Revista Viração - Edição 104 - Março/2014

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Vânia Correia

quem faz a vira pelo brasil

Tulio Bucchioni, da Redação, entrevista Albert Sansano, do Conselho Internacional do Fórum Mundial de Educação, em Porto Alegre (RS)

Conheça os Virajovens em 19 Estados brasileiros e no Distrito Federal: Aracaju (SE) Belém (PA) Boa Vista (RR) Boituva (SP) Brasília (DF) Campo Grande (MS) Curitiba (PR) Fortaleza (CE) João Pessoa (PB) Lavras (MG) Lima Duarte (MG) Macapá (AP) Maceió (AL) Manaus (AM) Natal (RN) Picuí (PB) Pinheiros (ES) Porto Alegre (RS) Recife (PE) Rio Branco (AC) Rio de Janeiro (RJ) Salvador (BA) S. Gabriel da Cachoeira (AM) São Luís (MA) São Paulo (SP) Sud Mennucci (SP) Vitória (ES)

Auçuba Comunicação e Educomunicação – Recife (PE) • Avalanche Missões Urbanas Underground – Vitória (ES) • Buxé Fixe - Amadora (Portugal) • Casa Peque Davi – João Pessoa (PB) • Catavento Comunicação e Educação – Fortaleza (CE) • Cipó Comunicação Iterativa – Salvador (BA) • Ciranda – Central de Notícia dos Direitos da Infância e Adolescência – Curitiba (PR) • Coletivo Jovem – Movimento Nossa São Luís – São Luís (MA) • Gira Solidário – Campo Grande (MS) • Grupo Conectados de Comunicação Alternativa GCCA – Fortaleza (CE) • Grupo Makunaima Protagonismo Juvenil – Boa Vista (RR) • Instituto de Desenvolvimento, Educação e Cultura da Amazônia – Manaus (AM) • Instituto Universidade Popular – Belém (PA) • Mídia Periférica – Salvador (BA) • Instituto Candeia de Cidadania – Lima Duarte (MG) • Jornal O Cidadão – Rio de Janeiro (RJ) • Lunos – Boituva (SP) • Movimento de Intercâmbio de Adolescentes de Lavras – Lavras (MG) • Oi Kabum – Rio de Janeiro (RJ) • Projeto de Extensão Vir-a-Vila (UFRN) - Natal (RN) • Projeto Juventude, Educação e Comunicação Alternativa – Maceió (AL) • Rejupe • União da Juventude Socialista – Rio Branco (AC)


Copie sem moderação! Você pode: • Copiar e distribuir • Criar obras derivadas Basta dar o crédito para a Vira!

editorial quem somos

A

Em busca de oportunidades

É

um legítimo desejo do adolescente a inserção no mercado de trabalho e o acesso a uma educação de qualidade. Como vimos em edições anteriores em reportagens sobre trabalho infantil e adolescente, é necessário que o primeiro emprego do jovem seja decente, sem que o direito à educação e o direito ao lazer sejam violados em razão da necessidade financeira. Nesse sentido, um curso técnico pode colaborar no aprofundamento em uma área do conhecimento, além de preparar o jovem para um primeiro emprego em que coloque em prática o que aprende em sala de aula. Na reportagem de capa desta edição, você confere a opinião de especialistas, estudantes e ex-alunos sobre o ensino técnico no Brasil. E você ainda confere uma matéria sobre customização de roupas e materiais escolares. E, a partir de versos do rock nacional, toma conhecimento de uma rede de jovens paranaenses. Boa leitura!

Viração é uma organização não governamental (ONG) de educomunicação, sem fins lucrativos, criada em março de 2003. Recebe apoio institucional do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), do Núcleo de Comunicação e Educação da Universidade de São Paulo e da ANDI - Comunicação e Direitos. Além de produzir a revista, oferece cursos e oficinas em comunicação popular feita para jovens, por jovens e com jovens em escolas, grupos e comunidades em todo o Brasil. Para a produção da revista impressa e eletrônica, contamos com a participação dos conselhos editoriais jovens de 20 Estados, que reúnem representantes de escolas públicas e particulares, projetos e movimentos sociais. Entre os prêmios conquistados nesses dez anos, estão Prêmio Don Mario Pasini Comunicatore, em Roma (Itália), o Prêmio Cidadania Mundial, concedido pela Comunidade Bahá’í. E mais: no ranking da ANDI, a Viração é a primeira entre as revistas voltadas para jovens. Participe você também desse projeto. Paulo Pereira Lima Diretor Executivo da Viração – MTB 27.300

Apoio institucional

Asso

ciazione Jangada


d Dos bueiros para as HQs

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Um rato e sua turma de bichos asquerosos são os personagens do álbum de quadrinhos Níquel Náusea, sobre o qual trata a coluna Quadrim dessa edição

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Macapá solta a voz Programa de rádio, veiculado pela internet, está presente em escolas da capital do Amapá promovendo ações de educomunicação

Falando do rolê Saiba mais sobre os famosos rolezinhos que jovens da periferia têm feito em shoppings de grandes cidades a partir do olhar de um de seus organizadores

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Em Porto Alegre No contexto de mais uma edição do Fórum Social Temático, discussão sobre educação acontece sem a presença de jovens estudantes

sempre na vira:

Manda Vê Como se Faz Vale 10 Quadrim Imagens que Viram No Escurinho

RG da Vira: Revista Viração - ISSN 2236-6806 Conselho Editorial

Eugênio Bucci, Ismar de Oliveira, Izabel Leão, Immaculada Lopez, João Pedro Baresi, Mara Luquet e Valdênia Paulino

Conselho Fiscal

Everaldo Oliveira, Renata Rosa e Rodrigo Bandeira

Conselho Pedagógico

Alexsandro Santos, Aparecida Jurado, Isabel Santos, Leandro Nonato e Vera Lion

Presidenta

Susana Piñol Sarmiento

Vice-Presidenta Amanda Proetti

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Rafael Lira

Diretoria Executiva

Paulo Lima e Lilian Romão

Equipe

Bruno Ferreira, Elisangela Nunes, Evelyn Araripe, Filipe Campos Borges, Gutierrez de Jesus Silva, Irma D’Angelo, Manuela Ribeiro, Rafael Silva, Tulio Bucchioni e Vânia Correia

Administração/Assinaturas

Douglas Ramos e Norma Cinara Lemos

Mobilizadores da Vira

Acre (Leonardo Nora), Alagoas (Alan Fagner Ferreira), Amapá (Alessandro Brandão), Amazonas (Jhony Abreu, Claudia Maria Ferraz e Sebastian Roa),

Em busca de qualidade de ensino e qualificação profissional, adolescentes optam pelo ensino técnico para vivenciar experiências que a escola não proporciona

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Criativa e econômica... A customização de roupas, bolsas e cadernos é uma oportunidade para personalizar seus pertences e evitar o consumo desnecessário de novos produtos

Não foi a toa, não! Mesmo sem saber, uma rede de jovens paranaenses dança conforme o “engajamento” presente nas músicas de consagrados roqueiros brasileiros

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Que Figura Sexo e Saúde Rango da Terrinha Parada Social Rap Dez

Primeiro-Secretário

Pensando no futuro

Folia se faz na rua Há nove anos, moradores do Complexo de Favelas da Maré, no Rio de Janeiro, fazem do Carnaval uma festa de cidadania e protesto

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Bahia (Emilae Sena e Mariana Sebastião), Ceará (Alcindo Costa e Rones Maciel), Distrito Federal (Webert da Cruz), Espírito Santo (Jéssica Delcarro e Izabela Silva), Maranhão (Nikolas Martins e Maria do Socorro Costa), Mato Grosso do Sul (Fernanda Pereira), Minas Gerais (Emília Merlini, Reynaldo Gosmão e Silmara Aparecida dos Santos), Pará (Diego Souza Teofilo), Paraíba (José Carlos Santos e Manassés de Oliveira), Paraná (Juliana Cordeiro e Diego Henrique Silva), Pernambuco (Edneusa Lopes e Luiz Felipe Bessa), Rio de Janeiro (Gizele Martins), Rio Grande do Norte (Alessandro Muniz), Rio Grande do Sul (Evelin Haslinger e Joaquim Moura), Roraima (Graciele Oliveira dos Santos), Sergipe (Elvacir Luiz) e São Paulo (Luciano Frontelle e Paolla Menchetti).

Colaboradores

Antônio Martins, Fernanda Papa, Heloísa Sato, Márcio Baraldi, Natália Forcat, Nobu Chinen, Novaes e Sérgio Rizzo.

Projeto Gráfico

Ana Paula Marques e Manuela Ribeiro

Revisão

Izabel Leão

Jornalista Responsável

Paulo Pereira Lima – MTb 27.300

Divulgação

Equipe Viração

E-mail Redação

redacao@viracao.org


diga lá!

O que é Educomunicação?

Via e-mail Olá, Equipe Viração! Conheci a iniciativa através do canal CNU, pelo Programa Quarto Mundo, e fiquei encantada com o projeto e os depoimentos dos jovens envolvidos. Este ano pretendo cursar Educomunicação na USP. Tenho um enorme interesse em colaborar nesse processo político, social e educativo. Acredito nessas grandes experiências e vivências na construção de gente com um novo olhar, cientes de si, de seu papel e das mudanças a serem feitas. Gostaria de parabenizar a iniciativa e saber como colaborar e ingressar nesse mundo. Muito Obrigada! Abraços, Camilla Zarbinati

Resposta: Olá, Camila! Ficamos muito felizes por saber do seu interesse por Educomunicação! Estamos torcendo por você! Quando quiser, apareça na sede da Viração para conhecer o nosso espaço, jovens e equipe! Um abraço!

Perdeu alguma edição da vira? não esquenta!

@viracao

É comum, nas edições da Vira, encontrar a palavra “educomunicação” ou o termo “educomunicativo”. A educomunicação é um campo de intervenção que surge da inter-relação comunicação/educação para a transformação social. Dizemos que um projeto ou prática é educomunicativa quando adota em seus processos, especialmente do jovem, o caráter comunicacional, como o diálogo, a horizontalidade de relações e o incentivo à participação, fazendo com que os sujeitos exerçam plenamente o direito humano à expressão e à comunicação, em diferentes âmbitos e contextos. A Viração promove ações educomunicativas por meio da produção midiática, incentivando que adolescentes e jovens produzam reportagens coletivas em diferentes linguagens.

Como virar um virajovem? Virajovens são os integrantes dos conselhos editoriais jovens da Viração, que produzem conteúdos mensais em suas cidades. O conselho pode ser um coletivo autônomo de jovens ou um grupo ligado a uma entidade, organização, movimento social, escola pública ou privada, que dará apoio para que os virajovens produzam conteúdos. A parceria entre a Vira e entidade é oficializada com um termo de compromisso e com a publicação do logotipo da organização na revista Quer saber mais? Entre em contato com a gente: redacao@viracao.org.

Agência Jovem de Notícias

Você pode acessar, de graça, as edições anteriores da revista na internet: www.issuu.com/viracao

Para garantir a igualdade entre os gêneros na linguagem da Vira, onde se lê “o jovem” ou “os jovens”, leiase também “a jovem” ou “as jovens”, assim como outros substantivos com variação de masculino e feminino.

Mande seus comentários sobre a Vira, dizendo o que achou de nossas reportagens e seções. Suas sugestões são bem-vindas! Escreva para Rua Augusta, 1239 - Conj. 11 - Consolação - 01305-100 - São Paulo (SP) ou para o e-mail: redacao@viracao.org - Aguardamos sua colaboração!

Parceiros de Conteúdo


manda vê

Maria Eduarda, Virajovem de Londrina (PR); Mariana Flores, do Virajovem Curitiba (PR); e Emilae Sena, do Virajovem Salvador (BA)*

Muitos dizem que o livro tem cheiro e que nada substitui a sensação de tocar suas páginas e vê-las passando, conforme uma história ou ideia revelada ao leitor. Mas esse pensamento não é unânime. Em tempos de tecnologia, internet e outras novidades, há quem prefira os fatores mobilidade, facilidade e interatividade. Assim surgem os e-books, que permitem aos usuários de tablets e celulares mais modernos acessarem inúmeros livros pela internet, o que é atrativo para quem se incomoda com o peso e espaço ocupado pelos livros impressos, e pode contar com o recurso de aumentar a letra do texto e ter uma iluminação própria na tela. Não há como negar o poder de adaptação dos livros à era digital. Antes apenas impressos, hoje há cada vez mais livros vendidos e até mesmo disponibilizados gratuitamente na internet. No entanto, há os que não se adaptam à leitura na tela de um computador ou tablet. Por isso, a galera quer saber:

As novas tecnologias tornaram os livros impressos menos atrativos? Guilherme Zinkoski

17 anos | Francisco Beltrão (PR) “A ‘mágica’ de ir direto ao ponto desejado proporcionada pelas novas tecnologias deixa os livros impressos muito atrás no quesito atração. Histórias parecem ser muito mais interessantes e animadas quando contadas ou transformadas em filmes.”

Kelly Regina

18 anos | Maringá (PR) “Acredito que não, porque muitas vezes as novas tecnologias abrem mais horizontes e curiosidades, fazendo os usuários lerem mais sobre assuntos que os interessam, já que procurar um livro na biblioteca e descobrir sobre ele é bem mais difícil do que ler sobre ele em um blog. Uma vez que gostam da leitura, nada melhor que um livro nas mãos.”

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Rhuani Vellozo

20 anos | Paranaguá (PR) “Na minha rede de amigos virtual é bem comum fazer trocas de livros impressos e também usamos sites e aplicativos no celular para comprá-los. Não é a tecnologia que substitui os livros, mas a falta de interesse das pessoas pela leitura.”

Gabriel Mestre Guilherme 17 anos | Londrina (PR)

“Os livros em mídia digital são ótimos para quem gosta ou precisa ler alguma coisa na correria do dia a dia. Mas nada substitui o prazer de sentir o livro em suas mãos, folheá-lo e sentir aquele cheirinho de livro novo.”


Betania César

26 anos | Salvador (BA)

Eric Reis

25 anos | Salvador (BA)

“As pessoas, hoje em dia, têm preguiça de pegar o livro impresso e não têm mais tempo para eles. Com a internet e outros recursos, há a possibilidade de fazer tudo ao mesmo tempo.”

“Acho que é mais fácil, rápido e barato encontrar conteúdo em meio digital. Mas pra mim, isso não substitui as sensações de ter um livro físico. Além disso, o conteúdo impresso ainda consegue passar uma credibilidade maior.”

faz parte para ler no busão História sem Fim Fim, de Michel Ende Bastian é um menino que se sente só e dá asas à imaginação para aliviar suas tensões e a dor causada pela perda recente da mãe. Em visita a uma livraria, fica interessado por um livro que, segundo o proprietário da loja, tratava-se de uma história sem fim. Incrédulo, o garoto leva o livro e se transporta ao mundo mágico sobre o qual o livro trata. Ao mesmo tempo, Bastian era leitor e personagem da história. O livro ganhou versão para o cinema em 1984.

O comportamento dos leitores brasileiros é estudado na pesquisa Retratos do Brasil, elaborada pelo Instituto Pró-Livro. Em sua terceira edição, com dados coletados em 2011, a pesquisa revela que há 88,2 milhões de leitores no País, de um total de 178 milhões de brasileiros com mais de cinco anos de idade. A pesquisa define como leitor “aquele que leu, inteiro ou em partes, pelo menos um livro nos últimos três meses”. Em sua terceira edição, 2012, traz dados sobre o perfil e o comportamento dos leitores de livros digitais.

*Virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal

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como se faz!

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Jornal Escolar Alunos repórteres retratam tudo o que rola na escola

Alcebino Silva, Virajovem de Sud Mennucci (SP); e Elvacir Luiz, Virajovem de Aracaju (SE)*

O

jornal escolar pode ser uma ótima ferramenta de comunicação para melhorar a linguagem escrita dos alunos bem como a expressão comunicativa dentro e fora da sala de aula. Nele podemos abordar vários assuntos que são mais discutidos entre os alunos no recreio, ações bacanas que estão acontecendo na escola e agenda de eventos. Uma ótima alternativa para colocá-lo em ação é juntarse com a galera do grêmio estudantil de sua escola e buscar parceria para sua circulação, periodicidade e impressão no próprio ambiente escolar. Para isso, você vai precisar de computador, papel, caneta, máquina fotográfica e muita criatividade. É bom fazer junto com um grupo de pessoas que possa se dividir e ficar responsável por cada seção do jornal.

Passo a passo 1. Recrute amigos, professores e gremistas que possam colaborar com ideias e conteúdos. É interessante pedir aos próprios alunos sugestão de conteúdos que queiram ler no jornal. 2. Em grupo, defina um nome para o jornal e suas seções e também a periodicidade em que o jornal irá circular – se será semanal, quinzenal, mensal, bimestral etc. Defina também o número de páginas, formato do periódico, como será a impressão, levando em conta o tamanho da equipe e recursos financeiros destinados a ele. 3. Para a primeira edição, discuta as pautas com o grupo e quem ficará responsável por cada uma delas. Para escrever uma matéria rica, é importante ouvir todos os envolvidos sobre um fato e depois contemplá-los no texto. Após a elaboração da matéria, confira junto ao professor se não há erros de português ou redação. 4. A diagramação determina o visual do seu jornal. Neste processo de organização dos textos e imagens nas páginas, você pode contar com recursos simples do Word. Use letras grandes para o título e menores para o corpo do texto da matéria. Faça títulos curtos, que chamem a atenção do leitor. Utilize desenhos, charges que podem ser coletados juntos aos alunos da escola. 5. Convide a galera no intervalo para ajudar a distribuir e divulgar o jornal. 6. Para que o jornal se torne cada vez mais interativo, é necessário que se crie um espaço para sugestões e participação ativa dos leitores. Elabore uma conta de e-mail e divulgue-a no jornal para que os colegas opinem sobre os conteúdos. Jornal escolar produzido por estudantes participantes do Projeto Mais Educomunicação, de Sud Mennucci (SP)


quadrim

Um rato contra a praga do mau humor

Nobu Chinen, crítico de quadrinhos

R

atos de esgoto normalmente são bichos asquerosos. Animais que vivem na sujeira, espalham doenças e costumam provocar nojo, medo e repulsa. Não é esse, porém, o caso de Níquel Náusea que, ao contrário, só provoca risos. O nome em si já é uma piada e, como se pode notar, trata-se de uma brincadeira com Mickey Mouse, o famoso camundongo que deu origem ao império de Walt Disney. Níquel vive nos subterrâneos imundos de uma grande cidade, onde tem como companheiros a barata Fliti, que curte levar um spray de inseticida na cara; o valentão Rato Ruter, uma ratazana de corpo enorme e inteligência curta; o velho rato sábio, que vive dando conselhos óbvios; além de vários outros bichos. Muitas vezes, essa turma sai do seu habitat e invade casas, parques, escolas e outros recintos bem frequentados, em busca de alimento e diversão, aterrorizando garotinhas incautas e marmanjos não muito corajosos. No entanto, o autor Fernando Gonsales não se restringe a essa pequena fauna urbana para criar novas

Por que é legal ler? A série é muito divertida ao explorar situações absurdas, muitas delas baseadas nos hábitos e comportamentos dos animais. O desenho também é muito engraçado.

tiras. Muitas vezes, ele utiliza animais de outras paisagens, valendo-se, inclusive, de bichos exóticos e até seres mitológicos como sereias, centauros e unicórnios. Vale tudo pela nobre causa da boa piada. Gonsales é formado em biologia e veterinária, e aproveita os seus conhecimentos científicos sobre animais para criar situações absurdas e hilariantes que aliam humor e criatividade a figuras extremamente cômicas, num traço bem peculiar que lembra as imagens cubistas do pintor espanhol Picasso. A série Níquel Náusea estreou em 1985, após vencer um concurso promovido pelo jornal Folha de S. Paulo para revelar novos talentos. Desde então, a tira vem sendo publicada ininterruptamente e foi distribuída para jornais de outras cidades do Brasil e até em Portugal. Nos anos 1980, o personagem chegou a ter revista própria, que durou pouco tempo. Nos últimos anos, os álbuns vêm sendo editados com coletâneas de tiras, selecionadas do material já publicado.

Por que é importante ler? Níquel Náusea é uma das séries de humor mais premiadas do Brasil. Gonsales é um autor que, há quase 30 anos, tem conseguido manter um trabalho de humor consistente de forma simples e direta, sem deixar cair a qualidade do seu trabalho.

Para ler e refletir! Muitas vezes o comportamento de certas pessoas, comparado a de alguns bichos, nos leva a questionar quem, de fato, é irracional.

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Somando sonhos com as juventudes

O

ano de 2014 já é um ano muito especial para a juventude do Brasil. Quem é jovem hoje tem a chance de participar de um momento histórico, em que a juventude, em suas diversas expressões, chama a atenção de toda a sociedade para seguirmos somando esforços na construção de um País mais justo. Com vidas livres de violência e desigualdades, com garantia de direitos, entre eles os de ir, vir, fazer escolhas e de ser feliz, seja na escola, no trabalho, em casa, no shopping, no futebol, nas eleições, nas relações, nas redes e nas ruas. Viver esse momento, e poder dialogar com ele, a partir da visão de quem é jovem e se comunica com base nessa identidade, das periferias aos centros das cidades, do meio rural às áreas urbanas, passando pelos sertões, pelas florestas, pelas fronteiras do nosso imenso País, é um grande desafio, talvez até um sonho. Mas esse sonho virou realidade de dez anos para cá, com a criação da Viração. Vão-se mais de dez anos do dia em que um jornalista que conectava pessoas, projetos e instituições em torno de um veículo de comunicação jovem, procurou a organização em que eu trabalhava, a Fundação Friedrich Ebert, para somar sonhos. Imaginem a conexão imediata diante da proposta inovadora da Revista Viração! A Vira surgiu não só como revista, mas principalmente como ponto de conexão e encontro que informa e transforma a vida de quem participa de suas atividades, de quem lê as suas reportagens, de quem se forma cidadã e cidadão fazendo educomunicação. Fazer comunicação de jovens, com jovens e para jovens é uma necessária revolução na era da informação e da comunicação democrática que buscamos. Fazer comunicação com participação é um dos pontos fortes deste processo em que a Vira se vira muito bem! Porque ela forma no seu fazer e informa, criticamente, com um enorme bem querer. É uma alegria acompanhar esta trajetória de dez anos que, não por acaso, “coincide” com a caminhada em que

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a Política Nacional de Juventude foi criada, em 2005, e uma série de pequenas e grandes conquistas alcançadas, como a aprovação do Estatuto da Juventude, que desde agosto de 2013 já é lei! Isso não teria sido possível sem a participação de milhares de jovens que se mobilizam em torno desta construção, em conferências, conselhos e outros espaços. E na maior parte deles está a turma da Vira, com a bandeira e o exercício do direito humano à comunicação. Por uma lei de mídia democrática, pelos direitos das juventudes, que a construção coletiva e participativa que caracteriza a Viração possa contagiar ainda mais a sua rede no Brasil e no mundo neste ano, em que certamente a juventude estará também no centro das atenções. Dentro e fora do campo. Sempre firme entre as políticas públicas de juventude e a democratização da comunicação.

Natália Forcat

Fernanda Papa*

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*Fernanda Papa é comunicadora social, mestre em administração pública e governo e compõe, desde março de 2012, a equipe da Secretaria Nacional de Juventude, como Coordenadora Geral de Relações Institucionais / Plano Juventude Viva


mídias livres No ar, a juventude do Amapá

Programa de rádio feito por jovens está presente estudantes em escolas públicas do Amapá para dar voz aos

Alessandro Brandão, do Virajovem Macapá (AP)*

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*Um dos virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal

Fizeram parte da primeira turma, ainda no ano de 1999. dois dos atuais oficineiros, Cliver Campos e Odivar Filho, além do coordenador-geral do Fala Juventude nas Escolas, Waldemir Bola Júnior. “Para mim é um orgulho participar novamente desse projeto, que, na verdade, contribui para formar bons cidadãos”, completou Bola Júnior. O Fala Juventude teve inicio em 1997 e passou oito anos fora do ar. Mas por determinação política, o programa voltou à ativa em 2011. Até hoje é líder de audiência na Radio Difusora de Macapá (RDM, 630 kHz: 630 AM). Fala Juventude

m junho de 1997, numa oficina de capacitação para os profissionais da Rádio Difusora de Macapá, surgiu a ideia de se criar um programa que conversasse com os jovens: o Fala Juventude, missão nada fácil na época. Para ajudar, a Difusora convidou a Assessoria Especial de Juventude a embarcar nesta aventura e viajar nas agitadas ondas do rádio. Sabe aquele papo de que a juventude não gosta de ouvir rádio AM? O Fala Juventude mostra que aquele quem tem o que dizer sempre será ouvido. Para tornar-se uma referência, o programa precisava ter uma identidade especial, com a cara dos jovens que moram às margens do Rio Amazonas, na esquina do Marco Zero do Equador. O legal do programa é a ideia de sair do estúdio e ir à escola, o que proporciona a troca de ideias e interação entre a equipe do Fala e o público. Mas não bastava chegar com microfones e caixas de som e armar o equipamento em um lugar qualquer. Era preciso ter propostas que permitissem a participação plena e o total envolvimento dos jovens que nunca tiveram a oportunidade de pisar num estúdio, de ouvir sua voz, de expressar sua opinião. “Oferecemos aos participantes material de qualidade, feito por profissionais com vasta experiência no rádio e, principalmente, dentro da política nacional de educação e comunicação”, comentou o secretário da Juventude do Amapá, Alex Nazaré. O Fala Juventude, enquanto um processo educomunicativo, também proporciona aos jovens estudantes a experiência com comunicação no contexto escolar. Trata-se de um projeto específico, chamado Rádio Escola, que funciona em circuito interno, em que a voz do estudante vai ecoar pelos corredores, salas de aula e refeitório. Esse projeto já é uma realidade em várias escolas do Estado do Amapá.

O coordenador do projejo, Bola Júnior, com os educadores da Escola Irineu da Gama Paes

Governador do Amapá, Camilo Capiberibe, é entrevistado no Fala Juventude

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Alessandro Muniz

galera repórter “Proibir é fácil, difícil é dar opções.”

Bora pro Rolê!

re io e preconceito à juventude negra e pob Os rolezinhos provocaram reações de apo organizadores dos rolês em São Paulo da periferia. Confira a entrevista com um dos PaollaMenchetti, do Virajovem São Paulo (SP); Stephany Pinho, do Virajovem São Luís (MA)*; e Bruno Ferreira, da Redação

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ocê chama a galera do seu bairro ou seus colegas da escola para passear no shopping, namorar, olhar as vitrines e, se as economias deixarem, até fazer umas comprinhas. Até aí nada de estranho, não é? Mas, e se acontecer de vocês serem barrados na entrada do shopping por “aparentarem pobreza”, serem negros e moradores de periferia? Isso, certamente, é uma nítida demonstração de discriminação. Os “rolezinhos”, passeios marcados para acontecer em shoppings e mobilizados a partir da rede social Facebook por jovens da periferia de São Paulo (prática que, logo em seguida, se espalhou por todo o País), suscitaram enormes discussões e mostraram o quanto ainda precisamos avançar na discussão sobre direitos e democracia. Tratados como verdadeiros profanadores dos templos capitalistas, os jovens negros da periferia foram criminalizados por ousarem ocupar um espaço que, historicamente, não foi destinado a eles. A polícia foi mobilizada para “conter” os jovens que queriam apenas dar um “rolê”. O auge do rolezinho foi em novembro de 2013 quando, no Shopping Vitória, na Enseada do Suá, no

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Espírito Santo, a Polícia Militar cercou o local para “proteger” lojistas trabalhadores e consumidores ameaçados por um suposto “arrastão”. Na verdade, tratava-se apenas de jovens pretos, pobres e funkeiros que ocuparam o shopping para se proteger da violência da tropa da PM que tinha acabado de encerrar à força um baile funk que acontecia no pier ao lado. Após esse episódio, em 14 de janeiro, no Internacional Shopping Guarulhos, na Grande São Paulo, a polícia prendeu 23 jovens no segundo rolezinho, alegando “perturbação de sossego”. Como se a força policial não fosse o bastante, um juiz de São Paulo concedeu uma liminar que prevê multa de 10 mil reais para quem comparecer aos rolezinhos nos shoppings. Em solidariedade aos jovens presos e em repúdio à criminalização da juventude negra da periferia, estão sendo marcados “rolês” em várias cidades brasileiras. Um dos organizadores de um dos primeiros “rolezinhos” de São Paulo, o jovem Jefferson Luís, de 20 anos, bateu um papo via Facebook com a gente para explicar como surgiu a idéia dos “rolezinhos” e toda a sua repercussão. Confira!


Jefferson Luís

O jovem Jefferson Luís, de 20 anos, ficou conhecido por ser um dos organizadores dos rolezinhos na Grande São Paulo

Fotos: Acervo pesso al/

Em que contexto o primeiro rolezinho foi idealizado? Qual era o objetivo e como foi esse rolezinho? A intenção era reunir amigos que só conhecemos pela internet e nunca tivemos contato pessoalmente, também conhecer pessoas novas e criar uma opção de lazer, porque onde moramos é muito carente nessa parte. O jeito que foi pensado correspondeu com o modo como aconteceu? Em grande parte sim. Nos encontros havia pessoas diferentes que podíamos conversar e conhecer. Foi uma coisa legal, já que todo mundo não tem muito “o que fazer”. Todos gostaram da ideia e foram nos rolezinhos. O que você acha da discussão política e social que esse evento gerou? Você está por dentro de tudo o que tem sido discutido? Sim, estou por dentro. Os rolezinhos serviram pra mostrar exatamente isto: a falta de lazer e que nós também temos direito de frequentar qualquer lugar, mas sentimos preconceito algumas vezes. De que forma você entende a questão do direito à cidade? Nós, jovens, estamos carentes de espaços de cultura. Pode até ter espaços, mas não há atrativos, não tem projetos para que os jovens se interessem, não tem uma feira cultural próxima, uma aula de música, de violão e, como sabemos que é nosso direito ter tudo isso, então estamos cobrando da prefeitura. Você tem participado de negociações com a prefeitura sobre a realização dos rolezinhos. Como tem sido? Sim, participei. Por enquanto, estamos resolvendo de uma forma que pode ajudar a todos nós, jovens, e aos shoppings, principalmente o pessoal da periferia. Na sua opinião, como o poder público tem encarado a questão dos rolezinhos? Essa eu não posso responder. Acho que vocês teriam que perguntar pra eles lá.

O que você achou da proibição dos bailes funks em determinados horários e locais? Isso tem a ver com a organização dos rolezinhos, como uma forma de protesto a essa proibição? Não tem nada a ver com as proibições dos rolezinhos. Eu sou a favor de não ter bailes todo dia, toda hora, na madrugada e na rua, porque temos que respeitar as outras pessoas. Mas se forem proibir o funk na rua tem que arrumar outros espaços, porque proibir é fácil, difícil é dar opções.

*Virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal

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imagens que viram

Cantos, encantos e cores

Fátima Ribeiro, do Virajovem Lavras (MG)*

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ivenciar a história, ouvir as lendas, as tradições culturais que se materializam nas danças, no vinho, nos bordados, nas moradias e na comida, é lição para a vida toda! As paisagens da Ilha da Madeira deslumbram, os caminhos tiram o fôlego, a comida desperta sentidos e sabores ímpares, as flores estão por toda a ilha nas quatro estações. As pessoas são assim, um misto de tradição e modernidade e se orgulham de lá viverem, de suas raízes. Nem só o mar encanta com seus tons e com a luz que reflete; as florestas causam encantamento pelos caminhos da ilha. Floresta essa chamada de Laurissilva, classificada pela UNESCO como Patrimônio Mundial da Humanidade. Sentir prazer, no alto do Pico do Areeiro (1.818m de altitude), literalmente acima das nuvens; sentir encantamento em Porto Moniz, onde o mar é soberano, se deslumbrar com as flores e a vegetação do mundo todo no Jardim Botânico foi um presente inesquecível!


Ilha da Madeira Principal ilha do Arquipélago da Madeira, situado a sudoeste da costa portuguesa Capital: Funchal População: 265 mil habitantes *Uma das virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal

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Rumo à Tunísia Documento final do Fórum Social Temático de 2014 aborda temas centrais sobre o sistema capitalista e superação de crises pelo mundo

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Tulio Bucchioni

Evelin Haslinger, do Virajovem Porto Alegre (RS)*; Tulio Bucchioni e Vania Correia, enviados da Vira a Porto Alegre (RS)

edição 2014 do Fórum Social Temático (FST) encerrou-se em 25 de janeiro, em Porto Alegre (RS), com a Assembleia dos Movimentos Sociais, que contou com a presença de representantes de centrais sindicais, partidos e organizações políticas, pastorais e movimentos sociais. Depois de quase uma semana de atividades e fóruns paralelos, o evento, que nesta edição teve como temática Crise Capitalista, Democracia, Justiça Social e Ambiental, foi concluído com um documento final. O próximo Fórum Social Mundial acontece em 2015, na Tunísia. O documento final, ratificado durante a assembleia, expressa a posição comum dos movimentos em relação a temas considerados centrais para a superação das crises vivenciadas pelo mundo e contra o capitalismo. A democratização da comunicação aparece como condição para a luta de ideias da qual depende a sua vitória em todos os demais pontos citados na carta. A reforma agrária; criação do Estado Palestino; o fim da violência contra a mulher; eliminação das armas nucleares e o fim da OTAN; superação do racismo, entre outros, foram temas abordados no documento genérico. Como encaminhamento, a declaração convoca os povos do mundo para um dia de ação global contra o capitalismo a ser realizado em 1º de abril, data em que o golpe militar no Brasil completa 50 anos.

Por outra educação possível A tendência de sufocar as diversidades a favor de um padrão comum que não existe, mas que se impõe, foi denunciada como um desafio para a sociedade e, prioritariamente, para o sistema de educação durante 16

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Movimentos sociais e centrais sindicais marcam presença em Marcha realizada em Porto Alegre

o Fórum Mundial de Educação (FME), que aconteceu de 21 a 23 de janeiro, em Canoas (RS), antes do início oficial do FST. “A escola não sabe o que fazer com a diversidade, com os valores distintos dos sujeitos que a frequenta. Ao professor é exigido educar com base num padrão”, destaca o argentino Alberto Crocce, da Campanha Latino-Americana pelo Direito à Educação. Lucia Regina Brito, uma das educadoras que representou o Brasil no grupo de trabalho “Educação, Diversidade e Inclusão”, chamou atenção para o que identificou como um voluntarismo de professores e diretores de escolas públicas para tratar o tema da cultura e história africana na escola. Lúcia destacou a necessidade do cumprimento da Lei 10.639, que estabelece a obrigatoriedade do ensino da cultura e história do continente africano em sua diversidade, das


Ciranda de Comunicação Compartilhada

lutas e do papel dos povos negros na formação da sociedade brasileira.“É preciso conhecer, recuperar a população negra, que sempre esteve marginalizada e excluída da cultura brasileira; a cultura negra é um dos pilares desse País”, considera. Apesar de discutir temas centrais para a educação, o FME contou com baixíssima presença de estudantes. Albert Sansano, do Conselho Internacional do FME, reconhece que tem sido um desafio acertar as estratégias para garantir a participação dos debates do Fórum. “Precisamos aprofundar o debate com a juventude e integrá-la melhor, mesmo que isso signifique mudar formatos organizativos. Queremos a juventude aqui.”

Cerimônia homenageia comunicadoras e comunicadores, de vários lugares do mundo, mortos por militarem na defesa da mídia livre

A abertura do Fórum Mundial de Mídia Livre, espaço integrante do Fórum Social Temático, prestou homenagem às mulheres e homens comunicadores assassinados nos últimos anos por militarem em defesa da mídia livre, em sua maioria jovens de até 30 anos. Também foram homenageados militantes da Palestina, Curdistão, Quênia, Brasil, Estados Unidos, Canadá e México, entre outros países. Inserindo-se em um processo de resgate do acervo e da memória dos espaços ligados ao Fórum Social Mundial (FSM), a homenagem aos militantes comunicadores foi feita por meio da exposição Presenças, primeiramente exposta na Tunísia e que este ano foi para Porto Alegre. “Essa exposição sempre emociona. Conta a história de gente com quem aprendemos a fazer a caminhada pela mídia livre. A entrega está sendo feita ao Memorial do FSM, em Porto Alegre, para que as histórias de construção de outro mundo possível e da conquista de outra comunicação necessária sejam contadas juntas a quem for chegando para mudar e melhorar tudo outra vez”, explica Rita Freire, da Ciranda - Comunicação Compartilhada. Dando continuidade às atividades, na tarde do primeiro dia do Seminário Internacional do Fórum Mundial de Mídia Livre (FMML), a liberdade de expressão e a comunicação pública foram debatidas em duas rodas de conversa. A atividade teve como foco a construção da Carta Mundial de Mídia Livre e a preparação para o 4º Fórum Mundial de Mídia Livre, que acontece em 2015, na Tunísia.

Rodas de conversa durante o FMML debateram a liberdade de expressão e a comunicação pública

Tulio Bucchioni

Outra mídia necessária

tá na mão Fique a par dos debates e acontecimentos do FST, FME e FMML, acessando www.agenciajovem.org

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capa

Aprender antes de começar Os cursos técnicos são opção para jovens que não esperam a faculdade para se especializar e obter qualificação para o mercado de trabalho

Igor Bueno, do Virajovem São Paulo (SP); Evelin Haslinger, Iris Sanhudo e Paula Schmitz, do Virajovem Porto Alegre (RS); Diego Teófilo, do Virajovem Belém (PA); Webert da Cruz, do Virajovem Brasília (DF); Sebastian Roa, do Virajovem Manaus (AM); Everton Nova, do Virajovem Salvador (BA)*; e Bruno Ferreira, da Redação

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ensino médio é um importante momento na vida de um adolescente. É nessa época que começa ou se reforça a busca por vocações e escolha profissional. Muitos se questionam sobre qual carreira seguir após terminar os estudos na escola. Outros, no entanto, não esperam a conclusão do terceiro ano para se descobrirem profissionalmente. Logo após o nono ano do ensino fundamental, certos de suas habilidades e desejos, alguns jovens prestam uma prova de ingresso em escolas técnicas. Em São Paulo, por exemplo, há as Escolas Técnicas Estaduais (Etec) e o Sistema S (Senai, Senac e Sesi), que oferecem ensino médio e cursos técnicos com duração de um ano e meio a dois anos. No entanto, apenas 6,4% dos adolescentes matriculados no ensino médio cursam também o ensino técnico, de acordo com o Censo Escolar 2012. A maioria dos estudantes é, portanto, composta por pessoas já adultas, que terminaram a escola. Em 2010, o Ipea lançou a publicação Juventude e Políticas Sociais no Brasil,, que traz um recorte das ações destinadas ao público jovem do País. Um dos capítulos trata de educação, tendo como um dos pontos em destaque a educação profissional e técnica. A presidenta Dilma Rousseff, em declaração durante o programa Café com a Presidenta, de 3 de fevereiro de 2014, afirmou que no ano passado foram feitas 5,7 milhões de matrículas no ensino técnico e profissionalizante; sendo 1,7 milhão nos cursos técnicos e 4 milhões nos cursos de qualificação profissional. Só pelo Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), iniciativa do governo

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A formação técnica introduz, na prática, conhecimentos científicos aos estudantes

Educação para além do mercado Segundo o último Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população jovem cresceu e hoje supera 50 milhões de pessoas de 15 a 29 anos. Muitos desses jovens enfrentaram diversas dificuldades no seu processo de escolarização. Alguns param de estudar para arrumar emprego e ajudar a complementar a renda da família. Outros continuam seus estudos,

Fotos: Arquivo pessoal/ Nelson Beute r Júnio

para a inclusão de pessoas com baixa renda em cursos técnico-profissionalizantes, em dois anos, foram mais de 600 mil matrículas em 1.872 municípios do País. Essa iniciativa contempla, especificamente, o público atendido pelo Programa Brasil Sem Miséria. Mais da metade dessas vagas são de jovens de 15 a 29 anos e 65% das vagas são ocupadas por mulheres. Pelo Pronatec, os estudantes recebem material escolar e didático, além de auxílio alimentação e transporte para frequentar as aulas.

tendo como finalidade o próprio mercado de trabalho. E, dessa forma, os cursos técnicos passam a fazer parte do objetivo de muitos adolescentes em razão da inserção qualificada no mercado. Esse era o objetivo de Vinicius Cardoso dos Reis da Silva, de 18 anos, que se formou técnico em Engenharia Mecatrônica em uma Etec de São Paulo. Mas apesar de ter gostado do curso, o jovem diz estar decepcionado com a falta de valorização do mercado de trabalho, e decidiu mudar de área e prestar vestibular para um curso de graduação na área biológica. “Percebi que o peso do técnico não é tão grande quanto se imagina e nem tão abrangente quanto a propaganda estadual incentiva. À frente do profissional técnico, há ainda o tecnólogo e, à frente deste, os acadêmicos. Vejo que esses outros dois profissionais são o futuro do técnico, que busca um futuro com bons horizontes”, diz Vinicius. Conforme pontua o professor Carlos Artexes, especialista em ensino técnico, essa modalidade de educação é útil não apenas para a inserção no mercado de trabalho. Para ele, o ensino técnico introduz o estudante a um conhecimento mais amplo sobre o mundo. “A formação técnica tem uma característica fundamental na formação humana de inclusão da tecnologia e da perspectiva do trabalho em uma dimensão mais ampla que a formação para o mercado de trabalho. Essa profissionalização tem um caráter transitório”, afirma. Breno Raphael Cordeiro Amador, de 19 anos, é estudante do curso técnico de Design de Interiores no Instituto Federal do Pará (IFPA). Ele prestou vestibular para a graduação em Artes Visuais no final de 2013, na Universidade Federal do Pará, mas não foi aprovado. O jovem relata que não enfrentou dificuldades na sua prova de aptidões e habilidades, graças ao curso técnico. “Procurei o ensino técnico por ser uma das poucas formas de me formar na área em que eu desejo atuar. E também por ser uma das formas que esse curso é oferecido, que não seja no ensino privado”, afirma Breno. Revista Viração • Ano 12 • Edição 104

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Além do bom desempenho em testes específicos, o ensino técnico, de acordo com Carlos Artexes, colabora para um melhor desempenho dos estudantes em provas de conhecimento geral, como é o caso do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). O especialista afirma que estudantes que cursaram o ensino técnico costumam ter melhor desempenho no exame em comparação aos que cursaram apenas o ensino médio regular. No entendimento de Carlos, isso ocorre porque o ensino técnico é a proposta que mais se aproxima da ideia de educação integral, contemplando dimensões fundamentais para a formação humana, como a científica, tecnológica, cultural e profissional. “É uma visão restrita pensar que o mercado de trabalho é estático e deve direcionar totalmente a oferta da formação técnica local. Por outro lado, a formação técnica pode e deve criar novas estratégias para os sujeitos e ampliar seu projeto de vida que inclui, inclusive, a continuidade de estudos”, analisa. Para Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, o ensino técnico não pode ser o único modelo de ensino médio de qualidade. “As escolas técnicas são importantíssimas para o ingresso dos estudantes em universidades e para o preparo para o mercado de trabalho, mas é preciso desenvolver outras formas de educação, por exemplo, com forte carga cultural, com oficinas de arte e cultura digital, que são tão decisivas para a entrada na universidade e mercado de trabalho quanto as escolas técnicas”, afirma. Daniel lembra ainda que muitos jovens optam pelo ensino técnico não pelo interesse em profissionalizar-se, mas principalmente pela qualidade do ensino dessas escolas. 20

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Linha do Tempo do Ensino Técnico no Brasil 1808 Com a vinda da Família Real para o Brasil, D. João VI cria o Colégio das Fábricas, considerado o primeiro estabelecimento instalado pelo poder público, com o objetivo de atender à educação dos artistas e aprendizes vindos de Portugal.

1889 Ao final do período imperial e um ano após a abolição legal do trabalho escravo no País, o número total de fábricas instaladas era de 636, com um total de 54 mil trabalhadores, para uma população de 14 milhões de habitantes e economia acentuadamente agrário-exportadora, com predominância de relações de trabalho rurais pré-capitalistas.

1909 É criada a Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica no Brasil. No começo, eram escolas de aprendizes artífices, destinadas ao ensino primário e profissinalizante.

1927 O ensino profissional torna-se obrigatório no País.

1937 A Constituição Brasileira prevê, pela primeira vez, o ensino técnico como direito.

2011 O governo federal cria o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), com o objetivo de ampliar a oferta de cursos de educação profissional e tecnológica, disponibilizando bolsas de estudo para estudantes de baixa renda.


O químico Nelson Beuter Júnior, que fez curso técnico antes de se graduar, apresentou trabalho em Congresso de Química, na Escócia

Escola técnica e humana O início de uma carreira feliz começou com um curso técnico para o químico Nelson Beuter Júnior, de 26 anos, que, assim como muitos de seus colegas, ingressou na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (URGS) e chegou a trabalhar por dois anos em Barcelona, Espanha, por indicação da escola técnica onde estudou. Formado técnico, em 2005, na Fundação Escola Técnica Liberato Salzano Vieira da Cunha, de Novo Hamburgo (RS), Nelson afirma que na instituição teve oportunidade de tomar contato com pesquisa e desenvolvimento nas ciências humanas e da terra. “Com os projetos que desenvolvi nesse período, me levaram a participações em feiras nacionais e internacionais, em países como Estados Unidos e Argentina. Cursei a graduação em Química, devido à experiência e o gosto adquiridos durante o Técnico. Hoje, atuo como Químico, mas muito do meu desenvolvimento profissional devo aos anos que exerci a função de técnico, que me trouxeram maturidade e experiência profissional”, diz Nelson. A escola técnica Liberato é uma instituição pública estadual localizada no município de Novo Hamburgo (RS), que atua desde 1967 na área do ensino médio profissional e, atualmente, oferece cursos de Química, Mecânica, Eletrotécnica, Eletrônica, Segurança do Trabalho, Automotivo, Design, Informática e Internet. São cerca de 3.600 estudantes provenientes de mais de 50 municípios do Estado do Rio Grande do Sul. Chegando à Liberato, já é possível perceber que se trata de uma escola diferente. Em 20 hectares de gramado, espaço onde os jovens aproveitam os intervalos e o tempo livre para conversar, descansar ou para tocar algum instrumento, os estudantes promovem um ambiente de lazer e divertimento. A estrutura física da escola conta com um parque de laboratórios específicos dos diferentes cursos técnicos,

com laboratórios das ciências básicas e sociais, como matemática, biologia, língua portuguesa, física, química geral, informática e língua inglesa, além de um complexo esportivo. Além dos cursos técnicos, a Fundação oferece uma série de atividades extra-curriculares, como cursos de extensão sobre cultura e cidadania, além da exposição dos projetos finais de curso na Feira Interna de Ciências e Tecnologia (Feicit) e Mostra Internacional de Ciência e Tecnologia (Mostratec). Para além de uma escola técnica, a Liberato oferece atividades que reforçam o repertório cultural dos estudantes. Esse é o caso da orquestra e do Coral da escola, além de festivais de música, teatro, literatura e olimpíadas esportivas. O diferencial da instituição, segundo o seu secretário executivo Ramon Fernando Hans, é a visão cidadã que se tem da educação, numa perspectiva não apenas técnica, mas também humana e cultural: “Não acreditamos no ensino compartimentado. Não existe técnico sem existir um homem e um cidadão. A investigação espontânea motiva o aluno na busca pelo conhecimento, que não estuda para ser aprovado na série, mas sim para evoluir no conhecimento”, afirma.

A questão do acesso Em São Paulo, por exemplo, para ingressar no ensino técnico público, é necessário prestar uma prova – o chamado vestibulinho – que seleciona os melhores colocados para os cursos oferecidos nas Escolas Técnicas Estaduais (Etec). O jovem Vinicius Cardoso, nota, entre os colegas, o alto poder aquisitivo dos estudantes do ensino técnico do Estado. “A minoria é de baixa renda. Apenas em cursos como Logística, por exemplo, oferecido pela mesma Etec onde estudei, é possível encontrar um equilíbrio entre as condições sociais dos alunos”, afirma. O professor Carlos Artexes defende a adoção de cotas para minimizar o que chama de “elitização” dos Revista Viração • Ano 12 • Edição 104

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cursos técnicos da rede pública de ensino. “A lei das cotas para a rede federal pode reduzir a perversidade da elitização ocorrida na oferta pública de formação técnica. Houve um tempo que se analisava a sociedade brasileira a partir de uma leitura do dualismo estrutural. Atualmente, considera-se uma dualidade invertida, em que aos pobres é reservado um ensino médio de baixa qualidade e não profissional.” Daniel Cara, da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, defende uma educação que contemple a diversidade. “A heterogeneidade tem sido acompanhada pela desigualdade. Os cursos técnicos são válidos, mas é preciso desenvolver mais alternativas para o ensino médio.”

Em outros países Ainda que poucas, as escolas técnicas são uma boa porta de entrada para o mercado de trabalho e ensino superior no Brasil. A demanda por esse tipo de escola ainda é maior que a oferta, tornando o acesso restrito. No Brasil, é comum encontrar adolescentes que fazem cursinho preparatório para não ficar para trás. Porém, em outros países a situação é diferente. Na Colômbia, por exemplo, há um grande índice de exportação de latifúndios da terra. Por isso, o país percebeu a importância de possuir mão de obra qualificada para tratar dessa demanda, tornando mais democrático e abrangente o acesso a cursos. Qualquer jovem matriculado na rede pública de ensino pode fazer um curso técnico, sem a necessidade de fazer um exame e concorrer com milhares de outros alunos. Basta interessar pelos cursos que a escola oferece, como Economia e Agronomia, por exemplo. Ainda na América do Sul, o Equador também se destaca pelos seus colégios técnicos. O país já possui um plano fortificado e se planeja para ampliar o número de escolas técnicas em 23% até 2016. Na Argentina , há uma legislação que garante a educação técnica como um direito de cada cidadão do país. Diferentemente do Brasil, os argentinos oferecem cursos de nível técnico sem vestibular. A jovem colombiana Diana Cardenas Montoya, de 25 anos, é estudante de química. Cursou parte do ensino médio no Instituto Nacional de Ensino Medio Diversificado (Inem). Segundo ela, o acesso a esse tipo de escola no seu país é um pouco mais democrático. “Foi super fácil entrar. Bastou ter vaga. Estudei com muitas pessoas, de várias classes sociais. Havia *Virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal

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indígenas junto, foi uma experiência única. Os cursos técnicos são muito enriquecedores. Em alguns casos, constitui aquele primeiro contato com o conhecimento fora de uma sala de aula. Um técnico adquire experiência, que posteriormente pode lhe ser útil tanto para continuar seus estudos e seguir sua carreira profissional na mesma área, como para ir direto ao mercado de trabalho, e é neste ponto que é importante que essa educação seja mais acessível”. Para Diana, o que beneficia muitas pessoas na Colômbia é o acesso livre a qualquer estudante da rede pública a este tipo de ensino. “Ao passar por essa experiência, pude conhecer vários colegas que, após se formarem, conseguiram bons empregos como técnicos, podendo ajudar muito suas famílias, que, aliás, em alguns casos, mal tinham concluído o ensino médio. Vários deles, muito esforçados, hoje em dia são concursados, e conseguiram mudar completamente sua situação financeira”, afirma.

Processo mais educomunicativo Esta foi a segunda reportagem de capa da Viração realizada colaborativamente pelo Google Docs. A primeira experiência foi com a matéria sobre Economia Solidária, publicada na edição de novembro do ano passado. No final do janeiro, foi criado um documento na plataforma, inicialmente apenas com itens a serem desenvolvidos no âmbito do tema “ensino técnico”. A partir disso, os núcleos virajovens interessados em participar dessa pauta, foram adicionando suas contribuições, que passou por uma edição final compartilhada com todos os seus autores para apreciação, discussão e aprovação. Isso tornou o processo de produção ainda mais dinâmico e dialógico. Virajovens das cinco regiões brasileiras colaboraram com esta reportagem.

tá na mão Para saber mais, procure: http://pronatec.mec.gov.br/. Conheça a Escola Técnica Liberato, de Novo Hamburgo (RS) em: www.liberato.com.br

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Cara nova às coisas velhas

A customização traz o estilo pessoal como prioridade, é sustentável e segue na contramão do consumismo desenfreado

Evelin Haslinger, Iris Sanhudo, Mônica Oliveira e Paula Schmitz, do ViraJovem Porto Alegre (RS); Ingridy Almeida, do ViraJovem Lima Duarte (MG)*

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uita gente diz que o ano começa de verdade depois do carnaval, quando a correria para a compra de material escolar volta com tudo. Por que não usar a criatividade e colocar o seu estilo nessa volta às aulas? Você pode dar cara nova àquela mochila que já não está tão nova ou que você nunca usou. Ou ainda criar uma linda capa para aquele caderno pouco usado do ano passado. Além do material escolar, você pode também dar uma renovada no guarda-roupa e customizar camisetas, bermudas, calças e bolsas… Enfim, peças que você não curte mais. O melhor de tudo isso é dar uma cara nova às suas coisas velhas e economizar uma boa grana.

Mas, o que é customizar? Customizar é personalizar, dar a sua cara para uma roupa, um acessório ou mesmo um objeto. Quem customiza deixa as peças diferentes e exclusivas, muitas vezes por um preço bem abaixo do mercado. As peças mais customizadas são as camisetas, pois permitem infinitas possibilidades. Podem ser as básicas, do dia a dia, ou mesmo aquelas chamadas abadás, que funcionam como “camisetas de ingresso” para festas e baladas. As modificações podem ser feitas com recortes, costuras, tingimentos e aplicações. O mais legal da customização é justamente dar asas à imaginação sem gastar muito dinheiro. Na hora de colocar a mão na massa, o que vale é a criatividade.

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A customização é uma atitude sustentável, já que em vez de comprar uma roupa nova você renova uma que já está no armário. O ideal é usar acessórios que já tem em casa. Se não, procure na papelaria ou na casa de artesanato mais próxima a você e compre dentro das suas condições financeiras, procurando não desperdiçar materiais. Algumas lojas já vendem retalhos de tecidos, uma ótima alternativa para quem quer customizar. Aquele caderno que você ganhou e não gostou, ou que usou poucas folhas, pode ser personalizado com aplicações de fotos, tecido, recortes de revista, e outros inúmeros materiais. Uma calça jeans velha vira um shortinho jeans esfiapado, super na moda. Quer ousar? Pode tingir o shortinho, aplicar spikes ou strass. A velha mochila pode receber aplicações de botões, bottons-pins, miçangas, tecido... Antes de comprar os materiais para customizar, pense bem no quanto você vai utilizar para evitar o desperdício e o gasto além da conta!

Customizar é possível ! Durante o Fórum Social Temático, realizado em Porto Alegre (RS), no mês de janeiro desse ano, conhecemos o Luciano Bueno, de Londrina (PR). Desde 2008 ele customiza roupas e ensinou passo a passo o corte de uma camiseta. Confira o vídeo com Luciano Bueno no link: http://migre.me/hIgpp


Ainda durante o Fórum, registramos fotografias de algumas peças de um coletivo de economia solidária, o Misturando Arte. Desde 2006, o grupo de artesãos produz camisetas, brincos, luminárias, bolsas, tudo com materiais reutilizados e customizados. Outro exemplo é o da jovem Ana Paula Santos, de 20 anos, de Canoas (RS), que resolveu customizar tudo o que veste ainda aos 13 anos, quando passou por uma situação nada legal. Tintas de cabelo mancharam suas roupas novas. Por isso, teve que arranjar uma forma de reformar as roupas manchadas sem que sua mãe percebesse. A partir desse dia, percebeu que poderia fazer isso sempre.

Eco fashion Hoje, já se fala em moda sustentável ou ecofashion, uma proposta com estilo e consciência ambiental. Compras e vendas em brechós, uso de tecidos orgânicos, tingimentos de roupas com produtos não tóxicos, reaproveitamento de garrafas pet e roupas usadas na confecção de tecidos e acessórios, a customização de roupas, o desapego ao guarda roupa, passando adiante o que não se usa mais, fazem parte das práticas de moda sustentável.

Para facilitar na hora da customização

Fotos: Evelin Ha

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1. Tesoura: sempre é bom deixar reservado em sua casa uma tesoura para tecidos e outra para papel. Se você usar a mesma para os dois materiais, perderá mais rápido o fio para o corte; 2. Cola: Informe-se, lendo a embalagem do produto, para que tipo de material é indicado o uso, tempo de secagem e como manusear. Limpe a superfície a ser colada e, se precisar, utilize espátula ou régua para auxiliar o trabalho. A cola branca, PVA, por exemplo, é ideal para aplicar tecidos em madeira ou papel e impermeabilizá-los. Se achar necessário, dissolva com água. A cola de contato é indicada para uso em couro, borracha, madeira, EVA, tecido. Existem colas especificas para tecidos; 3.Tecidos: os de algodão são sempre os mais indicados, mas você pode encontrar opções com um valor mais acessível como tricoline ou chita. Quando customizar em tecidos com lantejoulas ou miçangas é preferível costurar em vez de colar.

tá na mão Saiba mais sobre customização nos sites: Misturando Arte: www.facebook.com/MisturandoArteRS/info Oficina de Estilo: oficinadeestilo.com.br/tag/moda-consciente/ Eco Fashion Brasil www.ecofashionbrasil.com Customizando www.customizando.net Com materiais diversificados, é possível reformar e personalizar seus objetos pessoais, como cadernos, bolsas e carteiras

*Virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal

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As charadas estão no rock brasileiro Mesmo sem saber, Barão Vermelho, Skank, Legião Urbana e Titãs já tinham (escondidas em suas músicas) as dicas para fazer a rede de adolescentes do Paraná dar certo Diego Henrique da Silva, do Virajovem Curitiba (PR)*

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ingar muito no Twitter e disparar caracteres de pura revolta no Facebook, definitivamente, não são as melhores formas de crianças e adolescentes fazerem com que seus direitos sejam respeitados. Nada contra a utilização das redes sociais para se expressar, mas é que adolescentes de cinco diferentes macrorregionais do Paraná estão se unindo para consolidar uma rede que criaram no ano passado, com o intuito de ajudar a melhorar a vida de meninos e meninas no Estado deles.

A metralhadora cheia de mágoas do Cazuza e do Barão Dias sim, dias não, eles foram sobrevivendo sem nenhum arranhão e já participaram de cinco ciclos itinerantes de formação, totalizando 25 encontros, que reuniram cerca de 250 adolescentes das regionais de Maringá, Foz do Iguaçu, Londrina, Curitiba e Ponta Grossa. Eles estão se articulando para fazer a Rede Pontes, nome que escolheram para a rede engrenar de vez. Essa “engrenagem” já começou a girar! Desde setembro de 2013, eles definiram o seu propósito e missão e já estão realizando novas ações. De modo geral, a intenção é compartilhar e trocar informações com crianças e adolescentes sobre seus direitos, incentivando-os à participação política e social. Como o tempo não pára, os integrantes da Rede não conheceram Cazuza em vida, mas, certamente, vão ficar de olho para que a piscina dos direitos de crianças e adolescentes não fique cheia de ratos... 26

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Acervo da Rede

Eu te chamei a atenção não foi à toa, não A Rede Pontes quer ajudar crianças e adolescentes a não se tornarem pacatos cidadãos. Uma das diversas formas pra evitar que isso aconteça é incentivar a participação da garotada nos conselhos municipais dos direitos da criança e do adolescente. “Minha ideia para que todos saibam da existência dessas reuniões seria a tal divulgação... Não uma divulgação tipo horário eleitoral, mas sim algo mais dinâmico, que chame a atenção. Algo interativo, divertido e que, ao mesmo tempo, Representantes das cinco regionais da lembre a todos qual o propósito de tudo aquilo”, sugere a Rede Pontes participam, mensalmente, adolescente Mônica Almeida, que mora no município de das reuniões do CEDCA/ PR Sarandi (PR) e integra a Rede Pontes na regional de Maringá. Como de pacato os adolescentes dessa rede não têm nada, vários deles já começaram a incidir politicamente nos espaços públicos, como fez Leandro Olegini Durizotti, de Curitiba. Em novembro de 2013, ele participou da reunião do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (CEDCA/ PR). Quando percebeu que os conselheiros estavam discutindo sobre a importância da participação dos adolescentes nos encontros dos conselhos municipais de direitos, aproveitou para dar uma sugestão no ato! “Sugeri que os locais e horários dessas reuniões fossem anunciados nas escolas de todo o Paraná. E nós, adolescentes, temos que comparecer aos conselhos das nossas cidades para mostrarmos a nossa força”, enfatizou. A banda Skank ia ficar orgulhosa se soubesse que a galera da Rede Pontes, “apoiada em poesia e em tecnologia” está fazendo a participação infanto-juvenil acontecer!

Será só imaginação? Por algum tempo, a formação da Rede Pontes foi só um plano da ONG paranaense Ciranda – Central de Notícias dos Direitos da Criança e do Adolescente, que desenvolve o Projeto de Formação e Articulação de Adolescentes para a Participação e o Controle Social juntamente com o Fórum Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Fórum DCA/PR). Esse projeto, que estimulou a criação da Rede Pontes, conta com apoio de diversas entidades e do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e Adolescente (CEDCA/PR), através de recursos do Fundo Estadual para a Infância e Adolescência (FIA). Entretanto, a rede foi tomando forma durante os encontros regionais, que abordaram as seguintes temáticas: direitos humanos de crianças e adolescentes; Sistema de Garantia de Direitos; Participação Popular e Controle Social; Políticas Públicas; e Orçamento Público. “A formação foi extremamente importante, pois dela surgiu informação e a segurança para tratar, com convicção, nossas ideias buscando inseri-las em nossa realidade”, analisa Lucas Ribeiro, que integra a Rede Pontes na Regional de Maringá. Revista Viração • Ano 12 • Edição 104

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Hoje, tentando responder ao vocalista da banda Legião Urbana, Renato Russo, quando ele pergunta “será que vamos conseguir vencer?”, já dá pra dizer que temos uma resposta. Ela vem do seu “chará”, Renato Eliseu Costa. Renato [não o Russo] fez parte da equipe de palestrantes no período de formação dos adolescentes da Rede Pontes e é membro, pela sociedade civil, do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda); além disso, também é coordenador nacional de ação pública da Fundação Fé e Alegria do Brasil. “Tenho plena convicção de que o modelo da Rede Pontes deve sim ser aplicado, não somente no Paraná, mas em outros Estados, além de ser incorporado às formas de agir de outras organizações, até mesmo nos modelos de formação e ação aplicados pelos órgãos estaduais e os conselhos. Certamente, é uma experiência que valoriza o jovem e o ajuda a assumir a vida pelas próprias mãos”, analisa.

mais figurinhas sobre suas realidades e replicarem as experiências das ações que já deram certo”, avalia Juliana Cordeiro que, juntamente com Rafael Lira e a Rita Jys desenvolvem o projeto e dão uma força para a Rede. Até o final deste projeto, os adolescentes vão produzir coletivamente quatro jornais, que circularão em todas as regionais em que a Rede Pontes está presente. Além disso, a ONG Ciranda produzirá um livro compartilhando as suas experiências ao desenvolver este projeto e o disponibilizará como instrumento para ajudar outros Estados brasileiros a replicarem as metodologias adotadas.

Retirando toda pedra do caminho Em 2014, a rede já sabe que “é preciso ter cuidado pra mais tarde não sofrer” com a quebra dessa ponte, coisa que eles certamente vão se esforçar para que não aconteça [evitando decepcionar a galera do Titãs e os compositores Roberto Carlos e Erasmo Carlos também]. Pensando assim, a Maria Eduarda Garcia, integrante da Rede Pontes na Regional de Londrina, reforça que é trabalhando de forma unida que a rede conseguirá incentivar cada vez mais a participação dos adolescentes nos espaços públicos. “Pra mim tem sido o ideal porque quando se trabalha em uma Rede as coisas acontecem de um jeito muito mais funcional, várias pessoas com um mesmo objetivo têm mais sucesso na efetivação de projetos ou ações”, afirma. “A rede está se consolidando, por isso, o principal desafio para este ano é a realização de mais ações integradas. Espero ver os adolescentes das regionais trocarem

tá na mão Acompanhe as atividades da Rede Pontes pela fanpage, em www.facebook.com/redepontes1

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Cada um dos 25 encontros de formação contou com, aproximadamente, 50 adolescentes

Você sabia? Existem três tipos de rede: a centralizada, a descentralizada e a multicentralizada. Quer entender melhor sobre o que dizem os estudiosos de redes? Então assista à palestra do Augusto de Franco, que aconteceu no TEDx São Paulo! http://migre.me/hJjUl

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*Um dos virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal


Pelo direito de ir e vir! Gizele Martins e Thais Cavalcante, do Virajovem Rio de Janeiro (RJ)

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Que Dá

Foliões se organizam para início do desfile na Maré

Crianças mostram cartazes que carregaram pelas ruas

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Arquivo Se Benz e

á nove anos, o bloco carnavalesco Se Benze que Dá faz a alegria dos moradores do Conjunto de Favelas da Maré, uma das maiores favelas do Rio de Janeiro. É um bloco formado por moradores militantes de algumas favelas que compõem o conjunto e o seu principal objetivo é tocar, cantar e sambar, mas sempre levantando a bandeira pelo direito de ir e vir. O bloco sai duas vezes ao ano, um sábado antes e outro depois do carnaval, passando por pelo menos dez comunidades da Maré. E esta é uma favela conhecida por suas fronteiras visíveis e invisíveis e, por isso, o nome Se Benze que Dá e a ideia de percorrer as ruas fazendo com que os moradores ocupem o seu espaço, o seu chão. No ano passado, o tema escolhido foi o Crack. Foliões saíram pelas ruas protestando pela não internação compulsória e tratando o tema como um caso de saúde e não de polícia. E o crack, infelizmente, passou a estar presente no dia a dia do mareense, pois nela há uma das maiores cracolândias do Rio. “Todos os temas do bloco são escolhidos a partir de uma conversa e é sempre um assunto que esteja visível na Maré. Depois que a galera (usuários de crack) foi expulsa da favela de Manguinhos, por causa da entrada da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), eles vieram para cá. Aqui tem um grande número de dependentes desta droga, e muita coisa tem acontecido com eles”, disse Priscilla Monteiro, moradora e foliona. Segundo a mestra de bateria Geandra Nobre, é significativo desfilar pelas favelas da Maré cantando músicas que tratam de um tema tão presente no dia a dia dos moradores, como é hoje o crack. “Desfilar pela Nova Holanda, umas das favelas da Maré, onde tem um foco grande de usuários de drogas fortalece ainda mais a luta no Se Benze. É um desfile político. A gente levou a mensagem de que este é um caso de saúde pública”, afirma. Este ano, os integrantes do Bloco Se Benze que Dá, receberam uma homenagem do Bloco carnavalesco O Samba Brilha, na Cinelândia, Rio de Janeiro, por seu histórico de resistência no Conjunto de Favelas da Maré.

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no escurinho

fi

Guerreira do meio ambiente Sérgio Rizzo*

N

o cinema, os heróis de crianças e jovens brasileiros são majoritariamente estrangeiros. Um dos motivos: a produção infantil no país é pouco numerosa e muito irregular. Por causa disso, torna-se ainda mais notável o feito alcançado por uma personagem indígena que protagonizou três longas-metragens em um período de dez anos e se tornou familiar para milhões de espectadores: Tainá, a brava guerreira de uma tribo amazônica. Ela foi apresentada em Tainá – Uma Aventura na Amazônia (2001), dirigido Cena do filme Depois de Maio, por Sérgio Bloch e Tania Lamarca. Depois, do diretor francês Olivier Assayas reapareceu em Tainá 2 – A Aventura Continua (2004), dirigido por Mauro Lima. Em ambos, quem fez o papel foi Eunice Baía, que não tinha mais idade para voltar à personagem em Tainá – A Origem (2011), mas participou da produção e da divulgação do filme, como um dos apoios à indígena Wiranu Tembé, que assumiu o desafio. Em suas aventuras, ela está sempre integrada à natureza da região e procura defender a floresta de agressões variadas. Dirigido por Rosane Svartman (que assinou as comédias Como Ser Solteiro e Desenrola), Tainá – A Origem volta no tempo para revelar como foi que a personagem ficou órfã, sendo criada pelo avô, um sábio que apresenta a ela os valores e segredos da vida na floresta. Sabemos também, em uma chave mitológica, por que a proteção da Amazônia está prevista em seu destino. Rosane, o produtor Pedro Carlos Rovai e a roteirista Claudia Levay (que morreu em novembro de 2013, aos 51 anos, em decorrência de um câncer) mantêm essencialmente os traços da personagem já apresentados nos filmes anteriores, mas exploram mais, neste terceiro longa, as peripécias infantis. *www.sergiorizzo.com.br

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que figura!

Da redação à militância Eneida de Moraes ultrapassou os limites de uma época para declarar seu amor pela arte de escrever

Jorge Anderson, do Virajovem Belém (PA)*

J

ornalista, escritora, militante, mãe, artista, mulher. Assim foi Eneida de Villas Boas de Moraes. Nascida em 23 de outubro de 1904, em Belém do Pará, em meio ao auge da belle-époque. Em 1930, fixou residência no Rio de Janeiro, onde morreu em abril de 1971. Mulher a frente de seu tempo, chocou a sociedade ao fazer parte de redutos até então exclusivamente masculinos, como o de intelectuais, boêmios e sambistas. Foi perseguida pela ditadura militar, chegou a ser presa por diversas vezes. Aos sete anos, já demonstrando curiosidade pelas letras ao participar de um concurso de contos infantis, narrou a história de um lenhador imaginário nas matas da Amazônia. Ganhou o primeiro lugar e prêmio de 20 mil réis pela ousadia da escrita realista contagiante e tão detalhada ao traçar um personagem cujas características refletiam a identidade amazônica. Da redação de jornais à filiação partidária, instância pela qual Eneida militou, não tardou para que a escritora mudasse para o Rio de Janeiro. Seduzida pelos ideais socialistas, filiou-se ao Partido Comunista do Brasil (PCB), dedicando-se ao ativismo revolucionário. Altamente marxista, Eneida contesta o poder constituído se fortalecendo nas reivindicações sociais e comunistas. Produz uma escrita sólida, ressaltando seu posicionamento de esquerda contra o sistema capitalista e as opressões do governo brasileiro. Seus textos foram veiculados em periódicos de jornais nas décadas de 1930 e 1940. Mesmo tendo passado por muitos percalços, a escritora não perdeu seu encantamento pelo carnaval. Dizia ela: “É no carnaval que todas as fronteiras sociais desabam”. O seu reconhecimento pelo carnaval brasileiro pode ser lido em História do Carnaval Carioca (1958), livro indispensável para quem quer conhecer mais sobre a festa popular. Hoje, sua obra continua a impressionar pela atualidade, sendo reconhecida como uma grande escritora e mulher brasileira.

“Eneida sempre livre/ Eneida sempre flor/ Eneida sempre viva/ Eneida sempre amor”. (João de Jesus Paes Loureiro) *Virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal

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sexo e saúde

G

ênero e sexualidade são questões que, no senso comum, se confundem com frequência. É preciso esclarecer que uma pessoa homossexual não necessariamente se identifica com o gênero oposto. Mas há casos de homens e mulheres que se caracterizam e se comportam como pessoas do sexo oposto. Em muitos dos casos, tratamse de homossexuais, mas há pessoas que, apesar de não se sentirem confortáveis com seu gênero, são heterossexuais. Para pessoas que não se sentem felizes com seu gênero, o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece uma cirurgia de genitoplastia. No entanto, antes de ser realizada, a pessoa transgênero passa por um acompanhamento psicológico por dois anos para se certificar da mudança. Sobre a questão, conversamos com Judit Lia Busnello, diretora técnica do Ambulatório de Saúde Integral para Travestis e Transexuais do Centro de Referência e Treinamento em DST/AIDS de São Paulo. Confira!

Da Redação

Como é o apoio psicológico a travestis e transexuais que desejam fazer a cirurgia de mudança de sexo? O acompanhamento psicológico é realizado por pelo menos dois anos. Normalmente a pessoa que deseja fazer a cirurgia passa por algumas entrevistas com o psicólogo. Se necessário, elabora-se um plano psicoterápico até que as questões percebidas nas entrevistas sejam resolvidas. Para as pessoas que não desejam ou não necessitam de psicoterapia, fazse um acompanhamento periódico que pode ser quinzenal, mensal ou mesmo bimensal, durante dois anos. Cada caso é estudado e o plano de psicoterapia é combinado de comum acordo entre psicólogo e paciente. Após os dois anos, exigidos pela portaria nº 2.803, 19/11/2013 do Ministério da Saúde, o acompanhamento poderá ser feito a intervalos maiores. O atendimento e acompanhamento podem ser realizados tanto em nosso ambulatório ou em serviços externos (particulares ou públicos), a critério do paciente. Como é, biologicamente, essa adaptação antes da intervenção cirúrgica? A adaptação proporcionada pela cirurgia é muito mais social do que biológica. É comum observamos que o início da mudança começa com o uso de hormônios ainda na adolescência, numa tentativa de feminilizar ou masculinizar o corpo. Em seguida, essas pessoas passam a usar roupas que o/a identificam com o gênero ao qual se sentem pertencer. É comum em ambos os sexos, esconder, camuflar aspectos que denunciam seu sexo biológico. Estes disfarces podem, entretanto, causar complicações, como ocorre em caso de silicone industrial implantado por “bombadeiras”. Quais os cuidados posteriores à cirurgia?

Mande suas dúvidas sobre Sexo e Saúde, que a galera da Vira vai buscar as respostas para você! O e-mail é redacao@viracao.org 32

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As orientações pré e pós-cirúrgicas para homens e mulheres trans são diferentes. Ao sair do hospital, a pessoa trans deve assumir a responsabilidade pelos cuidados necessários. O resultado da intervenção, em longo prazo, dependerá da consistência e qualidade do cuidado no pós-cirúrgico.


Prato Indígena na mesa Mingau de banana madura faz parte da tradição indígena do Alto Rio Negro Cláudia Ferraz, do Virajovem São Gabriel da Cachoeira (AM)*

A

s comidas tradicionais indígenas do Alto Rio Negro dão água na boca. Como em qualquer cultura, também entre os grupos indígenas amazônicos há pratos para o dia a dia e também para serem saboreados em ocasiões especiais. Esse é o caso da época de derrubada de árvores para fazer roça nova, lugar de plantação de frutas, verduras e criação de animais. Nessas ocasiões, as pessoas costumam organizar os trabalhos coletivos chamados ajuri. Ao longo do dia, as mulheres fazem mingaus de diversos tipos que são servidos aos trabalhadores, para que ganhem forças para continuar o trabalho. O mingau de banana, servido com peixe logo pela manhã, é uma refeição rica em proteína, ômega três e potássio, importante para quem trabalha utilizando força física. Confira como se prepara esse simples, mas delicioso mingau:

2 litros de água; 6 bananas pacovãs (também conhecidas como banana da terra).

Modo de preparo Descasque seis bananas pacovãs. Coloque-as numa panela com água para ferver e as cozinhe até amolecer. Retire as bananas cozidas da panela e deixe-as esfriar. Depois, passe-as na peneira para transformá-las em uma massa. Em seguida, devolva tudo para a panela e cozinhe novamente. Aproveite a mesma água, usada anteriormente, para cozinhar a massa de bananas. Mexa até ferver. Deixe cozinhar por um tempo, mas sempre mexendo, até engrossar o mingau. Apague o fogo e sirva. Bom apetite!

Virajovem São Gabri el da Cach oeira

Ingredientes

*Uma das virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal


parada social

Em cena, a juventude paraense Há mais de 20 anos, projeto educativo fortalece as lutas sociais por meio do teatro

André Souza e Alexandre Luz, do Virajovem Belém (PA)*

Fotos: Acervo Unipop

“C

ala a Boca Já Morreu” é uma mundo, da ética do cuidado a partir da expressão muito utilizada história de vida das pessoas, construindo nas brincadeiras infantis novas formas de perceber a sociedade e e deu nome a um projeto que serviu enfrentar os paradoxos da globalização, de marco para o movimento teatral que traz de um lado o desenvolvimento de Belém. A princípio, o objetivo tecno-econômico e, de outro, uma era apenas se apropriar do porão do grande exclusão. Instituto Universidade Popular (Unipop) Assim, com a proposta de trabalhar e transformá-lo num espaço alternativo uma formação sociopolítica atrelada aos e artístico ainda no final dos anos 1980. conhecimentos e técnicas do teatro, o Dessa iniciativa, tiveram origem outros curso reforça sua metodologia pautada dois importantes projetos: o grupo de na educação popular, contribuindo para teatro da Unipop e um curso de iniciação uma cultura de participação e luta em teatral voltado à comunidade. defesa dos direitos humanos. Criado em 1994, o Curso de Iniciação Teatral e Arte-educação da Unipop se consolida como um dos mais antigos cursos livres de teatro oferecidos na cidade de Belém. Sua criação inicialmente tinha como intuito fortalecer o trabalho desenvolvido por participantes de outros processos educativos da instituição, a partir de jogos, técnicas e montagens cênicas que visavam à ampliação do olhar sobre o espaço sociopolítico cotidiano e as O teatro faz parte das atividades da relações humanas entre os sujeitos Unipop, em Belém, desde os anos 1980 inseridos nesse contexto. Ao longo desse tempo, aproximadamente 500 pessoas já passaram por ele, em sua maioria jovens de 17 a 24 anos, muitos dos quais hoje seguem carreira artística com destaque na cena cultural da cidade. O exercício de colocar-se no lugar do outro, que o teatro permite, juntamente com discussões de situações vivenciadas pelas pessoas envolvidas, é um rico momento de *Virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal compreender o sentido de estar no


Fotos: Acervo Unipop


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