Revsita Cultural Prosa 3

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junho de 2012 - ano 1 - n˚ 3

MARQUÊS DE SADE cinemapolivozartesvisuais literaturamúsicateatro

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editorial “Amigo leitor, prepara teu coração e teu espírito para o relato mais impuro já feito desde que o mundo existe.” É assim que se inicia o livro 120 dias de Sodoma, escrito no século 18, pelo Marquês de Sade. A frase inicial dá uma ideia do que virá pela frente. Na história, durante quatro meses, 44 pessoas se entregam aos mais secretos - ou nem tanto - deleites de quatro libertinos. Eles devem esquecer seus pudores, seus medos e seus questionamentos morais, pois não há lugar para isso. Por Sade estar muito vinculado ao tema do sexo, acredito que muita gente já tenha uma ideia pré-concebida do escritor francês. Entretanto, se a gente for analisar bem, Sade utiliza esse universo para fazer uma metáfora de outras questões como o do individualismo do ser humano, da sua busca incessante pelo prazer e pelo poder, que é um assunto recorrente atualmente, apesar de o texto ser do século 18. A terceira edição da nossa revista vem com o propósito de expor ideias artísticas, principalmente no que tange à sexualidade, corroborando diversas reações sobre a temática. Tentamos fazer da nossa publicação um objeto de beleza e informação. Sem barreiras, sem medo de ousar e de testar nossos limites criativos. Para a arte não existe limite. A revista prosa é isto: um espaço criativo e aberto a experimentações. Libertem-se e deliciem-se com mais essa edição da revista. Prazer, prosa!

revista prosa produzida pelo studio v artes visuais ano 1 – n˚ 3 – junho de 2012 rua la plata, 79 – sion tel: (31) 3658.1992 belo horizonte/mg e-mail: studiov@studiovartesvisuais.com.br diretora: letícia lima mendanha editorial: leticia lima mendanha mariana silveira arte e diagramação: tiago farias coordenação comercial: mariana silveira revisão: marina palmieri impressão: paulinelli serviços gráficos tiragem: 5.000 exemplares

Acompanhe as novidades:


Ă­ndice 30

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sexo, livros e rock & roll

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gastronomia banquete dos deuses

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mapa de ouro preto


música Jamile Hallack

Igor “Lorão” Marotti

SOM VIL

Protesto, perversão e sexo: ingredientes de uma composição sádica Dentro de uma música, até o proibido se torna possível. A melodia é a expressão da alma e a letra, a transformação de um desejo em palavras. Em Veraneio Vascaíno, Renato Russo expôs a corrupção policial na época da ditadura, sem se referir a ela de forma direta. Atualmente a banda belo-horizontina UDR põe, na música, prazer, desejo e também tudo aquilo taxado de impróprio e pervertido, trazendo à tona os preceitos do Marquês de Sade. A horda, como preferem ser chamados, começou em 2003 e o significado de “UDR” vem

de “União Democrática Ruralista”, um partido de latifundiários. A ideia era dar um nome conservador para uma coisa que na verdade é totalmente libertária. As letras são excêntricas, os temas estão sempre ligados a sexo e perversão, em um ritmo “funk Miami beat”. Algumas lembram até as festas descritas nos contos de Sade. O grupo é formado por três integrantes: João Carvalho, conhecido com o “MS Barney”, Thiago Machado, vulgo “Porquinho” e Rafael Mordente, o “Professor Aquaplay”, que nos cedeu a entrevista abaixo. Aos

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30 anos, ele é o vocalista e produtor da UDR, além de ser poeta e mergulhador de plateias. Qual a história da UDR? Rafael Mordente : O conjunto musical UDR Banda Ballet e Coral começou em maio de 2003, a partir da junção de várias iniciativas prévias de corrupção musical, como: Essepçonais MCs, MC Abutre e MC Carniça, MC Carvão & Karkarah. Assim como os Segredos de Fátima e os olhos de Mithra, somos três. Uma vez formada essa “chinfra” com os aliados, na semana seguinte fomos juntos ao show do Silverchair no “Mineirinho”. Choramos em Emotion Sickness. Por que escolheram esta temática sexual e irreverente para as letras das músicas? RM: Por que não escolheríamos? Toda arte possui temática sexual se você domina bem

seus conhecimentos de semiótica. A irreverência é um bônus, porque não gostamos de esconder nossos sentimentos negativos atrás da vã esperança de que devem nos amar por sermos bons confeiteiros emocionais. Todo artista que não é a UDR pode e deve ser taxado como mentiroso, corporativista e fútil. Como se dá a composição delas? Quem as compõe? RM: Nosso processo de composição é como a Alquimia. No começo, nem nós mesmos entendíamos. Agora, só nós mesmos entendemos. Criamos a partir de sílabas isoladas que se formam de acordo com sua própria ordem de atração entre si. Você conhece o Marquês de Sade? O que acha das obras dele? Você acha que as músicas do UDR têm um pouco do Marquês?

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Igor “Lorão” Marotti Camiseta verde é o MS Barney Camiseta preta é o MC Carvão Camisa vermelha é o Professor Aquaplay RM: Não pessoalmente, mas adoro O Apagador no Campo das Cem Teias. Acho que não tem muito em comum não. Vivemos em épocas muito distintas, o Marquês e eu. O tempo dele é carente de acesso à informação e saneamento básico até para quem é das camadas mais altas do intelecto. O meu tempo, contudo, é carente de camadas mais altas do intelecto até pra quem tem acesso à informação e saneamento básico. Diria que são obras complementares como aquelas cobrinhas japonesas: I-Ching e I-Chang. Qual o show mais inusitado que vocês já fizeram? RM: Foi o de 06 de maio de 2005. Dois mil “metaleiros” esperavam um show do Massacration e foram ofuscados pelo “Evangelho Illuminati” da UDR. 1.500 deles responderam com uma chuva de objetos. Os outros 500

responderam digladiando-se, morrendo e ressuscitando em honra à UDR. Os 500 de “Spartanás”, por assim dizer. Você tem alguma história que queira contar? RM: Uma vez eu estava na rua a fim de comer um cachorro-quente. Parei em uma carrocinha de cachorro-quente e falei assim: “Moço, me dá dois cachorros-quentes. Ah! Um deles eu quero sem mostarda”. Aí o vendedor fez os dois, pegou a mostarda, olhou para os cachorros-quentes; olhou de volta pra mim. Por fim, perguntou: “Qual?”. Contei essa história pro Rogério Skylab e pouco tempo depois ele lançou a música Carrocinha de Cachorro Quente, cuja estrutura musical e lírica viria eventualmente a influenciar um b-side nosso chamado No Seu Cu. E sim, eu terminei a entrevista duas vezes falando “no seu cu”.

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teatro

Sthefanny Gozze

Marionetes

lascivas garantem

fantasia sádica

Grupo de teatro de bonecos utiliza técnica precisa de manipulação realista de marionetes em espetáculo lúdico baseado na obra de Sade A Filosofia na Alcova, diálogo publicado clandestinamente em 1795 por Marquês de Sade, representa um documento base do pensamento do autor. A obra aborda temas polêmicos, como o cristianismo, as “boas maneiras”, o aborto, o incesto e toda sorte de perversões e exacerbações dos prazeres. Na história é retratada a iniciação de uma jovem ao mundo da libertinagem, por meio de uma educação sexual teórica e prática regada a erotismo sádico. As posições ideológicas são essenciais para a execução do exercício, estas se colocam em oposição aos ideais republicanos da época de Sade e contra toda e qualquer forma de submissão. Sobre seu projeto inspirado nesse texto, o diretor do grupo Pigmalião Escultura que Mexe, Eduardo Félix, concede à Prosa uma entrevista: Como surgiu o projeto e qual seu propósito? Eduardo Félix: O Pigmalião Escultura que Mexe” tem como objetivo principal desenvolver espetáculos de marionetes para adultos, associando essa modalidade ao teatro contemporâneo, já que ela é quase sempre associada só a temas tradicionais ou infantis. Buscamos fazer isso desenvolvendo pesquisas dramatúrgicas e sobre a representação do movimento. O grupo surgiu em 2007, com a montagem da cena curta O Presente, que

foi uma das vencedoras do 8º Festival de Cenas Curtas do Galpão Cine Horto. Era uma montagem muito visual e muito ligada ao meu trabalho como artista plástico. Por que escolher a obra Filosofia na Alcova, de Sade para tratar a religião, os bons-costumes, o aborto e a sexualidade? Você não acha que o exímio escritor francês é áspero ao abordar essas questões? Ou escolher Sade é meramente provocativo? EF: A escolha de Filosofia na Alcova se deu por diversos motivos. A obra é sim extremamente provocativa e vimos nela a possibilidade de desenvolver um espetáculo que provocasse a reflexão, como sempre acontece quando lemos Sade. Gostaríamos que o público pudesse se confrontar com questões de sua própria natureza a respeito das quais muitas vezes, ele não se permite pensar. A ambiguidade de Sade revela a verdadeira condição humana sem muitos véus, mas é difícil perceber qual é o seu real posicionamento. Ele é tão imoral em seus escritos e acaba chocando tanto com sua visão, que também pode ser entendido como extremamente moralista. Acho que o texto do Sade é tão provocativo hoje quanto foi na época em que foi lançado, no final do século XVIII. Pensar no que ele diz sem nenhuma hipocrisia é pensar livre e filosoficamente. Interessa-nos

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muito fazer com que as pessoas tenham verdadeiras indagações filosóficas e catárticas assistindo aos nossos espetáculos de bonecos. Buscamos um princípio básico do teatro, que desde a antiguidade, nas tragédias gregas, tem por objetivo levar à reflexão pelo horror e pela piedade. É o que propunha Aristóteles em sua Arte Poética. Esse é o objetivo maior da tragédia. É este o princípio da catarse e o principal objetivo do espetáculo. Não concordo com tudo o que o Sade diz. Além disso, acho que nem ele mesmo concordava, pois seus textos tem muitas contradições. Por exemplo, Sade condena em seus textos a piedade como sendo um sentimento pusilânime, porém, ele provoca no público esse sentimento o tempo inteiro. Para mim a cena mais ambígua do espetáculo talvez seja a que fala do aborto. O texto defende o aborto como uma prática absolutamente normal e justificável, mas a imagem dessa cena choca tanto, que ela também pode ser entendida como uma cena anti-aborto. Conseguir isso com um espetáculo de marionetes é muito interessante, pois ninguém espera que vai sair de um espetáculo de marionetes pensando em questões como essas. Portanto, nossa escolha é sim pelo provocativo no Sade, mas não é uma escolha gratuita, e sim filosófica e livre de preconceitos sociais, morais e religiosos. Interessa-nos em Sade o filósofo e pensador que ele foi. Já estamos pensando e trabalhando em nossa nova montagem, que também vai buscar provocar a reflexão filosófica, mesmo que para isso o público tenha que se chocar novamente com o que ele mais tenta esconder de si mesmo. Ainda não posso contar qual será a montagem, pois estamos no início do processo criativo e muita coisa pode mudar, mas já posso dizer que tratará da loucura.

mes Brèves Marionnettiques Orbis Pictus, na cidade Reims, na França. Em seguida, estreamos em BH, em setembro do ano passado, no Galpão Cine Horto. Depois ficamos em cartaz no SESC Palladium, em outubro. Este ano nos apresentamos no Teatro Marília e em agosto entraremos em cartaz no teatro Oi Futuro, nos dias 10, 11 e 12. Como foi a receptividade do público mineiro? EF: O público mineiro, assim como o público de Brasília e mesmo o da França, terra do Sade, recebeu muito bem o espetáculo com todas as suas provocações. Obviamente muita gente fica chocada ao ver, mas nunca pensamos que este seria um espetáculo que agradaria a todos. Sabemos que as marionetes são sempre associadas a temáticas mais ingênuas, mas queremos muito mudar essa visão e mostrar que elas são capazes de ser catalisadoras de pensamentos, assim como o teatro de atores. Criado em 2007 o PIGMALIÃO escultura que mexe desenvolve e exibe espetáculos de teatro de bonecos tendo como ponto de partida as técnicas tradicionais, resgatando-as para a cena contemporânea. É composto por Daniela Papini, Eduardo Félix, Huberth Allan, Igor Godinho, Mariliz Schrickte e Taís Scaff: artistas vindos do teatro, das artes plásticas e do circo. Atuam na criação, construção e manipulação de marionetes, na elaboração e montagem de cenografias e ainda em palestras, oficinas e workshops.

Amira Hissa

Nos dias 23, 24 e 25 de março deste ano, o grupo apresentou os espetáculo de marionetes no Teatro Marília, em BH. Houve outros pontos de apresentação em Minas Gerais? EF: Estreamos o espetáculo em março do ano passado, no teatro da FUNARTE em Brasília. Depois disso fizemos uma versão de 18 minutos que apresentamos no Festival de For-

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gastronomia

&

Cinema Gastronomia:

Banquete dos deuses Como descrever o ato de ir ao cinema ou ir de encontro à degustação gastronômica? A pessoa que vai ao cinema segue os mesmos princípios que a movem de encontro à degustação gastronômica: prazer, alimentação, satisfação, conhecimento. Dentre muitos outros motivos e desejos, ambos promovem o alimento para a alma. Para os gregos, as artes em geral promoviam a saúde mental e espiritual. Unir o corpo e a mente nos transporta para a substanciosa e a união perfeita do alimentar ambos os “corpos”: físico e anímico. Dionísio, deus da arte, da música, da alegria e da gastronomia, tinha um momento de saciedade: o encontro com sua plenitude de alma – o êxtase. Nós atingimos esse êxtase quando nos deparamos com um prato saboroso ou com um filme fabuloso. No ato

de ver ou de comer; sabores, cores, culturas, são incorporadas e vividas em sua plenitude. Elevamo-nos de simples mortais a um deleite dos deuses. Essas artes, Cinema e Gastronomia, servem-nos como veículo de transporte. Transportamos para outras culturas, outras vidas, outras misturas. Dentro do filme, com o filme, diante do filme podemos nos alimentar, nos recriar, transformar. Diante da comida, com a comida, saciar é trocar. Segundo Fernando Pessoa, somos muitos. E nestes muitos nos reconhecemos. Elegemos partes de nós na escolha de um prato ou de um filme e a partir daí, degustamos, retemos ou nos saciamos, mas, sobretudo, estamos abertos à experimentação, ao novo. Neste espaço em que figura o inédito, o inusitado, perdemos momentaneamente

Rosângela Bicalho Teixeira Rezende Psicológa e Cineasta

Luciana Brito Historiadora e Psicanalista

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o controle, e nos colocamos aos encontros. Desfrutamos da saborosa comida de “A festa de Babette”, assombramo-nos com a comida de “O cozinheiro, o ladrão, sua mulher e o amante”, deliciamo-nos com “ Como água para chocolate”, encantamo-nos com “ Ratatouille”, sentimos seduzidos por “Chocolate”, assustados com “A comilança” ou aprendemos com “ O tempero da vida”. Em cada filme ou em cada prato, o corpo em seu saber que lhe é próprio, reterá o que é importante, descartará aquilo que não lhe alcança ou se debruçará em seu próprio deleite. Quando essas duas artes se encontram: culinária/gastronomia e cinema/reflexão, estaremos diante de um banquete dionisíaco. Extasiaremos com o diverso, para viver a experiência da síntese, o Cinema em nós. Nesse momento, em que a criação advinda das misturas imperam, todos os sentidos se juntarão para produzir o prato imaginado, que prazerosamente pode

ser vivido com “outros olhos” e que nos conduzirá ao que imaginamos ser a sapientia, isto é, o conhecimento saboroso.

FILMOGRAFIA: “A festa de Babette” (1987) – Gabriel Axel “O cozinheiro, o ladrão, sua mulher e o amante” (1989) - Peter Greenway Como água para chocolate” (1992) - Alfonso Arau Ratatouille” (2007) – Brad Bird “Chocolate” (2000) - Lasse Hallström “A comilança” (1973) – Marco Ferreri “O tempero da vida” (2003) - Tassos Boulmetis

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cinema Denise Flores

A T R “Quando U C morremos à noite”

Conversa em balcão de bar é ficção que retrata realidade. Bar e bebida são elementos constantes de histórias de encontro, sedução, carência, sexo e prazer. São partes de histórias que começam à noite, e não têm hora para acabar. Raul paga uma bebida especial a uma jovem, cheia de vida e charme, e que tenta demonstrar que sabe o que quer. A bela menina passa a sensação de não se importar com as consequências de seus atos, mas ao mesmo tempo parece medir o tamanho do poço no qual pretende se lançar. O diálogo, simples e direto, foi feito para seduzir. Ela desafia. A suposição de que homens mais velhos trepam melhor é o suficiente para raul embarcar, mesmo sem saber a direção.

Para a solidão daquele homem basta a companhia dela. Para ela, tem que ir até o fim. Tem que sentir na pele. Tem que se envolver. O encontro de uma noite rende uma relação de construção rápida. Um homem mais velho, solitário e sincero. Parece cético diante de tantas possibilidades, incomodado com toda a situação. Mas, diante da possibilidade do prazer como recompensa, deixa-se levar. Pequenos atos de tortura podem ser aceitos na busca pelo prazer, é a dor que antecede o êxtase. A menina tem mente livre, desejos infinitos e sede de liberdade. Tem uma carência aparente. Vontade de estar perto. Busca remédio e conforto para as marcas de seu corpo. Quer ser livre, mas não quer que ele a libere. O

Marcelo Martins Santiago

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Marcelo Martins Santiago sexo, uma bebida e alguma conversa se tornam um porto para onde voltar. A busca pelo prazer é inerente ao ser humano. O prazer à mesa, à noite, em casa, o prazer na cama. O prazer a dois. Homem não é ilha, não foi feito para viver sozinho. E o prazer é algo natural. Tem como objetivo satisfazer e precisa ser expresso. A vida em sociedade dita regras e cria relações estereotipadas, que muitas vezes vão na contra mão dos desejos mais sinceros. Em um primeiro momento, os personagens se valem do sutil sadismo de ver que o desejo mútuo não satisfeito tortura o outro. Raul até tenta se convencer de que é possível não ter contato físico, mas ela vai além. O prazer quase inconsciente de ver o outro sofrer de desejo, se torturar na dúvida do que pode acontecer. O ser torturado se deixa levar, a tortura se torna parte dele mesmo. E a recompensa é o prazer que chega e satisfaz. Duas pessoas cheias desejos e carências, diante uma da outra, não devem seguir outro caminho senão o da entrega mútua.

E, como se não houvesse outra fonte de prazer, passa a valer um carrossel de emoções, desejo, tortura, busca pelo prazer e satisfação. A vontade de se satisfazer faz do outro um coadjuvante. Que aparentemente poderia sair de cena, mas, quando desaparece, termina a história. Quando os personagens se separam, negam o que lhes é de direito, o prazer da companhia um do outro. Os diálogos sem muito objetivo, apenas para dar um tempo antes da cama. A vontade de estarem juntos não importando o que isso signifique para o mundo. Raul se deixa levar por um tolo convencionalismo que dita trabalho, sobriedade, andar na linha, não se envolver com uma menina tão mais nova. Tenta acreditar no impossível, que ela seria capaz de se cuidar, de seguir. Ambos torturam o espectador que, satisfeito, acompanhava o prazer de outrem. Negando o que lhes é de direito. A falha tentativa de se enquadrar leva raul, a mais linda mulher da cidade e os espectadores num ponto comum a todo ser humano: sempre que negamos nossos desejos mais íntimos e sinceros, tornamos-nos sádicos de nós mesmos. É quando morremos, à noite ou a qualquer hora.

Marcelo Martins Santiago

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FICHA TÉCNICA título original: quando morremos à noite duração: 20 minutos ano de produção: 2011 cidade: rio de janeiro gênero: ficção formato exibição: 35mm (legendas em inglês e francês) direção, roteiro e montagem: eduardo morotó elenco: roney villela, thaís loureiro, junior vieira FESTIVAIS festivais já realizados, a partir de setembro de 2011: mostra foco (competitiva) - 15º mostra de cinema de tiradentes mostra brasil (competitiva) - 22º festival internacional de curtas metragens de são paulo - curta kinoforum 2011 mostra competitiva - 21º festival internacional de curtas do rio de janeiro curta cinema 2011 mostra competitiva - III semana dos realizadores mostra competitiva - IV janela internacional de cinema do recife mostra competitiva - festival do júri popular 2012 mostra competitiva - XI mostra do filme livre secção competitiva - 15º festival de

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cinema luso brasileiro de santa maria da feira - portugal mostra competitiva – 24èmes, cinélatino, rencontres de toulouse - frança próximos festivais confirmados: mostra competitiva – III festival de cinema de montes claros (maio) programme brazilian histories – short film corner 2012 – setor de cannes voltado para o mercado de curtas (maio) mostra competitiva – II festival internacional lume de cinema (junho) brazilian focus section – festival word cinema amsterdam (agosto) PRÊMIOS melhor curta metragem eleito pelo júri da crítica na 15º mostra de cinema de tiradentes. eleito um dos dez filmes preferidos do público no 22º festival internacional de curtas metragens de são paulo - curta kinoforum 2011 prêmio do público no festival internacional de curtas do rj - curta cinema 2011 prêmio onda curta - aquisição da tv portuguesa rtp2 no festival internacional de curtas do rj - curta cinema 2011 mensão honrosa do júri jovem no festival internacional de curtas do rj - curta cinema 2011 mensao honrosa júri oficial- 15º festival luso brasileiro de santa maria da feira

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jornalista

FICA A DICA!

Tiago Farias

Nada melhor que curtir o inverno na cidade histórica de Ouro Preto. Para dar início à temporada de invasão artística na cidade: 7a MOSTRA DE CINEMA DE OURO PRETO Pioneira no circuito de festivais a enfocar e destacar em sua programação o patrimônio cinematográfico brasileiro, a CineOP chega à sétima edição, de 20 a 25 de junho de 2012. Nestes seis dias de evento, a primeira cidade brasileira declarada Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade pela UNESCO – Ouro Preto, se transforma em fórum privilegiado de discussão, reflexão e ações para a preservação, restauração e memória do patrimônio cinematográfico brasileiro. O evento receberá uma programação cultural intensa e gratuita. Serão instalados três espaços de exibição – o Cine-Praça, na Praça Tiradentes (espaço para mais de 1.000 espectadores); o precioso Cine Vila Rica (platéia para 600 pessoas); e, no Centro de Convenções, sede do evento, o Cine-Teatro (um espaço com 500 lugares). A 7ª CineOP apresenta ao público o cinema brasileiro em diversos gêneros e formatos, em retrospectivas e pré-estréias mundiais, homenagens, ações e projetos de restauro, sessões cine-escola e cine-debates. A memória resgatada sob o ponto de vista do cinema contemporâneo. A Revista prosa não ficará de fora dessa! Criamos um mapa destacável para você se guiar pelas ladeiras de Ouro Preto e para melhorar, a nossa publicação, em parceria com a Hospedaria Antiga preparou uma super promoção para você...Veja o anúncio na próxima página e garanta já o seu cupom de desconto e curta a sua estadia em OP!

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cinema Daniel Caetano

POR

DENTRO

E POR

FORA DAS

PORNOCHANCHADAS O interesse dessa matéria é perceber pontos centrais da exuberante produção de filmes com tons eróticos, feitos num certo período do cinema brasileiro compreendido entre a década de setenta e o início da de oitenta. Especificando ainda mais, parece fundamental entender a relação estabelecida por este(s) gênero(s) de cinema e sua forma mais constante e representativa – a pornochanchada – e seu público. Mas não apenas aquilo que se convencionou chamar de “pornochanchada”. Me parece evidente que precisamos olhar com novos olhos para o apelo que este cinema sedutor exerceu sobre a platéia, desde A Mulher de Todos, marco do cinema chamado Marginal – cujo sucesso nas bilheterias, que muito se deveu à generosa interpretação da estrela Helena Ignez, sugeriu um caminho a ser trilhado para vários produtores de cinema, sobretudo na capital paulista –, seguindo pelas comédias de costumes mais safadas, se-

guidoras de uma tradição próxima de um certo gênero italiano de cinema, até suas manifestações críticas e tardias, já em meados dos anos oitenta, incluindo nisso a conseqüente evolução de alguns realizadores e produtores para o cinema explicitamente pornográfico. Não sei se é do conhecimento de todos os leitores, mas, há alguns anos, o lançamento do filme Tolerância foi envolvido por uma falsa polêmica em torno de suas cenas com situações sexuais – coisa semelhante já tinha acontecido com Um Copo de Cólera, mas nesse caso sem dúvida com uma conotação bem menos negativa. No caso de Tolerância, bastante tinta foi desperdiçada para criticar o fato do cartaz do filme (e equivalentes capas de vídeo e afins) exibir a atriz Maitê Proença, protagonista do filme, vestida com um sumário baby-doll. É o tipo da imagem que chama a atenção de um grande números de possíveis espectadores, e decerto isso pareceu “ape-

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lativo” para os que esperam que o cinema nacional tenha bons modos. Isso parece indicar que não há mais espaço garantido para o cinema erótico dentro deste formato de exibição de filmes que temos hoje nas salas de cinema, dentro de seus shopping centers bem-vestidos. O espectador do cinema erótico parou de ver seus filmes nas salas dos centros, refugiou-se em casa com seu vídeo (agora DVD). Certo. Mas nada justifica que se aceite esta grotesca simplificação de que os filmes eróticos levaram o cinema nacional à falência, nem tampouco este mito pedante e broxante de que não há nada a se descobrir de criativo nos filmes dessa época. Não justifica que aceitemos o mito de que filmes que claramente dialogam com o formato da pornochanchada e procuram seu público sejam vistos à parte, como se fossem um corpo estranho a lidar sofisticadamente com a podridão. Necas, nada feito. Quando Joaquim Pedro fez Guerra Conjugal ou o curta Vereda Tropical, quando Person fez Cassy Jones - O Magnífico Sedutor, quando Jabor fez Eu Te Amo – em todos estes momentos os diretores claramente flertavam com um público já predisposto a entrar nas salas para assistir aos filmes eróticos brasileiros (e, ao mesmo tempo, punham em crise os pressupostos do gênero, como mais tarde fez Reichenbach). No entanto, cria-se essa bizarra diferenciação: Eu te Amo não é pornochanchada, é drama erótico – então o filme do Sílvio de Abreu, Mulher Objeto, então também passa a ser, não é? Dona Flor e Seus Dois Maridos não é pornochanchada, de fato é uma comédia erótica, mas tem grife, ‘é bem-feito’, Xica da Silva é filme histórico, não tem nenhuma relação com a pornochanchada... Bem, David Cardoso também produziu seus filmes históricos e suas adaptações ousadas de escritores brasileiros. Me parece que mais uma vez surgiu o preconceito contra o cinema que agradava ao populacho, e esse rótulo ‘pornochanchada’ não me parece ser mais firme, mais con-

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sistente, que o rótulo que o inspirou, ‘chanchada’. Vale como definição grosseira de um certo formato histórico, entendendo-se por grosseira o fato de que esta definição (comédias eróticas, ocasionalmente dramas, de baixo orçamento feitos num certo período, certo?) será por demais imprecisa e limitada. Chamar um filme de ‘pornochanchada’ foi inicialmente, mais uma vez, uma maneira de desmerecer a priori um certo tipo de manifestação cultural que, provocando o interesse da plebe, não foi digerido de imediato por uma certa classe “bem-pensante”. Como já disse um colega meu, quando se assiste a um filme, há quem ache obscena um cena de sexo que lhe pareça “gratuita”, há quem ache obscena uma

cena de assassinato que lhe pareça “gratuita” – a diferença estará no que cada um considera obsceno. Não que aqueles filmes que se pode chamar de ‘pornochanchadas’, com mais ou menos precisão e purismo de ocasião, sejam todos obras-primas incontestes ou que aquela produção de cinema seja um modelo a ser seguido. Não, decerto teremos muitos pontos problemáticos a notar em cada enfoque, em muitos filmes. Mas não importa aqui descobrir exatamente a quantidade de obras-primas e de filmes péssimos. Cabe, sobretudo, notar a chance de dialogar e produzir idéias que um certo formato histórico teve, a partir da descoberta de um viés de contato com seu público – o viés erótico, sem pudores. Tendo, eventualmente, seu tom machista ou reacionário, mesmo assim teve esse formato o mérito de exibir para nós um imaginário que despertou o interesse em seu público – o que significa que ao mesmo tempo retratou-o e ajudou a moldá-lo. Que este imaginário tenha se voltado ainda mais reacionariamente contra essa produção, essa é a ironia histórica suprema – não estaria de acordo com a realidade a idéia de que o “feio” cinema brasileiro só mostra palavrão e sacanagem só existe nas classes abastadas, creio eu. Compreender o percurso dessa mudança é ver como um mito se estabelece como um preconceito cultural – mas, mais do que compreender, é preciso tentar desmistificar.

Texto publicado originalmente na Revista Contracampo em março de 2002

Sônia Braga na capa do filme “A Dama da Lotação”

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jornalista


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1- Praça Tiradentes 2- Museu da Inconfidência 3- Escola de Minas 4- Igreja São Francisco de Assis 5- Matriz Nossa Senhora do Pilar 6- Igreja Nossa Senhora das Mercês e Misericórdia 7- Igreja Nossa Senhora do Rosário 8- Estação Ferroviária 9- Centro de Convenções 10- Igreja Santa Efigênia 11- Igreja Nossa Senhora das Mercês e Perdões 12- Cine Teatro Vila Rica 13- Igreja Nossa Senhora do Carmo 14- Igreja de São Franscisco

1- República Nau Sem Rumo 2- República Bangalô 3- República Chega Mais 4- República Território Xavante 5- República Necrotério 6- República Poleiro dos Anjos 7- República Adega

1- Hospedaria Antiga 2- Pousada Aleijadinho 3- Pousada de Minas Gerais 4- Hotel Pousada Casa Grande 5- O Sorriso do Lagarto Hostel e Pousada 6- Restaurante Adega de Ouro Preto 7- Hotel Solar do Rosário 8- Arte, Cultura e Museu Jeca Tatu


jornalista


literatura

Elizângela Inocêncio Mattos

Um pensamento radical ou somos corretos demais? nto ame s omo pens Um cal ou s mais? radi s de eto to corr en os am om is? ns u s ma pe o e al d Um dic tos ra rre co

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Um pensamento radical ou somos corretos demais?


A

vasta obra do Marquês de Sade compreende um pensamento que, para além das necessidades de seu tempo, descreve os lugares profundos da natureza humana, sem delongas. Por vezes extremamente radical, Sade tem em suas linhas o excesso elevado à ultima potência, de modo a retirar do homem toda máscara,

os estudiosos de Sade no que se refere às poucas informações sobre sua infância e, mais ainda, aos poucos retratos que encontramos do Marquês. Sua obra é de revolta, reivindica a liberdade diante de todo conteúdo moral e legislador do Estado. Preso a maior parte de sua vida, Sade morre aos setenta e quatro anos. A obra retrata o espaço fechado em que ele viveu. Um furor declarado em sua escrita exprime uma verdade que ele não se cansa de repetir: “a busca pelo prazer é a ação mais urgente do homem. Busca na qual devem ser banidos todos os obstáculos e impedimentos de ordem moral e social, precisamente. Essa ruptura necessária em nome de uma liberdade que ele encontra na natureza decorre do rompimento inevitável que a ideia de liberdade lhe engendra. Assim, não é possível uma liberdade se continuamos atrelados à ideia de uma religião que, repleta de erros, como seus textos explicitam, deturpa a ideia de ser livre e, portanto, de buscar o prazer, a satisfação plena no excesso, descrito pelo Marquês. Seu radicalismo pode ter contribuído para seu esquecimento por parte da tradição filosófica que, somente após muitos séculos, passou a ver na obra do Marquês uma leitura da discurssão sobre o homem e sobre o que o constitui. Uma escrita de combate, diante das chamadas amarras da vida em sociedade, uma obra que rompe com o estabelecido, ao

“...a busca pelo prazer é a ação mais urgente do homem...” desvelando, assim, as potencialidades humanas em toda sua capacidade, para além de todo conteúdo normativo e moral. Nascido em 2 de junho de 1740, Donatien-Alphonse-François, o Marquês de Sade, veio ao mundo em um momento em que a França vivia a monarquia absoluta, instaurada por Luiz XV. De família aristocrática e tradicional, Sade nasce em um momento de conflito, uma sociedade em crise, na qual o poder do rei se debatia com a vontade do povo. Há um consenso entre

seguir tão e somente a natureza que tudo cria. Assim, o prazer, o uso do próprio corpo como necessário a si mesmo, não encontra impedimentos da natureza mas, antes, nos atributos condicionantes do homem. Mas o que é o homem, afinal? Capaz de sempre fazer o bem, de seguir o caminho da virtude? Sade nos responderia: “Não, se o homem é capaz de fazer o bem, também o é em igual medida de fazer seu oposto, o mal, e de seguir o caminho do vício em lugar do da virtude”. Oportuno referir-se as suas

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duas obras: Justine ou os infortúnios da virtureza humana, para realizar todas as suas tude e Juliette e as prosperidades do vício, possibilidades, requer para tanto que se deique Sade descreve a história de Justine e xe de fora toda moral e convenção social, Juliette, duas irmãs separadas na infância, assim como a religião e os costume. Enfim, e como cada uma segue seu caminho setodo atributo constituinte da sociedade, que guindo elementos opostos e curiosamente no espaço fechado é inimigos do prazer e, irmãos: o vício e a virtude. É interessante portanto, da felicidade do individuo. como o Marquês conduz a narrati“...não é possível uma liberdade va de modo a conciliar estes antase continuamos atrelados à ideia gônicos elementos. de uma religião que, repleta de Sade é a representação da liberdade impossível de se fazer pre- erros, como seus textos explicitam, sente na vida pública. Por isso a deturpa a ideia de ser livre” importância do espaço fechado, a metáfora do cárcere, da intimidade, a proAutor de uma obra ousada para seu tempo, funda possibilidade do sujeito e de todas as fato este que se estende ao nosso, pois ele suas nuances, onde todo e qualquer juízo é coloca sem rodeios a natureza do homem e colocado em suspenso. todas as possibilidades de prazer em que o No cinema, o filme de 1976, de Paolo Pacorpo pode se inserir, rompendo com o essolini, Saló, baseado na obra Os 120 Dias tabelecido e com a ideia de Deus. Requisito de Sodoma ainda hoje causa espanto. Uma reflexão possível é buscar justificar tal sensação. O filme de Kaufman, de 2002, Contos proibidos do Marquês de Sade, narrou em obra ficcional os últimos tempos de vida do Marquês sob a ótica do cinema norte americano e demonstrou a necessidade de escrever tão característica de Sade. Sua obra, por vezes de cunho extremamente radical, descreve, em suma, a dificuldade em atrelar a felicidade individual à vida em sociedade. O que a natureza designa não pode ser alcançado na vida ditada pela ordem, pelas normas e pela religião. Esta última é alvo de severas criticas de Sade, que estimula que ela seja rompida pelo individuo, pois constitui um impedimento à liberdade defendida por ele. A felicidade do individuo se insere no movimento permanente do desejo, que quer ser atendido completamente, beirando o absurdo, pois, nas cenas descritas por Sade, as possibilidades do corpo pedem a presença da imaginação, bem como o reconhecimento de que a felicidade tal como descrita, só é possível ser encontrada no espaço fechado. Assim, o lugar de realização do pleno prazer acontece no espaço privado, onde a na-

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este imprescindível para vencer a ignorância e as falsas ilusões. A religião em Sade aparece como uma inimiga da verdadeira luz da razão, um problema sem justificação lógica. Ela sobrevive a partir de falsos pressupostos que, não estando na natureza, justificam-se na vã crença do homem. Em sua obra A Filosofia na Alcova, Sade descreve em diálogos a educação de uma jovem de quinze anos, educação da qual, pouco a pouco, os libertinos não vão inserindo, mas rompendo

Sade oferece ao leitor um permanente movimento de romper fronteiras, como se dissesse que não há na natureza impedimentos e, portanto, toda fronteira deveria ser vencida em nome do prazer. Este, para além dos atributos morais, retorna sempre vivo e constante. Se por um tempo a história das ideias pareceu deixar o Marquês de lado, tal como um pensamento às margens de seu tempo, a vanguarda europeia, em outro tempo, o tomou como ícone de liberdade e “Mas o que é o homem afinal? colocou Sade em lugar de destaque Capaz de sempre fazer o bem, ao pensar as ideias de transgressão de seguir o caminho da virtude?” e liberdade. Certamente o viés preconceituoso fomentou esse modo de deixar de lado a riqueza da obra de Sade, preceitos estabelecidos. Eles buscam, asimprescindível para quem se interessa pelo sim, estimular o esforço para se compreenassunto fundamental que é o homem. O esder que, em última instância, o que deve ser critor libertino é tido como um louco e pornóseguido sempre é a natureza, que, por não grafo -eis de pronto uma forma deliberada conhecer juízos, não oferece impedimentos de tomar sua obra - porém, certamente ele para o prazer, para o gozar sempre, de acorvai além. Descrever a natureza humana, em do com a vontade. A ideia de religião deveria

especial diante das possibilidades do corpo ser abolida por constituir um elemento conem busca do prazer, nada fazem de Sade trário à liberdade humana, um turbilhão de um autor pornógrafo, mas antes, um autor pormenores que, em lugar de confortar, delegam mais impedimentos à felicidade do individuo. “A felicidade do individuo Desse modo, os apetites do corpo se insere no movimento são colocados em primeiro plano, e a permanente do desejo, que quer ignorância e a ingenuidade humanas ser atendido completamente, dão lugar a um clamor pelo prazer que beirando o absurdo...” só repousa na exaustão dos corpos.

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que desvenda a natureza do humano apontando um além mais de toda e qualquer condição normativa. Há um permanente furor em Sade, através do qual o espírito de revolta caracteriza todas as ações dos que ousam pensar a natureza humana e a felicidade material na relação do corpo com seu objeto de desejo. Os temas em Sade rompem com o comum e com o estabelecido, como se chamasse a atenção, como se trouxesse às claras o que permanecia por debaixo do tapete. Se sua

“Sade é representação da liberdade, impossível de se fazer presente na vida pública.”

se submete. Por isso, por seu descontentamento diante de uma liberdade condicionada aos valores morais e religiosos, Sade deixa o homem nu diante de sua própria natureza, de maneira que corremos sempre o risco de recebê-lo com certo incômodo, deixando mesmo sua leitura de lado. Contudo, avançar em suas páginas é olhar de frente o que somos de fato, quais as dimensões do prazer e do corpo. Sade é, sem dúvida, um autor a ser lido, um autor que compreende que tudo deve ser dito, até o que aprendemos, por cuidado ou pudor, calar. Sua obra, escrita como se fosse para encenar em um teatro, poderia nos tomar, leitores, como espectadores de uma encenação na qual somos, nós mesmos, os protagonistas.

obra apresenta o mal, certamente se deve ao fato de se antecipar ao mesmo, como se nos dissesse sobre tudo aquilo de que somos capazes, mas não conseguimos enxergar diante dos véus a que nossa visão

Elizângela Inocêncio Mattos

Professora da Universidade Federal do Tocantins Mestre em filosofia pela Unicamp, Doutoranda no PPG de Filosofia da Ufscar

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de projetos e entidades como o Itaú Cultural, Prêmio Visa de Música Brasileira e projeto Natura Musical. Atualmente, é diretor artístico da Rádio Inconfidência, colaborador do jornal Estado de Minas e da revista de economia Mercado Comum. Letrista bissexto, parceiro de Gilvan de Oliveira, Sérgio Moreira, Affonsinho, Danni Calixto, Victor Mazarello e César Maurício.

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Marina Palmieri

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E S O R V I L , O X SE

L L O R & K C RO

Com 96 contos inscritos, através de uma seleção feita para Sexo, Livros e Rock & Roll. A princípio a ideia era reunir textos que levassem principalmente o bom humor do velho e bom rock and roll, aliados aos temas sexo e/ ou livros. Mas não foi exatamente isso que aconteceu. Seja porque os autores não interpretam corretamente o regulamento (coisa que acontece com muita frequência), ou porque a ousadia da inspiração vinda do rock extrapolou o proposto pela organização, os textos chegaram com uma diversidade muito grande de sentimentos atrelados a eles. Os temas Sexo e Livros foram respeitados, e alguns textos trouxeram o bom humor. Porém, o que se viu no geral foram lembranças de amores perdidos, revoltas, reflexões... e até mesmo elementos fantásticos. Normalmente com outras antologias, o que faríamos neste caso seria descartar aqueles que não obedeceram as regras ou sugestões propostas pela organização. No entanto, se pensarmos bem... o que é o Rock & Roll senão uma forma de extravasarmos nossos sentimentos, não nos importando como serão recebidos? Não seria a cara do Rock & Roll e de suas vertentes essa diversidade e liberdade de expressão que bate de frente até mesmo com quem dita as regras? Sendo assim, a Editora Estronho apresenta pra vocês “Sexo, Livros e Rock & Roll” O tradicional rock and roll é a base dessa antologia da Editora Estronho. Fantasias e sonhos se misturaram a relatos e testemunhos reais, através de contos e crônicas que, uniram o rock and roll a pelo menos mais um dos temas restantes, explícitos no título dessa antologia. E seguindo o espírito rock and roll, os textos trazem uma diversidade de ideias e sentimentos inspirados em clássicos do rock... e outras

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músicas assim nem tão clássicas, mas isso é rock! Nada de preconceitos e rótulos. Nossos rockers/escritores selecionados para essa antologia que acabou por não se prender a estilos literários ou de subgêneros do rock (se preferir, pode usar qualquer rótulo ridículo dado pelos críticos... a mim basta saber que é rock ou que veio do rock): Alfer Medeiros [autor convidado] (“O homem de preto na Prisão Folsom”, inspirado em “Folsom Prison Blues”, Johnny Cash) Bruno R. R. Santos (“Ruídosomia”, inspirado em Cuckoo for Caca, Faith no More) Carlos Henrique M. Abbud (“O livro do amor”, inspirado em “Rock and Roll”, Led Zeppelin) Carolina Mancini (“A pensão do lago”, inspirada em “Detroit Rock City”, Kiss e “Perfect Strangers”, Deep Purple) Celly Borges e M. D. Amado (“E só restou a lua”, inspirando em “Bad moon rising”, Creedence Clearwater Revival) Chico Pascoal (“Tres personae, una substantia”, inspirado em “Metamorfose ambulante”, Raul Seixas) Dimitry Uziel (“Divina volúpia”, inspirado em “When The Music´s Over” e toda obra de The Doors) Fernanda Vilardi (“Rebel Queen”, inspirado em “I love rock n’ roll”, Joan Jett & The Blackhearts) Guilheme Sandi (“Lúcia se diviniza”, inspirado em “Lucy in the sky with diamons”, The Beatles) Hélio C. Brauner (“Barata tonta”, inspirado em “Uma barata chamada Kakfa”, Inimigos do Rei) João Manuel S. Rogaciano, de Portugal (“Um adorável lugar para pernoitar”, inspirado em “Hotel California”, Eagles) Paulo Fodra (“Asfalto quente”, inspirado em “Highway to Hell”, AC/ DC) Ramon Bacelar (“Baby... Light my fire”, inspirado em “Light my fire”, The Doors) Rochett Tavares (“Os tempos estão mudando”, inspirado em “The times they are a-Changin’”, Bob Dylan) Valentina Silva Ferreira, de Portugal (“La Bamba, esposas e amantes”, inspirado em “La Bamba” de Ritchie Valens).

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...TUDO, ATÉ LITERATURA De site de entretenimento (desde 1996), o Estronho e Esquésito foi tomando o rumo da Literatura Fantástica (desde 2004) e tentando fazer a sua parte ao incentivar as escritas de novos autores na seção de contos e poesias sombrias do site. No início de 2010, veio a ideia de montar parcerias com editoras, para o lançamento de livros solo e antologias, usando o nome e a bagagem do Estronho. E com muitas ideias novas e com muita vontade de agitar a litfan nacional, chegou a Editora Estronho... Desde 1996, o site Estronho e Esquésito vem divulgando contos e poesias de autores nacionais de literatura fantástica, tendo como marco de um aumento significativo de qualidade e quantidade, a partir de 2004, quando autores que já começavam a ficar conhecidos no cenário da literatura fantástica brasileira, começaram a publicar seus textos no site. No final de 2009, já com um pouco de bagagem em relação a antologias publicadas, Marcelo Amado (M. D. Amado) teve de volta o seu sonho de um dia publicar um livro que levasse o nome do site, reunindo alguns autores nacionais do cenário da Litfan. No início de 2010 viu que esse sonho era possível, mas descobriu que os autores agoram eram muitos e que além dos conhecidos, para que a proposta do site fosse levada a diante, era preciso realizar um concurso para novos autores. No lugar de um livro, surgiu a ideia de uma coleção que reunisse autores convidados e selecionados por concurso. Em parceria com uma editora, surgia então o Selo do Estronho. Os projetos Extraneus, Histórias Fantásticas, À Sombra do Corvo, Aos Olhos da Morte e Na Próxima Lua Cheia, deram início a essa nova fase. Porém, algumas barreiras ainda eram encontradas nessas parcerias, em relação a oportunidades para novos autores, remuneração e até mesmo em relação a qualidade

do material gráfico. Cheio de ideias na cabeça, o caminho que M. D. Amado, mantenedor do site Estronho e Esquésito, poderia seguir era um só: a criação da Editora Estronho. O objetivo principal da Editora Estronho, continua sendo o mesmo do site, ou seja, lançar novos autores e mesclar seus trabalhos com autores experientes. Além disso, disponibilzar aos leitores, livros com preços mais acessíveis (através da venda direta no site da editora) e com melhor qualidade gráfica, não esquecendo obviamente da qualidade de conteúdo. Outro objetivo da editora é estreitar as relações entre autores e leitores, dando a oportunidade de um contato mais direto entre eles, através das páginas biográficas, comentários e eventos que estaremos promovendo. Novos projetos, novas ideias e pessoas de muito talento e criatividade ajudando nesse início. É assim a Editora Estronho, que tem de tudo... até literatura! * Em 2011, com apenas um ano de existência da editora, fomos indicados ao prêmio Codex de Ouro em duas categorias: Melhor Editora e Melhor antologia de contos com “Extraneus Vol. 1 - Medieval Sci-Fi”. M. D. Amado

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Participem!!! Para comemorar a parceria entre o Studio V artes visuais / Revista Prosa e a Editora Estronho, vamos sortear um exemplar do livro “Insanas”, uma Antologia de contos de suspense e terror. Para concorrer, leia o regulamento abaixo. O sorteio será feito pelo sistema random.org e o resultado será divulgado na próxima edição da Revista Prosa e em nossas redes sociais.

REGULAMENTO PARA A PROMOÇÃO NAS MIDIAS SOCIAIS:

Curta a Página do Studio V artes visuais no Facebook ou siga o @StudioV_AV dê RT na frase: Quero GANHAR o livro “Insanas” da @estronho

Lembrando que o ganhador será sorteado e quanto mais curtir a nossa página e/ou twittar, mais chances tem de ganhar.

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colaboradores J O K E R

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