Saúde ao Sul - Julho 2017

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Rio de Janeiro, Julho 2017 . No 8

A CRISE AMEAÇA A PROTEÇÃO SOCIAL Uma Crise

no Caminho até 2030

Cheque mate: quando os gastos em saúde vencem ENTREVISTA: CARISSA ETIENNE diretora da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS)

SAÚDE INDÍGENA: Um longo caminho a percorrer


INSTITUCIONAL ISAGS-UNASUL Diretora-Executiva: Carina Vance Chefa de Administração e Recursos Humanos: Gabriela Jaramillo Coordenadora de Relações Internacionais: Luana Bermudez GESTÃO DA INFORMAÇÃO E DA COMUNICAÇÃO Coordenadora: Flávia Bueno Editor-Chefe: Manoel Giffoni Reportagem: Carina Vance, Flavia Bueno, Manoel Giffoni, Mario Camelo Colaboradores: Angela Acosta, Francisco Armada, Gabriela Jaramillo, Luana Bermudez Equipe: Bruno Macabú e Rakel Cogliatt Contato: comunicacao@isags-unasur.org Telefone: +55 21 2505 4400 Esse é o informe do Instituto Sul-Americano de Governo em Saúde (ISAGS), o centro de pensamento estratégico na área de saúde da União das Nações Sul-Americanas (UNASUL) que visa contribuir para a melhoria da qualidade do governo em saúde na América do Sul por meio da formação de lideranças, gestão do conhecimento e apoio técnico aos sistemas de saúde.

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Uma Crise no Caminho até 2030 O ano é 2008. A crise do subprime nos Estados Unidos, em efeito dominó, afunda o quarto maior banco de investimento do país e dispara uma onda de pessimismo no noticiário econômico por todo o mundo – o desastre não poupa ninguém. O clima de incerteza na Espanha, além disso, faz estourar a bolha imobiliária local, gerando uma crise bancária que se reflete posteriormente em vários indicadores com efeitos diretos na vida da população, como a inflação e o desemprego. O país, entretanto, conta com um sistema de proteção social que inicialmente faz um excelente trabalho na redução de danos. Um sistema de saúde, por exemplo, que, ao figurar entre os países europeus com os mais fortes níveis de atenção primária, é considerado o 7º melhor do mundo por um polêmico estudo publicado em 2000 pela Organização Mundial da Saúde (OMS). “O sistema amorteceu uma crise verdadeiramente terrível, não tem outra maneira de dizê-lo; uma crise que deixou 50% da juventude sem trabalho”, conta o pesquisador da Escola Andaluza de Saúde Pública (EASP), Pedro Brito. De fato, não se trata de um trabalho menor. A partir de estudos realizados em plena crise econômica-política-institucional da Argentina em 2001, quando os níveis de pobreza chegaram a impressionantes 54%, o PIB despencou 11% e as taxas de desemprego bateram a casa dos 30%, não é difícil inferir a maneira como repercutem esses tipos de evento no funcionamento de um sistema de saúde e, consequentemente, na vida das pessoas. De acordo com o informe ‘Argentina: Efeitos Sociosanitarios da Crise, 2001-2003’ da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), quando já não podia pagar os planos de saúde privados, a população sobrecarregou de maneira extraordinária os centros de saúde públicos (um aumento de até 56% nas consultas de emergência e até 173% de consultas clínicas e especializadas), num cenário de deterioração generalizada com aumento crítico de desnutrição, taxas de

morbidade e mortalidade nas populações mais vulneráveis, como crianças, grávidas e idosos. “Existem estudos que demonstram também um aumento importante no abuso de drogas e álcool no país, além de transtornos mentais”, afirma Ligia Giovanella, da Escola Nacional de Saúde Pública do Brasil (ENSP-Fiocruz). Ainda que dê para identificar alguns efeitos da crise na população espanhola, como o aumento no tabagismo, na prevalência de obesidade e do consumo de ansiolíticos e antidepressivos, a situação não chega a caracterizar-se como calamitosa. “Proteção social é uma política anticíclica”, explica Brito. Foi justamente para discutir o efeito das turbulências econômicas sobre a saúde da população e o papel dos sistemas de proteção para mitigar esses efeitos, que o ISAGS reuniu entre 28 e 29 de junho, representantes dos países da UNASUL e especialistas no tema para o Seminário “Construção de um Painel de Dados sobre Assimetrias dos Sistemas de Saúde – Regulação e Financiamento Público em Tempos de Crise Fiscal”. O objetivo do encontro foi assentar as bases para o estabelecimento de um mecanismo de monitoramento conjunto da resposta dos sistemas de saúde às mudanças conjunturais das economias da região. À discussão, porém, se somou um alerta. “É possível dar marcha à ré nas conquistas sociais?”, perguntou retoricamente durante a sua apresentação Luís Andrés López, colega de Brito na EASP. “Lamentavelmente, sim”, se antecipou na resposta. Alentadas por organismos de financiamento internacionais, como o Banco Mundial e o FMI, as políticas de austeridade na Espanha acabaram por finalmente enfraquecer o sistema de saúde do país, com mudanças na legislação, cortes de recursos e, como consequência, aumento das filas, da emigração de recursos humanos de saúde e diminuição das taxas de satisfação entre os pacientes. Mais 3


Em princípios de 2016, a CEPAL já havia emitido um alerta similar na nossa região em seu “Panorama Social”, afirmando que era “imperativa a necessidade de resguardar o núcleo duro do gasto social, definindo políticas e programas que se considerem prioritários – particularmente aqueles contra a pobreza, a exclusão social e os direcionados à proteção da população mais vulnerável frente ao ciclo econômico. Esse relatório mostra como avançava a crise econômica e social pela América do Sul – o que só se agravou desde então. Ao mostrar num gráfico uma estrita correlação entre o aumento/queda do PIB e dos níveis de pobreza, Brito reforça o alerta: “Quando cai o PIB, cai o gasto social, debilitando o sistema de proteção justamente quando é mais necessário”.

Recuperação no nível de pobreza: 25 anoS versus Recuperação do PIB per capita: 15 ANOS

INCIDÊNCIA DA POBREZA

PIB PER CAPITA

América Latina e Caribe: Comparação entre o PIB per capita e a incidência da pobreza, 1980-2015

Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), sobre a base de informação oficial

Agenda de Desenvolvimento Sustentável Um consenso entre os representantes dos países presentes no Seminário e dos pesquisadores convidados e corpo técnico do ISAGS é a preocupação com alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), conforme está planejado para 2030. Acordada em 2015, a segunda jornada global em direção a um mundo com menos desigualdade, melhor saúde, educação e um estilo de vida mais sustentável teve um início atribulado em seus primeiros anos na América do Sul, com vários países (particularmente uma de suas maiores economias, o Brasil) registrando crescimento negativo, alta de desemprego e da inflação.

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Hoje em dia, não são raros os casos nos quais recomendações baseadas em evidência científica são ignoradas (vide o abandono dos Estados Unidos do Acordo de Paris, anunciado pelo presidente Donald Trump enquanto os mais respeitados cientistas alertam sobre os efeitos catastróficos do aquecimento global). Em uma América do Sul comprometida com a redução da desigualdade e em aprofundar os progressos obtidos no marco dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

(2000-2015), a implementação de medidas de austeridade nos sistemas de proteção social poderia desembocar em retrocessos no estado da saúde e do bem-estar da população, como demonstra a evidência disponível em outras partes do mundo.

Uma proposta de ação conjunta: monitorar os impactos e as respostas à crise Com a ferramenta que propôs o Seminário realizado no ISAGS, a ideia é fazer o acompanhamento em tempo real do impacto tanto da crise, quanto da resposta e dos efeitos na saúde da população, de modo que os debates também se enfocaram na escolha dos seus indicadores e categorias de análise. A pesquisadora brasileira Ligia Giovanella, uma das organizadoras do livro “Sistemas de Saúde na América do Sul”, publicado pelo ISAGS em 2012, recomendou, por exemplo, que, além dos indicadores econômicos, se contemplem também as três dimensões da universalidade: I) Amplitude da cobertura da população pelo sistema público (número de pessoas que têm acesso aos serviços) II) Profundidade da cobertura pública (atendimentos em saúde cobertos pelo sistema) III) Nível de cobertura do financiamento público (orçamento público dedicado ao setor saúde) Por outro lado, no Seminário foi sugerido que é preciso prestar atenção tanto aos indicadores quantitativos quanto qualitativos, que monitorem de maneira ampla os impactos da crise sobre as condições de saúde, como o aumento do abuso de álcool e drogas, recrudescimento de algumas doenças infectocontagiosas, entre outros.

Manoel Giffoni manoelgiffoni@isags-unasur.org

importante ainda para o futuro, a legislação deixou de considerar os cidadãos como sujeitos de direito e, agora, os chama de “assegurados”, abrindo espaço para outros cortes na universalidade do sistema.


PALAVRAS DO ESPECIALISTA A Avaliação de Tecnologias em Saúde, Alertas e Perguntas Sem RESPOSTA Angela Acosta, especialista em Medicamentos e Tecnologias de Saúde do ISAGS Se, por um lado, publicações recentes evidenciam as altas expectativas em torno à implementação da avaliação de tecnologias na América do Sul1,2, existem também outras que alertam sobre o que ainda falta resolver quase 20 anos depois de experiências institucionais como a do National Institute of Health and Clinical Excellence da Inglaterra (NICE) e outras mais recentes da Alemanha, Suécia e Canadá3,4,5. Em 1999 é criada a NICA; seu trabalho contribuiu para o reconhecimento das avaliações de tecnologias em saúde como ferramenta para estabelecer prioridades em saúde, apoiando-se, principalmente em métodos relacionados com a medicina baseada em evidência e avaliações econômicas, como estudos de efetividade comparativa, custoefetividade e análise de impacto orçamentário. A propósito dos esforços desenvolvidos por países como a Colômbia com relação à criação de Agências de Avaliação de Tecnologias, em 2012 algumas referências projetavam que esses organismos poderiam tornar-se na pedra angular que forneceria informações sobre os desafios das restrições orçamentárias, os crescentes custos de saúde, as transições demográficas em direção ao envelhecimento da população, assim como as pressões sociais e do mercado para permitir a entrada de novas tecnologias; igualmente, se fazia um chamado a desenvolver um exercício equilibrado da avaliação de tecnologias, dando a medida justa ao acesso a serviços individuais versus os serviços públicos de saúde. O critério de decisão em que hoje em dia mais se enfocam os programas de avaliação de tecnologias, são os estudos de custo-efetividade que avaliam dados de frequência das doenças, a segurança e a efetividade das intervenções, os resultados informados pelos pacientes e os custos, com a finalidade de examinar as consequências a curto e longo prazo. Entretanto, juntando as evidências atualmente, está demonstrado que uma tecnologia sanitária não consegue provar sua efetividade até que sua disponibilidade, aceitabilidade, segurança e condições de sua administração tenha se dado e avaliado em vários segmentos da população. A eficácia e a efetividade clínica são apenas a metade da história da avaliação de tecnologias. Mais importante ainda, a outra metade das respostas que o âmbito da avaliação de tecnologias pretende dar se refere à equidade. Até experiências de longa trajetória como a inglesa não logrou abordar essa dimensão. Componentes como os aspectos sociais, éticos e legais, embora, em teoria, devessem ser incorporados como variáveis de análise nas avaliações econômicas em saúde (Tobar, 2017), não o foram. Um alerta próprio da nossa realidade regional registra problemas dos sistemas de saúde relacionados tanto com a equidade e a eficiência, quando outro bem conhecido em países como Argentina, Brasil e Colômbia: o uso de vias de exceção, como as judiciais para garantir o acesso à cobertura de medicamentos 5,6. Se, por um lado, mais de 50% dos países sul-americanos ainda não incorporaram de maneira formal os processos de avaliação

de tecnologias em suas legislações; por outro, também há um alerta sobre a escassa disponibilidade de dados locais para o desenvolvimento de avaliações econômicas com dados de custos que correspondam a nossas realidades. Nesse sentido, projetos regionais como o Banco de Preços de Medicamentos da UNASUL se tornam fontes que podem fornecer insumos mais ajustados ajustados às nossas realidades. Outro componente teórico que foi excluído das avaliações de tecnologia são as estruturas de prestação de serviços dentro dos sistemas de saúde. Ainda que se relacionem como componentes das avaliações de tecnologias1, os programas nacionais não as abordam. Muitos países de baixa e média renda concentraram seus esforços nesse sentido, de modo a fortalecer e sustentar a saúde de suas populações; pesquisas, como a coordenada pelo ISAGS em 2012 sobre a estrutura de nossos sistemas de saúde7 devem contar com processos de atualização de maneira sistemática, que dê insumos para contextos específicos como esse. Hoje, a realidade geral em relação aos desafios mencionados no propósito de desenvolver a avaliação de tecnologias de saúde estabelece uma fragmentação entre as decisões de entrada, cobertura e financiamento, em particular para medicamentos dentro do sistema de saúde.

“As Avaliações de Tecnologias em Saúde são talvez o braço mais poderoso do programa nacional de pesquisa em saúde da Inglaterra” (The Lancet, 2013) Em 2013, Sally Davies, principal assessora médica do governo da Inglaterra em temas de saúde, formulou a incorporação da equidade como um ponto de inflexão na história do programa de Avaliação de Tecnologias em Saúde no país3, incluindo a forma como deve ser implementado nos próximos 20 anos. Deve ser abordado nos programas de avaliação de tecnologias na América do Sul, uma região que ainda guarda profundas e, às vezes, crescentes desigualdades. Referências 1. Lifschitz, E (Ed), Martich E, Tobar S, Watman R. Agencias de evaluación de tecnologías sanitarias, Lecciones aprendidas em países de Latinoamérica y Europa. Fundación Guemes, Argentina, 2017. 2. Rosselli D, Quirland-Lazo C, Csanádi M, etal. HTA Implementation in Latin American Countries: Comparison of Current and Preferred Status. Value in Health. Volume 14, pag 20-27. 2017. 3. Harton R. Offline: The error of our health technology assessment ways. The Lancet, comment. Vol 382 October 19, 2013. 4. Godman B, Oortwijn W, DeWaure C, etal. Links between pharmaceutical R&D models and access to affordable medicines. European Union, PE587.321EN.IP/A/ ENVI/2015-06.2016. 5. Oortwijn W, Determann D, Schiffers K, etal. Towards Integrated Health Technology Assessment for Improving Decision Making in Selected Countries. Value in Health (2 0 1 7), article in press. 6. Castro, H. (2012). Agencias de evaluación de tecnologías en salud ¿moda o necesidad? Vía Salud, 16 (1), 12-17. 7. Giovanella L, Feo O, Faria M, Tobar S. Sistemas de salud en Suramérica: desafíos para la universalidad, la intergralidady la equidad. ISAGS, 2012.

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Cheque mate:

quando os gastos em saúde vencem Os gastos catastróficos em saúde são responsáveis pelo empobrecimento de milhares de famílias todos os anos, apontando para a necessidade de medidas urgentes de proteção de seu direito à saúde O cenário é de desespero, a casa enfrenta uma dupla calamidade. De um dia para o outro, a família perde muito do que foi construído ao longo de gerações justo quando é afetada pela doença de um parente amado. Esta é uma realidade extrema, mas é mais comum do que se pode imaginar. Estimativas da Organização Mundial da Saúde1 sugerem que a cada ano cerca de 150 milhões de pessoas sofrem catástrofe financeira por gastos em saúde e que milhares são empurradas para a pobreza. Esta situação revela o que representam os gastos catastróficas em saúde (GES), gastos que excedem 40% da renda familiar depois de satisfeitas as necessidades de subsistência2. Eles estão intimamente ligados ao modo como a saúde é financiada, ou seja, por meio do pagamento de impostos, de alguma subvenção estatal ou são gastos diretos pagos pelos usuários. Essas despesas são, segundo a OMS, aqueles pagamentos por indivíduos para os prestadores de serviços de saúde no momento da utilização, excluindo impostos e também seguro de saúde, sem a possibilidade de reembolso.

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Desde a publicação do Relatório sobre a Saúde no Mundo 2010 “Financiamento dos Sistemas de Saúde: o caminho para a cobertura universal”, a OMS e seu braço nas Américas, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) vem trabalhando para aumentar a cobertura e/ ou o acesso universal como uma das maneiras de reduzir o risco de gastos catastróficos. A cobertura universal é um conceito amplo que se refere principalmente à estruturação de sistemas de saúde, abarcando desde aqueles baseados em seguros com pacotes mínimos até os reconhecidos como sistemas universais de saúde. Apesar da falta de especificidade do conceito, esta política ganhou ainda mais projeção com o lançamento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas (ODS), em que seus países membros acordaram alcançar uma cobertura universal até 2030. O objetivo 3.8 (parte dos ODS 3 -Saúde) tem como indicadores a cobertura de serviços de saúde essenciais e a insuficiência da proteção financeira, ou seja, a proporção da população com gastos em saúde superiores a 25% de sua renda total.


Perticara, que realizou um estudo sobre gastos em saúde em sete países (Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, México e Uruguai) para a CEPAL3, encontrou um dado que pode parecer contraditório, mas que tem explicações ainda mais devastadoras. A proporção de domicílios com despesas zero em saúde é, em termos relativos, mais alta entre grupos de baixa renda (com exceção do Equador e da Colômbia), ou seja, as pessoas mais vulneráveis não gastam com saúde. Isso, explica a pesquisadora, é devido ao fato de que muitas dessas pessoas estão cobertas de alguma forma por seguros sociais, mas além disso, existe uma conclusão mais preocupante: esses grupos simplesmente não tem recursos para gastar com saúde. Em um estudo de 20164, a pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, Vera Lucia Luiza, e colegas apontam que 5,3% dos domicílios brasileiros são extremamente afetados por gastos catastróficos em saúde e em 3.2%, os gastos com medicamentos foi o principal promotor dessa situação. O Brasil tem um sistema de saúde universal que abrange todo o seu território e busca a equidade e a integralidade do cuidado em saúde; entretanto, grande parte dos custos de medicamentos são privados5. Na Argentina, um dado importante revela que 1,7% dos domicílios caiu em situação de pobreza por gastos diretos em saúde6. Para mitigar esses efeitos, nos últimos anos no país “regulamentos que colocam limites em aumentos de planos de saúde melhoraram os direitos dos pacientes, também podem ter reduzido a incidência de gastos catastróficos”, disse Marcela Perticara. No sentido de mitigar esses riscos para as populações, outros países da região estão implementando reformas em seus sistemas. Chile é um caso importante com a recente aprovação da lei Ricarte Soto, experiência apresentada pelo país durante a Assembleia Mundial da Saúde

deste ano. Segundo a ministra da Saúde chilena, Carmen Castillo, em uma entrevista para a Saúde ao Sul, esta é uma lei que “inclui tratamentos, dispositivos sanitários e alimentos de alto custo cujos gastos diretos arruinariam uma família”. No caso do AUGE (Plano de Acesso Universal de Garantias Explícitas), que cobre doenças crônicas de maior prevalência na população, as expectativas de melhorias são ainda maiores. A OMS aponta várias maneiras de mitigar e reduzir essas despesas, como abolir pagamentos de serviços públicos, isentar populações vulneráveis ​​de pagamentos e oferecer sem custo serviços como cuidados materno-infantis. Isso, de fato, indica que são necessárias mudanças estruturais nos sistemas de saúde, com o amplo redesenho das políticas. Dessa forma, os desafios dos sistemas de saúde da nossa região são múltiplos no sentido de alcançar a proteção financeira das pessoas; no entanto, não podemos perder de vista a busca pela equidade de forma ampla e da garantia do direito à saúde para todas as populações.

Referências 1. OMS. Financiación de los sistemas de salud: el camino hacia la cobertura universal. 2010. 2. XU Ke, et al. Designing Health Financing Systems to Reduce Catastrophic Health Expenditure. Technical Briefs for Policy-Makers, OMS, 2005. 3. PERTICARA, M. Incidencia de los gastos de bolsillo en salud en siete países latinoamericanos, v. 50, supl. 2, 15s, 2008. 4. LUIZA, VL et al . Gasto catastrófico com medicamentos no Brasil. Rev Saúde Pública 2016;50(supl 2):15s. 5. Boing AC, et al. Acesso a medicamentos no setor público: análise de usuários do Sistema Único de Saúde no Brasil. Cad Saude Publica. 2013;29(4):691-701. 6. ABELDANO, RA. Análisis del gasto de los hogares en salud en Argentina, como componente de la cobertura universal de salud. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro , v. 22, n. 5, p. 1631-1640, May 2017.

Flávia Bueno flaviabueno@isags-unasur.org

De fato, os estudos que comparam a prevalência de gastos catastróficos apresentam metodologias muito distintas; além disso, as principais fontes de informação que eles utilizam, em geral nas pesquisas de domicílios de cada país, têm variantes importantes, tais como a estrutura do sistema de saúde e “a maneira como se pergunta nestes inquéritos de gastos, [que] pode fazer com que as pessoas respondam de forma diferente”, acrescenta Marcela Perticara, professora da Universidade Alberto Hurtado, Chile.

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Saúde Sexual

e saúde Reprodutiva Venezuela

Equador

Guiana

suriname

colômbia

Peru

2,5 milhões

menores de mulheres mundo dar de 16 anos no 16) (EMSMNA 20 à luz por ano

Brasil Bolívia Paraguai

chile

Argentina

uruguai

Número de na scidos vivos por 1.00 0 mulheres adolescentes de 15 a 19 ano s 40 a 55 55,1 a 70 70,1 a 85 85,1 a 90 Fonte: Saúde da s Américas 20 16 (OPAS/OMS)

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Número de nascidos vivos de mulheres entre 15 e 19 anos de idade

Fecundidade adolescente na América Latina 90 85 80 75 70 1990

2000

2010

anO

Fonte: Divisão Estatística das Nações Unidas: Bas e de dados de indicadores dos Objetiv os de Desenvolvimento do Milênio

Algumas recomendações para a prevenção de gravidez não desejada na adolescência

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Fortalecer a educação sexual sob uma perspectiva de direitos sexuais e reprodutivos Facilitar o acesso e o uso de anticoncepcionais aos adolescentes Reduzir o aborto inseguro entre os adolescentes

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Combater a violência sexual Limitar o casamento antes dos 18 anos

6 Favorecer serviços amigáveis à saúde sexual e saúde reprodutiva para os adolescentes

Meta 3.7 dos ODS Usãoruosgúunicaois epaGíseus idaa nAmaéricitaido

Para 2030, garantir o acesso universal aos serviços de saúde sexual e reprodutiva, inclusive os de planificação da família, informação e educação, e a integração da saúde reprodutiva nas estratégias e programas nacionais

aborto é perm do Sul onde o té 12 ircunstância a c r e u lq a u q em estação. semanas de g

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ENTREVISTA:

CARISSA ETIENNE

diretora da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) Nomeada em 2013 para a posição mais alta na Organização PanAmericana da Saúde, a sanitarista dominicana, Carissa Etienne, está concorrendo a um segundo mandato. Como a única candidata, ela certamente será reeleita na Conferência Sanitária Pan-Americana no final de setembro. Carissa Etienne falou com a nossa diretora executiva, Carina Vance, sobre o trabalho com outras organizações intergovernamentais, a colaboração com atores não-estatais e suas prioridades para o futuro. 10


Carina Vance: Há muitos acordos políticos e comerciais nas Américas - como UNASUL, do MERCOSUL, ORASCONHU, CARICOM e COMISCA - que têm seus próprios processos de definição de agendas sub-regionais. A partir da posição de diretora da OPAS, como você definiria um roteiro para fundir e criar sinergias entre todos estas diferentes agendas e prioridades? Carissa Etienne: As Américas têm muita diversidade, seja cultural ou socioeconômica, e a OPAS, como organização intergovernamental, tem o dever de reconhecer as especificidades e necessidades dos países e grupos regionais. A América do Sul, por exemplo, é uma região altamente desenvolvida no que diz respeito aos processos de integração e me parece essencial trabalhar com eles. Por um lado, temos muito conhecimento e experiência; portanto, devemos compartilhar muito mais no marco da cooperação Sul-Sul, da cooperação triangular, etc. Por outro, a OPS pode funcionar como um elo entre as subregiões.

CV: Como você vê o papel do novo escritório da OPAS em Lima para a coordenação subregional? CE: Nós temos um escritório regional há muito tempo na região da Comunidade do Caribe (CARICOM). Esta é uma iniciativa de aproximação da subregião, incluindo as organizações subregionais, não do ponto de vista de vender a nossa agenda, mas do ponto de vista da colaboração e de melhorar o trabalho que fazemos por meio da cooperação técnica ou de outras atividades. Novamente, isso depende das especificidades de cada país e subregião. Estou muito animada que tenhamos tanta solidariedade no nosso continente e parece perfeitamente possível que possamos nos juntar para definir uma agenda comum para unir nossos esforços. Em última análise, nós existimos para servir aos Estados membros, então o melhor que podemos fazer é dar mais eficiência ao nosso trabalho, nunca desde uma posição de oposição ou competição.

CV: Qual é a sua posição em relação aos atores nãoestatais, que hoje desempenham um papel tão importante na Saúde Global? Como a OPAS está implementando o Convênio Marco para colaboração com atores nãoestatais (FENSA) e quais os próximos passos? CE: Como você sabe, toda a discussão mundial na OMS sobre o FENSA demorou cerca de quatro anos, porque há uma dicotomia significativa em relação à forma como os países entendem o papel do setor privado e dos atores não-estatais. Muitos países do continente, particularmente o Sul, demonstraram muitas preocupações sobre a influência do setor privado dos atores não-estatais na tomada de decisões da OMS. Eles estavam preocupados com a necessidade de salvaguardar o papel da OMS na definição de normas e padrões e, portanto, desejavam uma barreira à influência de atores não-estatais. Outros grupos não pensavam assim. Então, o FENSA foi desenvolvido e foi aceito pelos Estados membros. A OPAS teve dificuldades com isso, porque temos a nossa própria constituição e teríamos que tornar-los compatíveis. Por exemplo, quem decide quem são os atores não-estatais com que a OPAS trabalha não é o diretor geral da OMS, mas a própria OPAS através do seu diretor. Minha opinião sobre isso é que, por causa da Agenda para o Desenvolvimento

Sustentável, a Agenda 2030, governos e organizações intergovernamentais por si só não poderiam fazer o trabalho. Vamos precisar da colaboração do setor privado, incluindo fundações e sociedade civil. No entanto, devemos ter cuidado. Os objetivos e desafios de atores não-estatais não são necessariamente os mesmos que os nossos, por isso temos de ter muito cuidado com as relações e com nossos princípios.

CV: Na sua opinião, quais foram as realizações mais importantes do seu primeiro mandato como diretora? Quais foram os desafios? CE: Continuando o trabalho que vinha sendo desenvolvido antes, tivemos muitas boas notícias nos últimos 5 anos, como o anúncio da eliminação do sarampo e da síndrome congênita da rubéola, o que é uma grande conquista. Estamos trabalhando com alguns países que finalmente conseguiram eliminar a oncocercose e o tracoma - os primeiros países do mundo a fazê-lo. Cuba foi o primeiro país no mundo a interromper a transmissão de mãe para filho do HIV-AIDS. Por sua vez, os casos de malária caíram drasticamente e estamos buscando uma agenda de eliminação particularmente na América Central, mas também na América do Sul. Ou seja, em termos de doenças infecciosas negligenciadas fizemos muito. Como você sabe, uma das minhas prioridades é o acesso universal à saúde e a cobertura universal. Revitalizamos a questão do fortalecimento dos sistemas de saúde com foco na atenção primária, com a adoção de uma resolução em 2014 - foi um dos dias mais felizes da minha vida - mas ainda falta muito. No que diz respeito às doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), é muito frustrante que não tenhamos financiamento suficiente nem de governos nem de doadores, embora pudéssemos fazer algumas coisas. Incluímos medicamentos para as DCNT no Fundo Estratégico, que hoje compreende 30 países. Inclusive, fizemos um acordo com o Mercosul para as negociações de medicamentos de alto custo cujas compras serão realizadas através do Fundo. Trabalhamos também com os países em temas de prevenção das DCNT, como a luta contra o tabaco, a implementação da rotulagem de alimentos, o aumento da atividade física, entre outros. Outro importante trabalho que fizemos foi com o Regulamento Sanitário Internacional. Em um total de 28 missões, podemos verificar o status de capacidades importantes, identificar lacunas e oferecemos ajuda para encerrá-las. No que diz respeito a vacinas, tivemos muitos desafios. Cerca de 41 países compram vacinas através do nosso programa, o que significa uma economia de milhões de dólares para eles. Seria necessário quantificar bem. Outro grande sucesso, algo sem precedentes na história da OPAS: o apoio que demos ao Brasil no programa “Mais Médicos” para aumentar o acesso aos serviços de cuidados primários em áreas rurais. Atuamos como mediadores entre o país e Cuba, que chegou a enviar 12 mil médicos através do programa. Trabalhamos também na avaliação contínua e no gerenciamento de seus fundos. Um dos principais desafios com resultados espetaculares, já que pudemos estender o cuidado a 63 milhões de pessoas. 11


AO PONTO

Por Carina Vance

Saúde em todas as políticas, incluindo o comércio... Em poucos meses, Buenos Aires será a sede da XI Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), a reunião de mais alto nível da organização, que a cada dois anos é convocada para discutir e decidir sobre questões de comércio mundial, incluindo tópicos com grandes implicações para a saúde da população. É a primeira vez que o evento é realizado em um país da América do Sul. Na OMS seus países membros já tomam decisões sobre o acesso a medicamentos, tais como o uso das flexibilidades do Acordo TRIPS para o licenciamento compulsório; políticas de controle de produtos do tabaco, tais como as implementadas no Uruguai e outros países da região, e são debatidas políticas, tais como a rotulagem de alimentos processados, implementadas por Chile e Equador. Nesta área de disputa entre os interesses da saúde pública e os interesses econômicos, setores 12

interdependentes, os interesses das maiores empresas transnacionais do mundo são muitas vezes apoiados pelos países mais poderosos em oposição aos argumentos do campo da saúde. É um cenário em que a saúde global se beneficiaria pela participação mais substantiva dos representantes do setor de saúde dos diferentes países. Os Ministérios da Saúde estão ativamente envolvidos na Assembleia Mundial da Saúde e em conferências internacionais e regionais dos mecanismos de integração ou organismos que trabalham diretamente na área da saúde. Estas também são áreas de disputa, sem dúvida, mas são onde a arena de debate está mais inclinada para os interesses da saúde pública e onde muitas vezes, apesar das particularidades e nuances das diferentes posições de defesa da saúde, estamos reunidos com aqueles já convencidos


disso. Isto não significa que não seja valioso este exercício que nos permite compartilhar ideias e experiências para fortalecer os argumentos e estratégias de negociação, mas os acordos e resoluções decorrentes destas áreas devem ser complementadas por acordos que existem em outras áreas, se esperamos que sejam eficazes. O caso da rotulagem de alimentos processados implementado no Equador em 2014 é amplamente reconhecido, mas menos conhecido é o processo subsequente que ocorreu na OMC, no qual, entre outros, a União Europeia, os Estados Unidos e a Suíça, levantaram uma “preocupação” de que a medida pode ser uma “barreira técnica ao comércio”. O Estado equatoriano manteve a política com sucesso, indicando que era uma medida que procurou proteger a saúde de sua população e demonstrando que não violou qualquer um dos acordos OMC. É bem possível que a estratégia de defesa não teria sido bem-sucedida se não tivesse havido uma articulação estreita entre Carteiras responsáveis ​​ pela saúde, comércio exterior e produção, como foi o caso. Além disso, algo que chama a atenção é que o Equador recebeu pedidos de cooperação na área da saúde em relação à implementação da rotulagem pelos ministérios de saúde de vários países, ao

mesmo tempo em que tinha que defender esta mesma política das objeções apresentadas à OMC por representantes de comércio exterior de alguns desses mesmos países. Este exemplo demonstra claramente uma situação que se repete ao tratar esta e outras questões dentro dos países, posições por vezes contraditórias entre os setores da saúde e do comércio. A abordagem “saúde em todas as políticas” é mencionada em quase todas as áreas onde os problemas de saúde são discutidos desde a Declaração de Helsinki de 2013. Ela propõe uma abordagem intersetorial que leva em conta o impacto de todas as políticas públicas sobre a saúde. Muitas vezes são compartilhadas experiências bem sucedidas de articulação com os setores da educação, desenvolvimento social e inclusão econômica, sem dúvida essenciais para melhorar a situação de saúde da população. Como esses setores, o comércio é igualmente crítico para a saúde. Seria, portanto, estratégico que os países que participarão da Conferência da OMC, o façam com contribuições dos ministérios de saúde nos temas de sua competência. Se efetivamente se deseja que a saúde seja considerada em todas as políticas, é preciso jogar a seu favor em todas as frentes.

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Um longo caminho a percorrer O que os países estão fazendo para superar os objetivos e desafios da região em Saúde Indígena Muito antes da chegada dos europeus, os povos indígenas habitavam vastas extensões da América do Sul. Se estima que, em 1492, a população indígena na região chegava a cerca de 20 milhões (Sapper, 1924). Por conta do voraz colonialismo, muitas destas populações foram dizimadas. No entanto, depois do século XIX, o número de indígenas voltou a crescer e suas necessidades, lentamente, passaram a integrar as agendas de políticas públicas de Saúde. De acordo com uma análise populacional da Comissão Econômica para América Latina e o Caribe (CEPAL), de 2014, se estima que a população indígena some cerca de 45 milhões de pessoas, ou 8,3% da população da região. Podemos supor que este crescimento é resultado de uma maior consciência étnica, e “da revitalização da identidade indígena nos últimos anos, que consequentemente se materializa em um aumento da auto identificação” (CEPAL/CELADE, 2014). Apesar do espaço conquistado nas agendas de políticas públicas de Saúde, hoje em dia, as necessidades destes povos também são muito mais complexas do que antes e vão além de assuntos como a interculturalidade e as diferenças entre a medicina tradicional e a medicina ocidental. Existem novas doenças, transtornos e outras condições introduzidas em suas vidas. A antropóloga e codiretora do Centro de Estudos em Antropologia da Universidade Nacional de San Martin de Argentina (CEA/UNSM), Silvia Hirsch, afirma que, ultimamente, se nota um aumento nos casos de Doenças Não-Transmissíveis (DNTs), por exemplo. “A diabete, a obesidade e os transtornos consequentes destes problemas estão crescendo muito”, informa a especialista, que junto a Mariana Lorenzetti acaba de lançar o livro “Saúde Pública e Povos Indígenas na Argentina”.

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Para ela, essas novas necessidades se refletem em muitos aspectos que requerem adequações na gestão pública de

Saúde, como por exemplo a Atenção Primária e a eficácia dos sistemas. Em geral, por toda América Latina existem políticas públicas em Saúde que “mais o menos” chegam a essas populações. “Mas acontecem muitas coisas. Em algumas comunidades os programas funcionam melhor que em outras. Às vezes não chegam médicos com frequência. O tema do acesso a medicamentos também é uma questão e a dimensão cultural é algo que precisa melhorar muito em políticas públicas, não somente na Argentina, mas em toda a região. Há diferenças e tensões sérias, mas se muitos procuram os sistemas é porque existem doenças graves para tratar”, opina. De uma maneira geral, na América do Sul, quase todos os ministérios de Saúde têm programas, direções ou secretarias que tratam exclusivamente do tema da Saúde Indígena ou intercultural. Brasil, por exemplo, que possui a maior diversidade da região com 305 povos originários, criou em 2010 a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). Desde então, foram desenvolvidas ações importantes como, por exemplo, o combate à mortalidade infantil indígena. Segundo o ministério, a cobertura nutricional de crianças com menos de cinco anos passou de 61,9%, em 2013, para 67,9%, em 2014. Além disso, o programa “Mais Médicos” aumentou em 344 o número de médicos nos 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI). Já no Peru, país que tem a maior população originária da região (7 milhões), em abril deste ano, foi reincorporada ao ministério da Saúde a Direção de Povos Indígenas ou Originários, mas agora como parte da Direção Geral de Intervenções Estratégicas em Saúde Pública. É esperado que a nova norma gere mais atenção em Saúde às comunidades do país com políticas adaptadas às suas realidades e necessidades.


A importância das organizações intergovernamentais

COLÔMBIA: Em maio de 2017, o Ministério da Saúde anunciou um plano estratégico contra a tuberculose. O subdiretor de doenças transmissíveis, Diego Alejandro García Londoño, sinalizou que no marco do plano devem se “fortalecer as linhas estratégicas na população vulnerável, especialmente a indígena”;

Na América do Sul, existem muitas iniciativas e organizações regionais que são muito significativas para o trabalho pela Saúde dos povos originários, já que têm a missão de superar as fronteiras e criar um olhar conjunto nas decisões dos governos. O Organismo Andino de Saúde-Convênio Hipólito Unanue (ORAS-CONHU), por exemplo, que desde 1971 trabalha pela Saúde dos povos andinos, possui muitas políticas neste sentido. Uma das mais importantes é a “Política Andina de Saúde Intercultural”, lançada em 2014.

ARGENTINA: Em 2016, o país criou o primeiro Programa de Saúde para os Povos Indígenas, no âmbito da Direção Nacional de Atenção Comunitária do Ministério da Saúde da Nação; BOLÍVIA: Em agosto de 2016, no seminário “Saúde dos Povos Indígenas”, Bolívia se comprometeu a fortalecer a Saúde Familiar Comunitária Intercultural; CHILE: Em abril deste ano, após dois anos de negociações, Chile aprovou o novo regulamento que estabelece o direito das personas pertencentes a povos indígenas a receber atenção de saúde com pertinência cultural; VENEZUELA: Em 2010, Venezuela deu início ao projeto “Cacique Nigale”, que tem como missão direcionar jovens estudantes de comunidades indígenas a carreiras da área da Saúde, diminuindo assim as brechas interculturais no sistema.

Outro exemplo de cooperação é uma capacitação em malária coordenada pela Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) em países como Bolívia, Peru e Equador, que vão formar seus técnicos em assuntos indígenas. Muitos dos participantes são membros destas comunidades. “A OTCA, como organização, tem entre suas funções criar estruturas que levem a decisões coletivas e que permitam aos países desenvolver visões coletivas que se convertam em ferramentas para decisões nacionais e regionais”, disse o diretor executivo da organização, César Augusto de las Casas Díaz. Apesar dos avances, ainda existem muitas dificuldades no caminho a uma atenção integral em Saúde para estas populações. O coordenador regional de Saúde da OTCA, Luis Francisco Sánchez Otero, cita alguns dos muitos objetivos atualmente apresentados, como a introdução de doenças sexualmente transmissíveis em seus ambientes como a AIDS e as hepatites, as doenças transmitidas por vetores, a resistência aos antibióticos, a mineraria ilegal e os interesses da iniciativa privada, entre outros. “A Amazônia é uma

região heterogênea. As situações e riscos são diferentes. Desde o ponto de vista da informação, por exemplo, os indígenas muitas vezes são fechados, ilhados ou o próximo posto de Saúde está a três dias em barco. Essa informação, que nos permitiria fazer uma melhor caracterização para as intervenções, nós não temos. Há muito trabalho, muitas perspectivas e muitas coisas interessantes para fazer por eles, mas não se pode olhar os problemas separadamente”, conclui. Atualmente, o ISAGS também trabalha no desenvolvimento de um levantamento de políticas de saúde intercultural dos países da região, coordenado pelo especialista do Instituto em Determinantes Sociais da Saúde, Francisco Armada. O estudo responde a um pedido da Bolívia, aprovado em consenso pelos ministérios de Saúde da UNASUL. “A enorme diversidade cultural sul-americana, assim como seu caráter multiétnico e pluricultural representa ao mesmo tempo um desafio e uma excelente oportunidade para a formulação de novas políticas públicas”, afirma Armada. Referências 1. Steward, Julian H. A população nativa da América do Sul. Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia, São Paulo, v.10, p. 303-315, 2000. 2. NU. CEPAL. Los pueblos indígenas en América Latina. Avances en el último decenio y retos pendientes para la garantía de sus derechos. Síntesis. 2014.

Mario Camelo mariocamelo@isags-unasur.org

Outras boas práticas em países da região

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INSTITUCIONAL Diálogos do Sul: A segunda edição do ciclo de debates sobre integração em Saúde destaca aspectos do Regulamento Sanitário Internacional (RSI) A segunda edição de Diálogos do Sul – o ciclo de debates que discute de forma prática e dinâmica temas de Saúde como ponto de convergência entre os países da América do Sul – tomou lugar no último 13 de junho na sede do ISAGS e foi marcada pela discussão sobre o Regulamento Sanitário Internacional (RSI), que acaba de completar dez anos de implementação. “Entre o direito individual e a proteção da Saúde Pública: Epidemias e o papel do Estado” foi o nome da mesa, moderada pelo especialista do ISAGS em Vigilância em Saúde, Eduardo Hage, e que contou com a participação da Doutora em Direito Internacional, Deisy Ventura, do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (IRI/USP); e do Doutor em Saúde Pública, Fernando Aith, do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (DMPFM/USP).

PÍLULAS

SALUD SUR

Convocatória de Estudos de Caso: Envelhecimento Saudável Até o dia 23 de julho, o ISAGS abre convocatória de Estudos de Caso sobre o tema Envelhecimento Saudável. Serão selecionados três estudos sobre intervenções realizadas em países da região, que receberão apoio na documentação e divulgação. O Instituto também oferecerá ajuda nos processos de recolhimento de informação, publicação e difusão dos estudos. O objetivo é caracterizar o processo de envelhecimento na região com ênfase no impacto nos sistemas de saúde e em estratégias dirigidas a um melhor funcionamento das condições de vida da população de idosos. Os interessados devem acessar o website do ISAGS para se inscrever: www.isags-unasur.org.

ENSP e ISAGS reafirmam convênio de colaboração pela formação em Saúde Pública

Hage e os especialistas discutiram as mudanças e desafios para os países sulamericanos na adoção das medidas do RSI, no que se refere às suas estruturas jurídicas; além das medidas específicas de vigilância previstas para emergências em Saúde Pública, especialmente as epidemias e suas relações com o direito à Saúde. Os direitos e liberdades individuais e coletivos também foram temas da pauta. Diálogos do Sul continua até o fim do ano e sua próxima edição será em setembro.

Dia Mundial sem Tabaco: ISAGS organiza evento para discutir os impactos do uso da substância na região No último 1º de junho, no marco da data instituída pela Organização Mundial da Saúde, o ISAGS organizou, junto a instituições do Brasil vinculadas ao tema, o evento “Dia Mundial Sem Tabaco – Os Custos para o Desenvolvimento na América do Sul”, chamando a atenção sobre a luta contra o uso da substância, que mata cerca de seis milhões de pessoas ao ano, segundo a OMS. A sede do Instituto recebeu pesquisadores, especialistas e representantes de instituições relevantes no tema para um debate conduzido pelo nosso especialista em Determinação Social da Saúde, Francisco Armada. Também foi apresentado o estudo inédito: “Carga de doenças atribuível ao uso do tabaco no Brasil e o potencial impacto do aumento de preços por meio de impostos”, da pesquisadora Márcia Pinto, do Instituto Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz) e colaboradores. A avaliação, elaborada em 2013 e atualizada este ano, inclui dados sobre algumas doenças relacionadas ao uso do tabaco e o custo das mesmas para os sistemas de saúde do Brasil e de outros países sul-americanos. Temas como os avanços e desafios do Programa Nacional de Controle do Tabagismo no Brasil; a contribuição das agências reguladoras para o desenvolvimento sustentável através do controle do tabaco; e o controle do tabaco na Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável foram alguns dos pontos levantados pelos especialistas. Foram co-organizadoras do evento a Comissão Nacional para a Implementação do Convênio Marco para o Controle do Tabaco (CONICQ/Brasil); a Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Brasil (ANVISA); o Instituto Nacional do Câncer do Brasil (INCA), a Aliança de Controle do Tabagismo (ACT), a Fundação do Câncer, e o Centro de Estudos sobre o Tabaco e a Saúde (CETAB/Fiocruz). 16

A diretora executiva do ISAGS, Carina Vance, e a equipe de Relações Internacionais se reuniram com a Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz) – que também exerce a Secretaria Executiva da Rede de Escolas de Saúde Pública da UNASUL (RESP/UNASUL) – para discutir temas da agenda comum de trabalho entre as duas instituições. No encontro, os organismos se comprometeram a seguir com a atualização do panorama de formação em Saúde Pública na região sul-americana, um projeto já em desenvolvimento. O diretor da ENSP, Hermano Castro, e Vance também destacaram a intenção de aumentar a participação em atividades comuns.

Novo informe sobre crianças e adolescentes do MERCOSUL O Instituto de Políticas Públicas em Direitos Humanos do MERCOSUL (IPPDH) acaba de lançar o informe “Meninos, meninas e adolescentes através das fronteiras do MERCOSUL”, que apresenta e discute os resultados de uma investigação elaborada durante o ano de 2014 com a Oficina Regional para América do Sul da Organização Internacional Para as Migrações (OIM) com o propósito de contribuir para uma melhor compreensão dos motivos e das modalidades pelas quais os meninos, meninas e adolescentes cruzam as fronteiras internacionais. Acesse o estudo completo no website da Organização: www.ippdh.mercosur.int.


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