Guarujá - Rimbaud e Artaud Navegando a Ilha Dragão - Flávio Viegas Amoreira

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GUARUJÁ Rimbaud e Artaud navegando a Ilha do Dragão

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A presente edição é inspirada nos trabalhos desenvolvidos na América Latina através de Sereia Ca(n)tadora (São Vicente, Santos – Brasil), Dulcinéia Catadora (São Paulo – Brasil), Eloisa Cartonera (Argentina), Sarita Cartonera (Peru), YiYi-Jambo (Paraguai), Yerba Mala (Bolívia), Animita (Chile) e La Cartonera (México).

Edições Caiçaras é uma realização do Instituto Ocanoa, Projeto Canoa, Percutindo Mundos e Imaginário Coletivo de Arte

Capa feita a mão com material reciclado.

Contato: mb-4@ig.com.br 13-34674387

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FLÁVIO VIEGAS AMOREIRA

GUARUJÁ Rimbaud e Artaud navegando a Ilha do Dragão

Edições Caiçaras

Ilha de São Vicente /SP Abril de 2013

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© Flávio Viegas Amoreira

Capa, projeto gráfico, diagramação e editoração: Márcio Barreto Conselho Editorial: Flávio Viegas Amoreira Marcelo Ariel

Amoreira, Flávio Viegas Guarujá / Flávio Viegas Amoreira – São Vicente: Edições Caiçaras, 2014. 35p. 1.Poesia brasileira I. Título Impresso no Brasil

2014 Edições Caiçaras Rua Benedito Calixto, 139 / 71 – Centro São Vicente - SP - 11320-070 www.edicoescaicaras.blogspot.com mb-4@ig.com.br 13-34674387 / 13-91746212

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I–

conhecedor da tábua das marés do curso incerto do rio a foz dos meandros das vagas por dentro dos rochedos resvalados dos montes a conformação das pequenas ilhas repousando na costa descolada do continente pela erosão das brisas sabedor dos ventos que trazem chuva e mormaço o poeta é como o sertanejo que fareja água e encontra no Oceano infindo manancial detalhado de metáforas liquefeitas´´ II- ´´teu leito em minhas veias insedentas em minha boca / olhos

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são rotas e correnteza minha alma e sexo tuas ondas e remanso de Deus és o eco, ó mar! por ti meus poemas! meus passos na terra reentrante meu descaminho e rumo por ti saúdo o cosmo espelhado nas vagas do horizonte e minha alma refletida em teu murmúrio etéreo no começo era o Verbo verbo mar incessante e para sempre tu em mim poeta reverbera mar.......´´

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II-

não sei que mistério que íntimo tesouro não sei desde quando a hora do ângelus sempre, sempre penso no horizonte da Praia do Tombo´´

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III-

ao colo curvo das Astúrias mirando o forte vislumbro a ilha afagando o dorso ilha ilha ilha! afrontando perolado do oceano em forma de dragão vencido de afagos pelo remanso´´

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IV

onde a rede a raia arresto onde a vaga a isca a onda é o peixe embalado em vento maresia o pirão do Tempo barco solto a estiva ao sol moreno a mulher que espreita o crepúsculo pescador que teima sem pressa alçar derradeiro cardume arisco entardecer tão lento madrugada vem do amor

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cantar o pescador e o par de seios de estrelas ao relento

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V-

[Perequê] ´´ na prainha branca o Padre Anchieta Santo de Guaibê entre Iporanga e Forte São João o jesuíta peregrino fez morada levando tupiniquins até contrafortes da Bocaina por fora huguenotes em acordo com tamoios na boca do Rio repetindo a saga de Piratininga com guerreiros caiçaras salvador da paz na Guanabara´´

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VI -

onde te espero a lua vaga entre penhascos debruçados ao mar revolto albatroz estou sempre onde te aguardo minha condição de espaço é sempre vácuo até teus braços´´

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VII-

hoje tudo envelheceu em mim menos a memória com a verdade fui companheiro tentei de tudo para iluminar meu barco noturno/ agora trabalho no silêncio de pedra e poema.´´

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VIII-

se nosso rumo é acidente o mar nos faz essenciais quando atravessamos a leve nave a prumo pela vaga contornando as brisas nada é lembrança tudo queda eterno quando se veleja ondulando as esferas´´

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IX-

para onde o mar obscuro/ e até quando o estuário que corta essa ilha apartada do ramo da terra? quantos mistérios oceânicos tão bíblicos quanto a conformação incerta dessa foz / a origem desse porto?´´

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X-

minha poesia é a soma dum corpo noutro corpo e em todos corpos que se faltam e todos que se fartam de amores e despedidas minha poesia é bendito ventre donde pendem todos frutos dos excessos e ausências: premente, a palavra acolhe a rosa e o vento na pele do mar que fulge a criação do tempo

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XI-

o futuro não pertence percurso volve / cede / enfim náufragos consentidos no ventre nirvânico das vagas azul / escarlate / trata-se de você em mim / nisso eu meu arrumo destro

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XII-

a ilha flutua / nada e anda / pelo mar afora a cidade ainda estica ou decresce em bloco se desprende. Ter em ordem o passo a ilha ilha ilha! o saber provisĂłrio do navegante agrimensor de marĂŠs profundas subvertendo a cartografia lunar no espiralado lĂĄpis lazuli arco furtivo dos corais em feixe

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XIII-

É aqui na orla perolada onde mora a poesia sem parecença que não outra que o eterno tempo intervalado da legião de almas que por ti viveram para olhar a passagem de futuros e remotos momentos / adejar de peixes: tudo passa e só tu mar fundeado na pedra desde infância das eras idas e vindouras´´

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XIV-

a margem tropical oceânica do mundo frio meridiano rente a janela onde espreito a fuga dos pássaros da estação que surge noutro hemisfério gostaria de ter punhado de termos que encerrassem o significado dessa sucessão de ondas sinônimos para as brumas quando os prédios se indistinguem da sombra feita na rebentação que leva nossos delírios no cotidiano paralelo ao oceano sem metafísica ele mesmo só ângulo e ontologia desfio ainda assim pergaminho que teço: o porto, a nau corrente, a beira desse precipício de escarpas liquefeitas

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XV-

ruas, ruas n達o me frustram os desejos se tenho indo reto no mar um caminho que me satisfaz todas as buscas eu confuso de rumos

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XVI-

Veleiros, cargueiros, rebocadores: naves, naus, embarcações: precisos, essenciais, detalhados: companheiros das águas, silhuetas milenares do Mar profundo: eis, em trações e cores , certeiros, eles! Os barcos! fenícios, gregos, atlânticos: barcos! Testemunhas das ondas, transportando a memória ancestral, infinita: os barcos são para Oceano como os homens diante horizonte: solitários navegantes. barcos : da cósmica substância marinha, substantivos mais que perfeitos. o Universo é barco, segue sem âncoras eternizando lastro dos invisíveis remos. Mirem esses barcos: pedem que embarquemos...

Ancorados ao remanso das brisas

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zarpando alvejando o sombreado das nuvens todo barco é melancólica recordação ou alegre pressentimento no marulhar do Tempo caligrafa poemas no alfabeto das ondas sereno deitado ao porto, na praticagem do instante que flui seguro e gozoso vai a nau coroando universo do zênite ao fundo a embarcação no cansaço do casco, mesmo límpido convés azulado testemunha remotas paisagens, submerge de tempestades vencidas impávidos, rasgando o horizonte , veleiros brotando flores d´água límpida ou lúgubre a aurora malva ou açucena ao convés rendilhada todo barco é testemunha e profeta , manso ou voraz é do viajante armadura expressando todo sentimento atlântico do mundo....

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HANS STADEN , o poema O litoral entre o Rio e Santos ainda propõe trópicos de sonho. Lévi – Strauss

A curva do Rio Uma Desemboca em ondas miúdas num Montão de Trigo a sereia surfa tatuada com uma cabeça de poro sem nenhum engano grafando peixes mórfico-lexemas fonântica mania de pensar pela língua feito touro sentado na Juréia a praia é Baleia Preta retinindo a pedra com seios fartos de sinos a ilha bolo come-se de beleza círculo fértil faz arquipélagos dum fogo brando 26


farta-se bronzeado alma alumiando ilha bola curvilínea ilha bote encantando naufrágios pelo casco escorregante no fundo Oceano é uma coroa dourado galeão repousando futuros pássaros castelhanos. ´´

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Crusoé

amo: procurado, perigoso a mensagem na garrafa nada nada que um gozo não trace o sorriso de Deus não vale mais que tua boca rescendendo ambrosia galáctica desdenhei ser entregue no teu laço de Sexta-feira agora ontem será sempre era cedo impreciso arrependimento deixo-te nessa margem onde STEVENSON aqui [livro delírio caiçara Flávio Viegas Amoreira]

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Flávio Viegas Amoreira - escritor, crítico literário e jornalista; já lançou dez livros entre poesia, contos e romance; colabora com diversos jornais, revistas literárias e sites especializados em Arte. Faz parte da denominada “Geração Zero Zero”, autores de vanguarda surgidos no começo do século. Foi traduzido e adotado por universidades europeias e norte-americanas. Fundador com Gilberto Mendes do “Fórum Santos Cultural”, de resgate das tradições de vanguarda e cultura do Litoral Paulista e do “sentimento atlântico do mundo”. flavioamoreira@uol.com.br

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EDIÇÕES CAIÇARAS São Vicente Brasil

A Edições Caiçaras é uma pequena editora independente artesanal inspirada nas cartoneras da América Latina, principalmente na Sereia Cantadora de Santos e na Dulcinéia Catadora de São Paulo. Nasceu pela dificuldade homérica e labiríntica em publicar meus livros em uma editora convencional. É uma forma de reavivar o ideal punk do “faça você mesmo”, incentivando a auto-gestão e o uso da habilidade manual, algo que está se perdendo em nossa sociedade tecnocrata. Assim, de fato, começa a tomar forma a filosofia da Edições Caiçaras, mais do que um caráter social, nos interessa, ousar na forma e no conteúdo. Na forma é um aprimoramento das técnicas das cartoneras - os livros são feitos com capa dura, costurados com sisal e presos com detalhes em bambu, e no conteúdo, priorizamos um diálogo profundo com a Internet e com as literaturas locais do Brasil.

Márcio Barreto

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CATÁLOGO

POESIA O Novo em Folha - Márcio Barreto Nietszche ou do que é feito o arco dos violinos - Márcio Barreto Pequena Cartografia da Poesia Brasileira Contemporânea - Marcelo Ariel (Org.) Perdas & Danos - Madô Martins Mundocorpo– as aerografias e outros desvios do tempo – Márcio Barreto Peixe-palavra (poesias caiçaras) – Domingos Santos Poemas Sinfônicos – Danilo Nunes Mar por perto – Flávio Viegas Amoreira Anga ibiisi – Luis Serguilha (Portugal) Excídios – Jorge Melícias (Portugal)

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DRAMATURGIA Atro Coração - Márcio Barreto Ácidos Trópicos – uma livre criação sobre a obra de Gilberto Mendes – Márcio Barreto

ENSAIO Obras Cadáveres - Arthur Bispo do Rosário, Estamira, Jardelina, Violeta e o Deus do Reino das Coisas Inúteis - Ademir Demarchi Desaforismos (aforismos) - Flávio Viegas Amoreira Meu Namoro com o Cinema – André Azenha

ROMANCE Teatrofantasma: O Doutor Imponderável contra o onirismo groove – Marcelo Ariel

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O IMAGINÁRIO COLETIVO

O Imaginário Coletivo de Arte agrega artistas do litoral paulista em suas diferentes linguagens e tem como proposta fortalecer e propagar a “Arte Contemporânea Caiçara”, valorizando nossas raízes e misturando-as à contemporaneidade. Formado em fevereiro de 2011, é resultado de anos de pesquisas desenvolvidas em diferentes áreas que culminaram na busca de uma nova sintaxe através da reflexão sobre os processos criativos na Arte Contemporânea Caiçara.Seus integrantes convergem da dança, eutonia, teatro, circo, música, literatura, história, jornalismo, filosofia e artes visuais. Estão diretamente ligados à experimentação através de núcleos de pesquisas desenvolvidos no grupo Percutindo Mundos – música contemporânea caiçara (2008), Núcleo de Pesquisa do Movimento - dança contemporânea (2011), no Espaço de Consciência Corporal Célia Faustino - eutonia (2003), no Projeto Canoa e Instituto Ocanoa – pesquisa da Cultura Caiçara (2007). Em seu repertório constam “Ácidos Trópicos – uma livre criação sobre a obra de Gilberto Mendes” (teatro), “Atro Coração” (teatro), “Homo Ludens – fluxos, lugares e imprevisibilidades” (dança contemporânea), “O Jardim de Patrícia” (dança contemporânea), “O Universo em Movimento” (música), “Universo em Gentileza” (música), “Percutindo o samba” (música), “Mundocorpo” (música) e “Poéticas para um novo tempo” (música). Ao longo do tempo realizou encontros, oficinas e palestras, tais como o "Sarau Caiçara" - Pinacoteca Benedito Calixto - Santos /SP, "Mostra de Arte Contemporânea Caiçara" - Casa da Frontaria Azulejada - Santos/SP, "Itinerâncias - Encontros Caiçaras" - Casa da Cultura de Paraty - Paraty /RJ, "Sarau Filosófico" - SESC Santos Santos /SP, "Virada Caiçara" - São Vicente /SP e “Vitrine Literária” – SESC Santos – Santos /SP. Seu trabalho está presente em universidades, escolas públicas e instituições de cultura através de cursos, apresentações e palestras, além de inserir sua proposta artística em outros espaços públicos.

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www.edicoescaicaras.blogspot.com www.youtube.com/projetocanoa www.percutindomundos.blogspot.com www.soundcloud.com/percutindomundos

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Guarujá foi impresso sobre papel reciclado 75g/m² (miolo). A capa foi composta a partir de papelão e sacolas de papel doadas pelo Espaço de Consciência Corporal Célia Faustino. www.celiafaustino-conscienciacorporal.blogspot.com

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