A LENDA DA NASCENTE DO RAMO - ALCABIDEQUE (Condeixa-a-nova)

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A Lenda da Nascente do Ramo Recolha oral de Fernando Abreu junto de Teresa Lêdo. Adaptação de Rede de Bibliotecas de Condeixa (Anabela Costa). Projeto 30 dias, 30 livros. 2016. Readaptada para a participação do 1ºB no concurso “Conta-nos uma história” 2021.

REDE DE BIBLIOTECAS DE CONDEIXA 1/2/2021


Conta a lenda que há muito, muito, mas mesmo muito tempo, existia uma pequena aldeia onde todos viviam felizes. Nessa terra, os campos eram verdes, férteis e floridos, as árvores estavam sempre cheias de frutos, o sol brilhava, as pessoas cultivavam as terras e sorriam. A fome não existia naquela aldeia, pois a água cristalina e fresca que corria dos riachos, das nascentes e das fontes era abundante e alimentava a natureza e todos os animais.

Como a água é tão preciosa e um bem do qual temos que cuidar, pois a sua falta põe em risco a harmonia e felicidade de todos, os animais escolheram de entre si quem iria ter a função de vigiar as fontes de água. Escolheram um belo pássaro azul, que lembrava a cor da água e que, por ser tão rápido, conseguia facilmente percorrer as longas distâncias que separavam as fontes. Era o guarda- rios.

GUARDA-RIOS: Bom dia, meus amigos. Vocês sabem que a água é fonte de vida? Sem ela o mundo morria. Temos que cuidar muito bem dela! Vocês vão ajudar-me? Combinado! A nossa missão de vigiar a água é muito importante! Estejam atentos!

Um dia, a água começou a desaparecer. Não chovia e as águas das fontes e das nascentes, que foram sempre tão abundantes, deixaram de correr. As árvores e a vegetação ficaram secas, os homens e animais não tinham água para beber. A seca chegara, e com ela a fome e a tristeza de todos!

GUARDA-RIOS: O que está a acontecer? Já repararam nas árvores e nos campos? Estão secos. A água é tão pouca… Algo de muito errado está a acontecer! Fui avisando todos para pouparem a água que consumiam, mas os seres humanos foram egoístas e foram gastando e gastando… Estou já cansado de sobrevoar todas as nascentes, mas não vejo a razão desta seca? Tínhamos uma fonte que era a mais abundante, mas secou! 1


Perto da Nascente de Alcabideque, que é uma freguesia de Condeixa-a-Nova, o guarda-rios encontrou um grande sapo. Ficou muito intrigado, pois pensou que se calhar a culpa da falta de água se devia a este animal!

SAPO: Rabit…. Rabit….

GUARDA-RIOS: Um sapo… Como é que um animal tão minúsculo consegue parar a água? Bem, este aqui não é assim tão pequeno. E está muito bem tratado!

SAPO: Ora vê lá como é que falas, ó passaroco! Estás a chamar-me gordo?

GUARDA-RIOS: Não Sr. SAPO! Gordo não, forte! Musculado, grande e com um aspeto maravilhosamente importante! Era o que eu queria dizer!

SAPO: Ah bom! Assim, sim! Respeitinho é muito lindo e eu gosto!

GUARDA-RIOS: Mas agora reparo… não tens ar de passar fome nem sede. Estás lustroso, luzidio, eu diria até brilhante!

SAPO: Lá estás tu outra vez com essas indiretas! Pois fica sabendo que eu cuido muito bem da minha saudinha! Só como os insetos mais suculentos, em intervalos de duas ou três horas, e bebo muita água!

GUARDA-RIOS: Fazes muito bem, muito bem! Mas era justamente aí que eu queria chegar! Ao contrário dos restantes animais e da natureza, não pareces estar a sofrer nada com esta seca. Isso é muito estranho! Ora, olha lá em volta. Já viste como está tudo seco e os animais estão magros e cheios de sede? Tu estás exatamente o oposto. Rechonchudo, cheio de saúde…

SAPO: Já estás a abusar! Se não paras de me chamar gordo, ainda te devoro, como se fosses um inseto. És tão antipático como todos os outros animais!

GUARDA-RIOS: Calma, calma! Não te quero ofender. Mas, porque achas os animais antipáticos? Nós somos até muito amigos, ajudamo-nos uns aos outros e somos sempre muito simpáticos. Até o animal mais feroz de todos, o homem, é nosso amigo e nos respeita. Pelo menos, nesta aldeia. 2


SAPO: Andas mesmo tapadinho, ó passaroco! Isso é tudo a fingir! Pois olha, a mim, todos me tratam muito mal. Os humanos, então, são os piores.

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Alguns têm medo de mim, porque me acham nojento e feio. Dizem que as bruxas me usam para fazerem magia negra. As crianças tentam apanhar-me para realizarem experiências. Detesto-os! São uns malvados!

GUARDA-RIOS: Não são nada! Olha bem para estas crianças que estão aqui a passar. Achas que eram capazes de te fazer mal? Eles adoram os animais! E quanto às bruxas, nem as há! Pois não meninos? Isso és tu que pensas nesses disparates!

SAPO: Olha e agora chama-me tolo! Disparates, disparates! Eu é que sei o que passo. Sempre a rirem de mim ou com um ar de nojo! Cansei-me de os ouvir dizer: “Blargh! Que verde! Que peganhento e húmido! Sai daqui, sai daqui!” E, se eu não salto depressa dali, sabe-se lá o que me podem fazer! Patas para que vos quero!

GUARDA-RIOS: Oh Sapo, o verde é uma cor tão linda! É a cor da esperança!

SAPO: Ora, estás a tentar amansar-me! Eu bem sei! Sabes passaroco? Revoltei-me contra esta situação e resolvi dar uma lição a todos!

GUARDA-RIOS: Que lição? Que fizeste?

SAPO: Ainda não reparaste? E dizes tu que guardas os rios, quando tu nem serias capaz de guardar a tua própria cauda! Cuidado que ainda te arrancam as penas! Eu explico… Diziam que tinham nojo de mim por eu ser verde e húmido, não era? Decidi mostrar-lhes como o verde e a humidade, ou seja, a água, são tão importantes na nossa vida. Agora já devem estar felizes. Olham em volta e já não veem verde nenhum. Apenas o castanho da terra seca… AH! AH! AH! Divirto-me imenso a ouvir as queixinhas de todos: “Ai que não chove! Ai que não há água nas fontes! Ai que as árvores estão todas secas e os legumes não crescem! Que saudades de ver tudo verdinho!“ Blá, blá, blá! Só se sabem queixar! 4 GUARDA-RIOS: O quê? Tu é que és o responsável por esta tristeza? Por esta fome? Por esta sede? Por esta terrível seca que só traz o sofrimento e a morte? És um grandessíssimo… EGOÍSTA! SAPO: Lá vêm os insultos! Que querias que eu fizesse? Vocês mereciam! 3


Sentei-me em cima desta nascente, tapei o buraco e agora não sai pinga de água! Tomem lá!

GUARDA-RIOS: Era bom que compreendesses que para os outros gostarem de nós, nós temos também de gostar deles. Ajudá-los, conversar, sem raivas e sem vinganças ou maldades! Todos achamos que és um Sapo verde muito bonito, mas a beleza não importa, pois a verdadeira beleza encontra-se dentro do nosso coração e na forma como influenciamos positivamente a vida dos outros. E fica sabendo que todos nós achamos que tens imensa importância na nossa vida.

SAPO: De verdade? Porquê? Eu não presto para nada!

GUARDA-RIOS: Isso é o que tu achas e não os outros. Tu é que não gostas de ti mesmo! Os sapos são animais muito importantes, pois ajudam-nos a combater as pragas de insetos que atacam as nossas plantações, que picam os animais e os humanos e, por vezes, até espalham doenças!

SAPO: A sério? BUÁÁÁÁÁ! BUÁÁÁÁÁ! Até estou emocionado! Nunca vi as coisas dessa maneira. Que posso eu fazer agora?

GUARDA-RIOS: Não chores mais. É simples! Basta saíres de cima da nascente! Assim, a água correrá novamente livre e trará consigo a vida!

SAPO: Não posso! Estou aqui entalado!

GUARDA-RIOS: Não podes? Claro que podes!

SAPO: Não, não posso! Eu bem queria, mas não consigo! Estou para aqui entalado! Até acho que o meu rabiosque já não é verde, mas sim roxo! Sabes, eu prometi a mim mesmo que só sairia daqui, se uma princesa se apaixonasse por mim e eu por ela, claro! Olha para mim… Achas que alguém se apaixona por mim? Fogem mas é a sete pés! Estou condenado a ficar aqui até ao fim dos meus dias e condenei-vos a todos a ficar sem água, para sempre!

GUARDA-RIOS: Não percas a esperança. Nunca ouviste dizer que “ENQUANTO HÁ VIDA HÁ ESPERANÇA”? Ainda por cima, tu que és da cor da esperança!

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SAPO: Mas eu não posso sair daqui! Ajudas-me? Prometes?

GUARDA-RIOS: Claro que sim! Como nesta aldeia não há princesas, pois todos são agricultores ou pastores, vou voar até reinos mais distantes e prometo que encontrarei uma princesa linda, com um coração ainda mais lindo para te fazer companhia. Adeus, até breve!

SAPO: Adeus meu amigo, guarda-rios! Volta em breve!

NARRADOR: E o guarda-rios começa a sobrevoar as terras…

GUARDA-RIOS: Ufa! Já sobrevoei tantos reinos e não descobri nenhuma princesa linda que fosse bondosa e simpática! Esta tarefa está muito difícil! Ajudem-me meninos! Esperem lá! Meninos? Meninos e meninas… Eu andava muito distraído. Estava tão preocupado em procurar princesas em locais distantes que nem reparei no que tinha aqui tão perto, na turma do 1ºB! Tantas princesas…. E são todas tão lindas por fora e por dentro, no seu coração! CARAS PRINCESAS, quem de vós gostaria de conhecer um Sapo solteiro e bom rapaz? Rapaz? Rapaz não, Sapo! Quem quer casar com o Sr. Sapinho que é tão bondoso e tão verdinho?

(as alunas da turma vão se oferecendo até que o guarda-rios escolhe uma) GUARDA-RIOS: És então tu a princesa que vai ajudar o Sapo a sair da solidão, e a aldeia a reviver de novo? Vamos lá então? Agarra nas minhas patas e eu levar-te-ei ao teu belo sapo.

GUARDA-RIOS: Olá amigo sapo! Esta é princesa …. (dizer o nome da menina que se ofereceu para ser a princesa) Do reino de Condeixa-a-Nova. Não é linda?

SAPO: Meus Deus, é tão linda! Olá, eu sou o Sapo!

GUARDA-RIOS: Cara princesa, este é o Sapo!

PRINCESA: Olá, Sapo. És bem bonito e simpático! 5


SAPO: Queres casar comigo?

PRINCESA: Claro que quero!

SAPO: Podes dar-me uma beijoca?

PRINCESA: Sim!

A menina beija o Sapo que desaparece e aparece um menino lindo que era um príncipe enfeitiçado por uma Bruxa má. Afinal as bruxas existem…. mas só nas histórias! Neste momento a água da fonte volta a jorrar.

PRÍNCIPE-SAPO: Salvaste-me! Aceita este ramo de flores como prova do quanto eu gosto de ti!

GUARDA-RIOS: VIVA! VIVA! O feitiço findou! A princesa o Sapo beijou, que num belo príncipe se tornou e esta história tão bem acabou!

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O príncipe sapo e a sua apaixonada princesa decidiram ficar a viver naquela aldeia, que batizaram com o nome de Alcabideque, nome que quer dizer “fonte de água". O Sapo que se tornou um príncipe feliz e apaixonado e a sua princesa compraram as terras de Alcabideque e deram-nas ao povo para que as cultivassem e partilhassem os frutos do seu trabalho. Note-se que, a partir daquele dia, a água límpida da nascente que o SAPO tapava nunca mais parou de jorrar, tendo-se criado aí uma fonte a que o povo chamou de FONTE DO RAMO, em memória do ramo de flores que o príncipe-sapo ofereceu à princesa, como prova do seu amor. Assim, Alcabideque tornou-se conhecida como uma terra feliz, rica e muito fértil, pois a água abundava, e onde a fome e a sede nunca mais existiram. E desta forma terminou esta bonita lenda que explica como surgiu a fonte do Ramo e o nome da aldeia de Alcabideque, aqui tão próxima. Então e o príncipe sapo e a princesa? - Perguntam vocês…. Esses viveram felizes para sempre. Para sempre, é verdade! Diz-se que depois de velhinhos e por darem tanta importância à água e a Alcabideque, ambos se transformaram em sapos verdinhos e vigiam também eles, juntamente com o guarda- rios, as águas deste local.

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Por isso, se forem a Alcabideque e virem um guarda-rios ou ouvirem sapos a coaxar, quem sabe se não serão os da lenda que cantam o seu amor e que alertam os seres humanos para

a

necessidade

de

melhor

cuidarem do seu património natural, a água.

”A ÁGUA É UM PATRIMÓNIO QUE DEVEMOS CUIDAR” FIM

Lenda popular Nascente do Ramo. Recolha oral de Fernando Abreu junto de Teresa Lêdo. Adaptação de Rede de Bibliotecas de Condeixa (Anabela Costa). Projeto 30 dias, 30 livros. 2016. Readaptada para a participação do 1ºB no concurso “Conta-nos uma história” 2021.

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