Escola Médica de Salerno

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Escola Médica de Salerno A . M. M e y r e l l e s do Sou to

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BOOK 9 789898 614247

A . M. M e y r el l es do Sou to

scola édica de

alerno

Natural de Lisboa (7 de Junho de 1934). Iniciou o curso de Medicina no Campo de Sant’Ana (dois anos – os últimos em que funcionou – continuando depois, no hospital de Santa Maria – ”fechei uma faculdade e abri outra”). Acabou o Curso em 1960, com a tese “Estudo experimental dos métodos de conservação do enxerto ósseo”. Classificação final de Bom. Serviço militar em Moçambique (1961-63); Louvado e condecorado com a Medalha de Mérito Militar. No regresso, iniciou o Internato nos HCL e terminou-o em 1972 com a categoria de Especialista em “Ortopedia e Fracturas”. Durante mais de oito anos frequentou como Tenente Miliciano o Hospital Militar Principal. Passou à Disponibilidade a seu pedido. Continuou nos HCL e na Clínica Privada.

Scuola Medica Salerniana A . M. M e y r e l l e s do Sou to

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Outros títulos da By the Book: Médicos Medievais Naturais de Al-Andaluz (2014) Cadernos de um cirurgião (2014) O “Espírito dos Hospitais Civis de Lisboa” (2013) Omnia Sanctorum : Histórias da História do Hospital Real de Todos-os-Santos e seus sucessores (2012) Podem ser adquiridos em www.bythebook.pt


© Edição By the Book, Edições Especiais Título Scuola Medica Salernitana © Texto A. M. Meyrelles do Souto Médico da Sociedade das Ciências Médicas de Lisboa da Sociedade de Geografia de Lisboa Antigo Presidente da Direcção de História da Medicina Revisão Isabel Santa-Bárbara Impressão Real Base ISBN 978-989-8614-24-7 Depósito Legal 384353/14

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Edições Especiais, lda Rua das Pedreiras, 16-4º 1400-271 Lisboa T. + F. (+351) 213 610 997 www.bythebook.pt


ndice 9

Prefácio

12

Cristianismo e Islamismo

26

Civitas Hippocratica

36

Professores

46

Scuola Medica Salernitana

51

Regimen Sanitatis Salernitanvm

73 74 93

Regimento de Saúde Salernitano Tradução de Henrique Pinto Rema Tradução de Sebastião Tavares de Pinho

113

Glossário

115

Bibliografia



refácio Introduzir esta obra é uma honra que agradeço ao Autor, A.M. Meyrelles do Souto, um Médico que, como tantos outros médicos portugueses, se tem dedicado a investigar os fundamentos históricos desta nobre profissão. O objectivo deste livro é o de dar a conhecer uma Escola Médica que existiu em Salerno. É um trabalho de grande erudição que desenha um quadro completo do que foi esta Escola de Formação de médicos que durou muito tempo, com períodos de grande esplendor e períodos de difícil manutenção, e que foi extinta, por vontade de Napoleão, em 29 de Novembro de 1811. Segundo o Autor a sua origem remonta ao século VIII e nela convergiram saberes médicos hebraicos, gregos, árabes e latinos. A localização privilegiada de Salerno no lado Sul da Baía de Nápoles, deu-lhe grande importância no comércio marítimo entre o Mediterrâneo oriental e os diversos povos do Mediterrâneo ocidental e do Norte de África. O trabalho de Meyrelles do Souto apresenta esta evolução de cerca de mil anos da Escola de Salerno referindo os nomes dos seus principais Mestres as suas obras e o seu reconhecimento no tempo. Algumas publicações de Mestres da Escola de Salerno foram usadas por outras Escolas de formação de médicos durante mais de cem anos. E o célebre Pantegni (Arte Total) que Constantino traduziu do Árabe e que “muitíssimos anos depois ainda era texto em Salerno e outras Escolas como Montpellier e Bolonha”.


ristianismo

&

slamismo


Após a queda do Império Romano do Ocidente, a Europa, tomada de Roma em 476 pelos Germânicos, na sequência da Invasão dos Bárbaros, perdeu muito da sua herança intelectual; só restou: dos gregos a Enciclopédia; de Plínio e dos romanos, pouco ou nada. O encerramento da Academia de Platão [1] em 529, por Justiniano, levou muitos escolares a procurarem refúgio na universidade da capital Persa. A Pérsia, desde 636 e por mais de 200 anos, tornar-se-ia parte integrante do Império Islâmico e seria o grande centro de ensino do mundo islâmico. O “Mundo Europeu” – o Mundo Ocidental – centrou-se, então, na Igreja Católica a qual deu ênfase à caridade: os doentes eram acolhidos nos mosteiros, melhor dizendo, nas “enfermarias” ou hospícios, para esse fim, a eles anexos; aí ou se curavam ou morriam consoante a vontade de Deus. Parece, o primeiro destes hospícios ter sido fundado, cerca de 369 em Cesareia, na Capadócia, por São Basílio Magno [2] (Helenoponto 329-379), Bispo daquela cidade – na sequência do Concílio de Niceia (325) – com duas secções: Nosocómio [3] (para os doentes) e Xenodoquia [4] (espécie de albergue, para os estrangeiros, para os passantes) e serviu de modelo a outros congéneres. Médicos não os havia, assim como não havia administração de medicamentos; apenas conforto físico e moral: a oração e a adminis[1] Fundada em 387 a.C., o ensino baseava-se na discussão e em seminários, e era

sobre matemática e dialéctica. [2] A. Meyrelles do Souto, Médicos e Santos, pp 26-28. [3] Nósoskomûon: cuidados que se dão aos doentes. [4] Xeno: estranho (ou estrangeiro). Xenodoquia era a acção de receber estranhos,

hospitalidade.


tração dos Sacramentos, pois, o tratamento da alma suplantava o do corpo. Não era a doença considerada flagelo divino? O Cristianismo, ao prescrever a prática da caridade e do amor ao próximo, faz nascer uma medi­cina cristã (oração, unção com os santos óleos e imposição das mãos); por oposição à medicina tradicio­nal – a pagã, de seitas místico-religiosas – pois estas tinham ritos mágicos vários: – os sénios curavam, exclusivamente, pela fé e a evocação de poderes “superiores”; – os seguidores de Simão Mago usavam mistura de elementos órficos, isto é, do culto de Orfeu, com o culto de Esculápio e ofereciam ritos mágicos; – os neo-platónicos, seita baseada nas doutrinas de Zoroastro e outras aristotélicas antigas. Tinham como base o facto do mundo estar repleto de emanações divinas, estas estavam armazenadas em demónios os quais causavam as doenças e só se podiam combater em estado de êxtase (pródromos da narco-análise?); – os gnósticos usavam, como “profilático”, talismãs os quais eram diagramas místicos, tendo inscrita uma das duas “palavras mágicas”: Abraxax e Abracadabra. A prática da medicina religiosa cristã era considerada como um dever, um preceito de caridade, mas, não incluía a investigação da causa das doenças, pois, estas eram atribuídas à vontade de Deus [5]. Chegando-se mesmo ao ponto de médicos, no século III, acusarem outros médicos por citarem Galeno em vez de elevar a Deus as suas preces para a cura dos doentes. Surgiu, deste modo, o culto dos Santos Padroeiros (ou Advogados) – cada doença (por vezes uma parte do corpo) tinha o seu patrono. Muito rapidamente, alguns exemplos: São Roque contra a [5] Conceito herdado do Judaísmo.

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peste (ainda hoje representado coberto de pústulas e, junto de si, um cão trazendo-lhe um pão); São Brás [6], para “males da garganta”; clamava-se por Sant’Iago contra a lepra; assim como Santo Antão, para o ergotismo; para os olhos, evocava-se Santa Lúcia (ou Luzia); São Bernardo era advogado para as “doenças dos pulmões”; Santa Apolónia protegia das “dores de dentes”; para as “dores das costas” era a São Lourenço que se recorria; apelava-se a São Guido ou São Vito, na Coreia Minor (ou Coreia de Sydenham). A Medicina depois de ter sido, sucessivamente, mágica, religiosa e empírica e de se ter tornado, posteriormente, na Grécia Antiga, prática racional; de objectiva e experimental em Alexandria; depois de ter imposto a higiene à cidade de Roma – construção dos esgotos, as cloacas [7] – volta a ser, após a queda do Império Romano do Ocidente, novamente religiosa, no Império Bizantino. No século VI “os monges, entre os christãos do occidente, exerciam quasi exclusivamente a medicina como obra de piedade e caridade, como um dever inherente à profissão religiosa”. (Sprengel – Histoire de la Médecine depuis son origine jusqu’au dix-neuvième siècle, Paris, 1815, p. 345). Em toda a Idade Média (sobretudo nos séculos V a X ) o ensino da Medicina recolhia-se aos claustros conventuais, onde se sabia ler e escrever, se conhecia o Latim, o Grego e o Árabe (“o saber grego arabizado”) por vezes com o apoio de judeus vindos das Hespanhas (Al-Andaluz, como diziam os árabes) fugidos aos almóadas safraditas. Isto, até finais do século XII. Estes mosteiros e suas escolas monásticas tornaram-se, posteriormente, nas Escola Catedralícias que, por sua vez, originariam, mais tarde, as Universidades; é exemplo São Bento de Montecassino.

Falecido em 3 de Fevereiro de 316, é hoje, o patrono dos laringologistas (A. Meyrelles do Souto, Médicos e Santos, Lisboa, 1945). [6]

[7] Canais que iam do fórum ao Tibre, como sabemos.

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