CASA VIVA

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CASA VIVA

JULIANA LAPA

CARPINA - PERNAMBUCO 2023

CURAD ORIA OVITACUDE BrunaRafaella MATERIAL

DIDÁTICO

POR UMA EMANCIPAÇÃO COGNITIVA

Este material didático foi pensado como um ponto de partida para inspirar pesquisas, reflexões e criatividade. Ele inclui sugestões didático-pedagógicas que permitem uma abordagem aberta e adaptável, sem impor uma única visão do que é a arte ou o processo criativo.

Quando trazemos a arte para o contexto doméstico, estamos falando de várias maneiras de viver e experienciar o mundo. Queremos promover uma conversa sobre essa diversidade e sobre viver a vida de maneira compartilhada.

CASA VIVA, de Juliana Lapa, nos convida a pensar sobre a importância do acolhimento e da hospitalidade. Habitar como proposição poética. Lar como local que ativa a magia do Contar: relatos de identidade feminina, memórias de territórios de resistência, doces e amargos registros históricos, paisagens interiores.

MEMÓRIAS E SONHOS ABERTOS E COLETIVOS

A CASA VIVA é aberta como um espaço de atração e mobilização dos sentidos. Nela foram elaboradas obras, ações, intervenções e mobiliário que provocam dinâmicas individu-

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ais e coletivas para um exercício de deslocamento, nas formas como nos relacionamos com a arte e com o espaço onde vivemos.

Ao entrar, os visitantes são convidados a se envolver em uma experiência multimídia que desafia as noções convencionais de “casa”, como ambiente exclusivamente privado, “museu”, como principal instância de difusão garantida por uma política pública cultural, e “arte”, que na exposição é apresentada de modo a recusar comportamentos que condicionam, constrangem e distanciam as pessoas.

PATRIMÔNIO/FLORESTA

A historiografia oficial relata diversas causas geradoras para o surgimento das cidades na Zona da Mata no Nordeste do Brasil, sendo estas geralmente associadas às relações econômicas, o que por sua vez remontam ao processo de colonização e a devastação secular das florestas dessa região pela monocultura da cana-de-açúcar. “Colonizar é subjugar, humilhar, destruir ou escravizar trajetórias de um povo que tem uma matriz cultural, uma matriz original diferente da sua” (Antônio Bispo dos Santos). O que implica pensar a história da ocupação de Carpina sob a narrativa do mito fundante de sociedade pernambucana na “açucarocracia”*? O que as matas dessa região testemunharam na constituição deste município?

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Se cidade é “o contrário de mata” (Antônio Bispo dos Santos), devemos lembrar: todo território urbano é subjetivo, já que foi submetido a linhas imaginadas e criadas por pessoas. Todo território urbano é também insuficiente, ainda que sonhe e se declare completo.

A partir dessa perspectiva, lançamos um olhar reflexivo sobre a construção identitária da cidade de Carpina, e com isso nos propomos imaginá-la ampliando a percepção e consciência do papel de certas narrativas hegemônicas. Interpretamos essas histórias como representações em processo de transformação.

Através da produção artística de Juliana Lapa e do avivamento de um reconhecido local de habitação num centro comercial pulsante, queremos acessar os sentimentos dos indivíduos em relação ao território onde vivem ou transitam. Com isso pretendemos expandir suas histórias, criar novas e projetá-las na cidade. Em movimento de vai e vem, saímos da esfera doméstica, privada, e partimos para a pública, e vice-versa. O mapa afetivo nos possibilita refletir sobre questões que pulsam não só na sociedade Carpinense mas em toda aquela onde desejamos nos reconhecer no espaço.

* Termo cunhado pelo historiador Evaldo Cabral de Mello para abordar o exercício do poder político e social pelos senhores de engenho, usineiros e seus apaniguados no Nordeste do Brasil do período colonial. Os senhores de engenho formavam o topo da açucarocracia. Já os lavradores eram vistos

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como “sócios menores do grupo senhorial”. A açucarocracia capitaneada pelos senhores de engenho constituía em Pernambuco, até os idos séculos XVIII, a chamada “nobreza da terra”. Somada à tradição revoltosa do estado, a açucarocracia possuía grande poder de barganha com a Coroa portuguesa.

“Para a Coroa, Pernambuco merecia uma atenção especial das autoridades metropolitanas não apenas por ser uma terra de restauradores, mas principalmente por causar grande preocupação e um permanente receio na Coroa, pois esta capitania possuía uma elite das mais “orgulhosas” e “melindrosas” da América portuguesa.” (LISBOA, Breno, in: Uma elite em crise: a açucarocracia de Pernambuco e a Câmara Municipal de Olinda nas primeiras décadas do século XVIII, 2011, p. 191)

ESCAVAR O FEMININO

Na CASA VIVA o conceito de “feminino” é moldado em resposta a diversos marcadores sociais, geográficos e temporais relacionados ao ato de receber. “Para que o ovo atravesse os tempos a galinha existe” (Clarisse Lispector). Para que a CASA VIVA exista mãos femininas escavam-na no tempo. A casa dentro da casa. Quantas casas a CASA VIVA pode abrigar?

Ferir a pedra para abrir janelas do tempo. Esta foi a principal ação conduzida na construção dos desenhos que preenchem as paredes da sala que propõe um resgate histórico na CASA VIVA. Por meio de fotos, documentos e da revelação de antigas camadas de pintura da edificação, Juliana migra seus desenhos-quase-pinturas (cheios de matéria e de textura) de bases como o papel para a superfície arquitetônica.

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Essas inscrições gráficas foram oportunizadas por duas circunstâncias. Uma, por meio da apropriação de uma técnica conhecida na área da conservação e restauração de bens patrimoniais como “prospecção estratigráfica”**, e outra, pela observação cuidadosa na seleção das cores reveladas a cada decapagem de camada de tinta.

O que em tantos outros processos anteriores à Casa se define por acúmulo de material artístico ou narrativo, nos desenhos Prospecção Casa Viva se conforma por subtração. Ou melhor, por escuta. Desse modo, Juliana Lapa se faz destinatária de murmúrios do passado, os quais fricciona aos sons do seu redor presente, misturando assim sua obra ao mundo.

** consiste em uma técnica de “raspagem” com o uso de bisturis de camadas de tintas anteriores de um determinado revestimento, o que permite entender o edifício como um documento, e tais prospecções, aliadas a estudo e projeto de restauro, podem fundamentar a reconstituição aproximada para uma fisionomia próxima aquela vigente em sua época de construção em diferentes períodos históricos.

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MAPAS AFETIVOS

Diariamente nos deslocamos na cidade, mas muitas vezes não nos damos conta de nós mesmos ocupando os lugares por onde passamos. Que tal fazermos um mapa coletivo do espaço urbano? Quais elementos povoam suas lembranças com a cidade?

Para esta atividade, podemos usar qualquer superfície de riscar, reutilizar papel grande de embalagem, o verso de cartolina daquele trabalho já descartado ou mesmo a lousa escolar. Também é possível usar recortes de revistas, giz de cera, canetas coloridas, lápis grafite ou de cor ou outros materiais nas cores e tamanhos de sua preferência.

Depois de mapear a cidade, cada participante pode traçar seus percursos, registrando seu caminhar com uma linha desenhada com material colorido ou com uma linha de barbante. Vamos marcar os trajetos que costumamos fazer para ir ao mercado, à escola, ao trabalho ou outros lugares. Escolha um material ou cor diferente para se perceber a pluralidade dos percursos possíveis.

Qual o percurso que você fez até chegar na CASA VISA?

Quais desenhos formam seu caminhar? Quantos mundos cabem na sua rota?

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FROTTAGE

Você conhece a técnica de frottage? A frottage é um processo intuitivo que estimula a percepção criativa nos espaços cotidianos propondo descobertas e uma leitura sinestésica das texturas que habitam nosso repertório visual.

A frottage (do francês "frotter", em português "friccionar") é uma técnica muito simples - basta lembrarmos daquela brincadeira de extrair o desenho de uma moedinha, riscando até “pintar” com lápis grafite um papel em cima dela. Na frottage se utiliza papel e um lápis grafite ou de cor, ou outra ferramenta de desenho, como giz de cera ou carvão, para fazer uma "fricção" sobre uma superfície texturizada.

É possível extrair as texturas (desenhos) das diversas partes de um objeto ou de superfícies com relevo, como folhas, bordados ou outros objetos usados no dia a dia, para montar uma composição gráfica única que pode ainda gerar infinitos desdobramentos criativos.

Que superfícies texturizadas você percebe na CASA VISA? Vamos ao encontro do desenho no mundo.

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ARTISTA

Juliana Lapa

CURADORIA E EDUCATIVO

Bruna Rafaella Ferrer

COORDENAÇÃO DE PRODUÇÃO

Mery Lemos

PRODUÇÃO LOCAL

Joseane Rocha

PRESTAÇÃO DE CONTAS

Rosinha Assis

MARCENARIA

Luiz V. A. Maciel Filho

João Diego Farias de Paula

FOTOGRAFIA

Danilo Galvão

PESQUISA HISTÓRICA Rodrigo Sávio

PROJETO GRÁFICO

Estúdio Ligatura

(Heitor Moreira e Rod Souza Leão)

CONSULTORIA EM RESTAURAÇÃO

Walas Fidelis

INCENTIVO:
PRODUÇÃO: APOIO:
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