Revista CHICO nº 14 - Novembro de 2023

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REVISTA DO COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO - DEZEMBRO DE 2023


Presidente: José Maciel Nunes de Oliveira Vice-presidente: Marcus Vinícius Polignano Secretário: Almacks Luiz Carneiro da Silva Produzido pela Assessoria de Comunicação do CBHSF, Tanto Expresso Comunicação e Mobilização Social Coordenação-geral: Paulo Vilela, Pedro Vilela e Rodrigo de Angelis Coordenação de comunicação: Mariana Martins Edição: Karla Monteiro Assistente editorial: Arthur de Viveiros Textos: Andréia Vitório, Arthur de Viveiros, Hylda Cavalcante, Karla Monteiro, Juciana Cavalcante e Mariana Martins Projeto gráfico: Márcio Barbalho Diagramação: Albino Papa e Rafael Bergo Fotos: Agência Senado, Azael Gois, Bianca Aun, Cristiano Costa, Edson Oliveira, Fernando Piancastelli, Léo Boi, Manuela Cavadas, Marcizo Ventura e ShutterStock Capa: @anandacolaa Ilustrações: Albino Papa Revisão: Isis Pinto Impressão: ARW Gráfica e Editora Tiragem: 3500 exemplares DISTRIBUIÇÃO GRATUITA Direitos Reservados. Permitido o uso das informações desde que citada a fonte. Secretaria do Comitê: Rua Carijós, 166, 5º andar, Centro - Belo Horizonte - MG CEP: 30120-060 - (31) 3207-8500 secretaria@cbhsaofrancisco.org.br Atendimento aos usuários de recursos hídricos na Bacia do Rio São Francisco: 0800-031-1607 Assessoria de Comunicação: comunicacao@cbhsaofrancisco.org.br

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SUMÁRIO

Expediente

10 El Niño

Alerta Máximo

16 Política Ambiental

Força-Tarefa

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Páginas verdes

O São Francisco é vida

22 Política ambiental

Custo d’água

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Editorial


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Gastronomia

Queijo Sertanejo

Movimento social

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Marcha das Margaridas

Literatura

O Sertão de Itamar

30 Perfil

Elba Alves

46 Turismo

Beleza Natural

26

Infraestrutura

Programa Produtor de Água

52 Ensaio

50 Aconteceu


Editorial

SOMOS MILHÕES

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ilustração: Albino Papa

Foi um ano difícil, com tragédias anunciadas devastando paisagens e ceifando vidas no mundo inteiro. Talvez 2023 entre para a história como o ano em que, enfim, as coisas ficaram claras: o aquecimento global e suas consequências no nosso dia a dia não se encontram lá, no futuro, mas no instável agora. Não seria por acaso que estamos todos morrendo de calor ou de frio, experimentando temperaturas extremas, que provocam destruição por todo lado. Na reportagem “Alerta Máximo”, sobre o El Niño e o Velho Chico, você vai entender do que se trata, afinal, este tão familiar fenômeno, que, de tempos em tempos, retorna para nos assombrar. Cada vez mais bravo e mais destrutivo. Diante da emergência climática, por sugestão do CBHSF, a ANA está apostando na Sala de Acompanhamento do Sistema Hídrico do Rio São Francisco. Prevenir é melhor do que remediar.

Sem dúvida, muita gente caiu na real neste ano de 2023 marcado por catástrofes naturais: ou cuidamos agora do planeta ou entraremos em extinção. No Congresso Nacional, acabou de se instalar a Frente Parlamentar em Defesa da Gestão e da Revitalização do São Francisco. De acordo com os congressistas engajados, se medidas efetivas e abrangentes não forem tomadas imediatamente, não serão somente as populações ribeirinhas que vão pagar a conta, mas o país inteiro. Sem o Velho Chico, inexistirá vida em boa parte do Brasil.

Além de falar do tempo, a CHICO traz como tema a luta negra. Nas Páginas Verdes, a quilombola Xifronese Santos nos conta como é estar em duas frentes de batalha, a racial e a ambiental. No perfil, apresentamos a nova comandante da Agência Peixe Vivo, a economista Elba Alves, mulher, negra e pioneira em gestão de recursos hídricos. E, para fechar com chave de ouro, o “Sertão de Itamar”. No caso, Itamar Vieira Jr., autor baiano que já vendeu mais de 700 mil exemplares de “Torto Arado”, o livro ambientado na Chapada Diamantina, bacia do Velho Chico.

A luta continua do lado de fora do Congresso Nacional, na Esplanada dos Ministérios. Na reportagem “Avante, Margaridas”, acompanhamos a sétima “Marcha das Margaridas”, que, desde o começo do ano 2000, vem tomando Brasília em nome da dignidade do trabalho no campo. Este ano, mais de 100 mil mulheres camponesas ocuparam o DF, pedindo, entre outras reivindicações, a recuperação da bacia do São Francisco, fundamental para a sobrevivência da agricultura familiar no sertão do Brasil. O presidente Lula e a primeira dama, Janja, estavam lá.

“O São Francisco é a vida. Sem ele não existiria nada disso que está aí, neste interior do Brasil, nem mesmo o ser humano”, comentou Xifronese. “Falamos muito sério quando alertamos que o rio precisa de socorro, de ajuda urgente. Se não cuidarmos disso o quanto antes, não só o São Francisco, mas nós também vamos desaparecer”. Boas Festas!

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Páginas verdes

Por: Hylda Cavalcanti Arte: Albino Papa

O SÃO FRANCISCO É VIDA Xifronese Santos: o nome forte mais parece o de uma guerreira africana, mas nem ela mesma conhece a origem da curiosa alcunha. Por ter sido batizada assim, acabou por encarná-la, carregando-a com orgulho. Aos 46 anos, Xifronese, aliás, acumula lutas cotidianas. Na comunidade quilombola de Caraíbas, localizada no município de Canhoba, em Sergipe, criou nove filhos trabalhando como merendeira, lidando na roça, fazendo artesanatos. Sua grande batalha, porém, encontra-se no ativismo em defesa dos povos tradicionais e pela revitalização do Velho Chico.

Integrante do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), ela não se cansa. Já conseguiu levar água para duas comunidades indígenas, tem propostas protocoladas no Comitê que estão em fase de avaliação, sugere projetos de lei e acompanha de perto medidas adotadas por prefeituras e estados da região. Vive nessa saga há 19 anos e admite que, entre vitórias e derrotas, ainda há muito mais a se lamentar. “Não estamos fazendo um alerta qualquer. O São Francisco é vida. E é importante para todo o país. A situação é séria e, se a degradação não parar com urgência, o Velho Chico vai deixar de existir”, comentou.

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Xifronese é um nome muito forte. É verdadeiro ou pseudônimo da militância? É o meu nome mesmo. Não sei se é africano, nem o que representa. Confesso que gostaria muito de saber a origem. Meu pai e minha mãe eram trabalhadores de uma fazenda e o dono foi quem sugeriu esse nome. Minha mãe não queria, mas terminou sendo feito o gosto do meu pai, como era comum naquele tempo. Não vou dizer que me identifiquei com ele desde o início, mas com o passar dos anos passei a me identificar e hoje sei que é forte. Eu o carrego como um nome de guerra Todos conhecem a militante guerreira que atua em defesa dos povos quilombolas e por melhoria na qualidade de vida da população que vive às margens do São Francisco. Mas como é a vida da Xifronese mulher? Sou merendeira da escola pública da comunidade, mas minha profissão sempre foi o artesanato. Sou artesã até hoje, além de agricultora. Atuo também há 19 anos na defesa do povo quilombola. Eu me casei com 15 anos. Aos 46, estou casada há 32 anos. Tivemos nove filhos. Agora estão vindo os netos. Já são quatro e aguardamos o quinto. Como é a sua história no ativismo? Hoje eu represento as comunidades quilombolas no CBHSF. Fui indicada pela Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ). Estou cumprindo o segundo ano de um mandato de três anos. O Governo Federal anunciou, recentemente, mais recursos no Orçamento da União de 2024 para os quilombolas. No que você acha que essa verba deve ser priorizada? A nossa grande questão é a morosidade dos processos de demarcação dos territórios quilombolas. Precisamos de mais reconhecimento e de demarcação célere da terra. Fiquei até feliz, claro, ao saber desses recursos e sei que vão ajudar a melhorar a vida em muitas comunidades, mas infelizmente essa não é a questão que mais nos preocupa hoje. Existe uma invisibilidade, os relatórios de avaliação das áreas quilombolas demoram para ser concluídos. Nós defendemos nosso território, mas sabemos que a maioria dessas áreas continuam sofrendo com invasões de latifundiários e do agronegócio a todo momento. É um problema sério, que envolve o poder econômico e que precisa ser enfrentado, porque consiste no nosso principal gargalo.

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A transposição do Rio São Francisco aconteceu, mas a revitalização do rio e das suas bacias nem tanto. O que você vê de mais grave nesse processo? O que acontece de mais grave é o desmatamento das matas ciliares, a devastação dos mangues que alimentam o São Francisco. Do jeito que as coisas estão, se não forem tomadas providências urgentes, temos medo que o rio venha a desaparecer. E isso não é um modo de falar. A gente sofre com a seca e a água reduzida. As comunidades quilombolas, em sua maior parte, moram na beira do rio, mas não podem usar a água para beber. O abastecimento é feito por meio de caminhões-pipa e outros sistemas, porque a área virou uma grande fossa. Sendo que em algumas comunidades, simplesmente não chega água de jeito algum. Como você avalia o avanço do agronegócio na bacia do São Francisco? Temos o uso indiscriminado de agrotóxicos, com despejos de esgotos industriais e o excesso de retirada de água principalmente para o uso agroindustrial. São, todas, ações que degradam um rio que é nacional e atende a todo o país. Os agrotóxicos, o esgoto, o dejeto das indústrias, tudo vai para o São Francisco. Nós lutamos, fazemos nossas mobilizações, atuamos junto ao Comitê enquanto representantes da sociedade civil, mas isso apenas não basta. Precisamos de medidas mais firmes por parte das prefeituras, governos estaduais e Governo Federal. A privatização da Eletrobras resultou num fundo de R$ 350 milhões para o uso na revitalização e preservação do São Francisco. Como você acha que esses recursos devem ser usados prioritariamente? A pergunta que deve ser feita é: como vamos usar esses recursos para acabar com gargalos existentes hoje, se sabemos que toda a área precisa ser revitalizada? As margens, sobretudo, estão nas mãos dos grandes fazendeiros e eles saem desmatando sem controle. Vamos defender que os recursos sejam usados, sim, para a revitalização. Mas antes, precisamos que seja definido um controle, um limite. Precisamos que seja avaliada a questão dos latifundiários que operam diretamente na beira do rio. Que limites terão? Serão obrigados a interromper esse trabalho que acaba com o rio? Sem isso, não será possível recuperarmos nada.


O Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco tem um plano de ação e metas montado com a sociedade civil. Como envolver mais, e com efetividade, os outros representantes do Comitê, que são representantes das empresas e do Estado, nesse processo? Esse foi um ponto muito bom abordado, porque existe descaso de uma maneira geral por parte de prefeituras, governos estaduais e até representantes do Governo Federal. Se assim como nós, os estados e municípios abraçassem a causa com empenho, já teríamos resolvido muita coisa. Na prática, são agentes públicos que pouco atuam ou atuam de forma muito lenta. Poderia traçar um balanço do que tem sido feito neste seu período à frente do CBHSF para as comunidades tradicionais? Conseguimos levar água para duas comunidades indígenas e agora estamos em vias de levar para uma terceira. Também temos atuado em projetos legislativos que possam melhorar a condição dos quilombolas de um modo geral nas câmaras municipais e assembleias legislativas e seguimos denunciando a demora para demarcação dos nossos territórios. Estamos juntos e de mãos dadas nessa luta, que não é pequena. No CBHSF, especificamente, apresentamos várias propostas que estão sendo discutidas e também objetivam levar melhorias para a população. As conquistas nas comunidades indígenas e no estado de Alagoas consistem numa luta conjunta das mais diversas organizações. E em Sergipe, no quilombo Resina, em Brejo Grande, no quilombo Mocambo, em Porto da Folha, e nas mais diversas comunidades tradicionais da bacia, as conquistas que tivemos foram apoiadas por todos que fazem parte desse grande Comitê do São Francisco. Qual, para você, é a verdadeira tradução da importância do Rio São Francisco na vida das comunidades que aí estão, desde o agricultor simples às pessoas que vivem da pesca e de outras atividades que dependem do rio? O São Francisco é a vida. Sem ele não existiria nada disso que está aí neste interior do Brasil, nem mesmo o ser humano. Falamos muito sério quando alertamos que o rio precisa de socorro, de ajuda urgente. Se não cuidarmos disso o quanto antes, não só o São Francisco, mas nós também vamos desaparecer.

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Rio Verde Grande, em Verdelândia (MG)

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ALERTA MÁXIMO

El Niño


Por: Arthur de Viveiros Fotos: Bianca Aun

Como o aquecimento das águas do Oceano Pacífico, provocado pelo El Niño, está afetando a vida no Velho Chico. A ANA, por meio da Sala de Acompanhamento do Sistema Hídrico do Rio São Francisco, criada no início de 2022 por sugestão do CBHSF, acompanha com atenção o fenômeno Secas prolongadas, enchentes avassaladoras: a severidade dos fenômenos climáticos ocorridos mundo afora marcou 2023. Segundo nota conjunta do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), culpa do El Niño, que começara a apresentar sinais já em fevereiro. Entre março e abril, as temperaturas do Oceano Pacífico, sobretudo nas costas do Equador e do Peru, elevaram-se de forma significativa. Com isso, no mês de junho, as condições registradas indicavam a instauração definitiva do El Niño. A temperatura do mar, próximo à costa sul-americana, apresentou um aumento superior a 3ºC.

As previsões indicam forte probabilidade, mais de 90% de chances, de o fenômeno seguir se manifestando, pelo menos, até março de 2024. “A previsão indica que as chuvas serão espacialmente irregulares nas regiões Centro-Oeste e Sudeste, enquanto isso, na região centro-norte do país, deveremos ter menos chuva que a média histórica para o período. O El Niño deixa a temperatura acima do normal em grande parte do Brasil e o período sob a influência desse fenômeno promete ser quente, especialmente no interior das regiões Norte e Nordeste”, explicou Danielle Ferreira, meteorologista e assessora técnica do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET).

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Represa seca, em Paracatu (MG)

Obviamente, o Velho Chico também está pagando a conta do clima extremo. Seja no Alto, Médio ou Baixo São Francisco, a bagunça climática impera, com os aumentos substanciais de temperatura, as secas prolongadas ou as chuvas excessivas. No município de São Romão, por exemplo, localizado no norte de Minas Gerais, bem dentro da bacia do São Francisco, a temperatura chegou a 43,5ºC, o recorde do ano. O calorão foi registrado pelo INMET, no final de setembro. Diante de tantas evidências do perigoso aquecimento global, a questão que fica é: como essas alterações climáticas vão afetar, na prática, a vida das populações ao longo da bacia do Velho Chico? “Sabendo do cenário, podemos inferir que a principal consequência é econômica. É necessário planejamento no plantio”, comentou Marília Nascimento, meteorologista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Ainda de acordo com ela: “Além, é claro, dos cuidados diários que as pessoas devem ter em termos de hidratação, não exposição prolongada ao sol, cuidados com a insolação, pois além de termos temperaturas elevadas acima da média, podemos também seguir registrando episódios de ondas de calor, como foi observado durante esse inverno”.

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O climatologista José Marengo, coordenador-geral de Pesquisa e Desenvolvimento do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) também deu o alerta: “Podemos ter realmente falta de água para a população, principalmente no interior do semiárido, o que fará com que haja uma reprogramação na agricultura, atenção ao fornecimento de água, valendo-se de caminhões-pipa e outros recursos”. Conforme Danielle Ferreira, outro risco passa pelo aumento da desertificação em áreas da bacia do Velho Chico: “Com a previsão dos modelos climáticos indicando a persistência do El Niño até, pelo menos, o final do verão 2023-2024, surge a questão sobre qual será o impacto desse evento no início do próximo período chuvoso, e isso pode representar uma redução nos volumes de água disponíveis na região, aumentando a degradação ambiental e a desertificação”. O coordenador da Câmara Consultiva Regional do Baixo São Francisco, Anivaldo Miranda, chamou a atenção para a necessidade de ações urgentes, para que a população ribeirinha atravesse o cenário de escassez hídrica. “É imprescindível que órgãos reguladores, como é o caso da Agência Nacional de Águas (ANA) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos

Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), de fato, exerçam suas prerrogativas para administrar, da melhor forma, o volume dos reservatórios, prevenindo a possibilidade de situações críticas, fazendo cumprir normas fundamentais de controle e, no limite, lançando mão de medidas de restrição de usos na hipótese de eventos dramáticos de escassez”. Para Anivaldo, o passado seria um bom professor: “Já sabemos, por amargas experiências anteriores, principalmente a crise de escassez de chuvas no Rio São Francisco de 2013 a 2019, que agir com atraso, falta de diálogo e planejamento pode causar enormes danos aos ecossistemas e aos usos múltiplos das águas”.


SALA DE CRISE Por sugestão do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), a Agência Nacional de Águas (ANA) criou, no início do ano de 2022, a Sala de Acompanhamento do Sistema Hídrico do Rio São Francisco, voltada para o monitoramento de eventuais situações de crise, principalmente relacionadas a mudanças climáticas. O espaço é um fórum no qual diversos atores interagem e o El Niño entrou na pauta este ano. Além desta, um outro grupo instituído dentro da ANA, a Sala de Crise da Região Nordeste, também se desdobra, com atenção, sobre os impactos do El Niño na bacia do Velho Chico. De acordo com a ANA, as salas de crise e de acompanhamento “funcionam como espaços para articulação e intercâmbio de informações para subsidiar a adoção de medidas relativas à gestão de sistemas hídricos ou prevenção, preparação e mitigação dos impactos de eventos hidrológicos críticos de qualquer natureza, como nos casos de secas e inundações”. Suas reuniões mensais ficam disponíveis no canal da ANA, no YouTube, e são mediadas pelo superintendente de Operações e Eventos Críticos da ANA, Joaquim Gondim. Um dos órgãos que integram as salas

é o INMET. “O INMET está realizando o monitoramento das condições oceânicas e atmosféricas e divulgando os resultados em boletins periódicos, bem como participando das reuniões mensais da Sala de Acompanhamento do Sistema Hídrico do Rio São Francisco, iniciativa encabeçada pela ANA e por outros órgãos como governo, entidades e usuários em geral, que discutem as condições hidrológicas da bacia do Rio São Francisco”, comentou Danielle Ferreira. Já na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), o monitoramento tem acontecido no Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (LAPIS), que conta com o Sistema Eumetcast, hospedado no norte da Alemanha. O coordenador do laboratório e professor do Instituto de Ciências Atmosféricas (Icat), Humberto Barbosa, explicou: “Desde 2007, o laboratório conta com esse sistema de recepção de dados, em tempo real, ou seja, todos os dados, informações, resultados de análises por parte dos pesquisadores do LAPIS têm, por base, esse sistema”.

Além disso, o LAPIS mantém relações internacionais de intercâmbio de informações com universidades de todo o mundo, como por exemplo da Eslováquia. De acordo com Barbosa: “Nos últimos oito anos, por meio de uma colaboração com o professor e pós-doutor venezuelano, Frank Paredes, o LAPIS trabalha diretamente na questão do Rio São Francisco, em especial no que tange ao monitoramento de secas, de chuvas e de degradação ambiental”. O professor Humberto ainda destacou um novo trabalho do LAPIS, voltado ao monitoramento do que é conhecido como “secas rápidas” ou “secas relâmpago”, que acontecem quando há a combinação entre altas temperaturas e baixa precipitação, quadro previsto para a região Nordeste enquanto os efeitos do El Niño seguirem se manifestando: “Em função do atual quadro climático, registrado no Brasil, a tendência é que essas secas relâmpago tenham cada vez mais destaque em diversas regiões do país”.

Represa seca, em Paracatu (MG)

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Além dos efeitos na bacia do Rio São Francisco, o El Niño afeta também outras partes do Brasil e do mundo. Confira algumas situações climáticas impulsionadas pelo fenômeno. No Brasil Seca na Amazônia A forte seca, que foi registrada no último semestre deste ano na região da Amazônia brasileira, deve se estender até este mês de dezembro e está ligada, segundo o Cemaden, ao El Niño. As previsões de chuva para a região ficaram abaixo da média na maioria das medições neste segundo semestre de 2023. Chuvas e enchentes no sul do Brasil As fortes chuvas que deixaram um rastro de destruição e infelizmente, provocaram mortes na região sul do país, ao longo deste segundo semestre, também estão ligadas à ocorrência do El Niño. O fenômeno provoca um aumento significativo na quantidade de chuvas para essa região do Brasil No Mundo O El Niño é capaz de provocar alterações climáticas na Índia, no sudeste da Ásia e na Austrália, que sofrem com períodos prolongados de seca e de aumento da temperatura média. Já na costa oeste da América do Norte, o fenômeno provoca um aumento da precipitação média, tendo como resultado a formação de grandes tempestades. Nova York foi uma das metrópoles que sofreu com esse aumento de chuvas nos meses de setembro e outubro deste ano, registrando níveis recordes de precipitação e, até mesmo, inundações. Na América Central, predomina uma condição climática quente e seca. Na América do Sul, como descrito, há registros de alternância entre secas severas, aumento de temperaturas médias e ocorrência de fortes chuvas.

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Política Ambiental

Maciel Oliveira, presidente do CBHSF

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Por: Hylda Cavalcanti Fotos: Cristiano Costa

FORÇATAREFA Segundo os integrantes da Frente Parlamentar em Defesa da Gestão e da Revitalização do São Francisco, lançada em setembro no Congresso Nacional, o Velho Chico precisa de todos nós. Se medidas efetivas e abrangentes não forem tomadas, em dez anos, não serão apenas as populações ribeirinhas que sofrerão o impacto, mas o país inteiro

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No último 13 de setembro, na Câmara dos Deputados, foi, mais uma vez, soado o alarme: o Velho Chico agoniza. Com a presença de mais de 400 pessoas, o lançamento da Frente Parlamentar em Defesa da Gestão e da Revitalização do São Francisco serviu justamente para se retomar o urgente debate. Ações pontuais já não adiantam. Para socorrer o Velho Chico, só uma força-tarefa. Se medidas efetivas e abrangentes não forem tomadas agora, em dez anos não serão apenas as populações ribeirinhas que sofrerão o impacto, mas todo o país, já que o rio da integração nacional não tem esse agnome por acaso. Praticamente, do Velho Chico, depende o Brasil de dentro. Somando-se aos deputados e senadores, estiveram presentes ao evento representantes de Comitês de Bacias Hidrográficas, autoridades de vários ministérios, pescadores, quilombolas, prefeitos, vereadores e deputados estaduais. Será que desta vez dará certo? Na Câmara dos Deputados, a pergunta pairava no ar. Nos últimos 30 anos, ao longo de nove legislaturas do Congresso Nacional, da 49ª até a atual (a 57ª), foram criadas sete frentes parlamentares com o mesmo objetivo: a recuperação do São Francisco. Desta feita, a ideia é traçar metas objetivas, lutando em várias frentes, desde a apresentação de projetos de lei que beneficiem o meio ambiente até o combate aos projetos de lei que caminhem na direção contrária. “Se não nos unirmos, independentemente de partido político, de tendências ideológicas ou qualquer outro tipo de divergência, em 2040 vamos colocar uma cruz no lago de Sobradinho com uma placa escrita: “Aqui jaz o Rio São Francisco. É muito triste prever isso, mas é a realidade”, afirmou o senador Otto Alencar (PSD-BA).

Membros da Direc participam do lançamento da Frente Parlamentar em Defesa do Rio São Francisco

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ProtagonismO Assumindo a presidência dessa nova frente parlamentar, o deputado federal Paulo Guedes (PT-MG) lembrou o óbvio. No momento em que o Brasil quer assumir a liderança global em questões ambientais, precisa-se olhar para o Velho Chico em vez de chamar a atenção somente para a Amazônia. “O São Francisco também precisa ser, daqui por diante, prioridade nas políticas de meio ambiente voltadas para a segurança hídrica, reunindo preservação ambiental e desenvolvimento econômico, social e cultural”, ressaltou. “Todos os dias o que vemos é poluição, despejo de esgotos domésticos e industriais, uso indiscriminado de agrotóxicos, ações desordenadas de mineradoras e garimpos, desmatamento das matas ciliares, corte da vegetação, erosão e assoreamento, queimadas, urbanização. Tudo isso leva a crescentes riscos de desertificação, não apenas pelas condições climáticas atuais, mas, principalmente, pela falta de gestão sustentável dos recursos hídricos. Um novo São Francisco é possível se revitalizarmos de forma integrada a bacia, retomando a sua missão de rio da integração nacional”. Na opinião de Paulo Guedes, a sociedade civil também precisa se engajar na luta. Dentre as ações urgentes ele destacou: a implantação de um sistema de barragens, visando à regularização de vazão na calha do São Francisco, combate ao desmatamento desordenado e amplo programa de saneamento básico.


Parlamentares levantam bandeira em defesa do Velho Chico

O grupo propõe, ainda, a criação de áreas de conservação e de corredores ecológicos, o incremento das disponibilidades hídricas para irrigação, abastecimento humano e, na indústria, geração de energia, controle de cheias, piscicultura, lazer e turismo. Obviamente, o foco mira a proteção e recuperação de áreas ambientalmente vulneráveis, adequação ambiental de estradas não pavimentadas nas áreas ribeirinhas, recomposição de cobertura vegetal e retomada de condições que permitam a volta de um transporte fluvial de cargas eficiente — como era observado em décadas passadas. “Com as intervenções adequadas e ações articuladas, será possível promover desenvolvimento social, ambiental e econômico para as pessoas que moram nas áreas ribeirinhas”, acentuou o presidente da Frente.

Já o vice-presidente, deputado Pedro Campos (PSB-PE), ressaltou: “O São Francisco, no seu caminho, nos ensina muito. Uma das lições é a necessidade de unidade entre nós. O São Francisco é feito de água, tradição e vida. Não dá para falarmos nele e abordar apenas a questão da água. Temos de ficar atentos a projetos estratégicos, como os recursos a serem destinados pelo comitê gestor da Eletrobrás”. Isso porque, segundo a legislação que permitiu a privatização da Eletrobras, dos recursos decorrentes da privatização, obrigatoriamente, precisam ser destinados R$350 milhões por ano, num período de 10 anos, para ações de revitalização. Na visão de Pedro Campos, a destruição dos recursos vai exigir muito debate.

Entre as prioridades, sem dúvida, estaria a aprovação do projeto de lei que propõe a defesa da Caatinga. Outro projeto que deve ser alvo de observação é a rediscussão da chamada Lei das Águas. “É parte da nossa história, faz parte da cultura brasileira e tem extrema importância ambiental para o país como um todo. Preservar as nascentes do rio implica em enfrentar o poder econômico, implica em dar limites ao direito de propriedade neste país”, ressaltou o deputado Patrus Ananias (PT-MG).

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Água Salgada

As demandas

Segundo o senador Otto Alencar, o Rio São Francisco já virou mar. À Bahia, ele já chega salgado. “Temos de nos ajoelhar para pedir às autoridades que nos apoiem nesta luta porque ela é urgente”, apelou. Alencar acentuou também que toda barragem com o tempo, acumula grãos que entram nos seus lagos, mas no caso das barragens de Sobradinho e Três Marias, um estudo constatou que esse aterramento de grãos está descontrolado. No caso da barragem de Três Marias, por exemplo, há 35% de aterramento. Em Sobradinho, esse aterramento seria da ordem de 20%. “Na situação em que se encontra o rio, R$350 milhões por ano, em 10 anos, não é um volume suficiente de recursos para salvar o São Francisco”, argumentou. O parlamentar citou, ainda, a dificuldade para se conseguir dinheiro nas gestões anteriores. Na Comissão de Meio Ambiente do Senado, em 2022, foram apresentadas emendas da ordem de R$600 milhões no Orçamento da União para o São Francisco, que chegaram a ser aprovadas, mas os recursos foram encaminhados para outros projetos de meio ambiente.

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“Queremos proteger o rio da erosão, mas também atuar na prevenção, em processos hidroambientais, no plantio de mudas nativas, por exemplo. Vamos trabalhar juntos com a Frente Parlamentar e os governadores e prefeitos de cada município por onde o rio passe”, declarou o presidente da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), Marcelo Andrade Moreira, ressaltando que já há projetos no órgão voltados para a continuidade do processo de implantação de sistemas de esgoto sanitário em cidades ribeirinhas e de novas estradas rurais. Projetos Polêmicos Presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco (CBHSF), José Maciel de Oliveira fez questão de destacar a participação de todos: órgãos do Executivo, parlamentares, lideranças, povos indígenas, quilombolas, pescadores, população ribeirinha e técnicos. “Este dia é de muita alegria e muita festa. Conversamos muito com o deputado Paulo Guedes, sabemos que temos

Implantação de um sistema de barragens visando à regularização de vazão na calha do rio Ações de combate ao desmatamento desordenado Programas de saneamento básico que possam conter as fontes poluidoras, ofertando água em quantidade e de qualidade para a população Criação de áreas de conservação e de corredores ecológicos Programas para controle de cheias Continuidade ou criação de novos projetos de piscicultura, lazer e turismo Proteção e recuperação de áreas ambientalmente vulneráveis Adequação ambiental de estradas não pavimentadas nas áreas ribeirinhas

muitos problemas na bacia do São Francisco em vários estados e que precisamos desse gesto de união”, frisou. Maciel lembrou que, além de cortar os estados de Minas Gerais (onde nasce), Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe, o São Francisco agora também abastece os estados do Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba, que possuem bacias receptoras, com a transposição. E citou projetos que podem trazer ainda mais prejuízos para o Velho Chico, como o PL 4546, que tira recursos e praticamente desconstrói a atual política de gestão das águas. Conforme a fala da deputada Delegada Catarina (PSD-SE): “Temos somente no estado de Sergipe 132 municípios banhados pelo rio e alguns desses municípios, por incrível que pareça, possuem os mais baixos Índices de Desenvolvimento Humano (IDHs) do Brasil. O que está apenas no discurso? Que ações ainda estão sendo realizadas ou em continuidade? Que ações precisam ser feitas? Temos que avaliar isso. O São Francisco passa por 505 municípios e apenas um deles tem esgoto 100% tratado.

Recomposição de cobertura vegetal Desenvolvimento social, ambiental e econômico para a população das áreas ribeirinhas. Debate técnico sobre o manejo do rio e o sistema florestal Rediscussão sobre o uso exato dos recursos que sairão da privatização da Eletrobras para a revitalização do rio Rediscussão de projetos legislativos voltados para a preservação dos biomas nas áreas cortadas pelo rio Acompanhamento constante e combate a matérias legislativas que podem ser prejudiciais para o Velho Chico, em tramitação no Congresso Nacional, em Assembleias legislativas e em Câmaras municipais.


“Não se pode dizer que nenhuma dessas frentes funcionou sem ter resultado, porque vários projetos tramitam ao longo dos anos e muitos deles, voltados para a área de meio ambiente como um todo, também disseram respeito ao São Francisco”, comentou o cientista político Alexandre Ramalho, analista econômico do Senado: “Agora o importante dessa informação é saber que o risco que o rio corre agora é maior e também a necessidade de que o grupo tenha uma atuação reforçada nesta legislatura”.

É uma situação muito séria”, denunciou. Na opinião dela, o São Francisco tem duas características importantes: “A primeira é a generosidade, a segunda é a resiliência. Mas temos de lembrar que, embora o Rio São Francisco seja muito resiliente, caso contrário estaria morto há anos, essa resiliência tem limites”. Segundo o coordenador da área de revitalização de bacias hidrográficas, acesso à água e uso múltiplo dos recursos hídricos do Ministério do Meio Ambiente, Alexandre Rezende Tofeti, a ministra Marina Silva está ciente da importância de uma força-tarefa: “Defendemos a gestão e a revitalização e sabemos que não há cenário futuro sem um rio saudável. Temos muito claro que é preciso envidar ações urgentes para o São Francisco e atuamos para manter a gestão de recursos hídricos no país com a presença da participação social, por meio dos Comitês de Bacia. Precisamos que o plano de bacias seja instrumento para nortear nossas ações, com diagnósticos muito bem detalhados e ações bem desenhadas”.

O curriculum

Frente a frente

No Congresso Nacional, já foram lançadas várias frentes parlamentares em defesa do Velho Chico. Porém, sem muitos resultados concretos. Está no regimento comum: toda frente parlamentar tem duração de apenas uma legislatura, ou seja, quatro anos. Não chega a incomum, entretanto, que, a cada nova legistatura, determinada frente parlamentar seja recriada. No caso do São Francisco, embora seja válido que os deputados e senadores se preocupem constantemente com o tema, chamou a atenção o número de frentes criadas nos últimos 30 anos, com nomes diversos.

49ª Legislatura (janeiro de 1991 - janeiro de 1995) - Frente Parlamentar de Defesa do Rio São Francisco 50ª Legislatura (janeiro de 1995 - janeiro de 1999) - Não teve 51ª Legislatura (janeiro de 1999 - janeiro de 2003) - Frente Parlamentar de Defesa do São Francisco 52ª Legislatura (janeiro de 2003 - janeiro de 2007) - Frente Parlamentar em Defesa da Revitalização do Rio São Francisco 53ª Legislatura (janeiro de 2007 - janeiro de 2011) - Frente Parlamentar em Defesa da Revitalização do Rio São Francisco 54ª Legislatura (janeiro de 2011 - janeiro de 2015) - Não teve 55ª Legislatura (janeiro de 2015 - janeiro de 2019) - Frente Parlamentar de Defesa e Desenvolvimento do Rio São Francisco 56ª Legislatura (janeiro de 2019 - 2023 - Frente Parlamentar em Defesa do Rio São Francisco 57ª Legislatura (iniciada em janeiro de 2023) - Frente Parlamentar em Defesa da Gestão e da Revitalização do São Francisco

Opará, ou Rio-mar: como o Rio São Francisco foi chamado inicialmente pelos povos indígenas. Nasce em Minas Gerais e passa por Bahia, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Goiás e Distrito Federal. Outros estados que abastece: Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba, que possuem bacias receptoras, com a transposição. Banha 505 municípios que, juntos, têm uma população de mais de 18 milhões de habitantes. Deságua no Oceano Atlântico e sua extensão corresponde a 8% do território brasileiro.

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Política Pública

CUSTO D’ÁGUA

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Por: Juciana Cavalcante Arte: Albino Papa

Há dez anos, o CBHSF achava-se entre os pioneiros na implementação da cobrança pelo uso dos recursos hídricos da bacia do São Francisco. Com os recursos obtidos a partir de então, foram realizados projetos e obras fundamentais de revitalização e preservação. Mas a inadimplência vem se tornando um grande desafio

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Quase 10 anos depois da criação do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), foi aprovada e instituída, em 2010, a cobrança pelo uso dos recursos hídricos. Então, o Velho Chico se tornava o terceiro rio brasileiro a implementar o único mecanismo eficaz para garantir projetos de revitalização e preservação. Até agora o resultado em investimentos gira em torno de R$ 150 milhões. Mas ainda falta muito para atingir o status da “bacia que podemos”. O Plano de Recursos Hídricos (PRH-SF 20162025) definiu uma meta de investimentos financeiros, com dois orçamentos: estratégico e executivo, ambos contendo atividades prioritárias a serem executadas pelo CBHSF e pela agência delegatária, a Agência Peixe Vivo. O orçamento estratégico estimou a necessidade de investimentos da ordem de R$ 500 milhões ao longo de 10 anos, com arrecadações basicamente oriundas da cobrança pelo uso dos recursos hídricos. Inicialmente o valor da cobrança repassado ao Comitê era de aproximadamente R$ 24 milhões e com a atualização da metodologia, realizada em 2016, o valor chega a aproximadamente R$ 42 milhões. “Nós iniciamos a cobrança pelo uso do recurso hídrico na bacia do Rio São Francisco no ano de 2010 e a operacionalização desse recurso veio no final de 2011 e 2012”, comentou o presidente do CBHSF, Maciel Oliveira. “Com os recursos, elaboramos 116 planos de saneamento, fizemos muitos projetos e programas hidroambientais, transformamos projetos em programas como o saneamento rural, investimos em saneamento e abastecimento de água, recuperamos milhares e milhares de nascentes, fizemos cercamentos de área de proteção permanente em áreas indígenas também, investimos em projetos voltados a povos e comunidades tradicionais. Ou seja: o Comitê, com recursos da cobrança, conseguiu investir muitos milhões de reais na recuperação da bacia. O Comitê iniciou esse trabalho e agora colhemos os frutos, vendo a melhoria na qualidade de vida deste povo que vive à beira do Velho Chico”.

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Se revitalizar e preservar os nossos rios se tornou questão de emergência, obviamente, é imprescindível a cobrança pelo uso dos recursos hídricos. Não se trata de imposto. Prevista na Lei nº 9.433/97 (Lei das Águas) a cobrança pelo uso da água é um dos instrumentos instituídos pela Política Nacional dos Recursos Hídricos, com três intuitos: garantir o orçamento para a recuperação das bacias hidrográficas, estimular o investimento em despoluição e, sobretudo, promover a educação ambiental, atribuindo valor à água. Priorizando a qualidade da água e o saneamento ambiental, o CBHSF destinou recursos para o desenvolvimento de estudos e projetos diversos voltados para sistemas de saneamento básico em seus quatro componentes: abastecimento de água, esgotamento sanitário, resíduos sólidos urbanos e drenagem urbana. Na elaboração de 116 Planos Municipais de Saneamento Básico (PMSB) foram investidos mais de R$ 16 milhões. Foram mais de 50 projetos hidroambientais, com investimento estimado de mais de R$ 20 milhões: formatação e acompanhamento da implantação de projetos hidroambientais, visando à proteção e conservação de mananciais, adequação de estradas vicinais, cercamento de nascentes e áreas de recarga, controle de processos erosivos e, ainda, atividades de sensibilização e mobilização de comunidades. Os projetos hidroambientais, distribuídos nas quatro regiões fisiográficas da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, atenderam, por exemplo, as bacias do Rio das Pedras e Córrego Buritis, do Córrego da Onça, Rio Jatobá, Entorno da Represa de Três Marias, no Alto SF; Rio Itaguari, afluente do Rio Carinhanha, Rio das Fêmeas, Rio Pituba no Médio; bacia do Rio Salitre, Rio Mocambo, Bacia do Córrego Onça, no Submédio; Rio Jacaré, Rio Boacica, Rio Piauí, no Baixo SF, entre outros.

Além disso, ações de grande porte foram realizadas para garantir a segurança hídrica, tais como: estudos de viabilidade para a implantação do Plano de Ação S.O.S. Lagoa de Itaparica (Gentio do Ouro e Xique-Xique, Bahia); projeto executivo de engenharia para implantação de comportas no perímetro irrigado do Vale do Paramirim; diagnóstico ambiental, prognóstico e definição de projetos de requalificação ambiental e urbanística para lagoa de dejetos no município de Felixlândia/MG; execução de obras e serviços de requalificação ambiental na Bacia Hidrográfica do Riacho das Pedras, no município de Bonfinópolis de Minas/ MG; execução de obras e serviços para implantação do Sistema de Abastecimento de Água da Aldeia Serrote dos Campos em Itacuruba, Pernambuco; implantação de um sistema de captação e adução de água bruta no município de Pirapora/MG; implantação de tanques pulmão em Piaçabuçu, Alagoas; elaboração do estudo de viabilidade e dos projetos básico e executivo do sistema de abastecimento de água da população da Aldeia Kariri-Xocó (Porto Real do Colégio, Alagoas); além da construção de viveiros de mudas nativas nos municípios de Lapão, no médio São Francisco, Patos de Minas, no Alto São Francisco, Santana do Ipanema e Piaçabuçu, no Baixo, e Jaguarari, no Submédio, ações que, ao todo, demandaram investimentos em torno de R$ 30 milhões.


INADIMPLÊNCIA Em 2018 o índice de inadimplência na bacia do São Francisco chegou a 15% e, com a pandemia do coronavírus, em 2020, a estimativa era de que esse número dobrasse, atingindo a ordem de 30%. Este ano, a Agência Nacional de Águas (ANA) apontou o montante de R$ 65.308.003,71 milhões de inadimplência relativa à cobrança pelo uso dos recursos hídricos. Um apanhado demonstrou, com base nesse relatório, que os 100 maiores inadimplentes são responsáveis por 70,64% da dívida, o equivalente a R$ 46.128.846,90, valor que significa a perda de mais de um ano de arrecadação, levando em conta a arrecadação na ordem de R$ 42 milhões. No ano de 2022 foram investidos R$ 55.337.224, quase o dobro de 2021, quando foram investidos R$ 28.557.227 em toda a bacia. “Há setores importantes, principalmente da economia, com a mentalidade que remonta ao século passado. Não querem pagar, acreditando ainda que a água é infinita e não existe responsabilidade com a gestão. Isso cria problemas sérios. Quem não paga, tende a fazer uso inadequado ou excessivo,

sem contribuir em nada para manter a saúde dos ecossistemas. À medida que se usa algo e não se paga por isto, além de dar mau exemplo, também se retira o recurso para manter a saúde dos ecossistemas. O problema que se impõe hoje é: que preço vamos pagar até adquirirmos essa consciência? Estamos vendo as catástrofes ambientais cada vez mais destrutivas e onerosas. Vai chegar o dia em que não se terá mais dinheiro público para enfrentar a recuperação do que está sendo destruído a cada ano em função das tragédias climáticas”, avaliou Anivaldo Miranda, ambientalista e coordenador da Câmara Consultiva Regional do Baixo São Francisco. “Isso demanda tempo, persistência, que as pessoas não percam a crença no futuro e na eficácia do caminho que estamos construindo, acho que todos os fatores vão demonstrar cedo ou tarde que estamos no caminho certo e que precisamos acelerar o passo para transformar a vida no planeta mais sustentável, o que não temos feito até agora”.

Recentemente, segundo Anivaldo Miranda, o país vivencia a tentativa de desmonte da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), com a possibilidade de retirada do repasse de 0,7% da Compensação Financeira pelo Uso de Recursos Hídricos (CFURH) no setor energético. Em tramitação no Congresso Nacional, a proposta consta do projeto de lei do senador Luís Carlos Heinze (PP/ RS). “O PL 2918/2021 pretende acabar com o repasse de 0,75% da CFURH à ANA e Saneamento Básico, recursos da ordem de R$ 217 milhões por ano (2022), com aplicação vinculada à Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) e nãocontingenciáveis. Recurso este com que a ANA vem cumprindo sua missão”, afirmou Ângelo Lima, secretário executivo do Observatório da Governança das Águas. “Imaginemos um país, que vive ao mesmo tempo seca e cheia, sem poder planejar a partir dos dados dessa rede? Teremos mais catástrofes. A proposta destinaria aquilo que até então é destinado à PNRH e ao SINGREH para beneficiar marginalmente um pequeno conjunto de 727 municípios já beneficiados pela maior parte da CFURH”.

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Infraestrutura

Um olhar profundo sobre o programa que está transformando a gestão da água no Brasil

FAZENDO ÁGUA

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Por: Mariana Martins Fotos: Fernando Piancastelli

Até muito pouco tempo atrás, parecia que a água nunca iria acabar, um recurso inesgotável, que se poderia seguir desperdiçando. Pois bem: agora se sabe que não é bem assim. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), até 2050, pelo menos uma a cada quatro pessoas viverá em um país que enfrentará a falta de água potável. Hoje, mais de 2 bilhões de seres humanos no mundo já não possuem acesso à água para consumo próprio. Diante desta impossibilidade de futuro, caso o mundo siga na mesma toada, a Agência Nacional de Águas (ANA) decidiu, então, agir. O Programa Produtor de Água veio para revolucionar a gestão das águas no Brasil. Atualmente, são 60 projetos apoiados pelo programa, abrangendo 72 municípios brasileiros. Desses projetos, 31 possuem arranjos ativos para o Pagamento pelos Serviços Ambientais (PSA). Os valores pagos em PSA atingem hoje aproximadamente R$ 5,25 milhões, beneficiando cerca de 1.000 produtores rurais. De acordo com o superintendente de Planos, Programas e Projetos da ANA, Henrique Veiga, até o momento foram beneficiadas 2.500 propriedades rurais, totalizando cerca de 86.000 hectares, distribuídos em nove regiões metropolitanas, de 13 estados e no Distrito Federal, atingindo direta ou indiretamente mais de 1,6 milhão de brasileiros. “A partir de relatos apresentados pelas estruturas locais de gestão dos projetos acerca dos impactos das práticas conservacionistas na melhoria da qualidade dos corpos hídricos, destacam-se o surgimento ou o restabelecimento de nascentes, o aumento da produtividade agrícola, a regularização da vazão do curso hídrico trabalhado e a melhoria da qualidade da água”, ressaltou Veiga.

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O Que é isto? O Programa Produtor de Água é uma abordagem inovadora que reconhece o papel dos produtores rurais na conservação e gestão sustentável da água. Ele oferece incentivos financeiros, capacitações e apoio para que esses atores adotem práticas que ajudem a proteger e restaurar as nascentes, os rios e os reservatórios de água. A lógica por trás do programa é simples: os produtores rurais que implementam medidas para preservar a água em suas propriedades são recompensados financeiramente por isso. Essas medidas incluem proteção e reflorestamento de áreas de preservação permanente, construção de barraginhas, construção de terraços, cercamentos, aceiros, instalação de fossas biodigestoras e outras práticas que reduzem a erosão e a contaminação da água. Na região do Alto São Francisco, o programa é comandado e executado pelo membro do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco e também presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica dos Afluentes do Alto São Francisco, Dirceu Costa. De acordo com ele, “é realizado, inicialmente, levantamento de áreas potenciais para a implantação de ações. Em seguida, é elaborado um diagnóstico socioambiental da microbacia, e uma valoração econômica para serviços ambientais. Então, é feito um projeto da unidade rural pertencente ao programa, e o produtor rural, dono da unidade, assina um contrato se comprometendo a investir em ações que beneficiem a qualidade e quantidade de água. Consequentemente, é feito o pagamento por serviços ambientais (PSA) aos produtores, conforme resultados obtidos”. Vários produtores rurais do Alto São Francisco já foram contemplados com o PSA, dentre os quais moradores de Piumhi, Doresópolis, Pará de Minas, Pimenta, Capitólio, Passos, Formiga, Luz, Bom Despacho e Carmo do Cajuru. “Realizamos as visitas técnicas de tempos em tempos, nos reunimos com os produtores, avaliamos e monitoramos o andamento do Programa”, explicou Dirceu. Dia a dia

lugar das fossas negras”, contou: “Tivemos também barraginhas construídas na propriedade, pois na época das chuvas as estradas ficavam muito ruins. Com o cercamento, temos a nossa reserva (Área de Proteção Permanente – APP) totalmente protegida. Então, é com muito prazer que a gente faz esse trabalho, e acho que mais pessoas deveriam aderir, porque é bom para a natureza, é bom para todo mundo”. Parcerias Há dez anos, o Ministério Público tornou-se um dos parceiros do Programa Produtor de Água na região do Alto São Francisco. Convencido pela ANA a aderir, o órgão passou a fomentar projetos, emprestando a credibilidade institucional na organização dos repasses financeiros. O promotor André Vasconcelos destaca que os benefícios do programa vão além das melhorias ambientais. “A proteção ambiental proposta pelo PPA facilita e impulsiona a parte agronômica das propriedades. As técnicas implantadas pelo projeto não apenas promovem a produção de água, mas também melhoram substancialmente a produção tradicional, seja na criação de gado, no cultivo de café ou em outras atividades presentes nas propriedades”. Outro importante parceiro na implementação do PPA no Alto São Francisco é o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM), entidade que integra o Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema) e o Sistema Estadual de Recursos Hídricos (SEGRH), em Minas Gerais. “A parceria do IGAM junto aos produtores ocorre através das chamadas UGPs - Unidades de Gestão de Projetos. Essas unidades são criadas para realizar a gestão do Projeto e estarem mais próximas das comunidades envolvidas, em especial do produtor rural que exerce um papel fundamental, pois em sua propriedade é que serão desenvolvidas as ações para promover a melhoria da qualidade e quantidade de água”, explicou o diretor-geral do Igam, Marcelo da Fonseca.

Produtor rural em Doresópolis, Hélio Francisco de Camargos, mais conhecido na região como Tio Gordo, foi beneficiado com o Programa Produtor de Água. Na sua propriedade, que antes sofria com enchentes, foram construídas barraginhas. Ao mesmo tempo, as nascentes foram cercadas, para impedir a entrada de animais. Segundo ele, o dinheiro do PSA é utilizado para a manutenção das benfeitorias. “Utilizamos o recurso para consertar uma cerca que estraga, mas também para o plantio de árvores”, comentou. Para Hélio, o importante agora é ampliar o acesso dos produtores rurais ao programa. “Principalmente meus vizinhos, para que eles possam me ajudar. Se eles me ajudassem, conseguiríamos produzir bem mais água”.

Também parceiro no PPA, o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, de acordo com o coordenador da Câmara Consultiva Regional do Alto São Francisco, Altino Rodrigues, prevê, em sua proposta, o aporte de recursos no Programa Produtor de Água. A ideia, inclusive, é expandir o programa para outras regiões da bacia. Existem duas áreas com potencial para a aplicação do Pagamento por Serviços Ambientais: o Alto São Francisco e o Médio São Francisco. “A escolha estratégica baseia-se na capacidade dessas regiões de produzir água, prevendo uma eficiência maior do PPA nesses territórios específicos. Assim, a intenção inicial é expandir o programa para o Médio São Francisco, visando potencializar seus impactos positivos em termos de conservação e qualidade dos recursos hídricos”, disse.

A adesão dos produtores rurais ao projeto vem ocorrendo de maneira orgânica, sobretudo via recomendações positivas. Em Piumhi, a produtora rural Xênia Almada conta que o Programa Produtor de Água chegou na hora certa na propriedade que administra, cuja produção gira em torno do gado leiteiro. “Tínhamos fossas negras na propriedade, e não estávamos gostando daquilo. O programa instalou dois biodigestores no

O sucesso do programa está diretamente relacionado aos projetos que seguem a sua linha de atuação, com gestão por parcerias, adesão voluntária e isonômica de produtores rurais, adequação ambiental, consentida e pactuada de propriedades rurais, uso das melhores e mais adequadas técnicas de intervenção no ambiente, mensuração e monitoramento dos resultados ao longo do tempo e, quando cabível, pagamento por serviços ambientais. De acordo

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Produtores rurais, em Doresópolis (MG)

com Henrique Veiga, da ANA, “os parceiros envolvidos nos projetos, sejam da sociedade civil, de empresas, de estruturas de governo, são, em síntese, os responsáveis diretos pelo sucesso dos projetos e cabe a eles se engajarem e permanecerem envolvidos ao longo do tempo, pois isso é o que, no entendimento do Programa, faz a diferença em termos de resultados ambientais e manutenção de seus impactos ao longo do tempo”. Expansão e impacto futuro Segundo o superintendente de Planos, Programas e Projetos da ANA, Henrique Veiga, “como próximos passos pretende-se estabelecer o reconhecimento de outras iniciativas existentes, validando a condução de projetos e divulgando seus resultados para parceiros que tenham interesse em investir ou estudar esse modelo de revitalização de bacias hidrográficas. Além de todo o suporte para os órgãos gestores e Comitês de Bacia na utilização do modelo e na busca por financiamento de projetos dessa natureza. O entendimento é que a sustentabilidade ou continuidade ao longo do tempo do Programa está cada vez mais atrelada ao protagonismo e empoderamento das estruturas de governança locais e regionais dos projetos. E que estes se consolidem como uma fonte de articulação, de criação de capacidade e conhecimento e de divulgação de resultados para a sociedade”.

Os Pilares Pagamento por Serviços Ambientais (PSA): os proprietários rurais recebem incentivos financeiros para adotar práticas de conservação do solo e da água, como a recomposição de áreas degradadas e a preservação de matas ciliares. Esse pagamento é realizado com base nos serviços ambientais prestados, como a melhoria da qualidade da água e a recarga de aquíferos. Assistência técnica: os participantes do programa recebem orientação técnica especializada para implementar práticas sustentáveis em suas propriedades. Isso inclui o uso adequado de agroquímicos, técnicas de agricultura de conservação e manejo integrado de bacias hidrográficas. Monitoramento ambiental: a qualidade da água é monitorada de forma contínua, avaliando os resultados das práticas adotadas. Isso garante que as ações de conservação estejam gerando benefícios tangíveis para o ecossistema aquático. Investimento nas obras: construção de barraginhas, terraços, cercas, plantio de mudas, instalação de fossas, que vão garantir a melhora da qualidade e o aumento da produção da água, objetivo primordial do programa

Assista ao vídeo sobre o Programa Produtor de Água (ANA) na região do Alto São Francisco: Acesse: bit.ly/ppa-alto-sf

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PERFIL

Por: Karla Monteiro Fotos: Manuela Cavadas

ESTOU VOLTANDO PRA CASA Mineira de Teófilo Otoni, mas radicada na Bahia há 16 anos, a economista Elba Alves, mestre em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental, assumiu a direção geral da Agência Peixe Vivo Nos idos de 1997, ainda cursando economia na PUC-MG, a mineira Elba Alves se viu, de repente, obrigada a se mudar para Porto Alegre. Não conhecia a cidade, não tinha amigos e, ainda por cima, teria que esperar a conclusão da transferência entre faculdades. Sem nada para fazer, resolveu, então, seguir o conselho da irmã mais velha, Eraly, que já se encontrava instalada na capital gaúcha há mais tempo, cursando o mestrado no Instituto de Pesquisas Hidráulicas, IPH, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Por que não fazer um curso técnico de hidrologia? A princípio, achou a ideia estranha, distante do seu contexto. Afinal de contas, era estudante de Economia e não conseguia enxergar a relação entre uma coisa e outra. Mas prestou os exames de admissão assim mesmo. Daí em diante, a vida tomaria um rumo totalmente inesperado. Duas décadas depois, em fins de outubro de 2023, Elba assumiu a diretoria geral da Peixe Vivo, a agência de bacia que serve, entre outros Comitês, o Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco (CBHSF). Para ela, além de representar um novo desafio, a Peixe Vivo é a coroação de uma carreira que começou por acaso e se tornou vocação. “Sempre admirei muito o trabalho da Peixe Vivo e ser a diretora geral da agência é muito desafiador. Além disso, uma conquista imensa. No processo de seleção, tinha gente de altíssima qualificação”, comentou Elba, que, quando da entrevista para a revista CHICO, ainda preparava as malas para se mudar para Belo Horizonte, após 16 anos vivendo em Salvador. “Minha formação está muito ligada à implantação de processos de cobrança. Na Bahia, onde a cobrança está em processo de implementação, evoluímos muito nesse sentido”.

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Nascida em Teófilo Otoni, no Vale do Mucuri, Minas Gerais, Elba chegou a Salvador em 2007. Antes disso, no entanto, o mundo deu cambalhotas. Primeiro, ela concluiu o curso técnico em hidrologia, em Porto Alegre, já com uma certeza: iria voltar para Minas, terminaria a faculdade de economia e, assim, com a graduação pronta, regressaria ao IPH para fazer mestrado. “Sou muito determinada”, comentou, ressaltando que havia escolhido até mesmo o orientador, o professor Eduardo Lanna, uma das grandes referências na área de recursos hídricos da América Latina. O plano deu certo. Com o título de mestre em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental, ela resolveu, então, passar férias na Bahia: “Vim visitar a minha irmã que havia se mudado para Salvador. Olha como são as coisas!”.

BA), chegando à Superintendência de Inovação e Desenvolvimento Ambiental. Na opinião dela, não há mais como negar as mudanças climáticas, diante dos trágicos eventos extremos dos últimos meses, como as enchentes de Nova York e do Rio Grande do Sul. Sendo assim, mais do que nunca, será preciso pensar e investir na gestão dos recursos hídricos. “Sou bastante esperançosa. O desafio é mundial. Mas os tomadores de decisão já entenderam que precisamos unir forças para mitigar o cenário que temos por vir. Não se trata de um cenário fácil”, comentou: “Mas sou sempre muito positiva. Os instrumentos econômicos, como a cobrança pelo uso da água, servem exatamente para instigar a mudança de mentalidade e comportamento. Um dos objetivos da cobrança é dar racionalidade ao uso”.

Na capital baiana, Elba fez carreira. Entre 2007 e 2011, trabalhou no Instituto de Gestão das Águas e Clima do Estado da Bahia (INGÁ) e, a partir de 2011, navegou por importantes instâncias da Secretaria do Meio Ambiente do Estado da Bahia (SEMA/

“Trabalhando na SEMA, eu fazia a representação institucional nos Comitês de Bacia. E, no CBHSF, em 2007, comecei a trabalhar justamente na Câmara Técnica de Outorga e Cobrança (CTOC). Fui secretária dessa Câmara Técnica até recentemente”, relatou:

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“Fui para a CTOC quando começou a efervescência da implantação dos modelos de cobrança. Acompanhei pela CTOC esse trabalho”. Aos 50 anos, Elba parecia feliz com as mudanças. “Estou voltando para casa, sô”, comentou ela, que não perdeu o sotaque e continua torcedora do Galo, como é chamado o Clube Atlético Mineiro. Cozinheira nas horas vagas, garante que o seu feijão tropeiro, prato típico da culinária de Minas Gerais, é muito elogiado. “Gosto de fazer feijão tropeiro e peixe ensopado. Mineiro não gosta de dendê, então não é moqueca baiana. Cozinhar é minha terapia” comentou. Otimista por natureza, acredita que dias melhores virão. “Eu aposto que estamos caminhando para uma mudança de mentalidade. Aposto muito na educação ambiental”, disse, completando: “Em 1997, quando fui para Porto Alegre, eu me assustei com a proposta da minha irmã para eu fazer um curso técnico em hidrologia. Hoje, combinar a formação em economia com a gestão de recursos hídricos está dentro do normal. Sem dúvida, a consciência ambiental só evolui”.


O propósito da Agência é oferecer suporte técnico-operativo para a gestão dos recursos hídricos nas bacias hidrográficas sob sua jurisdição. Isso se concretiza por meio do planejamento, execução e acompanhamento de diversas iniciativas, como ações, programas, projetos, pesquisas e outros procedimentos, todos alinhados com as diretrizes e deliberações dos Comitês de Bacia, assim como dos Conselhos de Recursos Hídricos Estaduais e Federais. Sua atuação se estende por seis estados e o Distrito Federal, abrangendo Minas Gerais, Goiás, Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe.

Dentre as inúmeras ações de secretariado e apoio técnico que a Agência Peixe Vivo executa figuram a execução de Projetos de Recuperação Hidroambiental, elaboração de Planos Municipais de Saneamento Básico (PMSB), Programas de Educação Ambiental (PEA), Campanhas de Comunicação e Mobilização Social, bem como estudos e obras que objetivam a melhoria da qualidade e quantidade das águas nas bacias hidrográficas de sua competência. Todos os projetos são financiados com recursos oriundos da cobrança pelo uso dos recursos hídricos. Os impactos da atuação da Agência alcançam potencialmente mais de 20 milhões de pessoas nas áreas abrangidas. Em 2022, mais de 66 milhões de reais provenientes da cobrança pelo uso da água foram aplicados em ações e programas voltados para as bacias hidrográficas atendidas.

Pedro Vilela

A Peixe Vivo em ação

Criada em 2006 como resposta à necessidade de gestão eficiente das águas na Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas, a Agência Peixe Vivo atende hoje dois Comitês estaduais mineiros, CBH Velhas (SF5) e CBH Pará (SF2), além do Comitê Federal da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF).

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Movimento social

AVANTE 34

Em sua sétima edição, a Marcha das Margaridas de 2023 foi considerada a maior mobilização de mulheres da América Latina. Entre as reivindicações das 100 mil mulheres que tomaram Brasília, em agosto, a vital recuperação da bacia do Rio São Francisco


Por: Hylda Cavalcanti Fotos:Agência Senado

MARGARIDAS

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“É melhor morrer na luta do que morrer de fome”: o grito de Margarida Maria Alves, a líder sindical paraibana assassinada em 12 de agosto de 1983, jamais foi calado. Entre os dias 15 e 18 de agosto, 40 anos depois do brutal assassinato, a Marcha das Margaridas chegou à sétima edição. Desta feita, com a pauta ampliada. Além da histórica reivindicação por melhorias das condições do trabalho no campo, mulheres vindas de todas as partes do Brasil e de mais 34 países aderiram à luta pela revitalização das bacias hidrográficas, sobretudo a bacia do Velho Chico. Com a presença do presidente Lula e da primeira dama Janja, o evento reuniu em Brasília mais de 100 mil mulheres. A primeira edição ocorrera em agosto de 2000, quando cerca de 20 mil mulheres tomaram a capital federal carregando com elas a voz da líder sindical morta a tiros, na porta de casa, em Alagoa Grande, por um pistoleiro a mando de latifundiários da região.

O que elas querem

Realizada de quatro em quatro anos, a Marcha das Margaridas de 2023 monopolizou Brasília por quatro dias. Praticamente todos os ministros de Estado estiveram presentes em algum momento das mobilizações. Na programação, passeatas, debates, encontros com autoridades e até homenagens no Congresso Nacional. “A marcha deste ano ficou marcada como a maior ação de mulheres da América Latina. Estou aqui ao lado de mulheres do campo, das florestas e das águas de todo o Brasil, para ouvir os movimentos sociais e, juntos, reconstruirmos o país”, disse Lula na abertura.

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No mesmo tom, a coordenadora do evento, Mazé Morais, destacou que, certamente, a edição “renderá frutos históricos”. Em nome do Ministério das Mulheres, coube a Cida Gonçalves resumir: “Quando as mulheres marcham, não é só por elas. É pelo Brasil, pelos filhos, pela vida, pela dignidade, cidadania e democracia” Estimulada pelo poder público, a marcha também representou a retomada de movimentos sociais, que perderam espaço durante o governo Bolsonaro. Conforme explicou Mazé: “Nossa ideia é voltar a ter o diálogo que foi interrompido”. Afinal de contas, de acordo com Cícera Costa, secretária de Mulheres da Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais do Ceará (Fetraece), “cerca de 70% dos alimentos produzidos hoje no Brasil, que chegam à mesa dos brasileiros, vêm da agricultura familiar. Contudo, mesmo com esses números, diversas mulheres do campo ainda têm dificuldades em acessar políticas públicas e assistência técnica que contribuam com sua produção”. Segundo enfatizou Cícera: “A gente acompanha os diversos programas, projetos, ações, elaborando pautas, em reuniões com as mulheres para trabalhar no empoderamento feminino, dizer não à violência, [tratar de] as questões sociais, as questões de paridade. São bandeiras de luta pelas quais atuamos, para que possamos nos desenvolver”. De acordo com Mazé Morais, as Margaridas não se restringem a 100 mil ou 200 mil mulheres: “Somos milhões. Trouxemos apenas uma parte da imensidão que existe fora daqui, para apresentar uma agenda importante que nos ajude a reconstruir o Brasil e alcançar o bem viver. Isso significa que queremos estabelecer uma relação de

Democracia participativa e soberania popular Poder e participação política das mulheres Autodeterminação dos povos, com soberania alimentar, hídrica e energética Democratização do acesso à terra e garantia dos direitos territoriais e dos maretórios (espaços constituídos a partir do mangue e do mar)

não exploração com a natureza. Usufruir do direito de viver em nossas terras e territórios e propor novas formas de produção de alimentos baseada na agroecologia”. A indígena Gracilda Pereira, da etnia Aticum-Jurema, de Petrolina (PE), também se manifestou. Segundo ela, muitas mulheres indígenas que vivem na bacia do São Francisco estavam ali pelo mesmo motivo: pedir a demarcação dos territórios. Afinal de contas, as comunidades tradicionais são fundamentais para promover a preservação do Velho Chico. “A nossa área da saúde indígena é descoberta. Não temos agente de saúde, nem médico. A unidade mais próxima, quando alguém precisa se consultar, é só para urgência. E há também a questão da educação. Os alunos frequentam escolas no município, fora da aldeia. São muitas carências, principalmente no Vale do São Francisco”, destacou Gracilda. Ao que a trabalhadora rural Suzana da Silva Pimentel, que saiu de Monte Santo, na Bahia, completou: “Só de sair do interior da Bahia e vir para essa aglomeração, no coletivo com mulheres de outras regiões, mostra uma força. Demonstra o quanto a gente precisa se organizar. E quem tem que se organizar e lutar somos nós, mulheres que estamos lá na Caatinga, as mulheres catingueiras”.

Vida saudável com agroecologia, segurança alimentar e nutricional

Saúde, previdência e assistência social pública, universal e solidária

Direito de acesso e uso da biodiversidade, defesa dos bens comuns e proteção da natureza com justiça ambiental e climática

Universalização do acesso à internet e inclusão digital

Autonomia econômica, inclusão produtiva, trabalho e renda Educação pública não sexista e antirracista, e direito à educação do e no campo

Vida livre de todas as formas de violência, sem racismo e sem sexismo Autonomia e liberdade das mulheres sobre o seu corpo e a sua sexualidade FONTE: Contag


Quintais Produtivos das Mulheres Rurais

O que o governo prometeu

Para promoção da segurança alimentar e nutricional, além da autonomia econômica. Até 2026, serão 90 mil quintais em todo o Brasil Retomada da Reforma Agrária com prioridade para as mulheres rurais Oito novos assentamentos, 5.711 novas famílias assentadas e 40 mil famílias regularizadas Programa Nacional de Cidadania e Bem Viver para Mulheres Rurais Garantir o acesso à documentação, à titulação conjunta da terra e ao território.

Lavanderias Coletivas Projeto piloto com a instalação de nove unidades de assentamentos em três estados do Nordeste (Piauí, Rio Grande do Norte e Ceará) Criação da Comissão Nacional de Enfrentamento à Violência no Campo (CNEVC) A finalidade é atuar na mediação de conflitos no campo Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios O objetivo é prevenir todas as formas de discriminações, misoginia e violências de gênero contra as mulheres por meio de ações intersetoriais com perspectiva de gênero. Entre as ações previstas está a entrega de 270 unidades móveis para o atendimento direto

de acolhimento e orientação às mulheres, mais 10 carros, dos quais a metade servirá para locomoção das equipes e os demais para transportar equipamentos de atendimento às usuárias. Além disso, serão destinados barcos e lanchas para regiões com necessidade de implementação do serviço fluvial para o atendimento das mulheres das florestas, das águas e do Pantanal. Bolsa Verde Programa de Apoio à Conservação Ambiental, que prevê um pagamento a famílias inseridas em áreas protegidas. O objetivo é incentivar a conservação. Antes, o pagamento por família era de R$300. Agora passa a ser de R$600. FONTE: Secom/Presidência da República

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Gastronomia

Por: Andréia Vitório Fotos: Azael Gois

QUEIJO

SERTANEJO Graças à Fiscalização Preventiva Integrada da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (FPI), as queijarias do sertão de Sergipe estão se profissionalizando e diversificando a produção.

Nem só de queijo coalho vive o sertão sergipano. Com o empurrão da Fiscalização Preventiva Integrada da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco em Sergipe (FPI/SE), na edição realizada entre os dias 23 de julho e 4 de agosto, as queijarias locais deram um salto de qualidade e diversidade. “Decidimos nos regularizar e procuramos todos os meios legais para isso”, comentou Bruna Letícia Santos Aragão, gerente de produção e sócia do Laticínio LagGlória, localizado na cidade de Nossa Senhora da Glória: “Conquistamos o SIE (Selo de Inspeção Estadual) e depois o selo SISBI (Sistema Brasileiro de Inspeção de Produtos de Origem Animal) – que permite à empresa vender em todo o Brasil.

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De acordo com Bruna, a última FPI/ SE serviu de pontapé para a revolução na forma de produzir e comercializar laticínios no interior sergipano. Foram percorridos 14 municípios da região média do São Francisco, mobilizando cerca de 200 profissionais e nove grupos de fiscalização, incluindo o Grupo Abate, responsável por fiscalizar a regularidade de matadouros, laticínios e mercados municipais. Presidente do CBHSF, Maciel Oliveira lembrou que a FPI funciona como indutor de políticas públicas, indo além da fiscalização: “A partir da FPI, muitas queijarias se regularizaram. E o que é que essas queijarias têm a ver com o São Francisco? Primeiro, é uma questão de saúde pública, já que as pessoas consumiam queijos produzidos em condições inadequadas. Além da segurança alimentar, todas essas queijarias geravam efluentes por conta das pocilgas, lançando dejetos altamente impactantes nos corpos hídricos, afluentes do São Francisco.”


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Desta vez, 21 queijarias e laticínios foram fiscalizados pela FPI/SE. Sete empresas apresentaram irregularidades sanáveis e não tiveram interrupção do funcionamento; outras sete, detectadas com irregularidades graves e insanáveis, foram interditadas até que se regularizem, enquanto as sete restantes funcionavam em condição regular – sendo que quatro delas estavam sendo revisitadas, a exemplo da LacGlória, da Ouro Bom e da Fazenda Nova, esta última operando de modo exemplar, atendendo a todas as regras para produção de queijos e laticínios, conforme ressalta o Diretor do Centro de Apoio Operacional do São Francisco e Nascentes do Ministério Público de Sergipe, o promotor de justiça Sandro Luiz da Costa, que integrou o Grupo Abate. “Além da questão ambiental, dos efluentes, dos dejetos, dos resíduos, da poluição atmosférica, há também a questão da saúde e do Direito do Consumidor, que é violado a partir do momento em que uma empresa que deve produzir produtos que exigem alto nível de higiene e de qualidade de produção são colocados no mercado sem que haja uma preocupação com isso”, ressaltou Costa. “Fazendo um paralelo entre as duas FPIs na região, a de 2016 e esta, de 2023, as empresas que foram revisitadas tiveram uma melhora substancial”.

Maria Joseane, proprietária da Queijaria Fazenda Nova

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Novos rumos O Laticínio LacGlória, uma das queijarias revisitadas pela equipe fiscalizadora, é uma empresa familiar que começou suas atividades há 25 anos. Produz queijo mussarela, queijo coalho e manteiga, conta com 18 funcionários e utiliza cerca de 22 mil litros de leite por dia para dar conta da produção. Antes, eram em torno de 10 a 15 mil litros/dia. De acordo com Bruna, a fiscalização promoveu mudanças positivas: paralelamente à corrida para regularizar a documentação da fábrica, novos equipamentos foram comprados para adequar a fabricação dos produtos aos padrões exigidos. Com o aperfeiçoamento, as vendas aumentaram, levando os produtos à capital Aracaju e a estados como Paraíba e Alagoas. Dois novos funcionários foram contratados, um para o controle de qualidade dos produtos e outro para a limpeza, agora valor essencial da LacGlória. Quem também decidiu mudar os rumos do seu negócio foi a proprietária da Queijaria Fazenda Nova, Maria Joseane. A mudança também contou com o incentivo da fiscalização “que mostrou os caminhos para a conquista do Selo de Inspeção Estadual”, permitindo a comercialização em todo o estado. A queijaria foi fundada há 8 anos, mas a regularização veio tempos depois, em fevereiro de 2023. Hoje são quatro funcionários e uma produção focada em queijos mussarela, requeijão, frescal, condimentados e manteiga. Cerca de 2 mil litros de leite são utilizados por dia.

“Estamos passando por um processo de adaptação, buscando novos mercados, mais qualificação e crédito para continuar melhorando e crescendo”, salientou Maria Joseane. “Essa conquista é um sonho de infância. A família do meu esposo é de queijeiros e já estamos na terceira geração de queijaria, então ver o que construímos até agora é gratificante e nos dá coragem para querer ir mais longe”. Atualmente com 70 funcionários, o Laticínio Ouro Bom avançou rumo à qualificação e se tornou referência na região ao produzir queijos tipo mussarela, prato e coalho, além de manteiga, seguindo normas legais de funcionamento. Para a produção, 50 mil litros de leite são usados por dia. “A primeira FPI nos incentivou a sair da ilegalidade”, contou Alan Diego Barros Silveira, diretor-geral da empresa fundada em 1993 e só recentemente regularizada após conquistar os selos de inspeção estadual e federal, SIE e SISBI, que atestam a procedência dos produtos comercializados e permitem ampliar o mercado. As melhorias não param. A Ouro Bom, também situada em Nossa Senhora da Glória, segue investindo em maquinários, estrutura, tanques para captação de produtores e qualidade. “Foi um sonho dos meus pais que hoje eu e meu irmão conseguimos colocar em prática. Nossa empresa já tem 30 anos e vê-la regularizada, crescendo e ajudando a desenvolver o povoado, gerando emprego e renda, é muito emocionante”, finalizou.


Outros Carnavais Conforme relato da médica veterinária Salete Dezen Vieira, que, desde 2016, participa de todas as ações da FPI/SE, as queijarias da região contemplada pela FPI em Sergipe atuavam de forma irregular, sem higiene, tanto do local, quanto dos manipuladores. Eram comuns pocilgas próximas ao local de manipulação para facilitar a alimentação dos suínos e muitas moscas no espaço de fabricação – nenhuma delas possuía licenciamento ambiental. A partir da primeira FPI, de 2016, foram estabelecidos critérios básicos para o funcionamento e a regularização da indústria: retirada imediata da pocilga, atendendo a uma distância dentro da legislação; piso de alta resistência; tela nas portas e janelas; forro; manipuladores uniformizados, equipamentos de inox, não sendo permitido artefatos de madeira na fabricação. Atualmente, muitas queijarias possuem o licenciamento ambiental e estão se adaptando às normas sanitárias para obter o serviço de inspeção. As instalações dos empreendimentos melhoraram, assim como a conscientização dos proprietários e dos consumidores quanto à importância de produzir e consumir um produto feito em condições adequadas. “Das cinco edições realizadas na região, foram fiscalizadas mais de 100 queijarias, muitas delas revisitadas e encontradas com uma estrutura completamente diferente da inicial”, comentou Salete.

Bruna Letícia Santos Aragão, gerente de produção e sócia do Laticínio LacGlória

O boom

No sertão sergipano, são mais de 300 queijarias que recebem de produtores locais uma média de 3000 litros/diários de leite. O fechamento de uma grande indústria na região, na década de 1990, explica o crescimento exponencial das pequenas queijarias, já que os produtores se viram sem ter onde colocar a produção e tiveram que recomeçar. A tradição na produção de queijo artesanal ganhou força com a diversificação e a introdução de novos produtos como queijo mussarela e queijo manteiga. A região do Alto Sertão sergipano se caracteriza por pequenas propriedades rurais que vivem um longo período de estiagem durante o ano e têm forte aptidão para criação de bovinos de leite. A produção leiteira é responsável por boa parte dos empregos, numa cadeia produtiva que começa bem antes, com plantio e produção do milho para silagem ou ração, e segue com cultivo e cuidados com palma forrageira, manejo de animais e, claro, indústria.

A Fiscalização Preventiva Integrada da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco em Sergipe (FPI/SE) foi realizada de 23 de julho a 4 de agosto de 2023 e contou com uma equipe multidisciplinar de 200 profissionais e 30 instituições parceiras, incluindo equipes de segurança da Polícia Rodoviária Federal e da Polícia Militar. A coordenação foi dos Ministérios Públicos Estadual, Federal e do Trabalho e do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF). Municípios visitados Alto Sertão Sergipano: Canindé do São Francisco, Poço Redondo, Porto da Folha, Monte Alegre de Sergipe, Nossa Senhora da Glória, Gararu, Nossa Senhora de Lourdes. Médio Sertão Sergipano: Aquidabã, Graccho Cardoso, Itabi e Feira Nova. Baixo são Francisco Sergipano: Canhoba, Malhada dos Bois e Amparo de São Francisco. A Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) é um programa continuado, de caráter principalmente educativo, com foco em proteger o meio ambiente e a vida das pessoas na bacia do Rio São Francisco.

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Literatura

Por: Karla Monteiro Ilustração: Albino Papa

O SERTÃO DE ITAMAR Ambientado na Chapada Diamantina, sertão da Bahia, “Torto Arado” já atingiu a marca histórica de 700 mil exemplares vendidos. Na obra, Itamar Vieira Jr. retoma o romance regionalista, abraçando as questões, ao mesmo tempo ancestrais e contemporâneas, que perpassam a luta pela terra Quando as gêmeas Bibiana e Belonísia surgiram na infinita imaginação de Itamar Vieira Jr., ele só tinha 16 anos. Então, despretensiosamente, começou a escrever o livro que o tornaria um escritor de 700 mil exemplares: “Torto Arado”. Enquanto se lê a incontornável obra, lançada em 2019, pela Todavia, inevitável deixar a cabeça vaguear de volta ao gênero que nos deu o melhor de nossa literatura: o romance regionalista. Vêm à lembrança Graciliano Ramos, Érico Veríssimo, Guimarães Rosa, Jorge Amado. Obviamente, não se trata de comparação de autores. Mas daquele sentimento poderoso que nos invade no encontro com um grande escritor. Nascido em Salvador, em 1979, Itamar já está no segundo bestseller: “Salvar o fogo”. Antes de chegar às livrarias, o novo livro havia emplacado 35 mil exemplares em sistema de pré-venda.

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O que é que o baiano tem? Sem dúvida, um dos feitos de Torto Arado é nos deslocar de volta para o interior do país. Como se olhar no espelho, reconhecendo-se na formação do tecido social brasileiro. A história gira em torno das irmãs Belonísia e Bibiana, nascidas e criadas na fazenda Água Negra, na Chapada Diamantina. Toda a trama que as envolve encontrase irremediavelmente conectada àquela terra – e suas ancestralidades. Na verdade, o sertão penetra em tudo, refletindo-se na dureza de alma dos personagens. Ainda crianças, as gêmeas, filhas de Zeca Chapéu Grande, o líder espiritual da comunidade, praticante do Jarê, religião exclusiva da Chapada Diamantina, encontram uma faca na mala da avó Donana. Todos haviam saído e elas se achavam sós. No meio da brincadeira, a língua de uma delas é decepada. Daí para frente, uma se torna a voz da outra e o leitor não sabe quem foi mutilado até atingir quase o final do romance.

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“Torto Arado” é um lugar em que o conhecimento da terra e o conhecimento do mundo se fraternizam”, escreveu o crítico Rodrigo Soares de Cerqueira, na revista Piauí. Nascido em Salvador, em 1979, Itamar foi mesmo fundo para construir a magistral obra. Aos 16 anos, iniciara a escrita, produzindo cerca de 80 páginas. Porém, com as mudanças da família, o manuscrito original acabou se perdendo. Muitos anos depois, já formado em geografia, ele resolveu retomar a ideia. Nesta altura, havia acumulado vasto conhecimento da vida no campo. Funcionário do INCRA por 15 anos, palmilhou o Brasil diverso, o Brasil que luta pela terra e pela sobrevivência no campo. São as vidas desta gente que não verga, apesar de invisibilizadas pelo poder do agronegócio, que ele trouxe para as páginas. “A gente fala do sertão, do semiárido, parece que se trata de uma coisa só, mas o sertão da Chapada tem uma regularidade de chuva, uma diversidade de paisagem, de mato, que salta aos olhos”, disse Itamar, ao lançar “Torto Arado”.

Na fazenda “Água Negra”, onde se desenrola o cotidiano de Bibiana e Belonísia, os trabalhadores não têm salário. Em troca do suor, ganham apenas o direito de plantar para a subsistência e também de construir casebres de barro. De alvenaria, não. Claro, quase todos são negros, descendentes de escravizados libertos havia poucas décadas. A individualização das irmãs só vai acontecer quando entra na trama o primo Silvério. Entre o amor das duas, o rapaz escolhe Bibiana – e, juntos, o casal foge, indo de encontro à formação política nos movimentos sociais de luta pela terra, retornando à Água Negra modificados. Enquanto isso, Belonísia permanece. Ao terminar de ler “Torto Arado”, impossível não estar completamente envolvido por essas gêmeas, que, num momento, se dividem, para, depois, voltarem a se fundir. “Sou um autor brasileiro que escreve a partir da Bahia. E a Bahia reúne muitas das referências que espelham o que é este país, então, meu próximo romance continuará voltado para as questões da terra”, declarara Itamar ao jornal El País, já anunciando “Salvar o Fogo”, que se passa no Recôncavo: “Sempre concebi Torto Arado como um projeto maior para falar dessa relação do homem com o seu território”.


Itamar Vieira Júnior (divulgação)

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Turismo

Por: Juciana Cavalcante Fotos: Marcizo Ventura

BELEZA NATURAL Em 2022 foram mais de um milhão de visitantes. Com paisagens de tirar o fôlego, o Monumento Natural do Rio São Francisco encontra-se hoje entre os dez lugares mais visitados do Brasil

Entre três estados, Bahia, Alagoas e Recife, esconde-se um dos lugares mais lindos do Brasil: o Monumento Natural do Rio São Francisco (MONA), que reúne num só recanto belezas de tirar o fôlego combinadas à riqueza cultural. Mesmo quem não é adepto do turismo ecológico se espanta com os cânions do Velho Chico, adornados pelos impressionantes sítios rupestres. Nos últimos anos, desde que a região se tornou área de proteção ambiental, cada vez mais gente vem descobrindo essa joia da natureza. Em 2022 foram mais de 1 milhão de visitantes. A partir de 2017, aliás, a região já figurava entre os 10 lugares mais visitados do país. Por enquanto, os equipamentos turísticos se concentram, sobretudo, nos municípios de Piranhas e Paulo Afonso, mas Canindé de São Francisco, e Delmiro Gouveia e Olho D’Água do Casado estão incrementando os investimentos. “Com a economia do turismo se dinamizando na região, há grande potencial de crescimento no setor”, comentou Emerson Leandro Costa de Oliveira, chefe do Núcleo de Gestão Integrada do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio Paulo Afonso). Segundo ele, a ideia é incrementar o turismo que, além de gerar negócios, oportunidades de trabalho e renda, busque valorização da cultura local. Só com desenvolvimento sustentável será possível preservar a Caatinga. “O ICMBio tratou no Plano de Manejo do MONA do Rio São Francisco de modo a estimular a organização do turismo na região, que ainda precisa ser aprimorada”, disse Oliveira, complementando que ainda falta muito para o ideal. “Os diversos segmentos do turismo (náutico, aventura, base comunitária, étnico etc.) são pouco integrados e o trade turístico não está capacitado”.

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Entre as principais aquisições do parque ecológico, ele cita a implementação de trilhas sinalizadas abrangendo mais de 15 quilômetros. Todas as trilhas são caminhos utilizados pelas comunidades e povos tradicionais da região há séculos e em algumas delas passaram personalidades e grupos históricos como o imperador Dom Pedro II, o empreendedor Delmiro Gouveia e o bando de Lampião. “O objetivo é que a trilha principal seja a Trilha Velho Chico, para conectar as UCs tanto federais, como estaduais, municipais e a Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN), desde a nascente do Rio São Francisco até a sua foz, integrando a Rede Brasileira de Trilhas”, completou.

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Ainda de acordo com o ICMBio o desafio agora é realizar um abrangente diagnóstico do perfil dos turistas que visitam os cânions do Velho Chico. De posse dessas informações, será possível elaborar a estratégia de desenvolvimento. Outra prioridade passa por estabelecer um Plano de Turismo de Base Comunitária, em que as próprias comunidades façam a gestão da visitação, valorizando a própria história e cultura. “Todos esses planejamentos devem buscar a integração com a Trilha dos Cânions do Rio São Francisco, aproveitando o potencial para atividades de arvorismo, astroturismo, balonismo, caminhada com pernoite, canionismo, escalada, espeleoturismo, iatismo, mergulho autônomo, mergulho livre, mountain bike, paraquedismo, passeio em animais de montaria, rafting, voo livre”, encerrou Oliveira.


Para não perder nada Os passeios pelos cânions incluem rotas que podem ser feitas a partir de pontos de partida em Paulo Afonso (BA), Alagoas e Sergipe. Os mais procurados estão em Alagoas onde os catamarãs saem para diversos passeios todos os dias, incluindo o trecho dos Cânions Ocultos em Alagoas e a Rota do Cangaço que leva o turista a conhecer o local onde o cangaceiro Lampião morreu. Todos os serviços são ofertados por empresas. Para acesso às trilhas, também é necessária autorização prévia, já que se encontram em sua grande maioria em propriedades particulares. Para passeios em catamarãs, os valores variam entre R$100 e R$190 reais por pessoa. Já o passeio de lancha, que oferece uma rota maior de cerca de cinco horas, custa a partir de R$600 com lotação de até três pessoas. A partir disso, os valores sofrem alterações. Trilhas mais conhecidas: Vale do Sal. Delmiro Gouveia, Alagoas Restaurante Castanho. Delmiro Gouveia, Alagoas. Mirante da Cruz. Delmiro Gouveia, Alagoas. Mirante da Paz. Delmiro Gouveia, Alagoas Assentamento Lameirão. Delmiro Gouveia, Alagoas. Cânions Dourados. Olho d’Água do Casado, Alagoas. Arte Rupestre no Assentamento Nova Esperança. Olho d’Água do Casado, Alagoas. Trem do Imperador. Piranhas, Alagoas. Vale dos Mestres no Assentamento Adão Preto. Canindé de São Francisco, Sergipe. Ecofazenda Mundo Novo. Canindé de São Francisco, Sergipe. Mirante do Santinho. Paulo Afonso, Bahia.

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Nos dias 15 e 16 de setembro, Paulo Afonso (BA) foi palco do V Seminário dos Povos Indígenas da Bacia do São Francisco. O evento reuniu representantes indígenas de toda a região, promovendo diálogos essenciais para a preservação cultural. Destacaram-se as presenças ilustres da Ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, e da primeira presidenta indígena da FUNAI, Joenia Wapichana, que abordaram as principais lutas enfrentadas pelos povos indígenas no Brasil.

Assista ao vídeo do evento em: bit.ly/V_Seminario

Marcizo Ventura

Por: Mariana Martins

Aconteceu

V Seminário dos Povos Indígenas da Bacia do São Francisco supera expectativas

Vire Carranca 2023

João Alves

Assista aos vídeos em: bit.ly/VireCarranca2023

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Os municípios de Felixlândia (MG), Paratinga (BA), Floresta (PE) e São Brás (AL) foram tomados por uma intensa programação cultural no Dia Nacional em Defesa do Velho Chico, em 3 de junho. A campanha ‘Eu Viro Carranca para Defender o Velho Chico’ focou nos povos e comunidades tradicionais da bacia, com o lema “Velho Chico: Gentes Tradições, Vidas” - um apelo para cuidar dos povos para preservar o rio e vice-versa.


Assista ao vídeo do evento em: bit.ly/XXVEncob-CBHSF

XXV Encob: Avanços e Desafios na Gestão das Águas

Entre os dias 21 e 25 de agosto, Natal (RN) sediou o XXV Encontro Nacional de Comitês de Bacias Hidrográficas (Encob). O CBHSF teve presença destacada, oferecendo um estande informativo e interativo. O evento proporcionou reuniões, oficinas e diálogos sobre os avanços e desafios na gestão das águas no Brasil.

Assista ao vídeo do evento em: bit.ly/III-Seminario

Frente Parlamentar em Defesa da Gestão e Revitalização do São Francisco Assista ao vídeo do evento em: bit.ly/FParlamentar

Em 13 de setembro, foi oficialmente criada em Brasília a Frente Parlamentar em Defesa da Gestão e Revitalização do São Francisco. Membros do CBHSF estiveram presentes, destacando a importância do envolvimento do parlamento brasileiro para a reabilitação social, cultural e ambiental da bacia.

Esgoto zero em Penedo (AL)

Azael Gois

Cristiano Costa

Paulo Afonso (BA) também foi sede do III Seminário das Comunidades Quilombolas da Bacia Hidrográfica do São Francisco, realizado nos dias 06 e 07 de outubro. O evento prestou homenagem à líder quilombola Mãe Bernadete, assassinada em agosto. As discussões abordaram os desafios enfrentados pelas comunidades, enfocando o fortalecimento de políticas públicas e mecanismos para melhorar a qualidade de vida.

Marcizo Ventura

III Seminário das Comunidades Quilombolas da BHSF

Uma iniciativa importante foi tomada para resolver a problemática do despejo de efluentes domésticos no Rio São Francisco. O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco e a Prefeitura de Penedo (AL) uniram forças, assinando a ordem de serviço para a implantação da rede coletora de esgoto no Centro Histórico da cidade. Com um investimento de R$2.405.682,48, busca-se eliminar o lançamento de esgoto no rio, promovendo ganhos significativos na saúde e na qualidade de vida da população local. As obras estão previstas para começar na segunda quinzena de novembro.

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CONG

Ensaio

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GADO Por: Bianca Aun

Os Reinados ficaram popularmente conhecidos como guardas de congado, uma das mais importantes manifestações da cultura negra de Minas Gerais. Em Carmópolis de Minas, no Centro Oeste do estado, a festa de N.S. do Rosário passa a tradição de geração em geração

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Bianca Aun é natural de Belo Horizonte, formou-se em Comunicação Social e atua como fotógrafa desde 1996. Iniciou na fotografia como assistente de seu pai, o fotógrafo Miguel Aun. Seu trabalho tem como foco principal eventos culturais, como cobertura de shows, teatro, artes plásticas, além de still para cinema e fotos para publicidade ou institucionais. Atua também como fotógrafa ambiental atendendo principalmente os Comitês de Bacias Hidrográficas do Rio São Francisco e Rio das Velhas. Participou de Exposições Coletivas e individuais, como o projeto “Aparecidas”, em 2014, e o “Lavanda”, exposto em 2023. As fotografias de Bianca Aun foram publicadas em diversos jornais e revistas e ilustraram livros e outras publicações.

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Léo Boi

cbhsaofrancisco.org.br


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