Revista Escola Avelar Brotero

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Director LINO VINHAL Maio 2010 Revista do Campeão das Províncias

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Índice

FICHA TÉCNICA

Edição

Deixámos marcas no século passado e vamos mantê-las no futuro

Felicitamos a Escola Secundário de Avelar Brotero pela passagem do seu 125.º Aniversário, os seus Professores, Alunos e Funcionários

DIRECTOR Lino Vinhal | COORDENAÇÃO EDITORIAL Geraldo Barros e Maria de Lourdes Figueira | TEXTOS José Armando Saraiva, Geraldo Barros, Maria de Lourdes Figueira, António Ralha, Maria Júlia Monteiro Jaleco, Francisco Lagarto, Maria José Quaresma, Fernando Castro, Isabel Miraldo Pires, Maria Emília Seabra, Flora Agostinho, Manuela Lisete Amaral e Maria de Lourdes Rosendo, Ana Cristina Feio, Julieta David, Graça Gouveia e João Sá | TESTEMUNHOS Helena Cabral, Carvalho Gomes, Esteves da Fonseca, Ana Paula Oliveira, Maria de Fátima Valente e Fonseca Andrade PRODUÇÃO Campeão das Províncias E-MAIL jornalcp@mail.telepac.pt MARKETING Adelaide Pinto E-MAIL adelaide.pinto@mail.telepac.pt | CONTACTOS Tel. 239 497 750 Fax 239 497 759 | PAGINAÇÃO E MAQUETAGEM Campeão das Províncias/ Nuno Miguel Peres IMAGEM DA CAPA excerto do painel em ferro

forjado, executado pelo mestre serralheiro Pompeu Aroso, a partir de um desenho da autoria de Almada Negreiros, dimensionado pelos professores da Escola de Avelar Brotero | IMPRESSÃO FIG Coimbra ESTA REVISTA FAZ PARTE INTEGRANTE DA EDIÇÃO 525 DE 27 MAIO DE 2010 E NÃÃO PODE SER VENDIDA SEPPARADAMENTE A

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JOSÉ ARMANDO SARAIVA DIRECTOR DA E.S.A.B.

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Ao completar 125 anos de existência, a Escola Secundária de Avelar Brotero abre-se a Coimbra, continuando a apontar novos rumos à Humanidade… Maio 2010

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Conhecer o Passado, realizar o Presente, construir o Futuro “A Brotero é uma escola de tradições. Uma escola que nasceu do nada e cresceu, valorizando Coimbra e o País. Uma escola marcada pela luta, que os seus docentes nunca recusaram travar. Uma escola abrangente, de horizontes amplos, olhando o futuro, sem nunca, porém, menosprezar o passado. Atenta à evolução do mundo exterior, sempre foi escola de vanguarda, objectivando o melhor, ainda que difícil, experimentando, dialogando, abrindo portas no dar e receber. Para a Brotero os alunos sempre foram nomes (não números), entidades, pessoas, a construir de forma integral. De mãos dadas com a prática da vida, não admitiu nunca alijar o seu cariz de escola sempre activa e sempre nova. Uma escola acreditada, meta de exigentes. Uma escola-Escola, de todos os tempos, de sempre, porque sempre em luta consigo própria. Para servir”.

Ao completar 125 anos de existência, a Escola Secundária de Avelar Brotero assume com orgulho um passado que, plenamente realizado no presente, permite projectar no futuro a missão educativa deste estabelecimento de ensino, relevante para a cidade de Coimbra, para a região Centro e para o país. A curto prazo, as obras de requalificação do parque escolar da Avelar Brotero vão criar uma nova escola, fruto de um investimento de 12 milhões de euros no âmbito do Programa de Modernização das Escolas do Ensino

das empresas Ramos Catarino, SA (1.ª fase) e Conduril, SA (2.ª fase) deverá ser terminada, previsivelmente, até Novembro deste ano. Iniciada em Julho de 2008, a obra em curso prevê a requalificação global de todas as instalações, incluindo a criação de novos espaços oficinais, laboratórios de Biologia, Física e Química, serviços administrativos e de alunos, bem como a biblioteca e mediateca. Adicionalmente, será criado um auditório, uma sala de professores e um espaço museológico que irá acolher o valioso acervo que a escola possui. Concluída a intervenção na Escola Secundária de Avelar Brotero, o estabelecimento ficará dotado de 60 salas e com

in Escola Brotero, Memórias de Sempre (Coimbra – 1996)

ca de 1 500 alunos. A entidade responsável pela obra é a Parque Escolar E.P.E. No âmbito da intervenção que está a ser feita, toda a organização funcional da escola passará a girar em torno de um novo eixo criado pela nova entrada, virada para a praça dos Heróis do Ultramar, até aos espaços desportivos cobertos. Segundo o professor Fonseca Andrade, esta profunda intervenção representa “uma oportunidade para todos se apropriarem do espaço escolar, para que todos o sintam como o seu, procurando com isso mudar atitudes conducentes a uma escola de sucesso”.

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A SEMPRE-ESCOLA MARIA DE LOURDES FIGUEIRA PROFESSORA DE PORTUGUÊS

dimensões. Leccionava uma disciplina – Desenho –, possuía um só professor – António Augusto Gonçalves, director da Escola Livre das Artes do Desenho Corria o ano de 1973. Um profes– e funcionava numa única sala – o sor da Brotero, falando aos seus alunos refeitório do antigo Convento de Santa do valor do património históricoCruz, junto ao Jardim da Manga –, emcultural português, informou-os de prestada pela Associação dos Artistas. que o Castelo de Soure e (propriedade Em 1889, graças aos esforços de privada penhorada) iria ser levado à António Augusto Gonçalves e mais praça. Surpresos perante o ineditismo uma vez da cidade, a Escola de da situação e reagindo contra Desenho Industriall foi elevada ela, os alunos empenharama Escola Industrial, com um se junto do Governo Civil no leque de novas disciplinas, sentido de que o leilão fosse umas de carácter teórico, outcancelado. Porém, inutilmente. ras de carácter oficinal, visando Então, reagindo de outro modo, a execução de trabalhos em a turma, com duzentos contos metal, madeira e barro. E, no bolso (obstinadamente contendo como primeiro director seguidos na Escola), meteu-se Albino Augusto Manique de num transporte público em diMelo, foi provida de um corpo recção a Soure no dia aprazado docente notável, incluindo para o leilão, disposta a adquirir especialistas estrangeiros – o o castelo. E comprá-lo-ia sem famoso artista italiano Leopoldo dúvida, se o dinheiro chegasse Battistini, o consagrado químipara a licitação e se, na hora, o co francês Charles Lepierre, leilão não tivesse sido suspenso os austríacos Hans Dickel e por decisão superior. A atitude Emil Jock. destes alunos, e do seu profesEm 1925, foi nela definisor, parece ter sido decisiva tivamente integrado o Sector para a forma como tal desfecho Comerciall (que já o havia sido se verificou. Desfecho honroso, de 1914 a 1918), passando, sim, contudo para estes jovens em consequência, a Escola a também de certa maneira indesignar-se Escola Industrial e glório. É que, para eles, grande Comercial (de) Brotero, nome motivo de orgulho seria, com O espólio da Escola integra uma tela onde que manteve durante quarenta efeito, a sua Brotero o vir a tornarestá retratado o consagrado químico francês e cinco anos. se senhora a de um castelo. Charles Lepierre Nesta primeira fase da Porém, entrando em círculos o foi sua existência, a Brotero de reflexão magoada, acabaram por reconhecer que tal seria desne- tação de um ensino que lhe formasse enriquecida pela introdução sucessiva cessário. Na verdade, a Brotero o era já ou especializasse técnicos, o ministro dos mais diversos cursos (científicos, por si mesma uma sólida fortificação. António Augusto de Aguiar, por de- artísticos ou tecnológicos, de formaNascendo do nada, fora-se erguendo, creto de 03 de Janeiro, criou na cidade ção ou aperfeiçoamento, de base ou pedra sobre pedra, até alcançar a es- uma Escola de Desenho Industrial, a de especialização, de mestrança), r trutura de um imponente e majestoso que foi posteriormente atribuído o afectos a variadíssimas áreas: Comércio, Serralharia, Mecânica e Artística, castelo, um castelo altaneiro de firmes nome de Brotero. Ao serviço das indústrias locais, a Carpintaria, Talha e Marcenaria, muralhas, gigantesco colosso rasgando o era uma escola de modestas Cerâmica e Vitrais, Electrotecnia, Mehorizontes, tentando lobrigar, das suas Brotero largas ameias, e sempre em posição de conquista, o perto e o mais longe... A Brotero o sempre foi uma das escolas mais prestigiadas do país. Miguel Torga poderia ter-lhe chamado, na sua poesia tão nossa, “a raiz do sonho que não desiste”... Foi em 1884. Visando satisfazer antigos anseios do povo de Coimbra, que teimosamente exigia a implemen-

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Foi em 1884 que o ministro António Augusto de Aguiar, por decreto de 03 de Janeiro, criou na cidade de Coimbra uma Escola de Desenho Industrial, a que foi posteriormente atribuído o nome de Brotero.

canotecnia, Construção Civil, Mecânica de Automóveis, Costura e Bordados, Formação Feminina e outras. O seu objectivo era a consecução de um “produto bem acabado”. Mão-de-obra que servisse com prestígio Coimbra e o país. Não era, por isso, uma constante para os seus jovens o desemprego. As empresas contratavam-nos ainda nas salas de aula. Os alunos da Brotero o eram admitidos nas maiores empresas do país (TAP, CTT, EDP, Triunfo o e similares), nos melhores gabinetes de desenho técnico, nacionais e até estrangeiros (da África do Sul, Austrália, Brasil), e em muitos outros lugares, desempenhando também cargos de chefia. Nos finais da década de sessenta, quando, com Veiga Simão, a dicotomia Ensino Técnico o e Ensino Liceall deu lugar a um Ensino Secundário, Técnico o ou Liceal, a Escola Brotero – já com abertura de perspectivas de acesso à Universidade, o que até aí, de forma directa, se não verificava – viu atenuada a sua feição profissionalizante, passando a denominar-se, em 1971, Escola Técnica de Avelar Brotero. Após esse período de transição, a Escola entrou no segundo momento da sua história. Em 1975, o Ensino Secundário, numa tentativa de adequação às exigências do pós-25 de Abril, l foi definitivamente unificado, passando a Brotero o a usufruir da mesma configuração estrutural dos antigos liceus. E passando, em consequência, a quase perder o seu cariz profissionalizante, embora tendo mantido as áreas e opções de índole tecnológica ou artística, acrescidas de outras que os tempos impuseram: Electrónica, Informática, Artes dos Tecidos, Artes do Fogo. O nome de Escola Secundária de Avelar Brotero, que com propriedade ainda conserva, advém-lhe de 1979. A partir de 1983, digamos que a

de relançamento do ensino técnico profissional, tiveram lugar nos seus planos de estudo os bivalentes cursos Técnico-profissionaiss e Profissionais, a possibilitar o ingresso directo na vida activa ou o prosseguimento de estudos. A Escola, dotada de infra-estruturas adequadas, equipamento específico e de um corpo docente qualificado, foi pioneira nesta experiência, revivendo ainda que em moldes diferentes os tempos que a marcaram, e (levando também a efeito Cursos Tecnológicos paralelos, apoiados por Programas da CEE, a que se candidatou) apostou mais uma vez na formação de bons técnicos. Poder-se-á considerar um novo período na centenária história da Brotero o o iniciado com a entrada em vigor, em 1992, da Reforma do Sistema Educativo (decorrente da Lei de Bases de 1986). Por um lado, a Escola (que veio a perder de vez, em 1997/98, a sua população mais jovem, o saudoso Básico, através do qual tinha sobremaneira valorizado o seu cariz tão específico) manter-se-ia integrada no somatório dos estabelecimentos de ensino que viriam a alcançar o estatuto de escolas exclusivamente secundárias. Por outro lado, faria renascer, com traços mais vincados, o seu pendor tecnicizante. Foi-se acentuando, com efeito, a tendência de nela se introduzirem cursos tecnológicos e profissionais, a facilitar a inserção ou promoção dos alunos no mundo do trabalho. Hoje, além de Cursos Científico-Humanísticos, incluindo Artes Visuais, que a Brotero o oferece no âmbito do Ensino Secundário o e do Ensino Recorrente nocturno o (este já quase inteiramente convertido ao chamado sistema de Educação e Formação de Adultos), s funciona neste estabelecimento de ensino uma

atrac tiva gama de cursos profissionais de nível 3, em sectores como Electrónica, Automação, Economia, Contabilidade e Gestão, Informática, Multimédia, Electrotecnia, Metalurgia e Metalomecânica, Frio e Climatização, Energias Renováveis, Construção Civil, Design de Moda, Gestão do Ambiente, Secretariado, e possuem autorização de nela funcionarem cursos de especialização tecnológica de nível 4, especificamente ligados às Ciências Informáticas. Nas suas oficinas, estão ainda em laboração áreas ditas tradicionais, como Mecânica-Auto, Cerâmica, Tapeçaria, Escultura a e outras. Em simultâneo, a Brotero o prossegue a dinamização de um Centro de Novas Oportunidadess (CNO), o qual, curiosamente, tem feito regressar aos bancos da Escola muitos dos seus alunos de outras eras. Qual Mondego o que, na busca do oceano, engrossa cada vez mais as suas águas, tomando um leito à sua altura, assim também a Brotero o foi, de facto, ao longo dos tempos, ampliando e diversificando o seu efectivo de cursos e áreas, sempre, contudo, na fidelidade possível ao rumo que inicialmente traçou. A Escola Brotero é hoje uma escola como as outras. O pendor tecnizicante e o pendor artístico que a estigmatizaram no passado permanecem, ainda que beliscados, no presente, constituindo marcas que a identificam perante a cidade e o país. São o viço da alma a que a sustenta, alma que de quando em quando emerge da sua gruta e, obstinadamente, insiste em não se deixar morrer.

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ESCOLA-DE-TODA-A-CIDADE

MARIA DE LOURDES FIGUEIRA PROFESSORA DE PORTUGUÊS

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Com o alargamento e cada vez maior complexificação de cursos e face ao aumento progressivo da frequência populacional (os primitivos cento e cinquenta alunos foram dando lugar a três, quatro, cinco mil, hoje cerca de dois mil; o único professor inicial multiplicou-se por centenas, hoje quase trezentos), foise impondo à Brotero o a aquisição sucessiva de novos espaços. Assim, depois da primi-

cola ocupou outras no mesmo edifício. Em 1918, após um incêndio que destruiu parte dessas instalações, a Brotero o – à excepção das oficinas que se mantiveram no Jardim da Manga 1, onde tinham sido instaladas (nos claustros primeiro, depois em pavilhões construídos sobre os tanques do Jardim) – foi transferida para a Casa da Quinta do Mosteiro, local onde se ergue actualmente a sede da Associação Académica. Em 1923, mudou-se para a antiga hospedaria do Convento, na época Hospício da Maternidade 2, edifício hoje ocupado dária de Jaime Coraumento crescente nos, aliado à dere Santa Cruz, em consigo a parte o, conduziu à utis salas dispersas num edifício da oavista, a partir de 0, e, mais tarde, no edifício do Museu Universitário (por cima d o

Instituto de Medicina Legal) e na Escola Primária de Almedina. Só em 1958 a Brotero o passou a usufruir de instalações construídas para o efeito, o actual edifício de S. José, cheias então de “vastos recursos” mas que, dentro de breve tempo, se mostraram exíguas. Facto que obrigou ao reaproveitamento da chamada Escola da Baixa, a qual veio a tornar-se uma Secção o da Brotero, e à criação doutras Secções, na o Lusã , em Arganill e no edifício do então iLceu D. Duarte, em Santa Clara. Em 1971, com o abandono desta última Secção e a autonomização das restantes como escolas independentes,a Escola Brotero voltou a confinar-se às suas instalações do Calhabé, na Rua General Humberto Delgado, sobreaproveitando-as até à exaustão. Presentemente, mais desafogadas por alijamento do Ensino Básico,estas instalações estão a ser objecto de significativa requalificação, fazendo obviamente já nascer entre os seus antigos e actuais utentes uma profunda saudade. Espera-se que por bem...

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Sobre a Brotero... de viva voz HELENA CABRAL Professora de Física-Química

“Passei na Brotero quase metade da minha vida, pois sempre a minha vivência se dividiu entre a família e a escola. Ao fim de 30 anos a dar aulas nesta escola posso afirmar, sem sombra de dúvidas, que esta era a minha segunda casa. Sempre gostei imenso do ambiente desta escola. Há um ambiente humano que a distingue de todas as outras e que se tem mantido ao longo dos tempos. Recordo na Brotero uma carga simbólica que fazia com que toda a gente, professores e alunos, se integrasse com muita facilidade. Sempre verifiquei um ambiente extraordinário, sobretudo, humano”.

CARVALHO GOMES Professor de Mecâ nica

“A Brotero é a minha primeira casa. Apesar de ter sido cá aluno pouco tempo, esta escola marcou-me logo. Gostei imenso de cá estudar sobretudo pelo ambiente e porque me senti cá bem. Quando cá voltei, então professor, tive a oportunidade de confirmar essa boa impressão. Ao longo dos anos, a Brotero tem conciliado bem a preparação dos alunos para a vida activa e, simultaneamente, para o ingresso nas universidades. Esta escola sempre teve bom ambiente de trabalho e isso faz com que todos se sintam bem, a defendam e se dediquem a ela”.

ESTEVES DA FONSECA Professor de Mecâ nica

“Fui aluno desta escola nos anos 60 [séc. XX], durante uma época bem diferente da actual. Desses tempos guardo uma certa nostalgia, associada, sobretudo, às relações de camaradagem e amizade, mas também ao bom ambiente que a escola tinha. Enquanto professor, encontrei uma escola ligeiramente diferente, mantendo, no entanto a sua matriz. A Brotero, apesar de ser uma escola vocacionada para cursos técnicos e profissionais, oferece também uma resposta na área de estudos científicos, humanísticos e tecnológicos. São duas vertentes que, apesar de diferentes, se complementam. Admito que as obras possam mudar o espaço físico da escola, beneficiando-o, mas não a sua identidade”.

ANA PAULA OLIVEIRA Professora de Português

“A Brotero assume uma importância p diferente f das outras escolas pelo cariz humano que tem. É uma escola heterogénea, que recebe bem toda a gente, que não está preocupada com elites mas sim em receber bem os alunos, independentemente da sua proveniência. Ao longo destes anos, notei sempre que esta é uma escola que está vocacionada para receber os professores e os alunos, fazendo com que se sintam bem. Este ambiente é a grande mais-valia da Brotero”.

MARIA DE FÁTIMA VALENTE Professora de Filosofia FONSECA ANDRADE Professor de Construção Civil

“Esta escola representa muito para mim pois parte da minha vida foi aqui passada, dedicando-me, fundamentalmente, à formação inicial de professores. Foi nesta área que trabalhei os últimos 20 anos e julgo que o meu contributo é pertinente. Sempre me senti muito bem nesta escola. Julgo que a maior parte dos professores gosta de trabalhar na Brotero. Há uma boa camaradagem, há cooperação e há respeito. Talvez seja isso que distingue esta escola de outras”.

“Não me posso desligar g da minha área, a Construção ç Civil, em que a Brotero sempre se destacou. É uma escola de tradição, empenhada em valorizar o trabalho dos alunos e colocá-los no mercado de trabalho. Pelo nome e prestígio que esta escola tem na região, sinto-me honrado em cá estar. Dia-a-dia, estamos empenhados em fazer a diferença em áreas que não existem em outras escolas da cidade ou da região”.

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A BROTERO

ANTÓNIO RALHA Professor de Inglês

Sobre a Escola Brotero já foi escrita uma dissertação de doutoramento1 e uma tese de mestrado2, ambas fora dos circuitos comerciais, mas disponíveis na sua biblioteca por gentileza dos seus autores. Se excluirmos a Universidade, a escola de Coimbra que mais tem merecido a atenção de quem se interessa pela História da Educação em Portugal é a Brotero. Joaquim Ferreira Gomes, entre outros temas, estudou os sete anos que se seguiram à sua criação como Escola de Desenho Industrial em 1884, e fê-lo com a sobriedade e eficiência

que todos lhe reconhecem, e outros investigadores, muitos deles gente da casa, foram dando à estampa estudos e artigos, alguns por dever de ofício, sobre aspectos da vida da Escola. Entre os trabalhos de professores da Brotero, sem desprimor para os contributos de Sílvio Pélico de Oliveira Neto e de Armando Viana da Rocha (que foi seu director), destaca-se pela sua qualidade e abrangência, numa perspectiva que nunca perde de vista o papel da escola enquanto lugar de ensino-aprendizagem-formação no contexto das políticas educativas, uma monografia de quase trezentas páginas, da autoria de Maria de Lourdes Figueira3. Ninguém que se interesse pela vida da Brotero o pode prescindir duma leitura atenta desta obra notável, que se encontra esgotada e justifica uma nova edição. Só teríamos a ganhar se a Autora fizesse dela uma versão actualizada, que contemplasse os quinze anos que passaram desde a sua publicação. O tema Brotero vislumbra-se nas designações que foi tendo ao longo da sua história: Escola de Desenho Industrial, Escola Industrial, Escola Industrial e Comercial, Escola Técnica, até ter passado a chamar-se Escola Secundária, designação que actualmente partilha com os antigos liceus. Também se compreenderá que desperte tanto mais interesse como tema de estudo quanto mais diferente for das outras escolas e que o seu perfil actual a torna muito semelhante a elas. Contudo, a sua vocação mais profunda continua a marcar a diferença nos dias de hoje, o

seu pendor para disponibilizar cursos de orientação profissionalizante que abrem sobre o mercado de trabalho e que vão ao encontro das necessidades do tecido empresarial da região. Quando se publicam os rankingss das escolas, a Brotero aparece entre as suas homólogas do secundário, partilhando com elas o denominador comum do currículo desse nível de ensino, mas não é avaliada pelos outros cursos que oferece. Para se compreender este pendor tecnicizante é preciso ir à procura das suas raízes. É que a Brotero o teve sempre um núcleo de professores muito ligados às técnicas e tecnologias, desde os seus tempos mais recuados. Quando era Escola Técnica e o que nela se aprendia e ensinava a distinguia dos liceus, era prerrogativa dos seus professores poderem acumular funções fora da escola, por se pensar que era importante e desejável que houvesse uma articulação entre o ensino e a realidade concreta no mundo do trabalho nas empresas. Era esse o espírito do ensino técnico. Quanto mais para trás formos, mais forte é esse pendor tecnicizante. Pensemos no período industrial e na plêiade de professores estrangeiros que foram contratados para ensinar as disciplinas que abriam sobre as necessidades da indústria, e que o foram por não haver gente preparada, ou, para sermos mais benevolentes, disponível, no País. Na Universidade, nos liceus, ensinava-se Química, por exemplo, mas coisa diferente era ensinar Química Industrial. Também as instalações criam essa predisposição, essa inclinação natural.

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As oficinas e os laboratórios, com equipamentos outrora de ponta, hoje insuficientes mas, apesar de tudo, melhores do que os de outras escolas, fazem da Brotero o um espaço mais vocacionado para a área científica e, consequentemente, para a oferta de cursos que se situam nesse domínio. Quem consulta os livros antigos da Escola, encontra a todo o passo nomes que vieram a notabilizar-se em áreas ligadas às artes industriais, como o ferro forjado, a marcenaria, a carpintaria, a pedraria, a cerâmica, e também de artistas plásticos, nomeadamente da pintura, da talha e da escultura. Não faltam alunos que vieram a ser farmacêuticos, técnicos de análises clínicas, enfermeiros, comerciantes, etc. Mas fíca-se surpreendido, como eu fiquei, quando se depara com certos registos de inscrição. É o caso de António Caetano Freire Egas Moniz, o nosso prémio Nobel, que no ano lectivo de 1896-7 se matriculou em Química, o caso de Fernando Baeta Bissaia Barreto Rosa, que frequentou Química de 1899 a 1902, o caso de Jaime Zuzarte Cortesão, que se inscreveu em Física e Mecânica em 1897-8 e em Química em 1902-3. A surpresa é óbvia,

pois é no mínimo inesperado encontrar estas brilhantes personalidades da nossa cultura ali inscritas. Mas se nos lembrarmos do prestígio da Escola nesse período, talvez compreendamos que estes espíritos superiores e ávidos de conhecimento fossem ali procurar saberes que lhes pudessem abrir novos horizontes, neste caso com os olhos postos nos estudos médicos na Faculdade de Medicina. São muitos os artistas que se formaram neste tempo antigo, sob a batuta de António Augusto Gonçalves, grande pedagogo, e dos seus colaboradores, com destaque para o arquitecto Silva Pinto e o italiano Leopoldo Battistini. Quando foi preciso mais tarde fazer os portões do Palácio da Justiça, pondo em obra o desenho do engenheiro Castelo Branco, lá estavam Daniel Rodrigues, Albertino Marques e António Maria da Conceição, quando foi preciso executar um lampadário para o salão nobre da Câmara Municipal, lá estava Lourenço Chaves de Almeida, quando Bissaia Barreto concebeu o projecto do Portugal dos Pequenitos, só o pôde levar a cabo porque tinha gente capaz para executar as miniaturas dos monumen-

tos ali representados. E no espaço da Brotero, que muitos já apelidam de escola-museu, vamos encontrar obras de arte da autoria de professores e alunos, desde peças de mobiliário até trabalhos de cerâmica, escultura e pintura, decorando as suas salas e os seus corredores. Quando se entra no átrio da Escola, tem-se logo em frente um trabalho em ferro forjado desenhado por Almada Negreiros e executado pelo serralheiro Pompeu Aroso, ele também aluno da Brotero. Quando, por força de decisões de política educativa, se acabou com a distinção entre escolas técnicas e liceus, poderá ter-se acabado com uma injustiça social, que fazia da Brotero o uma escola de nível inferior para quem quisesse e pudesse continuar a estudar depois da conclusão do ensino básico; poderá ter havido o triunfo de ideias democratizantes, mas acabou-se com o Ensino Técnico, o que todos reconhecem ter sido um erro com graves consequências. Se este tivesse sido reformado em vez de ter sido extinto, a Brotero o teria podido dar continuidade plena à sua vocação profunda e à sua tradição histórica.

1

António Manuel Pelicano Matoso Martinho. A Escola Avelar Brotero. 1884-1974. Contributo para a História do Ensino Técnico-profissional. Guarda. 1993

2

Marília de Assis Tavares, Corpo Discente da ETAB entre 1884-85 e 1903-04. Tentativa de Caracterização Sócio-profissional. Coimbra. 1993.

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Escola Brotero. Memórias de sempre. Coimbra 1996.

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OS PROFESSORES – É POSSÍVEL FALAR DE P

MARIA JÚLIA MONTEIRO JALECO Professora de Biologia

Comecei a trabalhar na Escola Brotero no ano lectivo de 1969/70, fazendo o estágio. Não sabia que a escola que iria ser a minha durante trinta e um anos “só” tinha, nessa altura, oitenta e cinco. Saí quando me reformei, em 2001. E, porque a minha memória é imperfeita e incompleta, e o espaço é curto, não poderei falar de todos. Alguns, muitos, “partiram já para parte incerta”2. Por isso escolho alguns “mais velhos” – expressão dos meus patrícios africanos – que conheci e de algum modo marcaram o meu percurso de trinta e sete anos em que me fui fazendo professora. O meu estágio foi orientado por dois Professores excepcionais, que se complementavam na perfeição: Carlos Gersão Ventura e Raquel Mateus. Tenho a certeza de que todos os seus estagiários não esqueceram o muito que com eles aprenderam, a amizade, a cumplicidade e a partilha profissionais, que persistiram para além do estágio. Dizia-se que éramos dos poucos estagiários da altura que não precisávamos de procurar a ajuda de um psiquiatra... (apesar do muito trabalho com as disciplinas de Ciências Físico-Naturais, Ciências da Natureza e Geografia e das muitas aulas). Cada um à sua maneira, procuraram que aprendêssemos a ser melhores professores para que os alunos aprendessem também

nossa escola3, depois do 25 de Abril. l Dos meus colegas de estágio, guardo mais recordações da Celeste Manuela, da Manuela Mesquita, da Isabel Faria, do Rui Oliveira (que foi depois, durante muitos anos, responsável pelo Serviço de Acção Social Escolar) e da Manuela Dias, alguns dos que, como eu, continuaram na Escola Brotero. Na “comunidade” dos estagiários trocavam-se experiências e também desabafos sobre as dificuldades, sobre os orientadores (então chamados “Metodólogos”): Rosa Pina Ribeiro, da “terrível” Matemática, considerada exigente e muito competente, Rocha e Cunha, o gentleman n do Inglês, Maria da Glória, das Físico-Químicas... Nos anos seguintes partilhei dificuldades e experiências com muitos colegas (principalmente – mas não só – com os que, como eu, trabalharam na formação de professores): Manuela Dias, Joaquim Morais, Gersão Ventura, Raquel Mateus, Olga Fernandes, Helena Cabral, Maria do Espírito Santo, Graça Gouveia, Manuela Carreira, Maria Emília Seabra, Padre Saúde, Rosa Amélia Faria, Sobral Henriques... Também com os meus estagiários, que me “obrigaram” a António Augusto Gonçalves foi o aprender sempre. A Sala dos Profesprimeiro professor da Avelar Brotero sores era um local de trabalho intenso e de circulação de ideias entre grupos aprofundada da praxiss docente com que, como é natural, se relacionavam base em todas as correntes filosófico- preferencialmente. Os engenheiros pedagógicas conhecidas na altura. Não e os “mestres” do corpo docente, tão se esquivou a ser delegado sindical na importantes na nossa Escola, “escapamelhor - sem nos inferiorizarem pelos erros que naturalmente cometíamos. Após o 25 de Abril, l quando tudo “efervescia”, o Dr. Gersão foi um grande entusiasta da “construção” do Ensino Unificado e promotor de uma reflexão

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Não! Falo deles, sim, na minha cabeça, no meu coração e, com muitos, na rua, nos cafés, em viagens com encontros improváveis e... na Internet. Aqui, pediram-me para falar de professores.

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Expressão utilizada para falar na morte pelos antigos estudantes do liceu Diogo Cão, Lubango, Angola – o meu liceu...

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O Sindicato dos Professores surgiu rapidamente após o 25 de Abril – o caminho estava feito pelos GEPDES. Também a revista “O Professor”, que existe ainda hoje, se afirmou, na sequência dos Cadernos “O Professor”.

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E PROFESSORES SEM FALAR DE ALUNOS?1

vam-me” mais – falha minha, claro; os kotas, lembram-se, com certeza, do eng. Matos Chaves e do mestre Galvão, entre tantos. Houve períodos em que esse relacionamento não foi isento de tensões, por divergências ideológicopolíticas e mesmo pedagógicas. Em 1973, Veiga Simão, ministro da Educação Nacional, lança a sua reforma, tentando a democratização do ensino, quer no acesso (pela unificação do ciclo preparatório, efectuada em 1967), quer na extensão, pretendendo o prolongamento da escolaridade obrigatória

para oito anos. Democratizar o ensino no seio de um regime não democrático era pretender a quadratura do círculo... Aproveitando alguma abertura, os professores organizavam-se nos GEPDES (Grupos de Estudo do Pessoal Docente do Ensino Secundário) desde 1969. Um pouco por todo o país faziam-se reuniões informais, em que participava quem estivesse interessado e consciente de correr alguns riscos bem reais. Discutiam-se problemas profissionais e laborais, lutava-se pela criação de uma Associação de Professores (um Sindicato

estava fora de questão), distribuíam-se Comunicados e abaixo-assinados reivindicativos. Os GEPDES foram a certa altura considerados subversivos e equiparados a uma “associação secreta” pelo então Secretário de Estado Augusto Ataíde, correndo os seus membros o risco de perda de direitos cívicos. Numa circular enviada aos Directores e Reitores, Augusto Ataíde chegou a pedir o envio de listas dos seus membros. Antonino Henriques, que já era director da CONTINUA

Felicitamos a Escola Secundário de Avelar Brotero pelos seus 125 Anos

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OS PROFESSORES – É POSSÍVEL FALAR DE PROFESSORES SEM FALAR DE ALUNOS?1 CONTINUAÇÃO

Escola quando comecei o estágio (e continuou a sê-lo até pouco depois do 25 de Abril de 1974), homem “da situação”, recusou-se a ser denunciante e respondeu à solicitação dizendo desconhecer quem, do corpo docente da sua Escola, fazia parte dos GEPDES. Os Comunicados, abaixo-assinados, distribuíamse e afixavam-se.... Soubemos deste episódio porque chamou alguns dos “subversivos” e lhes deu conhecimento. Recordo a sua dedicação à Escola, as preocupações pedagógicas (mais do que “apresentar serviço” à tutela), o seu sentido de humor e a correcção no trato, embora fosse às vezes um tanto duro. Tive pena de que não tenha querido apresentar-se para ser eleito, depois do 25 de Abril. l No plenário de professores em que se efectuaram eleições e que se prolongou pela madrugada, três colegas assumiram a responsabilidade de constituírem uma Comissão de Gestão eleita: Margarida Neto, Miranda e Faustino. Tiveram uma tarefa bem difícil, que enfrentaram com toda a coragem e... inexperiência. Há anos que penso merecerem uma homenagem da Escola. Depois da Revolução de Abril a estrutura do ensino transformou-se profundamente e muitos professores da nossa Escola empenharam-se com entusiasmo na concretização de novos caminhos. O Ensino Unificado abrangeu a escolaridade até ao 9.º ano, deixando de existir a dicotomia entre liceus e escolas técnicas, que obrigava crianças ou adolescentes, logo aos doze ou treze anos, a decidirem (ou os pais por eles) entre uma via para a Universidade e outra para “o mundo do trabalho”, menos qualificada a4 e socialmente desvalorizada. As escolas passaram a chamar-se Escolas Secundárias – e a ETAB passou

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a ESAB, Escola Secundária de Avelar Brotero. Para que todos os alunos tivessem uma formação geral equivalente, os curricula, unificados, passaram a integrar a Área Cívica e Politécnica e os Trabalhos Oficinais (estes com um leque de opções nem sempre satisfatório e bastante desigual, condicionado pelas estruturas físicas das escolas – laboratórios, oficinas, etc...). Felizmente (do meu ponto de vista, claro), desapareceu o Curso Geral de Formação Feminina... No âmbito da Área Cívica e Politécnica fez-se muito trabalho importante, envolvendo a participação, cooperação, organização, pesquisa e estudo, num esforço comum de alunos e professores de cada turma para realizarem actividades que valorizavam o background dos alunos e promoviam aprendizagens transdisciplinares (quando ainda não era moda falar nisto) e a construção da sua cidadania. Lembro-me particularmente de me ter empenhado numa ida a Vila Nova de Anços, terra de uma aluna de uma das minhas turmas, longamente preparada após opção por essa de entre várias propostas, em que a população e as suas “forças vivas” nos deram testemunho das actividades e profissões locais e convivemos todos com alegria. O trabalho era depois objecto de avaliação. Foi mais difícil ser professor nesses tempos – mas também um desafio entusiasmante. Era bom conhecer melhor os alunos e os colegas, “descobrir” a grande valia dos “Mestres” das Oficinas, com quem menos convivera até então porque trabalhavam numa outra ala da Escola. Houve muitas dificuldades e algumas resistências, que talvez tenham sido a causa do fim da Área Cívica e Politécnica (sem que tivesse havido qualquer avaliação global) e de ter acontecido o que alguns chamaram uma “licealização” do Ensino Secundário, com

prejuízo da formação técnica de base. Ao longo dos anos, muitos professores integraram a direcção, cujo órgão foi tendo outros nomes (Conselho Directivo, Conselho Executivo...) e número variável de membros eleitos: Maria de Lourdes Figueira, Maria de Lourdes Rosendo, Joaquim Morais, Lucas Pires, Maria José Cardoso, Margarida Pereira, Ana Cristina Brazão (já não me lembro se todos foram presidentes)... representam aqui, à sua revelia, todos os que, num cargo difícil, deram à ESAB muito das suas vidas e levaram a cabo as transformações que foram sendo necessárias. Os professores da ESAB que hoje constituem o seu corpo docente enfrentam muitas novas tarefas – porque há muitas mudanças e porque há sempre alunos e os alunos estão sempre à espera. Já são poucos os do “meu tempo”, os que conheço. Os novos não me conhecem mas decerto aceitarão que lhes dedique as linhas em que acabo de escrever, com emoção, sobre estórias, lutas e trabalhos de professores, de alunos, de pessoas que entraram e ficaram na minha vida até hoje. Orgulhem-se de estarem numa escola que sempre teve uma forte “personalidade”! Não desanimem com as dificuldades, com os rankings, com as críticas dos novos “sábios”, gurus que desvalorizam as “pedagogias” e, na maior parte dos casos, nem conhecem a vida dentro das escolas. Respondam sendo críticos e exigentes, trabalhem para e pelos vossos alunos – para quem havia de ser? Sem falsa modéstia, falo-vos com autoridade, conceito que, para mim, é igual a autor(a) + idade – é isso...

A menor qualificação das duas vias caía também sobre os professores: lembro-me de que em Viseu, onde fui professora no ano anterior ao do estágio, os da Escola Técnica eram “professores” (com minúscula...) e os do liceu eram “doutores”, mesmo sendo uns e outros licenciados... Os professores das disciplinas ofici nais estavam na base da pirâmide .

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A Escola-Museu MARIA DE LOURDES FIGUEIRA PROFESSORA DE PORTUGUÊS

Marca sacramentada desta Escola a centenária é também o riquíssimo património que nos foi legando e que, resto de um passado, condicionará indubitavelmente o seu futuro. São património todos os edifícios por que a Brotero o passou e nos quais deixou um pouco da sua alma. É património toda uma extensa gama de instrumentos didácticos (alguns dos melhores do país, alguns manufacturas de alunos ou professores), susceptíveis de fazerem da Brotero o – como é reconhec uma verdadeira Escola-Museu. São os velhinhos amperímetros e voltímetros, diferentes tipos de balanças, um gasómetro, um torno de pedal, um telégrafo de Morse, uma colecção de lâmpadas com filamento de carvão (que a própria Philips não possui no seu museu), máquinas de escrever do séc. XIX, um carrilhão eléctrico, copos para a lavagem de areias, a roda primitiva do oleiro, etc, etc... Tudo isto nas oficinas e laboratórios, ao lado de utensílios modernos – espectofotómetro assistido por microprocessador, maquetas de automatis industriais e muitos outros. São, na biblioteca, verdadeiros tesouros bibliográficos – um dicionário de monogramas, um outro de arquitectura, um tratado de Física, uma enciclopédia de Química, todos do séc. XIX; monografias;

programas escolares do tempo da monarquia; estampas (uma integrando a Enciclopédia do Oriente, obra rara; outras uma colecção talvez única no país, que se presume ter vindo de Itália). Património de alto sentido estético são os exemplares de arte que esta escola executou, desde o tempo dos seus mestres/artistas primitivos (A. A. Gonçalves, Leopoldo Battistini) até outros mais recentes (Mário Soares, Álvaro Camarinha, António Victorino, Francisco Lagarto (pai e filho)). Espécimes que, em jeito de exposição/decoração têm

corredores, vestíbulos ou até mesmo nos jardins: peças diversas e painéis de ferro forjado; móveis e outros variadíssimos artefactos de madeira, embutidos

ou em talha; tapetes de Arraiolos; toalhas bordadas; inúmeras peças de cerâmica (pratos, painéis, potes, estatuetas, vasos, azulejos); painéis em mosaico num declive da cerca (recentemente retirados por causa das obras); bustos modelados no bronze, retratos a óleo e desenhos feitos por professores; trabalhos em gesso; e muitos outros. Património são também um sem-número de documentos antigos que os arquivos religiosamente conservam; ou até mesmo as árvores de espécies raras do jardim. Disperso pelo país (e até pelo mundo) está ainda o mais valioso património o – o património humano, o dos que entraram na vida activa pelas portas da Brotero, o dos que nela moldaram a sua personalidade, que nela esboçaram, com honra, o seu perfil de cidadãos. É um património vivo, como vivo é também o que intra muros – alunos, docentes, técnicos, administrativos, auxiliares – faz dos ecos do passado o suporte do presente e que, sem esmorecer, vai ousando travar dignamente a batalha do futuro.

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A CERÂMICA NA E FRANCISCO LAGARTO Professor de Cerâmica

Retorno por breve tempo a esta minha casa, que o foi por longos anos. Faz-me bem o regresso. Não sou saudosista, mas confesso alguma nostalgia quando a Escola Brotero me vem à lembrança, nesta etapa da vida que é a de professor aposentado. Raízes fundas, estas. E raízes sãs. Devo estas emoções à Dr.ª Lourdes Figueira. Aqui fica a minha gratidão pela generosidade do convite para falar de minha justiça sobre a disciplina que foi, aqui nesta escola, o objecto do meu trabalho. A cerâmica tem tido lugar de relevo no tecido industrial de Coimbra, pois aqui foram laborando algumas das maiores e melhores fábricas do país neste ramo de actividade. É justo salientar o facto, sabendo, como todos sabemos, que a restrita e garbosa cidade onde vivemos esteve e está essencialmente ligada ao sector terciário: produzindo “serviços”, alguns altamente qualificados, natural consequência dos seus seculares estabelecimentos de ensino.

A indústria de cerâmica é, pois, uma consoladora excepção na paisagem tradicional em que se move a economia, melhor dizendo, “era uma consoladora excepção”. É da ordem natural das coisas que a Escola Brotero venha reflectindo, ao longo da sua existência, as circunstâncias que referi. É um lugar-comum dizer-se que as escolas, para cumprirem a sua missão de preparar para a vida, têm de ter uma ligação visceral à sociedade onde se inserem, seja em que aspecto for: social, cultural ou económico. Aqui se formam os jovens que, quando chegar a sua vez, serão a força geradora do desenvolvimento. Através do conhecimento em todas as áreas do saber, através da inovação que continuadamente nos é exigida, através da ousadia que marca a diferença entre quem já viveu grande parte da vida e aqueles que estão aquém dessas balizas. A fazer fé nas análises dos peritos que todos os dias enxameiam a comunicação social que todos consumimos, são aquelas as qualidades que sempre nos têm feito muita falta e que exactamente agora se vêm mostrando mais preciosas. Foi seguramente com estas ideias, ou pelo menos com algumas delas, que

o Dr. Antonino Henriques, antigo Director, com a sua pertinácia esclarecida, fez renascer na Brotero o a Cerâmica. Para o efeito, foi convidado o Mestre Lagarto, ao tempo responsável por idêntico curso na Escola de Viana do Alentejo. Durante um ano foram lançados os alicerces do que viria a ser o tão dinâmico curso; e para prosseguir a tarefa foi convidado o professor Lagarto, seu filho, ao tempo já professor de desenho na referida escola. Os nossos alunos faziam, após os cursos, os seus estágios nas fábricas que havia no distrito. Muitos deles foram convidados a integrar os quadros dessas empresas, numa simbiose denunciadora da sólida inserção da escola no meio local e da qualidade do ensino que aqui era facultado. Tenho de fazer referência a um pormenor que acho que é especialmente caro à ideia do Estado Social que tem de ser o Estado ao serviço da nossa República: o curso de Cerâmica teve muitos alunos deficientes auditivos, alunos portadores de deficiência limitativa de muitas actividades, mas para quem na prática esta arte não constituía sério handicap, como provou a experiência feita. As exposições de artesanato foram singularmente enriquecidas, em muitos casos, com os trabalhos desses alunos. As salas de aula e os corredores da nossa escola foram “decorados” com os trabalhos dos nossos ceramistas. Era isto sério motivo para a elevação da autoestima dos alunos e motivo de agrado para quem nos visitava. A função deste prazer era especialmente evidente nos dias de eleições. Em que essas “obras” dos alunos eram vistas e apreciadas por milhares de pessoas. A imagem de marca da Brotero o continha este “museu” permanente, motivo de são orgulho dos professores e dos alunos.

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A ESCOLA BROTERO

A própria oficina foi decorada com uma valiosa colecção de pratos executados no antigo edifício, muitos deles datados dos anos trinta e quarenta. Essa colecção foi retirada para a execução das obras. Destas obras resultou que a escola ficou sem alguns dos quesitos logísticos para a realização de trabalhos que exijam a utilização de fornos de altas temperaturas. A oficina actual reflecte essa carência. Sei que quebro a amenidade da minha conversa convosco, dizendo, em jeito de conclusão, que sinto algum desconforto em constatar que, nas importantes obras que aqui se fizeram,

não foi contemplada uma verdadeira oficina de cerâmica. Antes delas havia o que podemos chamar de mini-oficina, mesmo tendo em conta que a maquinaria disponível era a bem dizer obsoleta. A minha visão das coisas tem o peso que tem, mesmo assim sinto que devo exprimi-la. Sem equipamento que funcione não temos as condições adequadas à formação de ceramistas que sejam os protagonistas de um trabalho que dignifique a Escola Brotero. É a visão de um professor aposentado que continua a sentir-se aquilo que foi. Professor militantemente professor.

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A ARTE DO FERRO

MARIA JOSÉ FIGUEIREDO Professora de Filosofia

A Brotero o está, nos seus 125 anos de vida, a ser profundamente remodelada para responder aos novos tempos. Foi esta a marca de água desta escola desde a sua formação – a adaptação a uma sociedade sempre em mudança. A Escola Livre das Artes do Desenho, que foi o seu embrião, em 1878, procurava o aperfeiçoamento do método do trabalho de que a população de Coimbra se mostrava bem carenciada. Duas décadas volvidas, novas e grandes mudanças tecnológicas se apresentam na Exposição Universal de Paris de 1900.

O ferro era a novidade dominante e a Torre Eiffel era o ex-líbriss da nova era. António Augusto Gonçalves, então a dirigir a Brotero, vai a Paris; volta encantado com o que viu na “ferronerie”. No regresso a Coimbra, contagia com o seu entusiasmo a figura fortemente carismática do Dr. Quim Martins ( como é carinhosamente chamado) e o arquitecto Silva Pinto, à época professor na Brotero. Três amigos, um só projecto – implantar a arte do ferro em Coimbra. Encontram no escultor João Machado a capacidade de passar do cinzel para o malho; feitas as primeiras experiências, o lume da forja expandiu-se e mestres serralheiros como Lourenço Chaves de

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Almeida, António Maria da Conceição, Albertino Marques, Daniel Rodrigues, foram tocados pelo calor do entusiasmo e não tardou que Coimbra se enchesse de portões, grades, lampadários, varandas, etc, etc, de requintado gosto artístico. O “homo faber” seguia o seu curso – as mãos que modelaram o barro, desbastaram a pedra, domam o ferro. A mesma pertinácia, o mesmo gesto criador. A Escola Brotero não ficou alheia a este movimento. Quem entrasse pela porta principal (parece que a entrada vai mudar) deparava-se com um painel em ferro forjado, em situação fronteira à porta principal. Este magnífico painel


com figuras alusivas ao Comércio e à Indústria, que foram, durante décadas, a pedra de toque do ensino desta escola, é da autoria do “lápis” de Almada Negreiros, o mesmo Almada que, em Coimbra, deixa também o seu nome ligado à Faculdade de Ciências, cujas paredes de entrada se enchem de figuras ligadas à matemática e exploração científica. A obra do ferro é de Pompeu Aroso, que recebe a encomenda do Director da Brotero, Dr. Viana da Rocha. Pompeu Aroso é já um artista da 2.ª geração; a sua aprendizagem faz-se como discípulo de Albertino Marques e Daniel Rodrigues. Tinha a sua oficina na “Baixa”, na desaparecida Rua da Nogueira.

Era a Forjarte. Dali saíram magníficas obras, espalhadas um pouco por todo o país e que justificam a medalha de ouro que lhe foi atribuída em 1984. Acrescente-se ainda que foram os professores de Desenho da Brotero o que ampliaram o “cartão” de Almada para as proporções requeridas pelo lugar onde iria ficar. Mas a Brotero o continuou a criar outras obras “intra muros”. As aulas de serralharia deram azo a novas criações. Uma delas “preside” ao Refeitório – uma “Última Ceia”, com desenho do Padre Nunes Pereira e executada pelos alunos do Ciclo Preparatório sob a orientação do Mestre Balhau (A. Balhau dos Santos Pereira),

em 1962. Nunes Pereira traça, num realismo-geometrismo, as figuras bíblicas do Novo Testamento. Este painel inclui a Brotero o no roteiro das obras que Monsenhor Nunes Pereira deixou no decurso da sua longa vida de sacerdote e de artista. Outras figuras avulsas e lineares embelezam o átrio da escola com desenhos do professor do 5.º grupo, Mário Oliveira Soares, também ele, um reconhecido artista. Finda uma época, outras se seguem sob o mesmo signo da mudança que as novas sociedades impõem e a Brotero não recusa.

“Última Ceia”, com desenho do Padre Nunes Pereira e executada pelos alunos do Ciclo Preparatório sob a orientação do Mestre Balhau (A. Balhau dos Santos Pereira), em 1962

BIBLIOGRAFIA: Figueira, Maria de Lourdes, Brotero. Memórias de Sempre. Anacleto, Regina. Ourives conimbricenses do ferro na primeira metade do séc. XX. In Munda, Revista do Grupo de Arqueologia e Arte do Centro. N.º 40, Novembro 2006. Pimentel, José Maria. Oliveira, Maria da Conceição. Monsenhor Nunes Pereira. Patrocínio da Câmara Municipal de Coimbra. 2001. Fotobiografias Século XX. Almada Negreiros, Direcção Joaquim Vieira. Ed. Bertrand, 2006.

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DO CDAI À PROMUNDO

FERNANDO CASTRO Professor de Religião e Moral

O CDAI - Círculo de Desporto, Artes e Ideias – nasceu no final do ano lectivo de 1985/86 por iniciativa dos alunos da disciplina de Religião e Moral da nossa Escola. Culminando um programa iniciado em Julho de 1986 sob o lema “Nas férias construir uma escola diferente”, recuperaram os alunos uma sala de jogos que todos os anos era encerrada por actos de destruição. Estes jovens deitaram mãos à obra e transformaram a Sala de Jogos numa sala de leitura de jornais e de exposições, colóquios, reuniões e actividades, decorando-a com painéis da sua autoria. Alexandre Magno procurou pintar um painel autobiográfico. A pintura mural de António Barata tentou reflectir “a existência dos opostos”. Um dos painéis representou Fernando Pessoa e os seus heterónimos e, no tecto, um outro recriou o tema A Criação do Mundo, de Miguel Ângelo. Estas pinturas e algum mobiliário velho existente no sótão devida e originalmente recuperado, em moldes artísticos, abriram à Escola um espaço cultural e recreativo muito aprazível, que, a 7 de Março do ano seguinte (durante o Encontro distrital de associações e movimentos juvenis promovido pelo então FAOJ), foi inaugurado, com a presença do

ministro da Educação Couto dos Santos. Começou então a maravilhosa aventura da criatividade, dinamizando cerca de 35 núcleos de ocupação de tempos livres, que estavam distribuídos por cinco sectores – Cultural, Desportivo, Humanitário, Pedagógico e Social. Exposições, grupos de música e de mímica, participação em festivais, campanhas a favor do Terceiro Mun-

do, edições de trabalhos literários de alunos, recuperação de espaços para actividades, campanhas de sensibilização, café-concerto, pintura de um trolley, y o qual surpreendeu a cidade, encantou as crianças e foi tema para a comunicação social, festas de recepção aos novos alunos, organização de projectos de acção social em bairros problemáticos, cooperação com entidades de solidariedade social, conferências

e resolução dos problemas de alunos que se encontravam em Coimbra fora da família, nomeadamente permitindolhes usufruir dos jantares nas cantinas universitárias, foram algumas das acções que caracterizaram a actividade e a criatividade dos alunos, professores, pais e comunidade escolar que integraram o CDAI. Estas experiências não passaram despercebidas e na Semana de Formação, de 2 a 6 de Julho de 1990, dentro do projecto Coimbra, Cidade Nova, que actuava em cinco bairros da cidade de Coimbra abrangendo mais de 200 crianças e cerca de 80 jovens monitores, a esposa do Presidente da República, durante a Presidência Aberta de Mário Soares na cidade, visitou o CDAI e conversou com os jovens durante mais de duas horas. Durante vários anos este projecto ocupava os meses de Julho e Agosto com actividades lúdicas e desportivas, como idas à praia, piscina, jogos, lanches, desporto, teatro, concursos, prémios, e nos restantes meses do ano, nos campos da Escola, aos sábados, decorreram tardes desportivas para crianças das zonas mais desprovidas de recintos destinados ao desporto. Para estas actividades obteve o CDAI um subsídio da Segurança Social.

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Com este subsídio foi também possível apoiar quase uma centena de alunos do Secundário, oriundos de outras cidades da região Centro, que estavam em Coimbra, e que passaram a jantar nas cantinas universitárias. “Espaço Aberto à Criatividade na Construção de Uma Escola Mais Unida” foi o lema do CDAI; foi por este lema que tudo surgiu e é este o lema que ainda hoje é recordado pela geração que deu vida a esta Associação durante os anos 80. Depois de um interregno de quase dezassete anos, o professor que acompanhou a existência do CDAI voltou a Coimbra depois de uma passagem por vários países da América Latina, Caribe e África. A convite dos seus antigos colegas, desenvolveu junto de várias turmas algumas acções de sensibilização sobre a situação mundial e deu conhecimento de uma experiência vivida no Ghana. O encontro com uma turma do 12.º ano na Escola Secundária de Avelar Brotero, que desenvolvia um projecto com o título “Eu quero mudar o Mundo”, foi determinante e vital. Começaram a reunir-se todas as quintas-feiras pelas 17 horas na outrora Sala do CDAI, hoje conhecida por Sala de Exposições. Em poucas semanas esta experiência foi conhecida noutras Escolas, Institutos e Faculdades, tendo sido sensibilizados, no prazo de poucos meses, em Coimbra e noutras cidades vizinhas, cerca de 8.000 alunos, que aceitaram o desafio de querer mudar o Mundo. Assim, nas reuniões das quintas-

feiras nascia e desenhava-se com experiências, poemas e utopias um novo projecto e uma nova associação que estaria para germinar em breves meses: A PROMUNDO! Com um símbolo, que quer ser uma “mão” diferente e igual a todas, pequena e expressa com a mesma cor com que está escrito “PROMUNDO”, o nosso estar no mundo, o nosso contributo, dizem! A PROMUNDO pode assim definirse como uma livre Associação de cidadãos, nascida recentemente e que actua em três áreas: Educação e Sensibilização, Intervenção Social e Comunitária e Cooperação Internacional. Está formada por alunos, professores

e antigos professores da Escola Secundária de Avelar Brotero, em Coimbra, e também de outras instituições do Ensino Secundário e do Ensino Superior de todo o país. Quer desenvolver projectos de solidariedade social e de cooperação para o desenvolvimento que criem laços de fraternidade entre todos os povos, numa dinâmica de reciprocidade e através de uma convivência baseada no respeito pelas diferenças, na tolerância, diálogo, justiça e entreajuda, e que sensibilizem a cidadania portuguesa a ser responsável, criativa e protagonista na construção de um mundo mais justo e unido.

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O GABINETE DO ALUNO

MARIA EMÍLIA SEABRA Professora de Biologia

ISABEL MIRALDO PIRES Professora de Educação Física

O Gabinete do Aluno o foi criado no ano lectivo de 2001/2002 para dar cumprimento à Lei 3/84, de 24 de Março, que foi regulamentada pelo Dec-lei n.º 259/2000, de 17 de Outubro. No seu art.º 1.º, parágrafo l, diz-se: “A organização curricular dos ensinos básico e secundário contempla obrigatoriamente a abordagem da promoção da saúde sexual e da sexualidade humana...”. A equipa responsável pelo Gabinete, constituída pelas professoras Maria Emília Seabra, Maria Tereza Mizarela e Isabel Miraldo Pires e pela psicóloga Ana Bela Alfaro Cardoso, foi definida em Julho de 2001 pelo Conselho Executivo e, a partir de Setembro, começou a trabalhar na elaboração do projecto.

Seguiu-se uma etapa de divulgação à comunidade escolar, tendo sido elaborados cartazes que foram afixados em locais acessíveis aos alunos e na Sala dos Professores e também entregues aos coordenadores dos Directores de Turma. Durante o mês de Novembro mobilámos e decorámos uma sala junto ao ginásio grande. Como a queríamos alegre e acolhedora, fizemos cortinados, camilha, almofadas; forrámos dois sofás que fomos buscar ao sótão, donde também trouxemos móveis, um candeeiro e belas cerâmicas. Para tudo isto contámos com a boa vontade e incentivo dos colegas do Conselho Executivo e o auxílio dos funcionários da ESAB, sempre solícitos. Colocámos caixas de correio em pontos estratégicos para recolher perguntas dos alunos que ainda não

se sentissem à vontade para no-las fazerem directamente. No dia 29 de Novembro foi a inauguração, com um lanche para toda a comunidade escolar e iniciou-se o atendimento de acordo com um calendário previamente estabelecido. Além de apoiarmos, individualmente ou em pequenos grupos, os alunos, fizemos um inquérito para aferir dos seus principais interesses e organizámos acções de formação para eles, assim como para professores e funcionários, sobre estes temas: drogas e toxicodependência, doenças infecciosas e sexualmente transmissíveis, alimentação, métodos contraceptivos, violência escolar, alcoolismo, abuso sexual, orientações sexuais, etc... Comemorámos os dias mundiais relacionados com a saúde e sexualidade e projectámos filmes sobre essas temáticas, seguidos de debate. Tendo em conta o balanço positivo feito no final do ano, o Gabinete do Aluno o foi em 2002/2003 integrado no PAA, tendo funcionado desde então com diferentes equipas mas sempre com o mesmo empenho e dinamismo e com receptividade por parte dos alunos, que tanto têm lutado pela Educação Sexual nas Escolas.

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OS DIRECTORES DE TURMA

Flora Agostinho

Manuela Lisete Amaral

Maria de Lourdes Rosendo

Professora de Direito

Professora de Português

Professora de Geografia

Na sequência da criação do cargo de Director de Turma, o Conselho Directivo de então sentiu a necessidade de preparar os professores para o desempenho desse cargo, tendo em consideração a diversidade de tarefas com que se deparavam e que exigiam múltiplas competências. Efectivamente, para além das actividades burocráticas definidas por lei, o professor Director de Turma tinha de ter capacidades para lidar com alunos, colegas e pais e resolver conflitos de vária ordem. Nesse sentido, o Conselho Directivo passou a promover, com regularidade, acções de formação de professores, obrigatórias para Directores de Turma em exercício e para professores estagiários, de forma a que, em poucos anos, todos os professores da Escola tivessem sido sensibilizados para a importância do cargo, na detecção de problemas a nível de aprendizagem e de ordem familiar, social, económica e humana. Só mais tarde o Ministério deu conta das exigências desse cargo e veio a definir em lei um perfil para os Directores de Turma, como, por exemplo, que deveriam ser escolhi-

dos profissionais com capacidade de comunicação com vários interlocutores (pais, alunos, professores), compreensão, bom senso, disponibilidade, firmeza e espírito de trabalho em grupo. Todas as acções e formações assentavam em dois pilares: a legislação existente sobre o cargo, regime de assiduidade dos alunos, etc, e também sobre os vários órgãos da escola, e alertas, através de dinâmicas de grupo, da forma eficiente de desempenhar as várias funções do Director de Turma. Assim, entre as dinâmicas, era dada preferência à problemática da comunicação, a problemas de indisciplina na sala de aula e soluções a adoptar, à preparação e funcionamento de Conselhos de Turma e Conselhos Disciplinares, à orientação de reuniões com pais e também à organização do dossier de Director de Turma. Relativamente ao primeiro pilar – legislação – era preocupação nossa, as responsáveis pela formação, dá-la a conhecer, entregando cópias da mesma a todos, fazer a sua interpretação conjunta e modo de aplicação. Juntamente com a legislação, fornecíamos também modelos de convocatórias de pais e registo dos contactos com os mesmos, forma

de organizar o dossier do Director de Turma, que deveria conter todos esses elementos – legislação, registos, convocatórias, justificações de faltas, informações dos professores, etc. Na sequência das primeiras acções e em virtude da livre divulgação das mesmas pelos formandos, surgiram pedidos de outras escolas para que igualmente fossem dinamizados por esta equipa os seus Directores de Turma e professores estagiários. Pedidos que, graciosamente, fomos satisfazendo. Estas acções foram sempre feitas pelos dinamizadores com muito empenho, profissionalismo e gosto em transmitir atitudes básicas e fundamentais para o desempenho de tão exigente função. E talvez por isso, como estes conhecimentos não eram ensinados aos professores, à época, em parte alguma, a sua aceitação fosse tão positiva, como na realidade se mostrou, o que se constatava no final, pela avaliação escrita e anónima efectuada pelos formandos. Podemos dizer que a Escola Brotero, com esta sua iniciativa, mais uma vez marcou pontos como escola de vanguarda que sempre pretendeu ser.

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Do Gabinete de Projectos ao Gabinete

de

MOBILIDADE DE ESTUDANTES, E DESENVOLVIMENTO DE R

Ana Cristina Feio

Professora de Electrotécnica

Nota prévia: Este artigo foi escrito sem poder consultar a documentação existente. Com as obras de requalificação do edifício escolar, encontram-se as nossas fontes de consulta encaixotadas. Assim, foi recorrendo à memória que ele foi escrito e poderá haver aqui ou ali alguma pequena imprecisão. Agradeço aos professores Gaspar Dantas, Vítor Monteiro e em especial à professora Adosinda Antunes a especial colaboração.

Com a adesão de Portugal, em 1985, à Comunidade Económica Europeia ( CEE ) aumentaram as nossas possibilidades de participar em Programas comunitários. Assim, foram lançados diversos Programas, que pretendiam incentivar a mobilidade de estudantes e estagiários, nomeadamente, entre outros, os programas Língua a e Petra I. Nos finais dos anos 80, algumas escolas estrangeiras estabeleceram contactos com a Escola Brotero para a formação de parcerias. A primeira que se oficializou foi com o Lycée Grand’ Arc de Albertville, em França. Organizámos estágios de três semanas em empresas de Coimbra, para um grupo de quinze alunos, acompanhados de dois professores. No início dos anos 90, foi criado um Gabinete de Projectos, para dar continuidade e organização às iniciativas já existentes anteriormente. Destinava-se e destina-se a conhecer os programas europeus em vigor, os adequados à nossa realidade, seleccionar a analisar os meios existentes. Após esta fase, fazer as respectivas candidaturas e programação completa de execução, em colaboração com os nossos parceiros que, pre-

viamente, deram o seu acordo. Este processo é recíproco, pois também recebemos professores e alunos da nossa rede de parceria, que se tem mantido há muitos anos. Assim, como trabalho complementar, é-nos exigido nomeadamente organizar toda a logística em Coimbra, em que um dos pontos mais importantes é efectuar, mediante protocolos, a colocação e acompanhamento dos estagiários estrangeiros nas nossas empresas. É de salientar que as empresas de Coimbra, neste e noutros aspectos, têm tido connosco uma colaboração que é de realçar e louvar. Entretanto, em 1991, foi lançado o Programa Petra II. Fizemos visitas preparatórias e em 1992/93 organizámos os primeiros estágios de alunos, dos Cursos Técnico - Profissionais de Electrotecnia e Electrónica, em Albertville. De salientar que esta parceria continua, desde essa altura até agora, mas alargada a toda a região de Ródano – Alpes. No âmbito deste programa foi lançada uma candidatura na vertente Acção III, onde se incluía o desenvolvimento de projectos visando a introdução da dimensão europeia na formação profissional.

Assim e durante alguns anos estabeleceu-se uma parceria entre a Brotero, a ANFA (Associação Nacional para a Formação Automóvel de França), o Wirral Metropolitan College de Birkenhead/Liverpool, o Roc Utrecht College e , a Delta Schools, da qual resultou um CD interactivo sobre As Novas Tecnologias do Automóvel, acompanhado de um guia para o aluno e outro para o professor. Tudo isto nas quatro línguas envolvidas. Igualmente, e no mesmo âmbito, foi desenvolvido, ao abrigo do Programa Emprego/ Eixo Youthstart, o projecto Esabform, que envolveu uma parceria entre a Brotero o e escolas da Suécia, Grécia, Alemanha e Itália e consistiu na elaboração de um CD com conteúdos destinados a dois cursos de formação: “Redes de Energia, Gás e Água” e “Reparação, Venda e Manutenção de veículos automóveis”. Desenrolou-se nos anos de 1998 e 1999. Os cursos destinavam-se a jovens entre os quinze e os vinte anos, tendo como objectivos principais o combate ao insucesso, exclusão, e a inserção no mercado de trabalho. A avaliação e reconhecimento da importância da cooperação entre os estados-membros originaram a cria-

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de Relações Exteriores (de 1990 a 2009)

, ESTAGIÁRIOS, DOCENTES E RECURSOS DIDÁCTICOS Aquisição para novas abordagens e experiências de vida. Melhoria das competências linguísticas. A título de exemplo, na última década efectuámos (em números aproximados): Mobilidade de 350 alunos. Mobilidade de 30 professores acompanhantes. Mobilidade de 40 professores em formação. Acolhimento de 150 alunos de vários países europeus, que realizaram estágios, de duração variável, em empresas locais. Acolhimento de 100 professores, entre acompanhantes e participantes em projectos diversos.

ção de dois importantes programas comunitários: programas e Lonardo da iVnci e có Srates , de carácter global e integradores dos diversos programas anteriores. A primeira fase do Programa e Lonardo foi definida para um período de cinco anos, de 1995 a 1999. Baseou-se, entre outros, no Programa Petra a e numa parte do Programa íLn gua. O seu principal objectivo era o de melhorar a qualidade das políticas e práticas de formação. A primeira fase do Programa có Srates decorreu num período equivalente. No âmbito do Programa có Srates/Comenius foi desenvolvido um projecto de três anos, o Construbuild, que consistiu na construção em suporte multimédia e em suporte papel de um manual técnico (em três línguas) sobre ferramentas, materiais e técnicas utilizados na Construção Civil. As entidades envolvidas, além da Escola Brotero,

foram o e Leds College of u Bildings e oo Rc tUrecht College . Mas, além dos projectos que envolveram a produção de recursos didácticos, deu-se sempre particular relevo à mobilidade de alunos e professores. Tem sido nesta área que ao longo dos anos mais continuidade e intercâmbio de alunos e professores tem existido, nomeadamente em projectos na âmbito de todas as fases do Programa e Lonardo da iVnci , agora incluído no Programa de p Arendiza gem ao o Lngo da iVda . Podemos sintetizar as maisvalias que têm resultado para a comunidade envolvida: Melhoria de competências de cidadania. Melhoria da qualidade e acesso à formação profissional. Conhecimento de novas realidades culturais, formativas e técnicas.

Nesta Escola está uma nova fase da organização a ser iniciada. Começou com os Intercâmbios, organizou-se com o Gabinete de Projectos e está a continuar, a partir de 2009/2010, com o a Gbinete de e Rlações Exteriores . Nestes anos, muitos e muitos professores deram muito do seu trabalho para que tudo fosse possível e com um brio profissional generalizado. Sem estar a falar em todos os nomes, não se pode deixar de citar a professora Adosinda Antunes, que nos últimos anos coordenou o a Gbinete de Projectos, e desejar ao professor Vítor Monteiro, actual coordenador do a Gbinete de e Rlações Exteriores , que continue a contribuir para esta mais-valia da Escola Secundária de Avelar Brotero. Nota final: É da maior justiça enaltecer a autora deste artigo, eng.ª Ana Cristina Feio, como a empenhada e competente impulsionadora dos intercâmbios promovidos pela Brotero, tanto a nível nacional como internacional. AComissão das Comemorações

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Intercâmbio de Professores

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UM PEQUENO RELATO D JULIETA DAVID Professora de Inglês

Fui seleccionada para um intercâmbio com o Gymnasium An Der Stenner, em Iserlohn, Alemanha, de 22 de Fevereiro a 13 de Março de 1993. O professor Detlev Palluch esteve na ESAB de 17 de Abril a 7 de Maio do mesmo ano. Como no caso da escola alemã havia muitos alunos(as) filhos(as) de emigrantes portugueses, o professor Palluch sugeriu que organizássemos um Dia de Portugal no liceu, já que aqueles alunos desconheciam a Cultura Portuguesa. Como já estava habituada a trabalhar ao nível da Intercultura, aceitei o desafio , uma vez que tinha levado comigo documentação/ materiais que pudessem de algum modo ajudar os alunos portugueses e alemães a tomar consciência da cultura Portuguesa e assim incluir a dimensão Europeia no Liceu de Iserlohn. O Dia de Portugal foi realizado em 10 de Março de 1993. Em grupos de um ou dois, os alunos de origem portuguesa do Liceu apresentaram à comunidade escolar – alunos, professores e pais/mães – os seguintes temas: 1. História do vinho do Porto. 2. Camões, biografia e Lírica. 3. Diaporama sobre Portugal. 4. O Alemão e o Português – sons da língua Portuguesa inexistentes em Alemão. 5. Música Portuguesa – o fado. 6. O Sistema Educativo Português (este apresentado por mim). Assistiram a estas sessões profes-

O Programa de Intercâmbio de Professores da Comunidade Europeia iniciou-se no ano lectivo de 1989/90 e tinha como objectivo contribuir para a valorização da dimensão europeia na Educação, nomeadamente através de: 1. Incremento da cooperação entre escolas. 2. Elaboração de projectos europeus conjuntos, centrados em temas comuns. 3. Criação de redes e de associações de escolas. 4. Participação na vida da escola de acolhimento, quer em actividades curriculares, quer em actividades extracurriculares e culturais. No âmbito deste Programa decidimos candidatar-nos a uma bolsa a título individual, uma vez que pertencíamos ao Clube Intercultura/Clube Europeu e tínhamos prioridade na atribuição da bolsa. sores e alunos de cinco turmas, da parte da manhã, e, de tarde, foram novamente apresentadas as mesmas sessões e ainda um vídeo sobre Portugal, cedido pela Embaixada Portuguesa, com a presença dos pais e director do Liceu. Além da realização do Dia de Portugal, assisti a várias aulas no Liceu Gymnasium Na Der Stenner, em Iserlohn, em Hagen, na Ricarda-Huch – Shule e em Berlim na Marcel Grateau Berufsshule (escola profissional para cabeleireiro). Também fui ver aulas de Português (5.º ano – 2.º Ciclo do Ensino Básico) na Martin Luther Shule em Iserlohn. Tive ainda um encontro no Studienseminar, Hagen Bahnhof, ST, 7, sobre o sistema de formação de professores, pelo ex- formador de estágio Herr Loreng. Através de todos estes contactos fiquei a conhecer melhor o sistema educativo alemão de então em Westfalia e Berlim. Os sistema educativo português e alemão eram muito diferentes. O trabalho na sala de aula com os alunos nas escolas em que estive pareceu-me pouco dinâmico e tradicional. A existência de Hauptschule, de Realshule, de Gymnasium e

Gesamtshule tornava o ensino classicista. Havia escolas para bons e maus alunos. Não gostei do sistema. O nosso sistema de ensino unificado, com alunos de todos os níveis, é menos elitista e obriga-nos a um desempenho diferente e mais activo, pelo menos em relação aos professores(as) que conheço. Em contrapartida, no Gymnasium Na Der Stenner, os professores tinham tudo de que necessitavam na sala de aula: vídeo, gravadores, projectores, quadros móveis e fotocopiadora na sala de professores. Certamente, hoje terão também computadores e quadros interactivos. Era uma escola pequena, com cerca de 600 alunos, com aulas só de manhã, tendo 20 a 23 alunos por turma, embora também houvesse turmas com cerca de 30 alunos, nos 5.º, 6.º, 7.º e 8.º anos. Estas condições, disseram-me, não se aplicavam a todas as escolas, onde não havia condições de trabalho, com indisciplina e outro tipo de problemas. Pareceu-me que os professores tinham uma boa formação científica, que se evidenciava logo na escola secundária, com o tipo de disciplinas que os alunos tinham que escolher. O latim, por exemplo, era fundamental

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da Comunidade Europeia

O DAS NOSSAS VIVÊNCIAS GRAÇA GOUVEIA Professora de Inglês

para quem quisesse tirar um curso de Letras ou Medicina. O professor alemão Detlev Palluch,enquanto esteve na ESAB, assistiu a aulas de professores do 9.º Grupo (Detlev é professor de Inglês) e esteve presente numa sessão do Conselho Pedagógico. Realizou uma sessão sobre o sistema Educativo Alemão na Casa Alemã, para 31 professores, e visitou várias escolas do Centro do país. Perspectivou-se um intercâmbio de alunos entre a ESAB e o Gymnasium Na Der Stenner para consolidar a dimensão Europeia na Educação, mas não se realizou porque, entretanto, os alunos alemães foram convidados para desenvolver um intercâmbio com a Irlanda. Foi pena, mas não se perdeu tudo porque conseguimos motivar 19 alunos do 7.º ano para um Clube Alemão que funcionou durante um ano lectivo. Enquanto estive na Alemanha, fiquei hospedada em casa do professor Detlev, que por sua vez ficou em minha casa quando esteve em Coimbra. O facto de convivermos no mesmo espaço durante seis semanas foi importante para um conhecimento mais profundo da vida de professor(a) nos nossos países. Em termos gerais, a experiência foi muito positiva. Professores e realidades educativas diferentes fizeram cair por terra alguns estereótipos “ancestrais” que ainda poderiam existir sobre a Alemanha e os alemães. Algumas dúvidas surgiram em relação a muitas certezas e algumas dúvidas deram lugar a certezas relativas.

No meu caso, no ano de 1993/94 recebi uma bolsa para me deslocar a Holstebro Handelsskole, na Dinamarca. A professora dinamarquesa Jonna Christiansen veio para a ESAB de 8 a 29 de Outubro. Na escola dinamarquesa fui falar sobre Portugal a várias turmas com base no dossier elaborado em colaboração com colegas de História e Geografia. Constatei com grande surpresa que os alunos tinham uma ideia deturpada de Portugal, demonstrando uma grande ignorância sobre o nosso país, o que me magoou bastante. Os alunos ao verem os diapositivos e vídeos sobre Portugal não só ficaram a conhecer algo do nosso país como tomaram consciência das diferenças de cultura, objectivo do intercâmbio. Como leccionava turmas de alunos surdos, fui a uma escola em Ahrus Aont onde me familiarizei com os métodos de ensino e a integração dos alunos surdos no meio escolar. Visitei outras escolas na região (Jutelândia) e tomei conhecimento do sistema educativo em geral, desde o Ensino Básico ao Secundário. As escolas, especialmente as secundárias, eram excelentemente apetrechadas com a mais moderna tecnologia, dispondo os alunos e professores de todos os recursos necessários para o sucesso. A Jonna, quando esteve na ESAB, assistiu a aulas de Inglês e foi a

várias turmas falar sobre aspectos culturais, económicos e sociais do seu país e reuniu-se com o grupo de colegas de Inglês para dar a conhecer mais pormenorizadamente o Sistema Educativo na Dinamarca. Também visitou outras escolas da área de Coimbra, nomeadamente a escola de Febres (Escola de Ensino Integrado) e frequentou na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra um curso de Português para Estrangeiros, orientado pelo nosso colega António Ralha. Além destas actividades, participou na recepção a um grupo de professores e alunos de uma escola de Give na Dinamarca, que estavam a realizar um intercâmbio com a Escola Secundária de Jaime Cortesão. A Jonna esteve hospedada em minha casa e eu na dela, o que facilitou um relacionamento e conhecimento mais profundo das nossas diferenças e semelhanças pessoais e das nossas culturas. Este intercâmbio com a Escola da Dinamarca foi um dos momentos mais enriquecedores da minha vida quer a nível profissional quer a nível pessoal. O contacto de três semanas com uma cultura, uma sociedade e uma realidade diferentes, fez-me reflectir sobre a minha própria realidade e assim desenvolver a minha consciência intercultural.

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BROTERO, UMA ESCOLA DE S MARIA DE LOURDES FIGUEIRA PROFESSORA DE PORTUGUÊS

A Escola Brotero (que pertence actualmente ao Centro de Formação Minerva) foi sempre uma escola altamente prestigiada, uma escola de referência para Coimbra e todo o país. Quem vê o caleidoscópio Brotero o não pára de olhar um fluxo constante de acções mais ou menos coloridas, mais ou menos definidas, que se entrelaçam num movimento de singularidade permanente. No início, o seu gabinete de Física rivalizava com o da própria Universidade, com a qual a Escola partilhava professores e mesmo alunos, ou futuros alunos (que buscavam na Brotero outros saberes) – Egas Moniz, o nosso Nobel, Jaime Cortesão, Bissaya Barreto. Nomes sonantes integraram desde sempre os seus quadros de direcção e docência. Desde António Augusto Gonçalves, Sidónio Pais, Silva Pinto, Leopoldo Battistini, Charles Lepierre, Eugénio de Castro a Viana da Rocha, Sílvio Pélico, Antonino Henriques, Mário Soares, Padre Saúde, António Victorino, Amândio Cabral, Maria Teresa Morujão e outros mais, em lista infinda. Quão infindo é também o rol das grandes figuras que a Brotero o produziu para os bancos da Técnica, da Arte, da Ciência, da Vida, na cidade, no país, no mundo. Sempre a Brotero o desenvolveu uma consciência de Escola. Tentou promover um ensino de excelência. Combateu o insucesso, não desprezando a ajuda de quem sabe. Sempre se orgulhou do seu pendor tecnicizante e artístico. Por

muito que tenha sido empurrada para a uniformização (ou “licealização”...), nunca perdeu o seu cariz inicial. Tem uma alma a que se molda por aí, com o empenho constante dos seus técnicos. Assegura prestação profissional de qualidade, sem descurar a formação integral. Apresenta Projectos Educativos exigentes e Planos de Actividades abrangentes. Cultiva um clima democrático e de amizade. Tira hoje partido das experiências do passado, quando o contacto com carências de toda a ordem tornava os seus docentes mais abertos e humanos e a didáctica de cariz prático lhes abria mais facilmente as portas da Escola Activa. É sensível (sempre o foi) à neutralização dessas carências, quer sejam sociais quer culturais, quando as reconhece nos alunos de hoje e no meio que os envolve, com a oferta de actividades extracurriculares – desportivas, lúdicas, culturais, de defesa da integridade física, dos valores cívicos ou morais... A Brotero o soube optimizar o regime de coeducação de que sempre usufruiu. Acarinha os alunos da noite, um dos seus ex-líbris – foi a Escola da cidade que primeiro os recebeu e a única durante largos anos. Os laços fortes de entendimento e amizade entre professores e alunos, que foram uma realidade de vida no passado, tentam sê-lo no presente. Não é por acaso que os alunos de hoje batem palmas e oferecem flores à professora que esteve doente e voltou... A Escola Brotero tem-se aberto sempre ao mundo exterior. Entra na vanguarda dos tempos e avança. Essa

abertura está patente na sua capacidade de intervenção. De forte espírito crítico, discute, reage, luta. Junto das instâncias superiores, com a emissão de pareceres, reivindicações, protestos, dúvidas, tomadas de posição diversas. E junto dos parceiros sociais. Cede instalações. Recebe como boa anfitriã as mais diversas entidades. Tem estabelecido frequentemente intercâmbios com escolas de diversos países europeus, por via de regra trocando estágios. Tempos houve em que serviu o público (facultando análises, manufacturas, mão-de-obra especializada). Profissionalizou muitos docentes ao longo dos anos. Já em 1879 era uma das três escolas do país com tirocínio (a par de Lisboa e Porto). Preocupa-se com a formação contínua dos seus professores (e também dos seus funcionários), utilizando muitas vezes a prata da casa a (ou de outras casas...) em acções de autoformação por troca de saberes (particularmente antes da existência de centros de formação), e organizando visitas culturais. A Brotero o nunca gostou de recusar alunos por falta de espaço. Por esse motivo, chegou a recorrer a salas dispersas pela cidade e à criação de Secções, dentro e fora de Coimbra

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E SINGULARIDADE PERMANENTE

(das quais, mais tarde, quase todas se autonomizaram como escolas independentes – E. S. Jaime Cortesão, Lousã, Arganil). Promove a criação e apetrechamento de salas específicas com modernos modelos por vezes de alto valor, tirando partido, quando possível, de protocolos com empresas e de fundos comunitários. Fundos que lhe têm facultado a própria construção de alguns desses modelos – como a Casa Inteligente, quando tal valência até certo ponto ainda pertencia, na vida real, ao

mundo dos sonhos. Fundos que lhe permitiram também, a par dos oficiais, a ministração de cursos escolhidos, programados e regidos pelos seus grupos de docência. Tendo adquirido, por sua iniciativa, energia eléctrica antes da própria cidade, acolheu também cedo as novas tecnologias. Além dos cursos específicos e da concretização a seu tempo do Projecto Minerva, a mediateca, a utilização do Moodle, a criação de blogues, a iniciação do Projecto Ardósia, o uso de quadros interactivos são disso prova. As Artes, de alguns menos conhecidas, tomam ainda forma, também, nas variadíssimas peças que tem ostentado, em jeito de decoração-exposição, em salas, gabinetes, corredores, espaços exteriores. A Escola Brotero tornou-se, sem dúvida, uma verdadeira Escola-Museu.

Com um vastíssimo património de valor museológico – máquinas, utensílios didácticos, documentos, manufacturas de alunos (e professores), como peças de cerâmica, móveis de estilo, tapetes de Arraiolos, esculturas, pinturas, ferros forjados –, conserva o Passado, realiza o Presente e constrói o Futuro. Sempre valorizou e se apoiou nos seus Serviços Médicoss e de Psicologia e Orientação. Tem colaborado com a Associação de Pais, cuja criação muito acarinhou, e com as Associações de Estudantes. Tomou a iniciativa (a que deu continuidade) de reuniões e actividades com pais quando a relação Escola-Família era ainda incipiente. Os professores convidam por vezes os pais dos seus alunos (assim como outros colegas) para, na sala de aula, prestarem esclarecimentos sobre CONTINUA

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BROTERO, UMA ESCOLA DE SINGULARIDADE PERMANENTE

CONTINUAÇÃO

matérias específicas do seu especial conhecimento. Vislumbrando atentamente o futuro, a Brotero o teimou em lançar iniciativas de vanguarda: na prevenção e terapia da toxicodependência, de colaboração com especialistas (recordese a actuação do Padre Saúde e, posteriormente, dos professores Maria de Lurdes Rosendo e Carlos Marques e, mais recentemente, do Gabinete do Aluno o / Gabinete de Educação para a Saúde); na criação de uma sala / bar para os alunos e outra para os professores, de uma sala de jogos, de uma sala de estudo; na integração de alunos com deficiência – em 1981/82 foi pioneira na formação de um núcleo especial para surdos, o NADA, tornando-se hoje escola de referência em ensino bilingue; na criação, em 1973, de um Infantário o (de longa duração) nas suas instalações, devidamente adaptadas; na constituição de um Conselho Pedagógico antes da sua institucionalização legal; na oferta (que se prolongou em anos)

de acções de formação aos Directores de Turma, quando ainda mal elucidados sobre as suas competências, acções essas levadas, a pedido, graciosamente, a outras escolas; na promoção de encontros com dirigentes doutros estabelecimentos de ensino da cidade, para análise conjunta de problemas comuns. Soube vangloriar-se em 1984 do seu I Centenário, realizando um vasto programa de actividades, incluindo uma grandiosa exposição retrospectiva no Chiado, aberta ao país. Não foi por acaso que a Câmara Municipal lhe concedeu então a Medalha de Ouro da Cidade. Também não é por acaso que a Brotero o está presentemente a comemorar, com a pompa possível, os seus 125 anos de existência. O prestígio do passado, que lhe angariou prémios e renome, apesar de todas as mutações sofridas, manifesta-se ainda. Nos rankingss por classificações hoje em moda, esta Escola nunca terá tido as honras de primeiro-classificado. Mas num eventual ranking g por escolas em plenitude, que lugar se lhe atri-

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buiria? “Tornar bom o que já é bom nada tem de engenhoso” – afirmou o sempre alguém. O certo é que a Brotero foi uma escola para todos, uma escola “a oferecer soluções para todo o tipo de alunos”. Daí uma verdadeira Escola. E o que será mais relevante?... “A Brotero o tem os seus alunos que lhe dão vida. Mestres exigentes, que a prestigiam. Funcionário capazes, quando chega o momento, do impossível. Um clima familiar, que não exclui ninguém. O seu clã. Tem o seu brio. Poder de diálogo. Desejo de autonomia. A Brotero o luta com alma. A sua. Defende os valores estéticos e morais. Substitui cada vez mais a aprendizagem ao ensino. Olha, atenta, o mundo exterior. Positivamente constrói. Junta ao seu ex-líbriss de forma muitos outros ex-líbris. Orgulha-se do seu emblema. Do seu hino, que já não canta mas que sacraliza como um símbolo.” (Escola Brotero, Memórias de Sempre).


Uma escola que marca JOÃO SÁ PROFESSOR DE INFORMÁTICA

Enquanto aluno, passei por várias escolas. Depois da (antiga) primária, frequentei o ciclo preparatório – 5º e 6º anos – (actual 2º Ciclo do Ensino Básico) e, de seguida, numa terceira escola, os 7º, 8º e 9º anos. Foi no 10º ano que iniciei o percurso na Brotero, no Curso Tecnológico de Informática, que ambicionava. Devido à pouca disponibilidade dos transportes (horários pouco compatíveis), a que se somou a influência de amigos, com a conveniência de ter descoberto uma escola perto de casa com o mesmo curso, pedi transferência, deixando a Brotero o antes do final do primeiro período. Não me apercebi na altura, mas os cerca de dois meses aqui passados foram suficientes para deixar marcas. Foi por isso que, após conclusão do 10º e 11º ano noutra escola, decidi voltar à Brotero o para frequentar o 12º e concluir o ensino secundário. Nestes doze anos de estudo, o último foi sem dúvida o melhor: os colegas, os professores, o companheirismo, o estágio em Inglaterra, a viagem aventureira pelo Alentejo! … Foi um ano inesquecível.

Inesquecível e com um pano de fundo – a Brotero! Terminado o 12º ano, férias passadas, dei por mim no ensino superior, no curso de Engenharia Informática que desde o 9º ano elegi como objectivo. A vida académica, o próprio espírito do departamento que ainda hoje – noto – se tenta promover, o trabalho e o tempo dedicados a um curso absorvente, tudo me fez esquecer da Brotero. Ainda enquanto estudante universitário, iniciei a vida profissional que continuou, durante alguns anos, após conclusão da licenciatura [pré-Bolonha] sem qualquer ligação ao ensino. A certa altura, corria o ano de 2003, por várias razões que não vêm ao caso, surgiu a oportunidade e a curiosidade de dar aulas. Candidatura entregue, resultados publicados, eis que sou colocado na a Brotero. Não tive dúvidas, era o regresso inconscientemente esperado. Esqueçam as frases feitas, ou pelo menos aquela que nos leva a não voltar aonde já fomos felizes! Valeu a pena o regresso, mesmo se, agora, o papel é de professor em vez de aluno. A vida de professor tem as suas contingências e, enquanto professor contratado, como se diz na gíria, não

sendo profissionalizado, as perspectivas de continuar no ensino e na Brotero eram escassas. Descoberta esta vocação e o gosto pelo ensino, continuei um percurso que me pareceu natural. Fui preparando o rumo profissional em direcção à carreira docente, sempre com a informática como fio condutor. Em 2005/2006, leccionei uma segunda vez na Brotero o como professor contratado, antes de um período de três anos no Porto. Entre a realização da profissionalização longe de casa, a experiência de três anos em escolas bem diferentes da Brotero o e todas as alterações a que temos assistido na(s) escola(s), em Setembro de 2009 realizo um objectivo: regresso à Escola que também considero minha. Agora, numa época de mudança, de visível desconforto para muitos colegas, onde a única constante parece ser a imprevisibilidade, espero que o meu pequeno contributo permita retribuir um pouco do que a Brotero me tem dado, ajudando a preservar a identidade e o espírito de uma Escola que, indubitavelmente, tem o seu lugar na História.

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