Edição 297 Jornal Universitário de Coimbra - A Cabra

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12 DE NOVEMBRO DE 2019 ANO XXIX Nº297 GRATUITO PERIÓDICO DIRETOR PEDRO EMAUZ SILVA EDITORES EXECUTIVOS LUÍS ALMEIDA E DANIELA PINTO

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Académica Contigo

ELEIÇÕES AAC 2019

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Reerguer a Academia

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ENSINO

CULTURA

DESPORTO

CIÊNCIA

CIDADE

Voto antecipado e extinção do transporte de urnas são novidades no processo eleitoral. AAC vai a votos dia 19

Más condições, carência de associados e falta de verbas perduram nas secções culturais da casa

De Coimbra para Tóquio, trampolinista Joana Abrantes tenta qualificação para os Jogos Olímipicos 2020

Ajuste à universidade é a causa mais comum de ­p erturbações­­ psicológicas em estudantes

ANAI ergue-se contra o envelhecimento inativo e oferece atividades para quem procura aprender e ocupar o tempo


2 estatuto editorial 12 de novembro 2019

Estatuto Editorial

DO JORNAL UNIVERSITÁRIO DE COIMBRA A CABRA E DO PORTAL INFORMATIVO ACABRA.PT

D

e a cord o com o Ar t igo 17º, a l íne a 3 , d a L e i de Imprens a, qu a l quer publi ­ c a ç ã o d e ve divu l gar, anu a l mente, o s eu est a­ tuto e ditor i a l.

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ACABRA e ACABRA.PT são dois órgãos de comunicação social académicos cujo obje­ tivo é constituírem-se – numa simbiose capaz de aproveitar o formato e estilo diferente que cada um possui – enquanto Jornal Universitário de Coimbra.

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ACABRA e ACABRA.PT têm como públi­ co-alvo a Academia de Coimbra e é sob este princípio que se devem guiar as decisões editoriais.

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ACABRA e ACABRA.PT orientam o seu conteúdo por critérios de rigor, criati­

vidade e independência política, económica, ideológica ou de qualquer outra espécie.

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ACABRA e ACABRA.PT praticam um jornalismo que se quer universitário no sentido amplo do termo – desprovido de pre­ conceitos, criativo, atento, incisivo, crítico e irreverente.

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ACABRA e ACABRA.PT praticam um jornalismo de qualidade, que foge ao sensacionalismo e reconhece como limite a fronteira da vida privada.

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ACABRA e ACABRA.PT são na sua es­ sência constituídos por um conteúdo in­ formativo, mas possuem espaço e abertura para conteúdos não informativos, que se pautem por critérios de qualidade e criatividade.

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ACABRA e ACABRA.PT integram-se na Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra, perante cuja Direção são responsáveis; contudo, as decisões editoriais d’ACABRA e d’ACABRA.PT não estão subordi­ nadas aos interesses ou a qualquer posição da Secção de Jornalismo, nem aquele facto interfere com a relação sempre honesta e transparente que ACABRA e ACABRA.PT se obrigam a ter peran­ te os seus leitores.

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ACABRA é um jornal periódico, que acom­ panha os tempos de atividade letiva.

ACABRA.PT é um site informativo, de atu­ alização diária, cuja atividade acompanha os períodos de atividade letiva.

Estatuto Editorial disponível em acabra.pt/estatuto-editorial

PRINCÍPIOS E NORMAS DE CONDUTA

Isenção, integridade, responsabilidade e factualidade que devem marcar o trabalho no Jornal Universitário de Coim­ bra implicam por parte dos seus jornalistas o conhecimento e aceitação de regras de conduta. Assim, o jornalista deve:

1. Recusar cargos e funções incompatíveis com a sua atividade de jornalista. Neste grupo incluem-se ligações à Direção-Geral da Associação Académica de Coimbra, à Queima das Fitas, ao poder autárquico e político, bem como atividade em gabinetes de imprensa, na área da pu­ blicidade e das relações públicas. Cabe à Direção do Jornal Universitário de Coimbra e ao seu Conselho de Redação decidirem sobre casos em que a atividade jornalística se encontra prejudicada por outras atividades não previstas acima e agir em conformidade. 2. Abdicar do uso de informações obtidas sob a identi­ ficação de “jornalista do Jornal Universitário de Coimbra” (ou similares) em trabalhos que não sejam realizados no âmbito do Jornal Universitário de Coimbra. Além disso, o jornalista compromete-se ao sigilo das informações obti­ das desta forma. Exceções a esta norma poderão ser auto­ rizadas pela Direção do Jornal Universitário de Coimbra e pelo seu Conselho de Redação. 3. Recorrer apenas a meios legais para a obtenção da informação, sendo norma a identificação como jornalis­ ta do Jornal Universitário de Coimbra. De forma alguma podem ser usadas, de forma direta, informações obtidas através de conversas informais ou outras situações em que

o jornalista não se identifica como tal e como estando em exercício de atividade.

4. Abdicar de se envolver em atividades ou toma­ das de posição públicas que comprometam a imagem de isenção e independência do Jornal Universitário de Coimbra. Contudo, o Jornal Universitário de Coimbra reconhece o direito inalienável do jornalista universitário a assumir-se como cidadão. Assim, nunca um jornalista do Jornal Universitário de Coimbra será impedido de se manifestar em Reunião Geral de Alunos ou Assembleia Magna, desde que não esteja nessa altura no exercício da sua atividade jornalística, em cujo caso deverá prescindir do seu direito de expressão e voto. De igual forma, nunca será impedido de participar ativamente em qualquer ati­ vidade pública. Cabe à direção do Jornal Universitário de Coimbra e ao seu Conselho de Redacção decidir quais os casos em que a atividade jornalística se encontra prejudi­ cada por outras atividades e agir em conformidade. 5. Ter consciência do valor da informação e das suas eventuais consequências, particularmente no meio académico de Coimbra, no qual o Jornal Universitário é produzido e para o qual produz. Neste contexto parti­ cularmente sensível, o jornalista deve ter especial atenção à proveniência da informação e à eventual parcialidade ou interesses da fonte (não descurando o imprescindível processo de cruzamento de fontes), bem como garantir uma igualdade de representação em caso de informações contraditórias ou interesses antagónicos, evitando que o

Jornal Universitário de Coimbra se torne meio de comuni­ cação de qualquer instituição, grupo ou pessoa. Num meio em que o desenrolar de acontecimentos pode afetar, dire­ ta ou indiretamente, o Jornal Universitário de Coimbra, o jornalista tem também de saber manter o distanciamento necessário para a produção de uma informação rigorosa. 6. Garantir a originalidade do seu trabalho. O plágio é proibido. Nestes casos, a Direção do Jornal Universitário de Coimbra e o seu Conselho de Redação deverão agir dis­ ciplinarmente e o jornal deverá retratar-se publicamente. 7. Recusar qualquer tipo de gratificação externa pela re­ alização de um trabalho jornalístico. Estão excluídos deste grupo livros, CD, bilhetes para cinema, espetáculos ou ou­ tros eventos, bem como qualquer outro material que venha a ser alvo de tratamento crítico ou jornalístico; constituem também exceção convites de entidades para eventos que tenham um inegável interesse jornalístico (por exemplo, convites da Direção Geral da Associação Académica de Coimbra para a cobertura do fórum AAC). Cabe à Direção do Jornal Universitário de Coimbra e ao seu Conselho de Redação resolver qualquer questão ambígua. 8. Qualquer desrespeito em relação aos pontos acima vigentes implicará uma queixa por parte da Direção do Jornal Universitário de Coimbra e do seu Conselho de Re­ dação às entidades competentes, nomeadamente o Con­ selho Fiscal da Associação Académica de Coimbra, ou à formalização de procedimentos legais.


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As (des)complicações do processo eleitoral Presidente da MAM/AAC destaca voto antecipado do novo Regulamento Eleitoral. Estudantes em mobilidade continuam impossibilitados de exercer direito de voto - POR CARLOS TORRES -

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o dia 24 de outubro, foram aprovadas, em Assembleia Magna (AM), alterações ao Re­ gulamento Eleitoral para as Eleições da Mesa da AM da Associação Académica de Coimbra (MAM/AAC) e Direção-Geral da AAC (DG/AAC). Destaca-se a previsão do voto antecipado, a alteração do início da campanha eleitoral e a obrigatoriedade de debates, que passam a ser da responsabilidade da Comissão Eleitoral (CE). Como relembra o presidente da MAM/AAC e da CE, João Bento, estas alterações “já tinham sido in­ troduzidas nas eleições do Conselho Fiscal da AAC (CF/AAC) e da Assembleia de Revisão dos Estatutos Extraordinária (AREE)”. De acordo com o mesmo, as retificações visam resolver “pormenores relacionados com o comportamento da própria CE”, bem como colmatar a “falta de informação dos associados e de transparência em questões fundamentais”. Trata-se sobretudo de “facilitar o processo eleitoral”, realça o dirigente estudantil. O cancelamento do transporte de urnas é uma das medidas de destaque. Ao contrário de anos an­ teriores, “no final do escrutínio, a urna vai ser selada e todo o processo [de contagem de votos] segue nas faculdades”, esclarece João Bento. Nas palavras do di­ rigente associativo, “é importante realçar que, no final do dia [do voto antecipado], a urna é guardada”. Ou seja, esta também não vai ser transportada para fora do edifício da AAC. Pretende-se, segundo o mesmo,

“eliminar qualquer possibilidade de fraude”. Ao explicar o processo do voto antecipado, o pre­sidente da CE afirma que “qualquer associado pode usufruir desta opção”. Para tal, basta efetuar a ­inscrição até às 15 horas de dia 12 de novembro. Se­ gundo o próprio, esta medida tem como objetivo “dar uma oportunidade a quem não está na cidade no dia das eleições”. No que diz respeito à data de início da campanha eleitoral, João Bento confirma que a alteração se prendeu com o facto de, a princípio, o prazo não ­coincidir com o proposto para as eleições para o CF/ ­­ AAC e para a AREE. “A intenção era manter a igual­ dade entre todos os órgãos, logo, o prazo para a DG/ AAC deveria ser o mesmo”, esclarece o presidente da MAM/AAC. Inicialmente, quem usufruísse do voto antecipado teria acesso a apenas um dia de campanha eleitoral. Com a mudança para dia 11, passam a ter três dias de ponderação. Em relação à obrigatoriedade de debates entre listas candidatas, a medida já constava em ante­ riores regulamentos eleitorais para o CF/AAC e para a Assembleia de Revisão dos Estatutos, mas nunca veio a ocorrer. João Bento levou à Assem­ bleia Magna a proposta, tanto para a DG/AAC como para a MAM/AAC. Esclarece que “os de­ bates são meios muitos fáceis de atrair público e de dar a conhecer todos os projetos candidatos aos diferentes órgãos da casa”.

Este ano, os debates passam a ser da responsabili­ dade da CE. A este propósito, o dirigente associativo declara que “não faz sentido impor nos regulamentos que os órgãos de comunicação social tenham de os realizar”. Nas palavras de João Bento, “a CE deve ser vista como uma ponte entre os média e as listas, para que todos consigam chegar a um consenso de como vão funcionar na prática”. Questionado sobre o facto de os alunos em mobilidade não conseguirem votar, João Bento sugere que a resolução deste problema seja o voto eletrónico ou, à semelhança do que acontece a nível nacional, o voto por envelope. Contudo, “se nem num sistema tão bem regulamentado como as eleições nacionais funcionou, na AAC tenho muito medo de como seria”. Por outro lado, sa­ lienta que o voto eletrónico traz a problemática da presencialidade das pessoas. “A partir do mo­ mento em que esta se perde, surge o problema de garantir que o voto seja submetido pela própria pessoa”, afirma o dirigente associativo. Entre possíveis medidas futuras, a prioridade é a revisão dos cadernos eleitorais, para que “passe a ha­ ver um registo correto dos associados, quer dos efeti­ vos, quer dos seccionistas”, afirma João Bento. Realça ainda que “é necessário continuar a formar muito bem os delegados da CE e garantir a estabilidade de todo o processo, bem como a existência de cadernos eleitorais corretos”.

MARTA EMAUZ SILVA


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Órgãos Centrais da AAC ASSEMBLEIA MAGNA Constituída por todos os estudantes da UC, é o órgão máximo deliberativo da casa. Pode ser convocada a pe­ dido da Direção-Geral ou de cinco por cento dos asso­ ciados efetivos da AAC e tem a obrigatoriedade de se reunir pelo menos quatro vezes ao ano. É da sua com­ petência exclusiva a aprovação dos relatórios de contas uma semana após o parecer dado pelo Conselho Fiscal

MESA DA ASSEMBLEIA MAGNA Constituída por um presidente, um vi­ ce-presidente e dois secretários, é quem divulga, organiza e dirige a Assembleia Magna. Detém a responsabilidade pe­ las eleições dos órgãos centrais da casa, de modo que o seu presidente também preside a Comissão Eleitoral dos mesmos

DIREÇÃO-GERAL É o órgão máximo executivo da AAC e tem o poder de convocar Assembleias Magnas. Faz a gestão da casa a nível fi­ nanceiro e de ordem de trabalhos e põe em prática as decisões tomadas na AM. Constituída por 15 a 25 elementos, é subdividida internamente por pelouros

CONSELHO FISCAL Principal órgão fiscalizador da casa, é responsável por dar os pareceres dos relatórios de contas de todos os organismos da AAC e festas académicas. É constituída por onze membros e as suas eleições ocorrem em março. Tem a palavra final no julga­ mento de irregularidades estatutárias investiga­ das pela Comissão Disciplinar

COMISSÃO DISCIPLINAR É o órgão de investigação da casa, criado nos últimos Estatutos da AAC. É eleita, em março, por representantes das secções e núcleos. De­ tém a tutela e iniciativa da ação disciplinar na sua fase de inquérito. Posteriormente, elabora uma nota de culpa acusatória que é entregue ao Conselho Fiscal


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Duas listas em disputa pelo futuro da Assembleia Magna

GABRIELA MOORE

Descentralização das AM é acordo comum entre as listas candidatas. Falta de adesão estudantil permanece alvo de discussão na agenda eleitoral - POR ANA HAEITMANN -

A

votação da nova Mesa da Assembleia Ma­ gna da Associação Académica de Coimbra (MAM/AAC) vai decorrer no dia 19 de novem­ bro em todas as faculdades da Universidade de ­C oimbra (UC). As secções de voto abrem às 9h30 e encerram às 19 horas para a primeira volta. Para exercer o direito de voto é necessário apresentar bilhete de identidade e cartão de estudante ou certificado multiusos. Duas listas estão na cor­ rida eleitoral: a Lista C - “Académica Contigo”, liderada por Leonardo Fernandes, e a Lista R “Reerguer a Academia”, encabeçada por Nátali Caroline dos Santos. Lista R: “Os alunos devem tomar o papel deli­ berativo da discussão” A estudante internacional do quarto ano de Di­ reito integra a Assembleia de Revisão dos Estatu­ tos Extraordinária (AREE) da AAC. Durante esse período, constatou que as revisões dos estatutos não resultam porque nem o documento original é cumprido. A candidata apresenta a falta de informação dos estudantes sobre os órgãos da AAC como principal ponto a ser corrigido pela MAM/AAC, uma vez que é competência da mesma. O objeti­ vo é “motivar os estudantes a participar”, tendo em conta que a Assembleia Magna (AM) “perde o poder deliberativo pela falta de adesão estu­ dantil”, esclarece. Acrescenta que, sem o devido quórum, isto é, o mínimo de pessoas necessário para uma votação se realizar, torna-se inviável mudar assuntos fulcrais como propinas ou situ­ ações de bolsa. Ainda nesta problemática, a estudante de Di­ reito defende que, logo no início do ano escolar, os alunos devem ser informados sobre a importân­ cia que têm nas decisões da academia. Também propõe expor as pautas que vão ser tratadas na

AM com antecedência e alertar para a relevância das mesmas. C omo aluna internacional, Nátali Caroline dos Santos reconhece que “existem estudantes estrangeiros que são um pouco esquecidos na universidade e que precisam de ser ouvidos”. A candidata complementa: “também tenho voz e posso fazer parte disso ativamente”. Apesar de inf luenciar a visibilidade deste nicho de alunos no meio académico, afirma que não vai pensar somente neles, mas sim em toda a academia. Lista C: “Aproveitar os processos já implementados” A concorrer para presidente da MAM/AAC com a Lista C está Leonardo Fernandes, estu­ dante do quinto ano do Mestrado Integrado em Medicina na Faculdade de Medicina da UC. É também o atual coordenador geral da Pedagogia da Direção-Geral da AAC (DG/AAC) e membro da AREE deste ano. Leonardo Fernandes não apresenta novas propostas, pois pretende fazer do mandato uma extensão do trabalho da atual mesa. Tencio­ na continuar os projetos instaurados em 2019, que “tornam a academia mais moderna, cómo­ da e adaptada às necessidades dos estudantes”. Como motivação da candidatura, confessa que “há mais que podemos fazer pela casa do que um ano permite”. O estudante de Medicina ressalva que pre­ tende continuar a levar as Assembleias Magnas a outros polos e a disponibilização dos docu­ mentos ‘online’ nos prazos previstos pelos es­ tatutos. Também considera relevante suscitar maior participação e envolvimento dos estu­ dantes na AM, “que é um órgão com importân­ cia histórica em Coimbra”.

Descentralização vai continuar A distribuição das Assembleias Magnas pe­ las áreas da universidade é o ponto de con­ cordância entre as duas listas, que admitem a importância do trabalho feito pela atual mesa neste âmbito. O candidato da Lista C refere que os estudantes “reagiram bem à distribuição das Magnas e que na penúltima,no Polo III, o quórum foi significativo”. Assim, reconhece como positiva a atitude de se fazer presente nas diferentes áreas estudantis. Com uma posição semelhante neste processo, a Lista R considera crucial alternar o local das AM, por fazer com que todos os alunos se sintam in­ cluídos, visto que “tudo parece acontecer no Polo I”, aponta Nátali Caroline dos Santos. Propõe ain­ da fazer uma parceria com a Câmara Municipal de Coimbra para garantir transporte gratuito dos estudantes até às Assembleias Magnas. Críticas ao atual mandato Sobre as condições de instalação e organização da Assembleia Magna, a representante da Lis­ ta R considera que foram melhoradas pela atual MAM/AAC. Aponta que este fator não aumentou a adesão de novos estudantes, mas incentivou os regulares a marcar presença. Desenvolve que a falta de participação se deve, em parte, ao f­acto de estes não se interessarem em aprovar apenas regulamentos e orçamentos, que são os temas mais abordados. O projeto “Reerguer a Academia” visa resgatar o papel primordial de deliberação da AM, que acredita ter sido esquecido pelo mandato atual. No campo oposto, Leonardo Fernandes pensa que as mudanças feitas por João Bento têm espaço de melhoria, mas não consegue apontar nenhuma falha relevante por parte da Lista C.


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Lista C - Académica Contigo Daniel Azenha é mestrando em Geografia Humana, ­Planeamento e Territórios Saudáveis na Faculdade de ­Letras da Universidade de Coimbra. O atual presidente da DG/AAC recandidata-se pela Lista C – “Académica Contigo” e visa dar continuidade e estabilidade à casa. Propõe que seja feita a reestruturação da sede e manifestou a vontade de incluir o Museu Académico no espaço. Reforça a necessidade de saldar a dívida externa antes de se debruçar sobre a interna - POR GABRIELA MOORE E FRANCISCA SOEIRO -

A tua candidatura conta com algum apoio partidário? Não, pelo contrário. Nós temos pessoas de todos os quadrantes políticos, desde a esquerda à direita. Há membros da lista, inclusive eu, que fazem parte de juventudes partidárias.

e temos de começar a pensar de que forma vamos pagar ao Conselho Desportivo da AAC (CD/AAC). Neste momento, não temos qualquer banco a pa­ trocinar, que é essencial, e conseguir um vai ser um grande desafio.

O que motivou a recandidatura à presidência da Direção-Geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC)? Em primeiro lugar, a vontade pessoal. Em se­ gundo, percebi que existia apoio, não só dos ­e lementos da minha equipa, como também da co­ munidade em geral. Várias vezes fui abordado por secções e colegas que me perguntaram se havia a possi­bilidade de continuidade. Nós também somos estudantes, e com o trabalho diário que temos é impossível estabilizar a casa e deixar um legado em apenas um ano.

Qual vai ser o papel da DG/AAC na questão das propinas? Há algum projeto em mente? Nós entendemos que a propina é uma barreira ao desenvolvimento pessoal de cada um e que é obrigação do governo conceder. Portanto, a luta vai continuar, sempre irreverente. A propina foi reduzida, mas só em 200 euros, e ainda estamos muito longe daquilo que queremos. A ação social não deve servir para o pagamento da frequência no Ensino Superior (ES), porque tem um sentido muito próprio, relacionado com alojamento, ali­ mentação e transporte. Isto está completamente errado, é o que temos manifestado e que vamos continuar a manifestar.

Que balanço fazes do mandato? Aproveitámos as legislativas e as europeias para consciencializar a comunidade académica sobre o assunto. Fizemos as operações relâmpago nas questões da refeição social nas Cantinas Amarelas e das residências estudantis. Criamos mais uma sala de estudos no Polo I, na Cantina dos Grelha­ dos. Revolucionámos a Liga Académica e consegui­ mos que todos nossos estudantes possam praticar desporto. Aumentámos também o financiamento público, com as candidaturas a projetos do Institu­ to Português do Desporto e Juventude e da Câmara Municipal de Coimbra. Quais são as bandeiras desta nova candidatura? O projeto segue no sentido de estabilizar o que fizemos há um ano, mas vai ter novidades. Vamos continuar com uma postura irreverente. Porém, vivemos em estabilidade política e é difícil pôr dez mil estudantes na rua, a não ser que haja um pro­ blema gravíssimo. Em relação à cultura, ainda que seja difícil, pretendemos deixar já este ano um pro­ jeto para o futuro do Museu Académico, que gosta­ ria que fosse na AAC. Vamos ter este ano a revisão dos espaços do edifício e pode haver aqui algum espaço para o próprio museu. A nível desportivo, queremos fechar um patrocínio global para todas as secções para reduzir custos dos equipamentos. Isto é, pensar no futuro, reduzir os custos às nossas secções e aumentar a fatia do financiamento. E a questão da administração, que é um dos pontos es­ senciais desta casa. Nós, felizmente, conseguimos reduzir a dívida. A nossa visão era pagar primeiro a externa para ganhar credibilidade com os par­ ceiros. A redução da dívida e do seu pagamento a nível externo é obrigatória. Temos dívidas internas

Os estudantes internacionais pagam 7000 eu­ ros por ano. Como te posicionas em relação a esta questão? Entendemos que o estudante internacio­n al tam­ bém não deve pagar propina. Para nós, o princípio é exatamente o mesmo. Qualquer humano, qualquer pessoa deve ter acesso ao ES. Já manifestámos essa preocupação à reitoria dizendo que não faz qualquer sentido. Até porque eles nos trazem, por exemplo, a multiculturalidade e as próprias famílias. Tudo isso é riqueza e desenvolvimento no nosso país. Qual o papel da DG/AAC na discussão das políti­ cas públicas do ES? É de grande importância. Recordo que este ano escrevemos uma carta ao ministro da Educação, na qual pedimos um esclarecimento em relação à propina zero e fomos recebidos pelo secretário de Estado do Ensino Superior. Com isto, sentimos que a AAC tem muita força a nível nacional. Sempre que nos pronunciamos, isto chega a Lisboa e eles percebem que é algo sério. Quais são as propostas para as secções culturais? A nível cultural, o objetivo é aproximar a asso­ ciação daqueles que vivem em Coimbra. É impor­ tante que haja uma ligação porque não queremos que os habitantes da cidade nos olhem como um corpo estranho. Percebemos que as pessoas não sabem das nossas atividades, por isso fizemos uma agenda onde podem saber tudo o que a AAC tem planeado.

E a nível desportivo? A capacidade e o reforço financeiro, que é algo que queremos ver já no próximo ano. É preciso puxar o patrocínio global para as nossas secções de forma a reduzir esses custos e reforçar também a nossa Liga Académica. O que tens a dizer em relação a boicotes de gru­ pos académicos, uma vez que é uma situação que se tem vindo a repetir, em específico na Latada? Nesta Latada só tivemos um grupo a boicotar. Este ano, decidimos que não existiriam horários fixos para algumas tunas, porque, para nós, todos os gru­ pos são iguais, pelo que fizemos um sorteio. A Tuna de Medicina da Universidade de Coimbra (TMUC) foi o único grupo que não esteve presente. Eles ­ficaram descontentes com a hora que lhes calhou e entenderam que era desprestigiante. Mas a atitude foi lamentável. Deixaram que o cartaz saísse, que fizés­ semos as credenciais e tivéssemos o transporte e a alimentação a fazer conta com eles. Nunca manifes­ taram descontentamento. Nós respeitámos a decisão, mas não íamos voltar atrás com a nossa palavra.

“Com o trabalho diário que temos é impossível estabilizar a casa e deixar­­­ um legado em apenas um ano”

ENTREVISTA NA INTEGRA EM ACABRA.PT


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Tens algum projeto em andamento para a reestru­ turação do edifício da AAC? Foi-nos deixado um projeto pela direção do ano anterior que ainda vamos analisar. Mas vamos pre­ cisar do bom senso de todas as estruturas que coabi­ tam no edifício. Umas têm muitas salas, outras têm salas a menos. Tem de existir um equilíbrio. Claro que não vão haver expulsões – isto é algo que eu prometo. Até porque queremos criar novas secções. Temos a Pró-Secção de Futsal, que se vai tornar secção, e com isto tem direito a uma sala, como dizem os nossos regulamentos. Vamos ter também uma Pró-Secção de Boccia que, daqui a dois anos, vai ter a possibilidade de virar secção. O espaço é limitado e todos nós temos de ser sensíveis uns com os outros. Esta reestruturação já é discutida há algum tempo. Quanto achas que demora a entrar em funcionamento? Tem de ser implementada já este ano. Confesso que tenho algum receio, porque isto vai destabilizar

algumas estruturas. Deve ser feito com sen­ sibilidade da nossa parte, não vamos ter uma postura agressiva. Vamos sentar-nos todos, frente a frente, e apresentar a nossa proposta, que vai ser discutida este ano. Portanto não vamos permitir boicotes. Queremos crescer e a Académica não pode estar dependente de vontades próprias. A dívida externa já está a diminuir. E a interna? A estratégia neste momento é pagar a ex­ terna. Temos muito acordos de pagamentos judiciais, que são mais graves porque podem meter-nos em tribunal. E não podemos ser inconscientes em relação a isto. Depois va­ mos saldar, mais lentamente, a interna, que se refere a dívidas que temos com a Queima das Fitas (QF) e com o CD/AAC. A primeira está a ser reduzida todos os meses, e penso que pode ser liquidada neste ano ou no próximo. A segunda ainda não conseguimos perceber de onde vem. Já nos sentámos com o CD/ AAC, mas ainda não avaliámos toda a dívida que temos a nível interno – que, neste mo­ mento, é só ao desportivo. Existem maneiras de aumentar o financiamento da casa? Espero que sim. Um grande objetivo é aumentar o finan­ ciamento público. Como é uma recandidatura, sinto que a equipa está mais estável e bem informada sobre tudo que é preci­ so para evitar perder alguns financiamen­ tos. Também é impor­ tante reforçar que o financiamento privado tem alguma relevân­ cia. De momento, vive­ mos à conta das festas académicas e dos con­ tratos com a cervejeira e com o bar. Mas o banco, para o ano, tem de ser uma realidade.

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Quando anunciaste a recandidatura falaste em profissionalizar a casa. O que significa isto? É, no fundo, diminuir a burocracia. Um exem­ plo é a nossa tesouraria porque, neste momento, todas as faturas passam por lá e temos vonta­ de de a descentralizar. Se uma secção quiser le­ vantar dinheiro, é lá que se deve dirigir, estando dependente dos seus horários. A nossa ideia é ter uma plataforma em que todos os dirigentes de cada secção, núcleo de estudantes e a própria DG/AAC possam facilmente inserir alguns da­ dos no que diz respeito à faturação, aluguer de espaços ou mesmo da própria frota. Não é para torná-los independentes, é para não atrasar a sua atividade. Os relatórios de contas das últimas edições da QF têm sofrido atrasos. Consideras o prazo apertado? Na minha visão, os prazos deveriam ser ainda mais apertados. Não é admissível que a Queima das Fitas termine e passado um mês ou dois ain­ da não tenham entregado um relatório de con­ tas. Temos várias empresas e associações que conseguem cumprir os prazos. Por que é que a Comissão Organizadora da Queima das Fitas (COQF) não consegue? O que temos de fazer é responsabilizar os nossos dirigentes e o próprio secretário-geral, que é funcionário da COQF. E fazer com que eles saibam que, caso não entre­ guem dentro do prazo, ou apresentam uma justi­ ficação ou são sancionados internamente. Qual a tua posição em relação à retirada da carne de vaca do menu das cantinas? Em que medida a AAC pode contribuir para as questões ambientais? Em relação à carne de vaca, nós declarámos apoio à iniciativa da reitoria. A mensagem que a UC e a AAC passaram é que estamos a chegar à linha vermelha. O reitor disse que sentia ver­ gonha da geração que não se preocupou com o futuro. Nós não podemos cometer o mesmo erro. Quando tivermos 30, 40, 50 anos, não podemos sentir vergonha da nossa geração e dizer que não fizemos nada. Em relação à Di­ reção-Geral: já na Latada fomos um ecoeven­ to, o que nos deixou muito felizes. Consegui­ mos ter imensos caixotes para reciclagem em condições. Aliás, a empresa ERSUC ficou mui­ to satisfeita connosco. Tivemos os copos reuti­ lizáveis, que foram também uma problemática. Não é uma questão económica, mas sim uma preocupação ambiental para a casa. O próximo passo é tentarmos ser selo verde, o que é mais sério porque vem do Ministério do Ambiente. Algum apelo que queiras fazer aos estudantes? Quero dizer, acima de tudo, que participem e que exerçam o direito de voto, independen­ temente da vontade de voto. Se concordamos com uma lista, com outra ou com nenhu­ ma, não interessa. Mas que se diri­ jam às urnas e votem.

ANTÓNIA FORTUNATO


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Lista R - Reerguer a Academia Diogo Vale, estudante do quarto ano de Medicina na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (UC) encabeça a Lista R. “Maior proatividade e pro­ ximidade aos estudantes” são dois dos objetivos da lista. A ideia-chave é “perguntar aos estudantes como querem abordar problemas específicos das suas vidas”. Reivindicar a reabertura das Cantinas Verdes e dos Grelhados e promover um abaixo-assinado por melhores condições nas faculdades são ações propostas - POR ISABEL SIMÕES -

A tua candidatura conta com algum apoio partidário? Não. Pessoalmente pertenço à JCP, mas a nos­ sa candidatura é completamente independente. Há gente da nossa lista que não tem qualquer filiação partidária e a lista como um todo tam­ bém não tem. O que motivou a tua candidatura à presidên­ cia da Direção-Geral da Associação Académi­ ca de Coimbra (DG/AAC)? A nossa candidatura vem sobretudo de uma constatação de que o atual mandato tem sido insuficiente a combater os vários problemas do quotidiano dos estudantes. Sentimos que causa um grande afastamento dos estudantes em relação à Direção-Geral. Os dirigentes in­ sistem em ter ações independentes no sentido em que não consultam a comunidade estudan­ til em Assembleia Magna (AM). Um aluno que se depare com esta situação não vai sentir que a sua voz esteja a ser ouvida. A lista do Daniel Azenha é de continuidade com a anterior, em que ele também teve um cargo e, portanto, seria mais um mandato com esta ideologia, pelo que é necessário mudar. Noutra entrevista ao Jornal A Cabra, afirmaste que a Lista R se candidatava contra “a insuficiên­ cia do atual mandato”. Tens mais alguma crítica? No último ano, foi perguntado em Magna se havia alguma ação planeada para o Dia do Estudante. Responderam que os planos ainda estavam a ser feitos. Alguns dias depois, surgi­ ram as ações que todos vimos. Na AM seguinte, quando confrontado, Daniel Azenha r­ espondeu que era uma questão de ‘timing’. Já este ano, sobre as medidas que o reitor anunciou para atin­ gir a neutralidade car­ bónica na UC, a DG/ AAC proclamou o apoio da comunidade estu­ dantil sem a ter con­ sultado. Se isto tivesse sido

GABRIELA MOORE GABRIELA MOORE

discutido em Assembleia Magna, os estudantes até tinham apoiado, não é isso que ponho em causa. A nível das questões básicas, vemos que as Cantinas Amarelas foram reabertas com uma grande luta dos estudantes, mas sem pra­ to social. Já foi prometido, mas para quando? Mesmo que as Cantinas Amarelas tenham re­ feição social, não pensamos ser suficiente para solucionar as filas enormes que se vê por toda a universidade. É uma luta que deve ser con­ tinuada com a reabertura das Cantinas Verdes e dos Grelhados. As residências são um pro­ blema cada vez maior, pois há uma grande in­ suficiência de camas. O que constatámos este ano é que, um pouco por todo o país, estão a ser disponibilizadas mais camas em residências universitárias públicas e nenhuma delas é em Coimbra. A DG/AAC não se pronunciou de todo em relação a isto. Referiste a necessidade de exercer “pressão so­ bre a universidade”. Em que áreas consideras que a UC está a falhar? Não cabe à AAC colocar a refeição social nas Cantinas Amarelas, nem reabrir as cantinas que foram fechadas. De modo a concretizar essas ações, vai ter de ser exercida pressão sobre a UC e sobre as políticas nacionais. Qual a tua posição em relação à retirada da carne de vaca das refeições da cantinas? Esta questão, mais do que a minha opinião


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pessoal, devia ter passado pelos estudantes para ver qual a sua posição. Só assim nos devíamos pronunciar. Juntamente com a carne de vaca houve outras medidas que foram in­ troduzidas e temos de ver se estas diferenças são de facto bem-vindas. A minha posição central é esta: consultar os estudantes.

Portuguesa preveem ensino público e universal. A nossa lista defende isso. Como aconteceu na última legislatura, a descida do preço da propi­ na deve dar ainda mais força para continuar esta luta e não a deixar cair no esquecimento. É necessário continuar até chegar ao objetivo final que será a extinção da propina.

O que vão fazer melhor, caso ganhem? Só um rumo diferente, uma maior transpa­ rência e uma maior e mais frequente consulta dos estudantes. Alguns elementos da nossa lista vão começar já a apresentar um abaixo-assinado, no sentido de reivindicar aquilo que nós entende­ mos ser uma necessária melhoria das condições nas faculdades. Não existem espaços e as salas não têm condições. Pensamos que a função da DG/AAC deve passar muito por promover este tipo de ações concretas: abaixo-assinados e manifestações. Sempre que houver um problema, a Direção-Geral deve consultar os estudantes para perceber se têm in­ teresse em manifes­ tar-se publicamente para com­ bater estes p r o­b l e m a s . ­Aquilo a que nos compro­ metemos é a ter este tipo de proatividade.

Em relação à propina para os estudantes inter­ nacionais, têm alguma posição? Sim. Reparámos que a propina internacio­ nal tem um valor muito elevado em relação à dos estudantes nacionais. Também defende­ mos a descida desta propina. Qualquer desci­ da é bem-vinda.

Quais são as prin­ cipais bandeiras do teu projeto? Acabar com esta campanha de pro­ moção ao desinte­ resse que a atual DG/ AAC está a levar a cabo. Maior pro­ ximidade aos estudantes e mais inicati­ va. Apresen­ tar mais ações concretas e mais ­c onstantes. Per­ guntar aos estudantes como é que querem pro­ ceder de modo a abordar pro­ blemas específicos das suas vidas. Quais são, para a tua lista, os principais problemas que os es­ tudantes enfrentam? A Ação Social, de um modo geral, deve ser melhorada. Mas tam­ bém se pretende abordar pro­ blemas pedagógi­ cos e a falta de condições nos espaços das faculdades. Assim como não podemos ­d escurar a luta contra a propi­ na. Aliás, os próprios Esta­ tutos da AAC e a Constituição da República

Há muitos anos que se fala na reorganização dos espaços da AAC. É um projeto que têm em mente? Se sim, como o pretendem executar? Sim. Vimos que o edifício da AAC no piso zero tem estabelecimentos comerciais, sabendo nós que várias secções estão a carecer de espaço. Seria do interesse de todos os associados, efeti­ vos e seccionistas, que se dialogasse no sentido de perceber se é conveniente disponibilizar al­ guns desses espaços às secções que deles neces­ sitam. Muitas vezes, a desculpa apresentada é de cariz financeiro. Mas, se queremos estabilidade para a AAC, temos de cuidar dos problemas dos estudantes, das secções e dos organismos autónomos. Este ano, o Daniel Azenha infor­ mou ter diminuído bastante a dívida, portanto, é possível combatê-la. Não estamos a dizer para a Académica estar aqui a acumular dívidas sem fim, temos é de ver quais os problemas mais ur­ gentes. Tentar gerir melhor as prioridades e não colocar as dívidas à frente das secções. A dívida da AAC com o exterior tem diminuí­ do, mas em relação às secções, em especial às desportivas, continua elevada. Como resolvias o problema? Prende-se com a transparência e eficácia a nível da atribuição das verbas da Queima das Fitas, por exemplo. Sobre pressão, vemos que se conseguem avanços, como aconteceu com a Secção de Fado, em que acabou por se chegar a um entendimento. Qual o papel que a AAC pode ter na discussão das políticas públicas de Ensino Superior (ES)? Um dos grandes problemas que continua a afe­ tar o ES é o Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior. Há muito tempo que a sua re­ visão devia ter acontecido. Vemos que a própria DG/AAC e, por consequência, a AAC, não tem sido muito ativa em relação a este assunto. É importante não deixar que o debate desapareça. No Conselho Geral, por exemplo, cinco dos 35 membros são estudantes e outros dez são enti­ dades externas. É impensável que os estudantes tenham uma palavra tão pequena na gestão da própria universidade. Quais são as propostas para as secções culturais? Terá sempre de haver um grande diálogo com elas no sentido de perceber quais são os seus problemas e de que maneira a DG/AAC pode contribuir para os resolver. O nível prático prende-se com a gestão dos espaços do edifício e com a valorização das secções. Não é segredo que todos os anos existem problemas que vêm a público com secções ou grupos autónomos aquando das festas académicas. O que vemos é que, no caso da Latada, há necessidade de re­ estruturar a festa para colocar os estudantes no centro. Que seja de facto uma festa académica

ensino superior 9

para os estudantes e onde as secções têm sempre uma posição privilegiada relativo a tudo o resto. E para as secções desportivas? Passa muito pelo diálogo. Com algumas secções que estão mais distanciadas, seria necessário au­ mentar a informação junto dos estudantes, para que tenham conhecimento das suas atividades e se sintam mais próximos delas. O que propões para os organismos autónomos? Terá sempre de passar pelo diálogo, infor­ mação e trabalho em conjunto para que, no con­ texto quotidiano, se possam abordar problemas desses organismos e para que sintam que a DG/ AAC pode contribuir para os resolver. Mas são autónomos e se entenderem que não precisam... há que haver um diálogo. E para os núcleos? Os núcleos têm um papel muito importante no funcionamento da AAC e beneficiam de uma proximidade com os estudantes que a DG/AAC não tem. A nível de comunicar problemas locais, quer sejam problemas pedagógicos ou de in­ fraestruturas de uma dada faculdade, os núcleos têm o grande papel de apontar estas situações e de as comunicar. Depois, a Académica pode lu­ tar contra elas. A AAC participou na última greve climática. Que medidas propões para uma academia mais amiga do ambiente? A DG/AAC deve trabalhar com o Grupo Ecológico da AAC para mudar aquilo que eles entenderem e consultar sempre os estudantes antes de as aplicar. Mais uma vez houve um grupo académico a boicotar a Latada. Qual a tua posição? Esses boicotes surgem porque há uma falta de preocupação por parte da DG/AAC e da orga­ nização das festas académicas em beneficiar os grupos da casa. Há que colocá-los nas festas e garantir as condições necessárias para atuarem e se sentirem confortáveis. A Comissão Orga­ nizadora da Queima das Fitas está a ser revista em Assembleia de Revisão de Estatutos Extraor­ dinária da AAC, não vale a pena estar a pronun­ ciar-me, temos de ver o que sai daí.

“É impensável que os estudantes tenham uma palavra tão pequena na gestão da própria universidade” ENTREVISTA NA INTEGRA EM ACABRA.PT


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Valter Lobo: “Cheguei a uma idade em que perdi o filtro” Canta para “poucas almas tristes”, faz canções como “quem conversa no fim do dia em casa” e não se consegue desligar da sua área de formação, o Direito. Com copo na mão e pouco antes do concerto no Salão Brazil, Valter Lobo esteve à conversa com o Jornal A Cabra. Aos 36 anos, o cantautor fafense revelou o nome do seu novo álbum, que vai ser lançado em 2020 - POR BRUNO OLIVEIRA E CAROLINA PRODAN -

É a tua primeira vez em Coimbra?

Já estive aqui algumas vezes, mas nunca em nome próprio. Vim uma vez por iniciativa da As­ sociação Académica de Coimbra, também já aqui estive no Misty Fest, a abrir para o Scott Matthew. Voltei para o lançamento da revista Via Latina, em que fiz um poema e com o qual fiz uma música chamada “Ser de água”. Como sou independente, até agora sempre me deixei levar pelo vento.

Nas tuas redes sociais, falaste sobre reaproximação com o calor humano e o público. Foi por isso que escolheste o Salão Brazil? Também. A minha música leva para isso e procu­ ra espaços destes. Eu sempre disse que quando faço isto, não faço para festivais nem para multidões, é sempre para meia dúzia de almas tristes.

concerto, ter as pessoas à minha beira. Então a ideia foi esta: escolher três salas relativamente pequenas. E o Salão Brazil pareceu-me fazer todo o sentido. Gosto da ligação que se cria com o público.

Para além de músico és também jurista. Como ­descreves esse percurso?

O Direito, infelizmente, ainda não foi embora, mas a passagem foi natural. Sempre toquei, mas nunca nada de sério. Muito mais tarde é que decidi começar a gravar. Já tinha 27 anos quando isso acon­ teceu. Foi num momento triste de jurista, quando tens uma pilha de papéis, e dizes “nunca mais aqui volto”. E realmente nunca mais voltei.

Continuas a fazer aconselhamento jurídico a artistas. Como é que surgiu essa forma de conciliar os dois mundos?

O concerto de Coimbra abriu a “trilogia”, que segue em Naturalmente, porque o Direito é a minha formação e, embora não queira ser um advogado de escritório, Lisboa e no Porto. Quais são as tuas expectativas? Que sejam momentos diferentes. Para além de músico, sou também espectador. Adoro este tipo de concertos, porque estou farto dos grandes pal­ cos, com 30 mil pessoas a gritar. Eu gosto é de sen­ tir o artista, assim como gosto de, quando dou um

não me consigo desligar por inteiro. Acabei por me envolver com a Gestão dos Direitos dos Artistas, o que significa que falo mais ou menos a mesma linguagem que quem lá vai pedir aconse­ lhamento.­

Quais são as tuas motivações para escrever música?

Eu faço canções como quem conversa no fim do dia em casa. Vou escrevendo e transpondo ideias. Quero sempre passar uma mensagem. Quem es­ creve uma canção sem transmitir uma mensagem não faz uma canção. “Inverno” é melancólico. Es­ tava triste na altura e parecia que o mundo se tinha esquecido de mim. “Mediterrâneo” já é um bo­ cadinho de luz. O álbum transmite a ideia de que já não espero muita coisa, só uma varanda pequenina onde eu não me chateasse muito.

Já tocaste para o público de Eddie Vedder, em Amesterdão com o Glenn Hansard. Como foi essa experiência?

Foi completamente inusitada. Eu organizo um festival de cantautores, e consegui contratar o Glenn Hansard. Produzi esse concerto, que foi memorável, e fiquei amigo dele. Entretanto, ele ia tocar com Eddie Vedder nessas datas em Amester­ dão. Fui ter com ele, passámos uns dias juntos e, numa das noites, ele chamou-me para cantar. Foi ­d iferente. Ainda por mais, fora do nosso contexto. Estava a cantar para cinco mil pessoas que estavam à espera do Eddie Vedder, e cantei uma música em português que ninguém conhecia. Foi um choque incrível de realidades.

Achas que uma maior visibilidade podia acabar com o teu processo criativo?

Pode acontecer. Pensando na indústria, podiam pedir para fazer músicas mais apelativas, para as pessoas ouvirem na rádio pela manhã ou dançarem. Eu não consigo fazer isso. Ou melhor, consigo, mas não sou eu. Tenho a sensação, quando olho para as grandes rádios do nosso país, que não querem músicas muito melancólicas.

Tens um projeto em execução para 2020, não é?

“Quem escreve uma canção sem ­­t ransmitir uma mensagem não faz uma canção”

Sim. Fiz três ou quatro temas bastante alegres e fiquei contente e satisfeito. Passado um tempo, ao ouvir de novo, pensei que aquilo não era bem a minha cena, então meti de parte. Não quero ­fazer um disco, mesmo que bom, que não saiba ­d efender. Mas vai sair no início do ano qualquer coisa, um ‘single’. Quero contar tudo, sem filtros. [As pessoas] dizem: “prometo ser melhor para o ano”. Mas vou ser o quê? Vou ser melhor como? A fazer o quê? Vou ser o melhor para mim, mas não para os ­outros. É uma autorreflexão, é esse perder de filtro.

Então já tem título?

“Prometo ser melhor no ano novo”. É triste, muito triste.

“Prometo ser melhor no ano novo” pretende ser uma continuidade ou um começar de novo?

GABRIEL REZENDE

Não sei se é seguimento, acho que cheguei a uma idade em que perdi o filtro. Agora digo tudo o que me dá na cabeça. Conto tudo, se gosto ou não. E não me impor­ to com as reações. Apetece mandar passear a diplomacia toda encapota­ da que leio hoje em dia, em que toda a gente é dona da razão. Para seres politicamente correto, tens de per­ der a tua opinião. Estamos numa democracia sem opinião. Toda a gente fala de tudo, mas temos de estar todos naquela linha.


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Degradação das secções culturais mantém-se na AAC Estruturas com queixas recorrentes reivindicam mais fundos e melhorias dos espaços. DG/AAC continua a procurar soluções para obstáculos enraizados - POR TOMÁS BARROS, JOÃO ANTÓNIO GAMA E SIMÃO MOURA -

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uase três anos desde o último balanço, os pedidos das secções mantêm-se idênticos. Grupos reclamam de infraestruturas que põem em causa as atividades, carência de associados e falta de verbas. Secções exprimem que a divulgação por parte da Direção-Geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC) é insuficiente.

“Vivemos ali num sítio inóspito”

O presidente da Secção de Astronomia, Astro­ física e Astronáutica da AAC (SAC), Henrique Neves, declarou que o “sítio inóspito” atribuído pela DG/AAC à secção “está ao abandono” e não tem condições higiénicas. Este sentimento de re­ volta não se cinge a esta estrutura. O presidente da Televisão da AAC (tvAAC), António Cerca, r­ efere que chove no interior do espaço. “Não há uma limpeza assídua feita durante a semana ao local”, enuncia o presidente.

Já a Secção de Fotografia da AAC (SFotografia/ AAC), não detém nenhuma sala na sede da AAC há alguns anos, apesar de a DG/AAC de Alexandre Amado o ter prometido. “Ficou a promessa de ou­ tro espaço, mas até agora não foi possível”, afirma Paulo Abrantes, um dos associados fundadores da secção. Este problema evidencia, segundo o antigo dirigente da SFotografia/AAC, a distância que se tem sentido entre estudantes e a cultura na casa. Da mesma maneira, a Secção de Jornalismo da AAC (SJ/AAC) sofre da falta de espaço. Margarida Mota, antiga presidente da SJ/AAC, explica que “o espaço tem deficiências” e que “há salas pequenas que precisam de ser demolidas ou reorganizadas”. Adianta ainda que se conversou sobre a possibi­ lidade de um local de arrumos para arquivos da secção, até hoje inexistente, visto que a sala atual tem uso diário. “No que toca à Cultura, a DG/AAC devia ser um elemento que une todas as secções, mas acaba por não fazer a ponte”, considera o presidente da Rádio Universidade de Coimbra (RUC), Miguel Santos. Acrescenta que a divulgação da casa devia ter outra ênfase no início do ano letivo, no âmbito de captar a atenção dos estudantes.

Secções sem apoio para atrair estudantes Todas as secções culturais relatam falta de ­apoio da parte da DG/AAC na atração de associados, como também é o caso da Secção de Fado da AAC (SF/ AAC). O vice-presidente da SF/AAC, Carlos Pinho, declara que o apoio providenciado pela DG/AAC no início do ano letivo, no que toca à atração de pos­ síveis associados, é quase inexistente. A Secção de Defesa dos Direitos Humanos da AAC encontra-se numa situação semelhante. A presidente, Luíza Rocha, afirma que “houve uma melhoria de comunicação entre a DG/AAC e as secções, mas ainda falta muito apoio”. Reitera que os atuais dirigentes “tiveram boas ideias, mas pou­ ca concretização” e menciona a “sempre delicada” questão do financiamento. Muitas secções reclamam por mais verbas, en­ quanto outras queixam-se do método irregular com que são executados os pagamentos. Este é o caso da Secção Filatélica da AAC e do Centro de Estudos Cinematográficos da AAC, que ainda reivindicam valores do ano passado. Na situação da RUC, ­Miguel­ Santos confessa que o financiamento “cobre um décimo daquilo que é necessário”. À volta da problemática do financiamento, o presidente da tvAAC conta que a secção teve de comprar, ainda este ano, uma câmara no valor de 1300 euros, dos quais apenas 170 euros oriundos da DG/AAC. A Secção Experimental de Yoga da AAC exprime também algum desagrado, visto que o orçamento não chega para adquirir mais material e dinamizar a organização.

Algumas secções viram-se obrigadas a procurar em outros sítios apoio financeiro, caso da Secção de Escrita e Leitura da AAC (SESLA). O presi­­den­ te­­, Pedro Vaz, afirma que “há estabilidade através de financiamentos da DG/AAC, mas também de recur­ sos de organizações independentes”. Pedro Vaz aponta o número de associados como outra situação delicada. O presidente constata que é comum o número de estudantes diminuir ao longo do ano, o que impossibilita a formação de uma di­ reção segundo os Estatutos da AAC. “É muito com­ plicado montar uma lista com 12 pessoas”, explicou o presidente da SESLA.

Entretanto, a falta de seccionistas atinge o ­ utras proporções com a Secção de Gastronomia da AAC e com o Centro de Informática da AAC, que se encontram sob tutela da DG/AAC, sem solução à vista. Ambas as estruturas se encontram sem presidência há mais de um ano devido à falta de ativos para formar uma lista candidata à direção.

O que diz a DG/AAC

Em resposta a estes problemas, o vice-­ presidente para a Cultura da DG/AAC, João Figueiredo, referiu que algumas providências já estão a ser tomadas. Em relação à tvAAC, revelou que a Direção-Geral já entrou em contacto com um arquiteto, porém está ain­ da à espera de um orçamento para as obras. Quanto à SAC, ­r econhece o estado deplorável do ambiente em que se reúnem e vinca que vai ser travada uma “luta interna” pela revisão do regulamento dos espaços. No que toca ao apoio e à divulgação, o vice-presidente da DG/AAC assume uma pos­ tura diferente e explica que a culpa não re­ cai sobre o órgão gerente. Menciona que as secções têm quota-parte na responsabilidade da fraca adesão às atividades culturais. “Du­ rante a Semana C ­ ultural, todos os caloiros re­ ceberam ‘flyers’, mas faltou as secções divul­ garem os eventos nas redes sociais”, justifica. Como apurou o Jornal A Cabra, a DG/AAC apenas anunciou a Receção Cultural, organi­ zada nos jardins da AAC, um dia antes de o evento decorrer. A nível financeiro, João Figueiredo realça que tanto a Queima das Fitas como a Festa das La­ tas e Imposição de Insígnias geravam muito mais ­d inheiro em anos anteriores, apesar de a última festa académica de 2019 ter tido superávit. Uma das explicações, segundo João Figueiredo, é o au­ mento da concorrência com festas académicas no Porto e em Lisboa. O vice-presidente da DG/ AAC não garante uma solução para o problema, mas aponta que as soluções têm passado pela contratação de artistas de menor expressão e pelo maior foco na cultura da casa.


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Liga Académica tem pernas para andar JUC procuram integração com base na prática desportiva. Daniel Azenha acredita que edição passada deixa boas perspetivas para a que começa agora

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romovidos pelo Gabinete do Desporto da Universidade de Coimbra (GDUC) e com a colaboração da Direção-Geral da Associação Académica de Coimbra (DG/AAC), os Jogos Uni­ versitários de Coimbra (JUC) estão de volta. Se­ gundo o presidente da DG/AAC, Daniel Azenha, o objetivo por trás desta iniciativa é “proporcio­ nar aos estudantes a prática desportiva” sem notar a “condição financeira ou física”. Com vista à integração de todos na prática da atividade física, os JUC dividiram a iniciativa em

MARTA EMAUZ SILVA

- POR XAVIER SOARES -

quatro ligas distintas. A Liga Académica, disputa­ da por estudantes; a Liga Alumni, destinada a antigos alunos da universidade; a Liga Minerva, reservada a docentes, investigadores doutorados e não docentes; e a Liga 2I’s, constituída por ele­ mentos das empresas que colaboram ou são par­ ceiras da UC. Na Liga Académica, estudantes da UC compe­ tem em diferentes modalidades e, desta vez, os núcleos juntam-se à competição. Daniel Azenha considera que este é um passo fundamental para “chegar a todos os estudantes”. Aproveitar o que vinha a ser feito pelos núcleos através da organização de competições internas é o que está na origem da primeira fase da com­ petição. Este ano, a prova inicia-se com uma fase intra-núcleos, ao contrário do ano transato em que “as equipas de todas as faculdades se podiam inscrever e começavam todas a competir numa mesma fase”, explica a representante do GDUC, Filipa Godinho. Apurados os vencedores da fase primária, dáse a fase inter-núcleos, competição para facul­ dades com dois ou mais núcleos de estudantes. Terminada esta etapa, segue-se a fase final, onde são apurados os campeões da Liga Académica nos vários desportos.

Ainda que seja composta por dez modalidades, a competição “continua a ter no futebol de sete, no voleibol e no futsal a maior adesão”, confessa Filipa Godinho. Os desportos podem ser disputa­ dos de forma individual ou coletiva. O ‘feedback’ positivo da edição passada per­ mite antever um resultado positivo para a edição 2019/2020, considera o presidente da DG/AAC. “O ano passado tivemos mil estudantes e este ano queremos aumentar a participação”. Segundo o mesmo, tal é “um alerta da academia para a comu­ nidade estudantil” sobre a importância de prati­ car desporto e atividades extracurriculares. Às dez modalidades já existentes, o GDUC pre­ tende juntar mais, num futuro próximo. Como afirma Filipa Godinho, “tentar abranger o máxi­ mo de gostos do público-alvo é fundamental para envolver o maior número de estudantes possível”. Com o objetivo de tornar a prática desporti­ va transversal a todos, Daniel Azenha revela que a aposta numa liga de desporto adaptado é um plano para o futuro. O presidente da DG/AAC ­r evelou ainda que está reservada para dezembro “a criação da Secção de Boccia”, com o intuito de “colmatar aquilo que tem sido uma falha da AAC ao longo dos tempos”.

Pró-Secção de Futsal anda com a casa às costas Pavilhão Eng. Jorge Anjinho sem condições para a prática de futsal. Apostar e valorizar os jovens da formação é uma das bandeiras do projeto - POR FRANCISCO BARATA E PEDRO TEIXEIRA SILVA -

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Pró-Secção de Futsal encontra-se sem casa. O Pavilhão Eng. Jorge Anjinho foi gravemente danificado na sequência da tempestade ‘Leslie’, que aconteceu no dia 13 de outubro de 2018. O recinto havia sido requalificado para os European Universities Games 2018 (EUG 2018) e encontrava-se em ótimas condições para se tornar a “fortaleza” dos estudantes. A ausência de um espaço físico, onde a equipa possa treinar e jogar, tem dificultado o funcionamento da prósecção. A equipa não conta com nenhum patrocinador, nem com qualquer tipo de apoio. O presidente, Pedro Simões, explica que a principal fonte de rendimento são “as mensalidades pagas pelos atletas”. A direção já tinha projetado possíveis patrocínios, mas sem casa própria, “a obtenção de patrocinadores torna-se mais difícil”, adianta. Um ano após os estragos provocados pela tempesta­ de ‘Leslie’ no Pavilhão Eng. Jorge Anjinho, a Câmara Municipal de Coimbra disponibilizou à Associação Académica de Coimbra/Organismo Autónomo de Fu­ tebol (AAC/OAF) 221 mil euros em verbas para a repa­ ração do espaço. O assessor de imprensa da AAC/OAF, Paulo Rodrigues, confirma que as obras vão ter início até ao final do mês de novembro, apesar da possibili­ dade de a data prevista ser alterada caso as condições meteorológicas não sejam favoráveis. A Pró-Secção de Futsal tem como objetivo passar a ser uma secção. Pedro Simões destaca que, por ainda se­

rem uma pró-secção, não têm autonomia nem recebem qualquer tipo de verba da Direção-Geral da AAC, nem do Conselho Desportivo da AAC. O t­ reinador da equi­ pa feminina universitária e federada, João Filipe, aponta que a passagem a secção seria muito positiva. Sónia Fer­ reira, jogadora, capitã e treinadora de vários escalões de formação, partilha a mesma opinião. “A Universidade de Coimbra perdeu força”, afirma Pedro Simões. A pró-secção, através do futsal, procura “transmitir um gosto pela academia e criar raízes nos mais novos”, termina. A formação é um dos princi­ pais focos do projeto. João Filipe transmite a ideia de evolução e estabilidade desde a chegada da atual di­ reção. “Durante um fim de semana, são mais o número de vitórias do que derrotas”, conclui. No entender da di­ reção, as crianças devem, sobretudo, divertir-se a jogar e os resultados são secundários. No final da época passada, a pró-secção tinha 178 atletas. Na presente temporada, os estudantes contam com oito equipas de formação e três seniores – femi­ nina universitária e federada e masculina universitária. A equipa sénior masculina tem como maior conquista a medalha de bronze nos EUG 2018. Um dos princi­ pais objetivos passa pela ascensão da equipa feminina “à principal divisão do futsal nacional”, sublinha a capitã. O presidente explica que “o número de rapazes é bas­ tante superior ao de raparigas”. Segundo Pedro Simões, o

número de atletas do sexo feminino não ultrapassa as duas dezenas. No escalão sénior federado feminino, 75 por cen­ to das jogadoras são também estudantes universitárias. No entanto, o desejo da secção é que as equipas federada e uni­ versitária venham a ser constituídas pelo mesmo plantel. Nesta época, o objetivo passa por manter a estabilidade e oferecer condições de progressão, sobretudo, aos atletas mais jovens. A direção reiterou ainda o desejo de voltar ao Pavilhão Eng. Jorge Anjinho “o mais rápido possível”.

FOTOGRAFIA GENTILMENTE CEDIDA PELA PRÓ-SECÇÃO DE FUTSAL DA AAC


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Da Académica à Terra do Sol Nascente, ginasta tenta qualificação para as Olimpíadas 2020 Filha de treinadores de ginástica, Joana Abrantes cresceu rodeada pelo desporto. Talento conimbricense de 17 anos fala dos desafios para alcançar o seu maior sonho - POR JADE SANGLARD E LUÍSA TIBANA -

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abelos presos, olhos sempre atentos e sentada com postura, é como Joana se apresenta na sua segunda casa: a sala de ginástica. Com um grande histórico de con­ quistas, a atleta reflete com humildade so­ bre o seu percurso até agora e sobre o longo caminho que ainda tem pela frente. Foi na cidade de Coimbra que Joana começou a sua história. “Eu sou de cá, sempre vivi e trei­ nei aqui”, conta. Ginasta desde os dois anos de idade, Joana trabalha em busca da realização do seu maior sonho: representar Portugal nos Jo­ gos Olímpicos. Aos dez anos, após ter praticado todas as vertentes da modalidade, foi escolhi­ da para a ginástica de trampolins e começou a competir. Aos 17, treina entre oito a dez horas por semana e já participou em inúmeras com­ petições nacionais e internacionais. Joana sorri ao falar da importância da ati­ vidade física na sua vida. A atleta confessa que encontrou na ginástica um refúgio. “É onde eu desanuvio da escola, é o sítio que me faz bem e onde me sinto em casa”. Filha, irmã e afilhada de ginastas, não conteve o riso ao dizer que não teve escolha. Afirma não saber como seria a sua vida sem o desporto, mas imagina que lhe faltaria uma motivação, um propósito maior. Dedicar-se ao desporto re­ quer disciplina e organização, além de repre­ sentar sacrifícios. Mas Joana admite que “aca­ ba por compensar”. Saltar além Fronteiras Joana Abrantes já saltou nos trampolins de diversas cidades portuguesas.“Fiz muitos nacio­ nais porque, para ir ao campeonato do mundo ou ao europeu, temos de passar por apuramen­ tos onde são selecionadas as quatro melhores de cada escalão em Portugal”, explica. Deu início ao seu percurso como atleta in­ ternacional aos 12 anos, ao competir no seu primeiro campeonato do mundo na Flórida. No ano seguinte, foi à Dinamarca ter a segun­ da experiência no estrangeiro. Com 15 anos, a ginasta competiu na Bul­ gária, e, pela primeira vez, num campeonato da Europa, em Baku, no Azerbaijão. “Nesta ocasião, pude ver de perto a seleção nacional e tive a oportunidade de saltar com os me­ lhores da Europa”. Em 2018, foi na Rússia que saltou novamente a nível europeu. No mes­ mo ano, ganhou ainda o prémio revelação e, segundo informa, “não estava nada à espera porque era a mais nova e a única rapariga ali”. De acordo com Joana, ser apurada em campeonatos do mundo e da Europa e passar a elite permitiu-lhe receber o estatuto de alto rendimento, que conta ser o seu “maior orgu­ lho”. A ginasta partilha o gosto “pelo momento em que uma série ou uma competição corre na perfeição” e em que sente que conseguiu “al­ cançar tudo aquilo” para que trabalhou. “Quando represento Portugal, é como se tivesse uma responsabilidade maior, então quero dar o

meu melhor e espero que, naqueles 16 segundos de série, corra tudo bem”, declara a atleta.

UEG IMAGES

Tóquio não parece tão longe em 2020 Joana Abrantes sempre acompanhou os Jo­ gos Olímpicos e viu ali inspiração para treinar. “Assistir às provas dos outros atletas permite detetar erros e ficar contente por quem ganha”. Para a ginasta, esta competição “represen­ ta outro patamar, onde muitos não conse­g uem chegar” e, portanto, “seria muito especial par­ ticipar”. O que deixa a atleta mais ansiosa pe­ rante a possibilidade de fazer parte dos Jogos Olímpicos de 2020 é poder vir a “estar na pre­ sença dos melhores de sempre e aprender com eles”. Para além disso, Joana gostaria de ter a oportunidade de mostrar as suas séries e os seus melhores saltos. Segundo a atleta, o apuramento para esta competição vai ser “muito difícil, por ser tão nova e por competir com pessoas muito mais velhas”. “Ainda há um longo caminho a per­ correr, mas espero estar em forma e que os apuramentos sejam bons”, afirma. Conta que já tem os olhos postos nos Jogos Olímpicos de 2024, em Paris, e garante que pretende com­ petir aí: “se não for em 2020, vai ser, com cer­ teza, nos próximos”. Nos próximos anos, Joana Abrantes pre­ tende aumentar a dificuldade nas séries, trei­ nos e provas. “Quero conseguir passar a elite sénior, e, quem sabe, entrar na Seleção Nacio­ nal”, diz a atleta. Acredita que ainda vai treinar por muitos anos. “Vou saltar durante a facul­ dade, talvez até depois”, desenvolve a jovem. Com ambição, sonha participar em “Taças do Mundo por Portugal e estar entre as quatro melhores do país”. Para além da possível participação em Tóquio, a agenda da atleta já está repleta de competições que se aproximam. Primeiro, os jogos distritais em Coimbra e, depois, os na­ cionais. “De seguida, vou ter alguns estágios, talvez em Itália para participar num torneio internacional, onde vamos ter a oportuni­ dade de ver a Taça do Mundo”, antecipa. Joana vai participar ainda no World Cup Coimbra Gym Fest, um torneio internacio­ nal que também vai incluir a Taça do Mundo. “Acho que vai ser muito engraçado trazer os estrangeiros todos para Coimbra”, diz entre leves gargalhadas. A atleta reflete sobre a possibilidade de, no futuro, ser treinadora de ginástica, como os pais, ou juíza. Entre os dois, dá preferência ao trabalho de treinadora, pois vê na profissão uma forma de estar perto do desporto. “Gos­ taria de transmitir o mesmo que os meus trei­ nadores me transmitem”, revela. Se pudesse escolher um conselho para dar às praticantes mais jovens que pensam em entrar na modalidade, Joana Abrantes di­ ria: “nunca desistam da ginástica, porque é a melhor coisa de sempre”.


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Coimbra através do vidro do autocarro Um dia na vida daqueles que transportam histórias nos autocarros públicos da cidade. Três motoristas SMTUC revelam que não se sentem valorizados, mas não escondem a verdade por trás das queixas dos utentes - TEXTO E FOTOGRAFIAS POR MARIA SALVADOR -

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inda é de noite. São poucos os carros que circulam nesta madrugada e as lojas estão fechadas. As ruas onde há apenas umas horas se cru­ zavam turistas e estudantes estão agora desertas. É este o cenário com o qual Carlos Cristina se depara ao sair de casa para trabalhar. Esta semana entra ao serviço às 5h15. No caminho até às instalações da fir­ ma, na Avenida da Guarda Inglesa, não vê ninguém nas ruas. A cidade parece estar ainda adormecida, mas sabe que são muitas as pessoas que dependem de transporte para chegar ao emprego. Quando che­ ga, recolhe o horário de serviço e dirige-se à viatura que será o seu posto de trabalho nas próximas cinco horas. O autocarro está gelado. Por enquanto não há calor humano e a viatura velha deixa entrar o frio da alvorada. O motorista da rede de Serviços Mu­ nicipalizados de Transportes Urbanos de Coimbra (SMTUC) conta que já transporta passageiros pela cidade há 26 anos. O autocarro arranca e o motorista rapidamente deixa de estar sozinho. Muitos citadinos aguardam a pequena viatura na primeira paragem. Uns mais ­jovens que outros, esperam a boleia para começarem também o dia. Um homem de meia idade faz sinal ao condutor e uma fila começa a formar-se. As por­ tas abrem com ruído e as pessoas entram com pressa. Talvez por estarem muito concentrados na própria vida, são poucos os utentes que cumprimentam o homem por trás do volante. Carlos não parece abor­ recido. Revela que já está habituado à falta de cordial­ idade de alguns passageiros. “Muitas pessoas entram no autocarro e nem olham para o motorista”, ­lamenta. A viatura outrora em silêncio ganha agora vida com as conversas dos passageiros que o ocupam na totalidade. A escolha de lugar não é fácil. Virgínia

Frade, que ainda se desloca pelo estreito corredor interior quando o motorista arranca, é apanhada de surpresa por um solavanco brusco. É utente dos SMTUC há mais de 40 anos e explica que é muito comum os autocarros da manhã transitarem com ex­ cesso de viajantes. “Já cheguei atrasada ao emprego porque o autocarro estava muito cheio e o condutor recusou-se a levar-me”, revela. São muitos os utiliza­ dores da rede que se queixam da falta de simpatia dos motoristas dos SMTUC. Rita Rouxinol, estudante do Mestrado Integrado em Psicologia na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, declara já ter assistido a discussões en­ tre condutores e passageiros. O próprio motorista concorda com os utentes. “Há condutores muito cas­ murros”, admite. O outro lado da mesma história Na pequena sala de convívio das instalações dos SMTUC, as paredes azuis combinam com as cami­ sas dos poucos motoristas que ali descansam entre turnos. Uma pequena televisão transmite as notícias da tarde, mas é a ler o jornal que João Marmeleiro se entretém depois de almoço. Hoje fez o turno da ma­ nhã, mas a profissão não permite refeições no tempo certo e só às 16 horas teve um intervalo. Fecha e do­ bra o jornal enquanto conta que conduz os autocar­ ros da rede há 22 anos. Fá-lo pela paixão que sente à condução, mas não esconde que o ofício exige “uma boa dose de paciência”. A expressão no rosto mostra o cansaço e a tristeza com a profissão. “É raro o dia em que não tenho passageiros mal-educados”. Revela que pensa no assunto e tem uma teoria para explicar o problema. “É da crise económica que obrigou os portugueses a abdicar do carro particular. Quando

“Se os passa­ geiros soubessem as condições dos autocarros, não andavam neles” entram num transporte público vêm revoltados e quem paga é o motorista”, explica. Quebra-se a concentração pela entrada de um colega. Entre cumprimentos e risos, Carlos Fontes senta-se enquanto espera a hora de entrar ao serviço. João Marmeleiro faz uma longa pausa antes de recu­ perar o pensamento anterior. Diz que há uma frase que todos os motoristas estão habituados a ouvir: “se eu não pagar, você não tem trabalho”. “Para mim, é o reflexo da falta de consideração que o público em geral tem por nós”, acrescenta. Carlos Fontes, que já conduz transportes públicos há 21 anos, abana a cabeça em concordância com as palavras de João. Junta-se à conversa. “As pessoas, hoje em dia, não dão muito valor a quem desempenha o trabalho, só querem ser servidas”. Ambos concordam que, por vezes, as condições oferecidas a quem viaja nos auto­ carros da rede SMTUC não são as melhores, mas “a culpa não é do motorista”. A ideia de que os autocarros que circulam pela cidade não têm, há muito, condições para servir a população, é partilhada por utilizadores e motoris­ tas. Virgínia Frade queixa-se que as viaturas se estão a deteriorar de dia para dia. “É quase preciso usar guarda chuva quando se viaja porque no inverno costuma chover lá dentro”, ilustra. Segundo Carlos Cristina, “se os passageiros soubessem as condições dos autocarros não viajavam neles”. O motorista ga­ rante ainda que a falta de travões e questões elétri­ cas mal resolvidas são problemas da frota. O seu colega, João Marmeleiro, apoia. “As manutenções ficam muito aquém do necessário porque os nossos mecânicos não têm formação nem equipamentos adequados para mexer nos autocarros”. Combinadas com o desgaste dos quilómetros, estas são situações que deixam os motoristas com a constante sensação de falta de segurança no trabalho. Greves que param a cidade, mas não re­ solvem problemas Sobre os ombros dos condutores de transportes públicos pesa, todos os dias, a responsabilidade de zelar pela segurança dos passageiros. É em nome de todos os motoristas que João Marmeleiro afirma que a profissão é “um trabalho de risco”. Ainda as­ sim, esta característica não é reconhecida. Conta que quando começou a trabalhar na rede SMTUC “havia a vantagem de subir de escalão de quatro em qua­ tro anos”. Hoje, já não é assim. O governo português congelou as carreiras destes condutores que viram também ser-lhes diminuído o estatuto profissional. Carlos Fontes considera que “passar de agente úni­


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co a assistente operacional desvalorizou ainda mais o trabalho”. A ganhar salários baixos em relação aos mesmos profissionais de outros países europeus, os motoristas portugueses não sentem que o seu tra­ balho é devidamente recompensado. A juntar ao preço da carta de condução de pesados, é necessário um conjunto de formações pagas pelos próprios. Para Carlos Cristina está claro que não compensa investir na profissão para receber o ordenado mínimo nacio­ nal no fim de cada mês. O reconhecimento na carreira é o motivo de ­destaque de muitas das várias greves de motoristas SMTUC convocadas ao longo do ano. No entanto, outras situações são também alvo de reivindicação. João Marmeleiro explica que os horários de trabalho são difíceis. “É bastante desgastante conduzir duran­ te cinco horas seguidas”. Para cumprir estes turnos, quem está por trás do volante tem ainda de exceder o

tempo de serviço, não sendo remunerado por horas extra. A falta de comunicação entre os motoristas e os corpos gerentes da empresa é outra razão de pro­ testo. Considera ainda que “deviam pedir a opinião dos trabalhadores para questões como a aquisição de novos veículos ou a definição dos percursos. Nós é que conhecemos o terreno”. Segundo Rita Rouxinol, os motoristas têm o direito de fazer greves. No entan­ to, afirma que lhe incomoda a falta de aviso prévio. “Tomo conhecimento das greves muito em cima da hora e torna-se complicado organizar o dia. Acho que os utilizadores devem ser informados”, defende. Autocarros com asas procuram-se Horas mais tarde, Carlos Fontes percorre as ruas de Coimbra em serviço. Conduz a linha 24 no sen­ tido Arnado - Bairro Norton de Matos. Ao longo de tantos anos de trabalho já guiou todas as linhas

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e percorreu toda a cidade de autocarro. Na paragem “Praça da República” o ambiente está agitado. Tro­ cam-se conversas e olhares nervosos entre o relógio e a tabela dos horários. Maria Santos aguarda a viatura para voltar a casa depois de um dia de trabalho. Para seu alívio, já é possível ver ao longe o veículo amarelo e branco que sobe a Avenida Sá da Bandeira mistura­ do com os outros carros. Uma senhora já de idade entra com o auxílio de uma bengala. No interior, ra­ lha com o motorista que tenta, sem sucesso, explicar o motivo do atraso. Segundo Carlos Cristina, cumprir os horários “é impossível, os autocarros não têm asas”. O motoris­ ta culpa a administração da empresa SMTUC pelos frequentes atrasos das viaturas, “que não permitem servir os utentes como deve ser”. “Prefiro que o au­ tocarro chegue tarde, porque para o evitar tenho de desrespeitar o código da estrada e pôr em risco os passageiros”. A completa desadequação dos inter­ valos de tempo atribuídos às viagens é sentida todos os dias pelos condutores. “Muitos horários vigoram há 20 ou 30 anos. O trânsito da cidade mudou muito desde essa altura”, informa João Marmeleiro. Os dois colegas partilham a opinião de que a falta de corre­ dores ‘bus’, exclusivos aos transportes públicos, e os pisos em paralelos dificultam a circulação das viatu­ ras que muitas vezes não conseguem cumprir o tem­ po estipulado para cada percurso. Dentro do autocarro viaja uma jovem em cadeira de rodas. Teve a sorte de apanhar uma das 18 viatu­ ras adaptadas a passageiros com deficiência. Moto­ ristas e utilizadores concordam que não é fácil para pessoas com mobilidade reduzida deslocarem-se de transportes públicos em Coimbra. “Os autocarros mais velhos ainda têm degraus e, assim, torna-se im­ possível servir”, explica o condutor. As viaturas mais recentes vêm já equipadas com rampas manuais, mas obrigam o motorista a realizar uma série de proce­ dimentos demorados para que estes utentes possam viajar. No entanto, Carlos Cristina relembra que a empresa SMTUC tem um serviço exclusivo para pes­ soas com deficiência. No corredor interior da viatura o espaço é escasso. Debaixo dos pés de quem o percorre, o chão cin­zento revela as marcas da presença das várias pessoas que já transportou. O motorista relembra que “o mais im­ portante é chegar ao fim do dia e ter a consciência de que fizemos um bom trabalho”. E é com esta espe­ rança que o autocarro segue viagem.


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Carbono 0 - Universidade 1: UC na corrida à neutralidade carbónica “Devemos trabalhar no sentido da prevenção e não no sentido da adaptação”, alerta o reitor. Reivindicação e esforço pró-ativo dos estudantes são essenciais para mudança - POR ANTÓNIA FORTUNATO E HUGO GUÍMARO -

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eliminação da carne de vaca da ementa das cantinas da Universidade de Coimbra (UC) gerou discussão em setembro deste ano. Mas esta é apenas uma das várias medidas implementadas para a UC atingir a neutralidade carbónica até 2030. A neu­ tralidade carbónica consiste em igualar os níveis de emissão de carbono aos níveis da sua eliminação, ex­ plica a coordenadora do Centro de Ecologia Funcional (CFE) da UC, Helena Freitas. O dióxido de carbono é o principal gás causador de efeito estufa e o mais fácil de eliminar, sobretudo através da redução no consumo de ­combustíveis fósseis. O reitor da UC, Amílcar Falcão, destaca as estraté­ gias que estão a ser executadas: a substituição dos plásti­ cos, a atualização de eletrodomésticos nas residências universitárias para modelos mais eficientes e a substi­ tuição das lâmpadas para LED. Além destas medidas mais recentes, a UC já tinha começado a controlar o desperdício alimentar e a instalar painéis fotovoltaicos. De acordo com o reitor da UC “não se está a inventar a roda”. Este tipo de iniciativas já foi implementado por outras universidades, como a University of Cambridge e a University College London. Desde há quatro anos que a UC utiliza como guia os

indicadores do ‘Green Metric’, o que, segundo Amíl­ car Falcão, reflete a “preocupação da universidade em monitorizar as emissões de carbono e reduzi-las”. ‘Green Metric’ é um ‘ranking’ que contabiliza a sus­ tentabilidade ambiental das universidades. Os critéri­ os de avaliação procuram compreender como as in­ fraestruturas, o desperdício, a utilização de água e energia, o sistema de transportes e o investimento na educação e investigação da sustentabilidade afetam a pegada ecológica das instituições. A maior barreira da neutralidade carbónica vai ser, para Helena Freitas, a fragmentação da universidade. A coordenadora explica que “a existência de polos muito separados, sem um sistema de mobilidade adequado, resulta num consumo elevado de com­ bustíveis”. O reitor revela ainda que a UC conta com a colaboração da Câmara Municipal de Coimbra para a reordenação do tráfego automóvel e a introdução de transportes elétricos. A coordenadora do CFE alerta para a necessidade de ponderação na velocidade das medidas toma­ das. “Não podemos pensar numa transição rápida da economia sem pensar no bem-estar das pessoas”. Res­ salva, no entanto, que “os consumidores têm de fazer

a diferença e o mais importante é transitar para uma economia que prioriza os valores da ecologia”. Amílcar Falcão chama também a atenção para a urgência em agir. “Se, até 2030, as agressões ao meio ambiente não forem revertidas, vai ser preciso tra­ balhar no sentido da adaptação”, relembra. Na opi­nião de ­­Helena Freitas, embora a neutralidade carbóni­ ca seja difícil de atingir, é importante definir metas. Acrescenta que a “comunidade estudantil é determi­ nante”, seja a­ través da redução da pegada ecológica, no dia-a-dia, seja pela reivindicação que “incentiva os pares a fazer o mesmo”. De forma semelhante, o reitor defende que “a onda do combate às alterações climáti­ cas é impulsionada pelos jovens e as universidades de­ vem dar o exemplo”. A neutralidade carbónica, apesar de preponderan­ te, não é o único fator que deve ser tido em conta na questão da pegada ecológica, alerta Helena Freitas. “É também importante eliminar a poluição das águas e dos solos e prevenir a diminuição da biodiversidade”, recorda. Para envolver a população, a coordenadora do CFE sugere uma contagem decrescente para a meta. “A transparência e a participação coletiva são fundamen­ tais para a nova agenda ecológica”, conclui.

Medicina alternativa ou pseudociência? Especialistas discordam quanto aos benefícios da medicina não convencional. Falta de informação na sociedade é ponto comum na discussão entre bioquímico e fisioterapeuta - POR JOANA CARVALHO E BEATRIZ MOTA -

Imitação” e “falsificação” são termos que Da­ vid Marçal, bioquímico do RÓMULO - Centro Ciência Viva da Universidade de Coimbra, usa para ­descrever as terapias de medicina não convencional ou alternativa. O especialista insere estes métodos no con­ ceito de pseudociência, que define como “um conjunto de práticas ou teorias que se apresentam como ciência, mas que não o são”. Por outro lado, a gerente da Naturclinic, Mar­ ta ­Amaro, fisioterapeuta e osteopata, defende estas práticas. As terapias alternativas “permitem dar uma ­melhor qualidade de saúde ao paciente que as procu­ ra”, quer seja a nível preventivo quer no tratamento de alguma doença, revela. Exemplo destes procedimentos são a osteopa­ tia, a acupuntura e a naturopatia que, segun­ do a ­­especial­­­­­­­­­­­­ista­­­­­­­­­­­­­­, são os mais procurados na Naturclinic. “A naturopatia ba­

JOANA CARVALHO

seia-se em tratar o corpo de forma mais natural”, esclarece. A acupuntura está inserida na medicina tradicional chine­ sa e “tem princípios muito diferentes da nossa medicina”, conta Marta Amaro. No entanto, David Marçal aponta para possíveis perigos de algumas das alternativas à medicina convencional. A principal razão é o facto de as pessoas “tomarem decisões médicas erradas e prejudiciais, enganadas pela pseudo­ ciência”. O exemplo que mais menciona é a homeopatia e os respetivos remédios que, na opinião do ­cientista, “são placebos espetaculares e resumem-se a água com açúcar”. De acordo com o bioquímico, “os homeopatas não po­ dem ser honestos porque senão não têm clientes”. Uma crítica da comunidade científica é o “discurso manipula­ dor por parte dos profissionais da área” que, no parecer de David Marçal, se apoiam “em argumentos de ‘­marketing’ e manipulação política”. A principal defesa dos terapeutas das medicinas alternativas é a creden­ ciação dos seus profissio­nais do setor. Marta ­ Amaro explica que, quan­ to mais se destaca a vertente científi­ ca ­ destas práticas, mais cre­dibilidade ­ganham. “Quan­ do vê resul­

tados, a comunidade científica começa a acreditar­­­e fica sem argumentos”, declara. O único aspeto em que os especialistas concordam é a existência de desinformação na sociedade em relação à medicina não convencional. A osteopata vê na falta de conhecimento o motivo pelo qual as pes­ soas não aderem a estes tratamentos. Por outro lado, David Marçal argumenta que a desinformação e a “falta de cultura científica” levam as pessoas a recor­ rerem a estes procedimentos. Porém, o cientista não culpabiliza apenas as pessoas, mas também “as instituições que as deviam proteger”. Acrescenta ainda que estas entidades têm aprovado várias leis que validam as terapias alternativas, como a atribuição de cédulas profissionais, passadas pela ­Administração Central do Sistema de Saúde. O bioquímico utiliza o caso do movimento antivacinas para expor aquilo que vê como contradições na legislação acerca deste assunto. “Temos de nos questionar quando é que essas organizações falam a sério: quando aconselham a vacinação ou quando passam certificados profissionais a praticantes de medicinas que não funcionam?”, reflete David Marçal. Nas palavras de Marta Amaro, o tratamento da dor, onde mente e corpo se aliam para que uma pessoa se sinta saudável, é o principal objetivo da ­Naturclinic.­­ No entanto, David Marçal ressalva que se houver benefícios associados às medicinas alternativas, “são muito residuais”.


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ciência & tecnologia 17

Jovens pouco ­informados ­sobre o apoio à saúde mental na UC

HUGO GUÍMARO

Encenação de conflitos em grupo auxilia saúde mental do jovem universitário. Cuidados médicos no campus facilitam acesso aos estudantes - POR CARINA COSTA E MAFALDA PEREIRA -

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ajuste à nova realidade que é o Ensino Supe­ rior é uma causa frequente de perturbações psicológicas nos universitários. A ansiedade é a mais comum e sucede a alteração das rotinas habituais. Segundo a psiquiatra responsável pela Consulta de Psiquiatria do Jovem Universitário da Universidade de Coimbra (UC), Sofia Morais, são vários os fatores de­ terminantes na saúde mental. “Mais de 80 por cento dos estudantes estão deslocados da sua terra natal, em adição aos ­problemas financeiros e a uma maior exigên­ cia académica pós Bolonha”, explica. Ao recorrer a este atendimento, o jovem é avaliado numa primeira consulta, de triagem. Sofia Morais expli­ ca que, “se for detetada uma patologia depressiva ligeira, este é direcionado para os serviços de psicologia. Se o cenário for mais grave, pode ser internado ou ter con­ sultas subespecializadas”. O diretor clínico dos serviços de saúde da UC, Antó­ nio Queirós, destaca uma terapia de grupo semanal baseada na dramatização. A iniciativa começou o ano passado e tem funcionado “muito bem”. O diretor es­ clarece que no psicodrama são teatralizadas situações de conflito que conduzem a uma discussão de grupo. Dentro das várias estratégias, a psiquiatra salienta a relevância da área preventiva e a capacidade de res­ posta aos estudantes. “A prevenção é muito mais im­ portante que o tratamento, uma vez que a tua no jovem ainda saudável”, reconhece. O objetivo é levar “o aluno a ­conhecer as suas emoções e aprender a regulá-las de forma autónoma, sem profissionais”, termina. De acordo com António Queirós, um dos principais obstáculos surge quando o jovem portador de doença mental é incapaz de reconhecer que precisa de acom­

panhamento. Para além desta barreira, o estigma cul­ tural mantém-se. “Se uma pessoa tiver uma amigdalite não tem nenhum problema em ir ao médico ou em di­ zer que tem a doença, mas quando se trata de uma de­ pressão é diferente”, ressalva o diretor. A psiquiatra alerta também para a necessidade de prestar atenção a alguns indícios de problemas mentais. Absentismo académico, alterações de apetite, intenção suicida, alterações no padrão de sono e um nível de an­ siedade que impeça a interação social são sintomas de doenças psiquiátricas. No entanto, Sofia Morais esclarece que os jovens mostram estar cada vez mais atentos à saúde mental dos colegas. Os estudantes de Psicologia e de Medicina acabam por servir como “porteiros sociais de referen­ ciação precoce dos pares”. A psiquiatra faz um apelo a toda a comunidade académica, para que, caso vejam alguém com dificuldades, o comuniquem o mais rápi­ do ­­possível.­ Sofia Morais constata que 59 por cento dos pacientes são raparigas. Não por existir uma maior prevalência, mas por estas “monitorizarem melhor os sintomas e procurarem ajuda mais cedo”, esclarece. “Na verdade, a patologia grave é mais frequente no sexo masculino”, revela a psiquiatra. O desconhecimento da existência deste tipo de serviços é apontado por António Queirós como outro inconveni­ ente. A especialista adiciona que os alunos internacionais valorizam muito o acesso aos cuidados de saúde da UC. “Estão mais informados que os estudantes nacionais, por não terem o Serviço Nacional de Saúde que Portugal tem”. O protocolo assinado em 2015, no Dia do Estu­ dante, entre a UC e o Centro Hospitalar e Universi­

tário de Coimbra, resultou na criação da Consulta do Jovem Universitário. Como explica a psiquiatra, este “alargou o acesso gratuito à saúde aos jovens oriundos de ­outras cidades”. O diretor clínico reforça que “faz sentido aproximar os cuidados de saúde especializa­ dos aos locais onde são precisos”. Para António Queirós, o facto de as consultas ­decorrerem no campus universitário deixa os jovens “mais à vontade”. Seguindo a mesma ideia, Sofia Mo­ rais sublinha que a existência de vários serviços no mesmo espaço não torna evidente o objetivo da con­ sulta. “Ninguém sabe para que especialidade uma pes­ soa vai, pois na sala de espera não há qualquer tipo de diferenciação”, elucida a psiquiatra. O contacto pode ser feito de forma presencial, por telefone ou através da plataforma ‘online’. No caso da Psicologia e da Psiquiatria, o ‘site’ não é opção, uma vez que “é necessário um maior controlo nestas especiali­ dades”, informa o diretor clínico. Acrescenta que se trata de uma tentativa de auxiliar de forma mais rápida os estudantes que procuram ajuda. O reitor da UC, Amílcar Falcão, reconhece a neces­ sidade de acesso a estes cuidados no meio universi­ tário. “A saúde mental e física e o conforto têm de estar interligados para que os estudantes tenham um bom rendimento escolar”, frisa. O cenário da saúde mental na UC não é diferente do de outras instituições, realça António Queirós. O esforço para responder às necessidades dos alunos tem tido retorno e, de um modo geral, “a resposta tem sido bastante positiva”. Para ter acesso a estes serviços, o jo­ vem “deve primeiro saber que existimos, dispor-se a vir e, por fim, aparecer nas consultas”, conclui o diretor.


18 cidade 12 de novembro 2019

Do respeito à diversidade sexual: projeto revela Cores Univers@s Gabinete de Apoio ao Estudante da FPCEUC oferece assistência psicológica à comunidade LGBTQI+. Iniciativa preenche lacuna ainda não alcançada pelo Estado - POR CAROLINA FERNANDES E GUSTAVO FREITAS -

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ortugal é um país vanguardista na implemen­ tação de leis que contemplem os dilemas da co­ munidade LGBTQI+. Desde 2011 que a mudança de nome é legalmente permitida, mas este continua a ser um processo não naturalizado. Um exemplo é Xavier, aluno da Faculdade de Letras da Universidade de Co­ imbra, que viu o pedido de mudança de nome negado pelo médico de família. O jovem em transição procurou ajuda no Gabi­ nete de Apoio ao Estudante (GAE) da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra (FPCEUC). Desde fevereiro, tem recebi­ do acompanhamento psicológico por meio do projeto Cores Univers@s, iniciativa do GAE, que oferece acon­ selhamento terapêutico nas questões de orientação sexual, identidade e expressão de género. Julieta Azevedo, uma das responsáveis pelo projeto, e também psicóloga, explica que o trabalho tem três ver­ tentes: psicológica, educativa e de investigação. “O objetivo é educar acerca de questões LGBTQI+ e, ao mesmo tempo, prestar apoio psicológico a pessoas que tenham problemas com a sexualidade”, explica. Ao nível da investigação, estão a ser discutidas ideias para a produção de materiais que possam servir de auxílio a trabalhos futuros. O projeto Cores Univers@s conta com sete profis­ sionais da educação e da psicologia e presta aten­ dimento sem custos. Xavier faz terapia e atividades práticas como ‘mindfulness’ com o programa. Segun­ do o estudante, “é importante para a comunidade estu­ dantil ter o apoio gratuito da faculdade visto que já se pagam propinas, casa e contas”.

RAQUEL GUIOMAR

Na vertente educativa, pretende-se que os alunos entendam a diferença entre o que é identidade e o que é o seu corpo, explica Julieta Azevedo. Os profissionais estão abertos a convites de escolas para auxiliar os re­ cursos humanos das instituições ou desenvolver ativi­ dades com os estudantes. A psicóloga considera este apoio importante, vis­ to que, na sua ótica, o governo português também é insuficiente na educação. “Penso que o Estado devia introduzir esta temática nos programas escolares. En­ quanto as crianças não ouvirem falar sobre isto, vão sentir-se invisíveis por não corresponderem ao padrão heterossexual”, defende. Xavier avalia o projeto como positivo, mas acre­ dita que pode ser feita uma melhor divulgação para que seja acessível a toda a gente. “Ainda não há muito ­conhecimento por parte da comunidade estudantil so­

bre o GAE. Falo com colegas que ficam surpreendidos por este apoio existir. Querem usufruir dele, mas não sabem onde procurar”, comenta Xavier. Para além do apoio psicológico, o gabinete também orienta os pacientes em processos médicos ou jurídicos. A alteração de nome do Xavier iniciou-se com o acom­ panhamento dos profissionais do GAE. Os pacientes transexuais que optam por iniciar procedimentos hor­ monais ou médicos são encaminhados pelo núcleo para a Unidade de Reconstrução Génito-Urinária e Sexual, do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. O Cores Univers@s está a preparar palestras para serem ministradas aos estudantes a fim de sensibilizar futuros profissionais para a temática LGBTQI+. No mês de novembro, vai ser realizado o evento “Trans20”, com o intuito de explorar, na FPCEUC, questões rela­ cionadas com a transexualidade.

Manuscritos raros podem reinventar a história da música portuguesa Projeto Mundos e Fundos republica livros e partituras. Iniciativa revela nova face do património musical de Coimbra - POR ANA TEREZA MAY E JULIANA RIBEIRO -

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iferente do trabalho de tradução realizado pe­ los grupos de investigação de latim e grego da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (FLUC), o projeto Mundos e Fundos traduz e republi­ ca partituras e livros musicais. A investigação foca-se em manuscritos da Biblioteca Geral da UC (BG/UC), datados dos séculos XVI e XVII. As pautas são es­ tudadas e editadas para que músicos atuais possam ­interpretar as peças. A investigação dos materiais disponíveis na BG/ UC é feita pelo Centro de Estudos Clássicos e Hu­ manísticos da FLUC, por meio do trabalho de alunos de mestrado e doutoramento de Estudos Artísticos. Os estudantes passam por um processo de formação, no qual identificam as antigas funções dos materiais, que podiam ser de uso litúrgico ou para as festas da ci­ dade. Têm, ainda, a possibilidade de aprender a tradu­ zir peças, da linguagem musical da época para a atual. “As músicas que eram feitas para festas, na altu­

ra, foram pensadas para ter impacto e isso continua nos dias de hoje”, diz o diretor do grupo O Bando de Surunyo, Hugo Sanches. O grupo integra o projeto Mundos e Fundos e interpreta as peças em concertos. Muitos dos documentos são originais e contêm anotações pessoais dos compositores, o que dificulta o processo de republicação dos mesmos. Segundo Pau­ lo Estudante, professor da Licenciatura em Estudos Artísticos da FLUC e um dos fundadores do projeto, ao estudar o manuscrito “tenta-se entender a música e o contexto de modo a tentar construir uma proposta atual e moderna”. Após o processo de tradução, caso seja notada a fal­ ta de versos, é feita uma pesquisa noutras fontes para completar as músicas. De seguida, é feita uma edição para observar se a peça está pronta para ser tocada sem perder o seu sentido original. O projeto Mundos e Fundos tende a trabalhar com manuscritos que nunca tinham sido manuseados,

como é o caso da peça MJ-I, de Manuel Joaquim, um dos pioneiros da musicologia portuguesa. Como con­ sequência, as composições que o integram são inéditas e isso, “pode mudar, aos poucos, a história da música portuguesa do século XVII”, explica Paulo Estudante. Os materiais, que há oito anos são analisados pelo grupo de Paulo Estudante e José Abreu, foram ­entregues à UC no século XIX. Esta foi a altura da revolução anticlerical, quando se entendeu que o ­património deveria pertencer ao Estado. Por este mo­ tivo, todo o material musical das instituições religiosas de Coimbra, manuscrito ou impresso, passaram a per­ tencer à UC. Para o docente, o projeto dá a conhecer à cidade o seu património musical, além de oferecer novos es­ petáculos através dos grupos aos quais cede os docu­ mentos. Entre os grupos parceiros está o Cupertinos, o Capella Sanctae Crucis e O Bando de Surunuyo, que vai lançar o primeiro álbum em fevereiro de 2020.


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ANAI: Por um envelhecimento saudável e ativo ANAI é um órgão que se ergue contra o envelhecimento mental e cria condições para os que recusam a inatividade. Pintura, restauro de livros, cerâmica são algumas das atividades organizadas pela ­i nstituição - POR CÁTIA BEATO E FILIPE SILVA -

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Associação Nacional de Apoio ao Idoso (ANAI) dedica-se a ajudar e a dinamizar a ter­ ceira idade. São dois os centros de atividade da ANAI: a Universidade do Tempo Livre (UTL) e o Centro de Dia/Oficina do Idoso (CD/OI). Entre aulas, convívios e viagens, são várias as ofertas para quem quer apren­ der e ocupar o tempo. Segundo a coordenadora de atividades da UTL, Ma­ ria Amélia, os idosos dispõem de 26 disciplinas anuais, além dos diferentes minicursos e ‘workshops’. Como explica o presidente da associação, José Ribeiro Ferrei­ ra, “não se deve tratar os idosos como crianças ou pes­ soas com problemas mentais, mas sim como pessoas capazes de fazer tudo”. Estes podem não ter a mesma agilidade física, mas têm “surpreendido em muitos as­ petos”, adiciona. Já o CD/OI disponibiliza serviços de apoio domi­ ciliário e permanente e, ainda, o Banco de Ajudas Técnicas. Através deste último, fornecem “cadeiras de rodas, camas articuladas e canadianas” que, segundo a coordenadora, são equipamentos difíceis de adquirir. “É um auxílio que damos com a ajuda da Fundação EDP”, reforça José Ribeiro Ferreira. A UTL oferece um leque de possibilidades, desde História e línguas a tecnologias e ginástica. As disci­ plinas são lecionadas por professores especializados nas áreas. O presidente explica que os docentes re­ cebem “um pequeno ordenado”, mas que nem sempre foi assim. Houve uma altura em que os professores eram voluntários. Porém, devido ao facto de não re­ ceberem, “não sentiam a responsabilidade de repor aulas quando precisavam de faltar”, esclarece José Ribeiro Ferreira. Neste momento, existe uma escala de ordenados que beneficia os professores com mais alunos e que os incentiva a “avisar com antecedência e repor essa aula”, esclarece. Além de coordenadora, Maria Amélia é também aluna da UTL e afirma que gosta do contexto das au­

CÁTIA BEATO

CÁTIA BEATO

las. “É um ambiente de diálogo, debate e troca de ide­ ias. Há sempre espaço para intervenções”, relata. Para a coordenadora da instituição, a UTL “é uma oportuni­ dade de socializar”. As pessoas saem de casa para ir à universidade e, aqueles que já não frequentam as aulas, juntam-se nos convívios para partilhar experiências. Maria Amélia conta ainda que fazem “viagens lo­ cais, nacionais e ao estrangeiro”. Revela também que estão a preparar uma viagem a Paris, em conjunto com a turma de História da Arte. Esta experiência é aberta

a todos os alunos, associados, “pessoas amigas e côn­ juges que queiram participar”, explica a coordenadora. Nas salas da UTL, quase todos os anos são ­realizados eventos “segundo um tema dominante”, alude Maria Amélia. Este ano, decorreram várias atividades “que não abrangem só a UTL, mas também a Oficina do Idoso”. Entre elas, a demonstração de pintura de papel, no âmbito da disciplina de Encadernação e Restauro de Livros e o Sarau no Conservatório de Música de Coimbra. São também publicados boletins trimestrais redigidos por funcionários, professores e participantes das atividades. O CD/OI dispõe de diversas oficinas como a de pin­ tura, encadernação e restauro de livros, cerâmica e a oficina de crochet e bordados. Contudo, a limitação do espaço não permite ter tantas atividades como deseja­ vam. José Ribeiro Ferreira fala numa oficina de carpin­ taria, dedicada ao arranjo de cadeiras de palhinha, que não é possível devido à falta de espaço. De acordo com o mesmo, se houvesse melhores condições de espaço, a ANAI poderia lucrar com a recuperação das cadeiras. Tal como acontece no CD/OI, o espaço da UTL não foi pensado para dar aulas. “Isto é uma casa que nos foi fornecida pela Câmara Municipal de Coimbra”, revela Maria Amélia. A coordenadora partilha a von­ tade de ter instalações próprias e adequadas, “mas isso é um sonho”. Como alguns idosos têm problemas de mobilidade, “foi incorporada uma cadeira elevatória de modo a facilitar o acesso aos andares superiores”. Com o mesmo intuito, as aulas são concentradas no primeiro e segundo pisos. A ANAI comemora, este ano, 25 anos desde que foi criada por um grupo de cidadãos ligado ao Clube de Empresários de Coimbra. A coordenadora deseja que “a associação continue a estar ao serviço de todos aqueles que na terceira idade precisam”.


20 soltas 12 de novembro 2019

CRÓNICAS DO TRODA - POR ORXESTRA PITAGÓRICA -

ARQUIVO FOTOGRÁFICO - JORNAL A CABRA

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as que grande comboio emocio­nal que vai nesta academia. Primeiro perdemos a carne de vaca, depois o Sarau da Latada foi re­ locado para os jardins da AAC e, ainda há umas semanas, para a eleição dos comissários, a nos­ sa AAC transformou-se num pronto-a-vestir. Para além disto, vamos agora passar pelo nosso período académico favorito: ELEIÇÕES PARA A DIREÇÃO-GERAL DA ASSOCIAÇÃO ACADÉMICA DE COIMBRA. Assim sendo, durante uns tempos vai haver uma grande mo­ bilização, dia e noite, de cola­boradores e outros a quem prometem o céu, com as virgens e isso tudo, se distribuírem panfletos e parafernália de escritório. E ainda falam mal da praxe. Interesses políticos à parte, a nossa mãe ensi­ nou-nos a não falar com estranhos e é isso mes­

mo que vamos fazer sempre que nos abordarem na rua. Frio não passamos porque não faltam isqueiros oferecidos, mas era interessante lu­ crarem com outros vícios do pessoal. Que tal oferecer também os filtros e as mortalhas? Ou um conjunto de seringas esterilizadas com co­ lheres de prata e preservativos que, como a ex­ pectativa dos colaboradores, sai furada. Não se podem limitar a pedinchar os votos de quem fuma, a outra parte da população agarrada não se sente devidamente representada. E ainda falam de uma academia inclusiva. O novo ‘feature’ das eleições é o voto ante­ cipado. Provavelmente vai dar barraca, mas normalmente é assim com muitas atividades precoces. Uma das partes de certeza que fica satisfeita e a outra nem tanto. Se estiverem

curiosos podem experimentar em casa, não nos responsabilizamos por quaisquer juízos de valor. A Black Friday chegou mais cedo, dado que as filas das cantinas estão maiores que o cordão humano para salvar o choupal e que as cantinas amarelas cessaram atividade mais depressa que os leitores que pararam no parágrafo anterior. Passando à cultura, este mês é propício à ati­v idade tunal, pelo que se recomenda que fiquem em casa para não prejudicarem a vos­ sa saúde. Assim nos despedimos de vós. Carícias Académicas, Orxestra Pitagórica


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LIBERTAÇÃO ANIMAL, LIBERTAÇÃO HUMANA - POR ANA CLÁUDIA BORDALO - GRUPO ECOLÓGICO DA AAC -

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omos quase oito mil milhões de hu­ manos no planeta e, todos os dias, 821 milhões passam fome – um em cada nove. No entanto, não falta alimento para os 56 mil milhões de animais terrestres reprodu­ zidos forçosamente e mortos pela indústria alimentar todos os anos. Toda esta sobre­ população animal tem um impacto nefasto a nível ambiental. “Toda esta sobrepopulação animal tem um impacto nefasto a nível am­ biental. Por exemplo, a produção de comida com toda a utilização de terra, água, com­ bustíveis e, em grande probabilidade, produ­ tos tóxicos. O impacto dos próprios animais que também ocupam espaço, consomem água, necessitam de transporte, medicamen­ tos e gestão de dejetos e outros resíduos. E ainda o impacto ambiental dos matadouros”. Cada vez mais sentimos as consequências deste impacto, mas sabemos que são as pessoas em situações mais fragilizadas a senti-las pri­ meiro e de forma mais acentuada. É junto de comunidades mais vulneráveis que se situam, escondidos, estes campos de morte e de con­ centração. São as pessoas em situações mais vulneráveis que carregam o fardo de tirar a vida e de lidar diretamente com a miséria dos

outros animais. São essas pessoas que estão, diariamente, de forma mais forte e direta, ex­ postas ao impacto que isso tem na sua saúde física, mental, emocional. As condições em que sobrevivem milhares de milhões de animais são propícias à proliferação de doenças e exigem cuidados veterinários, o que impacta a saúde de quem os consome, e cria resistência à ação dos medicamentos. Isto impacta ambientalmente os locais onde chegam os resíduos dos animais e aumenta o ambiente tóxico de quem lida com eles e com a sua morte. Sob um sistema capitalista que produz em massa e promove um consumo inconsciente não haverá libertação humana ou animal. A des­politização e tentativa de capitalização so­ bre movimentos e causas sociais são frequentes e inerentes ao próprio sistema. Vários países europeus são congratulados pela diminuição do consumo de animais ou por melhores práti­ cas ambientais, mas estes países depois inici­ am ou aumentam a exportação de animais, vivos ou mortos. Por exemplo, este ano, no nosso país, abriram novos matadouros onde são mortos dez mil porcos todas as semanas para exportação para a China. Mas o sistema não pode justificar tudo.

Sabemos a importância do papel individual, quer no que se consome como naquilo que se escolhe não consumir. E, muito além do con­ sumo, a importância do exercício da cidadania, da promoção da partilha e do debate de ideias. A importância de nos politizarmos e às nossas escolhas, de nos posicionarmos claramente, em todas as esferas, pelos nossos valores. Criticamos dura e acertadamente líderes mundiais pela sua irresponsabilidade política e pela sua rejeição da ciência e do papel que ela e a sua evolução ética têm no desenvolvimen­ to das nossas sociedades. No entanto, desva­ lorizamos muitas vezes o que a ciência nos diz sobre a natureza animal – que também parti­ lhamos enquanto humanos. Negamos o que temos de semelhante com outros animais, com base nesse “outro” que tantas vezes nos bate­ mos por desconstruir quando em causa estão outras discriminações. A opressão é errada, independentemente das suas vítimas. Teremos de nos desafiar a re­ fletir sobre as nossas semelhanças com outros animais, sobre os nossos posicionamentos e sobre aquilo que dizemos defender.

OBITUÁRIO - POR CABRA COVEIRA -

ELEIÇÕES FASHION WEEK

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8 de outubro, 2º piso da AAC. Marcham fro­ tas de pessoas de Capa e Batina em direção à Sala Sr. Xico. De grelo na pasta (ninguém sabe de quem), prontinhos para votar num geral na Queima das Fitas. Mal sabiam eles que po­ diam votar. E, no entanto, lá foram. A mando de quem? Também ninguém sabe ao certo. Diz-se que foram enviados pelo Santo Padroeiro do Tacho. Sem precisar de passar por Pró-Secção, a Secção de Moda da AAC (como lhe apelidou a Pitagórica) teve sucesso imediato e direito à sala da vice-presidência. Se calhar deviam avisar o Futsal que há espaço na casa, basta um patrocí­ nio da Toga.

NENHUM MACACO SABE DO SEU GALHO

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eira cultural nos jardins? Quando é que isso foi? Ouviu-se dizer que meia dúzia de secções culturais (o que é isso? Dá tacho? Não!) perderam uma tarde nos belíssimos (e sujos) Jardins da AAC para receber novos estudantes possivelmente interessados em juntar-se à sua pobre atividade. Sim, pobre porque não há di­ nheiro! E se continuar assim, nem associados! Mas pronto, quando os núcleos quiserem vir mostrar a associação àqueles que representam vão dar com o nariz na porta. Talvez um dia os núcleos percebam o seu lugar e que não são associações de estudantes nem fazem parte de uma federação académica. Mas que se danem os estatutos.


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CINEMA H

GUERRA DAS CABRAS A evitar Fraco

Dançar ao som do caos

Podia ser melhor

- POR PEDRO DINIS SILVA -

Razoável

á algo sobre Joker, o sádico e perverso arqui-­ inimigo de Batman, que faz ressoar na atenção do espectador um burburinho de empatia. Desde a sua primeira aparição na banda desenhada da DC Comics, em 1940, até à gloriosa transição do personagem para o grande ecrã, com hoje icónicas representações em filmes de Tim Burton e Christopher Nolan (entre ou­ tros), Joker atrai multidões e parece satisfazê-las com a sua aura fria de antagonista sorridente. No entanto, “Joker”, realizado por Todd Phillips, não pretende debruçar-se sobre a história de um dos maiores vilões do mundo do entretenimento, mas an­ tes inspirar-se nos contos da DC Comics e criar um enredo original num universo já conhecido. Neste filme, não se assiste à ascensão do protagonista pe­ los caminhos do crime. Assiste-se, sim, à ruína de um homem que luta contra uma doença que o faz rir ­inoportunamente, ao deteriorar do seu estado mental, que se agrava a cada segundo, e ao desenrolar da sua trágica vida familiar, social e profissional. Pesado e derrotista, o argumento centra-se em ­Arthur Fleck (Joaquin Phoenix), uma personagem cri­ ada propositadamente para esta película. Arthur vive numa Gotham City caótica, instável a nível político e em plena crise de lixo. Trabalha numa agência de palhaços, mas é despedido. Chega a tentar a sorte na comédia de stand-up, mas é ridicularizado em horário nobre por um programa de televisão. Em casa, trata sozinho de uma mãe doente, é dócil e sonhador. Lá fora, farto de uma sociedade que considera injusta e

traiçoeira, é agressivo, instável e à beira do colapso. Arthur vai desvanecendo até deixar de existir, ao co­ meter crimes sangrentos que lhe surgem como alívio psicológico; dá lugar a Joker, que protagoniza, por si mesmo, uma autêntica revolução contra o sistema político de Gotham, acompanhado por uma multidão cada vez maior de seguidores. Todd Phillips apresenta uma análise intensa sobre a queda psicológica de um homem que dança ao som do caos e o aproveita em seu favor. Apesar de criar uma história baseada em obras anteriores (“Joker” já foi comparado, por exemplo, a “Taxi Driver” e a “O Rei da Comédia”), não lhes falta ao respeito, muito pelo con­ trário. Entre as cenas explicitamente violentas e os mo­ mentos introspetivos que a longa-metragem exibe, o realizador consegue estabelecer originalidade ao mes­ mo tempo que homenageia as referências que evoca. Ao mesmo tempo, Phillips ilustra o argumento com imagens poderosas e bem conseguidas e uma sono­ plastia sólida e imponente. É também de sublinhar a prestação praticamente impecável de Joaquin Phoenix, que veste na própria pele os dramas do protagonista e os representa com perícia e minudência. O sucesso que “Joker” tem arrecadado nas bilheteiras justifica-se: o burburinho de empatia pelo personagem continua presente. Mesmo não existindo no universo da DC Comics, o nome de Arthur Fleck passa a estar, de ­agora em diante, intrinsecamente associado ao vilão. Vai ser difícil esquecê-lo tão cedo.

A Cabra aconselha A Cabra d’Ouro

JOKER De Todd Phillips com Joaquin Phoenix, Rob­ ert De Niro, Zazie Beetz 2019

A Cabra aconselha


12 de novembro 2019

MÚSICA

A missas destas ia todos os Domingos - POR DIOGO MACHADO -

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A Cabra aconselha

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pós produzir cinco álbuns em 2018 e atraves­ sar uma das fases mais controversas da sua vida, Kanye West decidiu tomar um novo rumo na sua vertente criativa. No início do presente ano, era lançado um vídeo que mostrava o rapper de Chicago num ‘Sunday Service’ acompanhado de um enorme coro, levando todos a acreditar que brevemente seria lançada mais uma ‘masterpiece’ daquelas a que o artis­ ta já habituou o publico. A espera foi longa, e depois de inúmeros atrasos o seu nono álbum de estúdio “Jesus is King” foi lançado no final de outubro. Confirma­ ram-se todas as promessas de um álbum fortemente influenciado pelo ‘gospel’ e é evidente a importância do cristianismo na vida diária de West. Timbaland, Pi’erre Bourne e Benny Blanco foram alguns dos pro­ dutores convidados para dinamizar toda a sonoridade do álbum. Assim que o álbum se inicia com “Every Hour” le­ vamos uma chapada de positividade pelas angelicais e prepotentes vozes do coro que o tem acompanhado. Kanye entra de forma agressiva no tema “Selah”, o qual é seguido por um belíssimo arranjo de voz por parte do coro. Num dos temas mais contrastantes do álbum, “Follow God” o rapper regressa a tempos antigos com um ‘flow’ rápido e pesado mostrando que o ‘YE’ ain­

da vive dentro de si. West admite que Deus o está a usar para se mostrar. “Sou um homem negro cristão e bilionário”. A participação de Clipse e Kenny-G no tema “Use This Gospel” demonstram a irreverência de Kanye West na sua constante procura de quebrar bar­ reiras artísticas. Todo o álbum é o colmatar de uma carreira que já há 15 anos demonstrava a capacidade do artista em renovar a sua imagem. Tal como fez em “808’s & Heartbreaks” o seu quarto álbum onde o rapper aban­ donou o seu estilo de rap agressivo e passou a adotar um estilo de rap melódico e mesmo a cantar com o auxílio do ‘auto-tune’. A religião é algo que acompanha Kanye desde o seu single “Jesus Walks” e que o define como artista, mas agora na sua última criação artística acabou dominar o projeto.

Jesus is King De Kanye West Editora G.O.O.D. MUSIC/Def Jam Género Christian Hip-Hop, Gospel 2019

Um passo para lá da paz, um passo para cá da distância - POR MARIA FRANCISCA ROMÃO -

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se Don Vito Corleone, o mafioso siciliano a quem todos carinhosamente apelidavam de “O Padrinho”, acordasse um dia no Vaticano com todo o mundo católico a seus pés? Regressara a Itália, mas tinha recuado meio milénio, encontran­ do o pano de fundo do Renascimento do século XV. E não mais o tratavam por “Padrinho”. Agora, era Rodrigo Bórgia, por todos conhecido como Papa Alexandre VI. No romance póstumo de Mario Puzo não há, na verdade, sinais de Don Corleone. Mas é inevitável não traçar o paralelismo, pois “A Família” troca o crime organizado da máfia italiana pelas obscuras redes de influência do Vaticano, mantendo, con­ tudo, todos os outros ingredientes da mais célebre obra do escritor. Assim, reencontramos nestas pági­ nas a ambição desmedida, a sede de poder, a traição e a mentira, mas, sobretudo, uma intensa dedicação à família. Um amor que, tal como em “O Padrinho”, está tão perto de unir irmãos de sangue quanto de os asfixiar e destruir. Embora fossem apenas quatro dos muitos nomes da lista de descendentes do Papa Alexandre VI, César, João, Lucrécia e Godofredo Bórgia eram os únicos a conhecê-lo como pai, antes de serem força­ dos a tratá-lo por “Sua Reverência”. César tinha o dom das armas, João o da manipulação e Lucrécia

LIVRO

o da beleza e da graciosidade feminina. Godofredo, mais novo que os irmãos, vivia ainda na sombra de um talento por descobrir. O plano de Alexandre VI para cada um dos filhos era, no entanto, profundamente alheio ao que estes desejavam. A César, por exemplo, estava reservado um lugar de sacerdote que o obrigava a abandonar a guerra e a passar escudos e armas a João, demasiado adepto de banquetes, festas e mulheres para poder liderar exércitos. “A Família” narra, assim, a história dos membros do clã Bórgia, acompanhando, parágrafo a parágrafo, a vida de Rodrigo Bórgia e a infância e mocidade dos quatro filhos, demasiado diferentes para que se relacionassem de forma pacífica e demasiado ­semelhantes para que vivessem d ­ istanciados.

A Família De Mario Puzo Editora Dom quixote 2002

A Cabra aconselha


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EDITORIAL As palmas que não se ouvem - POR PEDRO EMAUZ SILVA -

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egressámos ao período eleitoral que de­ cide a próxima Direção-Geral da As­ sociação Académica de Coimbra. Uma ocasião outrora recordada com orgulho e espe­ rança, não tivessem edições passadas manchado a nossa memória. E se fosse apenas a memória… A verdade é que, por muito eterna que pareces­ se a confusão das eleições anteriores, já cá estamos de novo. Num novo capítulo desta nossa casa, com uma página em branco em diante, por muito bor­ radas que estejam as antecedentes. Com apenas dois candidatos, vemos em Daniel Azenha e Diogo Vale um confronto entre Continuidade e Renova­ ção. Há bastante trabalho a fazer. Muita dívida por reduzir. Certos relatórios de certas contas por des­ vendar. Cantinas prometidas por fazer aparecer, in­ dependentemente da cor. Entre diversos assuntos, há que escolher o circuito que enfrentará estes obs­ táculos: a manutenção dos passos que já caminham há um mandato, guiados pela confiança do presen­ te; ou a curva numa direção alternativa à atual, fo­ mentada pela insatisfação que se foi acumulando. Vença quem quer que seja, há ainda uma outra tarefa (talvez a mais fundamental de todas) que há muito se vai descumprindo. Permitam-me a alusão ao Festuna passado, onde dois dos responsáveis pela histórica revolta dos estudantes em ’69 subiram ao palco do TAGV para a entrega dos prémios do fes­ tival. Décio de Sousa e Pio de Abreu foram recebi­ dos pelo púbico com um enorme aplauso, nunca tão grande quanto eles. Palmas que ecoavam o som de esperança. Há 50 anos atrás, eles agigantaram-se, como tantos outros, porque tinham neles o tamanho de toda a Academia. E nessas palmas, ao reconhecer a sua grandiosidade, apercebemo-nos da nossa pe­ quenez. Cada vez mais, esta academia está cercada pelo desinteresse por aqueles que antigamente luta­ riam por ela. Seja Lista C ou R, cabe a esta academia reacender o que nos trazem Décio e Pio: palmas e al­ guém para aplaudir. Para se voltar a ouvir esperança.

Cada vez mais, esta academia está cercada pelo desinteresse daqueles que antigamente lutariam por ela”

Ficha Técnica

Diretor Pedro Emauz Silva

Jornal Universitário de Coimbra – A CABRA Depósito Legal nº183245702 Registo ICS nº116759 Propriedade Associação Académica de Coimbra

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Equipa Editorial Rafaela Chambel e Isabel Pinto (Ensino Superior), Leonor Garrido e Gabriel Rezende (Cultura), Vasco Borges e Diogo Machado (Desporto), Beatriz Furtado e Maria Monteiro (Ciência & Tecnologia), Mariana Rosa (Cidade), Nino Cirenza, André Crujo e Hugo Guímaro (Fotografia) Colaborou nesta edição Francisco Barata, Tomás Barros, Cátia Beato, Joana Carvalho, Carina Costa, Carolina Fernandes, Antónia Fortunato, Gustavo Freitas, João António Gama, Hugo Guímaro, Ana Paula Haeitmann, Ana Tereza May, Gabriela Moore, Beatriz Mota, Simão Moura, Bruno Oliveira, Mafalda Pereira, Carolina Prodan, Juliana Ribeiro, Maria Salvador, Jade Sanglard, Filipe Silva, Pedro Teixeira Silva, Francisca Soeiro, Xavier Soares, Luísa Tibana, Carlos Torres

JORNAL UNIVERSITÁRIO DE COIMBRA

Conselho de Redação Carlos Almeida, Inês Duarte, Filipe Furtado, Hugo Guímaro, Margarida Mota, João Diogo Pimentel, Paulo Sérgio Santos, Pedro Dinis Silva Fotografia Cátia Beato, Joana Carvalho, Antónia Fortunato, Hugo Guímaro, Gabriela Moore, Maria Salvador Ilustração Raquel Guiomar, Marta Emauz Silva Paginação Luís Almeida, Hugo Guímaro

Impressão FIG – Indústrias Gráficas, S.A. Telf. 239499922, Fax: 239499981, e-mail: fig@fig.pt Produção Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra Agradecimentos Reitoria da Universidade de Coimbra Tiragem 2000 exemplares


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