Edição 298 Jornal Universitário de Coimbra - A Cabra

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17 DE DEZEMBRO DE 2019 ANO XXIX Nº298 GRATUITO PERIÓDICO DIRETOR PEDRO EMAUZ SILVA EDITORES EXECUTIVOS LUÍS ALMEIDA, HUGO GUÍMARO E DANIELA PINTO

Do Polo I ao Polo III: novas soluções entram na fila das cantinas Estudantes da UC lamentam tempo de espera. Novas­­­obras, contratações de funcionários e métodos de pré-pagamento no plano de ação dos SASUC PÁG. 3

HUGUS GUÍMARUS

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ENSINO

CULTURA

DESPORTO

CIÊNCIA

CIDADE

Antigas e atuais caras da DG/AAC esclarecem a dívida interna da casa. Relatórios acusam os valores dos últimos anos

No retorno dos Cantos da Casa, as 25 edições dos Caminhos que colocaram Portugal no mapa do cinema

Secção de Basebol procura ‘home-run’ nas instalações de treino. CD/AAC diz garantir as melh­ores condições possíveis

Caráter sazonal da gripe e a importância da vacinaão são explicados por especialistas

Aumento do turismo na Baixa de Coim­bra não se reflete na adesão às lojas tradicionais, que se vêem forçadas a encerrar


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O peso da burocracia na mala de um estudante em Erasmus Estudantes defendem que principais problemas residem na falta de comunicação com coordenadores de área. Experiência de mobilidade pode resultar em mais um ano de licenciatura

- POR MAFALDA PEREIRA E TOMÁS BARROS -

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programa europeu de mobilidade Erasmus+ envolveu cerca de 21 mil estudantes portugueses de Ensino Superior em 2017. Com o mote de tornar possível o contacto entre alunos e universidades de outros países, quem se inscreve revela que nem tudo são rosas. Falta de apoio por parte dos coordenadores, problemas com equivalências e custos adicionais são os principais inconvenientes apontados pelos alunos. Ana Carlos, licenciada em Ciência da Informação pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (FLUC), decidiu inscrever-se no programa Erasmus+ em 2017. Foi na Universidade La Sapienza, em Roma, que passou o primeiro semestre do terceiro ano de licenciatura. Refere que a má comunicação com a respetiva coordenadora foi uma das dificuldades com as quais se deparou. Ao chegar à cidade que a acolheu durante seis meses, a estudante teve de refazer o plano inicial, sem obter resposta por parte da coordenadora. Ao regressar, “não foram reconhecidas as cadeiras que tinha feito por não coincidirem com o plano original e fui obrigada a devolver a bolsa na totalidade”, segundo conta. A par de Ana Carlos, outros estudantes admitiram ter passado por experiências semelhantes no que toca ao apoio prestado pelos coordenadores. Rita Flores, antiga aluna de Jornalismo e Comunicação na FLUC, afirma que “os professores têm de ser os primeiros a ajudar e isso não chega a acontecer”. Apesar de considerar o programa de mobilidade uma experiência enriquecedora a nível pessoal e profissional, a estudante viu a sua licenciatura “por um fio”. A estadia de Rita Flores em Barcelona ficou marcada pela falta de informação e esclarecimento em relação às unidades curriculares. Estes inconvenientes tiveram repercussões na vida académica da estudante, que partiu com a garantia, por parte do seu coordenador, de que as alterações necessárias às cadeiras seriam resolvidas. De regresso a Coimbra, o processo não estava formalizado. Rita Flores esclarece que “o problema foi a informação não ter chegado em tempo adequado”. Mónica Santos e Francisca Lobato frequentam a licenciatura em Jornalismo e Comunicação da FLUC e encontram-se em Lòdz, na Polónia. Admitem que a verdadeira ajuda proveio de alunos que passaram pelo mesmo programa em anos anteriores, uma vez que “o coordenador não costuma estar presente”. Mesmo num processo inicial, as alunas queixam-se da falta de atenção e cuidado por parte dos profissionais. Revelam ainda que, na maioria das vezes, são os próprios alunos que tratam de todo o processo. Em resposta a estes problemas, o coordenador de mobilidade na área de Jornalismo e subdiretor da FLUC, Sílvio Santos, admite que, por vezes, sucede o contrário. “Já aconteceu tentarmos acompanhar uma situação e o estudante não se mostrar preocupado”, contrapõe. O professor acrescenta que estas são situações que podem acontecer “tanto de um lado como do outro”.

O presidente da Erasmus Student Network (ESN), Pedro Valente, salienta que a parte mais complexa do processo acontece quando os alunos chegam a Coimbra e os créditos das unidades curriculares feitas em mobilidade não são validadas pela UC. Muitas vezes, “é dito ao aluno que o processo é simples, mas a verdade é que quando não há inscrições suficientes numa disciplina, esta não abre e o aluno tem de arranjar uma alternativa, o que pode ser difícil”, explica. Na perspetiva de Pedro Valente, as complicações despertadas pelo programa podem trazer várias consequências. A perda de uma oportunidade de crescimento pessoal e curricular é, na ótica do presidente, um mal menor quando comparado com o medo de ver a licenciatura prolongada. “Muitos alunos evitam fazer Erasmus+ porque sabem que vão ter de fazer um ano extra”, lamenta. Em adição, a UC, “que diz querer ser internacional”, perde prestígio, sustenta. Para Pedro Valente, “é essencial começar a pensar, não só na mobilidade ‘incoming’, mas também na ‘outgoing’, ou seja, na projeção de estudantes para fora do país”. A chefe da Divisão de Relações Internacionais

(DRI) da UC e coordenadora institucional do programa Erasmus+ na UC, Liliana Moreira, esclarece que, antes de dar início à aventura, é assinado um contrato de aprendizagem que contém as unidades curriculares elegíveis para equivalência. Adianta que “se trata de um contrato e que quem o assina se responsabiliza por todo o processo de equivalências. É a única forma de garantir que não há falhas”, conclui. Albano Figueiredo, coordenador dos programas de mobilidade da FLUC, refere que o papel de um coordenador de área deve residir na ajuda aos estudantes. A carência de auxílio é justificada pelo docente com o facto de “estes profissionais também serem professores, o que pode suscitar dificuldades em conciliar tarefas“. Uma das possíveis soluções para estreitar a relação coordenador-estudante, levantada por Liliana Moreira, reside na criação de gabinetes com pessoal técnico, de forma a dar uma ajuda mais próxima aos alunos. “Embora estes gabinetes já existam em algumas faculdades, seria importante que essa boa prática se estendesse para as restantes”, sublinha a chefe da DRI.

MARTA EMAUZ SILVA


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Novas soluções para problemas recorrentes nas cantinas da UC Horários de almoço coincidentes levam a sobrelotação dos espaços. Reabilitação da Cantina Amarela, bar de Informática com refeições e nova esplanada no Polo III pretendem diminuir tempo de espera - POR CAROLINA FERNANDES E ANTÓNIA FORTUNATO -

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as 15 unidades alimentares distribuídas pelos três polos universitários, dez servem prato social. O Jornal A Cabra entrevistou vários estudantes nas filas das cantinas e a longa espera é o principal problema apontado. O administrador dos Serviços de Ação Social da Universidade de Coimbra (SASUC) garante que o reaproveitamento dos espaços, a introdução de métodos de pré-pagamento e a contratação de mais funcionários são algumas das soluções a ser implementadas. As cantinas são uma opção óbvia para Joana Castro, aluna na Faculdade de Direito da UC. “A comida é boa e barata”, confirma. No entanto, a demora no serviço leva-a a optar por almoçar noutro local quando “não há tempo para estar à espera”. “As filas são intermináveis, uma pessoa quer comer e acaba por ter de ir a restaurantes mais caros”, acrescenta. Ricardo Agostinho, aluno na Faculdade de Medicina da UC, partilha de uma opinião semelhante. Ir à cantina “é mais barato e mais saudável”, constata. Adianta que existe uma variedade aceitável na ementa e elogia a presença de um prato vegetariano. Mais uma vez, a demora da fila nas horas de ponta é a principal crítica. Já Marcelo Gomes, estudante na Faculdade de Ciências e Tecnologia da UC, considera a comida no complexo alimentar do Polo II “um pouco repetitiva”. Apesar disso, continua a escolher a cantina por julgar o preço acessível. Todos os alunos entrevistados referiram períodos de espera entre os 15 e os 30 minutos, que acham elevado, tendo em conta a duração da hora de almoço. De forma a diminuir o tempo gasto nas filas, Joana Castro julga que “é crucial servir o prato social na Cantina Amarela”. O administrador dos SASUC, Nuno Correia, garante que esta já está a ser remodelada para poder albergar o prato social e deve ficar concluída no início do próximo ano. “De fora não é percetível, mas por dentro tivemos de reformular tudo”, explica o administrador. No geral, Nuno Correia indica três situações distintas que resultam nos elevados tempos de espera: “a forma como se faz o pagamento, o atendimento e a capacidade da sala”. Em resposta ao primeiro problema, o administrador esclarece que os refeitórios vão disponibilizar um sistema de pré-pagamento. “Os alunos da UC vão poder comprar refeições com antecedência, através de uma ‘app’ associada ao cartão”, revela. Explica que, de momento, é apenas possível carregar o cartão de estudante. “O dinheiro acumulado pode ser usado para pagar serviços dos SASUC, nas lavandarias e nas cantinas”, esclarece. Está ainda prevista a instalação de quiosques nas unidades alimentares para aquisição de refeições no momento, com ou sem cartão. Estes sistemas de pré-pagamento vão ser implementados em janeiro como projeto piloto, clarifica o administrador. Numa fase inicial, vão ser testados em algumas cantinas pelos três polos. Para Priscila Neves Moreira, aluna na Faculdade de Economia da UC, a melhoria do tempo de espera na Cantina São Jerónimo consegue-se através do “aumento da quantidade de funcionários”. Ricardo Agostinho

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apresenta a mesma solução para as cantinas do Polo III. “Por vezes, as pessoas que estão a servir têm de registar o pagamento dos alunos. Com mais um ou dois funcionários o trabalho pode ser mais organizado”, clarifica o estudante. Segundo o administrador dos SASUC, está a decorrer um processo de contratação para as cantinas, que pode empregar, no máximo, 20 elementos. Até ao momento, já foram integrados na equipa dois novos cozinheiros, acrescenta. Para o administrador, “o trabalho dos funcionários é vital e tem de ser reconhecido”. O reitor da UC, Amílcar Falcão, aponta uma solução para a demora das filas. Refere que “é necessário um desfasamento nos horários de almoço”, mas que é um problema a ser resolvido de forma interna nas faculdades. Para responder à falta de espaço nas unidades alimentares, planeia-se a “criação de uma esplanada na Cantina Luzio Vaz, no Polo III”, adianta o administrador. A expansão do Cantina Estádio Universitário é outro projeto a ser desenvolvido. No entanto, Nuno Correia ressalva que “não se pode intervir em várias cantinas ao mesmo tempo”. Como explica, é necessária a gestão dos projetos, uma vez que não é possível fechar cantinas sem alternativas suficientes para receber os estudantes. Questionado sobre a possível utilização da antiga Cantina Verde, instalada junto ao Departamento de Arquitetura da UC, Nuno Correia refere que a mesma já não está sob alçada dos SASUC. “Está entregue aos laboratórios de investigação de Psicologia” e não é, por

isso, passível de ser utilizada para aumentar os espaços de refeição, declara. No Polo I, a Cantina das Químicas é outra preocupação dos serviços. Segundo o administrador, a renovação da cantina está nos planos da UC. “As Químicas precisam de uma intervenção, não só no refeitório, como na cozinha e na copa”, elucida. Nuno Correia adiciona que as obras ainda não têm uma data prevista. Relembra que “a gestão tem de ser feita em função do ‘timing’ e dos recursos financeiros”. Conforme o site da UC, no Polo II existem dois espaços com oferta de prato social: o Complexo Alimentar do Polo II e o bar do Departamento de Engenharia Mecânica. O administrador dos SASUC informa que o bar do Departamento de Engenharia Informática está a ser renovado para oferecer algumas refeições. Nuno Correia justifica a existência de ‘buffet’ na cantina como forma de “acomodar eventos, como congressos internacionais, que contribuem para a estratégia de internacionalização e investigação da universidade”. A oferta vegetariana é uma valência que tem sido melhorada, de acordo com o administrador. “Houve necessidade de formar os funcionários para saberem como preparar este tipo de refeição”, completa. O objetivo apontado é obter refeições apelativas e de qualidade. Amílcar Falcão denota ainda que, para assegurar a riqueza nutricional do menu, os SASUC recorrem a uma nutricionista. Assim, o reitor garante que “as ementas são equilibradas e saudáveis”. Contudo, Nuno Correia relembra que “há sempre melhorias a fazer”.


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Dívida interna: de onde vem e para onde vai Valor da dívida ao Conselho Desportivo da AAC é uma constante nas contas da casa. Antigo ­a dministrador admite que nem todos os valores estão corretos - POR SIMÃO MOURA E BRUNO OLIVEIRA -

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dívida interna da Direção-Geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC) é um tema complexo que se arrasta há largos anos. A inalteração do valor a pagar ao Conselho Desportivo da AAC (CD/

CRISTIANO MATIAS

AAC), e o baixo lucro da Queima das Fitas (QF) são o que dificulta a abordagem deste tema. Numa análise aos dois mandatos de Alexandro Amado, o então administrador da AAC, João Ferreira, confessa algumas dificuldades. O atual presidente da casa, Daniel Azenha, revela as estratégias da atual administração para lidar com este problema. De acordo com o Relatório Anual e Contas de 2016, a dívida ao CD/AAC era de 205.562,53 euros. Esta manteve-se em todos os relatórios posteriores. Como explica João Ferreira, o valor é “referente a contratos de 2012”. Muita é considerada interna, mas “sem explicação”. O ex-administrador da DG/ACC lembra ainda que “há valores que são imputados na dívida interna que são fruto de erros contabilísticos”. Sobre a dívida ao CD/AAC, o Relatório Anual e Contas de 2018 expõe que os números são referentes aos anos de 2013 e 2014 (percentagens do valor dos contratos com a Meo e com a Caixa Geral de Depósitos) e aos anos de 2015 e 2016 (percentagem do valor do contrato com o Montepio). João Ferreira recorda que o contrato da Portugal Telecom revertia para o CD/AAC. “Quando acabou, em 2012, a DG/AAC não pagou ao desportivo. Depois entrou em vigor um contrato com a Caixa Geral de Depósitos. Os contratos do Montepio fixaram a mesma percentagem que era dada pela Caixa”, aponta. O antigo administrador conclui que “alguns valores estão corretos e outros não”. Durante a presidência de Alexandre Amado, o que foi pago da dívida interna pela DG/AAC foram “os contratos que estavam em vigor na altura”, explica João Ferrei-

ra. Ou seja, a dívida não aumentou, mas também não foi reduzida. O que continua por saldar antecede os mandatos de 2016/2017 e 2017/2018. Daniel Azenha confirma a declaração e acrescenta que o objetivo “é reunir com o CD/ AAC e perceber o valor total da dívida”. No que diz respeito à QF, o Relatório Anual e Contas de 2016 mostra que existe uma dívida de 73.351,94 euros a esta estrutura. No entanto, nos relatórios dos anos seguintes, os montantes não foram aprovados. De acordo com João Ferreira, esta questão passa pelo contrato feito com a Super Bock, que “imputava sempre 220 mil euros à QF, quer a DG os recebesse ou não”. Acerca da QF‘17, o ex-administrador esclarece que “se apurou ter dado prejuízo e que o problema vem de há muitos anos. Ao longo do tempo, foram considerados valores de lucro da QF que, na realidade, não existiam”. “Isso foi uma das correções no novo contrato com a Super Bock”, lembrou João Ferreira. Como consta no Relatório Anual e Contas de 2018, a “DG/AAC decidiu adiantar 50 mil euros aos conselhos da casa, referentes à edição de 2017 [da QF]”. Sobre esta quantia, Daniel Azenha clarifica que não se trata de um empréstimo, como tinha decidido a direção de Alexandre Amado. “Trata-se antes de uma injeção de capital que não espera retorno”, elucida. O atual presidente confessa que, em relação ao festival, “há muito a melhorar” e estima que a dívida à Comissão Organizadora da QF “ronde os 25 mil euros”. Enquanto isso/em contrapartida, o administrador da AAC, João Gonçalo, aponta que o valor se aproxime de 69 mil euros.

Estudante internacional paga sete vezes mais: reitor adia questão por falta de tempo Reitor garante que acolhimento ao estudante internacional vai ser melhorado. Alunos contestam que valor da propina internacional não se reflete na qualidade do ensino - POR CAROLINA PRODAN E PEDRO TEIXEIRA SILVA -

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propina dos estudantes internacionais tem sido o foco de atividades promovidas pela Associação de Pesquisadores e Estudantes Brasileiros (APEB) e o Conselho Geral da Universidade de Coimbra (CGUC). A UC cobra, neste momento, sete mil euros por ano a estes alunos. Os fóruns criados têm como objetivo elaborar uma proposta concreta de aplicação da propina a estudantes internacionais, para entregar à reitoria. Até à data, não foi entregue um documento final. O reitor da UC, Amílcar Falcão, explica que “a preocupação com estes estudantes não é tanto o valor da propina, mas sim a qualidade do ensino e dos serviços”. O presidente da APEB, Rafael Firpo, defende que “a quantia cobrada não tem uma boa relação custo-benefício, tendo em conta a realidade da UC”. Denner Déda, estudante do Mestrado Integrado em Engenharia Química na Faculdade de Ciências e Tecnologia da UC, também se opõe ao valor da propina e sublinha que “quer estudar numa universidade em que pague aquilo que custa”. Luís Coimbra, representante do 3º ciclo no CGUC, adianta que a proposta a entregar à Reitoria “já está bastante avançada” e que, no próximo semestre, vão apresentar algo concreto. O

membro do CGUC admite que tem havido uma boa recetividade por parte da Reitoria. Conclui que “o que interessa é ter uma proposta justa que represente a maioria”. Amílcar Falcão realça que tenciona ponderar a questão da propina internacional, mas ainda “não houve tempo”. Esclarece, também, que a análise só pode ter implicâncias no ano letivo de 2020/2021. O reitor admite que o tema merece reflexão e garante que, no próximo ano, se vai melhorar, ainda mais, o acolhimento ao estudante internacional. Denner Déda e Amílcar Falcão partilham a convicção de que o valor da propina não pode ser igual para estudantes nacionais e estudantes internacionais. O mestrando reconhece que “os pais destes alunos não pagaram impostos nem fizeram esse investimento a médio/longo prazo em Portugal”. Ainda assim, acredita que o preço seja um entrave para muitos colegas que pretendam estudar em Coimbra. Pietro Mack, aluno da Licenciatura em Arqueologia na Faculdade de Letras da UC, desabafa que o “valor cobrado é absurdo, até porque é superior ao salário mínimo nacional”, embora compreenda as razões do custo. “Muitas pessoas vêm para a Europa em busca de uma educação de qualidade e acabam por pagar o mesmo que em algumas

universidades privadas brasileiras”, explica o estudante. Quando questionado sobre a qualidade do ensino, o mesmo mostra-se satisfeito e afirma que “tem aulas com professores de renome”. Segundo a própria instituição de Ensino Superior (ES), em 2018, a UC foi capaz de reunir mais de seis milhões de euros em propinas de estudantes internacionais . Rafael Firpo sublinha que “é surreal para a realidade económica do Brasil e dos países lusófonos pagar sete mil euros anuais à UC”. Relembra que esta “deve ser uma luta conjunta entre os alunos, não só brasileiros, como também dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa”. O presidente da APEB considera que “o sonho de Coimbra ainda vale a pena, mas podemos trabalhar por uma experiência ainda melhor”. Os números relativos à propina internacional são díspares entre a UC e outras instituições de ES do país. Na Universidade do Porto, a frequência dos cursos de 1º ciclo e Mestrado Integrado implica o pagamento de uma anuidade que varia entre três mil e oito mil euros, conforme o curso. Na Universidade de Lisboa, o valor das propinas também varia. O preço vai dos três mil aos 12.500 euros. No Instituto Superior Técnico, o valor é fixo e tem um custo de sete mil euros anuais, tal como na UC.


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FOTOGRAFIA CEDIDA PELO CEC

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31 anos de Caminhos resumidos em 25 edições

Transformação de mostra de cinema em festival foi ponto de viragem na história do Caminhos. Falta­­­­ de reconhecimento dentro da academia não impede crescimento do evento, segundo organização - POR CARLOS TORRES -

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elebrou-se no passado mês de novembro a 25ª edição do Festival Caminhos do Cinema Português, que conta com 31 anos de história. O evento estreou-se em 1988, num registo mais cineclubístico, como lembra António Monteiro, antigo membro da direção do Centro de Estudos Cinematográficos da Associação Académica de Coimbra (CEC/AAC). Intitulada de Mostra de Cinema Português, esta atividade surgiu de uma parceria entre o CEC/AAC e a Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Numa reportagem de Juliana Pereira, disponibilizada pelo CEC/AAC, João Amado Gabriel, cofundador do Caminhos do Cinema Português (CCP), revelou que a primeira ideia era realizar um ciclo de cinema de antestreias. Este acabaria por não se realizar, já que, quando os realizadores foram contactados, mostraram pouca recetividade ao evento criado pelos estudantes. Surgiu então, em julho de 1988, a primeira mostra de filmes portugueses, que contou com obras de realizadores consagrados, como Luís Filipe Rocha, João César Monteiro e Manoel de Oliveira. O evento teve três edições, com a última a decorrer em 1990. Seguiu-se um interregno de sete anos. A quarta edição da mostra de cinema viria a ocorrer em 1997, organizada pelo CEC/AAC. A reafirmação do evento ocorreu no ano seguinte. A transformação da mostra em festival estava solidificada, e foi a primeira vez que se constituiu um júri oficial e se atribuíram prémios aos realizadores vencedores. A introdução de ações de formação no painel de atividade do festival ocorreu em 2003. Esta iniciativa contou com grandes nomes do cinema nacional, como Virgílio de Almeida, Paulo Filipe Monteiro e Henrique Espírito Santo. Hoje em dia, o CEC/AAC continua a fornecer este tipo de atividades à comunidade interessada, caso do curso de cinema “Cinemalogia”, criado em 2011.

Sobre esta iniciativa, o vice-diretor do festival, Tiago Santos, revela que “se pretendia que qualquer estudante da Universidade de Coimbra pudesse aprender como é fazer um filme”. Acrescenta que “se começou a ter cada vez mais intervenientes de relevo e se procurou convidar as pessoas que ganham prémios a vir ensinar a sua perspetiva sobre determinada fase do trabalho”. Uma outra aposta do CCP passou pela criação do “Caminhos Juniores”, sessões de cinema especiais para as escolas do distrito de Coimbra. Uma edição recordista Em 2012, a 19ª edição do festival ficou marcada por ter sido um ano de recordes. Segundo os dados fornecidos pelo CEC/AAC, houve um total de 390 filmes candidatos às diferentes seleções do festival. Foi também uma edição de destaque no que toca à cobertura mediática, visto que se chegou aos cinco por cento da quota das audiências de filmes nacionais. Por outro lado, esse ano ficou também marcado pelo corte nos apoios à produção de cinema em Portugal. A falta de verbas em 2013 levou à suspensão do festival, pelo que a vigésima edição apenas ocorreu no ano seguinte. Tiago Santos conta que no ano de 2014 tudo funcionou bem. “Era uma equipa que estava bem entrosada e tivemos a sorte de ter uma comunicação espetacular”, relembra o vice-diretor. Desde então, o festival tem crescido em audiência, como mostram os dados do CCP. O registo da audiência global atingiu um total de 11.994 espectadores, no ano de 2018. No mesmo ano, foram a competição 762 filmes, repartidos pelas diversas seleções do festival. Houve também um total de 292 menções na imprensa. Sobre a evolução técnica que o festival tem sofrido, o responsável pela programação, João Rui Pais, considera que esta resulta “de uma ponte entre o CEC/ACC e a sala de projeção do Teatro Académico de Gil Vicente

(TAGV)”. A responsável pelo secretariado-geral, Sílvia Ferreira, recorda que, na época em que fazia parte da organização do CCP, tinham de fazer programação em película e em vídeo. “Na altura era feita com base no formato disponível porque o TAGV nem sempre tinha técnicos disponíveis”, lembra. No que diz respeito ao reconhecimento da própria academia, Tiago Santos considera que “a falta de comparência de membros do Conselho Cultural da AAC nas sessões, nas cerimónias de abertura ou de encerramento acaba por refletir um pouco essa falta de consideração interna”. O vice-diretor do festival lembra que há “um esforço do CEC/AAC em abrir o evento à comunidade académica e que, por isso, se convida todas as secções a marcar presença nas sessões”. Por outro lado, “naquilo que é o envolvimento na academia real, ou seja, na universidade, o Caminhos sente um grande reconhecimento”, explica o vice-diretor do festival. A título de curiosidade, tanto João Rui Pais como Tiago Santos revelam alguns episódios caricatos que enfrentaram enquanto membros da direção do CCP. Tiago Santos começa por descrever uma situação que se passou em 2010, relacionada com as ‘after-parties’. “O Teatrix era o nosso parceiro de programação da altura e decidiu fechar a porta de repente. Foi muito mau porque tivemos de cancelar artistas e viagens e dar a cara por um problema que não era da nossa responsabilidade”, conta o vice-diretor. O programador conta ainda uma das coisas que mais o surpreendeu no festival, em 2018. “Já havia uma data marcada para o início do evento, estava tudo organizado, mas na altura de marcar hotéis e restaurantes não havia nenhum disponível. O festival acabou por começar um dia depois e a programação que estava planeada para nove dias teve de passar para oito”, explica João Rui Pais.


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“A Terceira Margem do Rio”: um conto sobre a continuidade do ser humano O que se faz e o que se quer deixar são dois dos temas que podem ser invocados por peças da exposição. Conto que deu origem a tema do ANOZERO’19 revela como rios podem acompanhar vidas - POR ANA TEREZA MAY -

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que há de semelhante entre o conto de João Guimarães Rosa, “A Terceira Margem do Rio”, e o tema homónimo da Bienal de Arte Contemporânea de Coimbra – ANOZERO’19 é o debate sobre a perpetuação da história do da humanidade. Na história do autor brasileiro, um homem manda construir um barco do seu tamanho e deixa a sua família para ir morar no meio do rio. Os anos passam e o único momento em que retorna para uma das margens é quando o seu filho propõe que, de ali em diante, ele assumiria o seu lugar no barco. Contudo, ele foge quando o pai se aproxima. Ao escapar, o sentimento de culpa invade-o. Para o filho, ele deveria assumir o lugar do pai no barco, é o que explica Rebeca Fuks, doutorada em literatura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e pela Universidade Católica Portuguesa. “Da mesma maneira que o pai está preso ao rio, o filho está preso ao pai”, explica. O desejo de perpetuar quem somos e a nossa história também pode ser reconhecido nas obras da bienal ANOZERO’19. A obra “Once Upon a Time”, de Steve McQueen, é uma compilação de 116 fotografias que a NASA enviou para o espaço dentro da nave não tripulada Voyager 2. Essa embarcação vagueia sem destino específico e funciona apenas como uma cápsula do tempo, cujo fim é retratar a vida na Terra para possíveis

extraterrestres. Com banda sonora para a sequência de imagens, o artista inglês escolheu vozes que falam línguas desconhecidas. Outra obra que dialoga com a perpetuação da linguagem é “The Last Silent Movie”, de Susan Hiller. Nessa obra em formato áudio, a artista estadunidense traz línguas e dialetos já extintos ou que estão ameaçados. “Nós somos as nossas linguagens, e quando uma desaparece, algo de nós também se vai”, comenta o curador da exposição e professor da Universidade de São Paulo (USP), Agnaldo Farias.

“Se o meu pai, sempre fazendo ausência: e o rio-rio-rio, o rio — pondo perpétuo”. Além dessas obras, uma das que obteve maior destaque na abertura da bienal foi “Sonhos de Outubro”, de José Spaniol. Consiste numa canoa equilibrada em palafitas, finos pedaços de madeira verticais. Esta faz referência às casas construídas pelos ribeirinhos no Brasil para se protegerem da água em época de cheias. Para Agnaldo Farias, esta é mais uma das representações de que o ser humano se tenta manter a salvo do tempo e do espaço.

Ao pensar na temática da bienal, o professor da USP elegeu a obra de Guimarães Rosa por também falar da continuidade da história representada pelo rio. Heráclito, filósofo pré-socrático, afirmara que “ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio, pois quando nele se entra novamente, não se encontra as mesmas águas, e o próprio ser já se modificou”. No conto, enquanto o pai está com o barco parado no meio do rio, além de correrem as águas, também corre a vida da família. A filha casa-se, tem um filho, e, aos poucos, todos os integrantes da casa vão deixando a vila onde moravam. Do mesmo modo em que, na ficção, a vida se modificou por completo, em Coimbra, o Mondego esteve a acompanhar tudo desde o início. Agnaldo Farias quis lembrar que, antes de a universidade ser construída, o rio já lá estava. “É uma cidade milenar, mas nasceu por causa desse rio. Ele foi o causador de tudo”, reflete. No conto, o homem que está no barco torna-se a terceira margem e presencia todas as coisas que estão a correr pelo rio. Para a investigadora Rebeca Fuks, da mesma forma que o personagem se transforma num elemento do rio, conforme perde as suas características físicas, também o desafia a querer um lugar fixo ali. “Ao procurar isso com os nossos feitos, tornamo-nos a terceira margem”, explica o curador.

O coro que leva o nome de Inês de Castro pelo mundo Consideram-se um grupo amador, mas não universitário, e trazem a Coimbra atuações diferentes e inovadoras. Pisaram alguns dos palcos mais famosos do mundo e tencionam visitar novos países - POR CÁTIA BEATO -

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e três em três meses, o Coro Sinfónico Inês de Castro (CSIC) apresenta novos projetos a toda a comunidade nacional e estrangeira, sempre acompanhado de uma orquestra. Conhecido por ter sido um dos primeiros grupos sinfónicos a utilizar ‘tablets’ como partituras e, apesar de trabalhar apenas com originais, leva o público numa viagem que os transporta para a cena. Tem um DVD gravado e, em 2020, dá início ao VIII Ciclo de Requiem Coimbra. Após a decisão de começar um grupo coral autónomo, em que poderiam participar pessoas de vários coros da cidade, surge, em maio de 2012, o CSIC, uma associação sem fins lucrativos. Começou na Orquestra Clássica do Centro e depois separou-se de forma a crescer e afirmar-se como um orfeão comunitário. Um dos fundadores é o maestro Artur Pinho Maria, que também foi presidente do CSIC. Após seis anos, reformou-se do cargo para se encarregar somente da direção artística, o que foi positivo, pois acredita que “eles têm muita dinâmica”. Além disso, o maestro acrescenta que este é um dos poucos gru-

pos corais portugueses com seis profissionais a trabalharem de forma artística com o CSIC. “São cinco que trabalham técnica vocal e um pianista que colabora nos ensaios”, explica. O grupo é composto tanto por vozes masculinas como femininas. Para o compositor, o objetivo não é ser mais um coro da cidade, por já existirem o ­ utros 35 grupos corais em Coimbra, mas sim fazer um “repertório diferente do que a maioria, acompanhado de uma orquestra”. Desde as grandes obras corais sinfónicas de Mozart, Guiseppe Verdi e Beethoven, o CSIC teve a oportunidade de estrear algumas peças dirigidas por Artur Pinho Maria. O maestro dá o exemplo da obra de Jorge Salgueiro que, “depois de desistir de dirigir uma composição, dirigiu-a connosco duas vezes”. Para a presidente da direção, Rosário Pinheiro, a ideia inicial foi sempre a formação. No futuro, vão sofrer inovações, não só na área do canto, mas também “no saber como se coloca a voz”, declara. A dirigente sconsidera que os jovens passam muito tempo calados a olhar para tecnologias. Além disso, segundo Rosário Pinheiro, a atividade coral tem a

capacidade de criar “sinergias com outras áreas”. Uma das histórias que marca este grupo sinfónico foi a atuação na Sé do Funchal, na Madeira, em 2016. O maestro conta que nunca tinha visto tanta gente. “Eram mais de duas mil pessoas a assistir” o concerto que foi gravado pela RTP Madeira. Contudo, pelas suas palavras, todas as viagens foram importantes. “Isto é uma das maneiras através da qual nos temos afirmado como uma marca cultural e artística da cidade”, expressa Rosário Pinheiro. Além de terem feito concertos em território nacional e estrangeiro e pisado os palcos mais famosos do mundo, como o Royal Albert Hall, em Londres, a presidente da direção espera “visitar países onde ainda não se esteve”, como Alemanha, Bielorrússia, Espanha e Luxemburgo. Contudo, para a dirigente, é preciso haver apoios para que as obras sejam executadas com “o profissionalismo que o CSIC oferece”. Para Rosário Pinheiro, quem quiser participar no coro não precisa de saber cantar “tudo de todas as maneiras”, mas pode “encontrar uma oportunidade para aprender a cantar, nem que seja na banheira”.


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Equipas de Basebol e Softbol da Académica continuam sem condições para treinar Secção procura crescer para se tornar autossuficiente. Conselho Desportivo diz fornecer as melhores condições ao seu alcance - POR FILIPE SILVA E FRANCISCO BARATA -

CÁTIA BEATO

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pesar da pouca divulgação e conhecimento do público universitário em geral, a Secção de Basebol e Softbol da Associação Académica de Coimbra (SBS/AAC), procura manter-se ativa e melhorar as condições de treino. Este objetivo tem-se revelado ­complicado, lamentam o presidente da secção desportiva e o treinador. Entre os problemas apontados, a dívida herdada por administrações anteriores e as marcações inadequadas à prática da modalidade no Campo de Santa Cruz são os mais urgentes. Segundo o treinador da equipa e professor de educação física na Escola Secundária D. Dinis, Filipe Jorge, as condições são “mínimas”, não tendo acesso ao horário “nobre” do campo onde decorrem os treinos. Já o presidente da SBS/AAC, António Gonçalo, refere que os fundos fornecidos pela Direção-Geral da AAC são direcionados para abater a dívida, enquanto o financiamento para deslocações e material vem de doações dos próprios membros da secção. Sobre as verbas atribuídas à SBS/AAC, o secretário-geral do Conselho Desportivo da AAC ­ (CD/AAC), Miguel Franco, diz que existe uma “fórmula” de modo a distribuir os fundos. Esta tem em conta os escalões nos quais as secções estão inseridas, o “mérito desportivo” e o número de atletas inscritos. “Portugal não tem uma tradição de basebol”, refere ao explicar que é difícil fornecer melhores condições à prática do desporto. Sem espaço próprio e sem acesso ao estádio universitário, a SBS/AAC vê-se obrigada a alugar o Campo de Santa Cruz, que não está preparado para os treinos e jogos da modalidade . A restrição de uso do complexo universitário, segundo o treinador, deve-se a “alegações da secretaria de que a equipa rasga o relvado do estádio”. Miguel Franco afirma estar ciente desta ­realidade. Ex-

plica ainda que o CD/AAC fornece “as condições dentro do que é possível”. Sobre as alegações de que a equipa danifica o relvado e, por isso, está impossibilitada de usufruir do complexo, Miguel Franco esclarece que essa decisão foi t­ omada pela reitoria após as obras no mesmo, em 2017. “Ainda tentámos contornar essa questão”, mas acabou por ser uma decisão unilateral, expõe o ­secretário-geral. De momento a secção conta com 36 associados, mas o presidente afirma que o objetivo é atrair mais atletas universitários. “Este ano conseguimos aumentar a divulgação e juntaram-se cinco estudantes à secção, o que já é bastante bom”, comenta.Também Filipe Jorge reconhece que é importante “estabelecer um núcleo duro, para que a secção não esteja dependente de atletas do ensino secundário”. Filipe Jorge explica que tanto a equipa masculina como a feminina contam sobretudo com atletas novos na secção. A competição mais relevante na qual a Académica participa é a Liga Atlântica, onde não tem “capacidade para competir com as outras equipas”, refere o técnico. O presidente reforça que os adversários nesta prova são “equipas seniores, que já praticam há cinco anos”. Segundo o mesmo, os horários não permitem formar equipas competitivas.Tanto o treinador como o presidente concordam que tal realidade seria facilitada caso tivessem campo próprio, ou um campo mais indicado para a prática da modalidade. Para além da Liga Atlântica, a secção está inserida também na Taça Osterlund, competição criada para homenagear Osterlund, o marinheiro norte-americano que introduziu o basebol em

Portugal. Esta liga tem servido para compensar a falta de competições de softbol organizadas pela Federação Portuguesa de Basebol e Softbol. É a SBS/AAC que assegura a realização desta prova, tendo esta lugar, por norma, no Campo de Santa Cruz. De acordo com o técnico, já é excelente terem o Campo de Santa Cruz e horários para treinar. Contudo, lamenta a falta de apoio da autarquia para praticar o desporto a nível sénior. O treinador diz que em Portugal se aproveitam muito as linhas de campo do futebol para demarcar os limites do espaço de jogo do basebol. Filipe Jorge reconhece, no entanto, que o Campo Santa Cruz é suficiente para as competições de softbol. A capitã da equipa feminina da Académica e aluna do Ensino Secundário, Maria Silva, revela que o interesse pelo basebol surgiu da apresentação do desporto dada pelo treinador da secção, numa aula de educação física. “As condições proporcionadas pelo treinador são ótimas”, acrescenta. Maria Silva revela ainda que não tinha grandes expectativas antes de se integrar na equipa, mas que após experimentar acabou por “gostar muito”. Mais tarde, foi consagrada como capitã do plantel feminino. Já José Miguel Cabral, estudante da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, afirma que o interesse pelo basebol surgiu pelo visionamento de vídeos no YouTube, mas foi um ‘clip’ no Facebook da AAC que o cativou a praticar o desporto. “Interessei-me por vários desportos até que encontrei o basebol”. Conta também que a componente tática dos jogos foi crucial na decisão. Apesar de ser um membro recente na equipa, Miguel Cabral está “empolgado” por poder vir a participar nas competições.


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AAC de passo firme rumo às finais do CNU Grande parte das modalidades arrancaram com prestações positivas. Judo revalidou título ­c onquistado no ano passado - POR VASCO BORGES -

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s meses de novembro e dezembro trouxeram as primeiras jornadas concentradas da fase de apuramento para os Campeonatos Nacionais Universitários 2020 (CNU). As equipas da Associação Académica de Coimbra (AAC) participaram em diversas modalidades e obtiveram alguns resultados ­positivos. Os CNU são organizados pela Federação Portuguesa do Desporto Académico (FADU) e apuram as melhores equipas universitárias do país em 48 modalidades diferentes e em várias categorias. Para além da distinção nacional, os campeonatos servem como provas de acesso aos European University Games, que se realizam no próximo verão em Belgrado, na Sérvia. Sortes diferentes nos desportos de ­­­­­pavilhão coletivos Depois de se ter sagrada campeã nacional em 2019, a equipa de basquetebol masculino da AAC começou a defesa do título da melhor maneira. Os estudantes somaram vitórias nos três jogos disputados, incluindo um resultado expressivo frente ao Instituto Politécnico de Santarém por 66-19. Desse modo, avançam para as próximas jornadas na liderança da tabela, em conjunto com a Associação Académica da Universidade de Aveiro (AAUAv), com seis pontos.

Já na vertente feminina, a equipa da AAC somou uma vitória e uma derrota e segue, para já, no quinto lugar, com três pontos arrecadados. Ainda no ‘basket’, mas na vertente 3x3, a equipa masculina da Académica chegou ao último lugar do pódio. Também a defender o título de 2019 está a formação de futsal feminino. Na primeira jornada concentrada, as atletas da AAC venceram os três primeiros jogos, mas saíram derrotadas no confronto face à Associação Académica da Universidade do Minho (AAUM), estando, para já, na terceira posição, com nove pontos. A equipa masculina conseguiu o pleno de vitórias, graças a triunfos frente aos Institutos Politécnicos (IP) de Portalegre, Leiria, Tomar e Santarém. Em quatro jogos, os estudantes marcaram 41 golos e sofreram quatro. Ainda nos desportos de pavilhão, a equipa de andebol feminino foi menos feliz na abertura dos CNU, averbando zero pontos após as primeiras jornadas. Depois de pesadas derrotas frente ao IP de Leiria, à AAUAv e à AAUM, a equipa da AAC avança para 2020 no último lugar da tabela. O andebol masculino também não foi bem sucedido e venceu apenas uma das equipas que defrontou. Por fim, no badmínton, a equipa mista da AAC acabou por ficar no último lugar do Grupo B, com

dois jogos perdidos, e no quinto lugar da tabela geral. A competição, que se realizou em Odivelas, foi ganha pela Universidade de Lisboa. Judo vence “em casa”, futebol e ‘rugby’ de ‘sevens’ bem encaminhados Numa prova realizada no Estádio Universitário de Coimbra, o judo da AAC revalidou o título por equipas dos CNU. Apesar de nenhum dos seus judocas ter conquistado a medalha de ouro nas provas individuais, a tabela combinada por equipas acabou por colocar a AAC no primeiro lugar do pódio. Do pavilhão para o campo, também o futebol de 11 masculino se destacou pela positiva. Depois de uma derrota na primeira jornada frente ao IP de Coimbra, a AAC respondeu com quatro vitórias consecutivas. Desse modo, os estudantes ocupam o segundo lugar da tabela, com 12 pontos. Já no ‘rugby’ de ´sevens’ masculino, a AAC arrecadou três avultadas vitórias. Entre as três partidas que disputou, converteu 129 pontos e não sofreu nenhum. Nota também para o tiro, modalidade na qual João Caetano foi quarto na prova de “pistola mista”, e para o ténis, que viu a equipa da AAC acabar no nono lugar do ‘ranking’ por equipas, na prova ­realizada em Lisboa.

Diversidade desportiva ganha lugar na AAC Nova secção alerta para integração de todos os estudantes na prática desportiva. Presidente da pró-secção destaca apoio da DG/AAC e da Reitoria - POR FRANCISCA SOEIRO -

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esporto abrangente a todos os estudantes é o lema da recém-criada Pró-Secção de Boccia da A ­ ssociação Académica de Coimbra (AAC). O ­presidente da pró-secção, Bernardo Lopes, que é também estudante de História da Arte na ­Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (FLUC), realça a importância de “combater o sedentarismo e proporcionar a todos os atletas atividade física adequada à sua condição e p ­ atologia”. Bernardo Lopes tem mobilidade r­eduzida e pratica boccia desde os seis anos. Foi a­ tleta internacional e, por isso, sente o peso da ­responsabilidade ao dar a cara pela iniciativa. O presidente da recém criada pró-secção refere que há a necessidade de criar infraestruturas e alargar o desporto adaptado a outras secções. “Este projeto só pode funcionar a cem por cento se as outras secções colaborarem connosco, até porque a academia é para todos”, reitera. Além disso, reforça a ideia de que é fundamental que o desporto universitário adaptado esteja presente a nível nacional. O secretário-geral do Conselho Desportivo da AAC (CD/AAC), Miguel Franco, destaca a importância do projeto: “a Académica deve promover, acima de tudo, a inclusão de todos os ­j ovens, seja qual for a sua condição física, social ou económica”. Tal como Bernardo Lopes, entende que é essencial que o desporto adaptado seja abrangente a mais modalidades. Salienta

ainda que a iniciativa foi aplaudida por todas as outras secções e que muitas veem aqui uma oportunidade de promover o desporto ­a daptado. Em relação às infraestruturas do edifício da AAC, Bernardo Lopes sugere que seja criado, nos Jardins da AAC, um complexo que ofereça garantias de acessibilidade e possa ser utilizado por todas as secções. Sobre uma possível reestruturação do edifício, explica que “não pode ser modificado por ser património e, portanto, não se pode instalar um elevador”. No mesmo sentido, Miguel Franco reforça a ideia ao dizer que é necessária a aprovação por parte de várias entidades e que isso apresenta entraves. A solução, segundo o mesmo, pode passar por “ uma aposta da Reitoria da UC na construção de um elevador paralelo ao edifício, de modo a manter a arquitetura e assegurar a igualdade de direitos para todos”. Sobre a tomada de posse, Bernardo Lopes faz um balanço positivo. Sublinha a importância da equipa que tem a trabalhar consigo e como foi fundamental o apoio da Direção-Geral da AAC (DG/AAC) e da Reitoria. O presidente da secção lembra que “a AAC é a academia mais revolucionária do país e voltou a provar que está a ­i novar”. Para além da Pró-secção de Boccia, Bernardo Lopes conta que o desporto adaptado já tinha lugar na AAC, como, por exemplo, na natação

e no judo. Ainda assim, o dirigente associativo esclarece que uma das bandeiras da pró-secção é “pensar o desporto adaptado em toda a AAC”. “O objetivo é fazer o melhor para a academia e para os atletas, porque, sem eles, não faz qualquer sentido”, remata. A falta de condições deve-se, em grande parte, à carência de financiamento e, por este motivo, Miguel Franco assegura que “o CD/AAC quer que o desporto adaptado abranja outras secções e, para tal, está a estudar como pode majorar esta questão a nível económico”. O secretário-geral do CD/AAC reforça que é importante que a ­R eitoria invista na promoção da igualdade de direitos e oportunidades para todos os estudantes.

LUÍS ALMEIDA


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Clubes Pequenos com Grande História Um está presente na segunda competição mais importante da FIBA, outro é um clube centenário reerguido por força de sócios e simpatizantes. Olivais FC e União 1919, dois clubes esquecidos sem Coimbra, mas não na história - POR XAVIER SOARES -

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asqueteb´Olivais Tem “futebol” no nome, mas o basquetebol nas mãos. Do Pavilhão Engenheiro Augusto Correia chega o Olivais FC. Fundado em 1935, o clube conimbricense tem na equipa sénior feminina a sua principal fonte de triunfos. Título atrás de título, a equipa orientada pelo técnico Eugénio Rodrigues, destaca-se como uma das melhores a nível nacional. Num país onde o desporto rei é o futebol, é cada vez mais difícil encontrar um clube que tenha outra modalidade como a principal. O Treinador, vê nesse aspeto um fator positivo, pois “permite concentrar mais energias e mais forças no basquetebol”. Eugénio Rodrigues acrescenta que, desse modo, “não há aquele efeito de sanguessuga que o futebol normalmente tem nos clubes com várias modalidades”. Em contrapartida, o técnico considera que não ter futebol é um fator que acaba por não ser “tão atrativo para os média, o que torna mais difícil arranjar orçamentos e atrair patrocinadores”. Assim, conclui que este é “um doce amargo”. A equipa feminina do Olivais FC participa agora na segunda competição mais importante da Federação Internacional de Basquetebol (FIBA), a Eurocup. Carregar o símbolo do clube conimbricense para pavilhões internacionais é

“Aqui não há aquele efeito de sanguessuga que o futebol normalmente tem nos clubes”

para a capitã de equipa, Marcy Gonçalves, “uma sensação de orgulho”. “Vamos elevar o nome do Olivais até ao mais alto nível, sempre que estiver nas nossas mãos”, acrescenta. A aposta nas camadas jovens é outro dos pontos fortes do clube, que tem todos os escalões masculinos e femininos. Uma aposta bem vista por Eugénio Rodrigues, é a necessidade de haver sempre um equilíbrio entre gente de fora e gente da casa. “Um terço da equipa de seniores tem que ser composta por atletas da formação, sob pena de não ser sustentável”, justifica. O facto de o Olivais FC ter um pavilhão próprio é, segundo Marcy Gonçalves, outro fator importante para o desenvolvimento dos escalões de formação. Deste modo, “não se tem de dividir o pavilhão com outras modalidades, o que favorece um treino regular ao longo da semana”, explica. A criação de um sentimento de união entre os mais jovens e os mais experientes vai para além das quatro linhas. Também nos adeptos se sente essa ligação. “Há juventude na bancada quando jogamos em casa e isso é um sinal de que os miúdos se revêem nas equipas seniores, quer seja masculina ou feminina”, aponta o treinador. Para Marcy Gonçalves, ser uma referência para os mais jovens é algo natural, mas traz uma responsabilidade acrescida. “Nós estamos a representar o mais alto nível do basquetebol e a imagem que procuramos passar é que com trabalho tudo se consegue”, desabafa. Como conclui a capitã, “o Olivais FC tenta criar pessoas para a sociedade e não só para o basquetebol”. O União que se fez da força O ano de fundação data de 2016, mas a história remonta a 1919, ano de fundação do CF União de Coimbra. Extinto em 2016, depois de declarar insolvência, o clube renasceu por mão de sócios e antigos dirigentes que deram uma nova vida ao clube. Reerguido com base no “amor à camisola”, tal como refere o atual presidente do clube, João Trindade, a alteração de nome não impede que a história do antigo União esteja presente na memória de dirigentes e simpatizantes da equipa. “Neste momento, o clube chama-se União 1919, por força das circunstâncias, mas de qualquer das formas tenta-se passar-se a imagem de que é o CF União de Coimbra que ali está”. Os três anos passados desde a nova fundação permitem ao presidente fazer um balanço sobre o renascer do clube, que tem no futebol a sua principal força. O dirigente dos unionistas confessa que o prestígio de outrora facilita o processo de reafirmação. “O União é centenário, faz parte da história da cidade e isso está a ajudar imenso”, confessa. João Trindade relembra que “o clube não pode dar passos maiores do que aqueles que consegue” já que “ ainda está em crise”. Fazer parte da história coimbrã remonta a antigas rivalidades com a Académica de Coimbra. Algo que, segundo o presidente do clube,

ainda está presente nas duas equipas. Conforme o dirigente, a época de 1972/1973 foi marcante para o acentuar desta disputa, quando “houve a coincidência do CF União de Coimbra subir à primeira divisão e a Académica descer para a segunda”. Hoje em dia, Académica e União 1919 apenas se encontram em jogos da formação. Segundo o presidente, nada dá mais gosto à direção do que “ver os miúdos desde tenra idade dentro do campo, já a sentir que há algo diferente, que estão a passar por um histórico”. João Trindade garante que o amor à camisola não se explica, sente-se, e é esse um dos valores que se transmite. “Não é uma ocupação de tempos livres. É um clube, com tudo aquilo que implica”, conclui João Trindade. Mas nem só de futebol vive o União 1919. O futsal tem sido também uma das apostas. Duas equipas seniores, uma masculina e outra feminina, e uma formação que tem, nas palavras do dirigente do clube, “entusiasmado” e atraído inúmeros espectadores ao pavilhão, o “que é algo que também nos satisfaz porque queremos dar vida àquele recinto”. Com casa situada no Campo da Arregaça, entre os prédios da Rua do Brasil e o Bairro Norton de Matos, renasce hoje um clube que, aos olhos de João Trindade, “tem crescido pouco a pouco com olhos postos futuro, honra cimentada no passado e um presente assente na formação”. “O que nos interessa não é a quantidade, mas sim a qualidade da formação, porque são estes jovens que vão ser o futuro do União 1919”, conclui.

“O União é centenário, faz parte da história da cidade”


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Um giro ao encontro da prostituição Casas, a margem da estrada e bares de alterne são algumas das paragens da ­ERGUE-TE. A equipa celebra uma década de “pedagogia do amor” para apoiar ­pessoas em contexto de prostituição - POR RAFAELA CHAMBEL -

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stá uma manhã nublada e a técnica Catarina Pedro dirige-se à carrinha da associação para conduzir o próximo giro. As ­a reias da Figueira da Foz constituem a paragem do dia. É pouco depois das nove que arranca, mas é muito antes que começa a preparação. A comida e a conversa são confecionadas a pensar nas pessoas que convidam a entrar. Com a equipa de intervenção social a conduzir, a ERGUE-TE caminha ao encontro e apresenta-se. Tudo começa no gabinete. É entre técnicos e voluntários que se combinam os turnos e a logística dos materiais. Catarina Pedro ­d esabafa que partilha a equipa com pessoas que trabalham e, por isso, têm de mexer com a sua dinâmica profissional e familiar, logopelo que os horários são sempre imprevisíveis. Nenhum dia é igual ao anterior e todas as horas são poucas para quem quer ajudar. Desde a sede à garagem, notam-se as caras familiares, frutos dos anos comprovados pelo sabor da experiência. Desta vez, a técnica Mónica Subtil já leva os bolos cozinhados na pastelaria do ­Tamoeiro, que, acompanhados depor um chá quente, aconchegam o ambiente da intervenção. Mónica Subtil integra a associação desde o início, em 2009. É com uma expressão atarefada que se encosta à carrinha, para explicar que a ideia é ter uma equipa de rua que vai ao encontro das pessoas no contexto em que estão. Criado no seio da Fundação Madre Sacramento, das Irmãs Adoradoras, o projeto foi apresentado à Segurança Social e, após dois anos de negociações, avançou. A carrinha faz de sala de estar, com três bancos de cada lado virados para uma mesa no centro. Dá espaço ao diálogo, na forma de uma “escuta ativa, em pé de igualdade”, conta Mónica. “Somos nós que estamos no espaço delas, são elas a dominar a conversa”, acrescenta. Há quem prefira narrar a sua história, ­o utros ­o ptam por um silêncio partilhado. Cumprimentam-se com dois beijinhos e t­­ ratam-se por “tu”. “Se uma delas disser que está a chegar um cliente, nós respondemos: faça favor”, conclui Mónica Subtil.

As dificuldades em Erguer “Já me aconteceu ter de chamar a polícia por ver porrada entre as mulheres ou mesmo entre clientes”. A técnica Mónica relata algumas peripécias dos giros noturnos. “Está tudo relacionado – prostituição, tráfico de armas, tráfico de droga, são ambientes pesados”, confessa. Em caso de emergência, mantém a marcação rápida para a polícia. Salienta que “é importante mostrar que, no meio daquilo tudo, existe alguém com quem elas podem falar, alguém que tem uma alternativa”. As dezenas de mulheres com quem contactam no quotidiano costuma estar sempre nos mesmos sítios. Ainda assim, “há pessoas que são abordadas há anos e nunca abriram processo em gabinete, mas que continuam a agradecer o tempo disponibilizado, um sorriso e a atenção”, esclarece Marta Neves, diretora-técnica. Quem quer permanecer no contexto da prostituição também recebe apoio. Na traseiraparte de trás da carrinha, um amontoado de caixas de cartão guarda preservativos e lubrificante, que são distribuídos, em conjunto com informação preventiva de doenças sexualmente transmissíveis. Os que pedem acompanhamento são atendidos no gabinete da equipa. Escolhas temperadas pela liberdade Uma rua estreita (como quem vai da baixa de Coimbra) dá acesso ao prédio azul que acolhe a associação. Caso a pessoa esteja interessada nos serviços da ERGUE-TE, tem um processo aberto em seu nome e um Plano de Acompanhamento traçado com objetivos, atividades, indicadores e data de avaliação. Como indica a diretora, “cada pessoa é considerada especialista de si própria, com direito à liberdade de informação, expressão, escolha e ação, com direito à privacidade, à ­c onfidencialidade e ao profundo respeito de todos”. Explica que não há um sistema de ajuda “que pressupõe que existe um especialista social e uma vítima que não sabe nada”. Seja nos giros ou no atendimento, procuram estabelecer uma relação mútua de confiança mútua, indoque vai

ao encontro das necessidades de cada pessoa, desde a marcação de uma consulta ao tratamento de um processo jurídico. A dignidade, o empoderamento e a cidadania fazem parte da missão. Isto não implica que mudem o estilo de vida, como esclarece a diretora. A experiência que tem revela que a maioria dos casos “não resulta de uma opção livre e informada de quem a exerce: há muitas pessoas que parecem estar ligadas a redes de tráfico de seres humanos e a situações de lenocínio”. Conta, ainda, que muitas mulheres “não têm alternativa de sustentabilidade, quer seja pela situação de imigração irregular, baixa escolaridade, ou incapacidade física ou mental”. Em 2018, a equipa de intervenção social abordou 366 pessoas em contexto de prostituição (335 do sexo feminino e 31 do sexo masculino), das quais 70 por cento são imigrantes. A prostituição continua a ser condenada por aqueles que passam nas ruas de Coimbra. Catarina Pedro, também técnica na ERGUE-TE, desabafa que “não é fácil estabelecer parcerias, porque as pessoas pensam que todas as mulheres são prostitutas porque querem”. Em reflexão sobre a mente da cidade, Mónica sublinha que “a prostituição é uma realidade paralela à nossa, ou seja, só quem está alerta para isso é que se apercebe”. Uma década de luta pela “pedagogia do amor” A associação celebra, agora, dez anos. O trabalho começa a dar frutos na forma de ­reconhecimento, sobretudo no seio da comunidade católica. “A equipa já tem algum nome e visibilidade, mas sofremos muito estigma”, conta a técnica Mónica. Marta Neves confessa que, se pudesse, mudava a indiferença e a intolerância da comunidade, em prol “da defesa dos direitos humanos, do desafio à participação social e de trabalho acessível para todos, incluindo migrantes”. Estatísticas à parte, existe um nicho da comunidade que é sensível à prostituição enquanto problema social e procura apoiar a ERGUE-TE. Desde convites para conferências a ações de


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“Cada pessoa é considerada especialista de si própria, com direito à liberdade de informação, de expressão, escolha e ação, com direito à privacidade, à confidencialidade e ao profundo respeito de todos”

MARTA EMAUZ SILVA

sensibilização; quer no apoio de atividades de inclusão, quer na compra de artigos realizados na Estrutura de Emprego Protegido, sustentada pela Congregação das Irmãs Adoradoras. O ­o bjetivo é dar uma segunda oportunidade a pessoas em situação de tráfico para exploração ­s exual, com inspiração num passado ainda muito presente para as Irmãs. Com início em Madrid, no final do séc. XIX, Santa Maria Micaela desenvolveu uma pedagogia específica que viria a servir de pilar para a associação. Uma relação próxima e igualitária é o que sustenta a “pedagogia do amor”, teoria em que a equipa se inspira. Faz parte do espírito da congregação a que pertencem. Como diz Mónica Subtil, “é através da partilha e do amor que se faz a mudança”. “Adoração, libertação”: como tudo começou A Sé Velha dá acesso à rua onde estão instaladas as Irmãs Adoradoras. É uma porta férrea que guarda o espaço que partilham. A Cabra faz ouvir as 10 horas quando a Irmã Teresa se senta para relembrar fragmentos de histórias de Coimbra, a cidade que a acolhe há 25 anos. “A Igreja sente esta vocação, pelo espírito de Santa Maria Micaela”, começa. “Era de classe alta

FOTOGRAFIA CEDIDA PELA ERGUE-TE

e um dia teve um encontro com uma jovem que estava doente e tinha sido dada como morta pela família”. A partir daí, Santa Maria Micaela “criou algumas casas que sustentava com os próprios bens e, mais tarde, uma congregação”, adiciona. Na época, as mulheres em contexto de prostituição usavam um colar que as distinguia de toda a gente como “mulheres dae má vida”, explica a Irmã. A Santa responsabilizava-se como fiadora para as livrar daquela identidade. “Ninguém sabia as vidas delas”, como menciona a Irmã Teresa., “Aas histórias de todas as raparigas eram fechadas com um cadeado, pelo que nem as mestres, nem as outras Irmãs as sabiam”. Assim se estabeleceu a relação de confiança e respeito que inspirou a ERGUE-TE a seguir o exemplo. Entre agulhas e tecidos, explica que, naquela casa, todos colaboram para a sustentabilidade do projeto com trabalhos manuais. As voluntárias doam tempo e talento para tricotar, ao lado das Irmãs, anjos, lancheiras, presépios e bonecos de peluche, que são vendidos no ‘site’ e nas festas anuais. Com a mesa preenchida de cores, a Irmã Teresa acrescenta, ainda, que ali se prepara o café e o leite para os giros, que, por vezes, ajudam a distribuir, com uma pitada de amor e

carinho. “Ajuda-se em tudo o que se pode, mas aos que querem, porque Deus não força nada a ninguém”, sussurra. De momento, costuram pequenas sardinhas enfeitadas. O sol nasce sempre ao som de uma oração, como descreve a Irmã Lurdina. Nasceu em Goa, na Índia e instalou-se em Portugal sem saber uma única palavra dae português língua. Em Coimbra há quatro anos, afirma convictacom convicção que “o primeiro objetivo é rezar pela mulher que queira trabalhar connosco”. “Adoração, liberação” é o lema que segue. Cada um tem a liberdade de escolher se quer ajuda. Com uma mistura de culturas na língua, adiciona que “é preciso respeitar estas mulheres, pois cada uma constitui um ramo da grande árvore de alegria”. Espalhadas à volta da mesa estão antigas caixas de gelado, que agora recolhem os fios e tecidos para os projetos. Para além das ­v oluntárias, as Irmãs colaboram com os utentes, de forma a introduzi-los nas exigências do mercado laboral. Os horários definidos, a rotina e o ordenado mínimo são alguns dos fatores que a Irmã Teresa define como vantagem para o futuro. A escadaria em caracol faz o trajeto da sala dos trabalhos manuais para a sala dea costura, e da sala dea costura para a sala deas refeições. É com orgulho que as Irmãs mostram o espaço. Na parede do terceiro andar vê-se têm um cartaz que diz “Quando alguém se ergue, toda a humanidade se levanta”. É um dos ‘slogans’ da ERGUE-TE. As Irmãs servem uma vida comunitária. “Pela manhã levantamo-nos cedo, depois vamos à Eucaristia, levamos uma vida muito simples”, narra a Irmã Teresa. Quando conseguem, participam nos giros. Mas são os ­v oluntários, em conjunto com as técnicas, que abordam as mulheres. A próxima paragem é a baixa de Coimbra. Seguem caminho, como dita a obra em que se inspiram, por “uma experiência de amor, libertação e encontro”. Reportagem redigida em junho de 2019


12 ciência & tecnologia 17 de dezembro 2019

Os desafios que o digital está a trazer ao jornalismo Iliteracia, rapidez, ‘fake news’ e desinformação afetam atividade jornalística. Geração dependente do digital cria novos desafios para deontologia e formação de novos profissionais - POR SOFIA GONÇALVES E ISABEL SIMÕES -

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oi a partir da década de 1990 que as pessoas se começaram a deparar, no dia a dia, com inovações tecnológicas no campo da comunicação. O aparecimento da Google em 1998 e a comercialização e acessibilidade da Internet ao grande público em 1999 vieram facilitar a difusão de informação e agilizar a forma como as notícias chegam à população. O ‘online’ tornou-se um novo espaço de disseminação dos media, distinto dos canais de comunicação tradicionais, explica Inês Amaral, professora de Jornalismo e Comunicação da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (FLUC). Com o crescimento das redes sociais enquanto plataforma de divulgação, o coordenador do Mestrado em Marketing na Faculdade de Economia da UC (FEUC), Arnaldo Coelho, realça a dificuldade que o jornalismo tem “em permanecer ‘up to date’”. Sustenta a ideia através do “excesso de informação”, que torna difícil “acompanhar a rapidez com que os factos acontecem”. De acordo com dados publicados no Digital News Report 2019 pelo Instituto Reuters, Portugal é o segundo país no mundo que mais confia nas notícias que lê nas redes sociais e motores de pesquisa, logo a seguir à

Finlândia. Nos resultados obtidos pelo estudo, confirma-se que é no Facebook que as audiências mais consomem conteúdos jornalísticos. No entanto, verifica-se um crescimento de partilhas na plataforma Whatsapp e uma estagnação do Twitter. Tendo em conta a rapidez com que estas mudanças estão a decorrer, Arnaldo Coelho relata que grande parte das notícias chega “um pouco mais tarde do que devia”. Acrescenta que, caso contrário, alcançam os leitores “carregadas de erros”. Para Inês Amaral, o tem-

MARTA EMAUZ SILVA

po “é sempre o carrasco do jornalismo”. A própria estrutura do conteúdo jornalístico é, muitas vezes, “adaptada ao contexto das redes sociais”, completa. Segundo o Instituto Reuters, no que diz respeito à participação do quotidiano noticioso, cerca de quatro em cada dez portugueses têm preferência em comentar os acontecimentos com amigos ou colegas. Contudo, 35,5 por cento opta por divulgar o conteúdo nas suas redes sociais. Arnaldo Coelho declara, citando o escritor Umberto Eco, que “as redes sociais estão a dar voz a muitos imbecis”. Defende também que muitas pessoas “partilham conteúdos jornalísticos depois de lerem apenas os títulos”. Na opinião do professor de Marketing, “existe muita informação e pouca formação”. “Se no caso da televisão e da rádio há competição entre quem vai noticiar primeiro, no digital a corrida é muito maior”, revela Inês Amaral. Enfatiza que o número de pessoas dentro de uma redação condiciona a criação de “conteúdo em quantidade e qualidade”. O professor da FEUC concorda e alega ainda a “falta de rigor jornalístico” enquanto problema a ser resolvido, para que não se fique dependente de informação “que é tudo menos factual”. A maior desvantagem do jornalismo digital, para a docente da FLUC, passa pela dificuldade em conseguir “responder com bons trabalhos de investigação”. Justifica com o chamado “jornalismo das visualizações”, que começou por solucionar “questões relacionadas com o mercado publicitário.” No formato ‘online’, segundo Arnaldo Coelho, a necessidade de “vencer na guerra das redes sociais” é complementada com o ‘marketing’. Com o objetivo de “obrigar os leitores a clicar e ler”, o professor considera os títulos “cada vez menos claros”. Numa outra frente, surgem as notícias falsas. Inês Amaral reconhece que as ‘fake news’ sempre existiram, porém “nunca tiveram a dimensão que têm hoje, graças às redes sociais”. Adianta não ser “só informação falsa, mas também descontextualizada”. Do ponto de vista do ‘marketing’, um dos lemas fundamentais do jornalismo é “ captar a atenção, sem induzir as pessoas em erro”, refere o professor. Ainda assim, a professora da FLUC confessa ser complicado descobrir a origem das notícias falsas. Ilustra com o e­ xemplo “comum da partilha de notícias antigas como se fossem atuais”. Uma das soluções propostas por Arnaldo Coelho passa por aprender a dar algum ‘sex-appeal’ à informação relevante, desde que “não se confunda com conteúdo falso”. O docente da FEUC explica que, para garantir alguma capacidade de sobrevivência, tem ocorrido uma “enorme concentração” dos diferentes meios de comunicação social. Evocou ainda algumas declarações do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, no encerramento da conferência sobre financiamento dos meios de comunicação social, que abordou questões como a reorganização de grupos de media. A formação de jornalistas é um dos desafios apresentados por Inês Amaral. Com destaque para a “nova ­geração”, a professora confessa que as redes sociais trazem “desafios interessantes na área da deontologia e da própria formação, já que se trata de uma geração que não vive sem o digital”. Já para o professor Arnaldo Coelho, a luta por “uma carreira séria é claramente uma prioridade, senão corre-se o risco de estar sujeito a quaisquer informações que surjam nesses meios”, termina.


17 de dezembro 2019

ciência & tecnologia 13

Vacinação indispensável perante a evolução do vírus da gripe Especialistas da área da saúde ilustram razões para caráter sazonal da gripe. Pneumologista alerta para ­importância da vacinação nos grupos de risco - POR BEATRIZ MONTEIRO MOTA E LUÍSA TIBANA -

M

ais do que celebrações de Natal e de Ano Novo, é o início do período gripal que marca a chegada do invernoW. A gripe é uma doença viral transmitida pelo ar e afeta sobretudo o sistema respiratório. Pela alta suscetibilidade de transmissão, a melhor forma de se prevenir, segundo Filipe Froes, pneumologista, e Maria João Amorim, investigadora na área da virologia, é a vacinação. Filipe Froes esclarece que “embora haja atividade gripal durante todo o ano, esta é mais concentrada nos períodos frios, como o inverno”. Explica que este caráter sazonal se deve ao maior confinamento das pessoas em locais fechados, resultado da diminuição das radiações ultravioleta do sol e da queda da temperatura. Estes são alguns fatores que favorecem a sobrevida e a proliferação do vírus. Por outro lado, Maria João Amorim conta que, “segundo novas tendências”, a humidade é o principal fator que explica uma maior propagação do vírus nesta época do ano. “A gripe é uma infeção que pode atingir tanto as vias aéreas superiores, como o trato respiratório inferior e os pulmões”, expõe o médico. Informa que, apesar de os sintomas variarem consoante o doente, se caracterizam por febre, tosse, calafrios e sensação de mal-estar. Filipe Froes menciona também que os sintomas podem evoluir para dores de cabeça e garganta e, em situações mais graves, dificuldades em respirar e cansaço após pequenos esforços. Influenza, o vírus responsável pela doença, tem quatro subtipos: A, B, C e D, clarifica o p ­ neumologista. Ressalva ainda que “a gripe A não existe e que esta terminologia é uma má designação global de gripe”. O médico revela que depois da pandemia de 2009, se vulgarizou o termo. Maria João Amorim salienta que a particularidade da doença de subtipo A é estar

distribuída por muitos animais diferentes. A investigadora realizou um estudo no âmbito desta enfermidade e, como resultado deste, descobriu os mecanismos de formação do vírus da gripe A. Frisa a ideia de que “há um mundo diferente para cada vírus” e que, por estes terem uma informação genética muito limitada, precisam sempre de um hospedeiro para se replicarem. Maria João Amorim aponta as limitações a nível técnico e do próprio conhecimento como alguns dos obstáculos à investigação. Apesar disso, a especialista declara que a descoberta acabou por ter um grande impacto no campo da Medicina. Através do estudo foi possível compreender os mecanismos de formação do genoma “de modo a encontrar estratégias de combate à formação do vírus”. Na visão da especialista, esta pesquisa foi crucial para a área da vacinação. “Da mesma forma que o vírus está sempre a evoluir, as vacinas também têm de o fazer”. A investigadora realça ainda a importância do estudo nos tratamentos e na previsão de estirpes que vão circular no ano seguinte. Uma melhor compreensão do vírus permite criar vacinas que acompanhem a evolução do mesmo, elucida. Na opinião de Filipe Froes, a vacinação é essencial na prevenção da gripe, sobretudo por parte dos quatro grupos prioritários determinados pela Direção-Geral da Saúde (DGS). Estes são indivíduos portadores de imunodeficiência ou deficiência crónica, idosos, grávidas e profissionais de saúde com contacto direto com doentes. Dentro destes grupos, o especialista enfatiza que “os profissionais de saúde têm tripla indicação para se vacinar”. Refere que, apesar de saudáveis, devem ter o cuidado de se proteger nos períodos de maior risco e de não transmitir a doença aos paci-

entes. “Enquanto profissio­nais da área, têm a res­ ponsabilidade de dar o exemplo e promover a vacinação de todos”, sublinha Filipe Froes. Segundo o médico, a distribuição das vacinas pelos dife­rentes países tem de ser feita de acordo com a dis­ ponibilidade económica de cada um. “Portugal, que adquire cerca de 2.2 milhões de vacinas por ano, tem que zelar por uma maior utilização por parte de quem mais precisa”, revela. Filipe Froes considera que, num mundo ideal, todos deviam ter acesso à vacinação, mas “é preciso dar prioridade a quem mais necessita”. O pneumologista afirma ainda que o tratamento é realizado conforme os critérios de gravidade do doente. Na maioria dos casos, é suficiente um tratamento sintomático que, de acordo com o médico, consiste em “repouso, hidratação e consumo de analgésicos para diminuir a febre e as dores”. Nos quadros mais graves, há necessidade de atendimento hospitalar e prescrição de medicamentos específicos, conclui. Sem tratamento adequado, podem surgir complicações de doenças crónicas associadas, entre as quais a diabetes e insuficiência renal e cardíaca, ­e xemplifica o médico. Adiciona ainda que a infeção viral causa um enfraquecimento dos mecanismos de defesa local do aparelho respiratório, o que favorece as pneumonias bacterianas. “O principal problema da gripe não é a gravidade, é a elevada taxa de ataque”, destaca o especialista . Segundo a DGS, os vírus da gripe estão em ­constante alteração e a imunidade provocada pela vacina não é duradoura. Por este motivo, a população deve vacinar-se todos os anos, de preferência até ao final do ano. “As pessoas pensam que por ­e xistirem grupos prioritários a vacina da gripe não é indicada para todos, não. A vacina é benéfica para todos”, termina Filipe Froes.

BEATRIZ MONTEIRO MOTA


14 cidade 17 de dezembro 2019

Confluência de culturas: a integração de ­refugiados através da tradição têxtil portuguesa Falta de financiamento ainda constitui entrave ao arranque do projeto. Objetivo é manter tradição da tecelagem de Almalaguês e oferecer trabalho a migrantes que se instalem em Coimbra - POR GUSTAVO FREITAS E JADE SANGLARD -

À

semelhança de outras cidades europeias, Coimbra tem recebido refugiados oriundos, sobretudo, de África e do Médio Oriente, como consequência da crise migratória no ­Mediterrâneo, iniciada em 2015. Governos foram confrontados com a necessidade de lidar com esta situação. No entanto, a inserção social de famílias no mercado de trabalho e nos ambientes de ensino continua a ser um desafio. O Observatório da Cidadania e Intervenção Social (OCIS), da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra (FPCEUC), é uma das organizações que procura resolver estes problemas. Foi desta entidade que partiu a ideia de formar migrantes para a técnica de tecelagem de Almalaguês. Na visão da coordenadora do OCIS e professora Clara Cruz Santos, esta seria uma oportunidade de reavivar uma tradição portuguesa em declínio e trazer inovação. O objetivo é, não só que os migrantes aprendam a técnica, mas também que apliquem a sua cultura, esclarece. “A ideia é combinar a técnica de manufatura do Almalaguês com a experiência de vida e estética das pessoas que vêm do Mediterrâneo”, explica a investigadora. O OCIS trabalha no sentido de facilitar o encontro entre possíveis empregadores e ­instituições que lidam com a população migrante. Uma das parceiras do observatório é a Peacefull Paralells, uma ONG que trabalha na integração de famílias estrangeiras em Coimbra. Segundo Clara Cruz Santos, o projeto “vai resolver um problema complexo que é a dificuldade de integração, enquanto se tenta gerar rendimento”. Quando se instalam num novo lar, as famílias

FOTOGRAFIA CEDIDA POR NATALIYA BEKH

passam primeiro por um período de adaptação que dura cerca de 18 meses. Durante este tempo, a aprendizagem da língua portuguesa é um dos desafios. “Os refugiados têm de ser autónomos, isto supõe que aprendam português e adquiram competências para trabalhar”, explica Ana Cristina Almeida, investigadora do OCIS. Após este período, o projeto pode dar ­p erspectivas de futuro aos migrantes. “Algumas famílias já começaram a fazer trabalhos manuais, a decorar as casas e a dar prendas aos amigos. Este trabalho começou a dar frutos”, avalia a presidente da Peacefull Paralells, Nataliya Bekh. Para Clara Cruz Santos, um dos grupos mais acessíveis entre a população migrante são as ­m ulheres. “Estavam muito entusiasmadas para fazer tecelagem. Vêem uma possibilidade de autonomia, quer a nível económico, quer enquanto mulheres no seio de famílias conservadoras”, relata. Mas o género feminino ainda não se pode dedicar de forma integral aos projetos. “São as ­mulheres quem cuidam dos filhos pequenos e não têm onde os deixar”, destaca a coordenadora do projeto. Clara Cruz Santos que aponta este como um dos problemas ainda a ser tratado. O principal desafio das organizações que lidam com estas pessoas é inseri-las numa nova realidade. De acordo com Clara Cruz Santos a população migrante é muito heterogénea. “São cidadãos que vêm de vários países com uma diversidade cultural rica, que se não for bem trabalhada, pode ser um obstáculo”, esclarece. Alguns dos refugiados têm formação profissional e eram médicos, enfermeiros ou profes-

sores nos países de origem. Mas, segundo Ana Cristina Almeida, também há “pessoas com baixo nível de escolaridade e com dificuldades em termos de comportamento e inserção social”. Melhores perspetivas e maior segurança são alguns dos motivos pelos quais estas famílias se têm deslocado para a Europa. Os Damasco (nome fictício), uma das famílias do projeto, que não quis ser identificada, vem da Síria, mas passou pelo Líbano e pelo Egito antes de chegar a Portugal. “Não existiam bons trabalhos nem [oportunidades de] estudo para as crianças. Por isso, viemos para Portugal à procura de um futuro melhor”, esclareceu. Os Cartum (nome fictício), outra família do projeto, perderam o pai no Sudão e moram em Portugal com a mãe. A família saiu do país de origem devido à guerra e à procura de ­m elhores condições. “Não havia uma boa vida nem liberdade no Egito”, revela o mais velho dos sete irmãos. As duas famílias consideram ter sido bem ­a colhidas em Portugal e ambas pretendem permanecer no país. “Estamos a gostar do tempo e das pessoas. Portugal é sempre calmo”, desabafa a família Damasco. O projeto de integração social e económica dos refugiados está a avançar, mas há ainda entraves relativos à falta de financiamento. Para que estas pessoas sejam integradas na tecelagem de Almalaguês é preciso que se adquiram novos teares. De forma a contornar esta dificuldade, a proposta é integrar também os homens na atividade, “de modo a que passem a produzir os teares, que são muito caros”, explica Clara Cruz Santos.

Refugiados a fazer trabalhos manuais em programa de apoio a migrantes


17 de dezembro 2019

cidade 15

Os rostos que mantêm vivo o comércio tradicional Turismo na cidade aumenta, mas nem todos os negócios locais veem benefícios. Perseverança dos comerciantes justificada pela exclusividade de produtos - POR JOANA CARVALHO E JOÃO ANTÓNIO GAMA -

A

Baixa coimbrã foi em tempos um local onde o comércio tradicional vigorava. Em anos mais recentes, tanto a Praça 8 de Maio como a Rua Ferreira Borges contam com milhares de passos todos os dias. No entanto, este tipo de comércio tem sentido dificuldades. Fecham-se as portas de lojas com mais de meio século de história. De um modo geral, os comerciantes queixam-se que o turismo não chega para manter os negócios abertos e sentem-se abandonados pela autarquia. “O turismo em nada tem a ver com a “baixinha”, fomos desprezados por completo pela Câmara Municipal de Coimbra (CMC)”, comenta Manuel Pedrosa, um dos proprietários da Pedrosa Enxovais, que há 66 anos oferece serviços de costura no Largo do Poço. Explica que o seu estabelecimento surgiu com ele e a mulher a fazer camisas e pijamas em 1953. “Continua a não haver quem faça roupa por medida”, conta o dono da loja. O costureiro, assegura que “se tudo ficar como está, o futuro é fechar”, como vai acontecer com a parte do negócio responsável pela costura, a encerrar já em setem-

MARIANA ROSA

Fachada da loja de enxovais Pedrosa

bro de 2020, avança o proprietário. Sansão Pronto-A-Vestir, estabelecimento de Horácio Mendes desde 1969, destaca-se de ­outros negócios do ramo por oferecer “tamanhos grandes para corpos difíceis e por ter clientes de todo o mundo”, comenta o dono com orgulho. Segundo o mesmo, o estilo clássico da loja tem sido elogiado pelos turistas, “que tiram fotografias às montras, mas compram pouco”. Ainda assim, a casa não é reconhecida como um Estabelecimento e Entidade de interesse histórico e cultural ou social local pela CMC. Horácio Mendes comenta que “várias pessoas julgam que há apoio, mas isso é o que se chama de paleio. A CMC até tem prejudicado porque não repara que, sem estacionamento, não há clientes”. Interrogado sobre o futuro do seu negócio, o comerciante desabafa que ”existe mercadoria, mas não se vende. Adoro o que faço, mas o que se ganha não chega para pagar as despesas”, lamenta. Algumas das lojas tradicionais ainda resistem, tal como acontece com a casa Tecidos de Coimbra que, desde 1986, se mantém “nesta luta”, ressalva o proprietário, Jorge Mogo. Apesar do turismo não afetar de forma significativa o negócio, esclarece

No que toca ao futuro do estabelecimento, Narciso refere que é complicado ter uma perspetiva a longo prazo. “Se alguém comprar um rolo e precisar de outro, o movimento continua, mas se houver consumos de longa duração, deixa de ser necessário comprar mais produtos e, nesse caso, a loja fecha”, atenta.

JOANA CARVALHO

Interior da loja Sansão Pronto-A-Vestir

que o facto de não existirem muitas lojas como a sua lhe tem permitido continuar em funcionamento com alguma estabilidade. Reconhece que sente dificuldades em encontrar “quem queira trabalhar”. Jorge Mogo salienta ainda que a dimensão da sua loja torna essencial a existência de vários funcionários “que vêm com custos associados”. A Chapelaria Bragas Lda., uma das mais antigas da Baixa de Coimbra, existe há 95 anos. Luís Braga, filho do proprietário, explica que as vendas aumentam no verão, devido aos turistas. Refere que, assim como a Tecidos de Coimbra, a diferença é o fator que mantém o negócio a funcionar. “Já se vendeu menos do que se vende hoje, depende das modas. Pode haver mais dificuldades, mas, enquanto conseguirmos, vamos cá estar”, assegura. Não só de vestuário se constitui o comércio tradicional de Coimbra. Com uma história centenária, a loja Focus, especializada em fotografia analógica, já teve quatro proprietários, revela Narciso Saraiva, um dos funcionários. “Lojas que façam revelação de fotografia a preto e branco já não existem muitas. A Focus é capaz de ser a mais antiga de Coimbra”,supõe. De acordo com o trabalhador, o turismo “tem uma influência bastante positiva e sem ele era provável a loja já ter fechado”.

JOANA CARVALHO

Máquinas fotográficas da loja Focus

Um espaço emblemático da Baixa já obrigado a encerrar foi a Olímpio Medina, uma loja de instrumentos musicais com 96 anos. A decisão de vender o prédio prendeu-se com a idade avançada do proprietário, Olímpio Medina, aliada à falta de vontade dos filhos em dar continuidade ao negócio. Após ter vendido o edifício, surgiu “uma proposta muito aliciante” por parte da Nickolaus, uma empresa de artigos de decorativos, que o levou a “encaixotar tudo de uma maneira absurda”. Desde setembro, altura em que tomou a decisão, Olímpio Medina admite sentir uma certa melancolia: “fui lá uma vez e espero não voltar tão cedo. Sinto-me muito triste”. Lamenta ainda que o turismo, nos seus moldes atuais, não contribua para o crescimento do comércio tradicional. “Os turistas vêm com a agenda toda marcada: saem do autocarro, andam um pouco e voltam a entrar. As lojas tradicionais não evoluíram muito com o turismo”, desabafa Olímpio Medina. Nas ruas da Baixa, há quem parta e há quem fique. Resta a memória de ruas outrora marcadas pela tradição.

JOANA CARVALHO

Fachada da antiga loja de instrumentos musicais Olímpio Medina

“Uma estudante comprou cá um rolo e, passado algum tempo, voltou com uma fotografia que os pais tiraram na loja quando estudavam”, recorda Narciso Saraiva para ilustrar o legado que a Focus deixa naqueles que a visitam. Também explica que “quem aqui passa e gosta de fotografia encontra esta casa como uma referência passado vários anos”.

MARIANA ROSA

Fachada da antiga loja de instrumentos musicais Olímpio Medina


16 soltas 17 de dezembro 2019

CRÓNICAS DO TRODA - POR ORXESTRA PITAGÓRICA -

B

em caros leitores, bem-vindos a mais uma crónica do Troda, esse grande estudante. O que estão a presenciar agora é aquilo a que no teatro/cinema/literatura chamam quebrar a quarta parede, onde eu, o narrador, reconheço que pertenço a uma realidade fictícia e apenas existo para entreter os leitores, neste caso, do Jornal Universitário de Coimbra - A Cabra. Visto que já estão ligeiramente mais cultos, podemos falar de coisas sérias. A nossa AAC, inclusiva como é, criou para o nosso deleite e entretenimento uma nova Secção Desportiva. Foi assim que nasceu a Secção de Rally da AAC, que já conta com o patrocínio do Rally Dakar. Na próxima edição, vai ter uma etapa no nosso troço da associação. A competição vai ser deveras renhida nos cerca de dez metros enlameados que vão desde o bar até ao lago, com uma ligeira curva em cotovelo que apenas os mais hábeis conseguem contornar. Tudo isto é possível dentro das nossas débeis infraestruturas, pois temos os melhores administradores dos jardins que a cunha pode comprar. Mantendo a temática do desporto, vamos falar um pouco do favorito dos alunos da academia e dos bêbados de praça pública: o levantamento do copo. Mil cortejos da Queima das Fitas depois e alguém, que provavelmente ficou sóbrio durante o último cortejo, reparou que se faz muito lixo durante as festividades inseridas no mesmo. O nosso Dux, mantendo as tradições Coimbrãs que prega que nem Padre António,

FOTOGRAFIA CEDIDA PELA ORXESTRA PITAGÓRICA

moderou um debate sobre o tema. Este debate culminou num consenso geral e particular de que o carro Alcoholocausto deveria mudar de nome. A Pitagórica, em tom de solidariedade com os atuais movimentos ecológicos, criou o carro Ecolocausto, que será o último do cortejo, após os camiões do lixo. O nosso carro, em vez de cerveja, vai distribuir panfletos impressos em guardanapos reutilizados da Cantina Amarela, uma vez que um membro da nossa ilustre organização se encontra lá a fazer trabalho comunitário e tem por vício guardar guardanapos usados. Esta doença - a cleptonapus-usadus-mania, para os mais céticos - existe e afeta

cerca de uma pessoa na região de Coimbra. Por isso troquem o antissemitismo pelo antilixismo, que a nossa sala já se encontra cheia de lixo da Cantina Amarela. Com o fim do semestre à porta, só nos resta rezar a Jesus/Ala/Buda/Outro: _____________ (riscar o que não interessa), pois de certeza que muitas cadeiras vão ficar por fazer. Em solidariedade com todos aqueles que não vão completar todas as cadeiras, esta crónica encontra-se incompleta. Esta fotografia é um empréstimo da Pitagórica ao Jornal A Cabra, com juro de 6,9% à propina.

ÉXTÉGUES DA ISABEL - POR ISABEL SIMÕES -

C

entro Comercial cheio de adolescentes a torrarem parte da mesada na sexta-feira louca ao som da música de Natal de outras paragens, com um nível demasiado alto para se considerar agradável. Há pouco, alguns colegas meditavam em silêncio a favor do clima.

M

esmo em dia de chuva lá vai ele no autocarro para a Baixa da cidade. Tem mais de 90 anos e, quando lhe perguntam por que não fica em casa no quentinho, responde “a noite é demasiado grande”. #hávidanestesmtuc

H

á fila a descer e a subir para o centro comercial, mesmo em dia de chuva. Chegou o Pai Natal de certeza absoluta! Tadinho do menino Jesus, tem uma concorrência tão desleal... #hávidanestesmtuc

#ohvidadíficil

cabreando por aí...


17 de dezembro 2019

soltas 17

O VERDADEIRO PREÇO DA ‘FAST FASHION’ - POR RITA VIEGAS - GRUPO ECOLÓGICO DA AAC -

N

esta época de saldos e consumismo natalício, alguma vez parámos para pensar quem faz as nossas roupas ou sapatos? Quanto é que esses trabalhadores recebem pelo que produzem e quantas horas trabalham por dia? Ou onde estão localizadas estas indústrias e como funcionam? Qual o verdadeiro impacto da indústria têxtil a nível ambiental? Alguma vez pensámos nestas questões quando estávamos a comprar aquela t-shirt barata numa loja convencional? Será que sabemos realmente o que está por detrás deste grande mundo da moda que gera milhões de euros anuais? O vestuário faz parte da nossa cultura há séculos. Podemos ­c onsiderar que a roupa é a nossa “segunda pele” e que a moda é uma forma de expressão, daí ser algo banal no dia-a-dia. O conceito de ‘fast fashion’ foi revolucionário para a terciarização deste ramo da indústria em economias de baixo custo localizadas, na sua grande maioria, em países de terceiro mundo, passando a ter uma produção global e onde a mão de obra é mais barata. Para satisfazer a crescente onda de consumismo, é necessário que os custos de

produção sejam baixos, para que o valor do produto final seja, também, reduzido. Este conceito, praticado pela maioria das empresas do setor, muda inevitavelmente a forma como as roupas são vendidas e compradas. Assim, todas as semanas são lançadas roupas novas de diferentes modelos para serem consumidas rapidamente. Esta enorme produção traz encargos, tanto para o planeta, como para a vida de muitas pessoas. A indústria têxtil é uma das mais poluentes, utilizando, em todas as fases de produção, quantidades excessivas de recursos naturais (culturas intensivas de algodão geneticamente modificado, que consome grandes quantidades de água e requer pesticida para ser produzido). Globalmente, produz 80 mil milhões de peças de roupa por ano. Isto significa que consumimos mais 400 por cento do que há apenas duas décadas, o que significa que o nosso consumo está a aumentar a um ritmo chocante. Relativamente ao cultivo de algodão e a algumas técnicas de produção de couro, não há qualquer tipo de controlo durante o processo. Os químicos utilizados são altamente tóxicos, acabando por contaminar cursos de água e causar danos irreversíveis

na saúde de várias populações e no próprio meio ambiente. Estima-se que uma em cada seis pessoas trabalha na indústria da moda global e que a maioria desses trabalhadores são mulheres. Ganham menos de três dólares por dia e trabalham em condições desumanas. Estima-se também que 10 por cento das roupas que são doadas a instituições de caridade ou a mercados em segunda mão são vendidas. O resto acaba em países em desenvolvimento, como o Haiti, abarrotando os mercados, “matando” a indústria local ou acabando em aterros sanitários. Apesar dos efeitos desta indústria, nós, consumidores, temos poder de escolha relativamente àquilo que queremos ou não financiar. Temos o direito de pedir às empresas transparência nas contas e nos impactos sociais e ambientais. As indústrias dão ao consumidor o que ele procura. Consciencializemo-nos e optemos por soluções mais “amigas do ambiente”, dando possibilidade de crescimento a pequenas empresas ou simplesmente comprandoroupa em segunda mão! Nós temos voz e influência!

OBITUÁRIO - POR CABRA COVEIRA -

BAR WARS: DOS JARDINS PARA O CHUC

O

ntem estava a passear nos Jardins e sujei os meus sapatos novos. Sujei-os na lama. Não naquela provocada pela chuva, mas sim na dos lamacentos contratos com o Bar da AAC. Queria lavar os sapatos, mas a casa de banho estava pior ainda. Nunca vou esquecer a imagem daquele vómito. Alguém jantou feijoada da cantina naquela noite. A sair da casa de banho tropecei numa cadeira partida. Lá se foi a minha perna! Na verdade, isto é um campo de bata­ lha. Quem pode atestar este selo de “cu-alidade” é o São Pedro, que foi atingido pelo próprio 69 d’aço. Dada a instabilidade do seu instrumento, pousado num relvado ainda mais instável, este partiu-lhe a cabeça e um dente. A conta do CHUC ninguém sabe a quem mandar...

É

CE CI NÉ PÁ UM PINHEIRO

de notar o exaustivo investimento, por parte da ilustre e iluminada Direção das ­Generalidades, no ‘decor’ sazonal da casa-mãe. Sim senhor. Já que não se gastam 2 mil euros no jantar de tomada de posse, o dinheiro tem de ir para algum lado (será que dá para um implante capilar?). Portanto, tomem lá luzinhas intermitentes. Como é que alguém se pode queixar de cantinas/propinas/dívidas/etcétera quando se depara com um belo pinheiro a iluminar a cara do Sr. Xico. E sabem o que é melhor que um pinheiro? TRÊS PI-NHEI-ROS! Mudando de assunto. Sabem o que é que o Grupo Ecológico anda praí a oferecer? PiNhehIrOooooooooOO oOoOOOOOoOOOOOOoooooOooOOOo OoOoOoooooos!!


18 artes feitas 17 de dezembro 2019

CINEMA

GUERRA DAS CABRAS A evitar Fraco

O dia em que o fim foi esquecido

P

Podia ser melhor Razoável

- POR MIGUEL MESQUITA MONTES -

ela tonalidade dos cabelos de Frank Sheeran (Robert De Niro) vamos sabendo quando estamos em “O Irlandês”. Ora grisalhos e pausados, ora mais vivos e soltos, são estes os fios que nos conduzem pela cronologia líquida do filme. Martin Scorsese volta a premir o gatilho para cravar, na sua filmografia, outra grande obra. E que grandes são as 3 horas e 29 minutos de fita do veterano realizador, que se nota cansado, apático e a preparar o fim. (Haverá, por acaso, melhor maneira de o fazer, além de com os nossos amigos?) É também com a ideia do fim bem presente que assistimos à entrada de Frank Sheeran no mundo sempre duvidoso, mas nem por isso menos envolvente, da máfia. Russell Bufalino (um calmíssimo Joe Pesci) é quem o retira daquela sua vidinha secante, que já sabíamos gozada e rejeitada pelo imoral “Tudo Bons Rapazes” (1990), do mesmo autor. Desta vez, quem sai do volante, deixando-se por sua vez transportar, muda mesmo de vida. De recadinho em recado, a importância da personagem de Robert De Niro naquele mundo perigoso vai escalando. A confiança que os “do topo” depositam em si, bem como o respeito que por ele vão ganhando partem para um nível de consideração relevante. Pouco depois da hora de filme, lá mergulhamos no cerne da sua história: surge finalmente Jimmy Hoffa (Al Pacino), que torna Frank Sheeran no seu segurança, braço direito, amigo, e confidente,

e com quem mantém conversas íntimas enquanto escova os dentes ou debruçado na berma da mesinha de cabeceira, até adormecer. É incrível acompanhar todo o desenrolar da narrativa redigida por Steven Zaillian, adaptada para o ecrã do romance “I Heard You Paint Houses”, de Charles Brandt. Ainda que já sabida (“O Irlandês” não deixa de ser uma biografia), esta história foi sendo por muitos esquecida: o exímio, quase irrepreensível Al Pacino interpreta um poderosíssimo líder sindical que, segundo o típico – e adorável – voz-off scorsesiano, é maior do que o Elvis. E isso levanta inimizades fulcrais para o enredo. No fim, a grandiosidade incontestável deste figurão não sobreviveu ao maior inimigo público que alguma vez teve de enfrentar: o tempo. Jimmy Hoffa terá sido por todos esquecido, pendendo algures numa fotografia antiga, não datada, tingida daquele preto e branco esbatido pelas horas mortas. Para além de outras grandes homenagens que tem teimado em fazer [“O Aviador” (2004), “A Invenção de Hugo” (2011)], Martin Scorsese não quis aceitar que Jimmy Hoffa fosse só mais uma imagem descolorida, deixada numa mesa de cabeceira qualquer. Debruçou-se para a ver melhor, deu-lhe cor, e com isso um tempo próprio, e atribuiu-lhe uma significação. A última até pode ser despreocupada do fim, mas tem em conta o esquecimento. Este épico é a prova desse crime.

A Cabra aconselha A Cabra d’Ouro

The Irishman De Martin Scorsese com Robert De Niro 2019

A Cabra aconselha


17 de dezembro 2019

MÚSICA

Saudosismo com sabor a lagostim - POR PEDRO DINIS SILVA -

S

eja em nome próprio, como dB ou como produtor-chefe dos Conjunto Corona, David Bruno é já um conhecido cúmplice da cada vez mais eclética cena ‘hip-hop’ portuguesa. Depois de um 2018 em grande com dois discos lançados (“O Último Tango em Mafamude” a solo e “Santa Rita Lifestyle” com os Corona), surge na segunda parte deste ano o seu mais recente esforço: “Miramar Confidencial”. Com o novo álbum, regressam os traços que tão bem caracterizam o estilo do artista. De “O Último Tango em Mafamude” herda as referências à sua terra natal de Vila Nova de Gaia, ‘hooks’ instantaneamente cativantes, rasgos de guitarra elétrica e uma sonoridade que mistura batidas de ‘hip-hop’ com melodias românticas e orquestradas. Em “Miramar Confidencial”, no entanto, troca-se a aparente estética acústica do trabalho anterior pelas texturas mais eletrónicas, com sabor a anos 80, a ‘pop-rock’ e até, à sua maneira, a ‘vaporwave’. Esta mudança resulta e cria um ambiente original que em tudo combina com a narrativa quase cinematográfica apresentada no disco. O seu protagonista é Adriano Malheiro, um típico c­onstrutor civil português com sonhos de riqueza e vida de luxo, que ao longo do alinhamento do álbum se vai perdendo em negócios manhosos e dívidas por pagar. Nomes como Samuel Úria, Fernando Alvim e Carlos Afonso (Este Senhor) aparecem para ajudar a contar esta história. A principal colaboração surge em “Interveniente Acidental”, onde Mike El Nite

A Cabra aconselha

Google Stadia: a estreia da Google nos videojogos - POR BERNARDO AGOSTINHO -

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om a aproximação do ano de 2020, à entrada desta década já nos é prometido pela Sony e Microsoft as tão aguardadas PS5 e XBOX Séries X. Porém, não são as únicas empresas que prometem abanar a indústria gaming com nova hardware, a Google faz finalmente a sua entrada no mundo dos videojogos ao lançar o seu projeto Google Stadia. A empresa norte americana afirma ter a resposta para o futuro dos videojogos, que é há muito tempo especulado e discutido entre os jogadores, o “cloud gaming”. Por outras palavras, a empresa retira a TV e a consola do quadro tradicional do jogador, oferecendo apenas um comando e uma conta Google ligada aos seus servidores. Esta transmite o feedback visual do jogo escolhido no ecrã do seu telemóvel, tablet ou computador, exatamente como se fosse um stream. Sem transferências ou transações, foi demonstrado na sua apresentação o Assassin’s Creed Odyssey a ser jogado num telemóvel, o que é inacreditável. Com um preço de $9.99/mês e direito a um jogo grátis todos os meses e resolução 4k, não seria de estranhar uma boa receção. Porém este sonho de um serviço de gaming através de stream ainda está longe do que muitos jogadores esperavam… Primeiro, o serviço de $9.99/mês não está disponível individualmente, para ter acesso é necessário comprar o pacote do controlador Stadia, ChromeCast e 3 meses grátis por $129.99. Para poder jogar no telemóvel ele precisa de ser um Google da série

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Pixel, o uso de telemóveis ios e android no Google Stadia por agora não funciona, o que acaba por deixar de fora uma grande fatia do público em geral. E como este serviço tem as suas bases no wi-fi, é preciso de ter uma excelente qualidade de internet para jogar, no mínimo uma velocidade 10 mbps por segundo para resolução 720p, e o recomendado 35 mbps por segundo para resolução 4k. Mas mesmo que cumpra os requerimentos recomendados pela Google isso não o exclui de ter problemas com o Stadia, visto que o 4k aparece e desaparece quando bem quer, e muitas vezes a imagem soluça e para com frequência dependendo do dia e tráfego na internet. A Google parece ter saltado para o mercado de “cloud gaming”, querendo ser o primeiro de todos os outros competidores, porém essa sua antecedência acabou por ser o seu maior erro, oferecendo uma plataforma inacabada e no melhores dos casos em estado Beta. É uma indústria com muito potencial mas todos os fatores que compõem uma boa conexão à internet são ainda difíceis de controlar e torná-los numa plataforma universal.

conta na lírica da canção o episódio em que Adriano é chamado a tribunal. David Bruno veste a pele desta personagem e atribui-lhe uma aura mítica e galante, com rosas nos dentes e cocktails baratos incluídos. A foleirice não existe neste universo, que tem tanto fantástico quanto de ordinário. Se a imaginação não chegar para o descrever, aconselha-se uma visita ao canal de YouTube do artista; os telediscos lá publicados são suficientes para ilustrar todo este cenário. “Miramar Confidencial” convida-nos a dar uma volta de Fiat Uno pelas paisagens costeiras de Miramar. Há tempo de ir ver o naufragado Reijin à Praia da Madalena e de passar noites inteiras no Aparthotel Céu Azul. Há lagostim, ­arroz de tamboril e sorvete “bom p’a cacete”. Há, no fundo, uma respeitosa evocação do saudosismo litoral, que tão bem caracteriza o romântico português, com aspeto renovado e atual.

Miramar Confidencial De David Bruno Editora Brandit Music Género Hip-Hop, Eletrónica 2019

JOGO

Google Stadia De Google 2019

Podia ser melhor


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EDITORIAL Soluções que enchem, mas que não matam fome - POR LUÍS ALMEIDA -

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á quase um ano que a Cantina Amarela reabriu e é de conhecimento geral que as filas do outro lado da estrada não diminuíram. Não é preciso ser-se muito perspicaz para notar a quantidade de pessoas que, deparando-se com o tamanho da fila, dá meia volta e vai embora. O problema não está no facto de a Reitoria querer uma cantina com um conceito diferente. Variedade é positivo (os vegetarianos não têm esse luxo), mas o que sai da boca dos estudantes não se prende, certamente, com o excesso de sítios com o prato social. Talvez o reitor e o administrador dos ­SASUC devam ser convidados a ir a uma Assembleia Magna (AM) para ouvirem a retórica do costume: há pouco tempo de almoço e muito tempo de espera. Melhor ainda, deviam enfrentar o desafio de ir almoçar às cantinas na hora de maior confusão. A comunidade académica folga em saber que há medidas previstas para remediar os problemas. Resta saber para quando. A Cantina Amarela é campeã em prazos incumpridos. Ouvimos o presidente da Direção-Geral da Associação Académica de Coimbra anunciar em AM que as obras nesta cantina estariam prontas até ao final de novembro. Não aconteceu. Depois, em entrevista, mudou para final de dezembro. Ainda não está em incumprimento, mas o administrador já aponta para “o início do próximo ano”. Assim torna-se difícil de acompanhar. Resta a esperança de um prato social para breve, acompanhado de filas mais pequenas. Bem se sabe que não se podem fazer as obras todas ao mesmo tempo, mas no entretanto já alguém faltou à aula das 14 horas porque não teve tempo para almoçar.

FALTAM 8 DIAS PARA O NATAL

Bem se sabe que não se podem fazer as obras todas ao mesmo tempo, mas no entretanto já alguém faltou à aula das 14 ­horas porque não teve tempo para almoçar” ERRATA Na página 18 da edição 297 do Jornal Universitário de Coimbra - A Cabra, no artigo que tem como título “Do respeito à diversidade sexual: projeto revela Cores Univers@s”, onde se lê “Para além do apoio psicológico, o gabinete também orienta os pacientes em processos médicos ou jurídicos” deve ler-se “Para além do apoio psicológico, o gabinete também encaminha os pacientes para o aconselhamento suplementar necessário”. Aos visados, as nossas desculpas.

FALTAM 15 DIAS PARA 2020

Ficha Técnica

Diretor Pedro Emauz Silva

Jornal Universitário de Coimbra – A CABRA Depósito Legal nº183245702 Registo ICS nº116759 Propriedade Associação Académica de Coimbra

Editores Executivos Luís Almeida, Hugo Guímaro, Daniela Pinto

Morada Secção de Jornalismo Rua Padre António Vieira, 1 3000-315 Coimbra

Equipa Editorial Rafaela Chambel e Isabel Pinto (Ensino Superior), Leonor Garrido e Gabriel Rezende (Cultura), Vasco Borges e Diogo Machado (Desporto), Beatriz Furtado e Maria Monteiro (Ciência & Tecnologia), Diana Ramos, Mariana Rosa e Maria Salvador (Cidade), Nino Cirenza, André Crujo e Hugo Guímaro (Fotografia) Colaborou nesta edição Francisco Barata, Tomás Barros, Cátia Beato, Vasco Borges, Joana Carvalho, Rafaela Chambel, Carolina Fernandes, Antónia Fortunato, Gustavo Freitas, João António Gama, Sofia Gonçalves, Ana Tereza May, Beatriz Monteiro Mota, Simão Moura, Bruno Oliveira, Mafalda Pereira, Carolina Prodan, Jade Sanglard, Filipe Silva, Pedro Teixeira Silva, Isabel Simões, Francisca Soeiro, Xavier Soares, Luísa Tibana, Carlos Torres

JORNAL UNIVERSITÁRIO DE COIMBRA

FALTAM 143 DIAS PARA A QUEIMA DAS FITAS (O VERDADEIRO NATAL)

Conselho de Redação Carlos Almeida, Inês Duarte, Filipe Furtado, Hugo Guímaro, Margarida Mota, João Diogo Pimentel, Paulo Sérgio Santos, Pedro Dinis Silva Fotografia Luís Almeida, Cátia Beato, Joana Carvalho, André Crujo, Antónia Fortunato, Hugo Guímaro, Beatriz Monteiro Mota, Mariana Rosa Ilustração Cristiano Matias, Marta Emauz Silva Paginação Luís Almeida, Hugo Guímaro, Gabriel Rezende

Impressão FIG – Indústrias Gráficas, S.A. Telf. 239499922, Fax: 239499981, e-mail: fig@fig.pt Produção Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra Agradecimentos Reitoria da Universidade de Coimbra Tiragem 2000 exemplares


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