Revista FIT 2021

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DESIGUALDADE

Mudanças na tributação podem ampliar a distribuição de renda e fortalecer as economias no pós-covid

REGRESSIVIDADE

Alta tributação sobre o consumo penaliza a América Latina

COFRESPÚBLICOS

Dívida ativa dos estados supera

R$ 800 bi

Edição especial

AGRADECIMENTOS

Apandemia

de covid-19 aprofundou as desigualdades e expôs com nitidez o quanto a regressividade tributária reforça as iniquidades no país. Realizar a 2ª edição do Fórum Internacional Tributário (FIT 2021) e debater tributação, desigualdade e desenvolvimento na América Latina junto à classe fiscal e a renomados especia listas em um momento tão sensível, só foi possível porque contamos com ampla colaboração, assistência e apoio de nossos sindicatos filiados, parceiros e funcionários.

Nosso especial agradecimento à As sociação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (ANFIP), nas pessoas de Décio Lopes, presidente, e César Roxo, pela parceria consolidada entre as duas entidades, fomentando o debate de temas que desafiam o cotidiano tributário, pela defesa e valorização da administração tributária e por uma sociedade mais justa e igualitária.

Ao presidente do Sindicato dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo (Sinafresp), Alfredo Maranca, e toda a

diretoria, por não medirem esforços para acolher e viabilizar meios para a realização deste grandioso evento.

À Oxfam Brasil, representada por sua diretora executiva, Katia Maia, pela parceria e luta por justiça fiscal, política, e social.

Gabriel por traba-

incansável-

À Internacional de Serviços Públicos – (ISP), representada por seu coordenador, Gabriel Casnati, trabalha lhar incansavelmente pelo fortalecimento do movimento sindical mundial, em defesa de serviços públicos de qualidade e pela igualdade de oportunidades.

E, finalmente, ao professor de Economia da Unicamp e coordenador do movimento Reforma Tributária Solidária, Eduardo Fagnani, pelos esforços empreendidos para a realização do FIT 2021 e por demonstrar tecnicamente, por meio de estudos e pesquisas, que é possível desenhar um sistema tributário mais justo e alinhado com a experiência dos países mais igualitários, preservando o Estado Social e Democrático de Direito, estabelecido pela Constituição Federal de 1988.

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especial
Imagem: Freepik

EXPEDIENTE

DIRETORIA EXECUTIVA

TITULARES

Presidente

Charles Johnson da Silva Alcantara – Sindifisco/PA

Vice-Presidente

Marlúcia Ferreira Paixão – Sindsefaz/BA

Diretor Administrativo e Financeiro

Celso Malhani de Souza – Sindifisco/RS

Diretor para Assuntos Parlamentares e Relações Institucionais

Ricardo Bertolini – Sindifisco/MT

Diretor de Formação Sindical e Relações Intersindicais

Francelino das Chagas Valença Junior – Sindifisco/PE

Diretor de Comunicação

Cloves Silva – Sindifisco/MS

Diretor Jurídico e de Defesa Profissional

Marco Antonio Couto dos Santos – Sindifisco/MG

Diretor de Aposentados e Pensionistas

José Marcio Santa Rosa – Sindifisco/SE

Diretor para Assuntos Técnicos

Anatal de Jesus Pires de Oliveira – Sindifisco/AP

Diretor do Departamento de Projetos Especiais

Glauco Honório – Sinafresp/SP

Departamento de Políticas Sociais da Fenafisco

Ronaldo Oliveira da Silva – Sindaftema/MA

SUPLENTES

Roberto da Silva Geraldo – Sindifisco/AM

Fernando Carvalho de Freitas – Sindifern/RN

Sáris Pinto Machado Júnior – Auditece Sindical/CE

Gabriela Vitorino de Sousa – Sindifisco/GO

Martin Baria – Sinfrerj/RJ

Jorge Antonio da Silva Couto – Sindare/TO

Alexandre José Wanderley de Moraes – Sindifisco/PE

CONSELHO FISCAL

TITULARES

José Caetano Mello Junior – Sinaffepi/PI

Mauro Roberto da Silva– Sindafisco/RO

Paulo Roberto Ferreira Bonfim – Sindifisco/MS

SUPLENTES

Leyla Maria Alves da Silva – Sindifisco/AC

Marco Aurélio Cavalheiro Garcia – Sindifiscal/MS

Rudimar Braz de Melo – Sindifisco/SE

REVISTA DO FIT

Coordenação

Cloves Silva

Textos

Wanúbia Lima (MTB 9585/DF)

Allan César (13138 DRT/ DF)

Colaboração: Ascom ANFIP

Edição

Wanúbia Lima

Revisão Ortográfica

Anna Guedes

Fotos

Fórmula Digital

Projeto gráfico

Sergio Bastos | 585 DRT/PA

Impressão

Ideal Gráfica

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EDITORIAL

Diantedos desafios econômicos e sociais potencializados pela pandemia de covid-19, se faz imperioso discutir a tributação na América Latina, e em especial o sistema tributário do Brasil, em busca de medidas efetivas para a recuperação, combate às desigualdades e pleno desenvolvimento dos países afetados.

Durante os dias 20, 21 e 22 de outubro, o Fórum Internacional Tributário (FIT 2021), realizado em formato híbrido (presencial e virtual), reuniu mais de 30 renomados palestrantes nacionais e internacionais para debater as propostas sobre tributação progressiva em discussão nos países desenvolvidos e suas possibilidades para a América Latina.

Nomes como Marc Morgan, pesquisador do World Inequality Database; Alberto Barreix, economista-chefe fiscal do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID); Ricardo Fenochietto, do Departamento de Assuntos Fiscais do FMI; Attiya Waris, especialista independente da ONU em dívida externa; e Andres Knobel, pesquisador líder da Tax Justice Network, abordaram temas como: imposto sobre a renda e riqueza; paraísos fiscais; sonegação, dívida ativa e administração tributária; desafios tributários pós-pandemia, entre outros.

Esta revista apresenta uma síntese das atividades realizadas ao longo do FIT 2021.

Boa leitura!

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SUMÁRIO

10 ENTREVISTA

Os desafios do sistema tributário da América Latina

48 GALERIA

Fotos dos melhores

momentos

20

Caminhos para uma tributação mais justa no pós-covid

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PALESTRAMAGNA

SUMÁRIO

36 Estudo denuncia rombo bilionário nos cofres públicos

ATLASDADÍVIDAATIVA

46 Comissão organizadora e apoio operacional estruturam o FIT 2021

BASTIDORES

40 Plenária debate a conjuntura política e econômica do país, além de pleitos da categoria

PLENAFISCO

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PALAVRADOPRESIDENTE

Asegunda

edição do FIT foi mais um momento de reflexão e debates sobre a importância da tributação como fator de desenvolvimento econômico e social. Com uma visão voltada para as realidades da América Latina, o FIT foi uma oportunidade de trazer à sociedade uma abordagem franca sobre a tributação, a desigualdade e o desenvolvimento em economias mais próximas da realidade brasileira.

Trazer as mais diversas opiniões foi uma forma de dar suporte ao amadurecimento das discussões acerca da necessidade de uma reforma tributária mais ampla, capaz de corrigir as distorções do sistema, com foco, além da simplificação, num modelo de tributação que desonere as classes menos favorecidas e possibilite alcançar as maiores rendas e grandes patrimônios e riquezas.

É necessário que os atores políticos deem exemplo aos cidadãos quanto ao dever fundamental de pagar tributos, observado o princípio da capacidade contributiva, da segurança jurídica e da proteção da confiança, como única forma de prover o Estado de recursos necessários à realização das políticas públicas e promoção do desenvol-

vimento econômico e social. É imperioso o fortalecimento das administrações tributárias, impingindo a tais órgãos autonomia no exercício das suas competências, sem ingerências políticas, com orçamento adequado para realização de suas atividades de arrecadação, fiscalização e inteligência.

Vai aqui o meu agradecimento especial à Fenafisco, pela parceria já consolidada com a ANFIP na realização do FIT, e ao Sinafresp, pela logística e organização do evento.

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PALAVRADOPRESIDENTE

Em 2021 a Fenafisco e a ANFIP, com o apoio de seus colaboradores, realizaram mais uma exitosa edição do Fórum Internacional Tributário, que trouxe a todos um feliz resultado. Graças à alta tecnologia e aos esforços empreendidos muito antes do evento, conseguimos realizar um encontro híbrido, com palestrantes de todo o mundo e de diversas organizações, para debatermos temas relevantes e diretrizes para o enfrentamento das desigualdades aprofundadas pelo contexto da pandemia, e nutridas por um sistema que perpetua a penalização das classes mais pobres.

Mais do que necessário, o FIT veio para ficar. Torcemos para que este evento seja incorporado ao nosso calendário de debates, de modo que possamos contribuir com o país, ao debatermos medidas que retirem dos mais pobres o fardo imposto por um sistema injusto, regressivo e responsável por ampliar as iniquidades não apenas no Brasil, como em toda a América Latina.

Meus especiais agradecimentos à diretoria da Fenafisco, a todos que ajudaram de alguma forma para que esse evento acontecesse, às organizações parceiras e aos demais colaboradores envolvidos.

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Eduardo Fagnani

Em entrevista à Fenafisco, o professor de Economia Eduardo Fagnani, coordenador dos estudos que deram à luz o projeto Reforma Tributária Solidária, fala sobre a segunda edição do FIT, defende o fortalecimento do gasto social para o enfrentamento à crise aprofundada pela pandemia de covid-19, critica o modelo tributário atual e reafirma que o combate às desigualdades exige uma ampla reforma do sistema de tributos, atualmente, regressivo e punidor da população carente.

Fenafisco: Conte um pouco sobre a sua formação acadêmica e profissional.

Eduardo Fagnani: Formei-me em Economia pela Universidade de São Paulo (USP), em 1976. Fiz mestrado em Ciência Política, e doutorado em Economia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Lecionei na Unicamp entre 1985 e 2020. No Executivo, fui diretor de planejamento da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo (1988 a 1990) e diretor financeiro do Metrô de São Paulo (1990 a 1992).

10 ENTREVISTA

F: Quais grandes debates ocorreram no FIT?

EF: O FIT 2021 reuniu destacados especialistas e lideranças globais, para, além de debater as propostas de mudanças na tributação que têm sido formuladas pelos países centrais, responder a questões como: Qual é o papel da tributação na superação da crise pós-covid? Quais as propostas de justiça fiscal que estão em curso nos países desenvolvidos? Qual a agenda dos organismos internacionais para justiça fiscal e combate à desigualdade? E quais são as possibilidades de que essas mudanças cheguem à América Latina?

F: A agenda prioritária do Congresso Nacional está desconectada do debate conduzido pelo establishment das finanças internacionais e por governos liberais dos países avançados, no que versa à tributação no Brasil?

EF: No Brasil, as ideias liberais que hoje iluminam o mundo não prosperam. A agenda prioritária do Congresso contempla, preferencialmente, a simplificação da tributação do consumo, sendo omissa quanto à tributação da riqueza; e, no caso do imposto de renda da pessoa física, a proposta tardia apresentada implica em redução da participação relativa do tributo na carga tributária total.

ses centrais estão propondo e implementando a elevação dos impostos para os mais ricos e sobre os lucros extraordinários das grandes corporações para financiar serviços essenciais.

F: Contextualizando, historicamente, como chegamos ao modelo tributário atual?

EF: No plano externo, destaca-se a histórica inserção subordinada no Brasil na economia global, aprofundada na atual etapa do

O FIT demonstrou de maneira cabal que, atualmente, instituições como FMI, OCDE, Banco Mundial e CEPAL e governos de paí-

capitalismo dominada pelas finanças, no contexto da globalização e sob a hegemonia da doutrina neoliberal, que restringe o papel dos estados nacionais e impõe reformas socialmente excludentes que visam ampliar o lucro e facilitar a mobilidade dos capitais. No plano interno, é preciso considerar que somos um país capitalista de industrialização tardia, com longo passado colonial e escravocrata, com um estado patrimonialista capturado pelas elites econômicas há séculos. Nesse cenário, os impostos sempre foram transferidos para as camadas de baixa renda para livrar os ricos da tributação.

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O caráter secularmente regressivo do sistema é percebido pela elevada tributação sobre o consumo e pela reduzida tributação das altas rendas e grandes patrimônios.

F: Na sua visão, qual a grande injustiça do nosso sistema tributário? Aponte somente a maior.

EF: De forma categórica, pode-se afirmar que o sistema tributário brasileiro é inconstitucional. Se, antes da atual crise, a tributação progressiva era imperativo de justiça fiscal, após a crise passou a ser imperativo civilizatório. Somos um dos países mais desiguais do mundo e o nosso sistema tributário é um dos mais injustos na comparação internacional. O caráter secularmente regressivo do sistema de impostos é percebido pela elevada tributação incidente so-

tas reduzidas na comparação internacional. O sistema de impostos possui diversos mecanismos que isentam de tributação as camadas de altas rendas e grande parte das rendas do capital, inclusive, os rendimentos remetidos para o exterior, aos sócios e acionistas estrangeiros. Por conta desses dispositivos, os contribuintes de alta renda têm mais de 70% dos seus rendimentos não tributados, pagando alíquota efetiva semelhante aos contribuintes de renda baixa e média.

F: Com a carga tributária atual é possível investir em políticas sociais que melhorem a qualidade de vida da população e diminua a desigualdade social?

bre o consumo e pela reduzida tributação das altas rendas e dos grandes patrimônios, uma anomalia em relação aos países capitalistas relativamente menos desiguais.

F: Os dados revelam que o Brasil possui uma das maiores cargas tributárias do mundo a incidir sobre o consumo e que, portanto, captura uma proporção maior da renda dos pobres e uma parcela menor da renda dos mais abastadas. Comente.

EF: Sim. O IRPF tem baixa progressividade, reduzido poder arrecadatório e alíquo-

EF: De modo geral, o senso comum de que a carga tributária no Brasil é alta não reproduz a realidade. É verdade que a carga tributária é elevada para os pobres, justamente para manter os privilégios tributários dos super-ricos. Essa é a raiz da secular regressividade do sistema de impostos brasileiro. Os pobres têm carga tributária exorbitante porque os impostos sobre o consumo representam quase 50% do total arrecadado, (ante 17% nos EUA), o que captura uma proporção maior da renda dos pobres e uma parcela ínfima da renda dos ricos. Os ricos têm carga insignificante porque os tributos que incidem sobre a renda e a riqueza são baixos na comparação internacional.

F: É possível dizer que a simplificação do sistema tributário, e a diminuição do número de impostos é suficiente para ala-

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Ao reduzir a carga de impostos dos mais pobres, aumentando a renda disponível, a tributação progressiva atua como instrumentos para impulsionar o desenvolvimento.

vancar investimentos e promover o desenvolvimento econômico do país?

EF: A simplificação da tributação do consumo é necessária, mas insuficiente. O seu papel para o desenvolvimento econômico é limitado para alavancar investimentos. O que faz isso é uma demanda por produtos. E isso requer ampliar a renda da população pobre, que consome tudo o que ganha. Ao reduzir a carga de impostos dos mais pobres, aumentando a renda disponível, a tributação progressiva atua como um dos instrumentos para impulsionar o desenvolvimento.

F: Nesse momento de pandemia, como a

tributação pode ser utilizada como instrumento de combate à crise e para a retomada do crescimento econômico?

EF: No Brasil, a necessidade de taxar as altas rendas e a riqueza é imperativo civilizatório. Não há saída para a crise sem forte tributação do topo da pirâmide da renda. A tributação progressiva deve se concentrar, especialmente no imposto de renda que, em países desenvolvidos, é o centro do sistema tributário. Mas, também, deveria incidir sobre a tributação da riqueza: a riqueza concentrada na propriedade imobiliária; a riqueza transmitida por gerações (heranças) e a riqueza acumulada (pela via do Imposto Sobre Grandes Fortunas - IGF).

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F: Rapidamente, nos fale da proposta da Reforma Tributária Solidária.

EF: O projeto “Reforma Tributária Solidária”, nascido em 2017 por iniciativa da ANFIP, Fenafisco e outras entidades apoiadoras, produziu entre 2017 e 2019 dois documentos, que contaram com a colaboração de mais de 40 especialistas. O primeiro apresenta amplo diagnóstico sobre a totalidade dos problemas crônicos da tributação brasileira. O segundo traz propostas para mudar o sistema tributário, apresentando estimativas e simulações de impactos financeiros das medidas sugeridas.

Após a conclusão dos estudos, teve início a

etapa da ação parlamentar, que resultou na sua acolhida por seis partidos da oposição, tendo recebido mais de 200 assinaturas de parlamentares de 11 partidos políticos. Daí resultou a Emenda Substitutiva Global no 178 à PEC 45, rebatizada de “Reforma Tributária Solidária, Justa e Sustentável”.

Poucos sabem da sua tramitação no Congresso Nacional porque a grande imprensa não difunde essa informação para a sociedade.

F: Quais são os pilares da “Reforma Tributária Solidária, Justa e Sustentável”?

EF: Trata-se de uma proposta pensada na perspectiva do desenvolvimento, que “sim-

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plifica” a tributação do consumo, corrige a injustiça tributária, preserva o financiamento do Estado de Bem-estar Social, e corrige dois mecanismos que historicamente transferem renda, das camadas mais pobres para as camadas de maior renda da sociedade: as isenções fiscais e a sonegação. Trata-se da única, dentre as propostas que tramitam no

pobres e as pequenas empresas, fortalecem Estados e Municípios e incidem sobre as altas rendas e o grande patrimônio, onerando apenas os 0,3% mais ricos. Com a retomada do crescimento, estima-se que essas medidas possam gerar recursos adicionais da ordem de R$ 291,8 bilhões por ano.

F: Teremos um processo eleitoral em 2022. Qual a sua perspectiva para o perfil dos novos eleitos e de que forma isso poderia influenciar na discussão de um novo modelo tributário nacional?

Congresso Nacional, que, de fato, enfrenta a questão da vergonhosa desigualdade social brasileira – mas poucos sabem da sua existência, pois ela tem sido negligenciada no debate nacional.

F: Após a eclosão da crise gerada pela pandemia, as entidades que elaboraram as propostas que resultaram na “Reforma Tributária Solidária, Justa e Sustentável”, prepararam o documento “Tributar os super-ricos para reconstruir o país”. Comente.

EF: O documento apresenta oito propostas prioritárias que promovam uma progressividade efetiva na tributação da renda e da riqueza. Essas propostas isentam os mais

EF: As eleições de 2022 são uma nova oportunidade para se debater os reais problemas da sociedade brasileira. E eu não tenho dúvidas em afirmar que a maior chaga brasileira é a desigualdade social, amplificada, de forma obscena nos governos Temer e Bolsonaro. O debate desse tema recoloca a questão do desenvolvimento e da tributação progressiva na ordem do dia.

F: Quais são suas perspectivas para a tributação brasileira?

EF: Uma perspectiva mais otimista dependerá, em última instância, da capacidade das forças democráticas e progressistas de formular propostas e ampliar o debate dos problemas reais do país com a sociedade e convencê-la do imperativo de encerrar esse ciclo nefasto de destruição da democracia, da cidadania e dos instrumentos voltados para o desenvolvimento nacional. Esse é o pré-requisito de uma jornada difícil rumo a progressividade tributária.

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No Brasil, a necessidade de taxar as altas rendas e a riqueza é imperativo civilizatório. Não há saída para a crise sem forte tributação do topo da pirâmide

Entidades reafirmam a importância da tributação para a redução das desigualdades

Durante

a cerimônia de abertura do Fórum Internacional Tributário (FIT 2021), representantes das entidades organizadoras e apoiadoras do evento destacaram a promoção da justiça fiscal por meio da progressividade tributária como medida fundamental para alavancar a economia, enfrentar as desigualdades sociais e de renda e alinhar o sistema tributário da América Latina com as experiências bem sucedidas de países desenvolvidos.

Na oportunidade, o presidente da Fenafisco, Charles Alcantara, fez um comparativo sobre o fosso social existente no Brasil ao lembrar que, na data de 20/10/2021, 20 milhões de brasileiros se encontravam há mais de 24 horas sem comer, seguidos de outros 24,5 milhões que não sabiam até então se comeriam naquele dia, somados a outras 74 milhões de pessoas que estariam com medo de não ter o que comer. “Mais da metade da população brasileira não come, não sabe se vai comer ou está com medo de não comer. Estamos falando de 120 milhões de pessoas. Os dados são alarmantes”, criticou.

Em contraponto à extrema pobreza, Al-

cantara lembrou que os 20 mil brasileiros com renda superior a R$ 230 bilhões por ano, não pagam impostos e criticou a superoferta de benefícios. “Esse é o Brasil que temos, com R$ 300 bilhões anuais de privilégios fiscais. Uma realidade comum a países da América Latina, também desiguais

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ABERTURA

e com tributação regressiva. Taxar o grande patrimônio não é uma agenda apenas ética, é uma questão de justiça. É também uma agenda que nos permite sair da crise e promover o desenvolvimento. A tributação progressiva é necessária”, defendeu.

Décio Bruno Lopes, presidente da ANFIP, enalteceu o evento e classificou o momento como relevante para intensificar o debate sobre as medidas para se combater a corrupção, a evasão de divisas e o contrabando, além de estratégias para viabilizar a tributação como instrumento de redução das desigualdades e justiça fiscal. “Neste momento de crise, cabe às nações procurarem alternativas para a continuidade das

políticas públicas e da prestação de socorro à sociedade. Tributar as grandes riquezas e fortalecer as administrações tributárias como possibilidade de efetivação das receitas são medidas importantes”.

“Nosso desafio no pós-covid 19 são enormes. Para além da fome, precisamos combater a extrema concentração de riquezas, a disfunção econômica e a regressividade no sistema de tributação. País com desenvolvimento é país com tributação justa, sustentável e solidária”, pontuou Kátia Maia, diretora executiva da Oxfam Brasil.

“A pandemia trouxe a oportunidade de debatermos a importância da justiça fiscal para a América Latina e mecanismos para enfrentarmos a falta de coordenação social, política e econômica do mundo. O FIT acerta muito ao reunir organizações da sociedade civil, sindicatos e organizações não governamentais (ONGs) neste projeto”, disse Gabriel Casnati, coordenador da Internacional de Serviços Públicos (ISP).

Alfredo Maranca, presidente do Sinafresp, classificou o FIT como um espaço relevante para abordar a reestruturação do modelo tributário vigente. “Neste momento de crise sanitária e econômica, vamos pensar em um sistema justo e igualitário, e vamos, com o debate, revolucionar e mostrar para o globo que o terceiro mundo pode ter modelos adequados”, disse.

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Progressividade tributária e suas perspectivas para a América Latina Para

ampliar o debate sobre as propostas de mudanças na tributação dos diversos países da América Latina, com o objetivo de corrigir as disparidades percebidas em comparação aos países desenvolvidos, representantes de organismos internacionais alertaram sobre a importância de redução das desigualdades, potencializadas no globo após a pandemia da covid-19.

No painel coordenado pelo professor do Instituto de Economia da Unicamp, Eduardo Fagnani, a diretora executiva da Oxfam Internacional, Gabriela Bucher, observou que o aumento da desigualdade mundial afetou sobretudo as mulheres e os grupos minoritários, cuja recuperação não será possível em curto tempo. Bucher enfatizou que as “instituições internacionais não conseguem mais absorver esse desequilíbrio da desigualdade”.

Segundo o diretor da Divisão de Desenvolvimento econômico da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe

(Cepal), Daniel Titelman, uma das alternativas para minimizar as desigualdades econômicas agravadas pela crise atual seria promover a reestruturação do sistema tributário, de modo a fortalecer o gasto público, diante das crescentes demandas sociais.

Titelman também destacou a necessidade da América Latina potencializar a política fiscal para fomentar o desenvolvimento e combater as desigualdades, por meio de medidas para ampliar as receitas, melhorar as estruturas, revisar os gastos tributários e ampliar o imposto sobre patrimônio e propriedade.

18 MENSAGEM
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Tributação como alternativa para fortalecer a economia no pós-covid

Aassimetria

de renda na América Latina representa um dos aspectos mais evidentes das desigualdades do território, e reflete-se no acesso limitado a bens e serviços, na brutal concentração de riquezas, na injustiça fiscal e no desenvolvimento da economia.

Como ponto de partida para a superação destes entraves, o presidente executivo da Tax Justice Network, Alex Cobham, abordou

caminhos para uma tributação mais justa no cenário de crise pós-covid, oportunidade em que destacou a tributação como fator determinante para o alcance da justiça tributária e o combate às desigualdades.

Durante a palestra magna, Cobham explicou que a evasão fiscal na América Latina é mais acentuada do que nos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), cujo percentual

20 PALESTRAMAGNA

arrecadatório é superior ao dos países latinos. Segundo ele, cerca de U$ 427 bilhões em tributos são evadidos anualmente, por conta de abusos cometidos por companhias, multinacionais e offshores, provocando a perda de recursos que poderiam ser investidos em políticas públicas e infraestrutura social. “O que não é contabilizado aprofunda ainda mais a desigualdade”, alertou.

Ele lembrou que o atual cenário de crise provocado pela covid-19 favoreceu grupos econômicos a ampliarem seus lucros durante a pandemia. “Pessoas estão se beneficiando, e é preciso fecharmos essa ‘torneira’, para que haja distribuição das riquezas de forma igualitária”.

O doutor em Economia Marc Morgan, pesquisador do World Inequality Database, ao comentar o tema, defendeu o princípio da progressividade nos sistemas tributários para reduzir a desigualdade de renda nos países da América Latina, em especial no caso brasileiro. Morgan defendeu a equidade e a transparência dos impostos e criticou a falta de tributação de lucros e dividendos e isenções fiscais do país. “São problemas a serem enfrentados para viabilizar a progressividade do sistema”, finalizou.

O painel teve como debatedores Marc Morgan, e Jayati Ghosh, da Universidade de Massachusetts (EUA). A coordenação foi de Pedro Humberto Carvalho Junior, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

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A equidade nos tributos e as constituições nacionais

“ A importância do princípio da equidade na tributação dos países desenvolvidos, sua representação nas constituições do Brasil e do Chile e a realidade da tributação nessas nações” trouxe ao debate os pesquisadores Jorge Atria (Centro de Estudos em Conflitos Sociais e Coexistência do Chile), Juan Apablaza, da Associação dos Fiscais de Impostos Internos do Chile e Eloísa Machado, da Fundação Getulio Vargas, para apresentar caminhos possíveis à implementação da justiça fiscal nas sociedades latino-americanas, por meio do aumento da tributação dos mais ricos.

Os especialistas defenderam o princípio da capacidade contributiva como pilar para os sistemas tributários dos países em desenvolvimento e fundamento de suas constituições, além de ações voltadas à educação fiscal, com foco nos contribuintes.

Na ocasião, Atria lembrou que a América Latina é a única região do mundo com

um perfil tributário em que prevalecem os impostos indiretos sobre os diretos, dificultando a tributação sobre os mais ricos. “Oitenta por cento das pessoas no Chile não pagam imposto de renda”, afirmou.

Segundo ele, as alterações em curso na Constituição chilena não serão suficientes para solucionar as desigualdades e os problemas derivados da injustiça tributária, mas poderão ajudar a fortalecer a conscientização popular acerca da importância do recolhimento de impostos, “como um instrumento para a criação de bens comuns”.

EQUIDADE | CONSTITUIÇÃO

Juan Apablaza, presidente da Asociación de Fiscalizadores de Impuestos Internos,

22 PAINELI

do Chile, explicou que o sistema tributário de seu país é “deficiente, complexo e regressivo. Para tornar o modelo tributário chileno mais equitativo, o especialista defendeu as ferramentas de controle e sanção de despesas rejeitadas, a desburocratização do acesso às informações sobre movimentações financeiras dos contribuintes, a simplificação do sistema, a alta tecnologia para processamento de informações e de pagamento; e o reforço da fiscalização de indivíduos com alto patrimônio líquido.

Eloísa Machado, da FGV, criticou a regressividade do sistema tributário nacional e lembrou que a Constituição brasileira de 1988 nasceu de valores pré-determinados e positivados para reduzir as desigualda-

des regionais, erradicar a pobreza, e construir uma sociedade livre, justa e igualitária. “A desigualdade persistente no Brasil, ainda que tenhamos uma Constituição que movimente as políticas públicas em prol da igualdade, é fomentada pelas políticas de Estado. Temos dificuldade de enfrentar o próprio Estado agindo na construção de desigualdades”, analisou.

Segundo ela, os princípios tributários que visam a equidade também são enfraquecidos por equívocos na enunciação do texto constitucional, por meio do termo “sempre que possível”, de forma contínua.

“Temos o dilema de um texto que enuncia direitos e um sistema político que esvazia nosso projeto social constitucional”, destacou.

BRASIL X CHILE

Ao comparar as alterações promovidas por Brasil e Chile em suas matrizes tributárias ao longo da história, a procuradora do Ministério Público da Justiça do Estado de São Paulo (MPSP), Élida Graziane Pinto, criticou a atual política brasileira, por fomentar a manutenção de privilégios e perpetuar desigualdades e exaltou o país vizinho pelas medidas adotadas para combater às iniquidades. “O Chile revisita seu passado ditatorial e segue no sentido de enfrentar problemas estruturais. O Brasil, ao contrário, invisibiliza sua desigualdade escravocrata e caminha para ser o Chile da década de 1970”, disse.

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Reforma estruturante exige novo modelo de tributação sobre a renda na América Latina

Especialistas do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), da Universidade de Buenos Aires e da Fundação Getulio Vargas (FGV) analisaram as propostas de mudança na tributação sobre a renda de pessoa física e jurídica dos países desenvolvidos e as alternativas para reformar o modelo tributário adotado atualmente pelos países periféricos, com o objetivo de aprimorá-lo.

Na oportunidade, o consultor do BID, Alberto Barreix, alertou que a América Latina só alcançará equilíbrio fiscal e tributação equânime a dos países desenvolvidos por meio de “um esforço fenomenal, com técnicos muito competentes, e parcerias com os países da OCDE.”

Em sua exposição, o professor da Universidade de Buenos Aires, Dario Rossignolo, apresentou um conjunto de estudos que definem socioeconomicamente quem seriam os ricos e super-ricos, destacando que os primeiros representam os 10% que estão no topo da pirâmide e, os super-ricos, o 0,1% mais acima.

O professor explicou que, na Argentina, a participação do 1% de rendas mais altas caiu 5% em dois períodos distintos, de 1990 a 2001 e de 2002 a 2010, e logo cresceu 1% em um período posterior. A participação dos 10% mais ricos também caiu na mesma proporção. No Brasil, para os 10% mais ricos, o crescimento da concentração de re-

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ceitas foi de 0,1% e 4% para ambos os períodos, enquanto a participação do 1% considerado super-rico teve incremento de 2% e 5% para os períodos.

Sobre a reforma do imposto de renda, Rossignolo verificou que nos últimos anos houve mais reformas na América Latina e Caribe,

pulação de mais baixa renda e, consequentemente, aumenta a desigualdade no país. “No Brasil, há uma forte concentração na tributação sobre bens e consumo. A tributação onera os mais pobres. Ao focar na tributação sobre o consumo, o sistema se torna desigual”, explicou.

Outro problema da tributação regressiva, segundo Piscitelli, é o impacto e o aumento da desigualdade na população negra e minoritária. “A população mais pobre no Brasil é a negra e, dentro dessa população negra, estão as mulheres. Nas pessoas em condição de pobreza no Brasil, 38% são mulheres pretas ou pardas, seguidas dos homens pretos ou pardos e, depois, mulheres brancas, por último, homens brancos. A tributação tem um impacto direto nessa realidade. Um sistema tributário que perpetue essa desigualdade tem um viés de discriminação intrínseco. E é essa desigualdade que precisa ser enfrentada quando falamos de reforma tributária”, ressaltou.

especialmente entre 2007 e 2012, que em períodos anteriores, embora tenham diferido em termos de cobertura e profundidade.

A professora Tathiane Piscitelli, da FGV, analisou a tributação da renda no Brasil, com foco na tabela do IRPF, mostrando como a tributação regressiva, impacta a po-

A professora da FGV também destacou que, com as atuais alíquotas da tabela do IRPF, que é regressiva, a população mais rica é pouco tributada. “Temos uma disparidade evidente. Olhando os dados da Receita Federal, é possível ver que os mais ricos pagam muito menos impostos do que os mais pobres. Precisamos enfrentar a regressividade, de modo que o sistema tributário não seja um potencializador dessa desigualdade. Temos que olhar para a tributação como uma realização dos direitos humanos”, enfatizou a professora.

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Especialistas debatem os efeitos da tributação sobre o consumo nos países em desenvolvimento

Atributação indireta nos países da América Latina e seus efeitos sobre as desigualdades social e de renda, acirrou mais um debate realizado no Fórum FIT 2021. O painel mediado pela vice-presidente da Fenafisco, Marlúcia Paixão, contou com a participação da professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Débora Freire, e dos especialistas Juan Pablo Jimenez, da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais de Buenos Aires; Nestor Castañeda, da University College of London e Fernando Peláez, do Centro Interamericano de Administraciones Tributarias (CIAT), que apresentaram os efeitos deletérios da tributação regressiva para a promoção de justiça fiscal e desenvolvimento dos países latino-americanos.

Na ocasião, Jimenez, afirmou que a situação socioeconômica da América Latina necessita de medidas urgentes para reverter o cenário anêmico da economia, a queda na produtividade e o desemprego na região, agravados pela pandemia de covid-19.

“Será necessário o fortalecimento das bases de financiamento da proteção social, cooperação entre os países e mudanças nos sistemas tributários para torná-los mais justos e eficientes. Devemos considerar modificar a tabela de IRPF, para promover a equidade do sistema, ampliar a tributação da renda e da propriedade e aumentar a carga tributária para financiar as políticas públicas prestadas pelo Estado”, disse.

Na mesma linha, o professor Castañeda ressaltou que fatores como tributação sobre o consumo, baixa tributação sobre renda e patrimônio e isenções fiscais, representam grandes desafios tributários para a América Latina, que podem ser enfrentados a partir da mobilização dos atores políticos para implementar transformações estruturais no sistema tributário, de modo a reduzir as desigualdades.

26 PAINELIII

Castañeda recomenda uma política tributária mais eficiente, reformas estruturais, especialmente as progressivas, ainda que difíceis de implantar na América Latina.

Fernando Peláez explicou que os gastos tributários dos países latino-americanos estão mais concentrados em impostos gerais do consumo. No caso dos países que adotam o imposto sobre valor agregado (IVA), há isenção de taxas e redução de alíquotas em produtos e serviços de saúde, educação, medicamentos, dentre outros. “Apesar de reduzir a regressividade do imposto sobre bens de consumo, o IVA não tem se mostrado eficiente. Estudos mostram sua (leve) capacidade de reduzir a incidência e depois a re-

gressão, mas com custo fiscal excessivo”, observou.

Para ele, as reformas tributárias dos países latinos precisam promover mudanças na tributação sobre o consumo, visando a progressividade e, consequentemente, a redução da desigualdade de renda. Débora Freire, debatedora do painel, destacou a convergência dos problemas na América Latina.

“A coordenação dos atores políticos e empresariais, assim como na Colômbia, é um grande problema para o avanço de reformas estruturais no Brasil. Toda proposta de reforma é difícil de ser levada em frente. Propostas progressivas têm muita dificuldade de avançar por essa falta de coordenação”, enfatizou.

Para a professora, a América Latina precisa de uma reforma que atue na tributação sobre o consumo, e sobre o imposto de renda e trate da tributação sobre patrimônio e herança. “Equilibrar o sistema, de forma que não traga cumulatividade, proporciona redução de custos”, avaliou. Freire concluiu que o caminho é colocar a sociedade para pensar, debater e gerar consciência de que a desigualdade é ruim do ponto de vista humano e econômico. “Uma sociedade menos desigual é uma sociedade mais produtiva”, finalizou.

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Pesquisadores questionam os efeitos das renúncias fiscais na distribuição da renda no mundo

Aanálise

das desonerações tributárias e das renúncias fiscais ao redor do globo, e seus efeitos sobre as transferências de renda, foi um dos destaques do FIT. Na oportunidade, o doutor em Economia, Augustin

Redonda (Universidade de Lugado – Suíça), alertou para o papel preponderante das reformas tributárias na promoção de justiça fiscal, redução das desigualdades e financiamento de políticas socais de combate às crises agravadas pela pandemia de covid-19.

Redonda criticou a escassez de informações pertinentes à eficácia dos incentivos fiscais para os países e reforçou a necessidade de se verificar os efeitos colaterais da concessão, na arrecadação de tributos.

Segundo o professor Daniel Artana, (Universidade Nacional de La Plata – Argentina), as renúncias têm um alto custo fiscal, com grande impacto no Produto Interno Bruto, sobretudo no PIB de países em desenvolvimento.

Artana citou alguns trabalhos produzidos por autores como Howell H. Zee, Vergara, Alvaro Bustos, Eduardo Engel, Alexander Galetovic, Ann Harrison, Andrés Rodríguez Clare e Van Parys, que revelam pouco ou efeito nulo em termos de eficiência, quando concedidos incentivos fiscais ao setor produtivo.

“Com meus estudos, não vi nenhum país onde se faça análise de custo e benefício com muita seriedade para sabermos se é conveniente ou não a desoneração fiscal para favorecer setores”, concluiu.

Michael Jorratt, consultor em política e administração tributária, explicou a necessidade de incorporar a progressividade tributária no sistemas de impostos. “Despesas tributárias são uma transferência de recursos públicos realizada por meio da redução

28 PAINELIV

das obrigações fiscais, com relação a um imposto de referência, e não por meio de gastos diretos”, explicou.

Segundo Jorratt, o sistema tributário também é utilizado por muitos países para ala-

vancar políticas econômicas, com o incentivo à poupança ou estímulo ao emprego, assumindo um papel semelhante ao dos gastos públicos, por meio da renúncia à cobrança. Em relação aos incentivos, ele observou que poucos países medem seus efeitos distributivos. “Existe uma necessidade de avaliação constante dos gastos tributários, como poucos países fazem”, disse.

A jornalista Adriana Fernandes, do jornal O Estado de São Paulo, lamentou o aumento das renúncias fiscais no Brasil. De 2%, no início dos anos 2000, o percentual de renúncias subiu para 4,65% do PIB, em 2020. Na pandemia, esse debate surgiu como uma saída para a recuperação econômica, porém nada foi feito de efetivo no período.

Outro movimento para aumentar a progressividade, conforme destacou a jornalista, ocorreu com a votação do projeto de reforma do imposto de renda. “A proposta foi para o Congresso com um modelo progressivo, mas, no final, o que vimos, foi a desfiguração do projeto, tornando-o sem eficácia para ampliar a progressividade na tributação”, disse.

No Brasil, exemplificou, as renúncias dão incentivo para a fabricação de concentrados de refrigerantes, mesmo quando a Receita Federal mostra que práticas ilícitas desse setor geraram contencioso de mais de R$ 125 bilhões. “As mudanças esbarram no ambiente político”, constatou.

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Sonegação fiscal e dívida ativa atrasam o desenvolvimento da América Latina

Especialistas em Economia e Tributação trouxeram ao debate os prejuízos da sonegação fiscal, dívida ativa e a importância do fortalecimento das administrações tributárias para a retomada do desenvolvimento econômico dos países da América Latina no pós-pandemia, além de apresentarem estratégias para a promoção de justiça tributária e combate à evasão e à elisão fiscal na região.

O painel, coordenado pelo vice-presidente de Assuntos Tributários da ANFIP, Cesar Roxo Machado, contou com exposições de Dalmiro Morán, do Centro Interamericano de Administraciones Tributarias (CIAT); Dina Pomeranz (Universidade de Zurique – Suíça); e Vilma da Conceição Pinto, diretora da Instituição Fiscal Independente (IFI). Para o debate, o convidado foi o doutor em Economia pela Unicamp, professor Juliano Goularti.

Em sua análise, Dalmiro Morán, constatou que a evasão e a elisão são mais acentuadas nos países latino-americanos e Caribe, do que em economias avançadas, integran-

tes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – (OCDE) – 30,1% frente a 11,5%, dados de 2017.

Segundo ele, medidas como fortalecimento da fiscalização, cooperação internacional e tributação efetiva da economia digital pelas administrações tributárias são mecanismos efetivos para reduzir os níveis de sonegação.

Na oportunidade, a professora Dina Pomeranz, apresentou estudo sobre a reforma tributária implementada no Chile em 2012, que visava aumentar a arrecadação pública, por meio do aumento da alíquota de impostos para empresas, e diminuir as brechas para a evasão fiscal. O objetivo, segundo ela, era monitorar a remessa de divisas para paraísos fiscais. Porém, na prática, o aumento da arrecadação não foi significativo e a evasão de divisas não foi reduzida.

A partir do monitoramento intensivo, as empresas passaram a contratar serviços externos para incrementar o planejamento tributário, ou seja, mecanismos para en-

30 PAINELV

contrar brechas legais que permitiram a continuidade da evasão.

Vilma da Conceição Pinto apresentou a realidade do Brasil na busca pela modernização e digitalização da administração tributária do país e apontou alguns avanços. “O Brasil tem alguns casos de sucesso nessa questão, como o próprio imposto de renda, que foi aprimorado ao longo da

brasileiro. No Brasil, conforme exemplificou, a carga tributária é de 31%. “Concordo que a carga é alta. Mas a pergunta que temos que fazer, antes de questioná-la é: quem paga mais tributo no Brasil e quem paga menos?”, indagou.

“Reclama-se muito do tributo. Mas se não pagarmos, o que vai acontecer?”, questionou. Numa sequência de probabilida-

história. Entretanto, precisamos avançar para melhorar a eficiência arrecadatória do país” por meio da tecnologia, uma vez que a economia digital impacta positivamente a arrecadação e diminui a sonegação.

Juliano Goularti, após as apresentações, fez reflexões sobre o exemplo tributário

des, Goularti lembrou que com a ausência da arrecadação tributária, União, estados e municípios não pagariam mais o funcionalismo público. Em seguida, o Estado fecharia, pois são os recursos públicos que mantêm as estruturas estatais. No dia seguinte, não pagaria mais a dívida pública. “A essência do Estado acabaria”, ressaltou.

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Remessas ilegais para o exterior penalizam os países da América Latina

Os impactos da evasão e da elisão fiscal em países da América Latina, contexto internacional e propostas de enfrentamento às remessas ilegais para o exterior – assunto de grande relevância no contexto da reforma tributária – foram amplamente discutidos pelos pesquisadores Andres Knobel, - sênior da Tax Justice Network, e Dirk Foremny, professor da Escola de Economia da Universidade de Barcelona.

Na ocasião, Knobel trouxe à memória o caso Pandoras Papers, que recentemente divulgou informações confidenciais de escritórios especializados na abertura de empresas em paraísos fiscais, com o objetivo de escapar dos impostos, e criticou a falta de transparência financeira quanto às remessas para países com regimes fiscais privilegiados, por configurarem altos custos para América Latina, comprometendo o seu nível arrecadatório.

“Falta transparência e acesso facilitado às informações imprescindíveis para se saber quem são de fato os donos dos ati-

vos. O termo “paraíso fiscal”, ainda que não seja ilegal, pode muitas vezes camuflar corrupção e lavagem de dinheiro”, disse.

Com base em suas pesquisas, Knobel aferiu que a legislação de 82 países exige informações acerca das transferências de recursos para os ditos paraísos fiscais, mas nem todos disponibilizam dados abertos, e de acesso público facilitado.

Segundo o projeto de pesquisa intitulado “Paraísos Fiscais, Tributação de Riqueza e Mobilidade”, apresentado na oportunidade, o professor Dirk Foremny, analisa os efeitos da tributação internacional e da globalização das economias para as receitas tributárias e as desigualdades de riqueza.

Para explicar o impacto da migração de recursos, o professor citou Madri, um pa-

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PARAÍSOS
FISCAIS

raíso fiscal que enriquece a população local em cerca de 9% ao ano, uma vez que se trata de um destino bastante procurado por ricos, em busca de baixa tributação. “O aumento da concentração de riqueza pode levar a um aumento da influência política nas regiões, pressionando por alíquotas baixas ou zero na tributação sobre renda. Alíquotas mínimas de impostos, provavelmente, serão politicamente mais viáveis e eficazes para este grupo, portanto, os esforços para tributar a riqueza devem vir em conjunto com coordenação política e melhores mecanismos de fiscalização”, concluiu.

O jornalista Guilherme Waltenberg, integrante do Consórcio Internacional de

Jornalistas Investigativos, que iniciou o caso Pandora Papers, reiterou que grandes empresas encontram brechas nas regras, apoiadas por um capital intelectual muito bem preparado, e que é necessário facilitar o acesso às informações públicas sobre as offshores, a fim de estabelecer parâmetros entre remessas de divisas lícitas e ilícitas, de modo a facilitar consultas com fim investigativo, e promover mecanismos para efetivar a justiça social nos países latinos.

Segundo ele, a linha que diferencia uma evasão criminosa de uma elisão fiscal é muito tênue, uma vez que os fluxos financeiros ilícitos englobam um percentual muito grande de transações.

Waltenberg apontou números relevantes: segundo dados do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação, a sonegação fiscal anual no Brasil é de cerca de R$ 417 bilhões. Já a elisão gira em torno de US$ 15 bilhões, segundo estudos realizados pela Tax Justice Network. Fora isso, existem 37 bilhões de euros declarados legalmente por brasileiros no exterior, segundo informações da Receita Federal do Brasil.

“Diante dos dados, diferenciar as offshores, com real controle sobre as ilícitas, pode garantir que parte dos recursos de sonegação e evasão reingressem no Brasil”, explicou.

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Agentes públicos opinam sobre tributação e desigualdade no Brasil

Encerrando o primeiro dia do FIT 2021, foi realizado um debate em tribuna aberta para manifestação de agente s públicos sobre tributação e desigualdade no Brasil. A mediação foi do vice-presidente do Sindicato dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo (Sinafresp), Glauco Honório.

O secretário da Fazenda do Estado do Maranhão, Marcellus Ribeiro Alves, esteve presente e compartilhou medidas adotadas no seu estado para tornar a tributação menos regressiva. “No Maranhão, conseguimos destinar parte do ICMS diretamente para atender as necessidades das pessoas carentes, buscando enfrentar um problema muito grande que temos no nosso estado, que é a mortalidade infantil”.

Na avaliação de Alves, qualquer reforma tributária que seja discutida hoje, precisa enfrentar três problemas: regressividade do sistema, tributação sobre renda e propriedade e o pacto federativo.

O secretário também comentou as propostas que tramitam no Congresso Nacional que visam a simplificação do sistema. “O problema não é a simplificação, é que você vai esconder dentro dessa simplificação a necessidade de enfrentar a regressividade da tributação no país, que é a principal questão. Se não diminuirmos a tributação sobre o consumo, de fato, não vamos enfrentá-la. Então, temos que ficar atentos para não cairmos nessa armadilha”, ressaltou.

Ciro Gomes, vice-presidente do PDT, avaliou que estamos vivendo um momento peculiar e, na questão tributária, esse parece um tema sem consenso. “Não conheço unanimidade que afirme que o país não precisa de uma reforma tributária. A pergunta que se faz é: se existe esse consenso, por que ela nunca acontece? Por que o sistema persiste com distorções, provocando graves injustiças?”, questionou.

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Para ele, a reforma se impõe para pôr fim à guerra fiscal, para garantir que os tributos sobre o consumo sejam cobrados no destino. Desta forma, acredita, o cidadão, no ato de pagar o tributo, adquire também consciência enquanto contribuinte. “Temos cinco tributos sobre valor agregado. Aqui já está uma questão: por que o Brasil não tem IVA? Nossa forma de se desenvolver se concentrou em estados que detém a produção industrial brasileira. Ao cobrar no destino, encerra o crédito na origem e desfinancia estados importantes que já passam por situação frágil”, avaliou.

O senador Roberto Rocha (PSDB-MA) chamou de um “verdadeiro manicômio” o sistema tributário brasileiro e defendeu sua simplificação, com a criação do IVA-dual, que cria um tributo de compe-

tência dos estados e municípios e outro da União. O parlamentar é relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 110/2019, e apresentou seu parecer no dia 5 de outubro de 2021.

Em seu relatório está prevista a criação de dois impostos: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que será de competência dos estados e municípios; e ISS, ICMS e a CBS, da União, que reuniria Cofins, Cofins-Importação e PIS.

Aloizio Mercadante, presidente da Fundação Perseu Abramo, ressaltou que a reforma tributária e a política fiscal precisam ser politizadas. Ele acredita que o cenário pós-pandemia é parecido com o que foi o pós-Segunda Guerra Mundial, quando aumentou a demanda da população por saúde e educação. “Não precisamos de menos Estado, precisamos de mais Estado, que vai ser o condutor da saída das crises econômica e social”.

Segundo Mercadante, a reforma tributária precisa ser feita sob o ponto de vista econômico, além de combater a concentração de riqueza do país.

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Atlas da Dívida Ativa denuncia rombo bilionário nos cofres públicos dos estados

Olevantamento

encomendado pela Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital aponta que a dívida ativa das empresas com os entes federados soma R$ 896,2 bilhões. Ao longo de um ano, a Federação investigou a composição dos débitos estaduais e elaborou uma lista com os 100 maiores devedores. Os dados estão presentes no Atlas da Dívida dos Estados Brasileiros, que foi lançado no Fórum Internacional Tributário (FIT 2021), realizado em outubro de 2021, em São Paulo.

O estudo, coordenado pelo doutor em Economia, Juliano Goularti, identificou que a dívida ativa sob administração das procuradorias gerais dos estados ou das secretarias de Fazenda aumentaram 31,4% entre 2015 e 2019.

Para o pesquisador, a maior dificuldade na produção do estudo foi a disponibilização dos dados. Ao todo, dez estados negaram as informações. “Conseguimos reunir subsídios dos mil maiores devedores de apenas 17 estados, pois mesmo com a obrigatoriedade de dar transparência aos dados, as informações não foram divulgadas. A dí-

vida ativa tributária não envolve sigilo fiscal, essa divulgação é obrigatória, afirmou”.

Ao se considerar o estudo na totalidade das 27 unidades federativas, verifica-se que, em 14 estados, a dívida ativa supera a arrecadação anual com o recolhimento de impostos. Os estoques acumulados do Distrito Federal e Rio de Janeiro equivalem a mais de 200% da arrecadação, enquanto o Mato Grosso quase supera 300%. Outros quatro estados possuem a dívida ativa equivalente a mais de 80% da arrecadação tributária anual.

Os valores devidos pelas empresas aos estados totalizam 13,18% do PIB nacional. Ao passo em que os estoques da dívida ativa aumentam, o pagamento delas é tímido. Em 2016, foram recuperados R$ 4 bilhões; no ano seguinte, em 2017, o montante pago chegou a R$ 5,1 bilhões. A média nacional de recuperação da dívida ativa estadual gira em torno de 0,6%.

“O estudo é revelador e alarmante. É necessária uma política séria para recuperar os montantes devidos e investimento na estrutura das carreiras vinculadas ao fisco.

36 LANÇAMENTO

É inaceitável que as empresas devam quase R$ 1 trilhão aos cofres públicos, enquanto o país enfrenta dificuldades para financiar uma renda básica de R$ 400 para famílias que passam fome”, afirma Charles Alcantara, presidente da Fenafisco. Caso o valor da dívida fosse recuperado, seria possível pagar 11 anos de Bolsa Família aos mais vulneráveis com valor de R$ 400.

O Atlas também traz os cem maiores devedores de cada estado. As dez maiores devedoras são: Refinaria de Petróleo de Manguinhos (R$ 7,7 bilhões), Ambev (R$ 6,3 bilhões), Telefônica – Vivo (4,9 bilhões), Sagra Produtos Farmacêuticos (R$ 4,1 bilhões), Drogavida Comercial de Drogas (R$ 3,9 bilhões), Tim Celular (3,5 bilhões), Cerpasa Cervejaria Paraense (R$ 3,3 bilhões), Companhia Brasileira de Distribuição (R$3,1 bilhões), Athos Farma Sudeste (R$ 2,9 bilhões) e Vale (R$ 2,8 bilhões). O estudo também aponta que os maiores de-

vedores também recebem isenções fiscais em suas áreas de atuação.

ESTUDO

O Atlas da Dívida dos Estados Brasileiros é uma iniciativa da Fenafisco, coordenada pelo doutor em Economia, Juliano Goularti, desde o final de 2020. Para elaborar o estudo, foram considerados dados de 2015 a 2019. Apesar da obrigatoriedade legal para divulgação das informações, apenas 17 unidades federativas informaram esses dados.

“A importância desse estudo é levá-lo ao conhecimento da sociedade e impulsionar a cobrança por mudanças. Dentro de um sistema tributário regressivo, a dívida ativa elevada contribui para a concentração de renda. É um privilégio tributário para poucas e grandes empresas, que escapam da tributação e conseguem ampliar seu poder”, reforça Goularti.

37

ARTIGO

Adívida

ativa é um importante mecanismo de captação de recursos do Estado, sendo gerada principalmente pelo não pagamento de tributos por parte de pessoas físicas e jurídicas. Há diversas razões pelas quais o devedor pode manter-se inadimplente, desde dificuldades financeiras e equívocos por parte da gestão pública, até a práticas de corrupção e sonegação de impostos. Nesse sentido, é fundamental conhecer essas razões, já que o recebimento desses recursos deveria resultar no desenvolvimento e fortalecimento de políticas públicas.

O “Atlas da Dívida Ativa dos Estados” desenvolvido pela Fenafisco, demonstra que existe alta concentração dos estoques de dívida ativa dos estados brasileiros em grandes empresas que atuam no mercado nacional. Diversas empresas devem em mais de um estado ou que, mesmo em apenas um deles, ocupa as primeiras posições nos rankings de devedores, ao mesmo tempo em que os balanços financeiros desses “barões da dívida” declaram que altas lucratividades estão sendo distribuídas entre os acionistas. Nesses casos, o planejamento tributário e/ou a sonegação

aparecem como meios para a valorização do capital, assim como as contestações jurídicas das cobranças abrem brechas para o desvio de recursos que deveriam ser destinados às políticas públicas.

Quanto maior a empresa, mais recursos ela possui para encontrar brechas na legislação, para possuir um setor especializado na análise e contestação de pagamento de impostos. Além disso, relações políticas podem garantir proteção judicial, isenção de impostos e perdão de dívidas, além de outras práticas de corrupção que lesam o Estado e a sociedade em prol da lucratividade da empresa e do enriquecimento do empresário. Assim, percebe-se que a dívida ativa de grandes empresas se tornou um instrumento de geração de riqueza que favorece o lucro em detrimento de políticas públicas, aprofundando a concentração de renda, já que são fundos públicos mantidos sob posse e controle do setor privado. São esses tipos de práticas que precisam ser combatidas pelo poder público.

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Dívida ativa: dos recursos públicos à acumulação privada

Sim, ricos precisam pagar mais: mas sem aumento de carga para eles

Nas discussões de 2021 sobre o imposto de renda, o relator do projeto no Senado afirmou que a alteração causava “desconforto”1 entre empresários, pois poderia gerar aumento de carga tributária, o que, na visão dele, segundo a imprensa, a sociedade brasileira não aceitaria.

Na primeira parte da sentença, sobre o redimensionamento da carga tributária brasileira para cima, é de se perguntar que, sendo folclórica a exiguidade de nossa carga tributária sobre imposto de renda e patrimônio, até para padrões estadunidenses – uma vitrine liberal (que anda um tanto rachada, vá lá) –, como, então, findar esse privilégio do segmento bem aquinhoado, sem elevar a tributação deles? Depois que se equivocadamente se reduziu impostos sobre os mais ricos, como reparar o erro crasso sem aumentá-los de novo, sem desfazer a redução que privilegiou a uns poucos?

Já na segunda parte da afirmativa, sobre o juízo de recepção dessa medida pela sociedade, o parlamentar parece ignorar

que 84% da sociedade brasileira aprova aumentar, elevar, sobretaxar, inflacionar os impostos sobre os mais ricos - não sei se fui claro, como mostrou pesquisa do DataFolha2 no primeiro semestre de 2021. Essa é a tradução da vontade democrática que deveria ser atendida nesse fio de democracia que ainda resiste nas cordas roídas de nossas instituições.

A desigualdade brasileira enfrenta obstáculos muito primários na comunicação, que retardam uma tributação progressiva por meio de mal ajambradas razões de força econômica, que sublevam a força da razão no debate público.

1 https://valorinveste.globo.com/mercados/brasil-e-politica/ noticia/2021/09/28/relator-da-reforma-do-ir-diz-que-numeros-geram-desconforto-e-critica-alta-de-tributos.ghtml 2 https://fenafisco.org.br/02/06/2021/pesquisa-datafolhaoxfam-brasil-aponta-que-84-da-populacao-quer-aumentode-impostos-para-os-mais-ricos/

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ARTIGO
brasileira não aceitaria.

Carta aprovada adverte servidores a não votarem em candidatos alinhados com o neoliberalismo

Adiretoria executiva da Fenafisco e delegados dos sindicatos filiados à Federação, reunidos em São Paulo, realizaram VIII Plenária Nacional do Fisco Estadual e Distrital –Plenafisco, evento político destinado a discutir teses e temas de interesse da categoria, nos termos do estatuto da entidade.

formato híbrido

Em formato híbrido (presencial e virtual) e conduzida pelo presidente, Charles Alcantara, a pauta da Plenária contemplou temas como a Proposta de Emenda Constitucional - (PEC) 32/2020 (reforma administrativa), reforma tributária e defesa do serviço público; além de proposições apresentadas pelos filiados.

Na oportunidade, o colegiado debateu a conjuntura política e econômica do país, aprovando por unanimidade as três proposições apresentadas, sendo elas:

-28 de outubro de 2021 | Dia Nacio-

nal de Luta em defesa do serviço público;

-Compromisso da Fenafisco em intensificar o trabalho de mobilização junto aos presidenciáveis, com o objetivo de apresentar as premissas da Reforma Tributária Solidária, em busca de apoio;

– Carta de São Paulo – documento em que a Federação propõe ampliar a mobilização política pelo fortalecimento do serviço público, da administração tributária, por maior participação política da categoria e defesa do Estado Social e Democrático de Direito.

40 PLENAFISCO

CARTA DE SÃO PAULO 2021

1. O serviço público brasileiro experimentou algumas “reformas” nos últimos 30 anos, todas sob a ilusória promessa da modernização e racionalização, mas nenhuma se compara à PEC 32 em termos de destruição do serviço público e de aparelhamento do Estado pelo setor privado;

2. Até agora, graças à mobilização extraordinária de várias categorias de servidores públicos, por intermédio de suas entidades representativas, e ao apoio fundamental e decisivo de uma bancada parlamentar valorosa, mas extremamente minoritária, na Câmara dos Deputados, conseguimos retardar o avanço da PEC 32;

3. Não sabemos quanto tempo ainda vai durar essa verdadeira guerra contra a PEC 32, mas sabemos que, da parte da Fenafisco e de todas as entidades representativas dos servidores públicos, não há outra escolha senão a de aumentar a mobilização e a pressão políticas, cientes da nossa disposição e capacidade de resistência, mas também de uma das nossas maiores fragilidades: a baixa representatividade dos servidores públicos no Congresso Nacional, que se repete nas casas legislativas Brasil afora;

4. Somos quase 12 milhões de servidores públicos no país, mas muitos de nós votam em políticos alinhados com o receituário neoliberal hostil ao serviço público, como é o caso da PEC 32, que, se aprovada, vai retirar da população, principalmente a mais vulnerável, a proteção de um serviço público prestado de forma republicana e gratuita;

5. A verdadeira e necessária reforma tributária, por sua vez, segue sendo sabotada pela mão não tão invisível da máquina neoliberal demolidora do Estado Social, naquilo que é mais fundamental de ser enfrentado e corrigido: a crônica e aguda regressividade do sistema tributário;

6. Uma reforma tributária que se deixe guiar pelos objetivos fundamentais da República, prescritos no artigo 3º da Constituição Federal, que faça cumprir o princípio da capacidade contributiva, que tribute adequada e progressivamente as altas rendas e o grande patrimônio, que fortaleça o federalismo fiscal e que assegure o exercício pleno e republicano das administrações tributárias, ao tempo em que é a aspiração legítima das forças vivas e democráticas da sociedade brasileira, é, por outro lado, uma grande ameaça aos artífices e operadores da agenda neoliberal, que, para se impor, depende de uma esfera pública frágil e, portanto, suscetível aos interesses privados;

7. A Plenária Nacional da Fenafisco reafirma o seu inarredável e intransigente compromisso com a defesa de uma agenda verdadeiramente democrática para o país, que passa necessariamente por: i) um serviço público valorizado e fortalecido; ii) uma administração tributária de Estado; e iii) uma reforma tributária efetivamente progressiva e, portanto, solidária;

8. E, por compreender que essa agenda é absolutamente incompatível com a agenda econômica vigente, adverte os servidores públicos de todo o país, às vésperas de mais um 28 de outubro, que a melhor maneira de celebrar o dia do servidor público e defender o serviço público, é denunciar e derrotar as políticas neoliberais que prevalecem no país.

São Paulo, 22 de outubro de 2021. Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco)

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Participar dessa segunda edição do FIT, em São Paulo, foi um prazer. Fiquei extasiado e orgulhoso pela excelência do evento promovido pela Fenafisco e pela ANFIP, e organizado com os colegas do Sinafresp, em que o fisco brasileiro demostrou o seu alto nível a nossa sociedade como um todo. Temas presentes, propostas convincentes, comprometimento com o Estado e, principalmente, com soluções para a nossa sociedade, aliado com a sua magnitude em organização, primando na excelência de cada detalhe. Voltei ao Mato Grosso do Sul com o peito cheio de um sentimento bom em pertencer a esta categoria que muito me orgulha.

Realizar o FIT 2021 no formato híbrido com palestrantes nacionais e internacionais foi um grande desafio aos organizadores e, na minha opinião, concluído com muito sucesso. Parabenizo a todos(as) pelo altíssimo nível dos palestrantes que, nos mais diversos temas, provocaram discussões muito interessantes sobre os sistemas tributários e os enormes desafios para a construção de novos modelos que reduzam as desigualdades sociais e a concentração de renda e riqueza. A segunda edição do FIT se consolida como um evento imprescindível, que precisa se incorporar à agenda da Fenafisco e da ANFIP, entidades realizadoras, para aprimorar e qualificar ainda mais as intervenções do fisco nos debates e proposições sobre os desafios necessários para mudar o injusto sistema tributário brasileiro. Vida longa ao FIT!”

DÉBORA AMORAS

Diretora de Comunicação e Relações Intersindicais do Sindifisco – PA

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OPINIÃO
FRANCISCO CARLOS DE ASSIS Presidente Sindifiscal – MS

O Fórum FIT é um evento que já está na nossa agenda. Traz uma oportunidade incrível de conhecer outras realidades tributárias do mundo além de organizações de administrações tributárias. Pautas relevantes, palestras incríveis, ele deve acontecer sempre que oportuno”.

Presidente do Sindifisco – PB

A realização do Fórum Internacional Tributário, organizado e realizado pela ANFIP e pela Fenafisco, contribuirá com os debates em busca de um modelo de tributação menos perverso para o trabalhador, tributando menos o consumo e mais a renda, e promovendo a justiça fiscal”.

Representante da ANFIP – MT e ex-vicepresidente do Conselho Executivo da ANFIP

O FIT é o ambiente propício para se conhecer e discutir as alternativas e soluções tributárias para o nosso país. Nesse importante Fórum encontramos modelos que deram certo e outros que precisam ser evitados ou ajustados na busca de uma tributação justa e eficiente para o Brasil.

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OPINIÃO
MANOEL ISIDRO EUCÉLIA MARIA AGRIZZI MERGÁR Vice-presidente executiva da ANFIP BENEDITO CERQUEIRA SEBA

A meu ver, o Brasil enfrenta dois problemas sérios: a nossa renda per capta equivale a 20% da dos países da OCDE e a renda nacional é mal distribuída. Temos uma grande concentração de renda nas faixas mais altas. A realização do FIT 2021 tem a importância de demonstrar essa realidade ao Brasil e ao mundo. Levantando essa realidade para discussão e apresentando propostas com a finalidade de viabilizar o incremento da renda nacional e diminuir a distância entre o maior e o menor salário, conseguiremos uma sociedade mais justa e solidária.

O FIT é um evento de grande envergadura e prestígio na área tributária. Já em sua segunda edição, demonstra que veio para permanecer no calendário dos grandes eventos técnicos internacionais realizados no Brasil. A edição de 2021, em formato híbrido, abordou, de forma crítica e extremamente aprofundada, questões fundamentais como a importância de uma guinada rumo à progressividade na cobrança de impostos, a questão dos paraísos fiscais e os efeitos nocivos da sonegação, entre outros temas de extrema relevância. Sem dúvida alguma, o FIT eleva o debate tributário a um novo patamar no Brasil.”

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OPINIÃO
ALTEMIR FELTRIN DA SILVA
Sindifisco
RS

Eventos como o FIT 2021 são perfeitos para fomentar a discussão sobre o aperfeiçoamento dos sistemas tributários e enfrentamento às desigualdades , pois possibilitam a troca de experiências entre técnicos, estudiosos e acadêmicos de diversos países, o que é fundamental para a construção de um modelo de tributação adequado para o Brasil. Parabéns à ANFIP, à Fenafisco e ao Sinafresp pela iniciativa e realização do FIT 2021.

Foi um imenso prazer participar de um Fórum com esse nível de qualidade nos debates. A necessidade de uma Reforma Tributária Justa e Solidária, com impostos regressivos, maior planejamento na distribuição da receita tributária e simplificação do sistema tributário nacional foram pontos marcantes em todos os painéis de discussão.

LIGIA REGINA SABARAENSE

Diretora Intersindical Sinafresp – SP

O FIT 2021 foi uma excelente oportunidade de debater assuntos de relevância ímpar e para refletir sobre estratégias que diminuam a desigualdade social nos países da América Latina e, em especial, no Brasil. O país enfrenta uma enorme crise sanitária, econômica e social, que incide de maneira mais brutal sobre os mais necessitados, acentuando as desigualdades. Eventos como este devem continuar a ocorrer, pois somente a partir do debate qualificado, poderemos encontrar soluções para que os mais carentes tenham uma vida digna.

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MARIA BEATRIZ FERNANDES BRANCO Vice-presidente de Assuntos Jurídicos da ANFIP CESAR ROXO MACHADO Ex-vice-presidente de Estudos e Assuntos Tributários da ANFIP (2019-2021)

Trabalho em equipe garante o sucesso do FIT 2021

Planejar um evento internacional, sobretudo em formato híbrido, sempre impõe à comissão organizadora grandes desafios para otimizar as etapas, em busca dos melhores resultados.

Ao longo de 2021, dirigentes da Fenafisco, acompanhados por representantes da ANFIP e colaboradores, se reuniram em diversas ocasiões para pensar e organizar as estruturas do FIT 2021, desde a localidade, espaço, logística eficiente, orçamento, divulgação, coordenação de equipes, de modo a otimizar a realização do evento.

Para o pleno êxito do FIT, os funcionários da Federação contribuíram, oferecendo o suporte para o apoio operacional, que ficou responsável por todo o staff, além da estrutura física, como organização do anfiteatro, secretaria de credenciamento, organização da sala VIP, som e tradução simultânea, contato com os fornecedores, entre outros.

A cobertura do evento contou com o trabalho das assessorias internas de Comunicação da Fenafisco e ANFIP, que produziram conteúdo informativo para suas bases. A gestão das redes sociais do FIT, alimentadas

em tempo real, foram conduzidas pela Nata Digital – agência de marketing.

A equipe de Comunicação do SindsefazBA, sindicato filiado à Fenafisco, somou esforços junto à imprensa do FIT, produzindo conteúdo informativo de qualidade, voltado aos fazendários.

A Oficina Agência de Comunicação ficou responsável pelo relacionamento com importantes veículos do país, atendendo solicitações da imprensa de forma ágil e, oferecendo informações exclusivas do evento, de interesse jornalístico.

O registro fotográfico e entrevistas foram realizadas pela equipe da Fórmula Filmes.

Segundo o coordenador geral do FIT, Glauco Honório, levando em consideração que o evento foi realizado em meio a uma pandemia, era imperioso que houvesse poucos deslocamentos. “Um de nossos maiores desafios foi ajustar as agendas dos palestrantes internacionais e superar as questões tecnológicas do fluxo de transmissão, tanto dos palestrantes para o palco, quanto para o público virtual”, lembrou.

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