Coletaneaoxe 2011 2012

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Arte de capa e diagramação Rogers Neves Organização André Arruda e Mariana Moura Revisão Fabia Pierangeli, Mariana Moura e Meire Ramos Produção Ôxe! Produtora Comunitária Realização Ôxe! Produtora Comunitária e Confraria Poética Marginal Contato (11) 4488-8524 digaoxe@gmail.com



Copyright© Dos Autores 6711/1 – 1500 – 80 – 2013 O conteúdo desta obra é de responsabilidade do(s) Autor(es), proprietário(s) do Direito Autoral.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Coletânea ôxe! : 2011-2012 / organizadora Mariana Moura Lima. -- 1. ed. -- São Paulo : Scortecci, 2013. Vários autores. ISBN 978-85-366-3252-0 1. Contos brasileiros - Coletâneas 2. Poesia brasileira - Coletâneas I. Título.

13-05520

CDD-869.9308 -869.9108

Índices para catálogo sistemático:

1.  Contos : Coletâneas : Literatura brasileira 869.9308 2. Poesia : Coletâneas : Literatura brasileira 869.9108

Grupo Editorial Scortecci Scortecci Editora

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Esta coletânea Ê dedicada a todos aqueles que heroicamente continuam produzindo Arte e Cultura nas periferias do Brasil e do mundo.



Este livro foi produzido através do Programa de Ação Cultural 2012, da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo, um programa mantido com recursos públicos, ou seja, dinheiro dos nossos impostos. Portanto, você leitor, que tem este livro em mãos, além de leitor, é também um co-financiador dessa nossa empreitada. E por isso, nós, organizadores e autores, te pedimos para nos ajudar num grande desafio: o de fazer com que ele e todas as suas informações circulem por aí. Não deixe este livro guardado na gaveta ou empoeirando numa estante, leia-o e depois, passe pra frente.

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Sumário

Uma introdução.................................................................... pág. 11 Chamamento à Revolução - André Arruda........................... pág. 15 Pais Pudins - Beto Bellinati.................................................. pág. 17 Regue o Jardim – Nilton Mourão.......................................... pág. 19 Conto de todas as cores no Paraíso - André Arruda............. pág. 21 Comodidade X Mudança - Danilo Góes................................ pág. 22 Que Diabos! - Nilton Mourão............................................... pág. 24 Dia da Verdade - Danilo Góes.............................................. pág. 26 A menina da mochila vermelha - George de Paula............... pág. 27 À caminho do almoço - Beto Bellinati.................................. pág. 28 Trabalho - Daniela Mendes................................................... pág. 30 Paixãozinha - George de Paula............................................. pág. 31 Dor de Cão - Daniela Mendes ..............................................pág. 33 As rachaduras - George de Paula.......................................... pág. 34 Aonde ando é onde ando - Messias Silva...............................pág. 36 Uma cena peculiar - George de Paula................................... pág. 37 Pílulas do Lobato - Luís Lobato........................................... pág. 38 O Tempo - Messias Silva....................................................... pág. 39 A infeliz história de Morato - Alexandre Barbosa.................. pág. 40 Lembranças póstumas de um Morto-Vivo - Danilo Góes....... pág. 41 Na fila do banco... - Geoge de Paula.................................... pág. 43 O Predador - Messias Silva................................................... pág. 44 Mais veloz que o pensamento - André Arruda....................... pág. 45 Até no Lixão nasce flor - Danilo Góes...................................pág. 46 Passado ao Presente - George de Paula................................pág. 48 Há Elite e Elite! - Messias Silva............................................ pág. 49 O golpista - André Arruda.................................................... pág. 51 Das Eleições - George de Paula.............................................pág. 52


Ao "Girandolá" apresento o "Pé na Jaca" - Messias Silva..... pág. 53 Espelho - André Arruda.......................................................pág. 55 Os aparelhos sonoros em trens e o futuro da Humanidade - George de Paula........................................pág. 56 É Chegado o Grande Dia - Danilo Góes............................... pág. 57 Diagnóstico Denúncia - André Arruda.................................. pág. 59 A única verdade é que mentimos - Danilo Góes.....................pág. 61 Das cenas pitorescas de cada dia - George de Paula............. pág. 63 Ela é a Fina Flor do Samba Moratense - Messias Silva.........pág. 65 Ditadura ao contrário - Franklin Falcão................................pág. 69 No Leito de Morte - Frank Neres...........................................pág. 71 Na Rodoviária do Tietê... - George de Paula..........................pág. 72 A Arte - Messias Silva........................................................... pág. 74 Ressaca de Cinza - Danilo Góes........................................... pág. 75 Maria da Silva - George de Paula......................................... pág. 77 Quem conta um conto... - Marco Nogueira e

Fabia Pierangeli.................................................................... pág. 79 O Homem de Terno Xadrez... - Messias Silva....................... pág. 81 Fazenda no Passado - Silmara Cavalcante.............................pág. 84 Homem virtual - André Arruda............................................. pág. 85 Amores ad infinitum - André Arruda.....................................pág. 85

Quadrilha pós-moderna ou atualizando Drumond - André Arruda.................................. pág. 85 O Movimento Feminista, o pior erro das mulheres - George de Paula........................................... pág. 86 Quem conta um conto aumenta um ponto (parte 2) - Marco Nogueira................................... pág. 87 Tenho Fé - Danilo Góes e Silmara Calvacante...................... pág. 89 A Lei Maria da Penha - Tião Simpatia.................................. pág. 91 Na praça... - George de Paula............................................... pág. 93 A outra face - André Arruda................................................ pág. 95 Mais esta noite - André Arruda.............................................pág. 95 A culpa sumprema - André Arruda....................................... pág. 95 21 Gramas - Danilo Góes..................................................... pág. 96 Dos personagens de cada dia - George de Paula................... pág. 98 Triste ironia da vida - Danilo Góes...................................... pág. 100 Poema furtivo – Remisson Ancineto..................................... pág. 102


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Uma Introdução

Ôxe! Produtora Comunitária No surgimento da ideia de se produzir um informativo que tratasse das questões culturais, entre outras tantas, relacionadas à realidade de Francisco Morato e região, pensava-se já em uma espécie de jornalismo cidadão, ou seja, aquele em que a própria população; independentemente de uma formação jornalística mas enquanto agente da história local; vivencia, denuncia e propõe algum tipo de reflexão sobre os acontecimentos do lugar, colaborando dessa forma com o processo de disseminação das informações. Quando, pois, em junho de 2009, veio à luz a primeira edição do Informativo Ôxe!, convidando esses cidadãos a colaborarem de forma participativa com textos, imagens, sugestões, etc, houve de imediato a resposta de muita gente amiga (alguns já de tempos, outros tantos a quem até então a vida não nos havia apresentado, mas que hoje já fazem parte também desta grei) que parecia chegar com um tremendo anseio de expressar suas inquietações. Essas mesmas inquietações estão reunidas nesta coletânea de textos que celebra o quarto aniversário do Informativo Ôxe! e que foi possível realizar graças ao apoio da Secretaria de Estado da Cultura, através de seu Programa de Ação Cultural. Falar sobre cada um dos autores reunidos nestes livros seria um tanto difícil, isto porque, além de prolongar um texto que se propõe introdutório, para fazê-lo teríamos, de alguma forma, de falar dos vários que podemos encontrar em cada um deles. E isso estamos certos de que o leitor, com sua acuidade, terá a oportunidade de perceber. Como poderá perceber também a evolução, não apenas 11⁠


cronológica, mas, principalmente, estilística, de cada um deles. E este, para nós, é o fator que mais importa, pois, consequente e naturalmente, isto contribuiu também com a, cada vez melhor, aceitação do Ôxe! pela população de leitores. Escrever com propriedade sobre o lugar onde vive não parece ser tarefa das mais difíceis. Porém, fazer isso com uma visão refinadamente crítica, numa forma que ousamos definir como uma poética da transformação e, ainda mais, não tendo preocupação alguma em querer agradar a “x”, “y” ou “z” é algo que merece ser destacado. Fica para nós a satisfação de cumprir mais uma etapa, o que não deixa de ser mais uma conquista da Equipe Ôxe!, da qual também fazem parte Alexandre Barbosa, André Arruda, Beto Bellinati, Cleidemir Gonçalves, Daniela Mendes, Danilo Góes, Eduardo Bartolomeu, Fabia Pierangeli, Frank Neres, Franklin Falcão, George de Paula, Josefa Perez, Luis Lobato, Marco Nogueira, Mari Moura, Messias Silva, Nilton Mourão, Remisson Aniceto, Ricardo Luiz, Silmara Cavalcante, Thiago Henrique e Tião Simpatia. E que outros se apresentem!!!


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Chamamento à Revolução

André Arruda

o que desgraça o mundo? o que mais desgraça o mundo não é a Política o que mais desgraça o mundo são os políticos o que mais desgraça o mundo não é a Ciência o que mais desgraça o mundo são os cientistas o que mais desgraça o mundo não é a Religião o que mais desgraça o mundo são os religiosos o que mais desgraça o mundo não é a Filosofia o que mais desgraça o mundo são os filósofos o que mais desgraça o mundo não é a Economia o que mais desgraça o mundo são os economistas o que mais desgraça o mundo não é a Sociologia o que mais desgraça o mundo são os sociólogos o que mais desgraça o mundo não é a Ideologia o que mais desgraça o mundo são os ideólogos O que mais desgraça o mundo não é a Arte o que mais desgraça o mundo são os artistas 15⁠


Coletânea Ôxe!

o que mais desgraça o mundo não são os seres humanos o que mais desgraça o mundo é a falta de humanidade

o que mais desgraça o mundo não é a falta de poesia observada entre os poderosos o que mais desgraça o mundo é a falta de coragem dos poetas em tomar o Poder

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Pais Pudins Beto Bellinati

Uma Avó Nós, adultos, que sabemos ler e escrever, temos a incoerente mania de querer facilitar a vida das crianças. Elas não podem sofrer. “Eu não quero que meu filho sofra!”, é o que diz – e se não diz, é o que pensa – a maioria esmagadora das mães e pais espalhados por esse mundo. Acontece que, por conta de um fator fundamental, que une todos os seres vivos deste planeta, não podemos ficar parados. Temos que nos alimentar. A comida, simplesmente, não aparece ou cai do céu; é preciso buscá-la. A maioria das crianças – e todas que vivem com um mínimo de conforto em uma comunidade urbana – no entanto, não recebe essas informações. Não fazem a menor ideia de que a vida é dura e, pior, não podem nem saber disso. São protegidas por todos os lados. O que é uma criança, senão um adulto em preparação? Sendo assim, a dor, o sofrimento e o cansaço, que serão inevitáveis na busca adulta por alimentação e moradia, deveriam fazer parte da formação dos nossos filhotes. Contudo, nas sociedades que encontramos por aí, as crianças estão sendo preparadas para serem, eternamente, crianças. Julia é uma dessas. Um dia, sua avó paterna, contrariando todos os prognósticos de avós, confrontou essa situação. Mamãe e papai queriam ir ao cinema depois de jantar. Não sabiam que horas voltariam. Estavam precisando disso. Portanto, Julia foi rebocada para a casa da vovó, o que, de início, a alegrou. Após quinze minutos da despedida, Julia exclamou que tinha fome. O jantar está quase pronto, querida, foi a resposta da avó. Mas eu tô com fome agora. Mas você vai ter que esperar. Eu vou ao banheiro. Se quiser acelerar o processo, pode ir colocando a toalha na mesa. Inconformada com a falta de atenção da avó, Julia entrou decidida na cozinha. Só não sabia o que comeria. Abriu a geladeira e lá estava ele: suculento, coberto de chocolate, esperando, atrás do pote de palmitos, o fantástico pudim da vovó! Não teve dúvidas. Espi17⁠


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chou-se na ponta dos pés e puxou o pote que atrapalhava seu caminho. Só que calculou mal. O pote espatifou-se. A avó observou em silêncio e saiu da cozinha. Julia choramingou. A avó voltou. Julia tentou pedir desculpas. Recebeu uma vassoura, uma pá, um pano, folhas de jornal e instruções. A avó não se moveu. Cortou-se num caco de vidro do pote de palmito. O sangue a assustou. Calma e silenciosamente, a dona da casa fez um curativo. Em seguida, apontou para a sujeira; ainda havia trabalho a fazer. Julia chorava enquanto limpava seu próprio sangue misturado ao palmito. Depois que acabou, jantaram juntas e em silêncio. Ninguém comeu pudim. A avó tem diabetes. Julia não quis. A mãe soube da história no dia seguinte; obviamente, não lhe agradou.

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Regue o jardim

Nilton Mourão

Poeta, tudo pode! in morato no more to garden. Garden, sem gardênias. Negue a Alegria de Jardim sem flor, há odor. Fede the garden Regue Baby Sonia Reggae baby, reggae! Guardem, sem blasfêmias. Segue o Bandeirante no Jardim sem grama, há lama. Fede o jardim Regue Baby Tônia Reggae baby, reggae! No more garden! Desceu a sujeira, Jardins no morro, há morte! No more garden! Desceu a ladeira, Lares do povo, sem sorte! Não more tu no jardim abandonado! Alegria de Bandeirante não é daí desse rol municipal. Não more tu no jardim rejeitado! Alegria de Bandeirante não assa aí

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Coletânea Ôxe!

nesse Sol total. Never more abandonado, rejeitado pelos poderes públicos podres. Nunca mais! Jardim, com beleza. Pegue o homem Guardem com amor, sem dor! Regue o jardim Regue a Bebê Gônia Baby, regue e babe!

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Conto de todas as cores no Paraíso

André Arruda

raíso.

Depois de passar por Francisco Morato, onde Judas perdeu o seu sapato; por Franco da Rocha, onde Judas perdeu sua galocha; por Caieiras, onde Judas perdeu as estribeiras; por Perus, onde Judas perdeu o seu capuz; por Cajamar, onde Judas perdeu seu all-star; por Mairiporã, onde Judas perdeu seu talismã; por Guarulhos, onde Judas perdeu altos bagulhos, por Santo André, onde Judas perdeu o seu boné; por São Caetano, onde Judas perdeu o seu tutano; por Campo Limpo Paulista, onde Judas perdeu sua revista; por Jundiaí, onde Judas perdeu o seu rubí; por Taboão da Serra, onde Judas perdeu a sua guerra; por Catanduva, onde Judas perdeu a sua luva; por Santo Bento do Sapucaí, onde Judas perdeu seu jabuti; por São Carlos, onde Judas perdeu os seus regalos por Jales, onde Judas perdeu gorros e chales; por Bauru, onde Judas perdeu o seu tabu; e outros lugares, por onde Judas perdeu-se nos olhares, o Teatro Girandolá chega com seu Conto de todas as cores, enfim, quase ao Pa-

Mais precisamente ao Centro Cultural Vergueiro, Sala Paulo Emílio, aos sábados e domingos do mês de abril, sempre às 16 horas. Não vá perder você também!!!

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Coletânea Ôxe!

Comodidade X Mudança Danilo Góes

dessa.

- Mãe, quero essa pizza aqui ó, Romeu e Julieta. - Não filho, mussarela ou calabresa... Num sei... Nunca comi

- Mãe, cansei de meio a meio. Situação simples, que refletia minha vida. O medo de arriscar com medo de perder. Era mais cômodo viver naquela situação do que arriscar uma mudança. Coloquei esperança no futuro e ali era meu abrigo. As coisas vão mudar um dia, ideia vaga, sem consistência. Esperava que as coisas mudassem de uma hora para outra. Ele não mudou com o casamento. Simplesmente aperfeiçoou o monstro dentro dele. Tenho minha parcela de culpa, desde o começo já se mostrava um estúpido, era agressivo com as palavras. Mas o desejo e o sexo que se confundiam com amor, me fez refém. As suas brincadeiras agressivas, eu gostava, essas coisas para mim eram atraentes. Vem na mente a primeira briga quando me olho no espelho, devido à marca no supercílio: cismou que a comida tava com veneno – detalhe, nunca pegou num prato para colocar comida – jogou a comida no chão e veio pra cima de mim gritando que eu queria matá-lo. Tava muito louco, com o cão no corpo. Eu era uma tapada, aceitei aquilo e aquilo virou uma constante. Rezava para algum vizinho que não achasse que “briga de homem e mulher ninguém mete a colher” e chamasse a polícia. Uma vez meu irmão entrou na briga e me fez morar com ele. Não me sentia a vontade na sua casa e a minha cunhada era um saco - tudo era culpa dos meus meninos. Meu marido veio com palavras de arrependimento. Não queria ver a verdade, no fundo do meu coração aquelas palavras eram mentiras, mas era o que eu queria ouvir. Voltei para casa. Meu irmão bradou: “finge que morri, você gosta de sofrer mesmo”. Arriscar uma vida nova era novo, ele não entendeu. Situação diferente nos primeiros dias, mas ficou desempregado e a ignorância voltou. Eu retornei para escola, supletivo, e arrumei emprego. A escola e o emprego me trouxeram confiança. O meu 22⁠


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mundo não girava mais em torno do meu marido. Conheci mulheres da minha idade, independentes, fazendo faculdade, que me incentivavam a prosseguir o estudo... Com 24 anos e quatro filhos sentia que a vida já tava findada. Colocava a minha covardia nos filhos, repetia que seria difícil eles crescerem com os pais separados, mas só piorava a situação, pois as crianças odiavam mais o pai a cada briga nova, e via nos olhares deles o respeito por mim virando sentimento de dó. Em uma aula de filosofia o professor falou sobre “A Rã no Chaleiro” - coloque uma rã em uma chaleira fervendo ela vai pular fora, mas ao colocá-la em uma temperatura ambiente e esquentado aos poucos ela vai ficar até morrer cozida. Já tinha me acostumado àquela vida, as piores grosserias eram elogio, me acomodei de tal forma que não percebia que aquilo iria me matar. Fui pressionada a pedir demissão do emprego, pois era isso ou mandada embora por justa causa - faltas consecutivas. Meu marido colocou na cabeça que eu o estava traindo e trancava a porta para eu não sair. Isso me fez refletir, o que me amarrava àquela pessoa que só me fazia sofrer?... Amor? Não mais, nem sentia mais atração física. Filhos? A vida familiar era a pior possível. Sustento da casa? Nos últimos tempos eu é que bancava a casa. O medo de arriscar? Superei... Aproveitei que ele não tava em casa e peguei umas coisas essenciais, os filhos e fui embora de “Alcatraz”. - Adorei a pizza... Vamos comer logo crianças, tenho que dormir, amanhã vou fazer a matrícula para o curso de enfermagem.

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Que Diabos!

Nilton Mourão

Já dizia minha avó que mente vazia é oficina do Diabo... Que vagabundo não é aceito pela sociedade. O trabalho (atividade física) dignifica a alma humana. O trabalho mental não existe. Quem pensa não trabalha, apenas manda. Ela foi educada assim. Hoje, muitas pessoas têm pouco tempo para pensar. De propósito, talvez! A classe dominante (minoria que possui os bens construídos pela humanidade) prega essa ideia. Os senhores das terras, os coronéis, possuíam os bens, enquanto os escravos apenas trabalhavam e, sem tempo para pensar, após longo período (de Sol a Sol e um pouco da Lua também) de labor. O Diabo, aquele que divide, instala-se na mente dos vagabundos. Quem não trabalha fica pensando besteira, assim pregam os privilegiados. Filhos de escravos, e hoje, operários não precisam dedicar-se ao ato pensante, é preciso manter a classe! Muitas foram as estratégias utilizadas. Veja o currículo oculto para os negros americanos. Plantadores de algodão eram lhes permitido cantar durante o trabalho – mantinha o ritmo igual (e assim, tinham a sensação de pertencer ao grupo). Expressavam a dor, atenuando a ideia de revolta ocupada pelo canto (naquele momento). Para cantar, tinham que trabalhar. O Diabo foi expulso do Céu, pois se rebelou contra Deus. Revoltou-se, queria ser igual ao Senhor – mas ninguém pode ser igual ao Senhor – e ainda, convenceu outros a pensar igual... Diabo ruim, sô! Você quer ser igual ao Diabo? Quer os privilégios do senhor? Não fique aí de papo pro ar, vá trabalhar seu vagabundo! – pregam os dominantes senhores (de tudo). Guri! Deixe de ser arteiro, vá fazer algo de bom, vá trabalhar! Surge então o preconceito contra a Arte – os poetas, músicos, escultores, escritores, pintores, atores com ideias fazem arte, mas não trabalham! É, disseram para os dominados que trabalhar é bom, pensar não. Para não haver arteiros, os dominantes envolveram o Diabo. Um tocador de Blues (EUA) ou violeiro (Brasil) – dizem – fez pacto 24⁠


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com o Diabo numa encruzilhada... Mas, o preconceito não está só para os que fazem arte. Também na educação, o preconceito velado é grande. Há pouco tempo, advogados, engenheiros, médicos, etc., tinham plena liberdade de ensino. E, assim, “davam” aulas e “bico” nas escolas. Quando perguntado – vai trabalhar hoje? – diziam: Não, hoje apenas darei aula! Ensinar não era trabalho. Hoje, existe a pergunta: Você estuda ou trabalha? E uma frase comum: Vou parar de estudar para trabalhar. Talvez, digamos que a verdadeira arte de ensinar seja uma atividade que faça o outro pensar, refletir e questionar (não responder respostas decoradas – como há pouco tempo). E, quem divide a sociedade, tem parte com o Diabo (Ciência x Religião). Educadores, cuidem-se! Quem estimula a ser diferente é considerado diabólico, fazedor de intrigas. Mas, quem pensa que pensar não dá trabalho está enganado! Que digam Zumbi, Gandhi, Picasso, Che e outros... Felizmente, o homem desobedece, pensa e diverge! Portanto, quem pensa não tem a mente vazia. Artistas e outros fazedores de ideias vivem nas oficinas do di(ferente), do di(vergente).

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Dia da Verdade Danilo Góes

Ao invés do dia da mentira Deveria ter o dia da verdade No qual por um dia as relações seriam Baseadas sem maquiagem Casamento, namoro, amizade, vínculo empregatício Sendo desfeito após umas verdades nos ouvidos Fingimos, no mínimo omitimos Achou engraçado? Por que do sorriso? Mentimos o ano todo E o que mente bem é que se dá bem nesse jogo Ninguém esta preparado pra ouvir e falar a verdade Pra viver nessa sociedade Criamos anti-corpus: a falsidade Atitude tolerante? Pensamento flexível? Não, é arrogante, é prepotente porque leu alguns livros Usar palavras em desuso Tem uma visão diferenciada de mundo O superior perante os seus Seu ponto de vista é absoluto Brasil influência cristã: maniqueísmo Um é certo e são errados os outros caminhos Gerar desrespeito e preconceito e alienação No passado, verdade única: Nazismo e Inquisição Quem tem o poder é o dono da verdade A mentira é uma peça usual na nossa sociedade A verdade é relativa dependendo do ponto de vista Só sei que a mentira conforta muitas vidas. 26⁠


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A menina da mochila vermelha Capítulo I: Bendito toscanejo!

George de Paula

Trancafiem feras raivosas e famintas numa pequena jaula e tenham por resultado um vagão de trem da linha Rubi, que liga a Capital ao subúrbio. Eu trabalhava como digitador, em um escritório de contabilidade na Zona Norte e passava por este martírio todos os dias. Em mais uma daquelas tardes desagradáveis eu voltava do trabalho, o calor estava insuportável e o trem, como sempre, lotado. Naquele fétido e barulhento ambiente, lia “Espumas Flutuantes” de Castro Alves, entre rimas ricas e solavancos, acabei por toscanejar... O livro me escapou das mãos e ao me abaixar para pegá-lo depareime com roliças pernas morenas... Retomei novamente a postura e pude perceber a rapariga que estava a minha frente (“rapariga”, gosto tanto desta palavra! É uma pena que hoje, popularmente, ela tenha sido reduzida de feminino de “rapaz” para sinônimo de “meretriz”). Depois de vê-la não consegui ler poema ou olhar para lugar algum. Sem dúvida, uma fêmea atraente, acima do padrão de sua espécie. Tinha cabelos longos e negros, como uma cachoeira de betume, seus olhos eram ávidos e sedutores, os lábios eram carnudos e voluptuosos, e uma pinta singela lhes ornava na parte esquerda superior... Que prenda! Ela usava um vestido godê e uma sapatilha, ambos na cor preta (parecia uma personagem de Allan Poe), trazia consigo uma mochila surrada, com vários remendos e manchas, a mochila era vermelha. D’onde surgira aquela menina? Seria uma conterrânea? Como não havia percebido-a antes? Lembro-me que após vê-la, o vagão tornou-se maior e surgiu um mágico aroma de tulipas no ar. Tive impulsos de puxar conversa, de perguntar-lhe a hora... Talvez ela pudesse me dizer seu nome... Mas não o fiz. Foi na última estação (a sórdida cidadezinha dormitório) que desembarcamos. Ela saiu apressada e perdeu-se em meio ao turbilhão. Eu? Procurei nos rostos apáticos dos transeuntes, mas não a encontrei... Deveria, ao menos, ter perguntado o nome dela! Diabos! 27⁠


Coletânea Ôxe!

À caminho do almoço Beto Bellinati

(Julia é uma garota de sete anos, que está a descobrir, entender e organizar o mundo em sua cabeça. As pessoas de sete anos, e todas as que são levemente interessadinhas em viver, estão, a todo momento, descobrindo, entendendo e organizando o mundo em suas cabeças. Agora no carro, à caminho do almoço.) Pai. O que é, Ju? O que é aquilo ali? É uma favela, minha filha. E pra que serve? Não serve para nada. Quer dizer, tem algumas pessoas que moram ali. Mas, para a gente, não serve pra nada. (Um breve silêncio) E por que eles moram lá? Porque eles não tem outro lugar pra morar. Por que? Porque esse povo vem aqui para a nossa cidade pra trabalhar. Mas aí chega aqui, não encontra emprego e têm que construir esses barracos. Da onde que eles vem? Do nordeste. Lembra, pra onde a gente viajou nas férias? Na Bahia? Aquela praia bonita? É. Lembro. Então. Esse povo vem de lá, do nordeste. São nordestinos. (Outro breve silêncio) Eles não gostam de lá? Ah, não sei. Alguns acho que gostam. Mas eles não tem o que comer lá. Mas a gente comeu lá. É, mas a gente tinha dinheiro. A gente tem dinheiro. Eles não têm, vem pra cá tentar ganhar, não ganham, e ficam enchendo essa cidade de gente. 28⁠


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(Outro silêncio. Dessa vez, não tão breve.) Então, era melhor se eles não tivessem vindo? Bem melhor. Quer dizer, pra gente seria bem melhor. Mas pra eles acho que não. Por que pra gente seria bem melhor? Porque como eles não conseguem emprego, eles começam a roubar as pessoas. Assaltar. Viram bandidos. Ah... (Outro breve silêncio) Eles são perigosos? (Toca o telefone do pai.) Peraí, Ju. (Ele atende. É a mãe, que já está na lanchonete e quer adiantar o serviço ainda mais.) Só um segundo que eu vou perguntar pra ela... Julia, você vai querer o McLanche Feliz?

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Trabalho

Daniela Mendes Caminho entre tortos seixos O percurso é curto, mas solitário. Passos apressados, Cheiro de perfume doce e cara lavada... Tropeço por entre lacunas dessa terra tão carente de tudo (Dessa terra de gente tão puramente apropriada...). Chego por fim ao meu fadário E precocemente fatigada estou! Sim... A tarde repleta de gestos vãos E idéias pobres, Consomem o tempo breve que tenho e que ingenuamente, Vejo partir para sempre.

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Paixãozinha

George de Paula A data do vestibular estava chegando! Precisava entrar numa faculdade para me autoafirmar como indivíduo pensante. O curso, ainda não tinha certeza... Queria algo que chocasse a família: Letras, História, Sociologia, Filosofia... Algo que me furtasse do universo dos números e sugerisse uma vida boêmia... Arte Cênica, por exemplo! Minha vizinha, Eva, foi atriz! Dançarina e foi meretriz também... Aliás, Eva já foi de um tudo! Ela é como costumo dizer: um exagero de mulher. Certa vez umas pestes aqui da rua, viram-na através da janela, deflorando-se com um legume. Por essas e outras, toda a vizinhança a repugna, mas eu a admiro. Tem seus quarenta e poucos, é solitária e sofre de alguns transtornos mentais – cria amantes que nunca existiram... Com certeza seria inspiração a Dostoievsky –, mora com Hércules, um gato cinza, vira-lata, porém belo. -Isso é paixão, menino! Foi o que me disse quando lhe contei sobre a menina da mochila vermelha. Eu, apaixonado?! Pobre de mim! Não possuía, sequer, tempo para me dedicar a uma paixão... Minha economia tirana não me permitia arcar com o ônus dum curso preparatório, por isso estudava incessantemente em casa... Dormia com Lenin e acordava com Bhaskara. No escritório, era puxado! O Senhor Leonel e a Dona Brigida (os patrões, italianos avarentos!) faziam-me de office boy, secretário e contador, enquanto seus filhos, três rapazes cursando Administração, passavam horas em sites proibidos. Ali eu só poderia me encantar por algum balancete! Lembro-me que no colegial, sentia, até, inveja ao ver os casaizinhos pervertendo-se libertinamente em becos escuros. Minha discrição pode ser considerada prejudicial. Meu nome: Olavo Passos, era conhecido somente pelo corpo docente. Nunca fui atraente aos olhos donzéis femininos. Talvez Eva tivesse razão, todavia, verdade é, que a juventude 31⁠


Coletânea Ôxe!

é volúvel e que as paixões, efêmeras; sei que sou um jovem suburbano de classe média baixa e que tenho que batalhar um bocado para ter um futuro digno... Não devo dar-me ao luxo de dedicar-me a uma paixãozinha.

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Dor de Cão

Daniela Mendes

Os olhos que me observam não se compadecem, muito menos entendem alguma coisa sobre a minha dor. Há muitos anos desde que era nascido, permaneço na mesma solidão, mesmo abandono... A principio, quando eu era bem pequeno (época em que mal me equilibrava sobre as patas) e latia pedindo comida, alguns seres caridosos mesmo que apressados prestavam atenção em mim... Outros até, queriam me levar para a casa deles! Mas esse tempo se foi... Hoje considero um dia feliz quando um humano já farto de tanta comida, joga um pedaço de osso com alguns vestígios de carne mal mastigada. Agora estou deitado sob o cimento em uma rua pouco movimentada. Há um vento forte que embaça minha visão e empurra poeira e bitucas de cigarro para meus olhos, mas isso não importa muito pois conheço coisa pior! Uma vez, por exemplo, um humano velho chutou minha cara simplesmente porque eu observava um pedaço de pão que ele mastigava com a boca super aberta! Aquele chute custou-me a visão do olho esquerdo... Ele girou para cima e até agora não o recuperei. Francamente, quanta ingratidão! Logo nós, que ajudamos os humanos oferecendo-lhes proteção e amor desde a época em que eram devorados ou sofriam ataques de outros animais! Atualmente, vejo que este pacto está definitivamente quebrado... Quando não nos maltratam para valer ou ignoram, nos tratam como se fossemos criaturas sem inteligência alguma ou personalidade para então satisfazerem seu próprio ego nos “vestindo” ou nos penteando... Como se de repente pudéssemos experimentar um instante a bela maravilha que deve ser tornar-se um humano! Veja! Agora chegou um belo exemplar deles! Mulher, é como eles chamam... Está se aproximando de mim oferecendo alguns restos de comida... Acho que hoje é meu dia de sorte! Só por hoje, não precisarei brigar com nenhum de meus companheiros à noite por causa de algum osso podre que é lançado do caminhão do açougue. 33⁠


Coletânea Ôxe!

As rachaduras

George de Paula

Tudo começou quando esguias rachaduras surgiram no prédio. Sr. Leonel não tardou a reclamar ao síndico, com seu jeito dócil: - Isto está acontecendo por causa desta maldita construção da prefeitura aí do lado, só pode ser! O edifício tem apenas oito anos! Pagamos um aluguel altíssimo numa sala minúscula, senhor Bastos... Não pagaremos reforma alguma e esperamos que vossa senhoria tome as providências devidas! O síndico, velho intrometido e reumático, solicitou da visita de um fiscal da Vigilância Civil que declarou, lhe apresentando uma porção de documentos: - Devo dizer-te, prezado senhor, que as rachaduras não são, em hipótese alguma, por conseqüência das obras públicas vizinhas... Este posto de saúde trará fama ao partido... Enfim, também não há nenhum indício de infiltração. Sugiro que procure o engenheiro responsável. Homem de classe A e bem formado, o engenheiro mostroulhe mais uma série de papéis e disse que nunca tivera problemas com nenhum de seus projetos, a menos que os materiais utilizados fossem de qualidade inferior à requerida e aconselhou o Sr. Bastos a reunir-se com o encarregado. De formação mediana e muito arrogante o encarregado, com todas as notas fiscais em mãos, afirmou convicto que os materiais comprados eram de ótima qualidade e acrescentou: - É claro que no caso de falha humana tudo é possível... Creio que o senhor deva procurar o mestre-de-obras... Sabe como é essa gente... O mestre-de-obras, malandro e sem formação, disse ter acatado todas as ordens e transmitido-as da mesma maneira... - Mas os pedreiros... Ah, os pedreiros! Só querem é moleza. É melhor o senhor falar com o Genival, vai que ele fez alguma cagada? Então foi chamado o Genival, analfabeto de pai e mãe, famoso por sua bondade e por ser um excelente pedreiro: 34⁠


201 1 - 201 2

- Óia seu Bastos, juro por Deus que só fiz o que me mandaram, mas... Tenho uma reputação a zelar! Bem, se o erro foi meu o sinhô pode ficar sossegado, precisando de quarqué coisa, quarqué reforma: eu dou minha mão-de-obra! Tenho dito!

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Coletânea Ôxe!

Aonde ando é onde ando

Messias Silva

sou errante ando no ar como errante, ando ao universo estelar; ando sobre a terra ando sobre o mar ando dentro da terra ando dentro do mar; ando na árvore ando na lua ando no espaço ando na sua; no avião ando no ar, dentro da terra de metrô, de navio e de submarino; no mar, no espaço, onde o astronauta andou; ando em destino ignorado ando no caminho da solidão ando carente e apaixonado, só não ando em teu coração; ando, ando, ando! vou me distanciando, não posso parar, se olhar para trás, me deparo ao teu olhar; ando desde o dia nascido, ando em todas as sociedades, ando até o desconhecido, também até a eternidade; sou errante ando aonde meu pensamento enxergue, como andante, comecei andando pelo estreito de Bering. 36⁠


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Uma cena peculiar

George de Paula

Nós, suburbanos deveríamos ter um acréscimo de horas em nossos dias. Analisemos: passamos, em média, seis horas nos confortáveis transportes coletivos; oito horas trabalhadas – sem contar as extras –, e se foram quatorze horas; para os estudantes, lá se vão mais seis horas... E quantas restam? Exatamente, quatro horas e... Feliz daquele que não sofre de insônia! Portanto, não é raro nos depararmos com cenas no trem como esta que me ocorreu: Barbosa estava prestes a dar o beijo em Lenita – do polêmico romance A Carne, de Júlio Ribeiro – senti um peso maior sobre meu ombro esquerdo, volver os olhos para o lado romperia o apogeu do capítulo, mas... Era um rapaz de traje social, a julgar pela bolsa, um estudante. O pobre dormia, roncava e, de quando em quando, dava uns estrimiliques engraçados. Percebi que os que estavam ao meu redor riam discretamente da minha agonia: O que fazer? O rapaz balbuciava umas frases ininteligíveis, Lenita coravase de seus anseios eróticos... Eu suspirava a cada parágrafo e a cada página procurava cutucar o dorminhoco, não queria parecer intransigente, importuno... “Se ele se virasse para o outro lado...”. “As pessoas dormem no trem, isso é comum, poderia ser comigo... Mas o que é isso!?” e um fio cintilante de baba me escorria pelo pullover... “Céus! O que faço?”. - Acorde ele, meu filho. – disse-me uma amistosa senhora, que estava de fronte, no assento preferencial, e que notara meu desconforto – Ande! Acorde-o! E ele aconchegou-se a meu ombro – minha predileção é por mulheres! Papai, mamãe, os senhores sabem... –, estava ficando difícil manter-me caridoso àquela circunstância, “Que nojo!”. “Já sei! Vou simular um bruto espirro!” foi quando soou o anúncio duma estação, que não me recordo, que o indivíduo deu um salto assustado, bateu na testa, proferiu um escárnio e saiu acelerado... Pronto Barbosa, pode declarar-se à Lenita. 37⁠


Coletânea Ôxe!

Pílulas do Lobato

Luís Lobato

(em memória)

Sempre vire a página quando não gostar da história. Porém na vida é mais difícil virar a página sem mexer com a história. O momento é esse!! Momento de refletir e buscar o desconhecido, assim, jamais ficará um passo atrás. A sorte do dia é acreditar em você mesmo, sempre e todos os dias. O que é saudade? Uma dica que sempre uso: Viver o presente, planejar o futuro sem correr atrás do passado! Dia 08 de Maio, para muitos especial, para outros dia de saudades e para você? Mãe é única. Dia das mães é todos os dias, quando você levanta, olha para sua mãe e diz: Bom dia, te amo, te adoro.... Uma panela, um liquidificador não diz o quanto você a admira e sim, um simples e honesto abraço... (Ainda não consegui pôr em prática esse texto) A Atitude de recomeçar vale mais do que o silêncio de omitir o ato.... Qual é o significado de um dia especial para você! Simplesmente esse dia é o momento da descoberta do seu "eu"! Não sinta-se culpado por nada que não seja a sua culpa. Não leve nas costas tudo e sim só o que é sua parte. A criatividade enobrece o ser. Seja sempre criativo, uma simples ideia pode transformar o mundo. As vezes, é bom viver um pouco de ilusão. Porém não viva de ilusões! Seja firme e siga seus projetos com um olhar crítico. O sol é um grande astro. E você? Seja também um astro. Sua estrela vai brilhar muito, basta você refletir e conquistar os seus objetivos. Axé! 38⁠


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O Tempo

Messias Silva O tempo Me dá a essência A contento, Me leva a existência Se causo o merecimento... Ele me dá o viver A contento, Ao merecer; Me brinda os momentos... Me tira do relento Se o amor, em mim, mora Me bota pra dentro, Do coração da aurora... Me reluz Me dá ciência À vida me conduz Adquiro consciência Porém, devo ter luz... A ele, Devo gratidão Pela oportunidade De minha mãe, ele tocar o coração E me dar a longevidade, Portanto, A todo dia, O meu bom dia! Ao meu tempo de felicidades. 39⁠


Coletânea Ôxe!

A infeliz história de Morato

Alexandre Barbosa

Quem disse que Morato nunca foi à guerra? Pois, foi. E digo mais... Morato não esteve em uma só guerra, passou pelo Vietnã, em um surto de curiosidade guerreou no Iraque e acaba de voltar do Egito. Mesmo parecendo um indivíduo comum, sinto que não o é. Ainda que ofereça grandes banquetes aos amigos do interior: Cajamar, Jundiaí, Botujuru, e outros mais. Vejo em seu semblante a fome e o desespero. Contudo, não dá o braço a torcer e apresenta novos projetos na esperança de impor moral, sejam terminais rodoviários ou centros de integração municipal (CIM), e já há quem diga que Morato carrega uma “urucubaca” na vida que não o permite levar nada para frente. Penso comigo, deixa o cara... Está cansado de guerras e conflitos! Será que ninguém não vê que o coitado está só o buraco? Não bastam os quintais de sua casa cheios de “crateras”? E seus jardins mal carpidos? O pior são seus filhos que o abandonaram da noite para o dia. Como se diz por aí: Morato está na roça! E, olha que está mesmo, viu? O pobre do Morato, ainda não sabe o que de fato é: Interior ou Região metropolitana? É meio indefinido. Digo de novo: deixa o mano... Seus filhos revidam: “é uma porcaria, não presta para nada”. E, lá fica o sofredor nos cuidados do asilo, sobre a supervisão de pessoas caladas, de seres que mais parecem Lírios e de muitos outros Zezinhos. Repito mais uma vez: Deixa o velhinho... Ainda mais agora, que arranjou uma grana e comprou novas coisas. Os filhos contentes, indagam: “Cuidamos e depois o devolvemos ao asilo!” Infeliz Morato. Quando sair dessa vida, quer junto aos Estados Unidos invadir outro país. Mal sabe o infeliz que do jeito que as coisas andam não tirará o pé do barro tão cedo.

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Lembranças póstumas de um Morto-Vivo

Danilo Góes

“Arturzinho”. É assim que minha mãe me chama, não gosto, prefiro Pedro, meu primeiro nome. Falarei um pouco da minha vida, lembranças póstumas de um morto-vivo. Esse morto-vivo suscita um filme de terror, mas na real, está mais para filme experimental no qual ninguém assiste sem dormir. Mas desde já, queria dizer ao caro leitor que não compensa muito perder o precioso tempo lendo a minha merda de vida, pois não terá nem um final surpreendente - de superação ou dramático - esse texto vai ser meio insonso como minha vida. Lembro da infância, devido ao humor da minha mãe, uma casa “repleta de ninguém”, nenhum parente ou vizinho vinha nos visitar. Brincava sozinho, nem sei como brincava, para minha mãe era desperdício de dinheiro gastar com brinquedo que eu iria quebrar em uma semana. Outra coisa que ela achava desperdício, e senti muito na minha adolescência, era comprar roupas, usávamos roupas doadas. Ia para escola de chuteira com cravo, isso me rendeu várias aloprações. Pedi um tênis para ela, lembro como se fosse hoje, visivelmente irritada me gritou: - Você já num tem calçado! Quer andar que nem mauricinho. Tentei argumentar que os meninos ficavam pegando no meu pé por causa da chuteira, mas ela num deu chance. Fui usar tênis já era maior de idade ou você acha que essa roupa e calçado que você veste, eu tinha privilégio de ter? E fim de papo. Na escola, sempre pelos cantos só, as poucas vezes que abri a boca gaguejei, e não era gago. Minha autoestima e cabeça sempre baixa. Na maioria das vezes, só escutava meu nome na chamada. Os meninos pegavam no meu pé, mas não muito, pior do que não ser zuado é não ser visto. Jamais me relacionei com uma menina, me auto flagelava, falava sozinho “ela deve tá me olhando de dó”. O seu pior inimigo é você mesmo. Nunca explorei minhas qualidades e habilidades, me retrai no 41⁠


Coletânea Ôxe!

meu casulo. Em Gênesis, Deus já dizia “não é bom que o homem esteja só”. Sinto-me uma estátua permanente e fixa, fechado como um punho cerrado, um ponto isolado num círculo, sou aquele aluno que você não lembra que era da sua sala. Tive alguns amigos, que para alguém normal seria efêmero, para mim foram intensos. Alguns meninos da minha sala foram me chamar para jogar bola no campão, minha mãe saiu com “duas pedras na mão” xingando os meninos. Minha mãe havia perdido um irmão, por tiro, que nem chegou à maioridade e temia que isso fosse acontecer comigo, devido a essa super proteção, minhas únicas amizades duraram uma semana. Até sombra quer brilhar. Às vezes penso em suicídio! Desisto, sou bundão. Não consigo nem usar droga, acho sem graça. Estou aí, vivo, mas não vivendo.

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201 1 - 201 2

Na fila do banco...

Geoge de Paula

Faltavam trinta e sete minutos para o término do expediente, aparece-me Dona Brigida: -Querido, preciso que vá até o banco para mim, pagar estes boletos. Não era a primeira vez que ela fazia isto... O banco ficava a um quilômetro do escritório, sem falar na fila que iria enfrentar e o tempo que perderia, ela nunca me dava o dinheiro da condução (Prezados leitores, peço-vos aqui um auxílio, talvez a indicação de um livro de auto-ajuda de como dizer não ao patrão). Fui. Estava na fila do banco. Em minha frente havia: uma moça, universitária por sinal; um rapaz elegante, vestindo salmão; uma mulher de trajes simples e, lá na frente, uma senhora negra com sua filha mongolóide. A senhora conversava com a mulher: - Sá menina só me dá trabáio Dona... Ei! Pisiti! Larga mão de ritá o moço!... Num seio o que faço com ela... Venha cá, sua moleca!... - Mas ela não estuda? - Perguntou a mulher afagando a cabeça da menina. - Estuida não, Dona! Tirei ela da escola... Não se joga no chão, sua peste!... Ela num aprendia nada! A guria não parava. Corria, pulava, cutucava a orelha das pessoas, fitava de perto as bocas que bocejavam... Fazia o Diabo! - A senhora não busca tratamento? - Dona, o pastor falô que num tem que pô a mão. Deus feiz ela assim e só ele pode curá! Ah! Sô eu agora! Fica com Deus, Dona! Venha Desgraça! Rapidamente a mulher comenta com o rapaz: -Além de preta é ignorante! A mulher se despediu e foi atendida. O rapaz cochicha à moça: -Você viu menina: um pobre falando de outro! Ai, que horror! O rapaz é atendido. A moça vira-se para mim e diz: - Um bicha preconceituoso! Essa é demais! … (baseado na cena criada por: Victor Caique, Tátila Dayse, Renata Teixeira, Silvia Sapucaia e Stephanie D’Agnes)

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Coletânea Ôxe!

O Predador

Messias Silva

Mentalizo um mundo melhor vejo proteção ao mundo animal reflito saúde a todo redor medito o nosso mundo ideal. Mas um homem predador desmata destrói a natureza causa dor mata. Faz cair árvores a vida desabriga faz queimadas os animais ele fustiga. Destruições causa queima a flora assusta a fauna põe fim às florestas afora. Depois de destruir, dá as costas vive defronte ao capital a natureza dá a resposta: destruições, abalos, vendaval. Em defesa do verde, do arvoredo senhores administradores do poder revisem enquanto é cedo evitando a absurdidade do planeta perecer.

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Mais veloz que o pensamento

André Arruda

Quando percebeu, não teve tempo de rezar, de chamar pelo seu anjo da guarda, de despedir-se da esposa, nem do olhar curioso e encantador da filhinha. Quando percebeu o cano do revólver, não teve tempo de pedir aumento de salário, de lutar pelos seus direitos e por sua dignidade, nem de dizer o que pensava dos patrões, da classe política, muito menos da sogra. Quando percebeu o cano do revólver alí, não teve tempo de terminar de ler aquele livro, de ir ao futebol e, depois, tomar aquela cerveja com os amigos, nem mesmo de saber a previsão do tempo para o dia seguinte. Quando percebeu o cano do revólver alí, encostado em sua nuca, não teve tempo de não reagir, de admitir alguma culpa e nem sequer de não pensar em nada. Quando percebeu o cano do revólver alí, encostado em sua nuca, o gatilho já havia sido disparado.

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Coletânea Ôxe!

Até no Lixão nasce flor Danilo Góes

“Quem te viu, quem te vê”, ditado popular sempre carregado de inveja, as vizinhas não perdem a oportunidade. Mas é a verdade, Bianca hoje é uma exceção, conseguiu fugir de um destino já provável, surpreendeu mesmo. As quatro irmãs já tiveram filhos, engravidaram na adolescência e seguem o caminho da mãe. Observando os erros, ela está trilhando outra rota. Sua mãe vai buscá-la num ponto uma meia noite e pouco e às quatro da matina ela está levantando. Tem pouco tempo para descansar, já faz uns anos que está nessa rotina, trabalho e faculdade. Sempre foi uma moça dedicada ao estudo, fez diversos cursos, mas sempre ela que corria atrás. Foi assim que entrou num cursinho pré-vestibular, prestou uma faculdade, e conseguiu uma bolsa em um curso de advocacia e já está estagiando na área. O começo da faculdade foi muito pesado, quase desistiu, no final do semestre sempre batia uma deprê na volta no trem. Passava mó larica na faculdade, só tinha dinheiro para condução do trem, passava mal quando sentia o cheiro do yakissoba. Tinha dia que a tiazinha do hot dog lhe dava um lanche que havia feito errado. Bianca sempre passava em frente esperando ganhar e nada, jamais pediu a ela. No começo da adolescência ela tinha vergonha de sua mãe um monte de filho, maltrapilha e barraqueira. Foi nessa época que passaram pela pior fase, mãe desempregada, o pai de um dos seus irmãos havia deixado a casa. Tiveram que pedir comida de casa em casa. Bianca uma vez se recusou a ir nas casas, levou um tapa na cara de sua mãe. Não poderia pedir naquela rua, ali moravam suas amigas de sala, não teria cara para aparecer na sala se pedisse: “minha mãe tá desempregada e somos em 7 irmãos menores, você não teria 1 kg de feijão, arroz ou fubá? Qualquer ajuda serve!”. Não guardou mágoa da sua mãe por causa do tapa, compreende hoje que ela era uma vítima de um país de desigualdade gritante e na época tinha outro motivo: pior que um tapa na cara é pedir comida de casa em casa. 46⁠


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Como diamante, ela saiu do barro, foi lapidada pelo seu suor. O sol não nasceu pra ela, mas sentiu os raios solares pela fresta do barraco. Sempre vai ter alguém pra desmerecer: “facu de fundo de quintal”; “eu quero ver passar na OAB”; “o que não falta é advogado”. Para nossa vitória ninguém bate palma. Se tivermos uma visão pelo macro, iremos nos perguntar cadê a vitória, pois vive uma vida precária ainda. Mas olhando com sensibilidade, é a primeira da família em um curso superior e, como pessoa, evoluiu muito. Ela adora uma frase de uma música (Bethânia – Sonho Impossível) que não sai do seu mp4, acredita que sintetiza sua luta: “E o mundo vai ver uma flor brotar do impossível chão”.

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Coletânea Ôxe!

Passado ao Presente

George de Paula

Vivemos em um período Neo. Neo-colonial, neo-imperialista, neo-nazista, neo- romântico, neo-rótico... Onde nada é originalmente Neo. Tenho a impressão de que a Humanidade estagnou-se (o que se cria além de tecnologia?), ou melhor, que a arte estagnou-se. O Modernismo é um ancião esquisito* de quase noventa anos, seus filhos morreram, seus netos morreram... O Concretismo pretendeu ser fase, mas é gênero. Andrades, Mané Carneiro, Carlinhos... O tédio é agora! Qual o próximo passo? Para onde estamos indo? Creio, cada vez mais veemente, que o processo do progresso é o retrocesso da mente. *** No museu, apreciava indiferente às velharias parnasianas clássicas. ... Um exemplar, em especial, furtou-me a atenção. Havia ouvido falar daquilo, todavia não gozei de seu uso. Parecia uma obra de arte; uma escultura escrita em fá maior. Era um cume meio fálico, agudo, em tons de vermelho. Disparava projéteis, críticas, ironias, denúncias. Suas inúmeras funções; desde desbravar caminhos até promover impeachment. O que estava em exposição era nacional – Made in Brazil. Infelizmente já não mais se usava quando nasci... Talvez tivesse saído de moda. Recentemente vi um desses no Egito e na Líbia... Funcionava! Procurei sua descrição, e dizia assim: REVOLUÇÃO Objeto sócio-político-artístico milenar

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* do Latim exquisitus que significa: apurado, excelente, boníssimo, raro.


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Há Elite e Elite!

Messias Silva

A elite desperta ao som da periferia a periferia manifesta sua inconformidade... Há elitista que quer limitar a arte e cultura inviável à sociedade. A globalização avança dia a dia mas ele prefere atrasar, a riqueza está na simplicidade, a indiferença revolta a periferia que se arma de dignidade; Há elitista que cochila e subestima o dom da camada periférica original e estremece na batida do som que anuncia que o povo unido é igual; O cidadão vai ao encontro do conhecimento para resgatar a cultura que lhe é peculiar há elitista que parou no tempo e o poder da massa ele tenta abortar; Quer a periferia exilada numa extremidade esquecida e em ostracismo quer a sociedade mal-educada e uma quantidade mínima acima. A elite do bem prima pelo valor humano, dá suporte ao plano social não admite discriminação ao suburbano ao interesse comum dá atenção especial, não ignora a cultura atual, conserva a tradição Grécia, Roma, Egito, suas artísticas produções, é a verdadeira elite; Há elitista que ocupa cargo exuberante mergulha no egoísmo no seu efêmero poder do povo se mantém distante da casta sociedade não quer saber

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Coletânea Ôxe!

sempre um criado à uma minoria a atender; A massa com direito à voz argumenta para a continuidade da cultura e da arte, que o poder da palavra seja para nós a ciência do saber à toda parte.

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201 1 - 201 2

O golpista

André Arruda Intuiu o golpe perfeito. Arquitetou. Reuniu o bando. Ardiloso, apresentou estratagemas, argumentou, esquematizou, definiu e distribuiu funções. Soube também ouvir e acatar aquilo que lhe convinha. Tudo acertado, na data marcada, ainda bem cedo, conforme o combinado, partiu para o ataque. Ao final, tal e qual o planejado, conseguiu se eleger.

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Coletânea Ôxe!

Das Eleições

George de Paula O Partido dos Operários (P.O.), de centro-esquerda, fundado na década de oitenta por sindicalistas – grevistas – possui a preferência de quase um quarto da população... É o que mostram os indicadores. Já os polegares... Pobres coitados! Baixos e troncudos, são exímios funcionários. O Partido da Classe A (P.C.A.), fundado em 1.988, é o segundo maior partido político quando se considera o número de prefeituras. Seus filiados são, geralmente, empresários, economistas ou médicos. Eis que iniciara a Corrida Eleitoral Municipal e cá em minha cidade os representantes destes dois partidos eram fortes candidatos. Os outros estavam destinados àqueles míseros votos de protesto. Lembro-me que, naquele ano, o Tribunal Superior Eleitoral havia anunciado que a distribuição de camisetas, bugigangas e a promoção de showmícios estariam proibidas, mas como as leis fazem uma exaustiva viagem de trem – às vezes este atrasa ou faz paradas com maiores intervalos... – elas sempre custam a chegar. Durante meses tive que aturar jingles ridículos e discursos repletos de promessas e barbarismos. No dia das eleições, a cidade ficou imunda. Além da sujeira habitual, um espesso manto de diabinhos cobria as ruas e calçadas. ... Confesso-lhes, prezados leitores, – e lhes peço que não tomem isto como exemplo – que meus votos foram nulos, pois todos os candidatos apresentavam propostas, mas nenhum apresentava soluções. ... Quanto ao resultado, posso dizer que foi rápido e previsível. Os vereadores? Os mesmos. O prefeito? O de propaganda mais original: Um outdoor no centro da cidade com o retrato do dito-cujo abraçado a um ancião afro-descendente que sorria banguela e fazia o sinal de positivo, no roda-pé, em letras garrafais: “O Homem que trabalha pelo povo!”. 52⁠


201 1 - 201 2

Ao "Girandolá" apresento o "Pé na Jaca"

Messias Silva

"GIRANDOLÁ"; auge, apogeu, confiança, nasceu para a alegria união, ternura, aliança, determinação, harmonia; Arruda, Roger, Fabia, pela arte labutam Roseli, Gilberto, Meire, Mari, com Libana; parcerias computam; Ao nosso célebre "GIRANDOLÁ", "PÉ NA JACA"apresento, distinto "ÔXE!, OXANDOLÁ!", "elas", união, casamento: "PÉ NA JACA" em encarte, pela arte, contra-ataca; Com a sua arte cênica "PÉ NA JACA" entra em cena contra a inatividade, pelas comunidades; "PÉ NA JACA" é calor humano carinho, ternura e cumplicidade na construção saudável, bacana da arte e cultura com destreza, habilidade; A perfeição feminina é formada, pela essência da arte que se destaca na excelência das musas do "PÉ NA JACA" irradiante equipe amada;

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Coletânea Ôxe!

Nascidas para as artes, às belas-artes e as cenas harmonia, expressão primor, sensação nas apresentações cênicas; Adriana, elaboração, técnica e perfeição, Amanda interpretação a altura e representa com desenvoltura, Fabiana estrela natural suavidade, brandura incandescência especial apresentação natural, espirituosa de estilo reluzente brilho, atuação, leveza, terna na arte é plena, é moderna; estendo a teatralidade às também beldades, a presença, a performance de palco com grande personalidade, Angélica, Geisa, Marina, Viviane são fineza, belas atrizes, em movimentos, destreza, abrilhantam "PÉ NA JA" em magia e matizes; "GIRANDOLÁ; PÉ NA JACA", donas da prática, a irmandade tá formada pela felicidade da criançada.

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Espelho

André Arruda Aconteceu de, naquele dia, ter seu único desejo realizado. Pôde então, sem qualquer cerimônia, trocar de lugar com aquela sua imagem, que o velho espelho teimava todas as vezes em refletir. De repente, e por uma única vez, viu-se com as mesmas verdades que todos sempre a viram.

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Coletânea Ôxe!

Os aparelhos sonoros em trens e o futuro da Humanidade

George de Paula

Percorria o vagão uma “melodia” desagradável, com termos que poriam corada qualquer dama de brio. Esta “melodia”, de notas descompassadas e letras grosseiras, tem a pretensão de ser música – não que eu não goste... Detesto! – se encaixando no gênero: Funk. Pause. Convido o leitor a fazer uma breve análise da evolução de três gêneros musicais: Funk, Samba e Forró. O Funk de James Brown e, cá no Brasil, Tim Maia e Jorge Ben Jor, evoluiu a “Vai sentando! Vai sentando...”. O bom e velho Samba de Noel Rosa, Cartola, Ismael Silva, transformou-se em “Tá vendo aquela lua...”. O Forró de Luiz Gonzaga, João do Vale e Sivuca, evoluiu a “Vô não, posso não...”. Baseando-se apenas nas músicas da contemporaneidade, o que nos guarda o futuro? Sinceramente: eu temo. Play. Algumas pessoas reclamavam aos cantos, outras torciam o nariz. Percebi que o infortúnio era um garoto, a julgar pela aparência, não deveria ter mais de quinze anos. Pude suportar até metade do trajeto, foi quando chamei-lhe a atenção: - Ei guri! Você sabia que o uso de aparelhos sonoros, sem os fones de ouvido, é proibido pela CPTM dentro dos trens e estações? Ele fitou-me, incógnito, por uns três segundos e disse-me: - Cuida da tua vida, tio! Rapazinho mal-educado, Seu... E ainda chamou-me de “tio”! Pois como disse: Temo o futuro da Humanidade.

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201 1 - 201 2

É Chegado o Grande Dia Danilo Góes

A semana toda foi preparativo e trabalho para esse dia. Não é a Copa do Mundo e sim a Copa do Bairro. Eles carpiram o terreno, foram no matagal pegar eucalipto para fazer as traves do gol e pegaram sem permissão o cal da vizinha doida da rua para fazer a marcação do campo. No dia anterior ao dia tão esperado, eles queimaram o mato seco, e conseguiram irritar a vizinha que morava ao lado do campinho. Os canos da casa dessa senhora passavam embaixo do campinho e por descuido eles foram queimados. Quando viram, a primeira reação foi de risadas, mas depois da histeria e gritos da vizinha, perceberam que fizeram merda. Em uma região carente de divertimento, haviam dois campos de futebol: o primeiro ficava ali perto da cachoeira do Recanto Feliz (campo do Crispim) que devido à obra do piscinão, a terra tirada de lá veio parar no campo; e o outro (campo do Recanto) ficava onde foi o rodeio, que depois do evento ficou impossível jogar bola. Bem vindo ao país do futebol, onde governantes gastam milhões de dinheiro dos contribuintes para erguer estádio particular para ficarem bem vistos e lucrarem com os grandes capitalistas esportivos (CBF e FIFA). Só que a verdadeira alegria desse esporte está longe do mundo midiático e empresarial. Alí em um terreno baldio se fortifica amizade, se estreita relação, tem suas desavenças também e para muitos a única alegria. Os times foram formados pelos gostos em comum fora das quatro linhas, alguns deles: “Avassaladores” formados pelos meninos que, a cada gol, comemoram com uma dancinha de Funk; “Galácticos” apelidados pelos demais como “Os Evangélicos” pois tinha quatro irmãos evangélicos; “Os Neymars” devido a moicanos, também por que tinha mais moleques habilidosos, com talento para estar no profissional, mas no campinho da quebrada não tem olheiros. Para a maioria desses meninos o campinho é uma válvula de escape. Correndo no sol quente, eles esfriam a mente: alguns não lembram que não tomaram café da manhã, outros esquecem a discus57⁠


Coletânea Ôxe!

são dos pais que viraram a noite e é campo fértil, longe da visão dos pais, para atos libertinos. O campeonato começa eufórico, muitos gols e briga também. Teve uma pausa, para arrumar uma bola, pois um integrante do time “Os +”, que era dono da bola, foi embora e a levou após uma derrota. Na sequência “Os Evangélicos” tiveram que sair, o pai deles veio buscá-los, “jogatina era coisa do capeta”. Arrumaram outra bola e o campeonato prosseguiu. O campeonato chegou à final com “Os Neymars” enfrentando “Os Arranca Toco F.C”, mas a final não aconteceu e eles dividiram o troféu (um fardo de refrigerante). O motivo para não ocorrer a final foi a vizinha dos canos, para se vingar e para parar a perturbação de toda hora ficar jogando a bola que caía no seu quintal, furou ela; furou não, cortou todinha.

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201 1 - 201 2

Diagnóstico Denúncia

André Arruda

o professor está doente eu o vejo e a moléstia que reparo no professor (e que talvez nem o próprio o saiba) não é aquela tosse da madrugada fria ou da condução lotada nem o termômetro caseiro guardado na maleta de primeiros-socorros dentro do guarda roupas que lhes vão denunciar não é o voltarem do médico, às pressas, da UBS nem o analgésico da bolsa da amiga a quimioterapia ou o coquetel de azt que vão aliviar suas dores não é o raio X o exame de urina ou fezes não é o hemograma ou a ultrassonografia nem mesmo o papa Nicolau a mamografia nem o teste do bafômetro ou o dedo indicador do temido urologista irão apontá-la porque aquilo que esses buscam mostrar talvez nem exista e quando e se existe não passa de uma somatização daquela doença principal que é a vergonha que vem do medo de ao procurar cumprir seu dever com maestria

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Coletânea Ôxe!

ele, o professor ser fulminado por um ultrapassado falido cínico criminoso e desumano sistema hoje chamado Educação

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A única verdade é que mentimos

Danilo Góes

- Filho tem um rapaz te chamando, falou que estudou com você e pega sempre o trem contigo. Que merda. Faz mó cota que não saio para rua, prefiro ficar em casa vendo DVD, estou cada vez mais identificado com “Dr. House” e “Dexter”. Ultimamente decidi não me relacionar com mais ninguém, cansei dessas hipocrisias. As relações são baseadas em mentiras, não estamos preparados para ouvir e nem falar a verdade. Entrei em crise mesmo, e me sinto bem, cansei de ficar sorrindo sem motivo, simplesmente para não ser visto como antipático. Todo brasileiro é um homem-bomba em potencial, são fundamentalistas, seja religiosa ou ideologicamente, não estão dispostos a aceitar outras verdades. Ninguém dialoga, cada um defendendo sua ideia. Acredito que não temos atentados no pique do mundo árabe devido ao “homem cordial” de Sérgio Buarque, que castrou as atitudes terroristas - o brasileiro só não mata outro que pensa contrário ao seu pensamento por que é bundão. Antes estava fazendo uma social, as pessoas vinham falar comigo, respondia, mas só valia a sua opinião, de tudo conhece ou viveu, sempre batia e nunca apanhava. Passou um tempo, passei a ignorar as pessoas, graças ao fone de ouvido, um bom jeito de afastar as pessoas sem atrito. Tinha um fulano que estudou comigo, encontrava com ele na estação, era chata a viagem com ele: lembro que quando comecei a conhecer a minha ex, vinha com ela no trem, o assunto rendia, era uma viagem de 50 minutos que parecia 15, o tempo passava rápido. Com esse cara era uma eternidade, tipo umas 3 horas e com ele o trem resolvia quebrar ainda. Passei um tempo me escondendo nos pilares da estação para ele não me ver. Falando na minha ex-mina, lembro que tínhamos a liberdade de falar o que pensávamos, tudo perfeito, tirando a sogra. Não estava aguentando ficar mais a tarde de domingo na casa dela. A mãe dela refletia a hipocrisia da sociedade em pequenas doses. Ela se emocionava assistindo Criança Esperança, Ratinho quando falava de uma 61⁠


Coletânea Ôxe!

situação social, mas se alguém pedisse qualquer coisa na porta da sua casa ou na rua, era extremamente arrogante: “Vai trabalhar, vagabundo”. Prefiro a solteirice, me esquivo de ritual familiar, não gosto de festividade em que o principal fundamento é o lucro: Páscoa, Dias das Mães, dos Pais, Namorados e Crianças, Natal e Ano Novo. Mas o que eu odeio de paixão mesmo é Natal e Ano Novo, onde as falsidades e o cinismo afloram. Passamos o ano todo sem olhar pra pessoa até mesmo odiando-a e em uma virada de noite saímos abraçando todo mundo que não abraçamos e nem abraçaremos outra vez, fazemos isso devido a uma moral que diz que temos que perdoar nessas datas, mas ninguém perdoa e faz mó circo. - Mãe fala que estou passando uns dias na casa da minha namorada.

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201 1 - 201 2

Das cenas pitorescas de cada dia

George de Paula

Dona Brígida e o Sr. Leonel foram ao restaurante caro dali da esquina... Um minuto e meio, minha marmita esquentava no microondas. Percebi algumas xícaras sujas de café, sobre a pia, não as lavaria se não fosse o bilhete na geladeira: “Olavo, querido, por favor, lave as xícaras!” – Aquilo era um ponto de exclamação!!! Seria um pedido ou uma ordem? – com toda certeza, fora dona Brígida que o escrevera, e como ainda não sei dizer não... Na habitual “esticadinha de pernas” após o almoço, dei uma volta no quarteirão e sentei-me no banco da praça de fronte ao edifício do escritório. Havia um caboclo fumando ao meu lado – Como cigarro fede! Não consigo compreender como alguém pode colocar esse negócio na boca – e, em um outro banco, um ancião cochilava com a cabeça caída. Mas o que me furtara a atenção fora outra coisa que vi. Ele arremessava o coco no chão... O coco rolava. Arremessava o coco no chão... O coco rolava. – Mais forte! – ela dizia – Mais forte, senão cê num consegue, pô! Ela vestia trapos que mal lhes cobriam o sexo; uma calça vermelha bastante suja e uma camisão largo com buracos grandes, mas era uma dama. Ele continuava. Finalmente conseguiu quebrar um coco e, como todo herói apaixonado, ergueu-o orgulhoso, oferecendo, generoso, aquela fina iguaria à sua colombina. Ela, como toda dama, pegou do coco sem perceber abaixo de si o olhar do herói a implorar por um agradecimento ou sorriso qualquer, ou sei lá o quê... Raspava com as unhas, compridas e imundas, o recheio branco. Saíram dali – ela na frente, a saltitar –, pararam numa banca de DVDs piratas e foi só porque ela disse: – Ah, esta música... Eu acho ela tão linda! – Era uma música gospel, destas que estão em voga – Compra pra mim, meu amor! Compra vai, eu acho ela tão bonita... Ele meteu no bolso as mãos, tirou com pena, mas sorrindo, um nota de dez e entregou-a ao camelô. 63⁠


Coletânea Ôxe!

Isto não seria uma prova de amor para muita gente, todavia, para eles, era. Ele não teria motivo para comprar aquele DVD, até mesmo porque, não teria nem onde assisti-lo, já que eram mendigos. Perdi-me no tempo apreciando-os... Subi correndo até o escritório e voltei a minha labuta vazia. Da história contada pela minha musa: Senhorita Agnes.

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Ela é a Fina Flor do Samba Moratense para Anderson Santana

Messias Silva

Ela samba, ela desfila me deixa de pernas bambas, num tremor vacilo ela sorri, não liga sabe que ali, o meu ser castiga ela é produtora, designer, jornalista é minha confessa, professora; meu coração em sua lista ela é livre para amar, o samba é sua vida quando a vejo desfilar, tenho paixão recolhida ela me quer seu passista, ela a gata do meu tema seu corpo escultural assisto, a essência pro meu poema ela ao me ver oferece o sorriso, samba com agilidade é disso que preciso, me encher de vaidade ela ama a natureza, a passarada em animação serena de rara beleza, de fina educação ela odeia o mau-humor, vivaz em alegria não revela seu amor, contido nela com harmonia ela entrou no jardim, voltou com um grande buquê dizendo ser para mim, não revelou porquê ela se foi sorrindo, no ar vários aromas ficou minha emoção sentindo, olhei cada pétala de flor ela se expirou da minha mente, me senti estático despertei de repente, sonho e sentimento emblemático... ela apareceu no outro dia, sempre disposta! lhe perguntei com euforia: quais as flores que você gosta? ela me respondeu: "Vou dizer: até parece coincidência! essa noite pensei em você! mas cultivo uma hortênsia... para você esse ramalhete, feito com amor nele um lembrete, com nomes de flor com certeza, um girassol uma giesta, afinidade brilhante como o sol uma dália, uma peônia; um bogarim um antúrio, um íris-branco; um jasmim uma sempre-viva, uma camélia

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Coletânea Ôxe!

um alecrim, uma íris-amarela um lírio, um cacto um anis, uma acácia um goivo, uma orquídea uma rosa, uma margarida uma prímula, um copo-de-leite uma tulipa, um amor-perfeito uma azaleia, um amarílis uma gérbera, uma flor-de-lis um açafrão, um lilás um dente-de-leão, uma coroa-imperial um nenúfar, uma begônia uma fúcsia, uma beladona um cravo, uma bonina uma centáurea, uma glicínia uma violeta, um lisianto um brinco-de-princesa, um crisântemo uma gardênia; uma papoula, um aro uma anêmona, um lírio-do-vale de amor, alegria, elegância; o jardim vive florescendo com a presente substância; também a você o rodondrendo porém, em retribuição, me darás a que mais gosto não precisa adivinhação, é a flor de lótus..." Na sua volta ao carnaval, me revelou estará na ala principal, após o réveillon pensará em libertar o coração se o pierrô lhe fizer declaração e lhe trouxer o pote de ouro que juntará ao seu tesouro que pode ficar despreocupado; que seu amor está no final do arco-íris - sou o tal pierrô apaixonado; até fevereiro!...colombina Thamires...

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2012



201 1 - 201 2

Ditadura ao contrário

Franklin Falcão

- Conheci um novo Mc. - Sim, caro “camarada”, o Mc Chico Buarque! - Ah, eu também... Mc Geraldo Vandré, um novo Mc Renato Russo, Mc Jackson do Pandeiro, nossa, entre outros nesta caixa... Mas “companheiro”, podemos falar destes tais. - Será que aquela força, que não podemos tocar, acusar, questionar... Nos deixará ouvir tais, “lutadores”, de momentos que devem ser valorizados? - Momentos que estudantes faziam passeatas com livros nas mãos, expulsos do próprio país! - “Camarada”, escuta essa, “Os jovens”, repressores de antes. - Isso repressores, de retirantes, nordestinos, sertanejos, etc. Hoje tem netos, “sertanejos universitários”. - Mas “camarada”, e aqueles “sertanejos”, que nem alfabetizados são? Serão o “Sertanejo Analfabeto”! - Mas “companheiro”, não devemos nos calar? Pois em 1979 o Mc Chico Buarque “mandou” essa “rima”: “... Se tu fala palavras sutis E gostas de senhas, sussurros, ardis A lei tem ouvidos pra te delatar Nas pedras do teu próprio lar...” Kurt Weill / B. Brecht / Adapt. Chico Buarque - “Camarada”, as passeatas de hoje são com caixas de som tocando as “rimas” dos crimes. Seria isso os gritos da periferia? - Não, “camarada”, não é!! Pois hoje, tem-se bibliotecas, sebos, internets, colunas nos jornais, simples trocas de ideias nas esquinas, rádios sem censuras de horário ou sintonia... … Hoje nem pontuação no português se precisa mais... - “Companheiro”, a onda é esquecer quem um dia fez algo por algum ideal... Olga Benário: Para lutar, por ser mulher; - Che Guevara: Por camponeses e cubanos; - Zumbi: Por liberdade; - Gandhi: Por união pacificadora.

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Coletânea Ôxe!

- Anônimos dizendo não à repressão - O trabalhador de cada dia de trens e trens, ônibus e ônibus; - O “miserável” por léguas e léguas, caminhadas por água; - É “camarada”, como disse o Mc Cazuza: “Ideologia, eu quero uma pra viver...” - Caro “camarada”, esses que falamos, e outros que nem lembramos... “Eram proibidos de tocar, hoje os proibidões podem tocar”. - Oh, “camarada”, escuta esse Mc: “... Ei, Al Capone, vê se te 'emenda', já sabem do teu furo no imposto de renda...” - Caramba, caramba! - Tchê, tchêrêrê, tchê, tchê!

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201 1 - 201 2

No Leito de Morte Frank Neres

A ignorância é uma dádiva, maldito os que pensam que sabem. Eu na minha medíocre prepotência que só me isolou do mundo. Sou ranzinza, chato de poucos amigos, sinto perder os poucos que tenho, evitei o mundo para que ele me evitasse e de fato ele me esqueceu. Vivi provisoriamente, amei de forma superficial com medo da dor, pois pensei que o tormento assolava os entregues aos sentimentos, lutei para não ser fraco. Minhas lágrimas, apenas em segredo derramadas. Vivi sobre lemas, códigos de honras, que ninguém mais conhece ou respeita. Já não tem importância. Não admiti medo, sinto que fui covarde, pois me escondi dentro da cela chamada corpo que agora apodrece. Não contemplei pássaros, flores, pôr do sol, não brinquei com crianças, quase nunca sorri, apenas de deboche. Concentrei bens para não usufruir, estoquei alimentos que estragaram, acumulei conhecimento e por vaidade, não passei a ninguém. Aproveitei-me do mais fraco, subjuguei os indefesos, omiti culpas, engoli palavras, magoei e não pedi desculpas. Temi catástrofes, por isso vivi cárcere privado, na dúvida fiquei calado para não parecer idiota. Discriminei por ser incapaz de compreender. Preservei o orgulho de me achar melhor que os outros e hoje vejo que somos iguais. Que nada ganhei com a arrogância, exceto o isolamento, quando na verdade a inveja me corrói por dentro, odiei os felizes. Agora o inevitável, o irremediável, que coloca a todos sobre a mesma condição, me bate a porta, e o que fomos e somos? Não interessa, sem uma obra na terra. A que memória serei revivido? Quanto tempo durará meu legado secreto de vasto conhecimento trancafiado? Serei apenas uma foto envelhecida num túmulo qualquer, um nome e duas datas, na estrela e na cruz, e assim como os feriados Natal, Ano Novo, Dias dos Pais, o Dia de Finados também será solitário.

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Coletânea Ôxe!

Na Rodoviária do Tietê...

George de Paula

Chegava na metrópole após as merecidas férias de fim de ano, passadas no Litoral Norte, numa pousadinha pulguenta... Mas valeu a pena, não aguentava mais aquele escritório! Já estava tendo pesadelos com razonetes. Bem... O congestionamento me pegara o ônibus na serra e lento, lento, lento levou-o até o destino. Era meia noite e meia e o Metrô só abriria lá pelas quatro e meia da manhã. O quê fazer até lá? Se ao menos fosse daqueles que puxam conversa com qualquer um... Apreciei as vitrines, fui ao banheiro – não por vontade, mas por não ter o quê fazer ou talvez por curiosidade, para saber como era aquele banheiro. Quando já estava fatigado de caminhar ao léu arrastando aquela mala imensa, senteime. Havia uma equipe de faxineiras lavando alguns box's, e não é que um guri feliz da vida, chafurdava a espuma cinzenta como se aquilo fosse a coisa mais maravilhosa do mundo! Ninguém falava nada, nem as faxineiras nem a mãe da criança, que sabe-se lá onde estava. Atrás de mim, uma senhorinha falava, sem pausas, há uns quarenta minutos sobre o fato de não ter conseguido retirar sua aposentadoria. Sua ouvinte era uma jovem maquilada com exagero... Dessas jovens comuns de minha geração, denominadas: piriguetes. – … E a menina ainda me falou que não podia fazer nada por mim! Cê acredita, bem?! Isso é um absurdo! Ninguém mais respeita o idoso, hoje em dia, nem o governo... A gente trabalha, trabalha e depois não vale mais de nada! – ela continuava – Na minha época, só pr'ocê vê, quando meu pai tava conversando na sala com alguém, a gente, criança, não podia nem passar pela sala que levava um safanão. Esses dias aí atrás, eu tava no trem, de pé, nenhum filho de Deus pra me dar lugar! As pessoas se esquecem que vão envelhecer um dia... Hoje cê é jovem, bonita, cinturadinha... Amanhã... A moça aproveitou a pausa. – Licença, vou ao banheiro. Ela pegou sua mala e saiu. Tempo depois a menina ainda não havia voltado, a velinha ficou olhando para os lados meio inquieta, procurando a moça ou mais alguém que estivesse disposto a conver72⁠


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sar, sua sorte foi que apareceu um senhor de traje social bastante encardido que sentou-se ao seu lado. Não demorou para que ela começasse: – O sinhô veja, ant'onti fui receber minha aposentadoria... Quando ela deu uma pausa, o sujeito começou: disse que findaria os tempos de dor na vida dela, que Deus amava a sua alma... E tirou da mala uma bíblia. – A irmã crê? – vociferava ele – Está aqui neste salmo... Como sou amante do silêncio, saí dali para dar mais uma volta na rodoviária. Eram umas três e pouco... A essas alturas aquele guri feliz da vida, comia espuma até pelos olhos e ainda nada de sua mãe. Finalmente os portões de entrada para o metrô se abriram. Voltaria para minha sórdida cidadezinha suburbana. Rumo a entrada, passei novamente por onde estava. A senhorinha ainda falava feito uma matraca e pela cara do sujeito, ele havia desistido de seguir em seu proselitismo.

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Coletânea Ôxe!

A Arte

Messias Silva A arte me fascina me alumbra me alucina, ela me estimula com sua excelência me formulo, sua habilidade me preenche me aviva me enche, nela pratico uma ideia ao conhecimento da plateia, me leva ao pensamento à criação e o surgimento, para o encanto a alegria da composição da sonata à sinfonia, para o flutuar das formosas musas na magia de belas músicas, na coreografia das bailarinas na escola o balé na sapatilha das meninas, é a alma do teatro, cinema, televisão o glamour dos artistas em encenação, está na beleza da miss no beijo envolvente do ator, da atriz, nos museus de artes me sinto agraciado ao ver expostas: fotografias, gravuras, quadros, é a essência formidável das culturas encarnou Niemeyer-arquitetura, presente nos escravos das pirâmides e jardins suspensos da Babilônia, surgiu como o big bang alumbrando todo o universo no meu mundo revelada por criaturas rupestres, A arte vive em mim... capítulo a capítulo... eu a usarei para esculpir... o teu coração rupícola... 74⁠


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Ressaca de Cinza Danilo Góes

É carnaval, mó chuva, Maicon liga Zé do Mato pra colar no centro de Morato, hoje tem carnaval no Progresso. Não curte, mas melhor que ficar em casa assistindo desfile pela TV. Espera a chuva dar uma trégua, pois tem que ir na caminhada, só tem o da entrada. Não iriam entrar de bico seco, foram no mercado, jogaram para as calças uma Vodca, esse foi o motivo para vários tapas na cara dados pelo segurança do mercado. Ficou bravo, mas tava aliviado: “não parava de falar que iria chamar a polícia, melhor uns tapas do que ser preso”. Mais do que nunca agora necessitava de álcool, foram em outro mercado e, com medo, pagaram com o dinheiro da entrada. Colava sempre nos lugares com Zé do Mato, que foi apelidado devido ao consumo exacerbado de maconha. A amizade já era de longa data, quando Maicon deu um primeiro peguinha com Zé. Tinha 14 anos nessa época, hoje tem 17, já consumia álcool na direta. Seu primeiro porre foi quando tinha 5 anos, abriu a geladeira e bebeu a batida de morango do pai. O consumo do álcool sempre foi algo normal. Quando experimentou a maconha ficou com a mente pesada, pois sua mãe sempre disse que isso é coisa de vagabundo. Mas seu primeiro trago foi no cigarro da mãe que mandava ele acender no fogão pra ela. Sinceramente não sabia o motivo por que bebia, mas posso enumerar uma centena de motivos: Como uma árvore genealógica de cachaceiros; tédios diários de uma vida de moratense; uma forma de fuga da realidade; simplesmente beber por beber; talvez, as propagandas televisivas que associam bebidas com mulheres. Ele não tinha muita sorte com meninas, timidão. Foi fumando maconha e bebendo um goró, que o deixava desinibido, que descolou uma moça, ela curtia também um fininho e outras fitas. Zé povim comenta “essa mina é louca em ficar com esse projeto de marginal”. Mas mal sabem as más línguas que ele foi de suma importância nos rumos dessa moça. A novinha já tava descabelada na cocaína quando o conheceu. Apesar da pouca idade viu vários se afundarem e perderem a dignidade devido à química. Convenceu a

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Coletânea Ôxe!

moça a largar, ficou com ela um ano, ela teve que se mudar com os pais para outra cidade. Quando bebe e fuma dá nele uma letargia profunda. Nem se lembra como chegou em casa. Não se lembra que tava dormindo no banheiro da Pracinha do Coreto mesmo com cheiro insuportável de urina. Nem da briga que arrumou na Ponte Seca, mexeu com mulher acompanhada. O mal estar e os hematomas no rosto o fizeram fazer um juramento de não beber mais, é sempre assim após uma ressaca.

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201 1 - 201 2

Maria da Silva

George de Paula

Passeando pelas magras calçadas da minha cidade, esbarrando vez em ombros, vez em muambas, perdia-me em devaneios apreciando a muvuca. De repente ouvi chamarem meu nome: - Olavo Passos. Não acredito! Será que é a... - Maria da Silva. – Disse meio incerto de ser. - Puxa! Pensei que não fosse se lembrar de mim... Maria da Silva fez o colegial comigo, porém não chegou a concluir, pois engravidou na metade do segundo ano. - Como poderia? Conte-me, como você está? E sua filha está com quantos anos? - Estou bem! A Marilúcia está com dois aninhos, ela é terrível, Olavo! Acredita que... Não conseguia prestar atenção no que minha amiga dizia... Como estava diferente! Quando estudávamos juntos, Maria tinha corpo esguio, seios e nádegas perfeitos, era cortejada por todos os rapazes... O que o tempo lhe fez? Sua anca estava da largura de um fogão (de seis bocas), saltava-lhe do cós uma protuberância flácida e cheia de estrias... - Está me ouvindo? - Sim, é claro! E o Leonardo? Ele está bem? Leonardo foi o colega que a fertilizou. Ele era, na escola, daquela estirpe de sujeito que ouve músicas burlescas e se orgulha em exibir os preservativos que carrega na carteira. Eles se amasiaram após a gravidez de Maria. - Não sei e não quero saber! Nos separamos fazem seis meses e já me casei novamente, com Luiz, você não deve conhecer... - Você se casou novamente?! - Sozinha é que eu não vou ficar! Bem... Deixe-me ir agora! Tenho que buscar a pequena na casa da minha mãe. Foi um prazer te encontrar! Tchau! - O prazer foi meu! Saí daquela conversa com um desagradável aperto no pei77⁠


Coletânea Ôxe!

to... Temos a mesma idade, entretanto Maria está no segundo casamento e já tem uma filha... E eu ainda nem tirei minha carteira de motorista.

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201 1 - 201 2

Quem conta um conto...

Marco Nogueira e Fabia Pierangeli Ano eleitoral é sempre um prato cheio para acontecimentos que mais parecem histórias de novela. Eleições municipais então, nem se fala... as coisas vão acontecendo, as histórias vem surgindo e a gente acaba nem mais sabendo em que acreditar ou deixar de acreditar. Esses dias ouvimos uma e até agora estamos a nos perguntar se de fato aconteceu ou se é mais uma dessas histórias que alguém conta, a gente ouve e reconta com mais alguns detalhes, um terceiro repassa mais incrementada e por aí vai. Sabe aquele ditado: "Quem conta um conto, aumenta um ponto?" Pois é! Aproveitamos então para pedir licença à você leitor, pra contar, do nosso jeito a tal história que ouvimos e que garantimos que já foi recontada algumas dezenas de vezes. Dizem que num desses jardins, aqui em morato, um homem muito prepotente, dono de um comércio, desses onde, entre outras coisas, vende-se muita cachaça, resolveu se candidatar a vereador nas eleições passadas. Como não tinha muito dinheiro para investir na sua campanha, fez tudo da forma mais caseira possível. O jingle foi criado por ele mesmo e deve ter sido gravado num estúdio improvisado no banheiro da sua casa. Pra divulgar ele saía nos fins de semana com sua brasília 78, no qual adaptou uma caixa de som de sua antiga vitrola. As camisetas que distribuiu pros cabos eleitorais todas pintadas a mão; os santinhos xerocados; as promessas, as mais ingênuas possíveis, resultado: teve sim alguns votos. Provavelmente, o dele, da família e de alguns dos cachaceiros que aproveitaram o período da campanha para bebericar de graça, aliás beber junto com ele, porque o nosso aspirante a político dificilmente é encontrado sóbrio, a maior parte do tempo ele quase não consegue parar em pé. O fato é que o tal candidato ficou furioso, revoltado com sua condição de "candidato pobre" e bradou aos quatro ventos que nas eleições de 2012, tudo seria diferente. Que a qualquer custo ele arranjaria dinheiro pra fazer uma campanha como deve ser feita, com tudo de primeira, inclusive distribuição de cestas básicas, caixas d'água, remédios e tudo mais que seu possível "eleitorado" precisasse. 79⁠


Coletânea Ôxe!

E não é que a sorte bateu em sua porta? Ou melhor, pousou em seu balcão, mais precisamente no balcão da cachaça, e pousou mesmo, literalmente, levemente, na forma de um bilhete sorteado de loteria. De quem seria esse bilhete? Obs: Acompanhe, na próxima edição, mais detalhes dessa história...

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201 1 - 201 2

O Homem de Terno Xadrez... (Parte 1 )

Messias Silva

- Olá amiga, tudo bem? - Tudo, amigo, tudo sim! - Labuta pela vida, também? - Certamente! a jornada é sem fim; -Gosto muito de prosear contigo! - Mesmo, minhas mensagens não descarta!? - Tenho todas comigo! - As suas me fazem falta; - Não creio, que este ano, casarás!... - Estou incerta, mas formularei uma lista... - A santo Antônio enviarás?... - Só ao consultar um vidente na Bela Vista... - Sou eu!... tenho dom para médium... - Mesmo, o que o leva a tal sublimação!? - Vejo o altar para você como tédio!... - És do bom! namoro, mas casar é prisão...; - Para mudares de ideia lhe indicarei um Terreiro... - Já escolhi a minha amada Umbanda! - Cultuas os orixás, com danças, cantos o ano inteiro? - Sim, são eles que a natureza comanda; - Direi à você minha intuição, bela feiticeira! - Sobre sua mediunidade? - De fatos, fatores, acontecimentos à minha maneira! - Sou toda ouvidos, à vontade: ¨Nasci querido de vovó ela e meu irmão viviam em desavença, vovó faleceu não me deixou só a todo lugar sinto sua presença; 81⁠


Coletânea Ôxe!

Quando papai morreu o vi em sonho me apareceu muito jovem, mamãe foi ao seu encontro eu, desamparado, como, pode!?... Na infância cavalgava à cavalo com papai ele vendia produtos do CEASA, usava chapéu de palha, dobrava as laterais vendíamos frutas também em casa; Certa vez tiveram que sair um estoque de laranjas em caixarias, no portão de casa vimos surgir dezenas de crianças que laranjas queriam; Inocentemente, laranjas distribuímos aquela turba de crianças, diziam depois pagar, iam saindo meus pais lucraram em felicidades e novas esperanças; Anos se passaram e na adolescência mudamos para outro bairro, com a vizinha uma má vivência meu pai continuava com carroça como carro; Dona Vivaldina almejava a nossa propriedade o seu José Justo o antigo dono, usava chapéu desses da cidade de couro como esses de filmes de gangster; José Justo vendia legumes com carrinho de mão brincava comigo quando me via, ia para a igreja de terno, a caminho da salvação lembro-me não mais tê-lo visto outros dias; Se tenho à mediunidade tendência inspiração por grandes vultos do espiritismo, a minha reminiscência: ciências ocultas, filosofia, moralismo; 82⁠


201 1 - 201 2

Penso na mediunidade pelo acontecido talvez seja o que Freud explica, o fenômeno anímico por mim vivido posso afirmar, sim, vi um espírito. (Confira, na próxima edição a parte 2 dessa poesia e descubra o que seu protagonista viu...)

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Coletânea Ôxe!

Fazenda no Passado

Silmara Cavalcante

Fazenda no passado, cortada por ferrovias, trabalhadores,

Maria fumaça. Rica em verdes, águas límpidas. Hoje, uma cidade grande, movimentada, e o que havia. Antes, hoje não passa de histórias guardadas. Rios limpos que se transformaram em Negrume transbordando a cada chuva, invadindo casa, e até mesmo as ruas. Antes o Clareado de um céu limpo, de um ar puro, e hoje, as árvores que nos restaram, Inibem o mau cheiro e nos deixam seguros. Uma cidade que está Sediada de mudança, gritando, pedindo ajuda, onde está nossa esperança? Cidade Cercada de corrupção, o que antes era apenas uma boa administração, hoje O que predomina é a enganação. Manuseada pelo sistema, monopólio, enganada pelo sistema ganancioso e opressor Ofegantes correrias, para muitos, uma cidade dormitório, triste Realidade moratense, moradores dependentes, manipulados por políticos Ausentes, um transporte usurpador, onde para se locomover, pagamos Tremendo absurdo no valor. Francisco Morato tem esperança, se nós nos Organizarmos em favor da mudança, por isso, pense, analise e faça o que tiver de melhor ao seu alcance e tudo em nossa cidade será como antes.

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Homem virtual

André Arruda

um certo dia, empunhou o mouse. desde então, nunca mais foi encontrado, apenas conectado.

Amores ad infinitum

André Arruda

resolveu o problema. retirou de seu teclado a letra “ ”. a partir daí, nunca mais suas histórias de amor tiveram “ im”.

Quadrilha pós-moderna ou atualizando Drumond João clicou Teresa que twitou Raimundo que cutucou Maria que curtiu Joaquim que compartilhou Lili

André Arruda

João recebeu um spam Teresa não foi comentada Raimundo não foi selecionado nem Maria encaminhada Joaquim foi deletado e Lili, pôde olhar olhos nos olhos abraçar e beijar J. Pinto Fernandes que não participava de redes sociais

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Coletânea Ôxe!

O Movimento Feminista, o pior erro das mulheres

George de Paula

O Feminismo defende a igualdade de direitos e status entre homens e mulheres em todos os campos. Desencadeou-se após a Revolução Francesa, em 1789. Enquanto os revolucionários proclamavam a declaração dos direitos do Homem e do Cidadão, a escritora Olympe de Gouges redigia um projeto de declaração dos direitos (especificamente) da mulher. Em 1848, a Europa passou por outra revolução e as mulheres agora reivindicavam não só a igualdade jurídica e o direito a voto, mas também a equiparação de salários. Com a crescente industrialização, as mulheres do século XIX foram, cada vez mais, abandonando seus lares para empregarem-se como assalariadas nas indústrias e oficinas. O fato é que elas não precisavam iniciar nenhum movimento revolucionário. Não precisavam nem ter se preocupado em trabalhar, pois seus laboriosos maridos já cumpriam com esta árdua obrigação... É claro que quando os pobres coitados retornavam aos lares, tinham o direito de, no mínimo, uma janta quente! Daí que naquela manhã eu havia conseguido me sentar no trem – uma grande façanha! –, em minha frente se aprumaram duas belas mulheres de meia idade, destas típicas contemporâneas ou declaradas “independentes”, trajadas com elegância e bem perfumadas, inclusive o perfume de uma até me irritava as narinas. Elas conversavam: - Os homens de hoje não são nada cavalheiros! - Não mesmo, menina! – instigava a outra – Não mandam flores, não puxam a cadeira, não dão passagem... Nem assento! - É mesmo! Nem assento! Percebi que se referiam a mim quando falavam, em voz alta, sobre o assento. Ah, minhas caras! Se o Movimento Feminista lutou por igualdade de direitos e deveres... Se todos nós temos, da mesma maneira, de fazer esta viagem cansativa para ir ao trabalho... O que me motivaria a sair do meu assento para oferecer a uma das senhoras? Agora sofram as consequências do desvario de suas ancestrais! 86⁠


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Quem conta um conto aumenta um ponto (parte 2)

Marco Nogueira

Pois é caros eleitores, voltando ao nosso "quem conta um conto aumenta um ponto" e lembrando que no capítulo anterior, nosso aspirante a político, muito chateado por ter perdido as últimas eleições, bradou aos quatro ventos que na próxima tudo seria diferente; a história que chegou até nós continua assim: Acostumado que é, a lidar com bêbados e também sendo um deles, viu-se um dia diante de uma situação que para ele era o resultado de suas orações à nossa senhora dos alcoólatras; eis que um bebum, desses que não conseguem nem mesmo fixar os olhos em alguma coisa, pois os mesmos ficam meio que fora de foco, surgiu em sua frente com um bilhete de loteria. Isso seria muito comum se não fosse o fato desse bilhete estar premiado! E o nosso politiqueiro, por incrível que pareça, nesse dia estava sóbrio! Então, seu grande coração (talvez inchado pelo álcool), se comoveu e ele se ofereceu para ajudar o pobre bêbado a resgatar o prêmio. Passado algum tempo, o pobre desgraçado, quando perguntado sobre o bilhete, chora e diz que não sabe que fim deu, que nunca conseguiu botar a mão em dinheiro algum, pois disseram a ele que seu CPF estava irregular e que teria que aguardar uns dias para tomar posse de seu "legado". Dois anos se passaram e tudo que se ouve sobre o assunto são falatórios e “diz que me disse”, porque o bêbado, continua bêbado e pobre, já o devoto de nossa senhora dos alcoólatras parece que se deu muito bem. Como num milagre, a vida do nosso protagonista deu uma verdadeira reviravolta, seu comércio cresceu muito, sua vida mudou da água para o vinho, e ao que tudo indica, é claro que ele deve estar se esbaldando. E agora eleitor, será que a campanha de nosso candidato ainda vai ser feita com seu velho carro ano 78? Já faz algum tempo que ele desfila com um carro bem diferente, aliás do ano! Achamos que sua campanha agora vai bombar; ou quem sabe ele retorna às origens e reforma seu velho carro, faz cara de santo, honesto, de candidato bem intencionado, preocupado com o povo moratense, tão judiado, tão carente, tão necessitado de um vereador que se interessa 87⁠


Coletânea Ôxe!

tanto pelo bilhete, quer dizer, pelo bem estar de todos. E como já dissemos na edição anterior, caro (e)leitor, ano eleitoral é sempre um prato cheio para acontecimentos que mais parecem história de novela... Mas essa ainda não terminou, teremos mais detalhes na próxima edição. E não esqueçam que toda história contada muitas vezes, tem alguma alteração, (aumenta-se um ponto), por isso, pesquise bem o seu candidato antes de votar, imaginem um tipo como esse administrando nossas vidas? Fiquem alertas... "ELE" vem aí...

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Tenho Fé

Danilo Góes e Silmara Calvacante

O pôr do Sol já se aproxima, que sensação estranha, o medo me consome. Não me sinto bem, parece que estou em outra órbita. Que vontade de estar em outro lugar, bem longe, mas bem longe mesmo. Sinto-me no corredor da morte, quando o sol cai é o momento de ir para cadeira elétrica. Me sinto em apuros, sozinho... para onde ir, as horas na rua voam... não senti fome, por horas minha mente ficou tranquila. Mas no horizonte o sol está se pondo, um silêncio, mas sinto na alma o sinal gritando dizendo que tenho que voltar para masmorra do castelo. Porém ainda tenho um punhado de esperança, alguns minutos ou horas. Observo e penso em que casa eu posso passar esse momento de tranquilidade. Um vizinho, um familiar, algum lugar que me traga paz. Encontrei a calma jogando Playstation com vizinho, sonho como uma criança... Eu sou uma criança, mesmo as feridas na pele e na mente agindo como ação envelhecedora na minha personalidade, ainda sou uma criança. Tenho sonho, tenho um desejo de um dia encontrar o caminho, que eu possa seguir sem me preocupar com o anoitecer, que os domingos não sejam facas que penetrem minha alma. Pois vivo uma guerra não declarada, um lugar tão íntimo transformado no Iraque. Não tem ajuda Humanitária, ONU, UNICEF, CRIANÇA ESPERANÇA, nem Maria da Penha... Preciso de um direcionamento de um guia que me leve a um lugar passivo, que eu não me sinta estranho no próprio ninho, que afaste as maldades da minha mente, onde eu possa ter o amor e carinho. Vou continuar a procura, pois são poucas as minhas escolhas, tenho que correr, ou você mata o mal ou ele mata você. Eu sei que o ódio não fez bem, mas ele que me mantém vivo, mesmo se as pessoas encararem isso como loucura, é ele que me faz subir no ringue, é ele que me dá força para voltar para casa, após a vizinha dizer que “está tarde”. É ele que faz com que eu não deixe minha mãe sozinha. Ele é a motriz da minha resistência. Confesso que vivo em conflito interno, sei que é errado, mas 89⁠


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embaixo do cobertor rezo para que o tirano seja deposto do poder, que tenha a sua cabeça na guilhotina. Luto para que esse sentimento não mude o meu ser, serei eu mesmo sempre, não poderão dizer que quem lutar contra a opressão com todas as suas forças tenha a mesma brutalidade do opressor, isso é autodefesa. Lutarei e vencerei meus inimigos, externos ou internos, porque tenho fé, a única coisa que me sobrou. Estou perdido no deserto, descrente, preciso de alguém, na madrugada fria não tenho ninguém e o que sobrou para mim, me sinto Jerusalém no meio do conflito e minha mãe é a Palestina. Pergunto onde está Deus, tem vezes que o xingo, mas se estou aqui protegendo minha mãe é por que Deus sempre está comigo.

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A Lei Maria da Penha (Parte 1 )

Tião Simpatia

Está em pleno vigor não veio para prender homem mas para punir agressor pois em “mulher não se bate nem mesmo com uma flor”. A violência doméstica tem sido grande vilã por ser contra a violência desta lei me tornei fã para que a mulher de hoje não seja vítima amanhã. Toda mulher tem direito a viver sem violência é verdade, tá na lei que tem muita eficiência pra punir o agressor e à vítima, dar assistência. Tá no artigo primeiro que a lei visa coibir a violência doméstica como também, prevenir com medidas protetivas e ao agressor, punir. Já o artigo segundo desta lei especial independente de classe nível educacional de raça, de etnia; opção sexual... De cultura e de idade

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de renda e religião todas gozam dos direitos sim, todas! sem exceção que estão assegurados pela constituição. E que direitos são esses? eis aqui a relação: à vida, à segurança também à alimentação à cultura e à justiça à saúde e educação. Além da cidadania também à dignidade ainda tem moradia e o direito à liberdade só tem direitos nos “as” e nos “os”, não tem novidade? Tem direito ao esporte ao trabalho e ao lazer e o acesso à política pro Brasil desenvolver e tantos outros direitos que não dá tempo dizer.

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Na praça...

George de Paula Em minha cidade há uma praça. Em minha praça há um coreto com um característico odor de urina. Eu estava lá – Entre Sertões e Sevilhas –, acompanhado de João Cabral de Melo Neto, que declamava-me suas aventuras. Após a chegada em Catalunha, nos apareceu um varão: encardido – de pele e colarinho –, vestia um paletó azul marinho e, até o umbigo, uma gravata lhe escorria. Este falava da vida de Jesus de Nazaré – tornaram-no, em minha opinião, tal como o computador e a televisão, um meio eficacíssimo de anestesia às massas. – Que ele morreu na cruz e nos lavou com seu sangue, irmãos! Se sacrificou para que a gente alcançássemos o Reino do Céus... De Concordância ele não era tão bom... Porém, de Eloquência, era fenomenal! E gritava, gesticulava, batia as palmas e dava saltos... Preparação corporal digna dum atleta! Eu e João assistíamos ao show. – A Terra está imundada – com licença poética, tínhamos conosco um neologista! – de pecado... “João, quanto quer valer que daqui há poucas frases mencionará o Cão?” – Pois o Satanás... “Ah! Você paga o café!”. Esses pregadores urbanos devem sentir prazer ao pronunciar este nome e suas derivações... Ou o próprio dito-cujo lhes dá uma ajuda de custo pela divulgação. Enquanto ele não nos percebia, tudo ia bem, mas João não conteve seu riso... E o varão nos avistou... – Irmão! Você crê que há um Deus e que ele ama a sua alma? “Que falta de respeito, não é João? Essezinho te ignorou completamente!”. Ele continuou: – Você quer sair desta vida de pecados, meu filho? Quer largar esta vida mundana e obscura deste mundo de ilusão? Segure na mão do criador e seja um servo temente. Venha para luz e aceite a

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Jesus como seu salvador! – seus olhos se espremiam e reviravam, seu corpo fremia como se uma overdose tivesse – Aceite a Jesus como seu salvador, meu filho! Aceite! Aceite! De repente, meu diálogo com João Cabral tornou-se impossível. Foi quando decidi. “S’embora, João! Prosearmos noutra freguesia!”.

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A outra face

André Arruda

no ato da bofetada, antes mesmo que pudesse assimilar o ataque, lembrou-se do ensinamento de Jesus. simultaneamente, agradeceu ao céu o fato de não ser cristão e, imediatamente, revidou em dobro.

Mais esta noite

André Arruda

após o terceiro toque, reconheceu a voz da mulher. sem maiores explicações e de maneira bastante rápida informou, persuasivo, e sob os olhares atentos daqueles três, que voltaria para casa no dia seguinte. cuidou ainda de dizer que a amava e também deixar um beijo às crianças. ao desligar, explicou: - pelo menos, ainda mais esta noite, ela vai poder dormir tranquila. seguiu, então, com seus executores.

A culpa suprema

André Arruda

e tivesse Ele se contentado com tudo o que já havia criado até o sexto, e neste mesmo dia tivesse então descansado, eximindo-se assim de seus derradeiros inventos, muito provavelmente, até os dias de hoje, o mundo seria um bom lugar para se viver.

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21 Gramas

Danilo Góes

Cleintinho acordou. Todos dormiam ainda, passou por cima dos irmãos que estavam deitados no colchão no chão, com todo cuidado para não acordar eles. Era um cômodo só, 7 metros por 5, cinco crianças, ele e a sua mãe. Se arrumou e alimentou o pintassilgo – gostava muito desse pássaro que pesava 21 gramas. Tinha uma fita a fazer, saiu sem ninguém ver. Neide, coroa enxuta, era muito vaidosa, não aparentava ser mãe de sete filhos. Seus filhos nunca passaram fome, mas quando tinha um dinheiro sobrando gastava consigo – cosméticos, roupas e cabeleireiro. Dava motivo para as fofocas “seus filhos andam como menino de rua e ela gastando com besteiras”. De certa forma era uma verdade, seus filhos foram criados na rua, “a deus dará”. Mas é ser simplista colocar a culpa nela, fazia de tudo pelas crianças. Todo dia a mais-valia para patrão a esgotava, se não é o “risca-faca” uma vez por mês para aliviar o estresse, já tinha chutado “o balde”. Cleintinho esticou 21 gramas, enquanto o parceiro arrumava a nota, estavam prontos. Neide nunca teve sorte com amor, cada relacionamento terminava quase do mesmo jeito, homem sumido de uma hora para outra e deixando uma prole. Traz consigo uma amargura que inquieta as suas noites - seu primeiro filho foi assassinado, em frente de sua casa, treta por droga, tentou mandar o menino para morar com a tia, mas não deu tempo. Dificilmente falava desse assunto com alguém, nunca foi de reclamar da vida. Cleintinho tinha adquirido o passarinho na feira do rolo, trocou por um celular ching-ling 4 chips. Sua mãe via várias coisas chegar em casa, questionava a origem, o rapaz dizia que tinha feito rolo. Sabia que ele não era santo, mas não fazia noção do que andava fazendo na sua ausência. Sua mãe não poderia ofertar as suas necessidades, tinha que correr atrás. Neide tava de folga e acordou várias vezes na noite assustada, pressentimento ruim. Olhou para o chão, faltava um. Do lado de fora o passarinho amanheceu morto na gaiola. Cleintinho estava envolvido em umas fitas erradas. O parceiro 96⁠


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veio dar a notícia. Neide ficou estática. Não derramou nenhuma lágrima, embora um tsunami desaguava por dentro. No inicio do século 20 o Dr. Duncan MacDougall disse que a alma pesava 21 gramas. Estava desgastada com toda obrigação e sofrimento que a vida ofertou. A sua alma tava carregada, a perda de mais um filho fazia com que sua alma pesasse uma tonelada. A maquiagem era como um escudo, não mostrava o que realmente sentia no cotidiano. Ela não era de demonstrar a tristeza. Pai e mãe ao mesmo tempo ela não poderia transmitir fraqueza. Soluçava na cama na madrugada quando todos estavam dormindo. Até nessa hora tem buchicho: “Nossa, nem chorou no enterro do filho!”

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Dos personagens de cada dia

George de Paula

Vejam vocês que... É cada figura que a gente encontra por esses trens! Mas é que dentro dum vagão de trem da companhia de transporte público da maior metrópole deste país onde nasce china em casa de galego e galego em casa de crioulo, não poderia ser diferente. Entrou depois de mim esse sujeitinho, parecia um pedinte da década de cinquenta: roupa surrada, suspensório e um chapéu de palha com a aba molenga, tinha o cabelo grande e desgrenhado e um bigodinho... Ah, o bigodinho! Parecia o daquele pintor... Como é mesmo o nome dele? Sim, Salvador Dali. Nunca que teria coragem de me vestir com aqueles trajes, até mesmo porque meu ofício não me permite – lá no escritório, do meu sapato aos arquivos, é tudo muito alinhado. Mas é que ele, apesar de maltrapilho, até passava um ar bonacho. – Licença, filho, posso me sentar aqui? – foi o que me indagou. Senti um desconforto ante o fulano, talvez pelo fato de, contidamente, estar reparando nele, ou sei lá. Afastei-me uns três palmos. – Você tem horas? – Essa pergunta pode indicar que alguém está interessado em puxar conversa com você. Foi o caso. Disse lhe a hora e em pouquíssimo tempo já discutíamos sobre o dia, a decadência da humanidade, sobre música... – Mas é claro que conheço Gardel, grande amigo meu! Olha só! Ele também gostava de tango! Além de tudo, o sujeito ainda tinha uma risada bastante extravagante, cheguei mesmo a sentir vergonha, mas... Se ele não sentia... Trabalha num jornalecozinho – não me lembro o nome, sei que nunca ouvi falar –, escreve crônicas, foi o que me contou. Perguntei-lhe como era escrever num jornal. – Veja, filho, que é um troço pra lá de complicado, porque cada um pensa dum jeito e interpreta o que está escrito através da própria óptica, o que é comum... Mas é um paradoxo, porque isso é bom, ao passo que complicado. Vez por outra, recebo mensagens elogiando, parabenizando algum texto meu, mas também tem uns 98⁠


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camaradas metidos a intelectuais, puritanos, que caem matando em cima da opinião dos personagens, sem se dar conta que os próprios não tem a obrigação de serem perfeitos, já que as pessoas não são perfeitas. Entende? Daí que logo se levantou empunhando seu guarda-chuva, assim mesmo: como uma bengala... Agradeceu a prosa e disse que foi um prazer. Saiu lento. Para mim também foi um prazer prosear com o fulano. Fulano... Diabo! Não lhe perguntei o nome!

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Triste ironia da vida Danilo Góes

Eu ficava só olhando, no começo não me aproximei, devido a família e a infância que dificultava as ideias complexas. Na adolescência me aproximei e até que um fato fatídico me fez seu conselheiro. Deixe-me contar a historia de como me aproximei de Mesaque. Mesaque tinha um irmão mais novo, Sadaque, que sofria de crise asmática, diferença de idade de um ano, filhos de pais evangélicos, creio que essa doutrina religiosa me afastava dele, mas depois foi o estopim para me aproximar. Os únicos que chamavam o Sadaque pelo próprio nome eram seus pais, pois todos o chamavam de Sacolinha, eles vendiam sacolas na feira. Calça social e chinelo havaianas era a vestimenta dos dois, tanto na escola como na feira. Usavam sapato social em dias de muito frio e para irem à igreja. A família passava por momentos difíceis, se é que teve um momento bom. Um certo dia apareci e fiz Mesaque começar a questionar aquela situação com seu irmão: “por que quando é um macumbeiro que está passando necessidade é castigo. E quando é um evangélico é uma provação divina?” Seu irmão só ouvia, sempre foi mais calado. Já Mesaque não, questionador, brigão. Para Mesaque não tinha mais sentido argumentos como “Deus quis assim”, estava íntimo dele nessa época. Eu havia incentivado ele a furar a orelha e fazer um topete, motivos da surra do pai e que foi o motivo para deixar de vender sacolas. Sacolinha só observava, ficava sozinho vendendo na feira. Moleque de boa, nunca levou uma com ninguém, de poucos amigos, mesmo com a constante agonia por falta de ar, sofria bastante com isso, nunca blasfemou e continuava a ir à igreja sem a presença do irmão. Mesaque, à principio, sem minha interferência, queria viver o “mundão” – só não roubou, mas de resto... E antes da maioridade, já era pai. Já Sacolinha, chegou à maioridade vendendo sacola, seu pior 100⁠


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crime foi se masturbar, o que rendeu para si várias noites sem dormir, pensando que iria para o inferno. Parou de vender sacolas por que conseguiu um trabalho na farmácia. Estava se aproximando de uma colega de trabalho, balconista evangélica, se tudo desse certo seria a primeira relação amorosa. Sacolinha em crise, bombinha não tava adiantando... Correcorre, Mesaque mesmo sem habilitação pega o carro do tio, aflição, “não poderia acabar assim, não com o Sacolinha” gritava loucamente pulando lombada em alta velocidade, estava fora da sua compreensão, sentido Santa Casa. Sua mãe no banco traseiro desesperada “acorda filho”. Nem uma lei faz sentido, é a contradição da vida, a morte se atira na multidão, e atinge sem olhar a quem. Mesaque buscava uma verdade e a verdade não poderia ser esse desfecho, palavras de conforto não ajudavam, a crença de que ele encontraria a felicidade em outro plano soava como palavras ofensivas em seus ouvidos. Eu, a Descrença, estava apoiando Mesaque, o único apoio nesse momento.

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Coletânea Ôxe!

Poema furtivo

Remisson Aniceto O poeta ao falar de si fala dos outros, que cada um tem um quê do outro. Tudo é como se fosse um amarrio de cordas seguidas, compassadas, continuadas. O poeta ao falar dos outros fala de si, que cada um outro tem um quê de nós, cada um vive a vida alheia sem saber e morre na morte do outro. Cada poema é impessoal, é de todos, ainda que impregnado de evidências da mão. O meu seu poema dele não existe.

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Índice Remissivo

Edição Janeiro de 2011

Chamamento à Revolução - André Arruda........................... pág. 15 Pais Pudins - Beto Bellinati.................................................. pág. 17

Edição Fevereiro de 2011 Regue o Jardim – Nilton Mourão.......................................... pág. 19 Edição Março de 2011 Conto de todas as cores no Paraíso - André Arruda............. pág. 21 Comodidade X Mudança - Danilo Góes................................ pág. 22 Que Diabos! - Nilton Mourão............................................... pág. 24 Edição Abril de 2011 Dia da Verdade - Danilo Góes.............................................. pág. 26 A menina da mochila vermelha - George de Paula............... pág. 27 Edição Maio de 2011 À caminho do almoço - Beto Bellinati.................................. pág. 28 Trabalho - Daniela Mendes................................................... pág. 30 Paixãozinha - George de Paula............................................. pág. 31 Edição junho de 2011 Dor de Cão - Daniela Mendes ..............................................pág. 33 As rachaduras - George de Paula.......................................... pág. 34 Aonde ando é onde ando - Messias Silva...............................pág. 36 Edição Julho de 2011 Uma cena peculiar - George de Paula................................... pág. 37 Pílulas do Lobato - Luís Lobato........................................... pág. 38 O Tempo - Messias Silva....................................................... pág. 39 Edição Agosto de 2011 A infeliz história de Morato - Alexandre Barbosa.................. pág. 40 Lembranças póstumas de um Morto-Vivo - Danilo Góes....... pág. 41 Na fila do banco... - Geoge de Paula.................................... pág. 43


O Predador - Messias Silva................................................... pág. 44

Edição Setembro de 2011

Mais veloz que o pensamento - André Arruda....................... pág. 45 Até no Lixão nasce flor - Danilo Góes...................................pág. 46 Passado ao Presente - George de Paula................................pág. 48 Há Elite e Elite! - Messias Silva............................................ pág. 49

Edição Outubro de 2011 O golpista - André Arruda.................................................... pág. 51 Das Eleições - George de Paula.............................................pág. 52 Ao "Girandolá" apresento o "Pé na Jaca" - Messias Silva..... pág. 53 Edição Novembro de 2011 Espelho - André Arruda.......................................................pág. 55 Os aparelhos sonoros em trens e o futuro da Humanidade - George de Paula........................................pág. 55 É Chegado o Grande Dia - Danilo Góes............................... pág. 57

Edição Dezembro de 2011 Diagnóstico Denúncia - André Arruda.................................. pág. 59 A única verdade é que mentimos - Danilo Góes.....................pág. 61 Das cenas pitorescas de cada dia - George de Paula............. pág. 63 Ela é a Fina Flor do Samba Moratense - Messias Silva.........pág. 65 Edição Janeiro de 2012 Ditadura ao contrário - Franklin Falcão................................pág. 69 No Leito de Morte - Frank Neres...........................................pág. 71 Na Rodoviária do Tietê... - George de Paula..........................pág. 72 A Arte - Messias Silva........................................................... pág. 74 Edição Fevereiro de 2012 Ressaca de Cinza - Danilo Góes........................................... pág. 75 Maria da Silva - George de Paula......................................... pág. 77 Quem conta um conto... - Marco Nogueira e Fabia Pierangeli. pág. 79 O Homem de Terno Xadrez... - Messias Silva....................... pág. 81 Edição Março de 2012 Fazenda no Passado - Silmara Cavalcante.............................pág. 84 Homem virtual - André Arruda............................................. pág. 85 Amores ad infinitum - André Arruda.....................................pág. 85 Quadrilha pós-moderna ou atualizando Drumond - André Arruda.................................. pág. 85 O Movimento Feminista, o pior erro das mulheres - George de Paula........................................... pág. 86


Quem conta um conto aumenta um ponto (parte 2) - Marco Nogueira................................... pág. 87

Edição Abril de 2012 Tenho Fé - Danilo Góes e Silmara Calvacante...................... pág. 89 A Lei Maria da Penha - Tião Simpatia.................................. pág. 91 Na praça... - George de Paula............................................... pág. 93 Edição Maio de 2012 A outra face - André Arruda................................................ pág. 95 Mais esta noite - André Arruda.............................................pág. 95 A culpa suprema - André Arruda.......................................... pág. 95 21 Gramas - Danilo Góes..................................................... pág. 96 Dos personagens de cada dia - George de Paula................... pág. 98 Edição Junho de 2012 Triste ironia da vida - Danilo Góes...................................... pág. 100 Poema furtivo – Remisson Ancineto..................................... pág. 102


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