Torres-Garcia: el niño aprende jugando

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Torres-GarcĂ­a el niĂąo aprende jugando

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Alejandro Díaz e Mariana Casares (orgs.)

1ª edição

São Paulo

2015



A criança e o sábio. ........................................................ 08 Alejandro Díaz

A criança aprende brincando. .......................................... 14 Obras............................................................................ 30 Juguetes...................................................................................................................31 Esboços...................................................................................................................38 Teatrinho e cenários.................................................................................................40

O desenho escolar.......................................................... 48 Curso ministrado por Joaquín Torres García no Instituto Normal de Senhoritas de Montevidéu, 1935

Versão fac-similada do caderno Dibujo Escritura. ............. 86


“Moldam-se as plantas pela cultura, e os homens pela educação. Se o homem nascesse grande e forte, a estatura e a força ser-lhe-iam inúteis até que tivesse aprendido a servir-se delas; ser-lhe-iam prejudiciais, pois impediriam que os outros pensassem em socorrê-lo e, entregue a sim mesmo, morreria de miséria antes de ter conhecido suas necessidades. Queixamo-nos da condição infantil e não vemos que a raça humana teria perecido se o homem não tivesse começado por ser criança.”

J. J. Rosseau, Emílio ou Da Educação, Livro I.

Arlequins, óleo s/ madeira, 1921-22

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A

presente exposição de Torres García na Biblioteca Mário de Andrade, reunindo objetos, brinquedos, desenhos, anotações e conferências de seus cadernos artístico-pedagógicos, sob o conceito de “brinquedos transformáveis”, constitui-se numa oportunidade única para educadores, pais e filhos, mas, principalmente, para as nossas crianças travarem contato com a obra e o pensamento desse que é considerado um dos mais importantes artistas modernos latino-americanos. Torres García subordina a educação e o ensino ao plano da criança, elevando o educador a esse mesmo plano, longe do qual é tão somente um repropositor nocivo de práticas sociais preestabelecidas ao longo das gerações das quais ele também foi uma vítima. Não é da conveniência ou do costume que virá a verdadeira compreensão da criança a respeito de suas próprias necessidades e desejos, nada podendo ser-lhe ensinado. A exemplo de Jean Jacques Rosseau, Torres García sustenta a opinião mediante a qual as instituições educacionais – a escola, por exemplo –, mais do que educar, corrompem a mulher e o homem do futuro, privando-lhe da liberdade de aprender, o que lhe é, a cada instante, e de acordo com as suas tendências naturais, o mais essencial. Numa de suas conferências (pela primeira vez editadas neste livro), o artista coloca que “a escola, antes de ser uma instituição social, deve ser uma instituição humana”. Ao plano da criança devem ser trazidas questões de natureza universal, o mundo, a água, o fogo, os ventos e o mar, o céu e a geometria, a navegação, sem se especificar países ou acontecimentos históricos, sem os nomes de outros, como meio de acordar a consciência para as suas reais necessidades. Tangencia o mesmo plano a Natureza e os modos como opera para a criação de seus entes: partindo de elementos fundamentais, abstratos, ela elabora elementos cada vez mais complexos a partir da disposição daqueles. Igualmente, para García, os brinquedos transformáveis possibilitam que a criança também parta de elementos gerais, abstratos, para a construção de expressões ou imagens concretas de acordo com aquilo que sua vida subjetiva prefigura. A construção, não orientada ou ensinada, dar-se-á naturalmente caso não se obste a criança, maculando a sua vontade com coisas que lhe são exteriores – entenda-se, as superfluidades da vida em sociedade. O bom professor ou o professor ideal de desenho coloca-se no nível do aluno, em seu plano, por intermédio do brincar. Brincando, a criança confere ao fazer uma qualidade que a orienta para aquilo que de fato ela é. A ordenação proposta no âmago desse fazer traz paras as mãos da criança, bem como para as do artista, o modo operatório da natureza na conformação de seus seres. Trata-se de propor para a criança o que Torres García denomina “desenho-escritura”, ou seja, o desenho como meio de expressão estética, o qual se subdivide conceitualmente em dois campos: o abstrato e o concreto. Articulando os dois campos, subdividem-se as ações dentro dele em lições nas quais se sugerem exercícios com linhas, entes geométricos fundamentais, cores primárias e desenhos de coisas ou situações em que sejam reconhecíveis esses elementos. Depois, gradualmente, projeta-se o mundo visível sobre essas estruturas primárias que o comentam plasticamente. A composição enfeixa as figuras sobre uma armação de natureza geométrica. Apura-se, então, a observação do mundo natural com desenho a lápis ou carvão. Da linha e dos contornos, procede-se às anotações de luzes e sombras: o programa albertiano (Leon Battista Alberti, 1404-1472) – circunscrição, composição, recepção de luzes – é aqui curiosamente reproposto. Esse desenho-escritura é programático, sendo a criança exposta a “objetos feitos pelo homem” e, em seguida, “a objetos naturais, a aspectos de coisas e da natureza, a acontecimentos humanos e da natureza”. A ordem e o regramento ainda estavam presentes nessas lições, como se vê, mas aplicados aos elementos para uma ação construtiva que se dá no plano da criança com a liberdade e a espontaneidade que lhe são inerentes por natureza. Três conceitos de natureza cruzam-se, portanto, nas obras e conferências de Torres García: a natureza da criança, a natureza da arte, a natureza da Natureza.

Luiz Armando Bagolin Diretor da BMA

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Joaquim Torres GarcĂ­a e sua filha Olimpia, 1912

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E

m janeiro e fevereiro de 1935, Joaquín Torres García deu cinco conferências cujo tema era O desenho escolar no centro de formação de professoras das escolas uruguaias do Instituto Normal de Senhoritas. No ano anterior, o artista, com seus 60 anos, carregando a família à tiracolo e dezenas de baús repletos de quadros, desenhos e manuscritos, tinha sido recebido com entusiasmo e expectativa a notícia de sua volta a Montevidéu. Ao longo dos anos seguintes, aceitou dar várias conferências, conversas e dissertações em estações de rádio, no Ateneu de Montevidéu, em faculdades e em sua casa, totalizando mais de quinhentas. Torres García recebeu essa tarefa do governo uruguaio antes do seu retorno de Madri, de onde havia chegado procedente de Paris, em 1932. O Uruguai esperava que esse artista já maduro e já dono de um prestígio ganho em meio às vanguardas europeias, como bom filho pródigo, contribuísse com novidades, trazendo tendências artísticas e conhecimentos adquiridos na Europa, atualizando essa pequena república, que então considerava a si mesma como a mais culta e “europeia” da América Latina. Com o seu habitual estilo direto, desde a primeira conferência, Torres García disse às futuras “moldadoras de crianças” que, para ele, o realmente importante no processo educativo não é o que a criança possa “adquirir”, mas

o que possa “perder”. Provavelmente um pouco consternadas, as alunas do instituto tiveram de escutar que, para esse importante artista (uma glória nacional), nada ou quase nada de valor pode ser ensinado ou aprendido. E ainda de maneira mais radical, pouco depois lhes dirá Torres: O pedagogo, sempre considerando um fim social e trabalhando inconscientemente, pensando no futuro homem que está moldando, acaba por matar a criança! Mata a criança e arranca uma flor. E, o que era aquela criança, aquela criança que morreu? Uma coisa preciosa, um sábio. Tão sábio que com ele poderíamos ter aprendido muito, saber o que não saberemos jamais porque sofremos a mesma sorte que ele. E por isso é que há tão poucos sábios no mundo e em troca há muitíssimos homens inteligentes.

Pode parecer que uma conferência ditada em um centro de formação docente – e cujo tema era o desenho escolar –, com a sua maior parte dedicada a expressar que a escola é uma das piores coisas que pode acontecer a uma criança, tenha sido certa forma um ato violento, uma espécie de provocação antissistema, quase um happening. Uma provocação sem fundamento tem sempre um caráter irônico, mas Torres García atuava e falava com a mais profunda e sincera convicção – o que rapidamente tinha lhe dado uma fama de apostólico com a qual não se incomodava muito. A inflamada defesa da criança realizada por Torres García tem como referência direta sua própria formação e prática docente no Colégio de Mont d’Or de Barcelona, onde atuou como professor de cerâmica e desenho para crianças entre 1907 e 1914. Esse colégio experimental, onde eram estudadas e praticadas as ideias de Fröbel, Dewey e Montessori, não era um caso isolado na Espanha, mas formou parte de uma notável rede de instituições educativas avançadas que se disseminaram na Espanha em finais do século xix e começo do xx, impulsadas pela instituição livre de ensino, projeto pedagógico que teve um forte papel de renovação na vida intelectual e educativa espanhola.

Joaquín Torres García, 1938

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As ideias e métodos do que logo se chamaria Escola Nova, baseados na liberdade, no interesse da criança como motor da aprendizagem e na função do pedagogo como facilitador de um processo de autodescobrimento, eram extraordinariamente afins à idiossincrasia de Torres García, que foi criado em um ambiente de grande liberdade e poucos condicionamentos. Torres foi uma criança de particular rebeldia – todas as tentativas de mandá-lo à escola tinham terminado em fuga –, então, como se conhecesse intuitivamente os postulados da Nova Escola, tornou-se um autodidata, estudando em casa com livros escolares e sendo guiado exclusivamente pelo seu próprio interesse. Posteriormente, ao longo de sua vida familiar, não foram poucos os amigos que perceberam um extraordinário ambiente de liberdade infantil e respeito pelas crianças na casa da família Torres Piña. Tratados como iguais, os filhos eram colaboradores do artista, não seus súditos. Tampouco os enviou à escola, ao menos enquanto pôde. De Barcelona, a família mudou-se para Nova Iorque para, entre outras coisas,

realizar a fabricação de brinquedos em grande escala, e foi nessa cidade, por ordem policial, que os filhos começaram a ir à escola. Mas logo emigraram – uma vez mais, e não a última nem a penúltima, para o norte da Itália, onde Torres García teve de retomar a educação dos seus filhos. Nesse contexto, criou seu Teatrinho, uma caixa mágica de onde saíam uma infinidade de histórias educativas ambientadas tanto na vida moderna quanto em diversas culturas da Antiguidade. No entanto, não é apenas a biografia do artista ou sua formação que explicam a postura extrema do artista na sua conferência sobre o desenho escolar em 1935 – que não foi somente uma nova forma de colocar as teorias da nova pedagogia. Há, quase no começo de sua fala, um trecho em que revela: “No tempo em que estava dentro da pedagogia, entre professores e entre crianças, entre livros e métodos de ensino, acreditava em outra coisa. Hoje, afastado de tudo isso, tendo recobrado uma independência em relação a essa fase que então não tinha, já não tenho aquele critério”. Chama a atenção a distância que o Torres García de 1935 põe em relação às suas convicções desses tempos em que estava “entre crianças e métodos de ensino”, porque as suas convicções “atuais” relativas à educação e à infância, em geral, estão totalmente de acordo com o essencial das ideias de Fröbel, Montessori e Dewey, para mencionar apenas três autores que o artista conheceu e estudou entre 1908 e 1913. Como se verá, a discrepância é consigo mesmo, com a ideia e os objetivos pedagógicos do – especificamente – ensino de desenho para crianças que ele mesmo tinha praticado durante sua fase como professor de desenho e cerâmica. Em um artigo sobre desenho nas escolas, publicado em Barcelona em 1908 e chamado “L’Art a l’Escola”, Torres García tinha plasmado a sua experiência docente. Montado no influxo da nova pedagogia, resgatava a importância didática do ensino do desenho no contexto escolar, propondo atitudes e práticas inovadoras. Torres abolia energeticamente a,

Joaquín Torres García, 1934

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O Torres García de 1908, com uma visão inovadora, mas convencional, queria ajudar as crianças a desenhar bem, a fazer o que ele fazia nesse momento: desenhar ou pintar procurando transpor plasticamente a realidade visual de maneira efetiva, convincente e, ao mesmo tempo, de forma pessoal e expressiva. Entretanto, na conferência dada às professoras em 1935, referindo-se à representação no desenho, ele dirá algo bastante diferente, deixando claro que tinha realizado um caminho em uma direção muito específica. Já não existe tal coisa como “desenhar bem”:

Torres Garcia com seus alunos no colégio experimental Mont d’Or, 1912

então, prática usual de copiar lâminas impressas e modelos de gesso no lugar de desenhar diretamente do natural. Criticava a imposição que se fazia para a criança de desenhar usando maneiras já dadas de interpretar as formas do natural, que se interporiam entre ela e a impressão clara da realidade, privando-lhe da possibilidade de exteriorizar depois essa impressão de uma maneira pessoal. Por outro lado, falando do papel do professor no ensino do desenho, Torres García afirmava: A força imaginativa da criança o aparta do conceito objetivo ou da consciência clara do objeto real. Por falta de dados positivos, tende a supri-los com os que tem internamente. Por isso, no começo, a criança, mais que objetos, desenha ideias de objetos. [...] Então, aqui, a lição do professor (não a correção, como se acostuma dizer) é lhe fazer notar que se tem deixado levar pela sua fantasia, fazendo-a passar de uma ideia para um objeto real. Em isso e em lhe fazer observar a proporção, o escorço, a relação de valores, as cores, a relatividade da forma conforme a situação de modelos em relação ao espectador [...] sendo que a parte educativa do desenho deve consistir em proporcionar dados ao discípulo para que possa construir uma imagem perfeita e retificar os conceitos equivocados.1

[...] ensinar-lhe [a criança] mostrando-lhe imagens fotográficas em que apareçam as linhas das perspectivas é um erro, pois aquelas linhas, assim vistas, não são na realidade tal como se veem, mas horizontais e verticais. [É preciso ensinar] que, no desenho, [a criança] terá de retificar esse erro e, portanto, que deverádesenhar a imagem que vê dentro de si, a imagem mental, e não a que veem seus olhos, pois a primeira é verdadeira e a segunda em erro visual.

Pintura visual e pintura mental são dois polos que conviveram e lutaram na arte e no pensamento de Torres. Uma das suas buscas permanentes foi tentar sintetizar de ambas, tanto na teoria quanto na realização plástica. Essa síntese adquire uma dimensão superlativa em muitos quadros construtivos nos quais a visualidade está implícita na qualidade pictórica da pincelada e nos planos de cores, ao mesmo tempo que a imagem mental se sublima na estrutura regulada pela medida harmônica e nos grafismos ou símbolo – expressão gráfica de ideia, forma e conteúdo em presença simultânea. No entanto, na necessidade de ser claro na sua mensagem, às vezes Torres exagerava posições. As sínteses que se produzem na realização plástica necessariamente se dissociam no discurso, tomando uma forma de oposição, simplificação que não responde a um mal-entendido por parte do artista, senão a uma necessidade de expressar as suas ideias mediante esse sistema de confrontação. Assim, o ar-

1. J. T. García, Escris sobre Art. L´Art a l´Escola.

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tista tendia a assimilar pintura visual com pintura figurativa, e pintura figurativa com pintura imitativa. Porque, à pintura que pretende reproduzir a realidade sem considerar a harmonia dos valores plásticos aos que recorre para realizar essa representação, Torres García chama – com bastante desprezo – pintura imitativa, que considera um engano. E não qualquer engano, mas um que integra uma espécie de mentira oficial, uma grande mentira sustentada por centenas de anos de desenvolvimentos técnicos da arte de pintar. A pintura imitativa tomava, no discurso de Torres, o lugar maléfico da aparência do mundo, do voo da ilusão. Uma ilusão feita de meros truques e convencionalismos e que colaborou com a armadilha para manter o indivíduo preso em uma existência convencional, apartado do plano do verdadeiro. Possivelmente, não há nada que repugne mais a Torres García do que a existência dentro dos meros convencionalismos, os bons costumes sem sustento na ética, as relações cordiais sem sustento nas pulsões internas e verdadeiras. Era avesso à rotina e ao “porque sim” sem a última certeza de um propósito, mesmo que este seja desconhecido. No manuscrito original em que ficaram registradas as conferências de 1935, há um fragmento que é uma espécie de descarga, um jogo (no sentido torresiano); outra forma – não conceitual, mas poética – que Torres García utiliza para expressar sua percepção do sem sentido no que, para ele, vai derivando o viver moderno. Esse fragmento, que

Desembarque de Torres García em Montevidéu 1934

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Manual de educação artística, 1909

não sabemos se teria lido ou não para as professoras, está escrito com a mesma vertigem futurista que impregna as páginas do seu notável livro New York, impressões de um artista, de 1921, no qual tinha mostrado de uma forma muito expressiva e original que, em sua opinião, o “moderno” está inextricavelmente associado a um sistema econômico, cultural e social no qual o indivíduo se convertia em mero instrumento de uma grande maquinaria de produção e consumo, ao mesmo tempo que perdia o contato com suas íntimas raízes humanas. Mas não está tudo perdido, não enquanto haja crianças, e – segundo Torres García – enquanto haja artistas. Pois, se para Torres a criança é um sábio por estar ligado ainda às raízes arquetípicas de nossa humanidade profunda, a arte não é um passatempo qualquer, nem um entretenimento, nem um luxo. Para Torres García, o artista, para poder realizar algo de valor, deveria se pôr em contato com certas verdades transcendentes e “dar testemunho” dessa sublime harmonia por meio de sua obra. Assim, o artista pode redimir ao homem, pois a arte é (ou deveria ser) uma manifestação da verdade, da estrutura e da harmonia íntima do universo. E essas não são para ele simples convicções teóricas, são parte de um modo de vida, de um estado de consciência a que


ele mesmo tinha chegado não sem esforço, renúncias e penúrias extremas. Não é esta a ocasião para relatá-las nem para intentar desembaraçar essa meada de algo que parece uma conversão religiosa laica, que se faria explícita em uma mística da pintura. Porém, é importante contextualizar a publicação dessas conferências inéditas, porque foram ditas no marco mais amplo da prédica incessante do professor, que certamente não tinha como finalidade a mera renovação do cenário artístico local, mas que [...] impulsionado por não se sabe o quê, com a finalidade de que tudo se eleve, empurra os outros, os remove, os seduz e até os atormenta. Já a si mesmo, não se deixa em paz, e se pergunta se está dormido, se quer estar mais vivo do que está. Deve tirar a cabeça do mundo real para ver mais, para compreender, para saber mais e fazer mais, como outros fizeram. Para cumprir com algo que, de longe, nos lembra um dever.2

Manual de educação artística, 1909

Referências Torres García, Joaquín. Escrits sobre art. La Caixa. __________. Universalismo constructivo. __________. New York, Impresiones de un artista. __________. Hechos. Manuscrito inédito não publicado. __________. Lo aparente y lo concreto en el arte. Fröbel, Friedrich. La educación del hombre. Krause, Karl Christian Friedrich. Ideal de la humanidad para la vida. Aladdin, Juguetes Transformables. Catálogo del Museo Torres García. Infancia y Arte Moderno. Catálogo del ivam. Centre Julio González. Aladdin Toys. Los juguetes de Torres García. Catálogo del ivam. Centre Julio González. Revista de Educación. Números 236-241. “Reformas e innovaciones educativas (España,1907-1939) en el centenario de la jae”. Revista de educación. La escuela nueva en el uruguay. Antes y después del “Plan Estable”. Abbagnano, Nicola & Visalberghi, Aldo. Historia de la pedagogía.

Alejandro Díaz Montevideo, agosto de 2015 2. Idem, ibidem, “Universalismo Constructivo. Conferencia n. 42”, Punto de referencia en lo eterno.

“La Escuela Nueva en Cataluña”. Disponível em: http://www.memoria. cat/ Wikipedia; María Montessori, Friedrich Fröbel, Johann Heinrich Pestalozzi, John Dewey, Ovide Decroly, Krausismo, Institución libre de enseñanza, Residencia de estudiantes de Madrid, Julián Sanz del Río.

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A criança aprende brincando1 Pois o jogo, para ela, há de ser exercício de múltiplas experiências e atividades. De criação e descobrimento. De conhecimento das coisas e de si mesma. De iniciação a futuras empresas e estudos. De revelação de sua personalidade. E, por isso, quem se encarregue de educá-la, jamais deverá privá-la dessa constante e livre atividade e, menos que isso, impor-lhe algo oposto. Devemos querer que chegue a ser um adulto livre. Livre no pensar e no agir. O brinquedo pode servir de meio educativo. Talvez não seja um dos mais importantes, mas, por excitar em tão alto grau ou interesse da criança, é realmente um princípio motor de primeira força, e deve ser aproveitado. O construtor de brinquedos deve se preocupar com isso. Deve pensar, antes de tudo, que a criança se move sobre realidades. Não sobre essas coisas fantásticas e inexistentes sobre as quais divagamos. O passado não lhe interessa, nem a poesia. Mas, ao contrário dessa inútil fantasmagoria, sua visão intuitiva a leva ao verdadeiro conhecimento e, por isso, à mais pura e real imagem estética. O brinquedo, portanto, há de ser algo em harmonia não só com todo o vivente que rodeia a criança, mas também com tudo o que for atual, do tempo presente, o que em maior grau que para os mais velhos, interessa aos mais novos. E isso – já não é preciso dizer –, interpretado ao compasso, também, da evolução estética. Porque, se o artista – o verdadeiro artista – por meio de sua obra, pode dizer que, em cada momento do tempo ou dos tempos, cria para todos algo à maneira de órgãos novos, para penetrar mais na essência da vida, porque não educar a criança desde o primeiro momento na mesma orientação? Isso é o que deve ser. E o mesmo com a relação à pedagogia, da qual o construtor de brinquedos deve ser um colaborador. Normalmente, vemos o contrário. O brinquedo costuma ser algo fantástico, que não responde a nada de tudo isso e, menos ainda, à realidade das coisas. Isso quando não é francamente escola de mau gosto, pelo grotesco, inclinando assim a criança às coisas superficiais e tendendo a formar seu espírito de acordo, ou pelas cores berrantes, ou pelo objeto do brinquedo em si. E há mais. Por carecer de sentido real, o brinquedo, em geral, não diverte a criança. Porque a ela, como já dissemos, não interessa nada além do verdadeiro. E por isso, também a pretensão de querer diverti-la constitui um grande erro, pois a diversão ou o jogo, para ela, consiste no exercício de seu espírito criador e na satisfação do seu afã de conhecimento, e não, como geralmente se acredita, em gastar o tempo com coisas vãs. Finalmente, permitam-nos duas observações que, por serem secundárias não deixam de ter importância: a fragilidade do brinquedo, em geral, e o anti-higiênico. A primeira pode constituir um engano com vistas ao lucro, muito censurável, mas, em si, sem transcendência. A segunda já é mais grave, pois envolve um perigo que se deve evitar. Ao contrário, o fabricante de brinquedos não será, como deve ser, o amigo da criança, mas seu encoberto inimigo. E os pais, culpados de cumplicidade. Para terminar, outra consideração. Se a criança quebra seus brinquedos, é, em primeiro lugar, para investigar, depois para modificar, e que faça o que quiser. Assim nos adaptaremos à sua psicologia. 1. Joaquín Torres García, 1919. Texto incluído no Catálogo de manufaturas de brinquedos, de Francisco Ramblà, Barcelona.

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Torres García e os brinquedos

I. Catalunha “O trato com as crianças nas escolas1 e o que ia observando em seus próprios filhos, fez como que TorresGarcía pensasse nos brinquedos, acreditando que ali havia algo para estudar e criar que estivesse mais de acordo com o que devia ser. Sabia que nada podia substituir as coisas naturais (água, terra, madeira) com que a criança se diverte e adquire habilidade e conhecimento, mas, já que se constroem brinquedos, ao menos que tenham relação com a psicologia infantil. E vendo, então, que nada, por enquanto, podia esperar da arte, e querendo criar uma situação independente, pensou em fabricar brinquedos. E, como nas outras ocasiões em que empreendia algo novo, pôs todo seu ardor e entusiasmo. Começou a criar alguns modelos, os quais, ao vê-los, o carpinteiro industrial que o ajudava nesse trabalho, pensando que com aquilo se podia realizar um bom negócio, propôs-se a formar uma sociedade a fim de reunir capital para fabricá-los em grande escala. [...] Torres-García aceitou, porque esse podia ser o meio, finalmente, de ser independente. E formou-se a sociedade, venderamse brinquedos e exportou-se.”2 Nesses parágrafos de sua autobiografia História da minha vida, Torres García sintetiza o começo da realização de seus brinquedos desmontáveis de madeira, em algum mo1. Desde 1907, Torres García deu aulas de artes plásticas no colégio experimental de Mont d´Or, fundado por seu amigo, o pedagogo Joan Palau i Vera. Esse revolucionário colégio também contava com Isaac Albéniz entre seus docentes. 2. Joaquín Torres García, História da Minha Vida, Barcelona, Editora Paidós, 1990, p. 143

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mento entre meados de 1917 e 1918. Esses brinquedos seriam companheiros de rota ao longo de uma peregrinação que o levou a Nova Iorque, Itália, sul da França, Paris, Madri e Montevidéu,3 e que tem na fabricação dos brinquedos um motor, o sustento material e, às vezes, um pretexto. O começo da criação e da fabricação de brinquedos coincide com o fim da primeira grande guerra mundial. O caótico estado social do momento é descrito pelo artista da seguinte forma: “Já começou a desenhar-se o desconcerto de hoje. Havia desorientação e falta de fé, e a bandidagem comercial ia se impondo pelo monopólio de tudo. Evidentemente, a guerra havia estragado as pessoas. Certa crueza na linguagem e nos procedimentos foram entrando na moda. Os valores morais caíam, havia atordoamento, nervosismo, incertezas. Loucura. [...] O equilíbrio se havia rompido, iniciava-se uma mudança, havia coisas que tinham caído em desprestígio e que seriam abandonados para sempre”. O próprio Torres García também estava em crise. Até pouco tempo antes, esse uruguaio filho de um emigrante catalão era considerado o pintor da Catalunha. Chegando à Espanha aos 17 anos de idade, seu profundo interesse pela arte clássica e sua busca pessoal de origens e identidade o puseram em aparente consonância com os postulados do noucentismo catalão.4 O momento culminante de vinculação de Torres García com esse movimento foi a encomenda que recebeu para realizar os afrescos do Salão “San Jorge” no Palácio da Assembleia de Barcelona.5 Esses murais, de inspiração neoclássica, mas modernos no seu plano e geometria, geraram uma grande polêmica tanto por sua estética despojada como por seu simbolismo. Quando em agosto 3. Entre 1916 e 1926, Torres García e sua família mudariam treze vezes de domicílio, em nove localidades diferentes. 4. Movimento nacionalista catalão de índole política e cultural que reivindicava a autonomia e a identidade catalães respaldadas em suas raízes clássico-mediterrâneas. 5. A encomenda foi realizada em 1912. O artista realizou quatro murais entre 1913 e 1916. O quinto e último permanece inacabado (somente realizado em esboço).


de 1917 faleceu Prat de la Riba,6 Torres García carece de apoio entre políticos e intelectuais e o trabalho é interrompido pelas novas autoridades. Os murais nos quais ele havia posto toda sua arte e empenho seriam cobertos com pinturas acadêmicas e amaneiradas,7 realizadas ao gosto da burguesia que as patrocinava. Um tempo antes do fim de sua participação no noucentismo, Torres García havia se distanciado asperamente do ideólogo do movimento, Eugenio d’Ors.8 “[...] o rompimento com d’Ors e os efeitos que isso casou desgostaram tanto Torres que ele quis buscar a independência mais absoluta possível. Viu que nada se podia fazer coletivamente e, por isso, quis artisticamente renovar-se por completo.”9

A primeira notícia conhecida sobre os brinquedos de Torres García está documentada em sua agenda pessoal. No dia 1 de julho de 1918, uma segundafeira, escreve: “De manhã, fui com Manolita10 à Exposição de Brinquedos”.11 Os brinquedos não foram comercializados diretamente pelo artista, mas foram realizadas exposições para incitar o interesse de comerciantes que os distribuíssem. Rapidamente, o empreendimento passou a absorver grande parte de seu tempo e energia. No dia 5 de novembro, conta a Barradas:12 “Ando metido em cinquenta mil projetos e soluções, em assuntos de todos os tipos, envolvido em intrigas (não minhas), em assuntos comerciais, em cálculos e estudos de problemas, enfim, em coisas alheias ao Foi então que, junto a uma renovação Cartaz publicitário do cavalinho andante espírito [...]. E, enquanto os pincéis dorna sua pintura, começa a fabricação dos mem o sono dos justos e as belas ilusões se distanciam até brinquedos de madeira. Concebidos como uma forma de perder-se de vista [...]. Em todo esse tempo, como vê, não gerar recursos com uma atividade ao mesmo tempo artística e comercial, os brinquedos tinham como missão con- pude me ocupar mais do que de resolver nossa situação quistar a completa independência material de seu criador, econômica e acredito que em breve, terei terminado o traapesar da aceitação que tivessem suas obras e suas ideias. balho de organizar, e tudo começará a andar definitivamente. A indústria de brinquedos será uma coisa séria – tanto como possam ser essas coisas”.13 Em carta de 24 de no6. Enric Prat de la Riba (1870 -1917). Político catalão. Militante precoce em defesa da identidade catalã. Ocupou diversos cargos e presidiu a Assembleia Provincial vembro, conta que está passando por problemas econômide Barcelona a partir de 1907, criando o Institut d’Estudis Catalans. Impulsionou cos e que pintou pouco. “E, desde que decidi fabricar brina criação da “Mancomunidad de Cataluña”, da qual foi o primeiro presidente até a sua morte. É autor de La nacionalitat catalana (1906), considerada a obra mais quedos, toda minha atividade se canalizou para isso. Por importante do catalanismo político. último, faço sociedade – sociedade formal, com contrato, 7. Os murais de Torres García foram posteriormente restaurados, ainda que não devolvidos ao lugar para o qual foram concebidos. Estão instalados na Sala Torres García do Palácio da Assembleia. 8. Eugenio Ors, ou d’Ors (Xenius) (1882-1954). Filósofo e ensaísta. Secretário do Institut d’Estudis Catalans (1911). Diretor de seu Seminário Filosófico (1918) e do Departamento de Instrução Pública da 44 “Mancomunidad de Cataluña”. Entre outros trabalhos, destaca-se o romance La Bien Plantada, peça literária fundamental do noucentismo.

10. Manolita Piña de Rubies (Barcelona, 1889 – Montevidéu, 1995). Esposa de Torres García, que participou ativamente com ele no desenvolvimento dos brinquedos.

9. Em 1916, Torres García escreve o livro O descobrimento de si mesmo, que antecipa profundas mudanças interiores. Diferentemente dos precedentes, que estavam em catalão, esse livro foi escrito em espanhol. Nessa época, sua pintura toma um rumo radical para a modernidade, o que o distancia ainda mais do público, que se sente traído.

12. Rafael Barradas, artista nascido em Montevidéu em 1890, criador do vibracionismo e amigo de Torres García, com quem manteve uma extensa correspondência. Faleceu em Montevidéu em 1929.

11. AP-18-1 Arquivo do Museu Torres García (MTG). Torres García teve um diário pessoal de 1912 a 1938. AP é o código do Arquivo do Museu para esses diários.

13. Pilar García Sedas, J. Torres García-Rafael Barradas. Um diálogo escrito: 19181928, Barcelona, Parsifal Ediciones, 2001, p. 139.

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com um industrial –, pois eu sozinho não me haveria salvado. E agora estou trabalhando nisso; projetando brinquedos, calculado etc. No dia 20 do próximo mês, faremos uma exposição para venda na casa Dalmau.”14 Efetivamente, no dia 6 de novembro, foi constituída a Sociedade do Brinquedo Desmontável,15 pela qual Torres García se associação de Torres García com Francisco Ramblà, fabricante e industrial catalão que possuía uma carpintaria industrial.16 Durante o mês de dezembro, o trabalho foi intenso, provavelmente pela proximidade da exposição. Torres García escreveu em sua agenda “Todo o dia no trabalho de Rambà pintando brinquedos”;17 e, em carta a Barradas, no dia 13 de dezembro, diz: “Volto a me animar para trabalhar,18 depois de tanto tempo sem pintar nada. Os brinquedos me arrastam a isso. Porque é o mesmo que o outro. Enfim, creio que encontrei algo que, apesar de dar dinheiro – se é que o dá – me fará feliz de fazê-lo. Tudo é brinquedo e pintura! Você já sabe o belo que é viver para essas coisas. Mas agora, trabalho sob pressão. Pois no dia 20 abro uma exposição – de brinquedos – na casa Dalmau”.19 14. A exposição se chamaria Brinquedos de Arte. Josep Dalmau (1867- 1937) foi um galerista catalão de princípios do século, fundador das Galerias Dalmau em 1906. Foi pioneiro em apresentar artistas da vanguarda europeia.

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A imprensa local difundiu, de certa forma, a exposição; um artigo de Joan Sacs (pseudônimo de Feliu Elias)20 termina falando dos brinquedos: “Não nos cansaremos de recomendá-los”. Desde o começo, os brinquedos geraram um amplo interesse em círculos intelectuais e artísticos. Em janeiro de 1919, Torres recebe carta de Roberto Payró,21 que lhe fala de sua pintura e elogia seu trabalho: “e os brinquedos; porque estou convencido – e o estaria ainda que você não o dissesse – que não se trata de uma indústria pela indústria, mas de uma maneira de fazer amar a arte e de inculcá-la nas massas desde a infância. Espero que se esforce para produzir o brinquedo barato, e o espero por duas razões: porque assim estaria ao alcance dos deserdados que seriam beneficiados e porque, assim, se venderiam a milhares, e seria benéfico também a você”.22 O início do ano 1919 encontrou Torres García novamente “todo dia pintando brinquedos”.23 E, em carta a Barradas, relata: “Apesar de andar entre minhas ideias, não deixo por nenhum momento de dar direção a todas minhas coisas e vou pintando mentalmente; o viver materialista que tenho que fazer, me sufoca [...] Encontro-me, pois, muito só, sem nada que me alente a trabalhar e com excesso de trabalho material que me ocupa mais do que eu queria. Farei um esforço para enviar brinquedos à exposição, essa de que me falam”.24 Registram-se numerosas atividades em conjunto com Ramblà. No dia 1 de junho, marcaram uma exposição de brinquedos na Universidade da Indústria. Nova carta a Barradas, do dia 6 de junho de 1919: “Não pense que me esqueci; pelo contrário. Mas, agora posso dizer que sou um escravo do trabalho. Espero que, depois do dia 20 – dia

15. AP-18-1. Arquivo do MTG.

20. Feliu Elias (1878-1948). Escritor, crítico de arte, desenhista e caricaturista catalão. Escreveu um artigo sobre os brinquedos sob o pseudônimo de Joan Sacs. Também utilizava o pseudônimo de Apa.

16. A iniciativa tinha sede em Sarrià, Rua Hort de la Vila, 29.

21. Escritor e jornalista argentino (1867-1928).

17. AP-18-1. Arquivo do MTG.

22. C-19-3. Arquivo do MTG.

18. Refere-se à criação artística.

23. AP-19-1. Arquivo do MTG.

19. P. G. Sedas, op. cit., p. 148.

24. P. G. Sedas, op. cit., p. 152.


em que se inaugura a exposição de brinquedos aqui –, poderei escrever-lhe um pouco, pois outro grande trabalho me espera”.25 Em Barcelona, no dia 10 de junho, Carlos Bonet Durán26 apresenta em nome de Torres García a solicitação para a patente de “invenção para um sistema de balanços para movimentos oscilantes e de translação”.27 Torres García havia inventado um mecanismo que grava o avanço dos cavalinhos de balanço para crianças, que viria a patentear em Nova Iorque, e que animaria o Go Pony. No final de junho, realiza-se em Barcelona a sexta edição da importante Exposição de Brinquedos e Artigos de Bazar na Universidade Industrial. Várias vezes no mês, Torres passa o dia todo pintando brinquedos28 e, depois, pintando a instalação. Em carta a Barradas, uns dias depois, lhe conta: “Nossa instalação parecia um desses barcos camuflados, de guerra. Mas ninguém soube apreciar isso”. A exposição foi inaugurada no dia 23 de junho. De manhã, foram instalados os brinquedos e, de tarde, Torres García foi com Manolita à vernissage de inauguração. Em seguida, recebeu a visita de Miró.29 No final de julho, em carta a Barradas, fala das coisas que está pintando e dos livros que pensa publicar. “A questão dos brinquedos está muito favorável: as pessoas do comércio os trataram como coisa séria, cotizável. Fizemos uma apresentação na Exposição de Brinquedos e Artigos de Bazar que todo ano se realiza em Barcelona. [...] Logo terá fotografias. Recebeu um catálogo de brinquedos? Diga-me.”30 Entretanto, as dificuldades econômicas o assediam. Sua nova pintura tem escassas possibilidades comerciais e os brinquedos não solucionam o problema. Entre setembro

e outubro de 1919, vendeu Mon-Repòs.31 Em carta a Barradas, diz: “Sacrifiquei Mon-Repòs. Quando você ler esta carta, será de outro; ainda que esse outro não a possuirá de verdade, talvez sim, materialmente, porque aquilo não pode mais ser nosso, mas porque é uma casa como música, e ele não poderá jamais ouvi-la. Dizer que vendi a casa, parece pouco; mas eu sei o tempo e os desgostos e trabalhos que me custaram, sem contar a mudança de tudo o que ficava ali. Depois de coisas assim, você fica meio louco. E perdi tudo! Tudo!”.32 A situação social e política na Catalunha havia deteriorado gravemente. No início de 1920, já existiam indícios de uma possível mudança para os Estados Unidos, onde Torres García poderia continuar a fabricação de brinquedos. No dia 21 de janeiro, recebeu uma carta de seu amigo Cipriano Montoliu,33 que lhe diz: “Falei de você a G. Stephens, o fundador e a alma de Arden, a quem mostrei seus brinquedos e catálogos. Eu o achei muito interessado e prometeu estudar o assunto para ver se aqui haveria os meios para

31 Nome da casa que o próprio Torres García construiu para viver com sua família em Tarrasa, em 1913. Em 1993, a casa foi restaurada, junto com os afrescos que Torres realizara no interior e que representam o que há de mais importante do noucentismo catalão.

25. Idem, ibidem, p. 167.

32. P. G. Sedas. op. cit., p. 171.

26. Engenheiro industrial.

33 Cipriano ou Cebrià. Marqués de Montoliu (1873-1923). Urbanista e advogado. Promotor da Ciulat Jardí. Já advertia desintegração do mundo rural e defendia o respeito à natureza. Escreveu um livro sobre Walt Whitman e traduziu seu Leaves of Grass para o catalão. Torres García o havia conhecido ao mudar-se para Sarrià. Há quem sugira que foi no dinamismo dos poemas de Whitman que Torres García encontrou o estímulo para se mudar para os Estados Unidos.

27. Documento original conservado no Arquivo do MTG. 28. AP-19-1. Arquivo do MTG. 29. Joan Miró, pintor catalão (1893-1983). 30. C-19-13. Arquivo do MTG.

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desenvolver essa indústria e lhe oferecer uma base de operações. Também mostrei aos professores e alunos da escola, trouxe um dia um modelo de carruagem, que encantou a todos, e acho que não seria difícil fazer uma exposição, em que provavelmente se venderiam bastantes brinquedos e seria para você uma boa propaganda [...], há muita gente rica e culta que passa aqui temporadas para descansar e recuperar forças”.34

Na época dos acontecimentos, Torres García aparece visivelmente perturbado. Em carta a Ramblà de 14 de setembro, conta: “Como não entendo daqueles malditos papéis de negócios, que não servem mais do que roubar legalmente, antes de responder no que tange a nossa má aventurada sociedade, hei de consultar a coisa com um advogado, que me explique o significado de tudo isso que para mim é hieróglifo. Mas, antes de isso, hei de responderlhe sobre algo que não diz respeito ao negócio. Bom, se você quis me ferir e me causar desgosto com a carta, conseguiu. Pode ficar bem satisfeito. Porque quem deve estar lamuriento sou eu. Você é cavalheiro. Perfeitamente. Sem me avisar, quase ao final do mês, você não vai me entregar a soma que eu devia receber todo mês da sociedade, me deixando, como você já sabia, com compromissos pendentes. Você não podia ter me avisado com tempo, para que eu me ajeitasse de um modo ou outro? Você não teve, nem tampouco manifestou sentimentos de pena, e ainda me expôs a coisa como se tratasse de um desconhecido. [...] E não tenho mais o que dizer. Que deus o ajude e que as coisas sejam para você melhores do que têm sido para mim”.36

Exposição de brinquedos na Universidade da Indústria, Barcelona, 1919

Em setembro de 1920, aconteceu o dramático final de sua relação com o industrial Ramblà. Anos mais tarde, em História da minha vida, Torres García relataria a situação do seguinte modo: “até que ao final aconteceu o que tinha de acontecer: esse industrial quis eliminá-lo por lhe parecer que já não o necessitava. E buscou o meio, que foi não lhe dar mais dinheiro, alegando razões que não existiam e deixando, assim, Torres na pior das situações. E fracassado isso, já não lhe restava nada a fazer em Barcelona”.35 Álbum New York, aquarela n. 120, 1919

34. C-20-13. Arquivo do MTG. 35. J. T. García, op. cit., p. 144.

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36. C-20-7. Arquivo do MTG.


desembarcamos em Nova Iorque. Vieram ao porto os Montolius e os Ortell”.40

Capa de Aladin, decênio de 1920

Uns meses depois, a partida para Nova Iorque é um acontecimento, e dá a notícia ao seu amigo Barradas: “E agora, a grande notícia: lá por abril vamos para Nova Iorque! É coisa decidida, a menos que haja alguma dificuldade material. Essa decisão deveria ter sido tomada pelo menos há dez anos. Agora a tomo, motivado por uma enorme porcaria que me faz meu sócio, o dos brinquedos. Agradeço-lhe, pois, essa porcaria. Aquele é meu país, Barradas, a vida múltipla, gigante, maquinística, dinâmica e livre!”.37 No dia 15 de maio, deixa definitivamente Barcelona. Primeiro, viaja para Paris; despedem-se dele na estação “Salvat,38 Llongueras, Amparo, Barradas e a senhora, Guardia, Mirambell e Inés”.39 No dia 5 de junho, embarca no Leopoldina rumo a Nova Iorque.

II. Nova Iorque

A cidade lhe provocou grande impacto visual, gerando ao recém-chegado o mais vivo interesse. “Primeira impressão: plástica. Interessantíssima para um artista moderno. Mil formas novas em movimento que chega ao paroxismo – superfícies enormes com mil cavidades retangulares, escadas descendo em zigue-zague desde o alto, planos em movimento vertiginoso, elevadores, trens elevados, subterrâneos: números 56, 56, 56, 56, passando rapidamente nos postes, 56: estação, parada brusca. Mil pessoas em oposta direção, radiantes – luzes multicolores, ruído retumbante. A square – árvores, bondes, chapéus de palha, cores ao sol, bazares, carros, caminhões. Casas vermelhas, amarelas, cinzas. Anúncios – fixos, móveis, luminosos, acústicos, descendo, subindo, vibrando sempre, sem dar descanso à sensibilidade. O porto – visão extraordinária, realidade cubista, futurista, geometria, vermelho, preto, ocre, fumaça, água oleosa, cabos, sirenes, bandeiras, placas, mil rostos humanos debruçados no gigante transatlântico, mil línguas diversas em letras, breu, alcatrão, milhões de chaminés esfumaçando. Mil produtos da indústria, em caixas, botes, pacotes, e letras e mais letras, letras e números. Organização, maquinismo. Telégrafo, telefone, abreviação, relógio, botão elétrico, indicadores, cifras e letras, e mais letras e cifras. Nova Iorque: uma gigante, inimaginável casa de comércio.”41 Torres García mergulha nesse novo mundo e se impregna rapidamente dessa estética que tomará força na sua pintura e na criação de novos brinquedos. Recorta de jornais e

Torres García, Manolita e seus quatro filhos chegaram a Nova Iorque no dia 16 de maio de 1920. “Esta manhã, 37. P. G. Sedas, op. cit., p. 200. 38. Salvat-Papasseit (1894-1924). Poeta catalão, um dos máximos representantes das vanguardas catalãs. Publicou, em 1919, Poèmes en ondes Herzianes, com ilustrações de Torres García.

40. AP-20-1. Arquivo do MTG.

39. AP-20-1. Arquivo do MTG.

41. Do livro inédito New York. Arquivo do MTG.

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revistas imagens de todo tipo, anúncios, fotografias e caricaturas. Realiza os álbuns de aquarelas New York, nos quais capta em rápidos traços todo esse novo ambiente. Mas a vida não dá trégua: “sem perda de tempo, pois ali se gasta fantasticamente e os dólares que leva são poucos, começa suas correrias em busca de algo [...]. Casas de decoração, litografias, arquitetos, empresários de teatro, escultores e pintores, redações de jornais e revistas, editores. Enquanto isso, vem gente para vê-lo, dar-lhe endereços a onde ir. [...] assim, vão se aproximando de Torres García e de sua família uma multidão de amigos – e isso de multidão não é modo de falar – seja por simpatia, seja por desejo de ajudar-lhes, com um interesse e uma franca naturalidade que os surpreende”.42 Entre abril e maio de 1921, Torres García realizou numerosos trâmites para concretizar a patente do “cavalo mecânico”43 e a venda de brinquedos. No dia 6 de julho, firma contrato com o senhor Riefstahl, diretor da Anderson Galleries, nasceu a Artist Toys Makers.44 “Essa sociedade, a Artist Makers Toys, forma-se baseada na patente de invenção do cavalinho mecânico inventado por Torres García. Gostaram da invenção, constitui-se uma sociedade e pede-se a patente a Washington. Mas a petição está mal escrita e não se obtém. Tudo se acaba, as pessoas perdem seu dinheiro, mas isso não os preocupa, e continuam na boa amizade e ajudando a Torres. Este insiste e, enfim, obtém-se a patente, mas já é tarde, aquelas pessoas já estão em outra coisa.”45 Não obstante, no dia 23 de setembro, o artista recebeu cinquenta dólares do Artist Toys Makers e, no dia 11 de outubro, outros cinquenta dólares. Apesar da ajuda que alguns lhe dispensavam, a vida no novo mundo era dura. Em carta a Badrinas, em dezembro 42. J. T. García, op. cit.

de 1921, Torres fala de como tudo ia mal em Nova Iorque, pelo clima e pela gente. Tem muitas saudades de Tarrasa (não tanto de Barcelona) e lhe diz: “O que fiz? De tudo. Retratos, decoração de teatro, ilustrações, brinquedos, conferências, artigos, estudos, quadros [...] para explorar as novas atividades artísticas – qualquer que sejam – espontaneamente, formou-se uma sociedade – Artist Toy Makers – tudo aqui se faz assim, base comercial. O valor de tudo se mede pelo que é convertível em dólares, assim em tudo. País especial, verdade?”.46 Efetivamente, o entusiasmo inicial pela grande cidade estava se convertendo em desencanto e sufoco. “Business, negócios, aqui não tem mais nada. Tudo é negócio – o trabalho, a arte, qualquer atividade. Tudo é industrial. E o homem que criou essa indústria, agora é formado por essa indústria. Aqui acabam as categorias, as classes, as individualidades, tudo está em conexão e pertence ao conjunto. O homem aqui não pensa, nem se move por automatismo próprio: move-se, queira ou não, ao compasso dos demais. Transforma-se em máquina.”47 E logo, como uma reação a todo esse materialismo, escreve: “o importante é manter o espírito desperto e vibrante. E isso tem de ser conseguido ocupando-se destas divinas coisas inúteis. Imita as crianças: brinca. Brincar é realizar algo de acordo com nossa tendência pessoal. Atuar de dentro para fora, com liberdade, que é manifestar a ordem. Comerciantes de Nova Iorque: todo vosso exemplo de constante atividade do útil não poderá fazer de mim um homem sério. E agora a você, artista: entra no caminho da extravagância, brinque! Saia do real para entrar na ordem universal. O que é sério, ordenado em certo sentido material, o que é regulamentado, é o antiartístico. Outra ordem é a arte. E para encontrar essa outra concordância que fará

43. AP-21-1. Arquivo do MTG.

22

44. AP-21-1 Arquivo do MTG.

46. C-21-16. Arquivo do MTG.

45. J. T. García, op. cit., p. 167.

47. Do livro inédito New York, 1921. Arquivo MTG.


as coisas belas e poéticas, é preciso abandonar-se, brincando, de certo modo extravagante, liberar-se da realidade. Porque – ouça bem, artista – sem extravagância (emancipação) há brincadeira. O mundo, levado a sério, é antiartístico. E triste. A arte tem (além de outras coisas) de trazer ao mundo a alegria. Seja extravagante, brinque! Faça as coisas ao contrário – pode, tem liberdade para fazê-lo (De certo modo). Imite as crianças. Poesia e arte: extravagância – liberdade – brincadeira. Nunca deixe de ser criança”.48

fosse impor seus brinquedos. Achava que era a única coisa que poderia sustentá-lo ali. A última tentativa será na Dover Farms Industries, cuja direção quiseram lhe confiar.51 Mas é vítima de manobras ou procedimentos que ele não compreende e ao final se evade. [...] Ali levou seus modelos, ali trabalhou com os operários e depois foi mostrá-los às grandes lojas, e, quando achava que ia deslanchar o negócio, fracassava, porque a impossibilidade que se impunha para resolver qualquer assunto impossibilitava sua solução normal. A qualquer pergunta, todos respondiam de maneira equívoca; ou se não, de repente, diziam outra coisa alheia a tudo aquilo, enfim algo incompreensível que não conseguia explicar. Mas não termina aqui toda a odisseia dos brinquedos, como se verá.”52

Através de numerosos relacionamentos entre artistas e intelectuais, Torres García conheceu a abastada escultora Gertrude Vanderbilt Whitney. Mrs. Whitney, como a chamava Torres, havia começado a expor obras realizadas por “Depois, ao se mudar para o Up Town, a parte alta da cidade na qual já não havia amigos seus em um estúdio na West 8th mais do que casas para vivenda, foi deiStreet de Greenwich Village, criando, xando de pintar, seja porque não via graça posteriormente,o Whitney Studio Club. nas coisas de lá, seja porque estava se deO Studio Club realizou exposições de dicando ao trabalho com os brinquedos. quadros de Torres García, e também de brinquedos, os quais ficariam em uma Com tudo isso, e ainda com o fato de que amostra permanente para sua difusão. Patente do cavalinho andante, 1921 quase ninguém ia vê-lo, foi ficando triste, Mrs. Whitney, assim como suas assistenfoi desanimando, e, por fim, aconteceu o 49 50 tes Mrs. Force e Mrs. Brown, interessaram-se muito que devia acontecer. Foi pensando que já não tinha nada o pelos brinquedos de Torres e realizaram repetidos es- que fazer em Nova Iorque, devia ir embora dali. Mas para forços para ajudá-lo a encontrar quem os produzisse onde? Ultimamente, Mrs. Whitney havia assumido o negócio dos brinquedos, e então se pensou fabricá-los na Eupara, posteriormente, colocá-los no mercado. “Seguindo passo a passo a vida de Torres-García em ropa por ser mais barata a mão de obra, e trazê-los ali, e Nova Iorque, percebe-se que, durante o segundo ano da assim se combinou. E com essa esperança, embarcaram no 53 sua estadia, quase não trabalhou em outra coisa que não vapor Europa, rumo à Itália, no dia 17 de julho de 1922.”

48. Do manuscrito inédito Feitos, 1922. Arquivo do MTG. 49. Juliana Force (1876-1948), secretária de Gertrude Whitney, foi a primeira diretora do Studio Club. 50. Secretária de Mrs. Force.

51. De maio a junho de 1922, Torres García trabalhou na Dover Farm Industries desenhando brinquedos. 52. J. T. García, op. cit, p. 168. 53. Idem, ibidem, p. 170.

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Olimpia, a filha mais velha de Torres García, recorda esse momento com sofrimento. “Quando fomos embora de Nova Iorque, foi o momento mais triste do mundo. Meu pai conhecia a senhora Vanderbilt, que era uma grande dama e se apegou muito a nós. Mas no fim, não foi muito generosa. Manolita tinha uma joia muito importante, um diamante, porque vinha de uma família muito rica. A senhora deu dinheiro ao meu pai para as passagens, mas foi preciso pagar o favor com dez quadros mais a joia. Minha mãe chorou horrores, sofreu muito. Fomos embora porque meu pai se cansara de Nova Iorque, não se adaptava a essa vida.”

III. Itália “Depois de um mês em Genova, foram para Pisa. Não se falará aqui daquela famosa torre inclinada, nem de sua Catedaral e Batistério, nem das maravilhosas pinturas do Camposanto. Devemos nos lembrar que Torres estava na Itália para fazer brinquedos e exportá-los para Nova Iorque. E falava disso uma noite no hotel com um comerciante (pois lhe importava documentar) e este lhe disse que o lugar mais adequado para essa fabricação era, sem dúvida, Cascina, pequena cidade da Toscana, por não haver ali mais do que carpinteiros. E pouco depois, para lá foram. Era verdade, lá não se trabalhava mais do que a madeira. E logo vem aquela gente receber o ‘americano’ que desejava fabricar brinquedos em grande escala. E trataram de preços, e de formas para fazê-los, e até ofereceram capital. A coisa ia de vento em popa.”54 “Instalaram-se, pois, naquele paraíso, no dia 7 de outubro de 1922, na Villetta Amelia, e lá Torres García começa a estudar como realizará sua indústria de brinquedos. Lá sim, que deveria pensar em arte e não em indústrias! Logo percebe que o negócio é quase impossível, por carência absoluta de indústrias – nem aí nem em Florença elas exis-

tem – e por isso, carência também de materiais e meios mecânicos de fabricação. Mas tudo se fará, porque deve ser feito. E começa a educar o único carpinteiro que tem lá que tenha serra mecânica. Os primeiros modelos são para desanimar a qualquer um. E tinta [...], por lá, não há nada, e um construtor de carros, que a fabrica para sua indústria, lhe oferecerá dessa [...]. E depois, todo o resto: as caixas, as etiquetas, as figuras, ‘tudo de primeira qualidade’! Apesar disso, Torres trabalha com o maior entusiasmo e vão saindo uns brinquedos muito bonitos e originais. E as estantes vão se enchendo de cores e de formas, e aquela casa, tão vulgar, vai adquirindo nobreza e refinamento. Assim, Logasa55 encontra tudo. Ele faz outra viagem de Villefranche-sur-Mer, onde mora, para ver o que faz Torres. E, como bom americano, já queria pôr mãos à obra – e sugere meios de acelerá-la e dá sua opinião a respeito do comércio da América, ajudando o seu amigo a fazer contas e estabelecer preços.”56 Por volta do fim do ano, envia várias mostras de brinquedos a Florença e consegue realizar algumas vendas. Também envia brinquedos para a Espanha. Ao final da agenda de 1922, escreve: “Já não vou mais pintar, vou colocar minha pintura nos brinquedos. O que fabricam as crianças me interessa mais, vou brincar com elas”. No dia 9 de janeiro de 1923, Torres García recebe carta de Grace Putnam, de Nova Iorque. “Mrs. Force me falou de seus brinquedos. Eu também sou uma artista e, como você, planejei desenvolver um brinquedo, colocá-lo no merca55. Pintor que Torres havia conhecido em Nova Iorque, com quem teve uma forte amizade.

54 Idem, ibidem, p. 176.

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56. Idem, ibidem, pp. 176-7.


Cartaz publicitário para uma edição não reali­ zada de Brinquedos Aladin, 1924

do e ter recursos que me ajudem a educar meus filhos, manter meu futuro estúdio (oficina) e evitar que o velho lobo arranhe minha porta. Meu brinquedo é uma boneca. Cheguei a São Francisco faz dois anos para encontrar um fabricante e recentemente agora encontrei um, The George Borgfeldt Co., de ampla reputação. [...] se você enviar mostras a Mrs. Force, eu as mostrarei aos diretores de Borgfeldt.”57

A ideia de Torres García era, como disse, fabricar os brinquedos na Itália e exportá-los para Nova Iorque. Os brinquedos seriam comercializados sob a marca Aladdin Toys. O artista associou-se, então, com o pintor Bueno de Mesquita,58 que se encarregou da representação comercial a partir de Florença, enviando catálogos e mostras, e pegando pedido em diversas cidades da Europa. Torres encomendou a impressão de catálogos com informação comercial sobre seus brinquedos e, em fevereiro de 1923, enviou a patente de seu “cavalo mecânico” e novas mostras de brinquedos ao Whitney Studio Club, onde foram exibidos.59 Na cidade, os numerosos amigos do pintor realizavam esforços para a comercialização dos brinquedos. No dia

3 de março de 1923, Torres García recebeu carta de J. Agell,60 que lhe recomenda se associar com um catalão que teve sucesso vendendo uma boneca-moedeira: “Ainda que cem mil bonecas não seja grande coisa neste país, esse é o número de vendagem delas”.61 No dia 6 de junho, recebe uma nova carta de Grace Putnam. “Foi difícil escrever, desculpe a demora. Logo que seus brinquedos foram desembrulhados, fiz que os dois principais diregentes da Borgfeldt Co. os vissem. Sua avaliação não foi a seu favor. Disseram que ainda que os brinquedos tenham uma qualidade única, existem alguns que se baseiam em ideias similares, e que o aspecto artístico não lhes interessa. Fundamentalmente, importa-lhes o baixo preço que se possa realizar mediante procedimentos mecânicos. Eles já tiveram um cavalo que avançava, mas estragava os pisos. Falei por você tudo o que pude, mas não consegui nada. Apresentei-os a outras companhias, mas é sempre a mesma coisa, não querem lhe pagar direitos, mas comprar com baixo preço.” O próprio Torres relata o episódio do seguinte modo: “E quando tudo está pronto, Torres-García faz um envio a Nova Iorque de um mostruário completo de brinquedos a Mrs. Force, que se encarregará de exibi-los e receber pedidos. Mas [...] o negócio não deu resultado. Realizou-se a exposição no Whitney Studio Club, visitou-se os principais diretores de bazares... e nada! O que tinham esses brinquedos de Torres García que a todos seduziam e que não podiam ser, jamais, matéria de negócio? Porque isso se repetirá ainda muitas vezes. Entre os visitantes da exposição no Studio Club estava Juan Agell, um grande amigo de Torres García, que pensou que aquilo podia ser salvo – como havia pensado Mrs. Force – e com esse fim, falou com ela. Então, criou-se a Aladdin Toys Company,62

57. Grace Putnam patenteou em 1923 uma boneca que, fabricada por Borgfeldt & Co., foi comercializada como “The Bye-Lo baby”, posteriormente rebatizada “The Millon Dollar Baby” pois sua criadora se tornara milionária. O sucesso da boneca se devia ao fato de que, diferentemente das bonecas comuns, reproduzia caraterísticas de um recém-nascido de três dias.

60. Juan Agell (às vezes Joan ou John), amigo de Torres García, engenheiro de profissão.

58. Enri Bueno de Mesquita, pintor holandês residente em Florença.

61. C-23-7. Arquivo do MTG.

59. Gabriel Peluffo, Catálogo do Museo Torres García, Montevidéu, Museu Torres García, 1990.

62. No dia 13 de fevereiro de 1924, foi firmado o contrato de associação da Aladdin Toys Co. de Nova Iorque entre Teresa Arabia, espanhola; Ramón Fuste, espanhol;

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Enquanto isso, na Europa, Torres García trabalha com Bueno de Mesquita na Aladdin Toys. Este “mandou modelos de brinquedos a uma casa holandesa (a casa Metz Co.), que fez um grande pedido,66 e mais outros, poucos meses depois”.67

para a fabricação desses brinquedos em Nova Iorque. Então, enfim, foram vendidos”.63 Efetivamente, Agell havia visto nos brinquedos de seu amigo a possibilidade de se desenvolver profissionalmente. No final de 1923, Torres García envia numerosas remessas de brinquedos e, no dia 22 de janeiro, em carta a Torres, Rafael Sala64 diz: “Recebi uma carta de Agell, na qual me fala com entusiasmo e fé sobre o sucesso dos brinquedos em Nova Iorque. Desejo vivamente tanto por você como por ele que tudo saia bem”.65

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“Já que a casa Metz & Co.68 de Amsterdã tinha aceitado os brinquedos de Torres García, seu amigo Bueno de Mesquita acreditou que isso poderia ser uma base segura para montar um negócio em maior escala e, por isso, aconselhou mandar amostras a casas que ele conhecia em Paris, Londres e Bruxelas, além de se ocupar em exportar chapéus de palha e de ráfia à Aladdin Toys Company, de Nova Iorque, bem como cestas e outros objetos de Córsega, de caráter popular. E tudo isso se fez, maldizendo Torres García, o fato de ter de andar metido naquela odiosa coisa comercial. Tudo isso se coloca aqui, frequentemente, para defender a Torres García de quem se disse, às vezes, que era resistente em aceitar algo para sustentar sua casa que não viesse de sua arte. Basta dizer que, durante todo esse ano de 1923 e parte de 1924, não se ocupou de outra coisa além disso, se isso for dito, basta para provar o contrário.”69 Efetivamente, na agenda pessoal de Torres se encontram anotações como: 11 de abril: “Expedidos brinquedos e chapéus para Nova Iorque, Aladdin Toys Co.”.70 27 de maio: “Expedidos brinquedos para Metz e Aladdin Toys Co.”.71

Joan Agell, norte-americano, em representação própria; e Torres García, mediante uma procuração que também o habilita a explorar a patente do cavalinho. Apesar de causar certa confusão, trata-se de duas empresas diferentes; de um lado, a Aladdin Toys Co. de Nova Iorque, que emite ações e possui uma fábrica para produção de brinquedos nessa cidade (sobretudo “cavalos mecânicos”, dos quais chegou a produzir cem por dia), e de outro, os Aladdin Toys, produzidos pelo próprio Torres em seu escritório comercial em Florença, na Itália.

66. O primeiro pedido para Metz & Co. havia sido feito no dia 5 de julho de 1923. Foram enviados 901 jogos por 4.180 liras, que no valor atual seriam três mil dólares. Metz lhe pediu a exclusividade de venda na Holanda.

63. J. T. García, op. cit., p. 177.

69. Idem, ibidem, p. 179.

64. Artista plástico catalão.

70. AP-24-1. Arquivo do MTG.

65. C-24-1. Arquivo do MTG.

71. AP-24-1. Arquivo do MTG.

67. J. T. García, op. cit., p. 178. 68. Esse comércio emblemático de Amsterdã foi fundado em 1740 e continua em atividade. Sua edificação conta com aportes do arquiteto Gerrit Rietveld, De Stijl.


27 de junho: “Enviei para Aladdin mostras de chapéus”.

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IV. Sul da França “Depois de mais de dois anos de trabalho na Itália para impor seus brinquedos, e não havendo a indústria conseguido financiar, tampouco outras coisas que se tentaram, deve ter pensado procurar outro caminho para seguir adiante. Lá na Itália também não se podia fazer pintura, por falta de ambiente.” Então, decidem se mudar para o sul da França e, no dia 20 de dezembro, chegam a Villefranche-sur-Mer. “Lá se instalaram, e lá Torres voltou a seus brinquedos.”73 13 de fevereiro: “Incendiou-se a Aladdin Toys Co. Inc”.74 No dia 18 de fevereiro, recebe a notícia por carta de Agell. “Como poderia lhe dizer amigo Torres, que a fábrica Aladdin pegou fogo? Queimou-se, destruiu-se totalmente na tarde do dia 13 e no dia seguinte de manhã. Quando eu começava a lhe escrever esta carta, antes de sair de casa, ainda não sabia de nada. E não fiquei sabendo até o meio-dia, quando me encontraram em visita no escritório de um comerciante e fabricante de brinquedos; interessado em comprar nossos brinquedos, liguei para Teresa para combinar nosso compromisso do sábado,75 e ela me avisou. Hoje já posso lhe falar com mais serenidade da destruição de nossa fábrica, com serenidade da resignação forçada da qual se fala de um morto querido; depois de cinco dias, ainda não posso acreditar que a Aladdin esteja morta, ou, pelo menos, não os Aladdin Toys nos quais cada dia tenho mais confiança, apesar de todos os contratempos, que as circunstâncias fatais ou inesperadas, previstas ou imprevistas nos foram [cuidando ou

acostumando]. [...] Muitos modelos se perderam. Todos os grandes e todos os que retirei do Whitney Club. Lembranças a todos e não desanimemos, que algo faremos, não há dúvida, um abraço forte de seu amigo.”76 No dia 1o de abril, Torres García recebeu nova carta de Agell, na qual este relata as dificuldades que tem para receber o seguro da fábrica. Mantém as esperanças em reerguer a indústria, mas diante do acontecimento, era o final. Todos os sócios da Aladdin Toy Co. perderiam o capital que tinham investido, e já não voltariam a fabricar nem a vender brinquedos em Nova Iorque. Numa última carta de fevereiro de 1926, Agell confessa que se deu por vencido e que estava resignado a viver de fazer traduções. Planeja se mudar para a França.77 A atividade comercial recai, então, sobre o próprio Torres, que passa o resto de 1925 comercializando brinquedos e realizando numerosas viagens para promovê-los. Em geral, é acompanhado de sua filha Olimpia. Realiza envios às lojas de Talance, Riviera e Bazar Republique,78 e viaja para Nice, Beaulieu e Monte Carlo. Também envia amostras a sua irmã Inés.79

72. AP-24-1. Arquivo do MTG. 73. J. T. García, op. cit., p. 181.

76. C-25-11. Arquivo do MTG.

74. AP-25-1. Arquivo do MTG.

77. C-26-13. Arquivo do MTG.

75. Teresa Arabia, sócia da Aladdin Toys Inc., era noiva de Agell. Casaram-se tempo depois.

78. AP-25-1. Arquivo do MTG. 79. AP-26-1. Arquivo do MTG.

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“Mas, apesar de haver percorrido toda a costa, de Monte Carlo a Nice, obteve poucos pedidos. Por isso pensou novamente em exportá-los e, para esse fim, já havia combinado com um viajante que os levaria a Paris e Bruxelas. Mas, no momento de realizar isso, Torres é apresentado a um grande comerciante, que lhe oferece condições vantajosas para levar a cabo a empresa. Torres aceita – fazem contrato – e tudo teria saído bem, se esse comerciante não tivesse encontrado algumas dificuldades e rescindido o contrato, deixando, portanto, Torres na pior das situações. O que fazer? É quando, decididamente, pensa em se mudar para Paris.”80

V. Paris No dia 19 de setembro de 1926, Torres García e sua família chegam a Paris. Então, a prioridade passa a ser a pintura. Os anos em Paris serão os mais produtivos e é lá onde ele produzirá muitas das suas obras mais notáveis. Os brinquedos continuam presentes como uma ajuda para sustentar a família, mas são realizados de forma artesanal e caseira; já não se tentaria a produção em gran-de escala. “Em Paris, os verões são temíveis porque tudo se paralisa. E então, ou tem de fazer como todo mundo e ir para o campo ou para o mar, ou buscar meios extraordinários para subsis-

tir. Por isso, Torres oferecerá seus brinquedos às lojas Printemps,81 que lhe farão um pedido considerável. Tem de ver o tanto que se trabalhava naquela oficina! Todos os amigos vêm para ajudar e, assim, sem pena, se pintam mais de oito mil peças.”82 Olimpia Torres, filha mais velha do artista, relata: “Em casa, que era na cidade de Paris, Torres tinha uma oficina muito grande, que havia dividido devido ao frio. Em uma parte, fez sua própria oficina, e na outra, colocou uma mesa onde todos trabalhávamos nos brinquedos. Augusto trazia umas tábuas e marcávamos as silhuetas com base nos moldes que meu pai tinha feito. Então, um carpinteiro que meu pai ‘conquistou’ as cortava, nós as lixávamos e depois pintávamos. Ele fazia o original e nós o imitávamos. Naqueles que eram todos cobertos de pintura, que eram os mais luxuosos, colocavase um prego torcido e se penduravam uns fios para que secassem. Passei muito tempo pintando patinhas, olhinhos e asinhas. Pintávamos Augusto, Manolita e eu; ele também pintava, e nos corrigia no que estávamos fazendo. Fazia-os por encomenda, porque os oferecia para grandes lojas, como Printemps e Galeries Lafayette, e, de tempos em tempos, havia grandes pedidos. Também os vendia em galerias. Todo o tempo que estivemos em Paris, vivemos parcialmente dos brinquedos. 81. Loja fundada em Paris em 1865 por Jules Jaluzot, e que ainda existe.

80. J. T. García, op. cit., pp. 182-3.

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82. J. T. García, op. cit., p. 198.


Foram, em grande parte nosso meio de vida, porque os quadros eram vendidos de tanto em tanto. Quando chegamos ao Uruguai, trouxemos muitos brinquedos que haviam sobrado, e fizemos uma exposição para vendê-los, mas aqui já não os fabricamos mais. Quando estive em Paris depois da guerra, visitei uma galeria de arte na qual havia muitos brinquedos. O dono se lamentava de que não se fabricassem mais, porque ele gostava muito deles e os havia vendido em grande quantidade.”83 Os anos da estadia de Torres García em Paris foram, como se disse, os mais importantes na evolução de sua pintura e de sua relação com o meio artístico. Ali, o artista vinculou-se aos principais exponentes das vanguardas, promove grupos de artistas, publicações e formula seu Universalismo Construtivo. Entretanto, existem numerosas anotações em suas agendas diárias que testemunham que a fabricação e comercialização de brinquedos, ainda que estivessem em segundo plano, continuavam presentes. Entre agosto e outubro de 1927, quando se produz a encomenda para as lojas Printemps, se lê: “todo dia pintando brinquedos”, “trouxeram 48 tábuas de madeira para brinquedos”, “vieram Milbauer e sua mulher para pintar brinquedos”, “expedido brinquedos para Printemps”, “acabado os brinquedos”, “levado os brinquedos para Printemps”.84 “Em 1928, envia brinquedos à Metz & Co. e a Mesquita, assim como a Waldemar George.”85 “Em 1930, há envios de brinquedos a Zurich, a Lugano e a Berna, e entrega de brinquedos a La Boutique.”86 Em 1931, realiza uma exposição de livros e brinquedos na Librairie Oliviero.

83. Entrevista realizada com Olimpia Torres por Jimena Perera e Alejandro Diaz em agosto de 2005.

VI. Montevidéu Em 1934, Torres García, já com 60 anos de idade, chega com sua família a Montevidéu. Traz a ideia de fundar uma Escola de Arte Construtiva, e os brinquedos já estão longe do seu centro de atenção. Entretanto, é no Uruguai que termina essa história, em uma exposição realizada no Museu de San José testemunhada na calorosa nota de imprensa que encerra o presente texto.87 Do consagrado pintor compatriota Torres García. Uma magnífica exposição de brinquedos. Os senhores Casto Canel Suárez e Francisco Espínola (filho) trouxeram a esta cidade, para vender entre suas amizades e pessoas de bom gosto, uma encantadora coleção de brinquedos em madeira concebidos e realizados pelo ilustre pintor Joaquín Torres García, há alguns meses radicado em Montevidéu, cujo nome, quase desconhecido no Uruguai, figura entre os maiores renovadores da pintura contemporânea. Se sua obra, particularmente a de sua última época, aparece como hermética e inacessível a nós, que estamos cobertos de preconceitos ou falhos de cultura em extensão e em profundidade, os brinquedos que tivemos a oportunidade de ver, ao contrário, nos abrem um caminho, pequeno, mas um caminho enfim, para nos aproximar à alma de um homem insigne. Milagre de síntese, de sorridente ternura, esses brinquedos enobrecem o espírito. E, entre as mãos das crianças impacientes por harmonizar seus fragmentos, devem fazer tão bem quanto sobre a mesa de trabalho do adulto ou junto a seus bibelôs mais apreciados. Só os vendo é possível perceber o que é capaz de fazer, com humildes pedaços de madeira, um gênio bondoso para quem as formas não têm segredos. Possivelmente, essas deliciosas criações serão expostas ao público em um salão no centro, não só para comodidade dos interessados em sua aquisição, mas também com o objetivo de que possam ser admiradas por todos.

84. AP-27-1 Arquivo do MTG. 85. AP-28-1 Arquivo do MTG. 86. AP-30-1. Arquivo do MTG.

87. Nota de imprensa. Arquivo do MTG.

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1.

5. 7.

3.

2.

1. Arlequins, óleo s/ madeira, 1921-22 2. Vilarejo numerário, óleo s/ madeira, 1921-22 3. Caminhão Leiteiro, óleo s/ madeira, 1921-22 5. Mulher com vestido azul, óleo s/ madeira, 1923-31 7. Homem cinza, óleo s/ madeira, 1928-30

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1.

8.

6.

4.

4. Carro Esportivo, óleo sobre madeira, 1917-19 6. Homem amarelo, óleo sobre madeira, 1928-30 8. Ferroviário, óleo sobre madeira, 1928-30

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9.

9.

9. Passarinhos, óleo s/ madeira, 1922

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Pequeno Circo Dois arlequins, 贸leo s/ madeira, 1922 Elefantes, 贸leo s/ madeira, 1922-23 Apresentador, 贸leo s/ madeira, 1922-23

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Pássaros articulados, óleo s/ madeira, 1917-19 Leão, óleo s/ madeira, 1917-19 Esboços de brinquedos, nanquim e lápis s/ papel, 1923-24

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Esboรงos de brinquedos, nanquim e lรกpis s/ papel, 1923-24 Charrete, รณleo s/ madeira, 19?

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Bailarinos, aquarela e nanquim s/ cart達o, 1923-24

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Teatrinho, madeira e metal, 1923

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Pérsia

Babilônia

Egito Grécia

Cenários e personagens para teatrinho (antiguidade), nanquim e aquarela s/ cartão

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Cenรกrios (patinadores), nanquim e aquarela s/ cartรฃo

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Loja

Vilarejo

Cenรกrios (modernidade), nanquim e aquarela s/ cartรฃo

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Cenรกrios Feira (modernidade), nanquim e aquarela s/ cartรฃo

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Texto inĂŠdito do curso dado no Instituto Normal de Senhoritas, entre 12 de janeiro e 9 de fevereiro de 1935. MontevidĂŠu

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Primera conferencia

Consideraciones generales Con respecto a la enseñanza y educación yo soy bastante escéptico: creo que no se puede enseñar ni se puede educar. Lo que hay es que cada niño puede aprender, si él quiere y puede educarse a sí propio, si eso lo siente. Y es todo. Por otra parte no veo diferencia esencial entre un niño y un adulto. Mayor o menor desarrollo en uno que en otro, mayor o menor experiencia, nada más. En el tiempo en que yo estaba dentro de la pedagogía, entre maestros y entre niños, entre libros y métodos de enseñanza, yo creía otra cosa. Hoy, alejado de todo esto, habiendo recobrado una independencia con respecto a esa fase, que entonces no tenía, ya no tengo aquel criterio. Además, creo firmemente que un individuo viene completamente formado para un desarrollo determinado y que no hay fuerza en el mundo que pueda torcer eso. Y se comprende: es su razón de ser. ¿Cómo, pues, va a educarse en un sentido determinado? Para hacerlo otra cosa de lo que es, habría que volverlo a forjar. El medio influye pero no en el sentido de cambiarlo. Influye con relación a que encuentre más en un medio que en otro todo aquello adverso o favorable a su desarrollo. Y no hay más. ¿De esto vamos a deducir que la labor del pedagogo es nula, que la escuela es algo inútil? En modo alguno. Lo que hay es que el pedagogo y la escuela podrán poco, todo depende del alumno. El individuo es, pues, algo dado, y en virtud de eso busca aquello que le conviene. Ni el medio ni el maestro tendrían que ver con eso. Ahora, ¿qué es el maestro, qué es la escuela? El maestro tiene una doble función: de un lado obligar –quiera el niño o no– a seguir ciertas disciplinas y a enterarse de ciertas cosas, y segundo, proporcionar al alumno todo aquello que él necesite para llenar un programa que se le habrá fijado. ¿Y qué pasa en la escuela? Exactamente ni más ni menos que lo que pasa en el

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mundo. Atento a su desarrollo personal, el niño –dentro como fuera de la escuela– aceptará o rechazará lo que vaya pasando ante él. Con lo cual quiere decirse que lo que le impongan –sea en el sentido educativo como en el de aprender– es trabajo perdido. En cambio, lo que él escoja para su formación eso será lo que le aprovechará, y no valdrá buen ejemplo ni imposición ni premio ni castigo, pues las cosas no pueden pasar de otro modo. Por esto la escuela hace relativamente poco, porque aparte de aquello muy elemental como es saber leer, escribir y contar (que pueden dar origen a todas las actividades), lo demás, si no es con la aquiescencia del alumno, se aprende para olvidarlo. Al comenzar hemos hablado de responsabilidad... menos tenemos de lo que creemos (y esto es lo triste del caso), porque yo me he puesto frente a un niño y me he preguntado si podía enseñarle algo y he visto que no. Quizás esto que digo sorprenda, o puede que no sorprenda, porque otros habrán pensado lo mismo que yo. Veo en cambio que su experiencia, su acción, es lo que solo pueden enseñarle. (Quiero englobar de momento enseñanza y educación porque, en el fondo, hoy no veo que sean cosas distintas.) Tomando pie en esto que digo (que para mí es una convicción) veo que hemos de mirar que, con toda nuestra buena voluntad, no desviemos al niño de su verdadero camino, que es el de la acción para conocerse y desarrollarse. Miremos que nosotros, debido a eso, ya no estamos en armonía con las leyes naturales y que hasta ignoramos su existencia. Se verá esto luego y en qué sentido es dicho. Ciñéndonos al tema, yo puedo decir (también con convicción) que generalmente todo lo que se entiende por enseñanza de dibujo es desviar al niño, reducirlo a la impotencia, para que ya jamás pueda decir algo propio. Y en las demás materias que se le enseñan suele pasar lo mismo: se le desvía ordinariamente del verdadero camino natural, que es la


Primeira conferência

Considerações gerais Em relação ao ensino e à educação, sou bastante cético; acho que não se pode ensinar nem se pode educar. O que há é que cada criança pode aprender, se ela quiser, e pode educar a si mesma, se isso o sente. E é tudo. Por outro lado, não vejo diferença essencial entre uma criança e um adulto. Maior ou menor desenvolvimento em um do que no outro, maior ou menor experiência, só isso. No tempo em que eu estava dentro da pedagogia, entre professores e crianças, entre livros e métodos de ensino, eu achava outra coisa. Hoje, afastado de tudo isto, tendo recobrado uma independência em relação a essa fase, que então não tinha, já não tenho aquele critério. Além disso, acho firmemente que um indivíduo vem completamente formado para um desenvolvimento determinado, e que não há força no mundo que possa torcer isso. Com isso quero dizer: existe uma razão de ser sua. Como, pois, vai-se educar em um sentido determinado? Para fazê-lo ser diferente do que é, o indivíduo teria de voltar a se forjar. O meio influi, mas não no sentido de mudá-lo. Influi no sentido de fazê-lo encontrar, mais em um meio do que em outro, tudo aquilo que seja adverso ou favorável ao seu desenvolvimento. Nada além disso. Daí deduzimos que o trabalho do pedagogo é nulo, que a escola é inútil? De jeito nenhum. O que há, é que o pedagogo e a escola poderão pouco, tudo depende do aluno. O indivíduo é, pois, algo dado, e em virtude disso, procura aquilo que lhe convém. Nem o meio nem o professor terão a ver com isso. Pois bem, o que é o professor, o que é a escola? O professor tem uma função dupla: por um lado, obrigar [o aluno] – queira a criança ou não – a seguir certas disciplinas e a ficar sabendo de certas coisas, e, por outro lado, proporcionar ao aluno tudo aquilo que ele precise para preencher um programa que lhe será estabelecido. E o que acontece na escola? Exatamente nem mais nem menos do que acontece no mundo. Atento ao seu desen-

volvimento pessoal, a criança – dentro como fora da escola – aceitará ou rejeitará o que lhe acontece. Com isso, quer se dizer que o que lhe imponham – seja no sentido educativo como no de aprender – é trabalho perdido. Por outro lado, o que ele escolhe para a sua formação é o que aproveitará, e não valerá bom exemplo nem imposição, nem prêmio nem castigo, pois as coisas não podem acontecer de outra maneira. Por isso, a escola faz relativamente pouco, porque além daquilo muito elementar como ensinar ler, escrever e contar (que podem dar origem a todas as atividades), o resto, se não for com a aquiescência do aluno, apreende-se para esquecer. No começo, falamos da responsabilidade... menos temos do que acreditamos (isso é o triste do caso). Porque eu tenho me colocado frente a uma criança e me perguntado se podia lhe ensinar algo, e vejo que não. Surpreendentemente ou não, outros têm pensado o mesmo que acabo de afirmar. Vejo, porém, que a sua experiência e sua ação é tudo o que podem ensinar. (Quero englobar agora ensino e educação, pois, no fundo, hoje não vejo que sejam coisas distintas.) Partindo disso que digo (e que para mim é uma convicção), devemos cuidar, com toda a nossa boa vontade, para não desviarmos a criança do seu verdadeiro caminho, que é o da ação para se conhecer e se desenvolver. Fiquemos de atentos para o fato de que nós, devido a isso, já não estamos em harmonia com as leis naturais e que até ignoramos a sua existência. Logo se verá em que sentido isso é dito. Atendo-nos ao tema, posso dizer (também com convicção) que geralmente tudo o que se entende por ensino de desenho consiste em desviar a criança, em reduzi-la à impotência para que jamais possa dizer algo próprio. E nas demais matérias que lhe são ensinadas, acontece o mesmo: desvia-se o aluno ordinariamente do verdadeiro caminho natural, que

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acción, para conocerse y formarse. Pues queremos hacer con él lo que otros han hecho con nosotros. Parece que hemos de realizar un tipo de hombre aceptado por todos; y para esto vestir, saludar, imitar gestos y maneras, ocupaciones, modo de hacer las cosas, conversaciones, pasatiempos, lecturas, juegos, un sinfín de cosas. Y si faltamos a cualquiera de ellas, a cualquiera de esas cosas convencionales, ya nos parece que hemos pecado, ya enrojecemos de vergüenza. Y si realizamos ese tipo de hombre recogido, ya nos parece que hemos hecho algo notable. Yo veo en cambio que hemos de cuidar de no matar en el niño al hombre verdadero el cual siempre acciona en sentido libre y esto para conocer y formarse. Es innegable que el hombre gana con la cultura, pero ¿qué debemos cultivar? Sobre esto mi criterio es éste: que el hombre ya viene hecho, perfecto para armonizar con todo lo natural. Por esto cuidemos de no estropear esa cosa tan delicada para que conserve todos sus maravillosos instintos y potencialidades, y así realice su experiencia de la vida. Y para esto ¿qué debe hacer el maestro? Pues ponerse en el plano en que está el niño. La enseñanza que se acostumbra a dar en todas las escuelas del mundo no corresponde a ese plano, correspondería más bien al plano en que puede estar un joven de 20 años. Y es que el pedagogo, siempre teniendo en cuenta un fin social, pensando (y hasta sin pensar y como obrando inconscientemente) pensando, digo, en el futuro hombre que está moldeando (haciéndolo a su imagen) hechura suya (¡y él es un hombre!), haciendo un futuro hombre, digo, ¡mata al niño! Mata al niño. Troncha una flor. ¿Y qué era aquel niño, aquel niño que murió? Una cosa preciosa: un sabio. Tan sabio que por él hubiéramos podido aprender mucho. Saber lo que no sabremos jamás porque sufrimos

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la misma suerte que él. Y por esto es que hay tan pocos sabios en el mundo y, en cambio, hay muchísimos hombres inteligentes. Volveremos sobre eso luego, y diremos lo que a nuestro juicio debiera enseñarse al niño. Siguiendo este orden de ideas, una de las cosas más importantes –a mi juicio– es que el niño se dé cuenta de lo que posee. Lo que se puede llamar verdaderamente conocimiento (conocimiento directo) es el modo propio y natural de conocer del niño, y por esto no convendría sacarlo de ese plano para ponerlo en el de lo convencional. Aunque hay niños, que pronto pierden esa maravillosa facultad, son aquellos que suelen ser aficionados a la guerra y al negocio, por las cosas de lucha, de combate. Esos, prematuramente, ya están pervertidos. Ya han sufrido el injerto del hombre maduro, mal injerto, porque ese no es el hombre verdadero. El hombre verdadero es el niño, o el hombre maduro en quien no ha muerto el niño. Lo que se debe tener en cuenta al tratar de despertar aquello latente que trae el niño, es no oponerse a él. Al contrario, hay que seguirle siempre, a fin de desarrollar su tendencia natural y que haga su experiencia. Por esto, aquello que puede probar mejor la bondad de un método pedagógico y la capacidad de un maestro en aplicarlo me parece que tiene que ser la mayor o menor personalidad de sus discípulos. Hay escuelas que son a manera de laminadores, donde domina la voluntad del maestro y, más que esto, algo peculiar suyo que contagia al alumno (sea bueno o malo), y esto es de lo más perjudicial. ¡Da miedo pensar en la obra que hacen! Piensen, pues, los maestros, que no es sin grave y trascendental importancia ponerse a ejercer ese ministerio. Y ahora, si se me preguntase cómo puede adquirirse la verdadera ciencia de enseñar, diría: haciéndose discípulo del niño, aprendiendo del niño, olvidando que se es adulto.


é a ação para se conhecer e se formar. Pois queremos fazer com ele o que outros têm feito com nós. Parece que temos de realizar um tipo de homem aceito por todos, e, para isso, vestir, cumprimentar, imitar gestos e maneiras, ocupações, formas de fazer as coisas, conversações, passatempos, leituras, jogos, um sem-fim de coisas. E se faltamos a qualquer delas, a qualquer uma dessas coisas convencionais, parece que pecamos e ruborizamos de vergonha. E se realizamos esse tipo de homem recolhido, sentimos como se tivéssemos feito algo notável. Acredito, porém, que devemos cuidar para não matar na criança o homem verdadeiro, aquele que sempre age em sentido livre para se conhecer e se formar. É inegável que o homem ganha com a cultura, mas o que devemos cultivar? Sobre isso minha opinião é: que o homem já vem feito, perfeito para harmonizar com tudo que é natural. Por isso, cuidemos de não estragar essa coisa tão delicada, para que [o indivíduo] conserve todos os seus maravilhosos instintos e potencialidades e, portanto, sua experiência da vida. E para isso o que deve fazer o professor? Pôr-se no plano em que está a criança. O ensino que se costuma dar em todas as escolas do mundo não corresponde a esse plano, corresponderia melhor àquele de um jovem de 20 anos. Pois o pedagogo, sempre considerando um fim social, pensando (e mesmo sem pensar e trabalhando inconscientemente) no futuro homem que está moldando (fazendo-o a sua imagem), feitura sua (e ele é um homem!), fazendo esse futuro homem, mata a criança! Mata a criança. Arranca uma flor. E o que era aquela criança, aquela criança que morreu? Uma coisa preciosa: um sábio. Tão sábio que poderíamos ter aprendido muito com ele. Saber o que não saberemos jamais, porque sofremos a mesma sorte que ele. É por isso que se tem tão poucos

sábios no mundo e, por outro lado, há muitíssimos homens inteligentes. Voltaremos a isso logo, e falaremos o que para nosso critério deveria ensinar-se à criança. Continuando com essa ordem de ideias, uma das coisas mais importantes – a meu ver – é que da criança perceba o que possui. O que se pode chamar verdadeiramente de conhecimento (conhecimento direto) é a forma própria e natural de conhecer a criança, e, por isso, não seria conveniente tirá-lo desse plano para pô-lo no plano convencional. Há crianças que logo perdem essa maravilhosa faculdade, aquelas que logo se tornam aficionadas pela guerra e pelos negócios, pelas coisas de luta e de combate. Estas, prematuramente, já estão pervertidas. Já sofreram o enxerto do homem maduro, mal enxerto, porque não é o do homem verdadeiro. O homem verdadeiro é a criança, ou o homem maduro em quem não tenha morrido a criança. O que se deve ter em conta quando se quer despertar o que está latente na criança é não se opor a ela. Pelo contrário, é preciso seguir-lhe sempre com a finalidade de desenvolver a sua tendência natural de realizar sua experiência. Por isso, aquilo que pode provar melhor a generosidade de um método pedagógico e a capacidade de um professor ao aplicá-lo, acredito, tem de ser a maior ou menor personalidade dos seus discípulos. Há escolas que funcionam como rolo compressor, onde domina a vontade do professor e, mais do que isso, algo peculiar dele que contagia ao aluno (seja bom ou ruim), e isso é das coisas mais prejudiciais. Dá medo pensar na obra que fazem! Pensam, pois, os professores que exercer essa função não é algo grave e de transcendental importância. E agora, se me perguntarem como pode se adquirir a verdadeira ciência de ensinar, diria: fazendo-se discípulo da criança, aprendendo com ela, esquecendo que se é um adulto.

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Lo importante siempre es que el niño se dé cuenta de lo que sabe, que es como decir de lo que es. Porque da un verdadero paso cuando tiene conciencia de eso que sabe y es. Por esto la actitud del maestro ha de ser, en cierto sentido, pasiva. Eso que llaman enseñanza y educación (hablo en general, y no conozco, por otra parte, ninguna escuela del Uruguay), eso, digo, que llaman enseñanza y educación, hay que decir que es un grave error: el aniquilamiento del hombre verdadero. A cambio de lo que el niño trae para sí con proporción y medida, o sea, con ajuste perfecto, según sus necesidades y futuros desarrollos, se le da algo fosilizado. Algo que se pretende incorporar a él, quiera él o no, y pegue o no pegue, pues ese niño es un número (un niño en abstracto). Parta más bien el maestro de otra cosa: esté persuadido de que jamás sabe aquello que conviene al niño, y trate de explorarlo. Y cuando lo sepa ayúdele con sus conocimientos. Hecho esto, entonces viene lo más importante: que el maestro haga por manera de que el niño se dé cuenta de lo que sabía y de que él, el maestro, no le ha enseñado nada. O sea, que tenga conciencia de lo que es. Pero, dirá alguien, ¿adónde iríamos a parar con semejante método de enseñanza? ¿Y las buenas costumbres y maneras, los hábitos buenos, la educación, en suma? Y otro que protesta y recuerda que, además de educarse, el niño ha de instruirse, que ha de

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adquirir conocimientos generales, etc. Contra esto digo: lo que conviene que sepa el niño, solo él lo sabe, y esto tanto en lo que respecta a la educación como en lo que respecta a la enseñanza (que en ese momento histórico del niño deberá ser lo mismo) Volveremos sobre eso. Otra cosa, todo aquello que pueda llamarse defecto en un niño, o mala tendencia, yo aseguro que si no se la violenta y si se le da un cauce apropiado, inteligente, puede ser una cualidad de primer orden. Este es un asunto delicado. Y ahora, para el caso aquel en que se crea que puede haber en el niño algo que tengamos derecho a extirpar, piénsese que sea cual fuere el método que empleemos no llegaremos a conseguirlo, porque es algo indestructible. En general ¿qué debe hacerse? Seguir al niño sin temor ni duda. Disciplina y obediencia ¿Por qué ha de obedecer el niño? ¿Por qué ese respeto sagrado a los mayores? ¿Con qué derecho se le priva de ciertas cosas? Yo no comprendo todo eso. Dejemos de lado la tan manoseada cuestión del bien y del mal, caballo de batalla de moralistas y filósofos y preocupación de toda clase de gentes. Porque en el fondo de esa cuestión, antes que otra cosa yo veo convencionalismo. Es decir, algo postizo (nada de bien ni mal) que trabaja por encima de los hechos reales profundos, únicos que importarán, que es donde está situado el ser virgen: el niño. Por esto, ante cierto espíritu social, la sinceridad del acto de cualquier niño no lo justifica. Y con esto matamos algo de lo mejor que poseía. Y a cambio de eso ¡fijarse lo que le damos! Vamos ahora a los derechos del niño. He visto poblarse mi casa con nuevos individuos, libres como yo, con los que he comenzado nuevas relaciones, como entre amigos. Ciertos derechos que yo creo tener debo hacérmelos respetar y yo respeto los de ellos. Nos tratamos de igual a igual. Ellos tienen sus aspiraciones, sus gustos y caprichos, y yo los míos, y hacen sus personales investigaciones y experimentos, y yo los míos.


O importante sempre é que a criança perceba o que sabe, que é mesmo que perceber o que é. Porque [ela] dá um verdadeiro passo quando tem consciência disso que sabe e é. Por isso, a atitude do professor tem de ser, de certa forma, passiva. É preciso dizer que isso que chamam de ensino e educação (falo em geral, e não conheço, por outro lado, nenhuma escola no Uruguai) é um grave erro: a aniquilação do homem verdadeiro. Ao contrário do que a criança traz em si mesma com proporção e medida, ou seja, com ajuste perfeito, conforme suas necessidades e futuros desenvolvimentos, dá-se-lhe algo fossilizado. Algo que se pretende incorporar a ela, queira ela ou não, grude ou não grude, pois essa criança é um número (uma criança em abstrato). É preciso que o professor parta de outra coisa: esteja persuadido de que jamais sabe aquilo que convém à criança e trate de explorá-lo. E quando o saiba, ajude-lhe com seus conhecimentos. Feito isso, então, vem o mais importante: que o professor faça que a criança perceba o que sabia e que ele, o professor, não lhe ensinou nada. Ou seja, ajude a criança a ter consciência do que é. Mas, dirá alguém, aonde iríamos parar com semelhante método de ensino? E os bons costumes e maneiras, os bons hábitos, a educação, em suma? Outro poderá reclamar e lembrar que, além de ser educada, a criança precisa instruir-se, que deve adquirir conhecimentos gerais etc. Contra isso digo: o que convém que a criança saiba só ela o sabe, e isto tanto no que diz respeito à educação como no que concerne ao ensino (que nesse momento histórico da criança será o mesmo). Voltaremos a isso. Outra coisa, tudo aquilo que possa se chamar defeito em uma criança, ou má tendência, garanto que, se [ela] não é violentada e sim dá-se-lhe um leito apropriado, inteligente, pode ser uma qualidade de primeira ordem. Esse é um assunto delicado. E agora, aqueles que acre-

ditam que possa haver na criança algo que tenhamos o direito de extirpar, não importa qual método empreguemos, [saibam que] não chegaremos a consegui-lo, porque é algo indestrutível. Em geral, o que se deve fazer? Seguir a criança sem temor nem dúvida. Disciplina e obediência. Por que a criança deve obedecer? Por que esse respeito sagrado aos maiores? Com que direito se lhe priva de certas coisas? Eu não compreendo tudo isso. Deixemos para lá a velha questão do bem e do mal, cavalo-de-batalha de moralistas e filósofos, e preocupação de toda classe de gentes. Porque no fundo dessa questão, antes de qualquer coisa, vejo convencionalismo. Ou seja, algo postiço (nada de bem ou mal) que trabalha por cima dos fatos reais profundos, únicos que importarão, que é onde está situado o ser virgem: a criança. Por isso, ante certo espírito social, a sinceridade do ato de qualquer criança não o justifica. E com isso matamos algo do melhor que possuía. E em troca disso, devemos prestar atenção no que lhe damos! Vamos agora aos direitos da criança. Tenho visto a minha casa povoar-se com novos indivíduos, livres como eu, com os que tenho começado novas relações, como entre amigos. Certos direitos que eu acho ter, devo fazê-los respeitar, e eu devo respeitar os deles. Tratamo-nos como iguais. Eles têm as suas aspirações, seus gostos e seus caprichos, e eu os meus. Fazem suas investigações pessoais e experimentos, e eu os meus.

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¿Todo esto no es muy natural? Y es cierto que yo tengo una experiencia pero ésta solo puede servirme a mí. En cambio, por otro lado, ellos tienen otra, más antigua y más vasta, que está más en armonía con las leyes de la vida. Pues yo he perdido eso. Por esto puede afirmarse que el niño está aún dentro de la sabiduría, por esto de la inocencia. Lo que saben y lo que hacen de acuerdo con esto que saben es perfecto. Están en el plano del hombre verdadero. Con respecto a los niños mi trabajo único, después de comprenderles, ha sido llevarlos a la conciencia de ellos, que es decir de eso tan precioso que poseen y de lo que son, y en cuanto a lo convencional, esa fantástica construcción que, abarcando todos los tiempos, puede llamarse sociedad, que por tiempo la ignoren. Las palabras “enseñanza” y “educación”, después de lo dicho, casi me parecen ridículas. Pero hay que añadir más. Dado que se pueda enseñar (que yo creo que no) y dado que se pueda y deba educar, reprimir, desviar (en lo que tampoco creo), dado que eso no fuese (como es) el camino opuesto, ahora yo pregunto: ¿qué podemos enseñar, cuando tenemos tanto que aprender, desviados como estamos del verdadero camino y deformados todos, por pésimas costumbres artificiales con conceptos equivocados (aunque se crea lo contrario) estrechos y a veces miserables? ¿Qué podemos enseñar en educación, mutilados como estamos, atrofiados los sentidos, pervertidos, sustituido el verdadero conocimiento por un ficticio desarrollo de un saber físico encarado a lo convencional, y por lo tanto encasillados, moral y materialmente, en moldes? Testimonio de esa desviación, y algo que la delata, es la deformación física (yo soy un bello ejemplar), tan apartada del tipo ideal humano, y las crecientes innumerables enfermedades (cosa nada normal), lo corto del vivir y los desequilibrios del mundo psíquico… Por esto, a eso que llamamos enseñar yo llamaría contaminar y también pervertir, atrofiar y desencaminar.

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Miremos que, en vez de hacer un bien al niño, no le hagamos un mal. Y esto por desconocimiento nuestro. Porque nos parece natural pensar que dentro del niño no hay nada. Por esto pensamos que es como una hoja de papel en blanco, sobre la que podemos escribir lo que queramos. Y no es así. Pensemos que ni Sócrates ni Platón (verdaderos educadores) creyeron eso. Al contrario: hemos de pensar que dentro de cada niño habita la sabiduría y que de nuestra habilidad depende que él descubra ese mundo: que tenga conciencia. Con respecto a la sociedad, el hombre –como el niño– puede tomar dos actitudes, o bien se adapta (y son los más) o bien sigue su norte, su estrella, algo de genio que le guía. En el fondo, uno y otro han hecho lo mismo: se han desarrollado en el sentido que debían. Ahora, lo que hay de cierto es que han tomado dos caminos opuestos: el del bienestar, el primero; el de la virtud, de la sabiduría, de la justicia, el segundo. Y de la escuela y del maestro habrán tomado lo que más les habrá convenido. Pero ¿se habrán dado cuenta de esos caminos que habrán tomado y que el camino que han formado son ellos mismos? Aquí es donde únicamente el maestro puede hacer algo. Y debe hacerlo: que se den cuenta, pero sin pretender desviarlos. Camino de lo convencional, de la mentira, del error, del egoísmo, aquel del que se adapta. Camino de la sabiduría, de la ley, de lo justo, el de aquel que si está en desacuerdo con el mundo, no lo está con su conciencia. El primero podrá saber muchas cosas, el segundo sabe –así, en singular–, está en la ley, que es el saber universal. El primero está en lo físico, el segundo en el espíritu, el primero con él solo, el segundo con todos. Porque el adaptarse es ponerse de acuerdo con algo convencional hecho por los hombres, mientras que el que no se ha adaptado es porque está de acuerdo con el espíritu de la naturaleza, es decir, con algo que es, algo de fijo, de permanente, porque es la ley: la verdad.


Tudo isso não é muito natural? E é certo que eu tenho uma experiência, mas ela só pode servir a mim. Entretanto, por outro lado, eles têm outra, mais antiga e mais vasta, que está mais em harmonia com as leis da vida. Algo que já perdi. Por isso, pode-se afirmar que a criança está ainda dentro da sabedoria pela inocência. O que sabem e o que fazem de acordo com o que sabem é perfeito. Estão no plano do homem verdadeiro. Em relação às crianças, meu trabalho único, depois de lhes compreender, tem sido levá-los à consciência deles mesmos, disso tão precioso que possuem e são. Quanto ao convencional, essa fantástica construção que, abarcando todos os tempos, pode-se chamar sociedade, ensino que por tempo a ignorem. As palavras “ensino” e “educação”, acredito, são quase ridículas. Mas há que se acrescentar mais. Dado que se possa ensinar (o que acho que não) e dado que se possa e se deva educar, reprimir, desviar (no que tampouco acredito), dado que isso não fosse (como é) o caminho oposto, agora eu pergunto: o que podemos ensinar, quando temos tanto a aprender, desviados como estamos do verdadeiro caminho e deformados, todos, por péssimos costumes artificiais, com conceitos equivocados (embora se ache o contrário), estreitos e às vezes miseráveis? O que podemos ensinar em educação, mutilados como estamos, com os sentidos atrofiados, pervertidos, tendo substituído o verdadeiro conhecimento por um fictício desenvolvimento de um saber físico encarado de forma convencional e, portanto, catalogado, moral e materialmente, em moldes? Testemunha desse desvio, e algo que o delata, é a deformação física (eu sou um belo exemplar), tão apartada do tipo ideal humano, e as crescentes e inumeráveis doenças (coisa nada normal), a vida curta e os desequilíbrios do mundo psíquico... Por isso, o que chamamos de ensino, eu chamaria contaminar, e também perverter, atrofiar e desencaminhar. Cuidemos que, no lugar de fazer um bem para a criança, não lhe façamos um mal. E isso, por falta de conhecimento

nosso. Pois achamos natural pensar que dentro da criança não há nada. Por isso, pensamos que [ela] é como uma folha de papel em branco, sobre a qual podemos escrever o que quisermos. E não é assim. Lembremos que nem Sócrates nem Platão (verdadeiros educadores) acreditavam nisso. Pelo contrário, temos de pensar que dentro de cada criança habita a sabedoria, e que da nossa habilidade depende que ela descubra esse mundo, que tenha consciência dele. Em relação à sociedade, o homem – como a criança – pode ter duas atitudes, ou bem se adapta (a maioria) ou bem segue o seu norte, sua estrela, algo de gênio que o guia. No fundo, um e outro têm feito o mesmo: têm-se desenvolvido no sentido que deviam. Agora, o certo é que são caminhos opostos: o do bem-estar, o primeiro; o da virtude, da sabedoria, da justiça, o segundo. E da escola e do professor, pegarão o que mais lhes convier. Mas, terão percebido esses caminhos que escolheram, e que o caminho que têm feito são eles mesmos? Aqui é onde unicamente o professor pode fazer alguma coisa: deve fazê-los perceber, mas sem pretender desviá-los. O caminho do convencional, da mentira, do erro, do egoísmo, é aquele de quem se adapta. O caminho da sabedoria, da lei, do justo, é aquele em que se está em desacordo com o mundo, mas não com a sua consciência. O primeiro poderá saber muitas coisas, o segundo sabe – assim, em singular –, está na lei, que é o saber universal. O primeiro está no físico, o segundo no espírito, o primeiro com ele só, o segundo com todos. Porque o se adaptar é se pôr de acordo com algo convencional feito por homens, enquanto que quem não se adaptou é porque está de acordo com o espírito da natureza, é dizer, com algo que é, algo de fixo, de permanente, porque é lei: a Verdade.

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Estas diferencias en los niños son poco acentuadas, todos están en el paraíso, en la inocencia y el saber. Después, poco a poco, se van acentuando, y luego vemos pronto niños que ya parecen hombres, y luego, más tarde aún, hombres que, por suerte, aún parecen niños. Pues bien, con respecto a las artes (y también al dibujo en la escuela), esto sucede del mismo modo: puede y debe enseñarse el error, y puede y debe enseñarse la verdad. Debe enseñarse el error para aquel que enderece su actividad hacia él, hacia lo convencional (el gran andamiaje social) y entonces, dentro del error, deberá enseñársele perspectiva, la relatividad de sombras y luces, el gesto fugaz, el movimiento, lo anecdótico, en una palabra: se le enseñará a copiar la apariencia de las cosas. Pero hay que repetirlo: el alumno deberá escoger este camino y no imponérselo. Deberá también enseñarse la verdad para aquel que enderece su camino hacia ella. A éste casi no habrá que enseñarle nada, podrá casi dejársele que haga, pero por si se desviara, se le enseñará (mostrándole imágenes fotográficas en que aparezcan acusadas las líneas de la perspectiva) que esto es un error, que aquellas líneas, si se ven así, no son en realidad tal como se ven sino horizontales y verticales, y que en el dibujo habrá que rectificar este error, y por lo tanto, que debe dibujar la imagen que él ve adentro, la imagen mental, y no la que ven sus ojos, pues la primera es verdad y la segunda un error visual, etc. De estos dos puntos de partida se derivan una serie de lecciones interesantísimas que trataremos más adelante. Vuelvo a mi tema de que nada de espíritu (que es el alma de todo) puede enseñarse. Porque si ese espíritu no está ya en aquel a quien queremos hacer comprender algo, es imposible de toda imposibilidad que jamás nos comprenda. Porque todo es reacción de algo que duerme en lo profundo nuestro. Por esto el único método de enseñar será siempre el socrático. Tanto me da que se diga que el niño juega como que trabaja. Y lo mismo del adulto. Yo sé únicamente que

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tanto el uno como el otro trabajan cuando han de hacer algo por imposición, en desacuerdo con sus tendencias. Y que, por el contrario, juegan cuando lo que hacen responde a un impulso interior, de dentro hacia afuera, por ello en armonía con lo que son. Sin vacilar digo: que ni el niño ni el adulto tendrían jamás que trabajar, salvo excepcionalmente. A la escuela, pues, el niño tendrá que ir siempre a jugar, y excepcionalmente a trabajar. El maestro, en la escuela, tendría que ser un niño más y tratar a los niños de igual a igual, todos en un mismo plano. Y esto no de una manera aparente sino efectiva. El maestro tendría que ser una verdadera enciclopedia en conocimientos y técnicas, y la escuela algo que participase del taller, del laboratorio, de la casa, de la biblioteca, del teatro, etc. Y polarizándose, aun de la calle, de la ciudad y del mundo. En esa escuela todos podrían hacer lo que mejor les pareciera y accionaría como las cosas accionan fuera de la escuela. ¿Queréis que vuestros discípulos dibujen? Dibujad vos primero. Y dibujará aquel que tenga que dibujar, otro mirará, otro hará otra cosa, cada niño hará exactamente lo que tenga que hacer. Y eso sin libertad no sería posible. ¿Qué ganaréis con que dibuje aquel que no tiene que dibujar? No corrijáis nunca al discípulo, en cambio, preguntadle por qué ha hecho en tal forma aquello que a vosotros no os ha parecido bien y hacedle acentuar el defecto. Porque por ese lado seguramente hallaréis el camino que él debe seguir. En ese defecto, sin duda, está su personalidad. Y esto vale tanto para el dibujo como para todo aquello que tengáis que resolver con un niño. Y recordad siempre esto: ni represión, ni imposición. Al contrario: haced que manifieste lo que lleva dentro. Si el niño no se corrige a sí mismo


Essas diferenças nas crianças são pouco acentuadas, todos estão no paraíso, na inocência e no saber. Depois, pouco a pouco, vão se acentuando, e logo vemos crianças que cedo já parecem homens e, mais tarde ainda, homens que, por sorte, ainda parecem crianças. Pois bem, em relação às artes (e também ao desenho na escola), isso acontece da mesma forma: pode-se e deve-se ensinar o erro, e pode-se e deve-se ensinar a verdade. Deve-se ensinar o erro para quem dirige sua atividade para o erro, para o convencional (a grande estrutura social) e, então, dentro do erro, ensinar-lhe a perspectiva, a relatividade de sombras e luzes, o gesto fugaz, o movimento, o anedótico, em uma palavra: ensiná-lo a imitar a aparência das coisas. Mas é preciso reforçar que o aluno deve escolher esse caminho, e não se deve impô-lo. Deve-se também ensinar a verdade para aquele que direcione seu caminho para a verdade. Para este, não será preciso ensinar quase nada, basta deixar que faça. Mas se ele se desviar, será preciso ensinar-lhe (mostrando imagens fotográficas em que apareçam denunciadas as linhas da perspectiva) que isto é um erro, que aquelas linhas, se vistas dessa forma, não são iguais ao que enxergam, mas horizontais e verticais; e que no desenho será necessário retificar esse erro, ou seja, que se deve desenhar a imagem que se vê de dentro, a imagem mental, e não a que os olhos veem, pois a primeira é verdade e a segunda um erro visual etc. Desses dois pontos de partida, derivam uma série de lições interessantíssimas das que trataremos mais adiante. Volto para o meu tema de que nada do espírito (que é a alma de tudo) pode se ensinar. Porque se esse espírito já não está naquele a quem queremos fazer compreender algo, é absolutamente impossível que [ele] venha a nos compreender. Porque tudo é reação de algo que dorme profundamente em nós. Por isso, o único método de ensinar será sempre o socrático. Tanto faz para mim que se diga que a criança brinca como que trabalhando. E o mesmo do adulto. Eu sei uni-

camente que tanto um como outro trabalham quando têm de fazer alguma coisa por imposição, em desacordo com as suas tendências. E que, pelo contrário, brincam quando o que fazem responde a um impulso interior, de dentro para fora, e por isso em harmonia com o que são. Sem vacilar digo que nem a criança nem o adulto jamais teriam de trabalhar, salvo excepcionalmente. À escola, pois, a criança deve ir sempre brincando, e excepcionalmente trabalhando. O professor, na escola, teria de ser uma criança a mais e tratá-la de igual para igual, todos num mesmo plano. E isso não de uma maneira aparente, mas efetiva. O professor teria de ser uma verdadeira enciclopédia em conhecimentos e técnicas, e a escola algo que participasse da oficina, do laboratório, da casa, da biblioteca, do teatro etc. E se polarizando em relação à rua, à cidade e ao mundo. Nessa escola, todos poderiam fazer o que melhor lhes parecesse, ela funcionaria como as coisas funcionam fora da escola. Querem que seus alunos desenhem? Desenhe você primeiro. E desenhará aquele que tiver de desenhar, outro olhará, outro fará outra coisa, cada criança fará exatamente o que tiver de fazer. E isso sem liberdade não seria possível. Que ganhará fazendo desenhar aquele que não precisa desenhar? Não corrija nunca o aluno, diferentemente, perguntelhe por que tem feito de tal forma aquilo que para você não parece direito e faça-o acentuar o defeito. Porque, por esse lado, seguramente, ele encontrará o caminho que deve seguir. Nesse defeito, sem dúvidas, está a sua personalidade. E isso vale tanto para o desenho como para tudo aquilo que precisar resolver com a criança. E lembre sempre disto: nem repressão, nem imposição. Pelo contrário, faça que [o aluno] manifeste o que leva dentro. Se a criança não corrige a si

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por una autocrítica especial, si no se abstiene porque quiere, tened por seguro que no ha dado ni un solo paso en su camino. No me desdigo de lo que he dicho antes: que nada puede enseñarse. Por tanto, si el maestro no sabe dibujar, poco importa. En cambio, en lo que quiero al maestro habilidoso es en despertar aquello que lleve dentro el discípulo. Preguntad quién sabrá dibujar un objeto cualquiera: se adelantará el que tenga que adelantarse, porque aquél será su trabajo. No hagan sistema los maestros, el discípulo espontáneamente hará el suyo. El maestro ha de mantenerse en absoluta pasividad en cuanto a eso. Porque el maestro que enseña con un método o procedimiento tiene que hacer una mala obra. Creo que la escuela ha de ser, antes que una institución social, una institución humana. Por encima de las tierras y las épocas, en ella ha de trabajar aquello que es: algo universal. Por esto, por encima de todo pondremos a las cualidades personales. Al niño no le quiero heredero de la raza, civilización, a la que pertenece para hacer de él un hombre despierto a las realidades prácticas, sería prematuro. Él está dentro de algo más grande, más universal. Y ahora es el momento de indicar aquello que debe enseñarse al niño. Mi criterio es que debe enseñársele todo lo que es de orden general o universal, y esto en todos los sentidos. Idea del mundo, de su formación, sus leyes, la astronomía, y qué es el fuego y el agua, y los vientos y el mar, los fenómenos celestes y la geometría, las grandes rutas de los navegantes y el trabajar en materiales diversos, y el dibujar y pintar, el danzar y hacer música, los inventos, la construcción de objetos, el germinar de las semillas y el cultivo, el estudio de los animales, las grandes obras del hombre, etc. Pero todo

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esto sin mentar países, ni fechas, no como cosa histórica sino como cosa existente siempre. Y háblese de ejemplos de bondad y de maldad, pero sin que el maestro emita juicios, y observe las reacciones sin comentarlas, refuerce las opiniones del bueno y del malo pero con grande exageración a fin de que se den cuenta. Pero no dé importancia al asunto. Lo importante es, sea lo que sea, que la conciencia se despierte. Coloquémonos en el plano, que podríamos llamar magnético, de la naturaleza (en que ya está el niño) y veremos cómo nos comprende al momento. En cambio, el niño no comprende la razón, lo convencional. Por otra parte, tampoco tiene valor para él. Para él tiene gran valor todo lo que sea una cualidad personal. Que comprenda el niño que en la escuela está solo, tal como si estuviera en la calle. Y que si tiene una absoluta libertad también tiene responsabilidad. Ante un problema que haya de resolver, o ante un dibujo que haya de hacer (sea copiando o inventando, o interpretando), que se sienta también solo, sin el apoyo del maestro, que sea en el caso que sea, desde un principio ya ha de comprender que deberá bastarse a sí mismo. Que comprenda bien el niño que no aprende a dibujar sino que ya dibuja, esto es: que hace algo definitivo. Que lo que hace, pues, no es un camino para llegar a otra cosa. No quiero a los maestros evangélicos, sino hombres de carácter que se impongan por sí mismos. Y la escuela ha de ser a puertas abiertas, que por ella circule siempre puro aire de libertad. Los niños vendrán a vosotros, maestros, llenos de prejuicios, llenos de atavismos, contaminados por parientes y vecinos, por el medio en que vivan. ¡Limpiadlos de todo eso, sin temor a consecuencias! ¡Sed sinceros y puros! Y sobre todo que en la escuela no anide la horrible hipocresía, el único crimen –casi– que puede cometer el hombre. Y aun tened más cuidado con esto: he leído en Goethe que “el niño es el padre del adulto”.


mesma, por uma autocrítica especial, se não se abstém porque quer, pode ter certeza que não tem dado nem um só passo em seu caminho. Não desminto o que afirmei antes: que nada pode ser ensinado. Assim, se o professor não sabe desenhar, pouco importa. Entretanto, o que quero do professor habilidoso é que ele desperte aquilo que o seu aluno leva dentro de si. Pergunte quem saberá desenhar um objeto qualquer: adiantar-se-á aquele que tenha de se adiantar, porque aquele será o seu trabalho. Não façam sistema os professores, o discípulo espontaneamente fará o seu. O professor deve se manter em absoluta passividade em relação a isso. Porque o professor que ensina com um método o procedimento fará uma má obra. Acho que a escola, antes de ser uma instituição social, deve ser uma instituição humana. Por cima das terras e das épocas, ela tem de trabalhar aquilo que é: algo universal. Por isso, por cima de tudo, poremos as qualidades pessoais. Não quero a criança herdeira de raça, civilização, à que pertence para fazer dela um homem desperto às realidades práticas, isso seria prematuro. Ela está dentro de algo maior, mais universal. E agora é o momento de indicar o que se deve ensinar à criança. Meu critério é que se lhe deve ensinar tudo o que é de ordem geral ou universal, e isso em todos os sentidos. Ideia de mundo, de sua formação, de suas leis, da astronomia, do que é o fogo e a água, do que sejam os ventos e o mar, sobre os fenômenos celestes e a geometria, sobre as grandes estradas dos navegantes e sobre o trabalho em materiais diversos; o desenhar e pintar, o dançar e fazer música, as invenções, a construção de objetos, o germinar das sementes e o cultivo; o estudo dos animais, as grandes obras do homem etc. Mas tudo isso sem mencionar países, nem datas, não como coisa histórica, mas sim como coisa existente sempre. E fale-se de exemplos de bondade, e de maldade, mas sem que o professor emita juízos; observe as relações

sem comentá-las, reforce as opiniões do bom e do mau, mas com grande exageração a fim de que percebam. Mas não dê importância ao assunto. O importante é, seja o que for, que a consciência acorde. Coloquemo-nos no plano, que poderíamos chamar de magnético, da natureza (na qual está a criança) e vejamos como somos capazes de compreender esse momento. Entretanto, a criança não compreende a razão, o convencional. Tampouco isso tem valor para ela. Para ela, tem grande valor tudo o que seja uma qualidade pessoal. Que a criança compreenda que na escola está só, assim como se estivesse na rua. E que, se tem uma absoluta liberdade, tem também responsabilidade. Frente a um problema que tenha de resolver, ou frente a um desenho que tenha de fazer (seja copiando, inventando ou interpretando), que ela se sinta também só, sem o apoio do professor, que não importa o caso, desde um princípio, deve fazê-la compreender que precisa bastar-se si mesma. Que a criança compreenda bem que não aprende a desenhar, pois já desenha, isto é, que faz algo definitivo. Que o que faz, pois, não é um caminho para chegar a outra coisa. Não quero professores evangelizadores, mas homens de caráter que se imponham por si mesmos. E a escola tem de ser a portas abertas, para que por ela circule sempre ar puro de liberdade. As crianças virão a vocês, professores, cheios de preconceitos, cheios de atavismos, contaminados por parentes e vizinhos, pelo meio em que vivem. Limpem-nos de tudo isso, sem temor a consequências! Sejam sinceros e puros! Mais que tudo, que na escola não aninhe a horrível hipocrisia, o único crime – quase – que pode cometer o homem. E prestem atenção nisto: li em Goethe que “a criança é o pai do adulto”.

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Tened en cuenta, pues, el hombre que estáis ayudando a hacer. Cohibiendo al niño hacéis al hombre futuro tímido, pesimista, si no vive con alegría; cobarde si le enseñáis lo que es el miedo. Porque todo eso reaparecerá en el adulto, como una fuerza desconocida que lo aprisionará y que, a pesar suyo, prevalecerá por encima de todo lo que haga para liberarse. Ni valdrá el pensar, ni el esfuerzo voluntario. Temprano, muy temprano el niño ha de comprender lo que es, para que trate de equilibrarse en la medida que pueda. Fomentad en cambio, entre ellos, los niños, la alegría y el optimismo, ¡Qué bien que les haréis! Estáis ayudando a hacer el hombre de mañana. Y así, pese al fracaso, a toda suerte de desastres, algo, como una fuerza desconocida, lo hará erguirse valientemente para luchar contra el destino. La persistencia en repetir un trabajo hace que al fin se inculque en el niño un conocimiento cualquiera. Así, en esta forma, adquiere todo un conjunto de nociones dentro de un plan más o menos armónico, y ya tenemos un bachiller. Pero ¿a costo de qué? De su carácter. Porque así no es posible que se forme tal como hubiera tenido que ser. Ni el maestro ni él saben, ni sabrán jamás, lo que aquel niño –ahora adolescente– hubiera podido ser. La escuela, pues, si no forma deforma, y si no enseña (y enseñar será con respecto a lo que es un niño dado), en cambio da un sinnúmero de conocimientos. Un zapato no dará jamás una forma linda a un pie, pero sí la da la libertad. En cambio lo deforma. Deduzco de todo esto que, al menos hasta los diez o doce años, el niño deberá tener en la escuela la más amplia libertad y todo aquello que pudiese facilitar su desarrollo, es decir, que le permitiese toda suerte de actividades. Solo así yo creo que sabríamos lo que es y, por esto, tendría un

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carácter. ¿Habría entonces tan excesivo número de hombres de carrera? Indudablemente no, y por el contrario, habría más originalidad en la actividad humana. Ahora se hace el hombre estandarizado, que es decir un hombre deformado. Luego se le pone una etiqueta y ya sirve para un fin social. De ahí se deriva un mal muy grave: la gente que ejerce una carrera sin vocación, que es decir sin intuiciones, sin entusiasmo y, por esto, de manera rutinaria. Y al fin ¿en qué para eso? Que como no se tiene ningún respeto a eso, esa carrera, se transforma solo en un medio de hacer dinero. Se la prostituye. El conjunto social pierde enormemente con eso, el hombre se vuelve cínico, sin fe en nada (pues la fe viene de creer en sí mismo, y ese hombre no puede creer en él), y si no tiene fe, como en cambio tiene mala fe (pues no puede ser de otra manera), de ahí un conjunto social detestable. Baja de tono del nivel moral, mediocridad, confusionismo, subversión de todos los valores. ¿Punto de origen de todo eso? La escuela. La escuela, sí, donde existe la mejor voluntad, la mejor clase de hombres, el sacrificio constante y la mayor buena fe, pero cuya base está, a mi entender, mal afirmada. Deduzco de todo esto una sola cosa: que hay que respetar al niño. Que quiere decir que se le deje en libertad para que se forme según él sea. Hay que trabajar siempre sobre lo espontáneo del niño, después hacer que tenga conciencia. Y hay que fijarse aun en esto, respetar la voluntad del niño, su impulso. Ese impulso que se proyecta hacia afuera –diríase como algo explosivo– es el término o fin de un largo trabajo subconsciente, que tiende a realizarse. No hay que detenerlo jamás. Bien distinto de ese trabajo es aquel otro puramente cerebral al que de ordinario se somete a los niños. Este de que hablamos, este espontáneo y natural, tiene un sello inconfundible, es sentimental. Todas las fuerzas vivas del niño ahí se juntan para realizar algo: realiza un descubrimiento, un hecho, cumple una misión.


Considerem, pois, o homem que estão ajudando a fazer. Coibindo à criança, farão do homem futuro um tímido, um pessimista, que não vive com alegria; um covarde, se lhe ensinam isso que é o medo. Porque tudo isso reaparecerá no adulto, como uma força desconhecida que o aprisionará e que, apesar de seu, prevalecerá por cima de tudo o que venha a fazer para se libertar. Não valerá o pensar, nem o esforço voluntário. Cedo, muito cedo, a criança tem de compreender o que é, para que trate de se equilibrar na medida do que possa. Fomentem a mudança, entre elas, as crianças, a alegria e o otimismo. Que bem que vocês os farão! Ajudem a fazer o homem do amanhã. E assim, apesar do fracasso, de toda sorte de desastres, algo, como uma força desconhecida, o fará se erguer corajosamente para lutar contra o destino. A persistência em repetir um trabalho faz que, no final, inculque-se na criança um conhecimento qualquer. Dessa forma, [ela] adquire todo um conjunto de noções dentro de um plano mais ou menos harmônico, e temos um estudante do segundo grau. Mas, a que custo? Do seu caráter. Porque assim não é possível que se forme tal como deveria ter sido. Nem o professor nem ele sabem, nem saberão jamais, o que aquela criança – agora adolescente – poderia ter se tornado. A escola, pois, se não forma, deforma, e se não ensina (ensinar será respeitar o que uma criança já é), por outro lado, dá um sem-fim de conhecimentos. Um sapato não dará jamais uma forma linda para um pé, mas a liberdade sim. Em troca, [um sapato] o deforma. Deduzo de tudo isso que, ao menos até 10 ou 12 anos, a criança deverá ter na escola a mais ampla liberdade, e [acesso a] tudo aquilo que pudesse facilitar seu desenvolvimento, ou seja, que lhe permitisse toda sorte de atividades. Só assim, acredito, saberíamos o que é ter um caráter. Haveria, então, tão excessivo número de homens de carreira? Indubitavelmente não, e, pelo contrário, haveria mais originalidade na atividade humana. Agora se faz o homem estandardizado, que é, por assim dizer, um ho-

mem deformado. Logo depois, coloca-se-lhe uma etiqueta para que sirva a um fim social. Daí deriva um mal muito grave: pessoas que exercem uma carreira sem vocação, ou seja, sem intuições, sem entusiasmo, e, por isso, de maneira rotineira. Ao final, para que tudo isso? Como não tem nenhum respeito para isso, essa carreira, [o indivíduo] transforma-a só em um meio para fazer dinheiro. Prostitui-se. O conjunto social perde enormemente com isso, o homem torna-se cínico, sem fé em nada (pois a fé vem de acreditar em si mesmo, e esse homem não pode acreditar nele mesmo), e não tem fé, mas terá má fé (pois não pode ser de outra maneira), o que resultará em um conjunto social detestável. Baixo nível moral, mediocridade, confusão, subversão de todos os valores. O ponto de partida de tudo isso? A escola. A escola, sim, onde existe a melhor das vontades, a melhor classe de homens, o sacrifício constante e a maior boa fé, mas cuja base está, para meu entender, mal afirmada. Deduzo de tudo isso uma coisa só: que tem de se respeitar à criança. O que quer dizer que se lhe deixe em liberdade para que se forme conforme ela seja. É preciso trabalhar sempre sobre o espontâneo da criança, depois fazer que tenha consciência. E é necessário prestar atenção ainda nisto: respeitar a vontade da criança, seu impulso. Esse impulso que se projeta para fora – poderia se dizer como algo explosivo – é a concretização, o fim de um longo trabalho subconsciente que tende a se realizar sozinho. Não se pode deter jamais. Bem distinto desse trabalho é aquele outro puramente cerebral do que de ordinário se submete às crianças. Esse do qual falamos, esse espontâneo e natural, tem um selo inconfundível, é sentimental. Todas as forças vivas da criança ali se juntam para realizar algo: realiza um descobrimento, um fato, cumpre uma missão.

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Permaneced impasibles y observad. Después haced al niño consciente de aquello que haya hecho, entonces habrá dado un paso. Siempre trabajad sobre lo espontáneo. Y ahora, ¿qué os puedo aconsejar para vuestra propia formación? En primer lugar, que leáis mucho y… olvidéis. No volváis a pensar en lo que hayáis leído, dejad que vuestro cerebro repose. El trabajo, ¡no dudéis!, se hará solo, sin que os deis cuenta, y os servirá cuando os convenga (no antes ni después). Improvisad siempre. Solo ante el niño sabréis aquello que tendréis que hacer, jamás antes. No vayáis a la clase con un plan preconcebido. Porque si procedéis así, seguro que impondréis algo a los niños, y esto les será nocivo, sea lo que sea. Pensad que vale más la libertad que la ortografía, pensad que vale más la libertad que la corrección. Estamos hablando con respecto al niño. Porque por encima de lo convencional, por encima de todo lo que hemos acordado adoptar, está lo viviente que tiende a ser, a crecer y desarrollarse: aquel impulso sentimental de que hemos hablado, el impulso creador. Y éste es el que no hay que perder de vista. Pensad en lo grave de vuestra misión: en vuestras manos está la evolución. No queráis ser profesionales, sed hombres como los demás y sobre todo ante los niños. Y, ¡atención!, que vuestra fuerza física jamás se ejerza sobre los niños, y tampoco para reprimir. No deis ese espectáculo repugnante y antipedagógico. Manteneos en vuestro lugar con vuestra fuerza de carácter para no provocar situaciones extremas. Lo opuesto es precisamente lo que debe hacerse: dejar que el niño se desahogue, después hacedle comprender aquello que haya hecho, lo demás él mismo lo hará. Debemos centrar al hombre. Porque todos hemos comenzado bien, pero después, de abstracción en

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abstracción, hemos llegado a esa monstruosa construcción de lo convencional y, ya en ella, a creerla algo real. Por esto, nos conviene reintegrarnos a eso real y a los pequeños no sacarlos aún de ese plano en que ya están. Sin darse cuenta el niño se defiende de eso. Porque todo colabora contra él en ese sentido. Él quiere ser eso libre: es decir, él. Alrededor del niño que llora o se defiende valientemente están los adultos, que se aplican constantemente en transformarlo, transformación que se opera –además– sistemáticamente (podría decirse científicamente) en las escuelas. El hombre de siempre (el viejo hombre que hay en el niño) es el que ha hecho al hombre moderno y hará todavía al hombre del futuro. Entre este hombre enormemente antiguo y el hombre moderno hay un eterno combate: el mismo que hay entre el niño y el hombre adulto.

Apéndice Entonces, ese hombre quizás tendrá conciencia de lo que hubiera podido ser y podrá decir: de un individuo real, la escuela primero y la sociedad después han hecho de mí un individuo convencional. Me muevo al compás del reloj, me sitúo en el sitio que me corresponde, me abstengo, estoy clasificado, numerado. Así que nací se llevó a cabo esa operación. Lo vivo y lo mecánico se confunden, el signo y el concepto. Empalma el nervio con el hilo telegráfico, el instrumento es prolongación del hombre. Soy una rueda en el enorme engranaje mecánico de la vida convencional. Soy un individuo mecánico, tan mecánico como el tranvía que me lleva. Si salgo a la calle debo cubrirme, si entro en cualquier laberinto de una casa debo en cambio descubrirme. Alargo la mano, hago un movimiento expresivo, digo algo convenido. Si me invitan, me siento. No existo, a cambio de eso soy un autómata. Y eso no debería ser, sino lo otro. Debería ser idéntico a mí mismo, y siempre partir de eso.


Permaneçam impassíveis e observem. Depois façam a criança consciente daquilo que tenha feito, então [ela] terá dado um passo. Sempre trabalhem sobre o espontâneo. E agora, o que posso lhes aconselhar para a própria formação de vocês? Em primeiro lugar, que leiam muito e... esqueçam. Não voltem a pensar no que tiverem lido, deixem que seu cérebro descanse. O trabalho, não duvidem!, se fará sozinho, sem que percebam, e os servirá quando os convenha (não antes nem depois). Improvisem sempre! Só frente à criança saberão aquilo que deve ser feito, jamais antes. Não vão à aula com um plano preconcebido. Porque se procederem assim, é certo que imporão algo às crianças, e isso será nocivo para elas, seja o que for. Pensem que vale mais a liberdade do que a ortografia, pense que vale mais a liberdade do que a correção. Estamos falando a respeito de crianças. Porque por cima do convencional, por cima de tudo o que temos acordado adotar, está o vivente que tende a ser, a crescer e se desenvolver; aquele impulso sentimental do qual temos falado, o impulso criador. E este é o que não podemos perder de vista. Pensem na gravidade da missão de vocês: em suas mãos está a evolução. Não queiram ser profissionais, sejam homens como os outros e, acima de tudo, frente às crianças. E, atenção!, que a força física de vocês jamais se exerça sobre as crianças, muito menos para reprimir. Não deem esse espetáculo repugnante e antipedagógico. Mantenham-nas em seu lugar com a força de seu caráter para não provocar situações extremas. O oposto é precisamente o que se deve fazer: deixar que a criança desabafe, depois fazer-lhe compreender aquilo que fez, o resto, ela mesmo o fará. Devemos colocar o homem no centro. Porque todos nós começamos bem, mas logo, de abstração em abstração, chegamos a essa monstruosa construção do convencional e, imbuídos dela, acreditamos que é algo normal. Por isso, convêm nos reintegrar nesse real e, aos pequenos, não tirá-los desse plano no

qual já estão. Sem perceber, a criança se defende disso. Porque tudo contribui contra ela nesse sentido. Ela quer ser livre, quer dizer, ser ela mesma. Ao redor da criança que chora ou se defende corajosamente, estão os adultos que se dedicam constantemente para transformá-la, transformação que se realiza – além do mais – sistematicamente (poderia se dizer cientificamente) nas escolas. O homem de sempre (o velho homem que há na criança) é o que fez o homem moderno e fará ainda o homem do futuro. Entre esse homem enormemente antigo e o homem moderno, há um eterno combate: o mesmo que há entre a criança e o homem adulto.

Apêndice Então, esse homem talvez terá consciência do poderia ter sido e poderá dizer: a partir de um indivíduo real, a escola primeiro e a sociedade depois têm feito de mim um indivíduo convencional. Movimento-me ao compasso do relógio, situo-me no lugar que me corresponde, abstenho-me, estou classificado, numerado. Assim que nasci, levou-se a cabo essa operação. O vivo e o mecânico se confundem, o signo e o conceito. Encaixa o nervo com o fio telegráfico, o instrumento é prolongação do homem. Sou uma roda na enorme engrenagem mecânica da vida convencional. Sou um indivíduo mecânico, tão mecânico como o trem que me leva. Se eu saio para a rua, devo me cobrir, mas se entro em qualquer labirinto de uma casa, devo, entretanto, descobrir-me. Estendo a mão, faço um movimento expressivo, digo algo convencional. Se me convidam, sento. Não existo, entretanto, sou um autômato. E isso não deveria ser, mas sim o contrário. Deveria ser idêntico a mim mesmo e sempre partir disso.

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Calles, hilos de telégrafo, rails, vehículos de mil formas. Tubos que lanzan humo en el espacio, respiraderos de las casas. Millones de agujeros rectangulares a lo largo de los muros, hechos con ladrillos pequeñitos y rojos, uno a uno puestos por manos pacientes. La carta, que va fielmente en viaje complicado, la sustancia alimenticia en botes de hojalata: fideos, clavos, fibras, tejidos, venenos. El quilo, el metro, la moneda. El frío, creado artificialmente, y el calor. Peluquero que recorta mi cabello y barba, médico que interviene en mi cuerpo y sabe más de él que yo. Palacios donde se hace justicia, no pudiendo hacerse en otro sitio. Sitio para yacer muerto y pudrirse. El diario, que llega cada día a la hora precisa. El agua canalizada, el gas inflamable llevado a las casas para guisar, hacer llamas a voluntad. La voz, llevada en mil direcciones a enormes distancias. Comprendo el jeroglífico de un billete de banco, de un recibo, de una factura, de un periódico, de una cifra. Enormes cuerpos flotantes, de hierro pintado, movidos por poderosos ingenios mecánicos, surcan la superficie líquida del globo. No tienen conciencia, como yo, aunque son casi tan bien organizados como yo. Van ciegos, movidos por fuerzas naturales aprisionadas en su interior. Todo eso y mil cosas más sé y comprendo. Como el maravilloso invento de la cerilla, esa velita inflamable hecha por manos industriosas. Mi pipa, invento singular. Admiro también la cuchara y el tenedor y el cuchillo. Y más aun la escalera y más la rueda, dignos inventos del ingenio humano. El empedrado de las calles, bien considerado, es una maravilla. Y el jabón, ¡tan útil! De todo esto disfruto a diario, y ya no sabría vivir sin eso. Mientras aún duermo, por la mañana, un ser humano, hembra, ya se mueve para mí. Fuego, café, leche, manteca, pan: calorías. Fuerza que recibo y retribuyo en otra forma. Sonidos armoniosos, a cambio de algunas piezas pequeñas de metal, plata o cobre. Emociones en rectángulos alineadas en los muros.

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Pensamientos humanos de ahora, de miles de años, ordenados, clasificados, convertidos en pequeñísimos signos fijados por negra sustancia grasa en el papel, en millones de millones de billones de rectángulos de papel. La máquina que fija mi imagen, la que retiene la voz y la emite cuando quiero, el auricular que se pega a mi oído… El hombre real desaparece bajo las leyes, las costumbres, la clasificación, el encasillado social. Abogado, médico, militar, presidente, basurero, artista, mecánico, rey, sastre, son moldes. Amo, mozo, señor, criado, juez, político, soldado, rico, pobre, propietario, jornalero, sacerdote, son pura ficción. Formas útiles, como las otras, necesarias para vivir en sociedad, indispensables. Mil y mil convencionalismos nos atan y sujetan por todos lados, cohibiéndonos y mutilándonos. El día del santo, el entierro, el estar de visita, el no poder hablar entre personas desconocidas, el saludo, la derecha y la izquierda, lo que impone la diferencia sexual, el traje, lo que debe hacerse en cada sitio, lo correcto y lo incorrecto, lo que puede y no puede o debe manifestarse, la hipocresía en lo que se exhibe y en lo que se oculta, las frases estereotipadas. Lo que se enseña en las escuelas, en las universidades, en las academias. Lo que intervienen los tratados, los mapas geográficos, cosas todas convencionales. Los uniformes, las banderas, las cruces y medallas honoríficas, los títulos nobiliarios. Los signos, los nombres de las cosas. Los sistemas filosóficos, los estilos, maneras y formas del arte. El criterio… en fin, todo aquello combinado y realizado por virtud del cerebro humano.


Ruas, fios de telégrafo, rails, veículos de mil formas. Tubos que lançam fumaça para o espaço, respiradouros das casas. Milhões de buracos retangulares ao longo dos muros, feitos com tijolos pequeninos e vermelhos, um a um colocados por mãos pacientes. A carta, que vai fielmente em viagem complicada, a substância alimentar em barcos de lata: macarrão, cravos, fibras, tecidos, venenos. O quilo, o metro, a moeda. O frio, criado artificialmente, e o calor. Cabeleireiro que corta o meu cabelo e minha barba, médico que intervém no meu corpo e sabe mais dele do que eu. Palácios onde se faz justiça, não podendo se fazer em outro lugar. Lugar para jazer morto e apodrecer. O jornal que chega cada dia na hora precisa. A água canalizada, o gás inflamável levado às casas para guisar, fazer chamas à vontade. A voz, levada em mil direções a enormes distâncias. Compreendo o hieroglífico de um bilhete de banco, de um recibo, de uma nota fiscal, de um jornal, de uma cifra. Enormes corpos flutuantes, de ferro pintado, movimentados por poderosos engenhos mecânicos, sulcam a superfície líquida do globo. Não têm consciência, como eu, mesmo que quase tão bem organizados como eu. Vão cegos, movimentados por forças naturais aprisionadas no seu interior. Tudo isso e mil coisas mais, sei e compreendo. Como o maravilhoso invento da cera, essa vela inflamável feita por mãos industriosas. Minha pipa, invento singular. Admiro também a colher e o garfo e a faca. E mais ainda a escada e mais a roda, dignas invenções do engenho humano. O imperador das ruas, bem considerado, é uma maravilha. E o sabonete, tão útil! De tudo isso desfruto diariamente e já não saberia viver sem isso. Enquanto ainda durmo, pela manhã, um ser humano, fêmea, já se move para mim. Fogo, café, leite, manteiga, pão: calorias. Força que recebo e retribuo de outra forma. Sons harmoniosos, em troca de algumas peças pequenas de metal, prata e cobre. Emoções em retângulos, alinhadas nos muros. Pensamentos humanos de agora, de milhares de anos, ordenados, classificados, convertidos em peque-

ninos signos fixados por negra substância gordurosa no papel, em milhões de milhões de bilhões de retângulos de papel. A máquina que fixa minha imagem, a que retém a voz e a emite quando quero, o auricular que se gruda ao meu ouvido... O homem real desaparece debaixo de leis, costumes, classificação, do envasilhado social. Advogado, médico, militar, presidente, lixeiro, artista, mecânico, rei, alfaiate são moldes. Amo, garçom, senhor, criado, juiz, político, soldado, pobre, proprietário, jornaleiro, sacerdote são pura ficção. Formas úteis, como as outras, necessárias para viver em sociedade, indispensáveis. Mil e mil convencionalismos nos amarram e nos prendem por todos os lados, coibindo-nos e nos mutilando. O dia do santo, o enterro, o estar de visita, o não poder falar entre pessoas desconhecidas, o comprimento, a direita e a esquerda, o que impõe a diferença sexual, o terno, o que se deve fazer em cada lugar, o correto e o incorreto, o que pode e o que não pode, o que se deve manifestar, a hipocrisia no que se exibe e no que se oculta, as frases estereotipadas. O que se ensina nas escolas, nas universidades, nas academias. Os que intervêm nos tratados, os mapas geográficos, todas coisas convencionais. Os uniformes, as bandeiras, as cruzes, as medalhas honoríficas, os títulos nobiliários. Os signos, os nomes das coisas. Os sistemas filosóficos, os estilos, as maneiras e as formas de arte. O critério... enfim, tudo aquilo combinado e realizado pela virtude do cérebro humano.

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Segunda conferencia

Lo que debe proponerse el maestro con la enseñanza del dibujo

Decíamos que el niño luchaba, que se defendía de la presión que sobre él ejercían los adultos, todos de consenso en querer moldearlo a su imagen, en querer adaptarlo a lo convencional de la sociedad. Y decíamos que la escuela colaboraba en el mismo sentido, y aun empleando métodos científicos. Y que con ello se mataba algo virgen que traía el niño y que debido a eso después sería un hombre que carecería de carácter, de originalidad. En fin, que lo que pudo ser aquel individuo ya jamás se sabrá. Y de ahí que indicara yo que, al menos hasta los doce años, se dejase al niño con libertad, y no solo esto, sino que además se procurase desarrollar todo aquello latente en él, y que sobre todo él se diese cuenta de eso que poseía. Por esto se aconsejaba pasividad en el maestro y esto a fin de no influenciarlo en ningún sentido. De respetar aquello natural suyo como cosa sagrada. Con motivo de eso, se habló de una especie de sabiduría innata que yo aseguraba poseer el niño de acuerdo con las leyes armónicas del universo. (Al prepararme yo para explicar eso recordaréis que la conferencia quedó truncada debido al reglamento que nos vedaba pasar de cierto límite de tiempo fijado, y eso fue una demostración de cómo lo convencional mata aquello viviente que se produce inespontáneamente y que siempre con eso se pierde lo mejor. Y por esto, lo que entonces no pudimos decir debemos decirlo ahora, aunque más brevemente.) Decía, pues, que el individuo ya viene hecho, y aparejado con él trae todo aquello que le es necesario para su desarrollo. No hay, pues, que romper ese conjunto armónico, sabiamente hecho por la naturaleza, no hay que desequilibrarlo. Porque aquí se presentan dos problemas que igualmente hay que resolver: uno, de acuerdo con el individuo, otro de acuerdo con la sociedad. Un individuo podrá crecer y desarrollarse de acuerdo con él, pero ¿eso armonizará luego con el medio so-

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cial? En este punto está la tragedia individual. En la medida que sea personal, menos se adaptará. Valdrá más como individuo, pero su situación en el mundo será más difícil. Pues bien, la escuela, previendo lo que puede pasar, y teniendo más en cuenta el conjunto social que no al individuo, trata sobre todo de hacerlo apto para que entre lo más ajustadamente a su engranaje. Y de ahí sus programas que el alumno debe cumplir estrictamente. Con esto hace un individuo corriente, apto para sincronizar con todo lo convencionalmente establecido, pero, a costa de eso, ha matado en parte la personalidad, el carácter, lo original que lleva el individuo. Yo protesto de eso, y si hoy a ciertas naciones se les reprocha la esterilización hecha con fines políticos (y aun en los niños) éste es otro género de esterilización quizás mucho peor y que se practica con el beneplácito de todos. Y esto, queridos maestros, explica el que por el mundo ande tanta mediocridad, pobres seres esterilizados, mutilados, y que como decía el otro día, dé todo esto un conjunto social detestable. Hay un punto que hay que dilucidar, que el otro día también, merced al reglamento, quedó incompleto. ¿Qué podría ser esa pretendida sabiduría que yo decía poseer el niño? Aquí también debemos desdoblar las cosas en dos aspectos: primero, aquello que posee el niño con relación a él, es decir lo de carácter individual. Segundo, lo que pueda poseer de orden universal. Lo primero puede entrar en la ley biológica de la herencia ancestral, lo que podría llamarse instinto y que hace bien en defender el niño, porque le es necesario y hacemos mal en restringirle eso en cualquier sentido. Porque ahí, como he dicho, hay una armonía que no debemos desequilibrar. (Afortunadamente, como ya dije, se puede poco en ese sentido.) Lo otro que debemos explicar ya será más difícil y más discutible. Vamos a ello. Si el instinto como fuerza mira hacia el individuo, otra fuerza igualmente importante (y si no fuese así ya no habrá equilibrio) se proyecta en sentido diametralmente opuesto: es nuestra tendencia hacia la generalización (y en esto vemos lo que distingue al hombre del animal).


Segunda conferência

O que se deve propor ao professor com o ensino do desenho

Dizíamos que a criança lutava, que se defendia da pressão que sobre ela exerciam os adultos, todos com o objetivo de querer moldá-lo à sua imagem, de querer adaptá-la ao convencional da sociedade. E dizíamos que a escola colabora no mesmo sentido, e ainda empregando métodos científicos. Que com isso se matava algo virgem que trazia a criança e que devido a isso, depois, [essa criança] seria um homem que careceria de caráter, de originalidade. Enfim, o que poderia ter sido aquele indivíduo jamais se saberá. E, portanto, indiquei que, pelo menos até os 12 anos, se deve deixar a criança com liberdade; e não só isso, mas também procurar desenvolver tudo aquilo latente nela e que, acima de tudo, [permitir que] ela perceba isso que possuía. Por isso, aconselhava-se a passividade do professor a fim de não influenciar a criança em nenhum sentido. [A necessidade] De respeitar aquilo natural próprio dela como coisa sagrada. Por esse motivo, falou-se de uma espécie de sabedoria inata que eu assegurava que a criança possui de acordo com as leis harmônicas do universo. (Ao me preparar para explicar isso, vocês hão de lembrar que a conferência ficou truncada devido ao regulamento que nos vedava passar certo limite de tempo fixado, e isso foi uma demonstração de como o convencional mata aquele vivente que se produz espontaneamente e que, com isso, sempre se perde o melhor. E por isso, o que então não pudemos dizer devemos dizê-lo agora, mesmo que brevemente.) Dizia, pois, que o indivíduo já vem feito, aparelhado, traz com ele tudo aquilo que lhe é necessário para o seu desenvolvimento. Não há, pois, que romper esse conjunto harmônico, sabiamente feito pela natureza, não há que desequilibrá-lo. Porque aqui se apresentam dois problemas que igualmente é preciso resolver: um, de acordo com o indivíduo, outro, de acordo com a sociedade. Um indivíduo poderá crescer e se

desenvolver de acordo com ele, mas isso se harmonizará logo com o meio social? Nesse ponto, está a tragédia individual. À medida que seja pessoal, menos se adaptará. Valerá mais como indivíduo, mas a sua situação no mundo será mais difícil. Pois bem, a escola, prevendo o que pode acontecer e considerando mais o conjunto social do que o indivíduo, tenta, acima de tudo, torná-lo apto para que entre da forma mais ajustada à sua engrenagem. E daí os planos de estudo que o aluno deve cumprir estritamente. Com isso, faz um indivíduo corrente, apto para sincronizar com tudo o que é convencionalmente estabelecido, mas o resultado disso tem matado em parte a personalidade, o caráter, o original que o indivíduo carrega. Eu reclamo disso, e se hoje se critica certas nações pela esterilização feita com fins políticos (e ainda nas crianças), esse é outro gênero de esterilização, talvez muito pior e que se pratica com o beneplácito de todos. E isso, queridos professores, explica que pelo mundo ande tanta mediocridade, pobres seres esterilizados, mutilados, e que, como dizia o outro dia, o resultado de tudo isso é um conjunto social detestável. Há outro ponto que também precisa ser elucidado, pois, no outro dia, graças ao regulamento, ficou incompleto. Que poderia ser essa pretendida sabedoria que eu dizia que possui a criança? Aqui também devemos desdobrar as coisas em dois aspectos: primeiro, aquilo que possui a criança em relação a ela, ou seja, aquilo de caráter individual conforme o que possa ter de ordem universal. O primeiro pode entrar na lei biológica da herança ancestral, o que poderia se chamar de instinto e que faz bem a criança em defender, porque lhe é necessário e fazemos mal em lhe restringir isso em qualquer sentido. Porque ali, como tenho dito, há uma harmonia que não devemos desequilibrar. (Afortunadamente, como já disse, pode-se pouco nesse sentido.) O outro que devemos explicar será mais difícil e mais discutível. Vamos lá. Se o instinto como força olha para o indivíduo, outra força igualmente importante (e se não fosse assim, não haverá equilíbrio) se projeta em sentido diametralmente oposto: o da nossa tendência para a generalização (e nisto vemos o que distingue o homem do animal).

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Embrionariamente, en el niño, esta tendencia toma el carácter de fantasía: facultad de crear, de jugar haciendo y rompiendo, de investigar, de experimentar sin finalidad práctica para él. Germen de todo esto, de ulteriores realizaciones, y que es muy importante dejar que se produzcan (y de ahí el no estorbarlo, el no imponerle aún nada). Y esto se comprende que debe ser así: pese a que cada uno de nosotros pertenezcamos, ante todo, a la especie, pese a esto traemos algo de original, por el hecho de ser un nuevo componente producto de la más heterogénea combinación. Cada individuo, pues, trae algo nuevo, y esto para el pedagogo tiene que ser algo muy importante que él deberá destacar. Si el instinto, pues, nos da la base del carácter individual, esa otra actividad tendrá que darnos la base de su actividad creadora. He tenido que ocuparme en estas cuestiones –que no son de mi competencia pues el tema que debo desarrollar, que se me ha encomendado, debe limitarse al dibujo en las escuelas– para encontrar las bases sobre que debe fundamentar esa enseñanza que entra en sus programas. Y no he querido, al tratar de encontrar ese fundamento, servirme de otro medio que el natural de reflexionar sobre ello para hallar lo que me ha parecido más lógico. Años hace que no toco un solo libro de psicología, ni tampoco de pedagogía, y por esto no he podido apoyarme en la autoridad (quizás, como hubiera tenido que ser) de otros que, en la actualidad, se ocupan de esas importantísimas cuestiones. Con todo, no creo que lo dicho esté apartado de la verdad y, que por esto, puede servirnos para desarrollar y determinar lo otro. Sobre lo expuesto pues, vamos a ver qué debe ser el dibujo escolar. La cosa es compleja, si es que queremos conciliar conceptos antagónicos, todos igualmente importantes. Porque si de un lado queremos que el niño conserve y desarrolle lo suyo, por otro también hemos de querer que sea un individuo apto para entrar normalmente en el engranaje social. Y mi solución ya la he dicho: que antes de los doce años se deje al niño en gran libertad:

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a fin de que desarrolle lo que él traiga, lo suyo a fin de no matar esto en germen y a este fin, también, que se le den todos los medios para el desarrollo de sus posibles actividades y ya he indicado lo que debía ser la escuela para cumplir esa finalidad y por último, que todo el trabajo del maestro ha de consistir: de un lado en ayudarlo (nada más) dejando la iniciativa al niño; y de otro, que por todos los medios trate (sin perder jamás esto de vista) de que el niño se dé cuenta de lo que hace, se dé cuenta de lo que sabe y se dé cuenta de lo que es.

Respondiendo, pues, al tema de hoy, que reza así: “Lo que debe proponerse el maestro con la enseñanza del dibujo”, casi no tengo más que añadir sino que debe aplicar ese mismo método general al caso particular del dibujo. Y así tenemos que si el maestro ordena bien la actividad de su escuela, esto es: comenzando por el juego para ir al estudio (y juego considero toda actividad manual con diversos materiales, o toda actividad intelectual y no el juego propiamente dicho), pasando, entonces, del caso particular de la actividad de sus alumnos, entrará a explicar algo de orden general (que habrá previamente destacado de sus programas) y esté cierto que todos sus alumnos le rodearán para escucharle y entonces, en sus papeles, que tomen sus notas o hagan sus croquis, los cuales, más tarde, pasarán a otros papeles o libretas, ordenadamente. Así se hará trabajo viviente y original y no se descuidará el programa y con esto se atiende al desarrollo de lo que trae el niño (sin forzarlo) y a lo que mira a su futura vida social. Pero, ¿sobre qué temas deberá tomar punto de partida el maestro para que cumpla con todo aquello que debe proponerse con el dibujo? Esto será lo que trataremos (muy extensamente) en la lección próxima. Yo me permitiré sugerir un método que yo no he visto aplicado nunca. Y esto es natural, pues es


Embrionariamente, na criança, essa tendência toma o caráter de fantasia: faculdade de criar, de brincar fazendo e quebrando, de investigar, de experimentar sem finalidade prática. Germe de tudo isso [a generalização], de ulteriores realizações, e que é muito importante deixar que aconteça (e dali o não lhe estorvar, o não lhe impor nada). E isso, compreende-se, deve ser assim: cada um de nós pertence, acima de tudo, à espécie, trazemos um pouco de original por sermos um novo produto da mais heterogênea combinação. Cada indivíduo, pois, traz algo novo, e isso, para o pedagogo, tem de ser algo muito importante e que ele deverá destacar. Se o instinto, pois, nos dá a base do caráter individual, essa outra atividade terá de nos dar a base de sua atividade criadora. Tenho tido de me ocupar dessas questões – que não são da minha competência, pois o tema que devo desenvolver, que me foi encomendado, deve limitar-se ao desenho nas escolas – para encontrar as bases sobre as quais deve-se fundamentar esse ensino que entra nas suas programações. E não quis, ao tentar encontrar esse fundamento, servir-me de outro meio, que não seja o natural, de refletir sobre isso para encontrar o que tenho achado mais lógico. Faz anos que não mexo em livros de psicologia, nem de pedagogia, e por isso não pude me apoiar na autoridade (talvez, como fosse necessário) de outros que, na atualidade, ocupam-se dessas importantíssimas questões. Contudo, não acho que o dito esteja afastado da verdade e que, por isso, pode nos servir para desenvolver e determinar o outro [o ensino de desenho]. Sobre o exposto, pois, vamos ver o que deve ser o desenho escolar. A coisa é complexa, se quisermos conciliar conceitos antagônicos, todos igualmente importantes. Porque, de um lado, queremos que a criança se conserve e se desenvolva e, do outro, também queremos que seja um indivíduo apto para entrar normalmente na engrenagem social. E minha solução, já a tenho dito: que antes dos 12 anos se deixe a criança em grande liberdade:

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a fim de que desenvolva o que ele traz, o que é seu a fim de não matar esse germe e a fim, também, que se lhe deem todos os meios para o desenvolvimento das suas possíveis atividades e já indiquei o que devia ser a escola para cumprir essa finalidade e por último, que todo o trabalho que o professor tem de construir é, por um lado, ajudá-la (só isso) deixando a iniciativa para a criança e, por outro lado, que por todos os meios tente (sem perder jamais isso de vista) que a criança perceba o que faz e perceba o que é.

Respondendo, pois, ao tema de hoje, que reza o seguinte: “Qual o propósito do professor com o ensino do desenho?”. Quase não tenho mais o que acrescentar, mas que deve aplicar esse mesmo método geral no caso particular do desenho. Temos, então, que se o professor organiza bem a atividade da sua escola, isto é, começa pelo jogo antes de ir para o estudo (e jogo considerando toda atividade manual com diversos materiais, ou toda atividade intelectual e não o jogo propriamente dito), passando do caso particular e da atividade dos seus alunos para algo de ordem geral (que terá previamente destacado nos seus planos de cursos), pode estar certo de que todos os seus alunos lhe rodearão para escutá-lo. Dessa maneira, conseguirá que, em seus [primeiros] papéis, [as crianças] escrevam suas notas ou façam seus croquis, os quais, mais tarde, passarão para outros papéis ou cadernos, organizadamente. Assim se fará o trabalho vivente e original e não se descuidará do plano do curso. Com isso se atende ao desenvolvimento do que a criança traz (sem forçá-lo) e para o que será sua futura vida social. Mas, de quais temas o professor deverá partir para que cumpra com tudo aquilo que se deve propor com o desenho? Isto será o que tentaremos [explicar] (muito extensamente) e na próxima lição. Eu me permitirei sugerir um método que não tenho visto aplicado. E isso é natural, pois está de

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de acuerdo con la práctica que yo lo he formado (que pidan los maestros que se publiquen estas conferencias). Sin que el niño se dé cuenta (pero cosa que el maestro no perderá jamás de vista), doble tendrá que ser la actividad del niño, o mejor dicho, que deberá proyectarse su actividad en el diseño en dos sentidos opuestos o diversos. Uno, como se ha visto, libre, como de impulso interno y otro, sujeto a un plan escolar, de acuerdo con posibles especializaciones en grados superiores en sus estudios. Pero, entre una y otra de estas dos actividades debe haber algo que las junte, o que debe juntarlas porque en ambas debe manifestarse un sentido de belleza. Indico eso, pero con muchísimo temor. En efecto, ¿qué es belleza? Parece una necedad el hacerse tal pregunta, porque la casi totalidad de las personas dirán que eso ya se sabe. Y… sin embargo, se sabe menos de lo que se piensa. En nombre de la belleza, ¡qué cosas tan horribles vemos por todas partes! Fachadas de casas, interiores, muebles, objetos… ¡un sinfín de cosas! No hay más que ver ciertos bazares donde se venden objetos de decoración. Da escalofrío pensar en lo que se vende allí. Y el tipógrafo, que llena de firuletes, sin orden ni concierto las páginas de los libros. Y el arquitecto de molduras, cariátides y cornisas innecesarias. Y los escultores, fabricantes de monumentos públicos, desacato a todas las normas que los antiguos, ¡tan sabios!, respetaron. Y en nombre de la belleza, los pintores, qué crímenes estéticos comenten, esclavos del capricho, gente sin ciencia alguna pero con un formidable costal de suficiencia. ¡La Belleza!, ¿quién la ve? Ella, la real, la auténtica. Muchos y pocos, todos y casi ninguno. Depende eso desde el ángulo en que se consideren las cosas. Porque yo me atrevo a afirmar que se menosprecia la belleza auténtica y se adora la estridencia, lo inarmónico, lo antiestético. ¿Paradoja? Nada de eso, amigos. Pero sería muy largo meternos en estos difíciles problemas. Ampliaremos en mi última lección estas consideraciones. Por de pronto, indico al maestro que sea muy humilde el señalar camino para que el niño vea belleza, y esto tanto en lo que se refiere a la belleza natural como en lo que se refiere a la belleza de

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la arquitectura y obras de pintura y escultura. Sería lo mismo que querer despertar en ellos ideas poéticas, ¡cuidado!, puede caerse en sentimentalismo llorón, en lo tierno, en lo exageradamente romántico, y… “blanda cera es la infancia”, como dijo alguien, y aquello se graba, se incrusta (porque a pesar de todo, el prestigio del maestro es grande, su autoridad pesa y… tiene que perdurar aquel criterio). Es pues, éste, terreno muy resbaladizo, y con todo habrá que trabajar mucho en ese sentido. Se ve, con esto, la trascendencia de toda acción del maestro en este sentido educativo. Porque si en el terreno moral nada puede, en éste sí. Además el maestro apoya su autoridad en los textos. Él, la mayor parte de las veces tiene que estar equivocado en una materia que ha podido profundizar poco (poesía, artes plásticas) y, dando crédito al libro, ha formado su criterio que, a su vez, formará el de los discípulos. Así se propaga el error. No dudo ni un momento de que esto que acabo de decir parecerá muy exagerado. Y justamente lo digo porque no de pocas sino de muchas obras, que yo durante muchos años tomé por extraordinarios modelos, luego, con mayor criterio, he visto que distaban mucho de estar de acuerdo con las leyes estéticas. Y viceversa, de otras que según el común criterio de arqueólogos pasan por ser obras de un arte rudimentario, veo yo ahora que allí, justamente, está lo fundamental. Y, naturalmente, no puede exigirse de ningún maestro (ya que no es su especialidad) que tenga ese criterio maduro y entonces que tengan que ir las cosas fatalmente por el camino que siempre han ido. ¡No! Puede hallarse una solución a esa dificultad y esto lo explayaremos en la última conferencia ya que deberá tratar de ese problema. Con todo lo dicho ya se perfila un poco aquello que debe proponerse el maestro con, diremos, la enseñanza del dibujo. Porque asusta ver el camino del error. Y os pido perdón si soy un poco duro en eso, si lastima –un poco, quizás– vuestras convicciones. Pues no está dicho todo, y a vosotros, pedagogos, hay que decíroslo todo. ¿No tenéis en vuestras manos las o la generación futura? Voy a ello, pues, con ánimo resuelto.


acordo com a prática que tenho indicado (que os professores peçam a publicação destas conferências). Sem que a criança perceba (mas coisa que o professor jamais perderá de vista), a atividade da criança terá de ser o dobro, ou melhor dito, que a sua atividade no desenho deverá se projetar em dois sentidos opostos e diversos. Um, como se tem visto, livre, como impulso interno, e outro, sujeito a uma planificação escolar, de acordo com possíveis especializações em graus superiores nos seus estudos. Mas, entre uma e a outra dessas duas atividades, deve haver algo que as junte, ou que deve juntá-las, porque em ambas deve se manifestar um sentido de beleza. Indico isso, mas com muitíssimo temor. De fato, o que é a beleza? Parece necessário se fazer tal pergunta, porque quase a totalidade das pessoas dirá que isso já se sabe. E... contudo, sabe-se menos do que se pensa. Em nome da beleza, que coisas tão horríveis vemos em toda parte! Fachadas de casas, interiores, móveis, objetos... um sem-fim de coisas! Ainda mais em certos bazares onde se vendem objetos de decoração. Dá arrepios pensar no que se vende ali. E o tipógrafo, que enche de enfeites de mal gosto, sem ordem nem concerto, as páginas dos livros. E o arquiteto de molduras, cariátides e cornijas desnecessárias. E os escultores, fabricantes de monumentos públicos, desacato de todas as normas que os antigos – tão sábios! – respeitaram. E em nome da beleza, os pintores, que crimes estéticos cometem, escravos do capricho, gente sem ciência alguma, mas com um formidável arsenal de competência. A beleza! Quem a vê? Ela, a real, a autêntica. Muitos e poucos, todos e quase nenhum. Isso depende do ângulo em que se considerem as coisas. Porque eu me atrevo a assinalar que se menospreza a autêntica beleza e se adora a estridência, o inarmônico, o antiestético. Paradoxo? Nada disso, amigos. Mas seria muito longo nos enfiar nesses difíceis problemas. Ampliaremos na minha última lição essas considerações. Por enquanto, indico ao professor que seja muito humilde ao indicar o caminho para que a criança veja a beleza, tanto no que se refere à beleza natural como no

que se refere à beleza da arquitetura e de obras de pintura e escultura. Seria o mesmo do que querer acordar nela ideias poéticas. Cuidado! Pode-se cair em sentimentalismo chorão, no terno, no exageradamente romântico, e... “mole cera é a infância”, como disse alguém, e aquilo se grava, incrusta-se (porque, apesar de tudo, o prestígio do professor é grande, sua autoridade pesa e... tem de perdurar aquele critério). Esse é, pois, terreno muito escorregadio. Contudo, [o professor] terá de trabalhar muito nesse sentido. Vê-se, com isto, a transcendência de toda ação do professor nesse sentido educativo. Porque, se no terreno moral nada pode, naquele sim. Além disso, o professor apoia sua autoridade nos textos. Ele, a maior parte das vezes, poderá estar errado numa matéria em que se aprofundou pouco (poesia, artes plásticas) e, dando crédito ao livro, formou o seu critério. Este, por sua vez, formará o critério dos seus discípulos. Assim se propaga o erro. Não duvido nem por um momento que isso que acabo de dizer parecerá muito exagerado. E justamente, digo isso porque, não de poucas, mas sim de muitas obras, que eu durante muitos anos tomei por modelos extraordinários, portanto, com maior critério, descobri que estavam muito longe de estar de acordo com as leis estéticas. E vice-versa, de outras que segundo o critério comum de arqueólogos passam por obras de uma arte rudimentar, eu vejo agora que ali, justamente, está o fundamental. E, naturalmente, não pode se exigir de nenhum professor (embora não seja a sua especialidade) que tenha esse critério maduro e então que tenham que ir as coisas fatalmente pelo caminho que sempre têm ido. Não! Pode se achar uma solução para essa dificuldade e sobre isso nos alongaremos na última conferência, pois deverá tratar desse problema. Com tudo o que foi dito, já se perfila um pouco aquilo que deve se propor o professor com o ensino do desenho. Porque assusta ver o caminho do erro. E lhes peço desculpas se sou um pouco duro nisso, se machuca – um pouco, talvez – as convicções de vocês. Pois não está dito tudo, e para vocês, pedagogos, deve-se dizê-lo. Não tem vocês nas mãos as gerações futuras? Vou para isso, pois, com ânimo resoluto.

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Tercera conferencia

Método que podría proponerse para conseguir la finalidad de lo que debe ser el dibujo en la escuela

Orientados un poco por lo estudiado en las dos lecciones anteriores hoy podemos, partiendo de aquellas bases, fijar en qué sentido ha de desplazarse el dibujo en las escuelas. Dijimos que la actitud del maestro ante el niño tenía que ser más bien pasiva, dejando que éste, en cierto modo, tomase la iniciativa. Cosa que a primera vista no parece admisible, pues la indisciplina y la fantasía pronto reinarían en la escuela, y ésta tiene que proponerse todo lo contrario. Por eso debe explicarse en qué sentido se dice esto, pero ahora no es el caso de discutir sobre lo ya dicho. Pero en resumen puede sintetizarse así: que el maestro, ante todo, tiene que saber qué es aquel niño que tiene ante sí, y por otro lado (como ya dije), que éste se dé cuenta de lo que es. Cosa que no obtendremos si, considerándolo no un individuo con personalidad sino más bien un niño en abstracto, tratamos de imponerle lo que pensamos que le conviene, sin conocerle, y que él tenga que asimilar aquello sin saber por qué. Considero esto un verdadero atropello. Se le da al maestro un ser vivo, inteligente, con voluntad, con un carácter determinado y con posibilidades de dar, cuidando de su normal desarrollo, un rendimiento provechoso a la sociedad y posibilidad para él de formarse en sentido apropiado. Y si en vez de eso, considerándolo un número entre otros, se le quiere estandarizar, ¿qué obtendremos? Un autómata como tantos millones de seres como andan por el mundo. Sobre esto me extendí en la lección anterior, y creo que basta con lo dicho. Ahora, partiendo de cierta edad (yo señalé los doce años), la cosa debe variar. Ese niño, ya suficientemente poseído de su personalidad, ya conociéndose diestro en algo determinado, y moralmente habiéndose

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dado cuenta de su fuerza o de su debilidad ( y todo esto habrá sido la buena obra altruista del pedagogo), debe pensar (o mejor dicho han de pensar en eso sus maestros), debe pensarse, pues, que fuere como él sea, ha de entrar dentro de la armonía social y desde ese momento, visto para qué sirve y en qué forma, ha de procurar adaptarse. O mejor dicho, sus maestros han de procurar adaptarlo. Se objetará, quizás, que esta esmerada enseñanza (casi individual) no sería posible en escuelas públicas ni aun en las privadas. También puede objetarse que esa especialización determinada por la tendencia individual de cada alumno podría llevarnos a tan numerosa cantidad de materias y modalidades que prácticamente la cosa se haría imposible. Y también, la de que especializados así los alumnos, carecerían de conocimientos generales, a todos necesarios, y que hacen a lo que suele llamarse un individuo culto. Largo sería entrar en el detalle de estas objeciones, solo hasta cierto punto justas. Démoslas mejor por buenas, y tratemos de solventar la dificultad y de dar satisfacción a todo aquello indiscutiblemente necesario para hacer un individuo no solo apto para alternar con los otros, sino también, y principalmente, para su propia subsistencia, sí, para su propia subsistencia en la sociedad, por el mejor rendimiento que dé a ella con su especial actividad. Y creo que no ha de consistir en un justo equilibrio de disciplinas y conocimiento, pero por agrupamiento de materias afines (dando con esto un máximo de amplitud a unas y restringiendo a un mínimo las otras) con el fin, en lo posible, de crear tipos sociales determinados, (oficios, artes, letras, etc) y así no recargando con un volumen innecesario de técnicas o de conocimientos al discípulo. O, si aun resultasen excesivas estas agrupaciones, hacerlas entonces por modalidades de actividad: manuales, intelectuales,


Terceira conferência

Método que se poderia propor para conseguir a finalidade do que deve ser o desenho na escola

Orientados um pouco pelo estudado nas duas lições anteriores, hoje podemos, a partir daquelas bases, fixar em que sentido deve-se deslocar o desenho nas escolas. Dissémos que a atitude do professor ante a criança tinha de ser passiva, deixando que ela, de certa forma, tomasse a iniciativa. Coisa que à primeira vista não parece admissível, pois a indisciplina e a fantasia logo reinarão na escola, e esta tem de se propor o contrário. Por isso, deve-se explicar em que sentido se diz isso, mas agora não é o caso de discutir sobre o já dito. Mas, em resumo, pode-se sintetizar assim: que o professor tem de saber o que é aquela criança que tem diante de si, e, por outro lado (como já disse), que ela perceba o que é. Coisa que não obteremos se não a consideramos como um indivíduo com personalidade, mas sim como uma criança em abstrato, tentando lhe impor o que pensamos que lhe convém, sem lhe conhecer, e que [a forcemos] a assimilar aquilo sem saber o porquê. Considero isso um verdadeiro atropelo. Dá-se ao professor um ser vivo, inteligente, com vontade, com um caráter determinado e com possibilidades de dar, cuidando do seu normal desenvolvimento, um rendimento proveitoso à sociedade e possibilidade para que ele se forme no sentido apropriado. E, se no lugar disso, considerando-o um número entre outros, [ele seja] estandardizado? O que obteremos? Um autômato como tantos milhões de seres que andam pelo mundo. Sobre isso me estendi na lição anterior, e acho que basta com o dito. Agora, a partir de certa idade (eu sinalei os 12 anos), a coisa deve variar. Essa criança, já suficientemente dona da sua personalidade, já se conhecendo capaz em algo determinado, e moralmente tendo percebido sua força ou a

sua debilidade (tudo isso será obra altruísta do pedagogo), deve pensar (ou melhor dito, tem de pensar nisso os seus professores), então, seja como for, tem de entrar na harmonia social e, a partir desse momento, entender para que serve e de que forma terá de procurar se adaptar. Ou, melhor dito, seus professores têm de procurar adaptá-lo. Se objetará, talvez, que esse esmerado ensino (quase individual) não seria possível nas escolas públicas nem mesmo nas escolas privadas. Também pode-se objetar que essa especialização determinada pela tendência individual de cada aluno poderia nos levar a uma numerosa quantia de matérias e modalidades que praticamente a tornaria impossível. E também, a objeção de que, especializados assim, os alunos careceriam de conhecimentos gerais, para todos necessários, e que constituem o que se pode chamar de um indivíduo culto. Seria demasiado longo entrar nos detalhes dessas objeções, só até certo ponto justas. Melhor as ter como boas, e tentarmos resolver a dificuldade de dar satisfação a tudo aquilo indiscutivelmente necessário para fazer um indivíduo que não seja só apto para se relacionar com os outros, mas também, e principalmente, para dar conta de sua própria subsistência, sim, para a sua própria subsistência na sociedade, pelo melhor rendimento que sua atividade possa lhe dar. E acho que [isso] não tem de consistir num justo equilíbrio de disciplinas e conhecimento, mas em agrupamento de matérias afins (dando com isso um máximo de amplitude para umas e restringindo um mínimo das outras) com a finalidade, no possível, de criar tipos sociais determinados (ofícios, artes, letras etc.) e, assim, não sobrecarregando o aluno com um volume desnecessário de técnicas ou de conhecimentos. E, se mesmo assim resultarem excessivos esses agrupamentos, façamos então por modalidades de

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morales, con lo que se obtendrían tipos bien determinados. Todo ello siempre con vistas al desplazamiento y actividad del futuro hombre. Y arriesgaría aun otra clasificación, quizás más simple pero también más atrevida, y sería esta: de hombres en el tiempo y de hombres en el espacio. Hombres de acción, de carácter, y hombres constructores, contemplativos y estudiosos. Pronto, en un grupo de individuos se definen estas dos modalidades del carácter humano, y da el mejor resultado el adaptar a ellas un plan de disciplinas, actividades y estudios. Y a vosotros, pedagogos, no os costaría mucho el establecer un plan así en vuestra escuela, que, por otra parte, definiría de la mejor manera el tipo de niños que la integrasen. Y ¡piénsese en la eficacia de semejante plan para que el niño se defina a sí mismo! De la experiencia, del trato con los alumnos yo he sacado esta consecuencia y me he podido dar cuenta de la esterilidad de todo empeño encaminado a dar un conocimiento a un niño para el que era perfectamente impermeable. Tortura para él, fracaso para el profesor, pérdida de tiempo: este es el resultado. Atendiendo, pues, a todas estas y otras más cosas, yo he tratado de equilibrar lo que debe enseñarse en las escuelas en cuanto al dibujo. Podrán ver que es un método completamente nuevo, inédito, y que yo lo brindo ahora por primera vez a mis compatriotas los maestros uruguayos. De su eficacia no dudo, aunque para su debida aplicación yo tendría que hacerlo practicar, y no solo eso, sino también extenderme en ciertas explicaciones que ya son del dominio del arte. Pero quizás supla a eso vuestra intuición, que sabrá comprenderme en este esquema que voy a presentar. Aunque pienso que más que todo ello os ilustrará algún ejemplo que veremos al final de esta lección. Voy a lo que se puede llamar dibujo escritura, es decir medio de expresión y (fijaos bien) de expresión estética o, mejor dicho, medio de expresarse estéticamente. Divi-

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do el campo de operaciones en dos conceptos distintos, lo abstracto y lo concreto, y así tenemos: Primera lección Que el niño dibuje lo que pueden llamarse elementos plásticos (que el profesor irá dictando): una línea recta, una quebrada, una circunferencia, un arco, unas paralelas, etc. Y luego un círculo rojo, un triángulo azul, un cuadrado amarillo, una forma irregular negra. Segunda lección Composición con la recta y el color rojo 1. Simples líneas cruzándose haciendo ángulo, en la combinación que se quiera, y el color rojo. 2. Objeto a base solo de rectas y el color rojo. 3. Línea recta, un triángulo, una circunferencia. Tercera lección Ritmo de dos elementos. Repetición de una figura geométrica: círculo, cuadrado, rectas, onduladas o alternándose y combinándose. Y el color azul. Ritmo de tres elementos. Líneas geométricas alternando con rojo y azul. Cuarta lección Ritmo de objetos. Sugerir al niño, o que él los busque, objetos en que se repita rítmicamente un elemento: una hilera de árboles, las ventanas de una casa, una escalera, los arcos de un puente. Esto y un color: amarillo. Quinta lección La circunferencia, recta y un color: azul. Sexta lección Que el niño busque objetos circulares, una rueda, un reloj, etc., y también objetos en que entre la circunferencia y las líneas rectas. Esto y un color.


atividade – manuais, intelectuais, morais –, com o que se obterá tipos bem determinados. Tudo isso sempre olhando para o deslocamento e a atividade do futuro homem. Arriscaria ainda outra classificação, talvez mais simples e também mais atrevida, que seria: de homens no tempo e de homens no espaço. Homens de ação, de caráter, e homens construtores, contemplativos e estudiosos. Logo, num grupo de indivíduos se definem essas duas modalidades de caráter humano, e daria melhor resultado adaptar a elas um plano de disciplinas, atividades e estudos. E para vocês, pedagogos, não lhes custaria muito estabelecer um plano assim na sua escola, que, por outro lado, definiria da melhor maneira o tipo de crianças que a integrassem. E, pense na eficácia de semelhante plano para que a criança se defina a si mesmo! Da experiência e do trato com os alunos, tenho tirado essa consequência e tenho percebido a esterilidade de todo empenho no sentido de dar um conhecimento à criança para o qual ela era perfeitamente impermeável. Tortura para ela, fracasso para o professor, perda de tempo: esse é o resultado. Atendendo, pois, a todas essas e outras coisas mais, eu tenho tentado equilibrar o que se deve ensinar nas escolas com relação ao desenho. [Vocês] Poderão ver que é um método completamente novo, inédito, o qual brindo agora pela primeira vez aos meus compatriotas, os professores uruguaios. Não duvido da sua eficácia não duvido, ainda que para a sua devida aplicação eu teria de fazê-lo ser praticado, e não só isso, como também me estender em certas explicações que já são do domínio da arte. Mas talvez isso seja suprido pela intuição de vocês, que saberão compreender esse esquema que vou apresentar. Ainda penso que, mais que tudo isso, algum exemplo que veremos no final desta lição o ilustrará. Vou ao que pode-se chamar de desenho-escritura, quer dizer, meio de expressão e (reparem bem) de expressão estética ou, melhor dito, meio de se expressar estetica-

mente. Divido o campo de operações em dois conceitos distintos, o abstrato e o concreto, e assim temos: Primeira lição Que a criança desenhe o que se podem chamar de elementos plásticos (que o professor irá ditando): uma linha reta, uma quebrada, uma circunferência, um arco, umas paralelas etc. Então, um círculo vermelho, um triângulo azul, um quadrado amarelo, uma forma irregular preta. Segunda lição Composição com a reta e a cor vermelha. 1. Linhas simples se cruzando e fazendo ângulo, na combinação que quiser, e na cor vermelha. 2. Objeto formado apenas por retas e na cor vermelha. 3. Linha reta, um triângulo, uma circunferência. Terceira lição Ritmo de dois elementos. Repetição de uma figura geométrica – círculo, quadrado, retas, curvas – ou [figuras] se alternando e se combinando, na cor azul. Ritmo de três elementos. Linhas geométricas alternando com o vermelho e o azul. Quarta lição Ritmo de objetos. Sugerir à criança objetos em que se repita ritmicamente um elemento – uma fileira de árvores, as janelas de uma casa, uma escada, os arcos de uma ponte – ou fazer que ela os procure. Isto com uma cor: amarela. Quinta lição Uma circunferência e uma reta numa cor: azul. Sexta lição Que a criança procure objetos circulares, uma roda, um relógio etc., e também objetos em que entre a circunferência e as linhas retas. Isto numa cor.

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Séptima lección Manchas de color en formas libres e irregulares. Solamente los tres colores primarios, rojo, amarillo y azul. Octava lección Aplicación de esas manchas a objetos adecuados: una pera, unas guindas, un pez, etc. Novena lección A base de pocas líneas, hacer un paisaje: una casa, una tranquera, unos árboles, un puente (bien esquemático y casi geométrico) y después: Entresacar, como por análisis, elementos de ese paisaje: los cuadrados de las ventanas, los palos de las tranqueras, la copa de los árboles. Y todo esto se pondrá en orden. Décima lección Desarrollar una historieta cualquiera. Por ejemplo, un cuadrado (provisto de piernas, brazos y cabeza) disputará con una circunferencia (igualmente animada) la posesión de una botella. Undécima lección Dibujar un navío y se emplearán los tres colores primarios, y después, como haciendo análisis de los elementos, se entresacarán la bandera, la chimenea, el ancla. Duodécima lección Formas libres hechas con rectas y curvas (bien determinadas) y llenas por rojo, azul, amarillo y negro. Decimotercera lección Buscar objetos compuestos de rectas y curvas bien determinadas, campana, guitarra, copa, etc. y llenarlos con los tres colores y negro.

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Decimocuarta lección Proponer otra historia: un campesino que va al campo, al salir el sol, seguido de su perro y llevando la azada al hombro (todo en base al círculo, el cuadrado, la ondulada, el triángulo) y empleando los tres colores puros. Decimoquinta lección Hacer siete cuadrados y llenarlos con los tres colores fundamentales: rojo, amarillo y azul, y ahora los tres complementarios y el negro. Decimosexta lección Hacer seis figuras inventadas irregulares que podrán corresponder a los siete días de la semana y llenarlas con los colores antedichos. Como se ve, el método consiste: primero en dar los elementos abstractos, colores, líneas y formas, y segundo, después buscar en la realidad objetos que puedan corresponder a esos elementos. Este dibujo será practicado hasta los doce años. Como puede verse no es imitativo. Establece solo una relación entre lo abstracto y lo concreto de la realidad, y creo que no conviene al niño sacarlo de ese plano. Y la eficacia de tal sistema consiste en eso: primero se le han dado los elementos plásticos, las líneas geométricas puras y los colores puros, abstractos, tales como el rojo, el amarillo y el azul, y también el negro, teniendo el blanco ya en el papel. Pero además se le han dado elementos de belleza: el ritmo, la manera de obtener resultados estéticos por la combinación de colores, líneas y figuras abstractas. Con esto se asegura el elemento belleza del dibujo, puesto que se ha estudiado así separadamente. Y entonces viene luego el ir a lo concreto, el buscar en la realidad objetos que se puedan hacer con esos elementos y que tengan un


Sétima lição Manchas de cor em formas livres e irregulares. Somente as três cores primárias: vermelho, amarelo e azul. Oitava lição Aplicação dessas manchas em objetos adequados: uma pera, umas guindas, um peixe etc. Nona lição Em poucas linhas, fazer uma paisagem: uma casa, uma porteira, umas árvores, uma ponte (bem esquemático, e quase geométrico) e então: Pinçar, como por análise, elementos dessa paisagem: os quadrados das janelas, os paus das tranqueiras, as copas das árvores, pondo em ordem tudo isso. Décima lição Desenvolver uma história qualquer. Por exemplo, um quadrado (provido de pernas, braços e cabeça) disputará com uma circunferência (igualmente animada) a posse de uma garrafa. Décima primeira lição Desenhar um navio, empregando-se as três cores primarias, e então, fazendo uma análise dos elementos, se pinçarão a bandeira, a chaminé, a âncora. Décima segunda lição Formas livres feitas com retas e curvas (bem determinadas) e preenchidas de vermelho, azul, amarelo e preto. Décima terceira lição Procurar objetos compostos por retas e curvas determinadas – campana, violão, copa etc. – e preenchê-los com as três cores [primárias] e preto.

Décima quarta lição Propor outra história: um camponês que vai para a lavoura, ao nascer do sol, seguido pelo seu cachorro e levando a enxada no ombro (tudo com base no círculo, no quadrado, na curva, no triângulo) e empregando as três cores primárias. Décima quinta lição Fazer sete quadrados e preenchê-los com as três cores fundamentais: vermelho, amarelo e azul, colocando agora as três cores complementares e o preto. Décima sexta lição Inventar seis figuras irregulares que possam corresponder aos sete dias da semana e preenchê-las com as cores citadas. Como se vê, o método consiste em: primeiro, dar os elementos abstratos, cores, linhas e formas, e, segundo, procurar na realidade objetos que possam corresponder a esses elementos. Este desenho será praticado até os 12 anos. Como pode-se ver, não é imitativo. Estabelece só uma relação entre o abstrato e o concreto da realidade, e acho que não convém à criança tirá-la desse plano. E a eficácia de tal sistema consiste nisso: primeiro foram dados os elementos plásticos, as linhas geométricas puras e as cores puras, abstratas, tais como o vermelho, o amarelo e o azul, e também o preto, tendo o branco já no papel. Mas, também, foram dados elementos de beleza: o ritmo, a maneira de obter resultados estéticos pela combinação de cores, linhas e figuras abstratas. Com isso, assegura-se o elemento beleza do desenho, posto que foi estudado separadamente. E então, em seguida vem o ir para o concreto, o procurar na realidade objetos que possam ser feitos com esses elementos e que tenham um ritmo ou uma proporção por contraste com formas geométricas, podendo assim

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ritmo o una proporción, por contraste de formas acusadas en sentido geométrico, y así el niño podrá describir aquel objeto estéticamente. Y esto, que es fundamental, y que por esto conviene que se grabe profundamente en la mente del niño, no tiene que ser distraído por otras nociones. Además, realizará un trabajo de creación de acuerdo con esa edad en que la fantasía domina. Pasados los doce años, como he dicho, las cosas deben cambiar. Entrar en lo aparente, en lo relativo de la visión física y, por esto, en el claroscuro y la perspectiva. Y aquí todo el trabajo del pedagogo estará en hacerle ver, en hacerle observar y también en hacerle comprender la finalidad de poseer un medio gráfico. Para obtener buen resultado yo no puedo proponer más que lo que yo he hecho y que, por haberlo experimentado, sé que puede dar satisfacción al objetivo que se persigue. Debe ser (como el anterior) un sistema cíclico o rotativo en que se vayan alternando los ejercicios. Y a éstos yo los dividiría así: Primer ejercicio. Dibujo de memoria Enseñar un objeto y ocultarlo. Después hacerlo dibujar. Luego, con el objeto a la vista hacer que rectifiquen las equivocaciones. Dibujos trazados con lápiz y después de la corrección fijados con tinta. Segundo ejercicio. Dibujo de invención A. Dado un elemento, flor, animal, objeto, componer algo decorativo: cubierta de libro, friso decorativo, decoración de una habitación. B. Describir un suceso cualquiera, de un cuento o de una lectura, de un sitio, de un personaje. Tercer ejercicio. Dibujo directo Copiar del natural, sirviéndose del lápiz o del carbón y también del color, objetos de forma regular en que se acusen las líneas de la perspectiva y los planos de sombras y de luz. Y ahí el maestro ha de hacer ver la relatividad de

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esas líneas y planos, sirviéndose de una regla o el lápiz puestos vertical y horizontalmente. Y también la deformación perspectiva de un círculo y del escorzo. Asimismo el contraste de los colores de los objetos y el tono relativo que toman por la luz y la sombra. Y todos los objetos, sin distinción, pueden servir para esos ejercicios, y las flores y los frutos. Cuarto ejercicio. Dibujo lineal Tómese un objeto cualquiera y háganse dibujar los diferentes planos de él, midiendo primero al mismo tamaño y después el doble más grande o la mitad más chico, o un tercio, etc. Por ejemplo, una botella de forma bien acusada, una caja, un jarro, una herramienta, etc. Hecho el dibujo con lápiz, ha de pasarse luego en tinta. Con estos cuatro ejercicios, turnándose, me parece que se consigue una base para partir luego en direcciones bien diferentes, según la individual tendencia de cada alumno, y tener un bagaje de conocimientos para dar expresión a cualquier idea que convenga. En la lección próxima ampliaremos todo esto con ejemplos y ejercicios.


a criança descrever aquele objeto esteticamente. E isso, que é fundamental e que, portanto, convém que se grave profundamente na mente da criança, não pode ser desviado por outras noções. Além disso, [a criança] realizará um trabalho de criação de acordo com essa idade em que a fantasia domina. Passados os 12 anos, como tenho dito, as coisas devem mudar. [Podemos] Entrar no aparente, no relativo da visão física e, devido a isso, no claro-escuro e na perspectiva. E aqui, todo o trabalho do pedagogo estará em lhe fazer ver, em fazer-lhe observar e também fazer-lhe compreender a finalidade de possuir um meio gráfico. Para obter um bom resultado, não posso propor mais do que já tenho feito e que, por tê-lo experimentado, sei que pode servir ao objetivo que se persegue. Deve ser (como o anterior) um sistema cíclico ou rotativo no qual venham se alternando os exercícios. E estes dividiria assim: Primeiro exercício. Desenho de memória Ensinar um objeto e ocultá-lo. Depois, fazê-la [a criança] desenhar. Então, com o objeto à vista, fazer que retifique os equívocos. [Fazer a criança realizar]Desenhos traçados com lápis e, depois da correção, fixados com tinta.

das linhas e planos, servindo-se de uma régua ou do lápis colocados vertical e horizontalmente. E também, a deformação perspectiva de um círculo e do escorço. Também [fazer ver] o contraste das cores dos objetos e o tom relativo que adquirem graças à luz e à sombra. Todos os objetos, sem distinção, podem servir para esses exercícios. Quarto exercício. Desenho linear. Pega-se um objeto qualquer e faz-se um desenho de seus diferentes planos, medindo primeiro o mesmo tamanho e, depois, o dobro ou a metade, ou um terço etc. Por exemplo, uma garrafa com forma bem marcada, uma caixa, uma jarra, uma ferramenta etc. Após feito o desenho com lápis, pintá-lo com tinta. Alternando esses quatro exercícios, acredito que se consegue uma base para partir logo em direções bem diferentes, dependendo da tendência individual de cada aluno, e tendo uma bagagem de conhecimentos para dar expressão para qualquer ideia que convenha. Na próxima lição, ampliaremos tudo isso com exemplos e exercícios.

Segundo exercício. Desenho de invenção A. Dado um elemento – flor, animal, objeto –, compor algo decorativo: capa de livro, friso decorativo, decoração de uma habitação. B. Descrever um evento qualquer, de um conto ou de uma leitura, de um sítio, de uma personagem. Terceiro exercício. Desenho direto Copiar do natural, servindo-se do lápis ou do carvão e também da cor, objetos de forma regular em que se mostrem as linhas da perspectiva e os planos de sombras e de luz. E ali, o professor tem de fazer ver a relatividade

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Quarta conferencia

Expresión y representación La idea de ensayar el método de dibujo que expuse en mi última conferencia, me vino después de haber visitado una exposición (muy completa) de dibujos escolares de Checoslovaquia. Había trabajos de diversos grados, y aun bastantes de cursos muy superiores y al parecer especializados, pero a pesar de la pulcritud de muchos de aquellos estudios, de la organización en general de la exposición, de aplicaciones llevadas a objetos diversos, confieso que la exposición no me satisfizo. No vi orientación, no vi algo que unificase todo aquel heterogéneo conjunto de cosas; al contrario, vi solo un hacer sin rumbo, y aun un poco rutinario de puro anticuado, pero sobre todo, lo que noté más a faltar, fue la absoluta ausencia de belleza y vida de todo aquello. Y como de ese mal justamente pecaba todo lo que a dibujo escolar se refiere en Madrid, que era donde yo entonces estaba y vi esa exposición, y como que en ese momento tuviese que dar algunas lecciones experimentales sobre esa materia, pensé que sería bien idear un método que atendiese a lo que debe ser el dibujo escolar, pero que al mismo tiempo tuviese belleza, valor estético. ¿Por qué debía descuidarse eso tan importante? Y allí en Madrid no debía descuidarse eso, y por esta razón, después de madurar el plan y de ordenar las lecciones, pasé a la experimentación con algunos alumnos. Fue esto después de más de veinte años de no dedicarme al trabajo pedagógico y pocos meses antes de salir de allí para venir a Montevideo. Por esto no sé qué resultado habrá dado, si es que se ha puesto en práctica. Pero sé en cambio el resultado que a mí me dio, que fue excelente. Y de ahí el proponerlo yo ahora aquí. Creo que se habrá comprendido bien lo que expliqué en mi última lección, que fue primero dar los elementos, los colores primarios, las líneas y figuras

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geométricas esenciales, es decir, lo que yo he llamado abstracto. Así como también, y dentro de este mismo orden, el ritmo, la combinación de líneas, formas y colores sin llegar a ninguna representación. Asegurado esto, puesto bien en evidencia para que el niño se dé cuenta, debe pasarse de inmediato a lo concreto. Y entonces, empleando solo eso elemental, deberá buscar en la realidad algo que pueda ser representado por eso tan primario, esos simples elementos plásticos. Cuatro órdenes de cosas deberá sugerir el maestro al niño como tema en sus dibujos: 1. Objetos hechos por el hombre. 2. Objetos naturales. 3. Aspectos de cosas y de naturaleza. 4. Sucesos (humanos y también de la naturaleza). Alternando esto, podrá primeramente hacer pintar y dibujar en un papel lo siguiente: Elementos plásticos (y que los niños anoten esto). Un círculo rojo, un triángulo azul, un cuadrado amarillo, una forma irregular negra. Y después: una línea recta, una circunferencia (y si las conocen algunas figuras geométricas). Y ya con esto puede comenzar la: Primera lección Simples líneas cruzándose, haciendo ángulo, buscando combinarlas estéticamente, y un color. Hecho esto debe pasarse a lo concreto: buscar objetos que puedan representarse con esas simples líneas y ese solo color. Segunda lección. Ritmo con dos elementos. Repetición de una figura geométrica (círculo, cuadrado, rectas, onduladas) alternándose rítmicamente, y un color.


Quarta conferência

Expressão e representação A ideia de ensinar o método de desenho que expus na minha última conferência surgiu depois de ter visitado uma exposição (muito completa) de desenhos escolares da Checoslováquia. Tinha trabalhos de diversos graus, vários de cursos muito superiores e, parece, especializados, mas, apesar da pulcritude de muitos daqueles estudos, da organização em geral da exposição, de aplicações levadas para objetos diversos, confesso que a exposição não me satisfez. Não vi orientação, não vi algo que unificasse todo aquele heterogêneo conjunto de coisas; pelo contrário, só vi um fazer sem rumo, e ainda um pouco rotineiro e antiquado, mas, acima de tudo, o que percebi foi a absoluta falta de beleza e vida de tudo aquilo. E como desse mal, justamente, pecava tudo o que se refere ao desenho escolar em Madri, que era onde eu então estava, e onde vi a exposição, e como, nesse momento, dava algumas lições experimentais sobre essa matéria, imaginei que seria bom criar um método que atendesse ao que deve ser o desenho escolar, mas que, ao mesmo tempo, tivesse beleza, valor estético. Por que se devia descuidar de algo tão importante? E também em Madri não se devia descuidar disso, e, por essa razão, depois de amadurecer o plano e de pôr em ordem as lições, passei à experimentação com alguns alunos. Isso aconteceu depois de mais de vinte anos sem me dedicar ao trabalho pedagógico e poucos meses de sair dali para voltar a Montevidéu. Por isso, não sei o resultado disso, nem se foi posto em prática. Mas sei, por outro lado, o resultado que tem dado, que foi excelente. Portanto, eu o proponho agora aqui. Acho que se compreendeu bem o que expliquei na minha última lição, que foi: primeiro dar os elementos, as cores primárias, as linhas e figuras geométricas essenciais; ou seja, o que eu tenho chamado de abstrato. Da

mesma forma, e dentro dessa mesma ordem, o ritmo, a combinação de linhas, as formas e cores, sem chegar a nenhuma representação. Garantido isso, colocado bem em evidência para que a criança perceba, deve se passar imediatamente para o concreto. E então, empregando só essa coisa elementar, deve-se procurar na realidade algo que possa ser representado por isso tão primário, esses simples elementos plásticos. O professor deverá sugerir à criança quatro ordens de coisas como tema para os seus desenhos: 1. Objetos feitos pelo homem. 2. Objetos naturais. 3. Aspectos de coisas e da natureza. 4. Acontecimentos (humanos e também da natureza). Alternando isso, poderá, primeiramente, fazer pintar e desenhar num papel o seguinte: Elementos plásticos (e que as crianças escrevam isso). Um círculo vermelho, um triângulo azul, um quadrado amarelo, uma forma irregular preta. E depois: uma linha reta, uma circunferência (e se as conhecem, algumas figuras geométricas). E assim, já se pode começar a: Primeira lição [Sugerir que o aluno desenhe] Simples linhas se cruzando, fazendo ângulo, procurando combiná-las esteticamente, com uma cor. Feito isso, deve-se passar para o concreto: procurar objetos que possam ser representados apenas com essas simples linhas e essa cor. Segunda lição: Ritmo com dois elementos Repetição de uma figura geométrica (círculo, quadrado, retas, curvas) se alternando ritmicamente, com uma cor.

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Después de esto pedir al niño que busque ese mismo ritmo en objetos naturales: una escalera, una hilera de árboles, un puente, etc. Tercera lección Combinación con la circunferencia y la línea recta y un color. Y después que busque objetos circulares o compuestos con curvas y rectas y los dibuje aplicando un solo color.

Novena lección A base de formas geométricas representar objetos. Primero dibujar las formas geométricas y llenarlas de colores. Después dibujar los objetos y también llenarlos con los mismos colores.

Cuarta lección Manchas de color en formas libres irregulares (solamente de los tres colores primarios y el negro) y después buscar objetos de formas irregulares que dibujarán siempre de memoria, una pera, un tomate, unas guindas, un pez, etc.

Décima lección Ejercicios de formas irregulares para obtener siluetas de objetos. Dibujar luego los objetos.

Quinta lección A base de pocas líneas hacer un paisaje, una casa, una tranquera, unos árboles, un puente y que pongan de los mismos colores primarios. Y después que entresaquen de ese dibujo los elementos de que está compuesto. Sexta lección Formas libres hechas con rectas y curvas, bien acusadas, y después llenarlas con los colores primarios. Luego buscar objetos adecuados, una campana, una guitarra, una copa, etc. Séptima lección Trazar un mapa en que haya, por ejemplo, indicado los cerros y montañas, la ciudad, los navíos y el puerto, alguna isla. Y después levantar un paisaje de acuerdo con esa descripción abstracta.

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Octava lección Formas regulares e irregulares, aplicando los colores primarios. Y después, a base de esas formas dibujar el interior de una cosa en que puedan entrar esas formas.

Undécima lección Objeto medio oculto por otro. Primero formas geométricas, después objetos, siempre frontales y con color.


Depois disso, pedir à criança que procure esse mesmo ritmo em objetos naturais: uma escada, uma fileira de árvores, uma ponte etc.

Oitava lição Formas regulares e irregulares, aplicando as cores primárias. E depois, a base dessas formas; desenhar o interior de uma coisa em que possam entrar essas formas.

Terceira lição Combinação com a circunferência, uma linha reta e uma cor. E depois, que [a criança] procure objetos circulares ou compostos com curvas e retas e os desenhe aplicando uma cor apenas.

Nona lição A partir de formas geométricas, representar objetos. Primeiro, desenhar as formas geométricas e colori-las. Depois, desenhar objetos e também preenchê-los com as mesmas cores.

Quarta lição Manchas de cor em formas livres irregulares (somente das três cores primárias e o preto) e depois, [sugerir] que [os alunos] procurem objetos de formas irregulares, que desenhem sempre de memória: uma pera, um tomate, umas guindas, um peixe etc.

Décima lição Exercícios de formas irregulares para obter silhuetas de objetos. Logo depois, desenhar os objetos. Décima primeira lição Objeto parcialmente oculto por outro. Primeiro, formas geométricas; depois, objetos, sempre frontais e com cor.

Quinta lição A partir de poucas linhas, fazer uma paisagem, uma casa, uma porteira, umas árvores, uma ponte e que [os alunos] utilizem as mesmas cores primárias. E depois, que pincem desse desenho os elementos de que é composto. Sexta lição Formas livres feitas com retas e curvas, bem marcadas, e depois preenchê-las com as cores primárias. Em seguida, procurar objetos adequados, um sino, um violão, uma taça etc. Sétima lição Traçar um mapa no qual, por exemplo, sejam indicados os morros e as montanhas, a cidade, os navios e o porto ou alguma ilha. E depois, levantar uma paisagem de acordo com essa descrição abstrata.

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VersĂŁo fac-similada do caderno Dibujo escritura, 1933, pertencente ao acervo do Museu Torres GarcĂ­a

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Torres García. El Niño Aprende Jugando

Prefeito do Município de São Paulo Fernando Haddad

Direção geral:

Alejandro Díaz Secretário Municipal de Cultura

Curadoria e desenho

Nabil Bonduki

da montagem:

Alejandro Díaz, Federico Méndez,

Gustavo Serra

Coordenação da exposição:

Fabrício Reiner de Andrade e

Biblioteca Mário de Andrade

Mariana Casares

Diretor:

Luiz Armando Bagolin

Edição de textos:

Mariana Casares

Supervisora de acervo:

Rita D'Angelo

Projeto gráfico:

Gabriela Lissa Sakajiri e

Supervisora de ação cultural:

Tarcila Lucena

Rafael Micheski

Supervisor de administração

Tradução de textos:

Yara Duffau

e finanças:

Pedro Henrique R. Rocha

Correção de textos

Supervisora de atendimento:

Kátia Santos

em espanhol:

Supervisor de planejamento:

Fabrício Reiner de Andrade

Edda Fabri

Preparação e revisão de textos em português:

Marcelo Carpinetti e Tarcila Lucena

Fotografias:

Alejandro Díaz

Vídeo:

Alvaro Adib Barreiro

Atividades didáticas:

Kátia Santos e Natame Diniz

Agradecimentos:

Demian Díaz Torres, Jimena Perera,

Micaela Perera, María Celia González e

Museu da Cidade

Impressão:

Ipsis Gráfica e Editora

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Torres-García : el niño aprende jugando / Alejandro Díaz e Mariana Casares (orgs.). -1. ed. -- São Paulo : Editora IPSIS, 2015. Realização: BMA Edições. Bibliografia ISBN 978-85-98741-88-8

Todas as imagens e textos pertencem à Fundação Torres García de Montevidéu. Direitos reservados

1. Arte contemporânea - Exposições 2. Artes plásticas - Uruguai 3. Arte Uruguaia - Exposições 4. Arte Uruguaia - Século 20 - Exposições 5. Biblioteca Mário de Andrade (São Paulo, SP) 6. Brinquedos educativos 7. Torres-García, Joaquin, 1874-1949 - Exposições I. Díaz, Alejandro. II. Casares, Mariana.

15-10692

CDD-709.895

Índices para catálogo sistemático: 1. Arte contemporânea uruguaia : Exposições 709.895



Torres-GarcĂ­a el niĂąo aprende jugando

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