As duras lamentações de uma coroa

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ESTE FOLHETO É PARTE INTEGRANTE DO ACERVO DO BEHETÇOHO EM FORMATO DIGITAL, SUA UTILIZAÇÃO É LIMITADA. DIREITOS AUTORAIS PROTEGIDOS.


INFORMAÇÕES SOBRE O PROJETO O Acervo Eletrônico de Cordéis do Behetçoho é uma iniciativa que pretende dar consequências ao conceito de (com)partilhamento dos artefatos artísticos do universo da oralidade, com o qual Behetçoho e Netlli estão profundamente comprometidos.

INFORMAÇÕES SOBRE A EQUIPE A equipe de trabalho que promoveu este primeiro momento de preparação e disponibilização do Acervo foi coordenada por Bilar Gregório e Ruan Kelvin Santos, sob supervisão de Edson Martins.

COMPOSIÇÃO DA EQUIPE Isabelle S. Parente, Fernanda Lima, Poliana Leandro, Joserlândio Costa, Luís André Araújo, Ayanny P. Costa, Manoel Sebastião Filho, Darlan Andrade e Felipe Xenofonte


ABRAÃO BATISTA

AS DURAS LAMENTAÇÕES DE UMA COROA



Eu gosto de observar as cousas da natureza para andar acertado e de tudo ter a certeza, como sentir nos meus lábios o gosto dessa beleza. Quando eu ando sozinho no meio da multidão o meu espírito se ocupa em toda a sua extensão de ouvir de perto, a voz serena do coração.

Pois, numa dessas andanças que eu sozinho encontrei-me com uma coroa em determinado caminho chorando, se maldizendo só por faltar-lhe carinho.


A coroa se lamentava com tanta reclamação que eu parei para ouvir com toda a minha atenção por achar o choro dela ser digno de compaixão. Não sei se o amigo leu dois folhetos que escrevi falando sobre a “coroa” como hoje entendi apresentando um terceiro contando tudo o que vi. A gente vê porque sabe embora não se acredite; o povo conhecedor concorda nesse palpite revelando então, o verso o que escrevi à grafite.


Pois bem, quando passei eu fiquei em posição que a cora não me via por padecer de emoção já que dava uns esturros de incomodar até leão.

Eu fiquei para ouvir e no papel eu anotei as lamentações de uma coroa que por isso quase chorei e compadecido dela sete dias eu fiquei. Até que fiquei com pena da miserável coroa lamentando a sua sina na beira duma lagoa por seu pranto ser grande bem no meu ouvido ecoa.


Ela dizia: 贸 meu Deus que triste sina a minha! Quem me dera, quem me dera que ainda fosse mocinha para tirar a desforra dessa vida sozinha.

Todo dia tomo banho com o sab茫o mais cheiroso boto talco do melhor e estrato do famoso]s贸 para ver se eu agarro um rapaz rico e formoso

At茅 que me conformava desde que tivesse aquilo... com qualquer homem, casava fosse gordo ou fosse um grilo! -E continuava a coroa nesse triste estribilho.


Quem me dera que eu tivesse 17 anos de idade! Se eu tivesse esses anos com toda a sinceridade eu namorava todo homem que vivesse na cidade! – Eu namorava os rapazinhos carecas e cabeludos eu nãoo enjeitava atletas baixinhos, pretos e pançudos eu namorava até os doidos dos manicômios sizudos!

Eu já fui até São Paulo para ver se me casavam mas os pestes dos paulistas nem para mim eles olhavam e só lá eu descobri como as amigas me enganavam!


Me disseram que em São Paulo tinha homem aos montões mas os que lá me olhavam eram aqueles dos senões... com perucas coloridas mini-blusas e macacões.

Se eu fosse ainda mocinha eu nunca diria um não; me arrependo pois eu fui muito cheia de ilusão... Eu pensava que homem era igualzinho a qualquer cão.

Para um cão a gente estrala com o dedo e ele vem balançando o rabo dele mas, o homem isso não tem ai quem me dera ser mocinha e gritava o eim, eim, eim...


Se eu tivesse 18 anos eu vestia como princeza chamava todos os rapazes que morasse na redondeza e somente eles e eu banqueteavamos com realeza...

Quem me dera que eu fosse jovem, bonita e faceira eu só vivia entre os homens como uma dama primeira eu era como Cleópatra: sabida, fácil e ligeira! Mas agora eu estou só triste e desiludida já passei dos 33 como perdi a sacudida se eu subo a minha saia a minha pele está frangida


Se eu procuro rebolar logo, dói o panariço o reumatismo do pescoço endurece o meu toitiço e as pernas não aguentam... ... me botaram foi feitiço!

Quem me dera ser mocinha pois, eu banca não botava - eu me lembro: nas lapinhas quantos rapazes eu negava e nas festas da Padroeira os pretendentes não contava!

Agora estou desgraçada não há quem me queira mais... garanto que os guaxinins que moram nos canaviais enjeitarão os meus ossos na fome dos canaviais.


Se eu fosse jovem ainda no meio de um salão... o diabo é quem esquentava e faria renda no chão... eu mesma me levantava e tirava o cidadão!

Me dá uma raiva tão grande quando eu vejo uma donzela não querer que o namorado pegue e beije na mão dela!... Substituir essa moça é o que meu peito apela.

Se arrependimento matasse muitas vezes eu morreria arrenego aquelas vezes que às amigas eu dizia: vou entrar para o convento... Credo, cruzes, Ave-Maria!


Quando me lembro dessas coisas me dá um desgosto no peito que sinto azia na guela e o meu sonho desfeito dizendo – tai safada dessa vez não tem mais jeito! Eu sou mesmo miserável o meu caso é sem solução antes de morrer vou dar tudo o que tiver na mão mas não vou morrer agora – batendo com o pé no chão... Eu só posso acreditar que nem o diabo me queira apanho e boto num balaio e vendo tudo na feira - metia o dedo nos olhos que lhe rasgava a beira.


De que me serviram as novenas que eu fiz pra São José?! não acredito mais em canto tudo isso é um filé... vou picar meu Santo Antônio só com a ponta do quicé. Quantas vezes eu rezei a trezena de Santo Antônio! Parece até ser armada do horroroso demônio... vou rezar a cabra preta mas garanto meu patrimônio. Não é possível que eu morra sem um homem conhecer armei todas as arapucas mas não pude merecer nem que fosse um aleijado... dessa vez eu vou morrer!


Eu era tão bonitinha fazia tantos castelos... agora sou uma desgraçada com meus dentes amarelos estou de bucho quebrado que não vejo os meus chinelos! Nessas alturas eu estava com um frio na garganta não minto – quase chorei por isso, você se espanta e agora esse meu verso pela coroa se alevanta.

Eu deixei a coroa chorando se maldizendo não fiquei, porque já disse: quando vejo alguém gemendo o meu coração se abala e também fica roendo!

FIM



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