Lições de electricidade - 30.ª parte

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o electricista Jorge Castilho Cabrita Engenheiro Electrotécnico (IST)/Professor do Ensino Secundário

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LIÇÕES DE ELECTRICIDADE 30º. PARTE

Capítulo II - Corrente Contínua Electroquímica (5ª parte) – Pilhas primárias (2ª parte)

Neste segundo artigo dedicado às pilhas primárias (não recarregáveis) são analisadas a constituição e funcionamento de diversas pilhas, desde as primeiras até algumas mais recentes, mostrando um pouco da evolução verificada.

58.3.2› Pilha elementar É possível realizar uma pilha elementar de diversas formas. Uma delas consiste em obter um limão, um objecto de cobre (um fio eléctrico ou uma moeda) e um objecto de zinco (de uma pilha usada, por exemplo). Estes dois últimos devem ser raspados para tornar as superfícies condutoras da electricidade e inseridos profundamente no limão. Com um voltímetro pode medir-se entre os dois uma tensão de cerca de meio volt. O ácido do limão funciona como electrólito e os dois metais como eléctrodos. Pode realizar-se uma experiência idêntica com outros electrólitos e outros metais, obtendo valores diferentes de tensão para metais diferentes.

58.3.3› Pilha de Volta 58.3.3.1› Constituição Como se indicou, cada elemento da pilha

Pólo negativo

Pólo positivo

(H2 SO4) aq ZINCO

COBRE

Figura 264 . Elemento da pilha de Volta.

de Volta é constituído por dois eléctrodos, um de zinco e outro de cobre, mergulhados numa solução aquosa de ácido sulfúrico (electrólito) (Figura 264).

excesso de cargas negativas e na solução há excesso de cargas positivas.

Ligando exteriormente o cobre e o zinco por um condutor eléctrico, verifica-se que há passagem de corrente do eléctrodo de cobre (pólo positivo) para o de zinco (pólo negativo).

58.3.3.2› Funcionamento a) Diferença de potencial inicial Muitos metais mergulhados em água dissolvem-se, pelo menos parcialmente. Ao mergulhar o zinco na solução de ácido sulfúrico, os átomos neutros de zinco perdem electrões 2 por cada átomo), originando iões positivos que passam para a solução, enquanto os electrões permanecem no metal do eléctrodo (Figura 265). Isto conduz a um excesso de electrões no interior do eléctrodo de zinco. À medida que a dissolução continua, os iões de zinco junto do eléctrodo repelem novos iões de zinco que se pretendam criar, dificultando a continuação da dissolução e o aumento do excesso de electrões no eléctrodo. Cada novo ião de zinco, ao ser repelido pelos restantes e ao entrar em contacto com dois electrões do eléctrodo regenera um átomo neutro de zinco. Nestas condições, o eléctrodo de zinco fica com um potencial negativo em relação à solução, pois no eléctrodo há

(H2 SO4) aq

Figura 265 . Dissolução do zinco.

De forma similar, também o cobre se dissolve na solução (Figura 266), produzindo iões positivos de cobre e electrões (2 por cada átomo) que ficam no interior do eléctrodo. A capacidade de ionização depende de cada metal, sendo a do zinco mais fácil do que a do cobre. Por isso, o eléctrodo de zinco fica com maior excesso de electrões do que o de cobre. Assim, os potenciais dos eléctrodos de cobre e de zinco são inferiores ao da solução, mas o do eléctrodo de cobre é superior ao do eléctrodo de zinco, pelo que o eléctrodo de cobre está a um potencial mais positivo que o de zinco. Desta forma se gerou uma f.e.m. entre os eléctrodos.


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assim, devido à formação dos iões de zinco em torno do eléctrodo de zinco. Além disso, estas pilhas iniciais não são práticas para transportar, devido a usarem electrólitos perigosos em forma líquida. Por estas razões, surgiram as pilhas secas com despolarizante.

Esta pilha também não é transportável, mas substituindo o electrólito por uma pasta de cloreto de amónio e fazendo mais algumas alterações, constrói-se a chamada “pilha seca”, que ainda hoje continua a ser muito utilizada, partilhando o mercado com outras pilhas mais recentes como as alcalinas.

58.3.4.2› Pilha padrão de Weston Para aferição da f.e.m. de uma pilha e outras aplicações é necessário utilizar uma f.e.m. de referência com uma f.e.m. conhecida e muito estável (uma pilha-padrão).

58.3.5› Pilha seca de Léclanché A pilha seca de Léclanché foi inventada em 1868 pelo engenheiro francês George Léclanché. O seu princípio de funcionamento é similar ao da pilha líquida, mas o electrólito líquido foi substituído por uma pasta de cloreto de zinco e cloreto de amónio. A esta pasta foi adicionado o despolarizante, dióxido de manganésio. O eléctrodo positivo é de carvão e o negativo de zinco. Há variantes de construção e muitas formas. A f.e.m. de um elemento de pilha é 1,5 V. Foram vulgares ao longo de dezenas de anos pilhas cilíndricas com várias dimensões (capacidades) e também achatadas, contituídas por três elementos em série, para proporcionar uma f.e.m de 4,5 V. O principal inconveniente destas pilhas residia no facto de o consumo do eléctrodo de zinco, utilizado como invólucro, produzir o derrame do electrólito no fim de vida da pilha.

Uma delas surgiu em 1892 criada por Edward Weston. A pilha de Weston (Figura 269) é uma pilha padrão impolarizável cujo eléctrodo positivo é constituído por mercúrio e sulfato de mercúrio e cujo eléctrodo negativo é constituído por uma amálgama de cádmio, sendo o electrólito uma solução de sulfato de cádmio. O valor típico desta f.e.m. é 1,01858 V a 20º C.

58.3.4.3› Pilha (líquida) de Léclanché com despolarizante A pilha (líquida) de Léclanché foi inventada em 1865 pelo engenheiro francês George Léclanché. Usa um eléctrodo positivo de carvão, um eléctrodo negativo de zinco, ambos mergulhados num electrólito constituído por uma solução de cloreto de amónio. O eléctrodo de carvão está envolvido por dióxido de manganésio (MnO2). Este funciona como despolarizante, reagindo com o hidrogénio que se forma durante o funcionamento da pilha. Como resultado de diversas reacções químicas, o hidrogénio formado irá combinar-se com oxigénio originando água e evitando, desta forma, a polarização pelo hidrogénio. No entanto, dá-se a formação de cloreto de zinco em torno do eléctrodo de zinco que, a somar ao desgaste do zinco, conduzem ao fim de vida da pilha. Esta pilha, ao contrário das anteriores tem uma maior força electromotriz de 1,5 V.

58.3.6› Pilha (alcalina) de botão de mercúrio Foram desenvolvidas investigações durante a II Grande Guerra com vista a melhorar a capacidade da pilha de Léclanché e diminuir os seus inconvenientes. Em 1944, Samuel Ruben inventou, nos EUA, a pilha de botão de mercúrio que foi licenciada pela companhia de Philip Rogers Mallory. Posteriormente, Ruben e Mallory fundaram a companhia Duracell, um dos grandes fabricantes actuais de pilhas. O eléctrodo positivo é de óxido de mercúrio misturado com grafite, o eléctrodo negativo é óxido de zinco e o electrólito é uma solução de hidróxido de potássio. A f.e.m. é cerca de 1,4 V, inferior à da pilha Léclanché, mas a

sua capacidade é 6 ou 7 vezes superior. As dimensões e outras características destas pilhas tornaram-nas muito utilizadas em aparelhos portáteis. As pilhas de mercúrio têm sido substituídas por outras desde que foram banidas por muitos países, devido à toxicidade do mercúrio.

58.3.7› Pilha alcalina de zinco-dióxido de manganésio Esta pilha é semelhante à de mercúrio, mas o eléctrodo positivo é de óxido de mercúrio misturado com dióxido de manganésio. Tem uma f.e.m. um pouco superior à da pilha de Léclanché.

58.3.8› Outras pilhas alcalinas As pilhas alcalinas de manganésio derivam das pilhas de Léclanché, tendo eléctrodos de zinco e dióxido de manganésio, mas em que o electrólito é hidróxido de potássio. A sua f.e.m. é 1,5 V, substituindo facilmente as pilhas Léclanché de zinco-carvão. A sua capacidade e a sua duração são várias vezes superior ao destas pilhas. Funcionam bem para grandes correntes, mantendo estável a sua capacidade. Grande durabilidade também em armazém. São feitas de materiais não tóxicos. Por outro lado, são mais caras e pesadas do que as pilhas de Léclanché. O custo mais elevado é compensado pela maior duração. São fabricadas em muitas formas. As suas aplicações são inúmeras nos mais diversos aparelhos eléctricos e electrónicos. É enorme a quantidade destas pilhas actualmente fabricadas, ocupando o lugar outrora ocupado pela pilha seca de Léclanché.


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