

Na retina, no pranto morejada, Retrata o filho que partira um dia, E em vão pergunta o mar pela jangada. Ademais, foi a primeira mulher a ingressar na Academia Maranhense de Letras, eleita em 03 de abril de 1943 como Membro Fundador da Cadeira N º 26, Patroneada por Antônio Lobo, que foi seu professor. Na Academia Caxiense de Letras, fundada no dia 1º de junho do ano de 1962, Laura Rosa é Patrona da Cadeira Nº 12, no Instituto Histórico e Geográfico de Caxias, fundado em 12 de dezembro de 2003, é Patrona da Cadeira Nº 10, e, em São Luís, na recém-fundada Academia Ludovicense de Letras-ALL é Patrona da Cadeira N º 25. Acho pertinente ilustrar a situação da mulher do seu tempo, por meio de um pequeno excerto do seu Discurso de Posse, na Academia Maranhense de Letras, em 17 de abril de 1943:

Dilercy Aragão Adler é uma poeta contemporânea das mais combativa e empática, no que toca a busca do empoderamento do ser humano, através do conhecimento profícuo em Educação, em Psicologia , em Literatura e nas Artes, , escritora e conferencista nasceu em São Vicente Férrer, Maranhão, É Psicóloga. Doutora em Ciências Pedagógicas - Cuba (revalidação na Brasília); Mestre em Educação pela Universidade Federal do MaranhãoUFMA; Especialização em Metodologia da Pesquisa em Psicologia e Filha de João Rodrigues Peixe e de Isabel Alves Ro-Especialização em Sociologia pela Universidade Federal do Maranhão-UFMA. É aposentada pela Universidade Federal do Maranhão- drigues Peixe, nasceu em São Francisco de Urubu-UFMA. É membro do Banco de Avaliadores do Sinaes - BASIS/INEP/MEC. retama, atual Itapajé no Ceará, em 12 de dezembro de 1874, e faleceu em 05 de fevereiro de 1962, no Rio de Janeiro. Diplomou-se pela Escola Normal do Ceará, dedicando-se ao Magistério, ao Jornalismo e aos Estudos Literários. Ela produziu diversos textos em periódicos, revistas e almanaques. Uma forte característica de suas obras consistia no engajamento em embates pelos direitos da mulher. Colaborou com vários jornais e revista aos quais fornecia trabalhos, contos e crônicas altamente apreciados. Dentre as publicações em periódicos de seu tempo, podem ser citados: Revista da Academia Cearense de Letras; Revista do Ceará (1905); Panóplia (1914); Diário do Ceará, 1917-1919; Correio do Ceará, 1921-1922; Uma Tribuna (1922); A Razão (1919); Unitário (1955); O Nordeste (1927); Jornal do Commercio (1930); Diário do Recife (1935); Íris de Porto Alegre (1920). Feminista declarada, entre as lutas em defesa dos direitos das mulheres, defendeu o voto feminino e a igualdade entre os sexos. Criou a "Liga Femi"Manda a justiça que vos diga, em primeiro lugar, que me trouxeram para esta casa de sábios ilustres as mãos amigas de Corrêa de Araújo e Nascimento de Moraes com a benevolência de seus pares. & Poemas Róseos Trouxeram-me, porque, de mim mesma, nunca imaginei suficientes os meus versos, para mereciPoematizando o mento de tão honrosas credenciais". Cotidiano ou Pegadas do Imaginário (1997)E continua: "Eis-me, portanto, aqui, Senhores, a primeira mulher que aqui entra, porque assim o quiseram os homens ilustrados desta agremiação, guardas fiéis de nossas tradições literárias" (Revista da AML, 1998, p. 15). Até certo ponto dirige palavras elogiosas para os acadêmicos, enquanto para si, a mim me parecem, palavras apequenadas. Firmina também coloca algo semelhante no Prólogo do seu romance Úrsula. Coletânea

Poética da Sociedade de Cultura Latina do Estado do Maranhão -LATINIDADE I (1998) Arte Despida ( 1999)

Gêneses IV Livro (2000); Seme... ando dez anos 2000 cinquenta vezes dois mil Human(as) idade(s)-2001

Coletânea Poética da Sociedade de Cultura Latina do Estado do MaranhãoLATINIDADE III (2002)

nista Cearense", a Academia Feminina de Letras, ocupando a Cadeira Nº 16 que tinha como patrona Francisca Clotilde, integrou-se ao Instituto do Ceará (Histórico Geográfico e Antropológico). Foi ainda a primeira mulher a ingressar na Academia Cearense de Letras em 1922, assumindo a Cadeira Nº 8, que tinha Álvaro Martins, e posteriormente na mesma Academia ocupou a Cadeira de Nº 22, patroneada por Justiniano de Serpa.

Demonstro a seguir duas, dentre as várias evidências das situações vividas pelas mulheres na sociedade oitocentista, com a respectiva prova de resistência em Alba Valdez:

A primeira diz respeito ao discurso proferido, por ela, na sessão do Quinquagenário do Instituto do Ceará (Histórico, Geográfico e Antropológico) ao expressar: "A mulher é um ser fraco, propalam. Pois, da própria fraqueza, construirei a força necessária para comunicar as minhas emoções. (VALDEZ, 1937).

E a segunda, concerne ao diálogo que manteve com o seu pai, quando ele tomou conhecimento de que ela colaborava com a imprensa de Fortaleza, dez anos depois. Essa pequena mostra do diálogo retrata, em parte, os valores da sociedade de então:

- Minha filha, você escreve em jornal? - Sim meu pai. - Ganha alguma coisa com isso? - Não. - Você imagina que faz boa coisa? Pensa que não vai ter de desgosto? - Já tenho experimentado aborrecimentos. - Pois eu não a proíbo. Espero, apenas, que não se arrependa um dia.

Isso posto, podemos concluir que essas três mulheres oitocentistas são nomes importantes na história da literatura e da educação brasileira e, apesar do subjugo masculino vigente na sociedade, foram obstinadas, no sentido de lutar pelo rompimento da opressão e se firmaram como autoras de vasta obra, o que a nós reafirma a necessidade de colocá-las como grandes escritoras representantes da cultura e educação brasileiras.

Por fim, reafirmo que urge persistir no trabalho de desconstrução do silenciamento secular das vozes femininas, mesmo reconhecendo que não é tarefa fácil a extinção de um condicionamento tão enraizado e hegemônico. No entanto, é incontestável que essa quebra está sendo feita, os grilhões como os de toda e qualquer escravidão estão sendo quebrados, paradigmas superando exclusão... numa viagem sem volta!

REFERÊNCIAS

DUARTE, Constância. Escritoras nordestinas do Século XIX: resgate e história. Revista dos Programas de PósGraduação do Instituto de Letras da UFBA- Estudos Linguísticos e Literários, 2018.

FANGUEIRO, Maria do Sameiro. Alba Valdez. Biblioteca Nacional Digital: Periódicos e Literatura. Disponível em: https://bndigital.bn.gov.br/dossies/periodicos-literatura/personagens-periodicos-literatura/albavaldez/. Acesso em: 20 de julho de 2020.

MOTTA, Diomar das Graças. As mulheres professoras na política educacional no Maranhão. São Luís: EDUFMA, 2003.

MUZART, Zahidé. (Org.) Escritoras brasileiras do século XIX: antologia. Florianópolis: Editora Mulheres, v. 2, 2004.

MORAIS FILHO, José Nascimento. MARIA FIRMINA FRAGMENTOS DE UMA VIDA. São Luiz: COCSN, 1975.

REIS, Maria Firmina. (Organizadores: Adler Dilercy; Gomes Osvaldo). Cantos à beira-mar. 1ª edição atualizada conforme o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa em vigor. São Luís: Academia Ludovicense de Letras, 2017

VASCONCELOS, Anna Heloisa de. Ipomeias: mulheres do século XIX na imprensa cearense. Monografia. Universidade Federal do Ceará, Instituto de Cultura e Arte – ICA, Curso de Comunicação Social – Jornalismo, Fortaleza, 2018.

MÁRIO LUNA FILHO NO DICIONÁRIO DE POETAS CAXIENSES.

Caxias

(((Mário Luna Filho)))

No teu silêncio

Encontro instantes de mim mesmo

Guardados na memória

Destas ruas quase sem nomes.

Num rito de busca

Vou colhendo fragmentos

De meus momentos dispersos

Pelos teus rumos.

Já não mais brincam meninos traquinos

Em tuas calçadas, Bolsos repletos de petecas multicoloridas.

O trem, em seu ritmo lento de chegar

Não mais cogita a atenção

De teus filhos tão dispersos.

Mas a memória de teu rio

Lembrou-me cousas

Há muito esquecidas.

Achou-me

Talvez um pouco mais triste. Mais sentido.

Mais só, Mais

Mário...

Mário Luna Filho, poeta caxiense contemporâneo, nascido em São Luís aos 27 de julho de 1950, vindo cedo para Caxias onde regou os sonhos de infante. Vencedor de vários concursos literários, é cirurgião-pediatra, membro da Sociedade Brasileira de Escritores Médicos - Regional do Maranhão (SOBRAME/MA). Principais títulos publicados: "Do sapato ao pé descalço" (poemas); "Um pingo para o seu devido i" (ensaio); "Chão azul" (contos); "Do granito ao infinito" (poemas).

O poema aqui compartilhado foi extraído da coletânea "Itinerário poético de Caxias", organização do poeta Quincas Vilaneto.

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4 POEMAS DE QUINCAS VILANETO CARVALHO JUNIOR

Quincas Vilaneto (Caxias/MA). Poeta e pesquisador brasileiro. Possui graduação em Administração de Empresas, com pós-graduação em Administração Municipal, sendo Administrador do quadro efetivo da UEMA há muitos anos. Entre outras publicações, é o autor de Balaio de Ilusões (1997), Itinerário Poético de Caxias (2003), A Lira dos Esquecidos (2006), Tear (2012), Caxias (2014), Empalavrando silêncios (2014) e Ao Pé da Letra (2016). Mora na capital São Luís e é um dos organizadores do sarau Na Pele da Palavra. É membro efetivo da Academia Caxiense de Letras (ACL) e do Instituto Histórico e Geográfico de Caxias (IHGC).

Entre a luz e a sombra

De que adiantam as metáforas, Se o infinito está de boca quebrada

E cada um de nós Como se não tivesse voz sequer se reconhece?

De que adiantam as palavras Se a esperança avermelhou

E do outro lado do peito O amor perdeu a cor Diante dessa dor incolor?

De que adianta o poema, ao projetar-se na voz do silêncio, se depois de tudo isso, segue inominado entre a luz e a sombra que vai à bancarrota alvejado pelas retinas que o consome?

Imutável

Poemas não são úteis por motivos vários, não têm serventia. Só servem para as palavras

que são anônimas e estão no mundo sendo sempre tudo. Poemas não precisam existir para serem repetidos soletrando segredos quando se cava a fala que o Sol incinera como se nada recolhesse do eco ciumento que incha embaixo da língua enquanto o silêncio o atormenta. Poemas são fósseis cravados na existência. Tem forma humana cinzelada por fora. São como as flores, se não fossem os espinhos, que nos levam às dores como reflexo do medo de algum fantasma a caminho.

À beira do silêncio

Poesia, destranca a minha voz, que sem ela, o silêncio não tem vez. Deixados a sós, nenhum de nós sabe o que fazer com a dialética dizendo tudo a menos. As palavras são pedras, a roçar o chão da pressa que nunca se exaure e me ultrapassa como se fosse uma tartaruga indo de bengala para o banquete dos signos. Esse é o preço que se paga. Não há como segui-la calando no peito o canto. Porque viver não é repetir o que fazemos sempre. A liberdade deriva disso, toda a existência sofre a insistência de ser útil, se possível. Toda dor é monocárdica, cingida de carência às vezes dói, outras vezes mata, tal como as palavras

que revolvem as entranhas e as impelem para fora, sem nada conter, sem nada a contar.

Indomável

As palavras estão vazias, tudo em torno se desmancha sem sombras. No céu da boca, a língua míngua e a rebeldia da cárie desarruma o sorriso. Impressa na alma, a imagem da saudade modelada está, – não como resumo, mas como atração.

Desde então: Dissolve-se no olhar que a devorou.

CONSIDERAÇÃO DE ANIVERSÁRIO

FRANCISCO TRIBUZI

Hoje como a sessenta anos

Renasço das cinzas da solidão

Abraço os meus desenganos

E os danos da desilusão

Quanta saudade guardada

Quanta lembrança esquecida

Nos caminhos da jornada

Atribulada de minha vida

Quanta história aprendida

Quanto lição ensinada

Quanta palavra contida

Nos atalhos da estrada

Quantas noites indormidas

Quantas manhãs decoradas

Quantas horas perdidas

Nos horizontes das madrugadas

Quantos amores ardentes

Quantos adeuses e dores

Abortaram as sementes

Antes que virassem flores

Quizera, tanto, quizera

Ter nascido hoje, de novo

E que fosse primavera

No jardim do meu povo

Só pra ver meus pais

Ninando o meu sono

Que agora, jaz

No abismo do abandono

Minhas irmãs que partiram

Partiram também uns amigos

Por isso – eles não viram

Nem a paz, nem os perigos

Que corri na contra-mão

Do tempo que nos envelhece

Dividindo o multiplicado pão

No amor e na prece

Por eles não comemoro

Mais esta primavera

E me quedo e choro

Não foi como (eu) quizera

Portanto meio constrangido

Pelos perdidos brinquedos

Mas valeu ter vivido

Divido entre amores e medos

Nem tudo enfim foi só ferida

Amo essa gente que me tem aturado

-Obrigado Deus pelo dom da vida

-Obrigado vida por Deus ter me olhado!

O CAPITÓLIO TUPINIQUIM JOÃOZINHO RIBEIRO

A quem interessar possa / A história embora seja / Coisa escrita no presente / Sempre vasculha o passado / E traça o futuro da gente.

Quando afirmo que o futuro é pra ontem, é porque pelo passado recente nem teríamos direito ao amanhã. O tempo que se nos apresenta é de reconstrução e construção das relações humanas. A mudança é um processo permanente. A única coisa perene em todo o sempre do Universo em desalinho. Implacável e contínua, a marcha dos acontecimentos convoca os sujeitos e os objetos da história para os atos, cujas digitais ficarão para os anais dos feitos das suas (des)humanidades. Uns cometerão canções e versos; outros, crimes e genocídios, que serão lembrados pelas vindouras gerações. A História continuará sendo o tribunaldomundo.Dela,nãoescaparãoosratos,aindaqueabandonemasembarcaçõeseretornemaosesgotos, ou que intentem dissimulados discursos, com auras de um intelectualismo reacionário e defensor do silêncio dos culpados.

Uma linha no horizonte / Um ponto no firmamento / A humanidade do Planeta / Despenca a todo momento.

Devemos ser, cada vez mais, criteriosos e seletivos para escolher os confrontos e conflitos pelos quais valha a pena lutar. A nossa passagem por esta estação terrena é breve e única. Precisamos valorizar as coisas aparentemente pequenas e insignificantes, que valem e justificam o milagre da existência. A paz e o reencantamento do mundo retornam como bandeiras necessárias para serem içadas nos pavilhões das nossas esperanças. Sem a pieguice contemplativa das omissões, nem o açodamento das ações destemperadas, inoculadas nos discursos de ódio e na pregação da violência, como meios e fins de resolução da peleja da sobrevivência.

Quem sabe, o recado de Modigliani ainda esteja bastante vivo e adequado para o momento: “O dever de todo artista é salvar o sonho!” Quem se habilita e se credencia para esta tarefa coletiva e urgente? Qual parte caberá aos ditos intelectuais e acadêmicos nesta contenda de enfrentamento da barbárie e do obscurantismo? Tormenta, degredo, tragédia / Silêncio que se alimenta / Do roteiro da comédia / Desumana e tão sangrenta.

Trago comigo algumas respostas, sem nem mesmo conseguir formular as perguntas correlatas. Talvez estas nem existam, porém é importante não negar a possibilidade de suas existências, assim como se dizia das bruxas, em tempos de cumplicidades e pensamentos medievalescos, para justificar a inquisição e a queima dos corpos das mulheres, condenadas sem o mínimo direito de presunção de suas inocências.

Labaredas da vida / Acendendo as razões / E o Planeta girando / Em muitas revoluções.

Quem sabe precisemos retornar ao dilema de Galileu, diante do Tribunal do Santo Ofício, com todas as controvérsias das narrativas, e afirmar com todas as letras: “E pur si mueve!”

Navegar é preciso, Pessoa! Mais do que antes, por mares nunca e sempre navegados! Ou não! Valendo o risco que toda descoberta oferece! Os rios nos cios, as águas vão rolar, apesar daqueles contrários aos seus movimentos! A Terra gira, o mundo gira, o planeta respira, a natureza conspira! A poesia inspira!

A barca da existência / Navega sua leveza / Flertando com a natureza / Nas águas da paciência / Mergulho na finitude / Desejo e delicadeza / Deságuam na correnteza / Da fonte da juventude.

Hora da arte mostrar que existe porque já não basta a vida; e que esta, sem dignidade e respeito, não merece assim ser denominada. Vida e sonhos não são excludentes. Não precisamos importar caricaturas deformadas de atos que glorificam a barbárie e a incivilidade, com seus negacionismos baratos e dantescos. Prefiro finalizar o presente com uma preciosa exaltação da existência, do escritor angolano que nos visita, José Eduardo Agualusa: “A vida não é menos incoerente do que os sonhos; é apenas mais insistente.”

RELATÓRIO SERTANEJO

FERNANDO BRAGA

O jornalista Nonato Cruz, nas orelhas de “Relatório Sertanejo” de seu pai, o poeta Olimpio Cruz, diz textualmente: " [...] Meu pai, nos seus últimos dias de vida, no leito de um hospital em Brasília, pediu-me: “Nonato, se eu não sair desta, não voltar para casa, não deixe de publicar “Cinzas do tempo”. [*] Era o seu último livro, só de sonetos selecionados. E arrematou: ”Peça ao poeta Fernando Braga para escrever a orelha e ao poeta Monsenhor Hélio Maranhão, para escrever a apresentação”. Sei apenas que o pedido do poeta foi direcionado para este “Relatório Sertanejo – Barra do Corda no Cordel de Olímpio Cruz”. Monsenhor Hélio, como era de se esperar, escreveu uma belíssima apresentação, e quanto à parte que me coube, como muita honra, cá está: [**]

Cordel, a liberdade verdadeira... [*]

Cordel deriva de coração e, talvez por isso, é a mais legítima tendência literária brasileira.

Assemelha-se essa nossa manifestação cultural com a antiga tradição do verso cantado originário da Provença, onde o trovador com seu instrumento, uma espécie de bandolim, com quatro cordas, encantavam à castelã nos requintes dos salões em presença de convivas ou nas sacadas de varandas e balcões onde a bem-amada se punha a escutá-lo.

Aqui no Brasil, no nordeste, em particular, o cantador empunha sua viola no acorde de uma nota só tira seus repentes a parir de um mote ou de um desafio. Geralmente são versos sextilhados, como rimas entrelaçadas, a 1ª com a 3ª e a 5ª; e a 2ª com a 4ª e a 6ª, geralmente tendo o fecho de cada estrofe imagens fortes m referência ao tema glosado.

O poeta no cordel dispõe de uma liberdade verdadeira. Há nessa modalidade literária uma licença métrica e, esta é feita de ouvido, como se diz, de acordo com o ritmo já impregnado no cérebro do cantador, caindo as rimas nas palavras quase sempre tônicas, percebendo-se, às vezes, nas rimas, um toque de quase perfeição, notando-se ainda em toda incursão do verso o uso do “enjambment”, que é um recurso poético que o artista se vale em completar No verso seguinte o que faltou no anterior. Isso ocorre instintivamente, sem que, para tanto, valha-se se construtor [o poeta] de algum conhecimento literário ou teoria a respeito.

Para falar em cordel, tive a alegria de ser amigo do poeta Rogaciano Leite, pernambucano de São José do Egito, um dos maiores repentista que conheci, de encher o Teatro Artur Azevedo, em São Luis, onde passava tempos a fio a dizer versos com mote solicitado à platéia. E, Rogaciano, assim, será aplaudido de pé por uma platéia exigente e de bom gosto, como se sabe ter sido a de São Luis naqueles tempos memoráveis. Rogaciano Leite tinha sido aluno do cego Aderaldo, mestre consagrado e respeitadíssimo nas plagas cordelistas destes brasis afora. Vem daí minha admiração pela poesia de cordel, pelo cantador a tirar na viola aquelas modas que reputo como preciosas dentro do nosso contexto literário, o que não faz a poesia grande para caber dentro de poucas estrofes, mas justamente o contrário, as estrofes pequenas para caberem dentro de tanta poesia de tanto alento.

Pois bem, fruto dessa estirpe de arista, coloco o poeta, etnólogo, sertanista e também repentista Olímpio Cruz que, sendo um dos sonetistas tão perfeitos quanto Rogaciano, acostumado a tecer as sedas dos alexandrinos decassilábicos, verseja também no cordel, com a mesma desenvoltura dos nossos irmãos das praças de Caruaru, ou de Piancó, terra ao nosso querido José Chagas, com ou sem viola, mas com a essência e com o sentimento mais profundo que expressam a emoção do nosso homem simples, do nosso caboclo, da caatinga ou do cerrado, do nosso sertanejo, enfim, desse homem que trás consigo na alma o timbre maior de nossa raça.

Neste livro ”Relatório Sertanejo”- Barra do Corda no Cordel de Olímpio Cruz, que agora é publicado postumamente pelas mãos engenhosas do jornalista Nonato Cruz, ilho do poeta, conta a história de Barra do Cora, situando famílias e homens numa narrativa inteligentíssima e caricatural, dentro do contexto social, político e econômico da cidade, não só ao tempo da elaboração do trabalho, mas no exercício pretérito, o que nos faz meditar na memórias privilegiada que o poeta atinha, fruto também de sua condição de anjo.

OlímpioCruzcomasmesmasmãosfidalgasdeum aristocratasonetistadesalãoesarau,doportodeMaranhão Sobrinho, de Ignácio Xavier de Carvalho e de Assis Garrido, tem o poder ou mesmos a magia de se transformar, não mais que de repente num cantador-violeiro de feira ou mambembe. Por isso, no que me cabe observar, a marca do gênio se projeta exatamente aí, nessa gama diversificada de aptidões a gravitar genuinamente em torno da poesia, que nada mais é do que o espírito da palavra trabalhada, usada pelo homem por direção de Deus. E Olimpio Cruz, na sua simplicidade santificada, tinha esse registro divino.

Aproveitemos para ouvir o poeta, e assuntar o que ele diz nestes versos:

“Quando era Treze de Maio

Que tinha a dança da Punga

Antõe Bode e João Calunga

Incomandava as batáia;

Vinha os cabras do Naru

A nêga Maria Pacu

Que de vento enchia a saia...

E a nêga veia Teixeira, Muito idosa, cum cem ano Vestida de sete pano, Sentada na pagodeira

Tinha os óio cheio d’água, Cacimba que num secou; Num sei se sodade ou mágoa Dos tempo que já passou!...”

Assim é o canto do poeta Olímpio Cruz, a marcar a nossa alma de coisas belas e de saudades que não morrem nunca, as quais se mais parecem com os encantos mágicos e naturais de nossa Barra do Corda, que por si só, na grandeza da criação, já se nos basta para ser poeta, de qualquer rima ou de qualquer mote. -----------

[*] Fernando Braga, In apresentação de “Relatório Sertanejo” [Barra do Corda no Cordel de Olímpio Cruz], Editora Visual, Brasília, 2009, para as edições da Academia Barra-Cordense de Letras.

[*]Creio que“Cinzas dotempo”,seriaumanovaediçãoqueNonatoCruzpensou em dizer,vezqueaprimeira, Olimpio Cruz a publicou em 1948.

[**] Tive a honra de prefaciar mais dois livros de Olímpio Cruz, “Clamor das selvas”, 1978 e “Caui”, 1882.

JOSÉ CLÁUDIO PAVÃO SANTANA

Há fatos que nem o autoritarismo que inunda a mídia de plantão pelos auxiliares do atual presidente do Brasil consegue apagar da memória. Menos a deles, seletiva pelas circunstâncias.

A cada investida na mídia uma espécie de ameaça, como se detivessem a legitimidade e autoridade suficientes para transformar fatos, mudar acontecimentos, subtrair circunstâncias da história. Não! Está tudo aí para quem desejar ver.

Li pelo twitter a comemoração de um senador da república, de um entusiasmo saltitante, que celebrava o retorno dos carros pipa ao nordeste. Viva! Eles voltaram!

Durante minha vida acadêmica os discursos sobre isso foram de que os carros pipa eram o símbolo dos coronéis que mantinham o sertanejo em rédea curta. Com isso, a dependência seria eterna.

Constato, agora, que em verdade aquilo que fora motivo de entusiasmo e sedução para nós, incautos estudantes, não passava de um populismo barato e renitente. A diferença, hoje, é que os coronéis estão muito mais jovens, a tripudiar, sem a menor cerimônia, do povo dependente da água que a todos é necessária. Esse tipo de gente não quer outra coisa, senão um bom palanque de onde possa apontar o dedo. Na primeira rebordosa nasce o mi mi mi a que estamos acostumados.

Nos quatro últimos anos eu li, quase diariamente, acusações contra comportamentos e posturas (algumas) desmentidas com menos de vinte e quatro horas que estão, às claras, sendo cometidos em menos de 15 dias de governo. E o que é pior: essa gente pensa que nós não nos lembramos.

Nessa primeira viagem ao exterior foi anunciada a primeira obra do atual governo. Um financiamento de um empreendimento na Argentina, de questionável sustentabilidade ambiental. Sim, lá onde o presidente (deles) diz que não há inflação e (o de cá) diz que eles estão muito bem das pernas.

Mas o correto não seria priorizar as obras aqui? Afinal, o presidente de um país não deve por a sua gente antes de qualquer outro povo?

A história está aí escrita. Através do BNDES as operações policiais identificaram, prenderam e a justiça processou e condenou um universo de pessoas. Valores vultosos foram repatriados. Em todos os mecanismos de fiscalização que agiram tecnicamente ficou claro que houve prejuízo ao Brasil.

Pois não é que uma montanha de gente fala em usar o mesmo mecanismo como tentando transformar a prática em investimento? Claro que não é. Claro que há precedente de pleno e amplo conhecimento, claro que há sinalizações vivas de que nós afundaremos com o Brasil nessa ladeira abaixo que transformou em quinze dias em pó tudo o quanto conseguiu ser recuperado.

Não há, até aqui, nenhum projeto que se possa dizer que envolva compromisso com o Brasil. Nenhum. Porque não há outra coisa, pelo que se vê; só um projeto de domínio, de poder, sem qualquer sinalização de dignidade das pessoas, pois o que se tem conhecimento é de corte de direitos alcançados, tudo em nome de desfazer o que foi feito pelo governo anterior.

A insensatez que insiste em manter estreitas ligações com ditaduras põe em risco a própria credibilidade do nosso país, porque no meio desse tipo de gente já há autoridades sendo monitoradas, razão dos passos calculados de alguns para deslocamento.

Sobejam o populismo e o autoritarismo do atual governo, pretendendo transmitir ao povo a ideia de que liberdade é o que essas três ou quatro dúzias de pessoas que constituem o staff pensam. Quem pensar diferente é antidemocrático.

Lamento decepciona-los, mas liberdade é essência da natureza humana, por isso é que os estados possuem um documento que não nasce para dizer o que o homem pode fazer, mas até onde o governo pode agir, para lembrar um destacado republicano americano.

ESQUECIMENTO E APRENDIZADO

É triste, mas os coronéis de hoje não aprenderam senão o lado mau dos coronéis do passado. O pior é que essa mesma gente que volta à cena não aprendeu nada com o passado, nem com o que o século passado ofereceu com ideologias nefastas, decadentes e desumanas, nem com o que eles mesmo fizeram contra o Brasil. Muitos serão cobrados pela história um dia, porque quem não aprendeu com o passado vai repetir no futuro no pretérito.

FERNANDO FERREIRA DE LOANDA, UM POETA ESQUECIDO

Foi Bandeira Tribuzi na redação do ‘Jornal do Dia’, em São Luís, quem primeiro me falou do poeta Fernando Ferreira de Loanda, o qual pensei que, em se tratando de um poeta português, de sua geração, e pela bem querença com que o tratava, tivera sido seu contemporâneo em Coimbra. Depois, Nauro Machado clareou dizendo-me que Fernando Ferreira de Loanda era um poeta português de Angola, mas já naturalizado brasileiro e um dos mais legítimos representantes da geração de 45.

Fernando Ferreira de Loanda [Luanda-Angola, 1924 – Rio de Janeiro, 2002], surgiu no panorama poético, no inicio dos anos 50, emergindo com uma tradição propensa ao assombro e à rebeldia, fenômenos naturais à condição humana, para juntar-se a outros jovens como Lêdo Ivo, Astrid Cabral, Thiago de Mello... É o escritor Wilson Martins quem diz: “Prefaciando em 1991 o que parece ter sido o seu último volume de versos ["Kuala Lumpur"], Lêdo Ivo, que foi, creio eu, o mais alto poeta da geração, assinalava que, em sua atividade editorial, Fernando Ferreira de Loanda lançou praticamente todos os poetas então emergentes: "Foi ele o primeiro editor ‘comercial’ de João Cabral, ao apresentar, nos ‘Poemas reunidos’ (1954), uma obra então rara. E a esse nome consular, acrescentemos os de Afonso Félix de Sousa, Darcy Damasceno, Nilo Aparecido Pinto, Péricles Eugênio da Silva Ramos, Marly de Oliveira, Octavio Mora, Marcos Konder Reis, Domingos Carvalho da Silva, Walmir Ayala, Gilberto Mendonça Teles, Stella Leonardos e tantos outros que constituem a chamada ‘Geração de 45’[...]."

Fundou, com Lêdo Ivo, Darcy Damasceno, Fred Pinheiro e Bernado Gersen, a Revista ‘Orfeu’, dirigindo-a no Rio de Janeiro de 1947 a 1953, à maneira da portuguesa, de Fernando Pessoa, Mário-Sá Carneiro e José Almada Negreiros...

FERNANDO BRAGA

O jornalista José Nêumanne Pinto organizou e publicou pela ‘Geração Editorial’, em 2001, a antologia d’ Os Cem Melhores Poetas Brasileiros do Século’ um dos raros instrumentais que se tem sobre o poeta, já que pouca coisa sobre a vida dele está disponível na internet.

“Ele foi uma personalidade relevante no cenário literário tanto como escritor, quanto como editor, compilando as produções de poemas de seus contemporâneos da geração de 45”. Vejam a poema: ‘Poema para os estudiosos e biógrafos’:

“Não me expliquem: prisma, de mil faces,/ sou insondável, abissal. /A poesia não é um espelho; é um estado momentâneo./ Se me retrato, logo me desdigo,/transfiguro-me, horizontalizando minhas emoções e incertezas./Amo o imprevisto,/dói-me o que adivinho;/não me ofereçam /banquetes mastigados./ A clareza não a tenho à superfície; /é necessário uma faca para fazê-la flutuar; /vão ao cerne; sou quarto crescente na lua cheia./Não me expliquem pelas palavras, pelo bigode nem pelo cachimbo”.

Seu livro ‘Signo da Serpente’ foi premiado pela Academia Brasileira de Letras, “a chegar frio e sem mais nenhuma esperança”, como diz alguns dos seus amigos. Fernando de Loanda publicou ‘Antologia da Nova Poesia Brasileira’; ‘Do amor e do mar’; ‘Equinócio’. ‘Kuala Lampur’; ‘Oda a Bartolomé Dias y otros poemas [em espanhol], além de produções em revistas, jornais e espalhadas em palestras e conferências.

O escritor Carlos Pacheco, amigo do poeta, escreve em ‘Um poeta sepultado vivo’, no qual apuramos este seu grito natural de revolta: “[...] Realmente o mundo das letras, de língua portuguesa, acaba de perder um dos seus maiores vultos, só que de uma forma gritantemente absurda: enquanto em todos os quadrantes de língua espanhola – do México à Argentina, incluindo a Espanha – se exalta a poesia de Fernando Ferreira de Loanda, pujante de beleza estética e densidade discursiva, no Brasil, longe disso, essa poesia tem sido emparedada pelas capelinhas, quando não menos votada ao ostracismo. Em Portugal, por incrível que pareça, são raros os que a conhecem.”

Nada mais se sabe... Foram esses os motivos, ou outras vertentes existem? O mundo das artes tem desses mistérios...

Ouçamo-lo em ‘Viseu Revisited’: “Não falo das ruas da minha infância,/ nem as nomeio, para que ignorem a pequenez do meu mundo./Tinham, porém, fauna e flora,

as árvores davam sombra e frutos,/ os homens bom-dia e os pássaros cantavam”.

Por fim, neste ‘Homem de incoercível esperança’, oferecido a Gabino-Alejandro Carriedo, enfeixado em ‘Poemas da Rua Quito’, Fernando Ferreira de Loanda, canta:

“Homem de incoercível esperança/ transita, sem sonhos ou amanhã,/cúmplice, intemporal, urde a teia,/ e ante o silabar e o afresco/trânsfuga, transmuta, transige./Repetir sempre, tudo já foi dito;/importa é como dizê-lo, insinuá-lo./Não te acovardes ante a palavra implume./Se desbotada ou erodida, dá-lhe tua seiva, tua vivência – investe:/morre quem ousa, quem ousa ama”.

Ou ainda: “Acabaram com os bondes/ e a paisagem dói;/ tentam dinamitar a poesia/ os poetas da paróquia,/ardilosos, confundem/o incauto forasteiro,/vendem gato por lebre./Sê surdo: o exílio/em tua casa, entre os livros,/é a solução; na balança,/ a amabilidade de um/ ou o impropério de outro/só tem peso para a tua vaidade./Que falem em vão ao vento”.

E Carlos Pacheco, finaliza triste: “Tudo terminou, para ele e em grande parte para todos, na melancolia cinzenta dos triunfos extintos": ”Os poetas da minha geração, a malograda,/ e os posteriores, os antolhados frívolos da glória,/ esqueceram-se de colocar a chave sob o tapete”, cantou por derradeiro o poeta Fernando Ferreira de Loanda, em ‘Ode para Walt Whitman ou Efrain Huerta’.

*Fontes: Escamandro; Material de Lectura –UNAM; Blog do Castrop, ‘Um poeta sepultado vivo’ e Blog de Antônio Cícero.

Ilustração: foto do poeta Fernando Ferreira de Loanda

OSMAR GOMES DOS SANTOS

Infecções e doenças de toda ordem que se espalham em consequência da desnutrição. O ápice da insegurança alimentar - a fome - chegou forte nas aldeias indígenas. A ponta do iceberg, que acendeu o alerta, foi visto na Reserva Yanomami, no Estado de Roraima.

Fome! Logo para eles, os legítimos donos desta terra. Estes, que primeiro puseram os pés neste solo, a canoa nos rios e lançaram flechas para garantir o alimento, já não tem onde plantar, pescar, caçar…

Krikatis, Canelas, Timbiras, Xavantes, Pataxós, Caiapós, Tupinambás, Ticunas, Guarani, Caingangue, Macuxi, Guajajara, Terena, Potiguara. Apenas para citar algumas tribos, constituem etnias, que choram a dor dos irmãos Yanomamis.

O problema ganhou contornos robustos diante do grave estado de emergência em que foram encontrados os Yanomamis, mas essa violência não é recente. Data mais de 500 anos, quando o Brasil teve suas “riquezas descobertas” pelos europeus.

Escravidão, engodo, assassinatos, disseminação de doenças, imposição de uma religião e um Deus; tomada a força dos corpos das mulheres e das riquezas que nossos indígenas cultivavam.

Deturpaçãodeumaculturacoletiva,emdetrimentodeumadinâmicasocialmarcadapeloegoísmoeoacúmulo de riquezas. Não bastasse a destruição que o homem, dito civilizado, causou aos povos originários, tirou-lhes, ainda, o seu meio de sustento: a terra.

Depois delevar-lhes as florestase suas riquezas, protagonizaram a criaçãodas reservas indígenas como último reduto territorial desses povos. Entretanto, parece que ainda não é o suficiente. O “homem branco” quer mais, mais e mais.

Reserva indígena virou sinônimo de terra sem proteção onde a lei é a do mais forte, das máquinas, da pólvora. Os limites legais foram transpostos faz tempo, tudo em nome do ouro, da fauna, da flora, das rotas para todo tipo de tráfico. Soma-se outras tantas “reservas” cujos processos de demarcação se arrastam por décadas.

Culturas e tradições milenares hoje se veem acuadas, em redutos cada vez menores, sofrendo os impactos do desmatamento desenfreado, do assoreamento no leito dos rios, do mercúrio que contamina a água e os peixes. Toda uma cadeia alimentar ameaçada pela ganância.

O garimpo foi a atividade que mais cresceu nos últimos anos. Tanto os legais, cuja licença fora concedida por órgãos públicos, como os ilegais, que atuam na “calada da noite”, ou mesmo durante o dia, na imensidão de silêncio da selva, só quebrado ao som da motosserra. Conflitos se amontoam, pessoas desaparecem, crimes ficam sem esclarecimentos. É desafiante sobreviver em uma terra em que o aparelho estatal não se faz presente, se não por uma linha imaginária sobre um simplório mapa.

Tal como nas grandes cidades, nos bolsões e cinturões de pobreza, nas periferias, criminosos marcam posições na ausência do Estado e de seu aparato, que deveria garantir a proteção, a segurança, a saúde, a comida, a paz, a vida.

Os órgãos de fiscalização da Amazônia legal estão com estrutura desmantelada e equipes reduzidas a cada nova baixa, seja em razão da aposentadoria, seja pela força da bala que faz tombar os guerreiros defensores da mata: Chico Mendes, Dorothy Stang, Dom Philips e Bruno Pereira.

Diante da crise instalada há décadas, podemos dizer séculos, os povos indígenas parecem buscar nos céus o socorro de que precisam. Yebá Bëló, Wanadi, Tupã e mesmo o Deus cristão, para aqueles já convertidos.

Preservar os índios é preservar nossa identidade nacional, nosso passado, nossa raiz. Ainda resta tempo e esperança para devolvermos uma vida com o mínimo de dignidade aos primeiros povos deste chão.

A QUEM PERTENCE ESTA TERRA?

UM TOUR PELA NOSSA CIDADE, E AS CHAVES DE UM TEMPO

ROBERTO FRANKLIN

Hoje pela manhã cumprindo a presteza e a hospitalidade maranhense, fiz um tour pela ilha de São Luis, levando minha sobrinha, o filho e sua namorada, uma polonesa muito simpática e agradável, além de ser uma artista com várias exposições de fotografia no seu país. A toda parada, ela no seu idioma ou com um sotaque ainda bem carregado, elogiava a beleza da cidade, assim como nossas praças monumentos etc. Também se queixava dos prédios abandonados e em ruinas, afirmando que o abandono dos prédios seria como o abandono de nossa memória.

Além de nossas ruas, prédios, e praças, fomos ao bairro do Portinho, até a sorveteria artesanal típica de São Luís, do meu amigo Iguaíba, onde tomamos nosso inigualável sorvete de coco na casquinha, quem não se lembra dos nossos sorveteiros que, principalmente aos domingos, passavam nas nossas rua pregoando “Sorveeeeeete coco, Veeeete Coco”, eu lembro e tenho saudades. Além de tomarmos o delicioso sorvete, logicamente minha sobrinha comprou um isopor para levar para minha irmã, que mora em Belém. Ao final do nosso passeio, atendi a uma solicitação da sobrinha. Ela pedira que nós fêssemos até a casa dos meus pais, situado na rua 13 de maio, no centro. Ela e seus pais quando vinham para São Luis sempre ficavam lá. A casa guarda muitas recordações, e lembro que justamente aos domingos, no final da tarde, era a hora de minha irmã e meu cunhado, juntamente com as duas filhas, voltarem para suas casas. Lembro que quando seu carro deixava a nossa casa e virava a rua, meus olhos se enchiam de lágrimas igualmente ao da minha mãe. Pois bem, o pedido foi aceito e lá fomos em direção a nossa saudosa casa, lugar de inspiração para muitas crônicas. Recordações, fatos foram lembrados. Ao pararmos na calçada, logo avistamos uma placa em sua sacada. A casa foi agora ocupada por uma ótica, descaracterizando todos os nossos sentimentos e lembranças. Além dos azulejos que ainda estavam intactos, observei suas duas janelas corrediças brancas que davam logo para os dois quartos da frente. Ali mesmo na calçada iniciamos os momentos de várias lembranças.

Atravessei a rua para ter uma visão melhor e global da casa, porém um detalhe me chamou a atenção, o portão de ferro ainda estava lá, e juntamente com a fechadura, já desgastada pelo tempo. Eu a olhava fixamente, e imediatamente vieram os dias e as noite que a usei, quantas voltas dei com a chave me liberando para a rua e para o mundo, quantas voltas igualmente com a chave eu dera entrando para o meu mundo caseiro, indo me resguardar e descansar dos momentos vividos em vários lugares de nossa ilha.

Se aquela fechadura pudesse falar, com certeza iria se lembrar muito da minha mãe e do meu pai, iria me denunciar as horas que enganei meus pais entrando em casa na adolescência após a hora marcada, ia me denunciar para onde eu ia nas noites e com quem eu saía. Se aquela fechadura pudesse falar, com certeza perguntaria a respeito dos nossos vizinhos e amigos que todos os dias passavam na sua frente. Ela, testemunha de vários fatos de nossa vida, ainda estava lá, solitária presenciando uma nova era de nossa cidade, sentindo a falta com certeza das mãos que um dia a segurava e introduziram a chave, a fim de abrir e fechar mais um dia, mais uma época e, acima de tudo, fechar e deixar lá em nossa casa as lembranças de um tempo que vivi, e que me traz recordações fantásticas. Minha amada fechadura, se algum dia eu não puder mais passar em sua frente, agradeço pelas vezes que me auxiliaste e os segredos que guardaste.

A SÍNDROME DA MOURA-TORTA

CERES COSTA FERNANDES

Se você nunca ouviu falar de Moura-Torta, sinto muito, mas nunca foi criança. Nem na infância, nem depois – aliás, tem idade para ser criança? E, em verdade, vos digo bem-aventurados aqueles que cultivam sua parte criança, pois eles jamais sofrerão de ressecamento da alma.

Após ter ilustrado os leitores, volto à moura–torta. É um conto de fadas, portador de sabedoria popular, como soem serem as histórias nascidas da tradição oral e repetidas ad infinitum durante séculos, até serem registradas no papel. Recebemos, via Portugal, este saboroso contodo fabulário ibérico, onde a figura da mouracomo vilã é sempre recorrente, resultanteda relação de amor e ódio com a mulher morena, ardente, bela e pagã (ou cristã-nova) vinda da Arábia. Afinal, foram sete séculos de convivência e luta contra a invasão árabe na Península.

Resumo parte da história: uma moura velha, feia, torta, enchia seu vaso de barro em um lago. Ao inclinar-se sobre a água, vê refletida a figura de uma jovem linda e loura. Pensando tratar-se de sua própria imagem, levanta-se tomada de indignação contra o trabalho servil que é obrigada a fazer. E, zás, quebra o vaso, lançando-o ao chão, dizendo: “Uma mulher tão linda como eu não pode estar a carregar jarros de barro!” Nesse momento, ouve risadas e percebe uma moça sentada em um galho de árvore, por detrás dela. Logo compreende o engodo em que caiu: a imagem refletida no lago era da jovem. Esfumou-se seu instante de glória: pensou ser bonita, mas continua feia, e, agora, mais pobre e sem seu instrumento de trabalho. Cheia de ódio, parte para vingar-se da que lhe roubou esse instante. Esta parte basta para o desenvolvimento da nossa conversa. Quem quiser saber o resto da história, procure lê-la. Vai se deliciar com isso.

Inspirada neste conto, costumo usar, no âmbito familiar, um nome para esse tipo de comportamento: “síndrome da mouratorta”. As vítimas dessa síndrome ficam entusiasmadas com seus 15 minutos de fama – que nem sempre lhe são devidos, mudam radicalmente de comportamento e, crendo-se um ser diferente, desprezam os seus antecedentes. O triste é que, no final da história, muitos retornam à sua situação anterior em condições ainda mais precárias.

Estou fazendo toda essa peroração por causa de uma notícia amplamente divulgada pela TV, há algum tempo: a catadora de lixo, Rosemary, que foi cinderela por um dia. A moça bonita foi descoberta pela equipe da emissora, à cata de assunto para aumentar o ibope, que tomou a si a tarefa de fada madrinha, transformando-a de gata borralheira em cinderela. Rosemary tomou um banho de loja, foi penteada, maquiada, frequentou restaurantes da moda, aprendeu etiqueta e tudo mais. A transformação foi radical. De moura-torta a princesa. A reportagem só não mostra o que aconteceu no “day after”, quando a carruagem virou abóbora e Rosemary teve que retornar à sua lida diária.

Sempre questioneiessas transformações-relâmpago.Servemparaquê?Para melhorar avida das pessoas ouapenas para elevar o índice de audiência? Há pouco tiraram umas meninas de rua e prepararam-nas para um desfile de modas. Sucesso total. A história de cinderela sempre mexeu com o emocional das pessoas. Depois de feito o auê, mídia e público, esqueceram o fato: a ninguém interessa o seguimento da história, basta o “foram felizes para sempre”.

Mas, dia desses, um repórter xereta resolveu meter sua colher torta e foi atrás das “modelos”. Fez a reportagem que ninguém gostaria de ler e descobriu as meninas de volta às ruas e agora também à prostituição e às drogas. O dia de princesa torna insuportável a volta ao velho jarro de barro.

Pixote, o menino pobre que ficou célebre da noite para o dia com o filme homônimo, baseado na obra de José Louzeiro, é um forte exemplo. De celebrado e mimado pela mídia, passou a desconhecido. Cresceu, perdeu a graça, outros o substituíram. A máquina de moer gente da fama não para. Não suportando o anonimato e a perda da vida regalada, derivou para a marginalidade para manter a boa vida. Perseguido pela polícia, acabou sendo morto, mal acabada a adolescência.

Oferecer aos despossuídos da sorte uma momentânea imagem de beleza para, logo em seguida, deixá-los com um jarro de barro quebrado nas mãos é perversidade e não abertura de uma possibilidade. A sugestão de mudança sem o devido suporte para garantir a sua continuidade é brincadeira criminosa com o destino das pessoas e deve ser punida. Deve-se investir na transformação oferecendo condições para o seu desenvolvimento e permanência. E, assim, tornar verdadeiro o verso do poeta inglês Keats: “Um instante de beleza é uma alegria para sempre” ( tradução livre).

A DIVA E A PROFESSORA VÃO À FLIP

CERES COSTA FERNANDES

Há dez anos...

Quase não acreditei: na programação para as mesas da FLIP – Festa Literária Internacional de Paraty –, lá estavam os nomes de Maria Bethânia e Cleonice Berardinelli, juntas na mesma mesa. O duo prestaria uma homenagem a Fernando Pessoa, recitando e comentando seus versos Mesmo conhecendo a competência e o carisma da dona Cléo – fui sua aluna e orientanda quando da minha pós-graduação na PUC- Rio –, admireime muito da ousadia de apresentar-se ao lado de uma cantora- atriz com o domínio de palco que a Bethânia tem.

A sedução da voz e o encanto da irmã de Caetano se multiplicam na apresentação ao vivo; ela chega a ficar bonita. Temi pela querida dona Cléo, quando alguém disse: Noventa e seis anos? Esta senhora vai gaguejar na leitura dos poemas. Após 23 anos sem vê-la, pensei se ela conservaria ainda a voz firme e forte.

Acho que todas as pessoas, ou somente as normais, como diria Nelson Rodrigues, têm, pelo menos, um professor ou professora que lhes marcou a vida, que os fez optar por um determinado caminho, sentir admiração por um escritor, ou melhor, forneceu-lhe um modelo de vida a ser seguido. O meu modelo, o que eu tento canhestramente seguir, é o da Professora Cleonice, a dona Cléo, como é carinhosamente chamada por todos.

Mulher admirável, professora por vocação, escritora, pesquisadora e conferencista. E tudo isso de modo superlativo: dá conferências na Europa, é professora emérita de várias universidades, publica livros que são sucesso de venda e nada disso é passado. Foi eleita há três anos para a Academia Brasileira de Letras. Está em dia com a literatura: lançou um livro novo na FLIP, “Cinco séculos de sonetos portugueses – de Camões a Fernando Pessoa”, que, somadosàs antologiasdeFernandoPessoa,Gil VicenteeCamões,fizeram-nadisputar com a jovem e bela franco-iraniana Lila Azam o título de campeã de vendas na Festa. Estou na plateia, a apresentação demora a começar. Dona Cléo, pontual, chegou à tenda há meia hora. Presenciei ao longe a sua chegada, cercada de câmeras, como estrela que é. Finalmente, ela entra no palco, amparada, e se dirige ao seu lugar. Meu coração se aquece ao rever os bem cuidados cabelos brancos, o colar de pérolas (faz parte dela), o casaco fino de lã branca, a figura leve e graciosa, batom nos lábios, jeito de menina. A aparente fragilidade que esconde a personalidade forte. Incrível. Nada mudou.

É ela que conduz a apresentação, a escolha dos poemas e o roteiro são seus. Bethânia entra e, após a apresentação, trocam amabilidades e beijinhos. A leitura que se segue dura uma hora, perpassa pelos heterônimos de Fernando Pessoa, e por poemas de Fernando Pessoa ele-mesmo. As duas levam o público – e eu junto – ao encanto e ao delírio. Dona Cléo, voz firme, jovem, mil inflexões, vive os poemas; Bethânia nada em águas claras e conhecidas da interpretação. Acho que Fernando Pessoa gostaria de ouvi-las.

Seguem-se as questões vindas do público e ambas respondem. E nas espirituosas respostas de dona Cléo, vamos saber que ela também tem um professor inesquecível, Thiers Martins Moreira, que a fez professora e apresentou a jovenzinha Cléo à literatura de Fernando Pessoa, tornando-a cativa para sempre desse poeta. Foi sua a primeira tese sobre Pessoa, no Brasil, em 1959.

Terminada a apresentação, pego meu livro, que comprei à tarde por precaução, e corro para o setor de autógrafos, que é todo aberto. Faz frio, e o ventinho à beira-mar incomoda. A tenda dos autores é longe dali. Temo que ela não venha e me frustre. É estranho para mim esse sentimento de tiete. Nunca andei atrás de autógrafo de ninguém, mas estou mais assanhada que as fãs de Michel Teló.

De repente, um burburinho, é ela quem chega! Vem andando lentamente no pedregulho, enfrentando o frio, mas vem! Pessoas comentam: “Que mulher!” Sinto orgulho.

Eu quero ser como dona Cléo, quando crescer, penso. A velha piada.

Uma dúvida amarga me assalta, ela me reconhecerá? Certamente que não. São 23 anos passados, e eu nunca mais a procurei. Timidez, insegurança, medo de incomodá-la, burrice, sei lá. Meu primeiro livro foi dedicado

a ela e ela é a minha heroína. Devaneio. E se ela disser: Oh, Ceres, que prazer revê-la. Não saberia o que dizer, onde meter pés e mãos.

Chega a minha vez, o meu nome está dentro do livro. Abre, olha e diz: A deusa das colheitas, pois não? Não me reconhece. Mudei mais que ela. Falo coisas tais como o nome do livro, a PUC, e ela vai relembrando devagar. Carinhosa (ou apenas gentil?) pede desculpas: São tantos os livros, os ex-alunos, e faz muitos anos... Saio de lá com sentimentos contraditórios, feliz, por ter falado com a minha musa; contrafeita por não ter mantido os laços com uma pessoa tão importante para mim. Não é essa a primeira vez que ajo assim, de modo contrário ao meu desejo. Ponto para Freud.

Dona Cléo, a poeta Bruna Beber, com “A Rua da padaria”. Milton Hatoun e sua palestra sobre Graciliano Ramos, o romancista e ensaísta José Luís Passos, ‘O Sonâmbulo amador” e mais uns poucos, valeram a FLIP, de resto um tanto chocha de literatura. Discutiu-se de tudo, arquitetura, música, cinema, pintura, jornalismo, manifestações políticas. Não que isso não seja bom, desde que se preserve o espaço e a qualidade das palestras e debates sobre literatura, o que não aconteceu. Outro ponto a lamentar é o gigantismo da festa sem a estrutura adequada, que torna difícil até a compra de uma garrafa de água. Digo que já esteve melhor.

Voltando a dona Cléo, antes que eu me esqueça, ela vai gravar um CD com Bethânia, recitando Pessoa. Esse projeto faz parte de seus planos para o futuro, que são vários, afinal ela só tem 96 anos.

P.S faleceu aos 106.

Morre a autora Cleonice Berardinelli, membro da ABL, aos 106 anos

Dona Cleo, como era conhecida, foi a sexta ocupante da cadeira nº 8 na

Academia Brasileira de Letras

ANTONIO GUIMARÃES DE OLIVEIRA

Em São Luís, dedicamos um dia para celebrar nossos poetas e poesias, ao dia 02 de fevereiro, em homenagem ao escritor e poeta ludovicense Bandeira Tribuzi, pseudônimo de José Tribuzi Pinheiro Gomes, que nasceu nessa data, 2 de fevereiro de 1927. Projeto instituído através do vereador Marcial Lima, e aprovado amplamente por todos os edis, que compõem aquela casa. Em nossas palestras, ou mesmo em parlatórios, salas de aulas, somos, muitas vezes, questionados: o que é ser poeta e criar poesias? Respondo-lhes: Embora a eternidade seja uma realidade, o fato é que é impossível compreendê-la, através de nossas mentes. Muitas vezes, tornando-se difícil, pois não somos donos de nossas vontades,poisdiantedas inúmerasdificuldades eimpossibilidades,nãoexistiráhonraouglória.Desistiremos? Ora, isso é uma obra do acaso...

Constantemente,andamos porruas revestidas porpedras eladrilhos, eseus casarões com ousem eiras ebeiras, somos “avivados” por sombras imortalizadas do passado: Antônio Gonçalves Dias e seu amor platônico por Ana Amélia, Maranhão Sobrinho, um boêmio inveterado e seus “Papéis Velhos”, Antônio Lôbo, um tísico suicida e sua “Carteira de um Neurastênico”, Raimundo Correia e seus “Primeiros Sonhos”, Bandeira Tribuzi esua“Louvação aSão Luís”,JoséChagas eseus telhados easua“MaréMemória”,FerreiraGullareo "Poema Sujo", Lago Burnett e sua "Estrela do Céu Perdido", Erasmo Dias, fanho e com uma rapidez cerebral inigualável, Nauro Machado e a sua “Antibiótica Nomenclatura do Inferno”, dentre outros.

Pergunta-se: na Atenas Brasileira, ainda existem poetas? Sim, afirmo: poetas e poesias ainda são marcantes, e com nomes, normas e estilos. Citarei nomes e constelações, que ainda orbitam entre nós, perdoe-nos as omissões não propositadamente, mas somente pela memória. Ei-los: José Maria Nascimento, Ewerton Neto, Laura Amélia, Ivan Sarney, Antonio Guimarães, Joselito Veiga, Aiab, Kleber Lago, Luísa Cantanhede, Paulo Melo e Sousa, Danilo, Sharlene Serra, Eloy Melonio, Chico Tribuzi, Salgado Maranhão, GIlmar, Joãozinho Ribeiro, Roger Dageerre, Florisvaldo Sousa, Ricardo Miranda Filho, Regis Furtado, Nicolau Fahd, Albert Mont Blanc, Wanda Cunha, Raimunda Frazão, Goreth Pereira, Roberto Franklin, Manoel Guimarães, Mhario Lincoln, Carvalho Junior, Bioque Mesito, Antonio Aílton, Daniel Blume, José Neres, Sônia Almeida, Anely Guimarães, Alex Brasil, Rossini Corrêa, Arthur Prazeres, Fernando Reis, João Batista do Lago, Edomir Oliveira, Wescley Brito, Marcos Boa Fé, Nerlir, Pedro Neto, Kalynna Dacol, Adonay Ramos, Barrozo Braga, Evandro Júnior, Neurivan Sousa, Wybson Carvalho, Ivone Silva Oliveira, Nonato Reis, José Carlos Sanches, Pádua, Ferreira da Silva, Moisés Abílio, José Raimundo Gonçalves, Félix Alberto, Celso Borges, Adriana Araújo, Paulo Rodrigues, Kissyan Castro, Rogério Du Maranhão, Augusto Pellegrini, Antônio Melo, Manuel da Cruz Evangelista, e outros.

Temos os grandes grupos, formados em redes sociais, reuniões noturnas, bares e mesas nos Bairros Praia GrandeeDesterro:OsIntegrantesdaNoite,eseus poemasmarcantes,OsVadiosdaPraiaGrande,eos poemas impregnados por sabor alcoólico e fumo maldito ou não; Os Herdeiros de Madame Maroca, e seus e poemas lascivos ou lúbricos; Os Declamadores do Bar do Léo, com suas verves; Os Poetas da Praça dos Poetas, e suas declamações; Os poetas do Laços poéticos, e seus poemas líricos; O grupo Flores da Noite, e os "Xirizais", do finado Oscar Frota; Grupo As Tertúlias, e seus poemas mórbidos, recheados de suas doenças crônicas e amores perdidos. Temos ainda os anônimos, escondidos por pseudônimos, timidez ou mesmo por falta de oportunidade em publicar suas lavras.

Resta-nos continuarmos criando o melhor ou não, não importando quantas vezes caímos, pois levantaremos e lutaremos, vez que nossas belezas estão em nossas verves e vidas. Às vezes, poderemos acordar ou não nos amanheceres, com raios ou trovões, e constatarmos o esplendor do Universo, em uma obra do Criador, e que nunca nos faltem esperanças nesse novo amanhecer... (

DIA MUNICIPAL
DA POESIA

JOSÉ NERES

Hoje, 02 de fevereiro, é o dia do aniversário de nascimento de um dos maiores poetas que o Maranhão já teve: Bandeira Tribuzi.

Como não temos o hábito de guardar a memória de nossos grandes valores culturais, a data deve passar esquecida, ou pelo menos pouco lembrada. Ontem, o professor José Carlos Sousa e Silva publicou em O Estado do Maranhão uma Homenagem a Tribuzi e provavelmente outros estudiosos escreverão sobre o poeta. Mas mesmo assim ainda é pouco para homenagear um homem que fez tanto. pelas letras maranhenses. Quando Tribuzi voltoudePortugal,oMaranhãoaindaeraumaterraquevivianaafãdopassadismoromântico. Coube a Tribuzi mostrar à juventude daquela época as novidades literárias que não chegavam a nossa terra. Hoje, três décadas após sua morte física, o Poeta continua vivo nas letras do Hino da cidade a que ele tanto amou, no nome de uma ponte, em um memorial que nunca sai do papel e na memória de quem ama a Poesia. Porém seus livros, repositórios materiais da alma e do estro do poeta, está cada vez mais esquecidos e menos lidos... Infelizmente.

Para os estudiosos desse grande poeta, deixemos aqui apenas algumas sugestões bibliográficas, para aprofundamento de leitura.

1. Rossini Corrêa - Pela Cidade do Homem - Livro essencial para quem deseja entrar em contato com a obra tribuziana

2. Rossini Corrêa - O Modernismo no Maranhão - Um desdobramento do livro anterior, com uma abordagem mais aprofundada e com um grande destaque ao momento histórico e às mudanças ocorridas no Maranhão da época de Tribuzi

3. Sonia Almeida - Tribuzi: Bandeira Poética de São Luís - Nesse livro, a professora Sonia Almeida estuda alguns poemas do poeta maranhense, mas aproveita também para dar uma visão panorâmica sobre o autor.

4. Nauro Machado - As Esferas Lineares - Um livro de ensaios de Nauro Machado. É interessante de grande talento ver um poeta fazendo uma leitura de outro poeta magistral. Nauro Machado demostra muita erudição e segurança ao estudar a poesia de Tribuzi.

5. Ramiro Azevedo - As Isotopias em Tribuzi - Livro hoje muito raro no qual o professor Ramiro Azevedo estuda Tribuzi de modo mais técnico, que serve tanto para a abordagem literária quanto (e principalmente) para a linguística.

6. GuesaErrante -Emalgunsnúmerosdessesinteressanteenecessáriosuplemento,épossívelencontrarvários textos sobre Tribuzi

Para terminar, um poema de Tribuzi: Imagem Vista do mar, a cidade,

BANDEIRA
TRIBUZI

subindo suas ladeiras, parece humilde presépio levantado por mãos puras: nimbada de claridade, ponteia velhos telhados com as torres das igrejas e altas copas de palmeiras. Seus dois rios, como braços cingem-lhe a doce figura.

Sobre a paz de sua imagem flui a música do tempo, cresce o musgo dos telhados e a umidade das paredes escorre pelos sobrados o amargo sal dos invernos. Tudo é doce e até parece que vemos só o animado contorno de iluminura e não a realidade: vista do mar, a cidade parece humilde presépio levantado por mãos puras e em sua simplicidade esconde glórias passadas, sonha grandezas futuras.

Leia mais: http://joseneres.blogspot.com/2009/02/bandeira-tribuzi.html#ixzz7sLkIQLhr

OSMAR GOMES DOS SANTOS

No Brasil algumas coisas parecem passar despercebidas, até que a situação seja noticiada, seja pelos veículos de imprensa, na nobre missão de informar, ou por cidadãos “comuns”, em um contexto cada vez mais midiatizado.

Rapidamente, assuntos ganham notoriedade com uma velocidade incrível. Os motivos são diversos: a gravidade, a dimensão, os impactos, a ordem do dia, os envolvidos. Como ingredientes desse enredo estão crimes, desastres, omissões por parte de pessoas nos mais variados escalões da organização.

Revisitava algumas leituras sobre crise na última semana e relembrando minha trajetória como servidor público, que sou até hoje. Ao se falar de gestão, seja ela pública ou privada, não se pode ignorar o fato de que a crise ocorrerá a qualquer momento.

Sim, ocorrerá. Do “verbo” vai acontecer, no tempo futuro que remete a uma certeza presente. Essa certeza é que faz o gestor vigilante, atento aos acontecimentos e sempre revisando seu plano de contingência.

Um gestor ávido e perspicaz está permanentemente a revisar seus protocolos, na expectativa que algo fora do planejado aconteça. Desejo? Não! Ninguém quer passar por situações complicadas, mas é preciso estar preparado para elas.

Em contrapartida, aquele que subestima os sinais, a ciência, a técnica, o conhecimento, a importância de processos, os protocolos, o investimento em segurança em favor de aferir mais lucro, está fadado a enfrentar graves crises.

Não é a proposta falar de crise aqui. É que tal leitura me despertou o olhar para acontecimentos recentes, deste século, nos quais a prudência, a atuação preventiva e mesmo a reativa, pautada em um plano de ação, poderia ter salvado milhares de vidas.

Região Serrana do Rio de Janeiro, Morro do Bumba, Boate Kiss, Mariana, Brumadinho, Yanomâmis. São situações que tiveram grande repercussão em razão das consequências, mas as causas já estavam lá. Quem as ignorou?

Porque não temos a capacidade de aprimorar o comportamento pautado na atuação preventiva? Deslizamentos, alagamentos, incêndios, contaminação. São desastres cujos prenúncios se acumulam, mas muitas vezes são ignorados.

Age-se no após. Mutirões, forças-tarefas, liberação de recursos, envio de profissionais especialistas, providências urgentes, coletivas de imprensa, discurso retórico de apuração, providências, apoio, solução (quase nunca definitiva).

Os Yanomâmis não chegaram a essa condição de um dia para o outro. Em que pese tenha se agravado nos últimos anos, a situação dos índios no Brasil é grave faz tempo. A intolerância cresce em segmentos que privilegiam o ódio, a separação, em detrimento da pluralidade e fraternidade. Quem está acompanhando este movimento?

Nossa cultura parece ter compelido a um comportamento reativo. Na esfera pública, por exemplo, o estar à frente para resolver o problema parece ser mais importante do que agir para evitar que ele aconteça. Impossibilidade de previsão ou a lógica do não valer a pena investir em saneamento?

É necessário mudar a conduta do agir para dar respostas, sempre no calor dos acontecimentos e sob luzes dos holofotes. No Brasil, os exemplos são aos milhares.

Sobre o crônico e histórico problema do garimpo na Amazônia Legal, adota-se a solução de fechar o espaço aéreo. Como cidadão, fico a me questionar sobre a efetividade dessa medida, uma vez traficantes e contrabandistas burlam diariamente os mecanismos de monitoramento daquela região.

O DIA SEGUINTE

O paradoxo visto, na verdade, é que o vazio da floresta parece não ter fim. Território sem lei, como costumam dizer aqueles que por lá residem. Ausência de lei em um Estado positivado?

É assim nas florestas, nos cinturões e bolsões de pobreza, nas encostas, tal qual o é na terra ressequida e rachada da estiagem sertaneja. O ápice da crise denota um fator estrutural que a precedeu. É como a ponta do iceberg, o problema é mais profundo.

No trágico roteiro do mal que impera quando o bem não faz sua parte, acumulamos negligência e omissão que, cada vez mais, vêm custando recursos ambientais, a cultura, a história, a vida, milhares delas.

Ocupações irregulares crescendo sistematicamente, atividades ilegais sem fiscalização, alertas negligenciados formam um quadro de omissão cujo desfecho, infelizmente, tende a gerar novas tragédias, ambientais ou humanitárias, ou as duas juntas.

Ainda sobre a Terra Yanomâmi, a assistência urge. Mas não pode vir como paliativo, um simples remédio que se toma no dia seguinte. É preciso efetividade e responsabilização em um crime que se reinventa no Brasil, especialmente nas fronteiras sem vigilância.

O trem parece ter descarrilado, mas resta tempo de coloca-lo nos trilhos. Como há muito defendo, a partir de uma discussão séria sobre todas as importantes pautas, necessitamos de um projeto de país e adoção de ações concretas capazes de alterar positivamente a ordem social.

*JuizdeDireito da Comarcada IlhadeSãoLuís.Membrodas Academias Ludovicensede Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.

SOUSÂNDRADE, O PRÓPRIO GUESA

FERNANDO BRAGA

para o “CB Revista – Caderno 3”, do Correio Braziliense, 5 de setembro de 1982.

Joaquim de Sousa Andrade [Sousândrade] nasceu em Guimarães [MA], a 9 de julho de 1812, faleceu m São Luís, a 21 de abril de 1902. Ao contrário de seus contemporâneos não foi a Coimbra ou a Olinda buscar o seu título universitária: conquistou-o em Paris, formando-se em engenharia de minas e m Letras, pela Sorbonne. É, talvez, por isso, se não mesmo pela originalidade extravagante de sua personalidade, que escapou à formação coimbrã, costumedogrupo que integrou notempo; foi um poeta diferente, estranhoe revolucionário em sua arte, que desponta como o mais remoto precursor do modernismo e ainda hoje um desafio marcante à teoria literária.

Sousândrade foi o primeiro Intendente de São Luís, após a Proclamação da República, cuja administração dedicou à educação e à reforma urbanística da cidade. Foi professor de grego no antigo Liceu Maranhense, idealizou com sua tendência progressista, a instalação, em São Luís, da primeira universidade brasileira – a daAtlântida – posteriormentedenominadadeNovaAtenas, não vingandoporcausadebaixos níveis políticos. Sousândrade foi ainda o autor do desenho da bandeira maranhense, em cujas cores branca, vermelha e preta, quis significar a fusão da raça brasileira. É patrono da cadeira nº 18 da Academia Maranhense de Letras e colaborou com o pseudônimo de Conrado Rotenski em “A Casca da Caneleira” [São Luís, 1866 – romance por uma dúzia de esperança], escrito juntamente com Trajano Galvão, Gentil Homem de Almeida Braga, Dias Carneiro e Joaquim Serra, todos integrantes do grupo maranhense. Esse romance fora escrito no mirante do “Palais Porcelaine”, solar erguido na Rua Grande, esquina com Rua do Passeio, precisamente no Canto da Viração, que era a morada de Gentil Homem de Almeida Braga.

Este poeta, até pela aglutinação de seu nome [Sousândrade], é um esteta intemporal, mergulhado universalmente no sintático e no lexical, completamente novo e original, arredio dos cânones [românticos] de seus contemporâneos, codificados nos fins do século passado. Uma presença conflitante de sua própria superação perante a historicidade da literatura em crise, a qual presenciou e sofreu suas diversas mutilações. Depois de chegar da Europa, para onde foi por favores de amigos, depois de negada ajuda pelo Imperador Pedro II [onde na Inglaterra criticou a monarquia sendo aconselhado a sair] se aventurou em viagem pelo Amazonas, contornando os Andes e rumando para os Estados Unidos, m 1871, levando em sua companhia a filha Maria Bárbara, cuja educação acompanhou até 1885, no “Sacre-Coeur”, quando então regressou ao Maranhão. Nessa peregrinação nasceu o seu famoso “Guerra errante”, fruto do testemunho de um mundo capitalista – que despertava em plena ascensão industrial em Nova Iorque – com seus escândalos financeiros e políticos, a fermentar toda a Walt Street [integrantes do Canto X do Guesa – Inferno de que nos fala Augusto e Haroldo de Campos. D. Invenção, São Paulo, 1964], bem como o arcabouço de uma democracia fundada no dinheiro e às expensas das misérias da competição desenfreada.

O autor também de “Harpas Selvagens”, Rio, 1857, Impressos, São Luís [2 vols.], 1978-9; “Eólias”, incluído em “Obras Poéticas” [1º tomo], Nova Iorque, 1874s e “Novo Edem”, São Luis, 1888-9, sem pertencer à escola satânica, ou ao modismo de Byron, tem muito do Lord Peregrino em seus contos magoados, apondo-se, ainda, à frente na exemplificação de normas de conduta e de dignidade, e crendo que todo o poeta, sob pena de escravidão e morte, deve ser o que ele é não o que aconselham para ser, porque o templo da liberdade, quando profanado, converte-se em túmulo de loucura, como justiceiramente asseverava.

Sousândrade foi o primeiro no Brasil, a inaugurar uma estética modernista. Sua contribuição à poesia, como em período revolucionário, reside fundamentalmente, segundo o e enfoque crítico de Alfredo Bosi, nos processos de composição: arquitetura dos sons ao plurilinguístico; no manejo verbal à montagem sintática, surpreendendo a forma – com a resolução – no entendimento de Hegel, ou a forma tão necessária à poesia como idéia ou, ainda, como diz Roland Barthes [in Le degré zéro de l’écriture, Paris, 1972] uma forma com os indicadores do escândalo, porque esplêndida ela é fora de moda; anárquica, ela é anti-social; uma forma que em si mesma seja a própria solidão. “O Guesa errante” [poema pan-americanista e autobiográfico de 13

cantos] foi editado em Nova Iorque, em 1876 e em Londres, possivelmente em 1888, publicados em etapas como o fez Byron com “Dom Juan” e Goethe com ”O Fausto”. Esta narrativa épica é original e onomatopaica, e seu universo surgiu de um poema delineado pelo molde de Chiuld Harold, na gênese de uma lenda da Colúmbia, narrada por Ferdinand Denis, ficando o poeta a imagem da romaria de um índio destinado a morrer no templo do sol. O Guesa desce os Andes, se esquece de seu “alterego”, convive com os selvagens engole o grande rio; e o poeta se incorpora em seu próprio protagonista e com sua natureza a emprestar, com sangue, o seu sofrimento mais íntimo ao índio viageiro, parafraseando o comentário de Frederick G. Williams e Jomar Moraes, estudiosos da obra sousadradina.

Cabe aqui lembrar – como Stendhal – o que preconizou Sousândrade: “Ouvi dizer já por duas vezes, que “O Guesaerrante”Serpalidocinquentaanos depois; entristeci – decepçãodequem escrevecinquentaanos antes”. Eisso se fezverdade porquesó agora a críticade vanguarda está tentando, aodescobri-lo, fazer-lhe a merecida e árdua interpretação, já que o poeta tem sido, no estrangeiro, objeto de estudos e pesquisas para tese de doutoramento em diversas universidades, por ter sido na Europa e nos Estados Unidos que mais intensificou a sua criação, mas carecendo, entre nós, e depressa, de uma atenção mais densa e acuidade, porque crendo como Píndaro “os gênios nascem e não se fazem”.

É-nos devido dizer, ao finalizar, que Sousândrade é o núcleo de seu próprio itinerário, de seu próprio roteiro. É em seu viajar o próprio universo dos fatos e a própria represa mítica da palavra. É ele o poeta que cunhou a sua própria metáfora de vida [estou na pedra!] quando de pedra necessitava para viver, arrancando-a e vendendo-a em sua Quinta Vitória, em São Luís, para comprar o pão de cada dia. É ele, Sousândrade – esse poeta extraordinário – o próprio Guesa.

FERNANDO BRAGA

Dizem alguns autores que o carnaval teve sua origem no Egito, há mais de 2000 anos a/c. Na Roma antiga, no dia 15 de fevereiro, realizavam-se danças em honra de Pã, chamadas Lupercais; os gregos festejavam a Baco. Primitivamente, os cristãos começavam as festas do carnaval a 25 de dezembro, compreendendo os festejos de Natal, Ano Bom e o de Reis. Jogos e disfarces predominavam nestas festas. Na Gália tais foram os abusos, que Roma proibiu por longo tempo o carnaval. Na Idade Média reaparece em Veneza, Turim e Nice, festejado com delirante alegria e excitação popular. No começo do cristianismo, a igreja deu nova orientação a essas festividades, punindo severamente aos que nelas se excediam. Os bailes de máscaras datam da Corte de Carlos VI; numa destas festas, esse rei foi assassinado por motivos políticos, quando se achava fantasiado de urso. O tempo carnavalesco começava com a festa de Santo Estevão, em 26 de dezembro. Afirma-se que em festas religiosas como a de Epifania, se usava máscaras. Em Veneza e Florença, no século XVIII, as damas elegantes fizeram delas instrumentos de sedução e disfarce para bem se servirem da carne, porque é esse o grande objetivo da festa.

Época de festas e divertimentos que abrange os dias entre o Dia de Reis [Epifania] e Quaresma, particularmente os três dias que precedem à quarta-feira de Cinzas, em fevereiro ou em março. Como exceção às festas carnavalescas realizadas fora do calendário oficial, convém lembrar, na França, a “mi-carême” e, no Brasil, a “Serração da Velha”, cerimônia caricatural, muito em voga no século XVIII, em Portugal, que tinha lugar principalmente durante a Quaresma e consistia em uma festa popular, em que um grupo de foliões serrava uma tábua, aos gritos estridentes e prantos intermináveis, fingindo serrar uma velha que, representada ou não por algum dos vadios da banda, lamentava-se num berreiro ensurdecedor. Quem nos conta esse fato é o folclorista Luís da Câmara Cascudo.

Segundo Antenor Nascenteéduvidoso aorigem do vocábulo “carnaval”,primitivamentedesignativo daterçafeira gorda, tempo a partir do qual a Igreja suprime [latim, levare] o uso da carne. Petrocchi dá como étimo o baixo latim [carnelevamen], modificado depois em [carne vale]. O velho pisano tinha [carnelevare], o napolitano [kanolevare], o siciliano [karnilivari]; é possível que tenha havido simples dissimilação. Stappers interpreta o baixo latim [carnelevamen] como [canis levamen], prazer da carne, antes das tristezas e continênciasdaQuaresma.Aetimologia[carrusnavalis],ditaporKörting,em1697,sebemquefoneticamente aceitável, não tem fundamento histórico.

Quanto à origem, o carnaval também é objeto de controvérsia: frequentemente tem sido atribuído à evolução e à sobrevivência do culto de Ísis, das bacanais, lupercais e saturnais romanas, dos festejos em honra de Dionísio, na Grécia, e até mesmo às festas dos inocentes e dos doidos, na Idade Média, as quais, mediante sucessivos processos de deformação e abrandamento, teriam originado famosos carnavais dos tempos modernos, como os de Nice, Paris, Veneza, Roma, Nápoles, Florença, Colônia e Munique. Mas seja qual for a sua origem, o certo é que o carnaval já era encontrado na Antiguidade clássica, e mesmo pré-clássico, com suas danças barulhentas, suas máscaras e licenciosidades, traços que seriam mantidos praticamente até hoje. A Igreja Católica, se não adotou o carnaval, tolerou-o com certa benevolência. Embora Tertuliano, São Cipriano, São Clemente de Alexandria e o Papa Inocêncio II tenham sido inimigos do carnaval. Com o decorrer do tempo, entretanto, essas modalidades de bufonaria medieval entraram em declínio, e o carnaval tornou-se menos violento e grosseiro. O deboche, em parte, cedeu lugar ao tétrico e ao macabro. Ficaram célebres as famosas danças macabras, da alta Idade Média, quando pessoas de ambos os sexos desfilavam perante a Morte que, impassível, lhes ouvia as queixas e depois de chasquear em verso com os suplicantes, lhes descarregava a foice.

Hoje, desde o renascimento, o carnaval se reduz à celebração ordeira, de caráter artístico, com bailes e desfiles alegóricos, e sob essa forma é que iria aos poucos desaparecer na Europa em fins do século XIX e começos do século XX. Tais características, entretanto, mantêm-se ainda em carnavais de algumas cidades européias, tais como Nice e Munique

SATURNÁLIA

O DESASTRE DA CORRUPÇÃO

OSMAR GOMES DOS SANTOS

Corrupção é uma palavra que por si só já vem carregada de significados negativos, daquilo que o comportamento moral e ético abominam de pronto. É uma tragédia da alma humana, que sobrepuja valores, que relega princípios, que apenas enxerga os ganhos a partir das práticas escusas.

Ela não está instalada apenas no seio da administração pública mundo afora, mas está também nas relações sociais, no comportamento desvirtuado que busca aferir vantagem sobre outrem. Há sempre o “esperto” disposto a passar o “bobo” para trás.

Tal comportamento humano, por ele fabricado e aprimorado, pode ser visto em todo mundo, sem exceção. Mas há que se considerar a sua proporção e as suas consequências naquelas regiões – nações – em que a corrupção já se tornou um “câncer social”.

A tragédia vivida conjuntamente por Turquia e Síria, assistida pelo mundo inteiro, joga luz sob um grave problema que abala, literalmente, as estruturas de uma nação. Antes que a pressa leve a questionar o que tem a ver a corrupção, o terremoto e as mortes, posso afirmar que, se não toda, há uma acentuada parcela de culpa. Os dois países em questão são governados com punhos de aço por seus líderes. No primeiro, um presidente eleito que subverteu o jogo democrático para se manter no poder, sob o pano de fundo da legitimidade. No segundo caso, um ditador cuja família governa a nação desde 1970, estando ele próprio há mais de 20 anos à frente da Síria.

Não pretendo me referir especificamente à pobreza de Turquia e Síria, cujas rendas per capita são de 990 e 760 dólares, valor baixo para os padrões globais. Na contramão dessa limitada quantia anual, estão “representantes” que governam para si, ostentam uma fortuna e esbanjam com regalias dentro e fora dos seus limites geográficos.

Corrupção incrustada na estrutura estatal, o que faz com que no Índice de Percepção da Corrupção, mensurado pela Transparência Internacional, ambos figurem entre as piores posições, estando a Síria à frente apenas da Somália.

O descaso das autoridades, somada à corrupção e a fenômenos naturais tendem a formar uma combinação perigosa, que em algum momento pode acarretar em tragédias sem precedentes. Foi o que ocorreu com esses países no terremoto recente, no qual mais de 30 mil pessoas perderam suas vidas.

A triste relação se acentua quando representantes do Estado Turco se veem envoltos a suspeitas de esquemas de corrupção. Em relação aos prédios que desabaram, há uma série de indícios que remetem ao pagamento de propina para fazerem “vista grossa” para a péssima qualidade dos materiais empregados nas construções que ruíram com o tremor.

Soma-se a esse fato, a falta de ações de prevenção de catástrofes, algo não muito distante daquilo que vemos por aqui e que, inclusive, relatei há pouco sobre nossas tragédias igualmente anunciadas. A corrupção mata, a omissão mata, a falta de prevenção mata.

Essa constatação pode ser verificada em estudos recente dos sismólogos Nicholas Ambraseys e Roger Bilham, que analisaram vários casos, tais como Haiti, Nova Zelândia e Japão. Em síntese, as cidades mal preparadas tendem a sofrer mais com danos e sua população a chorar as perdas de pessoas.

Na prática, países onde o dinheiro público tem destinação contrária àquela do interesse público, os estragos são potencializados. Hoje, já existe tecnologias para prever catástrofes, alertar antecipadamente e mitigar os impactos, como é possível verificar no Japão, por exemplo.

As causas para a corrupção são muitas, podendo variar de nação para nação, passando por questões políticas, educacionais e culturais. Fato é que ela constitui a maior ameaça à democracia e à vida. Resta-me, neste ponto, um dilema: o Estado de direito é forte onde a sociedade é organizada, ou seria o contrário?

Penso que o Estado, aquele que avocou as rédeas da sociedade, regulamentando a vida, estabelecendo normas, garantindo direitos e fazendo cumprir deveres é, antes de tudo, o maior responsável. Deve ser o protetor da nação em todas as suas dimensões.

Aqui ou além-mar, de forma mais ou menos intensa ou escancarada, a corrupção potencializa desastres naturais, faz vítimas, ceifa vidas, deixa órfãos.

COEMA HEMETÉRIO DOS SANTOS

SONETO12

DE Dilercy Adlrer: Eis aqui uma preciosidade, um poema intitulado SONETO, de autoria da professora Coema Hemetério dos Santos, filha primogênita do professor Hemetério dos Santos (maranhense da cidade de Codó). A professora Coema, entretanto, nasceu na cidade do Rio de Janeiro, mais precisamente na rua Ubá, 25, em São Cristóvão.

Tu podes dar a flor, não me aborreço, Ciúmes eu não tenho, tu bem vês, Se tiver algum dia, tu talvez Não percebas, amor, que já padeço.

Zangas, ódios, também eu não conheço Vacilas... nisto tudo tu não crês?

Olha este ramo, leva-o de uma vez, Não penses, não, não penses que enlouqueço.

Vae, que te segue a luz do meu olhar, Não olhes para trás – só que te peço –Senão verás de lágrimas um mar.

Volta, não sigas, não, meu coração, Já me sinto zangar, eu te confesso, Dá-me a flor, não mais a leves, não.

12 BIBLIOTECA NACIONAL, Seção de Periódicos Raros. O Magistério, Ano I, n. 2, 30/09/1909, p.37. 39A Escola Primária, Ano 6, n.8,abril de 1922, p.72.Disponível em: https://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/.

COEMA HEMETÉRIO DOS SANTOS: A “FLOR DE BELEZA” E “LUZ DE AMOR”. TRAJETÓRIA DE UMA INTELECTUAL NEGRA NO PÓS-ABOLIÇÃO CARIOCA13

Resumo

O texto analisa aspectos da trajetória de vida da professora Coema Hemetério dos Santos Pacheco, problematizando as relações raciais, de gênero e classe no imediato pós-abolição na cidade do Rio de Janeiro. Inúmeros registros nos contam sobre a constante racialização daspessoas negras em geral, especialmente pela literatura ficcional e pseudocientífica, além de publicações feitas pela imprensa. Às mulheres negras o desafio lançado era ainda maior, pois elas precisavam lidar com os estereótipos raciais e de gênero, contornando a agressiva sexualização que as atingia em cheio. Questões que também estavam postas à professora Coema, intelectual negra, parte de uma família que pertencia aos círculos letrados e camadas médias da sociedade carioca daquele tempo. A jovem se mostrou exemplar na condução das funções de professora, esposa, mãe e filha, combinando qualidades intelectuais, uma “feminilidade respeitável” e o papel coadjuvante diante do “homem da família”, seu pai, Hemetério dos Santos. Ser uma “mulher respeitável” foio modo pelo qual Coema falou diante daquela sociedade recém-saída da escravidão, expressando imagens positivas e afirmativas a respeito de si e de outras mulheres negras.Palavras chaves:Coema Hemetério dos Santos Pacheco; relações raciais, de gênero e classe; pós-abolição carioca.

É amanhã o primeiro aniversário natalício da gentil Coema, filha do nosso amigo, o professor Hemetério José dos Santos.Coema é o nome da flor de beleza, luz de amor –do imortal poeta maranhense.14

[ ... ] Hemetério José dos Santos, professor de Língua Portuguesa radicado na cidade desde o ano de 1875. [...] À época dessa publicação o professor Hemetério contava trinta e um anos de idade,

13 Luara dos Santos Silva Vista do COEMA HEMETÉRIO DOS SANTOS (ufam.edu.br) IN Revista do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Amazonas Volume 11, número 2, out./dez. 2019.DOI: https://doi.org/10.38047/rct.v11i2.665028

14 Cidade do Rio, 19/10/1889, p.02. Disponível em: https://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/. IN Revista do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Amazonas Volume 11, número 2, out./dez. 2019. Fragmentos de uma história familiar

NOTAS DO EDITOR:

aproximadamente seis anos de magistério e onze de casamento com a também professora Rufina Vaz Carvalho dos Santos. Em 1889 o casal comemorava o primeiro aniversário de sua filha, a menina Coema – evento lembrado com bastante afetuosidade pelo referido jornal. O nascimento da menina em 20 de outubro de 1888, cinco meses após a abolição oficial da escravidão em todo território nacional, foi um grande marco na vida do casal de professores não apenas por ser ela a primeira filha, mas também porque é a partir deste momento em que oficialmente passa a existir a família de sobrenome Hemetério dos Santos. A ação desse jovem nascido treze anos antes da Lei do Ventre Livre, filho da africana escravizada Domingas, alforriado e perfilhado aos cinco anos de idade pelo Major Frederico dos Santos Marques Baptisei15, foi um importante marco simbólico de agência e autonomia. Se ao longo de mais de trezentos anos as pessoas escravizadas foram marcadas pela imposição dos sobrenomes senhoriais ou mesmo por sua ausência, as experiências de liberdade incluíam a ratificação da condição de pessoa autônoma e livre, autora de sua própria história. Uma (re) afirmação que passava por diversos caminhos, inclusive o poder de construir uma história familiar própria, definindo nomes e sobrenomes por e para si próprios. Ainda que os Hemetério dos Santos não tenham efetivamente vivido a experiência da escravidão, pertenciam a uma sociedade que insistentemente reconstruía formas de hierarquização social baseadas em cor e raça. Traziam na pele as marcas que os vinculariam aos antepassados escravizados ao longo de toda a vida. [...] Aos moldes do patriarcado daquela época - mas atravessado pelas desiguais relações raciais da época -o professor maranhense define por ele próprio os rumos a serem seguidos a partir da formação dessa nova família. Uma família negra, formada por um pai de cor preta e uma mãe “mulata” 16, que construirá uma sólida trajetória no magistério público da cidade do Rio de Janeiro –Corte Imperial e capital federal a partir de 15 de novembro de 1889.

Após a primogênita vieram mais cinco filhos: Octávio, Gulnare, Clóvis, Aristides e Luiz. Todos os seis filhos tiveram acesso à educação formal, as moças seguindo carreira no magistério público municipal e os rapazes exercendo outras funções em outros setores do serviço público.

O casal de professores tinha por fonte de renda os salários recebidos por Hemetério como docente do Colégio Militar, da Escola Normal Livre e da Escola Normal Oficial. Já Rufina atuou ao longo de toda a vida profissional como professora do ensino municipal, ocupando o posto de catedrática e exercendo a função de diretora em algumas das escolas pelas quais passou.

Coema Hemetério dos Santos, o “início da manhã” e a continuidade familiar.

O nome Coema, de origem Tupi, significa “o início da manhã” e a escolha feita por seus pais é bastante simbólica por marcar, como dito anteriormente, o início da família Hemetério dos Santos. O “início da manhã” dos Hemetério dos Santos, uma menina negra nascida na cidade do Rio de Janeiro, teve acesso à educação formal desde as primeiras letras e ingressou na Escola Normal Oficial em 1904. Nesse ano ela cursou o 1° ano do Curso Diurno, sendo aprovada nas disciplinas de Francês (“com distinção”), Português (“plenamente”), Aritmética, Caligrafia, Ginástica, Trabalhos de Agulha, Trabalhos Manuais, Música, Geografia (somente na segunda chamada).Em 1905, aos dezessete anos, ela foi matriculada no 2° ano do Curso Noturno. Seguiu os estudos no período noturno até concluir o curso em 1907, aos dezenove anos. Aos vinte anos, em 1908, a jovem Coema “foi aprovada com distinção no exame de prática escolar” 17

15 Aderaldo Pereira dos.Arma da educação: cultura política, cidadania e antirracismo nasexperiênciasdo professorHemetério José dos Santos (1870-1930).Tese de doutorado em História Social da Educação, Faculdade de Educação, Programa de PósGraduação em Educação, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), 2019, pp.153-154.

RODRIGUES, Tadeu Luís Maciel. Hemetério José dos Santos: educador, homem de letras e sua obra. IN: Congresso Brasileiro de História da Educação, p.03. Disponível em: http://sbhe.org.br/novo/congressos/cbhe7/pdf/08-%20IMPRESSOS%20INTELECTUAIS%20E%20HISTORIA%20DA%20EDUCACAO/HEMETERIO%20JOSE%20DOS%20SANTOS%20EDUCADOR%20HOMEM%20DE%20LETRAS.pdf.

16 É o próprio Hemetério dos Santos que em artigo publicado no ano de 1913 identifica a esposa desta forma, indicando ser ela uma mulher negra de pele clara. Já em seu registro de óbito, ocorrido em novembro de 1952, consta que sua cor era parda. A discussão sobre cor e raça na formação social brasileira é analisada de forma primorosa em MATTOS, Hebe. Das cores do silêncio: os significados da liberdade no Sudeste escravista. 3 ed. rev. –Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2013

17 Informações localizadas no Histórico Escolar da aluna Coema Hemetério dos Santos, depositado no Centro de Memória da Educação Brasileira do Instituto de Educação Superior do Rio de Janeiro (CMEB-ISERJ), na cidade do Rio de Janeiro. Tal documento encontra-se disponível em formato digital nesta instituição, sendo-me gentilmente cedido pelos profissionais responsáveis pelo setor no ano de 2018.

[...] Em março de 1911 a professora Coema foi oficializada “substituta da cadeira de português do 1° e 2° ano” do Curso Noturno da Escola Normal. Um ano antes, em 1910, aos vinte e dois anos de idade, ela fora designada professora adjunta pela Diretoria Geral de Instrução Pública Municipal da então capital republicana. De acordo com a biografia publicada em 1913 pela revista A Cidade, ela ocupava o posto na Escola Normal desde 1909, visto que: Herdeira natural dos dotes didáticos que ilustraram e tornaram vantajosamente reputado o professor Hemetério, estava naturalmente encaminhada para substituilo na cadeira de Português, que leciona na Escola Normal. Fê-lo com a proficiência dos mestres consumados, em 1909 e atualmente continua, no curso da língua materna, a reger uma turma, fazendo-o com grande proveito para os discípulos.23Em 27 de fevereiro de 1912

Coema Hemetério foi designada professora adjunta municipal da 7ª escolado 5º distrito da cidade, “a cargo” da diretora Rufina Vaz, sua mãe. A parceria direta entre mãe e filha durou dois anos, quando em 1914 a jovem foi designada para a 12ª escola feminina desse mesmo distrito. No início do ano de 1913 há registros de sua atuação como professora de Português no Curso Noturno e da participação em “comissões examinadoras para exames da 2ª chamada” na Escola Normal. Ao final desse mesmo ano, ela e demais colegas do magistério estavam incumbidas de organizar, fiscalizar salas e recepcionar visitantes à exposição pedagógica anual, inaugurada em 20 de dezembro, no edifício da Escola Modelo Estácio de Sá (bairro de São Cristóvão). Segundo a publicação da Inspetoria Escolar do 5º distrito, professores catedráticos e adjuntos deveriam participar ativamente da exposição que seria “franqueada ao público, diariamente, das 6 às 9 horas da noite, até o dia 27, quando será encerrada às 8 horas, exceção feita ao dia 25, no qual não haverá exposição”.

Nas publicações dos anos de 1920 quem fala é uma professora de trinta e cinco anos e que há quinze exercia oficialmente o magistério. Sua escrita é em primeira pessoa e se dirige às colegas de ofício, buscando fornecer subsídios para o fazer pedagógico em sala de aula:

Sujeito-Predicado(recapitular lições anteriores) Sei, perfeitamente, que a classe conhece sem hesitação, o período simples,composto, coordenado e subordinado. Vamos hoje tratar dos dois elementos essenciais da proposição: sujeito e predicado. (...)18

A associação entre mulher-casamento-maternidade foi peça fundamental na construção das agências femininas, tanto no espaço privado quanto no público.

Para a jovem Coema não foi diferente, pois além das qualidades intelectuais e do nome “herdados” a moça seguiu o roteiro comum às moças do mesmo círculo social, casando-se em 1910, aos vinte e dois anos. O “enlace matrimonial” com Octavio Ferreira Pacheco, funcionário do Ministério da Agricultura, foi realizado em 21 de outubro de 1910, no civil e no religioso, tendo por um dos padrinhos ninguém menos do que o General Pinheiro Machado, um dos políticos mais importantes e influentes da Primeira República. Além da figura ilustre, “o auspicioso enlace” da filha do “provecto educador” Hemetério dos Santos teve a presença dos “numerosos amigos que foram levar à sua residência os mais fervorosos votos de felicidade ao jovem par”.

18

39A Escola Primária, Ano 6, n.8,abril de 1922, p.72.Disponível em: https://bndigital.bn.gov.br/hemerotecadigital/.

Em outubro de 1910, cerca de duzentas moças seriam solenemente diplomadas professoras naquela que prometia ser uma “brilhantíssima festividade” promovida pela Prefeitura do Distrito Federal (à época a cidade do Rio de Janeiro). Como havia três anos que não ocorria uma cerimônia desse tipo, seriam reunidas as concluintes dos anos de 1907, 1908 e 1909. Dentre as formandas estava a jovem Coema Hemetério dos Santos, que naquele mesmo mês completaria vinte e dois anos de idade. Seu nome, de origem Tupi, “o início da manhã”, foi a forma escolhida por seus pais, Hemetério José19 e Rufina Vaz20, para marcarem o início da família Hemetério dos Santos. Formada a partir da união de um casal de professores negros, os Hemetério dos Santos procuraram transmitir o legado do magistério à menina “flor de beleza” e “luz de amor”

Nascida em 20 de outubro de 1888 na Corte do Rio de Janeiro, Coema cresceu cercada pelas letras, acessando e dominando todos os códigos da cultura letrada. Enquanto a menina crescia, sua mãe, Rufina, conciliava a maternidade, o magistério e os estudos na Escola Normal para obter a diplomação e um lugar efetivo no magistério público primário. Além dos objetivos pessoais de formação, havia a busca pela segurança material que o emprego traria à família. De seu avô, o famoso tipógrafo Francisco de Paula Brito, Rufina herdara memórias e o importante legado das letras. Nada de fabulosas heranças materiais provenientes desseavô ou dequalquer outromembrodesua família.Portanto, todos os esforços para aobtenção do diploma e a efetivação no magistério eram muito necessários.

A formação na Escola Normal iniciada em 1888 só foi concluída em 1896. Enquanto terminava seus estudos, conciliava a função de professora pública interina (desde 1891) com a maternidade dos quatro filhos nascidos nesse mesmo período. Em 1898, dois anos depois da diplomação e já há sete anos no ofício, Rufina alcançou a promoção ao posto de Professora Catedrática – o topo da carreira no magistério público municipal. Essa promoção trouxe benefícios significativos: a efetivação no magistério público, maior segurança salarial e o estabelecimento da família em casa oferecida pela administração municipal. Por sua vez, o professor Hemetério, o pai da família, investia esforços para ocupar lugares de prestígio no magistério carioca. À época da “brilhantíssima festividade” de 1910 ele já havia se consolidado como renomado professor do Colégio Militar e da Escola Normal. Reunindo autoridade intelectual, boas relações sociais, formas positivas e afirmativas de auto apresentação, veemência e solidez em seus argumentos, o professor maranhense construía um lugar de respeitabilidade para si e sua família. A conjugação entre a apresentação estética e uma sólida bagagem intelectual desferia golpes contra o racismo alimentado por estereótipos e por perspectivas que procuravam inferiorizar a população negra. “O negro nunca foi fraco, imoral ou ladrão”, ele dizia… e comprovava com seu corpo e mente.

O Magistério, Rio de Janeiro, 30 de outubro de 1909, p. 01. Fonte: Seção de Periódicos da Biblioteca Nacional/RJ.

19 Nascido em 1858 na província de Codó, no Maranhão, Hemetério dos Santos embarcou para o Rio de Janeiro aos 17 anos com o intuito de completar os estudos – iniciados sob o patrocínio do pai, um importante fazendeiro maranhense. Já por volta do ano de 1879, ministrava aulas particulares. Sua vida pública, assim como a produção intelectual, aparece nos principais periódicos da cidade de modo mais intenso entre os anos de 1890 e 1920. Sobre sua trajetória ver: SANTOS, Aderaldo Pereira. A arma da educação: cultura política, cidadania e antirracismo nas experiências do professor Hemetério José dos Santos. 2019. 429 f. Tese de Doutorado. Programa de Pós Graduação em Educação. Rio de Janeiro, 2019; SILVA, Luara dos Santos. 2015. 152 f. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Relações Étnico-Raciais (PPRER/CEFET-RJ). Rio de Janeiro, 2015. Ver também: MÜLLER, Maria Lúcia Rodrigues. A cor da escola – imagens da Primeira República, p.92. Cuiabá, MT: Entrelinhas/EdUFMT, 2008

20 Rufina Vaz Carvalho dos Santos, esposa de Hemetério, exerceu o magistério na rede pública municipal de ensino

além de ocupar o cargo de diretora de algumas unidades 11 Dantas chama a atenção ao fato de que essas “visões positivas” acerca da mestiçagem não excluíam práticas racialmente discriminatórias. 75 Revista Eletrônica da ANPHLAC, ISSN 1679-1061, Nº 27, p. 66-102, Ago./, Dez., 2019. http://revista.anphlac.org.br escolares. Coema e Gulnare Hemetério dos Santos, duas dos cinco filhos do casal, também se dedicaram à atividade docente.1

O destaque alcançado pelo professor de Língua Portuguesa e Filólogo também era fruto das conferências realizadas e artigos publicados em diferentes periódicos da cidade. Nesses dois espaços ele defendia as pautas centrais de sua produção intelectual, o acesso à educação formal e a luta contra a discriminação racial. Diante dos ataques cruentos frequentemente recebidos das páginas de periódicos muito populares como Careta e Fon!Fon!, associando-o a primatas, símios e macacos, ele sabia que o racismo não se encerrava quando pessoas negras dominavam os códigos culturais hegemônicos.

Mas também estava muito claro para Hemetério que a exclusão da população negra dos estabelecimentos escolares perpetuariaadesigualdadeeoracismo.Porisso, suas conferências traziamàpauta“oprotesto contra a exclusão das crianças de cor de certos estabelecimentos de ensino”, lembrando a todos que “os indivíduos de cor preta foram os que mais colaboraram para a constituição da nacionalidade brasileira”. Como acertadamente definiu o historiador Aderaldo dos Santos, a educação foi sua arma para atacar de frente o racismo que atingia todas as pessoas negras, fossem elas intelectualizadas ou não.

Seguindo os caminhos dos seus progenitores, em especial de seu pai, Coema Hemetério atuou em escolas públicas primárias e esteve à frente da cadeira de Língua Portuguesa, formando outras professoras matriculadas no curso noturno da Escola Normal. Em 1913 ela e a professora Arminda Bastos estavam encarregadas das turmas do 1º ano do Curso Noturno, enquanto Hemetério ministrava as aulas para as alunas do 3º ano no mesmo horário. A carreira de Coema alcançou outros espaços para além da sala de aula: assim como o pai, ela foi colaboradora dos periódicos A Escola Primária e O Magistério.

O Magistério, Rio de Janeiro, 30 de outubro de 1909, p. 01. Fonte: Seção de Periódicos da Biblioteca Nacional/RJ.

Ao longo de sua trajetória no magistério, Coema seria sempre associada à figura paterna, tanto pelo reconhecimento e prestígio de que ele gozava, quanto pela efetiva parceria intelectual entre os dois. Ela carregava o legado familiar e, segundo a biografia publicada pela revista A Cidade, era a “dilecta filha do professor Hemetério dos Santos” que na Escola Normal “não desmereceu a fama que trouxera da escola primária”. Formando-se com “raro brilhantismo”, a “herdeira natural dos dotes didácticos” do “reputado professor” também se apresentava ao público com estética apurada, transmitindo uma imagem que simultaneamente remetia à beleza física e às qualidades intelectuais:

Professora Coema Hemetério dos Santos Pacheco. A Cidade, Rio de Janeiro, 02 de abril de 1913, p. 30. Seção de Periódicos da Biblioteca Nacional/RJ.

À época da publicação biográfica, além de professora da Escola Normal, Coema atuava como adjunta de 2ª classe na 6ª escola feminina do 5º distrito, “sob a direção da provecta professora que é a senhora sua mãe, D. Rufina dos Santos.” Duas gerações de professoras negras que em seu cotidiano lidavam com os desafios de liderar a instrução pública primária na capital republicana. Ao mesmo tempo, eram duas mulheres negras atravessadas por um racismo que se dizia científico e afirmava categoricamente que mulheres negras, assim como os homens negros, tinham uma “sexualidade exacerbada”, eram intelectualmente inferiores e estavam fadados ao fracasso e às mais diversas deformidades físicas e intelectuais.

Em 1909, pouco antes da festa de diplomação, Coema, que já era professora na Escola Normal, foi proibida pelo Diretor Geral da Instrução Pública de avaliar suas alunas. Era função docente avaliar alunos e alunas, um lugar de autoridade que publicamente foi retirado da jovem professora negra. Naquela sociedade onde imperavam o racismo e o poder masculino, foi o pai da família, o professor Hemetério dos Santos, quem tomou a palavra para duramente contestar tal afronta.

Em carta enviada ao jornal O Paiz, um dos mais prestigiados da cidade do Rio de Janeiro, ele narrou os caminhos percorridos em busca do necessário desagravo, solicitando providências diretamente do prefeito municipal, o Dr. Serzedello Correia. Hemetério não mediu esforços e protestou “bravamente, fortemente e energicamente” em defesa de sua filha, “duplamente ofendida, por ser mulher e por ser subordinada”. Não há registros da participação da professora Coema nessa petição e tampouco em outros artigos e conferências públicas realizadas pelo professor Hemetério dos Santos. Mas a minha imaginação histórica suspeita que a farta e combativa produção intelectual, antirracista e em prol da educação popular foi pensada por várias mentes no seio dessa família.

Acumulando o domínio da cultura letrada e a condição de livres por mais de duas gerações, os membros da família Hemetério dos Santos – e muitas outras pessoas negras ao longo da nossa história – tinham plena compreensão de que esse era um dos mais poderosos meios para conquista e afirmação da liberdade e da própria humanidade. E embora possuíssem todos os requisitos que os habilitavam à participação no universo letrado – além de algum recurso material –, eles não ficaram ilesos à discriminação racial que atravessava as vidas de todas as pessoas negras.

HEMETÉRIO JOSÉ DOS SANTOS: O PRIMEIRO PROFESSOR NEGRO DO INSTITUTO DE EDUCAÇÃO

Hemetério José dos Santos: o primeiro professor negro do Instituto de Educação (geledes.org.br) Equipe do Centro de Memória da Educação Brasileira do Iserj (Foto: Imagem retirada do site Iserj)

Hemetério José dos Santos (1858-1939) era gramático e filólogo, e foi professor da Escola Normal do Distrito Federal, do Colégio Pedro II e do Colégio Militar do Rio de Janeiro. Recebeu em 1920 a patente de TenenteCoronel Honorário do Exército Brasileiro.

O Professor Hemetério José dos Santos foi uma figura histórica no combate ao racismo e em defesa da educação na época em que viveu. Daria, inclusive, um belo debate no Iserj, com a participação do NEP-Raízes edo NúcleodeEstudos Afro-Brasileiroda FAETEC (NEAB),arespeitodesuaimportantepresençanoquadro docente da Escola Normal do Distrito Federal.

O professor Aderaldo conta que, à época, Hemetério era uma figura proeminente, se relacionava com pessoas da elite brasileira e aparecia nos jornais. E que, juntamente ao professor Manuel Bonfim, tinha ideias e iniciativas progressistas, como a criação de uma Escola Normal Livre:

O pensamento desses professores destoava da elite da época, eram pessoas que traziam a visão de que a educação tinha que chegar até a população pobre, por isso idealizaram essa Escola Normal Livre. A própria ideia de um curso normal à noite na Escola Normal do Distrito Federal já tinha esse propósito, tanto que, aqui, Hemetério foi professor do noturno, e quem vinha à noite estudar não eram os jovens da elite.

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Hemetério dos Santos: aspectos biográficos

O professor Hemetério dos Santos era um dos raros e legítimos representantes de uma geração que se notabilizou pelo número de homens ilustres que produziu em todos os ramos das ciências, artes e, por conseguinte, letras. O seu desaparecimento merece muito mais do que uma breve notícia telegráfica ou um mero registro necrológico.

Filho do Maranhão, como Artur e Aluísio Azevedo, Coelho Neto, Graça Aranha, Raimundo Correia e tantos outros poetas e prosadores notáveis, abandonou Hemetério a terra natal aos 17 anos de idade, e rumou para o Rio de Janeiro, onde desembarcava, alguns dias depois, abatido pelo balanço do navio, mas com a alma povoada de sonhos e esperanças.

Segundo relata um seu biógrafo, no mesmo ou no dia seguinte, sofreu a primeira contrariedade, incidente comum à maioria dos que se iniciam na vida. Recorrendo a um compatrício com prestígio suficiente para ampará-lo e auxiliá-lo na consecução de um emprego, este desconhecendo, talvez porque fosse ele negro, quis colocá-la como condutor de bondes.

Isso, entretanto, não o fez desanimar.

Consciente de seu valor dirigiu-se ao Reitor do Colégio Pedro II, também maranhense, que o acolheu com bondade e inteirado do que pretendia nomeou-o repetidor de francês, função que condizia, perfeitamente, com as aptidões que possuía.

Tempos depois fazendo o Imperador uma visita ao Colégio verificou a inteligência e o preparo do jovem professor, e tomando informações a seu respeito nomeou-o mais tarde, professor de português no Colégio Militar.

Proclamada a República, o marechal de Ferro, que já o conhecia, encarregou-o de fazer a reforma da Escola Normal, em que o sábio educador se manteve durante 42 anos.

Sem embargo de suas múltiplas ocupações colaborava o professor Hemetério num grande número de jornais e revistas, mantendo polêmicas sabre questões filológicas e escrevendo livros estimados, entre os quais se contam: "Gramática da Língua Portuguesa", "Preditão de Amor" e "Frutos cadivos".

Sofreu injustiças, movidas pelo despeito e pela inveja de uns e pela inconsciência de outros, que não sabiam avaliar a sabedoria de seu espírito e procuravam humilhá-lo porque era de origem negra, como se, a nossa pátria não tivesse orgulho de homens da mesma linhagem, que a enobreceram e engrandeceram, tais como: Henrique Dias, Luís Gama, Rebouças, Visconde de Jequitinhonha, Patrocínio, Monteiro Lopes, o sábio arcebispo D. Silvério, Marcílio Dias, Juliano Moreira, Cruz e Souza, entre muitos outros.

J. R.

A Gazeta, 9 de agosto de 1939. Pesquisa, transcrição e adaptação ortográfica: Iba Mendes (2019)

Inauguração da Biblioteca Hemeterio José dos Santos, em Códo (Maranhão), cidade onde ele nasceu. O Professor Hemeterio dos Santos, sem dúvida, foi sempre um lutador no enfrentamento ao racismo. Hemeterio José dos Santos é avô de Heliana Hemeterio, historiadora e militante. Saiba mais sobre o Professor Hemeterio dos Santos >> https://bit.ly/3g0tKI7

Ahistóriadoprofessornegroeantirracista queensinouduranteaescravidão

OFolhanaSaladestasemanacontaahistóriadoprofessorHemetérioJosédosSantos,umintelectual negroquelutouporumaeducaçãouniversaleumasociedadeantirracistaduranteofimdoséculo19e primeirametadedoséculo20.

HemetérionasceuemCodó(MA),em1858,trintaanosantesdaaboliçãodaescravidãonoBrasil.Aos16, mudou-separaoRiodeJaneiro,ondeterminouosestudosesetornouprofessorexplicadordefrancêsno ColégioPedroII.Ali,diz-se,foivistopelopróprioimperador,queficouadmiradopelasuacompetência. Aolongodavida,publicoulivros,escreveuparajornaisesefirmoucomoumrespeitadoestudiosoda línguaportuguesa,apontodeserumdospatronosdaAcademiaBrasileiradeFilologia.Suaatuação,no entanto,estevesempreligadaàsquestõesraciaiseàeducaçãodosmaispobres.

“NãopodemospensaroHemetériocomoumrevolucionáriodopontodevistasocialista,comunistaetudo mais.Masissonãotiradeleoméritodeserumcríticoàquelasociedadenaquestãoracialetambém,a coisamaisimportantetalvez,nãosópelaquestãoracial,maspelaeducação.Paraqueaeducaçãofosse públicaepopular,paraqueaeducaçãochegasseaospobres”,afirmaohistoriadorAderaldodosSantos, queescreveusuatesededoutoradosobreoprofessor.

HemetérioJosédosSantosmorreuem1939,aos81anos,eentreoslegadosquedeixouestáopróprio nome,quesetornousobrenomeeaindahojeéumamarcadesuafamília.

FONTE: Folha de São Paulo, por Sergio José Dias O educador negro Hemetério José dos Santos (Imagem: Biblioteca Nacional)

EDUCAR É PLANTAR TÂMARAS

Pensemos no professor Hemetério, que plantava tâmaras com ciência, espírito generoso e coragem para vencer a pobreza e o racismo por Educação e Dignidade no Maranhão

Publicado 16/07/2021 11:40 | Editado 17/07/2021 08:00

O nome dele é Hemetério

Educador que veio do Império

Professor que falou sério

A história do negro neste país

Hemetério sabe o que diz…

Ele veio de Codó

veio de Codó

Que fica no Maranhão

(Samba do Hemetério - Aderaldo Gil)

Um antigo ditado árabe ensina, quem planta tâmaras, não colhe tâmaras. O enigma da frase se desfaz, ao sabermos que demora de 80 a 100 anos para provarmos o doce fruto da tamareira. Quem a plantou? Gestão pública, de certo modo, é como plantar tâmaras. Apesar de todo dia fazermos o que há para hoje, e de as necessidades serem para ontem, é o amanhã que nos julgará. São muitos os desafios, não poucos os obstáculos no caminho que leva ao sonho de mudar para melhor a vida das pessoas. Há barreiras de todo o tipo, principalmente aos mais pobres, negros, indígenas e mulheres.

É perceptível o quanto o racismo, as desigualdades de gênero, raça e classe impedem nosso desenvolvimento e o exercício de uma cidadania plena. Lutar pela superação destes marcadores sociais é um desafio bastante atual, mas faz parte uma luta que não começou hoje. Muito desta contribuição e seus personagens encontrase oculta ou invisibilizada. Lembrar às gerações atuais que os nossos passos vêm de longe, é uma das nobres missões que os educadores podem cumprir.

Por Danilo Moreira, Subsecretário de Estado de Educação do Maranhão

Por isso, evoco a trajetória de um professor maranhense, nascido em 1858 na cidade de Codó. Ele viveu intensamente as três últimas décadas da escravidão e do Império, antes da Lei Áurea (1888) e da República (1889).

Seu nome é Hemetério José dos Santos, e sua bela história de amarga luta chega a nós como doces tâmaras de exemplo

Maria era o nome da mãe de Hemetério e seu pai era um fazendeiro escravista. Ele teve a sorte do acesso à educação, apesar da lei da época vedar a escola formal à população negra, porque escrava. Ao contrário da América Espanhola, a Independência do Brasil manteve a escravidão, ignorando os alertas de José Bonifácio, ainda em 1823, à Assembleia Constituinte dissolvida por D. Pedro I. Ele perguntava: “como poderá haver uma constituição liberal e duradoura num país continuamente habitado por uma multidão de escravos brutais e inimigos?”. E além de denunciar o crime que era a escravidão, defendeu as primeiras políticas públicas para impedir que a injustiça se perpetuasse. A educação como uma política universal essencial para mudar essa realidade e o futuro.

Hemetério teve duas influências decisivas na sua trajetória: a oportunidade de estudar e o enfrentamento à dura realidade do racismo. Sua inteligência foi reconhecida desde muito jovem. Com apenas 17 anos, já estava na Capital do Império, o Rio de Janeiro, e conquistou o cargo de Professor de francês no Colégio Pedro II. Chamou a atenção do Imperador D. Pedro II, que o assistiu. Tornou-se o primeiro professor negro do Colégio Militar, aos 32 anos, a partir de 1890.

Mesmo essas vitórias não o pouparam do racismo, inclusive em sala de aula, e essa experiência permeia toda sua obra. Pais e filhos da elite tiveram de engolir o professor negro, elegante, armado de erudição e coragem. Hemetério tornou-se um cientista, escritor, filólogo e historiador. Sua gramática foi adotada no Colégio Militar. Depois, publicou o Livro dos Meninos, uma obra didática voltada para seu tempo e em defesa do Brasil como sociedade multirracial. Não se contentou em dar aulas no Colégio Militar e criou uma escola noturna para ensinar analfabetos e também deu aulas na Escola Normal Livre, frequentada por mulheres trabalhadoras.

Escrevendo em jornais, Hemetério era respeitado polemista, rara voz negra na defesa da História da África, combatendo preconceitos vivos até hoje. Enfrentou o racismo da imprensa várias vezes. Seus filhos também foram vítimas e ele foi aos jornais em sua defesa, mas não apenas deles. Chegou a apontar na obra de Machado de Assis estereótipos reservados aos personagens negros. Estudou a Balaiada e resgatou aspectos importantes daquela luta histórica protagonizada por negros. Hemetério faleceu em 1939 aos 81 anos e um dos legados que deixou foi transformar o próprio nome em sobrenome. Hemetério virou a herança e o exemplo também para os seus descendentes.

Paulo Freire nos alertou, que se “a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser o opressor”. Em seu tempo, Hemetério jamais foi seduzido pelo status quo. Dedicou-se a abrir caminhos. Se rebelou por uma liberdade ainda longe no horizonte. Nas senzalas, nas ruas, no Direito, na literatura, na sala de aula, muitos precisaram ter gestos generosos, cujos frutos eram só a esperança de um futuro mais doce para todos. Hemetério fez na educação a sua luta.

Hoje, com esse mesmo compromisso na educação pública, lamentamos a falta que faz a escola na vida da comunidade. O impedimento de aulas presenciais que iniciou pela pandemia e se prolongou pelo negacionismo criminoso contra o povo brasileiro, trouxe também imenso prejuízo à infância e à juventude, que têm na escola um espaço importante nas suas vidas e de suas famílias.

Nahistóriaeno cotidiano,grandeparterevivealutadoacesso edapermanênciavividaporHemetério,travada contra o racismo e a pobreza e agravada pela epidemia da COVID-19 e pelo descaso federal. Sabemos o quanto a escola faz falta na vida dos jovens, das suas mães, de quem a constrói, trabalhando, ensinando e aprendendo. Hoje, no Brasil, em vez de se plantar tâmaras, tenta-se aniquilar a próxima geração. Contra isso está o esforço do Governo Flávio Dino, que enfrenta a pandemia sem deixar de lado a valorização da educação pública em todas as suas dimensões.

Pensemos no professorHemetério,queplantavatâmaras com ciência,espírito generosoecoragem paravencer a pobreza e o racismo. É um bom exemplo para a nossa política educacional, semear um futuro de desenvolvimento e igualdade de oportunidades.

1566838576_ARQUIVO_c528a2594fa8a37baee97c6215e44986.pdf (anpuh.org)

Era o caso da professora Rufina Vaz Carvalho dos Santos, e em parte o de sua amiga Elvira Pilar Guimarães da Silva, ambas mulheres negras. As duas iniciaram os estudos em fins dos anos de 1880 na “Escola Normal da Corte”, ainda durante o governo Imperial, vindo a concluí-los somente em 1896 (“Escola Normal Livre”).

Em 1891 elas passaram a integrar o magistério público municipal, sendo nomeadas “professoras adjuntas interinas” – o primeiro passo rumo à efetivação na carreira docente. Sete anos depois, em 1898, Elvira Pilar e Rufina chegavam ao topo da carreira sendo promovidas ao cargo de “professora catedrática”.

Essa promoção significava o aumento dos vencimentos, mas também conferia certa distinção dentro do grupo das professoras públicas primárias. Além disso, ser professora pública, oficialmente diplomada, chegando ao topo da carreira significava não apenas o aumento do salário, mas, sobretudo, a ocupação de um lugar social que conferia alguma respeitabilidade e reconhecimento.

E é exatamente nestes termos em que falam duas biografias publicadas na imprensa, afastadas no tempo em quarenta e três anos, sobre as professoras Rufina e Elvira Pilar.

Em 1956, a professora Rufina Vaz foi biografada por Mariza Lira na coluna “Nossas Mestras” (Jornal do Brasil, 26/02/1956, pp.17-18)21. Em texto extremamente laudatório, a autora descreve a trajetória da educadora de “tipo lindode mestiça” desde o nascimento até sua velhice, enfatizando suas notáveis qualidades de mãe, esposa e professora. Além disso, as origens familiares de Rufina, neta do respeitado editor e tipógrafo Francisco de Paula Brito22 (SANTOS, 2019, p.139), são utilizadas também como elementos enaltecedores de sua trajetória. A moça, de acordo com a biografia publicada, era “descendente de dois nomes brilhantes da Educação Infantil e da Literatura do Brasil”, além de pertencer a “uma família de recursos”.

No texto biográfico não há informações sobre a data desta fotografia, mas é certo afirmar que tenha sido feita algumas décadas antes dessa publicação em vista do falecimento da professora em 10 de novembro de 1952, aos noventa e dois anos de idade (SANTOS, 2019, p.149).

Apesar da qualidade ruim, a fotografia nos permite identificar uma mulher com cabelos, roupas e expressão facial extremamente formais. Uma mulher mestiça segundo com Lira e “mulata” de acordo com seu próprio esposo, o professor Hemetério dos Santos em artigo já citado (O Imparcial, 1913).

Em 1913 e em 1956 a professora, apesar da aparência bastante clara, não deixa de ser racializada. Na primeira ocasião o sentido é positivo e indicativo de boas qualidades, na segunda é como uma característica que vai indicar um “apesar de” e que pode ser aceita diante de tantos outros atributos físicos, familiares e intelectuais.

21 Jornal do Brasil (RJ) - 1950 a 1959 - DocReader Web (bn.br)

22 Francisco de Paula Brito (Rio de Janeiro, 2 de dezembro de 1809 - Rio de Janeiro, 5 de dezembro de 1861), que escrevia sob o nome de Paula Brito, foi um editor, jornalista, escritor, poeta, dramaturgo, tradutor e letrista brasileiro. Trabalhou em diversas tipografias e fundou a "Sociedade Petalógica", que teve como membro ilustre o então jovem escritor Machado de Assis Paula Brito – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)

RUFINA VAZ CARVALHO DOS SANTOS

CERES COSTA FERNANDES

Rodou bastante até encontrar uma vaga em uma praça um pouco distante do lugar de destino. Como sempre, não há vagas no centro. Procura manter-se calma enquanto o flanelinha gesticula freneticamente à sua frente atrapalhando as suas manobras e faz outro esforço heroico de autocontrole quando ele a chama de “tia”, na disputa com outro para “passar uma água” no carro recém lavado. Raciocina, lugar de destino. Estranho nome esse para identificar uma reunião rotineira da empresa onde iria desempenhar uma ação desimportante, como, de resto, era tudo que fazia na sua vida nesses últimos anos.

Um marido, dois filhos adultos, seu pequeno núcleo familiar. Um nem sei quê de amargo trava sua garganta. Eram gentis, de um carinho distante, por vezes parecia não os alcançar. Andando pela casa, tocava paredes de vidro que não conseguia transpor. Uma sensação estranha de que cada um vivia em uma dimensão própria. Até que ponto importava na vida deles? Não, certamente estava sendo injusta. Não os seus meninos, não o seu companheiro de longos anos. Sacode a cabeça e os maus pensamentos.

Voltaàsituação atualeantecipamentalmenteareunião:váriaspessoas,entediadascomoelaprópria,convictas de que não iriam resolver coisa nenhuma, mas todos falando difícil, usando adequadamente o jargão da profissão, feito para humilhar os que não são do ramo, propondo pomposamente “soluções” que sabiam defasadas de antemão. Era um jogo em que todos sabiam as regras e fingiam ignorá-las. Dá um suspiro profundo, resignado e começa a caminhar.

Fazia algum tempo que não caminhava pelo Centro Histórico. Lembra-se do tempo em que uma de suas distrações era andar sem destino por aquelas ruas antigas e deixar-se impregnar do espírito da cidade. O vaie-vem dos carros, os camelôs, omagotedegentea movimentar-se,impediam qualquercontemplação. Começa a sentir calor. Percebe que ela e a cidade já não têm a mesma simbiose: habituara-se a sair do refrigerado do carro para o refrigerado da repartição e de lá para o refrigerado do seu apartamento. Raio de blazer, pensou. Como é que, num clima equatorial, convenciona-se que a roupa de trabalho deve ser blazer, sapato alto e meias. Meias! E os homens de paletó e gravata? Coitados! Os ingleses quando dominavam a Índia usavam bermudas e chapéu. Devíamos usar chapéu, divagou. Bem fez o Jânio Quadros que impôs aquele traje leve para trabalhar, como era mesmo o nome? Ele não era doido de todo, enfim...

Os sapatos altos, de saltos finos, chiques e bem tolerados nos ambientes carpetados, começam a incomodar no sobe e desce das pedras irregulares. Devia ter vindo no carro da empresa (o motorista sempre desaparecia quando se precisava dele) ou de táxi, ia chegar atrasada, ainda faltavam dois quarteirões. Começa a escorrerlheno pescoço umagota desuorquevai morrerdentrodosutiã.Osuorcomprometeacorreção damaquiagem. Sua irritação aumenta cada vez mais. Súbito, começa a chuviscar. Olha em torno, nenhuma marquise. Tem que atravessar a praça, apressa o passo. Com esses sapatos não pode correr. Pingos grossos começam a cair. Não há como evitar se molhar.

Sente no rosto e nos cabelos os pingos mornos de chuva tropical. Estremece. É uma sensação deliciosa, inesperada naquela manhã formal e pré-determinada. A água cai forte, ela desiste de apressar-se e abandonase à chuva. Com gestos pausados, como se ouvisse música, tira o blazer e depois os sapatos e as meias. Deixa a água molhar a blusa de seda fina e caminha com os pés livres, lentamente, sentindo a correnteza das águas escorrer entre seus dedos. Ergue o rosto e deixa a chuva, suavemente como um carinho, desmanchar a caprichada maquiagem. Algumas lágrimas escuras de rímel misturam-se à água límpida da chuva, até que caiam límpidas elas também. Cada poro do seu corpo arrepia-se, conectado à energia da tempestade: há como que um retorno a algo puro, intocado, à juventude, às sensações esquecidas, as quais não mais se permitia.

Pessoas abrigadas dentro das lojas e debaixo das marquises olham com surpresa aquela mulher de roupas finas, com jeito de pessoa séria, talvez uma executiva, andando sozinha debaixo do toró que desabou e escureceu os céus, parecendo um eclipse em pleno dia.

Como numa epifania, em meio à escuridão, dá-se o reencontro, a cidade reaparece na claridade dos seus olhos e mostra-se na beleza dos sobradões: azulejos lavados, brilhantes, ruelas encachoeiradas . Meu Deus! Como é bonita a sua cidade!

UM DIA DE CHUVA

Reconciliada com a cidade, leve, retorna ao estacionamento. Que bom, os flanelinhas sumiram. Entra no carro e coloca o CD de Edith Piaf que há tempos não escuta. Dirige, decidida, até seu apartamento. Lá, ignorando o pasmo do porteiro - que houve com a senhora.? - sobe ao seu quarto e pega uma pequena mala. Algumas mudas de roupa, que não pesem nem amassem. Um bilhete curto para os dois filhos – há muito não precisam dela. Outro para o marido. Este, absorvido nos seus variados interesses, nenhum que a incluísse, demoraria a notar a sua falta. Pode ser até que ficasse um pouco surpreso: Vá-se entender as mulheres.... Ela não tinha aqui tudo o que queria?

Os papeluchos não indicavam o “lugar de destino”, talvez nem mesmo ela o soubesse. Na verdade, não interessava o nome do lugar. Sempre podia telefonar quando lá chegasse. Depois de algum tempo, é claro. Só queria conviver um pouco com ela mesma. Não queria perder a pessoa que, após tantos anos, recuperara com a chuva.

“SOMOS TODOS DA GERAÇÃO DE 45”

FERNANDO BRAGA

*José Carlos Lago Burnett, mais conhecido como Lago Burnett, nasceu em São Luís do Maranhão, em 14 de agosto de 1929 e faleceu no Rio de Janeiro em 2 de janeiro de 1995. Foi um jornalista e escritor brasileiro. Em São Luís, atuou intensamente na imprensa local e em veículos de cultura juntamente com Bandeira Tribuzi, José Sarney, Ferreira Gullar e outros, onde fundaram o grupo ‘Ilha’. Considerado um dos expoentes daGeraçãode45, passou aexerceratividadejornalísticanoRiodeJaneiro,principalmentenoJornal do Brasil, onde foi por longo tempo Secretário de redação e um dos editores do ‘Caderno B’. Dentre suas obras, destacam-se ‘Estrela do Céu Perdido’, 1949; ‘O Ballet das Palavras’, 1955; ‘50 Poemas’, 1959 e ‘A Língua Envergonhada’, 1976. Foi membro da Academia Maranhense de Letras, onde ocupou a Cadeira nº 5, fundada por Fran Paxeco, sob o patronato de Celso Magalhães, sendo sucedido por Clóvis Sena, outro maranhense brilhante, também do Jornal do Brasil e também da Geração de 45.

Feita as devidas apresentações para os que não conheceram, ou não mais se lembram de Burnett, começo por dizer que nesse domingo passado, pachorrento e chuvoso, já sem a contagem temporal e farsante do ‘horário de verão’, fui à minha modesta biblioteca e retirei da estante o livro ‘De jornal em jornal’, desse meu querido amigo e conterrâneo Lago Burnett, o qual, a folheá-lo, deparei com a providencial crônica ‘Somos todos de 45’, publicada na edição de 9 de maio de 1967, do ‘Jornal do Brasil’.

Relendo-a, lembrei-me de que, há dias, ao publicar aqui um artigo sobre ‘Fernando Ferreira de Loanda: um poeta esquecido’, suscitou comentários em alguns estudiosos sobre aqueles ‘jovens intelectuais da geração de 45’: para muitos, esquecidos uns; para outros, desaparecidos alguns. Pois bem, sobre o assunto, transcrevo aqui esta crônica de Lago Burnett, justamente sobre aquela fantástica rapaziada de 45, da qual ele foi um dos grandes nomes.

Vamos à matéria:

“Onde começa e onde termina a Geração de 45 é um enigma tão ou mais complexo do que o do ovo e da galinha, cuja prioridade até hoje ainda se discute.

Fernando Ferreira deLoanda,por exemplopensa queaGeração de45 éoGrupoOrfeu –ele, Bueno deRivera, Ledo Ivo, Domingos Carvalho da Silva, Darci Damasceno, Fred Pinheiro, Bandeira Tribuzi, Mauro Mota, Afonso Félix de Sousa e outros menos voados.

Já José Condé, partindo da premissa de que Mauro Mota foi contemporâneo de Álvaro Lins no ginásio, chega à dedução de que a Geração de 45, se analisada em profundidade, revela raízes muito mais remotas do que sonha a nossa vã filosofia.

***

É possível que ela remonte às priscas eras de Olegário Mariano. Historiógrafos efeitos às generalizações drásticas creem que,tiranteCatulodaPaixãoCearense,todo mundopertence àGeraçãode45.Menos,éóbvio, Austregésilo de Ataíde, que deve ser da época de Heródoto ou Hesíodo. Quando cometi meu primeiro livro, a Geração de 45 estava no apogeu. Era um grupo tão atuante como a Frente Paramentar Nacionalista no Governo João Goulart. E, como a Frente acabou derrubando João Goulart, a Geração de 45, acabou dando margem à instalação da ditadura concretista, de saudosa memória. Naquela época, eu morava muito longe e me considerava, com base na certidão do Registro Civil, documento de que disponho ainda hoje, muito mais moço do que todos aqueles senhores, inclusive Wilson de Figueiredo, já consagrado no estágio antológico. Por isso, exclui-me da catalogação que tanta controvérsia tem causado. Com a sua ‘Antologia Poética da Geração de 45’, cuja primeira série acaba de ser editada pelo Clube de Poesia de São Paulo, Milton de Godoi Campos pretende acabar de vez com essa controvérsia. Ele enquadra na Geração de 45 todos os poetas que publicaram livros a partir de 1940, identificando-os qualitativamente, pela insubmissão ao espírito de 22 e pela busca de uma expressão nova na lírica brasileira. Assim, João Cabral de Melo Neto e Ferreira Gullar, os dois que obtiveram maior êxito na elaboração de sua obra, são arrolados na mesma geração de Geir Campos, um neoparnsiano confesso, Carlos Pena Filho, descendente espiritual de Jorge de Lima com Ledo Ivo, Nilo Aparecido Pinto, parnasiano mesmo, Tiago de Melo, um schmidtiano menos contido, e Stella Leonardos, uma réplica carioca, em encadernação feminina, ao feminil artesanato de Guilherme de Almeida.

Será válida essa classificação de artistas tão antagônicos em seus rumos, na sua técnica e na sua temática? Terá o Sr. Milton de Godói Campos conseguido realmente somar quantidades heterogêneas? Poderão figurar em aparente afinidade vozes isoladas que jamais fariam coro em uníssono, por divergências estéticas e ideológicas tão evidentes? E esse Milton de GodóiCampos, não será ele, por acaso, o próprio Milton Campos, o mais antigo representante da Geração de 45 da política brasileira?

Temo que esse critério acabe por transformar a Geração de 45 em sucata da literatura brasileira. Eu, por exemplo, até há poucos anos, era incluído em antologias de poetas novíssimos. Parei um pouco de fazer versos mas continuei fazendo anos. Agora, “de repente, não mais que de repente” (Vinicius de Morais não será nosso colega também?), vejo-me entre os de 45. Por quê? André Carneio tenta uma explicação: “Nilo Aparecido ponto publicou cinco livros, de 1940 a 1949, mas aos objetivos desta Antologia só interessam os que pulicou a partir de 1952.”

Osobjetivos–deixaentreverCarneiro– sãoosdeidentificar,nosautoresqueestrearamnoperíodoassinalado, uma contribuição, mínima que tenha sido, para a renovação da poesia brasileira. São honestos os objetivos mas talvez falte ainda perspectiva histórica para estabelecer quais os esforços individuais que terão sido realmente válidos. Quem nos dirá se amanhã, numa dimensão temporal mais ampla, a Geração de 45 não venha a ser absorvida pela própria Geração de 22, já que todos nós, mais jovens ou menos velhos, somos beneficiários da Semana da Ate Moderna de São Paulo? Assim, numa confraternização mais democrática, seremos todos coleguinhas – Menotti del Picchia, Plínio Salgado, Cassiano Ricardo, Dona Amélia Carneiro de Mendonça, Graça Aranha e o próprio Marinetti. E por que não Bilac? Cruz e Sousa? Castro Alves? Gonçalves Dias? Tomás Antônio Gonzaga? O padre Antônio Tomás? Bento Teixeira Pinto? B. Lopes? O padre Anchieta?

É muito temerário antecipa julgamentos para isolar uma corrente artística quando não existe propriamente a corrente. No caso do concretismo e, atualmente, de práxis, é fácil: o episódico supera sempre o mérito individual de participação. De uma só ensaboada, pode-se dar nome aos bois. Mas, quando na boiada se infiltram representantes de outras espécies da fauna literária, não é mole, não.

A iniciativa do Clube de Poesia de São Paulo valerá como informação aos estudiosos do fenômeno poético no Brasil. Os subsídios fornecidos à crítica são realmente importantes. Há alguns lapsos, como no meu caso, no registro biobibliográfico feito por esse poeta tão gentil que é Domingos Carvalho da Silva. Entre outras coisas, eu poderia chamar-me Luís Calos, mas meu prenome é José Carlos. Como, entretanto, não tenho a mínima pretensão de subsistir literariamente, podem chamar-me como quiserem. Afinal, somos todos da Geração de 45, estejam à vontade”.

O PODER SEM CONQUISTAS

Osmar Gomes dos Santos

Há quem diga que o poder corrompe o caráter, fazendo com que aquele quem o detém mude completamente sua conduta em razão deste valor subjetivo que criamos. Muito é dito que o poder pode “subir à cabeça”, fazendo amigos virarem as costas a outros amigos e até à própria família.

Visões de mundo diferentes levam a concepções diferentes. Dessa forma, olhando para minha trajetória, da minha família e de muitos amigos que ascenderam na vida, mas nunca mudaram seu jeito simples, prefiro tomar como regra aquela de que o poder a ninguém muda, apenas revela aquilo que estava oculto em cada um.

Quando se tem e se utiliza o poder para o bem, ele pode servir como um instrumento para transformar a realidade à volta de quem o detém. Quando este, no entanto, usurpa da capacidade que tem o poder para proveito próprio, está fadado ao declínio.

É assim no mundo dos negócios, na vida e na política. Quando o poder é conquistado com dedicação e afinco, fruto de um árduo trabalho, passa ele a ser merecido e consequentemente bem utilizado. Porém há os que tenham galgados os degraus da glória sem qualquer esforço, apenas se aproveitando do oportunismo para tomar uma carona galopante rumo à glorificação. Mal sabem que a mesmo velocidade com que sobe pode também ruir. A soberba precede a queda.

O poder pelo poder não edifica, não dignifica. Ademais, o que é o poder se não algo subjetivo criado por nós humanos para remeter a uma situação de investidura por circunstâncias diversas?

Situações as quais, diga-se, muitas delas em que uma pessoa é alçada a ela, por confiança, mas que ao chegar ao posto não dignifica a credibilidade recebida. Mesmo aqueles que tenham, por si só, alcançado tal posto, não pode simplesmente usurpar das prerrogativas da posição, notadamente daquelas cujo posto é de representação.

No caso da política, essas prerrogativas se vinculam muito menos a questões de mérito pessoal, aferindo ao poder uma condição de agir em prol da coletividade. É a capacidade de soberania, de determinar, de exercer a autoridade para gerir a coisa pública com altivez, sem olvidar da observância aos princípios da Administração Pública.

Há aqueles, no entanto, que precisam descer do pedestal da vaidade e ter a humildade de reconhecer quem lhe proporcionou as bases para ascensão, ainda que esta tenha sido por força do acaso.

Lembrei-me de um ditado que diz “jabuti não sobe em árvore; ou foi enchente, ou foi mão de gente". Apesar das volumosas chuvas que sazonalmente inundam a nossa querida Baixada Maranhense, não penso que fora as águas as responsáveis por fazer encalhar sobre os galhos “tal espécie.”

Mesmo para Maquiavel, cuja história não fora bem contada, o poder não se traduz naquilo que deve ser alcançado a todo custo. Embora tenha retratado a sociedade tal como era, ele ressaltava que o poder emana do povo e que o soberano precisa estar em consonância com a vontade popular.

Poder não existe em si, assim como o Estado, mas tão somente para servir. Portanto, desçam dos galhos os jabutis e deixem o poder seguir pelas mãos daqueles que seu uso fazem para promover o bem sem ver a quem.

ÁUREO MENDONÇA

Segundo dados do IBGE atualmente a cidade de Viana conta com uma população estimada de 52.852 pessoas. Um fato é que a cidade não possui uma livraria para comercialização de livros, somente existem papelarias para venda de material escolar.

Viana terra de grandes escritores e poetas é um berço de grandes artistas como Celso Magalhães, Antônio Lopes, Raimundo Lopes,Travassos Furtado, Luiz Alexandre Raposo, Nonato Reis, Lourival Serejo e muitos outros excelentes autores, valorizar os escritores vianenses é imprescindível para que sigamos rumo a um futuro melhor. Os Mendonça e a literatura uma arte de se comunicar por meio das palavras. Escritores como Sálvio Mendonça, João Cordeiro Mendonça, Nonato Reis (para quem não sabe também é Mendonça), Pollyanna Gouveia Mendonça Muniz e Áureo Mendonça, são oriundos da mesma árvore genealógica e se destacam como escritores. Além de vários outros autores vianenses de destaque. Para quem não sabe na época da minha infância na década de 1970 já existiu na cidade uma livraria onde eram vendidos somente livros. A livraria era mantida pela União Operária Vianense que foi fundada em 1954 pelo senhor Manoel Soeiro. Mas foi durante a gestão da canadense irmã Berta Lavoie que chegou à Viana em 1969 a frente da União Operária na década de 1970 que iniciou o funcionamento da Livraria Assunta que ficava na Rua Antônio Lopes (Rua Grande) na antiga casa que pertenceu ao tabelião Duduzinho Campelo. Com as novas tecnologias e na era do watsap a nova geração de vianense bem pouco tem o hábito de leitura, uma prova disso foi quando do lançamento do meu livro "Resgate histórico da cidade de Viana" que conta uma parte da memória da cidade, bem poucos jovens e pessoas prestigiaram ou adquiriram o livro, mas graças aos vianenses que residem fora da cidade, inclusive no exterior e muitos não vianenses que adquiram a obra, a edição do meu livro está esgotada.

OS MENDONÇA
E A LITERATURA

CERES COSTA FERNANDES

Momento1-Oautomóvelimportadodeslizasuave.Emplenatarde,océucinza-chumbo,melhordizendo,plúmbeo, como nos clássicos literários. Breno acha a palavra exata e deliciosa. Difícil encontrar outra que descreva melhor o ar pesado e escuro das tardes de inverno. Além do mais, é sinestésica. Com raro prazer, pronuncia-a dobrando a língua, rolando a palavra dentro da boca, gozando o som gordo e pesado: plúum-beo. Chuva fina. Pensa agora na palavra chuva - ela própria uma onomatopeia. Uma palavra-mãe. Cabem nela as onomatopeias do ri-bom-bar do trovão e do chuá-chuá suave das águas nos telhados,inda mais se forem eles de palha de babaçu. Se forem de telha, o pipocar (outra onomatopéia) monótono das gotas também serve de embalo ao sono. Sente muito pelos infelizes moradores de apartamentos, ele incluso, que dormem e acordam sem saber sequer se choveu.

Abre o vidro do carro e aspira com força e gosto, abrindo as narinas. O ar fino esfria as orelhas, parece que a chuva limpou as impurezas do ar. A vontade é toda de aconchego. Chegar logo em casa. Comer algo quentinho que conforte oestômagoemodorrarna cama entre lençóis,que friomaranhense nãodá pra mais.Chuva forte.Abriramse as comportas do céu. Trânsito lento. Em dias que tais não vale a pena apressar-se. Liga o som e vai curtindo Milton Nascimento. Antegoza a noite: um filme no sofá macio, enroscado em seu bem, devorando um balde de pipocas. E se der um apagão? Aí cabe um jantar à luz de velas, acompanhado de um bom vinho, e depois... Momento 2 - Osvaldo, cansado de tantas quizilas na repartição, tenta, irritado, chegar mais cedo em casa. Há um trabalho extra - e remunerado - a entregar no dia seguinte. Ainda na firma, notou o céu escuro. Dr. Breno tem mania de falar que é plúmbeo. Palavra mais fresca, parece coisa de gay. É chuva, no duro. Descolou a saída mais cedo, na esperança de chegar antes da maldita. Doce ilusão. No meio da ponte da Camboa, arriou o temporal. O trânsito vai lento, lento, até parar. Buzinaço. Vai ver que algum filho duma égua já se estrompou, derrapando nesse asfalto da saída da ponte que mais parece sabão! Por que não puseram um raio de areia grossa nessa mistura? O estômago começa a reclamar das dezenas de cafezinhos do dia, e uma vontade de fazer xixi vem vindo longe. Lembra as estatísticas (sabe lá quais) que dizem: sofrer um acidente com a bexiga cheia aumenta em x% os riscos de perfuração da própria. Que pensamento besta.

Liga o rádio. A Voz do Brasil informa sobre o fundo recebido por municípios. Procura um CD pra colocar e constata que os filhos adolescentes levaram todos. Sente-se próximo a um filicídio. Finalmente tiraram o filho duma égua do caminho. O trânsito flui devagar. Fila por um. Mais dois afogadinhos deram prego. Molharam o motor. Tomara que não aconteça o mesmo ao seu fordeco. Finalmente, está chegando em casa. Ôô, quê!? Sem luz outra vez? Manda a CEMAR para aquele lugar e buzina com força. Venha alguém abrir este portão eletrônico de merda! Marchas e contramarchas. Várias pessoas da casa participam da operação, afinal, abrem o portão. Direto ao banheiro.

Sem luz, nada de computador, O trabalho extra e o dinheiro foram-se. Come a comida fria. "Eu, esquentar comida sem forno de micro-ondas, meu filho? Nem morta", a desgracenta. A luz bruxuleante da vela não dá nem para ler. Aliás, a casa está cheia de velas, parece uma capela de ex-votos. Esse cuidado - de quem está acostumado aos apagões -, fez a prima do Sul Maravilha, em breve visita, desconfiar que ele e a mulher estivessem se dedicando a práticas de magia. Vai dormir em meio ao calor e aos mosquitos. Nem trabalho, nem a final do Vasco na TV, rádio, só no carro. Raio de vida.

Momento 3 - Zé Orelha saiu tarde do emprego de novo. O patrão ficou fazendo hora, e ele junto, esperando. Agoniado, um olho lá fora, outro cá dentro, via a chuva engrossar, e o Dr. Breno a papear no celular. Finalmente é dispensado. A parada de ônibus mais próxima dá um estirão. Sai correndo, protegendo o saco de pão com o próprio corpo. Não fosse a chuva molhar o jantar da família, que fim de mês a coisa não é brincadeira. Ônibus apinhado. Engarrafamento de novo. Fazer o que? Ruim é estar de pé, depois de um dia de faxina grossa, as pernas doem. Estivesse sentado, aproveitaria para dar um cochilo durante a viagem. Aí seria bom. Apesar da roupa molhada no corpo, não sente frio. O ônibus está quente, com o ar pesado de um bodum úmido de corpos. Que querem? São 14 horas de batalha, e ali não há anjos.

A chuva afinou. O bairro tá sem luz de novo. Ô siô! Todo inverno a mesma coisa. Chapinhando no barro, vai evitando as poças maiores, quando dá para enxergar. Agora o pão molhou de vez. Mês que vem, tem que sobrar um dinheirinho para o guarda-chuva. Vai subindo, a casa é no alto de um barranco. Os bombeiros já foram lá. É preciso sair da casa urgente. Dizem que a qualquer hora o barranco pode aluir. Esse pessoal é engraçado, como é

CHUVA EM 3 MOMENTOS

que a gente vai abandonar a casa – de telha e taipa, é verdade, mas bem boazinha, com três cômodos, não é para qualquer um - assim de repente. Além do mais, onde colocar a cama de casal, orgulho da mulher, a TV - quase toda paga -, o fogão e o botijão de gás (que dorme acorrentado ao esteio da sala-cozinha)? Depois, para onde ir? Foi difícil acomodar até ascrianças. Uma na casa dos primos, outra na comadre."Por poucos dias, não é? O Senhor sabe, aqui também estamos apertados... O pessoal do interior que veio se tratar...”

Entrega o saco de pão para a mulher e começa a mastigar um. E aí, minha velha? Melhorou da tosse? Hun. Hun. Acho que essa história de desabamento é léria. Inveja de vizinho. Pra gente deixar a casa e eles tomarem conta. Já fiz uma promessa pra Santa Efigênia,ela vai protegera nossa casa. Tu tá doente,vai dormir que eu vigio. Oserviço foi mole hoje. Depois te acordo, pra gente fazer a troca.

Tira a roupa molhada, mete um calção, pega o radinho de pilha pra ouvir o jogo, enche um copo com café requentado, e senta em frente à porta, mirando a barreira desabada, já bem perto da calçada de terra batida. A luz voltou, olha o Coroadinho, lá em baixo, tão bonito, suspira. Ah, se não fosse esta chuva, a vida até que seria boa, pensa, antes de ouvir o estrondo.

OSMAR GOMES DOS SANTOS

Quando se fala em algo inanimado, logo vem à mente um ser sem vida, entretanto presente na natureza e nas nossas vidas, de alguma forma; como por exemplo o sol, o ar, a água, as pedras, o vento, etc.

No dia 01 de março deste ano, tive a grata satisfação de estar presente num evento super democrático e cheio de seres “inanimados” com “vida real” e presentes na natureza - estive no Tribunal Regional Eleitoral do Estado do Maranhão, onde ocorria a posse de membros efetivos e suplente daquela corte e também ocorreu a eleição, melhor dizendo, aclamação para os cargos de presidente, vice-presidente e corregedor geral.

Num discurso emocionante, cativante e recheado de palavras eminentemente democráticas e republicanas, num estado não letárgico, foi possível perceber o quanto a Justiça Eleitoral brasileira merece a confiança do seu povo.

A urna eletrônica, responsável por dar agilidade e segurança ao processo eleitoral,sempre foi usada em diversas eleições em todo o Brasil, sem nunca ter sido provado, ainda que questionada, quaisquer tipos de possibilidades de fraudes ou descompassos com a tutela pretendida pelo eleitor - que é a garantia de que seu voto tenha sido computado para quem o votou.

Lembro-me que a primeira eleição simulada com a urna eletrônica no Estado do Maranhão foi na zona eleitoral de Barreirinhas quando eu era o titular, ocasião em que tinha o Desembargador Jamil de Miranda Gedeon Neto como presidente do Tribunal Regional Eleitoral. Ali, as urnas eletrônicas foram deslocadas para as seções eleitorais mais distantes e de maior dificuldades de acesso, exatamente para se ter a percepção do tempo que seria gasto até a conclusão do pleito e entrega de todo material na sede da justiça eleitoral, local de envio dos dados para totalização.

Mas não apenas isso, serviu também para se ter a certeza de que a urna eletrônica sempre foi digna de segurança, sem possibilidades de violação .

Todos os eleitos pelo sistema de votação eletrônico, com o uso da urna eletrônica ao longo de sua existência, nunca opuseram qualquer tipo de resistência. E nem poderiam, afinal de contas a urna eletrônica é digna da confiança do povo brasileiro por ser efetivamente segura, sem qualquer possibilidade de alteração dos resultados.

Um certo presidente de um TRE brasileiro ao receber uma petição de um causídico solicitando recontagem dos votos, exarou um despacho: "MANDEI ABRIR A URNA, VI TUDO QUE NELA CONTÉM, SO NÃO ENCONTREI VOTOS PASSÍVEIS DE SEREM RECONTADOS".

O Brasil tem dado exemplo ao mundo quando o tema é urna eletrônica, ninguém, nem os mais brilhantes especialistas ousaram chegar a um entendimento diferente . Além de ganharem notoriedade mundo a fora , as urnas eletrônicas representam o que existe de mais moderno e seguro em termos de votação, confiança e respeito.

Para garantia da efetiva segurança da máquina, o Tribunal Superior Eleitoral realiza testes periodicamente com técnicos de fora da corte, após o que o Tribunal emite relatório com as possíveis eventuais falhas e aponta as soluções. Depois de corrigidas os técnicos são chamados novamente para conferirem as correções. Isso significa dizer que a justiça eleitoral age com transparência e equilíbrio, o que a torna cada vez mais segura e ágil, permitindo a emissão do resultado da eleição em tempo recorde, diferentemente do que acontecia nos tempos das urnas de lona e votos de papel.

Palmas aos Desembargadores José Luís de Almeida e José Gonçalo de Sousa Filho, que comandarão a corte eleitoral do Estado do Maranhão e por certo farão um excelente trabalho à altura dos méritos democráticos, assim como fizeram a Desembargadora Ângela Salazar e o próprio Desembargador José Luís, na condição de corregedor, deste, merece aplauso o discorrer sobre a importância da urna eletrônica no processo

UM SER INANIMADO

democrático brasileiro e condenando o turbilhão de fake news e desconfianças por inúmeros que outrora foram eleitos pelo mesmo processo.

Esse ser inanimado ao qual se referiu o presidente do TRE.MA ao homenageá-la, é a urna eletrônica. Palmas à ela e ao processo eleitoral brasileiro .

Sucesso aos dignos e honrados membros da Justiça eleitoral em todo o país.

*Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís.Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.

O ROMANISTA ABELARDO SARAIVA DA CUNHA LOBO

FERNANDO BRAGA

Consultado por um amigo do Conselho Editorial do Senado Federal se dispunha de alguma informação biobibliográfica sobre o escritor e jurista Abelardo Saraiva da Cunha Lobo, disse ao meu interlocutor que iria procurar nos meus papéis velhos, e assim que encontrasse alguma coisa que atendesse aquela gentil solicitação,logooinformaria.Algumtempodepoisacheioquemefoipossível,paracolaborar,decertaforma, com a já agendada publicação pelo Conselho, do “Curso de Direito Romano”, deste ilustre autor maranhense. Este livro é uma reedição do Centro de Estudos de Direito Romano e Sistemas Jurídicos da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília.

O projeto gráfico do Senado Federal é o de n° 78, com prefácio do Professor Doutor Francisco de Paula Lacerda de Almeida, Catedrático de Direito Civil da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e agora enriquecido pelas notas de Pierangelo Catalano, da Universidade de Roma, o que “constitui motivo de grande alegria para os juristas brasileiros, indicando auspícios favoráveis ao desenvolvimento do Direito Brasileiro em consonância com as suas origens culturais”, no entendimento do Professor da UnB, Ronaldo Rebello de Britto Poletti, Presidente da União dos Romanistas Brasileiros-URBS.

Esse volume que na verdade reúnem três livros do mestre Abelardo sobre a matéria, enriquece e ilustra os estudos de Direito Romano, contendo, para tanto, o programa idealizado por seu autor, a partir dos primeiros conceitos de Leibnitz,Poponius eGaius, passando pelasOrdenações (Lei das SetePartidas),pelo Direito Civil Português, Canônico e Germânico, Ibero-Americano, até chegar ao Monumento Jurídico do nosso Clóvis Bevilácqua.

Sobre o autor, valho-me das notas contidas às páginas 665-6, do volume em referência [Notas sobre o Autor], transcrevendo-as na íntegra, para o conhecimento de alguns maranhenses, que pouco ou nada sabem, pela escassa divulgação feita até aqui, sobre esse nosso ilustre conterrâneo: Abelardo [Saraiva da Cunha] Lobo nasceu em São Luís do Maranhão em 24 de janeiro de 1869 e faleceu no Rio de Janeiro em 12 de maio de 1933. Filho de Cândido Emílio Pereira Lobo Júnior e de Maria Benedita da Cunha Lobo. Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito do Recife, em 10 de novembro de 1888. Doutorou-se na mesma Faculdade, em 24 de dezembro de 1889. Nomeado em 24 de janeiro de 1890, aos 21 anos de idade, para o cargo de Juiz Municipal da Comarca de Barra do Corda [Maranhão]. Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1891, sendo nomeado cônsul em Vera Cruz, no México, posto ao qual renunciou porque o Marechal Deodoro da Fonseca havia dissolvido o Congresso Nacional, e ele, Abelardo Lobo, fora contrário a esse golpe. Casou-se com Alzira Mesquita Bastos, em 18 de novembro de 1893, no Rio de Janeiro. Militou na advocacia. Foi o primeiro colocado no concurso público para Professor Substituto da 3ª seção da antiga Faculdade Livre de Direito do Rio de Janeiro, que compreendia a disciplina Direito Romano, Direito Internacional Privado e História Geral do Direito, sendo nomeado, incontinenti, professor de Direito Romano. Participou de vários congressos internacionais e pronunciou inúmeras conferências. Seu Curso de Direito Romano, em sete volumes, [sendo nesta edição que agora nos referimos somente reunidos os quatro primeiros tomos que abordam a parte histórica, muito divulgada nos meios jurídicos da Europa e América]. Com a República, foi eleito Constituinte pelo seu Estado natal. Nomeado pelo GovernoProvisório membrodaSubcomissãopelos seus pares, professores FiladelfoAzevedoePereiraBraga, dando eficaz colaboração na “Primeira Parte” do Código de Processo Civil. Doutor Honoris causa pela Universidade de Buenos Aires (Argentina), e de San Marcos, de Lima (Peru). Grande Oficial da Ordem do Sol (Peru).

Abelardo Lobo tornar-se-ia um dos principais pioneiros dos estudos do Direito Romano entre nós. Participou ativamente da Escola do Recife, associando seu nome aos dos intelectuais de nomeada como Tobias Barreto, SílvioRomero, ClóvisBeviláqua,CapistranodeAbreu,GraçaAranha, UrbanoSantos, ArturOrlando,Araripe Júnior, Gumercindo Bessa, Martins Júnior...

O Curso de Direito Romano, de Abelardo Lobo, é um clássico, entre nós, escrito à intenção de seus alunos. O Curso reflete uma grande cultura e erudição, e é o segundo a ser escrito no Brasil, antecedido apenas pela

História Interna do Direito Romano Privado, de outro maranhense, Luís Antônio Vieira da Silva, formado em Direito e Cânones pela Universidade de Heidelberg, na Alemanha.

Neste livro encontra-se a seguinte dedicatória, o que externa o grande amor de Abelardo Saraiva da Cunha Lobo pelo seu torrão natal:

“Ao meu longínquo Maranhão”.

“Quanto mais longe de mim te vejo no tempo e no espaço que nos separam, mais perto de ti sinto-me na irredutível singularidade de minha profunda e desinteressada afeição”.

Abelardo Lobo, Rio de Janeiro, 24 de janeiro de 1935.

Trabalho enfeixado em “Toda prosa” Vol. II de “Travessia” [histórias de um aprendiz de poeta e outras mentiras], de Fernando Braga, ainda em organização.

HERCULANA FIRMINA VIEIRA DE SOUZA - uma das primeiras historiadoras do Brasil.

DIOGO GALHARDO NEVES

Entre meados e fins do século XIX, foi professora na vila de Cururupu, Maranhão. Autora de várias publicações, teve no livro “Resumo de Historia do Brazil (1500-1840)” seu título mais afamado, publicado em São Luís em 1868.

No cenário maranhense e brasileiro, um livro de História publicado por mulher, no momento em que o país buscava seus referenciais como nação, era algo particularmente raro.

Herculana Vieira viveu até 1903, mas infelizmente é muito pouco conhecida, mesmo no Maranhão. Sua trajetória atualmente é objeto das pesquisas da historiadora Jeane Melo.

Almanak Administrativo da Provincia do Maranhão (MA)

Ano 1870\Edição 00002

NOTAS DO EDITOR

MULHER, PROFESSORA E HISTORIADORA DOS OITOCENTOS: Herculana Firmina e seu Resumo da História do Brazil (1868)PDF Download grátis (docplayer.com.br) Jeane Carla Oliveira de Melo

Ano 1855\Edição 00077 (1) Diario do Maranhão (MA) - 1855 a 1911

Ano 1859\Edição 00002 (1) Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial (MA) - 1858 a 1868

Ano 1860\Edição 00001 (1) Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial (MA) - 1858 a 1868
Ano 1864\Edição 00001 (1) Almanak Administrativo da Provincia do Maranhão (MA) - 1869 a 1875
Ano 1865\Edição 00008 (1) Almanak Administrativo da Provincia do Maranhão (MA) - 1869 a 1875
Ano 1866\Edição 00009 (1) Almanak Administrativo da Provincia do Maranhão (MA) - 1869 a 1875

Ano 1868\Edição 00035 Semanário Maranhense (MA) - 1868 a 1869

Pietro Castallamres

Ano 1868\Edição 00090 (1)

Ano 1869\Edição 00086 (1)

Ano 1869\Edição 00001 (1) Almanak Administrativo da Provincia do Maranhão (MA) - 1869 a 1875 Ano 1870\Edição 00002 (1) Almanak Administrativo da Provincia do Maranhão (MA) - 1869 a 1875 Ano 1871\Edição 00003 (1) Almanak Administrativo da Provincia do Maranhão (MA) - 1869 a 1875

Ano 1873\Edição 00005 (1) Almanak Administrativo da Provincia do Maranhão (MA) - 1869 a 1875

Ano 1874\Edição 00006 (1) Ano

1880\Edição 01925 (1) Diario do Maranhão (MA) - 1855 a 1911

Ano 1880\Edição 01951 (1)

XENOFOBIA: PALAVRAS AO VENTO? NÃO

OSMAR GOMES DOS SANTOS

Nunca busquei agir sob a luz do determinismo, não deixando que fatores ideológicos interferissem em minhas condutas. O olhar do outro é deveras importante, as visões de mundo que nos chegam, somam-se às nossas e enriquece aquilo que já temos. Mas se todas e todos têm um tanto de intolerante em si, eu diria, no meu caso, ficou reservado para a discriminação.

O caso do vereador de Caxias do Sul, senhor Sandro Fantinel, que ganhou, com toda razão, repercussão estrondosa dias anteriores é um desses casos que temos que abominar de pronto. Aí sim, deve predominar a intolerância.

Devemos ser intolerantes com o mal, com aquilo que separa a sociedade, com práticas que vão contra os princípios constitucionais, especialmente que tratam da igualdade e da dignidade da pessoa humana. Intolerantes sim, mas com base legal, assegurando o devido processo para apurar e punir práticas que não encontram espaço em nosso ordenamento.

Contra fatos não há argumentos, tampouco pode haver argumentos contra fatos que estão devidamente embasados em argumentos proferidos pelo próprio vereador, sem intermediários. É ele quem toma posição na tribuna de um parlamento e dispara palavras em alto e bom som, de forma clara, que atingiram não apenas aos baianos, mas toda “gente lá de cima” por consequência.

Gente lá de cima? Sim, mas também do meio, de baixo, de um lado e do outro. Do Chuí ao Caburaí, do Seixas à Contamana. Gente, povo, pessoas. Brasileiros e brasileiras que para cá vieram e aos daqui se juntaram para formar uma só nação: plural e diversa em cultura, religião, etnias.

Causa espanto que um “representante” eleito pelo povo use a tribuna para se manifestar em defesa de atos praticados por empresários da região, que denotam clara configuração de trabalho escravo. Para resumir, desrespeito a direitos, exploração, convívio em espaços sem condições de higiene para, ao cabo, fornecer insumos para produção dos famosos vinhos e espumantes da Serra Gaúcha.

O vereador saiu em sua defesa. Alegou usar “palavras ao vento”, que não vieram do “coração”. Obviamente, tais palavras vêm do sistema cognitivo, que tem como órgão central o cérebro, cuja faculdade nos permite ter o discernimento necessário. É onde se acumula nosso conhecimento, trazido ao longo de nossa vida.

Assim, não se pode querer defender que foi algo “fora de contexto”, em “lugar inapropriado”. A discriminação não encontra lugar, ponto! Não seria a mesa de bar ou a despretensiosa conversa de esquina um local mais adequado para este ou aquele assunto. As palavras de desculpa não convencem, tampouco suas sórdidas “lágrimas”.

Explicações trazidas só tornaram pior o que parecia já estar péssimo. Mas que bom não ter ficado calado após todo descalabro. Assim, o Brasil pôde ter a certeza de que não houve má interpretação e que as falas foram preconceituosas: “a minha esposa, o pai dela é africano”. Bah, guri! É de espantar tal afirmação, tanto quanto aquela em que diz ter amigos na Bahia, tchê.

Como negro e de família pobre que sou, posso dizer que sobre as palavras ditas após o episódio, esforceime para acreditar em uma expressão: “não passou pela minha cabeça diferença de cor ou raça”. Se isso é verdade, somente prova o quanto já estão naturalizadas em sua conduta as atitudes discriminatórias. Não pensa, apenas age de forma atentatória à dignidade das pessoas em função de sua cor, origem.

Falas que ofendem não apenas os baianos, mas todo povo brasileiro, especialmente aos aqui de cima, do Norte e Nordeste. Ofensa aos escravizados em questão, mas, também, aos próprios argentinos, como se natural fosse a submissão às condições degradantes encontradas naquela ocasião.

Escravidão “moderna”, que acomete os menos favorecidos, que não lhes foi oportunizado estudo adequado, que precisam deixar suas famílias em várias partes do país, inclusive na região sul, para buscar oportunidades temporárias nas safras sazonais Brasil afora.

Sua família, fato, no caso em tela, nada tem a ver com as palavras estapafúrdias proferidas pelo vereador. Não sendo justas quaisquer ameaças a ela destinadas, sob condição de agirem os agressores tal como agiu o agente político e estando eles passíveis de responsabilização. Em um Estado-nação positivado, o mal não se paga com o mal, mas segundo a lei.

Em tempo, o Patriotas, partido ao qual o vereador tinha filiação, anunciou sua expulsão. A Câmara emitiu uma nota modesta, daquelas típicas de que se trata de caso isolado e que não reflete o “pensamento” da Instituição. Em seguida, a Casa acatou o pedido de cassação, que vai tramitar naquele Parlamento.

Em tempo, é bom que se diga, o baiano é sim um povo festivo, que bom! Maior litoral do país, Estado de belas praias, gente acolhedora e muito trabalhadora. Mas também um povo de festas, alegre, tanto quanto os demais brasileiros, cuja cultura riquíssima deve ser celebrada. Carnaval da Bahia é maravilhoso, tanto quanto o do Rio. O São João encanta e faz o Nordeste ferver nos meses de junho e julho. Brasil de muitos ritmos, como a Polca dos gaúchos, que também tem suas festividades comemoradas, como a Festa Farroupilha e o Natal Luz que fascina milhões todos os anos. Num enredo Caprichoso, temos sempre Garantido o Festival Folclórico de Parintins, a Festa de Reis, Congada, Festa do Divino, Círio de Nazaré, Oktoberfest, Cavalhadas, Festa do Pinhão. Oxi, meu Brasil, és tu um gigante, visse! País capaz de guardar nos teus limites todas as condições para todas as “tribos” em plena harmonia.

És uma nação, de um povo único e heroico, de brado forte e que segue retumbante, para que os “lapsos mentais” não encontrem espaços nas relações sociais que ameaçam a igualdade tão buscada com braços fortes e que os raios sigam brilhando, para todas e todos, no céu de sua pátria.

*Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís.Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.

DEIXE-ME VIVER

OSMAR GOMES DOS SANTOS

Por séculos fui subjugada aos caprichos de um ordenamento sustentado sob falsos argumentos, inclusive religiosos. Tinha uma única função: a de reproduzir, gerar vida, como se vida própria não tivesse.

Retardaram meus direitos, extirparam minha dignidade, escondida sob o véu do patriarcado e as vestes justificadas por uma interpretação infundada da palavra. Fui reprimida, fui impedida, fui proibida.

Tolheram-me a beleza, a pureza, o prazer. Arrancaram-me do rosto o sorriso, seja com a burca ou com a dor que formaram cicatrizes do tempo sobre uma face calejada de uma vida de submissão e sofrimento.

Sob o julgo religioso, ainda que metafórico, fizeram-me surgir da costela do homem. Tal preceito não se investe de direito. Se Deus criou a todos e todas nós a sua imagem e semelhança, justificativa não se encontra para submissa eu estar.

Chega! Já sofri demais. Por muito tempo apagaram meus sonhos, arrancaram-me os estudos, fecharam as portas do mercado de trabalho, como se imprestável eu fosse. Só não tiraram minha esperança.

Não me concederam um lugar digno na sociedade. Aquém disso, sequer discutiram se caberia a mim lugar algum, que não aquele das aparências de uma boa e recatada mãe e esposa. Isso se eu prestasse para tal ofício.

Fui usada, abusada, possuída. Tão cedo arrancaram-me a pureza. Tudo contra a minha vontade. Não me perguntaram sobre sentimentos, tampouco o que desejava eu. Opinião, vontade? Não ficou para mim, pois já vim ao mundo sem.

Desde a tenra idade. Conduta, vestimenta, regras, comportamento, gestos, palavreado. Códigos de uma sociedade que me apagou. Compelindo-me a um quadrado perfeito, como se imperfeita eu fosse.

Mas acordei! Livrei-me dos nós das amarras que ainda insistem em me entrelaçar. Mas a caminhada me deu jogo de cintura e já não me permito esse cabresto. Rótulos e estereótipos são meras tentativas de me fazer voltar a um lugar no qual não deveria ter estado.

Chega! Quero meu espaço no mundo, pois carrego um mundo que já cabe mais em mim. Não quero gracejos, favores, sorrisos. Não quero favores, tampouco facilidades. Quero viver junto, ou só, mas quero viver.

Não quero esperar o 8 de março para receber elogios, flores, mensagens, atenção. Não quero o politicamente correto por obrigação, ser personagem de uma trama social na qual se ganham likes por ações simpáticas em datas importantes.

Quero ser vista olho no olho, lembrada, amada, valorizada todos os dias do ano. Algo de errado nisso? Quero fazer minhas escolhas, minhas roupas, meu cabelo, maquiagem. Não quero e não preciso de dono, pois dona de mim já sou.

Já não estou sob suas presas, seu julgo, seus caprichos. Um dia precisei de sua permissão até para votar; hoje, sou eleita também com o seu voto. Dirijo, por sinal muito bem. E não apenas carro, mas o trem, o avião, o navio, empresas, cidades, estados, nações.

Não tente mais me calar. Não tente mais tirar de mim a alegria, o sopro divino que me impulsiona a seguir adiante. Estudo, acordo cedo, empreendo, mantenho a casa, tal qual você. Iguais em direitos.

Entenda de uma vez que virei a página das construções sociais que me impuseram valores com os quais não me identifico. Sou mulher, quero viver, quero respeito, quero equidade. Não quero que me digam onde devo estar, mas quero estar onde eu quiser.

*Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís.Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.

OSMAR GOMES DOS SANTOS

A população mundial cresceu! Nações entraram em um frenético ritmo de mudanças que ainda não me convenci se trata de progresso, evolução desenvolvimento ou se apenas uma disputa incessante na qual buscamos superar nossos comuns a todo custo.

Criminosos estão de plantão para cometer os mais diversos tipos de delitos, com destaque para os cibernéticos que envolvem golpes, invasão de dispositivos e roubos de dados sensíveis e acessos a informações financeiras e confidenciais; porém o alerta que mais nos interessa aqui é o que devemos adotar com as nossas crianças. Em uma conjuntura social na qual nos acostumamos a dizer sim para tudo, é preciso entender que há limites a serem colocados e alertas a serem feitos de forma permanente.

O caso da menina de 12 anos que foi sequestrada e mantida em cárcere privado na última semana, teve repercussão nacional e causando espanto a todos. Ao mesmo tempo, nos traz diversos alertas sobre cuidados a serem tomados quando acessamos “o mundo” pelo nosso celular.

Outro aspecto que traz impacto é que a mesma criança de 12 anos, segundo o homem que a sequestrou e dela abusou, já mantinha contato desde quando a mesma tinha apenas 10 anos. Ela no Rio de Janeiro e ele em São Luís. Parece roteiro de ficção moderna com traços de uma realidade que extrapola a razoabilidade, mas foi assim mesmo que aconteceu. Troca de mensagens, viagem ao Rio, sequestro, uma corrida de aplicativo e ambos estavam em terras ludovicenses. Soa estranho, entretanto essa é a versão do abusador.

O bizarro é que a história parece ter muitas pontas soltas. Ida a outro estado, busca na porta da escola, um motorista que topa cruzar mais de 3 mil quilômetros, alimentação e hospedagens. Além do fato de, em tese, não ter o motorista do app desconfiado de absolutamente nada ao longo de, pelo menos, três dias de viagem.

Conversa para boi dormir (como dizem os mais velhos) ou não, o fato é que o crime foi cometido e uma criança, infelizmente vítima do criminoso. O alerta cabe a todos nós: pais, mães, parentes, professores, autoridades, sociedade.

Como pode um criminoso estar ao mesmo tempo tão longe e tão perto? A transformação mundial, que vem a reboque das tecnologias, nos transportam para além fronteiras de uma vasta aldeia global e ao mesmo tempo, traz perigo para dentro da nossa casa. Inocentemente, abrimos as janelas para criminosos e a pessoas más intencionadas. Simples joguinhos, aplicativos, redes sociais, podem esconder perigos, notadamente para as crianças, muitas delas ainda sem devida razão para discernir o certo e o errado, o bem e o mal.

Talvez as plataformas tenham uma dose de culpa, pois deveriam possuir mecanismos mais seguros para confirmar a idade dos usuários; todavia o cuidado maior deve estar dentro de casa. Estar atento a tudo e a todo momento.

Não falamos aqui de quebra de privacidade, mas de autoridade que deve existir na relação entre pais e filhos. Conhecer os colegas, saber com quem conversa, monitorar aplicativos ou mesmo nem autorizar o uso de alguns.

Em um mundo de aparências que navegam nos bits das redes sociais, crianças estão cada vez mais buscando espaço nesse mundo virtual, passando a alvos fáceis de facínoras de plantão. Ao pior enredo Chapeuzinho Vermelho dos tempos modernos, pedófilos, estupradores, charlatões e lobos estão na espreita, disfarçados de amiguinhos, amiguinhas, vovozinhas.

Onde nem tudo que parece é, todo cuidado é pouco e a vigilância tem que ser redobrada. Tecnologias são importantes e estão cada vez mais presentes em nossas vidas, porém é preciso que se use com responsabilidade, ou melhor, que ainda se permita a concorrência com bons livros, programas educativos e hábitos saudáveis.

Por fim, estabelecer relações transparentes, com base no diálogo, ainda parece ser o melhor caminho para se alcançar o nível de maturidade e confiança desejados, tudo no tempo certo. Lugar de criança não é nas redes, mas nos bancos de escola, brincando de bola ou de boneca.

DO OUTRO LADO DA TELA

O SENSO ESTÉTICO DE OSWALDINO MARQUES

FERNANDO BRAGA

Oswaldino Ribeiro Marques nasceu em São Luís do Maranhão, em 17 de outubro de 1916 e faleceu em Brasília-DF, em 13 de maio de 2003. Abriu seu caminho a golpes de tenacidade e mercê de inquebrantável adesão aos valores da inteligência. “Se não fosse escritor, gostaria de ser matemático ou físico nuclear”, dizia convicto com as exigências que tinha consigo.

Ao falar-se de Oswaldino é bom que se diga qual foi o ponto de ligação que houve entre sua geração maranhensede30, com os ecos da‘RevoluçãodeArteModernade22’,eé justamentesobreissoqueoescritor Rossini Corrêa em seu belo livro ‘Atenas Brasileira – A Cultura Maranhense na Civilização Nacional’, Thesaurus Editora, Brasília, 2001, à pág. 187, nos diz:

“O ambiente cultural ludovicense não foi contemporâneo do eixo construtor do modernismo brasileiro, na década de 20: ‘os revoltosos assustam no Maranhão’, reconheceria Odylo Costa, filho. Sem movimentos, sem manifestos, sem revistas, sem articulação interativa e sem livro-marco de reconvenção estética inserto na moderna história literária do Brasil. São Luís, na realidade, ficou à revelia do itinerário imediato de expansão da mudança modernista em curso no País. São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, sim. Pernambuco, Paraíba, Rio Grade do Norte e Alagoas, também. No Pará, menos. No Maranhão, não. Se alguns poucos sonharam em ensaiar a luta renhida, perderam a batalha que, em visão crítica, não vingou em terras gonçalvinas. O principal modernista maranhense, jovem da década de 20, foi Nunes Pereira, uma espécie de Raul Bopp fugindo do passadismo, que estava diante do seu mestre Mário de Andrade, em Natal, vindo de Belém, onde frequentara tertúlias peripatéticas. E, no Maranhão, nada de Nunes Pereira”.

Avesso às academias e a ciclos literários, Oswaldino Marques, não sei por que, cargas d’água, pertenceu ao ‘Cenáculo Graça Aranha’, ao lado de alguns dos seus mais legítimos companheiros da geração de 30, como Josué Montello, Franklin de Oliveira, Manuel Caetano Bandeira de Mello, Amorim Parga, José Erasmo Dias, Sebastião Corrêa, Paulo Nascimento Moraes, Ignácio Rangel e outros, “a buscar o sonhado caminho’ apregoado pelos cânones do modernismo de 22, o qual no Maranhão, como se viu, foi “febril e transitório, enquanto que, para o ideal de glória da mitológica tribo timbira, sempre a eternidade foram deusa e rainha sedutora”, como nestes versos do próprio Oswaldino Marques: “E sinto quanto mais contraditória/ é a fortuna de minha realidade:/ ter por órbita a vida transitória/ e em torno a mim só ver eternidade”.

Não procuraram e nem acharam ideia modernista nenhuma. Sobre o ‘Cenáculo Graça Aranha’, é Josué Montello que nos diz:

“Éramos românticos, e não sabíamos. O Cenáculo não publicou livros, não promoveu conferências, não empossou nem enterrou ninguém. Na verdade, pensando bem, foi uma bela ficção. Cada um de seus membros fundadores tomou rumo próprio, ficando em São Luís ou dali saindo. Tão completa foi a sua extinção que dele não restou o livro de atas, nem o álbum de recortes. Apenas uma tabuleta”.

Em 1936, Oswaldino zarpa de navio para o Rio de Janeiro, onde já lá estavam Montello, Franklin e Bandeira de Mello. Na velha capital, o mais tarde tradutor de Whitman, se torna um dos fundadores da União Nacional de Estudante-UNE, onde trabalhou como bibliotecário e tradutor, tendo sido um dos responsáveis pela divulgação da poesia moderna estadunidense no Brasil. Em 1965, mudou-se para Brasília, como servidor do Ministério da Educação, transferido do Rio de Janeiro. Por concursos, assumiu a cátedra de Teoria da Literatura na Universidade de Brasília [UnB]. Com o agravamento da ditadura militar no Brasil, o mestre Oswaldino a trilhar pelos caminhos do marxismo, foi demitido do cargo, se autoexilando nos Estados Unidos, aonde foi professor visitante das literaturas portuguesa e brasileira, na Universidade de Madison, Wisconsin.

Algum tempo depois, em 1991, via anistia, foi reintegrado à UnB pelo Reitor Cristovam Buarque. Oswaldino Marques era por temperamento retraído e viveu os últimos anos praticamente isolado em seu apartamento em Brasília, onde dedicava seus dias à leitura e a ouvir músicas. Quantas vezes, a seu convite, participei desses momentos silentes ao seu lado, entre clássicos e músicas de câmera de sua predileção, a degustar, por vezes, um delicioso ‘mingau de milho’, à moda maranhense, que em outras plagas chamam de ‘canjica’, preparado por Maria do Carmo, sua mulher. Infelizmente, Oswaldino se dizia ateu, mas não por isso, mas por outros, ‘caprichos’, deixou registrado em cartório, que não desejava qualquer tipo de cerimônia religiosa quando de seu sepultamento, nem discursos, e nem flores, e nem velas, o que foi seguido à risca por sua mulher e seus filhos, o gravador Igor Marques e o também escritor Ariel Marques.

Sintamos o quanto o Padre António Vieira tinha razão quando proferiu o seu famoso sermão a ‘Quinta Dominga da Quaresma’ ou ‘Sermão das Mentiras’, Rossini Corrêa [Op.cit. p.224], diz assim:

“Tribo conflitada e desunida a maranhense, que, no passado, falava mal de si às escondidas, como Humberto de Campos a comentar livro de Coelho Neto, no ‘Diário Secreto’: “Recebi um livro de Coelho Neto. É um punhado de crônicas de jornal, em que seguem os lugares-comuns, se sucedem as expressões banais, os termos de gíria, as frases feitas, compondo páginas sem relevo, sem interesse, sem beleza, uma grande piedade, uma grande dó...” [...] Atualmente, porém o duelo travado em terra estranha é público e notório, à faca peixeira, com fratura exposta, massa cerebral perdida, hemorragia desatada e de vísceras caídas por terra, como o servido em Brasília-Rio, por Oswaldino Marques e por Josué Montello. Combate, este, que inspirou ao primeiro a corrosiva e inédita produção poética, que substitui, em sua concisão, todo um banquete psicanalítico. Em: ‘Auto-epitáfico’– “Oswaldino aqui jaz./ De vezo polêmico, /índole indomada. /Zero contumaz/na vida foi nada/nem mesmo acadêmico”.

O que Rossini Corrêa atiça acima esmiúço abaixo, como ilustração a este dedo de prosa, e para que o leitor entenda melhor essa ‘luta corporal’ que em nada espantaria Ferreira Gullar: Oswaldino e Josué foram colegas no Liceu Maranhense por todo o curso de humanidades; tinham precisamente a mesma idade; ambos intelectuais de fina estirpe; Oswaldino foi ‘eminência parda’ de Montello quando este exerceu a direção da BibliotecaNacional, mas,infelizmente,um pelo outronutriauma‘rezingafigadal’,umacoisatalvezexplicada pela ‘reencarnação’. Oswadino era terno e generoso em gestos e delicadezas, mas quando se apoquentava, por qualquer coisa, perdia as estribeiras, sem medir consequências e sem economizar adjetivos, o mesmo acontecendo com Josué Montello, o que fazia dos dois, apesar de adversos, mais que semelhantes. Um belo dia, pela década de 80, um ‘Macunaíma’ qualquer, à guisa de fuxico, o instigou em relação a um ‘disse-medisse’ que Josué Montello houvera verbalizado sobre sua pessoa, o que na linguagem cibernética de hoje seria traduzido como ‘fake news’. Pelo sim, pelo não, Oswaldino surtou com que ouvira do ‘herói sem nenhum caráter’ e foi às pressas para o ‘Correio Brasilienze’ onde abriu as ferramentas contra Josué, num artigo intitulado ‘Desmontele-se’, o que imediatamente, o autor de ‘Os Tambores de São Luís’ respondeu pelo ‘Jornal do Brasil’ ao tradutor de Blake, num outro artigo, intitulado ‘Arquive-se’. Foi uma ‘batalha romanesca e ensaística’ espetacular, o que me faz rir até hoje quando as leio; guardei esses artigos comigo, de duas páginas inteiras cada um, devidamente catalogados em hemeroteca; são duas preciosidades literárias, que em matéria de ‘insultos em alto estilo’ nada existe semelhante em língua portuguesa, nem mesmo os terríveis epigramas trocados por Bocage e Caldas Barbosa na velha Arcádia Lusitana, ou as farpas trocadas entre Alexandre Herculano e seus ‘indesejados’ colegas da Torre do Tombo. Uma maravilha de briga literária!

De sua extensa bibliografia, eis aqui alguns livros e antologias de Oswaldino Marques: ‘Poemas quase dissolutos’, 1946; ‘Cantos de Walt Whitman’, 1946; ‘O poliedro e a rosa’, 1952; Cravo bem temperado, 1952; ‘Usina de sonho, 1954; ‘Videntes e sonâmbulos’, 1955; ‘Poemas famosos da língua inglesa’, 1956; ‘A seta e o alvo’, 1957; ‘Ensaios escolhidos’, 1968; ‘O Laboratório Poético de Cassiano Ricardo’, 1976; ‘A dançarina e o horizonte’, 1977, ‘Livro de sonetos’, 1986.

“[...] Em seus poemas, onde a beleza formal jamais se afasta da substância, em seus ensaios críticos, onde a arguta percepção está informada do mais dignificante calor humano, em suas traduções exemplares, [William Blake, Walt Whitman, T.S. Eliot] onde a fidelidade ao espírito criador original não está contida pela inevitabilidade da redução, sendo antes recriações válidas e autônomas, o escritor maranhense oferece generosamente o melhor de si [...] “A sensualidade de nossos trópicos se torna evidente mesmo quando os temas são aparentemente intemporais e forâneos”, disse dele o amigo e editor Ênio Silveira.

Escutemo-lo, em seguida, em ‘A dançarina e o horizonte’: “Em luz resplandeceu minha palavra/ e se fez sol interior, mental:/ sob seu calor agora torno à lavra/dos campos da sintaxe e do real”. Por fim, ouçamo-lo neste ‘Homo sum’, enfeixado em ‘Poemas quase dissolutos’: “Há nos meus ombros vestígios de asas,/Guardo zeloso uma rica herança de voos;/Não esqueci, de todo, os segredos da levitação,/E me vanglorio de flutuar ainda como leve paina no espaço!/Tem sua obscura razão este ingênuo amor pelas nuvens,/Esta infantil ternura pelas franzinas borboletas,/E o orgulho de atirar o rosto para as estrelas./Mas, ai! apalpo no meu cóccix também uma cauda atrofiada,/ Que em vão dissimulo e dissimulo com meu enganador manto celeste. /Besta e anjo um meridiano me corta em zonas de luz e treva, /De um dos meus lados nasce a aurora, /O outro é a úlcera de onde jorra a noite. / Ai! Que desgraça ser o antípoda de si mesmo! /Viver se despenhando em violentas diagonais de contradições. / A mão pura e a impuras pendentes do mesmo tronco. /O olho cego e o são coexistindo na mesma face. /O lábio podre e o eterno modelando estranhas palavras híbridas.”

A última vez que conversei com Oswaldino Marques, não preciso quando, foi no gabinete em que dividia com HerbertoSalesadireção doInstitutoNacionaldoLivro[INL]em Brasília.Tenhosaudadedesuagenerosidade e de suas colocações discursivas, sempre em altíssimo nível. Ele foi, repito, um querido amigo e um escritor que honra a Literatura Brasileira!

*Fernando Braga, in ‘Conversas Vadias’ [Toda prosa], antologia de textos do autor; Ilustração: Foto de Oswaldino Marques, do acervo de Antônio Miranda.

RESENHA: "CAIXA-PRETA (SALVARAM-SE TODOS OS BONS SENTIMENTOS)".

MHARIO LINCOLN

“Tudo isso, magicamente transmutado numa linha de raciocínio prudente e decisivo, com a segurança de quem escreveu cada parágrafo com um pedacinho de sua alma; e do preto e branco, coloriu sua realidade, ancorando a apoteose do texto nos parágrafos, vírgulas e pontos”. (Mhario Lincoln).

Há muito tenho evitado ler manuais de autoajuda. Contudo, quando abro este exemplar de “Caixa-Preta”, de Joseana Sousa, o impacto é de tal forma surpreendente que a emoção torna-se clara e abundante, a partir de duras e reais experiências da autora, como na página 25, quando discorre sobre o suicídio do pai biológico, acompanhado no alto de seus 2 anos de idade.

Confesso que o contexto deste livro é forte, o que vem mostrar um outro lado da moeda, bem aquiescido numa das frases de Osho: “Se você é positivo, então, nada é negativo, pois você é o criador de seu próprio mundo”.

Está aí toda a beleza desta obra, onde mostra uma Joseana Sousa, bem perto do que se delimita ser uma humana Índigo, de acordo com tese dos norte-americanos Lee Carroll e Jan Tober, isto é, pessoas evoluídas, nascidas com um propósito de impulsionar o desenvolvimento do Planeta, em diversas atividades. Porém, por terem um estágio mais avançado de pensar o mundo, geralmente enfrentam graves conflitos em seus núcleos familiares e fora dele, ratificando o pensamento de Osho, citado acima.

O livro é forte, conta experiências multidoloridas, mostra situações desumanas, inacreditáveis, incansáveis e humilhantes, até. Mas não é um romance shakespeariano narrado em primeira pessoa. É, na verdade, um belo compêndio de superação.

"Caixa-Preta" transmite uma realidade incomum. Leva a participar de cada evento intrínseco, de cada vivência ali descrita, fortalecendo toda a estrutura orgânica, quando “os acidentes”, como fala a autora, são transformados em pedra de torque para tornar fortes os sentimentos de quem o lê.

Assim vejo esta obra. Uma representação hercúlea do que ela mesmo escreve, "... não cabe a nós mudarmos o começo. Mas podemos querer, imaginar e fazer um novo fim."

Vale explicitar outra questão interessante: a inclusão, ao final de cada capítulo, de auto-questionários. Isso não é inédito. Porém, o ineditismo se prende ao fato de ser incentivada uma avaliação comparativa das

vivências da autora e do leitor. Exatamente aí, a diferença abissal entre "Caixa-Preta" e alguns outros livros congêneres. Assim, Joseana não impõe o seu modus vivendi, como verdade absoluta. Ela deixa o leitor livre para respirar suas próprias conclusões. Simplesmente genial!

Ademais, há um outro lado bem característico da autora: a extraordinária fluidez da linguagem discorrida nas páginas deste livro. Às vezes, são parágrafos aterrorizantes - morte do irmão Cláudio ou suicídio do pai biológico. Nesses casos, como num passe de mágica, acaba saindo da boca inconsciente de quem lê: “ ela vai superar isso…”. É extraordinário quando o leitor torce pela autora conseguir seu objetivo.

Mas, não termina aí a beleza da linguagem. Em outros capítulos, senti-me como se a escrita fluísse de forma iniludível, como quem conta fábulas de Esopo. Acho, até, que para formatar um tipo de configuração léxica tão interessante, além dos insights vivenciados, Joseana acabou trazendo algumas influências benéficas, referenciadas pela pedagogia de Maria Montessori, experiências de Donald Winnicott, pediatra e psiquiatra inglês e a Antroposofia, cultuada pelo austro-húngaro Rudolf Steiner.

Tudo isso, magicamente transmutado numa linha de raciocínio prudente e decisiva, com a segurança de quem escreveu cada parágrafo com um pedacinho de sua alma; e do preto e branco, coloriu sua realidade, ancorando a apoteose do texto nos parágrafos, vírgulas e pontos.

Desta forma, Joseana Sousa convence, porque escreve com palavras do coração, as quais servem, sim, de base para a solução de vários casos de superação especificados no livro, atingindo o objetivo que lhe era favorável naquele momento da vida, como lá pelas páginas 59, quando narra sua tentativa de fuga da cidade natal com apenas 10 anos, em razão de ter suposto ser reprovada de ano e que, por essa razão, poderia levar uma violenta surra.

Arquitetou tudo, mas foi pega e trazida de volta para casa. Vejam só que beleza de conclusão quando ela escreve, “(…) eu não me lembro da surra, então, acho que não apanhei. Ah! Também não reprovei no final do ano. (…)”. Viu que sutileza?

Dessa forma, o leitor atento, imediatamente tira suas conclusões sobre a antecipação do sofrimento e outras coisas inerentes ao contexto. Esse é o mote para que, ao final do capítulo, o leitor responda a questionários inteligentes sobre ele mesmo e não sobre o que a autora pressupôs. Entendeu como funciona?

A beleza desse livro vai muito além das nuvens de um céu de brigadeiro, navegado por uma piloto da aviação brasileira. Reúne força, dinâmica, autoconfiança, ambição e, em muitas páginas, ensina algumas características indispensáveis para uma grande liderança.

Aliás, “...grandes líderes quase sempre são grandes simplificadores. Conseguem passar por discussões, debates e dúvida para oferecer uma solução que todos possam entender.” – Colin Powell, secretário de estado norte-americano. É assim o livro “Caixa-Preta”. Induz o leitor a um entendimento prático, tendo como base, as discussões, os debates/embates e soluções da autora.

Portanto, quem chegar ao final dessas páginas, se sentirá indubitavelmente envolvido por algo parecido com um gestor de alta performance, liderando o seu time, onde cada integrante conseguirá extrair de si mesmo, o máximo, reavaliando forças e fraquezas, construindo “steps” crescentes, com base firme num elo entre o leitor e a autora. É a força de um energizando o outro, em prol de um objetivo comum.

Estou maravilhado com esta obra e vou seguir ao pé da letra, o que Joseana Sousa (ou Claudiane, como a conheciam em São Domingos, no Maranhão, onde nasceu), disse: “Aterrissagem autorizada: ouse e vá além. Ou, então, escolha decolar”.

Joseana Sousa. (Divulgação).

QUEM É JOSEANA SOUSA

Joseana Sousa é Psicanalista, Master Coach Trainer Sistêmica, certificada por renomadas instituições nacionais e interna- cionais, como European Coaching Association (ECA), Behavioral Coaching Institute (BCI), Metaforum Internacional, Instituto Bra- sileiro de Coaching (IBC).

Bacharel em Ciências Aeronáuticas, Pisicanalista Clínica, Psicoterapeuta, com MBA em Treinamento Desenvolvimento Humano e Coaching, Pós-Graduação em Constelação Sistèmica e Hipnose Ericksoniana, Master Trainer.

Analista Corporal e Comportamental, Piloto de Avião e apaixonada por desenvolvimento pessoal. Empreendedora e Criadora do Método Caixa-Preta.

Já atendeu centenas de mulheres em diversos países, entre eles Austrália, Noruega, Itália, Espanha, Portugal, Moçambique e Brasil.

"POESIA E FILOSOFIA: EM BUSCA DO PENSAR QUE POETIZA"

ROGÉRIO ROCHA

Poesia e Filosofia, portanto, tiveram por arkhé (princípio) um “páthos” (espanto). Foram tomadas pela vertigem provocada ao defrontarem-se com as “aporias”, com a incerteza presente no íntimo de cada recorte da realidade, na dúvida radical que as empurrou na direção de seus intentos formadores. Daí o motivo pelo qual Alberto Pucheu as denominou de “espantografias”. (RR).

Proponho-me a discorrer sobre a suposta relação entre importantes áreas da cultura. Relação fundada há, pelo menos,doismilequinhentosanosequeacabouporestabelecerumgraudeparentescoentredoissignificativos campos do saber, quais sejam: a poesia e a filosofia.

Meu principal intento será o de indicar as razões da viabilidade em se falar de uma proximidade fundacional entre o saber crítico-reflexivo da filosofia e a arte da poesia.

É preciso compreender, entretanto, que estou a tratar de campos de pesquisa autônomos, com estatutos de legitimação epistemológica distintos e que congregam objetos, métodos e finalidades específicas.

De um lado a poesia, forma de linguagem que tem por característica fundante o predomínio de um texto lírico, com objetivo de exprimir percepções do sujeito diante do mundo, quer pela via da expressão crítica, quer pela meramente estética. Para tanto, faz-se necessária a existência de uma relação triádica composta pela poesia (como arte), pelo poema (como produto final e objeto dessa arte) e pelo poeta (criador e artífice).

A filosofia, por seu lado, consiste no imprescindível campo de investigações que penetra as raízes dos problemas fulcrais da vida com a ferramenta do método e as luzes do logos.

Rogério & Utópicos gregos. (Arte: MHL com IA).

Voltando ao princípio, pode-se constatar que os filósofos pré-socráticos Xenófanes, Heráclito, Parmênides e Empédocles, por exemplo, escreveram suas reflexões utilizando um estilo de escrita similar ao encontrado na prática da versificação. Mas por quê? A resposta é relativamente simples. Porque a poesia, enquanto gênero literário, surgiu, no Ocidente, bem antes da prosa e da própria filosofia, ainda no tempo dos mitos, nas narrativas gregas dos tempos heroicos.

Além do mais, havia, por assim dizer, uma unidade originária, uma estreita aproximação entre a linguagem escrita e os vários discursos ligados à oralidade do período ágrafo.

Sendo assim, no plano da história, pôde-se observar a assimilação e uns pelos outros. Foi o caso do nascente discurso filosófico, absorvido pelo fazer poético, nomeadamente sob a forma do poema.

Mesmo com a famosa condenação platônica dos poetas e da poesia em seu clássico “A República”, e com a posição de teóricos que defendem haver uma divergência histórica entre os dois saberes, percebe-se a ocorrência de um vínculo entre eles. Vínculo que se apresenta desde suas gêneses e continua a influenciar as manifestações do intelecto.

Em decorrência do acima exposto, é razoável compreender o fato de as primeiras reflexões filosóficas terem sido realizadas por meio de enunciados poéticos, na mesma perspectiva do que, no plano de expressão da linguagem, era usual durante aquele período da história.

Foi como se a filosofia tivesse aderido à forma poemática para dar corpo às proposições e questionamentos lógicos.

Desse modo, trago aqui, a título de ilustração, dois exemplos extraídos aos fragmentos de Heráclito que possuem ligação com o que foi acima afirmado:

SEXTO EMPÍRICO, Contra os Matemáticos, VII,132.

“Deste logos sendo sempre os homens se tornam descompassados quer antes de ouvir, quer tão logo tenham ouvido; aos outros homens escapa quanto fazem despertos, tal como esquecem quanto fazem dormindo.”

ARIO DÍDIMO, em EUSÉBIO, Preparação Evangélica, XV, 20.

“Aos que entram nos mesmos rios outras águas afluem; almas exalam do úmido.” 49a. HERÁCLITO, Alegorias, 24.

“Nos mesmos rios entramos e não entramos, somos e não somos.”

Ora, a poesia em seu estrito senso, inserida num corpo-poema, constitui-se como um discurso-objeto, isto é, um discurso de caráter não proposicional, metafórico, contudo reiterável. Caracteriza-se por sua linguagem deabertura ao diverso e aotranscendente, aindaqueutilizadapara expressar arealidade.Logo, é,por natureza, uma linguagem no campo de um discurso não-convencional, chegando a lidar, por isso, também com o que vige na esfera do imponderável.

Enquanto isso, a filosofia, tipo de discurso convencional apoiado no método e na lógica, ocupa-se em analisar a realidade através de argumentos construídos com base em fundamentação racional.

Mesmo assim, em sua origem, na antiguidade grega, ainda que parcialmente, o pensamento filosófico ‘derivou’ da poesia como um de seus modos externalizáveis.

Explico a razão do uso do entre aspas quando do emprego da palavra derivou, ao correlacionar os referidos campos de conhecimento. Ambos emergiram do páthos, ou seja, do espanto, condição que precede a tudo que nos toca e nos permite um inevitável estado de admiração.

Poesia e Filosofia, portanto, tiveram por arkhé (princípio) um “páthos” (espanto). Foram tomadas pela vertigem provocada ao defrontarem-se com as “aporias”, com a incerteza presente no íntimo de cada recorte da realidade, na dúvida radical que as empurrou na direção de seus intentos formadores.

Daí o motivo pelo qual Alberto Pucheu as denominou de “espantografias”, isto é, escritas sobre espantos. Contudo, enquanto a filosofia buscou interpretar a realidade imanente e transcendente do mundo, em prol do saneamento das dúvidas humanas mais angustiantes, a poesia optou por tentar expressar o impossível de modo crível.

Nela, diferentemente da primeira, tudo pode ser e acontecer, vez que opera no âmbito de uma feitura. Ainda assim, responde a certos parâmetros definidores de condições de existência, representados, sobretudo, pelas regras de versificação, escanção e métrica.

Falando da filosofia, é relevante lembrar que na última fase da produção teórica de Martin Heidegger, por exemplo, viu-se o predomínio do pensar que poetiza sobre o pensar que filosofa.

Tal virada encontra explicação no fato de que a filosofia, segundo ele, teria alcançado seu fim. Razão pela qual ficaria a cargo da poesia a passagem (Übergang) a um pensamento do Ser. Assim sendo, o pensamento poético passaria a definir, dali em diante, um modo de ser com o mundo.

Vale frisar, contudo, que sempre que a poesia toma por traço fundamental mostrar-se como demasiadamente teórica, acaba por forçar o poeta a também pensá-la. Pensar o conteúdo mais que a forma, sua engenharia personalíssima, seus planos internos e externos, evidentes ou implícitos.

Eis o fazer poético. Um pensamento que escolheu seguir pelo caminho da sensibilidade, das intuições, da contemplação estética como via alternativa num mundo rodeado de fenômenos cientificizados. Ao mesmo tempo, com o propósito de dividir com a reflexão filosófica a leitura do mundo, esse modelo de racionalidade adicionou camadas de racionalidade capazes de acessar verdades cujo pensamento tradicional buscava.

Isto posto, entendo que a poesia se situa correlacionada à filosofia, mediante o que María Zambrano denominou de razão poética. Condição que radica na gênese desses dois campos e a qual nominei de emaranhamento intermitente. Fenômeno movido pela intencionalidade subjetiva do poeta e do filósofo, que vem se manifestando em caráter circunstancial, porém com retomadas constantes, desde os pensadores originários.

Nesse sentido, verifica-se a possibilidade da prática de um pensar que poetiza, a partir da unidade que fabricou poetas-filósofos como Mallarmé, Lucrécio e filósofos-poetas como Platão, Hölderlin, Nietzsche, Rilke e Heidegger.

LENDA DA CARRUAGEM DE FOGO DE ANA JANSEN

Por Euges Lima, convidado da Academia Poética Brasileira.

A VERDADEIRA LENDA DA CARRUAGEM DE ANA JANSEN

Ana Joaquina Jansen Pereira, mais conhecida como Ana Jansen ou ainda Donana Jansen é uma figura icônica da história do Maranhão, personagem histórico e ao mesmo tempo lendário que viveu durante o século XIX em São Luís do Maranhão.

Nasceu no ano de 1798 e faleceu em 11 de abril de 1869 em sua suntuosa residência na Rua dos Remédios (Rua Rio Branco), esquina com a Tapada.

Tinha ancestralidade alemã, holandesa, inglesa e portuguesa, porém, quando nasceu, os Jansen já se encontravam pobres no Maranhão, portanto, veio de origem humilde, mas recusou-se a aceitar sua condição social e lutou muito com todas as suas fibras para se tornar a mulher mais rica e poderosa não só do Maranhão, mas de todo o Brasil Imperial.

Por conta desse empoderamento feminino em pleno século XIX, incomum para o seu tempo, em meio a uma sociedade maranhense patriarcal, Ana Jansen, enfrentou muita oposição e teve muitos adversários poderosos – comendador Meireles, Cândido Mendes, entre outros – que trataram possivelmente de criar uma imagem negativa a seu respeito. Não que Donana fosse santa, mas também não deveria ser um demônio. A partir dessas imagens criadas e certamente exageradas de uma sádica senhora de escravos, ainda contemporâneo a sua existência, anos depois de sua morte, isso foi material fértil para o surgimento de lendas e crendices populares que ultrapassaram séculos e que povoam o imaginário coletivo dos ludovicenses; a exemplo da famosa lenda do “Carro (carruagem) de Ana Jansen” que reinventada com muitas variações, chegou com força até o século vinte um.

Pois bem, fiz esse preâmbulo, para compartilhar com vocês, uma versão que acredito ser provavelmente a primeira ou uma das primeiras, registrada em livro sobre essa lenda, portanto, ainda com seus elementos

Euges Lima e a Carruagem. Arte: MHL "Ana Jansen e a Carruagem". Arte IA: MHL

originais, colhidos da tradição oral e publicada pelo escritor Astolfo Serra, em 1941, no livro “Terra Enfeitada e Rica”, edição

Imparcial, conforme sua versão:

“[...] Por tudo isso Ana Jansen anda a cumprir rude penitência fora de horas pelas ruas da cidade histórica. Todas às sextas-feiras, do antigo cemitério dos Passos, quando a cidade mergulha no sono, o seu carro dispara pelas ruas sombrias. As rodas desse veículo rangem, quase gemendo nos mancais. O tropel da parelha sacode o calçamento e o rumor do carro desperta a canzoada, que o persegue aos gritos e uivos sinistros do pavor. O carro faz sua ronda puxado por duas mulas sem cabeça que saltam pelos cascos faiscações esverdeadas. Há de quando em quando, um longo gemido, dolorido, profundo, arrepilante. No céu as estrelas se ocultam. No espaço os rasga-mortalhas riscam o silêncio. Na cidade todos se recolhem com medo e o carro dispara até o galo cantar pela primeira vez.”

Astolfo Serra em seu texto reforça essa imagem de uma Ana Jansen má, cruel, que maltratava seus escravizados. A lenda da Carruagem simboliza uma punição, uma maldição à alma da poderosa matrona ludovicense, infligida pelo imaginário coletivo popular; condenada a vagar pela eternidade pelas ruas do Centro de São Luís

aterrorizando os notívagos incautos

“pela violência com que mandava castigar aos seus escravos por qualquer falta’’

PAULO RODRIGUES, APB E PRÊMIO UNIÃO BRASILEIRA DE ESCRITORES, NA SEMANA LITERÁRIA MARANHENSE DO FACETUBES

Membro efetivo da Academia Poética Brasileira, que contempla poetas de todo o país, é ensaísta e desenvolve umapesquisasobrea poesiacontemporâneado Maranhão. Dois deseus livros publicados pela editora Penalux de São Paulo, são trabalhados pelo país: O Abrigo de Orfeu e Escombros de Ninguém. Professor de Língua Portuguesa na rede estadual de ensino, Paulo Rodrigues leciona no Centro de Ensino Francisco das Chagas Vasconcelos (município de Pindaré-Mirim).

13/01/2023 às 18h06

Por: Mhario LincolnFonte: Paulo Rodrigues

A METAPOESIA DE QUINCAS VILANETO

“A poesia cresce sozinha. Já vem pronta Vê-se a todo instante”.

Quincas Vilaneto

Recebi os originais da obra Vila Poesia de Quincas Vilaneto no finalzinho do mês de novembro. Reli muitas vezes com a compreensão de que encontrava ali uma escrita madura, capaz de ampliar a metalinguagem para tons acima das águas normais. O enunciador ao longo dos poemas assume um ethos reflexivo e comprometido com a existência.

É claro que a discursividade de Quincas ocupa muitas avenidas. Ele carrega um existencialismo desconfiado (própriodonossotempo).Apresenta,namaioriadosversos,soluçõesdelinguagemcom imagensinquietantes.

Autores como Carlos Drummond e Ferreira Gullar trabalharam bem a metapoesia, na literatura brasileira. O autor de Vila Poesia também o faz com extrema consciência. Encontramos num fragmento de Poesia:

Tens me virado não é de hoje de cabeça para baixo, para que daí saíssem as palavras

Paulo Vice-presidente APB/MA

dadas como válidas e sem risco de se converterem em indizíveis, pela mordaça ante o verbo e a pirraça.

O enunciador mostra-se transformado pelo signo literário. Experimenta as mudanças nas manhãs: “tens me virado/ não é de hoje/ de cabeça para baixo”. Assume, portanto, que fora convertido pelos espantos da palavra.

A confissão fica exposta no antagonismo: “ante o verbo e a pirraça”. O eu lírico se liberta ao ultrapassar essa dicotomia.

Já no trecho do Poema Invocado, temos: A palavra existe para nos revelar preciosidades. Ela nunca deixa de produzir surpresas e a gente passa o resto da vida sem entender.

A poesia é um exercício de revelação. Em Quincas não tem fórmulas acabadas. Ele inventa os jogos possíveis, dentro desse desejo explícito de colocar em ordem a desordem da vida, até mesmo quando deixa claro que “a gente passa o resto da vida sem entender”.

Chalhub (2002, p.47) comenta: “o poema moderno é crítico nessa dimensão dupla da linguagem – que diz que sabe o que diz”. Há uma constante discussão em torno da poesia, na coletânea. Posso afirmar que na poética de Quincas Vilaneto a metalinguagem organiza a sintaxe da “carpintaria humana”.

O uso da metapoesia espalha densidade filosófica no corpus do opúsculo. É um autor, sem dúvida, que se consagra entre os grandes caxienses.

Paulo Rodrigues, poeta, Ensaísta e Vice-presidente Regional da Academia Poética Brasileira, seccional do Maranhão.

Quincas Vilaneto.

Quincas Vilaneto (Caxias/MA). Poeta e pesquisador brasileiro. Possui graduação em Administração de Empresas, com pós-graduação em Administração Municipal, sendo Administrador do quadro efetivo da UEMA há muitos anos.

Entre outras publicações, é o autor de Balaio de Ilusões (1997), Itinerário Poético de Caxias (2003), A Lira dos Esquecidos (2006), Tear (2012), Caxias (2014), Empalavrando silêncios (2014) e Ao Pé da Letra (2016). Mora na capital São Luís e é um dos organizadores do sarau Na Pele da Palavra. É membro efetivo da Academia Caxiense de Letras (ACL) e do Instituto Histórico e Geográfico de Caxias (IHGC).

PRÊMIO SESC DE LITERATURA ABRE INSCRIÇÕES PARA OBRAS DE ROMANCE E CONTOS

O regulamento completo está disponível em www.sesc.com.br/premiosesc.

08/01/2023 às 11h57

Foto: o escritor Rafael Gallo, revelado pelo Prêmio Sesc em 2012, foi o vencedor da última edição do Prêmio Literário José Saramago.

Estão abertas as inscrições para a 20ª edição do Prêmio Sesc de Literatura, um dos mais importantes e consagrados reconhecimentos de escritores estreantes, cujo objetivo é impulsionar a renovação no panorama literário brasileiro e enriquecer a cultura nacional.

As inscrições podem ser feitas de forma online e totalmente gratuita até o dia 03 de fevereiro e podem concorrer obras inéditas nas categorias Romance e Conto. O regulamento completo está disponível em www.sesc.com.br/premiosesc.

Os vencedores terão suas obras publicadas e distribuídas pela editora Record. A parceria possibilita a inserção dos livros na cadeia produtiva do mercado editorial. O vencedor de cada categoria tem sua obra publicada e distribuída comercialmente pela editora, com uma tiragem inicial mínima de 2.500 exemplares. “Este ano é especial. Chegamos a vinte edições, um marco importante e que deve ser comemorado. Criamos o Prêmio em 2003 e de lá para cá se o projeto se consolidou como o principal do país para autores iniciantes. Esperamos ter novos recordes de inscritos em 2023 – no ano passado recebemos 1.632 trabalhos, sendo 844 em Conto e 788 em Romance”, comemora Janaina Cunha, Diretora de Programas Sociais do Departamento Nacional do Sesc.

A relevância do Prêmio Sesc de Literatura também pode ser medida por meio do sucesso dos seus vencedores. Além de serem convidados para outros importantes eventos internacionais, os autores são, com frequência, finalistas ou vencedores de outras premiações importantes. O escritor Rafael Gallo, revelado pelo Prêmio Sesc em 2012, foi o vencedor da última edição do Prêmio Literário José Saramago.

Vencedores 2022

Na edição de 2022, foram premiados o paraense Pedro Augusto Baía, com a coletânea de contos Corpos benzidos em metal pesado, e a gaúcha Taiane Santi Martins, com o romance Mikaia. A origem dos autores reafirma a característica do Prêmio de estímulo à diversidade e sua capacidade de projetar escritores das mais distintas regiões do país. Em 2023, os vencedores circularão por unidades do Sesc em todo o país e poderão dialogar com o público sobre os temas e o processo de criação de seus livros, que foram lançados em novembro de 2022 na programação do Sesc durante a Flip – Festa Literária de Paraty.

Nesses 20 anos de prêmio, diversos autores foram descobertos e se consolidaram na literatura nacional, graças ao incentivo da Instituição, entre eles Juliana Leite, Marcos Peres, Luisa Geisler, André de Leones, Franklin Carvalho, Sheyla Smanioto, Tobias Carvalho e Lucia Bettencourt.

Rafael Gallo

MONTELLO, MELHOR QUE AZEVEDO, COM O MESMO VIGOR ÉPICO DE TOLSTOI

MHARIO LINCOLN

Arte/Montagem: MHL

Quem leu a 6a edição de "Tambores de São Luís", lançada pela editora "Nova Fronteira", no ano de 1985, leu também algo que impressiona e mostra a amplitude poética dessa prosa tão bem construída pelo conterrâneo Josué Montello.

No meu caso, não havia lido nem as orelhas (que abaixo reproduzo o belo conteúdo), nem mais nada. A ansiedade me levou direto para o primeiro capítulo, com um dos inícios de romances mais incríveis, após "Cem Anos de Solidão", de Gabriel García Márquez. Esse início é realmente épico, repito: "Até ali os tambores da Casa-Grande tinham seguido seus passos, e ele via ainda os três tamboreiros, no canto esquerdo da varanda, rufando forte os seus instrumentos rituais, com o acompanhamento dos ogãs e das cabeças, enquanto a nochê Andreza Maria deixava cair o xale para os antebraços, recebendo Toi-Zamadone, o dono do lugar (...)".

Lembram de Márquez? “MUITOS anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o Coronel Aureliano Buendía havia de recordar aquela tarde remota em que seu pai o levou para conhecer o gelo (...)”. Pois bem! É impossível não se apaixonar, de imediato, por esse introito compassado, erudito, simbólico, carmelita, insinuante e cenográfico, embutindo logo ali, o quanto seria importante nomear seus personagens, que foram muitos, iniciando com a nochê Andreza Maria. Eis o pulo do gato, quando críticos avaliam ser Montello, maior que Aluízio de Azevedo, (obra "O Cortiço"). Sim! A referência é pertinente ao elenco de inúmeros personagens. Por outro lado, a saga de "Tambores de São Luís", segue a linha narrativa de "Guerra e paz", de Tolstoi, com todo aquele vigor épico que a obra de Montello emprega.

Na 4a capa dessa edição de 1985, escreveram: "Considerado pela crítica nacional e estrangeira como ponto culminante da obra romanesca de Josué Montello, OS TAMBORES DE SÃO LUÍS constituem um dos livros básicos de nossa literatura, recompondo a luta épica da raça negra no processo de nossa formação histórica".

Vale ressaltar também, a bela capa de Victor Burten, em cima do óleo sobre tela do artista Cícero Dias"Interpretação da obra de Josué Montello - os sobrados, as palmeiras e o mar de São Luís".

Magnífica apresentação com conteúdo histórico e insuperável. Mas vamos a apresentação da obra publicada às orelhas do livro:

OS TAMBORES DE SÃO LUÍS

Os tambores de São Luís, considerado pela crítica nacional e internacional como um dos grandes romances da literatura de língua portuguesa, é a grande saga do negro brasileiro, nas suas lutas, nos seus dramas e na sua tragédia.

Antes do romance de Josué Montello, tínhamos o romance da Abolição, ou seja: o romance episódico da campanha pela libertação da raça negra. Faltava o romance que, em tom épico, apresentasse toda a saga do negro, desde a sua origem africana, no bojo dos navios negreiros, até a sua assimilação racial, como componente do tipo brasileiro e como elemento básico de sua cultura.

Josué Montello, criado a ouvir o bater dos tambores da Casa das Minas, em São Luís do Maranhão, construiu este romance do negro brasileiro com habilíssimo recurso técnico. Toda a narrativa de Os tambores de São Luís decorre durante uma noite e algumas horas da manhã seguinte. Mas, dentro desse espaço de tempo, que constitui seu arco narrativo básico, outro arco se abre, para conter, ao longo da epopeia romanesca, três séculos de lutas e insurreições negras.

Saudado pela crítica como um marco no conjunto romanesco de seu autor. Também o é na própria literatura brasileira, quer pelo seu tom narrativo, quer pela intensidade dos dramas que aqui se debatem, aliciando o leitor à sua leitura contínua.

Mais de quatrocentos personagens compõem a galeria humana de Os tambores de São Luís. Superior a O cortiço, de Aluísio Azevedo, como elenco de personagens, filia-se este romance à linha narrativa de Guerra e paz, de Tolstoi, com seu vigor épico.

Traduzido o para o francês por Jacques Theriot, para as edições Flammarion, de Paris, este livro foi traduzido para o alemão pelo professor Winfried Kreutzer, que dele fez o tema de sua tese no Instituto de Filologia Românica da Universidade de Wurzburg. Os tambores de São Luís corresponde também ao resgate de uma velha dívida -a dívida contraída para com a raça negra, em nosso país, e que merecia, de nossa literatura, o seu canto em prosa, a sua verdade e a sua denúncia. (…)”.

“(...)

LINDA BARROS FAZ HOMENAGEM A JOSÉ NERES COM RESENHA DO LIVRO "AZULEJOS EM PAPEL DE JORNAL"

ANIVERSÁRIO DE JOSÉ NERES NESTE 17.02.

CRÔNICAS EM AZULEJOS DE PAPEL JORNAL

A vida tem seus sabores e dissabores. O mundo e suas revoluções, por outro lado, corroboram para que mudanças sejam feitas e principalmente, sejam aceitas. Nesse entremeio, está o avanço tecnológico, que a cada dia amanhece com uma novidade, fazendo com que o que é tradicional seja deixado de lado.

O século XXI chegou trazendo os sabores e dissabores da vida e dos séculos anteriores. Como na vida, “el reloj no da vuelta hacia atrás”, temos que nos habituar com as mudanças recorrentes do novo século. Uma das mudanças mais vigentes do novo século, se refere à tecnologia e suas revoluções, tendo a internet como a principal mudança desse meio. A web chegou com força total e revolucionando tudo e levando todos à sua volta. Os meios de comunicação tiverem que se adaptar e se adequar às novas mudanças, ou seja, tudo se transformou em digital: livros, revistas, periódicos, canais de televisão, as tracionais bancas de revistas, enfim, tudo está no novo digital.

Dentre todas as publicações impressas que deixaram de circular, estão os jornais ou periódicos, que em sua grande maioria foi sumindo. Hoje em dia, o que existe é a saudade do barulhinho do jornal caindo no terraço da casa dos assinantes. E para que nossas memórias não sejam esquecidas em páginas amarelas, os autores, cronistas, escritores, deram vida as suas obras, como um grito de socorro para que suas letras e ideias não sejam esquecidas ou mofadas em algum rincón virtual, de quase nenhum acesso. Foi o que fez o escritor e Acadêmico José Neres, quando lança Azulejos em Papel Jornal (Academia Maranhense de Letras, 2019, 189 páginas), uma obra que não pode ser considerada como um grito no silêncio da nova geração midiática. O compêndio é um resgate dos textos publicados nos principais jornais da capital maranhense, como em O Estado; e, também, no periódico Correio do Estado, do Mato Grosso do Sul.

Linda Barros & José Neres

Como diz o autor na apresentação da obra, “devo às páginas dos jornais acima citados e de outros de poder escrever sobre assuntos diversos, de repensar ideias e de divulgar meu nome entre leitores de variadas faixas etárias e de diferentes classes sociais”. Com isso, o escritor deixa o leitor mais próximo de si e do conteúdo da obra em questão.

Azulejos em Papel Jornal é uma obra de relevante valor acadêmico e social, pois, o mesmo traz histórias de vida do próprio autor, mas de forma muito particular e que envolve o leitor menos atento, com narrativas do dia a dia, mas que de certa forma, todos acabam se identificando com elas.

José Neres inteligentemente dividiu a obra em três partes. A primeira, começa com crônicas e artigos relacionados com o cotidiano, os acontecimentos que vida pós-moderna nos oferece, trazendo nessas crônicas, angústias e questões que nem sempre são respondidas pelo autor. A segunda parte, traz os textos que discutem sobre todas as artes, como bem disse José Neres “acredito que a arte é o alimento para a mente e para a alma, e sem essa forma de nutrição toda a sociedade tende a fenecer sem deixar vestígios”. Daí dizer o tamanho da riqueza cultural que se pode encontrar nessa obra.

Na terceira e última parte e não menos importante, estão textos relacionados com a educação, ou com os problemas educacionais, outro tema de profunda discussão, haja vista a situação atual em que se encontra nosso país. Essa última e delicada temática, traz reflexões de cunho acadêmico, onde o leitor é capaz de se deleitar por horas e ainda assim, fechar o livro com a cabeça angustiada por essa problemática que assola nossos jovens estudantes e a nossos sofridos docentes.

Azulejos em Papel Jornal, foi editado pela Academia Maranhense de Letras, levando o selo da mesma, com texto de apresentação do próprio José Neres, e, como já foi dito, nessa sequência: Os Cotidianos que Rodeiam, com vinte crônicas; As Artes em nossos Olhos, contendo catorze artigos com temáticas sobre artes e por último, Entre os Muros da Escola, contendo vinte e três textos temáticos sobre Educação.

Por fim, a referida obra pode e deve ser estendida às prateleiras de bibliotecas das mais diversas instituições de ensino, tanto superior quanto nas escolas públicas e privadas, para assim, fazer discussões pertinentes aos temas envolvidos.

JOSÉ NERES: MANEJO E APLICAÇÃO DA INTELIGÊNCIA SÓBRIA, POIS SÁBIO É SABER APLICAR A SABEDORIA. E NÃO ACUMULÁ-LA

Assim o vejo, caro José Neres. amigo, irmão e com um imenso coração batendo no peito.

18/02/2023 às 13h28Atualizada em 19/02/2023 às 08h19

Por: Mhario LincolnFonte: Mhario Lincoln/José Neres

Neres e Lincoln

Parabéns José Neres. 17.02.2023

Mhario Lincoln*

Para traduzir José Neres enquanto pessoa humana não há mistérios, porque no primeiro contato direto com ele, a mim pareceu entrar numa máquina do tempo e ir buscar a presença de Carl Sagan, nessa lógica:

“Saber muito não lhe torna inteligente. A inteligência se traduz na forma que você recolhe, julga, maneja e, sobretudo, onde e como aplica essa informação”.

Exatamente um dos pontos nevrálgicos da personalidade forte de Neres reside em “onde e como aplica essa informação”. E como eu sei? Porque meu filho foi aluno dele, enquanto residíamos em São Luís. E todo mundo que o teve como mestre, desnuda elogios diferenciados ao professor José Neres.

Simeporumarazão:eleéumperegrinousualeintelectual,cruzandoestradascompostelanasdentrodaprópria alma e consumindo livros, por necessidade biológica. Vivenciador da origem, pensador de efeitos ácido/nucléicos diferenciados, cujo DNA explicita uma linhagem com mais células de suporte, do que a média das p

Aí entra um fator da personalidade indelével de José Neres: "(...) a humildade ainda é a parte mais bela da sabedoria". Essa força ativa ajuda-o a determinar o relacionamento das pessoas, baseado em seu padrão de interação social. Logo, amigos, leitores e fãs se inteiram do universo neriano e o traduzem como referência nos pensares, nas arguições e nas atitudes; como eu.

ApropósitodaabastançaconceitualdeJoséNeres, chamoparaconversaracientista,pesquisadoraeeducadora americana Marian Diamond, considerada uma das fundadoras da neurociência moderna, mostrando o cérebro "como estrutura dinâmica, (...) nunca estática".

Então, no meu bestunto de 'escrevinhador', passei a entender que, quanto mais se capta variações e se provoca uma ebulição hipotalâmica, mais a capacidade de aprendizagem aumenta e impregna a tendência pessoal de criar, no artista, no escritor, no físico ou no poeta. É assim que se dá, a partir do cérebro, a criação humana. Volto a minha tese sobre a qual, só o talento não é suporte para a criação humana deslumbrante.

"Sicut ad productionem", o leitor mais atento de José Neres, descobre, de chofre, essa tendência: abocanhar o universo de informações que lhe possam ser úteis para produção de tantas obras importantes e, como consequência natural, receber o "Prêmio Odylo Costa, filho", concedido pela Prefeitura de São Luís, pelo livro Resto de Vidas Perdidas; Prêmio “A Importância do Livro no Brasil do Século XX”, concedido pela Academia Brasileira de Letras em parceria com o jornal Folha Dirigida e “Medalha do Bicentenário de João Lisboa”. Logo, esse caminho o levou à Academia Maranhense de Letras, onde ocupa a Cadeira nº 36, como sucessor de outro grande nome, Ubiratan Teixeira. Essa é a base inequívoca do conhecimento de José Neres. Como aquela gota única, vertida por sobre o ramo de palma e da coroa de louros, no podium dos heróis. Enquanto lá fora, chove a cântaros!...

Vale ressaltar, enfim, que a todas as vitórias das pessoas boas revelam-se uma grande simplicidade de espírito, e que, ainda, um bom espírito sempre ajuda a dirimir dúvidas pertinentes à complexa hermenêutica da imortalidade acadêmica.

Destarte, caro amigo José Neres, receba meus mais sinceros parabéns neste dia de seu aniversário e relembre nossa entrevista recente.

(*) Mhario Lincoln é presidente da Academia Poética Brasileira

O LÍRICO, O FÍLMICO E O CRÍTICO NA POÉTICA DE PAULO RODRIGUES

JOSÉ RAFAEL DE OLIVEIRA. Médico, membro SOBRAMES/MA

Livro CINELÂNDIA, publicado pela editora Folheando, em 2021.

Publicado pela editora Folheando, 2021, o livro Cinelândia impacta, sobretudo, por transliterar uma realidade exposta a preconceitos e/ou dificuldades de toda a ordem. Realidade que, aliás, subsiste numa sociedade estigmatizada pelas diferenças sociais, econômicas, políticas, educacionais, humanas... Por isso as imagens poéticas de Cinelândia são, significantemente, desprovidas de regalias e/ou glaumors decorrentes da maisvalia, do stablishment e da filosofia do 'time is money', pois expõem, amiúde, o lado mais fragilizado e mais esquecido da sociedade em todos os sentidos.

É para esse lado, porém, que o poeta aponta uma das suas antenas para captar o poético antes mesmo dele se dissipar pelos subterfúgios ou simulacros do cotidiano, e assim revelar, irretorquivelmente, a própria desumanização do ser pela negação e pela indiferença ou, então, pelo efemerismo tão redundante no mundo contemporâneo, para o qual Bauman afirma que "nada é feito para durar". A não ser, talvez, a arte que o reinventa a partir das suas contradições, intolerâncias, cruezas, necessidades etc., onde "crescem as favelas/[...]/sem água, sem remédio." (p 63) ou por onde "a cidade não esconde/os moradores de rua." (p 68), sempre embrulhados em papéis destituídos de encantamento(s). Contudo, para Shelley, "A poesia é um espelho que torna belo o que é disforme", como, por exemplo, nestes versos: "Iriana mora na rua./foi comida pelo pai;/ pariu cinco filhos na calçada./nunca aprendeu a sonhar,/mas dorme no papel./sob os carinhos do/filho." (P. 55).

O Poeta e seu Livro.

Daí Freud ser preciso em dizer que "[...] somos feitos de carne e osso, mas temos de viver como se fôssemos deferro"parasuportartantasmazelas, entreas quais sobressaem crimes, drogas, corrupções, dores, abandonos etc. Por outro lado, a esperança é esfacelada toda vez que "a cada quatro horas/uma criança com menos de treze anos/é estuprada no Brasil."(p 46). Sem dúvida, a poesia rodrigueana reproduz/reprocessa a realidade com a tinta mais dolorosa e mais impactante das palavras, tornando, com isso, visível o que Paul Klee denomina de invisível dentro do visível. Por isso a necessidade de refletir o tempo todo sobre os antagonismos e infortúnios que sobejam em nossa existência, pois, afinal, conforme Jigoro Kano, "Sem oposto nem contrastes, a vida não é vida.", ou então como supõe Paulo Rodrigues: "cada um protesta como pode" (p 66).

Do vocábulo Cinelândia obtém-se "Cine" e "lândia". O primeiro, um substantivo que demarca as atividades inerentes à sétima arte; o segundo, termo adjetival, land, derivado do alemão/inglês, exprime a ideia de espaço territorial, lugar geográfico. Pode-se afirmar então que 'Cinelândia' é o lugar do filmico no poético. Essa ideia está implícita na estrutura (estética) do livro como um set de filmagem dividido em quatro partes: Claquete, Cena 1, Cena 2 e The End., cujo roteiro subtende as distopias humanas tratadas simbolicamente pelo poeta. Recorrendo à ideia sheaquespereana de que "[...] todos os homens e mulheres não passam de meros atores. [...] E cada um no seu tempo representa diversos papéis.", o poeta pinça algumas personagens da vida real para viver as cenas poéticas da sua Cinelândia. Na verdade, são personagens que interpretam o papel de si mesmas, mas sem ensaios prévios. Papel que, conforme Marx, exorta a condição humana de ser o autor e ator da própria história. Cada uma dessas histórias é registrada com a câmara das palavras em diferentes perspectivas, como a destes versos-cenas do poema Glauber (p 62):

o menino carrega um balde; busca água em qualquer parte.

o sertão é uma unha de gato.

o menino morde um pedaço de pano; a irmã quebra o pote.

A poesia, neste caso, retrata a existência humana em suas vertentes mais dilemáticas, mais emblemáticas e mais dramáticas, como, por exemplo, a subumanidade (poética) dos que vivem no sertão às expensas da própria sorte. Um sertão ressignificado na metáfora "uma unha de gato". Metáfora que arranha a pele e a alma de quem precisa desafiá-lo o tempo todo para sobreviver. Em contra partida, o poeta acredita que um dia "o lixo não seráo alimento/denenhumacriança." (p22). Ouque"Avidajánãoprecisa/pedirdescontos:/madrugar nos mercados,/esconder-se da fome." (p. 24). Ou ainda que "a porta da rua/se abriu para uma criança." (p.53). Muitas situações adversas condicionam o existir humano no século XXI, sobretudo, para quem está à margem ou vive na linha de pobreza. A consequência disso obviamente é vivenciar uma realidade que "não embala o sonho,/na manhã." (p 51).

É por isso que o poeta, e também produtor, cinegrafista, figurinista, editor, diretor etc., projeta na tela dos versos tanas cenas inspiradas na realidade para que o espetáculo do poético seja contemplado por meio de imagens linguísticas ou semânticas com efeitos catárticos. É assim que a consciência do leitor torna-se ungida pelo óleo refinado da lírica de Paulo Rodrigues, possibilitando ouvir, desse modo, o grito agudo ou o canto de indignação e desespero das palavras... Ou será da poesia?

"O PRONTUÁRIO POÉTICO DO DOUTOR RAFAEL"

"O avesso abstrato das coisas", (Pelanux, 2021, 128 páginas).

José Neres

José Neres, resenhista. O prontuário poético do doutor Rafael

José Neres

(Membro da Academia Maranhense de Letras e da Sobrames)

Ser poeta nem sempre está diretamente relacionado com o fato de alguém haver escrito e/ou publicado algum livro de poemas. Ser poeta vai além desse detalhe técnico. Ser poeta possivelmente é ter tatuados na alma, nas palavras e no silêncio a essência da poesia, a capacidade de enxergar além das aparências e o dom de renovar o tantas vezes já-dito com as vestes do não-dito. Às vezes a poesia abandona seu mundo de abstrações e se materializa em forma de poemas que acabam ganhando o mundo a partir da memória, dos recitais, dos endereços virtuais ou das páginas de um livro.

Mas, por algum motivo, as pessoas acabam exigindo que o poeta se “solidifique em poeta”, conforme vaticinou Nauro Machado em um de seus mais difundidos versos. Cria-se uma expectativa envolta em múltiplas cobranças: “Quando vai publicar um livro?”, “Estamos esperando seu livro.”, “E o livro, quando vem?”, etc. Não são raros os casos em que essas cobranças reiteradas acabam mutilando o poeta, que, no afã de agradar aos outros, acaba traindo as próprias convicções e acelerando a maturação de poemas que, infelizmente, às vezes, começam a nascer mortos ou talvez sem possibilidade de vi Contudo, há também aquelas pessoas que sabem esperar um momento propício (se é que isso exista) para a publicação de sua prole poética em forma de livro. E, quando esse momento chega, vem acompanhado de uma explosão de exclamações de júbilo, dada a qualidade do trabalho que é apresentado ao ansioso público.

Foi isso o que aconteceu com o poeta e médico Rafael Oliveira, que, depois de muita insistência e de muitos recuos, acaba de trazer à luz seu primeiro livro intitulado O avesso abstrato das coisas (Pelanux, 2021, 128 páginas), umaobraquetrazparaos leitores eamantesdapoesiaumamescladelevezapoéticacom adensidade de uma temática central que remete às enfermidades do corpo e da alma e faz cada pessoa refletir sobre a brevidade e a fragilidade de nossa condição humana.

Cada um dos poemas parece ter sido limado muitas vezes até atingir o ponto em que o contraste entre a economia de palavras e abundância de imagens transformasse palavras que poderiam ilustrar um prontuário médico em uma bem acabada peça de ourivesaria poética na qual cada vocábulo está engastado com perfeição No prefácio ao livro, o poeta Bioque Mesito já adverte que “o que parece quando lemos Rafael Oliveira é que tudo perpassa pela retórica do mundo imaginado como os conceitos duros das ciências exatas, mas o que significa, na verdade, é a sensibilidade da poesia, a ternura dos poemas paradoxais ou ainda o que recolhemos do espanto de viver.” E essas constatações podem ser vistas do primeiro ao último poema do livro.

Logo no início, os leitores se deparam com o impactante poema Alzheimer e podem perceberem tristemente que tal doença tem como um dos efeitos:

esquecer a vírgula depois da manhã a tarde perde o sentido

o pôr do sol não cabe na memória (pág. 23)

Ao longo das páginas, o médico nascido em Goiás, mas que adotou o Maranhão como segunda terra natal, segue em sua saga de tirar o máximo de poeticidade de algo que geralmente é visto como antessala de um fim inefável. Sinestesicamente, é possível trazer à margem de cada leitor as incômodas sensações pelas quais passam as vítimas de enfermidades que não trazem em sua essência vestígios claros de poeticidade. Assim o AVC, que faz parte do drama de muitas famílias, é pintado metaforicamente como o momento em que:

o corpo perde lembranças no máximo se lembra pela metade a mão esquerda não colhe flores (pág. 45)

E assim, nesse sintético prontuário poético, o doutor/poeta Rafael Oliveira consegue transmutar dores físicas e psicológicas em pílulas de poesia. Lúpus, dermatite, anorexia, infarto, Parkinson, impotência, insônia, traumas, bipolarismo e muitas outros problemas do dia a dia dos consultórios saltam das folhas soltas de recitas, diagnósticos e exames e passam a fazer parte de um mundo no qual dores e perdas podem dar origem a outras formas de se ver os vazios que alimentam nossa certeza de diária partida.

Mesmo respeitando as rotinas e protocolos médicos, o poeta acaba lembrando o leitor de que há remédios que podem ira além da farmacologia química. Para tentar controlar a pressão alta, por exemplo, será também importante tirar um tempo para:

ver o pôr do sol numa tarde qualquer evitar nuvens insubordinadas dentro dos olhos

tomar

uma cápsula de lua ao dormir (pág. 61)

No prontuário poético do doutor Rafael, cada leitor é mais que um paciente, é um amigo que entre consultas, exames e anamneses pode levar para o resto da vida, impressa na retina e na memória, a certeza de que a poesia está em todos os lugares, até na dor... na nossa e na alheia.

Membros da Sobrames – MA:

- Aldir Penha Costa Ferreira

- Antônio de Pádua Silva Sousa

- Arquimedes Viégas Vale

- Deíla Barbosa Maia

- Dilercy Aragão Adler

- Eliane Morais Araújo

- Erico Brito Cantanhede

- Erivaldo Amâncio da Silva

- Gabriel Costa Ferreira Andrade

- Hamilton Lima Oliveira

- Hilmar Ribeiro Hortegal

- Jadir Machado Lessa

- Joaquim Ribeiro Melo

- José Luiz Pires de Menezes

- José Rafael de Oliveira

- Lúcio Araújo da Cunha

- Márcia da Silva Sousa

- Maria do Perpétuo Socorro de Azevedo Veras

- Mário Luna Filho

- Michel Herbert Alves Florencio

- Natalino Salgado Filho

- Paulo Martins

- Raimundo Ribeiro Barbosa

- Sanatiel de Jesus Pereira

Nasceu em Barreirinhas, MA. no dia 17 de abril de 1954. É poeta, escritor e, pai de família, os primeiros anos do primário, cursou nos lugarejos de Tucuns e Tratada, o concluiu no Grupo Escolar Joaquim Soeiro de Carvalho no ano de 1968, em Barreirinhas. Nos anos de 1969 e 1970 estudou no Ginásio Bandeirante de Barreirinhas (GBB), no final de dezembro de 1970 mudou para São Luís, concluiu o primeiro grau no Ginásio Nina Rodrigues, em dezembro de 1972. Está radicado em São Paulo, Capital; desde julho de 1974. Cursou o 2º. Grau no Colégio Fernão Dias Paes, entre os anos de 1975 a 1977, em Osasco. Formou-se em direito pela Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), em dezembro de 1981. É advogado militante desde o ano de 1982. Foi membro do Centro de Oratória Rui Barbosa (CORB), de dezembro de 1974 a outubro de 1986, quando então participou de duas Antologias poéticas, em 1981 “IMPRESSÕES – POEMAS”, e em 1986 “JOGO DOS INSTANTES”. Embora tendo ficado afastado dos meios literários por um longo tempo, entretanto, não parou de produzir textos, poemas, crônicas, inclusive acabou de publicar o livro: “MINHAS MEMÓRIAS – Apesar das Intempéries”. Enquanto escreve sua alma vai se amoldando aos vendavais da vida, aos cataclismas, mas os seus olhos não se cansam de apreciar as belezas de um rio de água corrente, a magnitude de um pássaro voando, tudo isso são fontes inesgotáveis de sua criação!.

Manoel de Jesus de Sousa Lisboa (Colaborador)

Michel Hebert Alves Florêncio (inativo)

Michel nasceu em 1º de agosto de 1969 em Bacabal, no Maranhão. Formou-se pela Universidade Federal do Maranhão – UFMA em 1996 e especializou-se em pediatria e endocrinologia. Embora residindo atualmente em São Luiz – MA, recentemente reativou sua filiação à Sobrames-SP, da qual participa com a publicação de seus poemas nas edições de “O Bandeirante”. Também é membro da regional maranhense da Sobrames, para a qual foi eleito presidente em 2008. É autor dos livros “O Verbo em Ebulição –Orações, Salmos e Poesia” (2007) e “Palavras e Verbos” (2008). CONTATOS - mh.florencio@uolcom.br

A Sobrames também congrega escritores que já se tornaram imortais acadêmicos, a exemplo, Natalino Salgado Filho da Academia Maranhense de Letras e Arquimedes Viégas Vale, Mário Luna Filho, Dilercy Aragão Adler, Michel Herbert Alves Florencio e Sanatiel de Jesus Pereira, todos da Academia Ludovicense de Letras.

"ÉPICA E MODERNIDADE EM SOUSÂNDRADE"

"Para se compreender o fenômeno Sousândrade, talvez ainda mais nitidamente do que acontece com outros escritores, é preciso não reduzi-lo a fórmulas". (LL).

25/02/2023 às 08h48

Por: Mhario Lincoln Fonte: Luiza Lobo/Sousândrade/ "Épica e Modernidade em Sousândrade"

*Facetubes, grupo de pesquisa

"Para se compreender o fenômeno Sousândrade, talvez ainda mais nitidamente do que acontece com outros escritores, é preciso não reduzi-lo a fórmulas". (Luiza Lobo).

De acordo com um das obras clássicas sobre Sousândrade, escrita por Luiza Lobo - "Épica e Modernidade em Sousândrade", para se compreender o fenômeno Sousândrade, "talvez ainda mais nitidamente do que acontece com outros escritores, é preciso não reduzi-lo a fórmulas.". Abaixo, alguns excertos, retirados da publicação original.

MODELO ROMÂNTICO

"O modelo romântico se constituiu, para Sousândrade, numa mescla brasileira de Lord Byron - o grande ídolo dos nossos românticos - e do maranhense Gonçalves Dias, nove anos mais velho. Um ideal tão amplamente híbrido naturalmente seccionou a consciência do personagem Guesa em duas facetas: a de herói romântico, europeu, envolto em uma trama épica, política, idealista, semelhante à do Childe Harold, de Byron, e a de herói indígena, buscando buscando salvaguardar seus valores em meio a uma crescente destruição provocada pelo colonizador europeu. A originalidade de Sousândrade, à diferença de Gonçalves Dias, reside no fato de ele não se prender a um perfil já consagrado pelo indianismo brasileiro, como o de Alencar, que tornava o índio um herói quase inverossimil, apesar da sua derrota histórica".

VIAGEM PARA A AMAZÔNIA

"Sousândrade viaja e observa o índio no Amazonas, de 1858 a 1860, e descreve o rito provavelmente dos Tariana ou Ize como um sinal de decadência. Este rito orgiástico de iniciação sexual comunitária se tornou

capa

moralmente inaceitável para ele, conforme está no Canto II. Quando escolhe, como herói de O Guesa, a vítima de sacrifício mítico a ser perpetrado pelos índios muíscas da Colômbia, amplia as fronteiras do indianismo brasileiro para um perfil sul-americano, colando-o ao índio inca peruano e muísca colombiano. Sua defesa do índio assume um nível mais amplo e simbólico, mostrando o valor de sua cultura, língua e religião antes da chegada de uma civilização mais forte, a europeia. À medida que acompanhamos a viagem do Guesa rumo à Corte (Cantos I, 1852, VI, 1857), ao Amazonas (1858), à Europa via África (Canto VII, 18521900) e pela América do Norte, Central e do Sul (Cantos IX a XII, 1871-1878), percebe- mos que o poema trata não apenas do índio que vivia em terras brasileiras, ou do índio peruano (inca) ou colombiano. (...)"

MACHADO DE ASSIS

"Ao contrário, Machado de Assis, em lugar de buscar a defesa de valores puros, aceitou o fenômeno do hibridismo literário e da interpenetração cultural e imantou sua obra com todas as influências disponíveis. Sousândrade, como Machado, na medida em que aceitou a influência estrangeira, também pôde criar de dentro dela um conceito de nacionalidade próprio. Este método de trabalho lhe permitia reaproveitar, em O Guesa, fatos da história da América Latina, como a atuação de Bartolomé de las Casas ou dos irmãos Gutierrez, ao modo de José María Heredia, poetizando-os e integrando-os na evocação de seu personagem principal, o Guesa, espécie de alter ego do autor. Jamais se preocupou com a questão da nacionalidade, no sentido estreito do termo, enquanto nacionalismo temático. Ao contrário, era na mescla de culturas que encontrava o que se consti- tuía em especificamente nosso. Ele foi um exemplo do processo de colagem parafraseadora, que constituiu, quase 70 anos depois, o cerne do Modernismo, como praticado por Oswald de Andrade no poema Pau-brasil e por Mário de Andrade no capítulo "Carta pras Icamiabas", de Macunaína. (...)"

PERCEPÇÃO DE SÍNTESES DE INFLUÊNCIA

Sousândrade talvez tenha sido o primeiro autor brasileiro a perceber a importância da síntese de influências estrangeiras na literatura nacional. Esta percepção se tornaria, no Manifesto pau-brasil, de 1924, e no Manifesto antropófago, de 1928, um dos requisitos básicos do Modernismo: deglutir o estrangeiro e metamorfoseá-lo. Hoje ela parece ter-se tornado a mais forte tônica da literatura latino-americana, com Carlos Fuentes, Lezama Lima, Gabriel García Márquez, entre outros, que passaram a aceitar influências estrangeiras para criticá-las ideologicamente, de dentro da própria cultura, incorporando-as e desconstruindo-as. Mas foi Sousândrade, um dos primeiros a reverter, em pleno Romantismo, a noção de "cor local", tão cara a Victor Hugo no Prefácio a Cromwell, a cor transnacional. (...)".

O GUESA

O Guesa é, sem dúvida, o maior exemplo existente no Brasil, antes do Modernismo, de mescla estilística, no dizer de Erich Auerbach. Nele Sousândrade explorou as variações entre personagens românticos e diversos tipos de índios brasileiros, muíscas e incas, e criou o estilo épico com fragmentos cômicos (nos Cantos II e X). Optou por uma troca sucessiva de papéis, vivendo diferentes personagens e vendo-se como testemunha de várias mudanças políticas, na linha do Childe Harold, de Byron.

NA POESIA, DIVERSAS DIVINDADES

Na sua poesia, combinou diversas divindades indígenas, como a deusa das águas, lara ou Uiara (na grafia que era utilizada no século XIX, segundo Barbosa da Silva e Câmara Cascudo), e deusas incaicas, como Chasca ou Vênus, Mama Quilla ou a lua. Também inventou uma semideusa, Virjanura, provavelmente corruptela de Virgem Pura. Seu personagem principal, o Guesa, é a vítima do sacrifício dos índios muíscas da Colômbia e se identifica com a figura grega de Prometeu, o rebelde, que impregnou com frequência o Romantismo mundial: Prometeu, o rebelde, interpretado como uma primeira encarnação de Cristo.

REVISÃO DE SOUSÂNDRADE

Depois dos estudos mais sistemáticos sobre Sousândrade, iniciados por Fausto Cunha, em ensaio de 1955, posteriormente coletado em livro, foi sem dúvida a obra de Augusto e Haroldo de Campos, Revisão de Sousândrade, publicada em 1964 e desde 2002 em terceira edição, que melhor abordou a obra do poeta, embora continha quatro cantos do Guesa errante, num livro intitulado Obras poéticas. Em seguida saíram

mais duas edições em Nova York, em 1876 e 1877, sendo que esta última já incluía o Canto VIII, contendo o "Inferno de Wall Street". Na edição definitiva do Guesa errante, ampliada e denominada O Guesa, publicada em Londres, possivelmente em 1884,16 o Canto VIII foi renumerado como Canto X e passou a incluir aquele fragmento do "Inferno de Wall Street", bastante ampliado.

DISCUSSÃO IMPORTANTE

Uma importante discussão a respeito dos dois controvertidos fragmentos é exatamente definir até que ponto o limerick determinou a sua forma de composição. É provável que já na sua viagem à Europa, em 1854-56, durante a qual esteve também na Londres da rainha Vitória, Sousândrade tenha travado contato com a forma popular do limerick, espécie de verso jocoso infantil ou de cunho indecente, imortalizado pelo livro The book of limerick, de Edward Lear, composto em Londres entre 1832 e 1835 e publicado em 1846. Os irmãos Campos afirmam sem questionamento que Sousândrade empregou o limerick. Mas seria o caso de se perguntar até que ponto o Canto II, na forma em que apareceu inicialmente no Semanário Maranhense, em 1858, guardava semelhança com as formas românticas ibéricas encontráveis também em poemas de Gonçalves Dias? Comparando-se as diversas publicações dos dois fragmentos, nota-se que o poeta aproximou bastante a forma inicial da "Dança de Tatuturema" do limerick e de recursos gráficos da imprensa, durante sua estada em Nova York. (...)".

TÃO EXTENSO QUANTO ODISSÉIA

Deve-se levar em conta, entretanto, por mais importante que seja o levantamento das dramatis persona efetuado pelos irmãos Campos a respeito da Nova York habitada por políticos e religiosos no período posterior à Guerra Civil, que cada um dos fragmentos dos Cantos II e X não ocupa mais de 30 páginas num conjunto de 350 páginas com aproximadamente 14 mil versos, e que é, portanto, tão extenso quanto a Odisseia, de Homero, que constitui um dos modelos de epopeia para Sousândrade. Ambos os fragmentos são, contudo, fundamentais, uma vez que denotam originalidade do maranhense, que neles concentra aspectos humorísticos, que em Homero aparecem difusos na Ilíada e na Odisseia. Mesmo assim, pareceume primordial considerar aqui não só os dois curiosos e pioneiros fragmentos, como também todo o corpo da epopeia O Guesa.

Há um valor promocional do livro em: https://www.estantevirtual.com.br/livros/luiza-lobo/epica-emodernidade-em-sousandrade/872971376

O

G

-

NA POÉTICA METAFÓRICA (Ou carta aberta a Salgado Maranhão)

Resenha de Mhario Lincoln sobre a obra "Ópera de Nãos", do premiado poeta e escritor Salgado Maranhão.

Salgado Maranhão e a obra "Ópera de Nãos".

“(…) Porque a chuva lava o outono e a manhã é somente um homem no colo de um rio (...)”

Li ferozmente o teu “Ópera de Nãos”, caro Salgado Maranhão, (prêmio Jabuti-2016). Fui debulhando a obra e junto, levado pela ansiedade de terminá-la para reler quantas vezes fossem necessárias, acabei concluindo o que disse Fabrício Carpinejar: “A ansiedade é uma espécie de imaginação acelerada”. E eu complemento: meus 'ais' foram contaminados por intérminos gerúndios atemporais; impossíveis de controlar.

“(...) muito além do nada/ (…) de ser templo e carne;/ (…) que vence o estrume com seu perfume (…)”. Isso porque “vendemos as pupilas/ por um prato de sonhos/ e só temos lágrimas/ para o jantar (…)”. (Às págs. 55. e "Ladainha").

A primeira reação sistólica, me fez, então, me radicalizar de tal forma, que comecei a escrever este texto como sempre quis fazer e não me havia concedido coragem, desde quando li Hölderlin: vendo a poesia como parte integrante das entranhas do Homem, libertando-a de quaisquer proezas técnicas.

"Ópera de Nãos", produziu em mim, de imediato, um efeito façanhoso e eu também disse um 'não' quase eclesiástico: a partir de agora, não mais analiso obras literárias abissais, de 'fora para dentro', mas atentando para os enredos filigrânicos encontrados nas percepções convexas; de 'dentro para fora'.

Nem precisei ir muito longe para entender a tua mágica lírico-metafórica, explicitamente livre de engrenagens amórficas. Neste livro, ipsis litteris:

“(…) O pôr do sol te nomeou/ para iluminar as dálias, mas/ venderam-te ao arbítrio/ e ao sermão das urtigas./ Bendita seja a chuva secreta/ que te incita a ordenhar palavras (…)”. Às págs. 75.

É assim que tu consegues caro Salgado, moldar a tradução literal da essência; a essência poética; lida, sentida e analisada, sendo árvore nevrálgica humana, com dor e êxtase nirvânico: deflúvios construtivos da tua lógica aédica. E só quem experimenta essa sensação convexa, consegue enxergar essas filigranas. Porque, de uma forma ou de outra, olhando além do mito da Caverna 'dialódica' entre Platão e Glauco, tudo acaba virando grito, canto, repreensão, dilúvio, protesto, mergulho, rompante; ou uma lágrima de saudade...

PONTO -
MHARIO LINCOLN

É esse o arômata provocador desse choque vivificante na compreensão do leitor, o qual responde de forma imediata a esses estímulos, como eu respondi, apressando-me a desamarrar minhas mãos da parede platônica, em busca do respiro de sombras reais.

Isso porque, caro Salgado, não há mais razão para se medir qualidade lírica de forma academicista, sob obras que explicitam o humano, não o humanoide das novas inteligências artificiais, frágeis aglutinadoras de retalhos pinçados de imensos relatórios técnicos, com meras conclusões mecânicas, presas a escolas, rimas, harmonias, métricas, tetrassílabos, pentassílabos ou hexassílabos.

Havendo-me assim, doravante, me fez pensar: 'uau', eis o Milagre! Após “Ópera de Nãos” e dos paradoxos eclodidos de borboletas azuis, me senti livre para degustar o sabor único exalante, que empresta uma textura existencial aos teus versos contidos nessa bula intimista, até, com a “funcionalidade de palavras chaves, recorrentes (…) carregadoras de significância adicional (…)”, na escrita de Charles Perrone, da Universidade da Flórida, sobre esse teu livro.

Como se vê, há mágica no ar! Alguma coisa aconteceu quando atingi o ponto ‘G-Metafórico’ deste vademécum. Incitou-me a caminhar no limite dos lampejos sensoriais, "beirando a borda da tua língua", caro Salgado, “(...) nesse equilíbrio delicado em que um passo para trás é o lugar-comum e um passo para frente é o ininteligível (…)", bem como suscitou a professora Iracy Conceição de Souza, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), em posfácio.

Porque na "beirada de tua língua", há inquietas provocações:

“(…) E dormi sob o vento/ e a noite ferida de raios./ Havia um punhal entre as flores”. Às págs 70.

Só esses três versos podem levar a milhardárias interpretações introspectivas da essência, como, por exemplo, na filosofia existencialista: uma representação da angústia e incerteza que acompanham a existência humana?

Por isso, insisto em proclamar aos ventos pré-alísios: poesia é muito mais essência, que técnicas enciclopédicas. O inimaginável Mário Quintana é muito claro quando aborda o tema: "(...) Tudo já está nas enciclopédias e todas dizem as mesmas coisas. Nenhuma delas nos pode dar uma visão inédita do mundo. Por isso é que leio os poetas. Só com os poetas se pode aprender algo novo (...)". Caderno H/São PauloGlobo/Pág. 165/1995.

E Martin Heidegger (1889-1976) sobre a poesia de Friedrich Hölderlin: “... o homem habita em poesia. (...) A poética hölderliniana está para além de ser tomada como um mero estudo literário para fins especificamente críticos e/ou acadêmicos".

Segundo Heidegger, "(...) Hölderlin não era um poeta qualquer, cuja obra se resume a um objeto de estudo para historiadores da literatura. Ele é o poeta que indica o futuro e que por isso não deve permanecer um simples objeto de estudos holderlinianos, preso a representações da história da literatura (...)". (o "...poeticamente o homem habita..."/Hölderlin-heideggeriano/roberto amaral/revista germina). Maranhão.

Destarte, não há mais porque vincular o ‘eu poético’ de Salgado Maranhão, apenas, - por hermenêutica - a definições curriculares, exacerbações ortográficas, linhagens pertinentes aos conceitos linguísticos. Mesmo que eu venha a respeitar, elogiosamente, quem o faça.

A poesia incrível desse Samurai e Mestre de Shiatsu, Salgado Maranhão, pulula, vibra, cria e recria algo biológico, que massageia e acalma. São princípios do “Karma”, que ainda molham os “Upanisads Védicos”finalidade e essência.

Por isso, digo que esta obra não é um monte de folhas escritas rigorosamente entupidas de regras específicas e cingida em capa dura. Este livro tem medula:

“Em teu uivo há uma agonia/ de bicho rasgando a placenta. E/ há um cio devoluto que chama pra luta (…)”. Às págs. 75.

Consagra-se pela grandeza lírica, feito sangue:

“Que riso orgânico/ se dilata além/ do deserto?/ Além da orla da pupila/ e seus rubis?/ Poderia escandir a manhã/ em fatias/ e doá-la aos pássaros,/ mas estou cego de azuis/ e palavras que sangram (…)”. Às págs. 28.

Por existenciais orgânicos:

“Uma fenda se abriu/ nos lábios, ante/ o vaso partido/ e um desejo/ que nos chama/ a depor./ Fingi que meu cio/ fosse alimento/ aos teus leões domados;/ Sonhei que teu néctar fosse orvalho/ para a cidade em chamas (…)”. Às págs. 70.

Explícita mensagem calórica, brotando de suspiros de nirvana; estado eterno de graça.

Agora, confesso: essa minha ideia de mudança de foco nas análises lírico-artísticas vêm desde o momento em que assisti e ouvi a fala do professor John Keating, personagem de Robin Williams, no filme "Sociedade dos Poetas Mortos", diante do prefácio “Entendendo poesia”, do Dr. J. Evans Pritchard, Ph.D.

De forma emocionante ele diz: "Não estamos abrindo valetas. Estamos falando de poesia. Como pode descrever a poesia como se fosse um concurso? (...) Quero que rasguem essa página. (...) adeus J. Evans Pritchard, esta é uma batalha. É guerra. Os feridos podem ser seus corações e almas (...) Não importa o que digam, não lemos, nem escrevemos poesia porque é bonitinho. Mas porque somos humanos, porque a raça humana está repleta de paixões (...)".

Ano passado (2022), trinta e dois anos depois do lançamento do filme (1990), dou-me com "Ópera de Nãos" e isso robusteceu a minha coragem de mudar o foco, mesmo que alguéns ou ninguéns, viessem a interferir em minhas elucubrações.

Foi assim, mestre Salgado Maranhão, que mergulhei em teu livro de poesias. Com a certeza de que a tua lírica tem que ser entendida de forma inversamente proporcional ao tecnocrático, ao pirotécnico, sem analgia ou parcialidade.

Nesse caso específico, a leitura poética deixa de ser, unicamente, um padrão estético, para ser um instrumento lírico a interagir diretamente com nossos mais puros (ou impuros) sentimentos, tornando a mente equilibrada, o perispírito incorporado e o “ruach” - o nosso espírito natural - cheio de energia.

Eis a mágica, portanto, conterrâneo.

Xeque-mate!

Curitiba-PR

24.02.2023

Mhario Lincoln, Presidente da Academia Poética Brasileira.

SÃO LUÍS - FUNDADA POR FRANCESES E COLONIZADA POR PORTUGUESES: SAIBA SE VOCÊ TEM EMITIDO

OPINIÃO ERRADA OU ACERTADA SOBRE O TEMA

ANTONIO NOBERTO,

Foto: Antonio Noberto e o francês Jean-Marie Collin fazendo a entrega ao então governador do Maranhão José Reinaldo Tavares, do brasão recém-descoberto de Daniel de la Touche, fundador de São Luís.

Faz um século que a fundação francesa de São Luís é alvo de criticas por parte de alguns intelectuais defensores da colonização e da causa portuguesa. Nas ultimas décadas, com o declínio do império e do legado francês em todo o mundo, as críticas àherançagaulesatomoucorpo considerável. A acidezdas maledicências, no entanto, não são uma maldade pura e simples, mas parte de um rito de destruição das últimas colunas de um império findante para abrir espaço aos reinos sucessores. É por este prisma e fazendo esta leitura superior quea presença francesanoBrasil deve serobservada. Éolhando por cimaqueconseguiremos enxergarmelhor e ver o todo, e não o contrário, mirando apenas o específico como alguns fazem. Um dos assuntos levantados nos últimos dias sobre este tema é se a semelhança entre algumas partes do centro histórico de São Luís do Maranhão e alguns logradouros e casarões de Lisboa não seriam uma prova de que a fundação da capital maranhense seria portuguesa. Tal pensamento é semelhante ao "mico" de perguntar a uma mulher com uns quilinhos a mais se a mesma está grávida de cinco meses. O erro nos remete ao sábio adágio popular que nos adverte que "as aparências enganam" ou ainda: "De longe, toda montanha é azul".

O pós-guerra trouxe um rearranjamento geopolítico e econômico mundial, onde o império europeu saiu enfraquecido com a submissão francesa ao exército de Hitler e ao enfraquecimento econômico britânico. Por outro lado, a entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra foi o ponto chave para a ascensão de um novo império mundial. Desde então o que se viu foi o declínio do idioma e da influência francesa em todo o mundo incentivados pela força do nascente império ianque.

Isto posto, é mister analisar aqui no Brasil as transformações dos topônimos observadas nas últimas décadas, a exemplo da Base Naval do Rifoles, marco inicial do bairro do Alecrim, que nas últimas décadas teve o nome alterado para Base Naval do Natal. Outra descaracterização é a Rua Paris, primeiro logradouro do Brasil setentrional, na cidade de Viçosa do Ceará, onde os franceses Charles Des Vaux e Adolphe de Montville fundaram (por volta de 1590) e mantiveram uma espécie de colônia francesa na Serra da Ibiapaba. A rua Paris

teve o nome alterado para José Siqueira, restando a rua Pedra Lipse, que dá acesso à igrejinha do Céu. O que vem acontecendo no Maranhão é apenas a continuação da dilapidação do legado estrangeiro no Brasil. As pessoas de conhecimento e boa fé sabem quão grande foi a obra civilizatória dos franceses no Maranhão. Aboa convivência eoinvestimentoinicialfoi largamentesuperior às demais fundações portuguesas no Brasil observadas entre os anos mil e quinhentos e e mil e seiscentos, quando a imensa maioria dos marcos fundacionais à época era apenas missas rezadas sob uma árvore ou quando muito fortalezas de pau-à-pique. A herança dos franceses em São Luís, por outro lado, foi algo suficiente e muito superior às fundações portuguesas observadas país a fora.

Sobre a semelhança da arquitetura lusa e ludovicense, engana-se quem confunde fundação (nascimento) com colonização (crescimento). Arquitetura diz respeito ao séculos seguintes ao momento fundacional e não ao século XVII (anos mil e seiscentos).

O que existe do período fundacional de São Luís (1612 a 1650) é muito pouco. De arquitetura não sobrou quase nada (ainda existem as balizas francesas: praça do forte - Praça Pedro II; "fonte de água límpida" - Fonte do Ribeirão, praia do Estaleiro, etc; o traçado espanhol da capital, pelo engenheiro Frias de Mesquita, etc)... No mais, as construções que vemos hoje começaram de 1770 em diante, após o boom econômico advindo com a implantação da Cia de Comércio do Grão Pará e Maranhão. Nada da nossa arquitetura é do período fundacional. Quase tudo é do Século das luzes (XVIII) e do do século do Luxo (XIX). Mas muito antes de tudo isso foram os franceses que desbravaram com sucesso a região ainda nos idos anos mil e quinhentos. Os portugueses até que tentaram, mas sem sucumbiram em naufrágios e nas poucas posses dos donatários das capitanias hereditárias.

Foram os franceses que, no alvorecer dos anos mil e seiscentos puseram o nome na capital tomando emprestado o nome do rei francês Luís XIII e do rei Santo Luís IX.

À vista disto, a arquitetura de São Luís representa a colonização portuguesa. Fato! Mas a escolha do nome e da localização da cidade coube aos súditos de Sua Majestade o Rei francês.

No mais, as críticas descabidas e insistentes à fundação francesa da capital maranhense diz mais respeito às tentativas de destruir definitivamente o que sobrou do império francês e ao desejo da ganância política e econômicadediminuiroas balizas dacivilizaçãoparaempobrecerintelectualmenteasociedademundial (note que fazem o mesmo com a Atenas brasileira) e, com isto, "comprar" fácil e conquistar sem resistência o que ainda existe de belo e de civilização neste belo mundo nos legado pelo Criador.

A gente se vê!

Original do texto. (Noberto, Antonio).

EspeciaisMATÉRIAS HISTÓRICAS A ANTOLÓGICA ENTREVISTA DE UBIRATAN TEIXEIRA COM

BERNARDO COELHO DE ALMEIDA

A entrevista está publicada às últimas páginas do livro de Bernardo, "Éramos Felizes e Não sabíamos", 2ª edição.

Por: Mhario LincolnFonte: Mhario Lincoln/Ubiratan Teixeira/Bernardo Coelho de Almeida

Ontem em Alcântara,paraum grupodepessoasprivilegiadas, queforam participardainauguraçãoda Pousada do Mordomo Régio, da Academia Maranhense de Letras, Bernardo Coelho de Almeida autografou seu livro Éramos Felizes e Não Sabíamos, memória dos anos 50 de São Luís. O poeta Nauro Machado, que leu o livro ainda no original, admite que até então nenhum escritor havia feito um levantamento tão preciso e precioso da vida social e cultural de São Luís, como Bernardo, nestas suas memórias.

Poeta, jornalista e prosador, Bernardo Almeida começou sua carreira literária com o livro de poesias Luz! Mais Luz!, publicado pela Editora Mantiqueira de Belo Horizonte, em 1954. Seguiram-se A Gênese do Azul (poesia-1955), Galeria (crônicas-1961), A Última Promessa (romance-1968), O Bequimão (romance1973).

Membro da Academia Maranhense de Letras, e ligado aos melhores momentos da imprensa maranhense, BCA foi presidente da extinta Fundação Cultural do Maranhão (hoje Secretaria de Cultura), participou como um dos fundadores darevista"Legenda", demomento marcantedavida cultural doEstado,e em suapassagem pelo Peru, como adido cultural, atuou como professor do Centro de Estudos Brasileiros, em Lima, de onde trouxe muito mais do que deixou, segundo seus depoimentos. Aproveitando o lançamento de seu livro de memórias, conversamos com o escritor, para a entrevista que segue.

Bernardo Coelho de Almeida é um dos intelectuais maranhenses de vida integral mais intensa e campo de atividades mais diversificado. Sacerdote pela metade, viveu no Rio de Janeiro, em Fortaleza, Parnaíba e Peru. Deputado Estadual por três legislaturas, jornalista em tempo integral, admite que se tivesse sido mais inteligente teria usufruído os melhores momentos de sua vida intelectual durante o período em que esteve como adido cultural junto à Embaixada do Brasil no Peru: "Aquela é uma civilização deslumbrante, uma cultura extremamente preciosa, um repositório de informações inesgotáveis, que eu não soube aproveitar nas devidas proporções", confessa. - Tu te sentes de alguma forma frustrado na vida? -perguntei-lhe. "Não. Nem

Ubiratan & Bernardo Ubiratan & Bernardo

por isso respondeu-me. Fiz tudo o que me deu na telha, tenho minhas convicções e o meu modo peculiar de vida que muito me satisfaz, e hoje sou um homem rico, rico de experiências e ideias. Só lamento não ter me dedicado mais à literatura. Descuidei-me, e agora preciso ter muito cuidado no que produzo, pois não tenho mais idade para me ocupar com trivialidades: sou um homem sério" -concluiu sorrindo e com um ar matreiro. (Ubiratan Teixeira).

A ANTOLÓGICA ENTREVISTA DE UBIRATAN TEIXEIRA COM BERNADOR ALMEIDA

UT-De Luz! Mais Luz! e A Gênese do Azul, a Bequimão, o que mudou no intelectual Bernardo Coelho de Almeida?

BCA- 0 "mundo besta", a que se refere o poeta Lago Burnett, coloca muitas pedras no caminho do intelectual para desviá-lo do seu itinerário de Pasárgada. Levado pela tentação de uma estrada amena, ele pode sacrificar nossos melhores projetos. Isso aconteceu comigo, deploravelmente. Hoje, ainda bem, resta-me o conforto de haver conquistado uma visão melhor do mundo e a consciência de que devo atirar-me de corpo e alma na busca do tempo perdido.

UT-O Bequimão é do começo dos anos 70. Por pouco esta coletânea de crônicas/memórias não circula vinte anos depois. Preguiça ou falta de tempo para produzir literatura?

BCA - Falta de tempo e um pouco de preguiça. Deixei-me envolver demais por interesses absorventes no rádio, na política e em incursões frustradas como empresário. Somente o Augusto Frederico Schimidt andou se aventurando no mundo dos negócios sem deixar de ser poeta. De qualquer forma, se eu não tivesse sido tão injusto comigo, haveria um pouco de tempo para as musas. Quando não se possui erudição, resta-nos a boa companhia de intelectuais parceiros, para não se perder o élan. E eu me distanciei desse mundo de minha fascinante "geração perdida".

UT-Conta um pouco da gênese de O Bequimão.

BCA - Senti-me empolgado por um apelo de João Lisboa. Como gerente da Tipografia São José, eu recebia a visita, quase diária, de Arnaldo Ferreira, meticuloso na revisão do Boletim da Associação Comercial, ali impresso. Falei-lhe de minha pretensão. Ele me abriu as portas de sua biblioteca para minhas pesquisas. Confiando em mim, permitiu-me levar para casa alguns livros raros: Betendorf, Berredo e outros, os quais, com sua morte, me foram presenteados por seu filho Murilo Ferreira. Aqueles autores, com exceção de nosso maior historiador, anematizavam nosso herói. Se um século depois, em Vila Rica, a casa de Tiradentes foi demolida, e salgado o terreno onde ela se erguia, avaliem naqueles tempos de um colonialismo mais repressivo. Tomei as dores de Bequimão e seus companheiros. Perdoados os pecados do texto, creio que fui feliz na reconstituição romanceada do notável episódio histórico, digno de maior reverência nacional.

UT-Quais os maiores obstáculos que um escritor maranhense enfrenta para escrever a partir de dados com informação?

BCA-Eis uma resposta para ser dada por Mário Meireles, Nascimento Morais Filho, Milson Coutinho, Jomar Moraes,EloyCoelhoNetoeoutroseméritospesquisadoresdenossahistória.Nesseparticularnossas carências são inimagináveis. Creio que as universidades locais, com subsidios oferecidos pelo poder público, deviam promover a ida de nossos historiadores aos arquivos de Portugal, Espanha, França e Holanda. Após a morte de seu pai, Murilo Ferreira me passou um documento enviado do Tombo, em Lisboa, a Arnaldo Ferreira. Era o traslado da apelação de Manoel Beckman à Corte, quando de seu degredo no Forte do Gurupá. Do contrário eu jamais teria acesso à qualificação do herói e a informações fidedignas sobre suas atividades empresariais, e sua família.

UT-Já participaste de vários grupos de opinião e de decisão, no Maranhão; o que mais enriqueceu o artista e o escritor? O jornalismo, a politica ou a administração pública?

BCA- Talvez a política, seguida da administração pública, quando fui, por apenas 14 meses, presidente da Fundação Cultural do Maranhão. Conhecer a fundo os problemas do povo é uma forma de mergulhar em seus sentimentos, na alma humana, do que resulta uma experiência inestimável convertida para o exercício da literatura. Por outro lado, ao gerir bens culturais, tem-se a dimensão desses valores preciosos e convive-se melhor com seus apaixonados agentes. Mas, se queres saber de uma verdade, eu te digo: ser boêmio (e assim me qualifiquei durante algum tempo) enriqueceu-me bastante a inspiração, por incrível que pareça.

UT- Como foi a experiência de adido cultural junto à Embaixada do Brasil no Peru? E que experiência trouxe como professor no Centro de Estudos Brasileiros em Lima?

BCA- Foi magnífica, tão rica e tão breve que hoje me arrependo de não ter sabido aproveitá-la mais intensamente. O Peru talvez só perca para o México em grandeza histórica no continente americano. Se eu pudesse,iriaviveralguns anos, dos queaindamerestam devida,naquelanação.Ali oespíritohumanoprocura alçar-se às alturas de Macchu Picchu, na Cordilheira dos Andes. Ter sido professor, mesmo sem qualificação e vocação magisterial, no Centro de Estudos Brasileiros em Lima, foi-me uma experiência gratificante, inesquecível.

UT- Que destino tiveram os escritores maranhenses de tua geração?

BCA- Olha, Ubiratan, tu encarnas o escritor de minha geração. O talento de vocês, como potencial, talvez não seja igualado tão cedo. Pena que persistam tantas inibições e frustrações decorrentes das dificuldades do meio e do desencontro existente aqui mesmo entre nós. O malandro carioca, tolhido em seu afã donjuanesco, diante do concorrente burguês a dirigir um automóvel costuma dizer: "Eu quero ver é a pé...". Quanto às nossas limitações, vivemos, quero crer, esse mesmo drama, diante de um Jorge Amado, de um Josué Montello, não achas?

UT-E hoje, como está a literatura maranhense?

BCA- Talvez necessite de mais prospecção para a descoberta dos poços latentes e promissores de talentos aindanão revelados. Assim mesmo, sabes disso,separando-seo joio dotrigo,temos belos valores, atualmente. Quem não se deixa render diante desse notável Luís Augusto Cassas?

UT- O que falta para a literatura maranhense atingir um nível nacional, como a mineira, a baiana, a goiana e a gaúcha?

BCA- Sei lá, Ubiratan. Tal fenômeno implica em questionamentos que atingem o âmbito da sociologia, da economia. Cabe-nos desvendar as causas desse fenômeno, encontrarmos um diagnóstico. Só sei que por falta de talento não é. Infelizmente a coisa não é fácil de explicar, senão a gente poderia perguntar ao Tamer...

UT- A Academia Maranhense de Letras tem algum peso na vida cultural do Estado?

BCA - Tem, não como deveria. Temos vivido enclausurados, quando muito abertos, formalmente, para não dizer solenemente. Jamais teremos o direito de menosprezar a atuação devotada de Luiz Rego, por exemplo. Mas, é preciso reconhecer que agora, com Jomar Moraes a presidir nosso sodalício (mantenha a expressão), a Academia Maranhense de Letras vai atingir seus objetivos, desde que não lhe faltemos com nosso apoio indispensável. Com raras exceções temos sido relapsos e conformados. Nosso dever é realizarmos o ideal de Platão, reunindo-nos durante mais tempo, em nosso jardim de Academus, e não apenas nessas tardes melancólicas das quintas-feiras. Confesso também meu descaso, minha falta de assiduidade. Tudo depende de nós para que Academia Maranhense de Letras cumpra sua verdadeira missão, conduzida pelo abnegado Jomar Moraes, não crês?

(Entrevista reproduzida às últimas página do livro "Éramos Felizes e Não Sabíamos", 2ª edição - ed. Revista Legenda Editora - 1992).

UMA DAS MAIORES RADIOGRAFIAS EXISTENCIAIS DE SÃO LUÍS, FORA DA CAVERNA DE PLATÃO

BERNARDO COELHO DE ALMEIDA.

Bernardo Almeida e sua obra.

Bernardo Coelho de Almeida, cronista, jornalista, político, poeta, romancista, autor de dois grandes romances: "A Última Promessa" e "O Bequimão", além de "Luz! Mais Luz" e "A Gênese Azul" (poesias) e o indescritível livro de crônicas "Galeria".

PARTE 01

Bandeira Tribuzi (mais abaixo, ilustração original do texto publicado no livro "Éramos Felizes e Não Sabíamos"). Capa de Fernando Almeida. Ilustrações de Mário Garcês. Arte-Final: Ribinha. Revisão gráfica: Herbert de Jesus Santos. Segunda edição: 1992. Obs: esta publicação consta do livro acima referido. Vem datada do ano de 1988, portanto, com as características urbano-sócio-comerciais dessa época. Está conforme o original.

NE: Esta reprodução não visa lucros, nem publicidade pessoal ou 'transferível'. Apenas uma homenagem aos grandes nomes da história literária do Maranhão e do Brasil.

A CHEGADA

No dia oito de setembro de 1987, quando a cidade de São Luís festejava os 375 anos de sua fundação, e rememorávamos o décimo aniversário da morte do poeta Bandeira Tribuzi, o caderno alternativo do jornal O Estado do Maranhão publicava uma crônica de minha autoria, que assim começava:

BrasilTEXTOS ESCOLHIDOS
Poeta Bandeira Tribuzi. (Ilustração original: Mário Garcês).

"Pela vigia de um dos camarotes do navio Comandante Ripper, o olhar do garoto de dez anos de idade alcança a paisagem chuvosa: a colina adormecida e o casario sobreposto em diferentes planos acima do rodapé pontilhado de luzes que se refletem nas águas da baía de São Marcos. A partir daquela madrugada de fevereiro de 1938, o meu destino estaria para sempre encravado em São Luis igual aos empedernidos alicerces de seus velhos sobrados, de cujos mirantes apascento sonhos, luares e saudades".

Naquele tempo não podia existir cidade mais amena e encantadora do que São Luís do Maranhão. Sua população não ia além de noventa mil habitantes. Ninguém falava em desemprego, palafitas e gente faminta. As fábricas de fiação e tecelagem Santa Isabel, Santa Amélia, Camboa, Rio Anil e Cânhamo - que nos acordavam ao alvorecer com o silvo de seus longos apitos davam guarida a milhares de operários saudáveis e felizes.

O grande comércio local orgulhava-se da solidez inabalável de seus estabelecimentos, com reduto na Praia Grande. Ali estavam Martins & Irmãos, fabricantes do algodão hidrófilo de melhor qualidade do Brasil e do sabão Martins "sempre imitado e nunca igualado", referido nos apelos de solidariedade humana, quando se dizia que "uma mão lava a outra e o sabão Martins lava as duas". Subia-se ao escritório dos aristocráticos diretores da firma em um pequeno elevador gradeado, o primeiro de São Luís, hoje transformado em peça de museu.

Cunha Santos, Gaspar Marques, Chagas e Penha, Lages & Cia., Romão dos Santos, Azevedo e Moreira, Chames Aboud, Baptista Nunes, Moreira Sobrinho, Lima Faria, Francisco Aguiar (com sede na Avenida Pedro II), Silva Linhares e outras firmas formavam uma elite comercial que não dependia de crédito bancário para reforço de seus negócios, salvo do Banco do Brasil, nas transferências de valores a outras praças, e, mais para prestigiá-lo, dos serviços do velho Banco do Maranhão, detentor da segunda carta patente mais antiga do Brasil, concessão de uma época em que lhe era assegurado o privilégio de emitir papel-moeda. Nas tradicionais mercearias da cidade éramos saudados sempre em amável sotaque lusitano; nelas podíamos comprar o melhor bacalhau, puro azeite de oliva, bons queijos, nozes e requintados vinhos portugueses, mais facilmente e de melhor categoria do que se compra hoje uma mercadoria qualquer nos modernos supermercados. A Casa Dias (onde agora funciona a Sapataria Clark), a Casa Branca e o magazine A Exposição sustentavam a moda masculina - a primeira com a venda exclusiva dos famosos chapéus Ramezzoni, indispensáveis adereços da elegância dos cavalheiros.

O Bazar do Japão, as livrarias Universal e Moderna, as padarias, as alfaiatarias, estúdios fotográficos (um se chamava Londres, e o outro Berlim) e as farmácias, com laboratórios de manipulação, localizavam-se em pontos dispersos. Contudo, o império do comércio varejista concentrava-se, no "quarteirão sucesso da cidade", como era denominada a primeira quadra da Rua Grande.

Ali ficavam as grandes lojas de tecidos Rianil e Pernambucanas, a Sapataria Cleópatra (do Romualdo), a Padaria Cristal (do português Frias), a Farmácia Garrido, o bazar de Valentim Maia e o café do baixote Pataquinha, pois acima do cinema Éden era menor o movimento, sobressaindo-se a Mercearia Lusitana (embrião da poderosa cadeia de supermercados dos dias atuais), a loja Otomana e outra, de um carcamano alto, magro, que usava enormes suspensórios (pai de Hédel Azar), a alfaiataria de Carlos Souza (que confeccionava a farda de gala azul-marinho, com alamares dourados, dos alunos dos Maristas), o "Quatro e Quatrocentos" (Lojas Brasileiras) e, lá adiante, no canto da Rua de Santa Rita, em belo prédio "art nouveau", a conceituada Mercearia Neves. Nenhum de nós poderia imaginar o que seria a Rua Grande de hoje, com essas movimentadas agências bancárias, os fervilhantes magazines e a multidão dos camelôs aos quais se juntam milhares de transeuntes para torná-la um formigueiro humano.

A cidade contava apenas com meia dúzia de "carros de praça". O automóvel do Dadeco dava "status" a quem lhe contratava as corridas nas festas de bodas e batizados. O transporte urbano resumia-se nos bondes da Ullen Company: "Gonçalves Dias", "São Pantaleão", "Estrada de Ferro", "Areal", "João Paulo-Anil", este com o "cara dura" a reboque, para que os granjeiros da Maioba, Paço do Lumiar e outros sítios do interior da Ilha pudessem conduzir cofos de frutas e hortaliças. Nos demais, podia-se tomar assento ao lado de senhoras e senhoritas elegantes da alta sociedade, e de circunspectos desembargadores a caminho do Tribunal de Justiça.

Era muito agradável andar num daqueles trepidantes bondinhos, que subiam e desciam as ladeiras de São Luís, com as sinetas a tocarem em aflitos pedidos de passagem às lerdas carroças, à carreta de venda de gelo, aos verdureiros, sorveteiros e vendedores de frutas da terra, camarões e peixes frescos: "Olha o peixepedra de Ribamar."!

Nas tardes de domingo, o passeio de bonde fazia parte do nosso lazer. Caso não se consagrassem à simples satisfação de dar umas voltas, os passageiros, todos bem trajados, desciam até à "Pracinha" (Benedito Leite), entregue à animação de uma banda de música em retreta. Além disso havia o indeclinável "footing" na Avenida Pedro II, onde a rapaziada ia flertar com as pequenas, e ficava-se a andar para lá e para cá, prazerosamente.

Depois ia-se tomar o sorvete de bacuri, graviola, murici, cajazinho, juçara ou coco, no Lauande ou Moto Bar, até a hora da sessão das oito no cinema Éden, ou do espetáculo, no Arthur Azevedo, durante as temporadas de companhias teatrais de passagem para Belém e Manaus.

Nosso pequeno mundo provinciano era singelo, tranquilo e amável. Mesmo assim fomos atingidos, à distância, pelos horrores da II Grande Guerra, transformada em prato do dia dos noticiários da imprensa e das emissoras de rádio, assim como das rodas de bate-papo no Café do Chico. O afundamento dos primeiros navios da Marinha Mercante brasileira arrastou às ruas milhares de pessoas a clamarem por uma declaração de guerra às nações do Eixo (Alemanha, Itália e Japão). De repente o ódio invadia nossos corações.

José Machado:

Crédito/Câmara Federal.

(Na segunda parte, os respingos da II Grande Guerra, as Passeatas Cívicas, onde surgiram grande oradores e tribunos. Um deles, o conhecido e respeitado José de Ribamar Farias Machado, inúmeras vezes reeleito Deputado Federal/MA).

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