Teorias da Comunicação (Mauro Wolf)

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das normas aplicáveis às diversas situações, para decidir a selecção das opções comunicativas disponíveis. É a «premeditação do desconhecido» (Fabbri, 1973, 69). As comunicações de massa [...] são o domínio onde o mínimo de imprevisibilidade da mensagem é acompanhado pelo máximo de imprevisão sobre a sua recepção (Fabbri, 1973, 89). A assimetria dos papéis comunicativos confere um relevo particular aos elementos que, nas estratégias textuais, dizem respeito aos destinatários, ao seu trabalho interpretativo, aos conhecimentos que os emissores possuem acerca deles. «O emissor antecipa a compreensão do receptor. Escolhe a forma da mensagem que seja aceitável para o destinatário e, assim, [...] a codificação acaba por ser influenciada pelas condições da descodificação. A própria informação se transforma, devido ao facto de ser permutada» (Jacques, 1982, 172). Ao contrário do que o modelo informacional descrevia, o locutor não determina as suas próprias mensagens, atendendo apenas à informação que quer transmitir; baseia-se, necessariamente, em conjecturas sobre os acontecimentos, as capacidades e o estatuto dos seus destinatários. Como se verá no Capítulo 3, trata-se de um elemento bastante importante na dinâmica produtiva e comunicativa dos mass media, evidenciado teoricamente pela teoria serniótico-textual e que tem de ser alvo de aprofundamentos e articulações específicas na pesquisa. Um exemplo disso é a análise do papel que desempenham, na estruturação dos textos, os conhecimentos que os emissores possuem acerca do público, ou a análise do modo como esses sistemas de conhecimento se reflectem na dinâmica comunicativa, ou o estudo de como esses sistemas se formam e se consolidam, o seu grau de maleabilidade, etc. Todos estes pontos definem um dos aspectos menos estudados da communication research e sobre o qual é necessário efectuar um importante trabalho de investigação. Os procedimentos tradicionais de enfrentar a questão («públicos secundários», imagens institucionais, pesquisas de mercado, etc.), confirmam um certo grau de «isolamento da realidade, da falta de interesse em saber como é realmente constituída a audiência, um certo factor de profecia que se autorealiza e, por vezes, a intenção de regular o público para o ajustar às imagens que dele possui ocomunicador» (McQuail, 1975, 1811). Emissor e receptor têm, um do outro, uma imagem que eles próprios constroem, modificam e a que atribuem importância, «mas fazem-no de uma forma um tanto autista, sem grande referência ao outro e tendem a cair nos estereótipos, o destinador com um estereótipo do público e o destinatário com imagens estereotipadas daquilo que se deve esperar dos mass media» (McQuail, 1975, 167). Existem, portanto, questões que são inerentes à lógica comunicativa dos discursos dos mass media, cujas respostas são importantes para o tema dos efeitos e das influências sociais: a assimetria dos papéis comunicativos, com consequentes diferenciações de competência comunicativa entre emissor e receptores, torna a regulação interlocutiva - ausente, na situação de comunicação de massa fortemente predeterminada no texto. Por isso, no texto são acentuados, em primeiro lugar, os aspectos que se referem ao destinatário-modelo, isto é, ao tipo de destinatário previsto pelo emissor e que o texto prefigura; em segundo lugar, os elementos de conhecimento partilhado pressupostos pelo texto e, finalmente, o carácter quase normativo das condições de aceitabilidade dos próprios textos, estabelecidas pela sua inserção em formatos rígidos. Este último factor liga-se ao papel fundamental que os géneros desempenham na comunicação de massa, quer nas suas várias formas de reconhecimento, quer na dinâmica de transformação interna do seu sistema global15. Do ponto de vista das teorias comunicativas, a situação actual da pesquisa sobre os mass media apresenta-se como um momento típico de transição. O modelo comunicativo de origem informacional está nitidamente em crise, por vários factores: pela presença de quadros gerais de referência mais amplos do que o «administrativo»; pela consequente mudança das problemáticas consideradas principais; pela progressiva «esterilidade» da pesquisa empírica de baixo perfil; pela existência contemporânea de abordagens, disciplinarmente diferenciadas, sobre o conceito de comunicação. Na minha opinião, o cruzamento de tais factores permitiu um confronto, embora brusco e polémico, entre a communication research e as outras disciplinas comunicativas. A sua prossecução constitui, hoje, um problema extremamente complexo e delicado que exige muitos cuidados, sobretudo a nível de objectivo de pesquisa e de opções metodológicas. Provavelmente, só através de estados intermédios de integração se pode evitar o perigo de a importância sociológica da pesquisa sobre os mass media vir a ser negada pela ______ 15Acerca da questão dos géneros nos mass media, ver, entre outros, Bettetini e outros, 1977; Casetti Lumbelli - Wolf, 1980. atenção exclusiva à real complexidade dos mecanismos de comunicação e, por outro lado, o perigo de a atenção semiótica a esses mecanismos vir a ser considerada insignificante por uma pesquisa dos mass media que acaba por estudar os processos de comunicação como se o não fossem.


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