Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga - Autor: Marcos Rossiny Leandro

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HistĂłria da FamĂ­lia Manteiga

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RaĂ­zes do Cerrado:

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História da Família Manteiga

Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga

Marcos Rossiny Leandro 3


Raízes do Cerrado:

Copyright @ 2020 Marcos Rossiny Leandro Coordenação Editorial: Marcos Rossiny Leandro Projeto Gráfico/Diagramação/Capa: James Cruvinel Junior / jameskalel@gmail.com

Ficha Catalográfica LEANDRO, Marcos Rossiny Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga / Marcos Rossiny Leandro. – 1.ed. - Catalão – GO : Gráfica Modelo, 2020. Inclui bibliografia e índice ISBN 978-65-00-08289-0 1. História Oral. 2. Memória. 3. História Familiar.

Impressão: Gráfica Modelo Av. Raulina F. Paschoal, n° 535 - Centro CEP 75.701-480 - Catalão-GO Fone: (64) 3411-2223 2020 Impresso no Brasil Printed in Brazil 4


História da Família Manteiga

Dedicatória Aos idealizadores do projeto, preservadores da memória familiar e aos entrevistados, que não mediram esforços para participar desse projeto de resgate histórico de uma grande família; Aos meus familiares, amigos, professores que juntos incentivaram e auxiliaram no processo de escrita, catalogação de dados, releituras, correção e busca de fontes; Aos leitores e principalmente ao povo campoalegrense, que encontrem nesse livro um pouco de sua história, de uma família que mudou para sempre a face de sua cidade.

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História da Família Manteiga

Agradecimentos

A Deus;

Aos entrevistados que se sentaram por horas frente a um gravador e contou sua história, sua memória, envolta de um casal trabalhador, patriarca de toda uma geração: Sebastião Ferreira Álvares da Silva e Maria Emídio Álvares; A todos que colaboram de forma direta e indiretamente para a concretização desse livro, acompanhando em viagens, enviando fotos e dados, conversando sobre a família, fazendo releituras, auxiliando na catalogação de fotos, dentre outros processos que envolveram para o resultado final; A toda família, que abriu suas portas, resgatou suas lembranças, emocionou, riu e até mesmo ficou em silêncio diante todas as memórias. A vocês: muito obrigado!

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História da Família Manteiga

APRESENTAÇÃO

O livro “Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga” de Marcos Rossiny Leandro inaugura a investida do historiador pela aventura da história familiar, segundo uma inspiração do método de pesquisa da fonte oral e da biografia histórica. Não é um tipo de investigação nova, mas aponta para novas demandas que os historiadores brasileiros têm recebido nos últimos anos: os pedidos ou contratações de profissionais que possam contar a história de determinados grupos sociais, instituições, práticas culturais entre outros que almejam, ao narrar suas histórias, legar ao futuro uma memória que alcance as gerações vindouras. Nesse sentido, o que se tem chamado dentro da historiografia de História Familiar, tal como Leandro se dispõe a fazer, é um exercício de memória que é, ao mesmo tempo, direito e dever. Direito porque os sujeitos históricos têm um direito à sua memória individual, mas também a sua memória coletiva, o que não envolve apenas seu núcleo familiar direto, mas todo o entorno que o compõe, seja laços sanguíneos, laços sociais ou religiosos. Dever porque é, também dever de um grupo fazer-se conhecer através do que lega do passado ao futuro a seus membros. Isso implica que a história familiar se encontra também nesse processo: o que quer transformar de sua experiência vivida em legado de memória para seus descendentes. Aqui é importante destacar, como o livro irá mostrar ao leitor, que o pesquisador se valeu de um encontro com a memória familiar, através das fontes que lhe foram disponibilizadas pelo grupo para compor a história da família que apresenta. Ou seja, o livro não é apenas uma compilação de fatos, mas também um processo de construção de sentido próprio do exercício de narrar. Isso impõe perceber que a história da família, como gênero historiográfico não pode ser entendida apenas como uma narrativa simples do passado, mas sim como um conjunto de conhecimentos possíveis por uma iniciativa particular de composição desse passado. Essa perspectiva pode ser recebida com alguma desconfiança pela comunidade historiadora – que por diversos motivos ainda não compreendeu a 9


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importância dessa modalidade de trabalho – porém, ela sinaliza uma mudança também na própria historiografia que se ocupa das histórias familiares. Como muito bem observou Marisa Tayra Teruya1 a escrita da história das famílias no Brasil teve que se adaptar não apenas à mudança temporal, mas também à mudança das próprias famílias, dadas as novas gerações, as novas ocupações e, mesmo, às novas concepções de família com as quais hoje se defronta. Leandro optou por um olhar historiográfico marcado tanto pela demanda familiar dos Manteiga para a escrita da sua história, quanto pelo acervo documental a que teve acesso, ou seja, uma história contada a partir do modelo patriarcal de família posta pela narrativa dos depoentes e testemunhos. Isso implicou em traçar relações entre os sujeitos, suas memórias e o sentido próprio que estes dão ao seu passado e que querem legar ao futuro. Quase um monumento, tal como nos instrui Jacques Le Goof2, o texto de Leandro percorre a relação entre passado e presente, com intenções de futuro de forma que a história dessa família não seja esquecida, mas não seja tomada de forma individual e sim relacionada ao mundo no qual está, ou seja a cidade de Campo Alegre de Goiás e, no tempo no qual experiencia a existência: século XX em diante. Graduado e Mestre em História pela Universidade Federal de Goiás, Marcos Rossiny Leandro além de aventurar-se por um tema de pesquisa diferente daqueles a que está acostumado, reforça no conjunto do que podemos chamar de Historiografia Familiar Goiana, a importância de percorrer as memórias de determinados grupos familiares para, também, compreendermos o tempo e o lugar no qual fazemos História. Boa leitura e que este estudo possa inspirar tantos outros.

Profa. Dra. Márcia P. Santos Universidade Federal de Catalão Junho de 2020 1

TERUYA, Marisa Tayra. A família na historiografia brasileira. Bases e perspectivas teóricas. In: Encontro Nacional de Estudos Populacionais, 12., Caxambú, 23-27 out. 2000. Anais... s.l.: s.n. Disponível em: http://www.abep.nepo.unicamp.br/docs/anais/pdf/2000/TodosA%20Fam%C3%ADlia%20na%20Historiografia%20Brasileira....pdf. Acesso em: 28 de junho de 2020. 2 LE GOFF, Jacques. História e Memória. Campinas, SP: Editora Unicamp, 2003.

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História da Família Manteiga

Sumário Introdução 13 Capítulo I - Retornando às origens – Sebastião e Maria

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1.1 - Sebastião Ferreira Álvares da Silva – um apanhado genealógico

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1.2 - Sebastião Ferreira - A vida em Minas Gerais e a vinda para Goiás

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1.3 - Sebastião: a fábrica e o nascimento do apelido Manteiga

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1.4 - Dona Maria: uma mulher de vida simples

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1.5 - Sebastião e Maria: a formação de uma nova família

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1.7 - É chegada a idade: uma fase nova e à hora do adeus

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Capítulo II - Lázaro Álvares da Silva Campos – um homem além de seu tempo

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2.1 - Da infância a adolescência: relatos de memórias familiares

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2.2 - O casamento e a vida conjugal: pai e marido presente

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2.3 - Lázaro: o engenheiro, empresário e educador

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2.4 - Das eleições à prefeitura: as ações polêmicas, as obras e o planejamento

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2.5 - Sua casa: lugar de família, cozinha, receber autoridades e o gabinete itinerante

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2.6 - Valdeci: seu braço direito

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2.7 - Momentos prazerosos em família à velhice do corpo: a mente jovem e empreendedora

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2.8 - A continuidade de seu legado: Margareth, Elizabeth e Anália

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Capítulo III - A FÉ E VIDA DE LAZARINA ÁLVARES DA SILVA

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3.1 - Álbum de família

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Capítulo IV– Maria Álvares da Silva - ‘Dona Zezica’

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4.1 - Álbum de Família

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Raízes do Cerrado:

Capítulo V – Emídio Ferreira Álvares da Silva – pioneiro no café, grande agricultor e com um estilo próprio de ser

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5.1 - Um agropecuarista de destaque

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5.2 - Família – alegrias e perdas

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5.3 - A vida pública – um influenciador político

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5.4 - Dr. Antônio e Márcia – a continuidade de um legado e a implantação de uma novahistória em Campo Alegre de Goiás

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5.5 - Álbum de família

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Capítulo VI–Letícia Álvares Daher – “Dona alegria”

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6.1 - Uma vida simples na roça

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6.2 - A juventude, os namoros e a paixão pelo poeta

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6.3 - A nova vida: alegrias, filhos e perdas

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6.4 - Álbum de Família

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Capítulo VII–A menina que conquistou Ceres – história de vida da professora Mafalda 141 7.1 - Revivendo o passado – relatos de infância

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7.2 - Uma nova vida: trabalho, casamento e filhos

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7.3 - Álbum de família

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Capítulo VIII–Orazal – “uma paixão na nossa vida”

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8.2 - Os trabalhos na fazenda, chegada dos filhos

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8.3 - A morte repentina e a vida da família sem o pai

162

8.4 - Álbum de Família

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Capítulo IX - De um jovem destemido ao homem de caráter forte – A vida de Luiz Manteiga Álvares de Campos

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9.1 - Infância

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9.2 - O espírito empreendedor

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História da Família Manteiga

9.3 - A vida pública – de vereador à Câmara dos Deputados

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9.4 - Uma família regida pelos princípios cristãos

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9.5 - Álbum de família

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Capítulo X–Tia Anira – exemplo de superação e força de vontade

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10.1 - Lembranças de infância

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10.2 - O casamento, o luto e a luta

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10.3 - Álbum de família

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Capítulo XI–Juarez Manteiga – um visionário e empreendedor

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11.1 - A vida na fazenda: infância à juventude

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11.2 - Volta para casa – empresário, o casamento e novos rumos da vida

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11.3 - A vida de prefeito – “fizemos uma inovação na cidade”

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11.4 - A rotina normal de vida e novos convites a política

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11.5 - De jovem enérgico a Prefeito Municipal: a trajetória de Thiago Manteiga

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11.6 - Álbum de família

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Capítulo XII–Manteigada – a continuação de um legado

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Álbum de família

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Capítulo XIII–De geração a geração – A Castelo Branco como patrimônio familiar

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Capítulo XIV–Descendentes de Sebastião Manteiga e Maria Emídio

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Capítulo XV–Histórias, nossas histórias...

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Raízes do Cerrado:

Considerações finais

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Fontes orais

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Referências Bibliográficas

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Introdução O livro remete a história de um povo, a família Álvares da Silva, pautada nos patriarcas Sebastião Ferreira Álvares da Silva e Maria Emídio Álvares. Ele vindo de Abaeté - Minas Gerais depositou em Goiás suas expectativas de vida, iniciando seus negócios em Formosa e logo mudando para Campo Alegre de Goiás onde veio a conhecer a esposa, que por sua vez, filha de família tradicional na região desde o século XIX. A história central do livro é baseada na vida social e empreendedora do casal, desde seus empreendimentos até a chegada dos filhos, que também recebem devido destaque na história. A obra então tem por objetivo central colher dados dessa família a fim de preservar suas histórias e memórias, pesquisar os agentes transformadores da história familiar e traçar narrativas acerca dos membros famílias. Pesquisar a história da família Álvares da Silva já foi anseio de alguns pesquisadores locais e em própria pesquisa acadêmica realizada anteriormente, mas de forma complexas com outros fins. A ideia para uma pesquisa detalhada, de toda história particular da família surgiu, a partir de conversa entre grupos de primos, que tiveram o interesse em deixar registrados histórias dos antepassados e fatos vividos por eles na presença dos patriarcas da família. Sendo assim, a pesquisa encomendada pelos membros da família foi pensada e executada conforme os anseios dos interessados, com entrevistas aos filhos de Sebastião e Maria, para que a partir de seus relatos fornecidos fosse possível traçar de forma linear a história dos pais e dos demais membros. Por se tratar de uma família numerosa, delimitou os estudos para a história e memória do casal patriarca e dos demais 10 filhos e em alguns casos, adentra-se na narrativa de vida de alguns descendentes de acordo com a necessidade de cada temática trabalhada.


Raízes do Cerrado:

Vale ressaltar que o papel do historiador é dentre os mais diversos, estudar e investigar o passado humano nas mais diferentes vertentes e suas contribuições para as gerações atuais e futuras, assim, investigar e interpretar criticamente os acontecimentos, buscando resgatar a história e a memória dos homens para ampliar a compreensão e visão da humanidade. Um dos meios de trabalho do historiador e pesquisador é a pesquisa encomendada, como essa em questão, visando resgatar os fatos relevantes para os favorecidos com os resultados finais. Muito mais que um livro de memórias, os dados e resultados encontrados com a coleta de dados e a narrativa histórica, revela uma família que desde os patriarcas já sentia a vontade da preservação de sua história e memória, com os zelos dos pais com os filhos e os diversos momentos destinados para conversas sobre a família. Nasce daí a justificativa para escrita do livro, preservar suas memórias e identidades. A memória que parte das vivências do sujeito, que para Le Goff (1990) A memória é um elemento essencial do que se costuma chamar identidade, individual ou coletiva, cuja busca é uma das atividades fundamentais dos indivíduos e das sociedades de hoje, na febre e na angústia. Mas a memória coletiva é não somente uma conquista é também um instrumento e um objeto de poder. São as sociedades cuja memória social é sobretudo oral ou que estão em vias de constituir uma memória coletiva escrita que melhor permitem compreender esta luta pela dominação da recordação e da tradição, esta manifestação da memória (LE GOFF, 1990, p.476)

Entrelaçada à história e memória familiar, está também a história de Campo Alegre de Goiás, onde muitos membros da família participaram ativamente de sua vida política, social e cultural. São comuns durante as entrevistas pessoas levantarem questões referentes à cultura como tradições familiares. Com isso percebemos que, “a memória ativa é um recurso 16


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importante para transmissão de experiências consolidadas ao longo de diferentes temporalidades” (DELGADO, 2006, p.17). E, ainda, Para Walter Benjamin, o ato de contar histórias, até o início de século XX, tinha como propósito primeiro a transmissão de experiências, a vivificação da sabedoria da autora e tinha no ócio uma das condições básicas para sua existência. Por isso, os velhos – aqueles a quem o tempo já propiciara maior acúmulo de experiências – eram os narradores por excelências. (COSTA, 2001, p-73).

Ao narrar os relatos do cotidiano, vamos perceber no livro que, os membros homens da família, levaram muitas de suas histórias para o campo político, pois ao mesmo tempo que a família se desenvolvia a escrita histórica da cidade de Campo Alegre de Goiás estava entrelaçada ao dia-a-dia dos familiares. Uma família que intervém no crescimento da cidade, desde sua emancipação e esteve presente no poder por aproximadamente vinte anos consecutivos. O livro tem um papel histórico para a cidade de Campo Alegre de Goiás, junto com a história da família Álvares da Silva está narrado partes do desenvolvimento municipal, dando destaque a sua política administrativa e seus avanços econômicos pautados nas administrações comandadas pelos membros da família que exerceram cargos no executivo.

Para a pesquisa, utilizamos meios como a história oral, A história oral é se-

gundo Delgado (2006, p.15) “um grande desafio para a comunidade de historiadores, antropólogos e sociólogos que se propõe a reconstituir testemunhos e histórias de vida, utilizando a metodologia de história oral, consiste na definição do que seja a própria história oral” Defendemos que a história oral “é um procedimento metodológico que busca, pela construção de fontes e documentos, registrar através de narrativas induzidas ou estimuladas, testemunhos, versões e interpretações sobre a História em suas múltiplas dimensões” (DELGADO, 2006, p-15).

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Assim, através das perspectivas teóricas da história oral colheremos os relatos dos membros da família Álvares da Silva “Manteigas”, para elaborar sua história. Mas esse exercício, por si só não é um processo uniforme, pois como sugere Delgado, é: […] comum, por exemplo, pessoas se referirem ao passado utilizando-se de expressões como ‘no tempo de Vargas’, ‘à época dos corsos nos antigos carnavais’ [...] também é usual que depoentes, estimulados pelas entrevistas, recordarem a velhas relíquias ou a antigos guardados, encobertos pela pátina do tempo, como fotos, objetos, jornais, discos, cartas, poemas, ente outros recursos, que possam contribuir para tornar o ato de lembrar mais vivo. ” (DELGADO, 2006, p.17).

Portanto, teremos nos depoimentos colhidos relatos que irão contar a história de uma família tradicional, que se auto afirma como sustentada por princípios cristãos e civis. O contato com essa família através de espaço privilegiado de sentimentos, permitido pelo processo de coleta de relatas, durante os quais tive o cuidado de que pudessem contar da forma que preferissem os relatos de memória de sua vida familiar. Assim, as pessoas entrevistadas nos convertem em objeto de estudo, para Ferreira (2000) “a história oral tem tido especial importância não tanto por seus produtos, mas por seus processos; pelo envolvimento maior na recuperação e na reapropriação do passado que ela possibilita. ” Entendendo desta forma a História Oral, o passado pode nos ser apresentado de diferentes formas, sem perder seu sentido, e sem estar aliando as noções opostas de história e memória. O trabalho com fonte oral depende sempre da memória do indivíduo e cada um tem uma maneira de expressá-la. Cabe destacar acerca das imagens fotográficas do livro, um instrumento que nos traz as lembranças de uma vida histórica e social, é documento valioso para conhecermos o passado, por meio dos indícios que guarda. A fotografia pode ser usada como um artefato para a reconstrução 18


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da memória, individual ou coletiva, atrás de suas analises, os entrevistados voltavam ao passado e narravam fatos que aconteceram no dia que ela foi tirada, ou mesmo, em silêncio sentia a saudade daquele parente que já faleceu e está ali registrado para todas as gerações. Boris Kossoy (2001, p.152) explica que “[...] apesar de ser a fotografia a própria “memória cristalizada”, sua objetividade reside apenas nas aparências. Ocorre que essas imagens pouco ou nada informam ou emocionam aqueles que nada sabem do contexto histórico particular em que tais documentos se originaram. ” É importante ressaltar que a imagem da pessoa retratada ali na foto, tem importância para sua história, mas o que não quer dizer que seus sentidos sejam transmitidos para aqueles que a analisam e tentam identificar o contexto por trás daquele registro. No livro, a fotografia vem como um objeto memorialista e ilustrativa dos capítulos. Dentro de cada um deles, fotos que mostram momentos do seu dia-a-dia estão interligadas a informações narradas na história e no final, um boxe como um “álbum de família”, com registros da família reunida em momentos de descontração e eventos sociais. Essencial para compreender as memórias e histórias de uma família, é necessário recorrer alguns temas da historiografia, dentre eles o imaginário, pois para Borges (2007, p.11) “quando falamos de imaginário social, estamos nos referindo às representações e as imagens elaboradas sobre os mais variados aspectos da vida social”. Através disso percebemos o quanto os significados são relevantes para a construção de um imaginário e por esse podemos ver que uma família é um grupo social no qual há inúmeras representações seja de seus locais ou de seus tempos, o que nos remete ao imaginário constituído dentro da própria família. Dessa forma nos prendemos ao imaginário que se refere-se ao campo das imagens levantadas dentro da própria família e suas experiências humanas, constituindo o imaginário social da família, dessa forma, 19


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partimos com a vertentes de Borges (2007, p.13) “a investigar o imaginário familiar sua dimensão moral, como um conjunto de normas e regas de conduta, que se impunham aos membros de uma sociedade na forma de obrigações e expectativas, estabelecidas publicamente e que garantiam com que um indivíduo comportasse e agisse, recebendo dos membros de sua comunidade aceitação ou repulsa. Sistema de laços sociais que os vinculava por meio de uma série de pautas e valores comuns [...]. ” Partindo desse princípio investigamos os valores, atitudes de mais ações que pautavam a vida privada e pública da família Álvares da Silva. Obtivemos então com os princípios da investigação social da família, as representações dessas histórias, um conjunto de explicações e relatos para citar determinados fatos presentes no cotidiano familiar. Conhecemos que a representação faz com que algo não tão familiar possa se tornar familiar, nas mais diversas visões, assim, a interpretação desses acontecimentos e ideias sejam internalizadas pelos agentes e posteriormente aceitos pela sociedade. No desenvolvimento da pesquisa, vimos que se tornaria uma narrativa biográfica, pois, discorre sobre uma família e seus agentes, pois, todo relato de memória aqui contado, passa a ser uma confissão de testemunho da cultura e dos fatos vividos. Assim, a obra remete a fatos particulares das várias fases da vida de nossos personagens. Por se tratar de uma obra que resgata a memória de agentes históricos presentes em nosso dia-a-dia por meio de uma biografia de vida, trato como Le Goff (2002, p.20) que “como as publicações biográficas têm sido abundantes há alguns anos, porque o gênero está na moda, pode-se pensar que se trata de um exercício fácil, no que é suficiente estar documentado, o que é geralmente possível, e ter um certo talento para escrever [...]”, mas muito além, uma obra biográfica tem seus divergências, muitas vezes me reencontrei com vários problemas de investigação “e da escrita histórica 20


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com os quais até então na e tinha deparado”. O silêncio dos entrevistados diante tais fatos questionados e o “desconversar”, são alguns dos obstáculos encontrados pelo historiador diante a pesquisa biográfica encomendada. Ao citar a escrita histórica, o historiador deve levar em consideração ao que se pede sua fonte, muitas vezes, termos utilizados historicamente podem ser retirados, assim, como Le Goff, “a biografia confronta hoje o historiador com os problemas essenciais de seu ofício de um modo particularmente agudo e complexo [...] sendo ela uma das maneiras mais difíceis de fazer história. ” Mas o método biográfico buscar produzir uma narrativa com efeitos reais ao leitor, para transmitir emoções e aguçar a memória. As narrativas contidas na obra, refletem de uma análise de todos discursos colhidos, afim de produzir formas que contextualizem e preserve os fatos da família Álvares da Silva. De forma linear a obra contém quinze capítulos. O primeiro deles, retorna as origens dos patriarcas – Sebastião e Maria –, levantando um apanhado genealógico de cada um deles, os motivos da vinda de Sebastião para Goiás e o dia-a-dia de Maria Emídio antes do casamento. Ainda nesse capítulo o leitor poderá analisar o cotidiano da família desde o casamento, nascimento dos filhos, negócios, a instauração da primeira fábrica da região de Campo Alegre de Goiás até chegar a morte do casal e a continuidade de seu legado. No segundo capítulo, trataremos sobre a vida de Lázaro Álvares da Silva Campos, o primeiro filho do casal, que através do gosto pelos estudos e a curiosidade pelos avanços tecnológicos, desenvolveu várias técnicas em sua fazenda, fazendo-o a ficar conhecido na região e se tornar o primeiro membro da família a ocupar o cargo de Prefeito Municipal na cidade. 21


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O terceiro capítulo é dedicado a vida de Lazarina Álvares da Silva, a primeira filha de Sebastião e Maria, que teve desde a infância a manifestação e interesse por seguir os preceitos religiosos. Impedida pelo pai a seguir sua vocação, rezou por diversos dias seguidos até que sua fé o comovesse e só então, autorizar a filha a seguir os estudos à vida religiosa. No quarto capítulo, veremos sobre a vida a professora Maria Álvares da Silva, popularmente conhecida como Dona Zezica. Trataremos de sua infância, vida conjugal e a luta para criar os filhos intercalando com o dia-a-dia de professora da rede pública de ensino. Com um estilo próprio de ser, Emídio Ferreira Álvares da Silva, ganha destaque no quinto capítulo da obra. Um empreendedor do café na região teve sua vida marcada por diversas perdas familiares e financeiras, que o deixaram marcas em sua essência. Aqui trataremos também do grande influenciador político que articulou na eleição do genro Antônio Jácome Neto à prefeito da cidade de Campo Alegre de Goiás, mantendo a hegemonia da família no poder público. No sexto capítulo, analisamos a vida de Letícia Álvares Daher, dona de uma alegria insubstituível, narrou sua história de forma simples e alegre. O leitor irá perceber nesse capítulo os fatos voltados ao relacionamento conjugal, às formas de uma como uma moça criada no meio rural e educada em colégio interno, era preparada para a vida matrimonial no início do século XX. Mas uma grande professora na família, Mafalda Álvares Campos, é a personagem principal do sétimo capítulo. Ao reviver seu passado lembra-se de fatos importantes e detalhes que marcaram a vida dela e das irmãs ao lado da mãe. A filha que se mudou para mais distante dos pais afim de exercer a profissão de professora, hoje retorna frequentemente para junto da família. 22


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O oitavo capítulo é dedicado a Orazal Afonso Álvares, um jovem que perdeu sua vida em um acidente de trator na sua própria fazenda, deixou marcas em todos os irmãos que se lembram de forma saudosa. A vida de Orazal é contada através de relatos da esposa e de alguns filhos. O nono capítulo é dedicado ao político Luiz Manteiga Álvares da Silva, veremos que desde sua juventude foi um jovem de coragem para enfrentar os obstáculos de sua vida. No capítulo tratamos de sua infância, o espírito empreendedor e sua vida pública como prefeito da cidade, marcada por obras que marcaram sua gestão. No capítulo dez, veremos a história de Anirazal Álvares de Pádua, uma mulher simples, que perdeu o marido muito cedo e teve que conciliar a educação dos filhos, trabalho e tempo. No décimo primeiro capítulo, trataremos sobre a vida de Juarez Álvares da Silva, o último filho do casal Sebastião e Maria. Juarez que estudou na cidade do Rio de Janeiro –RJ, voltou para a região afim de empreender e trabalhar em sua formação, mas logo entrou para política com o objetivo de dar continuidade ao legado da família e contribuir com o desenvolvimento da cidade. Nesse capítulo, também veremos sobre sua vida particular e a educação dos três filhos. Também, trataremos acerca do filho Thiago Manteiga Álvares da Silva, que seguindo o exemplo do pai e influência da família ingressou na política e se tornou prefeito do município de Campo Alegre de Goiás. O capítulo doze relata sobre a importância da convivência familiar e instauração de encontros anuais de família, denominado “Manteigada”. Nele veremos sua origem, rituais e continuidade do legado dos encontros. No décimo terceiro capítulo trataremos sobre a Cachaça Castelo Branco, que está na família desde a geração de Joaquina de Pompéu, uma das primeiras a produzir a aguardente. 23


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O décimo quarto capítulo aborda a árvore genealógica da família. Como todos os membros descendentes de Sebastião Ferreira Álvares da Silva e Maria Emídio Álvares até os dias atuais. Por fim, o décimo quinto capítulo é dedicado as histórias familiares, contadas em encontros e entrevistas, onde os que desejaram retornar o passado, deixaram gravados às futuras gerações, fatos que ocorreram com os membros da família, tanto na presença dos avós, quanto em outros momentos reunidos.

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Capítulo I Retornando às origens – Sebastião e Maria Toda história tem seu início. Neste livro retratamos a vida de uma família muito importante na região de Campo Alegre de Goiás, família tronca na cidade, que a história de cada um de seus membros se entrelaça com seu desenvolvimento. De um lado temos um grande homem, de personalidade forte, com descendências mineiras e de outro uma mulher simples e batalhadora, de família regional, pais de 10 filhos que com personalidades diferentes, constituíram suas famílias e enfrentaram seus obstáculos, mas sempre relembrando os ensinamentos transmitidos por gerações. De início vamos tratar das origens, voltar ao passado, buscar relatos pessoais de membros das duas famílias, a de Sebastião Ferreira Álvares da Silva e de Maria Emídio Álvares. Segundo Kobner (p.4) “O grupo familiar é uma referência fundamental para a reconstrução do passado, porque ele é, ao mesmo tempo, objeto e espaço para recordações. Sempre há na família a figura do guardião ou guardiã da memória, é aquela pessoa “escolhida” para cuidar e transmitir a memória familiar e do grupo. ” Assim, a memória familiar é imprescindível para a reconstituição do passado, seja individual ou coletivo, sendo considerado um recurso fundamental para a apreensão da identidade e da história. 1.1 - Sebastião Ferreira Álvares da Silva – um apanhado genealógico Para embasar nos estudos acerca da genealogia de Sebastião Ferreira Álvares da Silva, tomamos por base o livro “Gerais de Todos os Tempos”, escrito por Oto Ferreira Álvares e Ignácio Ferreira Álvares da Silva (1999). Esta obra, além de relatos e memórias, traz a árvore genealógica do irmão de Sebastião, que é nossa fonte principal de pesquisa. Utilizamos 25


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ainda para compor o apanhado familiar, relatos dos filhos e parentes que resgataram na memória, passagens onde Sebastião comentava sobre seus laços familiares. Tanto na obra quanto nos depoimentos, está presente a descendência de Joaquina Bernarda Silva de Abreu Castelo Branco Souto Maior, conhecida como Joaquina do Pompéu, natural de Mariana - Minas Gerais, esta que foi uma das mulheres mais empreendedoras do Brasil no século XIX, matriarca de toda a uma região de Minas Gerais – 11 fazendas, 40 mil cabeças de gado, centenas de escravos, baixelas de prata, bandejas, barras de ouro e outros tesouros, além de uma imensa área territorial de 48.400km² no estado. O marido de Joaquina Bernarda Silva de Abreu Castelo Branco Souto Maior era o Capitão Inácio de Oliveira Campos, oficial militar responsável pelo comando de Tropas de Ordenanças na região que pertencia a Portugal além de pertencer ao clã de bandeirantes paulistas. Casaram-se em 20 de agosto de 1764. Por sua vez, Cap. Inácio era Bisneto do senhor Antônio Rodrigues Velho conhecido como “Velho da Taipa”, fundador de Pitangui (MG), onde foi o primeiro Juiz Ordinário. Nessa cidade, construiu a capela de taipa em honra de Nossa Senhora da Penha, donde provém seu apelido. “Velho da Taipa” era irmão de Ana Maria Bicudo, em que segundo Oto Ferreira Álvares (1999 p. 89) “irmãos formaram uma colossal descendência, num emaranhado de famílias que, ao se entrelaçarem umas às outras, numa consanguinidade de laços familiares muito próximos, guardam certas características que muito as identificam, principalmente na região: Pitangui, Pompéu, Abaeté e demais cidades circunvizinhas. ” Nesse entrelaço familiar de descendências, chegamos a Sebastião Ferreira Álvares da Silva, sendo Ana Maria Bicudo sua Pentavó. Ana Maria Bicudo (sua pentavó) foi casada com Manoel Picão Camargos, tiveram duas filhas, dentre elas, Isabel Bicudo Camargos, casada 26


História da Família Manteiga

com Manoel Dias Ferreira, tetravós de Sebastião. Casal que dentre os filhos, a Ana Maria de Jesus (conhecida também como Ana Maria Bicudo) casou-se com o Capitão Antônio Álvares da Silva, seus trisavós, tiveram dentre os filhos o Coronel Antônio Álvares da Silva (Filho) que se casou com Ana Jacinta Felisberta, esses por sua vez foram os bisavós. Dentre os filhos do Cel. Antônio e Ana Jacinta, a jovem Lourença Álvares da Silva casou-se com Francisco Ribeiro Camargo, tiveram seis filhos, dentre eles Manoel Ferreira Álvares da Silva conhecido como Manoel do Pará. Manoel do Pará possuía terras, era galanteador, amante do carteado e teve cinco casamentos, somando 20 filhos, entre eles Sebastião Ferreira Álvares da Silva. No primeiro casamento com Rozenda Alves de Souza, tiveram o Padre João Ferreira Álvares da Silva e Saint’Clair Ferreira Álvares da Silva. Passado algum tempo, casou-se com Antônia Umbelina Álvares da Silva, união que gerou quatro filhos: Francisco Ferreira Álvares da Silva, Lauro Ferreira Álvares da Silva, Francisca Carolina Álvares da Silva e Lourença Carolina Álvares da Silva. Em outra relação, desta vez com Maria Carolina, Manoel do Pará teve apenas um filho, Frederico Ferreira Álvares da Silva, em relação com Maria Albina também deixou apenas um filho, José Ferreira Álvares da Silva. Com a senhora Maria de Campos Álvares, seu último casamento e celebrado por um dos filhos que era padre, advindo de outra união, Manoel do Pará teve 12 filhos: “Josefina de Campos Álvares, Sebastião Ferreira Álvares da Silva (Sessé), Ana Álvares Felisberta (Naná), Manoel Ferreira Álvares da Silva Filho (Manoelzinho), Maria de Campos Álvares (Zinha), Joaquina de Campos Álvares (Quininha), Agostinha de Campos Álvares (Sinhá), Manoelita de Campos Álvares (Lilita), Rosália de Campos Álvares (Rosinha), Celina de Campos Álvares, Lourença de Campos Álvares (Neném) e Letícia de Campos Álvares.” (FERREIRA, 1999, p. 91). Sebastião Ferreira Álvares da Silva nasceu em 22 de setembro de 1896 na cidade de Abaeté – Minas Gerais, onde passou sua infância e juventude. 27


Raízes do Cerrado:

1.2 - Sebastião Ferreira - A vida em Minas Gerais e a vinda para Goiás Durante a infância e juventude de Sebastião, Minas Gerais estava no auge da economia nacional, a exploração do ouro, o avanço das primeiras lavouras do café, fazia de todo estado um dos principais alicerces dos “Oitocentos brasileiros” e, com efeito, possuindo o maior plantel provincial de escravos até o momento da emancipação geral, em 1888. Na Primeira República, Minas Gerais continuou se destacando como o Estado brasileiro com a maior população e o segundo maior produtor de café. Por relatos dos filhos, Sebastião não comentava muito a cerca de sua infância, apenas em alguns momentos de descontração dizia que foi uma infância boa, outrora comentava que era difícil a vida em Minas Gerais naquela época. Sua vinda para Goiás pode ter se dado por se sentir manobrado pelas irmãs, pois estava sendo apenas ele “o homem na casa”. O irmão Manoel tinha saído e outro havia ingressado no seminário a fim de se tornar padre. Durante a coleta de dados, foi encontrado o relato de Juarez, em que fala sobre a vinda de seu pai para Goiás, “segundo a família do meu pai, ele nunca disse, mas ele era filho de coronel Manoel do Pará, e tinha muito dinheiro na época, e segundo o que ouvimos, quando ele nasceu, já marcaram o casamento dele com o de uma filha de outro coronel, e quando ele fez 18 anos que teria que casar, ele não quis e veio embora. ” Anira relata que o pai veio muito jovem para Goiás, mas também reforçou a ideia de que ele não comentava os reais motivos da vinda, talvez por desavenças como levantado em questão por alguns membros da família, mas o certo que Sebastião veio a fim de desbravar novas terras. Goiás já se era falado na rota do ouro e sua economia dava sinais promissores, para aventurar-se, saiu de Abaeté com destino ao norte goiano. Sebastião deixou a família em Abaeté – Minas Gerais e mudou-se para a região da cidade de Formosa – Goiás, provavelmente percorreu tre28


História da Família Manteiga

chos de trem de ferro, meio de transporte que estava sendo difundido pelo interior do Brasil e outros a cavalo, principal meio utilizado no interior no início do século XX. Em Formosa, veio trabalhar na fazenda do Coronel Pedro Chaves, o qual Manoel do Pará já cultivava uma amizade muito profunda devido à comercialização de gados. Com o relacionamento estreito, firmou uma parceria que persistiu por longos anos.

Sebastião Ferreira Álvares da Silva – Sebastião Manteiga. Foto: Acervo Particular de Juarez Álvares da Silva. Sem data.

1.3 - Sebastião: a fábrica e o nascimento do apelido Manteiga Sebastião Ferreira Álvares da Silva trabalhou por alguns anos na fazenda do Coronel Pedro Chaves, onde com espírito empreendedor e firme, engajou em projetos visando lucros financeiros para seu sustento e independência – daí o apelido, que tornou sobrenome Manteiga. 29


Raízes do Cerrado:

Sem se lembrarem de datas especificas, os filhos falaram acerca da fundação de uma Fábrica de Manteiga de Leite, que o pai implantou na região de Formosa, pelo motivo de uma crise de peste suína ocorrida na região naquela época, o então Presidente da República Getúlio Vargas, ordenou a matança dos porcos para evitar a proliferação do vírus. O porco era o principal sustento das famílias interioranas no século passado, além de uma produção barata, aproveita-se dele além da carne, a pele, alguns órgãos e sua manteiga, “pessoal comia com óleo de babaçu porque houve a peste suína e Getúlio Vargas mandou sacrificar todos os suínos do Brasil na época, então a manteiga de babaçu não tinha um paladar agradável, então ele passou a produzir uma manteiga de leite, pois era uma região muito produtiva de gado leiteiro. ” Em relação à estrutura da fábrica em Formosa, destacamos que, ele organizou-a, buscando o maquinário em São Paulo pelo trem de ferro, iniciando a produção das primeiras manteigas de leite da região. O apelido nasceu devido a essa fábrica. Luiz cita que “o pessoal perguntava ‘aonde você vai? ’, ‘eu vou no Sebastião das manteigas’, foi onde advém o apelido “manteigas”, provenientes da fábrica de manteigas.”. Manteiga deixou de ser apelido e passou a ser sobrenome registrado, dos descendentes de Sebastião Ferreira Álvares da Silva, que desde a fábrica passou a ser chamado por todos como Sebastião Manteiga. A manteiga produzida por Sebastião ficou sendo conhecida na região e as vendas aumentaram de forma que passou a ser exportada para o estado de Minas Gerais. Para o transporte da mesma, utilizava a rota do sal, também conhecida na época como estrada real, “Aprazível e descampada ondulação, a “estrada real” que vinha do sertão de Goiás se bifurca, indo para Catalão e Ipameri (Vai-Vem). Sendo rota dos tropeiros que vinham do arraial dos Couros (Formosa), Mestre D’Armas (Planaltina), Cavalcante, Posse, São Domingos e Paracatu dos Príncipes (Paracatu-MG)” (FAEG – 2012, p.9).

Durante as idas e vindas pela estrada, em destino à linha férrea, 30


História da Família Manteiga

Sebastião Manteiga, parava no povoado de Rudá, que era ponto obrigatório para os tropeiros e carreiros. Neste ponto se esperavam tropas e caravanas que traziam novos mantimentos encomendados na época pelos fazendeiros ou mesmo utilizado como descanso para os animais. Em uma dessas paradas, Juarez comenta que o avô Major Emídio trabalhava com ferragens e oficina de carro de boi, meio de transporte da época, como Sebastião passava sempre pela região devido à rota para chegar à estrada de ferro, sempre precisava da assistência nos carros de boi na oficina, e foi nesse período que o conheceu e logo em seguida, sua futura esposa. 1.4 - Dona Maria: uma mulher de vida simples

Dona Maria Emídio Álvares. Foto: Acervo Particular de Juarez Álvares da Silva. Sem data.

Poucas são as informações sobre a história de vida de Maria Emídio Álvares, aquela que viera a ser o tronco da família, citada diversas vezes pelos descendentes. Sabemos que foi uma mulher simples, nascida e criada na zona rural do então distrito de Campo Alegre, filha de fazendeiros. 31


Raízes do Cerrado:

Maria, uma das filhas do Major Emídio Pereira dos Santos, comerciante e dono de terras no município de Campo Alegre de Goiás e de Anna Maria Pereira Duarte, do lar, filha de família tradicional na região, onde segundo a obra (ainda inédita) de Pe. Murah Rannier Peixoto Vaz, acerca de sua genealogia paterna, “Emidio Pereira dos Santos nasceu no ano de 1870, na fazenda Calaça e faleceu de enterocolite e suas complicações, em 27 de fevereiro de 1930, na mesma fazenda. Em 13 de junho de 1892, casou-se com Anna Maria Pereira Duarte nascida entre 1874/1875 e falecida em 27 de abril de 1926, devido a uma gastrite crônica”. O casal Emídio Pereira dos Santos e Anna Maria Pereira Duarte tiveram 10 filhos: Pedro Emídio Pereira, Joana Pereira dos Santos, Manoel Emídio Pereira, João Emídio Pereira, Eduardo Emídio Pereira, Joaquim Emídio Pereira, José Emídio Pereira, Maria Emídio Álvares, Salvina Emídio Pereira. Após o falecimento de Anna Maria Pereira Duarte, o então viúvo Major Emídio Pereira dos Santos, casou-se com Violeta Machado de Menezes, com quem teve dois filhos: João Emídio Pereira II e Walter Emídio Pereira. Maria Emídio Álvares, nasceu em 30 de julho de 1908, na região de Campo Alegre de Goiás.

1.5 - Sebastião e Maria: a formação de uma nova família Por meio das diversas viagens para a região de Campo Alegre de Goiás, Sebastião “Manteiga”, construiu um laço de amizade com o senhor Major Emídio, que como já relatado, tinha uma pequena oficina para concertar carros de boi, carroças, charretes, etc. conservando essa amizade, veio a conhecer a jovem Maria. Passaram-se os anos, Sebastião mudou-se para Campo Alegre de Goiás, e com ele, toda sua estrutura da fábrica de manteigas, onde continuou a produção por determinado tempo, para que a mesma fosse vendida 32


História da Família Manteiga

tudo era transportado por carros de boi até pequenos caminhões que transitavam na região, mas a maior parte da produção era vendida na própria comunidade. Com a dificuldade de vendas e exportação das manteigas, Sebastião resolveu vender o maquinário, a fábrica veio então a ser vendida para os chamados “turcos de Ipameri”, imigrantes que vieram para a cidade de Ipameri e estavam construindo patrimônios na região, após a venda da fabriqueta, a manteiga se difundiu em outras marcas. O namoro com Maria persistiu, e logo firmaram a união com a celebração do casamento, mas segundo Luiz, o avô (Major Emídio) foi muito criticado quando aceitou o casamento de Sebastião e sua filha (D. Maria), pelos moradores do distrito, dizendo que iria entregar “a mão” de uma moça “na mão” de um aventureiro, mas não sabiam da tradição da família de Sebastião e acerca do entrosamento com seu avô, através de negócios de gado. Em 1926 Maria perdeu a mãe Anna, e seu pai conheceu uma mulher chamada Violeta, casaram-se na mesma celebração do casamento da filha. Maria Emídio Álvares e Sebastião Ferreira Álvares da Silva, casaram-se no dia 26 de novembro de 1926, provavelmente em uma festa grandiosa conforme os padrões daquela época, celebrada na fazenda do pai, como relatado pela filha Letícia “o vovô, viúvo de pouco, porque a vovó tinha morrido, Ana Pereira Duarte e o vovô Emídio Pereira dos Santos. Então eles começaram a namorar e se casaram e o vovô casou-se com a dona Violeta, no mesmo dia, na mesma data, ela era viúva também. Mamãe falava que foi uma festona, tudo muito arrumado. ” Após o casamento, mudaram-se para a fazenda chamada de Buraco, onde viveram por cerca de 10 anos. Nessa fazenda, começaram a construir os bens e os filhos, seis nasceram nesse local: Lázaro Álvares da Silva Campos, o primeiro filho, nascido em 02 de Janeiro de 1929, Lazarina Álvares da Silva, nascida em 09 de Janeiro de 1930, Maria Álvares da Silva, nascida em 23 de Julho de 1931, Emídio Ferreira Álvares da Silva, nascido em 30 de Junho de 1933, Letícia Álvares Daher, nascida em 30 de Julho de 1935 e Mafalda Álvares Campos, nascida em 02 de Maio de 1937. 33


Raízes do Cerrado:

Durante o período de vivência nessa fazenda, o casal com os filhos pequenos seguia os afazeres do dia a dia, Sebastião administrava a fazenda e Maria cuidava do quintal e da casa. Mas, parte da fortuna construída pela família se perdeu. Sebastião apesar de seu espírito empreendedor e da larga sabedoria, gostava de se distrair jogando cartas e em algumas apostas feitas, foi vencido por seus opositores. Teve então que vender os bens: casas e fazenda, para quitar com os jogadores. Nesse período de dificuldades moraram em uma pequena casa improvisada feita em madeira e piso de terra. Diante das percas, Sebastião e Maria, juntamente com os filhos, tiveram que reconstruir a vida, e foram morar na Fazenda Bracinho, atualmente Fazenda Porteira Branca, na forma de arrendamento - contrato pelo qual uma pessoa, dona de bens imóveis, assegura a outrem, mediante contribuição fixa ou reajustável a prazo certo -, começaram a tocar lavouras na atual Fazenda Porteira Branca, que na época era de propriedade da família Junqueira, mudaram para aquele lugar e iniciaram o trabalho duro, que por diversas vezes foi lembrado como um “trabalho de sol a sol, trabalhavam até as 7 da noite e no outro dia cedinho”, nesse período o filho Lázaro, o primeiro do casal, interrompeu os estudos para auxiliar na jornada, na lida com a lavoura estava Sebastião, os filhos e a esposa que se mostrou, uma grande companheira . A lida com a lavoura foi muito complicada, num terreno de difícil acesso e com muitas elevações, e eles plantaram arroz, feijão, e tiveram nas primeiras colheitas um lucro benefício alto, todo o trabalho era no esquema artesanal, desde o preparo da terra até o beneficiamento dos grãos colhidos. Com o dinheiro arrecadado do trabalho, compraram a fazenda Pirapitinga, de propriedade atual da família. Nesse período em que lidaram na Fazenda Bracinho, a compra e formação da Fazenda Pirapitinga, tiveram os filhos Orazal Afonso Álvares em 31 de Janeiro de 1940, Luiz Manteiga Álvares de Campos em 19 de Junho de 1942, Anirazal Álvares de Pádua, nascida em 24 de Setembro de 1945 e Juarez Álvares da Silva em 10 de Abril de 1948.

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História da Família Manteiga

O casal Sebastião e Maria com seus filhos e crianças amigas. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher. Sem data.

A região da Fazenda Pirapitinga, recém comprada por Sebastião, era bem grande, na época tudo mato fechado, um vasto cerrado e tinha cerca 200 pessoas que moravam lá. Essas famílias começaram a trabalhar com ele na forma de “meia”, onde toda a produção dos locatários deveria ser dividida com o proprietário. Passaram a produzir na fazenda arroz, feijão, milho, porco. Sebastião um nato mineiro, gostava de leite, começou então a criar gado leiteiro a fim de produzir creme de leite, fazia-o e vendia para as fábricas, no auge das produções da fazenda, o único produto comprado na cidade foi o sal. A produção da fazenda era vendida para os comércios e centros de distribuição da região, de início com estradas precárias, o custo para tal atividade era alta, mas com a abertura de novas rotas, começou a transitar 35


Raízes do Cerrado:

mais caminhões. Assim, quem transportava sua produção era Nagib Salomão, respeitável empresário de Catalão na época, tinha caminhões para fazer transportes de cargas. Sebastião fretava os caminhões e a produção era levada da fazenda Pirapitinga para a transportadora a fim de ser distribuída para os grandes centros comerciais em todo o país. Enquanto o esposo cuidava da produtividade em grande escala, Maria criava e vendia galinhas e ovos e com o dinheiro comprava as coisas de casa, para os parentes e filhos.

Maria Emídio Álvares tratando da criação de galinhas em sua fazenda. Ao fundo na porta vê-se Sebastião Manteiga. Foto: Acervo particular de Norma Martins. Sem data.

Em 1947 montou um engenho para produzir cachaça, movido a boi, que segundo Luiz, começou com uma pequena produção de 130 litros, posteriormente chegando a 1000 litros por dia. Da produção da cachaça, Sebastião empreendeu na fabricação de açúcar mascavo, conforme foi relatado por Luiz, era uma grande produção de açúcar e cachaça. Vemos que Sebastião foi um grande empreendedor, muitos dos relatos colhidos citaram como um “grande administrador”, “uma pessoa muito enérgica”. Mas e Dona Maria? Os relatos a cerca dessa mulher a caracterizam como o “esteio” da família, como lembrado pelo o neto Clóvis: 36


História da Família Manteiga

Minha avó quase ninguém fala dela, mas era o esteio da coisa, ela tinha uma força de vontade, muito trabalhadora, uma pessoa muito boa, era firme também, meu avô era um cara durão, e ela um esteio. Minha avó fazia de tudo na casa, porque naquela época, não tinha maquinário pra plantar, então ela fazia, na época de lavoura, porque eram férias (escolares) e a gente estava lá, minha avó cozinhada pra 40 – 50 funcionários que trabalhavam na lavoura, fazia dois almoços, um às 10 horas pro pessoal que estava na lavoura trabalhando e uma as 11h30min que era dos filhos, quando estava todo mundo as filhas ajudavam, muitas vezes ela matava porco pra feira em Cristalina, matava, salgava e enrolava as carnes, embalava e mandava aquilo e tudo minha avó que ajudava.

Maria foi uma mãe, esposa, avó “extraordinária”, educou os filhos no ensinamento cristão. Era uma mulher trabalhadeira, em uma época em que as lavouras eram feitas no mato, abriam no machado, estava sempre ajudando o marido, além de juntamente com uma empregada, cozinhar para 70 homens, e toda a comida era servida na gamela (vasilha esculpida em forma de tigela ou bacia), e levada para lavoura com os pratos esmaltados, além de preparar as refeições, ainda organizava toda a cozinha e limpava todos os utensílios para serem utilizados novamente.

Sebastião e Maria com os filhos (em cima: Emídio, Orazal, Luiz, Juarez. Embaixo: Lazarina, Maria Álvares, Lázaro, Sebastião, Maria, Letícia e Anirazal) na porta da Catedral Divino Espírito Santo em Ipameri. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

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Raízes do Cerrado:

Letícia cita a mãe de forma saudosa relatando “que fazia muita coisa, e muito disposta, falam que eu puxei muito ela”, mas era trabalhadeira, acordava na madrugada para dar conta das refeições e demais afazeres. Nas refeições, era servido carne todos os dias, nem que fosse uma costelada com mandioca, tinha arroz, feijão, uma salada, farinha de mandioca, com muita fartura, ainda arrumava tudo direitinho nas gamelas, cada prato tinha seu lugar, preparado com carinho para a família e os funcionários, além de qualquer pessoa que chegasse poderia comer. Pela manhã sempre comiam pão preparado por ela e tomava leite, às 11h30min fazia almoço, à tarde, todos participavam o lanche, as 17h00min era servido o jantar dos funcionários da fazenda, e mais tarde ela fazia jantar da família. Para o outro dia a noite ainda fazia doces, bolos, biscoitos e pães. A filha de Dona Maria, Mafalda relata que certamente pelos cansaços da rotina temos uma imagem de uma mulher mais séria “mamãe era mais séria, firme, pessoa boa demais, gostava muito das crianças, criou 10 filhos e quando juntava aquela meninada ela teve foi muita paciência.”.

1.6 - A casa da Fazenda Pirapitinga: lembranças saudosas

Pintura da sede Fazenda Pirapitinga. Lorena Eleutério, 2014.

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História da Família Manteiga

A vida na Fazenda Pirapitinga foi dividida entre os filhos já na compra da mesma, e assim iniciou a história de vida da família Manteiga. Todos a citam como um espaço de lutas, de família, de descanso e principalmente de muitas lembranças.

A casa é sempre lembrada como um lugar cheio e simples. Letícia

descreve que “era uma casa simples, muito pequena, até desconfortável, não tinha banheiro, era do lado de fora, mas logo o papai providenciou, depois comprou uma geladeira a querosene e depois a gás, comprou um ferro de passar a gás também, mas fui uma das que não adaptou e tinha medo daquilo, mas em casa até o saco de guardar farinha a mamãe passava. Era uma casa muito pequena e simples, reuníamos em dois quartos, porque tinha três quartos, e um papai o dividiu, que ficou sendo o lugarzinho da freira depois de algum tempo, papai deu uma melhorada na casa, forrou, fez uma área externa na cozinha, fez o banheiro direitinho com chuveiro à serpentina, tinha o monjolo (máquina hidráulica e rústica, destinada na época a moagem de grãos), muitas árvores frutíferas, nós gostávamos de pescar no riacho que havia ao fundo, era muito bom.”.

Dentre os espaços, constatamos uma frente de chão batido, limpo

com árvores para sombrear. Além da casa, tinha uma casinha simples de guardados, típica de propriedades rurais, próximo ao rego d’água ficava o monjolo com o pilão, o galinheiro, chiqueiro mais ao fundo, e no quintal muitas árvores, espaço que foi descrito pela maioria dos filhos como um local propício para correr e brincar, pular de galho em galho.

Recorro ao poema “Antigamente lá na roça”, escrito por Di Mar-

tioli (segundo sites de pesquisas), declamado durante reportagem do Globo Rural “A Matança do Porco” em 2003, que nos faz imaginar de forma simples e singela a saudade da vida na roça, que condiz a fazenda da famí39


Raízes do Cerrado:

lia Manteiga:

Antigamente lá na roça...

Era a fartura guardada na lata, Tudo na arca, na tulha entulhava, O quartinho de guardar a tralha onde tudo dependurava, Na casa guardava história, O Santo que guardava a casa, A espingarda na parede enferrujava, O fogão a lenha na cozinha reinava, Os cabides que guardava os costumes, O vidro que guardava o perfume, As molduras com retratos amarelados, A mala que guardava a história de uma família abençoada... Os olhares que guardavam lembranças, Os amigos que guardavam carinho, A sanfona que embalava as cantigas, As modas que ouvia no rádio entoava, Era o tempo que lentamente passava... Hoje o choro que escorre quentinho levando a saudade guardada.

Recordar o passado, sempre arranca pensamentos, viagens ao tem-

po como bem disse Mafalda em seu depoimento “vamos voltar ao passado, viajar na memória”, recordações simples que nos remete a uma família alegre, que mesmo com as percas seguiram adiante com a reconstrução como meta.

Outro aspecto citado entre os diversos depoimentos colhidos foi

sobre a religiosidade da família. Rezava-se o terço todas as noites, princi40


História da Família Manteiga

palmente quando os netos estavam presentes. Esse momento era feito com todos na sala ou em dias de calor no alpendre. O terço ou rosário – como também pode ser chamado, faz parte da religiosidade popular presente no dia-a-dia dos católicos, como cita Paola Lins de Oliveira em sua pesquisa denominada: Circulação, usos sociais e sentidos sagrados dos terços católicos, 2009: “O valor sagrado dos terços e rosários repousa, em certa medida, em sua capacidade de mediar à relação entre o devoto, Maria e Jesus Cristo. Como uma ponta na cadeia de mediadores em direção ao sagrado, o instrumento para a oração permite que o devoto bem-sucedido em sua comunicação atualize em si mesmo a santidade. O objeto pode ainda autonomizar-se a ponto de receber um valor mágico”.

Outro ponto de religiosidade citada em depoimentos era a devoção

a São Sebastião, um dos santos católicos mais populares e cultuados, o qual mais adiante vamos nos deparar com uma promessa que resultou em benefícios a cidade de Campo Alegre de Goiás. Promessa feita por Sebastião Manteiga em honra ao santo para que a Dona Prima se curasse, resultando em uma festa na comunidade, cuja renda foi destinada a aquisição de uma imagem e doada para a Capela São Sebastião em Campo Alegre de Goiás. A imagem se encontra no altar da capela até os dias atuais. A doação foi confirmada pela paróquia, através do Pároco (até a presente pesquisa) Padre Ivan Vieira dos Anjos. A devoção ao santo se propagou ainda mais pela comunidade, realizando posteriormente outras festas em sua honra e todo o dinheiro revestido na construção do Hospital Municipal de Campo Alegre de Goiás. O culto forte do santo, perante produtores rurais e moradores da cidade, o tornou patrono do município, uma vez que a comunidade é dedicada à padroeira Nossa Senhora do Amparo.

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Raízes do Cerrado:

Escultura de São Sebastião doada pela família em nome de Sebastião Manteiga, exposta no altar da Capela de São Sebastião em Campo Alegre de Goiás. Foto: Pe. Ivan Vieira dos Anjos, 2019.

Todos da família se reuniam próximo a alguma imagem santa para meditar as orações presente no terço. Clóvis Júnior diz que era comum nas férias escolares, quando os netos estavam reunidos, o avô Sebastião pedir para que após a oração, algum dos presentes recitasse a poesia, que de certa forma, era uma homenagem aos familiares deixados por ele em Minas Gerais. Quando terminava a oração do terço o avô pedia para o neto Elias Roberto recitar poesias, dentre as que gostava, a predileta era Visita a Casa Paterna, e todos os dias deveriam declamá-la, Maria Márcia era a outra neta escolhida para que a declamasse a poesia. Sebastião pedia praticamente todos os dias e depois da declamação ficava meditando pensativo, talvez relembrando os tempos de infância, vivido em Minas Gerais. Assim encontrava na poesia acalento para sua saudade. 42


História da Família Manteiga

A poesia pedida por Sebastião, considerada um soneto (pequena composição poética) brasileiro, escrita por Luiz Caetano Pereira Guimarães Junior, denominada Visita a Casa Paterna:

Como ave que volta ao ninho, Depois de um longo e tenebroso inverno, Eu quis também rever o lar paterno, O meu primeiro e virginal abrigo. Entrei. Um gênio carinhoso e amigo, O fantasma talvez do amor materno, Tomou-me as mãos – olhou-me grave e terno, E, passo a passo, caminhou comigo. Era esta sala... (Oh! Se me lembro! E quanto!) Em que luz noturna à claridade, Minhas irmãs e minha mãe... O pranto. Jorrou-me em ondas... Resistir quem há-de? Uma ilusão gêmea em cada canto, Chorava em cada canto uma saudade.

Sebastião retornou à cidade natal para visitar sua família anos depois de seu casamento, por volta de 1933. Por meio de relatos, percebe-se que apesar de não comentar muito a respeito de sua vinda para Goiás, o 43


Raízes do Cerrado:

mesmo guardava boas lembranças da família. A numerosa família Manteiga promovia inúmeros encontros festivos, Dona Maria e seu Sebastião sempre preservavam pela união familiar, dos irmãos e dos netos e sempre que possível, uma reunião era feita: fosse aniversário, casamento, datas comemorativas, como Natal e Ano Novo. As festas de aniversários dos filhos e principalmente dele, eram sempre comemoradas com muitos convidados. Lembrança relatada pelos filhos, comentando que o pai tinha o hábito de fazer a festa de aniversário dele ou da esposa, dona Maria, e convidar quem ele conhecia. Em várias festas, a família chegou a receber cerca de 200 pessoas, com muita fartura. Matava-se porcos, vaca, galinhas, o que tinha direito de fazer, Sebastião exigia que fosse preparado cardápios típicos de festas rurais: arroz com galinha, tutu de feijão, pelota, carne de lata, torresmo, frango caipira ao molho, saladas diversas, tudo produzido na fazenda. Nas reuniões de aniversários dos pais, além dos amigos, a presença de toda família era obrigatória – fazia-se uma grande festa. Com o passar dos anos os 10 filhos, casados e com os filhos, contabilizava um número expressivo. Geralmente no natal passava mais as filhas, e na festa de ano novo compareciam os maridos e os filhos que tinham passado o natal com a família das esposas. Essa união familiar foi relembrada também pelos netos. O avô sempre comentava sobre a importância de serem unidos, para ele (Sebastião), se a família estivesse desunida seria a mesma coisa de pegar um galho seco e quebrá-lo, e ir quebrando um de cada vez, mas não tem como quebrar dez em uma única tentativa – fazendo referência ao número de filhos -. Esse sentimento de família unida foi relatado por todos os filhos de seu Sebastião, sempre de forma direta ou indireta, “papai gostava muito de reunir, conversar, rezar” disse Lazarina, a filha Anirazal também lembrou que “em época de férias, era sempre uma festa, todos os filhos e os netos que já tinham estava aqui na fazenda”, Luiz Manteiga relatou que “papai nos criou de forma rígida, com princípios cristãos e unidos, mantendo a 44


História da Família Manteiga

união da família”. Um fato lembrado era que Sebastião pedia para que após dar a benção aos filhos ou netos, os mesmos beijassem sua mão, ato esse que significa uma maneira respeitosa de saudação a pessoas de idade e autoridades – costume na época – os netos lembram que tinham que pedir a benção do avô e ele já vinha com a mão para ser beijada. Dona Maria não gostava da atitude, relatava que era costume antigo e ultrapassado.

1.7 - É chegada a idade: uma fase nova e à hora do adeus

Diante tanto trabalho Sebastião e Maria criaram os filhos e juntos construíram um patrimônio. Trabalhando de forma honrosa e dedicada, o casal passou por crises financeiras e a reconstrução familiar. Sebastião um homem que muitas vezes foi caracterizado como uma pessoa enérgica e determinada, Maria considerada por todos, uma trabalhadora o esteio da casa. Mudaram-se para a cidade de Campo Alegre de Goiás. Com idade avançada o corpo já não correspondia à força do trabalho que a fazenda exigia: levantar cedo, tratar dos animais, gerenciar a fazenda e outras atividades, deixavam o casal cansado. Para amenizar e proporcionar um conforto, os filhos pediram e foram acatados, a mudança para a cidade. Estar próximo aos filhos geraria de certa forma uma tranquilidade, a cidade já estava se desenvolvendo e equipando-se dos insumos básicos necessários, até mesmo na saúde. Sebastião gostava de caminhar todos os dias, visitando os amigos, jogando com os conhecidos ou mesmo “passando o tempo” em algum bar da cidade para “jogar conversa fora”. Sempre muito bem vestido com seu terno alinhado, gravata e uma arma modelo 38 45


Raízes do Cerrado:

na cintura – essa que com o passar dos anos, Dona Maria guardou e não o deixava andar com ela. Ainda na cidade, utilizava como entretenimento ouvir noticiário no aparelho de rádio que tinha em casa, geralmente nesses horários costumava sentar rente à janela, onde recebia também alguns amigos a fim de se informar com as notícias narradas. Dona Maria sempre gostou de agradar as visitas e na nova casa não foi diferente. Relatos citam que mesmo de idade, estava sempre a fazer roscas, bolachas, biscoitos e as mais variadas quitandas, além de fartos almoços e jantares para servir a todos que lá estavam na hora das refeições. Foi comum ouvir que Maria não “tinha sossego” estava sempre no fogão ou fazendo alguma outra atividade; os potes de doces e biscoitos nunca estiveram vazios e sempre que uns dos netos estavam na casa, tinha ainda mais quitandas a serem preparadas. As festas mudaram de endereço, deixando a fazenda para ser na cidade. As vezes no grande quintal debaixo das mangueiras e até mesmo na rua da casa, devido o tanto que a família havia aumentado. Buscando relatos com os vizinhos que moravam próximo ao casal na cidade, Solange de Paula, vizinha da casa onde Maria e Sebastião moraram em Campo Alegre de Goiás, lembra que em todo natal a rua ficava cheia, e vinha sempre dona Maria alegre, trabalhando para agradar e proporcionar uma grande festa como de costume, nos dias que antecedia. A chegada dos familiares era a todo momento: Silvane José Ferreira, que era rapaz e frequentava muito a casa de pais (Dorilena e Valdemar) na mesma rua da casa de Sebastião e Maria, lembrou que Dorilena se tornou comadre de muitos filhos e do casal, além de uma amizade muito estreita com seu Sebastião Manteiga e dona Maria, ele cita a troca frequente de agrados, seja um pote de doce, pedaço de bolo, às vezes era um pedaço de carne, era uma amizade muito grande.

Com o avanço da idade, Sebastião foi ficando mais frágil, o que o 46


História da Família Manteiga

levou a ficar de cama. Por meio de uma queda que sofreu na rua, fraturou a bacia, precisando do auxílio da cadeira de rodas por um período, até que se acamou. Sebastião ficou debilitado por cerca de 3 a 4 anos, com uma saúde muito frágil e outros problemas se agravando devido o avanço da idade. Veio a falecer em casa, no dia 05 de Agosto de 1986. Na época o município não contava com casa apropriada para velório, então todas as homenagens fúnebres foram prestadas em sua residência e o sepultamento no cemitério da cidade, no jazigo da família. Após a morte do marido, Dona Maria continuou a morar na mesma casa, acompanhada por algum filho, ora contratando pessoas para trabalhar na casa e dormir, depois alguns netos passaram a morar com ela, fazendo companhia nas noites. A sua saúde também foi debilitando. A filha Letícia lembra que ela fez comida até o último dia de vida. Segundo Anirazal, dona Maria “estava bem em casa e tinha um problema de vesícula mais não podia operar, ela passou mal e já foi direto pra Catalão com ela e no caminho ela teve uma parada cardíaca e morreu, a vesícula estourou, foi um dia difícil, uma lembrança muito difícil para todos nós.”, a morte de Maria Emídio Álvares foi em 15 de Janeiro de 1993, da mesma forma que o esposo, prestaram as homenagens fúnebres em sua residência e o sepultamento no jazigo da família, junto com o marido, quem acompanhou por toda a vida. O casal também recebeu homenagens póstumas de autoridades estaduais e municipais, alguns anos após sua morte. Durante o governo estadual de Íris Rezende Machado, nominou a GO 213 que liga Campo Alegre de Goiás a Ipameri com o nome de Sebastião Ferreira Álvares da Silva Campos, reconhecendo sua importância para o desenvolvimento econômico e seus esforços para a emancipação da cidade. Dona Maria também foi homenageada durante o mandato do prefeito Thiago Manteiga Álvares da Silva, que nominou o prédio do Conselho Tutelar da Criança e do Adolescente com seu nome, por seus esforços em criar os dez filhos e ainda ter 47


Raízes do Cerrado:

disposição para ajudar e brincar com os netos. Sebastião e Maria deixaram para os filhos um legado de perseverança e honradez. Além de patrimônio físico, também está presente a memória de pais que mesmo rígidos, educaram 10 filhos. Todos estudaram em escolas da região e até mesmo particulares, construíram novas famílias e passaram para seus descendentes os ensinamentos transmitidos pelos pais. Novas histórias, novas memórias foram formadas, até o mais novo neto e bisneto, tem uma visão formada de como foi a vida de Sebastião Manteiga e Maria. A memória do casal está sempre presente no dia-a-dia dessa família, nas próximas páginas visitarmos as memórias individuais de cada filho, contando suas trajetórias de vida até os dias atuas. Vale ressaltar que, infelizmente, não se tem todos os 10 filhos presentes, muitos estão na memória dos irmãos e seus descendentes.

Sebastião Manteiga e Maria Emídio, acompanhado de filhos, genros, noras e netas. Foto: Acervo particular Juarez Álvares da Silva. Sem data.

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História da Família Manteiga

Sebastião Manteiga e Maria Emídio acompanhado dos filhos, genros e noras.( Humberto Álvares de Abreu e Silva, Lazaro, Valdeci, Lazarina, Clóvis, Edésio, Maria Álvares, Letícia, Juarez, Carmem, Anirazal, Gercina, Mafalda, Rui, Emídio, Marina e Luiz) Foto: Acervo Particular de Juarez Álvares da Silva.

Sebastião e Maria junto com os filhos (Anirazal, Lázaro, Lazarina, Maria Álvares, Emídio, Letícia, Orazal, Juarez, Luiz e Mafalda). Foto: Acervo de Anirazal Álvares de Pádua.

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Raízes do Cerrado:

Sebastião e Maria na celebração do batizado da bisneta Ângela Álvares e da neta Marina (colo de Maria). Da esquerda para direita: Maria Márcia, Antônio Jacome, Sandra Abrantes – a criança, Emídio Álvares, Eleide Jácome, Gercina, Sebastião, Padre, Maria e Marina. Foto: Acervo particular de Ângela Álvares.

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História da Família Manteiga

Capítulo II Lázaro Álvares da Silva Campos – um homem além de seu tempo

Este capítulo é dedicado ao primeiro filho do casal Sebastião e Maria. Em 02 de Janeiro de 1929, nascia Lázaro Álvares da Silva Campos, um menino que desde criança despertava o desejo de ajudar o próximo, o gosto pelos estudos e a curiosidade por inovações, tornando-se um homem que sem um curso superior, realizou obras particulares e estudos que beneficiaram a região até os dias atuais. Para contextualizar o leitor historicamente, Lázaro nasceu no ano em que o mundo sofreu a maior de suas crises financeiras, a queda da bolsa de Nova Iorque, chamada de “a grande depressão”, onde no Brasil 51


Raízes do Cerrado:

foi afetada a produção de café. O café que era a base da economia brasileira para exportação deixou de ser comprado pelas grandes potências na época, levando assim a perca da produção e a queda nos valores. Diversos cafeicultores perderam seus grãos parados nos galpões sem comprador. Para controlar a crise financeira que assolava o país, o governo brasileiro comprou o café dos produtores e queimou toneladas do produto para tentar manter o preço do principal produto brasileiro. Sendo assim, em meio às mais diversas crises, Lázaro ajudou à superar problemas familiares em sua juventude, sempre trabalhando duro e buscando de novos desafios. Sua história é marcada por ensinamentos que foram transmitidos a todos de sua família e que os mesmos resguardam suas memórias passando a todas as gerações.

2.1 - Da infância a adolescência: relatos de memórias familiares. Primeiro filho do casal Sebastião e Maria, Lázaro passou sua infância na fazenda, onde morou até o casamento. Quando criança estudou na escola da fazenda do Coronel João Vaz, em que suas filhas ministravam as aulas para os alunos que vinham de diversas fazendas da região. Lázaro estudou até a 4° serie da época, e segundo relatos das filhas, ele tinha maior orgulho do diploma de conclusão, que ficava exposto em um quadro na sala de sua casa. “Papai sempre foi muito inteligente, ele era além de seu tempo”, como lembrado pelas filhas, que mesmo tendo pouco frequentado a escola, sempre teve um desempenho muito grande para os assuntos tecnológicos, gostava de estudar, saber de notícias do Brasil e do mundo. Além de querer buscar novidades para época, era uma pessoa curiosa – um pesquisador, queria ver tudo que estava sendo lançado, atento às novas tecnologias.

Sabemos que naquela época, manter filhos nas escolas era difícil, 52


História da Família Manteiga

no Brasil não se tinha tanta oferta de cursos superiores espalhados pelo território, escolas técnicas eram concentradas em grandes centros urbanos, e Lázaro tinha o sonho em ser um grande engenheiro. Mas logo teve que encerrar os estudos na fazenda do coronel, para auxiliar os pais no trabalho. Como vimos anteriormente, os pais de Lázaro, entraram em uma dificuldade financeira muito grande, pois Sebastião havia perdido seus bens em jogos de cartas, e tiveram que vender fazenda e casa. A família então foi morar em um ranchinho de pau a pique, em uma parte de terra na atual fazenda Porteira Branca. Com essa perca, Lázaro partiu com a família para essa fazenda, onde começaram a tocar pequenas lavouras. Como era o filho mais velho, trabalhava todos os dias até as 19 horas e estavam novamente de pé ao raiar do dia para lidar com as plantações, a fim de fazer com que a mesma gerasse lucro. O local onde estavam morando e trabalhando era difícil de chegar e sair, pois se tinha um morro muito alto, mas trabalharam muito, com muita dificuldade. Lázaro e o pai haviam feito a plantação “a meia”, ou seja, metade era do dono das terras e a outra deles. A produção começou a dar certo. Começaram a colher sem percas e obtiveram maiores lucros. Certa época, quando Lázaro já estava maior, e como de costume estava atento às notícias do rádio, sabia do preço das sacarias, seu pai queria esperar para efetuar a venda do produto, mas informado pelo noticiário acerca dos valores dos produtos fez com que o pai vendesse toda a produção na semana da colheita, esse valor veio a cair alguns dias após a venda. Com as produções e o trabalho dando certo, conseguiram comprar a fazenda, que foi escriturada no nome dos filhos já nascidos e dos filhos vindouros. Lázaro então, juntamente com o pai, montou a indústria de cachaça, para utilizar o restante da cana que Sebastião tinha em sua pequena fábrica de açúcar. 53


Raízes do Cerrado:

Percebe-se que desde a infância e adolescência, o pequeno Lázaro já demonstra para a família o grande homem que viria a ser, sempre em busca de objetivos e de ajudar no que for necessário. Um garoto feliz, animado e interessado por tudo ao seu redor, o construindo um valoroso caráter.

2.2 - O casamento e a vida conjugal: pai e marido presente.

Lázaro, sempre foi um jovem simpático e encantador com todas as pessoas que conhecia, sempre admirado por sua educação e forma que tratava a todos. Isso não era diferente com as garotas da época, principalmente com sua namorada, que se tornaria seu braço direito e juntos constituíram sua família. Valdeci era amiga das irmãs de Lázaro, principalmente de Zezica, estudavam juntas e as famílias eram aparentadas, mantendo assim laços 54


História da Família Manteiga

estreitos de amizade. E as meninas eram internas no mesmo colégio, na cidade de Catalão, fazendo com que se tornassem ainda mais amigas. Era costume ela frequentar a fazenda para passear durante as férias e encontrar as irmãs, até que começou a namorar com Lázaro. Um namoro fruto de uma amizade, Valdeci de família tradicional da região de Campo Alegre, manteve um relacionamento pautado no respeito e no amor, o que foi mantido durante toda a união duradoura. Com o avanço do namoro, trataram de ficar noivos e logo iniciaram os preparativos para o casamento e a nova vida familiar que iriam formar a partir de então.

Foto do convite de casamento Valdeci e Lázaro que foi distribuído entre os familiares. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

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Raízes do Cerrado:

Quando os jovens se casaram, em 05 de Junho de 1952, Lázaro tinha 21 anos de idade e Valdeci 22. Ganharam dos pais parte da fazenda Posse, para que constituíssem seu patrimônio e iniciassem a vida conjugal. Durante muito tempo, Lázaro continuou a trabalhar com o pai na fazenda Pirapitinga. Ia e voltava todos os dias de moto enquanto sua esposa ficava cuidando dos afazeres domésticos em sua residência. Para que ela não ficasse sozinha, tinha na fazenda o senhor João Monteiro, que era o ajudante e trabalhou com eles durante muitos anos.

Casamento de Lázaro e Valdeci. Foto: Acervo Particular de Elizabeth Álvares. Foto de 05 de Junho de 1952.

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História da Família Manteiga

Logo vieram os filhos, o primeiro, se chamava José, que nasceu com problemas cardíacos e faleceu pouco depois do parto. A criança foi registrada e batizada, pois Lázaro e Valdeci era um casal que respeitava e seguia as tradições da igreja, antes do enterro de José, houve seu batismo. Os pais já sabiam do problema do filho desde o acompanhamento do pré-natal, mas mesmo assim o luto pela perca do filho não deixou de existir. Passado algum tempo, nasceu à filha Elizabeth. Em seguida o casal tentou mais um filho que infelizmente viera a perder em aborto espontâneo, alguns anos depois nasceu Margareth a última filha do casal. Já com as filhas pequenas, Lázaro decidiu não trabalhar na fazenda do pai e tocar seus próprios negócios em sua fazenda. Negócios esses que trataremos de forma separada no próximo tópico, pois foi de suma importância para a região e formação de sua carreira política. Percebemos nos discursos das filhas, que Lázaro foi um pai e um marido presente, que sempre apoiou as filhas e as incentivou a seguir nos estudos, e conversa com as meninas sobre todos os assuntos. Quando a filha Elizabeth terminou o 4° ano, faltava um ano para o término do mandato e saída da prefeitura, Lázaro enviou as filhas para Ipameri para morar com a avó (mãe de Valdeci). A mais velha, com 11 anos na época, arrumou um “namoradinho”, o pai que era uma pessoa “muito além de seu tempo”, na maior tranquilidade sentou com ela e conversou sobre a vida e a necessidade dos estudos para garantir um futuro promissor. Tanto é que Elizabeth conta que em certa ocasião, Lázaro à levou em psicólogo, tratamento ainda não procurado na época, para tratar de uma crise de medo. Ele ensinou as filhas a dirigir muito cedo, relata Margareth que “Beth com 11 anos já dirigia sozinha. Quando a Beth terminou os estudos em Ipameri, meu pai mandou a gente para Brasília, estudar lá e minha avó mãe da minha mãe foi para lá morar conosco em um apartamento, ele e minha mãe iam de 15 em 15 dias, eu tinha 13 anos quando fui para lá, e fique até depois de casar, me formou em economia e Beth em administração.”. Sempre preservou os 57


Raízes do Cerrado:

encontros familiares, era querido por todos que em afilhados de batismo, crisma, casamentos, a família contabiliza mais de 200 pessoas.

2.3 - Lázaro: o engenheiro, empresário e educador. Diversas habilidades se destacaram no jovem Lázaro, desde sua infância era percebível o quanto se dispunha de força de vontade para fazer algo novo para ajudar a família. Um homem que sempre foi atento aos estudos e passou esse legado as filhas. Na fazenda, Lázaro implantou novas técnicas que posteriormente foram frutos de pesquisas, como veremos adiante. Suas filhas relatam que o sonho do pai era ser Engenheiro Civil, mas devido às dificuldades familiares, não pode realizar o curso superior na época. A falta do diploma não o impossibilitou de realizar feitos de engenharia. Uma de suas obras desenvolvidas por ele na fazenda foi uma represa, para que chegasse água na sede, sendo que passava um pequeno ribeirão na proximidade. Para os feitos, Lázaro então desenvolveu todo o trabalho de engenharia na montagem da barragem de represamento da água, sua neta Lorena relata que a terra para o nível da represa foi toda retirada no balde de forma manual, feito por Lázaro e Valdeci. Percebe-se aqui, que além de estudos necessários para a montagem da represa, todo o trabalho braçal foi feito por ele a sua esposa. Vale ressaltar que essa obra feita em sua fazenda era longe da casa, represar sendo preciso fazer rego, encanar, nivelar, tudo organizado e bem calculado para que não saísse nada de errado no final da obra. Outro trabalho de engenharia realizado por ele, foi o do engenho de cachaça na fazenda do pai e posteriormente em sua própria fazenda. No 58


História da Família Manteiga

início da produção era tudo manual, realizado por tração de animais que giravam amarrados nos equipamentos para espremer a cana-de-açúcar e a partir de então, seguir os parâmetros na fabricação da cachaça. Passado algum tempo, Lázaro sentiu a necessidade de aprimorar a produção e reduzir o uso dos animais. Em suas diversas pesquisas e conversas estudou a respeito da substituição do moinho movido pela tração do boi pelo movido a partir da força da água, foi então que trocou e aprimorou o engenho de cachaça com a roda d’água, para espremer a cana. Em sua jornada com a cachaça, Lázaro iniciou os trabalhos na fábrica Castelo Branco com o pai. Depois de casado e com sua fazenda, decidiu ter sua própria marca, onde montou um novo engenho para a fabricação da cachaça “Último Desejo”, que tinha um “ar” interessante, o rótulo é um velhinho jogando uma bengala para o alto e “uma moça bonita”, atualmente a marca da cachaça pertence ainda à família Manteiga, mas registrada por Luiz Álvares de Campos Filho, que foi um presente dado por Valdeci.

Dentro dos feitos de engenharia desenvolvidos por Lázaro, cabe

destacar ainda a roda d’água para mover o gerador de energia na fazenda, que, pela descrição das filhas, era uma enorme roda movida a água. Desde crianças as filhas lembram que tinha energia na fazenda, através de um gerador, mas movido com essa roda, com gravidade, montado pelo pai, sem engenheiro para calcular. Percebemos então a sua personalidade forte, em utilizar o seu conhecimento para gerar benefícios para sua família.

Lázaro também foi pecuarista, criava gado leiteiro e de corte, pro-

duzia creme que era vendido para outras empresas. A partir de seu trabalho com o gado e a cachaça foi adquirindo mais bens, aumentando suas propriedades. Geralmente no processo de aquisição de novas fazendas dava prioridade em comprar próximas ou de pessoas conhecidas. Com isso foi 59


Raízes do Cerrado:

aumentado sua produtividade, até que resolveu a plantar lavouras, mas não foi seu foco e logo voltou para o gado leiteiro.

Assim, ele buscou inovação para os pastos, viajou para vários esta-

dos do país e trouxe para a região espécies novas de capim, foi o pioneiro da região em uma espécie de brachiaria “braquiara”. Ao trazer, plantou em terreno preparado e reservado na fazenda a fim de testá-la. Detectando que a planta adaptou ao terreno, começou a expandir a plantação e vender sementes para a região, onde segundo as filhas, um hectare que aguentava cerca de três cabeças de gado passou a ter um suporte muito maior. Mediante as pesquisas e anotações, novas espécies e campos de plantações foram se aperfeiçoando, “no início foi ele que trouxe, ele foi testando, dividindo pastos e fazendo testes, lembro porque eu fui com ele nas pesquisas, tanto é que, vieram pessoas de fora para conhecer o capim, pesquisadores vieram desenvolver projetos na fazenda e deu muito certo”, relembra Margareth.

Cabe destacar ainda os cuidados que sempre teve em sua fazenda

e na educação das filhas, a saúde era primordial para que estivessem dispostos a estudar, tanto é que, Lázaro não deixava que ficassem descalças, com os pés na terra, para evitar o contato com verminose o que era muito comum naquela época. Para caminhar na fazenda as filhas tinham que estar de calçados fechados. Também eram comuns latas para lixo espalhados por todas as áreas das fazendas, para não deixar lixo espalhado pelo chão, “essa educação e cuidado com os princípios básicos de saúde, nós tivemos desde pequenas”. Na educação, Lázaro chegou a construir grupos escolares na sede da fazenda, onde durante o dia estudavam as crianças, filhos de funcionários e da região e a noite podiam estudar os próprios funcionários com aulas de alfabetização. 60


História da Família Manteiga

2.4 - Das eleições à prefeitura: as ações polêmicas, as obras e o planejamento.

Mediante aos feitos e ao conhecimento da família, chegara o período eleitoral, e um consenso de correligionários lançaram a candidatura de Lázaro, a prefeito de Campo Alegre de Goiás, sendo eleito no pleito para ser o 5° prefeito da cidade desde sua emancipação política, e o primeiro político da família a assumir cargo no executivo. Ora pela sua popularidade, ora pela influência do pai Sebastião que trabalhou diretamente no processo de emancipação da cidade. Lázaro foi prefeito entre os anos de 1966 e 1969. Período em que o Brasil atravessa o agravamento da ditadura militar e influência da mesma nos municípios. Em seu mandato teve como Presidentes da República Humberto Castelo Branco, Arthur da Costa e Filho e depois o período governado pela Junta Militar. No governo de Goiás trabalhou diretamente com o governador Otávio Lage Siqueira. Em seu mandato, enfrentou período de dificuldades. Na prefeitura, não se tinham verbas e arrecadação do município era pequena, mas mesmo assim, é lembrado hoje por suas obras e ações. Na educação, construiu diversas escolas na zona rural em parceria com os fazendeiros. A administração construía grupos escolares em pequenos terrenos cedidos por proprietários de terras. O prédio da escola fazia parte da prefeitura, com a sua manutenção e despesas de água, lanche escolar, material, feita pelo poder municipal. Foi uma grande parceria feita pelo prefeito Lázaro com os fazendeiros, quando acontecia de a escola ser desmanchada o terreno voltava para o fazendeiro. Toda parceria lavrada em contratos e registrados. A maioria dos grupos escolares foi feita em alvenaria, todos com água tratada e banheiros adequados. As escolas do município participavam dos 61


Raízes do Cerrado:

tradicionais desfiles cívicos em comemoração a Independência do Brasil, que eram realizados na cidade, e os alunos dessas escolas da zona rural ensaiavam nas estradas das fazendas a marchar para fazerem a sua apresentação na cidade. Eram grandes desfiles e com todos os alunos da rede. Para a época, Lázaro foi considerado o maior prefeito a investir em educação na região, com grande número de escolas e grupos escolares. Era muito comum em pequenas cidades a realização de mutirões para determinadas ações, seja limpar pastos, regos, capinar roças e plantações, o então prefeito Lázaro também adotou a prática para limpar e abrir estradas na zona rural do município que não se tinha tantas estradas prontas na época. Com esses mutirões novas vias foram abertas e as que já existiam receberam manutenção. Os funcionários da prefeitura iam na segunda de madrugada para a fazenda com o maquinário, utensílios, mantimentos, montavam o acampamento e trabalhavam durante a semana, retornavam na sexta a tarde. Eram muitos os trabalhadores que participaram desse projeto de estradas nas fazendas de Campo Alegre de Goiás, em algumas delas, funcionários até ajudavam os trabalhadores da prefeitura na abertura das novas estradas, por serem obras que beneficiavam a todos da região. As obras de iluminação pública da cidade tiveram início durante seu mandato, pois até então, tinha apenas um gerador de energia, que era ligado às 20 horas e desligado por volta das 22 – 23 horas. Lázaro foi até o governador Otávio Lage para conseguir a expansão da rede de energia da cidade Ipameri para Campo Alegre de Goiás, inclusive se conta uma passagem onde um grande amigo do prefeito disse que “se o Lázaro conseguir trazer luz elétrica para cá, eu serei o primeiro poste da cidade”, e conseguiu, mas a brincadeira não foi realizada. Essa obra da rede de energia só veio a ser concluída anos depois durante o mandato de seu irmão Luiz Manteiga. 62


História da Família Manteiga

Contra verminose se fez em todo o município, uma mobilização muito grande, contra o tártaro americano, que era infestado na região, principalmente na zona rural. Lázaro fez uma campanha de combate contra vermes da população em todo o município onde trocava os recipientes de armazenar água de consumo pelo filtro de barro. O projeto envolveu escolas, postos de saúde e fazendas, todas as casas do município receberam a visita de agentes de saúde, e todos receberam o filtro para poder filtrar água antes de beber. Assim como em sua fazenda, a cidade também recebeu lixeiras para lixo, diversas ruas do município passaram a ter pontos para que os moradores depositassem o lixo, e não os deixassem espalhados pelas calçadas e ruas. Segundo ele era uma forma de deixar a cidade limpa e organizada. Ainda nos projetos voltados à saúde e saneamento, Lázaro realizou dois que causaram grandes polêmicas entre os moradores da cidade, um deles foi à canalização dos regos d’água que estavam espalhados pelas ruas, onde animais bebiam água, defecavam, mulheres lavavam roupas e pratos e alguns até utilizavam da mesma água para beber. Muitos falaram que o prefeito estava retirando a água deles, de suas casas, promovendo grandes discussões entre todos, mas na realidade houve apenas a canalização desses córregos para evitar a infestação de mosquitos e proliferação de doenças. Outro projeto foi a transferência do Cemitério Municipal, que até então estava no centro da cidade, ao lado de um pequeno grupo escolar. O prefeito estava com o projeto de construir a escola no terreno, pois era bem localizado e para isso construiu outro cemitério. Começou a exumar os corpos e levar para os novos túmulos feitos pela prefeitura, essa obra causou grande alvoroço na cidade e a meio de muitos protestos foi concluída. Após a retirada de todos os túmulos e corpos do centro da cidade, iniciou-se as obras da nova escola que veio a ser chamada de Colégio Major Emídio, que passou a ter turmas de segundo grau. Mas adiante o colégio foi passado para o poder estadual que fez novas ampliações e hoje 63


Raízes do Cerrado:

é denominado Colégio Estadual Major Emídio, nome esse em homenagem ao avô materno de Lázaro.

Entre tantos enfrentamentos em seu mandato, Lázaro saiu com alto

índice de aprovação e popularidade alta, mas mesmo assim preferiu não concorrer a novas eleições, e sempre influenciou os filhos e netos a não adentrarem para a carreira política, alegando que seria uma experiência difícil, onde não agradaria a todos e com o passar dos anos ficaria ainda mais complicado os mandatos. Mesmo assim, deixou a prefeitura com amigos que o acompanharam até os últimos anos de sua vida.

2.5 - Sua casa: lugar de família, cozinha, receber autoridades e o gabinete itinerante

O lar, em seu aconchego, segundo Valdeci Rezende Borges, autor

do livro Imaginário Familiar: História da família, do cotidiano e da vida privada na obra de Machado de Assis (2007 p-49), destaca que “na recente cultura familiar que se constituía, a casa, era o refúgio onde o homem de negócios, encarregado de produzir o sustento material dos seus, sobretudo, esposo e pai, se recolhia para descansar e cultivar a afeição da família”. Mas na família de Lázaro, sua casa passa além de ser um espaço de descanso e encontro de familiares, um lugar de negócios e uma extensão de seu gabinete.

As filhas relatam que o pai, durante seu mandato como prefeito, fez

várias reuniões governamentais na sala de casa, recebia deputados, autoridades e em certa ocasião recepcionou o governador Otávio Lage durante 64


História da Família Manteiga

sua passagem pelo município. Percebe-se que, “a recepção particular tornou-se espaço de sociabilizar, de convivência [...] mas reuniões acontecidas nos espaços privados era que a sociedade buscava, obtendo resultados, lucros simbólicos, políticos e econômicos [...]. Nas recepções privadas, criavam-se condições de relacionamentos e interações benéficas aos interesses de seus anfitriões, pois aí pessoas eram apresentadas, relações iniciadas ou estreitadas, às vezes, eram indivíduos poderosos e importantes. ” (BORGES, 2007, p-57).

Diversos encontros de negócios também ocorreram na casa, que se

tornou uma “extensão da prefeitura”, outras vezes, servia de um “tribunal de paz” onde compadres iam até Lázaro para resolver conflitos de demarcações de terras e saíam com os problemas resolvidos mediante conselhos do prefeito. Margareth lembra que “lá era tudo misturado, papai fez da casa quase um gabinete, lá recebíamos padre, políticos, peão, tudo ali”.

Enquanto Lázaro resolvia os afazeres das atribuições como pre-

feito, sua esposa Valdeci estava sempre na cozinha preparando quitutes, almoço ou jantar para servir aos convidados que estavam reunidos na sala com o marido. As filhas, quando estavam em casa, ora ajudava a mãe, ora acompanhava o pai nas reuniões ou até mesmo estava em seus quartos cuidando dos estudos.

Muito mais que encontros políticos e reuniões, a casa também era

palco de encontros familiares, festas de aniversários, celebrações e muita conversa. Lázaro sempre foi um homem que gostava de conversar com todos, seja família, vizinhos e amigos. Passados os compromissos, o lar voltava a ser o espaço para o descanso e interação familiar.

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Raízes do Cerrado:

2.6 - Valdeci: seu braço direito

Lázaro e Valdeci. Foto: Acervo Particular de Elizabeth Álvares. Sem data.

Como primeira-dama, Valdeci nunca foi a Prefeitura Municipal,

era apenas a esposa do prefeito. Vale ressaltar que na época não existia no município o cargo, que só veio a ser instaurado alguns anos depois, por meio da criação da Organização das Voluntárias de Goiás, pela primeira-dama do estado Dona Íris. Até então cabia aos prefeitos instituir o cargo de acordo com a necessidade de cada município, o que não aconteceu em Campo Alegre de Goiás.

Valdeci sempre foi uma esposa muito presente na vida de Lázaro,

desde o casamento até sua morte, esteve com ele em todo o processo de erguimento de sua fazenda e suas decisões profissionais. Elizabeth narra que a mãe foi o esteio da vida do pai, o braço direito dele. Em entrevista realizada com Dona Valdeci em 18 de novembro de 2014, para outros fins, 66


História da Família Manteiga

tive a oportunidade de perceber e constatar a sua força de vontade em sempre ajudar o marido, o que viera a se confirmar com os recentes relatos das filhas. Percebe-se que a esposa amava o marido, sentimentos que permeavam as relações matrimonias. Estavam presentes a gratidão, o respeito, a admiração e a estima, e reciprocidade por parte do esposo.

Muito mais que uma esposa dedicada, foi também uma mãe pre-

sente na educação das filhas. Mesmo sofrendo com a perca de outros filhos durante gestações, nunca se deixou abater diante as dificuldades. Incentivadora, amiga, que acreditava que educação possuía suma importância na formação dos indivíduos, e não mediu esforços junto com o esposo para investir nos estudos de Margareth e Elizabeth, onde enviaram as meninas para estudar em Ipameri-Goiás e posteriormente, Brasília para concluir o ensino superior.

Lázaro e Valdeci cuidaram de mais uma criança, que família a tem

como uma irmã, o casal a tinha como uma filha, Anália, criada pela avó materna, conhecida como “Vó Prima”, mas após o falecimento da mesma, passou a morar com eles, e teve todos os benefícios que as outras filhas tiveram, sem nenhuma distinção, Lázaro apresentava Anália como filha, a toda sociedade, participou ativamente de sua vida escolar e acadêmica, levando-a para morar em Brasília-DF a fim de terminar os estudos e iniciar o curso superior. Além dos bens materiais, Lázaro e Valdeci proporcionaram à filha os sentimentos e afetos de carinhos e amor. Em conversa com Anália, nota-se o quanto o casal soube educar e a acolher para que ela se sentisse da família sanguínea, pois os laços familiares de afeto eram construídos a cada dia. 67


Raízes do Cerrado:

2.7 - Momentos prazerosos em família à velhice do corpo: a mente jovem e empreendedora. Terminado o mandato, Lázaro voltou para sua fazenda juntamente com a esposa. As filhas já estavam estudando em Brasília e vinham em feriados prolongados ou férias. Na saída da administração, retornou os cuidados das fazendas, alegando que na prefeitura “só deu prejuízo particular”, pois, deixou tudo de lado, agora teria que organizá-las novamente, assim Lázaro e Valdeci retomaram as suas rotinas rurais. Deixado os compromissos políticos, Lázaro dedicou-se mais tempo aos amigos, aqueles que já vinham de longa data, como os que fizeram na vida pública. As filhas lembram que o pai era um homem de muitos amigos, esses que fizeram parte de toda sua vida e começaram a ser considerados como membros da família e sempre presentes nas celebrações, encontros familiares, batizados, aniversários e no dia-a-dia. Tendo tempo para realizar as atividades de lazer que gostava, passou a ir mais às casas das pessoas, baterem papo e tomar café nos alpendres, além de praticar sua atividade mais prazerosa que era a pescaria, onde todo o ano tirava uma temporada para viajar pelos grandes rios do país, na companhia dos amigos. Nunca perdeu seu gosto pelas inovações, de pesquisar em jornais, ouvir o rádio e estar atento o que mais de moderno era inventado na indústria, para ele, era um passatempo ler e estudar os avanços tecnológicos. Na contramão dos conservadores, Lázaro estava à frente em busca de ideias novas. O dia-a-dia na fazenda começava cedo, logo que o sol raiava a rotina seguia o mesmo ritual. Sempre gostou de olhar tudo pessoalmente, acordava às 6 da manhã e ia dar a volta em toda a fazenda, conferir as 68


História da Família Manteiga

cercas, os colchetes, mata-burros, as vacas e a criação. Quando a família acordava de manhã, Lázaro já estava de pé, olhando os pastos, colocando sal para o gado, sabia de tudo que se passava em cada canto da fazenda, isso era um ritual sagrado, repetido diariamente. Ao pesquisar a relação de Lázaro com a família, nos deparasse com um líder, um grande conselheiro e respeitado por todos os irmãos e sobrinhos, sua filha Margareth conta que o Pai foi o líder da nossa família, era respeitado por todos eles, ajudou todos os irmãos, era um irmão presente, nunca vi falar que ele teve uma briga com irmãos, durante toda vida meu pai estava lá, presente com eles, um pai presente conosco, mesmo com a nossa distância [...] tanto nas horas boas como nas difíceis, dificuldades financeiras ele ajudava, momentos de percas na família, como por exemplo na morte do tio Orazal.

Ao citar a morte do tio, a filha relembra que o pai sentiu muito sua partida e se sentiu como o irmão mais velho, necessário a ajudar a viúva Norma e os filhos no que pode, pois, o irmão ao morrer deixou filhos ainda crianças, onde incentivou os sobrinhos aos estudos, Lázaro e Valdeci tinham uma relação muito estreita e amigável com a cunhada. O casal Lázaro e Valdeci gostavam de ver a fazenda sempre cheia da alegria das crianças, e isso foi lembrado pelas filhas, onde sempre citavam a casa como um espaço para a socialização familiar, “as férias lá em casa era uma farra, ele levava todos os sobrinhos para lá, tanto que nós os primos mais velhos foram criados todos juntos, e ele levava tudo, e depois os mais novos também, essa turma do Luiz Filho – O Goteira e o Thiago, ele lavava todos para lá, e a gente tinha que olhar essa meninada, inclusive quando o Thiago era pequena, uma coisa muito engraçada, ele era muito apegado ao meu pai, e eu fique grávida de um dos meninos, e o Thiago 69


Raízes do Cerrado:

ficou com ciúmes pensando que ia perder o colo pro neto, ele tinha uma ligação muito grande com o papai, todos, principalmente os que moravam mais perto.”. Lázaro gostava de brincar com as crianças. As filhas que gostavam de brincar de cozinhar, o pai fez então para elas pequenos forninhos a lenha, e depois repetiu o gesto para as netas e sobrinhas. Confeccionou carrinhos de mão para os meninos, e ainda tirava o tempo para se divertir com eles. As filhas gostavam de acompanhar o pai em suas viagens de negócios, e segundo elas eram viagens divertidas e de muito aprendizado. O pai em nenhum momento impedia-as de acompanhá-lo, inclusive relatam que uma vez a cada ano, a família se reunia para fazer viagens de férias. Lázaro queria que as filhas percebessem as diferenças do Brasil, tanto geográficas como sociais. As viagens deveriam ser nacionais e com destinos ainda não conhecidos. Fizeram viagens pelo Nordeste visitando todas as capitais, também realizou pelo Sul, sudeste e também em algumas cidades da região norte. Sempre acompanhado pelas filhas, e inclusive uma das viagens ao nordeste, logo após o casamento de Elizabeth. A religiosidade sempre esteve presente na vida do casal, tanto que a esposa Valdeci, comentou acerca das presenças dela e do esposo nas novenas, terços, missas na comunidade e sediar encontros religiosos na fazenda, destacamos também uma reforma da atual capela de São Sebastião que Lázaro fez em honra ao santo. Tanto que Margareth conta sobre a religiosidade e devoção Mártir São Sebastião “minha avó mãe da minha mãe estava doente com câncer no intestino, e meu avô Sebastião Manteiga, que também era devoto de São Sebastião, fez uma promessa que depois da primeira cirurgia se ela saísse bem ele queria fazer a festa em homenagem ao santo, para comprar uma imagem para a igreja de Campo Alegre de Goiás. A minha avó – Prima – foi bem na cirurgia, e como meu avô já estava velho, meu pai e minha mãe fizeram a festa, que inclusive foi lá 70


História da Família Manteiga

em casa, na fazenda, foram três dias de festa, depois meu pai comprou a imagem com o dinheiro dele e o dinheiro da festa ele doou para famílias carentes da cidade. ” Atualmente a imagem de São Sebastião doada pela família está presente no altar na igreja dedicada a ele na cidade de Campo Alegre de Goiás, que após a doação e propagação da devoção, passou a ser o patrono da cidade e a festa em sua honra se é tradição até os dias atuais. Cabe destacar ainda nas ações de Lázaro em parceria com a família e amigos, foi uma festa beneficente que fez juntamente com o doutor Vidal Moreira na sua fazenda, onde juntaram toda a comunidade e reuniram em honra e devoção a São Sebastião. Segundo as filhas animaram a festa a dupla Zazá e Zezé, e todo o dinheiro arrecadado foi doado para o início das obras do Hospital Municipal da cidade, que veio a ser concluído no mandato do irmão de Lázaro o senhor Juarez. Entre momentos de alegrias, o passar dos anos foram mostrando à Lázaro as suas diversas fases ruins, crises financeiras e perca de amigos e entes queridos como os pais, irmãos, e o genro Edgard em drástico acidade de carro na cidade de Campo Alegre de Goiás. Tais fatos que podem ter contribuíram para que o abatesse, foi diagnosticado com depressão, em torno dos 70 anos. As filhas relatam que foi o fato que o levou a morte. Lutou por 10 anos contra a depressão, Margareth que o acompanhava nos médicos em Brasília e Goiânia, onde iniciaram indo de 15 em 15 dias, até passar a ser mensalmente. Lázaro incentivado pela família fazia o tratamento à risca, “às vezes cismava que não queria fazer o tratamento”, e sempre repetia a frase “o que a vida mandar a gente tem que fazer”. Lázaro até então era dependente de suas ações como vimos até aqui, mas veio a se envolver em dois acidentes seguidos em rodovias, o que levou as filhas a conversar com ele e contratar um motorista particular, a partir do fato foi saciando a dependência de uma pessoa que dirigiu a vida inteira, ter de parar de dirigir, foi uma limitação. 71


Raízes do Cerrado:

A chegada da idade também foi desgastando o corpo, pois foi sem-

pre um jovem trabalhador, com rotinas pesadas, com o passar dos anos as articulações foram perdendo alguns movimentos e Lázaro começou a ter dificuldades para se movimentar, tendo ainda mais que ficar dependente de algum apoio, passos curtos e mais lentos, fazendo-o cada vez mais ficar em casa e realizar apenas pequenas caminhadas, e as visitas diárias ao redor da fazenda foram sendo suspensas devido as limitações.

Quando ia à fazenda acompanhada do motorista, apenas pergunta-

va ao caseiro se estava tudo em ordem e voltava para a cidade, em muitas vezes nem descer do carro Lázaro sentia ânimo e vontade. Em finais de semana a família reunia na fazenda e ao chegar o domingo quando começava a organizar as malas para voltar, o pai sempre chamava a esposa para ir embora para evitar ficarem sozinhos na propriedade.

Outras complicações na saúde levaram a Lázaro ficar mais quieto.

Enfrentou um câncer, fez todo o tratamento e recebeu o diagnóstico de cura, passados alguns anos, passou mal e foi levado às pressas para Goiânia devido complicações na apendicite, que o levou a ficar hospitalizado durante 20 dias, outra complicação na vesícula o levou a nova cirurgia e mais um período de internação. Devido a tantas complicações, desenvolveu uma crise do pânico, não conseguindo ficar sozinho em casa ou na fazenda, tinha sempre que estar próximo de pessoas. Nem mesmo a presença da esposa controlava os momentos de crise, sua filha conta que “tinha crise e ficava inseguro, aí não gostava de ficar sozinho com minha mãe de jeito nenhum, o dia ele sabia que era folga do motorista ou algum outro parente não estava na cidade ele ficava em crise. Aí tinha que vim com ele de ambulância ou alguém vir correndo para cá, chegava aqui, ele sarava, a última vez que trouxe ele era um dia de eleição, ele passou mal e eu estava 72


História da Família Manteiga

lá, peguei e trouxe ele, marcamos médico e ele não quis ir, deitou e disse: ‘ minha filha eu não quero ir’, falei ‘então não vamos, peguei e desmarquei todos os médicos, sempre respeitei ele. ”, relembra Margareth.

O estado de Lázaro foi ficando crítico e a depressão foi o agravan-

do ainda mais, a ponto de ele chegar em sua filha e dizer que não queria mais tomar os remédios e que tinha perdido a vontade de seguir em vida, como lembra de forma emocionada sua filha Margareth. “Quando o pai decidiu que não queria mais beber os remédios, ele me disse ‘minha filha não quero viver mais”, para ela que sempre respeitou as vontades do pai, foi um momento difícil e marcante.

Com o agravamento, uma estrutura hospitalar foi montada na re-

sidência de sua filha Margareth na cidade de Catalão, com enfermeiros, fisioterapeuta, médicos, e todos os aparelhos e medicamentos necessários para que o pai ficasse internado em sua casa, pois o mesmo não queria ir para o hospital. Relembra que, toda a família passou a visitá-lo, almoçar juntos, jantar, pois como o pai sempre gostava de visitar a todos, esse foi o momento de os familiares demonstrar ainda mais o carinho que tinham por ele. Mas uma infecção no intestino delimitou ainda mais seu estado de saúde, levando-o a morte no dia 19 de março de 2009, na casa de sua filha.

Ainda no leito, Lázaro reuniu os netos e as filhas para deixar seu

legado. Conversou separadamente com cada membro da família. Como neto Felipe, conversou sobre negócios, a fazenda por cerca de 2 horas, pedindo para que tomasse conta dos negócios. Com as netas, falou sobre os estudos, casamento e as incentivou ao futuro promissor.

Sobre sua morte, constatamos o quanto foi um homem muito di-

nâmico, que sempre falava que o corpo não correspondia com a mente. 73


Raízes do Cerrado:

Para as filhas, o principal problema do pai foi a velhice. Lázaro nunca pensou que um dia o corpo não acompanharia a sua mente, sempre muito despachado, envelheceu o corpo, mas a mente continuou a trabalhar e sempre querer mais.

Uma perca muito grande para a sociedade campoalegrense e irre-

parável para a família, Lázaro recebeu diversas homenagens póstumas, seu corpo descansa no mausoléu da família, mas sua memória está viva e ativa em todos os familiares e aqueles que o conheceu. Dentre as homenagens, uma obra da cidade de Campo Alegre de Goiás leva seu nome, a Unidade Básica de Saúde Lázaro Álvares da Silva Campos, para fazer memória àquele que tanto preocupou com a saúde básica da população, enquanto prefeito. Após seu falecimento a esposa Valdeci, juntamente com as filhas, deu continuidade aos negócios da fazenda, como veremos a seguir.

2.8 - A continuidade de seu legado: Margareth, Elizabeth e Anália

Suas filhas estão hoje dando continuidade aos negócios da família.

Margareth formada em Economia, casada e com dois filhos. Elizabeth é formada em Administração de empresas, viúva e com uma filha. E Anália, casada e mãe de um filho, servidora pública federal. Enfrentaram os afazeres da fazenda e teve o apoio da mãe que veio a falecer em 15 de maio de 2018. O filho que mais queria estudar e pouca oportunidade teve, prosperou muito em suas ações e vida familiar, uma pessoa que gostava das novidades, das inovações, gostava de acompanhar o sistema político, 74


História da Família Manteiga

um nacionalista, tinha uma grande visão de Brasil e de negócios. Criou mulheres fortes, despachadas, desde pequena as filhas foram criadas de longe dos olhos, estudando, mas ao mesmo tempo proporcionava a elas todo o conforto necessário para uma boa educação. Deixou para as filhas um legado de perseverança e força de vontade, onde elas citam-no com muita emoção e saudades. Atualmente a fazenda é gerida pela filha Elizabeth que pretende prosseguir com os estudos iniciados pelo pai. Para ela não é fácil produzir o mesmo tanto que Lázaro produziu em seu tempo, mas tenta deixar para a filha os mesmo gestos e ensinamentos, para que memórias dos pais estejam sempre vivas perpassando por todas as gerações. Para ela “Na verdade a herança física, claro que é muito confortável, e muito benéfica, mas o maior legado que tenho é o exemplo de vida dos dois, de trabalho respeito e dignidade, um casal que teve uma vida simples e querida”. Elizabeth cita que devemos sempre inovar nos desejos e nas funções atribuídas, seja ela qual for, sem desistir para que mesmo com os erros, possam se reerguer, da mesma forma que o pai fez junto com os avós quando perderam o patrimônio. Para Margareth, vários foram os legados, muito mais que homem público, mas um homem de caráter e íntegro em toda sua vida, uma pessoa que tinha a família como algo primordial e insubstituível. Anália preserva na memória os pais sempre vivos e cheios de alegrias. Tem o cuidado de resgatar seus ensinamentos e repassá-los para seu filho, afim de que todas as futuras gerações venham a conhecer sua história. Para ela seu maior legado foi o caráter humano de Lázaro e o cuidado de mãe e mulher expressado por Valdeci até seus últimos dias. 75


Raízes do Cerrado:

2. 9 - Álbum de família

Lázaro e Valdeci. Foto: Acervo Particular de Elizabeth Álvares. Sem data

Lázaro em uma de suas viagens. Ao lado, a dedicatória enviada à amada. Foto: Acervo Particular de Elizabeth Álvares. Foto de 1948.

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História da Família Manteiga

Celebração das bodas de prata. (Na foto: Margareth, Lázaro e Valdeci) na Igrejinha Nossa Senhora de Fátima em Brasília Foto: Acervo Particular de Margareth Álvares. 1977.

Celebração das Bodas de Ouro, realizada na Fazenda Posse em 2002. (Valdeci e Lázaro, ao fundo Ir Lazarina) Foto: Acervo Particular de Elizabeth Álvares.

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Raízes do Cerrado:

Elizabeth Álvares no dia de seu casamento com Edgard. Foto: Acervo particular de Elizabeth Álvares

. Elizabeth Álvares, Munique Álvares, Valdeci Eleutério e o pet da família Arnaldo. Foto: Acervo particular de Elizabeth Álvares.

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História da Família Manteiga

Carlos Antônio, Carlos Eduardo e Anália. Foto: Acervo particular de Anália, 2019.

Renato Rodrigues, Federico, Lorena e Lorenzo. Foto: Acervo particular de Lorena Eleutério, 2019.

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Raízes do Cerrado:

Felipe Álvares, Renato Rodrigues, Lorena Eleutério, sentados: Weber Vaz e Margareth Álvares. Foto: Acervo de Felipe Álvares, 2016.

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História da Família Manteiga

Capítulo III A FÉ E VIDA DE LAZARINA ÁLVARES DA SILVA

O ano de 1930 foi no Brasil um marco em sua história, com revoluções e o início da era Vargas, mas bem longe dos conflitos armados liderados por Minas Gerais e Rio Grande do Sul, na zona rural de Campo Alegre – já então distrito de Ipameri, viera nascer a primeira filha do senhor Sebastião e Dona Maria, no dia 09 de Janeiro de 1930 nascia Lazarina Álvares da Silva, a primeira mulher da família que desde pequena manifesta sinais de fé. Certamente um dia de alegria para Dona Maria, dar à luz a sua primeira filha, que desde criança sempre foi uma menina amável e estudiosa, segundo relatos de seus irmãos. 81


Raízes do Cerrado:

Lazarina passou sua infância na fazenda, pelo relatado, chamava Bracinho, onde junto com os demais irmãos foram educados com ensinamentos cristãos, sempre preservando a vida, a religiosidade, a reza do terço diariamente, e com um dia a dia simples, cuidando dos afazeres domésticos junto com sua mãe, na cozinha, na limpeza da casa, varrer terreiros, apanhar ovos, tratar de galinhas, dentre outros serviços domésticos rurais que “não acaba”, com momentos felizes segundo ela, de brincadeiras com irmãos e os pais. Nos estudos, Lazarina aprendeu a ler e escrever ainda na fazenda, depois foi estudar no Colégio Nossa Senhora Mãe de Deus, em Catalão que foi fundado pelos Padres Agostinianos em 1921, na época o colégio era destinado a moças e regido por religiosas. Sendo assim, Lazarina passou a integrar o grupo de alunas internas do colégio, onde frequentava aulas normais e os compromissos religiosos estipulados pela instituição. Já acostumada com costumes religiosos, Lazarina não sentiu dificuldades em seguir os preceitos da igreja durante o internato, onde segundo dados do colégio, na época em que frequentava, as alunas iniciavam às aulas às 11 horas da manhã e ia com atividades escolares até às 14 horas, em seguida as internas tinha meia hora para descanso, e às 14:30 começavam os trabalhos manuais, que era a reza do terço e ensaio de cânticos católicos para corais de solenidades da igreja. Passados alguns anos, outras irmãs de Lazarina também foram estudar no Colégio Nossa Senhora Mãe de Deus, fazendo companhia para ela. Visitar os pais na fazenda era difícil, na época não tinha transportes diários para a região. Elas deveriam esperar caronas ou que o pai mandasse buscá-las no colégio. “Geralmente íamos nos caminhões que buscava e levava arroz para Campo Alegre, no subia na carroceria e íamos até a fazenda. ” Segundo relato, essas viagens aconteciam nas férias ou feriados prolongados. 82


História da Família Manteiga

Como Lazarina foi uma das primeiras a saber ler e escrever coube a ela a missão de alfabetizar os irmãos na fazenda, “geralmente eu fazia tarefas com eles a tarde”, vários irmãos relataram que fizeram com ela a alfabetização e até a segunda ou terceira série do primário. Logo no início da adolescência, Lazarina despertou a vocação pela vida religiosa, ora influencia pela mãe, ora influenciada pelo cotidiano escolar, mas aos 13 anos ela decidiu que queria entrar para a congregação. Mas não imaginava que seu primeiro desafio seria em casa, seu pai, que não queria de maneira alguma que sua filha fosse para o convento. Seu irmão Luiz ao relembrar o fato, cita que o pai não alegava motivos específicos para que proibisse a sua entrada no convento. Mas Lazarina lembra que uma amiga tinha entrado e logo em seguida fugiu, “então ele pensava que eu ia fazer o mesmo”. Mas todos os relatos colhidos mostram que, a fé de Lazarina fez com que seu pai mudasse de ideia e autorizasse sua entrada para o convento. Luiz lembra que ela ficava ajoelhada rezando o terço todos os dias por várias horas. Diante de um altar em sua casa, Lazarina rezava de joelhos pedindo intercessão para cumprir sua vocação. Até que depois de tanta oração, conversas, reflexões, o senhor Sebastião, autorizou, e ela foi cumprir a primeira etapa dos estudos religiosos no convento em Ipameri.

Tinha-se a Congregação das Missionárias de Jesus Crucificado, fundada em Campinas – SP em 1928, e trazido uma unidade para Ipameri em meados de 1936, a congregação tinha como tarefa, além da formação religiosa das noviças, ajudar na educação na cidade de Ipameri, as irmãs que frequentavam esse convento, davam aulas de alfabetização e as primeiras séries regulares da época no Educandário Nossa Senhora Aparecida, colégio que também era interno, para crianças da cidade. Além disso, as internas da congregação trabalhavam na preparação de cursos de noivos, batismos, catequese para crianças e adultos, visitavam enfermos e idosos. 83


Raízes do Cerrado:

Terminada a primeira etapa de sua formação para freira, Lazarina deixou a cidade de Ipameri e passou a morar em Campinas – SP, na sede da congregação. Por relatos, ela não se recorda da data em que passou e nem a idade em que foi morar em Campinas, mas por aproximação, acreditamos que ela se mudou aos 26 anos.

Com a entrada no convento, Lazarina visitava a família apenas nas férias, onde ela se recorda que esse momento era de muita festa, todos iam até ela para saber das novidades, conversarem e colocar a “prosa em dia”. Ela aproveitava cada momento junto da mãe, do pai e dos irmãos, pois devido a distância sabia que só retornaria a Campo Alegre nas férias do ano seguinte. O dia a dia na congregação era de muita oração, estudos da bíblia, rituais litúrgicos, história da igreja, latim, filosofia, teologia, e o trabalho interno que elas tinham que fazer que fosse de visitar enfermos, presídios, fábricas, hospitais, orfanatos, asilos, além de ajudar e amparar trabalhadores sem direitos e desrespeitados, acolher crianças órfãs e abandonadas, amparar famílias sem assistências, dar aulas em escolas conveniadas com a congregação e visitar casa por casa na cidade. Era um trabalho mis84


História da Família Manteiga

sionário, levando a todos a palavra de Deus e os ensinamentos da igreja, “tínhamos que evangelizar as pessoas”, ser solidários, profetas e sensíveis aos problemas do povo. No dia de seus votos, em 26 de fevereiro de 1965, Lazarina lembra que nem todos da família puderam estar presentes, devido a distância e a dificuldade da época, mas foi um momento muito bonito e marcante para sua vida e de sua família, “papai e mamãe estavam felizes”. Nos votos para a vida consagrada de uma freira, elas prometem diante o clero da Igreja Católica, pobreza que “por meio deste voto, os que prometeram cumpri-lo, não podem mais ter bens pessoais, renunciando aos bens que já tinham e dispensando tudo o que venha a ter como posse e tudo o que por força de trabalho precisar ter é apenas propriedade do seu instituto religioso. Normalmente, esta visão é defendida pelas ordens religiosas, enquanto que as congregações religiosas têm uma visão menos austera e mais simples do voto da pobreza, permitindo assim aos seus membros a posse, mas não o uso, de bens pessoais”. Também prometiam castidade, que através do celibato “finalidade seria os professados terem um coração indiviso para Deus, fazendo-os seguir por isso a continência”, e por fim fazia o voto de obediência, que “todo aquele que for superior de um instituto religioso ou de alguma parte do mesmo passa automaticamente a ter autoridade sobre os professados, que devem obedecer aos seus superiores.”

Convite para a Missa de Consagração da Irmã Lazarina. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

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Raízes do Cerrado:

Depois da consagração a vida religiosa, a Irmã Lazarina veio visitar a família, “foi um momento alegre e de emoção, todos os familiares estavam presentes”. Como já era tradição, o senhor Sebastião e dona Maria faziam questão dos filhos se reunirem para celebrar e festejar, a visita da filha agora já freira, foi marcada por uma grande festa, muita fartura no banquete do almoço e sem deixar de lado o tradicional momento religioso, que era a reza do terço, sempre resguardado. Em depoimentos, vários filhos e netos lembram esse momento sagrado que Sebastião e Maria não abriam mão, a reza do terço. Passado à visita a casa dos pais, Irmã Lazarina retornou a Campinas e iniciou seu trabalho como freira e seguindo a missão da Congregação, sendo transferida para a cidade do Rio de Janeiro – RJ, e várias outras cidades onde tinha a congregação espalhadas pelo país sempre com o mesmo víeis, de acolher os humildes e necessitados. Na cidade de Brasília, a Irmã recebeu o título de Madre Superiora da unidade da congregação, um título hierárquico da Igreja Católica e ela tinha como missão coordenar as ações naquela cidade. Irmã Lazarina passou a realizar diversos encontros religiosos e de pastorais, catequéticos e inclusive a trabalhar no Complexo Penitenciário da Papuda na região administrativa de São Sebastião, Distrito Federal, lá ela era responsável por encontros de formação dos presos e a prepará-los na catequese para receber os sacramentos da igreja. Com o passar dos anos e os avanços da idade, Irmã Lazarina veio enfrentar outras batalhas, desta vez de saúde. Por duas vezes passou por tratamentos contra o câncer, onde todos foram de bom êxito, graças a sua determinação e também à oração, sempre querendo poder doar mais de sua vida e continuar sua missão. Irmã Lazarina, executou seu trabalho também na cidade de Ipameri, no mesmo convento onde iniciou seus estudos religiosos. Voltava para lecionar às noviças e ajudar nos serviços pastorais da comunidade ipame86


História da Família Manteiga

rina. Sua passagem pelo município de Campo Alegre de Goiás, também foi marcado por serviços prestados a comunidade como visitas a famílias carentes, idosos, asilo, escolas e a trabalhar como professora no Grupo Escolar da cidade e era a única professora formada em magistério na época, até que por motivos políticos ela foi exonerada de seu cargo.

Irmã Lazarina (ao centro) com a turma de noviças no Colégio Interno de Ipameri – Goiás. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

Após tantas idas e vindas, Irmã Lazarina foi transferida para a cidade de Goiânia – GO, onde segundo dados da Congregação Missionárias de Jesus Crucificado, a sub-região de Goiânia além de gerenciar as equipes de formação da capital, era responsável por coordenar as congregações presentes em Rio Branco – Acre, Porto Velho e Coacal – Rondônia, Bannach – Pará, Brasília – Distrito Federal, Campo Grande e Três Lagoas – Mato Grosso do Sul, um total de 20 comunidades com cerca de 90 irmãs. Na cidade de Goiânia, elas tinham todas as demandas que já existiam na congregação, visitas domiciliares, pastorais, visitas rurais, grupos de for87


Raízes do Cerrado:

mação e dentre outros.

Irmã Lazarina juntamente com outras irmãs de congregação, pas-

sou a morar no pensionato, criado por elas em frente à Catedral Metropolitana de Goiânia, onde lá ficou por oito anos. Nesse pensionato elas acolhiam moradores de ruas, crianças abandonadas, moradores de outras cidades que vinham à capital para fazer tratamentos de saúde e não tinham onde ficar, elas recebiam a todos que necessitassem de um local para passar a noite e tomar café da manhã, esse era o objetivo do pensionato das irmãs.

Com o avanço da idade das irmãs, foi fundada na cidade de Goiâ-

nia, uma casa para que elas fossem morar e descansar dos afazeres já prestados à comunidade, onde todas as moradoras são idosas e o único compromisso a partir dali seria a oração e frequentar às missas. Quando realizada a conversa prazerosa com Lazarina, aos 89 anos, com o corpo frágil e debilitado, a Irmã morava nessa casa, junto com suas amigas de congregação, sempre buscando forças na oração e comunhão com Deus e os santos de devoção.

Lazarina faleceu em 1 de maio de 2019, na cidade de Goiânia –

Goiás, deixando um legado de fé e perseverança a todos os membros da família. Uma mulher que sempre foi ligada aos preceitos religiosos e à união familiar, presente em todas as datas comemorativas e reuniões, fazendo parte da memória de cada um que pode conhecer e conviver com ela.

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História da Família Manteiga

3.1 - Álbum de família

Irmã Lazarina acompanhada da cunhada Valdeci, dos irmãos: Anira, Lázaro, Emídio, Juarez e Luiz. Foto: Acervo Particular de Juarez Álvares da Silva. Sem data.

Irmã Lazarina preparando para servir o almoço. (Edésio, Dr. Antônio Jácome e Ir. Lazarina) Foto: Acervo Particular de Juarez Álvares da Silva. Sem data.

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Raízes do Cerrado:

Irmã Lazarina durante a Colação de Grau do sobrinho Thiago Manteiga. Foto: Acervo Particular de Thiago Manteiga.

Irmã Lazarina visitando a casa dos pais na cidade de Campo Alegre de Goiás. Foto: Acervo Particular de Juarez Álvares da Silva.

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História da Família Manteiga

Capítulo IV Maria Álvares da Silva - ‘Dona Zezica’

Este capítulo é dedicado à inesquecível professora Dona Zezica, apelido que carinhosamente era chamada por todos munícipes e sua família. Maria Álvares da Silva, nasceu em 23 de Julho de 1931 e dedicou sua vida à educação, como veremos a seguir. Para a pesquisa, foram colhidos relatos do filho Clóvis e familiares. Como todos os irmãos, Maria Álvares cresceu na fazenda e iniciou os estudos nesse mesmo local. Infância simples, marcada pelas brincadeiras de irmãos e o dia-a-dia com a mãe. Era comum as meninas ajudarem nas horas vagas os afazeres domésticos atribuídos a dona Maria Emídio, todas as filhas no tempo que não estavam na escola ou realizando as lições escolares, ajudavam na cozinha – cortando uma verdura, lavando alguma vasilha e quando maiores, cozinhado -, limpeza da casa, varrer terreiro, aguar hortaliças e flores, tratar de galinhas, apanhar ovos e assim por diante, sempre estavam ao lado da mãe auxiliando no que fosse necessário. Segundo relatos, o apelido Zezica, foi colocado por sua irmã Lazarina, uma forma carinhosa de chamar a pequena Maria. Apelido este que pegou e transpassou dos laços familiares, Maria Álvares passou a ser chamada de Zezica por todos da região e conhecidos da cidade.

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Raízes do Cerrado:

Ao terminar os estudos na fazenda, Zezica também foi transferida para o Colégio Interno Nossa Senhora Mãe de Deus, na cidade de Catalão, onde já estudava a irmã Lazarina. Juntamente com irmãs e amigas, ficou na forma de internato naquela unidade de ensino, voltava à fazenda dos pais em feriados prolongados, alguns finais de semana e nas férias. E foi ao passar férias que despertou o interesse maior pela profissão de professora, pois, no grupo escolar mantido pelo pai Sebastião em sua fazenda, durante as férias das filhas, a professora regente gozava de seus direitos e quem assumia as aulas eram as meninas que ali estavam. Sendo assim, Zezica e as irmãs passaram a lecionar para um grande número de alunos. Elas revezavam as turmas para que todas pudessem dar a mesma quantidade de aulas, durante esse período, despertou o interesse pela carreira do magistério. Desde a juventude, Zezica foi uma pessoa muito enérgica, não gostava de ficar “parada no tempo”, estava sempre estudando e aprimorando os conhecimentos. Após a conclusão dos estudos e formação do magistério, passou a lecionar em escolas da zona rural, em séries iniciais com alfabetização de crianças e jovens. Alguns anos depois, foi aprovada em concurso público, sendo a única da família a ser funcionária pública, como lembrou o irmão Juarez.

Convite de casamento de Maria Álvares da Silva “Zezica” e Clóvis Silva. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

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História da Família Manteiga

Zezica foi casada com Clóvis Silva, natural de Cristalina – GO, mas morava com sua família em Ipameri –GO, Clóvis e o pai eram compradores de gado, geralmente compravam na cidade de Formosa- GO, e vinha campeando o gado até a região, em uma viagem de demorava cerca de três a quatro meses. Campo Alegre estava sempre no roteiro de suas paradas, e em uma delas estava acontecendo uma quermesse da igreja na cidade, Clóvis foi e encontrou Zezica, uma linda jovem com suas irmãs. Nesse dia começaram a conversar e mantiveram um entrosamento que logo depois veio a se tornar namoro. Passado algum tempo, as famílias se conheceram, e o casal resolveu oficializar a união, tiveram dois filhos, Clóvis Silva Júnior e Denise Álvares da Silva.

Casamento de Maria Álvares da Silva “Zezica” e Clóvis Silva. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

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Raízes do Cerrado:

Após o casamento, mudaram para a cidade de Ipameri, devido ao trabalho do marido, pois os maiores compradores de gado eram da região, na cidade. Zezica iniciou os trabalhos como professora no Grupo Escolar Dom Bosco. Parte da infância dos filhos foi em Ipameri, voltaram para Campo Alegre de Goiás em 1967, após a morte de seu pai Sebastião Ferreira. Zezica sempre incentiva os estudos dos filhos, auxiliou na formação de cada um, Clóvis Júnior chegou a morar na cidade de Goiânia para concluir o ensino básico e o cursinho pré-vestibular, até conseguir sua vaga na universidade. Ainda sobre os filhos, apoiou também em suas escolhas e casamento, Clóvis Júnior conheceu a esposa durante o curso na universidade e se casou em Mococa, devido a família da noiva ser daquela cidade, mas retornou para morar com a família ao lado da mãe. A irmã Denise conheceu o esposo e casou-se na cidade de Campo Alegre de Goiás, depois foi morar em Brasília, retornando anos mais tarde para a cidade natal, atualmente mora em Blumenau – Santa Catarina com a família. Percebemos que Zezica criou os filhos de forma simples, onde nos conta que as brincadeiras eram de ruas, correr, subir em árvores e aproveitar o tempo com as demais crianças vizinhas. A cidade não tinha muito asfalto e nem tanto movimento, tinha-se muito espaço para brincar. Uma mulher que manteve os preceitos cristãos herdados da criação dos pais, sempre dedicada à família e aos filhos, adorava promover encontros familiares em sua casa, sempre com muita fartura. Lembrada como uma grande quituteira, não passava um Natal sem preparar uma rosca parecida com o panetone, que era a sensação da festa e alegria das crianças. Ao colhermos relatos acerca de dona Zezica, vimos o quanto foi uma mulher trabalhadora, talvez como a mãe Maria, sempre estava “procurando o que fazer”, seja em casa ou no trabalho.

Foi uma pessoa amiga dos familiares e colegas de serviço, com94


História da Família Manteiga

panheira dos filhos, respeitava a família, sempre se encontra pelas ruas alguém que fale bem dela e traga uma lembrança boa, gostava muito de brincadeiras com os sobrinhos, de provocá-los a discussão, uma discussão boa e saudável, às vezes “implicava-os” um pouco, coisas rotineiras das tias. Na vida pública como professora, determinada e rígida, às vezes os alunos não gostavam, mas os pais dos alunos e depois até eles próprios viam, que tinha que ser daquela maneira, apresentava sempre um jeito “durão”. Na prefeitura a única pessoa da família Manteiga a ser concursada, com a criação do Colégio Estadual Major Emídio, passou a ser diretora daquela instituição, mas não por indicações políticas e sim disputando o processo interno entre os professores, em eleição para a gestão escolar, que assumiu por muitos anos, sendo reeleita por diversas vezes, até que chegou um momento que a mesma não quis mais se candidatar ao cargo, contrariando algumas pessoas devido sua administração educacional rígida e voltada para o aprendizado para dos alunos. O irmão Luiz Manteiga cita que “diretora por várias vezes no colégio, muito exigente, mas muito querida pelos alunos. Ela tinha uma possibilidade de ser severa e dócil ao mesmo tempo, fazia que ela cativasse toda escola. Quando o professor mandava o aluno para a secretaria ele já temia de medo da bronca que ia levar da dona Zezica, mas ela sempre dava bons conselhos e organizava. Foi um período que Campo Alegre, muito desenvolvimento que os alunos gostavam tanto dela que colocaram o nome de uma fanfarra em homenagem a ela. ” Zezica também exerceu a função de professora em Ceres quando se mudou acompanhando as irmãs. Na prefeitura de Campo Alegre de Goiás exerceu as funções de diretora das escolas da Zona Rural, coordenadora de merenda escolar, responsável pela equipe de modulação do quadro de professores, compras de materiais básicos para o funcionamento das unidades e respondia por todos os assuntos relacionados ao ensino rural. 95


Raízes do Cerrado:

Dona Zezica, faleceu em 1997, vítima de um câncer, o qual lutou por muitos anos, sendo diagnosticada anteriormente, fez todo o tratamento e recebeu alta, cerca de cinco anos depois, a doença voltou mais forte e no mesmo local da anterior. A família acompanhou-a no tratamento na cidade de Goiânia, com os mais renomados médicos da época do Hospital Araújo Jorge, referência em oncologia no Estado de Goiás. Junto com o tratamento, outros fatores fizeram agravar o quadro clínico, o filho relata que, “não entende se foi uma depressão ou um medo de alguma coisa”, sempre achou a mãe uma pessoa muito forte e determinada, mas não se atentou em recorrer à ajuda de um psicólogo. Com o agravamento, Zezica foi adoecendo até o momento que ela não mais falava e assim veio a óbito. Em 14 de julho de 1997, Campo Alegre de Goiás perdeu uma grande professora e admiradora da cidade, uma mulher que olhava para os alunos com uma visão de futuro, que sempre acreditou no processo educacional, incentivadora de uma geração. A família Manteiga perdia uma irmã que preservava os costumes dos pais, que era uma “cópia” da mãe, um braço direito para todos. Clóvis Júnior e Denise se despediram da mãe que, sobretudo era uma amiga, uma companheira que sempre esteve ao lado dos filhos em todas suas escolhas, suas angústias e alegrias. Dona Zezica recebeu diversas homenagens, inclusive o Colégio Estadual Major Emídio, local onde trabalhou durante anos, nominou sua banda marcial como Banda Marcial Dona Zezica, uma simples forma de lembrar que em todos os corredores da instituição tem um pouco de sua história e sua força de vontade. Atualmente Denise mora em Blumenau, casada, com dois filhos e curtindo os netos. Clóvis, advogado formado em direito e casado com Eliana, também formada em direito, ambos atuam na advocacia na cidade de Campo Alegre de Goiás e pais de três filhos.

A memória de Zezica é guardada com carinho pelos filhos e sem96


História da Família Manteiga

pre que estão a mesa com os familiares ou em conversa na sala de casa mesmo, contam histórias, repassam seus ensinamentos e mantém viva as tradições de família ensinada pela mãe. Clóvis, por exemplo, sempre, que tem oportunidade reúne a família, os tios, sobrinhos, primos em alguma data comemorativa ou mesmo para proporcionar um encontro para “jogar uma conversa fora”.

4.1 - Álbum de Família:

Maria Álvares “Zezica” acompanhada do esposo Clovis Silva e dos filhos Denise e Clóvis Júnior. Foto: Acervo Particular de Clóvis Silva Júnior.

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Raízes do Cerrado:

Clóvis Silva Júnior (filho de Zezica) com esposa Eliana e filhos André, Letícia e Gabriel. Foto: Acervo Particular de Clóvis. 2019.

Diego Álvares (neto de Zezica), esposa Daiana Cristina e filhos Bernardo e Manuela. Foto: Acervo Particular de Diego. 2018.

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História da Família Manteiga

Rodrigo Álvares (neto de Zezica) e sua filha. Foto: Acervo Particular de Diego. 2019.

Diego Álvares, Clóvis Silva, Rodrigo Álvares, Denise Maria Silva. Foto: acervo particular de Letícia Figueiredo, 2007.

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História da Família Manteiga

Capítulo V Emídio Ferreira Álvares da Silva – pioneiro no café, grande agricultor e com um estilo próprio de ser

Em 30 de Junho de 1933, nascia o quarto filho de Sebastião e Maria, uma criança alegre e arteira, com seu jeito particular, ao mesmo tempo em que era brincalhão transmitia no semblante de seriedade. Este capítulo foi escrito através de relatos do genro, neta, irmãos e membros da família. Emídio enfrentou em sua vida inúmeras batalhas, dentre elas a perca da esposa e filhas, e hoje também não se faz presente. 101


Raízes do Cerrado:

Emídio que como dito, sempre foi uma criança brincalhona, gostava de aprontar com os irmãos, aproveitou sua infância na fazenda com os pais, de forma simples, criado nos preceitos cristãos e iniciando os estudos no grupo escolar rural, segundo informações, estudou em Ipameri por algum tempo. Uma juventude arteira, que a neta Angelita relembra algumas histórias contadas por ele: “pelo que contava era homem custoso, fazedor de artes”, dentre essas artes, ela lembra que “diz que uma vez tomou uma surra muito grande da mãe dele porque fingiu que tinha morrido, mas ele contava dessa surra, porque fez uma arte e disse ‘vou passar um susto na minha mãe’ matou um pato, cortou o pescoço desse pato e saiu sangrando pelo quintal e subiu em cima de uma mangueira e ficou escondido o dia todo, e ai ela ficou louca atrás dele, e todos já estavam desorientados atrás achando que realmente tinha acontecido alguma coisa, já estava anoitecendo, e parece que ele riu, ficou com dó e ela (D. Maria) o viu em cima do pé de manga, ai como diz ele ‘ela quase me mata de verdade’. (risos) ”.

5.1 - Um agropecuarista de destaque

Emídio herdou do pai o gosto por administrar fazendas, tornando assim um agropecuarista renomado na região. No início da década de 1970, a economia cafeeira passou a se expandir por outras regiões brasileiras, dentre elas Goiás, Minas Gerais e Bahia, territórios que até então se destacam com outra produtividade econômica, receberam as primeiras lavouras de café, sendo um dos motivos a grande perca de café na região sul com uma geada devastadora. Com uma visão de chances econômicas, Emídio implementou as primeiras lavouras de café na região do Triângulo Mineiro, sendo o pioneiro no cultivo do grão. 102


História da Família Manteiga

Emídio e Gercina visitando a lavoura de café em sua fazenda. Foto: Arquivo particular de Antônio Jácome.

A região do cerrado goiano ainda não tinha recebido esse tipo plantação, mas Emídio obteve grande êxito, lucro benefício, fazendo expandir o cultivo para novas safras. Todo o trabalho de plantação, remoção de pragas e matos entre os pés, colheita foi feita por auxilio de bóias-frias (trabalho manual), principal fonte de mão-de-obra na época, com o auxilio dos próprios funcionários da fazenda. Na lavoura, além do respaldo do banco, tinham os técnicos do IBC – Instituto Brasileiro do Café – para dar instruções, como fazer todas as etapas, do plantio a colheita, mas como dito, todo o processo era considerado novidade, tanto para técnicos agrícolas quanto para Emídio.

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Raízes do Cerrado:

Pouca tecnologia tinha para o cultivo do café no cerrado goiano, os insumos necessários eram importados de regiões produtoras, mas uma nova técnica deveria ser formada a partir de agora um clima e um solo diferenciado em relação às outras regiões brasileiras. Emídio pagou um “preço alto” por sua visão empreendedora. Como não tinha tecnologia, quase todos os insumos eram importados, e produziu muito, mas depois o cafezal começou a morrer, talvez pela falta de tecnologia, depois do ocorrido não empreendeu mais, como lembrado pelo irmão Juarez. Teve o auge de toda a produção no primeiro ano, mas as raízes do café não conseguiam penetrar uma camada inerte do solo do cerrado, onde ainda exemplifica o irmão “temos no cerrado uma película de terra inerte que se não penetrar ela 50 cm, a raiz do café não penetra por si e não se sabia disso, mais 10 cm tinha dado certo”. Houve perca das novas mudas de café, a produção que já estava recém colhida, foi vendida por preço baixo. A sacaria do café desvalorizou fazendo que ocorresse mais perca de lucro. Por meio de sua inovação, Emídio foi reconhecido por órgãos responsáveis de agricultura como um dos pioneiros do plantio de café na região e através de seus erros, novos estudos foram feitos no solo do cerrado, transformando o Triângulo Mineiro e região de Campo Alegre de Goiás num grande polo no plantio de café. Alinhado ao café, Emídio foi um grande produtor de arroz em suas fazendas, talvez por herança do pai, que sempre cultivou em suas terras. No ramo da pecuária, destacamos a criação do gado Zebu, espécie considerada o carro-chefe da agropecuária brasileira, contribuiu com a economia brasileira, como maior fonte de proteína animal, couro, leite e derivados, ainda, no comércio nacional e internacional de sêmens, embriões etc., de reprodutores e matrizes, elevando mundialmente o conceito e valor da pecuária e do agronegócio nacional.

Com o gado, Emídio participava de exposições, sendo premiado 104


História da Família Manteiga

diversas vezes com seus animais de destaque. Animais imponentes e bem tratados, sempre convidados para expor em feiras agropecuárias e participar de competições. Depois das lavouras, o gado foi um de seus grandes negócios, criou também algumas outras espécies leiteiras para intercalar sua produtividade. Emídio é citado pelo genro, pela neta e pelos irmãos um administrador exemplar, fazia suas rondas diárias por todo espaço da fazenda, sabia cada detalhe e bastava um olhar para que o funcionário já identificasse o que ele queria. Cabe ressaltar que muitos o consideravam como um homem carrancudo, pois transparecia em sua face, mas sempre estava disposto a ajudar os peões no que fosse necessário e em momentos de descontração brincava com todos, tanto que recebeu de homenagem na época uma música que contava sua trajetória denominada “Ricaço de Goiás” autoria da dupla sertaneja Nequito e Nequinha.

5.2 - Família – alegrias e perdas Emídio foi casado com Gercina Cardoso Álvares, filha de família tradicional na região de Campo Alegre de Goiás. Moraram na fazenda e tiveram duas filhas, Maria Inês e Maria Márcia. Constituiu seu patrimônio juntamente com o auxilio da esposa, que sempre esteve ao lado, lembrada pela neta Angelita emocionada, como uma mulher guerreira, alegre e determinada, passava o dia cuidando dos afazeres da casa e das filhas. O casamento de Emídio e Gercina foi celebrado na cidade de Ipameri-Goiás, em cerimônia na casa da família da noiva. Os noivos celebraram o casamento durante o dia, que era desejo dela, em seguida, receberam os votos no mesmo local. 105


Raízes do Cerrado:

Convite do casamento de Emídio e Gercina distribuído aos convidados. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

Emídio educou as filhas em colégios da região e se formaram na cidade de Brasília-DF, onde ele sempre acreditava que tinha o de mais 106


História da Família Manteiga

moderno e avançado no quesito educacional. Enfrentou o diagnóstico de lúpus na filha Maria Inês ainda na juventude, fase em que a doença é mais agressiva aos órgãos. Buscaram tratamento com médicos especialistas e renomados na época, tanto no estado e até mesmo no Rio de Janeiro e em São Paulo. A filha Maria Inês sempre muito rígida com todo o tratamento, conseguiu controlar a doença e poder levar uma vida tranquila, chegando a exercer a profissão de professora na cidade de Campo Alegre de Goiás, assumindo também o cargo de secretária de educação no município. A segunda filha do casal, Maria Márcia também estudou em Brasília-DF, formada em curso técnico em laboratório, tinha o sonho de prestar vestibular para medicina, mas casou-se logo que terminou os estudos com o médico Antônio Jácome Neto. Sempre muito preocupada com o social, fundou na cidade de Catalão uma casa para acolhimento de crianças “Lar Maria de Nazaré”, onde chegou a ter 60 internos. Em casa, uma filha exemplar, uma esposa dedicada e uma mãe carinhosa, além de se preocupar com os que a rodeavam e deixar um legado de solidariedade como veremos adiante. Diante de uma família bela, Emídio se sentia realizado, filhas bem-sucedidas e uma esposa que o amava, até que um acidente fatal tira a vida de Gercina, em 14 de fevereiro de 1995, na rodovia que liga Pires do Rio – Goiânia, juntamente com o genro Teófilo, a filha Maria Márcia e o esposo sofreram um acidente onde o carro que estavam caiu de uma ponte, o impacto do automóvel na água espantou uma colméia de Abelhas Europa e atacou todos que estavam no carro. Diante os ferimentos, Gercina não resistiu a centenas de picadas que levou e veio a óbito no hospital de Goiânia. Muito abalado com a morte da esposa, Emídio encontrou nas filhas e netas o sustento para a lida do dia-a-dia. Em 2010, outro acidente deixa 107


Raízes do Cerrado:

mais uma vítima, dessa vez a filha Maria Inês, que estava voltando de um batizado da sobrinha em Londrina. Toda a família viajava e no retorno, próximo a cidade de Frutal, um acidente, o carro onde ela estava capotou, levando-a a óbito. Maria Inês sempre levou à risca o tratamento contra o avanço do lúpus com muita determinação e alegria, superou a morte da mãe junto com o pai e a irmã, deixando um legado de perseverança e humildade aos que ficaram. Naquele momento, Emídio teve que enfrentar uma grande perca, dessa vez não só financeira como na época do café, mas percas emocional. Uma vez mais teve que se reerguer e com o auxílio da filha Maria Márcia e com a energia das netas, voltou a tocar os negócios, um pouco mais debilitado, as marcas do tempo já o deixava um pouco mais cansado, porém superou os obstáculos e continuou na lida com a fazenda. No ano de 2014, a filha Maria Márcia foi diagnosticada com câncer, iniciando assim um longo tratamento, com o auxílio do esposo e das filhas e o apoio incondicional do pai, que tornou ainda mais um grande amigo. Ela sempre lutou pela vida, tratou nos maiores especialistas e em hospitais renomados de São Paulo, mas infelizmente, em 4 de dezembro de 2016, veio a falecer, deixando um vazio muito grande na família e principalmente no senhor Emídio, que depois de tantas percas sentiu ainda mais a da última filha. Diante das dificuldades vemos em Emídio um homem que superando obstáculos, sempre se reerguia, mas ao deparar com esposa e as filhas já falecidas, a idade e a delimitações do corpo, deixaram suas consequências. Aquele homem inquieto debilitou-se e pouco mais de um ano veio a óbito, em sua cama, durante um sono profundo, que segundo o genro “ele nem sabe que faleceu, estava dormindo”. Emídio faleceu em 27 de abril de 2018. Relatos citam que “não sofreu” nem foi hospitalizado, deixando para os netos um legado forte de superação e determinação. 108


História da Família Manteiga

5.3 - A vida pública – um influenciador político

Diferente dos demais irmãos, Emídio tinha um lado diferenciado

na política, sempre foi alheio e não gostava das especulações políticas, mesmo tendo sempre presença marcante e de respeito diante os munícipes da cidade. Assim como o pai, foi um influenciador e articulador político, nas campanhas dos irmãos Lázaro, Luiz e Juarez procurava ficar um pouco mais distante, nunca deixou de apoiá-los, participava de eventos e pedia votos para as famílias que moravam em sua propriedade e funcionários.

Chegando ao término do mandato de Juarez à frente da prefeitura

de Campo Alegre de Goiás, a família já articulava para o lançamento de um novo nome a fim de dar continuidade ao legado e às obras iniciadas. Sebastião queria que fosse um dos filhos, mas Emídio optou por lançar o nome do genro Dr. Antônio Jácome Neto, casado com sua filha Maria Márcia Álvares Jácome.

Diante de negociações, reuniões com partidos o nome foi escolhi-

do para concorrer ao cargo de prefeito, na época o período de transição da reforma política apoiada naquele ano, que até então o prefeito anterior teve seis anos de mandato e agora partiria para apenas quatro anos como no regime atual.

Emídio ficou satisfeito com a escolha do genro para as eleições

daquele ano e pela primeira vez participou um pouco mais do processo eleitoral, sua influência entre os agricultores e pecuaristas, ajudou para a concretização da campanha. Pediu votos aos funcionários, amigos e vizinhos da fazenda, contribuindo para o êxito. 109


Raízes do Cerrado:

5.4 - Dr. Antônio e Márcia – a continuidade de um legado e a implantação de uma nova história em Campo Alegre de Goiás

Antes de iniciar as explanações a cerca da administração de Dr. Antônio e Márcia, quero apresentar aos leitores o novo prefeito. Dr. Antônio Jácome Neto é natural da cidade de Dr. Severiano no Rio Grande do Norte, nascido em 15 de abril de 1946. Sua história também é marcada por muita luta e superação. Perdeu a mãe ainda criança. Estudou em escola pública durante toda sua trajetória educacional, fez o primário em Mossoró, depois se mudou para Natal fazer o ginásio, era costume naquela época tentar escolas melhores nas capitais. Segundo ele o principal objetivo de estudar era para prestar o concorrido vestibular de medicina. Em Natal morou em casa do estudante, oferecida pelo governo. Matriculou-se no período noturno para trabalhar durante o dia, mas conseguiu um emprego a noite, que o levou a uma luta para conseguir trocar de turno. 110


História da Família Manteiga

Segundo ele, a diretora da unidade escolar que tinha matriculado não cedia uma vaga no matutino, alegando que estava sem vagas. O jovem Antônio foi então para o Palácio do Governo tentar falar com o governador para trocar seu horário de aula, o trabalho que tinha conseguido era de auxiliar do professor Carlos Viveiro. Não foi atendido no primeiro dia, nem no segundo, mas Antônio estava todo o dia no Palácio do governo, até que na sexta-feira foi atendido pelo então governador, onde contou sua história e o mesmo solicitou uma vaga no matutino para ele no colégio estadual que estava matriculado. Antônio sempre foi entusiasmado com os estudos e a leitura. Amante de notícias comprava um jornal todos os dias, chegando a época de prestar o vestibular para medicina na Universidade Federal de Natal, foram ofertadas 60 vagas, mas quando saiu o resultado apenas 40 aprovados seriam chamados para iniciar as aulas devido a capacidade da faculdade. Antonio ficou dentre os 20 alunos em uma lista de espera, que talvez nunca seriam chamados. Após a divulgação do resultado frustrante da lista, foi juntamente com os outros aprovados à Brasília, pegaram tamboretes e faziam discurso, com a vinda da polícia saíam correndo até outro ponto da capital, até mesmo se escondiam, formaram um movimento estudantil dos aprovados, em 1968 era o auge da Ditadura Militar no Brasil, Costa e Silva estava lançando os atos institucionais de repressão popular, e os jovens ainda menores de idade estavam nas ruas tentando uma vaga na universidade. Antônio lembra que o ministro Társio Dutra da educação deu uma verba de muitos milhões para matricular 20 alunos de Natal e 20 de outra cidade, em alguma universidade do país, na época verbas de faculdades era bem maior que verbas de municípios. Surgiu o reitor, Marinho, de Manaus e matricularam os alunos em sua faculdade. Para o transporte aéreo era predominante o Correio Aéreo Nacional, da Força Aérea Brasileira, Antônio e os demais aprovados de Natal saíram de um avião da FAB e foram com destino a Manaus, já com a documentação de matrículas organizadas e uma turma paralela foi montada na Universidade Federal de Manaus. Iniciado o curso de medicina na cidade de Manaus, Antônio enfrentou novos desafios, como não podia trabalhar durante o dia, e a situa111


Raízes do Cerrado:

ção financeira foi apertando, resolveu procurar emprego em escolas de Manaus, mas nenhuma escola tinha vaga. Passando por uma rua viu o anúncio em jornal dizendo que haveria um encontro de Secretários Estaduais de Educação em Brasília com o ministro, de onde teve uma ideia que poderia auxiliar sua estadia em Manaus, “pensei comigo mesmo que o secretario de Natal conhecia o de Manaus, já tinha passado por todas as escolas e nenhum tinha vaga, tinha uns que nem me recebiam, eu magro, de cabelo arrepiado, não tinha jeito, ai veio uma ideia de escrever uma carta pra um conhecido casado com uma parente minha em Natal e ele tinha amizade com o secretário, [...] aí eu fiz o seguinte, ‘gostaria que você me recomendasse pro secretario de Natal pedindo aqui pro secretário de Manaus’ fiz aquilo ali sem muita esperança, mandei la pra ele, de repente eu recebo a carta de volta, era só um cartão, mas não li não. Tive uns intervalos de aula e fui pra secretaria de educação, a moça secretaria de governo toda bem arrumada, perguntava o que eu queria, eu dizia que tinha essa carta e elas queria que eu entregasse pra elas, falando que ele não podia me atender, fui lá todos os dias da semana, até que ela ficou com dó de mim, ela deve ter conversado com ele, falando que eu estava lá, ele saiu de fora me olhou e eu entrei com a carta na mão entregando, ele já rasgou, leu e me mandou sentar, não conversamos, ele só fez um bilhete e mandou pro diretor do Colégio Castelo Branco, cheguei nesse colégio, a coordenadora já me arrumou umas aulas.” Assim Antônio lecionou no noturno e estudava durante o dia, até que foi convidado para dar aulas em um colégio de freiras, onde ele conseguiu intercalar as aulas com os horários de folga da faculdade. Com muita luta e quase sem descanso, concluiu o curso de Medicina e foi servir o exército como médico na fronteira de Manaus, ficou cerca de um ano até ser transferido para Ipameri, onde começou a trabalhar no batalhão militar e sua história se cruza com a da família Manteiga. Dr. Antônio recém formado médico chegou a Ipameri - GO em 1975, para trabalhar na base militar da cidade, durante seu período de adaptação e apresentação à comunidade veio à região de Campo Alegre de Goiás acompanhado de amigos do exército, onde segundo ele foi por meio 112


História da Família Manteiga

das idas que veio a conhecer primeiro os irmãos de Emídio e mais adiante Maria Márcia, chamada apenas de Márcia, que viera a ser sua esposa, “a conheceu em uma ida à cidade, o Luiz era prefeito na época e ela estudava em Brasília, e nessa época de 1975 o Emídio estava na colheita de café, era o mês de julho [...] durante o abastecimento do carro em um posto de combustível da rodovia às margens da cidade, conversou com Márcia, e logo passou a ir à Brasília, namoraram durante o ano de 1976 e em fevereiro de 1977 a se casaram.

Dr. Antônio Jácome e sua esposa Maria Márcia no dia de seu casamento. Foto: Acervo particular de Angelita. Sem data.

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Raízes do Cerrado:

Transcorrido um pouco sobre a história de Dr. Antônio e sua chegada, podemos destacar seu mandato como prefeito, que como dito anteriormente, entrou na política por influência do sogro a fim de dar continuidade ao mandato de Juarez “Manteiga”. Seu mandato foi regido pelo lema “O progresso continua”. Eleito para quatro anos de governo, Dr. Antônio destaca que todas as ações foram realizadas em parceira com a esposa Márcia, cita ela como um “braço direito” em sua administração. A cidade estava aflorando para o crescimento do agronegócio, já havia iniciado a repartição dos lotes do Projeto Paineiras, que hoje é responsável por grande parte da produção agrícola do município. O novo prefeito teve então que dar continuidade a repartição, auxiliar na infraestrutura, além de receber o grande número de imigrantes vindos dos mais diversos estados brasileiros, sobretudo os sulistas, “estava chegando os imigrantes para o Projeto Paineiras, 31 lotes que o governo fez, financiou maquinário e pivô, e nós fazíamos uma propaganda muita grande, e a prefeitura mantinha 31 pivôs em área continua, e era a área mais irrigada da região era em Campo Alegre, e para funcionar esse pivô a energia não prestava e tinha uma central potente que tive que puxar de Pires do Rio, para vim direto pros pivôs e veio a tomada de água, fazer a represa, foi complicada fazer porque a independência de cada lote, tive que fazer estradas, muitas estradas, toda a infraestrutura do projeto foi feita na nossa administração, a estrada tinha que elevar elas e cascalhar e mais uma série de coisas.” Mas para ele todo esse esforço foi recompensado ao ver que hoje o município tem uma força muito grande na agricultura, a nível nacional. Ele lembra que começaram com duas safras anuais e foram expandindo as culturas a serem cultivadas, diversos grãos, cereais e frutos começaram a ser produzido, para que o projeto ficasse sempre gerando emprego, renda e produtos na região. Em relação a obras, Dr. Antônio foi responsável pela conclusão do Clube Recreativo de Campo Alegre de Goiás, a construção do novo Centro 114


História da Família Manteiga

Administrativo – o prédio da Prefeitura Municipal, a Creche Municipal Lar da Criança – hoje desativada, a Clínica Odontológica, concursando dentistas e médicos, e custeando o que precisasse para o atendimento da população. Era comum pacientes moradores da zona rural, com dentes deteriorados, precisando de implantes, dentaduras, pontes dentárias e ter todo tratamento gratuito. Se algum procedimento não tivesse como ser realizado nas clínicas da cidade, mandava pra Catalão e Ipameri com custos mantidos pelo poder público. A saúde representava o maior gasto e a clinica odontológica era maior parte, “queria da oportunidade pra todos, dar dignidade em sorrir”, em parcerias com Roriz em Brasília construiu um complexo com três grandes espaços para que a esposa executasse um projeto com crianças do município afim de tirá-las das ruas e da marginalidade, nesse projeto os participantes aprendiam a manusear pequenas marcenarias e construir rodos, vassouras e tudo era vendido, revertendo o dinheiro para as famílias carentes. No social de “olhares da minha esposa” realizou diversas ações, como cursos profissionalizantes, palestras de anti-drogas e saúde pública. Márcia como primeira-dama teve um carinho muito grande pelos jardins da cidade, arborizou e reflorestou praças e avenidas, foi responsável pela criação do jardim de entrada da cidade – hoje desfeito devida a duplicação da BR050 – realizou mutirões e iniciou o projeto de doação de brinquedos para as crianças do município nas comemorações do Natal. Na educação, contratou e qualificou professores, também contratou os colonos vindos do Sul e Sudeste que possuíam nível superior para dirigir as escolas, ajudando a melhorar a qualidade de ensino, mérito que segundo ele era de sua esposa. As escolas passaram a ter ensino equivalente às grandes cidades, as coordenadoras e diretoras que estavam ajudando, vinham de grandes centros como Maringá e Londrina. Dr. Antônio, por ter um relacionamento amigável com o secretário executivo do Ministério da Saúde, conseguiu de forma direta para o mu115


Raízes do Cerrado:

nicípio diversos recursos, dentre eles o valor referente à 30 internações no Hospital Municipal, que para a época era de valor altíssimo. As amizades e a forma em que Dr. Antônio conseguiu recursos para o município causou estranheza entre a cúpula política estadual, na maioria das vezes o prefeito ia direto à Brasília em busca de recursos, desviando das barganhas políticas propostas por alguns membros do estado. Dr. Antônio cita a respeito do fim do mandato que isso [recursos] me causou um transtorno muito grande na política, inclusive estou falando isso pela primeira vez, porque o governador e o secretário de estado da saúde tinha que liberar a verba por Goiânia e a minha veio direto, e eles acharam ruim de mais, eles pensaram ‘esse cara prefeito de Campo Alegre, uma currutela, arrumar 30 AIH em Brasília pro hospital dele, vamos queimar esse cara rápido’ e com apoio do governador, me podaram de um jeito, que constituíram um candidato do estado, com o aval da Assembleia Legislativa, que tinha o Rubens Cosac de Ipameri, a missão era ‘elimina esse prefeito por tudo’ e eu candidatei o Juarez que tinha feito sucesso nos 6 anos de sua gestão, e o meu tinha sido 4, eles botaram esse cara e ele saiu la na frente, ai é o seguinte, política tem que fazer o jogo de todo mundo, e eu não faço jogo, então saí e nunca mais quis entrar no meio político.

O fim do mandato de Dr Antônio se deu de forma drástica, infelizmente com a derrota de sua base nas urnas. Mas provavelmente influência de uma “renovação” política que se deu com a eleição do presidente Fernando Collor em 1989, o primeiro presidente eleito pelo povo após o Regime Militar. Com sua eleição um processo de reconstrução nacional se difundiu pelo país fazendo que novos nomes fossem eleitos pelo povo, como o que aconteceu em Campo Alegre de Goiás. A hegemonia da família Manteiga já estava desde 1966 com a eleição de Lázaro Álvares da Silva Campos ao cargo de prefeito, alternando apenas em dois períodos 116


História da Família Manteiga

curtos com outro prefeito, sem levarmos em consideração que o primeiro prefeito da cidade após sua emancipação foi indicado por Sebastião Ferreira – Sebastião Manteiga, contabilizado foi aproximadamente 20 anos de mandatos encabeçados por membros da família. Naquela eleição de 1992 a população de Campo Alegre de Goiás foi posta a um novo discurso de candidato formalizado pelo governo estadual e novamente o candidato da Família Manteiga, optaram pela alternativa da novidade, mesmo que futuramente, veio a sofrer impeachment – primeiro e único registro de cassação de mandato da história do município. Passado as eleições e sem êxito no processo eleitoral, Dr. Antônio foi convidado para trabalhar em Goiânia, mas preferiu mudar-se com a família para a cidade de Catalão-GO, segundo ele, mudou no outro dia após a posse, para procurar casa que comportasse a todos, matricular as filhas em escolas, procurar emprego e se restabelecer na medicina. Continuou atendendo no município até ser exonerado pelo prefeito. Após esse período começou a trabalhar em hospitais de Catalão, e foi aos poucos constituindo o patrimônio. Voltou a trabalhar na cidade de Campo Alegre de Goiás como plantonista e atendeu até o fechamento da edição na cidade. Relembra que em quatro anos já não conseguia atender a tanta clientela, o dinheiro começou a render e girar investiu em uma nova casa, pois onde morava não suportava toda família além das quatro filhas criou juntamente com a esposa mais três adotivos. Dr. Antônio destaca que toda sua trajetória de lutas quando criança e adolescente o fez tornar uma pessoa crente em Deus e com princípios que educou as filhas, sobre a esposa, que sempre foi seu alicerce, uma mulher de fibra e guerreira que lutou pela vida, que cuidou das filhas e as educou muito bem, que juntos constituíram tudo que tem “porque modesta parte o que eu tenho de alguma coisa material foi ela que fez a parte financeira toda, porque ela sempre muito equilibrada”. 117


Raízes do Cerrado:

O casal teve quatro filhas Áurea Angélica, Angelita, Ângela e Andréia, atualmente todas formadas e exercendo suas profissões. Atualmente Dr. Antônio trabalha na clínica projetada pela esposa na cidade de Catalão. As relações com a família Manteiga continuam presente e os laços fortes entre os primos, sempre que possível se reúne para conversar e comemorar datas, mantendo viva a memória de Emídio e suas filhas.

5.5 - Álbum de família:

Emídio durante a confraternização do Natal com sua família (Antônio Jácome, Angelita, Cássio,, Emídio, Maria Márcia, Dr. Antônio Jácome, Áurea Angélica, Edi Carlos, Robson, Ângela, Andréia, André, Mateus e Gabriel). Foto: Acervo particular de Angelita.

Emídio e sua esposa Gercina. Foto: Acervo Particular de Angelita. Sem data

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História da Família Manteiga

Filhas: Maria Márcia e Maria Inês

Emídio e Gercina com as filhas Maria Inês e Maria Márcia. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

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Raízes do Cerrado:

Emídio com as netas Angelita, Ângela, Áurea Angélica, Andréia e bisnetos Gabriel, Antônio Mateus e Beatriz (colo). Foto: Acervo Particular de Angelita, 2017.

Maria Márcia com seu esposo Dr. Antônio Jácome e filhas Angelita, Áurea Angelica, Andréia, Márica, Dr. Antônio e Ângela. . Foto: Acervo Particular de Angelita.

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História da Família Manteiga

Dr. Antônio Jácome e filhas Ângela, Áurea, Dr. Antônio, Angelita e Andréia. Foto: Acervo Particular de Angelita.

Maria Márcia e filhas. Foto: Acervo Particular de Angelita.

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Raízes do Cerrado:

Maria Inês com seu esposo Teófilo durante o batizando da sobrinha Andréia . Foto: Acervo particular de Andréia Álvares.

Andréia Jácome com o esposo André Luiz e os filhos Beatriz e Márcia.

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História da Família Manteiga

Ângela Álvares, Robson (esposo) e o filho Miguel. Foto 2020.

Teófilo, Luciano e Maria Inês 123



História da Família Manteiga

Capítulo VI Letícia Álvares Daher – “Dona alegria”

De uma simpatia e carinho exuberante, vamos agora à histó-

ria de vida da quinta filha do casal Sebastião e Maria. Letícia Álvares Daher, nasceu em 30 de Julho de 1935, sendo o maior presente que uma mãe poderia receber na data de seu aniversário. Sua história marcada de passagens alegres é marca de sua personalidade forte e perseverante. Uma criança arteira, uma jovem estudiosa e encantadora por sua beleza, uma mulher apaixonada pela família.

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Raízes do Cerrado:

6.1 - Uma vida simples na roça Um momento nostálgico, rico em recordações, no qual a memória da infância volta com certa facilidade, determinada socialmente, entre outros fatores, mas momento da vida do ser humano rico em imaginação, fantasia, vitalidade. Dessa forma que Letícia recorda sua infância, vivida na fazenda com seus pais e irmãos, segundo ela com muita simplicidade, mas com muita fartura e alegrias. Sobre lembranças de infâncias, caracterizada como maravilhosa, lembra das inúmeras quedas de árvores e das idas ao córrego junto com os primos escondido da mãe, aprendendo a nadar com cabaças – se pega cordas de bananeira seca e duas cabaças para apoiar nos ombros. Ainda sobre as diversas idas ao córrego cita que, sempre estava acompanhada das irmãs, e gostavam de represar o curso d’água com pedaços de pau e pedras para fazer um poço e ficar mais fundo. Nessa passagem, Letícia recorda de um episódio que ocorreu quando estava grávida de uma das filhas: eu lembro que estava nos dias de dar a luz a uma das minhas filhas, e eu inventei de subir em uma mangueira para apanhar mangas, perto do rego d’água que passava, estava com a Valdeci minha cunhada, era um pé de manga rocha, ai subi e fui jogando pra ela, e ela ia falando onde tinha, por cima da minha cabeça tinha uma penca de mangas madurinhas, coisa mais linda, quando eu levo a mão, só escuto o barulho da galha quebrando, e eu desci de uma vez no chão, papai estava do alto e viu, mas não sabia quem era e ainda brincou “nossa aquele lá esborrachou no chão”, a Valdeci sempre foi muito tímida e acanhada ficou morrendo de preocupação comigo e nenê, mas estávamos bem, a criança estava mexendo. Ai eu só dei uns arranhões e raladinhos.

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História da Família Manteiga

Além das brincadeiras de subir em árvores, também se destacava as bonecas de panos, os pega-pega, gostava ouvir de rádio e dançar ao som das músicas, brincar ao entardecer na frente da casa. Infância não muito longa, pois como as demais irmãs, Letícia também foi interna no Colégio Nossa Senhora Mãe de Deus na cidade de Catalão-GO, por esse motivo retornava a fazenda nas temporadas de férias e feriados prolongados. E quando estava em casa com os pais, ajudava a mãe nos serviços domésticos, que eram muitos. Sabemos que as primeiras décadas do século XX são marcadas pela construção e difusão de representações do comportamento feminino ideal limitando o horizonte da mulher ao espaço do lar, reduzindo ao máximo suas atividades e aspirações, as meninas passariam a serem educadas para se tornarem as “rainhas do lar”, um esteio para casa como esposa, dona de casa e mãe. Relata que passaram muita dificuldade na infância, mas nunca passaram fome, porque a mãe era muito dinâmica, a rotina da fazenda sempre foi voltada com as refeições, levantava-se ainda escuro para preparar as primeiras refeições do dia, tanto para a família quanto para os funcionários, as filhas sempre ajudavam a mãe, seja na lida com as vasilhas, arrumar um porco, apanhar verduras na horta, etc. Letícia lembra com muita alegria uma passagem a respeito das hortaliças: moramos um tempo na casa onde o Lázaro morava ali na cidade, e papai alugou a casa de frente e arrendou um pedaço de terra e era muito frio na cidade, mamãe começou a tocar uma hortaliça ali nesse lugar, o papai que arrumou pra ela, e nos pegávamos água no rego e levava com cabaça para regar, e eu ficava com uma raiva porque detestava levantar cedo, Mafalda e nós nessa época dormíamos no mesmo quarto ai ele (o pai) falava ‘Mafalda levanta e chama a Letícia para ajudar a regar as plantas antes do sol sair’, e ela chegava em mim e me chamava pra ajudar, eu tinha uma raiva de horta e uma raiva de verdura por conta disso, e nós íamos pra la molhar essas verduras, e era muito grande, hoje eu tenho saudade mas eu tinha uma raiva, não falava comigo em horta não que eu dava um tiro até uns 30 anos atrás. (risos). 127


Raízes do Cerrado:

Durante a conversa, identificamos marcas de uma infância bem simples, onde era preservada a união entre os irmãos, em nenhum relato foi citado brigas de crianças, claro que onde há crianças pode haver uma intriga que logo se esquece na próxima brincadeira. Educados com ensinamentos cristãos e valores éticos, sempre ajudando no que fosse necessário como já relatado, ainda reforça a característica da mãe que era muito trabalhadeira, relembrando o quanto de tarefas domésticas se tinha para fazer, e os filhos ajudavam sempre. Letícia expressa sua sensibilidade que tinha ao ver a mãe trabalhando e mesmo sem ela pedir ajudava a arrumar e organizar as atividades, tanto é que a citam como a que mais se parece com a mãe em todos os sentidos.

6.2 - A juventude, os namoros e a paixão pelo poeta

Nas primeiras décadas do século XX, as maiorias das mulheres jovens no Brasil estavam predestinadas a cuidar da casa, dos filhos e do marido, era como um caminho natural para elas naquela época, talvez pela dificuldade de dar continuidade aos estudos, pois, as faculdades estavam localizadas em grandes centros urbanos e para com isso os pais dever-se-iam abdicar de muita coisa para formar seus filhos. Partindo por esses preceitos, observamos na fala de Letícia que ela tinha outros planos para sua vida profissional, fugindo dos preceitos pré-estabelecidos pela sociedade naquele período, mas caminhos esses que a levou ao encontro de seu grande amor mudando seus planos, mas como ela mesma reforça “que não me fez falta, não me lamento e fui muito feliz”. Ao relembrar sua juventude, ela cita que passou parte desse período no colégio interno, onde estudou até os 17 anos, dentro das normas estabelecidas pela Igreja Católica, em uma escola regida por freiras agos128


História da Família Manteiga

tinianas. Tudo muito rígido, onde as entradas as visitas eram controladas e as saídas das internas era apenas para eventos religiosos ou com a família.

Aos 17 anos, era comum uma jovem já terminar os estudos e se ca-

sar, Letícia tinha o sonho de fazer o curso de farmácia. Quanto a namoros, relembra que tinha um namoradinho na época de escola, que trabalhava no banco real e mandava cartinhas, fotografia, tudo escondido, pois no colégio se alguém descobrisse poderia ser punida e até expulsa. Namorar naquela época era bem diferente do que se temos na atualidade, diferentes das heroínas de romances, viviam displicentemente vestidas, ocupadas com afazeres domésticos e dando pouca atenção à instrução, a janela, era mediadora de olhares, de recados murmurados, de rápidas declarações de amor, do som das serenatas. Ela era o meio de comunicação entre a casa e a rua. Recepções a estrangeiros ou desconhecidos eram raríssimas, o evento social mais importante continuava a ser a missa dominical. Hoje impossível imaginar os eventos religiosos como palco de histórias de amor. No meio de tanta gente, dava para trocar beliscões e pisadelas no pé da moça. Esses gestos tinham o mesmo efeito que o beijo de hoje: deixavam os amantes mais apaixonados. Quando se formavam casais, o namoro era na sala, junto com os pais, de forma vigiada, como conclui Letícia “era só de vista, só de longe. Eu só pude dar um beijinho no dia do noivado e escondido”.

Ela brinca sobre os casamentos naquela época, relatando seu medo

de se casar com fazendeiro, rejeitando alguns interessados, “pensava assim: eu casar com fazendeiro, lavar vasilha no rego, mas é nunca, Deus me livre! Tinha muitos que era apaixonado em mim e rejeitei mesmo, e papai não obrigava, nesse ponto ele era muito aberto”.

Ainda interna no colégio, Letícia conheceu Edésio Daher, que era

filho de Sírios vindos para o Brasil tentar uma melhora de vida: 129


Raízes do Cerrado:

o pai dele veio da Síria, do Líbano para cá, pobre, veio sozinho atrás de bens para ajudar a família, ai ele chegou aqui para vender as coisas de mascates, aquelas malas enormes cheias de coisa e sai pelas estradas vendendo, saia a cavalo e depois por conta do peso andava a pé, e por muitas vezes passou na fazenda do papai, e mamãe botava água na bacia para ele lavar os pés a noite, e depois de muitos anos, ai um dia conversando com mamãe, e ela disse o Elias Nego, porque tinha muitos Elias em Ipameri e todos árabes então ele tinha esse apelido, e o papai levava as cargas no carro de boi e entregava pra ele, então fizeram amizades com a família do Edésio, para você ver que já era para dar certo.

E foi por intermédio desse relacionamento com a família do seu Sebastião com essa família, que o então advogado Edésio Daher veio a conhecê-la. Era comum também naquela época, os homens já terem a intenção de conhecer alguma moça de determinada família, e Sebastião e dona Maria já eram conhecidos por toda a região, além da beleza das filhas. Como relembra Letícia, o Edésio mais velho, já era amigo de seu pai – Sebastião -. Edésio era chefe político em Ipameri e Sebastião em Campo Alegre de Goiás, “ele (Edésio) falava que o Manteiga tinha umas filhas muito bonitas e as irmãs dele reforçavam ‘namora as filhas do Manteiga, elas são bonitas, bem educadas’” a partir disso o interesse despertou, a primeira vez que o futuro namorado a viu, foi em Catalão, no colégio interno acompanhando o Sebastião em uma visita a unidade escolar, mas como brinca Letícia “com desculpa, mas era só pra me ver, e ele me viu pela janela só e ficou doido”, após o pequeno encontro, começou a escrever poesias e mandar para a amada. Edésio era um grande amante da poesia, adorava escrever cartas, poemas e enviar para ela. A cada visita lhe entregava um poema, como não 130


História da Família Manteiga

tinha telefone na época, o maior meio deles se comunicarem era através das cartas, que sempre chegava com algum versinho, tanto é que chegou a publicar posteriormente dois livros com poesias de sua autoria, sempre com um poema dedicado à amada.

Dona Alegria – Edésio Daher Alguma coisa sempre me dizia, voz interior da qual não duvidada, que, por mais que tardasse, ela viria, concretizar o sonho que eu sonhava. Mas os anos passaram, dia a dia, e a Bem Amada nunca mais chegava. A mocidade, aos poucos, me fugia, a esperança, porém, não me deixava. Mas ela veio, enchendo-se de espanto: que era bela e gentil eu bem sabia, nunca pensei, porém, que fosse tanto. Nunca pensei, ao menos, que teria tanta meiguice assim, todo esse encanto com que me cativou Dona Alegria.

A história de amor entre Letícia e Edésio, foi marcada por encontros, como ela relembra com alegria saudosa desse tempo. Um deles foi em outubro na festa de Nossa Senhora do Rosário em Catalão. Letícia estava hospedada na casa do Junqueira amigo da família, e a dona Maria sua esposa, torcia muito, alegando que casar com um poeta deveria ser muito romântico. Nessa festa, escreveu para ele marcando de se encontrarem na 131


Raízes do Cerrado:

igreja e conversar, e no encontro Edésio já falou em casamento, a jovem ainda estudava no colégio interno e nem pensava em se casar, negando a conversa. Se passaram dois meses, encontraram novamente, dessa vez em sua formatura do ginásio no fim do ano, que “era uma cerimônia com toda gala, organizado e contando com a presença de toda sua família, Edésio foi acompanhando sua Irmã, Zezica, além de vê-la, só que como não sabia do glamour da ocasião, não levou terno e ficou constrangido de assistir a formatura.” Para aquela noite comprou um brinco de ouro para presentear a amada, enrolou num papelzinho de embrulho cor de rosa e a entregou com os cordiais comprimentos. Transcorrido a formatura, aproximou-se da festa de aniversário do irmão Lázaro, e Letícia escreveu novamente o convidando para a ocasião, no evento voltou a falar em casamento, novamente negado, Letícia alegava que queria formar em um curso superior de Farmácia e só depois de estabilizar-se iria casar e conseqüentemente formar família, mas a resposta da amada o deixou ainda mais apaixonado, passou a escrever mais cartas, poesias e enviar a ela. Depois da formatura, Letícia retornou para a fazenda dos pais, continuou trocando cartas com o namorado e ajudando a mãe na lida com serviços domésticos, Edésio por sua vez, ia visitá-la com freqüência a cavalo, sem telefone essa era a saída para falar com a amada, com o passar do tempo Letícia foi ficando apaixonada, e como ela mesma brincam, se apaixonou pelos seus poemas, logo o casal ficou noivos. Foi no dia do noivado que aconteceu a primeira vez que conseguiu dar o beijo rápido e escondido no futuro marido, na sala de casa, o tio Manoel Manteiga a vigiava, e aproveitando um momento de distração e que ele havia se retirado, deu um beijo rápido no noivo, mas mesmo assim foi pega em flagrante pelo tio que contou para o pai, mas como já estava casando não se importou. Para a pesquisadora Maria Lúcia Bettega, o noivado é a etapa mais próxima do casamento e a aliança utilizada para confirmar o compromisso 132


História da Família Manteiga

estabelecido entre os noivos é uma tradição que se mantém entre diferentes culturas. A aliança é, incontestavelmente, o símbolo do casamento, o noivado é o período em que os noivos traçam objetivos comuns e empenham-se no planejamento e nos preparativos para o casamento. E assim aconteceu com nosso jovem casal, ele advogado e chefe político de Ipameri era 20 anos mais velho que a jovem Letícia, que ficou na fazenda cuidando dos preparativos para a cerimônia e a recepção do casamento.

Convite do casamento entre Letícia e Edésio. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

Dessa forma, havia uma preocupação por parte dos pais em manter costumes familiares, principalmente os religiosos, o casamento tinha que ocorrer dentro dos costumes aceitos pela família, para manter as regras e garantir as tradições consagradas pelo grupo. Convidaram o padre, organizaram o local da cerimônia, os convidados, tudo feito na fazenda da família, para os moldes de um casamento rural, “só faltou o noivo Edésio chegar de cavalo e a noiva de carroça. ” Sobre o dia do casamento, realizado dia 27 de outubro de 1953 com todo cerimonial a luz do dia uma recepção a típica com um cardápio variado: arroz, feijão tropeiro, torresmo, macarrão, frango caipira, pelota, 133


Raízes do Cerrado:

mandioca, doces, e feito pela família. Dentre os diversos convidados, se tinha pessoas de São Paulo, do Rio de Janeiro e da região de Campo Alegre de Goiás, todos recepcionados de forma simples, mas com muita alegria e hospitalidade. Como Edésio era advogado estava presente o alto escalão da justiça regional. Para garantir essa idéia de festa, contribuem alguns elementos que estão presentes em sua organização: música, bebidas, comidas específicas, comportamentos ritualizados e danças. Nessa perspectiva, o modelo de cerimonial que se difundiu na comunidade rural em estudo é visível, pois mantém os elementos já referidos. Assim, a festa aparece com dois significados sociais bem distintos: o de comemoração e o de expressão econômica como prestígio social (BETTEGA, p.63).

Letícia e Edésio no dia de seu casamento. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

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História da Família Manteiga

6.3 - A nova vida: alegrias, filhos e perdas Os recém-casados Edésio e Letícia foram, após a cerimônia, para uma chácara situada próximo hoje a cidade de Campo Alegre de Goiás. Foi para ela uma noite tumultuada, que recorda com muitas risadas: Saímos da fazenda, tinha uma chácara lá em Campo Alegre, que era do Edésio, nós passamos a lua de mel lá, foi muito engraçado, porque o caseiro morava lá com a esposa e sete filhas, foi a lua de mel mais tumultuada da vida, com muita criança correndo e chorando (risos).

Nessa chácara, o casal viveu por cerca de três meses, onde ela relata como era o dia-a-dia neste local. Geralmente nadavam no córrego que passava logo ao fundo e no poço de água represada da chácara. Levavam uma vida rural, às vezes Edésio cortava lenha para Letícia usar no forno de fazer biscoitos, em dias como esse a esposa passava tardes preparando o forno, amassando o biscoito, enquanto assava preparava um café. Levavam uma vida simples na chácara, ia muito a Ipameri devido o trabalho do marido. Decidiram mudar para a cidade de Ipameri a fim de facilitar o trabalho e também a educação das crianças que logo vieram. Em 1954 tiveram o primeiro filho, o Edésio Filho, depois 1955 Letícia perdeu o que seria o segundo filho do casal, em 1956 nasceu o Elias Roberto, de quatro anos mais tarde, tiveram a Eliana em 1960, e após quatro anos nasceu a última filha, Elaine em 1964. Ainda em Ipameri, cita que o marido Edésio ajudou no processo de emancipação política de Campo Alegre de Goiás, juntamente com o senhor Sebastião que até então era chefe político no distrito. Eles e outro influenciador, o senhor Marciano, se empenharam muito nos tramites da emancipação da cidade. Foram a Goiânia numa audiência com o 135


Raízes do Cerrado:

governador, e propuseram também a mudança do nome, que até então o distrito se chamava Rudá, e o gentílico dos munícipes seriam “rudaleiros”, pensando nisso, voltaram o nome para Campo Alegre, que após a emancipação ficaria Campo Alegre de Goiás, na época foi concedida pelo governador Pedro Ludovico Teixeira em 12 de novembro de 1953. Anos depois, a família muda-se para Goiânia, relembrada como tempos felizes. Se adaptaram bem a rotina na capital do estado, as crianças foram matriculadas em escolas próximas à residência para facilitar o trabalho de levar e buscar, nesse período em Goiânia, o casal sempre recebeu a família em sua casa, como lembra alguns familiares, “era o hotel da família”, que precisavam de resolver algo na cidade para fazer o que fosse, ficava lá. Uma casa grande, de três andares, e sempre cheia, sobrinhos, irmãos, amigos..., nesse ponto nota-se o quanto Letícia guardava os costumes da mãe, a casa sempre cheia e farta. Era Letícia quem dava suporte em tudo na família, suporte na parte de doenças e nos estudos, diversos membros da família a citam como uma grande acolhedora na cidade de Goiânia.

Letícia e Edésio com os filhos. Edésio Filho, Edésio, Léticia, Elias Roberto, Elaina e Eliana. Foto: Acervo de Elias Roberto Daher, 1976.

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História da Família Manteiga

Letícia conta que além de Goiânia-GO, também moraram na cidade de Brasília-DF, e na carreira profissional do marido que durante 12 anos seguidos foi chefe de autarquia, presidente da Caixa Econômica Estadual, presidente do Ipasgo, da Caixego, e do DAM. Momentos felizes ao lado da família e do esposo. Quando interrogada sobre o curso de farmácia (citamos no início desse capítulo), ela sorri e diz o Edésio ria até, e eu também, tinha dia que ele chegava na cozinha eu lá preparando alguma coisa e ele brincava ‘é minha farmacêutica’, não me fez falta nenhuma vez, não me arrependo de não ter feito também [...]nunca exigi nada, nunca lamentei, nunca faltou comida, roupa, tínhamos uma vida social muito boa, boa saúde, saímos, passeamos, no final que não tivemos uma vida social boa, porque a saúde não nos permitia mas mesmo assim frequentávamos um restaurante alguma coisa.

Mas nem tudo saiu como o planejado na vida do casal, infelizmente um trágico acidente de carro interrompeu a vida do filho mais velho Edésio Filho, carinhosamente chamado por ela de Edesinho, o qual é lembrado com muito carinho e de forma emocionada “infelizmente Deus me levou há quase 10 anos, ele era Engenheiro Civil, morreu trabalhando, morreu com 55 anos. Uma pessoa alegre, brincalhona, brincava com todos, mas com respeito, mas onde chegava era bem recebido, era muito alegre, trabalhador, pai de família, bom pai, bom esposo, bom filho, mas eu penso que Deus também quer os bons, na época eu fiquei meio inconsolável, sair para trabalhar e voltar em um caixão é muito triste, para uma mãe dói muito, uma dor que não passa. ” Um choque para toda a família, Edesinho já era avô, e o neto estava prestes a completar um ano de idade, segundo Letícia, ficou inconsolada por algum tempo, mas aceitou a vontade de Deus dizendo que “Deus também precisa dos bons”. Os outros filhos, o Elias Roberto é professor de cursinho preparatório para concursos e vestibulares, a Eliana pedagoga, “já está aposentada começou a trabalhar com 19 anos, agora aproveitando a vida, com o filho formado, ficou viúva muito cedo, batalhou muito, mas viu o mérito da família. A Elaine é jornalista, está em Portugal foi traba137


Raízes do Cerrado:

lhando em sua área. ” Letícia ainda cita de forma orgulhosa os netos, que em sua maioria já estão se formando, estruturados e os menores encaminhando para o sucesso profissional. Um casal que foi feliz até o fim da vida do marido, que a deixou. Sempre foram apaixonados um pelo o outro, uma união agradável e pautado no respeito, tinha como todo casal sua discussão, mas nunca nada demais. Se respeitavam em momentos de desconfortos profissionais. Por relatos, Edésio sabia quando a esposa estava nervosa e o contrário, as famílias testemunharam a agradável união entre o casal, uma convivência harmoniosa. Atualmente Letícia vive em Brasília, curtindo os netos e participando dos encontros de família, que para ela são de suma importância, viver, recordar e comemorar a união familiar pregada pelos pais Sebastião e Maria, que estão presentes na memória de cada membro que os conheceram.

6.4 - Álbum de Família

Letícia e os filhos: Eliana, Elias Roberto, Edésio Filho, Elaina. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

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História da Família Manteiga

Letícia Daher e suas irmãs: Lazarina, Anirazal e Mafalda. Foto: Acervo Particular de Mariana Álvares.

Letícia Daher e netos José Augusto, Rafael, Ludmilla, Nathália. Foto: Acervo Particular de Letícia.

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Raízes do Cerrado:

Letícia e bisnetos: Arthur, Marco, Miguel Luiz e Manuela. Foto: Acervo Particular de Letícia.

Elias Roberto Daher e filhos: Vanessa (em pé) Camila, Elias Roberto, Miguel Luiz e Ana Carolina. Foto: Acervo particular de Elias Roberto.

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História da Família Manteiga

Lazarina, Letícia, Edésio, Sebastião e Maria. Foto: Acervo particular de Eliana, 1981.

José Augusto e Eliana, em Portugal. Foto: Acervo particular de Eliana, 2018.

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História da Família Manteiga

Capítulo VII A menina que conquistou Ceres – história de vida da professora Mafalda

Privilegiada em comemorar dois aniversários durante o ano, trataremos agora da história de Mafalda Álvares Campos, filha do casal Sebastião e Maria, nascida em 2 de maio de 1937 mas registrada em 24 de setembro de 1938. Convidada a relembrar o passado, Mafalda nos relata sobre sua infância e o dia-a-dia ao lado dos pais. Para muitos, um momen143


Raízes do Cerrado:

to nostálgico, rico em recordações, no qual a memória da infância volta com certa facilidade. É como se quiséssemos lembrar, contar, relatar para alguém quem fomos, o que fizemos, como se fosse uma herança, na esperança de que a nossa vida continue mesmo quando não estivermos mais presentes. Assim veremos nas próximas páginas a história de uma jovem menina que se mudou para longe dos pais e conquistou a cidade com seu jeito de trabalhar e pensar.

7.1 - Revivendo o passado – relatos de infância

Uma infância marcada por brincadeiras e a tranquilidade da fazenda, Mafalda retoma o passado de forma saudosa, lembrando da fazenda dos pais e das diversas passagens felizes que vivera no convívio dos irmãos. Das brincadeiras lembra-se que foram muito boas, brincava com os irmãos, tanto os mais velhos quanto os mais novos. Brincavam de casinha, de boneca, cantigas de roda. Cita a fazenda com o grande pomar, onde brincavam, correndo, subindo nas mangueiras, escondendo atrás das árvores. “mas brincávamos, divertíamos muito, as brincadeiras eram de roda, quando dava a noite reuníamos a turma e cantávamos bastante, brincávamos de pique, tinha também as bonecas de pano, que nós mesmo fazíamos, principalmente a Letícia e eu, que éramos quase da mesma idade, e nós fazíamos as nossas próprias bonecas, que na época tinha muito pouca condição de comprar boneca pra gente, tínhamos apenas duas bonecas compradas, que o papai e a vovó nos deram, uma era de celuloide, na época chamava isso, uma boneca muito boa, guardávamos com muito carinho.” Outra brincadeira lembrada por ela, era o andar a cavalo nas tardes e os banhos de rio, hábito sagrado pois a fazenda estava às margens do Rio São Marcos. Adoravam banhar no rio, algumas vezes represavam a água 144


História da Família Manteiga

do rio com pedras para poder ficar mais cheio, era sagrado ir todas as tardes se banhar, inclusive em alguns dias de chuva. Além de brincar, ajudavam a mãe nos trabalhos domésticos, ajudava a fazer comida, lavar uma vasilha, apanhar ovos, varrer o terreiro, tudo que a mamãe pedia, nesse sentido, percebe-se o quanto eram ensinadas às meninas certas prendas, necessárias ao ambiente doméstico, marcadas pela construção e difusão de representações do comportamento feminino, ideal limitando o horizonte da mulher ao espaço do lar, reduzindo ao máximo suas atividades e aspirações. As mulheres foram assim identificadas no papel de rainha do lar sustentado pelo tripé “mãe-esposa-dona de casa”. Ela ainda conta que sua mãe sempre ensinava a elas os princípios de família, educação, moral e religião, cresceram em uma educação católica e com costumes de frequentar terços, novenas ou mesmo rezar em casa. A escola é lembrada como fator importante para sua vida, pois foi por meio dela que Mafalda despertou sua vocação profissional. De início estudou com sua irmã, a Lazarina, que inclusive veio a ser sua madrinha de batismo e casamento. Estudaram no grupo escolar da fazenda até o 2° ano, depois foram pra Campo Alegre os pais ficaram na fazenda, estudaram na cidade até o 4° ano. Para as próximas séries, transferiu para Catalão, passou interna durante quatro anos no Colégio Nossa Senhora Mãe de Deus. Encerrado o ginásio, cursou contabilidade em Ipameri, até o 2° ano do curso. Nesse período se destacou entre os demais alunos e começou a dar pequenas aulas. Logo seu lado professora evoluiu, tanto é que também lecionou no grupo escolar que era mantido pelo pai na fazenda, até que recebeu o convite de uma freira, Irmã Verônica, para trabalhar como professora em Ceres, uma cidade no norte de Goiás, próximo a antiga capital do Estado, a Cidade de Goiás “Velho”. O convite feito pela Irmã Franciscana foi para lecionar no Colégio Imaculada Conceição, naquela cidade. Nessa época foi sozinha, e trabalhou durante um ano, ano seguinte, Irmã Verônica retornou e convidou as outras irmãs para irem, aceitou o convite Maria 145


Raízes do Cerrado:

e Lazarina, Anirazal foi acompanhando, mas não se adaptou ao clima da região e logo retornou. As outras irmãs, lecionaram por mais algum tempo e depois voltaram, ficando apenas Mafalda. Foi a trabalho e ainda jovem na cidade de Ceres conheceu seu esposo, Rui, em uma festa promovida anualmente pela escola onde trabalhava.

7.2 - Uma nova vida: trabalho, casamento e filhos

Na cidade de Ceres, Mafalda foi professora de alfabetização durante alguns anos no Colégio Imaculada Conceição, depois mudou de escola e também trocando as séries em que lecionava, “trabalhei na alfabetização por quatro anos, depois fui para outro colégio trabalhar com turmas maiores”, até que por diversas razões decidiu voltar para o Colégio Imaculado que permaneceu por dezoito anos. Dedicada e pulso firme com os alunos, acredita-se que deixou um legado importante em cada criança que passou por seus ensinamentos, segundo relatos, a professora Mafalda ou até mesmo Tia Mafalda é muito querida por todos. Eventos típicos em cidades menores, festas de barraquinhas atraem várias pessoas, além de ser um momento de descontração também pode ser um importante momento para se conhecer pessoas novas e quem sabe engatar um relacionamento. E foi assim que a jovem Mafalda conheceu seu esposo, “foi numa festa de barraquinha promovida pela escola, eu estava lá e nós nos conhecemos, ele me achou bonita e eu também achei ele um rapaz muito charmoso (risos) ” Conheceu Rui, fazendeiro e comerciante na cidade de Ceres, namoram por algum tempo até decidirem se casar, no ano de 1960, em uma cerimônia com a presença das famílias e amigos, e com festa como era tradição entre a família Manteiga, celebrar a união dos filhos entre os parentes e convidados. 146


HistĂłria da FamĂ­lia Manteiga

Convite de casamento de Mafalda e Rui. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

Os noivos, Mafalda e Rui no dia do seu casamento. Foto: Elias Roberto Daher.

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Raízes do Cerrado:

Frutos desse casamento vieram seis filhos, mas mesmo morando distante dos pais não perderam os vínculos, estavam presentes na maioria das reuniões familiares e nas férias escolares, “quando era época de férias, eles já maiores eu vinha pra cá todo ano, juntávamos com os outros sobrinhos e era uma festa na casa dos meus pais. ”

Mafalda e o esposo Rui. Foto: Acerco Particular de Mariana. Foto sem data.

A educação dos filhos foi um período prazeroso, mas também difícil e corrido, dividia os afazeres domésticos, com os de mãe, professora e esposa. Os filhos estudavam no período matutino e a tarde ficavam com uma babá e com a filha mais velha, que já ajudava nos serviços de casa. A criação dos filhos foi muito agitada, eu trabalhava o dia todo, colocava eles para ir estudar no horário que eu trabalhava, no outro período eles ficava com a Roseana a mais velhas, e arrumava uma ajudante também, moças também, mas sempre trocava, foi uma luta, o pai também trabalhava, foi bem corrido. Eu tinha uma pessoa para 148


História da Família Manteiga

lavar e passar e eu chegava e ia fazer comida correndo. Muitas vezes cheguei para fazer almoço, ia no homem que vendia frango, eu matava ele na rua mesmo a água já estava fervendo quando chegava era só despenar e preparar o almoço, toda semana tinha frango era sagrado algum dia da semana fazer no almoço, por volta de 12:00 estava pronto. Eu levantava 5 horas, limpava o chão preparava o almoço já, muita coisa já deixava adiantado, dava mamadeira e arrumava as crianças, o que dava para adiantar já ficava pronto.

O casal sempre preservava os momentos de família, para conversar com os filhos, saber dos assuntos escolares, e divertir com eles. Costumavam viajar uma vez por ano em família, as principais viagens foram para Camboriú – Santa Catarina e férias no Rio Araguaia. Sobre a viagem ao Sul, Mafalda lembra que tinham um carro pequeno e viajavam em oito pessoas. Viajaram por onze anos seguidos inclusive fizeram amigos na cidade, que se tornaram compadres, criando um vínculo de amizade muito grande. Era mais que uma viagem, mas sim uma oportunidade de celebrar a família e os filhos, além de descansar das rotinas do dia-a-dia e passar um tempo maior com as crianças. Após a temporada no Sul, passava férias também no Rio Araguaia, onde reunidos em família. Mafalda aproveitava para descansar e fazer o que mais gostava na época de sua infância, nadar no rio pela manhã. Uma grande estrutura era levada para essa viagem, montavam ranchos às margens do rio, ficavam uma semana fazendo compras para levar, “levávamos uma casa para dentro do rio”, um costume que deixaram de fazer com o passar dos anos.

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Raízes do Cerrado:

Mafalda se preparando para uma pescaria no Rio Araguaia. Foto: Acervo Particular de Mariana Álvares. 2007.

Os filhos já crescidos traziam alegria à família. Até que um fato abalou a todos, o filho Sérgio sofreu um acidente de moto e veio a óbito, a partir desse fato o luto tomou conta da família, principalmente da mãe. O filho cursava agronomia, querido por todos, aos 17 anos de idade os deixou. Dentre os filhos, “o mais velho Mário, trabalha na fazenda, ajuda o pai, toma conta dos serviços da fazenda, devido Rui ter algumas dificuldades pelo avanço da idade, a Roseana trabalha como médica, o Robson, é agrônomo, mas não exerce a profissão, agora era fazendo projetos pra montar o escritório, o Sergio falecido cursava agronomia, a Alessandra que é agrônoma, mas não exerce, trabalha em pet shop em Goiânia e o Márcio que fez odontologia e exerce a profissão de dentista em Uruaçu. ” 150


História da Família Manteiga

Mafalda reforça que teve momentos muito felizes ao lado de todos os filhos, que aproveitou muito a infância de cada um deles e aprendeu a conviver com a perca de um deles, mas jamais o apagar da memória. Hoje, tem catorze netos e quatro bisnetos, aumentando a família e trazendo a alegria para casa, o marido pelo avanço da idade desenvolveu problema na visão, o impossibilitando de continuar a lidar com a fazenda. Saudosa, comenta que retornar a fazenda em Campo Alegre de Goiás, é sempre um motivo para relembrar os bons momentos e estar com a família. A sede onde foram criados está tomada pela água do represamento da Barragem Hidroelétrica do Rio São Marcos, mas só de estar próximo veem lembranças da boa convivência que teve com os irmãos e com os pais.

7.3 - Álbum de família

Mário Borges, Luiz Filho, Letícia, Mafalda, Ir. Lazarina e Luiz Manteiga, em viagem à praia. Foto: Acervo Particular da família. Sem data. Na foto abaixo: Malfada com os irmãos Luiz e Lazarina:

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RaĂ­zes do Cerrado:

Mayra, Rui, Marilha, Juliana (no colo), Juliano, Mario Borges, Gislainy, Mafalda, ... Isabela. Foto: Acervo particular da famĂ­lia.

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História da Família Manteiga

Mafalda Roseana, Luiza, Rui, Soraia, Mariella, Heloana, Gislainy, Rui Neto.

Mafalda e o esposo Rui na fazenda Pirapitinga (Luiz Manteiga) em Campo Alegre de Goiás. Foto: Acerco particular da família.

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Raízes do Cerrado:

Soraia, Alessandra, Heloana, Luiz Mário, Vitor, Laura, Mafalda, Luiza, Márcio, Rui Neto, Mariana, Rui, Mário, Tayrine . Foto: acervo particular da família.

Mafalda com suas irmãs: Anirazal, Letícia e Lazarina

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História da Família Manteiga

Robson, Rosangela, Vitor, Laura, Heloísa, Laís, Sérgio. Foto: acervo particular de Sérgio Borges, 2018.

Mafalda e Rui (sentados) Em pé da esquerda para a direita: Breno, Mayra Borges, Tayrine, Luís Mário, Gislainy, Isabela, Mário, Marílha, Juliano. Crianças: Juliana e João Pedro. Acervo particular da família.

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História da Família Manteiga

Capítulo VIII Orazal – “uma paixão na nossa vida”

Este capítulo é dedicado a Orazal Afonso Álvares, nascido em 31 de Janeiro de 1940, ano de ascensão da econômica no Brasil e de grandes feitos na área trabalhista por meio do Presidente Getúlio Vargas. Na família Manteiga, muita alegria em receber mais um filho, que veio a ser cheio de garra e comprometido com os trabalhos e a família. Um dos poucos que não adentrou a carreira política por alegar motivos específicos. As próximas páginas dedicam a esse homem que se tornou inesquecível na memória dos irmãos e filhos.

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Raízes do Cerrado:

8.1 - Infância, juventude e casamento Ao estudar a vida de Orazal Afonso Álvares, tivemos que buscar registros através de sua esposa, filhos e irmãos, devido sua morte repentina e violenta. Os relatos acerca da infância cabem ao irmão Luiz que lembra o quanto ele era um menino alegre e gostava de brincar com todos. Orazal estudou na escola São Francisco de Assis, antigo grupo escolar na zona rural, depois foi estudar em Ipameri e concluiu o estudo normal na cidade de Anápolis. Passou boa parte da juventude morando com os pais na fazenda e lidando com os afazeres da roça juntamente com os irmãos mais velhos. Sempre foi um rapaz simpático e galanteador, ajudava no que fosse preciso na fazenda. Sendo lá, que conheceu sua esposa Norma Martins Álvares, onde a mesma morava nas proximidades da fazenda da família, e ia muito lá para conversar com as filhas de Sebastião e Maria ou mesmo levar alguma encomenda de seus pais. O dia em que Orazal passou a olhar com “outros olhos” de mais encanto, foi quando chegou à fazenda de cabelo curto, cortado bem baixinho, e ele disse “nossa como está bonita’, a partir desse dia nós começaram à namorar, como relatado por Norma.

Convite do casamento entre Norma e Orazal. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

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História da Família Manteiga

O namoro entre Orazal e Norma, durou aproximadamente oito meses e casaram-se com uma grande festa na fazenda, Norma lembra como o dia mais feliz de sua vida. Para iniciar a vida de casado, Sebastião deu um pedaço de terra de uso e fruto do casal. A partir daí começaram a vida em uma nova fazenda, que era bem próximo da sede, na mesma região da Pirapitinga. Casaram-se ainda jovens, ela com cerca de 20 e o esposo 25 anos de idade. Assim o jovem casal começou a dedicar-se ao trabalho e logo constituírem uma família. 159


Raízes do Cerrado:

8.2 - Os trabalhos na fazenda, chegada dos filhos

Tempos difíceis. Começaram do zero a lidar com a terra.

Moravam na Fazenda Jurema, depois de algum tempo que construiu a casa na sede. Na propriedade, Orazal plantava, criava gado, fazia todo o trabalho braçal e administrava o funcionário, dentre as plantações se destacaram o feijão, arroz e milho. Tinham apenas um funcionário para ajudar, a maioria do serviço era de responsabilidade de Orazal que cuidava dos afazeres. Agropecuarista, vivia da criação do gado e alguns momentos chegou a trabalhar como leiteiro, puxando leite nas fazendas da região.

Naquela época era comum o hábito de “alugar” um pequeno

pedaço de terra na fazenda. Em troca o morador ajudava o dono da terra com a lida do campo. Os arrendatários moravam na fazenda, alguns agregados e os funcionários. O pessoal tinha o costume de “dar” um determinado pedaço de terra para alguém morar de favor e ajudar nos trabalhos da fazenda. Gesto repetido inúmeras vezes por Orazal. O casal teve quatro filhos, Sebastião Ferreira Álvares da Silva Neto, o primeiro, recebeu o nome do avô paterno, que segundo tradição da família, o primeiro neto de um filho, herdava o nome, sobrenome e apelido – caso tivesse, do avô. Depois vieram Alberto Álvares da Silva gêmeo com Adalberto Álvares da Silva e Marise Álvares da Silva. Todos os filhos foram criados na fazenda, com muita dificuldade, mas com dedicação e amor dos pais.

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História da Família Manteiga

Orazal e três dos quatros filhos. (Alberto, Adalberto e Sebastião) Foto: Acervo particular de Marise Álvares.

Os filhos citam que foi um tempo muito bom, morando na fazenda

ao lado do pai e irmãos, era tudo muito simples, mas os pais não mediam esforços para proporcionar conforto e estudos a eles. A vida era muito boa, diante todas as dificuldades por que passava, tinham a própria casa, e podiam usar um sapatinho – regalias para poucas crianças, a maioria era “pé no chão”. Além de conforto para os filhos, o casal tinha um carro para viagens à cidade e facilitar no dia-a-dia da família, “então na vida já tivemos um pouquinho mais de conforto. Era boa, muita fartura, meu pai não era bravo, era sistemático, do modo que foi criado, não fazíamos o que queríamos, meu pai na hora que precisava ser rígido ele era, se um de nós brigar os quatro apanhava para ninguém rir de ninguém. Quando fazíamos arte e minha mãe queria bater em nós, corríamos e entrava no mato para esperar meu pai chegar, que ele não deixa bater (risos) meu pai não pegava a gente para bater, só se fizéssemos algo mais grave”, relembra Alberto. 161


Raízes do Cerrado:

Ainda sobre a criação percebemos que Orazal e Norma era um

casal humilde, educaram os filhos de maneira confortável, mas simples. A personalidade do pai, “era íntegra e correta, não falava mal de ninguém, na família quando começava alguma intriga ele enfezava e saia de perto. ” Gostava de ficar no meio dos peões, brincando, distraindo e jogando nos finais de tarde, gostava do povão, amigo dos que o queria bem. Sobre sua ética, a filha cita uma passagem, Que foi no casamento da Beth, nós estávamos indo pra Ipameri e ele falou que não era para levar meu bico, e eu levei escondido. No caminho ele percebeu que eu estava de bico e pediu para dar para ele, eu disse que não dava, ele pediu de novo, eu fui e entreguei, aí hora que ele pegou eu respondi grosseira, ele ficou rindo calmo e disse que não, aí quando passamos na ponte do rio Veríssimo, ele disse para que eu desse tchau pro bico, porque o papai não vai colocar ele em lugar nenhum, e jogou lá dentro do rio.

Orazal com sua esposa Norma e a filha Marise. Foto: Acerco particular de Marise Álvares.

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História da Família Manteiga

Orazal, citado como uma pessoa agradável, farrista, amigável e carismático com todos nós, gostava de colocar apelido nos amigos e ajudar no que fosse preciso. Trabalhador cuidou da fazenda no que pode e educou os quatro filhos da maneira correta. O casal ainda criou junto com os filhos, uma sobrinha da mãe, chamada de Romilda. Quando os filhos começaram os estudos na cidade, devido a sede da fazenda ficara longe do grupo escolar, os meninos foram morar com a tia Zezica, e os pais ficavam na fazenda junto com a filha Marise e a sobrinha Romilda. Norma só se mudou para a cidade quando as meninas começaram a estudar. Com sua vinda, alugaram uma casa na cidade e para não deixar todos sozinhos, sempre iam na segunda-feira de manhã e retornavam para a fazenda na sexta-feira à tarde. Nos momentos de lazer, os filhos lembram que Orazal era um amante do truco e da pescaria. Sempre que surgia a oportunidade ele ia pescar com os amigos ou o irmão Lázaro, outro apaixonado pela pescaria. Segundo a filha Marise, os dois chegaram a viajar para o Rio Araguaia para praticar a pesca. No truco, Orazal passava os fins de tarde ou alguns fins de semana para jogar com os funcionários da fazenda e amigos. Encontrava no jogo das cartas um momento de descontração e descanso dos dias pesados com os trabalhos da fazenda. Foi destacado que, era sagrado tomar uma cachaça no fim do dia, cachaça essa do alambique da família, onde ajudava na fabricação de pinga. Nesse período em que trabalhava no alambique, os filhos lembram que iam ao engenho acompanhados pelo pai ajudar a lavar garrafas. A família também era cristã e devota, Orazal e Norma criaram os filhos nos preceitos da Igreja Católica, inclusive a devoção a Nossa Senhora da Lapa era muito grande, ao ponto de participaram da romaria até o santuário dedicado a ela na cidade de Vazante – Minas Gerais, local que atrai milhares de fiéis todos os anos. A filha Marise lembra que o pai ensi163


Raízes do Cerrado:

nava os filhos a rezar o terço desde pequenos. Para contar cada dezena do terço ele sentava com as crianças do lado de fora da casa e olhando para céu contava as estrelas, para cada estrela rezava-se uma Ave-Maria. Orazal era um esposo apaixonado por Norma, sempre a presenteava e mandava bilhetes com declarações. Viajavam juntos, iam às festas para dançar e se divertirem. Norma lembra que foi um marido muito presente na vida dela e dos filhos.

8.3 - A morte repentina e a vida da família sem o pai

Orazal veio a falecer muito novo, vítima de um acidente com um trator em sua própria fazenda. A família passou o final de semana com ele e, como os filhos moravam na cidade para estudar, retornaram na segunda-feira de manhã para Campo Alegre de Goiás junto da mãe. Esse fim de semana que a família passou na fazenda foi de muita festa, estiveram reunidos para comemorar o aniversário de Norma, que foi dia 16 de setembro, reuniu-se toda a família, “foi uma grande festa, meu pai estava muito feliz e alegre nesse dia.”. Na segunda-feira quando Norma e os filhos saíram da fazenda para retornar a cidade, deixou Orazal que iria concluir um trabalho de aragem da terra, sendo que na quarta-feira ele iria para a cidade ficar com a esposa e os filhos, após terminar todo o serviço. Mas no dia 20 de setembro de 1983, terça-feira, Orazal pegou o trator “cinquentinha” para terminar a aração próximo ao rio, mas perdeu o controle do mesmo e caiu no rio levando-o a óbito, como lembra sua filha Marise, que “ele estava arando, e segundo a informação foi falta de experiência e chegou muito perto do barranco, porque era um trator pequeno, ele foi engatar uma ré e a segunda 164


História da Família Manteiga

era muito perto e ele não tinha experiência, então achou que o trator fosse pra trás e ele deu foi um pulo pra frente, e o trator tombou e ele saiu fora dele e a roda pegou no pescoço dele e imprensou, morreu na hora, e foi um baque feio, muito difícil.”. No dia os filhos estavam para a escola e por volta de 09h00min, liberaram todos os alunos do colégio, mas não sabia o motivo, ao descer para casa, a prima Maria Inês relatou que o pai tinha sofrido um acidente estava muito ruim, mas pela aglomeração de gente que estava na porta de casa, deduziu que tinha sido fatal. Em pequenas cidades é costume quando acontecia uma tragédia com uma família, moradores iam para casa dar apoio no momento, como Orazal tinha muita amizade com o povo, ajudou mais ainda a aumentar o movimento na porta de casa. Percebemos nos depoimentos dos filhos, o quanto foi difícil a vida depois da morte do pai, “um choque muito grande, o Sebastião tinha 16 anos, os gêmeos 14 anos, a Marise ainda era bem pequena 10 anos, Norma, passou a cuidar dos filhos, da fazenda e dos negócios que ele deixou. Não quis colocar peão no início, tomou conta de tudo e a fazer tudo que o marido fazia, além de ver nos filhos, o quanto sentiam a morte do pai. A vida na fazenda passou a ser de responsabilidade da esposa, com os filhos, que no início ficaram para ajudar a mãe, mas como era preciso estudar, Norma contratou um caseiro que iria ficar na fazenda e tomar conta da criação e plantações com o passar do tempo, o filho mais velho ficou conhecendo sua esposa que trabalhava no tio Luiz e se casaram, depois disso passou a cuidar da fazenda deixada pelo pai. Após a morte de Orazal a família passou por diversos momentos desagradáveis e conturbados, mas com o amparo dos familiares e o decorrer dos anos, foram conseguindo se restabelecendo. Como tiveram que voltar para fazenda, os meninos ficaram um tempo sem estudar, ao retornarem, Norma alugou uma casa para morar com eles. Com a juventude dos 165


Raízes do Cerrado:

filhos, começaram a se relacionar e logo foram casando, e não seguiram com os estudos, como lembra Alberto Eu trabalhava no mercado do tio Lázaro e estudava, aí enjoei de estudar e fiquei só o começo do primeiro ano, peguei e fui pra fazenda, quando cheguei lá, meu tio Luiz viu e falou que eu não iria perder o ano e me levou pra Goiânia. Lá eu fiz dois anos em um só, para recuperar o ano que havia perdido, isso em 1987. Depois disso voltei de Goiânia, minha mãe já não morava mais aqui e minha avó me chamou para dormir com ela, morei com ela até ela morreu, saí da casa quando foram repartir os bens.

Marise nos relata sobre sua vida depois da morte do pai, dizendo sobre seu casamento e sua vida, uma infância muito rápida. Casou muito nova, com 13 anos, grávida do primeiro namorado, com quem foi casada por 17 anos. Sobre sua vida sem o pai, Alberto conta que conheceu a esposa através do futebol. Os irmãos Adalberto e Sebastião, casaram e constituíram suas famílias. Adalberto hoje é pai de filhas gêmeas e Sebastião – Sessé, tem filhos e lida com a atual sede da fazenda, que foi dividida entre os irmãos, mas uma parte foi desapropriada devido a construção da Barragem Hidroelétrica Serra do Facão. Da antiga sede restou apenas as lembranças, pois foi inundada pela água da barragem. Com a indenização Sessé propôs comprar partes de alguns dos irmãos. Do pai, restam saudades de um grande homem, honesto e que lutou para cuidar dos filhos e proporcionar uma vida confortável a eles e a esposa. Orazal nunca se envolveu com a política, ao contrário de outros irmãos que vieram a ser prefeitos da cidade de Campo Alegre de Goiás, preferiu ajudar à quem fosse preciso da forma que coubesse a ele, sem pretensão a vida pública. Uma pessoa simples que soube cativar os amigos e aproveitar os momentos bons, um irmão saudoso, como relata Luiz Manteiga “Aquilo ali foi uma paixão na nossa vida, ele era muito querido por nós.”. 166


História da Família Manteiga

8.4 - Álbum de Família

Orazal com sua mãe Maria Emídio, sua esposa Norma, sua irmã Lazarina, seu filho Sebastião. Foto: Acervo particular de Marise Álvares.

Os gêmeos Alberto e Adalberto filhos de Orazal e Norma. Foto: Acervo particular de Marise Álvares.

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Raízes do Cerrado:

Norma com os filhos Sebastião, Alberto, Adalberto e Marise. Foto: Acervo particular de Marise Álvares.

Orazal, Norma e os gêmeos Alberto e Adalberto. Foto: Acervo particular de Marise Álvares.

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História da Família Manteiga

Alberto acompanhado de sua esposa e filhas Isabela e Gabriella. Foto: Acervo particular de Isabela Álvares.

Elton, Marise, Norma, Dagna, Leonardo, Heithor, Ricardo e Vanessa. Foto: Acervo particular de Marise Álvares.

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Raízes do Cerrado:

Netos de Orazal: Isabela Álvares, Luis e Orazal. Foto: Acervo particular de Isabela Álvares.

Sebastião – Cecé com sua esposa Vera. Foto: Acervo particular de Sebastião.

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História da Família Manteiga

Os netos de Orazal: Luiz Fernando, Patrícia e Orazal, filhos de Sebastião. Foto: Acervo particular de Sebastião.

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História da Família Manteiga

Capítulo IX De um jovem destemido ao homem de caráter forte – A vida de Luiz Manteiga Álvares de Campos

“Sempre fui um homem destemido”, relatou Luiz Manteiga Álvares de Campos durante sua entrevista, e com essa frase podemos analisar a vida desse homem, que desde sua infância enfrentou desafios, com uma juventude promissora e uma vida pública a serviço do bem comum se tornando um grande pai e amigo de todos familiares. Um jovem que não temia os desafios, corajoso para enfrentar grandes crises, fortalecido por ensinamentos cristãos de seus pais. Luiz é o oitavo, dos dez filhos de 173


Raízes do Cerrado:

Sebastião e Maria. Por relatos ficamos sabemos que Luiz Manteiga preza a destacar a importância dos pais para a formação do caráter de todos os irmãos. Conta que, o pai (Sebastião) foi sempre presente, e Dona Maria uma mãe batalhadora, pessoa extraordinária, que os educou no ensinamento cristão, mulher trabalhadora. Assim caracteriza, em tom saudoso, sua mãe que para os membros da família, foi a base e sustentação em todos os momentos. Nascido em 19 de junho de 1942, Luiz Manteiga Álvares de Campos é casado com Marina Aparecida Porto Álvares, união em 27 de maio de 1957, que gerou quatro filhos: Luiz, Laís, Lilian e Marina.

9.1 - Infância

Em uma vida rural, vendo os pais trabalharem no dia a dia da fa-

zenda, Luiz cresceu juntamente com os irmãos de forma simples e seguindo os ensinamentos estabelecidos pela família. Luiz destacou que foi um período bom de vivência com os irmãos, com farturas de frutas das estações, animais, produções, e sempre muita festa. Uma rotina familiar baseada pela hora de estudar, de brincar e de ajudar nos afazeres da casa e da fazenda – o saudoso pai era rígido, devido a sua criação – mas ao mesmo tempo era um exemplo de pessoa a ser seguido.

Em uma época onde o interior do Brasil passava por dificuldades

de locomoção, a base de transportes era o carro de boi e o cavalo, Luiz destaca essa passagem, onde toda a produção da região era transportada em carros de boi até os grandes centros, feita em estradas de trilha, de174


História da Família Manteiga

marcadas com o passar frequente das locomoções. Tudo que era feito se transportava no carro de boi, na carroça, ou no lombo de um cavalo. No início de sua educação escolar, a irmã mais velha Lazarina, o ajudou, pois devido à distância da fazenda à escola, (meados do século XX) a educação das crianças se passava em grupos escolares, pequenas escolas rurais onde se tinha alunos de mais variadas faixas etárias, em um mesmo espaço. Os principais objetivos dos grupos escolares era alfabetizar, sendo assim, Luiz teve o início da alfabetização com a irmã que já estudava no Colégio Nossa Senhora Mãe de Deus na cidade de Catalão – Goiás. Durante as décadas de 1940-1950, se tinha no Brasil uma educação que contemplava o ensino camponês, preservando os costumes e tradições. A finalidade dessa modalidade de ensino era fixar o homem na terra, com adaptações ao currículo ao meio rural, sendo assim eram poucas as famílias que enviavam seus filhos aos centros urbanos para darem continuidade aos estudos. Luiz afirma que o ensino nos grupos escolares de Goiás naquela época, era mais atrasado em relação à educação oferecida pelos centros urbanos e pelo Estado de Minas Gerais, por esse motivo seu pai enviou o filho mais velho para estudar em Paracatu, pois a distância da fazenda era relativa, e os demais, para estudar em outras unidades escolares da região. Já maior, foi juntamente com os irmãos Juarez e Emídio, dar continuidade aos estudos na cidade de Ipameri. Lá cursaram o ensino regular no Colégio Estadual e no colégio regido pelas freiras. Estudou até o segundo ano do científico, mas paralisou os estudos para lidar com os serviços na fazenda junto com o pai, foi nesse período que Luiz conheceu dona Marina, esposa e companheira há 52 anos.

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Raízes do Cerrado:

Confraternização do Casamento de Luiz Manteiga e Marina. Foto: Acervo Particular da Família.

9.2 - O espírito empreendedor

Luiz Manteiga, ainda jovem, se preocupava com o futuro, em dar estabilidade à nova vida que formara após o casamento. Acompanhando os rumores da nova política de expansão territorial iniciada por Getúlio Vargas ainda no início da década de 1940, a chamada Marcha para o Oeste, que segundo Leandro (2016 p. 52.), abriu novos caminhos para o Estado de Goiás, principalmente economicamente, com programas de incentivo à cultura, que “fronteiras deram a Goiás um sentido de marcha, um rumo de formação ou um limite de fronteiras” (CHAUL, 2000, p 113). O objetivo do programa foi iniciar e incentivar o cultivo de grãos no Estado de Goiás, abrir novas estradas, fomentar a agricultura e as atividades de pecuária, Getúlio Vargas via o estado como o símbolo para uma nação moderna, de tal forma que incentivou a construção se sua nova capital, a cidade de Goiânia que viera a ser planejada. Um marco histórico 176


História da Família Manteiga

para o estado e o Brasil. Seguindo os passos do pai e acreditando no potencial agro pastoreio do estado, Luiz Manteiga iniciou sua carreira como produtor agropecuário. De início na fazenda do pai, com as lavouras ainda tratadas a mão e o trabalho ainda com máquinas a base de animais e até mesmo manuais. Com o passar do tempo e os bons resultados da atividade, adquiriu uma propriedade na região conhecida por Chapada, no município de Campo Alegre de Goiás, um local propício para o cultivo de feijão, arroz e outros grãos, devido à riqueza do solo e condições climáticas. Segundo ele, em 1967 chegou a plantar 300 hectares de arroz, se transformando assim num dos maiores produtores da região naquela época. Nesse período o consumo de arroz no Brasil tinha elevado, a região com maior consumo era a Sul, segundo dados da Fundação Getúlio Vargas, era responsável por 60,6% em todo território nacional. O arroz cairia então no prato do brasileiro, fazendo com que a procura aumentasse e a produtividade também, a partir de então que Luiz Manteiga aumentou sua produção. Segundo ele, teve um momento difícil no plantio do arroz, quando em Goiás o preço do saco com casca diminuiu drasticamente, “sacos de arroz de 60kg que na época estava valendo 90 cruzeiros, passou a valer apenas 50.”. Pelos dados da pesquisa realizada na época, o quilo do arroz caiu de Cr$ 11,52 cruzeiros, em 1961 para Cr$ 8,18 em 1968. Ninguém esperava essa desvalorização, mas como sempre foi um homem destemido, foi atrás de resolver o impasse, então Luiz ao ver o arroz parado em sacos e para não perder sua produção, beneficiou toda colheita na cidade de Araguari - Minas Gerais, na máquina de um amigo chamado Marcelo, e transportou toda sua produção para a cidade de Guaratinguetá – São Paulo. A sua ida a Guaratinguetá foi a oportunidade para vender todo o produto e alcançar um lucro maior. Constatamos por meio de pesquisas 177


Raízes do Cerrado:

que o Estado de São Paulo não tinha produzido arroz em grande escala, então o preço do quilo, já beneficiado estava em alta. Luiz Manteiga relata que naquele período o arroz estava a Cr$ 52,00 (cruzeiros) o saco de 5kg, na região de Campo Alegre de Goiás, estava apenas Cr$ 5,00 (cruzeiros), depois de decidir levar a sacaria, beneficiou aproximadamente 25 mil fardos de 5kg e transportou para Guaratinguetá. Após os dias de transporte, chegou àquela cidade, onde teve que entrar em uma fila de concorrência e apresentar amostras em saquinhos de 250g para avaliação e ser admitido pela comissão licitatória. Com um grande número de participantes no processo, conseguiu ganhar, pelo preço e qualidade do produto, vendendo todo estoque de arroz. Foi assim, que Luiz Manteiga permaneceu ainda por muitos anos na agricultura e como ele mesmo relata “foi trabalhando que consegui ganhar dinheiro e educar meus filhos”. Cabe ressaltar que a maioria dos produtores brasileiros que viveram na década de 1980 lembra do slogan do Presidente da República João Figueiredo, o último dos presidentes do regime militar, que incentiva a produção agrícola no país com o programa “Plante que o João garante”, que tinha como objetivo alavancar a economia do Brasil que passava por uma forte crise econômica reflexo da crise do Petróleo em 1979. Esse programa também chegou às terras goianas, ressaltando assim a importância do programa presidencial. Chegou a plantar mais uma grande tonelada de arroz e milho, que dessa vez houve uma valorização maior do preço final da produção. Para que o plano desse certo, o governo garantiu um preço mínimo alto e os produtores atendendo ao apelo e plantaram. Sua administração na fazenda da Chapada foi longa, até que recebeu uma proposta vantajosa e lucrativa para que vendesse a propriedade a um cidadão de São Paulo. Com a venda da fazenda, Luiz deixou de produzir arroz e com a negociação fez “capital” e aprimorou sua outra 178


História da Família Manteiga

renda iniciada pelo pai, a produção de Cachaça. Vale ressaltar que toda sua história na fazenda Chapada, é citada de forma saudosa e que Luiz admite se sentir arrependido de não ter dado continuidade ao agronegócio e efetivado a venda. Após a venda da propriedade todos os negócios se concentraram em torno da cachaça, a qual tratará mais a frente, e o plantio da cana-de-açúcar, produto base. Em propriedades rurais, Luiz Manteiga mantém até os dias atuais a Fazenda Pirapitinga dos Monteiros e a Fazenda Forquia onde está instalada a fábrica da Cachaça Castelo Branco, todas no município de Campo Alegre de Goiás.

9.3 - A vida pública – de vereador à Câmara dos Deputados

Em uma cidade pequena e em formação, sempre surgem lideranças, muitas delas aclamadas pelo povo e outras se posicionam para melhorar a vida dos munícipes. No caso de Luiz Manteiga que fazia parte de família pilar da formação do município e seu irmão, Lázaro, que veio a ser prefeito anteriormente, sentiu a necessidade de candidatar e lutar principalmente pelos professores, quando viu sua irmã, Lazarina, a única professora formada com magistério – curso básico para licenciatura na época – ser exonerada do cargo, por manobras políticas do então prefeito de oposição política da época. Muito revoltado e indignado com o ocorrido, se candidatou nas eleições gerais de 1970 ao cardo de vereador, a segunda eleição no período do Regime Militar, sendo o mais votado da cidade, com 214 votos, (dados disponibilizados pelo Tribunal Superior Eleitoral). Relatos contam que como vereador eleito pela 3° legislatura (31 de janeiro de 1971 a 31 179


Raízes do Cerrado:

de janeiro de 1973), Luiz Manteiga desempenhou um papel árduo e crítico perante a administração atual, e veio a desempenhar o papel de Presidente da Câmara Municipal de Vereadores de Campo Alegre de Goiás, no período de 31 de Janeiro de 1971 a 15 de Maio de 1972. Devido ao alto índice aprovação pela população da cidade, líderes políticos e correligionários insistiram em sua candidatura a vaga de prefeito nas próximas eleições. Nas conversas de pré-campanha, havia 10 nomes interessados na disputa, Luiz não tinha o interesse em disputar aquela vaga à prefeitura de Campo Alegre de Goiás, alegava que outros nomes tinham mais chances de se elegerem, além de carregaram uma história maior, com a cidade. Foi com a insistência do partido, lideranças da época e da própria população que após muita conversa, a candidatura de Luiz Manteiga foi homologada, tendo como vice em sua chapa, o senhor Sebastião Pedro da Silva. Cabe ressaltar que a candidatura se deu pela Arena, partido político extinto, e em meio a tantos possíveis candidatos no pleito, houve apenas uma chapa na campanha eleitoral. Por serem candidatos únicos, foi uma campanha simples e tranquila, com comícios em regiões rurais mais populosas, visitas a residências, fazendas, comércios, e com um trabalho estratégico, a candidatura foi ganhando a confiança da população de Campo Alegre de Goiás, que com um eleitorado de 1615 eleitores, Luiz Manteiga e Sebastião Pedro da Silva, obtiveram 888 votos saindo vitoriosos naquela eleição. Assim Luiz Manteiga Álvares de Campos viera a ser o sétimo prefeito de Campo Alegre de Goiás, para o mandato de 1973 a 1977, com fortes influências do Regime Militar, com um grande apoio do governo do Estado de Goiás e aliança com empresas, a cidade viera a ganhar obras que beneficiaria a população até os dias atuais. As primeiras ações do prefeito Luiz Manteiga e sua equipe administrativa, foi fazer um levantamento de obras emergências para a cidade, tais como limpezas de ruas e avenidas, 180


História da Família Manteiga

limpeza de córregos e regos, reparo em algumas estradas. Segundo ele, uma administração mais humana, com viés educacional de forma que toda a cidade seria agraciada com os benefícios. O prefeito deu continuidade ao projeto da rede de energia elétrica na cidade, que já tinha sido iniciada na administração do prefeito Lázaro Álvares da Silva Campos, com objetivo de levar energia para toda cidade, expandir a rede em bairros que ainda não havia construções, além de projetar novos bairros, já canalizados. O ano de 1974 foi um marco na expansão de redes elétricas no Estado de Goiás, firmadas pelo então presidente Ernesto Geisel, que determinava a passagem de novas áreas de transmissão de redes, com isso, ficaria mais fácil para que o município de Campo Alegre de Goiás fosse beneficiado com novas áreas. Para Denis Castilho, todo fator de expansão da transmissão elétrica de Goiás viera, Entre os anos de 1950 e 1964, houve o predomínio das políticas de governo e da criação de empresas públicas. Na década de 1960 foi criado o Ministério das Minas e Energia e a Centrais Elétricas Brasileira S. A. (Eletrobrás). Em Goiás foi criada a Centrais Elétricas de Goiás S. A. em 1955 e no ano seguinte entrou em operação as Usinas de Rochedo, no Rio Meia Ponte, e São Patrício (Cachoeira do Lavrinha), no rio das Almas. A capacidade instalada desse estado aumentou nesse período quando, em 1959, entrou em operação a primeira etapa da Usina Hidrelétrica (UHE) de Cachoeira Dourada. [...]de 1965 a 1990, uma vez que o desenvolvimento Estatal foi intensificado. A diferença é que do ponto de vista espacial, os sistemas de energia elétrica do país passaram a ser configurados em redes regionais, ampliando os sistemas de transmissão e distribuição. Nesse período também houve a instalação da Itaipu Binacional em 1974, que entrou em operação dez anos depois (p. 5-6).

A partir desse trecho, podemos identificar um grande avanço no setor elétrico do Estado de Goiás, e com a busca de recursos do prefeito Luiz 181


Raízes do Cerrado:

Manteiga, o município entrou na distribuição de recursos para a ampliação elétrica, que tinha sido iniciada em mandatos anteriores, conforme vimos, e interrompidas durante o mandato 1970 a 1972. Luiz Manteiga cita com muito orgulho que deu continuidade ao trabalho do irmão: Esse projeto devemos também a ele, que foi o primeiro prefeito a preocupar em trazer a energia em rede para a cidade, que até então era de gerador ligado as 20horas e desligado as 22horas, então tive esse orgulho e privilegio de continuar o trabalho.

Outra obra citada por Luiz Manteiga foi, o início do projeto de canalização e bombeamento de água nas residências da cidade, em parceria com a recém fundada Saneago, que para o trabalho do saneamento de água potável, a construção da estação de tratamento, teve o auxílio do senhor Augusto Sebba, amigo do então prefeito, que mediu a rede fluvial e o terreno para a prefeitura, além de um trabalho totalmente voluntário. Luiz Manteiga diz que não conseguiu concluir a obra, mas deixou em grande andamento, devido a cidade já ser grande em loteamentos, tinha muita coisa para medir, com bairros distantes da estação de tratamento, para concluir precisava de muito nível para isso, mas 70% das obras estavam em andamento. Apesar de tudo, constatamos uma mágoa: ao deixar a gestão, o sucessor não convidou Luiz Manteiga para a cerimônia de inauguração da Estação de Tratamento, provavelmente por motivos políticos – tinha uma divergência muito grande com o prefeito na questão política –, e para a solenidade de inauguração não o convidou, mas garante, “nunca liguei para o fato, pois o importante era o beneficiamento da população e sempre acreditou que o trabalho iniciado já seria uma marca registrada a futuras gerações.” Passa por Campo Alegre de Goiás uma das mais movimentadas rodovias federais do país, a BR 050, que liga Brasília a São Paulo, aberta no 182


História da Família Manteiga

governo de Juscelino Kubitschek, que para Rodolfo F. Alves Penas “o processo de industrialização do Brasil, naquela época, demandava uma maior integração territorial, o que incluía, sem dúvidas, uma rede de transporte articulada por todo o território nacional. Nesse sentido, Juscelino Kubitschek trouxe para o país a indústria automobilística, construiu a capital Brasília no interior do espaço brasileiro e promoveu a construção de várias rodovias importantes”. Tal rodovia veio a ser pavimentada em 1972 já o trecho do município teve as obras iniciadas durante a gestão do prefeito Luiz Manteiga. Com isso teve o privilégio de ter uma aproximação com a equipe e desenvolver junto com eles, trabalhos que marcou sua trajetória no município, que foi a pavimentação das duas principais avenidas da cidade. Segundo Luiz Manteiga, a equipe responsável pelas obras de pavimentação da BR, precisava montar uma usina de brita na cidade para ficar de fácil acesso o material utilizado, pois, era um valor muito caro transportar cargas de outro trecho além de perigoso, vejamos: Eu tive a oportunidade de ter uma aproximação muito estreita com a empresa que construía a rodovia, e teriam que montar uma usina de britagem para concretizar a pavimentação, e a usina além de ser cara, o transporte da pedra, carga vazia, viagem pra lá e pra cá, ficava bem onerado, aí eu conhecia toda a região, e levei o engenheiro lá no ribeirão Umburuçu, que tinha uma grande jazida, eles coletaram o material, mandou para a Anápolis e foi aprovado. [...] foi assim que consegui, com esse entrosamento, um preço mais acessível para a pavimentação.

Para a concretização da obra, o então prefeito precisou enviar à Câmara Municipal de Vereadores um projeto que causou grande alvoroço entre os membros da oposição. A administração tinha oposição muito forte na câmara. Luiz Manteiga lembra que foi difícil no início, os vereadores 183


Raízes do Cerrado:

não aceitaram os valores e a obra, mas ao entenderem que o asfalto das duas principais avenidas iria alavancar a cidade, o projeto foi aprovado na casa de leis. A partir desse momento iniciaram-se as obras de pavimentação das avenidas, que segundo o prefeito duraram 32 dias. Para época, o asfalto usinado era novidade na região do município de Campo Alegre de Goiás, e ele nos relata que isso chamou muita atenção dos municípios vizinhos tal como Ipameri que não tinha ruas asfaltadas ainda, todas eram no paralelepípedo. A ocasião chamou tanto atenção que foi destaque no Jornal O Popular, que reportava o trabalho do prefeito, ele cita que “a matéria tinha os dizeres: Fenômeno Administrativo em Campo Alegre de Goiás, jovem prefeito pavimenta toda a cidade”, a reportagem deu então um grande destaque para o município e ainda mais empolgação ao prefeito que continuou com os projetos de pavimentação de ruas e avenidas. Destaca ainda que se sentiu muito honrado quando enviou o projeto de nome de uma das avenidas e a câmara sugeriu o nome para a via principal de Avenida Álvares, em homenagem a família do pai e ao próprio prefeito que a pavimentou. A outra avenida viera a homenagear Bernardo Sayão, um engenheiro agrônomo do Ministério da Agricultura e político brasileiro, que em Goiás fundou a “CANG” Colônia Agrícola Nacional de Goiás, na Marcha para o Oeste de Getúlio Vargas deu origem à cidade de Ceres. Em razão do bem-sucedido trabalho lá realizado, em 1954, foi eleito vice-governador de Goiás, chegando a governar o estado interinamente, e 1958, Juscelino Kubitschek lhe encarrega à construção do trecho norte da Transbrasiliana (a Belém-Brasília). Acompanhando pessoalmente as obras, no início de janeiro de 1959, nos trabalhos de abertura da mata uma árvore é derrubada de forma equivocada e atinge o barracão em que estava Sayão, que morre no mesmo dia. Bernardo Sayão dá nome às principais ruas e avenidas de várias cidades em todo país. Mas as obras da avenida custaram muito aos cofres públicos, e como havia prometido na câmara que não iria fazer empréstimos munici184


História da Família Manteiga

pais para tal obra além do orçamento previsto, o prefeito vendeu na época 80 cabeças de gado, de sua própria fazenda, para conseguir quitar a dívida e assim terminar a pavimentação do município, e não se arrepende. Estava ali a serviço do povo. Para ele, foi o mínimo que poderia fazer para beneficiar a todos e não dificultar os cofres públicos. Quando perguntado sobre qual obra ou ação que o deixa mais feliz, ele responde que foi a ampliação do Colégio Major Emídio transformou-o em uma instituição estadual. Lembra que foi uma honra muito grande, levando a maior parte dos professores que tinha interesse em lecionar no colégio e outros que já estavam ao governador, para que os nomeasse em servidores estaduais. Isso desafogou a folha da prefeitura, os cofres municipais por bastante tempo. Ainda destaca que foi um incentivo muito grande para a educação municipal, transformar aquele colégio que até então era um grupo escolar municipal, onde se tinha uma educação pouco habilitada, devido os poucos recursos municipais, em um colégio estadual. Assim, os professores passaram a receber mais cursos de formação, e houve mais investimentos escolares, dando uma qualidade maior no ensino.

Prefeito Luiz Manteiga, discursando durante a formatura da 8° série em 1975. Foto: Acervo particular da família.

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Raízes do Cerrado:

Luiz Manteiga refere ao aspecto educacional de forma gratificante, relatando sua preocupação com a educação, sempre pensava que “se você leva educação e conhecimento, você leva tudo”. Em sua administração, manteve 25 grupos escolares com 40 a 60 alunos, em ranchos de palha e chão batido, alguns de alvenaria, todos com atendimento da merenda escolar e educação de boa qualidade. Durante a fala, percebemos o orgulho que o prefeito tinha pelo civismo, “era gratificante quando ia visitar as escolas e a criançada levantava para receber o prefeito e cantavam o hino nacional. ”, vimos que o mesmo teve sua gestão marcada no período do Regime Militar, em específico a administração foi nos anos finais do Presidente Emílio Garrastazi Medici e os dois anos iniciais do Presidente Ernesto Geisel. O Governo do General Medici foi considerado pela história o período mais opressivo e violento do regime militar, mas também ficou conhecido pelo milagre econômico no país, e o Governo do general Ernesto Geisel que começa um lento processo de transição rumo à democracia. Seu governo coincide com o fim do milagre econômico e com a insatisfação popular em altas taxas. Sabemos que no período do Regime Militar a educação brasileira era voltada para o civismo. Os estudantes não tinham mais Sociologia nem Filosofia, no lugar o governo militar criou três disciplinas: Educação Moral e Cívica, Estudos de Problemas Brasileiros e Organização Social e Política Brasileira – válidas para todas as escolas e todos os níveis, do fundamental ao universitário. O governo desejava, com o novo currículo, reforçar sua ideologia política, exaltando o nacionalismo e o civismo. Além disso, o ensino de História e Geografia também ficou comprometido: com a ditadura, essas disciplinas foram obrigadas a ficar menos críticas e mais factuais, exaltando a história dos grandes personagens e feitos. Outras obras e ações foram lembradas pelo prefeito, como a construção da um posto de saúde próximo a rodovia, e contratação de mais um médico residente para atender a população, que na época contava com apenas um e alguns enfermeiros. Também citou o policiamento, reforçan186


História da Família Manteiga

do o quadro de policiais na cidade, com cabos e soldados efetivos, além de conseguir fazer um patrulhamento na zona rural, em dias de festas, melhorando a segurança da população. Os crimes na região rural como roubos e até homicídios diminuíram, com um melhor policiamento. Conseguiu que um sargento e um delegado residissem na cidade. Terminado o mandado, chegou a hora de despedir da equipe e da população, Luiz Manteiga recebeu o carinho dos moradores, amigos, correligionários no último dia de sua gestão, ao sair da prefeitura, “o povo se juntou na porta do prédio para fazer uma despedida, atiravam flores, entregavam mensagens e bilhetes, mulheres emocionavam, homens se abraçavam”, aquele fato o marcou muito e mostrou que todos os feitos agradaram a população. Ao lembrar o encerramento do mandato político, ressalta a importância do compromisso com a administração pública. O prefeito deixou a prefeitura com todas as prestações de contas aprovadas pelo Tribunal de Contas dos Municípios, não tendo problemas com as prestações que sempre eram prestadas no trigésimo dia do mês, quando saiu da prefeitura, por exemplo, tinha conta do ex-prefeito ainda para serem aprovadas. Luiz foi pessoalmente à cidade de Goiânia levar todos os balancetes do último mês de mandato, que viera a ser aprovado logo em seguida. Mesmo fora da prefeitura, Luiz Manteiga continuou sendo um homem presente no dia a dia da sociedade, tanto que em meados de 1987 foi convidado pelo Governador do Estado de Goiás Henrique Santillo, a assumir a superintendência de irrigação do estado, onde teve que se mudar com a família para a cidade de Goiânia e desenvolver durante o governo um trabalho de criação do Projeto de Campo Alegre de Goiás, área determinada e importante polo econômico de lavouras do município, movido a pivôs de irrigação. O Projeto Formoso teve o mesmo objetivo. Para isso contou com a ajuda de um engenheiro agrônomo que dava suporte, requisitado por ele do Governo Federal para que trabalhasse na efetivação dos projetos, fazendo um trabalho muito bom para Goiás e nossa região. 187


Raízes do Cerrado:

Devido ao trabalho reconhecido pelo governador, Luiz Manteiga foi novamente levado aos palanques, desta vez a pedido de membros do governo estadual e do próprio Henrique Santillo, “ele me fez candidato a deputado federal, insisti que não queria, mas para ele só servia se fosse eu. ” Foi uma campanha difícil, percorrer o estado em poucos dias, e sem orçamento político, que não existia como nos dias atuais, Luiz Manteiga teve que percorrer diversos municípios goianos, de palanque em palanque em busca de votos. Ao relembrar essa campanha, ele cita um momento muito engraçado ocorrido na cidade de Cristalina, Lá tive uma façanha interessante, eu fui subir no palanque e minhas calças descosturaram a sorte que o palanque era vizinho de um casal de amigos que a esposa era costureira.

A corrida pela vaga na Câmara dos Deputados em Brasília foi árdua, na contramão de outros candidatos não fez promessas de empregos, porque não sabia se seria eleito, mas a cada cidade parada, seu trabalho como prefeito de Campo Alegre de Goiás e Superintendente de Irrigação, era reconhecido e aclamado, mas a eleição não veio, “perdi por poucos votos. ” Longe da vida pública, sem concorrer a cargos políticos, Luiz Manteiga se dedicou a vida familiar, até que em 2004 que viera a ser convidado a disputar o cargo de vice-prefeito pelo PMDB na chapa formado pelo candidato à prefeito José Lourenço Peixoto – o Bolinha, do PT, lembrando que não era simpatizante do Partido dos Trabalhadores, mas precisava ajudar o candidato a se eleger a fim de encerrar a hegemonia do prefeito de oposição da época, o qual não concordava com suas ações e forma de governar a cidade. A eleição de 2004 foi marcada com a vitória da chapa José Lourenço e Luiz Manteiga, onde fizeram novamente parcerias a fim de desenvolver a cidade em vários aspectos. Essa foi à última eleição concorrida por Luiz Manteiga, que agora acompanha os movimentos políticos da cidade e sempre que necessário, faz uso de diversas oportunidades para deixar mensagens ao povo. 188


História da Família Manteiga

9.4 - Uma família regida pelos princípios cristãos Durante sua trajetória política, Luiz Manteiga nunca deixou de lado sua família e seus compromissos de pai e esposo. Conheceu a esposa Marina Aparecida Porto Álvares na cidade de Ipameri-Goiás, que trabalhava em uma loja de artigos de escritórios do pai. Luiz ia todos os dias para comprar algo para encontrar-se com ela. Foram muitas borrachas, canetas, lápis e outros pequenos materiais comprados até o dia que tomou coragem e à convidou para uma sessão de cinema. Aceito o convite, os jovens foram para o cinema a noite e desse dia em diante começaram a namorar, passando-se algum tempo do relacionamento, ficaram noivos e começaram a preparar para a cerimônia de casamento. Naquela época era tradição que todos os protocolos do casamento acontecessem na cidade natal da noiva, sendo assim, a cerimônia aconteceu na cidade de Ipameri-Goiás, na então Catedral do Divino Espírito Santo, com a presença dos familiares de Marina e de Luiz, uma cerimônia simples, mas preparada com muito entusiasmo pelo casal.

Convite do casamento de Luiz e Marina. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

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Raízes do Cerrado:

Cerimônia de casamento de Luiz e Marina na Catedral Divino Espírito Santo em Ipameri-Goiás, 1967. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

Casado há 52 anos com Marina Aparecida Porto Álvares, que foi professora de escolas rurais, municipal e estadual. Desempenhando a função de diretora do Colégio Estadual Major Emídio, onde, segundo ela, foi um período de muito aprendizado e formação de amizades. Além de ter sido Primeira-Dama presente de Campo Alegre de Goiás com projetos e ações que envolvia toda a cidade. Marina nunca deixou de apoiar o marido e acompanhá-lo em seu dia-a-dia. A união gerou quatro filhos, sendo um homem e três mulheres. O casal destaca que o trabalho de educação dos filhos foi focado para a vida cristã e digna, ressaltando a importância dos valores que rege um bom homem na educação dos filhos, da honestidade e do trabalho na formação do caráter cidadão. 190


História da Família Manteiga

Luiz e Marina citam com orgulho a profissão dos filhos, deram um ensino regular para todos. Laís é administradora de empresas, o Luiz Filho é engenheiro agrônomo, a Lilian fez o curso de direito e a caçula Marina fez Medicina Alternativa, especializou-se em acupuntura. Sobre o casamento, ressalva que nunca tiveram uma discussão, que é um casal apaixonado até os dias atuais e cita com muito carinho olhando para ela a frase “ela diz que sou o doce dela, e ela o meu doce.”. Atualmente todos os filhos são casados, a casa é rodeada de netos e o casal vive na cidade de Catalão – Goiás, mas não esquece e deixa a cidade de Campo Alegre de Goiás, a qual segundo ele, foi palco das mais diversas experiências de sua vida. Um dos prazeres é reunir todos os filhos e netos para um dia de conversa e confraternização, resgatando a memória da família e mantendo vivos os laços que os unem.

9.5 - Álbum de família

Luiz Manteiga e Marina acompanhado dos filhos: Luiz Filho, Lilian,Marina, Laise e Artur. Foto: Acervo Particular da Família. Sem data.

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Raízes do Cerrado:

Lilian Álvares com o esposo Bruno Mastrella e os filhos: José Luiz, Beatriz e Valentina (no colo). Foto: Acervo particular de Lilian, 2019.

Luiz Manteiga e Marina com sua filha Marina Álvares. Foto: Acervo particular de Marina Porto Álvares de Campos, 2019.

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História da Família Manteiga

Luiz Álvares de Campos Filho com a esposa Polyana e filhos: Luiz Neto e Helena Álvares. Foto: Acervo particular de Luiz Filho, 2018.

Luiz Manteiga com Marina, Isabela, Clovis Silva, Munique, Alberto, Elizabeth, Letícia e Gabriel, durante a comemoração de seu aniversário. Foto: Acervo particular de Isabela Álvares, 2019.

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Raízes do Cerrado:

Em pé: Luana, Beatriz, Arina, Luiz Filho, Helena (no colo), Geovana, Luiz Neto, Isabela, Marina. Sentados: Mafalda, Luiz Manteiga e Marina. Foto: Acervo particular de Isabela Álvares, 2019.

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História da Família Manteiga

Capítulo X Tia Anira – exemplo de superação e força de vontade

A caçula das irmãs, Anirazal Álvares de Pádua, carinhosamente chamada por todos como Tia Anira, nasceu em 24 de setembro de 1945. Desde criança acompanhou as irmãs em brincadeiras e viagens. Após o casamento teve de aprender a viver com o luto e “matar um leão a cada dia” para criar os filhos com muito êxito. Nas próximas páginas trataremos de sua vida, percorrendo as lembranças de família e suas conquistas diárias.

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Raízes do Cerrado:

10.1 - Lembranças de infância

Como a caçula das filhas, Anira lembra de sua infância com muita saudade, tempos saudáveis e de brincadeiras tradicionais da época, adorava brincar com bonecas produzidas por ela e as irmãs, brincar de roda, além de correr no grande quintal de casa. “A gente brincava muito... tinha o pomar grande, a gente brincava ali de boneca, de cozinha, fazia fogãozinho, cozinhava de verdade as panelinhas, passava o dia todo brincando. ” Desde pequena ajudava a mãe nos afazeres de casa, assim como as irmãs mais velhas. Sempre muito apegada com as irmãs, estavam juntas em todas as atividades, seja afazeres domésticos, escolares e brincadeiras. Recorda-se que as crianças da família passavam bastante tempo brincando, no quintal, no pomar quando estavam na fazenda e até durante a noite de lua clara tinham a permissão para brincar fora de casa. Aprendeu também, quando ficou um pouco mais velha, a lidar com os serviços domésticos, as irmãs, mais velhas já tinha o hábito de limpar, cozinhar, lavar roupas. Aprendiam e tinham como obrigação fazer este trabalho todos os dias, só depois poderiam continuar as brincadeiras. Era ajudar a mãe mesmo, que cuidava dos filhos com muito zelo e carinhos, mas exigia a ajuda nos afazeres, porque ela já estava cansada da lida diária, que só aumentava. Além da cozinha e de outros trabalhos domésticos, aprendeu com a mãe trabalhos manuais, outra atividade que realiza até hoje. Muito comum naquela época, as filhas já serem educadas a se tornar boas “donas de casas” e esposas, tradição das famílias rurais do século XX. A escola aparece como algo marcante em suas memórias, um local de formação para o futuro, onde aprenderam a ler, escrever, fazer cálculos e também conteúdos considerados importantes para a vida adulta, no caso das meninas uma educação permeada por aprendizagens que as pre196


História da Família Manteiga

parassem para o papel de esposa, mãe, dentro dos preceitos religiosos. Sua alfabetização aconteceu na fazenda, pela irmã Lazarina que já lecionava, depois foi fazer o g s que conheceu o primo do esposo da irmã, Mozart Cardoso de Pádua, namoraram e se casaram. Na época, meados de 1965, Mozart trabalhava como caminhoneiro no transporte de britas para Brasília e também de taxista na nova capital do Brasil. Sua irmã já estava atuando no ministério e logo viabilizou para que o mesmo adentrasse no quadro de funcionários do Ministério da Agricultura.

10.2 - O casamento, o luto e a luta

Anira e Mozart namoraram por alguns anos, e se casaram em 13 de setembro 1969, com 24 anos, num dia muito esperado por toda a família. A filha caçula de Sebastião e Maria se casava, a casa estava preparada para receber as visitas e os agrados, em cidades interioranas era comum as pessoas levarem presentes na casa dos pais da noiva, além do mais, se tem a ideia que a filha ali estava morando. Além de receber a sua família, também esperavam ansiosos pela família do esposo que vinha de Ceres, alguns chegaram no dia anterior, outros no dia próximo ao horário da celebração. A cerimônia do casamento foi marcada para as 10 horas da manhã na Igreja Nossa Senhora do Amparo, que atualmente é a Capela São Sebastião, cabe ressaltar que na época ainda não se tinha a Paróquia de Nossa Senhora do Amparo, a comunidade religiosa ainda pertencia a Paróquia Nossa Senhora da Abadia – de Ipameri. Com a família e amigos reunidos na igreja, deu-se início a uma celebração simples que durou cerca de quarenta minutos. Após se dirigiram para um almoço servido por Sebastião e Maria – pais da noiva – em sua residência, preparado um verdadeiro banquete típico de festas de família. 197


Raízes do Cerrado:

Convite de casamento entre Anirazal e Mozart. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher

Anirazal e Mozart em seu casamento. Foto: Acervo particular de Marise Álvares. Foto de 1969.

A princípio Anira, morou em Brasília, devido o trabalho do esposo, na capital teve os dois primeiros filhos. Levava uma vida simples e do lar na cidade, o marido trabalhando na esplanada enquanto cuidava dos afazeres domésticos. Viveu anos felizes na capital, cada um com particularidades e problemas, mas que faz parte da vida cotidiana. Passados alguns anos em Brasília, o marido foi transferido para a cidade de Catalão, em 1974, onde trabalhou a serviço do ministério. 198


História da Família Manteiga

Onde moraram por um ano. Em Catalão, o terceiro filho do casal nasceu. Próximo dos pais e dos irmãos, Anira se sentia em casa, até que Mozart foi transferido para a cidade de Goiânia em 1975, na capital de Goiás. Ela continuou a rotina no lar, e procurando a se adaptar na nova cidade. Mantiveram seus costumes, logo veio a quarta filha do casal para dar ainda mais alegria. Anira, sempre cuidadosamente preparava o lar, as crianças e as refeições rotineiras de seu dia-a-dia, com o mesmo zelo que a mãe havia ensinado quando criança na fazenda. Por volta de 1977, Mozart resolveu se aventurar em uma nova jornada junto com seu irmão em Colinas – Tocantins. A família então vendeu as propriedades para abrir em sociedade uma madeireira. Uma nova jornada se iniciava, ora estavam em Colinas ora em Barrolândia, ambas em Tocantins para tocar os negócios. A sociedade entre Mozart e o irmão teve seus auges, mas também alguns pontos que levaram a desfazê-la, por motivos desconhecidos. Cerca de 6 meses depois voltaram para Goiânia retornando suas vidas normais. Logo depois do retorno à capital goiana, Mozart começou a enfrentar alguns problemas que comprometia alguns membros do corpo. Iniciou de forma lenta e foi-se agravando com o passar dos anos. Anira entrou em acordo com o marido para que fosse trabalhar fora, para ajudar nas despesas de casa, com os filhos já maiores e ela sentiu que estava na hora de trabalhar.

Mozart conseguiu emprego para a esposa na Celg, companhia

elétrica do Estado de Goiás, Anira então começou a trabalhar na empresa por volta dos anos de 1981, mas logo que a saúde do esposo debilitou um pouco mais, entrou com um pedido de licença para auxiliá-lo. Com o passar do tempo, o marido foi ficando mais dependente dos cuidados da esposa. Em casa cumpria a jornada de levar os filhos na escola, cuidar 199


Raízes do Cerrado:

das refeições e do marido, até que em outubro de 1983 Mozart veio a falecer, vítima de um infarto, deixando Anira e os filhos. Quando faleceu, o filho mais velho tinha treze anos e a caçula sete anos de idade, para ela uma luta, nunca tinha feito nada fora, serviço de banco, passou então a gerenciar uma família.

Agora um recomeço, a reorganização do núcleo familiar, a partir

disso Anira teve que se desdobrar para cuidar dos filhos, da casa e do trabalho. Voltou para o emprego da Celg onde trabalhou por mais 30 anos até sua aposentadoria. Levantava cedo, arrumava as crianças, levava-as para a escola e seguiam para o trabalho. Os filhos voltavam sozinhos da escola, esquentavam o almoço preparado pela mãe no dia anterior (sempre fazia o jantar afim de também servi no almoço do dia seguinte), e foi assim, “na correria com muita luta, então foi um aprendizado a cada dia, mas consegui formar todos eles. Trabalhava muito, além de fora, trabalhava em casa para arrumar as coisas e deixar encaminhado para o outro dia.”.

Anira foi auxiliada pela cunhada Ruth que ajudava a olhar as

crianças e também deu suporte na área educacional dos mesmos. O filho mais velho, Cláudio, também ajudava nos afazeres domésticos. Ele e os irmãos aprenderam desde cedo a cuidar e responsabilizarem pela casa e pelos atos, sabendo que mãe só chegava em casa após as 17 horas e ainda teria que organizar itens para o próximo dia. Herdeira de dotes culinários da mãe, Anira era excelente doceira, resolveu então apanhar os cocos do quintal para fazer cocadas e vender para as amigas da empresa a fim de complementar a renda. As cocadas fizeram muito sucesso e firmou-se com o “bico”, sempre tinha uma renda extra para proporcionar um lazer diferente para os filhos. 200


História da Família Manteiga

Com garra, Anira criou os quatro filhos, Cláudio Álvares de Pá-

dua, Ronald Álvares de Pádua, Rubens Álvares de Pádua e Gláucia Álvares de Pádua. “O Cláudio se formou em farmácia, mora em Brasília tem três filhos e casou-se duas vezes, o Ronald, tem dois filhos e casado mora em Goiânia fez e administração, mas não exerceu, recentemente fez um curso para corretor e trabalha na área, o Rubens é dentista mora em Brasília tem duas filhas e a Gláucia, mora em Brasília também e se formou para fonoaudióloga, ainda não se casou. ” Anira comenta a respeito dos filhos que hoje se tornaram grandes profissionais e que a enchem de orgulho e alegria, atualmente tem sete netos.

Anira mora em Goiânia. Os filhos que moram em Brasília fize-

ram diversas propostas para que a mesma se mudasse, mas ela alega que em Goiânia está sua essência, foi onde criou os filhos, batalhou e superou as dificuldades da vida e não se vê morando fora de uma cidade que viu crescer e que a propiciou os momentos mais marcantes de sua vida. Mesmo assim visita sempre os filhos e também frequenta a fazenda dos irmãos em Campo Alegre de Goiás para manter as reuniões de famílias desde a época dos pais. Para ela, estar na presença da família é um momento de reencontro e lembranças boas, sempre que possível gosta de reunir os filhos e netos em sua casa para celebrar datas importantes.

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Raízes do Cerrado:

10.3 - Álbum de família:

Anirazal, Mozart e filhos: Claúdio, Glaúcia (no colo), Rubens e Ronald (atrás). Fonte: Arquivo particular da família. Foto sem data.

Anirazal e família durante a comemoração do Natal. Vanusa, Cláudio, Álvaro, Gláucia, Ronald, Sirlene, Gustavo, Anirazal, Rubens, Eliane, Danilo, Rafael, Helena, Thaís, Júlia, Geovanna,.Fonte: Arquivo particular da família. Foto sem data.

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História da Família Manteiga

Thaís, Natália, Vanusa, Sirlene, Anira, Ronald, Eliane, Cláudio, Rubens, embaixo: Júlia, Geovanna, Gláucia, Gustavo, Álvaro, Danilo, Rafael. Fonte: Arquivo particular da família. Foto sem data.

Irmãos: Luiz, Anirazal e Orazal. Fonte: Arquivo particular da família. Foto sem data.

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História da Família Manteiga

Capítulo XI Juarez Manteiga – um visionário e empreendedor

Este capítulo é dedicado a Juarez Álvares da Silva, nascido em 10 de abril de 1948 na cidade de Campo Alegre de Goiás. Juarez, o irmão mais novo da família de Sebastião e Maria, carrega uma história memorável de trabalho e lutas, como que veremos nas páginas a seguir.

11.1 - A vida na fazenda: infância à juventude.

Assim como os demais irmãos, Juarez também teve uma vida infância marcada pelos costumes rurais e preceitos religiosos, a presença 205


Raízes do Cerrado:

marcante dos pais durante sua educação e o apoio dos demais irmãos. Cresceu e foi educado no meio, como ele mesmo nos lembra que tinha uma escola de alfabetização na fazenda mantida pelo pai, onde lá recebia as aulas normais, segundo ele, era um grande grupo escolar que além dele e dos irmãos, estudavam também os filhos dos funcionários da fazenda e dos vizinhos próximos. Era comum naquela época, em meados dos anos de 1955, termos em grandes fazendas essas escolas rurais, onde em uma sala de aula multisseriada, os professores atendiam um número grande de alunos. Outra característica marcante daquele tempo, é que as crianças que não residiam na fazenda sede da escola, iam à cavalo para estudar, por isso muitas das vezes as aulas eram suspensas em períodos chuvosos e de temperaturas muito baixas. Na escola sediada na fazenda do senhor Sebastião, a professora também era mantida por ele, e Juarez conta que as irmãs mais velhas, que já estudavam em séries avançadas e até mesmo em outra cidade, como Catalão, e em seu período de férias lecionavam na escola para que a professora regente pudesse tirar suas férias. Estudou na escola mantida pelos pais até concluir o ensino normal, depois foi para Ipameri, onde morou com sua irmã Zezica e continuou os estudos. Mudou para Goiânia para os estudos técnicos, logo em seguida foi aprovado na universidade no Rio de Janeiro, em 1969, onde ficou até o ano de 1972, para concluir o curso de Engenheiro Agrimensor. Sobre sua formação, “é Engenheiro Agrimensor – aquele que faz projetos rodoviários, geodésicos, antigamente era mais complexo. Quando formei trabalhava com projetos rodoviários, projetos urbanos de cidades, agora, normalmente o agrimensor só trabalha com medição de terras. ” Mediante informações, detectamos que Juarez sempre foi um rapaz confiante e determinado em suas ações, durante toda sua juventude foi querido por todos que estavam em sua volta e conquistou diversos amigos em todas as cidades onde residiu, os quais muitos mantêm contato até os 206


História da Família Manteiga

dias atuais. Mesmo morando fora, ao lado da boemia da cidade carioca, prezou pelos estudos e por uma vida sossegada.

11.2 - Volta para casa – empresário, o casamento e novos rumos da vida.

Após receber o grau de Engenheiro Agrimensor, retornou a região para exercer suas funções. De início montou uma empresa que, segundo ele, cresceu de forma inesperada, mas foi a partir dela e de seu trabalho que conseguiu erguer-se financeiramente e dar uma vida boa a sua família que logo veio a ser formada. Foi durante suas viagens a trabalho que veio a conhecer Carmem na cidade de Juiz de Fora, em 1972, ano inesquecível, pois conhecera a mulher que mudou sua vida. “Uma jovem mulher cheia de vida, alegre, de uma energia encantadora, além do mais tinha e tem até hoje uma beleza única”. Ela era jovem, aproximadamente 18 anos de idade, e não foi só uma “paixão de verão”, muito mais que a beleza que possuía, o que realmente os encantou foi o caráter, e a forma de ver o mundo. Juarez e Carmem namoraram por quatro anos, até marcarem a data do casamento, nesse intervalo de tempo, tiveram oportunidade de realizar viagens, conhecer suas famílias. Carmem lembra que nesse período de namoro, adorava vir para a fazenda dos sogros, onde teve a oportunidade até de brincar com os sobrinhos que já eram nascidos, sempre foi brincalhona e adorava passar o tempo com crianças. Aproximando a data do casamento, começou-se os preparativos para a recepção dos convidados, a distribuir os convites, a cerimônia ocorreu no dia 10 de Julho de 1976, com toda família presente e amigos, foi uma celebração simples mas grandiosa em 207


Raízes do Cerrado:

amor e presença de Deus, “foi um dia memorável” relembra Juarez, “todas as pessoas que gostavam de nós estavam ali presente, foi tudo muito lindo” nos conta Carmem.

Convite de casamento de Juarez e Carmem. Foto: Acervo particular de Elias Roberto Daher.

Juarez e Carmem durante a cerimônia religiosa do casamento. Foto: Acervo particular da família.

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História da Família Manteiga

Passada as festividades e os votos, o casal mudou para Catalão. Juarez continuou com sua empresa e trabalhando, sempre atento aos noticiários, gosto herdado do pai, que não passava um só dia sem acompanhar os programas jornalísticos do rádio. Logo veio os filhos, o primogênito recebeu o nome do pai, Juarez Álvares da Silva Filho nascido dia 11 de Julho de 1977, exatamente após a celebração das Bodas de Papel do casal. Em 1979, nasce Thiago Manteiga Álvares da Silva, no dia 14 de Novembro, e o caçula da família foi Diogo Álvares da Silva, nascido em 04 de Março de 1982.

Comemoração do aniversário de Diogo na Escola Municipal Liberdade em Campo Alegre de Goiás. (Juarez, Diogo e Thiago) Foto: Acervo particular da família.

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Raízes do Cerrado:

Criados com uma infância simples, onde tiveram a oportunidade de brincar e correr pelas ruas, principalmente quando os pais mudaram para Campo Alegre de Goiás em 1982, por um motivo que veio mudar a rotina da família. O Brasil estava passando por um momento de retomada da democracia, comandado pelo General João Baptista Figueiredo, último presidente do Regime Militar, responsável pela flexibilização do regime com leis para Anistia e criação de novos partidos políticos, além de autorizar eleições diretas aos cargos do legislativo e executivo municipal e estadual. Antenado as conjunturas políticas nacional, Juarez sempre foi contra a esquerda e a ditadura no Brasil, para ele o ano de 1982 foi um pontapé para o extermínio da ditadura no país, e com as convocações de novas eleições direta em todo o território sentiu a necessidade de deixar a empresa e fazer um pouco por sua cidade natal. Foi então que conversou com a esposa sobre a intenção de candidata-se a prefeito em Campo Alegre de Goiás. Ela de início foi contra, mas se fosse a vontade do marido iria apoiá-lo. Juarez lembra que, quando conversou com o pai, Sebastião perguntou sobre sua disponibilidade para o cargo. Depois de muitos conselhos, aceitou a candidatura do filho, pois via um futuro promissor, acreditando que seria o momento para concorrer a prefeito. Isso em 1982, já o mandato, seria até 1989, de seis anos, pela transição da reforma da política da época. Após a decisão toda família mudou-se para Campo Alegre de Goiás, Diogo, o filho mais novo do casal estava apenas com três meses de idade na época. A princípio no período eleitoral, moraram com Sebastião e Maria, pais de Juarez, após esse período separam uma casa para a família. Juarez e Carmem julgam que o período foi muito bom para as crianças, uma vida boa, no interior, sem correria de cidade grande, uma educação muito boa que demos para os meninos, foi, para ela, “muito gratificante, tanto no casal quanto para os meninos, nesse período a família fizeram muitos amigos que conservam até os dias atuais.” 210


História da Família Manteiga

11.3 - A vida de prefeito – “fizemos uma inovação na cidade”

Naquele ano de 1982, as eleições foram marcadas para o dia 15

de novembro, data que o Brasil relembrava a Proclamação da República. Ainda em pré-campanha, Juarez lembra que a primeira barreira que teve, foi trazer os irmãos que já foram prefeitos para o MDB, pois a família era correligionária da ARENA. Segundo ele foi uma campanha muito corrida, onde teve que percorrer todo município, com uma agenda entre comícios, carreatas, reuniões, eventos e visitas a famílias, mas sempre contou com o apoio da esposa, dos pais Sebastião e Maria, dos irmãos que foram prefeitos Luiz e Lázaro, demais irmãos e membros da família. Entre todas as idas e vindas da campanha, um trágico acidente tirou a vida do candidato a vice-prefeito de Juarez, como lembra ele “muito mais que um parceiro político, mas um amigo muito grande”, Leomar Marcelo de Morais Teixeira, faleceu em campanha, foi um baque muito grande e a comoção tomou conta da pequena cidade de Campo Alegre de Goiás. Pelas leis eleitorais, a chapa poderia escolher outro nome a vice. Como adversário, foi um nome de peso na política municipal da época, o candidato era aliado a agricultores e líderes do governo.

Na época, os votos eram em cédulas de papel, todos eram enviados

para o Tribunal Superior Regional na cidade de Ipameri, acompanhado de delegados de cada partido para participar e fiscalizar a apuração. Como era uma eleição grande, além de prefeito, a população votou em deputados estaduais e federais, senadores, vereadores e governador. A apuração foi demorada, cerca de dois dias após o fechamento das urnas, a equipe de Juarez veio em carreata de Ipameri até Campo Alegre de Goiás anuncian211


Raízes do Cerrado:

do a sua eleição, relatos de moradores que presenciaram a época, a euforia tomou conta da cidade, o povo festejou a noite toda e um grande churrasco foi feito para comemorar a vitória. Juarez veio a ser o 9° prefeito da cidade de Campo Alegre de Goiás. Durante o mandato, uma administração difícil, sem grandes recursos financeiros, mas conseguiram fazer grandes obras na cidade.

Um mandato marcado por diversas obras que persistem até hoje e

são lembradas por toda a população campoalegrense, podemos destacar a construção da Escola Municipal Liberdade, escola que segundo Juarez, começou a atender crianças a partir dos 4 anos de idade, e lembra ele que foi condecorado pelo feito, elevando a cidade em níveis altos de educação em parâmetros estadual e nacional. Ainda na educação, relembramos a creche da Vila Aurora, que funcionou em seu mandato e do sucessor. A pareceria com o governo do estado para montar o ensino médio técnico no Colégio Estadual Major Emídio, contratando mais professores, mesmo a unidade sendo estadual, a administração mantinha um bom relacionamento com o governador. Os professores fizeram cursos de aperfeiçoamento, já qualificados foram pagos pela prefeitura, todo esforço foi modular os novos funcionários no 2° Grau, recém-aberto na unidade escolar. Até então quem tinha condições de ir para outra cidade fazer o colegial e cursos preparatórios para o vestibular, mudavam da cidade, mas aqueles que queria continuar os estudos, mas não tinha condições, terminava o ginásio e ficavam parados ou desempregados, voltando a trabalhar em fazendas. O curso de 2° Grau aberto pelo prefeito foi profissionalizante, teve a primeira turma de contabilidade – que não tinha na região – e o magistério.

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História da Família Manteiga

Juarez Álvares da Silva em seu gabinete no antigo Prédio da Prefeitura Municipal de Campo Alegre de Goiás. Foto: Acervo particular de Carmem Massafera.

Destaca-se também, a realização das 150 casas populares dentro do programa de Mutirões do Governo de Goiás, Iris Rezende então governador propôs construir 1000 casas em todo o estado em um único dia, em Campo Alegre de Goiás o prefeito então pediu ajuda da população para o feito e construiu em mutirão as casas do Bairro Vila Aurora. Sua esposa Carmem se lembra desse dia que foi de muita alegria e muito trabalho, enquanto os homens estavam trabalhando na construção das casas, as esposas e voluntárias, preparavam o café da manhã, o almoço e o lanche da tarde para ser servido aos operários. Uma obra bastante esperada por toda a população foi à construção do Hospital Municipal, que veio a receber o nome de seu amigo Leomar Marcelo de Morais Teixeira, que havia falecido durante a campanha para prefeito. Segundo Juarez todos os prefeitos anteriores tiveram a vontade de construir um hospital na cidade, mas nenhum deles havia conseguido o fei213


Raízes do Cerrado:

to, em parceria com a iniciativa privada, especial ao Doutor Vital Moreira e seu irmão Lázaro que fizeram uma festa e todo o dinheiro arrecadado foi doado à prefeitura para o início das obras, como ele mesmo lembra: “Para construir o hospital, havia um interesse de todo mundo em construir um hospital em Campo Alegre de Goiás, aí tinha o Vital Moreira, era paulista que resolveu fazer uma festa com meu irmão, pra ajudar no hospital, mas o prefeito na época não interessou, ai logo entrei e ele me passou o dinheiro, foi uma ajuda boa, mas ai fomos atrás dos recursos pra concluir as obras.” Além do dinheiro doado, o prefeito Juarez buscou recursos junto ao governo estadual e federal para dar continuidade às obras, contou também com ajuda da população em mutirões e mão-de-obra, os quais são homenageados na placa de inauguração com os dizeres “Quando o povo une, nada é impossível”.

No destaque de grandes obras, citamos a construção do Abrigo dos

Idosos no Bairro Vila Aurora, uma entidade mantida pela prefeitura municipal a fim de acolher idosos que foram abandonados por familiares, e que segundo Carmem Massafera, responsável pela unidade, todos os domingos ela e a família se dirigia ao abrigo para fazer almoço ou um café e passar uma parte do dia com os internos. Juarez ainda cita obras como posto de saúde na cidade, na Sesmaria e Lago Azul, várias pontes e mata-burros por todo o município, abertura de novas estradas, recuperação de vias, e uma escola no Lago Azul, a gratificação rural para professores, que foi a primeira feita em Goiás, trouxe armazéns (de grãos) para a cidade.

No social, a administração de Juarez foi responsável por diversas

ações, como a horta comunitária, que foi plantada no pátio de cima do hospital municipal, as verduras colhidas mantinham as escolas, o hospital e o abrigo, além de ajudar as famílias carentes da cidade, tiravam sementes 214


História da Família Manteiga

para plantar mais, quem pudesse pagar pagava, quem não pudesse era doado. A horta comunitária foi um grande sucesso entre a população, inclusive a Dona Iris, primeira dama do estado, veio à cidade para inaugurar horta e na oportunidade planou algumas novas sementes. Carmem conta que gostava muito de fazer campanhas solidárias, para arrecadar coisas destinadas às famílias da cidade, inclusive realizou a maior Campanha do Agasalho da história da cidade, onde mulheres costureiras passaram um dia todo fazendo conjuntos de frio em diversos tamanhos para serem doados na cidade. Nessa campanha, foi doado para a prefeitura um caminhão fechado de tecido com diversas estampas, um grande evento foi feito na cidade no dia da entrega dos agasalhos.

Prefeito Juarez Álvares junto com a Primeira Dama de Goiás Íris de Araújo durante implementação da hora comunitária de Campo Alegre de Goiás. Foto: Acervo Particular de Carmem Massafera.

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Raízes do Cerrado:

O dia-a-dia de prefeito era conturbado. Toda a rotina da família era voltada aos eventos da prefeitura. As crianças estudavam na recém-inaugurada Escola Municipal Liberdade. A casa além de espaço familiar, também era lugar para receber autoridades, quando as recebiam na cidade, ficavam hospedados em sua residência, era servido almoço, café, lanches, jantar e até quartos quando tinham que dormir. Receberam deputados, senadores, e grandes nomes da política como Iris Rezende, Henrique Santillo e Joaquim Roriz, lembrando que todos os custos nas recepções eram pagos pelo casal Juarez e Carmem, ao contrário dos dias atuais que se tem todo um protocolo, e refeições são oferecidas em restaurantes e hotéis custeados pela prefeitura. Como prefeito, todos os gastos extras, eram pagos pelo próprio dinheiro, Juarez não utilizava recursos públicos ou carros oficiais em viagens, gastou cinco carros particulares durante o seu mandato, “eu não viajava em carros da prefeitura não, só em Brasília que ia no oficial”, durante o tempo na prefeitura, teve apenas duas diárias – reembolso do valor gasto em viagens à serviço - que mesmo assim eram da câmara de vereadores, pois na época eles não tinha verba, quem pagava era a prefeitura, então teve as que os vereadores foram a Brasília e Goiânia com as despesas pagas pela prefeitura. Tanto que sua esposa conta passagens de quando viajavam a Goiânia para algumas reuniões, Nós íamos para Goiânia, em reuniões e hospedávamos lá na casa da Letícia minha cunhada, e mulher você sabe, chega à tarde e à noite queria sair, e a gente ia no carro da prefeitura, mas dava 18 horas o Juarez colocava o carro dentro da garagem e não saia, só usava carro da prefeitura para serviço da prefeitura.

Na época as primeiras-damas tinham apenas o cargo, mas não recebiam subsídios para exercer a função. Após uma lei federal todas passaram a ter o direito de receber para tal. Carmem destacou que naquela época, em 216


História da Família Manteiga

1984, teve uma reunião em Caldas Novas - GO com as primeiras-damas e dona Íris, então primeira-dama do Estado de Goiás. Foi quando começaram a receber salário, só que ela (Carmem) não recebia para o cargo, passando ser a única do estado a não usufruir do benefício, os vereadores de Campo Alegre de Goiás até fizeram um projeto, lei que foi vetada pelo então prefeito Juarez, alegando que não entrou na prefeitura para ganhar dinheiro e constituir patrimônio. Ao findar o mandato, Juarez relata que foi condecorado com alguns prêmios em homenagem aos feitos, considerado “um dos melhores prefeitos que investiu em saúde, em educação, entre os 10 melhores do Brasil”, recebendo alguns atestados e diplomas. Condecorações que não chegou a ir receber durante a administração, vindos posteriormente pelo correio, alegando que o município era pobre e não queria gastar com essas viagens. Até hoje é lembrado por todos os moradores como um dos prefeitos mais importantes da história da cidade.

11.4 - A rotina normal de vida e novos convites a política

Deixando a administração da cidade, a família continuou morando em Campo Alegre de Goiás, as crianças estudavam nas escolas do município. Além de ficar perto dos pais de Juarez, que já estavam idosos e com a saúde debilitada. Após o falecimento dos pais, voltaram para Catalão até mesmo por conta dos estudos dos filhos. “Juarezinho”, filho mais velho, estudou até a 4° serie em Campo Alegre, e se mudou para Catalão, Diogo e Thiago foram posteriormente junto com os pais. Além dos estudos dos filhos, a família dedicou à retomada dos negócios particulares.

Em Catalão, Juarez recebeu o convite feito pelo governador a ser 217


Raízes do Cerrado:

candidato a deputado estadual, ainda em período de campanha, faltando poucos dias para as eleições desistiu da candidatura. Alega que o governador não cumprir o que tinha prometido para os municípios que estavam o apoiando. Na época os correligionários do partido ficaram indignados com a desistência, pedindo para que esquecesse a mágoa. Juarez justifica que tem um mito, que deputado não faz nada, visitava a cidade apenas para garantir votos, e seu compromisso feito com o governador era de deixar benefícios antes da campanha eleitoral. Mesmo desistindo, ele afirma que obteve muitos votos na região, em 1990.

Juarez Álvares em Campanha para Deputado Estadual, comício em Campo Alegre de Goiás. Foto: Acervo particular de Carmem Massafera.

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História da Família Manteiga

Aproximando as eleições municipais de 1992, Juarez foi convidado pelo então prefeito Dr. Antônio Jácome Neto, esposo de sua sobrinha Maria Márcia, a se candidatar a sucessão. Aceitado o convite, iniciou novamente todo o processo eleitoral, fizeram diversas caminhadas, carreatas e comícios pela cidade, visitaram as fazendas do município. Chegado o dia da eleição, muita tensão e expectativa para a apuração dos votos, que foram levados para cidade de Ipameri, nesse ano ainda era votos em cédulas de papel e contados manualmente. O resultado do processo eleitoral não foi favorável à Juarez, dando vitória ao concorrente, quebrando o ciclo de continuidade de governos iniciado por Lázaro em 1966. Juarez encerrou sua carreira política como candidato naquele ano com o sentimento de dever cumprido, aceitando o resultado das urnas que era reflexo dos anseios da população, desejando bom êxito ao prefeito eleito, que tomara posse para o mandato de 1993 a 1996, mas que foi interrompido por processos políticos. Como empreendedor, Juarez voltou a cuidar de sua empresa de asfalto, participou de grandes negócios a nível nacional, onde chegou a ter obras espalhadas por todo o país. Nesse período a família já morava na cidade de Goiânia, Juarez cuidava da empresa juntamente com os demais diretores, até que com a crise nacional, algumas das instituições e prefeituras que contrataram suas obras, tiveram dificuldades em realizar os pagamentos, com a visão empreendedora onde acreditava que obra parada era dinheiro desperdiçado, Juarez concluiu todas as obras mesmo com as dificuldades financeiras que a empresa estava passando. Após isso, terminou sua sociedade na empresa. Em 2008, começou a ser sócio de uma extratora de calcário na cidade de Taguatinga do Tocantins, os investimentos na sociedade estão até os dias atuas. Os filhos casados com suas ocupações, Diogo é biomédico na cidade de Goiânia, exerceu o cargo de secretário municipal de Saúde em Cam219


Raízes do Cerrado:

po Alegre de Goiás, Juarez Filho administra a empresa de calcário para o pai na cidade de Taguatinga do Tocantins e Thiago, veterinário, administra a fazenda e foi prefeito de Campo Alegre de Goiás entre os anos de 2013 a 2016.

11.5 - De jovem enérgico a Prefeito Municipal: a trajetória de Thiago Manteiga

O menino Thiago sempre foi uma criança que se destacou dentre as demais, sempre muito inquieto e cheio de energia, com um olhar diferenciado para as pessoas, demonstrando atenção ao conversar com os mais velhos. Talvez por influência, Thiago quando pequeno via a figura do pai, prefeito da cidade, envolvido com política, cheio de eventos socais, englobando toda a família.

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História da Família Manteiga

Crescido e terminado os estudos fundamental e médio, foi prestar o vestibular para Medicina Veterinária na cidade de Uberaba – Minas Gerais, sendo aprovado mudou-se para a cidade ficando até concluir a faculdade. Passados isso, casou-se com a arquiteta Adrienne Kopp Ikeda Álvares. Thiago ficou cuidando da fazenda dos pais, exercendo a profissão de veterinário e fazendo pós-graduação na cidade de Catalão, a esposa manteve o escritório também em Catalão. Thiago sempre gostou de ouvir o programa de rádio “Voz do Brasil”, onde se atualizava das notícias do cenário político brasileiro, com um olhar crítico, a política e a forma como a sociedade é regida pelos governantes, brinca que sempre foi contra o pai ter sido prefeito e às vezes em conversas com amigos e familiares quando tocava em assunto de candidatura, brincava: “um dia, quem sabe”. Com o trabalho na zona rural como veterinário, foi ficando conhecido entre os fazendeiros e pequenos produtores, sempre questionava as políticas voltadas para o agronegócio nacional e principalmente no município, com isso diversos fazendeiros estimularam a sua candidatura a presidente do Sindicato Rural de Campo Alegre de Goiás, o qual teve apoio em massa dos filiados, o elegendo por dois mandatos seguidos. Como presidente destacou por proporcionar cursos profissionalizantes aos pequenos produtores, reerguendo a instituição, quitando suas dívidas que segundo ele, estavam com valor mais alto do que o arrecadado e a promoção de leilões de gado para incentivar o comércio pecuarista no município. Fato comum em cidades pequenas como a de Campo Alegre de Goiás, que ao se aproximar os pleitos eleitorais, especularem nomes de possíveis candidatos. Os nomes de membros da família Manteiga sempre estão entre os diversos lembrados, e não foi diferente com Thiago, que teve sua candidatura especulada em 2008, onde segundo ele não fazia parte de seus planos, sendo que a preferência era do então prefeito José Lourenço 221


Raízes do Cerrado:

Peixoto – O Bolinha, que iria concorrer a reeleição, tinha o ex-prefeito Luiz Manteiga como vice em seu mandato que renunciou o cargo, mas apoiou junto com a família, a campanha. Sem estarmos planos de Thiago Manteiga a eleição municipal de 2008 continuou sua rotina, naquele ano o prefeito apoiado pela família, foi derrotado e a prefeitura passou o comando para a esposa do ex-prefeito, que era candidato, mas foi barrado pela Lei da Ficha Limpa, por processos de improbidade administrativa, nos mandatos anteriores. Passado o período eleitoral e o início do novo mandato, Thiago permaneceu na presidência do Sindicato Rural agradando o setor agropecuarista da cidade. As especulações políticas não paravam dentre os munícipes, em 2010 na campanha à deputado estadual e federal, Thiago e família mostraram forças, apoiando a seus candidatos, que também tiveram apoio maciço da população. Ao ser perguntado sobre sua intenção em candidatar-se no pleito de 2012, comenta que mesmo sendo citado pela população como provável candidato, ainda não fazia parte de seus planos, além do mais, ele e o partido estavam alinhados para apoiar um forte nome à prefeitura. Com o passar dos meses e encerrado o processo de filiações concluíram que a opção do partido de candidato não havia sido filiada. Checaram que o pré-candidato havia se filiado em outro partido junto com alguns colegas políticos. Thiago como gostava de política, sabia que o partido escolhido era da base atual do governo estadual, sendo aliados à prefeita da época, o que poderia complicar no lançamento do nome optado pela família. A teoria foi certeira, o possível candidato não pôde ser do partido, devido os dirigentes optarem por apoiar a prefeita à reeleição. Thiago começou a pensar e foi atrás do presidente do PMDB de Campo Alegre de Goiás, que na época também era vereador. Marcada a reunião, averiguou a situação do partido e se o mesmo tinha algum outro nome a concorrer o cargo, sendo as respostas negadas, se propôs a can222


História da Família Manteiga

didatar-se a prefeito naquele ano e se tivesse apoio do presidente e membros do partido. Depois, conversou com a esposa Adrienne, que a princípio questionou o marido, mas apoiou a decisão, pois era algo que ele sempre gostou e comentou, mesmo não esperando que fosse tão recente. Thiago conversou com o pai para saber de sua opinião, que, logo foi contra, mas disse que se fosse a vontade do filho, o apoiaria. Reunião após reunião, chega o dia de registrar a candidatura, muitos da cidade já se demonstravam empolgados pelo novo candidato, Thiago foi considerado o candidato a prefeito mais jovem da história da cidade, apenas 32 anos. Sua candidatura logo tomou gosto pela parte jovem da população e os mais velhos o viam como a chance da continuidade do legado do pai Juarez. Thiago iniciou a campanha com 3% das intenções votos contra 79% da candidata a reeleição, seria uma eleição pouco provável como mostrada na primeira pesquisa eleitoral. Conta-nos que, foi buscar o resultado da pesquisa em Goiânia com três marqueteiros, e saiu de lá sem nenhum. Levantando às cinco da manhã para fazer campanha na zona rural e voltando às três da tarde para iniciar os compromissos da cidade. Thiago teve apoio de diversos cabos eleitorais anônimos que sempre o ajudavam, apoio da família que foram seus marqueteiros e da esposa, que estava esperando a segunda filha do casal. 90 dias de campanha, diversas carreatas, comícios, reuniões em bairros, até em cima de tamboretes como a reunião na Vila Aurora relembrando os tradicionais comícios do pai e dos tios, a cada dia aumentando o número de frequentadores. Os comitês montados nos bairros recebiam inúmeras pessoas durante todos os dias, muitos iam para aproveitar e encontrar um amigo, um compadre e conversar. Nos dias de grandes eventos políticos pessoas saíam de suas fazendas para participar e ouvir as propostas do então candidato. Tanta correria que Thiago foi duas vezes ver a filha recém-nascida no hospital. No dia do parto estava marcada uma reunião no bairro Santa 223


Raízes do Cerrado:

Catarina, foi para o hospital acompanhar a esposa e voltou para Campo Alegre de Goiás para cumprir sua agenda eleitoral daquele dia, só depois pode voltar pra junto da esposa e da filha. Relata que chegando lá, o cansaço o fez dormir durante toda a noite. Segundo ele, durante todos os dias de campanha, parou para descansar apenas três vezes, mas ao mesmo tempo em que curtia o descanso já programava os próximos dias. O dia de um candidato não terminava às 22 horas, quando se fechava o comitê. Algumas vezes tinha algum eleitor marcado para visitar, que por algum motivo particular pedia para que a visita fosse um pouco mais a noite, outras vezes após esse horário os candidatos a vereadores e os dirigentes de campanha se direcionavam para sua casa, para tratar das metas dos próximos dias, e nessas reuniões Thiago conta que sempre foi realista para os participantes quanto aos números das pesquisas. Faltando pouco menos de 10 dias para as eleições, uma nova pesquisa foi encomendada e detectou a virada do processo, dessa vez a chapa de Thiago estava com 24% à frente da candidata à reeleição. Na quinta-feira que antecedia a eleição, um grande comício foi montado de encerramento da campanha, foi perceptível o número de pessoas que estavam presentes, muitos pela primeira vez, outras pela décima vez e alguns que o acompanharam desde a primeira reunião de convenção. No dia da eleição a cidade amanheceu com o povo nas ruas, os correligionários de Thiago se mobilizaram entre eles, para que fossem às praças e avenidas vestidos com as cores que identificassem o partido. A cidade estava tomada por pessoas vestidas de vermelho, amarelo e laranja. Os simpatizantes que concorria à reeleição estavam de azul, de forma acuada, devido a grande manifestação da oposição. Às 17h00min do dia 7 de outubro de 2012 as urnas de todo os colégios eleitorais foram fechadas e começaram a emitir os boletins de urna. Grande correria de um lado e de outro, muitos na porta dos candidatos, outros por receio de resultado foram para suas casas esperar, os que se mantiveram imparciais durante a campanha observavam todo aquele 224


História da Família Manteiga

movimento, afinal cidade pequena em dia de eleição é um dia de reencontros e de grande fluxo de pessoas. Por volta das 17h20min saia o resultado dos principais centros eleitorais, todos davam vitória a Thiago Manteiga, a praça principal da cidade estava tomada pelos eleitores, de e logo o prefeito eleito chegou, o povo já o tomou nos braços e uma grande carreata se iniciou pelas ruas da cidade, relatos citam que a festa da vitória se estendeu noite adentro. Passada a euforia da campanha, Thiago tirou alguns dias para descansar com a família, curtir a filha recém-nascida e ao mesmo tempo organizar sua nova vida. Além do mais, seriam quatro anos de muito trabalho dedicados ao município de Campo Alegre de Goiás. Ainda sem ter tomado posse, marcou reuniões em Brasília com representantes de ministros, deputados e começou a articular sua equipe de governo. Logo pela manhã do dia 01 de janeiro de 2013 estava marcada a posse do décimo oitavo mandato à prefeito da cidade, que durante a cerimônia fez discurso emocionado, agradecendo a todos os votos que obteve e jurando obedecer à Constituição e a Lei Orgânica do Município, ressaltando que a partir daquele dia seria prefeito para todos, sem distinção de sigla partidária, classes socais, cor, religião, orientação e demais grupos classificatórios da sociedade atual. Seu mandato foi marcado pela tentativa de emancipar o povo dos cabides eleitorais, promovendo ações em que a população se beneficiasse da prefeitura sem ser em troca de votos. Assim Thiago buscou gerar empregos para a cidade, indo atrás de grandes empresas a fim de buscar investimentos. Adquiriu um terreno para a implantação do Distrito Industrial de Campo Alegre de Goiás, marcou reunião junto a diversas empresas na cidade de São Paulo - SP, onde foi recebido pelos diretores e os mesmos ficaram empolgados com a proposta do município. Mas quando perguntavam sobre a existência de rede de esgoto, os diretores logo dispensavam devido a perca do controle de qualidade ambiental exigida pelas empresas. Viu a necessidade de implementar na cidade a rede de esgoto, com auxílio 225


Raízes do Cerrado:

de membros do Partido dos Trabalhadores, foi à Brasília em busca de recursos. O município entrou na lista das cidades contempladas pela rede, no programa do Governo Federal. Um processo longo, de diversas licenças ambientais, projetos, até que em 2016 foi liberado o início das obras, para a concretização do sonhado benefício, Thiago lembra que “aconselhado a deixar a obra de lado por próprios companheiros, porque eles alegavam que era uma obra que ia ficar enterrada e ninguém ia ver, mas não pensei no hoje, foi no futuro da cidade, e saneamento básico é saúde pública, não era uma obra pra mim.”.

Cerimônia de lançamento das obras da Rede de Esgoto município. (na foto: Márcia – superintendente da FUNASA, Daniel Vilela – deputado Federal, Pedro Chaves – deputado Federal, Thiago Manteiga e sua esposa Adrienne Ikeda. Ao fundo: vereadores Margarida Morais, Euler, Deusmar e Deusmar Barbosa. Foto: Acervo Particular de Marcos Rossiny. 2016.

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História da Família Manteiga

Thiago muito lutou pela saúde do município, vizinho a cidade de Catalão, com maiores recursos laboratorial e hospitais, fez parceria para mandar a população no que fosse necessária, mas se preocupou em dotar o Hospital Municipal com novos equipamentos, médicos especializados, aquisição de mais carros para a frota da saúde. Todos os dias a prefeitura mandava pacientes para tratamentos em diversas cidades, tais como Barretos – SP, Goiânia-Go, Brasília-DF e outras do próprio estado. Além de construir três Unidades Básicas de Saúde com verbas adquiridas do Governo Federal. Na educação priorizou a qualificação profissional dos professores e também dos estudantes, fazendo parcerias com instituições de ensinos e aparelhando as escolas. Um olhar na agricultura dando auxílio ao pequeno produtor, com empréstimo de máquinas agrícolas, auxiliou na produção de silos, abertura e reformas de estradas (algumas delas tinha cerca de 10 anos que não recebiam auxilio da prefeitura), construção de pontes e mata-burros para facilitar o escoamento da produção, além da construção da feira coberta do produtor rural, um espaço para que os pequenos produtores vendessem seus produtos oriundos da agricultura familiar. Na ação social, regido pela sua esposa, dedicou-se a disponibilização de cursos para gestantes, profissionalizantes, palestras, assistências aos mais necessitados com auxílio dos programas governamentais, e uma nova gestão e forma de gerir o Abrigo dos Idosos, implantado pela ex-primeira-dama Carmem e mãe do prefeito Thiago, uma reforma completa em toda a estrutura do abrigo, com acessibilidade, além de proporcionar aos internos uma melhor qualidade de vida. Outras obras foram lembradas por Thiago, como construção de ginásio de esportes e quadras poliesportivas, aquisição de maquinários agrícolas, calçamento de ruas da cidade, reflorestamento de nascentes, doação de kits escolares, dentre inúmeras outras obras e ações que foram espalhadas pela cidade. 227


Raízes do Cerrado:

Prefeito Thiago Manteiga discursando durante a inauguração do Centro de Referencia de Assistência Social. Foto: Acervo Particular de Marcos Rossiny. 2016.

Ao se aproximar o período eleitoral recomeçam as especulações políticas. Na cidade novos nomes surgiam, e o que todos esperavam era a candidatura de Thiago a reeleição. Mas segundo ele, sempre foi contra o prolongamento de mandato com reeleição em todas as esferas do poder, cita a importância da alternância dos políticos, e faltando pouco mais de um ano para o período eleitoral, reuniu sua família e perguntou sobre o interesse de alguém sair candidato para sua sucessão. Não houve interesse entre a família e Thiago marcou uma reunião com o secretariado e membros de governo para anunciar que não seria candidato à reeleição e anunciou que iria apoiar algum candidato que fizesse parte do partido e do governo. Logo veio o nome do vereador e presidente da Câmara, Euler Guimarães, que no processo eleitoral recebeu apoio de Thiago e da família Manteiga, mas talvez por tradição, não foi eleito. Tradição, porque se analisarmos os quadros eleitorais desde as eleições de 2004, percebemos que a população não reelege prefeito e/ou elege candidato da base do atual 228


História da Família Manteiga

governo, coincidência ou não, Thiago Manteiga acredita que chegará um dia onde não se poderá mais ter reeleição. Terminado seu mandato, Thiago retornou à sua rotina, voltou para a fazenda Pirapitinga e exercendo a profissão de veterinário e a esposa voltou para seu escritório de arquitetura. Ao ser questionado sobre sua possível volta, diz que não faz parte dos seus planos, pois, se sente magoado com o regime político e a forma de barganha que é regida a política, também cita a respeito dos companheiros, àqueles que o aplaudiram durante os quatro anos de governo e atualmente sequer o cumprimenta, segundo ele “Hoje não tenho vontade de voltar pra política, tive muito desgosto com ‘traição’, vejo pessoas que estavam com a gente e hoje está lá abraçado, não compactuo com esse tipo de atitude, porque quando você fala que não quer mais o poder as pessoas começam a te desrespeitar, e isso aconteceu, temos que respeitar a pessoa não pelo que ela tem, vou contra o ditado popular que o homem é o que tem, por isso, desencantei da política.”

11.6 - Álbum de família:

Carmem, Thiago, Juarez, Juarez Filho e Diogo. Formatura de Thiago. Foto: Acervo Particular de Carmem, 2004.

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Raízes do Cerrado:

Maria Emidio, Juarez Filho (no colo), Juarez, Carmem e Sebastião. Foto: Acervo particular de Carmem.

Juarez Álvares discursando durante campanha de Henrique Santillo ao governo do Estado de Goiás. Foto: Acervo particular de Carmem.

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História da Família Manteiga

Juarez e Carmem. Foto: Acervo particular de Carmem.

Juarez Filho, Diogo Álvares e Thiago Manteiga. Foto: Acervo particular de Carmem. 2016.

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Raízes do Cerrado:

Juarez Manteiga, Maria Eduarda, Livia, Juarez Filho.. Foto: Acervo particular de Juarez Filho. 2019.

Chá de bebê do neto de Juarez Álvares: Augusto Manteiga. Na foto: Pedro Manteiga, Juarêz Manteiga, Lívia Martins, Juarez Filho, Carmem Massafera, Sofia Álvares, Jucyara do Valle, Juarez Álvares, Diogo Álvares, Adrienne Ikeda e Thiago Manteiga. Foto: Acervo particular de Diogo Álvares. 2018.

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HistĂłria da FamĂ­lia Manteiga

Adrienne, Thiago Manteiga, Sofia e Pedro Manteiga. Foto: acervo particular de Adrienne, 2019.

Jucyara, Diogo e Augusto Manteiga. Foto: acervo particular de Jucyara, 2019.

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História da Família Manteiga

Capítulo XII Manteigada – a continuação de um legado Vimos no decorrer do livro que a família está em primeiro plano, entre os filhos de Sebastião Ferreira Álvares da Silva e Maria Emídio Álvares, ensinamento pregado pelos pais e que vai passando de geração a geração. O apelido Manteiga, advindo de Sebastião Manteiga, propagou pelos membros da família, e atualmente passou a ser sobrenome da família. Novos membros estão recebendo “Manteiga” em sua assinatura e outros entraram com ações judiciais para acrescentar. Uma forma de homenagear o patriarca da família, que através de sua fabriqueta de manteiga iniciou o patrimônio, sustentou e educou os 10 filhos. Mais adiante, na genealogia da família, poderemos perceber o crescente número da assinatura Manteiga nos nomes, os que não têm em registro, se auto denominaram com a assinatura. Uma família muito unida e festeira, mas com o passar dos anos e os compromissos de cada membro, foram pouco se encontrando, e após a morte de Sebastião Manteiga e dona Maria, a família foi perdendo o costume de se encontrarem e também muitos foram casando, formando suas famílias, morando longe, dificultando ainda mais os encontros. Diante tais fatos, a família passa a se encontrar apenas em momentos ruins, como na morte de parentes. E como esse nunca foi o intuito do casal Sebastião e Maria, que sempre prezaram por encontros familiares alegres, os primos Thiago, Luiz Filho (Goteira) tentaram a princípio montar uma festa para reunir a família. Clóvis Júnior cita que a ideia do nome surgiu também para homenagear o avô e resgatar a memória da família, 235


Raízes do Cerrado:

tanto é que a festas de famílias e encontros anuais, geralmente são denominados como “Encontro da Família X”, por exemplo, e no caso em estudo, denominou-se “Manteigada”.

Para Maria Cristina Caminha de Castilhos França (2009), a festa

de família “resulta da iniciativa de reestruturação da árvore genealógica, nas quais muitos parentes não se conheciam ou desconhecia a existência de laços familiares e de parentesco com determinadas linhagens. (p.23)” porque são em encontros como esse que a família que estava afastada, volta a reunir e a conhecer os novos membros, novos primos que ainda eram desconhecidos entre os parentes. Além claro, de prestar homenagem e manter sempre presente a memória dos patriarcas familiares, e os entes que já se foram. Com a festa, parentes que estavam dispersos em várias cidades, se encontram todos num mesmo local.

A Manteigada surgiu em 2008, com sua primeira edição, difícil de

fazer, reunir toda família novamente em uma data que todos ou a maioria poderia participar era um novo desafio. Quem fez toda a interlocução e recepção dos que aceitaram o convite foram o Thiago Manteiga e seu primo Luiz Filho - o Goteira, com a ajuda de Juarez e Luiz Manteiga, que sediou o evento em sua fazenda. Na primeira reunião da família, certamente a cada chegada de um membro convidado na fazenda, era uma nova lembrança: a tia que veio de longe, o primo que não via desde a infância ou aquele que se encontrou em momentos tristes, agora reunidos para celebrar a união da família, homenagear a memória de Sebastião e Maria.

É quase que um rito, presente desde a primeira edição, os convi-

dados chegam na sexta a tarde e durante a noite, já são recebidos pelo anfitrião, na mesma noite já é servido um jantar, uma bebida, organiza-se as acomodações, os mais velhos priorizam os quartos do interior da casa, os mais novos se organizam em barracas. Rodas de conversas são formadas, 236


História da Família Manteiga

tios socializando com os sobrinhos, primos com os primos, conversas, histórias, risadas vão tomando conta da noite. A cachaça produzida pela família está sempre ali presente, ora na mão de um primo servindo “uma dose” para cada convidado, outrora exposta na mesa para quem desejar “dar uma bicadinha”, mas não é servido apenas a cachaça do alambique familiar, faz parte da festa a cerveja, o Chopp, que entre um gole e outro vai embalando o primeiro dia de festa, os mais jovens ligam o som, os tios se escondem do frio na sala da casa, afinal a festa é realizada no mês de julho, período com temperaturas baixas.

No segundo dia, logo pela manhã, alguns membros ainda chegam,

o farto desjejum é servido que nos faz relembrar Dona Maria e sua fartura em quitandas para agradar os netos e filhos. Ainda de manhã geralmente é celebrada uma missa, ou em outros encontros uma oração ecumênica, quando é feita a primeira, realiza-se também batizados, que já faz parte dos ritos da família batizar os filhos na “Manteigada”. Alguns membros fizeram o ritual do batismo nas edições do evento: Thiago, Luiz Filho, Lorena, Lilian e certamente outros, quando realizado a segunda opção, faz a partilha de uma passagem bíblica, preparada por alguns primos, onde refletem sobre a importância da família e da união.

Passado o momento religioso, continua a confraternização, bebi-

das, som e comida animam a festa, mas as rodas de conversas e o resgate da memória são as atrações principais. É sempre possível ver um grupo de primos relembrando algum episódio que aconteceu na infância, novos membros da família sendo apresentados. Acontecem até mesmo de ser o primeiro contato com a família do namorado/a da/o prima/o, reunião importante para os mais velhos conhecerem os jovens e encontrá-los em momentos divertidos e descontraídos.

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Raízes do Cerrado:

Celebração Eucarística durante a edição da Manteigada. Foto: Acervo particular de Mariana Álvares.

Todas as edições da Manteigada eram compartilhadas entre os membros, um festeiro era escolhido, a data era priorizam o mês de julho, devido às férias escolares, depois “organiza-se a comissão que trabalhará para o próximo encontro” (FRANÇA, 2009, p.77), busca-se durante todo ano a preservação do encontro, para que possa participar o máximo de membros possíveis. Os gastos com a festa são pagos por meio de contribuição dos membros que se farão presente. Meses antes são cotados os gastos e dividido entre todos os participantes. A ideia de fazer com que a festa fosse de forma rotativa, é para alternar os roteiros e os encontros. A cada edição, um novo festeiro é apresentado, que na oportunidade já convida todos os presentes. Recentemente por logística de espaço, foi definido que as próximas edições serão realizadas na Fazenda Pirapitinga em Campo Alegre de Goiás, alternando somente os festeiros. Mas a nova sede do encontro carrega em si um importante requisito, afinal, foi a fazenda adquirida por Sebastião Manteiga e Maria, onde esforçaram e criaram os 10 filhos. Hoje a sede antiga está submersa devida o represamento do Rio 238


História da Família Manteiga

São Marcos, mas a memória está ali presente. Desde a criação, apenas no ano de 2009, não foi realizado o encontro. A morte de Lázaro Álvares da Silva Campos, que até então era considerado por muitos o chefe da família, por ser o mais velho. Mesmo assim alguns primos se reuniram na fazenda de Juarez na mesma data, para não deixar que o encontro se perdesse, alegando a dificuldade para iniciar o encontro. Thiago lembra que, Muitos não queriam que fizesse a festa esse ano, porque morreu a tia freira, e teve um ano que não teve, porque morreu o tio Lazaro, e o Edésinho mais a Maria Inês queriam que fizesse a Manteigada naquele ano, mas todos os tios pediram para não fazer, e eles queria que fizesse e no ano que não teve eles vieram a falecer de acidente, no mesmo ano, os dois que queriam que fizesse a festa morreram. Ai a partir daí fizemos todos os anos, inclusive ano passado a tia Valdeci faleceu e o Felipe neto dela era o festeiro, aí nos conversamos com a Margareth e a Elizabeth elas aceitaram fazer, esse ano (2019) alguns queriam que não fizesse novamente, porque faleceu a tia Lazarina.

Onze edições da Manteigada foram realizadas até o ano de 2019 (ano de realização da pesquisa). Veja abaixo a relação do ano com os festeiros: 2008 – Fazenda antiga de Luiz Manteiga Álvares de Campos, realizado por Luiz Manteiga Álvares de Campo Filho (Goteira) e Thiago Manteiga Álvares da Silva; 2010 – Realizada na nova Fazenda de Luiz Manteiga Álvares de Campos, sendo preparada por ele e sua família; 2011 – Realizada por Juarez Álvares da Silva e família em sua fazenda; 239


Raízes do Cerrado:

2012 – Realizada pelo senhor Evandro, na cidade de Paracatu-MG; 2013 – Realizada por Emídio Ferreira Álvares da Silva e sua família, na fazenda próximo a cidade de Campo Alegre de Goiás; 2014 – Realizada por Alessandra Borges, na cidade de Bela Vista – Goiás; 2015 – Realizada por Valdeci e suas filhas, na fazenda Posse, em Campo Alegre de Goiás; 2016 – Realizada por Cláudio, Rubens e Eliana, na cidade de Brasília – DF; 2017 – Realizada por Heloana e Pedro, na cidade de Ceres – Goiás; 2018 – Realizada por Thiago Manteiga e Felipe Vaz, em Três Ranhos – Goiás; 2019 – Realizada por Thiago Manteiga e Diogo, na fazenda Pirapitinga em Campo Alegre de Goiás. Mais que apenas um encontro, a reunião celebra a unidade familiar, diversas pessoas citaram a importância dessa união e dos resgates históricos com a memória da família, como nos relatos a seguir de seus membros:

“A nossa reunião está virando tradição já, ajuda a não acabar a família, a preservar a história, estreitar os laços, porque se ir deixando de lado acaba a família. ” Destacou Alberto.

“Acho importante, tem que continuar, mas não é só beber cachaça não, é muito importante para os mais velhos conhecer os jovens e encontrar em momentos bons, porque geralmente só encontra em momentos ruins, e acho que família tem que estar sempre junta. Porque os mais 240


História da Família Manteiga

velhos vão embora daí a família vai se distanciando se dispersando, porque é o fato, e tendo o encontro criado pelos primos, e nos vemos todos pelo menos anual, é muito bom, até hoje não faltei nenhum. Sempre marcamos a data um ano antes, sempre no mês de julho porque é mais fácil férias escolares. E eu acho maravilhoso, é muito importante, e esse livro mais importante ainda, cada um falar não ter medo de expor, falar a realidade, as dificuldade, igual meu pai e minha mãe foi uma vida boa mas tiveram muitas dificuldade, aperto, ralação, mas superaram, com muita luta muita garra, não é só flores, as vezes tem familiar quer contar só as glorias, temos que contar um pouco dos espinhos, se não fica um livro real, sou muito a favor do livro de preservar a nossa história a nossa memória.”, relata Margareth.

“É uma forma de união, meu filho hoje pequeno não entende, mais, é no convívio que crescemos aprendendo a valorizar a família. ” Lorena.

“Temos a Manteigada todos os anos para nos reunirmos, família muito unida, em todos os momentos. Quando os avós eram vivos, era sagrado, tínhamos que reunir nas festas de fim de ano, não tinha esse negócio de faltar um ou outro, tinha que está todo mundo, depois que eles faleceram que foi perdendo mais esse costume, cada um toma uns rumos, por isso é importante nos reunimos, fazemos memória a eles, e também dei a maior força de escrever nossa história para que as próximas gerações vejam como era unida nossa família. ”, diz Marise.

“É muito importante reunir todos, conhecer os novatos, é tanta criança que nasce que temos a oportunidade de conhecer nesses encontros. E quem não tem história, não tem vivência”, por Letícia.

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Raízes do Cerrado:

“Mas a convivência da nossa família é assim, me sinto feliz quando estou aqui, traz uma saudade muito grande, a fazenda onde era a casa deles, está de baixo de água por conta da barragem, durante o dia só vê a copa das arvores seca. A nossa infância aqui foi muito boa, e vindo aqui, me encontro, relembro de tudo, além de confraternizar com nossos sobrinhos e irmãos. ”, por Mafalda.

“É uma reunião onde se tem uma missa, tem uma conversa, troca de ideias, relembra histórias, lembram dos avós. ”, por Clóvis Júnior.

Sendo assim, percebemos o quão importante é o encontro para a

preservação da família Manteiga. Mais que um momento de diversão, a “Manteigada” se concretiza como um espaço para a memória e a construção de novas histórias, onde a cada edição novos membros se apresentam e novos momentos vão sendo vividos, em uma história que não se tem fim, apenas o início, bem atrás, com Sebastião e Maria, com seus costumes de reunir os filhos nos almoços de domingo, posteriormente com suas famílias, em datas comemorativas. Agora, o terceiro domingo do mês de julho de cada ano, é reservado para esse encontro, que já faz parte do calendário de eventos da família e é aguardado por todos os membros.

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História da Família Manteiga

Álbum de família:

Manteigada de 2018. Foto: Acervo particular de Thiago Manteiga.

Manteigada 2011. Foto: Acervo particular de Thiago Manteiga.

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RaĂ­zes do Cerrado:

Manteigada 2017. Foto Acervo particular de Thiago Manteiga

Manteigada 2019. Foto: Acervo particular de Juarez Filho.

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História da Família Manteiga

Capítulo XIII De geração a geração – A Castelo Branco como patrimônio familiar

A tradição está presente no contexto familiar de todas as famílias, em como se comemora as datas especiais, de como transmitem as lendas os costumes, as crenças, as memórias, os hábitos, coisas que persistem ao longo dos anos, das décadas e dos séculos, assim a tradição é a cultura da família. Nesse sentindo, temos a tradição, como uma dimensão necessariamente conservadora: o presente repetiria o passado através daquilo que dele herdou. Por meio disso, vemos o gosto pela cachaça e a fabricação da mesma, que tem um grande histórico na família. A história da cachaça na família Manteiga começa bem antes da atual geração que a conduz com muito êxito. Para Mariana Lacerda (2018), A cachaça é o caldo de cana fermentado e destilado, teria sido inventada ao acaso, no Brasil colonial e açucareiro. 245


Raízes do Cerrado:

Constata-se que desde o ano de 1780, Joaquina de Pompéu, antecedente genealogicamente de Sebastião Ferreira Álvares da Silva, produziu em sua fazenda, uma aguardente por meio de uma pequena fabriqueta caseira. Com os anos e as gerações, a continuidade da fabricação da aguardente com os pais de Sebastião, mas ainda é feita de forma pequena e caseira. Mas ela ganhou força a partir de 1947, quando montou sua fabriqueta de cachaça no município de Campo Alegre de Goiás, uma produção pequena cerca de 130 litros por dia, feita de forma artesanal, movida pela tração dos bois. O nome Castelo Branco faz homenagem a Joaquina Bernarda Silva de Abreu Castelo Branco Souto Maior, a primeira a empreender a fabricação de cachaça na família ainda no século XVIII. A partir da fábrica de cachaça de seu Sebastião Manteiga, os filhos começaram a trabalhar e ficar responsáveis pela produção. Herdada do pai Manuel do Pará os conhecimentos de como se produzir uma cachaça de qualidade, Sebastião transmitiu aos filhos Lázaro, Orazal, Juarez, Emídio e Luiz os manuseios e os processos da produção. No início, os filhos auxiliavam no processo, engarrafamento, lavagem das garrafas e curiosos, iam prestando atenção em cada detalhe da preparação e armazenamento da aguardente. A fábrica logo cresceu chegando nos primeiros anos a produzir 25 mil litros de cachaça, passando a ser a única indústria da região e a primeira de Campo Alegre de Goiás. Para se ter uma comparação, atualmente a produção da cachaça chega a 1000 litros por dia. Logo a produção da cachaça passou a ser gerenciada pelo filho Lázaro, que tomou conta do processo até dois anos após o casamento, passando a fabricar sua própria cachaça, em sua fazenda, chamada de Último Desejo, no rótulo se tinha o destaque para o desenho de um velhinho jogando a bengala para cima e uma moça bonita do lado. 246


História da Família Manteiga

Rótulo da Cachaça “Último Desejo”. Foto: Acervo particular de Luiz Filho. 2019.

Após o casamento de Lázaro, a cachaça ficou por alguns anos sobre a gerência de Emídio, que tomou conta da produção e as lavouras de cana-de-açúcar, matéria prima do produto. Por motivos não relatados, Emídio passou a fábrica para a responsabilidade de Orazal, que cuidou e trabalhou até sua trágica morte.

Rótulo da Cachaça Castelo Branco de 1961. Foto: Acervo particular de Luiz Filho. 2019.

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Raízes do Cerrado:

Em 1968 a fábrica da cachaça Castelo Branco passou para gerência e administração de Luiz Manteiga Álvares de Campos, que na oportunidade deu uma melhorada no maquinário para a produção “Montou um conjunto locomóvel, alimentado pelo bagaço da cana. Como não existia energia elétrica no interior goiano, a caldeira gerava energia para tocar os engenhos e dois alambiques de serpentina que até hoje funcionam”. Após a gerência da Castelo Branco por Luiz Manteiga, o comércio da cachaça passou a expandir e novas marcas foram sendo atribuídas na fábrica, como o caso da marca Ipamerina, que Luiz comprou a marca da família do Coronel João Vaz. Também produzida pela família, a marca Brazinha, passou a ser conhecida no mercado de cachaça, através de seu registro. Toda a fábrica se encontrava na fazenda do senhor Sebastião. Com as obras do represamento do Rio São Marcos para a Usina Hidroelétrica Serra do Facão, o terreno foi inundado, levando à construção de uma nova sede para a indústria de aguardente e transferência dos equipamentos, barris e outros utensílios utilizados para a fabricação da mesma. Uma nova sede foi construída na Fazenda Forquia, de propriedade do senhor Luiz Manteiga.

Conjunto de Caldeiras para a produção da cachaça. Foto: Acervo particular de Luiz Filho. 2012.

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História da Família Manteiga

Maquinário elétrico e à vapor. Foto: acervo particular de Luiz Filho. 2012.

Em 2008 a fábrica foi passada para Luiz Álvares de Campos Filho, uma nova geração começa a ser responsável pela indústria familiar. Luiz Filho já trabalhava com o pai, recebendo os ensinamentos de como tratar e cuidar para que não perca a essência iniciada desde Joaquina de Pompeu.

Atualmente a fabricação já está modernizada e não utiliza a tra-

ção animal em seu processo, mas muitas características tradicionais ainda são conservadas. A marca Último Desejo iniciada por Lázaro, foi dada de presente a Luiz Filho pela sua tia Valdeci – viúva de Lázaro – para que fosse registrada em seu nome e entrasse para o holl das cachaças Castelo Branco.

Em 2016 uma edição especial foi lançada para comemorar os

50 anos da primeira Castelo Branco produzida na Fazenda Pirapitinga, a mesma foi engarrafada com rótulo e frasco especiais, para celebrar um momento de suma importância na história do alambique familiar. 249


Raízes do Cerrado:

Presente em todos os eventos de família, conhecida nacional-

mente, a Castelo Branco é hoje uma marca condecorada e premiada entre as melhores bebidas destiladas do país. Luiz Filho está sempre presente com as marcas nos eventos do gênero, fazendo com que ganhe ainda mais destaque na produtividade nacional. Podemos encontrar a cachaça em várias casas de famílias brasileiras, e principalmente da região de Campo Alegre de Goiás. Uma bebida simples, com o toque familiar, que vem passando de geração a geração.

O nome Castelo Branco se confunde com a família Manteiga,

impossível não associar o seu nome aos filhos de Sebastião, pioneiro da cachaça de alambique na região do sudeste goiano.

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História da Família Manteiga

Capítulo XIV Descendentes de Sebastião Manteiga e Maria Emídio Neste capítulo traremos a relação dos descendentes do casal Sebastião Ferreira Álvares da Silva e Maria Emídio Álvares. A relação é dada por ordem de nascimentos dos filhos.

1 - Lázaro Álvares da Silva Campos (em memória) Nasceu em 02 de Janeiro de 1929 e casou-se com Valdeci Eleutério (em memória) em 05 de junho de 1952. O casal teve duas filhas biológicas e uma adotiva: 1.1

– Elizabeth Eleutério Álvares Estrela nascida em 09 de setembro

de 1958. Casada com Edgard Rosa Estrela (em memória). Teve uma filha: 1.1.1 – Munique Álvares Estrela nascida em 23 de dezembro de 1994. 1.2

– Margareth Eleutério Álvares Vaz nascida em 20 de fevereiro de

1961. Casada com Weber Vaz Júnior. Teve dois filhos: 1.2.1 – Lorena Eleutério Álvares Vaz nascida em 25 de fevereiro de 1986. Casada com Renato Rodrigues Vieira. Teve dois filhos: 1.2.1.1 – Frederico Álvares Vaz Vieira, nascido em 14 de março de 2018. 1.2.1.2 – Lorenzo Álvares Vaz Vieira, nascido em 27 de julho de 2019. 1.2.2 Felipe Eleutério Álvares Estrela nascido em 03 de novembro de 251


Raízes do Cerrado:

1988. 1.3 – Anália Lima e Silva, nascida em 27 de outubro de 1957. Casada com Carlos Antônio da Silva. Teve um filho: 1.3.1 – Carlos Eduardo Ferreira Silva, nascido em 27 de outubro de 1997.

2– Lazarina Álvares da Silva (em memória) Nascida em 09 de Janeiro de 1930, dedicou-se a vida religiosa não tendo sucessão.

3– Maria Álvares da Silva (em memória) Nascida em 23 de julho de 1931, casada com Clóvis Silva (em memória). Teve dois filhos. 3.1– Denise Maria Silva, nascida em 22 de junho de 1961. 3.1.1– Diego Álvares Silva Eckstein nascido em 07 de julho de 1987. Casado com Daiana Cristina Correia. Teve dois filhos: 3.1.1.1 – Bernardo Álvares Eckstein, nascido em 18 de junho de 2014. 3.1.1.2 – Manuela Álvares Eckstein, nascida em 02 de abril 2018. 3.1.2 – Rodrigo Álvares Silva Eckstein nascido em 06 de maio de 1989. Tem uma filha: 3.1.2.1 – Maria Clara Ferreira Eckstein, nascida em 22 de abril de 2017.

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História da Família Manteiga

3.2

– Clóvis Silva Júnior nascido em 24 de maio de 1960. Casado com

Eliana Giglio Figueiredo Silva. Teve três filhos: 3.2.1 – Letícia Álvares Figueiredo e Silva, nascida em 04 de abril de 1992. 3.2.2 – André Álvares Figueiredo e Silva, nascido em 04 de outubro de 1995. 3.2.3 – Gabriel Álvares Figueiredo e Silva, nascido em 29 de abril de 1997.

4– Emídio Ferreira Álvares da Silva (em memória) Nascido em 30 de junho de 1933, casou-se com Gercina Cardoso da Silva (em memória). Teve duas filhas: 4.1 – Maria Inês Álvares da Silva (em memória), nascida em 15 de setembro de 1957, casada com Teófilo Álvares de Abreu e Silva. Tiveram um filho: 4.1.1 – Luciano Álvares de Abreu e Silva, nascido em 03 de novembro de 1989, casado com Patrícia Pereira Pires. Teve uma filha: 4.1.1.1 – Maria Clara Álvares, nascida em 28 de fevereiro de 2014. 4.2 – Maria Márcia Álvares Jácome (em memória) nascida em 02 de agosto de 1958. Casada com Antônio Jácome Neto. Teve filhas: 4.2.1 – Áurea Angélica Álvares Jácome, nascida em 04 de janeiro de 1978, casada com Edi Carlos Tavanti. Teve dois filhos: 253


Raízes do Cerrado:

4.2.1.1 – Gabriel Álvares Jácome Tavanti, nascido em 19 de setembro de 2009. 4.2.1.2 – Mateus Zaghi Jácome Tavanti, nascido em 26 de agosto de 2011. 4.2.2 – Angelita Álvares Jácome nascida em 01 de maio de 1979, casada com Cassicley da Costa de Jesus. Teve um filho: 4.2.2.1 – Antônio Costa Jácome, nascido em 08 de maio de 2014. 4.2.3 – Ângela Álvares Jácome, nascida em 21 de dezembro de 1980, casada com Robson Galvão Amicis. Tem um filho: 4.2.3.1 – Miguel Álvares Galvão Jácome, nascido em 26 de setembro de 2019. 4.2.4 – Andréia Álvares Jácome, nascida em 21 de abril de 1984, casada com André Luís Álvares Hec. Tem duas filhas: 4.2.4.1 – Beatriz Álvares Hec, nascida em 06 de abril de 2017; 4.2.4.2 – Márcia Álvares Hec, nascida em 23 de março de 2019.

5– Letícia Álvares Daher Nascida em 30 de junho de 1935, casada com Edésio Daher (em memória) em 27 de outubro de 1953. Teve quatro filhos: 5.1 – Edésio Daher Filho (em memória), nascido em 01 de setembro de 1954, casou-se com Ângela Maria Áurea dos Santos Daher. Teve duas filhas:

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História da Família Manteiga

5.1.1 – Ludmilla Áurea Daher Moreira, nascida em 19 de fevereiro de 1981, casou-se com Fábio Zanini Moreira. Teve dois filhos: 5.1.1.1 – Marco Daher Moreira, nascido em 22 de dezembro de 2008. 5.1.1.2 – Arthur Daher Moreira, nascido em 01 de setembro de 2011. 5.1.2 – Marília Áurea Daher, nascida em 03 de outubro de 1991. 5.2

– Elias Roberto Daher, nascido em 22 de setembro de 1956, casado

com Monica Santos Penteado Daher. Tem cinco filhos, sendo dois do primeiro casamento com Regina Luisa Viana Silva (em memória): 5.2.1 – Ana Carolina Viana Daher Dionísio, nascida com 19 de dezembro de 1981, casada com Leandro Dionísio. Tem uma filha: 5.2.1.1 – Lavínia Daher Dionísio, nascida em 16 de julho de 2009. 5.2.2 – Pedro Viana Daher (em memória) 5.2.3 – Vanessa Nasser, nascida em 26 de janeiro de 1998, tem uma filha: 5.2.3.1 – Iara Nasser Leite, nascida em 30 de março de 2017. 5.2.4 – Camila Nasser, nascida em 26 de janeiro de 1998; 5.2.5 – Miguel Luís Santos Daher, nascido em 01 de novembro de 2005 5.3 – Eliana Maria Daher nascida em 19 de janeiro de 1960, casou-se com Antônio Daher Filho (em memória). Teve um filho: 5.3.1 – José Augusto Daher, nascido em 27 de dezembro de 1982. 5.4 – Elaina Maria Daher Jardim, nascida em 09 de março de 1964. Casada com Reynaldo Jardim. Teve três filhos: 255


Raízes do Cerrado:

5.4.1 – Rafael Daher Jardim, nascido em 23 de abril de 1988. Casado com Nathália Fernanda de Moraes Buganza. Tem uma filha: 5.4.1.1 – Manuela Buganza Daher Jardim, nascida 5.4.2 – Gabriel Daher Jardim, nascido em 23 de abril de 1988; 5.4.3 – Micael Daher Jardim, nascido em 17 de outubro de 1989. 6 – Mafalda Álvares Campos

Nascida em 02 de maio de 1937 (nota-se que o registro é datado

de 24 de setembro de 1938), casada com Ruy Borges Campos em 08 de dezembro de 1960. Tiveram seis filhos: 6.1 – Rosiana Borges Campo Silva nascida em 01 de dezembro de 1961, casada com Hélio Albino da Silva. Tiveram três filhos: 6.1.1 - Heloana Albino Campos, nascida em 13 de fevereiro de 1993. 6.1.2 – Pedro Albino Campos, nascido em 21 de março de 1995. 6.1.3 – Mariella Albino Campos, nascida em 11 de julho de 1997. 6.2 – Robson Borges Campos nascido em 03 de agosto de 1964, casado com Rosangela Maria Ribeiro Campos. Teve três filhos: 6.2.1 – Sérgio Borges Campos Sobrinho, nascido em 11 de fevereiro de 1988. Casado com Laís Lara Fernandes de Campos, tem uma filha: 6.2.1.1 – Heloísa Fernandes de Campos, nascida em 19 de julho de 2018. 6.2.2 – Laura Ribeiro de Campos, nascida em 13 de março de 1990. 6.2.3 – Vitor Ribeiro Borges de Campos, nascido em 10 de junho de 2005. 256


História da Família Manteiga

6.3 – Mário Borges Campos nascido em 21 de março de 1963, casado com Gislainy Mendonça Campos. Tiveram três filhos: 6.3.1 – Marilha Borges Campos, nascida em 21 de outubro de 1984. Teve duas filhas, casada com Juliano Geraldellho: 6.3.1.1 – Isabela Campos Rabelo, nascida em 11 de março de 2006. 6.3.1.2 – Juliana Campos Geraldello, nascida em 11 de maio de 2017. 6.3.2 – Luiz Mário Borges Campos, nascido em 17 de maio de 1988, casado com Tayrine Alves Leão Campos. Teve um filho: 6.3.2.1 – João Pedro Borges Campos Leão, nascido em 22 de julho de 2018. 6.3.3 – Mayra Borges Campos, nascida em 28 de maio de 1990. 6.4 – Sérgio Borges Campos (em memória), nascido em 13 de fevereiro de 1966. 6.5 - Márcio Borges Campos nascido em 21 de abril de 1971, casado com Soraia Rodrigues de Souza Campos. Teve dois filhos: 6.5.1 – Ruy Neto Borges Campos, nascido em 28 de agosto de 2003. 6.5.2 – Luiza Borges Campos Souza, nascida em 18 de agosto de 2010. 6.6 – Alessandra Borges Campos Romano nascida em 13 de abril de 1971, casada co Ricardo Jesuino Romano de Souza. Teve três filhos: 6.6.1 – Mariana Romano Borges, nascida em 13 de maio de 1993. 6.6.2 – Felipe Romano Borges, nascido em 17 de julho de 1997. 257


Raízes do Cerrado:

6.6.3 – Ricardo Jesuino Romano de Souza Filho, nascido em 17 de outubro de 2007

7– Orazal Afonso Álvares (em memória) Nascido em 31 de janeiro de 1940, casou-se com Norma Martins Álvares. O casal teve quatro filhos: 7.1 - Sebastião Ferreira Álvares da Silva Neto, nascido em 22 de julho de 1966, casado com Vera da Silva. Teve três filhos: 7.1.1 – Patrícia Álvares da Silva nascida em 17 de julho de 1988, casada com Wellington Paixão Correia. Teve um filho: 7.1.1.1 – Nathan Álvares Corrêa da Silva, nascido em 14 de maio de 2018. 7.1.2 – Luís Fernando Álvares da Silva, nascido em 15 de fevereiro de 1992, casado com Aline Cálita Cirilo Costa Álvares. Teve um filho: 7.1.2.1 – Kauã Álvares Cirilo, nascido em 10 de março de 2018. 7.1.3 – Orazal Afonso Álvares Neto, nascido em 02 de fevereiro de 1994, casado com Anandra Lima de Oliveira. Teve um filho: 7.1.3.1 – Bernardo Afonso Álvares de Oliveira, nascido em 22 de fevereiro de 2017. 7.2 - Alberto Álvares da Silva nascido em 15 de fevereiro de 1969, casado com Dailma Gomes da Silva. Teve duas filhas: 7.2.1 – Isabela Gomes Álvares, nascida em 21 de março de 1997.

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História da Família Manteiga

7.2.2 – Gabriella Gomes Álvares, nascida em 16 de julho de 2012. 7.3 - Adalberto Álvares da Silva, nascido em 15 de fevereiro de 1969. Teve duas filhas: 7.3.1 – Marielly Álvares Barbosa, nascida em 24 de dezembro de 2013. 7.3.2 – Luana Álvares Barbosa, nascida em 24 de dezembro de 2013. 7.4 - Marise Álvares da Silva nascida em 17 de dezembro de 1972, casada com Elton. Teve três filhos: 7.4.1 - Leonardo Álvares Peixoto, nasceu dia 8 de maior de 1989, casado com Dagna Fonseca Peixoto Álvares. Tem um filho: 7.4.1.1 – Heithor Álvares Peixoto, nascido em 21 de dezembro de 2016. 7.4.2 – Ricardo Ferreira Álvares Peixoto, nascido em 05 de agosto de 1992. 7.4.3 – Vanessa Álvares Peixoto, nascida em 11 de fevereiro de 1992.

8– Luiz Manteiga Álvares de Campos Nascido em 19 de junho de 1942, casado com Marina Aparecida Porto Álvares em 27 de maio de 1957. Teve quatro filhos: 8.1 – Luiz Manteiga Álvares de Campos Filho nascido em 25 de junho de 1974, casado com Polyana de Fátima Santos. Tem dois filhos: 8.1.1 – Luiz Manteiga Álvares de Campo Neto, nascido em 14 de outubro de 2009. 8.1.2 – Helena Álvares de Campos, nascida em 31 de março de 2018 259


Raízes do Cerrado:

8.2 – Lilian Porto Álvares de Campos Mastrella, nascida em 27 de fevereiro de 1980, casada com Bruno Mastrella Martins Silva. Teve três filhos: 8.2.1 – José Luiz Álvares Mastrella, nascido em 06 de outubro de 2008. 8.2.2 – Beatriz Álvares Mastrella, nascida em 14 de abril de 2012. 8.2.3 – Valentina Álvares Mastrella, nascida em 05 de junho de 2018. 8.3 – Laís Porto Álvares de Campos Sverberi Assumpção nascida em 21 de maio de 1972, casada com Emerson Sverberi Assumpção. Teve três filhos: 8.3.1 – Arthur Campos Sverberi Assumpção, nascido em 31 de maio de 2006. 8.3.2 – Lavínia Campos Sverberi Assumpção, nascido em 10 de março de 2009. 8.3.3 – Luana Campos Sverberi Assumpção, nascido em 03 de junho de 2013. 8.4 – Marina Porto Álvares de Campos, nascida em 26 de janeiro de 1984.

9 - Anirazal Álvares de Pádua Nascida em 24 de setembro de 1945, casada com Mozart Cardoso de Pádua (em memória) em 13 de setembro de 1969. Tiveram quatro filhos: 9.1 – Claudio Álvares de Pádua nascido em 30 de junho de 1970, casado com Vanuza Cristina Lima de Sá. Tem três filhos, sendo dois do primeiro casamento com Letícia Nacruth:

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História da Família Manteiga

9.1.1 – Danilo Nacruth de Pádua, nascido em 26 de maio de 2000; 9.1.2 – Álvaro Nacruth de Pádua, nascido em 20 de dezembro de 2006; 9.1.3 – Rafael Sá Álvares de Pádua, nascido em 08 de junho de 2007. 9.2 – Ronald Álvares de Pádua nascido em 26 de julho de 1971, casado com Sirlene Ferreira de Pádua. Tem dois filhos: 9.2.1 – Gustavo Ferreira de Pádua, nascida em 06 de fevereiro de 2000. 9.2.2 – Geovanna Ferreira de Pádua, nascido em 21 de maio de 2009. 9.3 – Rubens Álvares de Pádua nascido 28 de agosto de 1974, casado com Eliane Macedo da Cruz Pádua. Tem duas filhas: 9.3.1 – Thaís da Cruz Pádua, nascida em 24 de janeiro de 1998; 9.3.2 – Júlia da Cruz Pádua, nascida em 26 de fevereiro de 2003. 9.4 – Gláucia Álvares de Pádua, nascida em 27 de fevereiro de 1976.

10– Juarez Álvares da Silva Nascido em 10 de abril de 1948, casou-se com Carmem Aparecida Massafera Alves Álvares em 10 de julho de 1976. Tiveram três filhos: 10.1 – Juarez Álvares da Silva Filho nascido em 11 de julho de 1977, casado com Lívia Martins Campos. Teve dois filhos: 10.1.1 – Juarez Manteiga Álvares de Campos, nascido em 18 de julho de 2005.

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Raízes do Cerrado:

10.1.2 – Maria Eduarda Beliche Massafera Álvares, nascida em 25 de agosto de 2004. 10.2 – Thiago Manteiga Álvares da Silva nascido em 14 de novembro de 1979, casado com Adrienne Kopp Ikeda Álvares. Teve dois filhos: 10.2.1 – Pedro Manteiga Ikeda Álvares, nascido em 14 de março de 2010. 10.2.2 – Sofia Ikeda Álvares, nascida em 13 de setembro de 2012. 10.3 – Diogo Álvares da Silva nascido em 04 de março de 1982, casado com Jucyara do Valle Álvares. Teve um filho: 10.3.1 – Augusto Manteiga do Valle Álvares, nascido em 29 de dezembro de 2018.

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Esse espaço é dedicado para a continuação da Árvore Genealógica da família….

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RaĂ­zes do Cerrado:

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História da Família Manteiga

Capítulo XV Histórias, nossas histórias... Nesse capítulo passaremos por algumas das histórias contadas durante as entrevistas, histórias de infâncias, “bagunças” de crianças, curiosidades e outros momentos narrados por alguns membros da família. Muitas delas foram contadas durante a edição da Manteigada de 2019, realizada na Fazenda Pirapitinga em Campo Alegre de Goiás.

O susto na Igreja - por Mafalda “Certa vez que estávamos brincando em uma noite de luar muito bonita, na rua da Igreja de São Sebastião em Campo Alegre de Goiás, éramos muitos, uma turma grande de rapazes e moças. Ai o papai brincando disse ‘fala pra Iracema – que era uma vizinha, deitar la na igreja e cobrir com um lençol branco, que os meninos vão entrar e fazer o que eu mandar você levanta’, e assim nós fomos pra lá, e tudo que o papai falava nós fazíamos, brincamos, e o papai disse pra gente ir todo mundo rezar 3 Ave-Maria na igreja, e fomos, estávamos rezando ai a Iracema levantou e só escutava grito dos meninos e saindo correndo de dentro da igreja, nisso o papai quase morrendo de tanto ri do lado de fora vendo tudo aquilo.”

Pau de sebo – por: Robson, Juarez e Clóvis Lá no vovô tinha um pau de sebo, e ninguém conseguiu subir, mas eu pensei eu vou subir e pegar o dinheiro que esta lá em cima. Então um dia na calada da noite peguei e passei terra no pau de sebo. Muitos dias fazendo 267


Raízes do Cerrado:

isso, vovô colocava sebo e eu colocava terra. A pescaria - por Robson Eu sempre queria pescar com o tio Edésio, mas ir pescar com ele não podia conversar e nem falar alto. Uma vez ele estava arrumando pra ir pescar e eu pedi pra ir. Chegamos lá, ele jogou a isca, eu peguei e bati o pé pra fazer barulho na água (risos) era pirapitinga e elas tem medo de barulho. Eu queria conversar com ele não deixava eu pegava e fazia barulho. Quando ele ia caçar eu também gostava de ir junto, mas não ajudava em nada, só atrapalhava, assustava os cachorros, fazia barulho e ele ficava bravo comigo (risos).

Pó de mico – por Ludmilla Tem uma história com o Clóvis Júnior, o “boi”, ele gostava de sacanear eu e minha outra prima. E um dia ele foi ficar na casa da minha avó porque ele tinha audiência em Goiânia, ai falei pra minha prima “hoje a gente se vinga dele”, compramos pó de mico e jogamos na cama dele pra ele dormir e o trancamos lá dentro, e lá na minha avó a gente ficava no quarto do terceiro andar e ele dormia no quarto do segundo, e dormimos, esquecemos dele, demoramos escutar ele gritando, pra tirá-lo de dentro do quarto.

Rádio ligado – por Alessandra O vovô tinha mania de ligar o rádio a noite e sentar do lado, e quando nos pensava que ele tinha dormido, íamos lá desligava. E ele falava com a voz grossa e olho fechado “deixa ligado que estou escutando o noticiário”. Nós doido pra dormir e o vô com o rádio ligado, ficava até tarde.

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História da Família Manteiga

O “Covarde” – por Luiz Filho Meus primos de Ceres estavam aqui na fazenda de Campo Alegre de Goiás, estávamos tomando cerveja, mas aí acabou, e não me lembro qual dos meninos do tio Juarez estava junto conosco, ai fomos lá em Campo Alegre buscar a cerveja e o Márcio meu primo disse que iria também, e cachaça aqui não tinha pra tomar mais, compramos a cerveja e na saída passamos no posto e o Márcio olhou e viu as garrafinhas de castelo e comprou, e no caminho tomamos uma das garrafas. E o Márcio não bebe se não estiver com a família, e a mãe e o pai tinha ficava na roça, e viemos tomando cerveja e a cachaça. No caminho resolvemos para na Lage, onde tem umas cachoeiras aqui perto para tomar banho, e água estava muito gelada. Daí deu uma tontura nele de dar dó, efeito da água e chegamos aqui em casa ele estava mais bêbado, nos todos estávamos, mas ele como não era acostumado deu um baque maior, e quando o sangue esfriou subiu o efeito. Rapaz, quando eu cheguei aqui a tia Mafalda me descascou, falando que eu tirei o filho de perto para dar pinga pra ele (risos), mas ela ficou brava comigo e depois virou piada na família “oh covarde”.

O GPS – por Anira e Luiz Filho O filho da empregada dela (Anira) passou mal e eles foram pro hospital, daí peguei coloquei o endereço no Google Maps para ir buscar a tia no hospital em Campinas em uma clínica da Upa. Entramos no carro e coloquei o endereço de volta e seguimos, de repente a moça do GPS fala “vire à direita”, a tia Anira “não acredito que você vai na onda dessa mulher, nós não vamos chegar lá por esse caminho não” eu disse: “tia fica calma que chega direitinho”, logo andamos e vai, vira aqui, vira ali, entrava numa rua entrava em outra para acertar o caminho. E nesse caminho tinha umas ruas escuras e a tia “ah você não vai entrar ai não, porque está escuro, rua estreita, perigoso eu disse que essa mulher não sabe o caminho”, e eu 269


Raízes do Cerrado:

pedindo “calma tia”, aí que a mulher disse para virar a tia já deu o grito (risos), “está tudo errado, tem que ir reto, não pode virar aí não”, eu peguei e desliguei o GPS e deixei para ela me explicar o caminho, e continuei andando, quando perguntei para ela onde virar ela disse “não, à noite eu não sei andar aqui não” (risos). Rapaz nós entramos em uma quebra, que descobrimos que estávamos em um lugar perigoso de Goiânia, peguei e liguei o GPS de novo, quando chegamos a uma rua que ela conheceu ela disse “pode desligar que daqui para a frente agora eu sei”. (risos).

Susto na ponte – por Robson e Alessandra Os primos mais velhos sacanearam com os primos mais novos. O tio Juarez gostava de passar susto em nós, uma vez ele colocou um lençol branco e ficou escondido de baixo da ponte. Mas ai até o cavalo assustou e empinou e fez o funcionário dele cair.

O tiro na enxada – por Clóvis Júnior O tio Emídio era excelente em pontaria, meu avô colocava ele pra trabalhar na roça e ele não gostava de jeito nenhum em trabalhar com enxada, ele pegava e falava pro amigo Solom “vamos fazer uma aposta, quem atirar na enxada do outro, o que perder pega a enxada e vai trabalhar” ai o tio Emídio foi e quebrou a enxada do Solom que teve de pegar a enxada dele e trabalhar enquanto meu tio ficava olhando, depois meu avô descobriu e colocou o tio Emídio pra cozinhar.

Assombração – por Juarez Uma vez falei pro Roberto ainda pequeno, ir buscar uma rapadura na casinha do lado, isso nós já tínhamos contado histórias de assombração a noite 270


História da Família Manteiga

toda. Daí eu pedi pra ele buscar e falei que dava um presente, e ele foi. Ele andava um pouco e voltava, ia mais um pouco, esperei ele ficar uns 100 metros da casa e fiz um barulho imitando assombração, ah mas ele veio que veio correndo de lá.

A luz da lamparina – por Clóvis Júnior Minha mãe (Maria Álvares – Zezica) e a tia Valdeci sempre foram muito amigas, mesmo antes delas se casarem e gostavam de sair nas festas da igreja quando estavam na cidade. Meu avô deixava ela (Zezica) sair, mas com a condição de Valdeci e junto e elas voltarem cedo. Muitas vezes, a tia Lazarina saia a noite com uma lamparina na mão (não tinha energia elétrica na cidade) para buscá-las. Outra vez, ela contava, que chegou em casa pé por pé e meu avô escutou, mas não levantou da cama só perguntou “É você Zezica, está chegando agora?” para disfarçar ela respondeu “sim pai, sou eu, mas me levantei para tomar água”.

Desmaio - Alessandra Uma vez lá no tio Lázaro, que adorávamos ir pra lá, porque a gente aprontava mesmo, andávamos naqueles carneiros dele que eles ficava frouxo. Uma vez o Robson bateu a cabeça no chifre do carneiro e desmaiou, o Mário levou ele pra bica e jogou água nele até ele poder voltar.

O “teu” morreu – por Carmem Massafera Eu era muito nova quando namorava o Juarez e ficava muito no Emídio com a Gercina e as meninas, resolvi pegar um cavalo do Emídio, e ir até a fazenda do Orazal, sozinha, só que cheguei na ponte o cavalo caiu, só 271


Raízes do Cerrado:

que no que ele caiu o arreio saiu e eu desci, no que desci o cavalo não levantava, então fui da fazenda do Orazal até o Emidio de a pé, parei no Luiz e Marina e ela me viu chorando preocupou: “o que foi o que foi?”, eu chorando, falei “o cavalo morreu, o cavalo morreu”, ai fui correndo e chorando, e cheguei la no Emidio chorando, e falava pra Gercina em prantos “o Téo, o Téo morreu” ela não entendeu e desesperou e disse “pronto o Emídio morreu”, aí disse “não o teu cavalo morreu” ela queria me bater, e quando eu olho pro rumo da porteira o cavalo atrás de mim, ele tinha vindo sozinho da ponte até na fazenda.

O travesseiro – por Carmem Como eu ainda era jovem durante o namoro com o Juarez, geralmente que vinha pra fazenda ficava muito com os meninos menores. Certo dia estávamos no quarto e começou uma guerra de travesseiros, joga travesseiro pra um lado e para outro, e fazendo aquela festa e barulho. A Mafalda, minha cunhada, ficou espantada com toda aquela algazarra e foi até o quarto ver o que estava acontecendo, e no que ela chega na porta, sem percebeu eu taco com toda minha força um travesseiro que foi bem no rosto dela. Na hora ela disse “não acredito que meu irmão vai casar com uma criança” e depois rimos da situação juntas.

A queda – por Juarez Todas as férias nós podíamos ficar preparados para algum dos meninos machucar aqui na fazenda. Uma vez eu já tinha saído e não sei porque resolvi voltar na fazenda, quando cheguei aqui um dos sobrinhos, o Robson, tinha caído do cavalo e deu um corte na cabeça. Outra vez outro caiu e quebrou o braço, sempre tinha um que aprontava além dos limites.

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História da Família Manteiga

O buraco – por Clóvis Eu tinha mais ou menos uns 6 anos, e o tio Emídio morava na Jurema, e foi eu e tio Juarez pra lá de cavalo, o Queimadinho e o Canarinho. Fomos e chegando lá almoçamos e o tio Juarez deitou pra dormir, e tinha muito bode lá, e tinha um buraco e fiquei brincando na beira e mexendo com o tio sendo que ele queria dormir, quando eu caí lá dentro, o tio Juarez me disse “quer saber de uma coisa, eu vou embora e você vai ficar aí dentro”, eu comecei a chorar até ele me tirar lá de dentro.

O sumiço – por Angelita Meu avô Emídio comentava que uma vez tomou uma surra muito grande da mãe dele porque ele fingiu que tinha morrido, disse ‘vou passar um susto na minha mãe’ ele matou um pato, cortou o pescoço desse pato e saiu sangrando pelo quintal e subiu em cima de uma mangueira e ficou escondido o dia todo, e ai ela ficou louca atrás dele, e todos já estavam desorientado atrás achando que realmente tinha acontecido alguma coisa, e diz que já estava anoitecendo já, e parece que ele riu, ai ele ficou com dó e ela viu ele em cima do pé de manga, ai como diz ele ‘ela quase me mata de verdade’. (risos)

Ouvindo a conversa – por Elizabeth O tio Emídio sempre foi uma pessoa muito brincalhona, ele contava que certa vez queria saber o que as mulheres estavam falando porque cochichavam demais. Só que quando ele chegava perto ou outros irmãos elas parava de falar, então ele pensou “vou me vestir de mulher pra enturmar com elas”. Acredite, ele pegou roupas das irmãs, vestiu e foi para junto delas tentar ouvir as conversas. Mas claro que tudo passou de muita graça porque elas perceberam na hora que era ele. 273


Raízes do Cerrado:

Travesseiro – por Robson e Alessandra A vovó gostava de fazer muita coberta de tear, e tinha muito travesseiro lá, e quando estava todo mundo dormindo, eu (Robson) aproveitava que não tinha ninguém vendo e começava a jogar pra cima e caia pra todo lado, eu só não jogava pro lado da cama do vovô, porque se não era brigava, jogava era travesseiro de palha.

Chegar na vó – por Marise Adorava chegar lá na vovó, ela tinha uma bolacha maisena, e uma bolacha Maria, e uma caixa de bombons, sempre tinha alguma coisa para os netos. E meu avô tinha uma brincadeira de pau de sebo, nos adorávamos, quem subir no pau ganhava o dinheiro que estava lá na ponta, mas o difícil era subir, eu mesmo não me lembro de ter conseguido chegar ao topo algumas vezes.

Sono no terço – por Alessandra Fazer almoço nas férias pra esse tanto de gente era difícil, tinha tia Lazarina, ela ensinava etiqueta pra gente, a comer com garfo, facas cortar na mão certa. O dia que ela não estava, comíamos de qualquer jeito mesmo, pegava a coxa do frango com mão. E tinha reza do terço também, na hora de rezar todo mundo falava que estava com sono, os que ficava pra rezar com a tia freira logo podia olhar na cara deles que estava caindo de sono.

A festa de Judas – por Ludmilla Tinha a festa do Judas que todo ano fazíamos na roça. Era assim alguém fazia o Judas e levava de madrugada pra casa de alguém, e tinha que ir escondido pra ninguém ver, onde o Judas amanhecesse seria o almoço 274


História da Família Manteiga

daquele dia, e nós montávamos o Judas com tudo que tinha direito, na hora que a pessoa acordava estava la na porta ele. De vez em quando um sacaneava e corria com o Judas ainda antes de amanhecer pra casa de outro. Tinha também o testamento do Judas, onde as peças de roupas eram deixadas pra alguém, uma botinha, um chapéu, ia ficando pra alguém, mas sempre com mensagem de bom humor.

Queijos e doces – por Alessandra Nas férias que ficávamos aqui, a vovó fazia forminhas pequenas para gente fazer queijo, doces, e tínhamos que ir todo dia virar o queijo na casinha onde eles ficavam, raspava, lavava. Os doces todo mundo colocava nas forminhas e quando íamos embora, cada um pegava seu queijo e seu doce para levar. Dia de fazer doce de goiaba íamos pra goiabeira e pegava latas e latas de goiaba, depois descascar e lavar, doce de leite também, era aquela festa, e na hora de rapar o tacho era uma briga, todo mundo queria rapar uma parte.

Imitando bezerros – por Mário Nós saímos para ir ao ribeirão pra tomar banho, e o Robson nunca teve medo de gado, tinha aquelas vacas paridas cheias de bezerros novos, eu rodeava a fazenda pra não passar perto delas, porque eram bravas e ele passava imitando os bezerros, quase que elas corre atrás de nós.

O bico – por Marise Tem uma passagem que eu lembro, que foi no casamento da Beth, nos estávamos indo pra Ipameri e ele falou que não era para mim levar meu 275


Raízes do Cerrado:

bico, e eu levei escondido. No caminho ele percebeu que eu estava de bico e pediu para dar pra ele, eu disse que não dava, ele pediu de novo, eu fui e entreguei, na hora que ele pegou eu falei “soca o bico...” ele ficou rindo calmo e disse que não ia fazer isso, quando passamos na ponte do rio Veríssimo, ele disse pra mim, dá tchau pro bico, porque o papai não vai colocar ele em lugar nenhum, e jogou lá dentro do rio.

Aprender a cozinhar – por Letícia Nós estávamos um dia na Zezica, fazendo um quibe, estávamos moendo a carne ainda. Ai o Thiago chegou e disse “tia me ensina a cozinhar, me ensina a fazer quibe”, aí disse “que isso, você vai ser um doutor não precisa cozinha não”, ele me respondeu “não tia mas se um dia se eu me casar e não de certo com minha esposa, pelo menos eu sei cozinhar” (risos). O Thiago era pequenino.

Porco falso – por Laíse Eu me lembro de uma história, que meu pai me pegava quando criançinha, colocava dentro de uma fronha e levava para meu avô, falando que era um porquinho que tinha levado para a fazenda, enquanto eu coube dentro de uma fronha essa passagem se repetia.

Carrossel disparado – por Robson O tio Emídio e o tio Orazal morava aqui perto, cerca de um 10 km, e nós íamos para lar a pé, muitas das vezes escondido das mães, passava no tio Luiz chamava os meninos para ir também. Uma vez o tio Emídio arrumou um carrossel cheio de bode e nós montamos nesse negócio pra brincar, quando ele disparou com a gente em cima. Era bode pra um lado menino caído pra outro, uma bagunça e ninguém machucou. 276


História da Família Manteiga

A queda – por Letícia Subia e em árvores, eu lembro que estava nos dias de dar a luz a uma das minhas filhas, e eu inventei de subir em uma mangueira para apanhar mangas, perto do rego d’água que passava, estava com a Valdeci minha cunhada, era um pé de manga rocha, ai subi e fui jogando pra ela, e ela ia falando onde tinha, por cima da minha cabeça tinha uma penca de mangas madurinhas, coisa mais linda, quando eu levo a mão, só escuto o barulho da galha quebrando, e eu desci de uma vez no chão, papai estava do alto e viu, mas não sabia quem era e ainda brincou “nossa aquele lá esborrachou no chão”, a Valdeci sempre foi muito tímida e acanhada ficou morrendo de preocupação comigo e nenê, mas estávamos bem, a criança estava mexendo. Ai eu só dei uns arranhões e raladinhos.

O nome da Silva – por Letícia Meu nome, é Letícia Álvares Daher, mas sou Alvares da Silva, da família do papai não botou da mamãe, quando fui me casar o padre veio de fora, o Padre Teodoro, que nos fomos preencher os papeis, na hora de assinar eu assinei Letícia Álvares Daher e falei para ele tirar o “da Silva” e brinquei com ele que todo bicho de unha tinha da Silva no nome, ele caiu na risada, mas não falou nada, e quando ele foi assinar, Padre Teodoro Bebiano da Silva. Eu “padre do céu me perdoa, o que eu fiz” ele disse “aqui mais um bicho”, e riu até mesmo.

A ponte – por Hélio Vim pra passar as férias era uma festa. Uma vez estávamos fazendo uma pontezinha aqui perto e uma muda de “caninha da índia” pra fazer vara de bambu, ai o tio Edésio tinha plantado pra fazer, peguei esses bambus, cor277


Raízes do Cerrado:

tei, amarrei e fui fazer uma ponte bonitinha pra passar no rego. Ai o Junior vai e pisa na ponte, e ela ficou tão forte que só emborcou, eu peguei um pedaço de pau e corri atrás dele para brigar por conta dele ter ido passar em cima, mas nós corremos até e não peguei.

O lote – por Elizabeth e Sissi Teve uma briga feia com o padre e o tio Emídio por conta de uns lotes, ele chegou em casa bravo, “a compadre hoje eu mato o padre” porque o padrinho era bravo, tinha um pouso de folia em casa e ele foi com a Gercina, o Lázaro com a Valdeci. E ele encontrou o padre no caminho, e eles começaram a discutir por conta de uns lotes, mas no final fizeram as pazes.

A festa Junina – por Elizabeth Teve uma vez que fizemos uma peça de teatro na festa junina, na época em que seu Gregório morava aqui, e inventamos, eu não tinha filho tempo sobrando, ai a Tata me falou “vamos fazer o arraia da Florentina? ” eu já me coloquei de prontidão e começamos a escrever uma peça de teatro, era um casamento junino, e fomos arrumar os atores e o noivos não me lembro direito quem era, e o delegado pai da noiva era o tio Emídio, fizemos a decoração na chácara do Gregório ficou tudo lindo. Eu cheguei e falei pra ele que ia ser o delegado, ai teve o padre, e na hora do casamento, o noivo fala que não ia casar, o pai da noiva pega o revolver e chega na costela do noivo e fala “você vai casar o não vai? ”, e ele chegava o revolver na costela, e ele (tio Emídio) pega o revolver e aponta pra cima e da dois tiros pra cima e estava carregado, noivo ficou morrendo de medo, e na hora todo mundo assustou, e depois rimos que só.

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A chegada da autoridade – por Elizabeth Diz o tio Emídio que uma vez estava em Ipameri e meu avô pediu pra ele comprar uma pilha de rádio, era enorme a pilha, e o Berin tinha um avião, então foi os dois pra Paracatu comprar a pilha, só pra andar a toa. E eles foram todos de terno de linho, engomados, e no dia de voltar eles ficaram sobrevoando a cidade e o povo foi tudo para o aeroporto achando que era político chegando, e encheu de gente la no campo de aviação e eles desceram de do avião acenando pro povo e morrendo de rir.

Pedir dinheiro pro pai – por Thiago Uma vez cheguei nele (no meu pai) e pedi dinheiro para ele na frente de uma visita e ele não tinha jeito de falar não, eu tinha uns 13 anos, e ele me deu dinheiro, perguntei se podia sair ele me autorizou ai quando voltei ele me deu um sermão, pra mim nunca mais pedir dinheiro na frente das visitas.

O ferrão – por Thiago Estava na fazenda separando uns bois, estava eu meu pai, o Clovis o Juarezinho, o Zuis e mais umas 10 pessoas na cerca, e ai tudo fazia dava errado e meu pai nervoso demais já, me pediu pra que eu passasse o ferrão pro Juarezinho, eu falei que não ia porque era meu, ele disse “passa logo que estou mandando” respondi “não, o ferrão é meu e você não manda em mim não” eu apanhei demais disso, eu com 16 anos e ele arrancou o cinto e me deu cada lapada. Depois disso os peões que estava ali sumiu tudo e as coisas começou a dar tudo certo. Ele mandou eu ir para a porteira segurar pra não passar os bois e veio dois e bateu nessa porteira eu pulei pra cima, caiu os dois no chão, eu falei “morreu”, ele “mata mas não deixa passar”. Depois disso nunca mais mexi com ferrão (risos). 279



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Considerações finais Optei por “Considerações finais” ao invés de intitular “Conclusão”, talvez por falar de forma mais abertamente, mas na verdade porque não estou concluindo uma história familiar, apenas dando consideração a parte dessa história, pois afinal, a história não tem fim ela, está presente em nosso dia e todos nós somos agentes construtores dela mesma. Particularmente, desde pequeno ouço dizer “família manteiga”, “fulano manteiga”, “foram os Manteigas”, “na era Manteiga”, cresci imaginando o que era e quem eram os famosos Manteigas. Com o passar do tempo, fui identificando cada um, primeiramente os que fizeram parte da história do município de Campo Alegre de Goiás, como vimos no decorrer desse livro, de forma autônoma iria indagando alguns para saber quem era aqueles homens da sociedade campoalegrense que sempre estavam ali em algum palanque político, em alguma roda de conversa na casa dos avós. Até que por fim, consegui formar historicamente cada uma dessas personalidades. A pesquisa, cujo tema principal é o levantamento histórico da memória familiar Álvares da Silva em Campo Alegre de Goiás, a partir de seus patriarcas Sebastião Ferreira Álvares da Silva e Maria Emídio Álvares, pude debruçar e me deparar com história baseadas em lutas e desafios. Primeiramente com um desbravador, que veio de Minas Gerais para terras goianas, tentar reconstruir sua vida e instalar-se futuramente nesse município, afim de encontrar uma mulher determinada de pulso firme, como foi dona Maria, filha de major do exército brasileiro, em uma época onde poucos eram os casamentos onde os casais se amavam. Sebastião um homem de coragem e Maria uma mulher herdeira de terras, juntos constituíram seu patrimônio, e criaram dez filhos nos ensi281


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namentos cristãos e princípios regidos pela moralidade e o civismo, como podemos detectar durante várias passagens no decorrer dos capítulos. O casal passando por percas tanto financeiras como sentimentais, reconstruíram sua família na força braçal e encontrando um no outro o apoio para reger sua história. Os filhos marcados pelos ensinamentos dos pais transmitem a suas gerações esse legado de confiança e perseverança. Atualmente dos dez filhos, apenas cinco estão presentes fisicamente para transmitir e manter viva as tradições familiares, mas os que já se foram deixaram essas marcas em seus filhos e seus descendentes. Sendo assim, narrar a história da família Álvares da Silva ou como chamada por todos, Família Manteiga, foi de suma importância, para que as gerações futuras, seja da família ou de leitores, possam reconhecer a importância da preservação da memória de seu povo e de seus antepassados. Esperamos que a próximas gerações de Sebastião e Maria, encontrem nessa obra toda a força de vontade e que reflitam a mensagem de lealdade, perseverança, humildade e principalmente de família, instituição tão preservada pela atual descendência.

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História da Família Manteiga

Fontes orais: ÁLVARES, Carmem Aparecida Massafera Alves. Carmem Aparecida Massafera Alves Álvares: depoimento [março 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. ÁLVARES, Marina Aparecida Porto. Marina Aparecida Porto Álvares: depoimento [dezembro 2018]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. ÁLVARES, Norma Martins. Norma Martins Álvares: depoimento [janeiro 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Campo Alegre de Goiás: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. CAMPOS, Mafalda Álvares. Mafalda Álvares Campos: depoimento [junho 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. CAMPOS, Mário Borges. Mário Borges Campos: depoimento [julho 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. CAMPOS, Robson Borges. Robson Borges Campos: depoimento [julho 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. CAMPOS. Luiz Manteiga Álvares de. Luiz Manteiga Álvares de Campos: depoimento [dezembro 2018]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. DAHER, Letícia Álvares. Letícia Álvares Daher: depoimento [julho 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Fa283


Raízes do Cerrado:

mília Manteiga. ELEUTÉRIO, Valdeci. Valdeci Eleutério: depoimento [novembro 2014]. Entrevistar: Marcos Rossiny Leandro. Campo Alegre de Goiás: 2014. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao projeto História Política de Campo Alegre de Goiás. ESTRELA, Elizabeth Eleutério Álvares. Elizabeth Eleutério Álvares Estrela: depoimento [junho 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. FERREIRA, Silvane Jose. Silvane José Ferreira: depoimento [fevereiro 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. FILHO, Luiz Álvares de Campos. Luiz Álvares de Campos Filho: depoimento [junho 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. FONSECA, Solange Lopes. Solange Lopes Fonseca: depoimento [janeiro 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Campo Alegre de Goiás: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. JÁCOME, Andrea Álvares. Andrea Álvares Jácome: depoimento [setembro 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. JÁCOME, Angelita Álvares. Angelita Álvares Jácome: depoimento [agosto 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. JÚNIOR, Clóvis Silva. Clóvis Silva Júnior: depoimento [janeiro 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga.

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MOREIRA, Ludmilla Áurea Daher. Ludmilla Áurea Daher Moreira: depoimento [julho 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. NETO. Antônio Jácome. Antônio Jácome Neto: depoimento [agosto 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. PÁDUA, Anirazal Álvares de. Anirazal Álvares de Pádua: depoimento [dezembro 2018]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Goiânia: 2018. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. PÁDUA, Anirazal Álvares de. Anirazal Álvares de Pádua: depoimento [junho 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. PÁDUA, Cláudio Álvares de. Cláudio Álvares de Pádua: depoimento [setembro 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. ROMANO, Alessandra Borges Campos. Alessandra Borges Campos Romano: depoimento [julho 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. SILVA, Adalberto Álvares da. Adalberto Álvares da Silva: depoimento [janeiro 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Campo Alegre de Goiás: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. SILVA, Alberto Álvares da. Alberto Álvares da Silva: depoimento [janeiro 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Campo Alegre de Goiás: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. SILVA, Anália Lima e. Anália Lima e Silva: depoimento [outubro 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. 285


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SILVA, Hélio Albino da. Hélio Albino da Silva: depoimento [julho 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. SILVA, Juarez Álvares da. Juarez Álvares da Silva: depoimento [março 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. SILVA, Lazarina Álvares da. Lazarina Álvares da Silva: depoimento [dezembro 2018]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Goiânia: 2018. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. SILVA, Marise Álvares da. Marise Álvares da Silva: depoimento [janeiro 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Campo Alegre de Goiás: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. SILVA, Rosiana Borges Campos. Rosiana Borges Campos Silva: depoimento [julho 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. SILVA, Thiago Manteiga Álvares da. Thiago Manteiga Álvares da Silva: depoimento [outubro 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. SVERBERI, Laíse Porto Álvares de Campos. Laíse Porto Álvares de Campos Sverberi: depoimento [julho 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. VAZ, Lorena Eleutério Álvares. Lorena Eleutério Álvares Vaz: depoimento [janeiro 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. VAZ, Margareth Eleutério Álvares. Margareth Eleutério Álvares Vaz: depoimento [ janeiro 2019]. Entrevistador: Marcos Rossiny Leandro. Catalão: 2019. 1 cassete sonoro. Entrevista concedida ao livro Raízes do Cerrado: História da Família Manteiga. 286


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História da Família Manteiga

Sobre o Autor: Marcos Rossiny Leandro, filho de Cátia Débora e Duplani Correia, nasceu na cidade de Catalão-Go em 03 de março de 1992, morou em Campo Alegre de Goiás até os 26 anos. Bacharel e Licenciado em História pela Universidade Federal de Goiás – Regional Catalão, em 2014. Mestre em História pela mesma universidade em 2016, atuando na área de pesquisa em História das Cidades, cotidiano e ensino de história. Atualmente é professor da Rede Municipal de Ensino da cidade Catalão-Go.

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