Coletânea de Textos brasileiros

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O grupo de professores dessa escola era especial. O compromisso com o bom trabalho estava à frente de tudo. Fazíamos o máximo para garantir o aprendizado daquelas crianças. Discussões em horário coletivo, troca de atividades e informações, cursos que tratavam da alfabetização, leituras e relatos faziam parte do nosso dia-a-dia. A busca para compreender o que ainda não sabíamos muito bem era constante. As crianças que saíam da primeira série não-alfabetizadas eram a nossa maior preocupação. Para atendê-las, formávamos classes homogêneas que eram assumidas pelo professor mais experiente do nosso grupo. O papel do grupo era apoiá-lo no que precisasse. Assumi uma dessas salas. Uma segunda série com 39 alunos no início e mais ou menos 15 no final do período letivo, porque no decorrer do ano, havia o remanejamento das crianças que conquistavam a base alfabética para outras classes mais avançadas e eu ficava apenas com aqueles que precisavam de mais ajuda. Fazia também um atendimento especial após o horário para os alunos com maiores dificuldades. Hoje vejo quanto equívoco cometi, não sabia como a heterogeneidade poderia ajudar tanto as crianças, como a mim nesse trabalho. É muito forte a idéia que temos de que as crianças aprendem se estiverem no mesmo nível de desenvolvimento, como se isso fosse possível. Por trás dessa crença existe o desconhecimento do quanto uma boa parceria pode ser produtiva para o desenvolvimento das crianças. No fundo, a idéia de homogeneidade encobre a falsa concepção de que, tendo os alunos o mesmo nível, fica mais fácil ensiná-los. Vila Dionísia fez parte da minha vida como um grande aprendizado. Pude aprender que não existem classes homogêneas, porque as crianças são diferentes; que o processo de aprendizagem de cada uma é ímpar; e que o professor tem que conhecer como as crianças aprendem, como pensam nesse período de construção do conhecimento da leitura e escrita, para que possa organizar seu planejamento a favor da aprendizagem das crianças. Mas sem dúvida, apesar da condução equivocada do nosso trabalho com relação à formação das classes homogêneas, pude aprender também o valor do trabalho coletivo. De poder contar com um parceiro para trocar experiências, reflexões e... as angústias que sentimos quando vemos que, apesar de tudo que estamos fazendo, algumas crianças não estão aprendendo. Principalmente quando percebemos que o que fazemos não é útil a todas as crianças e nos indagamos sobre o que fazer, como atingir aquele aluno a quem parece nada fazer sentido. O trabalho coletivo mostrou-me a importância da interlocução com os parceiros que estão atuando na mesma realidade, pois evidenciou que procurar juntos soluções para problemas comuns é muito melhor que sozinho. Foi acreditando no meu trabalho e trabalhando em conjunto é que descobri a importância de ser uma professora alfabetizadora. Acredito que essa experiência me tornou a profissional que pode enxergar os próprios erros como parte da construção do seu conhecimento.

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